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Dossiê Amazônia: Ciência
Dossiê Amazônia: Ciência
Dossiê Amazônia: Ciência
DOSSIÊ
AMAZÔNIA I
Expediente
a finalidade de divulgar a atuação profissional e intelectual de geógrafos, professores de
Geografia da Educação Básica e Superior, estudantes de Pós-Graduação em Geografia e de
Ciências afins. Dentre seus objetivos estão:
Revista Ciência Geográfica 1 - Estimular a produção técnico-científica e didático-pedagógica dos sócios da Associação
Ensino - Pesquisa - Método dos Geógrafos Brasileiros, Seção Bauru – SP e de pesquisadores da Geografia Brasileira ou
Ano XXIV - Vol. XXIV - N.º 2 - Janeiro/Dezembro de 2020 de ciências afins;
ISSN Online: 2675-5122 • ISSN-L: 1413-7461 2 - Divulgar as ciências brasileiras no plano internacional e evidenciar as ciências mundiais ao
Publicação anual voltada ao ensino, à pesquisa e método em Geografia e áreas afins. conhecimento nacional;
3 - Promover a difusão e a popularização da Ciência e Tecnologia no âmbito da Geografia ou
Órgão oficial de divulgação da de Ciências afins;
ASSOCIAÇÃO DOS GEÓGRAFOS BRASILEIROS SEÇÃO LOCAL BAURU - SP 4 - Estabelecer, em caráter permanente, articulações orgânicas entre a pesquisa universitária
de Geografia e Ciências afins com as salas de aula dos Sistemas de Ensino Fundamental,
ASSOCIAÇÃO DOS GEÓGRAFOS BRASILEIROS: Médio, Técnico e Superior.
Presidente Nacional: Profª. Drª. Lorena Izá Pereira As edições online da Revista CIÊNCIA GEOGRÁFICA estão abertas para publicar todas as
Diretor Seção Local Bauru: Prof. Ms. Elian Alabi Lucci tendências acadêmicas e científicas críticas que estão em pauta na Geografia e nas diversas
Áreas de Conhecimento da Educação Escolar Brasileira contemporânea. O objetivo central da
Editores: Revista Eletrônica da AGB/Seção Bauru - SP é ampliar o alcance das Pesquisas e do Ensino de
Álvaro José de Souza (In Memoriam), Elian Alabi Lucci, José Misael Ferreira do Vale, Geografia e suas Ciências conexas. As páginas online estão disponíveis para divulgar todas as
Lourenço Magnoni Júnior, Nilton de Araújo Júnior, Rosicler Sasso Silva, Ruy Moreira e ações que aproximem a Ciência Geográfica brasileira dos cidadãos que desejam a construção
Wellington dos Santos Figueiredo. de um mundo mais justo, solidário, democrático e participativo.
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Álvaro José de Souza (In Memoriam), André Luiz Nascentes Coelho, Adnilson de
Almeida Silva, Antônio Francisco Magnoni, Cristiano Nunes Alves, Edson Belo Indexada em/Indexed in/Abstract in:
Clemente de Souza, Elian Alabi Lucci, Elvis Christian Madureira Ramos, Flavio Gatti, IBCIT (ISSN Online: 2675-5122 • ISSN-L: 1413-7461), Latindex, Diadorim, Gloogle
José Mauro Palhares, José Misael Ferreira do Vale, Lourenço Magnoni Júnior, Lucivânio Acadêmico e LivRe.
Jatobá, Maria da Graça Mello Magnoni, Patrícia Helena Mirandola Garcia, Rosicler
Sasso Silva, Ruy Moreira e Wellington dos Santos Figueiredo. ASSOCIAÇÃO DOS GEÓGRAFOS BRASILEIROS SEÇÃO LOCAL BAURU - SP
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Profª Drª Helena Copetti Callai (UNIJUÍ/Ijuí – RS – Brasil)
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Prof. Dr. Zeno Soares Crocetti (UNILA/Foz do Iguaçu – PR – Brasil)
460 Ciência Geográfica - Bauru - XVI - Vol. XVI - (1): Janeiro/Dezembro - 2012
Geográfica
ISSN Online: 2675-5122
CIÊNCIA ISSN-L: 1416-7461
Sumário
A luta das mulheres indígenas pela manutenção do território tradicional Arara ........................................................................................................... 489
Deborah Monteiro Santos • Maria das Graças Silva Nascimento Silva
As dimensões da vulnerabilidade social: estudo de caso na cidade de Porto Velho-RO, Brasil ................................................................................ 500
Helen Rose Oliveira da Silva • Maria Madalena de Aguiar Cavalcante
Aspectos técnicos para revitalização de bacias hidrográficas com enfoque em nascentes: um panorama de projetos no Brasil e no estado de Rondônia ... 517
Aline dos Santos Betiolo • Nara Luisa Reis de Andrade
Atores da paisagem: o padrão temporal e espacial de focos de queimadas no estado do Amapá entre os anos 2000 e 2019 e as influências das práticas
e saberes indígenas .......................................................................................................................................................................................... 535
Alexandre Luiz Rauber • Carina Santos de Almeida • Manuel Eduardo Ferreira
BR-364 – Nos confins da fronteira oeste do Brasil: uma via para a integração rodoviária do Acre (Cruzeiro do Sul) com Ucayalli (Pucallpa) .................. 554
Ednilson Gomes da Silva • Silvio Simione da Silva
Indígenas na/da cidade: territorialidades do povo Manchineri na cidade de Rio Branco/AC ........................................................................................... 576
Alessandra Severino da Silva Manchinery • Maria de Jesus Morais • Rogério Nogueira de Mesquita
Emissões de gases de efeito estufa no setor de mudança de uso da terra e floresta (MUT) no estado de Rondônia – Brasil ............................................. 596
Bárbara Elis Nascimento Silva • Alexis de Sousa Bastos
Entendimento dos aspectos condicionantes de processos erosivos em superficies tabulares na região sul do estado de Rondônia .............................. 607
Elaine Lima da Fonseca • Eliomar Pereira da Silva Filho •Wilker Kaio dos Santos Nogueira
Impacto da cafeicultura no uso e ocupação do solo da bacia do rio Ribeirão Cacau – RO ................................................................................................ 619
Fabrícia Martins Silva • Patrícia Soares de Maria de Medeiros
Gerenciamento de resíduos sólidos urbanos na fronteira franco-brasileira: impactos socioambientais ......................................................................... 634
Francinete Viana da Silva Corrêa • Valmir Corrêa e Corrêa • José Mauro Palhares
Compartimentação das bacias dos rios Uraricoera e Tacutu, Roraima, com base em parâmetros geomorfométricos do relevo ......................................... 655
Tatiane Ferreira da Silva • Thiago Morato de Carvalho
“Géographies Imaginaires”: la rivière et les représentations discursives dans la déconstruction de l’espace pan-amazonien ........................................ 669
Adnilson de Almeida Silva • Charlot Jn Charles • Jefferson Henrique Cidreira
A extração irregular de areia e os impactos ambientais no ramal Água Preta/Areal, zona rural de Manaus-AM ............................................................... 684
Maria de Fátima da Silva • Mircia Ribeiro Fortes • Mônica Barbosa de Castro Delgado
O contexto geográfico da educação prisional na Pan-Amazônia: desafios e avanços ...................................................................................................... 698
Maria Madalena Lemes Mendes Moreira • Mirian Pereira Suave • Maria das Graças Silva Nascimento Silva
Gestão dos recursos hídricos no estado do Pará-Brasil: uma análise de quinze anos de promulgação da lei nº 6.381/2001 (2001 – 2016) ........................ 712
Francisco Emerson Vale Costa • Antonio Cezar Leal • Carlos Alexandre Leão Bordalo • Edson Vicente da Silva
Agronegócio, dinâmica territorial e re-territorialização no médio-norte mato-grossense - o município de Diamantino ............................................... 729
Rosangela Alves Sobrinho • Tereza Cristina Cardoso de Souza Higa • Flavio Gatti
Panorama geral de fertilidade e teores de elementos-traço na bacia hidrográfica do curso médio do rio Teles Pires ..................................................... 746
Ademilso Sampaio de Oliveira • Maria Aparecida Pereira Pierangeli • Humbelina Silva Siqueira Lopes • Juberto Babilônia de Sousa • Antônio Carlos Silveiro da Silva •
Carla Galbiati
Análise da concentração demográfica na cidade de Vilhena-RO por meio da política de polarização regional ............................................................. 762
Natan Gurkewicz Nunes • Evaldo Ferreira
Alterações na espacialidade da cobertura vegetal no projeto de assentamento florestal Jequitibá detectados por imagens de satélites de média e alta resolução 774
Hélio Marques de Lira • Almir Mateus Melo • Siane Cristhina Pedroso Guimarães Silva
Análise multivariada para estabelecimento de relações de uso e cobertura da terra e dos tipos de solos nos municípios da bacia do Rio do Sangue - MT/Brasil 799
Edineia Aparecida dos Santos Galvanin • Jéssica Cocco • Diego de Lima Nascimento
O açaí como referência sociocultural para pensar, refletir e construir conhecimentos geográficos nas escolas ribeirinhas da Amazônia brasileira ........ 833
Rosana Torrinha Silva de Farias • Daguinete Maria Chaves Brito
Elementos ambientais, fisiografia e feições deposicionais na bacia hidrográfica do rio Tapaiúna, Nova Canaã do Norte, Mato Grosso ....................... 844
Luana Rodrigues de Carvalho • Leila Nalis Paiva da Silva Andrade • Célia Alves de Souza • Carla Galbiati • Maria Aparecida Pereira Pierangeli
O novo modelo de governança do povo Paiter Suruí frente às novas tecnologias da informação ............................................................................. 861
Paulo César Barros Pereira • Maria Liziane Souza Silva • José Luiz Gondim dos Santos • Gasodá Wawaeitxapôh Suruí
Dimensões geográficas e antropológicas das benzedeiras/ores em Porto Velho, Amazônia ocidental brasileira ........................................................ 876
Daniel Delani • Francisco de Assis Mendonça
Fronteira agrícola e conflitos territoriais nas Amazônias Brasileiras: a expansão do agronegócio da soja e seus efeitos no planalto de Santarém,
Pará-Amazônia-Brasil .......................................................................................................................................................................................... 893
Márcio Júnior Benassuly Barros • Otávio do Canto • François Laurent • Andréa Coelho
Bacia hidrográfica do rio Carapá, Mato Grosso: ocupação e uso da terra ................................................................................................................. 912
Rinaldo Marques Padilha • Célia Alves de Souza • Carla Galbiati • Maria Aparecida Pereira Pierangeli
Index
The fight of indigenous women for the maintenance of the traditional territory Arara ............................................................................................... 489
Deborah Monteiro Santos • Maria das Graças Silva Nascimento Silva
The dimensions of social vulnerability: case study in the city of Porto Velho-RO, Brazil .................................................................................................. 500
Helen Rose Oliveira da Silva • Maria Madalena de Aguiar Cavalcante
Technical aspects for revitalizing hydrographic basins with a focus on springs: an overview of projects in Brazil and the state of Rondônia, northern Brazil ..... 517
Aline dos Santos Betiolo • Nara Luisa Reis de Andrade
Landscape agents: the temporal and spatial bushfire patterns in the state of Amapá between the years 2000 and 2019 and the influences of indigenous
practices and knowledge ................................................................................................................................................................................... 535
Alexandre Luiz Rauber • Carina Santos de Almeida • Manuel Eduardo Ferreira
BR-364 – In the ends of the west border of Brazil: a way for the road integration of Acre (Cruzeiro do Sul) with Ucayalli (Pucallpa) .............................. 554
Ednilson Gomes da Silva • Silvio Simione da Silva
Indigenous in/from the city: territorialities of the Manchineri people in the city of Rio Branco/AC ................................................................................ 576
Alessandra Severino da Silva Manchinery • Maria de Jesus Morais • Rogério Nogueira de Mesquita
Greenhouse gas emissions in the land and forest use change sector (MUT) in the state of Rondônia – Brazil .............................................................. 596
Bárbara Elis Nascimento Silva • Alexis de Sousa Bastos
Enderstanding the conditional aspects of erosive processes in the southern region of the state of Rondônia ................................................................. 607
Elaine Lima da Fonseca • Eliomar Pereira da Silva Filho •Wilker Kaio dos Santos Nogueira
Impact of cafeiculture on the use and occupation of the soil of the Ribeirão Cacau river basin in Rondônia ..................................................................... 619
Fabrícia Martins Silva • Patrícia Soares de Maria de Medeiros
Urban solid waste management on the franco-brazilian border: socio-environmental impacts .................................................................................... 634
Francinete Viana da Silva Corrêa • Valmir Corrêa e Corrêa • José Mauro Palhares
Compartmentation of Uraricoera and Tacutu river basins, Roraima, with geomorphometric parameters of relief .......................................................... 655
Tatiane Ferreira da Silva • Thiago Morato de Carvalho
“Imaginary Geographies”: the river and the discursive representations in the deconstruction of the pan-amazonian space ...................................... 669
Adnilson de Almeida Silva • Charlot Jn Charles • Jefferson Henrique Cidreira
Irregular sand extraction and environmental impacts on the Àgua Preta/Areal side road, countryside Manaus-AM ................................................. 684
Maria de Fátima da Silva • Mircia Ribeiro Fortes • Mônica Barbosa de Castro Delgado
The geographical context of prison education in Pan-Amazonia: challenges and advances ......................................................................................... 698
Maria Madalena Lemes Mendes Moreira • Mirian Pereira Suave • Maria das Graças Silva Nascimento Silva
Water resource management in the state of Para, Brazil: a five-year analysis of the promulgation of law nº 6.381/2001 (2001 - 2016) ............................. 712
Francisco Emerson Vale Costa • Antonio Cezar Leal • Carlos Alexandre Leão Bordalo • Edson Vicente da Silva
Agribusiness, territorial dynamics and re-territorialisation in the mid-north matogrossense - the municipality of Diamantino .................................. 729
Rosangela Alves Sobrinho • Tereza Cristina Cardoso de Souza Higa • Flavio Gatti
General overview of fertility and total contents for trace elements in the hidrographic basin of the middle Teles Pires river .................................... 746
Ademilso Sampaio de Oliveira • Maria Aparecida Pereira Pierangeli • Humbelina Silva Siqueira Lopes • Juberto Babilônia de Sousa • Antônio Carlos Silveiro da Silva •
Carla Galbiati
Analysis of demographic concentration in the city of Vilhena, Rondônia via regional polarization policy ................................................................. 762
Natan Gurkewicz Nunes • Evaldo Ferreira
Changes in space of vegetable coverage in the Jequitibá forest sitting project detected by average and high resolution satellite images ................. 774
Hélio Marques de Lira • Almir Mateus Melo • Siane Cristhina Pedroso Guimarães Silva
Multivariate analysis for the establishment of relations of land use/land cover and soil types in the municipalities of the Rio do Sangue basin - MT/Brazil /
Análisis multivariado para establecer relaciones de uso y cobertura de la tierra y tipos los tipos de suelo en los municipios de la cuenca hidrográfica
de Rio do Sangue - MT/Brasil ............................................................................................................................................................................ 799
Edineia Aparecida dos Santos Galvanin • Jéssica Cocco • Diego de Lima Nascimento
The emergency of deep Brazil: the role of the Amazon in this process .................................................................................................................. 811
Carlos Santos
Socio-environmental communication: JBS and its discursive strategy in Rondônia .................................................................................................. 823
Larissa Zuim Matarésio • Maria das Graças Silva Nascimento Silva
Açaí as a sociocultural reference to think, reflect and build geographic knowledge in riberine schools of the Brazilian Amazon .............................. 833
Rosana Torrinha Silva de Farias • Daguinete Maria Chaves Brito
Ambiental elements, physiography and depositional feitions in the watershed of Tapaiúna river, Nova Canaã do Norte, Mato Grosso ..................... 844
Luana Rodrigues de Carvalho • Leila Nalis Paiva da Silva Andrade • Célia Alves de Souza • Carla Galbiati • Maria Aparecida Pereira Pierangeli
A new government model for the Paiter Suruí people in front of the latest change in technology information ....................................................... 861
Paulo César Barros Pereira • Maria Liziane Souza Silva • José Luiz Gondim dos Santos • Gasodá Wawaeitxapôh Suruí
Geographical and anthropological dimensions of folk healers in Porto Velho, brazilian western Amazon ................................................................ 876
Daniel Delani • Francisco de Assis Mendonça
Agricultural frontier and territorial conflicts in the Brazilian Amazon: the expansion of agribusiness soybean and its impacts in the Santarém plateau,
Pará - Amazonia - Brazil ..................................................................................................................................................................................... 893
Márcio Júnior Benassuly Barros • Otávio do Canto • François Laurent • Andréa Coelho
Carapá river hydrographic basin, Mato Grosso: land occupation and use ................................................................................................................ 912
Rinaldo Marques Padilha • Célia Alves de Souza • Carla Galbiati • Maria Aparecida Pereira Pierangeli
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 465
políticas e ambientais encontradas nesta vasta região geográfica. Desse modo, por meio
da Geografia, trazemos aqui diversos caminhos, perpassando desde os mergulhos em suas
águas de muitas cores, compreendendo as andanças em suas metrópoles ou comunidades
ribeirinhas, rumando ao sobrevoo em suas paisagens verdes, recentemente, de um modo
mais agudo e amplo, tornadas flamejantes, acinzentadas. Ainda que sejam exibidas
em retrato em miniatura com muitos recortes espaciais/territoriais, o que temos é um
grande mosaico de realidades e possibilidades, uma “monstruosidade geográfica” como
categoriza José Batista Ricardo Nogueira, que nos desafia constantemente.
Destarte, a edição especial será composta por três dossiês que valorizam e enfatizam o
sentido de conhecer, de sentir e viver um pouco daquilo que acontece no cotidiano ambiental,
social, político e econômico da Amazônia. Com isso, os editores da Revista Ciência
Geográfica prestam o merecido tributo e reconhecimento à região depositária de maior
biodiversidade na Terra, fator que a torna vital e indispensável à conservação ambiental do
planeta, com o fornecimento das chuvas, dos alimentos, dos remédios, dos conhecimentos e
saberes dos povos indígenas e das populações tradicionais — que sabiamente têm vivido e
convivido durante séculos, com que os recursos da natureza lhes oferecem.
Prezados leitores, sentimo-nos muito honrados em tê-los conosco e os convidamos
a adentrar no universo amazônico, a apreciar os relevantes conhecimentos produzidos por
nossas colegas e nossos colegas da Geografia e das Ciências afins, que integram a edição
especial Amazônia.
Nossos sinceros agradecimentos.
Os editores
466 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
LETTER TO THE READER
Studying the Amazon is an urgent, fascinating and challenging task: we are talking
about a place based on immense wealth and deep inequalities. It is a diverse and unique
region, home to different resources, whether natural or social. It extends over an immense
territory extending beyond several borders of the South American subcontinent, whose
complexities and nuances imply that we even think of it as “Amazons”: an intricate network
of places and peoples. Its extensive geographical, biological, population and geopolitical
configuration includes Brazil, Bolivia, Colombia, Ecuador, Guyana and French Guiana,
Peru, Suriname and Venezuela, countries and nations that make up the Pan-Amazon.
Its people, its knowledge, its flavors, its colors, its narratives and exuberant fauna,
flora, rivers, lakes, plains and mountains, have always aroused the imagination and interest
of travelers and researchers, of the many national explorers and foreigners. Since ancient
times, adventurers of all shades have been enchanted by its many mysteries, loved it and
still love its prodigious immensity. For this reason, the frequent lots of invaders hungry for
wealth have always brutally violated their inhabitants, biomes and the Amazonian subsoil.
And today, more than ever, they continue to plunder its immense territory, as if it were an
inexhaustible source of resources for all types of legalized and spurious interests.
At the beginning of the 20th century, the physician and anthropologist Edgard Roquette-
Pinto, founder of Brazilian radio broadcasting and one of the many passionate about the
Amazon, stated: “it is necessary to study Brazil, with its charms and its sadness, in order
to love it consciously; study the land, the animals, the people of Brazil ”. We agree with
Roquette-Pinto about this, however, we add to his thought: in the case of the Amazon, it is
necessary to know it, respect it and also value it due to its strategic importance for our country,
as well as for the whole humanity. In this sense, the Geographic Science Magazine (Revista
Ciência Geográfica) launched the challenge of promoting a special edition about the region.
Thus, we were grateful to receive articles from researchers from the states that make
up the Legal Amazon, from other Brazilian states and also from Bolivia. They are analyzes
and researches that portray the most diverse subjects that are present in Geography, from
the human, socioeconomic, cultural and physical aspects, which make it possible to know
a little of what is effectively produced scientifically and to be able to disseminate correct
information about the current situation in the Amazon region.
There were countless articles produced by teachers, students and researchers who
contributed with their ideas, learnings and experiences related to the Amazon, which
portray what is beautiful and valuable, but also present the socioeconomic, political and
environmental problems found in this vast geographic region. Thus, through Geography, we
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 467
bring here several paths, ranging from the dives in its waters of many colors, understanding
the wanderings in its metropolises or riverside communities, heading overflight in its green
landscapes, recently, in a more acute and wide, made flaming, grayish. Even though they
are displayed in miniature portrait with many spatial / territorial cutouts, what we have is a
large mosaic of realities and possibilities, a “geographical monstrosity” as categorized by
José Batista Ricardo Nogueira, who constantly challenges us.
Thus, the special edition will consist of three dossiers that value and emphasize the
sense of knowing, feeling and experiencing a little of what happens in the environmental,
social, political and economic life in the Amazon. With this, the editors of Geographic
Science Magazine (Revista Ciência Geográfica) pay the deserved tribute and recognition
to the depositary region of greatest biodiversity on Earth, a factor that makes it vital and
indispensable for the environmental conservation of the planet, with the provision of rain,
food, medicine, knowledge and learnings of indigenous peoples and traditional populations
- who have wisely lived and coexisted for centuries, with what nature’s resources offer them.
Dear readers, we feel very honored to have you with us and invite you to enter the
Amazon universe, to appreciate the relevant knowledge produced by our colleagues in
Geography and related Sciences, which are part of the special edition Amazon.
Our sincere thanks.
The editors
468 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
A produção de escalas no sul e no sudeste do Pará: a atuação da CPT em áreas de mineração da Vale S.A.
Palavras-chave: Produção de escalas. Mineração. Vale S.A. CPT. Sul e Sudeste do Pará.
ABSTRACT: Starting from the relationship between the scales and the different forms of action
of actors and social subjects, this work aims to analyze the Comissão Pastoral da Terra in defense
of populations affected by mining projects and the long-range mineral production of Vale SA, in
1 Artigo produzido a partir de resultados parciais do projeto de pesquisa “Energia e Mineração: efeitos territoriais de projetos hidro-
elétricos e de exploração de recursos minerais no contexto do sul e sudeste do Pará”, desenvolvido em âmbito do Grupo de Estudos
e Pesquisa em Território, Região e Políticas do Desenvolvimento na Amazônia (Gepeam) do Instituto de Estudos do Trópico Úmido
(IETU) e do Instituto de Ciências Humanas (ICH) da Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará (Unifesspa).
2 Professora Adjunta do Curso de Geografia do Instituto de Estudos do Trópico Úmido da Universidade Federal do Sul e Sudeste do
Pará – Ietu/Unifesspa. E-mail: luciana.rmborges@unifesspa.edu.br.
3 Professor Adjunto do Curso de Geografia do Instituto de Estudos do Trópico Úmido da Universidade Federal do Sul e Sudeste do
Pará – Ietu/Unifesspa. E-mail: victorsoliveira@unifesspa.edu.br.
4 Professor Adjunto do Curso de Geografia do Instituto de Ciências Humanas da Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará – ICH/
Unifesspa e do Laboratório de Estudos Regionais e Agrários do Sul e Sudeste do Pará – Lerassp. E-mail: serra@unifesspa.edu.br.
