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Heteropessimismo e Estereótipo de Gênero

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UNIVERSIDADE SALGADO DE OLIVEIRA – UNIVERSO

PRÓ-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM PSICOLOGIA
MESTRADO EM PSICOLOGIA

HETEROPESSIMISMO E ESTEREÓTIPOS DE GÊNERO

ERICK VIEIRA QUEIROZ DE OLIVEIRA,


RUAN JESUS SANTOS E STEFANE LIMA RODRIGUES

NITERÓI
2024
Resumo: A trajetória histórica de homens e mulheres é constantemente marcada por
inúmeras desigualdades levando os indivíduos a um distanciamento performativo e a
um pessimismo quanto as relações heteroafetivas. Essa pesquisa tem como objetivo
compreender de que forma os estereótipos de gênero fomentam o heteropessismo nas
mulheres. Algumas das hipóteses são: os estereótipos de masculinidade exercidos pelos
homens geram problemas de saúde mental nas mulheres e que as experiências repetidas
de relações heterossexuais problemáticas impactam nas baixas expectativas ou na
desistência de criar novos vínculos afetivo amorosos. Sendo assim, espera-se que essa
temática possa dar nome a micro violências sofridas, assim como gerar insights e
ampliar as formas de enxergar a expressão da sexualidade dentro e fora das relações.

Palavras-chave: heteropessimismo, estereótipo de gênero, feminismo.


Introdução

Asa Seresin (2019), pesquisador contemporâneo de gênero, cunhou em sua


dissertação de mestrado intitulada “Conflict of Interest: Heterosexuality and Genre in
U.S. Modernity” o termo “heteropessimismo” para descrever as desfiliações com a
performance heterossexual dentro dos relacionamentos afetivos. Este conceito visa
retratar o sentimento de indivíduos que, apesar de se identificarem como heterossexuais,
experimentam constrangimento e desilusão com as dinâmicas de relacionamento com o
sexo oposto, desenvolvendo assim um pessimismo e uma dificuldade de se engajar em
novas relações. Sendo particularmente atrativo para as mulheres, que frequentemente se
encontram aprisionadas em diversos estereótipos de recato e submissão, considerados
marcadores de vulnerabilidade e saúde mental (Zanello & Silva, 2012).

Para a Psicologia Social, um estereótipo não possui necessariamente um caráter


negativo, mas consiste essencialmente em generalizações de imagens mentais que
representam as características de determinado grupo social (Torres & Neiva, 2023).
Judith Butler, em seu livro “Problemas de Gênero: Feminismo e Subversão da
Identidade”, questiona se ser mulher constitui um fato natural ou uma performance
cultural, sugerindo que os atos performativos dos corpos são os responsáveis por
estabelecerem as categorias de sexo (Butler, 2023).

A expressão “gênero” emergiu através das teóricas feministas com o objetivo de


desnaturalizar as diferenças entre homens e mulheres, ao tratar feminilidade e
masculinidade como construções culturais, e não como características inatas (Piscitelli,
2009). No entanto, debates contemporâneos sugerem que o significado de “gênero”
aponta para um suposto fracasso do feminismo ao tentar criar uma definição que acaba
por sustentar uma estrutura binária em uma sociedade onde as categorias de gênero
mantêm a hierarquia entre os gêneros e promovem a “heterossexualidade compulsória”
(Butler, 2023, p. 8). Dessa forma, considerar a sexualidade como norma limita as
relações afetivas e sexuais a interações entre homens e mulheres, desconsiderando
outras formas de expressão da sexualidade (Welzer-Lang, 2001).

A masculinidade é construída por meio de códigos de estereótipos transmitidos


de geração em geração entre os homens. Homens que são ensinados a exercerem sua
virilidade como um lugar de privilégio sobre as mulheres, evitando qualquer expressão
de comportamento que possa ser interpretada como feminina (Walzer-Lang, 2001). Em
contraste, as mulheres são colocadas no papel oposto, exercendo um papel passivo,
reprimindo sua expressão de sexualidade e sendo domadas para corresponderem às
tarefas maternas e domésticas (Kehl, 1998/2008).

Historicamente, as mulheres sempre enfrentaram uma significativa desigualdade


de gênero em comparação aos homens (Perez & Ricoldi, 2019). Nesse contexto, o
feminismo surge, através de um movimento político expresso em ondas, busca demarcar
as lutas contra o sexismo (bell hooks, 2023). Embora esses movimentos tenham
contribuído para que as mulheres conquistassem seu espaço político, ainda hoje os
gêneros são atravessados por desigualdades. Ser mulher implica performar de acordo
com estereótipos de uma “natureza” tida como inata, através da maternidade, casamento
e tarefas domésticas (Kehl, 1998/2008, p. 48).

Essas performances estão relacionadas a representações sociais e


comportamentos esperados, como meninas brincando de bonecas e meninos de
carrinhos, sendo qualquer desvio dessa norma considerado inapropriado (Piscitelli,
2009). Apesar do feminismo ter exercido esse papel crucial em um mundo regido pelo
patriarcado, inaugurando um campo na ciência e na política que anteriormente era
invisibilizado (Pereira, 2018). Ele começa no final do século XIX com foco nos direitos
políticos das mulheres, e atualmente se encontra em sua quarta onda (Piscitelli, 2009).
Este movimento, que inicialmente se concentrou nas lutas de mulheres brancas de classe
social privilegiada pelo direito ao voto, foi se reconfigurando ao longo do tempo,
incorporando causas sociais mais representativas e permitindo uma compreensão
interseccional dos movimentos paralelos ao gênero, como raça, classe social e
sexualidade (Perez & Ricoldi, 2019).