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 469
Luciana Riça Mourão Borges • Victor da Silva Oliveira • Hugo Rogério Hage Serra
scope of the South and Southeast of Pará. It is understood that the scales of action are conflicting,
which makes them conceptual elements that serve as a starting point for the methodology
presented here. To this end, bibliographic surveys were carried out on the subject, collection and
treatment of secondary data, as well as documentary research carried out on CPT collections in
the localities and municipalities that have mining activities in the South and Southeast of Pará.
The analysis of the relationships between these actors and the production of scales resulting from
their actions in this regional context show the diversity of contradictory situations involving the
economic production of mining and the regional population.
Keywords: Scale production. Mining. Vale S.A. CPT. South and Southeast of Pará.
INTRODUÇÃO
470 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
A produção de escalas no sul e no sudeste do Pará: a atuação da CPT em áreas de mineração da Vale S.A.
da CPT por meio da análise documental em secretarias da entidade nas diversas localidades e
municípios que possuem atividades de mineração no Sul e no Sudeste do Pará. Com isso, este
trabalho está estruturado em três seções, além desta introdução e de uma conclusão.
No primeiro momento, realiza-se um breve debate sobre o conceito de escala para além de
seu escopo cartográfico, ao mesmo tempo em que se insere a importância do espaço geográfico
nesse conceito. Toma-se o conceito de escala a partir de sua dimensão, em que o fenômeno
observado não parte da representação do espaço como algo motivador da pesquisa (tal como
se pretende neste trabalho) ao se conceber o embate entre a CPT e a exploração que a Vale
S.A. imprime em (sub)solo paraense. Para além disso, compreende-se a escala a partir de sua
dimensão geográfica ou, como aponta Harvey (1980, 2000), até aonde o fenômeno alcança,
o que, certamente, faz mudar a composição política das relações de poder entre os diferentes
grupos sociais em uma região como o Sul e Sudeste do Pará. À escala, imputa-se um mecanismo
do modus operandi inerente à configuração territorial de questões particulares, as quais, por força
da relação sociedade-natureza, modificam-se conforme o conteúdo espacial que se apresenta.
Em um segundo momento, empreende-se uma caracterização e um dimensionamento da
produção global de minério no Sul e no Sudeste do Pará a fim de se saber quais os resultados que
a mineração, aqui personificada a partir da Vale S.A., obtém com a exploração de commodities.
Dessa forma, o esforço realizado nessa seção tem a pretensão de apresentar um panorama sobre
a produção de minérios nas regiões Sul e Sudeste do Pará. As informações apresentadas buscam
congregar elementos que caracterizam a operação da extração mineral e a possibilidade de abstrair
compressões sobre a produção das escalas a partir de uma lógica global. No entanto, esse exercício
é exclusivamente de ordem teórica. Busca-se, na sequência, apresentar dados que exponham a
vinculação teórica anteriormente debatida com a realidade analisada. As informações trazidas estão
organizadas em dois blocos, a saber: o primeiro, relativo à comercialização externa dos produtos
minerais extraídos e produzidos no Sul e no Sudeste do Pará. A fonte fora a Secretaria de Indústria,
Comércio Exterior e Serviços6, vinculada ao Ministério da Economia. O segundo bloco, obtido a
partir da Relação Anual de Informações Sociais (Ministério da Economia). Para o corte temporal,
optou-se por analisar o ano completo mais recente de cada um dos bancos de dados acima citados.
Dessa maneira, o ano de 2019 para os dados de Comércio Exterior e o ano de 2018 para dados
do trabalho. Para fins de compreensão das transformações em anos recentes, foram selecionados
outros três anos: 2015, 2010 e 20077. Em âmbito escalar, para fins de comparação das curvas
de crescimento e para estabelecer o peso da produção mineral para a região em tela, dentro das
possibilidades e da necessidade, utilizou-se o recorte estadual e o recorte nacional. Além disso, esse
paralelo é vetor para posicionamento da produção da escala da mineração em âmbito nacional e sua
capacidade de barganha política vis-à-vis para agentes de ordem local, como a CPT.
Por fim, em um último momento, apresentam-se as ações da CPT junto a populações
afetadas pelos projetos de mineração, como modo de resistência e como elemento central
na compreensão da escala frente à atuação da Vale S.A. no Sul e no Sudeste do Pará. É
preciso destacar que essa entidade atua junto a diversas populações que tenham seus direitos
à terra e ao território, em alguma medida, subsumidos ou retirados em função de atividades
industriais ou econômicas em larga escala. Busca-se realizar uma análise em contraposição
ao que esteve em discussão nos tópicos anteriores. Pretende-se apresentar, assim, uma
leitura empírica a partir de um estudo de caso, ou uma amostra de como a discussão de
ações locais realizadas pela CPT junto a populações afetadas direta ou indiretamente por
ações de grandes mineradoras, tal como é o caso da Vale S.A. Pretende-se, ainda, apresentar
um resgate histórico de implantação da Vale S.A. nas regiões do Sul e do Sudeste do Pará,
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 471
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assim como também, as ações realizadas por movimentos e organizações de sujeitos sociais
que combatem violações de direitos territoriais das populações atingidas por esses projetos.
A tomada empírica do sentido social a qual a CPT está vinculada, bem como o
mesmo sentido de relação com a natureza pela qual se percebe uma empresa como a
Vale S.A. no Sul e no Sudeste do Pará revelam explicitamente a brutal diferença como
esses dois agentes do espaço regional se reproduzem e como criam suas estratégias
sociopolíticas. Se de um lado a CPT responde pela defesa de sujeitos que veem a natureza
como uma extensão de suas vidas ou o abrigo, de outro, a Vale S.A. ou qualquer outro
agente dessa magnitude, vê a natureza como recurso (HAESBAERT, 2004). Em comum,
ambos usam a escala como um recurso de apropriação do espaço. Eles também tomam
a escala como um trunfo sem o qual não se pode conceber suas atuações em um sentido
regional mais particular, ou, em um sentido universal, ao se considerar uma visão global.
Ao se partir dessa assertiva, em se tratando de mineração, agentes espaciais como Vale S.A. e
CPT são coetâneos no espaço (MASSEY, 2008), o que, por seu turno, reproduzem-se em escalas que
são, ao mesmo tempo, díspares e conflitivas. Novamente, Castro (1995) direciona o debate sobre a
escala para a relação cartográfica-geográfica. Dito de outro modo, a autora afirma que há um:
472 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
A produção de escalas no sul e no sudeste do Pará: a atuação da CPT em áreas de mineração da Vale S.A.
Neste sentido, o recorte empírico tomado neste trabalho permite entender como a
atuação da CPT e seus embates vis-à-vis com a difusão de práticas mercadológicas da Vale
S.A. vão ao encontro do conceito de escala e, que, por essa perspectiva, não pode assumir um
entendimento linear, descartando-se, assim, seu aporte cartográfico para explicações regionais.
Outra autora que se apropria do debate que a escala proporciona aos assuntos
espaciais é Silveira (2004). Para ela, a associação histórica entre escala e geometria já
ganhou tamanho enraizamento que pode ser considerada uma discussão tautológica.
No entanto, ela alerta para o poder do processo na rápida transformação das coisas
em objetos, algo que é intensificado no contexto da globalização. Não cabe, mais uma
vez, deter-se nos contingenciamentos de uma concepção geométrica de escala, segundo
a autora. Para ela, “todo avanço da geografia repousa sobre a combinação e a passagem
incessante de uma escala para outra” (FERRARA apud SILVEIRA, 2004, p. 89).
Silveira (2004), ainda, afirma que, ao se apropriar da escala como um importante recurso
do espaço geográfico, há que se levar em conta a produtividade espacial inerente aos processos
de um lugar ou região, por exemplo. Para ela: “a produtividade espacial só pode ser mascarada
se uma visão escalar se antepõe ao reconhecimento das variáveis significativas” (SILVEIRA,
2004, p. 89). É possível, assim, entender que essa concepção se aproxima substancialmente
da realidade regional na qual se encontram o Sul e o Sudeste do Pará. De um lado, há uma
demanda verticalizada, que extravasa parte da região amazônica e a coloca em uma rota
internacional de produção de commodities. E, de outro lado, há a ação horizontalizada de um
grupo social como a CPT que imprime ao território atividades sociopolíticas que produzem
uma escala com um ritmo menos veloz do que a Vale S.A., porém, não menos denso.
Silveira (2004) afirma, também, que o caráter analítico da escala na apreensão do
fenômeno não se reduz ao recorte da extensão geográfica dos fatos. A dimensão temporal é outro
procedimento sem o qual a escala não procede a uma operacionalização correta. Se as variáveis
mudam no espaço, elas também mudam no e com o tempo, o que requer do pesquisador outra
mirada dos eventos que incidem no recorte escolhido. Com o tempo, os eventos regridem ou
avançam; eles dependem, nesse sentido, da intensidade da produção do espaço.
A variável tempo se torna uma condição para se compreender como a circulação do
modo de produção vigente articula estratégias para o desenvolvimento econômico. Não sem
menos, talvez seja Smith (1988) o autor que fornece subsídios mais esclarecedores para o
entendimento de como a produção das escalas se faz de maneira diferente ao tomar a natureza
como ponto basilar no desenvolvimento, o qual, ele afirma ser desigual. Para esse autor:
Com o desenvolvimento das forças produtivas sob o capitalismo, a lógica que preside
a localização geográfica afasta-se cada vez mais de tais considerações naturais. A
razão para isso é dupla. O que ligava o desenvolvimento econômico às condições
geográficas era primeiramente a dificuldade de vencer as distâncias e em segundo lugar
a necessidade de grande proximidade das matérias-primas. Com o desenvolvimento
dos meios de transporte, o primeiro obstáculo natural (a distância) diminuiu em
importância. Com o aumento geral das forças produtivas, o segundo também se torna
cada vez menos importante, pois as matérias-primas hoje são produtos de um número
sempre crescente de processos de trabalho anteriores (SMITH, 1988, p. 157).
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 473
Luciana Riça Mourão Borges • Victor da Silva Oliveira • Hugo Rogério Hage Serra
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A produção de escalas no sul e no sudeste do Pará: a atuação da CPT em áreas de mineração da Vale S.A.
Tabela 1. Total e percentual das exportações da indústria extrativa do Sul e do Sudeste do Pará (SSPA),
do Pará e do Brasil em 2019 (em bilhões de US$)
SSPA PA BR
Nº % Nº % Nº %
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Luciana Riça Mourão Borges • Victor da Silva Oliveira • Hugo Rogério Hage Serra
Gráfico 1. Valor das exportações da indústria extrativa do Sul e do Sudeste do Pará e do Pará em anos
selecionados. (em bilhões de US$).
Essa situação, tal como no âmbito nacional, pontua a extensão e ampliação em anos
recentes da exploração mineral na região, saindo de US$ 3,48 bilhões para US$ 13,85
bilhões, fruto de novos projetos de exploração iniciados. Não obstante, a tensão do embate
entre distintas formas de relação com o espaço amplia-se, como tratado em seção próxima.
Porém, resultado da magnitude dos valores envolvidos tanto para o Estado, como para a
política nacional, é a diminuição das lutas de sujeitos historicamente desassistidos por esta
política e o privilégio dos agentes que atuam na ordem global, como as mineradoras.
As regiões Sul e Sudeste do Pará são compostas por trinta e nove municípios. Destes, nove
tiveram ocorrência de exportação de produtos minerais nos anos analisados como demonstram
a Tabela 2 e a Figura 1. O montante das exportações expõe a concentração das atividades em
três municípios principais: Parauapebas, Canaã dos Carajás e Marabá. A análise temporal mostra
o crescimento das exportações e, por consequência, da exploração e transformação regional.
Projetos em outros municípios encontram-se, atualmente, em fase de estruturação e aguardam
autorizações legais para início, como em Ourilândia do Norte. Projeta-se para os próximos anos
o prosseguimento da curva ascendente nos níveis de exportação de minérios da região, seja em
função da execução de tais projetos, seja pela reafirmação da posição nacional de exportador de
commodities, intensificado em anos recentes, na divisão internacional do trabalho.
Tabela 2. Total de exportações da indústria extrativa por municípios do Sul e do Sudeste do Pará.
(em milhões de US$)
Município 2007 2010 2015 2019
Breu Branco 0,04 0,59 0,00 0,00
Canaã dos Carajás 564,90 697,12 605,05 4.914,38
Curionópolis 0,00 0,00 55,80 202,40
Marabá 602,42 413,64 1.048,48 1.588,92
Ourilândia do Norte 0,00 0,00 269,11 126,32
Parauapebas 2.309,01 7.893,59 4.003,26 7.016,92
Redenção 0,00 0,00 0,00 0,59
São Félix do Xingu 0,00 0,00 6,75 3,87
Ulianópolis 0,00 0,00 0,00 0,50
Fonte: Secretaria de Indústria, Comércio Exterior e Serviços (PA).
476 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
A produção de escalas no sul e no sudeste do Pará: a atuação da CPT em áreas de mineração da Vale S.A.
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 477
Luciana Riça Mourão Borges • Victor da Silva Oliveira • Hugo Rogério Hage Serra
(1996). O uso do poder político de barganhar baseia-se na magnitude econômica de agentes globais
é a tônica da economia internacional desde a década de 1970, assim como a ressignificação das
escalas que, de modo conflitoso, são usadas e produzidas por agentes com interesses antagônicos.
Tabela 3. Principais países parceiros de exportação de produtos da indústria extrativa das regiões Sul e
Sudeste do Pará. (em milhões de US$)
País 2007 2010 2015 2019
China $ 827,91 $ 4.095,30 $ 2.114,78 $ 8.313,86
Malásia $ - $ - $ 458,28 $ 1.356,05
Coreia do Sul $ 281,18 $ 597,97 $ 278,81 $ 451,14
Japão $ 416,88 $ 993,02 $ 355,89 $ 446,25
Países Baixos $ 86,47 $ 126,43 $ 287,92 $ 439,84
Alemanha $ 352,17 $ 827,08 $ 505,99 $ 437,40
Polônia $ - $ - $ 260,47 $ 296,77
Taiwan $ 39,34 $ 131,30 $ 233,48 $ 274,76
França $ 131,22 $ 389,40 $ 146,56 $ 257,50
Omã $ - $ - $ 41,62 $ 235,03
Fonte: Secretaria de Indústria, Comércio Exterior e Serviços do Estado do Pará
478 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
A produção de escalas no sul e no sudeste do Pará: a atuação da CPT em áreas de mineração da Vale S.A.
Tabela 4. Total e percentual de vínculos trabalhistas formais da indústria extrativa do Sul e do Sudeste do
Pará, do Pará e do Brasil em 2018.
SSPA PA BR
Nº % Nº % Nº %
Indústria extrativista10 16.783 7,30% 20.352 1,87% 212.629 0,46%
Outros 213.140 92,70% 1.065.194 98,13% 46.418.486 99,54%
Total 229.923 1.085.546 46.631.115
Fonte: Relação Anual de Informações Sociais.
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 479
Luciana Riça Mourão Borges • Victor da Silva Oliveira • Hugo Rogério Hage Serra
dos vínculos, ou seja, o setor em tela tem uma remuneração superior à média das demais
atividades econômicas, independentemente do recorte percebido.
Gráfico 2. Percentual de vínculos trabalhistas formais da indústria extrativa do Sul e Sudeste do Pará, do
Pará e do Brasil em anos selecionados.
Tabela 5. Total e percentual de salários pagos por vínculos trabalhistas formais da indústria extrativa do
Sul e do Sudeste do Pará, do Pará e do Brasil em 2018. (em salário mínimo corrente)11
SSPA PA BR
Nº % Nº % Nº %
480 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
A produção de escalas no sul e no sudeste do Pará: a atuação da CPT em áreas de mineração da Vale S.A.
Gráfico 3. Percentual de salários pagos por vínculos trabalhistas formais da indústria extrativa do Sul e
Sudeste do Pará, do Pará e do Brasil em anos selecionados. (considera-se o salário mínimo corrente)
Uma produção mineral industrial de grande alcance produz escalas produtivas nos
territórios que não se restringem ao Sul e Sudeste do Pará. Somente há, em contrapartida,
uma maneira de combate à expulsão de famílias de seus terrenos, em grande parte
camponeses, sejam de áreas destinadas à função social da terra – como a reforma agrária
ou regularização fundiária urbana –, seja à criação de territórios indígenas ou quilombolas,
ou, ainda, seja para a implantação de unidades de conservação, a exemplo.
Faz-se necessário considerar, outrossim, que os modos de atuação da CPT se dão de
modo articulado com outras instituições, tais como sindicatos, outros movimentos sociais,
Ministério Público, Ordem dos Advogados do Brasil, Conselho Indigenista Missionário,
entre outras, o que traduz seu caráter também multiescalar.
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 481
Luciana Riça Mourão Borges • Victor da Silva Oliveira • Hugo Rogério Hage Serra
482 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
A produção de escalas no sul e no sudeste do Pará: a atuação da CPT em áreas de mineração da Vale S.A.
hídrica superficial; v) Alteração das propriedades do solo; vi) Alteração da paisagem; vii)
Alteração e supressão de remanescentes florestais; viii) Redução da disponibilidade de
habitats e migração da fauna silvestre; ix) Alteração das comunidades faunísticas aquáticas
e/ou dependentes da água em decorrência do assoreamento de nascentes e cursos d’água;
x) Indução migratória pela expectativa de empregabilidade; xi) Alteração do cotidiano das
populações; xii) Pressão sobre a estrutura e infraestrutura urbana; xiii) Incremento no tráfego
rodoviário; introdução de patologias por insetos vetores; xiv) Impactos sobre as comunidades
indígenas, e; xv) Interferência sobre o patrimônio arqueológico (CRUZ NETO, 2008).
O processo de conflitos territoriais teve início, mais especificamente, no ano de 2003,
quando a empresa Canico do Brasil Mineração LTDA requereu à superintendência do Incra,
lotada em Marabá, a desafetação de uma área de mais de 7 mil hectares, o que incorreria da
desapropriação direta de diversas famílias dos projetos de assentamento Tucumã e Campos
Altos. Sem a desafetação imediata, a Canico do Brasil iniciou um processo de compra
de áreas dos assentados. Tal prática continuou com a Vale S.A., após sua aquisição dos
direitos minerários do projeto. O projeto de assentamento Campos Altos possuía cerca de
200 famílias, sendo uma área altamente produtiva (CRUZ NETO, 2008).
O surgimento do projeto de mineração Onça Puma implicou na atração populacional
para o município de Ourilândia do Norte, com a expectativa de empregabilidade no
projeto. Tal aumento acarretou diversos problemas em função da falta de infraestrutura
urbana e de serviços básicos como saneamento ou dos setores de educação e saúde.
Outros problemas, tais como prostituição e violência também se agravaram, reforçando
um padrão que ocorre em grande parte de áreas historicamente dominadas pelo garimpo
ou pela extração mineral em sua fase industrial.
Quanto à zona rural, houve um impacto direto na estrutura dos assentamentos tanto
em função da compra de lotes, quanto pela saída dos agricultores dessa área, culminando
em uma queda considerável na produção. Houve o fechamento de escolas, a ausência do
transporte público e de linha rodoviária, bem como o aumento do trânsito de veículos de
carga da empresa mineradora, causando risco à população local, e contribuindo, assim,
para o êxodo de diversas famílias (CRUZ NETO, 2008).
Face aos problemas fundiários e conflitos territoriais ocasionados pela Vale S.A. em 2008
– em função do projeto Onça Puma –, a CPT e diversas entidades de classe encaminharam uma
representação à Superintendência do Ministério Público Federal em Marabá (FERNANDES;
ALAMINO; ARAÚJO, 2014; CRUZ NETO, 2008; GUEDES, 2012). Segundo Cruz Neto
(2008), constam irregularidades de denúncias acerca da ingerência do Incra na representação:
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Luciana Riça Mourão Borges • Victor da Silva Oliveira • Hugo Rogério Hage Serra
estelionato (art. 171 do CP), bem como o crime de ameaça descrito no art. 147 de CP;
– a afirmação dos técnicos do INCRA de que a maior parte da área pretendida pela
empresa é imprópria para agricultura, é contrária um dos pré-requisitos básico para criação
de projeto de assentamento de que as terras sejam economicamente úteis e agricultáveis;
– os povos indígenas Xikrins do Cateté estão vulneráveis aos prejuízos
provocados pela exploração mineral.
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A produção de escalas no sul e no sudeste do Pará: a atuação da CPT em áreas de mineração da Vale S.A.
para serem vistos e conseguirem que as suas reivindicações sejam ouvidas pelo
Estado, simplesmente pressionavam as mineradoras, aproveitando-se da visibilidade
da presença de uma grande empresa, mas sem o intuito de negar a atividade
mineral. Assim, até os primeiros anos do século XXI, não existia um movimento
antimineração na Amazônia, mas movimentos que reagiam aos impactos diretos ou
indiretos das mineradoras e/ou pressionavam as grandes empresas como estratégia
para alcançar o Estado e verem assegurados os direitos sociais básicos e ao território.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
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NOTAS
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A produção de escalas no sul e no sudeste do Pará: a atuação da CPT em áreas de mineração da Vale S.A.
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Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 487
Luciana Riça Mourão Borges • Victor da Silva Oliveira • Hugo Rogério Hage Serra
Referência Complementar
488 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
A luta das mulheres indígenas pela manutenção do território tradicional Arara
RESUMO: É sabido que os povos originários do Brasil têm uma dinâmica mais harmônica
relacionada a seus territórios, em especial as mulheres indígenas. O corrente estudo
objetivou analisar a relação entre as mulheres do povo Karo Rap (Arara), residentes na
Terra Indígena (TI) Igarapé Lourdes, município de Ji-Paraná, Rondônia, e a equidade de
gênero e etnoconservação de seus territórios. A TI vem, desde seu contato, tem sofrido
diversos impactos ambientais. E há a cooptação dos homens indígenas para com que estes
colaborem com as atividades ilegais dentro do território. Com a articulação destas mulheres
junto a Associação de Guerreiras Indígenas de Rondônia (AGIR) as mulheres do povo Arara
passaram a sentir-se mais empoderadas e buscam se impor de modo efetivo dentro das
reuniões nas comunidades, que culminou na expulsão de diversos invasores de suas aldeias.
ABSTRACT: It is known that the native peoples of Brazil have a more harmonic
relationship with their territories, in special, the indigenous women. The current study
aimed at evaluating the relationship among women of the Ameridian tribe Karo Rap
(Arara), residents of the Indigenous Land Igarapé Lourdes, in the municipality of Ji-
Paraná, Rondônia, and the gender equity and ethnoconservation of their territories. The
IL has been suffering extensive environmental impacts since its first contact. Additionally,
1 Bacharela e Licenciada em Ciências Biológicas, Mestranda no programa de Pós-Graduação em Geografia- PPGG da Universidade
Federal de Rondônia (UNIR). Pesquisadora do Grupo de Estudos e Pesquisas em Geografia, Mulher e Relações Sociais de Gênero
(GEPGENERO). E-mail: deborah.tcc7@gmail.com.
2 Docente do Departamento de Geografia e do Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Federal de Rondônia-
-UNIR. Coordenadora do Grupo de Estudos e Pesquisas em Geografia, Mulher e Relações Sociais de Gênero. GEPGENERO. E-mail:
gracinhageo@hotmail.com.
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 489
Deborah Monteiro Santos • Maria das Graças Silva Nascimento Silva
there is cooptation by indigenous men with illegal activities within the territory. With the
articulation of these women along with the Association of Indigenous Warrior Women
of Rondônia (AGIR), the women of the indigenous people Arara started to feel more
empowered and sought to impose themselves in the meetings within the community,
culminating in the expulsion of several invaders from their settlements.
INTRODUÇÃO
490 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
A luta das mulheres indígenas pela manutenção do território tradicional Arara
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 491
Deborah Monteiro Santos • Maria das Graças Silva Nascimento Silva
O MÉTODO E AS METODOLOGIAS
Entendemos a pesquisa científica como uma estrada com inúmeras bifurcações, o método
é, para Marradi (2002), inicialmente, uma escolha. Pois este tem por função nortear o caminho
o qual o pesquisador percorrerá. A escolha do método é, sobretudo, fruto da visão de mundo do
cientista, de suas experiências e do modo como deseja abordar o fenômeno estudado, e deve
essencialmente ajustar-se ao fenômeno (NASCIMENTO SILVA; ALVES, 2017).
Para esta pesquisa adotamos o método fenomenológico, porque, ele tem se mostrado
capaz de expor dentro da Ciência Geográfica como se dá a experiência humana no espaço.
A abordagem fenomenológica nos permite, através da interação entre sujeito e objeto,
que passa para o além do possível ao fundamental e enriquece a percepção dos fatos,
ter um tratamento subjetivo, e a criação de uma postura filosófica diante dos fenômenos
estudados (N ASCIMENTO SILVA; ALVES, 2017).
A pesquisa de campo desenvolveu-se em quatro etapas: (1) a reflexão teórica
metodológica, que é fundamental à otimização desta pesquisa; (2) a relação com entidades
indígenas e indigenistas que está sendo construída desde junho de 2016 (anterior a
pesquisa); (3) a pesquisa participante junto as mulheres indígenas; (4) interpretação dos
dados coletados por meio da metodologia DSC- Discurso do Sujeito Coletivo.
A Pesquisa Participante
492 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
A luta das mulheres indígenas pela manutenção do território tradicional Arara
RESULTADOS E DISCUSSÕES
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 493
Deborah Monteiro Santos • Maria das Graças Silva Nascimento Silva
A luta destas mulheres retifica o que chamamos de ecofeminismo. Este pode ser
definido como uma escola de pensamento busca fazer uma conexão entre a opressão
sofrida pela mulher e pela natureza no sistema patriarcal e capitalista aos quais as mulheres
e o meio ambiente estão sujeitos. E visa a elaboração de estratégias para “libertar e curar
esses domínios interconectados através de uma melhor compreensão de sua etnologia
e aplicação” (RUETHER, 2000, p. 22)³ (grifos nossos). Este movimento tem orientado
feministas ambientalista desde a década de 1970, mesmo que sejam poucas os movimentos
sociais que façam esta ligação (GARCIA, 2009; RUETHER, 2000).
As pautas das mulheres indígenas em muito se correlacionam ao ecofeminismo pois
este movimento de ecologia profunda liga a humanidade e a natureza. De acordo com Ruether
(2000), o sistema de dominação moldado pelo patriarcado e pelo capitalismo, desassociaram
o homem da natureza. Ao torná-la feminina esta deve ser dominada e servir aos homens. Este
sistema de dominação molda no tecido social concepção de um Deus-Homem que concede
aos indivíduos do gênero masculino o poder que valida esta dominação. Completamente
diferente da cosmovisão indígena a respeito da relação com a natureza. Como observamos
durante as rodas de conversa, estas mulheres afirmam ter uma relação mais harmônica com a
natureza. As indígenas pensam no território para esta e para as gerações futuras.
É preciso entender que o “padrão corrente de desenvolvimento não é nem sustentável,
nem igualitário” (CASTRO; ABRAMOVAY, 2005, p. 37). Isto implica na necessidade
de um enfoque de gênero para tratar as questões ambientais. Enfoque este que deve ser
centrado na incorporação de ações de mulheres e homens nas políticas e programas
ambientais que trabalham na elaboração de uma perspectiva de gênero que estabelecesse
políticas sociais mais justas e equitativas. Pois, “o desenvolvimento será sustentável e
equitativo quando homens e mulheres participarem de forma mais igualitária, em todos
os níveis, do processo de tomada de decisões” (CASTRO; ABROMOVAY, 2005, p. 38),
em parte é este o foco das mulheres que participam da AGIR.
Estas relações de gênero e ecologia humana corroboram com as noções
de sustentabilidade propostas na ECO-92, e na construção da Agenda 2030 de
Desenvolvimento Sustentável da Organização das Nações Unidas (ONU). Em seu Objetivo
5, a Agenda 2030, aponta a necessidade de empoderar todas as mulheres e meninas.
Este documento ressalta a necessidade da equidade de gênero para o desenvolvimento
sustentável e a importância da construção do empoderamento feminino. Assim faz-se
basilar que estas mulheres adquiram o controle sobre o seu desenvolvimento e a gestão
de suas terras. Cabe ao governo ofertar condições que possibilitem as mulheres e meninas
desenvolverem seus potenciais e construírem um mundo equitativo (ONU, 2016).
É fundamental destacar que a noção de gênero e os povos indígenas põem em
discussão a relação entre as mulheres indígena e a sociedade não indígena, em um meio
que engloba desde a sociedade civil até as instituições governamentais. “A construção das
identidades das mulheres indígenas as coloca na posição de ter que preservar os valores
tradicionais e afirmar sua tradição étnica, ao mesmo tempo em que têm de lutar contra as
desigualdades específicas de seu gênero”. Isto implica em um feminismo feito por estas
mulheres que vai além das questões de gênero (SACCHI; GRAMKOW, 2012, p. 18).
Em diversas ocasiões mulheres entram no feminismo, na política e no ativismo
sobretudo como mulheres e mães. Visto que de maneira direta são responsáveis pela
educação e criação dos mais jovens, e diversas vezes pelo bem estar e segurança das pessoas
anciãs. Com isto, suas pautas tendem busca pelo bem estar coletivo e uma seguridade
494 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
A luta das mulheres indígenas pela manutenção do território tradicional Arara
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 495
Deborah Monteiro Santos • Maria das Graças Silva Nascimento Silva
O tema central da Marcha das Mulheres Indígenas do ano de 2019 foi “Território:
Nosso Corpo e Nosso Espírito”, onde o território é uma parte integrante do corpo dessas
populações podemos entender a importância da terra para os Arara. Ao usurpar o território
o não-indígena invade o corpo destas mulheres. Porque o território, o corpo e o espírito
são indissociáveis. “O território é tudo para o nosso povo, ele nos dá vida. A terra é
como se fosse nossa mãe, e o rio é nosso pai, eles nos dão a vida”” é a frase que marca o
encontro com as mulheres Karo Rap.
Por fim, para estas mulheres o único meio de acabar com as violências de gênero
contra seu povo e seus territórios seria a expulsão dos invasores de seus territórios e o
resgate cultural de suas ancestralidades. O segundo ponto elencado por elas é a união entre
as mulheres, o que podemos chamar de Sororidade. Com isto podem quebrar o outro ponto
que consideram fundamental: a quebra do machismo sistemático dos homens indígenas
com relação as mulheres. Para elas educar os homens sobre os conceitos de equidade de
gênero e feminismo são as ferramentas que resolveriam, em grande parte, estas violências.
Quando observamos uma das produções mais clássicas sobre feminismo Séc. XX,
os volumes I e II d’O Segundo Sexo de Simone de Beauvoir, observamos que o sistema
patriarcal ao confinar a mulher à esfera doméstica, e ao cotar sua da relação com outras
mulheres, sendo assim encarcerada ao âmbito privado sem contato com outras mulheres e
uma rede de apoio está em uma relação de vulnerabilidade social e material (BEAUVOIR,
[1949], 2014).
496 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
A luta das mulheres indígenas pela manutenção do território tradicional Arara
Pouco a pouco estas mulheres têm quebrado estas barreiras impostas por seus
próprios companheiros. Ir as assembleias anuais e realizar os cursos que são promovidos
ao longo do ano dão suporte a estas mulheres para que possam falar sobre seus problemas,
propor soluções e empoderar umas às outras.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 497
Deborah Monteiro Santos • Maria das Graças Silva Nascimento Silva
para o nosso povo”, isto o liga ao corpo destas mulheres. Quando o território é afetado,
elas também são atingidas de maneira direta.
Consideramos que a AGIR tem se tornado um espaço fundamental onde estas mulheres
podem falar sobre suas mazelas, propor soluções para suas demandas, cumprem assim seu
objetivo central de empoderar as mulheres. Ao passo que se empoderam, criam meios de
articularem-se com suas comunidades, mitigam os impactos causados por homens cooptados
pela lógica capitalista e patriarcal, oriundas do homem não-indígena que busca usurpar
e dominar a natureza. Visto que estas mulheres têm uma visão diferenciada da natureza,
respeitam-na, tratam-na harmonicamente, de acordo com as ideias centrais do ecofeminismo.
Por fim, consideramos que é imprescindível a ampliação do conhecimento a respeito
do aspecto organizacional das mulheres indígenas.
NOTA
3 Tradução literal de: “to liberate or heal these interconnected dominations by better
understanding of their aetiology and enforcement.”
REFERÊNCIAS
498 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
A luta das mulheres indígenas pela manutenção do território tradicional Arara
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 499
Helen Rose Oliveira da Silva • Maria Madalena de Aguiar Cavalcante
RESUMO: Este trabalho tem por objetivo gerar o Índice de vulnerabilidade Social da
cidade de Porto Velho, considerando como escala espacial os setores censitários que, de
acordo com o IBGE (2011), é a menor unidade territorial a ser representado, o que garante
maior nível confiabilidade nos dados gerados. A metodologia adotada partiu da escolha
de um conjunto de variáveis considerando as características individuais tais como: idade,
raça, renda, habitação, entre outras. Com base nos procedimentos metodológicos a cidade
de Porto Velho encontra-se classificada em quatro grupos de vulnerabilidade social, sendo
eles baixa vulnerabilidade com 33,47% da população da cidade, média vulnerabilidade
com 26,62%, alta vulnerabilidade 29,5% e muito alta vulnerabilidade com 4,65 %.
ABSTRACT: The aims of this work is to generate the Social Vulnerability Index of the city of
Porto Velho, considering as a spatial scale the census sectors which, according to IBGE (2011),
is the smallest territorial unit to be represented, which guarantees a higher level of reliability
generated data. The approach methodology begined from the choice of a set of variables
considering the individual characteristics such as: age, race, income, housing, among others.
Based on methodological procedures, the Porto Velho city is classified into four groups of
social vulnerability, which are low vulnerability with 33.47% of the city’s population, medium
vulnerability with 26.62%, high vulnerability 29.5% and very high vulnerability with 4.65%.
1 Este trabalho faz parte da tese de doutorado qualificada em 2019, intitulada – Vulnerabilidade socioambiental: Uma abordagem para
o planejamento urbano da cidade de Porto Velho – RO.
2 Doutoranda pelo Programa de Pós-Graduação Mestrado e Doutorado da Universidade Federal de Rondônia. E-mail: helen.roose1989@gmail.com.
3 Professora Doutora do departamento de Geografia da Universidade Federal de Rondônia. E-mail: mada.geoplan@gmail.com.
500 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
As dimensões da vulnerabilidade social: estudo de caso na cidade de Porto Velho-RO, Brasil
INTRODUÇÃO
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 501
Helen Rose Oliveira da Silva • Maria Madalena de Aguiar Cavalcante
502 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
As dimensões da vulnerabilidade social: estudo de caso na cidade de Porto Velho-RO, Brasil
urbano, como por exemplo a segregação, neste contexto torna-se clara a necessidade de
verificar como o risco pode atingir determinado grupo populacional.
Um dos principais fatores que contribui para a vulnerabilidade social é o fator
econômico, tendo em vista as oportunidades que demandam dele, como a possibilidade de
acesso de bens e serviços que se pode ter. Monteiro (2011), destaca que a vulnerabilidade
social está relacionada às condições e circunstâncias que podem ser minimizadas ou
restabelecidas, e não a algo especifico de um indivíduo. E assim como a ambiental a
social passa a ser compreendida a partir da exposição a riscos de diferentes naturezas.
De acordo com Cutter, Boruff e Shirley (2003), umas das dificuldades da gestão
em termos de planejamento no ordenamento do território urbano esta na dificuldade em
quantificar os fatores relacionados a vulnerabilidade social do ambiente da cidade.
A partir do momento que se identifica o lugar, quem são os atores e quais as
ações que os tornam vulneráveis, é possível traçar medidas que venham a reduzir sua
vulnerabilidade, assim como minimizar os efeitos que aumentam o risco (MARANDOLA
JUNIOR; HOGAN, 2006).
Objetivamente pode-se afirmar que a pobreza é indiscutivelmente uma das causas
mais profundas da vulnerabilidade. Razão esta que se explica pela distribuição desigual
dos serviços urbanos, uma vez que podemos associar para entendimento total do termo,
que este abrange questões sociais e econômicas, o que predispõe certos grupos a uma
maior ou menor suscetibilidade ao perigo (HOGAN, 2005).
Kaztiman (1999), importante propagador da temática destaca que as causas principais da
vulnerabilidade social têm a ver estritamente com a precariedade e instabilidade relacionada a
falta de segurança e enfraquecimento da instituição familiar. Atentando que a vulnerabilidade
social segundo o autor se dá pela incapacidade de aproveitamento do indivíduo pelas
oportunidades no âmbito socioeconômico, o que influirá em sua situação e bem estar.
Pode-se dizer assim que a propensão de maior vulnerabilidade social e ambiental
no âmago da cidade concentra-se em maior grau na periferia, contudo a ameaça ao social
no que se referem as demais ações do meio como, por exemplo, ̳a violência ‘independe
da localização geográfica. Ou seja, não escolhem lugar, todavia assim como os problemas
ambientais não atinge da mesma forma todo o espaço da cidade.
PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
Com base no arranjo estrutural que se pretende desenvolver nessa pesquisa, e dos
problemas sociais e urbanos ambientais, visa-se a interação da dinâmica da natureza e
da sociedade atentando aos desafios da gestão, face há um crescimento espontâneo e
não controlado da população, que muitas vezes ligado a uma insuficiência estrutural
desencadeia uma cidade de exclusões.
Para entender os questionamentos dessa pesquisa o ponto de partida é a formação
urbana e os interesses dos agentes produtores, com o propósito de analisar fatores decisivos
na estruturação do espaço urbano de Porto Velho, e que repercutem na vulnerabilidade
social, principalmente, dos grupos de baixa renda. Neste sentido os procedimentos se
dividiram nas seguintes etapas: Aspectos sociais: Estrutura para elaboração do IVS;
Escolha das variáveis e Processo de transformação das variáveis em índices. Como
observado adiante.
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 503
Helen Rose Oliveira da Silva • Maria Madalena de Aguiar Cavalcante
504 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
As dimensões da vulnerabilidade social: estudo de caso na cidade de Porto Velho-RO, Brasil
de dados dos Sistemas de Informações Geográficas. Assim cabe destacar Barroso, Abdo
e Silva (2011, p. 113), quando destaca que o SIG “permite o manuseio da informação não
só para a gestão ambiental, mas também para comunicar dados complexos de uma forma
acessível para cientistas e para o público em geral”.
Em vista destas arguições cabe frisar que no âmbito das geotecnologias, o avanço dos
resultados nos trabalhos desenvolvidos sejam eles no campo ambiental ou social atestam
a eficácia e potencial destas ferramentas proporcionando o conhecimento da realidade
espacial evidenciando as necessidades que precisam ser melhoradas. Por conseguinte,
constituem-se como importantes instrumentos de auxílio para os mais variados estudos.
continua
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 505
Helen Rose Oliveira da Silva • Maria Madalena de Aguiar Cavalcante
continuação
Para realização desta etapa do trabalho, apoiou-se em Soares (2016), que utilizou a
metodologia de Waquil et al. (2006), para obter o Índice da Vulnerabilidade Social de Porto
Velho, considerando a dimensão dos bairros da cidade. Contudo neste trabalho como mostrado
anteriormente esta metodologia será utilizada considerando a dimensão dos setores censitários de
Porto Velho, uma vez que, é a menor unidade territorial a ser representado, o que traz um nível de
confiabilidade maior, pois garante que todo o universo do território da cidade seja representado.
A metodologia utilizada por Waquil et al. (2006), foi aplicada para medir o nível de
desenvolvimento sustentável em quatro territórios rurais do Brasil junto ao Ministério do
506 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
As dimensões da vulnerabilidade social: estudo de caso na cidade de Porto Velho-RO, Brasil
Desenvolvimento Agrário (MDA), os autores deixam claro que é uma metodologia que
pode facilmente ser expandida para outros territórios, ao qual o urbano se encaixa.
Neste processo de desenvolvimento, leva-se em consideração os parâmetros utilizados
pelo IDH que avalia o desenvolvimento humano na escala de 0 a1, onde 0 está relacionado
com o pior índice de desenvolvimento e 1 para o melhor. Assim estes são utilizados como base
para a transformação das variáveis estatística em índice, como por exemplo, na obtenção do
IVS de Porto Velho o valor 0 será atribuído para o pior índice de vulnerabilidade social e 1 ao
melhor índice de vulnerabilidade social. Soares (2016) mostra essa relação no quadro abaixo.
0 Baixo Alto
1 Alto Baixo
Fonte: Soares (2016), adaptado de Waquil et al., 2006.
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 507
Helen Rose Oliveira da Silva • Maria Madalena de Aguiar Cavalcante
RESULTADOS E DISCUSSÕES
O resultado encontrado para o IVS da cidade muito tem a ver com o reflexo do seu padrão
de ocupação ao longo do seu desenvolvimento econômico e social, o que nos permite apontar uma
fragmentação que atinge não apenas o espaço citadino no geral diferenciando uma zona da outra,
mais uma fragmentação que permeia os interiores dos bairros deixando expressa a diferença no
padrão de ocupação em alguns destes que chegam a abranger alta, média e baixa vulnerabilidade
social. A importância de se considerar os setores censitários foi garantir que todo o universo
508 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
As dimensões da vulnerabilidade social: estudo de caso na cidade de Porto Velho-RO, Brasil
territorial da cidade fosse representado, haja vista que, a existência de bairros que possuem mais de
um índice de vulnerabilidade em sua espacialidade, na Figura 3 podemos observar essa realidade
da distribuição espacial do Índice de Vulnerabilidade Social de Porto Velho.
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 509
Helen Rose Oliveira da Silva • Maria Madalena de Aguiar Cavalcante
rede água geral, por exemplo é de 56,28% e a de Domicílios particulares permanente com
banheiro de uso exclusivo dos moradores ou sanitário e esgotamento sanitário via fossa
séptica é 67,25%, dado que se comparados com os setores de muito alta vulnerabilidade
correspondem a 0,7 e 0,27% respectivamente o que representa um contraste altíssimo.
Sendo possível observar este contraste de atendimento no gráfico abaixo.
510 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
As dimensões da vulnerabilidade social: estudo de caso na cidade de Porto Velho-RO, Brasil
A região central da cidade é a área de maior expressão dentro desse grupo, cabe destacar
que foi a partir do primeiro núcleo de povoamento que a cidade teve seu ponto de partida,
desenvolvendo-se e formando a Porto Velho atual. Um dos primeiros bairros foi o Arigolândia
formado inicialmente por soldados da borracha em torno dos anos de 1943 e 1945, de acordo
com informações do portal do governo. Sua estrutura e a baixa vulnerabilidade social têm a ver
com o seu desenvolvimento no período de construção da Estrada de Ferro Madeira Mamoré
– EFMM, onde foram sendo construídas casas e outros tipos de instalações destinadas ao alto
escalão de trabalhadores desse empreendimento formando assim os bairros da região central.
Esta parte da cidade abrigava as pessoas com as melhores condições de vida,
dessa forma seus reflexos contribuíram nesta estrutura de ‘desenvolvimento’ que hoje se
apresenta, haja vista o padrão de ocupação considerando os altos preços da especulação
imobiliária para região central, além dos prédios das secretarias e repartições que foram
instalados nessa região, contribuindo assim para que esta parte da cidade de Porto Velho
englobasse o grupo de baixa vulnerabilidade social.
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 511
Helen Rose Oliveira da Silva • Maria Madalena de Aguiar Cavalcante
que a região onde tiver o maior número de pessoas dependentes, mais vulnerável será seu
espaço habitado, uma vez que, necessitarão de terceiros para determinados assuntos, ou ainda
quanto menor rendimento mensal, maior serão as dificuldades. Na imagem da Figura 6 pode
se observar a espacialização dos setores de alta vulnerabilidade social.
512 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
As dimensões da vulnerabilidade social: estudo de caso na cidade de Porto Velho-RO, Brasil
Areia Branca, Cidade Nova e Novo Horizonte. As áreas de muito alta vulnerabilidade social
estão principalmente no limite da mancha urbana da cidade, consequentemente a oferta de
serviços básicos é precária nestas regiões, assim como as condições da moradia, como pode ser
observada na imagem da Figura 7 a espacialização dos setores de muita alta vulnerabilidade.
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 513
Helen Rose Oliveira da Silva • Maria Madalena de Aguiar Cavalcante
que terão alto número de pessoas dependentes em alguns anos, e 27,82% dos domicílios
possuem rendimento de meio a um salário mínimo, o que contribui no dimensionamento
da vulnerabilidade social. A figura abaixo mostra esta espacialização.
CONSIDERAÇÕES
514 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
As dimensões da vulnerabilidade social: estudo de caso na cidade de Porto Velho-RO, Brasil
REFERÊNCIAS
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 515
Helen Rose Oliveira da Silva • Maria Madalena de Aguiar Cavalcante
REFERÊNCIA COMPLEMENTAR
516 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
Aspectos técnicos para revitalização de bacias hidrográficas com enfoque
em nascentes: um panorama de projetos no Brasil e no estado de Rondônia
1 Mestranda em Gestão e Regulação de Recursos Hídricos – ProfÁgua da Universidade Federal de Rondônia (UNIR), pelo Departamento
de Engenharia Ambiental (DEA), Bacharel em Engenheira ambiental. E-mail: aline_straub7@hotmail.com.
2 Docente do Mestrado em Gestão e Regulação de Recursos Hídricos – ProfÁgua da Universidade Federal de Rondônia (UNIR), pelo
Departamento de Engenharia Ambiental (DEA), Doutora em física ambiental. E-mail: naraluisar@unir.br.
Agradecimentos:
As autoras agradecem ao Programa de Mestrado Profissional em Rede Nacional em Gestão e Regulação de Recursos Hídricos -
ProfÁgua, Projeto CAPES/ANA AUXPE Nº. 2717/2015 e a Universidade Federal de Rondônia (UNIR), Campus de Ji-Paraná, pelo
apoio técnico científico aportado até o momento.
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 517
Aline dos Santos Betiolo • Nara Luisa Reis de Andrade
INTRODUÇÃO
518 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
Aspectos técnicos para revitalização de bacias hidrográficas com enfoque
em nascentes: um panorama de projetos no Brasil e no estado de Rondônia
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 519
Aline dos Santos Betiolo • Nara Luisa Reis de Andrade
520 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
Aspectos técnicos para revitalização de bacias hidrográficas com enfoque
em nascentes: um panorama de projetos no Brasil e no estado de Rondônia
Conservação do solo
Os solos têm grande relevância para o meio ambiente, visto que recebem água das
chuvas, as quais depois emergem nas nascentes e mananciais, bem como sustentam a
biodiversidade das florestas (LEPSCH, 2010), sendo, portanto, imprescindíveis para a
qualidade ambiental das bacias hidrográficas.
Aliado a este fato, a deposição de material orgânico na superfície do solo, conhecida
como serapilheira, a qual é composta por folhas, ramos, órgãos reprodutivos e detritos, é de
grande importância para a ciclagem de nutrientes e a manutenção da umidade e atividade
biológica da área, mantendo a produtividade de ecossistemas florestais, principalmente
sobre solos de baixa fertilidade e fortemente intemperizados, sendo um indicador de
sustentabilidade de uma floresta (HENRIQUES et al., 2016; FERNANDES et al., 2018).
Essa ciclagem, juntamente com o processo bioquímico (circulação de nutrientes no
interior da planta), permite que as árvores possam sintetizar a matéria orgânica através da
fotossíntese, reciclando principalmente os nutrientes em solos, onde a biomassa vegetal
pode ser o principal reservatório (HOLANDA et al., 2017).