Um ponto crucial na questão de gênero é a submissão da mulher ao homem


dentro da estrutura de uma sociedade patriarcal, frequentemente manifestada no
casamento. Durante a Revolução Francesa, no século XVIII, o amor romântico emergiu
com uma ideologia de liberdade individual e burguesa, sugerindo uma possível busca
pela felicidade feminina (Tesche & Weinmann, 2020). De acordo com Maria Rita Kehl
(1998/2008), a literatura “inventa” o amor através do casamento burguês, nutrindo a
imaginação das mulheres com uma falsa noção de liberdade individual e expectativas de
felicidade no matrimônio (p. 79). Isso resulta em grandes expectativas quanto ao
casamento, muitas vezes culminando em frustração. “O casamento selava seu destino e
todo o horizonte de sua realização pessoal como esposa, mãe, dona-de-casa. A
felicidade individual (...) só seria acessível às mulheres através do casamento” (Kehl,
1998/2008, p. 81).

Segundo Valleska Zanello, a “prateleira do amor” é uma metáfora que ela criou
para definir o lugar de subjetivação onde as mulheres são condicionadas a serem
escolhidas por um homem (Zanello, 2018, p. 65). Uma vez que, segundo a autora,
sociedade molda as mulheres para aprenderem a amar e se encontrarem nesse papel de
passividade, sendo a escolha por um homem um fator identitário para elas,
frequentemente sobrepondo-se às suas carreiras e conquistas pessoais.

Desde Michel Foucault (1989) as ideias sobre poder são problematizas e


constituem um debate ainda muito atual. Como ele afirma, "Deve-se admitir que o
poder produz saber. Que poder e saber estão implicados diretamente um no outro; que
não há relação de poder sem a constituição correlata de um campo de saber, nem saber
que não suponha e não constitua ao mesmo tempo relações de poder" (Foucault, 1989,
p. 27). Assim, as estruturas patriarcais da sociedade não apenas exercem poder sobre as
mulheres, mas também criam e disseminam os saberes que definem o papel feminino,
perpetuando a ideia de que a realização pessoal da mulher está intrinsecamente ligada
ao casamento e à escolha por um homem, condicionando sua identidade e expectativas
de felicidade.

A partir do exposto, é notável que homens e mulheres são culturalmente


apresentados os estereótipos que corroboram para uma relação afetiva em que as
mulheres se encontram em um lugar de passividade de ser escolhida e os homens
exercem uma posição de dominação sobre elas, como visto em outros aspectos sociais.
Sendo assim, o objetivo deste projeto é compreender de que forma os estereótipos de
gênero fomentam o heteropessismo nas mulheres.

Algumas hipóteses são: os estereótipos de masculinidade exercidos pelos


homens geram problemas de saúde mental nas mulheres e que as experiências repetidas
de relações heterossexuais problemáticas impactam nas baixas expectativas ou na
desistência de criar novos vínculos afetivo amorosos. Espera-se que estudar sobre essa
temática possa dar nome a micro violências sofridas que ainda não são rotuladas, assim
como gerar insights e ampliar as formas de enxergar a expressão da sexualidade dentro
e fora das relações.
Referências

Alves, G. M. (2023). Representações do feminismo: uma investigação da retórica


irônica na série fleabag.

Butler, J. Problemas de gênero: feminismo e subversão da identidade. Tradução de


Renato Aguiar – 24 ed. - Rio de janeiro: Civilização Brasileira, 2023.
Foucault, Michel (1989). Microfísica do poder. 8. ed. Rio de Janeiro: Graal.
Pereira, C. F. (2018). Conexões entre os movimentos Feminista e LGBT no
Brasil. Caderno Espaço Feminino. Uberlândia, 31(1).
Perez, O. C., & Ricoldi, A. M. (2019). A quarta onda feminista: interseccional, digital e
coletiva. In Congresso Latino-americano de Ciência Política (ALACIP) (Vol.
10).
Pisticelli, A. (2009). Gênero: a história de um conceito. Berlendis & Vertecchia.
Teixeira, J. M. D. S., & Paiva, S. P. (2021). Violência contra a mulher e adoecimento
mental: Percepções e práticas de profissionais de saúde em um Centro de
Atenção Psicossocial. Physis: Revista de Saúde Coletiva, 31, e310214.

Torres, C. V., & Neiva, E. R. (2023). Psicologia social: principais temas e vertentes.
Artmed Editora.

Welzer-Lang, D. (2001). A construção do masculino: dominação das mulheres e


homofobia. Revista Estudos Feministas, 9, 460-482.
Tesche, Viviane Rascovetzki; Weinmann, Amadeu Oliveira. Reflexões sobre o enredamento
feminino em relacionamentos abusivos. Caderno Espaço Feminino, v. 31, n. 1, 2018.
Zanello, V., & Silva, R. M. C. (2012). Saúde mental, gênero e violência estrutural.
Zanello, V. (2020). Saúde mental, gênero e dispositivos: cultura e processos de
subjetivação. Editora Appris.

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