As práticas e técnicas adequadas de conservação e recuperação dos solos devem
estar alinhadas com os usos pretendidos na bacia. Para Gomes et al. (2012), para reverter o
quadro de redução de vazões dos corpos hídricos e a depreciação da qualidade das águas,
deve-se fazer uso de um manejo integrado na bacia, ressaltando que o solo assume posição
de destaque, haja vista que o mesmo é responsável pelo processamento da água na bacia.
Nesse contexto, o uso de práticas conservacionistas que aumentem a infiltração
e o armazenamento da água no perfil do solo, que intensifiquem a cobertura vegetal e
reduzam o escoamento superficial, é recomendável (DIONISIO, 2010), como também
a utilização de curvas de nível para evitar a erosão. Além do mais, manejo inadequado
do solo favorece o transporte de sedimentos, nutrientes e matéria orgânica pela erosão
hídrica, até atingir as áreas de recarga da bacia (FALCÃO E LEITE, 2018), bem como
causa o assoreamento dos corpos d’água. Assim, identificar as áreas suscetíveis à erosão
é fundamental para a adoção de práticas de conservação do solo, com o intuito de mitigar
os processos erosivos ou mesmo como ferramenta para o planejamento futuro de uso solo
na bacia de acordo com seu potencial (FALCÃO E LEITE, 2018).
Dentre as várias técnicas para evitar a erosão hídrica e minimizar os impactos
ambientais em bacias hidrográficas, tem-se a técnica de construção de terraços (Figura
2a). Terraços são estruturas combinadas por um dique e um canal, organizados no
sentido transversal à declividade do terreno, formando desta maneira obstáculos físicos,
que irão reduzir a velocidade do escoamento superficial, minimizando a erosão do solo
(MIRANDA et al., 2017).
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 521
Aline dos Santos Betiolo • Nara Luisa Reis de Andrade
Uma das técnicas extremamente importante para a gestão dos recursos hídricos
envolve a conservação e recuperação de APPs, quer seja mantendo a vegetação existente,
introduzindo espécies ou quaisquer outras técnicas que auxiliem na recomposição da
vegetação nessas áreas, vegetação essa que têm a função de proteção dos recursos hídricos.
Existe uma estreita relação entre solos florestais e eventos de precipitação extrema,
uma vez que a elevada porosidade do substrato favorece a infiltração, reduz o escoamento
superficial, a erosão, produz maior fluxo subterrâneo, amortece efeitos dos eventos
extremos e favorece a melhoria da qualidade da água (SANT ANA E BACK, 2019).
De acordo com a Lei Federal nº12.651/2012 (BRASIL, 2012) são consideradas
áreas de preservação permanente as faixas marginas de cursos d’água natural perenes ou
intermitentes, variando de 30 m à 500 m dependendo da largura do rio, e para as nascentes
é considerada como APP o raio mínimo de 50 m no seu entorno, entretanto, nos casos de
áreas rurais consolidadas em APP no entorno de nascentes e olhos d’água perenes, são
522 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
Aspectos técnicos para revitalização de bacias hidrográficas com enfoque
em nascentes: um panorama de projetos no Brasil e no estado de Rondônia
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 523
Aline dos Santos Betiolo • Nara Luisa Reis de Andrade
quanto na fase final (degradação biológica), estabelecendo etapas de curto, médio e longo
prazo, levando-se em consideração o sistema de exploração da área (Quadro 1).
524 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
Aspectos técnicos para revitalização de bacias hidrográficas com enfoque
em nascentes: um panorama de projetos no Brasil e no estado de Rondônia
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 525
Aline dos Santos Betiolo • Nara Luisa Reis de Andrade
continua
526 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
Aspectos técnicos para revitalização de bacias hidrográficas com enfoque
em nascentes: um panorama de projetos no Brasil e no estado de Rondônia
continuação
Projeto Estado Área de abrangência
Projeto Produtores de Água do Alto Rio Verde de
MG - Itanhandu S. I.*
Itanhandu - MG
Produtor de Água na microbacia do Córrego da Velha MG - Luz S. I.*
Projeto Oásis - Nascentes de Pimenta MG – Pimenta S. I.*
Revitalização e recuperação hídrica da sub-bacia do
MG - Sete Lagoas S. I.*
Ribeirão Jequitibá no Município de Sete Lagoas
Produtor de Água na bacia do Rio Mutum MG – Uberaba 20 ha
320km de conservação
Produtor de Água no Córrego Feio MG - Patrocínio
do solo
Conservador dos Mananciais de Delfim Moreira MG - Delfim Moreira S. I.*
Programa Manancial Vivo MS - Campo Grande 2.463 ha
Projeto Águas Cristalinas MT – Alta Floresta S. I.*
Manejo Integrado para revitalização de Microbacias
MT - Cedro do Abaeté S. I.*
do Rio Indáia
Projeto Renascendo as Águas de Mirassol D’oeste MT - Mirassol D’oeste S. I.*
Projeto produtores de Água MT – Tangará da Serra 16,85 ha
Bacia do Rio Macaé RJ – Nova Friburgo e Macaé S. I.*
Produtores de Água e Floresta – Bacia do Rio Grandu - RJ RJ - Rio Claro 4.157,93 ha
Projeto Águas Frias: garantindo a segurança hídrica e
RJ - Paraíba do Sul 05 nascentes
alimentar
Projeto Protetor das Águas RS - Vera Cruz 127 ha
Projeto Produtor de Água no Rio Camboriú. SC - Balneário Camboriú 5.000 ha
Projeto Produtor de Água SE - Canindé do São Francisco 140,73 ha
Conservador das Águas na Bacia do Rio Batalha SP – Bauru S. I.*
Programa Bacias Jaguariúna SP – Jaguariúna 2.082 ha
Projeto Produtor de Água no PCJ SP - Joanópolis e Nazaré Paulista 1.200 ha
Produtor de Água Salesópolis SP – Salesópolis 32 ha
Produtor de Água Votuporanga SP -Votuporanga 17 ha
Projeto Mais Água SP - São José dos Campos 800 ha
Programa Produtor de Água de Guaratinguetá SP - Guaratinguetá 2.000 ha
Produtor de Água Rio Branco AC – Rio Branco 30 ha
Produtores de Ibirapitanga BA - Ibirapitanga S. I.*
Produtor de Água Taquarussu TO - Palmas S. I.*
Oásis Apucarana PR - Apucarana 18 km de estradas
Fonte: Adaptado de ANA, 2019b. S. I.*= Sem informações.
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 527
Aline dos Santos Betiolo • Nara Luisa Reis de Andrade
continua
528 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
Aspectos técnicos para revitalização de bacias hidrográficas com enfoque
em nascentes: um panorama de projetos no Brasil e no estado de Rondônia
continuação
Bacia Ano de
Projetos Municípios Status atual
hidrográfica início
Alta Floresta D’Oeste, Cacoal,
Castanheiras, Nova Brasilândia D’Oeste, Findado em
Viveiro Cidadão2 N.D 2013
Novo Horizonte D’Oeste, Pimenta Bueno, 2019
Rolim de Moura e Santa Luzia D’Oeste
Ariquemes, Cerejeiras, Espigão D’Oeste,
Guajará-Mirim, Jaru, Ji-Paraná, Nova
Recuperar1 BH Rio Mororó Mamoré, Nova União, Ouro Preto D’Oeste, 2017 vigente
Pimenta Bueno, Porto Velho e Rolim de
Moura
Ariquemes, Castanheiras, Cujubim, Itapuã
D’Oeste, Ji-Paraná, Machadinho D’Oeste,
PLANTAR
N.D Novo Horizonte D’Oeste, Ouro Preto 2018 vigente
Rondônia3
D’Oeste, Presidente Médici, Rio Crespo e
Rolim de Moura
Renascer das
BH Rio Pirarara Cacoal 2018 vigente
Águas4
Fonte: 1RONDÔNIA, 2019; 2ECOPORÉ, 2019; 3RIOTERRA, 2019; 4CONDEMA, 2018; 5COMVIDA,
2019. Nota: N.D = dado não disponível.
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 529
Aline dos Santos Betiolo • Nara Luisa Reis de Andrade
CONSIDERAÇÕES FINAIS
530 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
Aspectos técnicos para revitalização de bacias hidrográficas com enfoque
em nascentes: um panorama de projetos no Brasil e no estado de Rondônia
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dezembro de 1996, e 11.428, de 22 de dezembro de 2006; revoga as Leis nºs 4.771, de 15
de setembro de 1965, e 7.754, de 14 de abril de 1989, e a Medida Provisória nº 2.166-67,
de 24 de agosto de 2001; e dá outras providências. Disponível em: http://www.planalto.
gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2012/Lei/L12651.htm. Acesso em: 22 de out. 2019.
BRASIL. Decreto nº 8.972, DE 23 DE JANEIRO DE 2017. Institui a Política Nacional
de Recuperação da Vegetação Nativa. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2017/decreto/D8972.htm. Acesso
em: 14 out. 2019.
COMDEMA. Conselho Municipal de Defesa do Meio Ambiente de Cacoal-RO.
Recuperar Renascer das águas. Projeto de recuperação e proteção de nascentes da sub-
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 531
Aline dos Santos Betiolo • Nara Luisa Reis de Andrade
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Aspectos técnicos para revitalização de bacias hidrográficas com enfoque
em nascentes: um panorama de projetos no Brasil e no estado de Rondônia
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 533
Aline dos Santos Betiolo • Nara Luisa Reis de Andrade
534 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
Atores da paisagem: o padrão temporal e espacial de focos de queimadas
no estado do Amapá entre os anos 2000 e 2019 e as influências das práticas e saberes indígenas
ABSTRACT: The present paper discusses the performance of the main landscape agents
in the State of Amapá. To that end, the relations between agents, landscapes, practices and
knowledge of indigenous peoples were considered and the landscape units and the behavior
of the agents involved were characterized through the spatial and temporal dynamics of forest
fires between 2000 and 2019. The data were obtained from the Amazon Fires Database,
from Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais – INPE, using the sensor reference from
Terra /Aqua MODIS satellites, which allows analyzing the quantity of fires and their relation
1 Doutor em Geografia pela Universidade Federal de Goiás/UFG. Professor Adjunto do Curso de Geografia no Campus Binacional do
Oiapoque da Universidade Federal do Amapá. E-mail: rauber@unifap.br.
2 Doutora em História pela Universidade Federal de Santa Catarina/UFSC. Professora Adjunta do Curso de Licenciatura Intercultural
Indígena no Campus Binacional do Oiapoque da Universidade Federal do Amapá. E-mail: carina_almaid@yahoo.com.br.
3 Doutor em Ciências Ambientais pela Universidade Federal de Goiás/UFG. Professor Associado do Programa de Pós-Graduação em
Geografia – PPGEO/IESA/UFG na Universidade Federal de Goiás. E-mail: mferreira.geo@gmail.com.
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 535
Alexandre Luiz Rauber • Carina Santos de Almeida • Manuel Eduardo Ferreira
with land use, enabling forest fire density mapping. The management of fire by indigenous
peoples transcends time and space and helps us to understand the relations with life cycles,
which always regard the fires and contribute to the maintenance of knowledges.
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Atores da paisagem: o padrão temporal e espacial de focos de queimadas
no estado do Amapá entre os anos 2000 e 2019 e as influências das práticas e saberes indígenas
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Alexandre Luiz Rauber • Carina Santos de Almeida • Manuel Eduardo Ferreira
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Atores da paisagem: o padrão temporal e espacial de focos de queimadas
no estado do Amapá entre os anos 2000 e 2019 e as influências das práticas e saberes indígenas
que são promovidos pelas atividades agropecuárias ou pelos distintos atores das terras
indígenas, dos assentamentos rurais, das unidades de conservação federal ou estadual,
dentre outros. O Amapá mantém, em qualidade e quantidade, as características físico-
geográficas de suas unidades de paisagem, sem dispor – ainda – na contemporaneidade de
violentos conflitos territoriais e sangrentos pela terra, como ocorre no estado vizinho do
Pará. Analisar a incidência de focos de queimadas, através da evolução e recorrência nas
unidades de paisagem ao longo de duas décacas – 2000 a 2019 – , permite-nos compreender
em perspectiva o comportamento dos atores e da ação antrópica, evidenciando as
fragilidades e sensibilidades das unidades de paisagem na atualidade.
No Amapá, assim como na Amazônia, existe uma dinâmica do tempo no espaço e que
dá ritmo ao ciclo de vida ao longo do ano e seus meses. Essa dinâmica é composta por dois
momentos distintos e marcantes: o período das chuvas (janeiro a julho) e o período da seca
(setembro a novembro).(7) A abundância, a rarefação e o cessar das chuvas preconiza a chegada
da seca e vice-versa. Particularmente, cada sociedade indígena, mas não somente, possui relações
antigas e próprias com a dinâmica do tempo no espaço. O ciclo do tempo, marcado pela presença
e ausência das chuvas ou intensidade da seca, envolve um conjunto de práticas, dentre elas,
o manejo do fogo, o controle dos aceiros, geralmente preconizando a estruturação das roças,
os fazeres da agricultura, a organização do plantio da mandioca, a produção da farinha e seus
derivados. Esse fluxo equilibrado e pulsante das chuvas e da seca no Amapá, dita o ritmo da vida
há séculos e demarca a performance de atuação dos atores na paisagem.
Com o objetivo de “limpar o terreno” para o recebimento de uma ação específica, os
focos de queimada são gerados com maior força no tempo da seca. É comum a incidência de
queimadas nesse período, sejam focos controlados ou mesmo sem controle. Contudo, para
além do manejo do fogo e controle dos aceiros que os povos indígenas fazem com grande
propriedade, outros atores da paisagem se utilizam dessa técnica com fins alimentares e/
ou econômicos. A dinâmica dos atores, e da própria paisagem, possibilita maior ou menor
incidência de focos de queimadas no Amapá. Os Campos Alagados no período de seca são mais
susceptíveis às queimadas, assim como o Cerrado Amapaense, se comparados à Floresta. Em
proporção, percebe-se que o comportamento dos focos de queimadas por quilômetro quadrado
entre 2000 e 2019 foram mais incisivos na unidade de paisagem Cerrado Amapaense do que
nos Campos Alagados e na Floresta. Os eixos de influência das rodovias federais BR-156 e
BR-210 se destacaram no cenário do estado com a maior incidência de focos de queimadas,
indicando que, apesar de não ser algo abstrato, a estrada e suas áreas de influência atraem
potencialmente esta atividade, mas sempre no breve tempo do período da seca.
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 539
Alexandre Luiz Rauber • Carina Santos de Almeida • Manuel Eduardo Ferreira
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Atores da paisagem: o padrão temporal e espacial de focos de queimadas
no estado do Amapá entre os anos 2000 e 2019 e as influências das práticas e saberes indígenas
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Alexandre Luiz Rauber • Carina Santos de Almeida • Manuel Eduardo Ferreira
Tabela 1. Incidência de focos de queimadas nas áreas de influência das BR-156 e BR-210, no Estado do
Amapá – 2000/2019.
Incidência de Focos de Queimadas (Focos)
Ano Influência da BR-156 e % na área de influência da
Estado do Amapá
BR-210 BR-156 e BR-210
2000 447 278 62,19
2001 2.072 805 38,85
2002 2.432 1.315 54,07
2003 2.148 1.275 59,35
2004 2.997 1.709 57,02
2005 1.653 959 58,01
2006 1.052 772 73,38
2007 506 336 66,40
2008 1.013 685 67,62
2009 2.842 1.501 52,81
2010 921 640 69,48
2011 1.458 976 66,94
2012 2.963 1.414 47,72
2013 1.300 829 63,76
2014 2.078 1.256 60,44
2015 3.725 1.945 52,21
2016 3.575 1.819 50,88
2017 2.710 1.492 55,05
2018 1.819 1.180 64,87
2019 2.063 1.286 62,33
Total 39.774 22.472 56,49
Elaborado por Rauber (2020). Fonte: Adaptado de INPE.
Tabela 2. Incidência de focos de queimada por unidade de paisagem, na área de influência das rodovias
BR-156 e BR-210 – Período de 2000-2005-2010-2015/2017.
Unidade de paisagem – Focos de Queimadas
N.º Focos de
Ano Campo
Queimadas Floresta % Cerrado % %
Alagado
2000 278 161 57,92 94 33,81 23 8,27
2005 959 422 44,00 482 50,26 55 5,74
2010 640 292 45,63 290 45,31 58 9,06
2015 1.945 914 46,99 743 38,20 288 14,81
2016 1.819 834 45,85 658 36,18 327 17,97
2017 1.492 796 53,35 543 36,39 153 10,26
Elaborado por Rauber (2020). Fonte: Série Histórica de Incidência queimadas do INPE.
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Atores da paisagem: o padrão temporal e espacial de focos de queimadas
no estado do Amapá entre os anos 2000 e 2019 e as influências das práticas e saberes indígenas
Elaborado por Rauber, 2020 Fonte: Interpolação de dados de queimadas do INPE no Software TerraView
Figura 3. Mapa de densidade de queimadas no Estado do Amapá, nos períodos de 2000, 2005, 2010 e 2015.
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Atores da paisagem: o padrão temporal e espacial de focos de queimadas
no estado do Amapá entre os anos 2000 e 2019 e as influências das práticas e saberes indígenas
foram alocadas até 2017. Totalizam 22 Assentamentos diferenciados e abrangem uma área
de 769.377,17ha, com uma média de 118ha por lote, com uma taxa de ocupação de 78,99%.
Os focos de queimadas nos Assentamentos Rurais, na série histórica analisada
(Tabela 3), foram de 6.338 focos, e, representaram, 15,93% de incidências. Em grande
medida, se concentram nos Assentamentos convencionais, onde as queimadas ocorrem
para a abertura das roças, sobretudo, na unidade de paisagem Floresta.
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Alexandre Luiz Rauber • Carina Santos de Almeida • Manuel Eduardo Ferreira
546 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
Atores da paisagem: o padrão temporal e espacial de focos de queimadas
no estado do Amapá entre os anos 2000 e 2019 e as influências das práticas e saberes indígenas
Focos de queimadas em Unidade de Conservação Estadual Focos de queimadas em Unidade de Conservação Federal
Focos de queimadas em Assentamentos Rurais Focos de queimadas em Terras Indígenas
Focos de queimadas – Demais Áreas
2500
2000
1500
1000
500
0
2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017 2018 2019
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Atores da paisagem: o padrão temporal e espacial de focos de queimadas
no estado do Amapá entre os anos 2000 e 2019 e as influências das práticas e saberes indígenas
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Alexandre Luiz Rauber • Carina Santos de Almeida • Manuel Eduardo Ferreira
dos povos nativos queimar os Campos Alagados para a renovação de pastagens, como
ocorre com a população neobrasílica do Amapá, sobretudo, porque os povos autóctones
não tem a tradição de exercer a pecuária bovina e/ou bubalina.
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Atores da paisagem: o padrão temporal e espacial de focos de queimadas
no estado do Amapá entre os anos 2000 e 2019 e as influências das práticas e saberes indígenas
e ágil das terras disponíveis para incorporação pela sojicultura e silvicultura no Cerrado e tarda
as concessões florestais para exploração de madeira na Floresta.
As práticas e saberes tradicionais contribuem para influenciar na manutenção das
características físico-geográficas das paisagens no Amapá. Enquanto as explorações
agropecuárias e extrativistas não dominarem o cenário econômico, as paisagens seguirão
mais equilibradas. Enquanto o Amapá continuar despercebido em suas potencialidades
ambientais para a exploração econômica dos recursos naturais, as paisagens permanecerão
constituídas. Os focos de queimadas se traduzem, em profusão, em um dos parâmetros
para que possamos mensurar os riscos que a paisagem está sofrendo, e, no Amapá em
particular, o interesse socioeconômico ainda não dominou as práticas e saberes regionais.
Esperamos, francamente, que a exploração neocapitalista e predatória tarde a chegar.
NOTAS
4 Conforme Simon Schama, não existe na Terra um “[...] único sistema natural que a cultura
humana não tenha modificado substancialmente, para melhor ou para pior.” (1996, p.17).
5 Diegues explica que, “A existência de um mundo natural selvagem, intocado e intocável
faz parte, portanto, desses neomitos. [...].” (2000, p.10).
6 O verbete “desenvolvimento” extraído de Mario Riedl nos indica a complexidade do significado
que a palavra assume no decorrer da história, com isso, o pesquisador destaca que os sentidos
mais complexos e completos estão ancorados em autores como Ignacy Sachs, Amartya Sen,
Celso Furtado, Fernando Henrique Cardoso e José Eli da Veiga (RIEDL, 2017, p. 97–99).
7 Na vulgata popular no Amapá, utiliza-se expressões como “inverno” e “verão” para
caracterizar o tempo das chuvas e o tempo da seca. Apesar de Souza e Cunha (2010) e INPE
atribuirem “estações” aos períodos anuais, a “primavera” corresponde aos meses de setembro,
outubro e novembro, o “verão” aos meses de dezembro, janeiro e fevereiro, o “outono” aos
meses de março, abril e maio e o “inverno” aos meses de junho, julho e agosto. Contudo,
optamos por não abordar tais expressões: “[...] adotar esta nomenclatura pode, apesar de
casual, provocar certa confusão, uma vez que o Estado é atravessado pelo Marco Zero do
Equador, convenção geográfica internacional que define os hemisférios norte e sul. Como boa
parte do estado encontra-se no hemisfério norte, adotar uma convenção de ‘estações’ atribuída
ao hemisfério sul deturpa a caracterização específica do período.” (RAUBER, 2019, p.27-28).
8 Criada em 1980, com 619.000 hectares.
9 Criada em 1984, com 357.000 hectares.
10 Criada em 1981, com área de 72.000 hectares.
11 Homologadas em 1982, 1991 e 1992, respectivamente, situadas no município de
Oiapoque e totalizando juntas 518.454 hectares.
12 O Cerrado Amapaense apresenta 9.861,89 km².
13 A unidade de paisagem Floresta alcança o total de 106.987,50 km².
14 Criado em 2002, com uma área de 3.867.000 ha.
15 Criada em 1989, com uma área de 412.000ha.
16 Criada em 2006, abrangendo uma área de 2.364.400ha.
17 Criada em 1997, com uma área de 501.771ha.
18 Criada em 1984, com uma área de 227.126ha, deste montante, o percentual majoritário de
60% está no estado do Pará e o restante de 40% no município de Laranjal do Jari no Amapá.
19 Demarcada em 1996 com uma área de 607.017 ha.
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 551
Alexandre Luiz Rauber • Carina Santos de Almeida • Manuel Eduardo Ferreira
20 Demarcada em 1997, uma pequena porção de área demarcada de sua área total está
localizada dentro do estado do Amapá, qual seja, com 53.000ha.
21 Ver: www.inpe.br/queimadas/bdqueimadas.
22 Existem inúmeras comunidades quilombolas no estado do Amapá, grande parte
situa-se nas cercanias da região metropolitana de Macapá, mas, também, em áreas de
assentamentos rurais, homologadas, demarcadas e em processo de reconhecimento,
contudo, em termos de tamanho territorial, as comunidades quilombolas não são extensas.
23 Para maior compreensão, ver LEONEL, 2000, p.232.
24 Os estudos de Warren Dean são singulares no que se refere as relações entre homem e
natureza, sobretudo, sobre a devastação das florestas no Brasil. Ver Dean, 1996, p. 206–227.
25 O trabalho do indígena Galibi-Marworno Solei Botã Santos Silva (2019, p. 20) destaca que:
Somos influenciados em nosso ritmo de vida pelos “períodos do tempo” ao longo do ano, como
“la botã” e “lagho djilo” ou “sezõ lapli”. A “época do verão” (la botã) e a “época de inverno”
(lagho djilo) ou “época da chuva” (sezõ lapli) fazem sentido na vida dos Galibi Marworno.”
26 Os povos Galibi (Marworno) e Karipuna são falantes de uma língua crioula, chamada Kheuól.
27 Referência a posição das estrelas no céu.
REFERÊNCIAS
552 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
Atores da paisagem: o padrão temporal e espacial de focos de queimadas
no estado do Amapá entre os anos 2000 e 2019 e as influências das práticas e saberes indígenas
desenvolvimento regional e temas correlatos. Porto Alegre: Editora Conceito, 2017. p. 97–99.
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SOUZA, E.B.; CUNHA, A.C. Climatologia da Precipitação no Amapá e mecanismos
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Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 553
Ednilson Gomes da Silva • Silvio Simione da Silva
RESUMO: Este trabalho é uma análise das propostas para a integração regional das faixas
de fronteira internacional do extremo oeste brasileiro com o leste peruano. Aqui se buscou
situar os possíveis impactos da extensão da Rodovia BR-364, ligando as cidades de Cruzeiro
do Sul (Brasil) a Pucallpa (Peru). Viu-se que esta ação visa à exploração de potencialidades
para agropecuária, recursos naturais, rotas comerciais e até de acesso a portos no Oceano
Atlântico e Pacífico. Pode-se concluir que, embora este projeto já existisse (Planos de Metas do
Presidente Juscelino Kubitschek(1956-1961), todavia nunca concluído. A partir de 2018 e 2019
ele foi retomado pelas autoridades do Acre e Ucayali, buscando consolidar formas de integração
regional. Nesse sentido, se buscou firmar condições para ampliação de intercâmbios e possibilitar
vias para o desenvolvimento no plano local, regional e internacional sul-americano, quebrando o
isolamento espacial da região e, dando maior vinculação desta com o mundo.
ABSTRACT: This work is an analysis of the proposals for the regional integration of the
international border of the extreme west of Brazil with the east of Peru. Here, you can find the
possible effects of the extension of the BR-364 road, connecting the cities of Cruzeiro do Sul
(Brazil) to Pucallpa (Peru). It was seen that this action aims to explore the potential exploration
for agriculture, natural resources, trade routes and even access to ports in the Atlantic and
1 Técnico em assuntos educacionais do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Acre-IFAC. Graduado em Geografia
pela Universidade Federal do Acre. Pós-Graduação Latu Sensu em Gestão Escolar/Orientação e Supervisão pelo Centro Universitário
Barão de Mauá (2013). Mestre em Geografia pela Universidade Federal de Rondônia. E-mail: edgeogs@yahoo.com.br.
2 Professor associado no Centro de Filosofia e Ciências Sociais da Universidade Federal do Acre - CFCH/UFAC, atuando nos Cursos
de graduação em Geografia e no Mestrado de Geografia – UFAC. Graduado em Geografia da UFAC; Mestre e Doutor pelo Programa
de Pós-graduação em Geografia pela Universidade Estadual Paulista; Pós Doutorado no Programa de Pós Graduação em Geografia do
Instituto de Estudos Socioambientais da Universidade Federal de Goiás - IESA/UFG. E-mail: ssimione@gmail.com.
554 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
BR-364 – Nos confins da fronteira oeste do Brasil: uma via para
a integração rodoviária do Acre (Cruzeiro do Sul) com Ucayalli (Pucallpa)
Pacific Ocean. You can conclude that, although this project already exists (Goal Plans of
President Juscelino Kubitschek (1956-1961), it has never been completed. From 2018 and
2019, it was taken over by the authorities of Acre and Ucayali, seeking consolidated forms of
regional integration In this sense, you will be able to find the best conditions for the expansion
of exchanges and allow development routes at the local, regional and South American level,
breaking the spatial isolation of the region and giving it a greater link with the world.
INTRODUÇÃO
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 555
Ednilson Gomes da Silva • Silvio Simione da Silva
556 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
BR-364 – Nos confins da fronteira oeste do Brasil: uma via para
a integração rodoviária do Acre (Cruzeiro do Sul) com Ucayalli (Pucallpa)
Tal integração ocupa a parte oeste do estado do Acre, dando continuidade ao Eixo de
Integração e desenvolvimento (EID/IIRSA) Brasil-Peru-Bolívia, que já tem vias ativas,
pelo sul do estado na cidade de Assis Brasil (BR) e Iñapari (PE), conforme Figura 1:
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 557
Ednilson Gomes da Silva • Silvio Simione da Silva
É a partir disto que objetivamos, com base nos estudos geográficos, caracterizar essa faixa
de fronteira e analisar as relações espaciais, perante a necessidade de políticas públicas que possam
promover a construção desse eixo rodoviário integrador, ligando as duas cidades, aproximando-as,
embora seus sítios urbanos esteja fora da linha limítrofe internacional. Tais ações de integração
ocasionará a possibilidade de maior abertura aos mercados internos da América do Sul, nesta porção
sudoeste amazônica em terras até então pouco exploradas. Nesse sentido, no que diz respeito à área
estudada, isso facilitaria que cada vez mais os fluxos comerciais entre Cruzeiro do Sul e Pucallpa se
intensificassem, tendo um circuito de integração com possibilidades de explorar, inclusive, formas
intermodais de transporte por vias terrestres e fluviais.
Ademais, cabe ressaltar que a rodovia internacional, nessa área, faz parte de um
plano estratégico de integração e expansão do capital previsto, na América do Sul, mas
que remonta aos planos de governos brasileiros dos finais da década de 1950. Depois
de colocada no esquecimento por tempos, apenas recentemente tem sido retomada no
contexto das políticas de integração regional sul americano (IIRSA), pós anos 2000,
como nota-se no relato a seguir:
A partir do ano 2003 os Presidentes do Brasil e Peru, Luiz Inácio Lula da Silva
e Alejandro Toledo, respectivamente, decidiram fortalecer e consolidar as
relações bilaterais entre os dois países, com o propósito de avançar na construção
de uma aliança estratégica. Na oportunidade foram constatadas importantes
convergências sobre a visão compartilhada de cooperação e integração o que
orientaram as relações bilaterais, destacando-se como elementos fundamentais
como: complementação das economias, promoção do comércio, interconexão
física, investimentos em turismo, combate ao narcotráfico, desenvolvimento
de cooperação técnica para a preservação do meio ambiente, proteção dos
recursos naturais buscando o desenvolvimento sustentável e a luta contra a
pobreza (FORUM BI-NACIONAL, 2006, p. 2-3).
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BR-364 – Nos confins da fronteira oeste do Brasil: uma via para
a integração rodoviária do Acre (Cruzeiro do Sul) com Ucayalli (Pucallpa)
Como resultado de tudo isto, as ações institucionais que já estavam em curso nesse
período começam a ganhar corpo, ainda na primeira década deste século:
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 559
Ednilson Gomes da Silva • Silvio Simione da Silva
560 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
BR-364 – Nos confins da fronteira oeste do Brasil: uma via para
a integração rodoviária do Acre (Cruzeiro do Sul) com Ucayalli (Pucallpa)
Seguindo essa lógica, Becker (2006, p. 57), assinalou que “as zonas de fronteira
correspondem a uma área de interpenetração mútua e de constante manipulação de
estruturas sócio-políticas e culturais distintas”. Ademais, cada lado da “fronteira apresenta
estruturas culturais, sociais, econômicas, políticas e demográficas diferenciadas”, mas que
se complementam nas inter-relações que se travam no convívio socioespacial estabelecido.
Desta forma, caracterizam-se, por serem locais de instabilidade e mutabilidade, podendo
surgir reações e conflitos de diferentes naturezas (nacionalistas, libertadores, econômicas,
etc.), a partir, tanto das aspirações das populações locais, como de pressões externas.
Atualmente, perante a lógica da globalização econômica as barreiras físicas de séculos
passados que segregavam espaços políticos já não fazem mais sentido. Na atualidade, a fronteira é o
local de flexibilização econômica, social e cultural em suas manifestações de complementariedade
e formação de uma identidade socioespacial de quem vivem em condições de territórios limítrofes.
Falar de fronteira, agora é se voltar para interpretação dos fenômenos econômicos e sociais que
acontecem ou podem vir acontecer, sobretudo, por meio da busca da integração entre diferentes
espaços nacionais que compartilham de condições geográficas existenciais próximas.
Geopoliticamente, a faixa de fronteira corresponde uma área considerada de defesa
contra possíveis invasores – isto é, área de Segurança Nacional. Por isto, mesmo estando
subordinadas as ações em nível estadual, ter uma vida social própria e específica, ela submete-
se a jurisdição federal, sendo áreas prioritárias para possíveis ações militares. Porém, na
condição de territórios limítrofes, a faixa de fronteira e suas bordas, podem ser locais onde se
encontram muitas cidades, povoados, comunidades campesinas e indígenas ou mesmo terras
de florestas desabitadas. Como faixas de segurança nacionais, estes territórios estão mais
expostos a determinação externa vindas de áreas centrais dos países; nisso reside a condição
que lhes são muito conflitivas. Por outro lado, essas áreas são muito importantes, pois são nas
bordas entre dois espaços de fronteira que ocorrem as principais relações sociais, econômicas
e culturais, formando também regiões de forte influência externa para ambos os lados.
No caso daAmazônia sul-americana estas bordas são habitadas por uma significativa população
indígena. Isso, por si, já marca a fronteira com certa fluidez nos limites, pois estes povos podem ter
parte de seus territórios nativos divididos entre dois países (como os Manchineri [Piro, no Peru] que
estão no Brasil e no Peru, no Estado do Acre [BR] e em Madre de Dios [PE]), transitando de ambos
os lados da fronteira. Tem que se considerar ainda, que estas bordas de fronteira são extensas e em
grande parte pouco povoadas, mesmo por povos nativos. Isso as torna portadoras de um cenário de
ações ilegais como o narcotráfico, facilitado pela quase ausência do Estado nesses lugares.
De forma geral, as bordas são assim, cenários principais de interação e fluxos (legais
e ilegais) em escala imediata e local, independe de ser povoado e não. A borda fronteiriça
entre Cruzeiro do Sul e Pucallpa, aqui parte de nosso espaço de estudo, são áreas de densa
floresta, na qual predominam os fluxos ilegais de contrabando de madeira, invasões a
terra indígenas, trilhas clandestinas funcionando como corredor do tráfico internacional
de drogas. Nesse sentido, independente da legalidade ou não, tudo isto, nos mostra que
já existe uma vivacidade na borda desta fronteira do oeste acreano com o leste peruano.
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 561
Ednilson Gomes da Silva • Silvio Simione da Silva
fluxos para os portos marítimos da costa litorânea peruana. Isto se trata de um Projetos
para uma possível rota de integração, de um percurso terrestre mais curto entre Brasil
e o litoral do Peru, de que o atual existente intitulado de “Rodovia do Pacífico”. Este
percurso existente se dá por meio da BR-317 liga a cidade de Rio Branco a Assis Brasil
(sul do estado do Acre) conectado a “Carretera Transoceânica” na pequena cidade Iñapari
(Madre de Dios, Peru) e seguindo a até o Porto de Illo, no litoral sul peruano.
Como já vimos, trata-se de apresentar as possibilidades e necessidades da
concretização de uma rodovia internacional entre as cidades de Cruzeiro do Sul (Acre)
e Pucallpa (Ucayalli) que se posicionará como possíveis locais para fortalecimento de
estratégias de aproximação de mercados locais, regionais e globais. Cabe ressaltar que
essa integração é um projeto antigo, e foi previsto no Plano de Metas do Presidente
Juscelino Kubitschek (1956 e 1961) como parte de séries de investimentos rodoviários,
sobretudo de integração da Amazônia. No caso específico, foi planejado a BR-029 que,
posteriormente viria a se chamar de BR-364 que tinha como projeto original ligar São
Paulo e Brasília em direção ao Centro-Oeste e Amazônia sobretudo, os estados de Mato
Grosso, Rondônia e Acre. O término desta rodovia estava previsto de ser na Comunidade
Boqueirão da Esperança, localizada no município de Cruzeiro do Sul (AC), em plena
fronteira, na linha limítrofe com o país vizinho Peru. O trajeto dessa rodovia já visava,
naquela época, a integração com a cidade de Pucallpa (Peru). A trilha para rodovia chegou
a ser aberta pelo Exército brasileiro e, posteriormente foi abandonada, ficando apenas a
“clareira” na floresta nas proximidades da fronteira (KAMP, 2002).
Geograficamente, trata-se de um projeto com uma nova rota internacional, com efeitos
em transformações socioeconômicas e consequentemente estruturais no espaço regional
produzido. Nisto, o projeto marcará uma nova reconfiguração que ultrapassa a escala local,
movendo-se para mercados globais com abertura regional de seus potenciais de recursos
naturais vegetais e minerais aos interesses do capitalismo, para muito além destas fronteiras.
Assim, dado que já existe uma ligação do Acre com o Peru (Rio Branco a Porto
Maldonado, via a cidade de Assis Brasil), cabe aqui ressaltar que a integração terrestre
de Cruzeiro do Sul a Pucallpa permitirá ao Acre outra conexão internacional, agora pela
mesorregião do Vale do Juruá (SILVA, 2020). Com isto, se antes o Acre era “fim de linhas”
das rodovias terá então conexão externa tanto no plano norte-sul, como no plano oeste-
leste. Os impactos positivos dessa alternativa de integração binacional, no fortalecimento do
desenvolvimento econômico da região, ocorrerão com mais ênfase no oeste acreano, firmando
Cruzeiro do Sul como enclave central/estratégico no extremo oeste brasileiro. Ademais, essa
rodovia permitirá uma integração intermodal como um corredor de fluxos socioeconômicos
dos grandes centros brasileiros em direção aos portos peruanos, mas também por hidrovias
com conexões terrestres-fluvial através dos rios Juruá e Ucayali em direção ao rio Amazonas.
Um fato importante sob esta perspectiva de consolidação desse novo eixo de
integração é considerar a redução do tempo de viagem rodoviária entre a cidade de
Cruzeiro do Sul até a cidade de Lima-Peru. Levando-se em consideração que a distância
de Cruzeiro do Sul até a Capital Peruana, utilizando-se desse possível “novo eixo” de
integração terrestre, via Pucallpa, consiste em aproximadamente 1.100 quilômetros. O
que evidencia ser um percurso bem menor do existente que se dá por meio da rodovia
BR-364, que liga Cruzeiro do Sul a Rio Branco, em torno de 635 quilômetros e depois
por meio da Rodovia BR-317 (Rodovia do Pacífico) que liga Rio Branco a Lima (PE)
equivalente a 2200 quilômetros. Isto significa que trecho de Cruzeiro do Sul (AC/BR) a
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BR-364 – Nos confins da fronteira oeste do Brasil: uma via para
a integração rodoviária do Acre (Cruzeiro do Sul) com Ucayalli (Pucallpa)
A Figura 3 representa estes trechos. Nota-se que é curto o trecho rodoviário que
falta para conectar o sistema rodoviário brasileiro ao peruano (BR-364 com a Rodovia
Peruana Federico Basadre).
Neste sentido, integrar a fronteira entre estas duas cidades apresenta-se como
uma nova opção de entrada e saída sul-americana, em direção ao Oceano Pacífico, tal
como em direção ao interior do continente em rotas que também seguirá para o Oceano
Atlântico; seja por terra ou por meio de hidrovias com a bacia hidrográfica do Amazonas.
A questão da integração entre ambas as cidades poderá ocasionar um processo geográfico
de abertura de possibilidades do surgimento um novo circuito de importantes relações
espaciais nesta área de fronteira, no centro da América do Sul. Esta integração binacional
poderá ser uma alavanca na interação de fluxos e um fator de transformação da região
levando ao surgimento de novas características espaciais e socioeconômicas em plena
Amazônia peruana e brasileira. Diante deste quadro, o oeste acreano com sua cidade
principal - Cruzeiro do Sul, terá maior relação como a cidade de Pucallpa – principal
cidade do leste amazônico do Peru; e, com isso, as trocas comerciais possibilitarão efeitos
de novas dinâmicas ao desenvolvimento econômico nos dos dois lados da fronteira.
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 563
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564 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
BR-364 – Nos confins da fronteira oeste do Brasil: uma via para
a integração rodoviária do Acre (Cruzeiro do Sul) com Ucayalli (Pucallpa)
ganhará maior vivacidade por meios dos fluxos comerciais e sociais, consolidando de
relações formais e legais em detrimento das atuais informalidades de rotas clandestinas
como áreas de corredores internacionais de narcotráficos, contrabando de madeiras, seja
por meio dos rios, ou de estradas vicinais não autorizadas na floresta.
Agora podemos passar a tratar de especificidades da cada área em estudo.
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 565
Ednilson Gomes da Silva • Silvio Simione da Silva
Esse circuito fluvial é usado por embarcações de variados calibres que navegam
fazendo a integração como outras regiões no território peruano, bem como para outros
países da América do Sul, sobretudo Brasil e Colômbia que ocorre através do rio Ucayali,
integrando o sistema hidrográfico do rio Amazonas, desde os tempos de exploração da
borracha (século XIX até meados do século XX) tem possibilitando conexão fluvial do
interior peruano com diversas cidades regionais como Iquitos (PE), Letícia (CO), Manaus
(BR) e Belém (BR), situação que ainda se mantém na atualidade (Figuras 04 e 05).
Assim, Pucallpa é considerada a capital industrial na Amazônia peruana (Figura
07). Corresponde a décima quarta cidade mais populosa da República do Peru, sendo
considerada uma cidade-polo de toda a sua região e concentrando 60% do parque
industrial peruano instalado na Amazônia. Esta condição foi reforçada pelo fato de ser
uma zona franca com isenção de impostos para suas operações mercantis e industriais, o
que potencializou sua economia no setor do comércio, indústria madeireira e no turismo.
Além disso, a região abriga sede de uma refinaria petrolífera próxima ao rio Pachitea, onde
tem desenvolvido atividades de perfuração e exploração do petróleo e gás natural (Figura
6). Tudo isto coloca a cidade como um ponto estratégico para integração econômica
peruana, como também para os interesses internacionais (KAMP, 2002).
566 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
BR-364 – Nos confins da fronteira oeste do Brasil: uma via para
a integração rodoviária do Acre (Cruzeiro do Sul) com Ucayalli (Pucallpa)
O Estado brasileiro do Acre criado pela Lei Federal 4070, em 15 de Junho de 1962, tendo
obtido a autonomia político cinquenta e oito anos na condição de Território Federal (desde
1904). Localiza-se na Região Norte, na porção mais ocidental do território nacional em plena
área de floresta amazônica, formando uma extensa fronteira com a República da Bolívia e com a
República do Peru. De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística-IBGE (2019),
possui uma população de aproximadamente 873.218 habitantes, estando subdivido em duas
mesorregiões geográficas intituladas de Vale do Acre e Vale do Juruá que correspondem a parte
leste e oeste do território acreano, respectivamente. Esta é a divisão atual, tendo sido elaborada
pelo IBGE em 1989, sendo ainda subdividida em cinco microrregiões geográficas: de Rio
Branco, de Cruzeiro do Sul, de Sena Madureira, de Brasiléia e de Tarauacá.
Na mesorregião do vale do Acre, localizam-se as microrregiões de Rio Branco,
Sena Madureira e de Brasiléia. Corresponde a área mais povoada do estado, onde residem
aproximadamente 70% da população, além de concentrar as principais atividades de comércio,
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568 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
BR-364 – Nos confins da fronteira oeste do Brasil: uma via para
a integração rodoviária do Acre (Cruzeiro do Sul) com Ucayalli (Pucallpa)
Cruzeiro do Sul, por ser principal cidade do extremo oeste da Amazônia ocidental
brasileira, dispõe de um Aeroporto Internacional com capacidade de receber grandes aeronaves
(Figura 10), sendo que no ano de 2017 recebeu uma média de 95.270 passageiros; 4.983 voos,
sendo 3.111 domésticos e 943 executivas gerais, além movimentar 91.937 kg de carga aérea
(INFRAERO, 2017). O aeroporto atende a aviação civil, comercial, turística e é base de apoio
aos municípios vizinhos para deslocamentos em questões de atendimento médico, comércio
e para as operações militares, sendo uma alternativa rápida de deslocamento. Atualmente, a
cidade dispõe de um voo diário ofertado pela companhia Gol linhas aéreas, em avião comercial
tipo Boeing 737 com destino a Rio Branco/Brasília e conexões nacionais e internacionais.
Ademais, depois da hidrovia do Juruá, tem no transporte aéreo sua principal ligação com
as outras cidades mais remotas do oeste do Acre (Porto Walter e Mal. Thaumaturgo). Destas
cidades menores, saem voos de aeronaves menores para Cruzeiro do Sul; e, daí pode segue
para a capital, Rio Branco ou outros lugares a partir do voo diário que liga Cruzeiro do Sul a
capital estadual. Assim, o aeroporto além de atender a aviação comercial é, base de apoio aos
municípios vizinhos, em transporte de maior rapidez.
Durante muitos anos, o meio de transporte aéreo foi a única forma de locomoção no
período de intensas chuvas, entre Cruzeiro do Sul e Rio Branco, devido à dificuldade de
acesso pela rodovia (épocas antes da pavimentação). Com isso a cidade tinha apenas duas
alternativas para conexões socioeconômicas, sendo por via aérea para Rio Branco e, transporte
fluvial para Manaus, que historicamente foi o grande centro de toda a região Norte, desde os
período áureos da extração da borracha, até a chegada das rodovias. No caso do transporte
fluvial, no Acre, o sistema fluvial não possibilita a integração entre a parte leste e oeste do
Estado, devido os rios terem seus fluxos definidos no sentido Sul/Norte, não se interligando
em território acreano. Explicando melhor esta dificuldade, temos de ressaltar as características
da geomorfologia fluvial dos rios que drenam o Acre. Esse sistema hidrográfico se faz num
plano de “sul para o norte”, ao passo que as terras que forma o Estado se estende de “leste
para o oeste”. Devido à essa característica, a ligação por hidrovias sempre foi inviabilizada
entre as cidades acreanas, situadas em duas bacias hidrográficas que não se integram entre si
no território estadual: do rio Purus (na parte leste); e, rio Juruá (na parte oeste). Diante dessa a
situação a parte oeste acreana esteve, economicamente, até recentemente muito mais ligadas
a Manaus (AM) do que à capital acreana.
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 569
Ednilson Gomes da Silva • Silvio Simione da Silva
Ademais, o porto fluvial da cidade Cruzeiro do Sul (Figura 11) tem capacidade
parcial de receber embarcações cargueiras (balsas) de grande porte, sendo os melhores
períodos entre os meses de outubro a junho que corresponde o período chuvoso e que o
rio Juruá estará com maior capacidade de navegabilidade. Porém, durante todo o ano,
diversos barcos de pequenos e médios portes movimentam o porto, junto com as “balsas”
que chegam de Manaus, com produtos alimentícios, combustível e gás de cozinha em
escala capaz de abastecer o comércio local.
Portanto, vimos que apesar de ter ocorrido a conclusão da pavimentação do trecho da
BR-364 entre Rio Branco e Cruzeiro do Sul, a dinâmica fluvial na região permanece como
alternativa de rota para o abastecimento. Diversos empresários que são proprietários de
grandes embarcações (balsas) continuam preferindo trazer de Manaus suas mercadorias
a serem comercializadas; sobretudo, porque a via fluvial ainda é menos onerosa que o
transporte de mercadorias por via terrestre ou aérea, embora o tempo de deslocamento
seja maior. Também, pode-se dizer que rio Juruá ainda permanece como a principal via
aos fluxos econômicos por embarcações que se dirigem às cidades de Mal. Thaumaturgo e
Porto Walter; cidade estas que até o presente não tem integração por rodovia consumada.
O meio de transporte rodoviário é bastante utilizado e hoje é responsável por novas
dinâmicas econômicas da região em direção ao Centro-Sul brasileiro. Assim, a cidade
também dispõe de um terminal rodoviário com fluxo diário para as cidades acreanas de
Rodrigues Alves e Mâncio Lima em ônibus e, dispõe de uma rota para a cidade Amazonense
de Guajará, distante apenas a 20 km. O Fluxo com mais intensidade se dá em direção a
capital Rio Branco, numa rota segue pela BR-364, passando por várias cidades que estão
nos trajetos da rodovia. De Rio Branco, pode-se ter acesso a viagens para outros lugares
do país. Portanto, a BR-364 é uma importante via consolidada de integração de Cruzeiro do
Sul, com os municípios a leste e com outros centros econômicos do país e da América do
Sul. De forma geral, Cruzeiro do Sul ocupa a posição geográfica de um centro estratégico
com agregação de três sistemas de transporte: fluvial, rodoviário e aéreo que se conectam
entre si e são responsáveis por comandar as principais dinâmicas socioeconômicas locais.
Porém, não há conexão para além da cidade, sendo ponto final da rota da BR-364. É diante
disso que se almeja tanto a possível interligação com a Região Peruana de Ucayali e sua
capital Pucallpa como meta para superação dessa condição de ser “fim de linha”.
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BR-364 – Nos confins da fronteira oeste do Brasil: uma via para
a integração rodoviária do Acre (Cruzeiro do Sul) com Ucayalli (Pucallpa)
Como viemos tratando, a fronteira pan-amazônica entre Brasil e Peru, sobretudo entre
a região oeste do Estado do Acre com o Departamento de Ucayali se apresenta, hoje também,
como um cenário de fluxos de atividades legais e ilegais. No que se refere à ilegalidade
na fronteira, cabe ressaltar que a invasão de madeireiros peruanos em território brasileiro,
também se dá em áreas de comunidades indígenas. Segundo Isaac Piyanko, diretor de uma
associação indígenas no Rio Amônia (AC) há anos, madeireiros peruanos fazem exploração
destes recursos em área onde vivem cerca de 500 índios do povo Ashaninka (ARAÚJO, 2011).
Referimos a ilegalidade especialmente no que se trata do tráfico internacional de drogas (Figura
12), por meios das bacias hidrográficas e trilhas e/ou estradas vicinais na floresta que articulam os fluxos
dos dois países. Sendo assim, a falta de uma ligação formal por terra, cria-se um espaço propício para
esta atividade com rotas mutáveis, no âmbito da articulação das bacias hidrográficas com trilhas na
floresta (isto é, podem ser mudadas facilmente), o que dificulta as ações de policiamento, em especial
no Brasil. Além dessas contravenções de entorpecentes, há também grande quantidade de madeiras
nobres como o ipê, cedro, o pau-ferro, o jatobá, o jacarandá, o angelim que são extraídos ilegalmente
das áreas de unidades de conservação brasileira, por contrabandistas madeireiros peruanos (Figura 13).
Desta forma, nessa rota de fronteira, os rios são utilizados para formação de uma rede transporte de
fluxos ilegais que conecta às trilhas na floresta, desde o território peruano até as cidades acreanas de Cruzeiro
do Sul, Mâncio Lima, Rodrigues Alves e Marechal Thaumaturgo. Daí, se poderão acessar as vias terrestres
que complementam essa rede de circulação de tráfico internacional de drogas, via BR-364 com destino a
Rio Branco e demais regiões do território brasileiro; ou ainda, por via fluvial com destino a Manaus e Belém.
Muitas dessas rotas seguem destinos internacionais em direção a Europa e Estados Unidos.
A exploração da madeira sem autorização das autoridades competentes tem recrutado um
elevado quantitativo número de pessoas, sobretudo pelo alto valor que é comercializado o produto.
De qualquer forma, exploração da madeira ilegal também tem sido uma das atividades que tem
dado vivacidade a região de fronteira, especialmente por ser bastante rentável economicamente,
dado a ausência permanente de fiscalização de ambos os países. Assim, a linha da fronteira é
praticamente como “terra sem lei”, em que os madeireiros peruanos, fazem as derrubadas e
chegam a montar vários acampamentos e abrem estradas clandestinas, ao longo da floresta,
usando tranquilamente os rios para escoar as “toras de madeiras” (ICMBIO, 2013, p. 1).
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 571
Ednilson Gomes da Silva • Silvio Simione da Silva
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao analisar os impactos positivos para Cruzeiro do Sul e toda região oeste do Acre,
percebe-se que primeiramente caso o projeto venha a se concretizar trará uma nova rota
terrestre, mais curta na ligação do Acre com a cidade de Lima, que é um dos centros
econômicos da América do Sul. Isto considerando que o Estado do Acre se localiza a mais
de 3.000 quilômetros das grandes metrópoles brasileiras e de todo o polo industrial. A
proximidade com a metrópole peruana, pode abrir mercado e maiores possibilidades ao
desenvolvimento regional nessa porção do extremo oeste brasileiro. Assim, o Acre poderia
exportar sua produção por duas vias terrestres internacionais com destino ao Peru, seja pela
via da rodovia do Pacífico Rio Branco/Assis Brasil/Iñapari/Lima que está consolidado; e a
segunda alternativa viria com a pavimentação do eixo terrestre Cruzeiro do Sul/Pucallpa
e assim estabelecer uma nova Rota terrestre internacional (que possivelmente, também
poderá ser parte de complexo de vias de transporte como a ferrovia projetada).
Para que isso se concretize serão necessários acordos bilaterais entre ambos os países
(Brasil e Peru); inclusive, que o Governo federal brasileiro reconheça a necessidade e
viabilidade econômica deste projeto para toda esta região do oeste acreano. Entretanto é
preciso mais que isso, todavia que ela seja avaliada como um projeto para a nação brasileira.
Tratar como um projeto nacional significa reconhecer que essa nova rota de integração, será
a abertura de mais uma via do circuito intercontinental que se volta da costa do Oceano
Pacífico, para a importação/exportação com Ásia e Oceania, inclusive, para países como
China, Índia, Japão e Austrália, grandes mercados e parceiros comerciais para o Brasil.
Nesse contexto, de integração e trocas comerciais Pucallpa e toda a região de Ucayali
se beneficiarão, pois abre também corredores de importação/exportação peruana ao mercado
brasileiro. Internamente também amplia as possibilidades de estabelecer trocas comerciais
com as cidades próximas e na rota fluvial do Amazonas como Tabatinga (AM), Rio Branco
572 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
BR-364 – Nos confins da fronteira oeste do Brasil: uma via para
a integração rodoviária do Acre (Cruzeiro do Sul) com Ucayalli (Pucallpa)
(AC), Porto Velho (RO), Manaus (AM) e Belém (PA). Isto significa ao Brasil e ao Peru
que se consolidam pontos de integração de outra rota comercial e social que articula do
Atlântico ao Pacífico, tanto em direção à Europa, como Ásia, a África e Oceania.
Ademais, Cruzeiro do Sul e Pucallpa se consolidaram como centros estratégicos de
passagem da grande produção brasileira e peruana; e, com isso também poderão ampliar
os fluxos de pessoas e mercadorias e os possíveis investimentos contínuos na região.
De certa forma, esses lugares, deixarão de ser “fim de linhas terrestres” de seus países,
passarão a ser pontos modais da integração bi oceânica, como parte do grande projeto da
Iniciativa de Integração Regional Sul-Americana (IIRSA).
Por final, pode-se compreender que as articulações institucionais em cursos para
concretizar a integração terrestre evidencia a importância dessa via integradora entre as
duas cidades. Isto virá com vista a melhor inserção social, econômica e política da região
Amazônica na lógica globalizante que se impõem, no contexto internacional da América
do Sul. Quem ganha? Quem perde? Dependerão dos acordos bilaterais que poderão ser
trilhados entre os dois países e com outros entes da economia global. De fato, é notório que
para a região, ficará a saída do isolamento interno em território nacional e a abertura para uma
economia mais internacionalizada. Então, formar-se-á mais um corredor que libera amplos
potenciais de recursos ainda não explorados e abre condições para que ações informais que
até agora ocorrem, possam ser fiscalizadas, incentivadas ou inibidas. O resultado de tudo
isso, certamente será novos caminhos que se abrem para o desenvolvimento da região.
NOTAS
3
Cabe esclarecer que a faixa de fronteira no Brasil é de 150 km (Lei 6.634, 2/051979).
Já as “Constituições do Peru e da Bolívia preveem comportamentos especiais quanto
à propriedade de terras e a exploração econômica. Numa faixa interna de 50 km junto
à fronteira” (STEIMAN, 2002, p. 28). Sendo assim, a cidade de Cruzeiro do Sul está
situada dentro da faixa de fronteira brasileira; já a cidade de Pucallpa não está situada
dentro da faixa de fronteira peruana. Contudo, como capital regional, ocupa a condição
de centro mais importante no leste amazônico peruano, o que lhe confere a condição de
cidade de fronteira (mais econômica que política).
REFERÊNCIAS
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 573
Ednilson Gomes da Silva • Silvio Simione da Silva
574 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
BR-364 – Nos confins da fronteira oeste do Brasil: uma via para
a integração rodoviária do Acre (Cruzeiro do Sul) com Ucayalli (Pucallpa)
Referência Complementar
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 575
Alessandra Severino da Silva Manchinery • Maria de Jesus Morais • Rogério Nogueira de Mesquita
1 Indígena do povo Manchineri. Geógrafa pela Universidade Federal do Acre/UFAC. Mestra e Doutoranda em Geografia na
Universidade Federal de Rondônia/UNIR. Pesquisadora do Grupo de Pesquisa Geografia, Natureza e Territorialidade Humana –
GENTEH/UNIR. E-mail: amanchinery@gmail.com.
2 Doutora em Geografia pela Universidade Federal Fluminense e, Pós-doutorado em Geografia Humana pela Universidade de São
Paulo. Professora do Curso de Geografia e, dos Programas de Pós-Graduação Mestrado em Geografia e, Mestrado e Doutorado em
Letras na UFAC. Líder do Grupo Sobre Produção do Espaço na Amazônia. E-mail: mjmorais@hotmail.com.
3 Mestre e Doutorando em Geografia pela UNIR. Pesquisador do Grupo de Estudos e Pesquisa Geografia, Mulher e Relações Sociais
de Gênero – GEPGÊNERO/UNIR. E-mail: rogerio_vitorioso@yahoo.com.br.
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Indígenas na/da cidade: territorialidades do povo Manchineri na cidade de Rio Branco/AC
this article, special emphasis is given to their motivations for coming to the city and how
they recognize themselves as indigenous people, in the urban context. As a methodology,
we worked with trajectories, which allowed us to live with indigenous people. Based on
experiences and field research, we can say that there are many reasons for the Manchineri
to come to the city and there are several strategies for staying there as indigenous people.
EXPOSIÇÕES INICIAIS
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Alessandra Severino da Silva Manchinery • Maria de Jesus Morais • Rogério Nogueira de Mesquita
É nesta forma que nos enraizamos e aprofundamos este trabalho, criando pontes e
formas de contribuir com estudos sobre povos indígenas em contextos urbanos.
Para tanto, o artigo está dividido em dois itens, cada um com uma representação da
realidade do Povo Manchineri, que reside e/ou nasceram na cidade de Rio Branco.
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Indígenas na/da cidade: territorialidades do povo Manchineri na cidade de Rio Branco/AC
Quadro 1. Mapeamento e bairros de famílias Manchineri que moram na cidade de Rio Branco
Nome (Chefe) Bairro Trabalha Membros Total Motivação
continuação
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Indígenas na/da cidade: territorialidades do povo Manchineri na cidade de Rio Branco/AC
duração, processo esse que se realiza nas novas formas como os jovens agregam a cultura
do “branco” para si. Isso não quer dizer que são proibidos ou que perderam sua cultura
tradicional, mas que é uma estratégia de amenizar os preconceitos e a discriminação
pelos seus diferentes modos de viver e ver o mundo; assim esses jovens tornam-se novos
sujeitos sociais locais que moldam as formas de ocupação do espaço, de definição das
novas territorialidades, de lógicas políticas e identitárias.
No entanto, mesmo tendo parcialmente “direitos legais” nas terras indígenas, muitos
têm saído das aldeias, seja individualmente, seja em grupo familiar, onde gozam da liberdade
cultural e da “proteção oficial”. Alguns Manchineri migraram para a cidade e se organizaram
politicamente, na tentativa de conquistar direitos como cidadãos em contexto urbano, e não
somente como categoria que pertence a uma minoria. Sendo assim, muitos têm lutado para
conquistar outros direitos, como o ingresso nas universidades, espaços físicos nas instituições
não governamentais e governamentais, e, assim, vão formando novas territorialidades na cidade.
Esta é uma questão desafiadora para a ciência, em especial para Geografia. Pois os
“universos” indígenas vêm se familiarizar e envolver-se, cada dia mais, com processos do
mundo do “branco”, do mundo ocidental, como, por exemplo, o consumo, os processos
de monetarização, de dependência de mercadorias industrializadas.
Viemos da aldeia depois que meu pai faleceu. Os parentes não queriam minha
mãe por lá. Fomos obrigados a sair. Sou vigilante na cidade. Ja voltei uma
vez para dar aula. Passei dois anos, mas os parentes não são interessados. Não
tenho vontade de voltar para a aldeia. Ja sofri preconceito sim na cidade. Eu
quero me inserir no curso superior. Nós, que somos urbanizados, temos uma
visão mais ampla em todos os sentidos. Os parentes das aldeias ainda possuem
um pensamento muito limitado. É uma pena. Os parentes da aldeia são
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parecidos com crianças. Eu aprendi muitas coisas todos esses anos na cidade,
coisas que nunca iria aprender, se estivese na aldeia. Pretendo ser empresario.
Eu não tenho muitas relações com os outros manchineri que moram na cidade,
somente com vocês (Raimundo Manchineri “Pixoto”, morador no Bairro
Sobral em entrevista realizada em 15 de março de 2013).
Esse contexto de fala mostra a passagem dos Manchineri da aldeia para o ambiente
urbano. Também pensado como um processo de “desagregação cultural”, aculturação e
consequentemente considerados pelos não indígenas como desaldeados, destribalizados,
desculturados, desterritorializados. Esses termos são usados, em muitos casos, nas
universidades e em outros ambientes, para caracterizar os indígenas que moram na zona
urbana. Na fala do Pixoto, vemos, claramente, a perpectiva do índio urbanizado, capturado
pela cidade, que vê a aldeia como local do atraso.
Isso faz com que os Manchineri tornem-se outros e somente mais uma classe-
categoria, vivendo na zona urbana de maneira excluída. Assim, tratamos de afirmar que
esse jogo de associações pejorativas sobre os indígenas, de forma geral, tornando-os como
único arranjo do preconceito étnico sobre os Manchineri, encontramos essa construção
no imaginário nacional da população “branca”. Imaginário esse que são efetivamente
maldosos para quem chega na cidade com um modo de vida tradicional distinto. Eri
Manchineri, por exemplo, relatou-nos que:
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espaço tem mais valor espiritual. Isso dá lugar a uma memória tanto coletiva quanto
individual. Já a noção de lugar também se expressa nos valores diferenciados que um
grupo social atribui aos diferentes aspectos de seu ambiente. Essa valorização é uma
função direta e determinante de cada povo.
Já a situação de pertencer a um determinado lugar, refere-se a grupos que se originaram em
um local específico, sejam eles os primeiros ou não. A noção de pertencimento deste lugar agrupa
tanto os povos indígenas de uma área imemorial quanto os grupos que surgiram historicamente
em outra uma área, através de diferentes processos, principalmente o econômico.
Entendemos, assim, que ser de um lugar não requer uma relação necessária com
etnia, que tende a ser avaliada em termos de “pureza”, mas sim uma relação com um
determinado espaço físico ao longo do tempo. Evocamos os Manchineri como exemplo,
que se relacionam com o espaço, eles o transformam em um novo território coletivo, e o
transforma em categoria de identidade que se amplia. À medida que a identidade se firma
naquele local, incorpora-se e materializa-se pela relação com os territórios construídos
com base nas suas respectivas cosmografias.
São essas expressões que formam a territorialidade indígena, que não reside somente
“na figura de leis ou títulos, mas se mantém viva nos bastidores da memória coletiva e
individual que incorpora dimensões simbólicas e identitárias na relação do grupo com sua
área, o que dá profundidade e consistência temporal ao território” (LITTLE, 2002).
Deste modo, mesmo o passar do tempo, não apaga o conhecimento dos movimentos
do grupo, desde que se mantenha viva a memória dos ancestrais. Todo Manchineri, que
reside na cidade, possui um lugar, sendo ele material e imaterial, e, sempre estará na
memória dos indivíduos.
Parentesco é a relação que une duas ou mais pessoas por vínculos de sangue
(descendência/ascendência) ou sociais e, sobretudo, pelo “casamento”, e união. Dessa
maneira, em concordânica com Strauss (2003), afirmamos que:
No caso, alguns homens Manchineri não obedecem a essa relação dada por Strauss. E nunca
obedeceram, essa relação é formada a partir da ótica e vivência ocidental. Significa que todo povo
indígena tem um sentido próprio para o casamento, para os seus rituais, para a educação e outros.
A “relação de parentesco entre os Manchineri que vivem na cidade” ocorre de
diversas formas. Uma dessas formas é o “casamento” com os “brancos” e, com indígenas
de outros povos, como os Apurinã, Kaxinawá, Pankararu, Jaminawa-Arara e Kambeba.
Esses são um dos papéis estratégicos nos processos de reprodução no território urbano,
pois aumentar a população indígena é fundamental para os povos em destaque.
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Alessandra Severino da Silva Manchinery • Maria de Jesus Morais • Rogério Nogueira de Mesquita
Meu avô morava no centro de Petrópolis, a gente passou lá, ela pediu o Sabá para
morar com ele, ele morava sozinho com a comadre Petrônia e a comadre Tereza.
Mais quando ele morreu, ele já não estava com a comadre Petrônia não, ele já
estava com a comadre Tereza, e quando a filha dela morreu, ela ficou com o genro
dela, exatamente isso. A sua vó pegou ela (Tereza) para criar com 7 anos. Depois
que seu tio (Antônio Alves) morreu eu fiquei na Extrema ainda, e o seu Zé Urias
também veio embora para cá (Rio Branco), eu vivi nove anos naquela aldeia ali,
se não fosse a confusão do Otavio e o Chico Natico comigo, porque eles queriam
ficar com as minhas vacas, eles butaram para mim matar viu, foi o Segundo
(nome de um ancião Manchineri) que me ajudou mais eu deixei porque eu tenho
coragem de trabalhar, se não fosse isso eu tinha morrido. Na aldeia eu tinha que
limpar roçado, eu tinha que brocar roçado, eu tinha que bater campo, fazer tudo
sozinha, meu Deus, porque os meninos eram tudo pequeno. Antes de eu vir para
Rio Branco, eu fui pra Sena, chegando em Sena eu consegui passagem para cá,
pra lá eu não quero voltar mais não (Dona Cândida Manchineri, ex- moradora da
Aldeia Extrema, T. I. Mamoadate, hoje aposentada e moradora no bairro Sobral,
entrevista à Alessandra Manchinery e Soleane Manchineri, em 2013).
Devido a muitos problemas nas aldeias, muitas famílias têm migrado, seja por fatos
particulares ou questões sociais. Isso faz com que a “urbanização” indígena se torne desigual e
conhecida como um fenômeno “recente”. Apesar de representar um tema ainda pouco estudado,
não é um acontecimento de agora, mas um fato que vem acompanhando o processo de formação
do Estado brasileiro como território, e se constitui um novo desafio para as políticas públicas.
Para melhor visualizarmos a relação dos Manchineri com a aldeia de origem,
elaboramos a Figura 2, com a porcentagem de indígenas que vivem na cidade e que
possuem laços afetivos muito fortes com a aldeia.
A presença de famílias Manchineri, na cidade de Rio Branco, remonta a década de 1980.
Isso já perpassa quase cinco décadas, conforme análise da mobilidade da família do senhor,
José Severino da Silva Manchineri, seu “Zé Urias”, que começou a andar em Rio Branco, nas
décadas de 1970 e 1980, para fazer a mobilização de lutas pela demarcação da Terra Indígena
Mamoadate. Em detrimento de problemas de saúde de sua esposa, firmou-se com toda a sua
família na cidade de Rio Branco, no ano de 1985. Assim. Muitas famílias alojam-se com a
finalidade de permanecer, estudar e se estruturar fisicamente, à medida que ganham seus espaços.
No que tange às relações de parentesco, vão desde as mais individuais e coletivas,
até as superficiais, como mostra a fala de seu Raimundo Manchineri: “eu não conheço
todos os Manchineri que mora na cidade, minha relação é somente com vocês, filhos do
tio Zé Urias” (Raimundo Manchineri, em entrevista a Alessandra Manchineri, em 2013).
A fala de seu Raimundo nos remete sobre a relação de ‘isolamento’ entre muitas famílias
Manchineri que vivem na cidade. Se antes a convivência na aldeia era coletiva, na cidade
passam a viver de forma longínqua e separada dos outros parentes.
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Indígenas na/da cidade: territorialidades do povo Manchineri na cidade de Rio Branco/AC
Diante desse novo modo de vivência na cidade, encontramos cinco (05) clãs de
Manchineri. Entre eles, estão os Severinos formados pelo Maimará, sobrenome negligenciado
por causa da ditadura militar (época em que não era permitido registrar no idioma originário), os
Alves Rodrigues, os Souzas, os Cascudos e os Emídios. Destes clãs, os únicos que não possuem
relações muitos amigáveis com os outros clãs de Manchineri, sejam eles da cidade ou/da aldeia,
são os Emídios, segundo informações de Maria das Chagas Souza Manchineri, moradora do
Ramal Bom Jesus/Vila Acre, em entrevista realizada por Alessandra Manchinery, em 2013.
Destas famílias, a maioria possui moradia própria. Grande parte delas em alvenaria.
São poucos os que possuem a casa de madeira. A Figura 3 mostra a porcentagem dessas
condições de moradia.
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Alessandra Severino da Silva Manchinery • Maria de Jesus Morais • Rogério Nogueira de Mesquita
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Indígenas na/da cidade: territorialidades do povo Manchineri na cidade de Rio Branco/AC
A Figura 6 mostra três membros de “clãs” de Manchineri, que chegaram à cidade com a
finalidade de estudar e atuar no movimento indígena. João Cascudo (em pé), por exemplo, nos contou
que ‘veio atrás do Zé Urias Manchineri em 1983’, mas quando chegou em Rio Branco, não encontrou
seu primo. Então, teve de trabalhar junto com sua mulher, de caseiros nas fazendas e chácaras de Rio
Branco. Foi assim que eles conseguiram juntar dinheiro e comprar seu primeiro terreno. Já os outros
dois jovens estão atuando na saúde e no movimento indígena, na luta por direitos e cidadanias.
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Alessandra Severino da Silva Manchinery • Maria de Jesus Morais • Rogério Nogueira de Mesquita
O acesso à educação ainda representa um desafio para as populações indígenas, seja pela
falta de informação e, sobretudo, pela barreira do preconceito e racismo sobre os povos indígenas.
Embora aproximadamente 51% da população pesquisada possua o ensino fundamental, esse
ainda não é um grande passo. Com relação ao ensino superior, há uma ampla procura para essa
modalidade, mas o que dificulta é a falta de estabilidade financeira, nem todos têm condições de
morar na cidade, já que, na capital, tudo é comprado, pois, na aldeia, vive-se da agricultura, da
pesca, caça e coleta, ou de seus árduos trabalhos braçais. Apesar de haver uma procura maior por
essa modalidade, ainda são poucos os Manchineri que possuem o acesso à universidade.
Não há dúvidas de que muitos estejam engajados nas causas indígenas, os Manchineri
– e sua presença representam minorias marginalizadas e sem muito poder de voz. Isso salta
aos olhos como um caso proeminente “novo”. Neste cenário, tem-se colocado uma série
de questões desafiadoras para a própria Geografia: como estudar os indígenas em meio
urbano? Como analisar essa nova espacialidade? Como estudar sua nova estrutura cultural?
Resta-nos pensar como o espaço urbano precisa ser rediscutido e ser moldado em novas
estruturas sociais para, assim, romper com o modelo antigo da Geografia colonizadora.
Diante de tantos desafios na cidade, os Manchineri decidiram também disputar o
mercado de trabalho e receber os benefícios a que os não-indígenas têm direito. A Figura
8 é uma representação real de muitos indígenas.
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Indígenas na/da cidade: territorialidades do povo Manchineri na cidade de Rio Branco/AC
CONSIDERAÇÕES FINAIS
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Alessandra Severino da Silva Manchinery • Maria de Jesus Morais • Rogério Nogueira de Mesquita
NOTAS
REFERÊNCIAS
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Indígenas na/da cidade: territorialidades do povo Manchineri na cidade de Rio Branco/AC
NUNES, E.S. Aldeias urbanas ou cidades indígenas? Reflexões sobre índios e cidades.
Espaço Ameríndio, Porto Alegre, v. 4, n. 1, p. 9-30, jan./jun. 2010.
OLIVEIRA. J.P.; FREIRE, C.A.R. A presença indígena na formação do Brasil.
Brasília: Ministério da Educação, Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e
Diversidade: LACED/Museu Nacional, 2006.
STRAUSS, L. As estruturas elementares do parentesco. Petrópolis: Vozes, 2003.
ENTREVISTAS
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 595
Bárbara Elis Nascimento Silva • Alexis de Sousa Bastos
ABSTRACT: In the State of Rondônia, the greenhouse effect’s gas emissions in the land
and forest use change sector - MUT represent 78% of total emissions. The deforestation
is the main source of emission of the MUT sector. This work proposes to analyze the
profile of the greenhouse effect’s gas emissions in the land and forest use change sector
in the state of Rondônia and discuss strategies for reducing emissions of this sector.
For understanding the emissions profile of the MUT sector, we used the database of
1 Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Federal de Rondônia- UNIR, Estado de Rondônia, Brasil.
ORCID: Nº 0000-0001-5491-3233. E-mail: barbara.elis17@hotmail.com.
2 Docente do Programa de Pós-Graduação em Geografia Universidade Federal de Rondônia- UNIR, Estado de Rondônia, Brasil.
ORCID: Nº 0000-0003-0236-7554. E-mail: alexis@rioterra.org.br.
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Emissões de gases de efeito estufa no setor de mudança de uso da terra e floresta (MUT) no estado de Rondônia – Brasil
the National Emissions Registry System - NERS, PRODES and DETER - to analyze
deforestation rates and classes. Regarding the change of vegetation cover in the state,
we used the database of the Global Forest Watch. Some municipalities in the Rondônia’s
Stade have already lost more than 45% of all their vegetation cover and Porto Velho is
the city with the largest increases in deforestation in the period from 2013 to 2018. In
conclusion, the state’s emissions would have a positive impact in the short term if the
State of Rondônia could efficiently deal with the issue of deforestation.
INTRODUÇÃO
Este trabalho tem como objetivo analisar em Rondônia o perfil das emissões de
gases de efeito estufa no setor mudança de uso da terra e floresta – MUT, e discutir
estratégias para a redução das emissões desse setor.
O setor mudança de uso da terra e floresta teve a maior parcela no total das emissões
brasileiras de gases do aquecimento global em 2018, foi responsável por 44% do total
de emissões de gases de efeito estufa do Brasil (SEEG, 2019). Segundo Global Carbon
Atlas (2020) no ranking mundial, Brasil está em 6º lugar entre os países mais poluentes,
se excluído o bloco da União Europeia.
Neste setor são incluídas as estimativas das emissões e remoções de gases de
efeito estufa associadas ao aumento ou diminuição do carbono na biomassa acima ou
abaixo do solo pela substituição de um determinado tipo de uso da terra por outro, como,
por exemplo, a conversão de uma floresta para agricultura ou pecuária, ou a substituição
de uma lavoura por reflorestamento (BRASIL, 2016).
Incluem também além das alterações de uso e cobertura da terra, a queima de resíduos
florestais e a calagem de solos. As fontes de remoções são florestas e vegetações não florestais
localizadas em áreas protegidas que não foram convertidas para outros usos (como pastagem
e agricultura), bem como as florestas secundárias. A soma das emissões e remoções resulta
nas emissões líquidas (SEEG, 2018). O gás predominante neste setor é o CO2, mas também
ocorrem emissões de outros gases de efeito estufa como o CH4 e N2O pela queima imperfeita
de madeira deixada no campo, no caso da conversão de florestas para outros usos.
O desmatamento é a principal fonte de emissão do setor de mudanças de uso da
terra, com aumento expressivo em 2016. Segundo o INPE (2016), foram verificados 7.989
km² de desmatamento por corte raso somente no bioma Amazônia, que teve naquele ano
a maior taxa de desmatamento registrada desde 2008 e contribuiu com 52% (602 milhões
de tCO2e) das emissões do setor em 2016, com aumento de 27% em relação a 2015.
Mediante a situação atual, as florestas não têm a atenção que merecem no que
diz respeito a seu potencial como solução para as mudanças climáticas. A capacidade
das florestas de absorver carbono do dióxido de carbono atmosférico está entre os
serviços que regulam as condições ambientais. As florestas, devido à sua longa vida e
massa potencialmente considerável, podem e geralmente possuem grandes volumes de
carbono contidos em suas células. Em essência, as florestas atuam como silos de carbono,
com crescimento biológico líquido aumentando seus volumes de carbono. Declínio ou
destruição biológica, por exemplo, por decomposição ou incêndio que destrói material
biológico, libera carbono e volta à atmosfera.
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Bárbara Elis Nascimento Silva • Alexis de Sousa Bastos
À medida que as florestas são desmatadas para terras agrícolas, áreas de cultivo
itinerantes ou pastagens, parte da madeira pode ser colhida para produtos que oxidam a taxas
variáveis. A maior parte da biomassa acima do solo é queimada e liberada imediatamente
para a atmosfera como CO2. O restante do material acima do solo e abaixo do solo decai. As
taxas de decaimento variam com o clima e a composição química do material vegetal, mas
nos trópicos úmidos a maioria do material se decompõe em 10 anos (MACHADO, 2005).
Uma pequena fração do material vegetal queimado é convertida em carbono preto, que é
resistente à decomposição. As áreas de terras agrícolas e pastagens quando são abandonadas,
essas áreas podem retornar à condição de florestas (uma vegetação arbórea em regeneração)
dependendo da intensidade dos fatores climáticos e de perturbação. No entanto, se a terra
agrícola for gravemente degradada dificilmente ela retornará a condição inicial.
Nos últimos anos, além da conversão da floresta em pastagens e cultivos
agrícolas, a exploração seletiva de madeira apareceu como uma das causas principais
do desmatamento na região, constituindo novos centros de exploração na Amazônia
brasileira, ao construir novas estradas e facilitar o acesso e colonização de novas áreas de
floresta, antes inacessíveis. Essas as áreas de floresta submetidas à exploração seletiva de
madeira tornam-se susceptíveis ao fogo, por abrir caminhos para os ventos, que ressecam
a superfície do solo, tornando os materiais mais secos e combustíveis potencializando a
incidência de ocorrer queimadas (ALENCAR, 2005).
Parte significativa das emissões de carbono brasileira está ligada a florestas, e estas
são potencialmente uma solução para o clima. Isso acontece porque as florestas podem ser
fontes ou sumidouros de carbono (um dos gases), dependendo de como as gerenciamos:
quando não perturbadas, mesmo florestas maduras capturam ativamente o carbono da
atmosfera pela fotossíntese. As árvores atuam como uma tecnologia segura e natural de
captura e armazenamento de carbono.
MATERIAIS E MÉTODOS
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Emissões de gases de efeito estufa no setor de mudança de uso da terra e floresta (MUT) no estado de Rondônia – Brasil
RESULTADOS E DISCUSSÕES
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Bárbara Elis Nascimento Silva • Alexis de Sousa Bastos
600 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
Emissões de gases de efeito estufa no setor de mudança de uso da terra e floresta (MUT) no estado de Rondônia – Brasil
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Bárbara Elis Nascimento Silva • Alexis de Sousa Bastos
602 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
Emissões de gases de efeito estufa no setor de mudança de uso da terra e floresta (MUT) no estado de Rondônia – Brasil
Para a Amazônia o fator médio de remoção foi de 1.35 tCO2e/ha/ano para todo
o período. Esses fatores de remoção foram então multiplicados pela extensão das áreas
protegidas criadas anualmente pelo ICMBio e FUNAI (SEEG, 2018).
No entanto, e não há nenhuma garantia de que as florestas nessas áreas protegidas, em
sua maioria florestas tropicais maduras, estejam de fato removendo carbono nessa quantidade.
Analisando os dados do PRODES sobre as áreas de proteção com maiores
incrementos de desmatamento (Figura 5) podemos observar que essas áreas estão sob
constantes ameaças e pressões de desmatamento.
Como boa parte das emissões rondonienses é proveniente de MUT e amplamente
influenciada pelo desmatamento, se o estado conseguisse lidar eficientemente com a questão do
desflorestamento, as emissões nacionais sofreriam um impacto muito positivo já no curto prazo.
Por muito tempo as políticas estaduais para o controle do desmatamento eram
baseadas em ações de comando e controle, com ênfase na fiscalização e aplicação de multas,
no entanto poucos foram os resultados para inibir o desmatamento e a invasão de áreas
protegidas, isolando cada vez mais as instituições responsáveis pela proteção e gestão do
meio ambiente da sociedade, dos agentes econômicos e da classe política (SEDAM, 2009).
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 603
Bárbara Elis Nascimento Silva • Alexis de Sousa Bastos
CONCLUSÃO
604 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
Emissões de gases de efeito estufa no setor de mudança de uso da terra e floresta (MUT) no estado de Rondônia – Brasil
REFERÊNCIAS
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Bárbara Elis Nascimento Silva • Alexis de Sousa Bastos
uso da terra, mudança do uso da terra e florestas. 2019. Disponível em: http://seeg.eco.
br/wp-content/uploads/2018/05/relatorios_SEEG_2018_-_MUT_Final_v1_.pdf. Acesso
em: 19 dez. 2019.
SEEG. Nota metodológica setor mudança de uso do solo e florestas. 2016. Disponível
em: http://seeg.eco.br/wp-content/uploads/2017/01/2016-12-15-NotaMetodologica-
SEEG4-0-MUDANCAUSOTERRA-2016.pdf. Acesso em: 20 dez. 2018.
SEEG. Perfil de emissões em Rondônia 2017. 2018. Disponível em: http://plataforma.
seeg.eco.br/territories/rondonia/card?year=2017&cities=false. Acesso em: 15 dez. 2018.
TERRABRASILIS. Painel Deter - B Diário. Disponível em: http://terrabrasilis.info/
dashboard/DETER-B#. Acesso em: 11 jan. 2019.
REFERÊNCIA COMPLEMENTAR
606 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
Entendimento dos aspectos condicionantes de processos erosivos em superficies tabulares na região sul do estado de Rondônia
1 Doutoranda do Programa de Pós-graduação Mestrado e Doutorado em Geografia da Fundação Universidade Federal de Rondônia.
E-mail: fonsecaelaine@gmail.com.
2 Prof. do Programa de Pós-graduação Mestrado e Doutorado em Geografia da Fundação Universidade Federal de Rondônia. E-mail:
eliomarfilho@uol.com.br.
3 Engenheiro Agrônomo. Especialista em geoprocessamento do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Mato Grosso.
E-mail: wilker_kaio93@hotmail.com.
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 607
Elaine Lima da Fonseca • Eliomar Pereira da Silva Filho •Wilker Kaio dos Santos Nogueira
ABSTRACT: Knowledge of the landscapes and attributes that determine the emergence
and evolution of erosive processes involves aspects of a complex interrelationship between
lithology, structure, soil, and vegetation cover under the constant action of man as the
elimination of natural coverage and poor conduct of agricultural activities. The objective
of this work is to make use of the evaluation of the natural aspects such as lithology,
geomorphology, pedology, vegetation cover, and topography, to understanding the factors
determining the occurrence and evolution of soil loss in erosive processes. The study
area consisted of the analysis of one erosion with 63.75 m in length, 13.91 m in width,
and 4 m in depth, located in Colorado do Oeste / RO. Was detected high susceptibility to
the erosive processes due to genesis, the natural aspects, and the anthropic aspects. The
geology is marked by blocks and boulders of fresh rock under structural lines, favoring
loss of soil; the geomorphology presents convex surfaces that favor the accumulated
surface flow; the pedology classified as Neosol has textural characteristics that favor the
erodibility to the soil, and deficient vegetation cover under steep slopes promotes the
evolution of soil erosion when exposed to high rainfall indexes.
INTRODUÇÃO
O estudo integrado dos elementos que compõem o meio físico é eficaz para elucidação
dos processos que desencadeiam a erosão. Fatores como a geologia, geomorfologia,
pedologia e cobertura vegetal agem dialeticamente e são interdependentes, apresentando
troca constante de energia e matéria. Essa concepção sistêmica parte do pressuposto
de que as trocas energéticas e materiais acontecem em relações de equilíbrio, mas que
a intervenção antrópica em qualquer nível altera esse estado de equilíbrio e provoca
desajustes transitórios ou permanentes.
A análise integrada dos processos erosivos acelerados é a produção do conhecimento
da paisagem e dos atributos relevantes que determinam os fatores que favorecem o
surgimento e evolução erosional que, em geral, agregam uma complexa inter-relação
entre litologia, estrutura, solo e cobertura vegetal sob a ação constante do homem.
Evidenciando, assim, a importância de conhecer o papel de cada componente, uma vez
que cada unidade apresenta certo grau de influência sobre as demais, e que o conjunto de
fatores respondem pela conformação da paisagem observada.
Segundo Avila (2009), o estudo integrado dos elementos que compõem o meio
físico é essencial na determinação das projeções de aumento da perda de solo, logo, o
entendimento do mecanismo desencadeantes do processo não é simples, envolve o
conhecimento de muitas variáveis e exige visão sistêmica do fenômeno.
A partir dos apontamentos elencados, o presente estudo pretende investigar a
relação entre as condições de evolução da erosão e as características do meio físico,
a fim de entender a atuação dos processos litológicos, geomorfológicos, pedológicos e
topográficos associados à cobertura vegetal e à ação do homem no desencadeamento da
erosão acelerada no município de Colorado do Oeste/RO.
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Entendimento dos aspectos condicionantes de processos erosivos em superficies tabulares na região sul do estado de Rondônia
MATERIAL E MÉTODOS
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Elaine Lima da Fonseca • Eliomar Pereira da Silva Filho •Wilker Kaio dos Santos Nogueira
RESULTADO E DISCUSSÃO
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Entendimento dos aspectos condicionantes de processos erosivos em superficies tabulares na região sul do estado de Rondônia
Figura 3. A - Presença de formação florestal após o terço final que auxilia a reter o sedimento no canal;
B - Piping na região da cabeceira.
De acordo com Augustin e Aranha (2006), a perda de solo indica que a água de escoamento
inicia seu trabalho de retirada e transporte de material, antes mesmo de atingir as bordas das voçorocas,
carreando material de fora para dentro, e após atingir as bordas, o poder erosivo do escoamento
aumentado pelo material mais grosso em transporte acarreta na retirada do solo nas paredes e cabeceira.
Em sentido semelhante, Rocha (2007) assevera que o surgimento de voçorocas está ligado
à formação de escoamento superficial concentrado e à atuação da água subterrânea; esta provoca a
intensificação do processo erosivo, favorecendo o desenvolvimento de mecanismos como a erosão interna
pelo destaque e transporte de partículas; e aquela promove o arraste na superfície do voçorocamento.
Bacarro (1999), Alves (2005) e Castro (2011) observaram ainda, que o escoamento
subsuperficial tem papel extremamente importante na preparação de condições
hidrodinâmicas favoráveis à ocorrência de processos erosivos, em especial, no surgimento
e evolução de voçorocas, e que o desmatamento e a adoção de pastagens em solos arenosos
propiciam elevadas taxas de infiltração e fortalece o piping.
No âmbito da geomorfologia a unidade no voçorocamento foi classificada como
Superfícies Tabulares em rochas vulcosedimentares. Caracteriza-se pela formação de
colinas amplas e médias com topos aplanados ou levemente convexizados (Figura 4).
Os relevos tabuliformes são vinculados a camadas sedimentares horizontais ou sub-
horizontais. A sequência de eventos para a construção de relevos tabuliformes foi descrito por
Casseti (1994) e estão associados: à organização do sistema hidrográfico devido ao clima mais
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Elaine Lima da Fonseca • Eliomar Pereira da Silva Filho •Wilker Kaio dos Santos Nogueira
úmido e à orientação do sistema fluvial de acordo com a orientação topográfica ligada ao processo
de pediplanação; aos esforços epirogenéticos que influenciam a drenagem a entalhar o talvegue,
implicando na elaboração dos vales pela possibilidade de alternâncias litológicas; e a alternância
de clima úmido para clima seco, que leva ao processo de denudação do modelado.
As vertentes possuem formas convexas desgastadas pela erosão laminar que remove
o sedimento e o deposita no interior da voçoroca. O processo ocorre de forma similar em
todas as vertentes pois há homogeneização na condição vegetativa da pastagem e não foi
verificado a existência sulcos erosivos nas encostas.
Carrijo e Bacarro (2000) afirmam que as vertentes convexas são caracterizadas por uma área
de concentração de águas pluviais. Nessas áreas, devido à declividade mais acentuada, começam a
surgir mais ravinas e voçorocas. Como essas vertentes são longas o escoamento superficial torna-se
mais concentrado, facilitando o desenvolvimento de processos de erosão acelerada.
A área apresenta relevo ondulado com declividade entre 8 - 20% (CPRM, 2010). A voçoroca
recebe fluxos superficiais com mais intensidade na lateral esquerda no sentido Norte-Sul, cuja cota
mais elevada encontra-se distante 138 metros e 10,06° de inclinação em relação à borda (Figura
5). A declividade associada ao comprimento de rampa confere maior fragilidade ao ambiente em
função da velocidade de escoamento aliada ao tamanho e à quantidade do material em suspensão.
Segundo Silveira, Fiori e Oka-Fiori (2005), a inclinação da vertente tem relação com a
erosividade e os movimentos de massa, pois a energia cinética resultante da energia potencial
das águas pluviais é diretamente proporcional à declividade e atua na esculturação do relevo.
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Entendimento dos aspectos condicionantes de processos erosivos em superficies tabulares na região sul do estado de Rondônia
Figura 6. Fotos da litologia da parede na incisão erosiva (A) e matacões graníticos próximo a voçoroca (B)
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Elaine Lima da Fonseca • Eliomar Pereira da Silva Filho •Wilker Kaio dos Santos Nogueira
Fonte: CPRM
Figura 7. Disposição dos lineamentos estruturais em Colorado do Oeste.
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Entendimento dos aspectos condicionantes de processos erosivos em superficies tabulares na região sul do estado de Rondônia
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 615
Elaine Lima da Fonseca • Eliomar Pereira da Silva Filho •Wilker Kaio dos Santos Nogueira
CONCLUSÃO
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Entendimento dos aspectos condicionantes de processos erosivos em superficies tabulares na região sul do estado de Rondônia
REFERÊNCIAS
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Elaine Lima da Fonseca • Eliomar Pereira da Silva Filho •Wilker Kaio dos Santos Nogueira
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Impacto da cafeicultura no uso e ocupação do solo da bacia do rio Ribeirão Cacau – RO
1 Mestranda em Gestão e Regulação de Recursos Hídricos – ProfÁgua no polo da Universidade Federal de Rondônia (UNIR), pelo
Departamento de Engenharia Ambiental (DEA), Professora Geografia da Secretaria de Educação do Estado de Rondônia (SEDUC-
RO). E-mail: famegan@hotmail.com.
2 Docente do Mestrado em Gestão e Regulação de Recursos Hídricos – ProfÁgua no polo da Universidade Federal de Rondônia
(UNIR), pelo Departamento de Engenharia Ambiental (DEA), Professora da Universidade Federal de Rondônia (UNIR) no
Departamento de Ciências Humanas e Sociais (DCHS) no Campus de Ji-Paraná/RO. E-mail: patrícia@unir.br.
Agradecimentos:
O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal Nível Superior - Brasil (CAPES) - Código
de Financiamento 001, agradecemos também ao Programa de Mestrado Profissional em Rede Nacional em Gestão e Regulação de
Recursos Hídricos - ProfÁgua, Projeto CAPES/ANA AUXPE Nº. 2717/2015, pelo apoio técnico científico aportado até o momento.
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Fabrícia Martins Silva • Patrícia Soares de Maria de Medeiros
ABSTRACT: This study sought to conduct a survey of land use and occupation in the
Ribeirão Cacau river basin (in the municipality of Alvorada D’Oeste, Rondônia) in a
temporal analysis through aerial images in the years 2008 and 2019 with the Landsat-5
TM (Thematic Mapper) and Landsat-8 OLI (Operational Land Imager) satellites, with
the aim of providing subsidies for better water management in the area concerned.
For the processing of the images, the software ArcGIS Pro version 10.7.1 was used
with the supervised classification technique, using the maximum likelihood algorithm
(MAXVER). As a result, it was found that there was an expansion of agriculture and
livestock, resulting in the replacement of native vegetation by pastures, coffee farms,
and other economic activities developed in this area, with a growth of about 10% of
pastures and 2.6% of coffee farms, while native vegetation decreased by 28.4%. Thus, it
is essential to rethink the agricultural practices applied in the region and point out which
measures can be formulated to employ more sustainable actions in the watershed.
INTRODUÇÃO
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Impacto da cafeicultura no uso e ocupação do solo da bacia do rio Ribeirão Cacau – RO
produção cafeeira, por meio dos novos plantios de café clonal, responsável por aumentar
a produtividade em 99,8% (ROSA NETTO, 2016). Com uma produção entre 2,34 e
2,39 milhões de sacas, há expectativa de aumento da área em produção e de aumento da
produtividade média em 2020, que deverá alcançar produção entre 6,6% e 8,7% maior
que àquela apresentada no ano de 2019 (CONAB, 2020).
Não obstante, o Estado de Rondônia destaque-se como importante produtor de café,
apesar da cultura ainda ser baixa, com cerca de 17,18 sacas/ha, quando comparada com a
do Espírito Santo, que também cultiva café canéfora, porém apresenta produtividade de
35,14 sacas/ha, e com a média nacional, de 29,54 sacas/há (MARCOLAN et al., 2015).
Mesmo com a baixa produtividade, tem ocorrido a gradativa substituição das lavouras
antigas (com sementes e baixo padrão tecnológico), por café clonal, gerando a renovação
do material genético e aceleração na produtividade (CONAB, 2020).
Nota- se que desde 1970, com uma política governamental de incentivo a ocupação
da Amazônia e intensificação no estado do avanço da agropecuária, ocasionou diversos
problemas ambientais. De acordo com Clark e Tilman (2017), a expansão agrícola é uma
das principais causas de degradação ambiental: emite gases de efeito estufa, ocupa 40%
das terras da superfície terrestre, impulsiona o desmatamento e a perda de biodiversidade,
além de consumir 70% da água doce retirada no mundo. De acordo com Góes et al.
(2019), a Revolução Verde trouxe avanços produtivos para a agricultura, porém, também
acarretou perdas para o setor ambiental, pois desencadeou problemas como: desmatamento
de grandes áreas; contaminação dos recursos naturais devido a aplicação de produtos
químicos e; esgotamento do solo. Desse modo, a partir da área de estudo escolhida para
a presente pesquisa, serão abordadas temáticas ambientais relacionadas à agricultura
cafeeira, quais sejam o desgaste hídrico e o desflorestamento.
A Lei Federal 9.433/1997 (BRASIL, 1997), em seu artigo 1º, no inciso V, dispõe sobre
a Política Nacional de Recursos Hídricos (PNRH) e institui as bacias hidrográficas como
unidades físico-territoriais para o planejamento ambiental. Para o seu diagnóstico, devem ser
considerados os aspectos ambientais, políticos, culturais e socioeconômicos de cada região
hidrográfica, reconhecendo assim as singularidades e estratégias de gestão na bacia.
Em detrimento das ações antrópicas é necessário utilizar a análise e interpretação das
imagens de satélite de alta resolução espacial como ferramenta para o monitoramento das
transformações ambientais, de forma a servir de apoio à tomada de decisões e possibilitar
alternativas inteligentes para um melhor planejamento ambiental (POLLO et al.,2019).
Desta maneira, as geotecnologias são utilizadas para a análise de uso e ocupação do
solo de uma bacia hidrográfica. Segundo Barbosa et al. (2018), o Sistema de Informação
Geográfica (SIG) permite quantificar as particularidades da paisagem e, incorporado ao
Sensoriamento Remoto, possibilita analisar o ambiente físico por meio de um banco de
dados georreferenciados em diferentes escalas e datas. Segundo Campos et al. (2016), a
geotecnologia permite identificar a dinâmica do uso do solo e, por conseguinte, implica
em mudanças de aspectos socioeconômicos de determinadas regiões, viabilizando o seu
monitoramento ambiental. Esta realidade propicia o aprimoramento técnico, de forma a
melhorar a qualidade dos dados para compreensão do estado atual do meio, o que resulta
no aperfeiçoamento de estratégias de gestão dos recursos naturais.
Portanto, a presente pesquisa buscou realizar um levantamento do uso e da ocupação
do solo na microbacia do rio Ribeirão Cacau, no município de Alvorada D’Oeste, em
Rondônia, numa análise temporal, por meio de fotografias aéreas dos anos de 2008 e
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Fabrícia Martins Silva • Patrícia Soares de Maria de Medeiros
MATERIAL E MÉTODOS
Área de estudo
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Impacto da cafeicultura no uso e ocupação do solo da bacia do rio Ribeirão Cacau – RO
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Fabrícia Martins Silva • Patrícia Soares de Maria de Medeiros
estatísticos. Este método parte do princípio que o usuário conhece o suficiente da imagem a
ser classificada para poder definir classes que sejam representativas (CROSTA, 1992).
Ademais, ao realizar a classificação das imagens foram selecionadas algumas áreas
de treinamento para cada classe no software e fornecidas ao classificador para caracterização
individual das classes temáticas a serem representadas. Desta maneira, foram definidas quatro
classes predominantes na área de estudo: vegetação nativa, cafeicultura, pastagem e área urbana.
Após a classificação das imagens referentes aos períodos de análise, foram
estruturados mapas temáticos para identificar as alterações que ocorreram nas classes
preponderantes ao longo dos anos, possibilitando, assim, visualizar a dinâmica de
cobertura vegetal ocorrida no decorrer do processo de ocupação da área em questão.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Após o mapeamento das áreas de uso e ocupação do solo na microbacia do rio Ribeirão
Cacau, por meio de fotografias aéreas do ano de 2008, foram geradas quatro classes de uso
preponderantes: vegetação nativa, cafeicultura, pastagem e área urbana (Figura 2).
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Impacto da cafeicultura no uso e ocupação do solo da bacia do rio Ribeirão Cacau – RO
Quadro 1. Distribuição das áreas e porcentagens de uso e ocupação do solo na microbacia do rio Ribeirão
Cacau, Rondônia, em 2008
ÁREA
USOS
(ha) (%)
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Fabrícia Martins Silva • Patrícia Soares de Maria de Medeiros
Em detrimento da anistia gerada até 2008 aos produtores rurais pela promulgação no novo
código florestal, justifica-se a escolha deste ano como parâmetro para discussão da expansão da
agropecuária na referida microbacia, identificando-se mudanças ocorridas até o ano de 2019.
Salienta-se que Rondônia, localizada na região oeste da Amazônia, apresenta um
elevado índice de desmatamento ao longo de sua história. Como relatam Da Silva et al.
(2018), o desflorestamento espalhou-se a partir dos eixos de desenvolvimento definidos
nos anos 70 até a década de 90, impulsionado principalmente pela expansão da fronteira
agrícola, iniciada por incentivo do governo federal no período militar. De acordo com
Jusys (2018), muitos camponeses brasileiros ganharam terras nesta área, limpando
florestas para ceder lugar à agropecuária. Segundo Morton et al. (2006), as pastagens
continuam sendo o uso dominante da terra após o desmatamento na região amazônica,
mas tem ocorrido uma rápida conversão de floresta em área agrícola, o que define um
novo paradigma de perda da floresta em refuta à alegação que a intensificação agrícola não
leva a novos desmatamentos. Esse contexto histórico resultou na expansão da fronteira
agropecuária e gerou diversos problemas de cunho ambiental e social.
Como consequência do avanço da agropecuária na microbacia, pode-se observar
que apenas 23,7% da área correspondem à vegetação nativa. Deve ser frisado que, de
acordo com o novo código florestal, por meio da Lei 12.651, de 25 de maio de 2012
(BRASIL, 2012), em seu Artigo 12, “todo imóvel rural na área de floresta deve manter
uma área de 80% com cobertura de vegetação nativa, a título de Reserva Legal”.
Os dados adquiridos demonstram que em 2008 já havia um forte uso e ocupação do
solo na microbacia do rio Ribeirão Cacau, identificando-se a devastação da vegetação nativa
que cedeu lugar à pastagem e cultivo de café, bem como à urbanização, em menor proporção.
Assim, o desflorestamento é um fator que interfere profundamente no regime
hídrico de uma bacia hidrográfica. Como indicado por Sumila et al. (2017), compreender a
dinâmica do desmatamento na Amazônia é importante para preservar não apenas o clima,
mas também as atividades econômicas que dependem dele, em particular a produtividade
agrícola e a geração de energia hidrelétrica. O desmatamento pode reduzir a precipitação,
levando a efeitos negativos sobre o rendimento da agricultura (ibid.).
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Impacto da cafeicultura no uso e ocupação do solo da bacia do rio Ribeirão Cacau – RO
Quadro 2. Distribuição das áreas e porcentagens de uso e ocupação do solo na microbacia do rio Ribeirão
Cacau, Rondônia, comparativo entre 2008 e 2019
ÁREA
USOS 2008 2019 Crescimento
(ha) (%) (ha) (%) (ha)
Pastagem 20.303,28 73,6 22.121,44 80,2 1.818,16
Cafeicultura 391,33 1,4 401,85 1,5 10,52
Área Urbana 342,19 1,2 376,89 1,3 34,7
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Fabrícia Martins Silva • Patrícia Soares de Maria de Medeiros
Fonte: Elaborada a partir de dados fornecidos pelo IBGE (2019) para o mapeamento da microbacia do rio
Ribeirão Cacau.
Figura 4. Comparativo das classes de usos preponderantes na microbacia do rio Ribeirão Cacau – RO
entre os anos de 2008 e 2019.
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Impacto da cafeicultura no uso e ocupação do solo da bacia do rio Ribeirão Cacau – RO
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Fabrícia Martins Silva • Patrícia Soares de Maria de Medeiros
Além disso, entre os anos de 2008 e 2019 pode-se também identificar, por meio
da análise das Figuras 3 e 4, que as propriedades produtoras de café atingiram diferentes
áreas de expansão territorial. Ao longo desta década, houve a substituição de boa parte do
café seminal - também conhecido como sequeiro, produzido de forma tradicional, sem
o uso da irrigação, pelo café clonal. De acordo com Rosa Neto (2018), a partir de 2011,
verifica-se a diminuição gradativa de plantios antigos de café no estado, de propagação
seminal, substituídos por plantios de variedade clonais, mais produtivas. Esse último,
devido à necessidade de suplementação hídrica no período de estiagem atraiu a produção
cafeeira para próximo das nascentes da bacia do rio Ribeirão Cacau, o que gera uma
preocupação no tangente ao uso desenfreado dos recursos hídricos na área em questão.
Como afirmam Covre et al. (2016), é necessário que haja o suprimento adequado de água
ao cafeeiro para eliminar os estágios críticos do cultivo devido à deficiência de água, de
maneira que a irrigação tem sido usada para aumentar a produtividade.
Considerando-se o fato de que a irrigação é um dos requisitos que mais influencia
na produção das culturas, é necessário considerar, no tocante à agricultura irrigada,
três preceitos básicos: quando, como e quanto irrigar. Estes são definidos com base na
capacidade de armazenamento de água no solo e consumo de água pelas plantas (ROCHA
NETO et al., 2015). Em seus estudos comparativos sobre os níveis de irrigação em mudas
de café Conilon, Dardengo et al. (2018) concluíram que a produtividade do café irrigado,
em comparação com o de sequeiro, obteve um aumento significativo de 162%, enquanto
o consumo médio de água em plantas irrigadas foi de 7,9 m³ e em sequeiro de 4,95 m³.
Segundo Dardengo et al. (2018), o consumo de água observado para o café Conilon
está relacionado ao ciclo fenológico, idade, precipitação, além do manejo de irrigação.
Portanto, o quantitativo de água necessária para cada produção varia muito, embora existam
vários estudos com áreas experimentais que quantificam essa demanda. Covre et al. (2016)
observaram em sua pesquisa rendimentos médios de 22,7 e 22,0 L por planta cafeeira
nos tratamentos irrigado e não irrigado, respectivamente. Entretanto, as plantas irrigadas
produziram 86,3% a mais de café que as plantas não irrigadas, resultando em valores de 16,1
e 8,6 L por planta, respectivamente. Outrossim, Dardengo et al. (2018) observaram em seus
estudos que o consumo médio de água dos clones de café Conilon durante a fase produtiva,
mantendo o balanço hídrico do solo por irrigação, foi de 8,22 m³, o que corresponde a 6,58
m³ de água por kg de café beneficiado, enquanto que o consumo de sequeiro foi de 5,0 m³
de água/kg, o que representa uma maior demanda hídrica para a variedade clonal.
No tocante ao uso dos recursos hídricos pela atividade agropecuária, pode-se adotar
para um estudo comparativo a pegada hídrica, que é a quantidade de água consumida para
se produzir direta e indiretamente um produto. Em seus estudos, Palhares, Morelli e Costa
Junior (2017) identificaram uma pegada hídrica média da carne bovina de 5.814 L/kg de
animal em áreas de confinamento, para o desenvolvimento de toda a cadeia de produção.
De acordo com Da Silva et al. (2016), a carne bovina é a commoditie brasileira que mais
contribui para a pegada hídrica (21%), de maneira que a pegada hídrica média do consumo
brasileiro de produtos agrícolas é de 1.619 m³/pessoa/ano. Por conseguinte, Hoekstra
e Chapagain (2011) indicam que a pegada hídrica do café é de 140 litros por xícara, de
maneira que a maior parte do volume de água consumido se deve ao cultivo da planta.
De acordo com Loose et al. (2019), a cafeicultura é uma cultura permanente que tem
se expandido em Rondônia, de maneira que esta é a fonte de renda principal para a maioria
dos cafeicultores, a qual movimenta a economia regional. Diante dos dados apresentados,
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Impacto da cafeicultura no uso e ocupação do solo da bacia do rio Ribeirão Cacau – RO
CONCLUSÃO
REFERÊNCIAS
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LOOSE, C. E.; SANDRI, E. A.; PIACENTINI, M. T. S.; PIACENTINI, A. L. S.; CRISTINA,
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 633
Fabrícia Martins Silva • Patrícia Soares de Maria de Medeiros
634 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
Gerenciamento de resíduos sólidos urbanos na fronteira franco-brasileira: impactos socioambientais
RESUMO: Este artigo teve como objetivo analisar o gerenciamento dos resíduos
sólidos urbanos na cidade de Oiapoque, além de descrever os impactos socioambientais
decorrente de seu mau acondicionamento. Para a realização deste estudo, foi necessário
fazer o levantamento bibliográfico do tema em sites, artigos, livros e dissertações, além
de obter informações no Departamento de Limpeza Pública de Oiapoque e na Secretaria
Municipal de Saúde. Foi realizada visita in loco em três bairros da cidade para a aplicação
de questionários com o objetivo de verificar a visão dos moradores sobre os impactos
socioambientais dos resíduos sólidos. Para isso, foi necessário o uso de transporte terrestre
para o deslocamento, mapa da área urbana, questionários, prancheta e máquina fotográfica.
O resultado demonstrou que Oiapoque realiza o gerenciamento dos resíduos sólidos urbanos,
porém de forma ineficiente. É importante inserir a Educação Ambiental junto à comunidade
com o intuito de sensibilizá-las, pois demonstrou que algumas doenças que afetam a saúde
dos moradores são decorrentes do mau acondicionamento dos resíduos sólidos.
ABSTRACT: The present article objectifies the analysis of the urban solid residues
management in the city of Oiapoque, besides the description of socio-environmental
impacts from its inadequate packaging. To accomplish the study, it ought to be necessary
to perform a bibliographical survey of the topic from sites, articles, books and essays,
besides obtaining information at the City Public Cleansing Department and Health System.
It was performed an in loco view in three districts of the city in order to make the survey
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Francinete Viana da Silva Corrêa • Valmir Corrêa e Corrêa • José Mauro Palhares
INTRODUÇÃO
No mundo moderno, a produção de resíduos sólidos a cada dia vem aumentando em uma
escala exagerada, exigindo soluções do poder público em conjunto com a sociedade civil, soluções
para resolver tal problema. Esse aumento na geração dos resíduos sólidos urbanos (RSU) é cada
vez mais preocupante, devido à falta de políticas públicas voltadas ao crescimento populacional.
O gerenciamento inadequado dos resíduos sólidos (RS) desde sua geração até a destinação
final pode provocar vários problemas ambientais e humanos. A acumulação de resíduos gera
poluição no solo, na água, no ar e atrai animais transmissores de doenças prejudicando a saúde
humana. O controle na geração, no armazenamento e na destinação final dos resíduos sólidos
é considerado um dos maiores problemas enfrentados pela gestão pública.
Nas pequenas cidades, como é o caso de Oiapoque/AP, o número de resíduos não é muito
grande, entretanto como em qualquer outro local precisa de atenção em relação ao seu tratamento
e em especial na sua destinação final para não expor a população e o meio ambiente ao risco.
Nesse contexto, um dos desafios enfrentado em Oiapoque está relacionado com
a destinação final dos resíduos produzidos na cidade, que são cada vez mais amplos e
complexos de resolver, pois há necessidade de melhorar as formas de armazenagem e de
depósito final dos resíduos, e a solução seria a construção de um aterro sanitário. Por outro
lado, é preciso sensibilizar a população a mudar seus hábitos de consumo, despertando
nela o interesse sobre as ações que podem ajudar na melhoria dos processos relacionados
aos RSU, a exemplo a coleta seletiva.
Outra maneira de sensibilizar a comunidade é realizando constantemente campanhas
educativa em combate às doenças decorrentes do mau acondicionamento dos resíduos
sólidos urbanos, a distribuição de cartilhas contendo informações de como armazenar
os resíduos adequadamente. Essas ações resolveriam parte dos problemas visíveis na
maioria dos bairros da cidade de Oiapoque.
Assim, este artigo visa mostrar como é realizado o gerenciamento dos resíduos sólidos
urbanos na cidade de Oiapoque, e caracterizar os principais impactos socioambientais decorrentes
do seu mau acondicionamento em três bairros da cidade de Oiapoque Centro, Paraíso e Russo.
No Brasil o Saneamento Básico teve início a partir do século XIX com a chegada da
Família Real Portuguesa, e com isso começou a surgir a urbanização e houve a necessidade de
abastecimento de água. Além da urbanização, as primeiras degradações ambientais apareceram,
devido à inexistência de investimentos em saneamento básico (SOUZA et al., 2010).
636 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
Gerenciamento de resíduos sólidos urbanos na fronteira franco-brasileira: impactos socioambientais
Segundo Cavinatto (1992), com a chegada do colonizador e dos negros ao Brasil, houve
a disseminação de várias doenças, visto que os nativos não possuíam defesas naturais no
organismo contra as moléstias. Esse episódio foi o responsável pelas preocupações sanitárias
em relação à limpeza de ruas e quintais, e para isso foram construídos chafarizes em praças
públicas para a distribuição de água à população, transportada em recipientes pelos escravos.
Até a década de 1930, as redes de abastecimento de água e de esgoto sanitário cobriam
apenas os centros urbanos. Em 1940, todas as capitais brasileiras possuíam sistemas de distribuição
de água e coleta de esgoto. A concentração urbana dos anos 1950 agravou os conflitos sociais,
aumentou a pobreza que deteriorou a qualidade de vida (SOUZA et al., 2010).
O investimento em saneamento básico no Brasil ocorreu nas décadas de 1950 a 1980,
pois nesse período existia o “predomínio da visão de que os avanços nas áreas de abastecimento
de água e de esgotamento sanitário nos países em desenvolvimento resultariam na redução das
taxas de mortalidade” (SOARES, BERNARDES; CORDEIRO NETTO, 2002).
Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS, 2004), para cada R$ 1,00 real
investido em saneamento, são economizados R$ 4,00 reais com saúde pública; sem essa
infraestrutura acabam morrendo por ano 1,6 milhão de crianças em todo o mundo devido
à diarreia causada por condições inadequadas de saneamento básico e higiene.
Quando o saneamento básico funciona em algumas cidades, esse serviço é considerado
especial, pois a maior parte da população brasileira não possui acesso à coleta adequada de
resíduos sólidos e líquidos, os quais são responsáveis pela contaminação do meio ambiente
e expõem a população ao contato direto com diversas doenças (SOUZA, et al., 2010).
Cavinatto (1992), ressalta que dentro das principais atividades de saneamento
básico estão a coleta e o tratamento de resíduos resultantes das atividades humanas, tanto
sólidos quanto líquidos (lixo e esgoto), a prevenção contra a poluição das águas de rios,
mares e outros mananciais, a garantia de qualidade da água utilizada pelas populações
para consumo, bem como seu fornecimento de qualidade, além do controle de vetores.
Portanto, saneamento básico é fundamental na prevenção de doenças. Além disso, a
limpeza dos ambientes, evitando jogar resíduos sólidos em locais inadequados, por exemplo,
também evita a proliferação de animais responsáveis pela disseminação de algumas moléstias.
Com a aprovação da Lei nº 12.305/10, houve uma forte articulação institucional
envolvendo os três entes federados à União, Estados e Municípios, além do setor produtivo
e a sociedade, todos juntos em busca de soluções para resolver os problemas graves e de
grande abrangência territorial que comprometem a saúde dos brasileiros.
Cabe à União, por intermédio da Coordenação do Ministério do Meio Ambiente,
no âmbito do Comitê Interministerial, elaborar o Plano Nacional de Resíduos Sólidos
num amplo processo de mobilização e participação social. O Plano Nacional de Resíduos
Sólidos tem vigência por prazo indeterminado e horizonte de 20 (vinte) anos, com
atualização a cada 04 (quatro) anos conforme descrito nos incisos I ao XI do Artigo 15 da
Lei 12.305/2010 (BRASIL, 2010).
De acordo com o Plano de Gestão de Resíduos Sólidos (PGRS, 2014) o manejo
inadequado de RS pode causar inúmeros impactos socioambientais negativos, tais como:
degradação e contaminação do solo, poluição da água e proliferação de vetores. Para evitar a
disposição inadequada de resíduos sólidos ao meio ambiente e que os mesmos não venham
causar perigo à saúde humana, a ABNT, pensando na colaboração da sociedade com as
questões ambientais, elaborou com base nas características de cada resíduo e classificou-os
de acordo com seus riscos e periculosidade ao meio ambiente e à saúde pública.
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 637
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Gerenciamento de resíduos sólidos urbanos na fronteira franco-brasileira: impactos socioambientais
METODOLOGIA
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com construção de mapas, gráficos e tabelas no programa Microsoft Office Excel 2013. Os materiais
utilizados foram: máquina fotográfica, prancheta, questionário, mapa e transporte terrestre.
Os principais rios do município são: Rio Oiapoque, Uaçá e Cassiporé (IBGE, 2010).
Oiapoque possui clima quente úmido e temperatura média anual mínima de 22°C e máxima
de 33°C, a pluviometria local é descrita da seguinte forma: estação definida de chuvas entre
os meses de dezembro a agosto, e estação de seca entre os meses de setembro a novembro,
com precipitação anual acima de 3.000mm (IBGE, 2010). De acordo com o Plano de
Saneamento Básico do Município – PMSB (OIAPOQUE, 2015), área urbana de Oiapoque
é composta por 10 bairros sendo eles: Centro, Fazendinha/Universidade, Florestal, FM,
Nova União, Paraíso, Planalto, Russo, Nova Esperança e Infraero/Quilombola.
Dentre esses bairros foram selecionados apenas três para a aplicação dos
questionários Centro, Paraíso e Russo (Destacado no Mapa 1), visto que os mesmos
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Gerenciamento de resíduos sólidos urbanos na fronteira franco-brasileira: impactos socioambientais
RESULTADO E DISCUSSÃO
Cada sociedade produz um tipo de resíduo, isto é, uma mistura de materiais que varia
de acordo com seus hábitos e costumes, além das influências das atividades econômicas
que mudam ao longo do tempo.
De acordo com Vilhena e D’Almeida (2002), o gerenciamento municipal dos RSU é
um conjunto que envolve articulações de ações normativas, operacionais, financeiras e de
planejamento, na qual a administração pública deve desenvolver para coletar, segregar, tratar e
dispor o resíduo de sua cidade em um local, sem gerar prejuízos ao meio ambiente e à população.
A cidade de Oiapoque em 2015 produzia aproximadamente 12 toneladas de resíduos
sólidos diariamente (comercial, urbano, doméstico, entulhos) (FERREIRA; SILVA;
FERREIRA, 2015), haja vista que, essa quantidade só vem aumentando, tornando-se um dos
principais problemas enfrentados pela gestão pública que necessita de atenção redobrada em
especial à destinação final dos RSU, pois os mesmos vêm causando inquietação na população.
O crescimento populacional ocorrido nas últimas décadas na cidade de Oiapoque
ocasionou o aumento na produção de resíduos, pois a cidade não está preparada com
infraestrutura adequada para acompanhar esse processo, pois os governantes municipais
não pensaram na implementação de políticas públicas voltadas ao crescimento
populacional. Esse problema é visto na questão da destinação dos resíduos sólidos, os
quais são depositados em um lixão a céu aberto. Oiapoque apresenta uma população de
aproximadamente 27.270 habitantes segundo as estimativas do IBGE, 2019. E, portanto,
é necessário pensar em políticas voltadas a construção de um aterro sanitário para suprir
a necessidade da população e amenizar os impactos ambientais.
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Até 2016, o município de Oiapoque não tinha políticas públicas voltadas ao manejo
e destinação final dos RSU. A partir do ano de 2017, com a nova gestão municipal, foi dada
continuidade ao Plano Municipal de Saneamento Básico que ainda está em fase de elaboração.
Um dos objetivos desse Plano é promover o acesso universal aos serviços de
saneamento básico como a integralidade, regularidade e qualidade de vida a toda população
por meio da saúde e do meio ambiente (OIAPOQUE, 2015). As ações expostas no plano
vêm contribuir para amenizar os problemas, especialmente dos resíduos sólidos urbanos,
dando oportunidade de acesso às ações sanitárias, que é prioridade pública no momento.
Atualmente (ano 2018), vem sendo debatido por meio de audiências públicas sobre
a questão do lixão a céu aberto da cidade, pois o mesmo vem causando preocupação por
parte da população e dos governantes locais. Essa questão é uma problemática que o
município de Oiapoque vem tentando resolver há muito tempo. O lixão recebe todos os
tipos de resíduos produzidos na cidade exceto o resíduo hospitalar.
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Gerenciamento de resíduos sólidos urbanos na fronteira franco-brasileira: impactos socioambientais
Coleta
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Transporte
O transporte de RSU é executado por dois (2) caminhões compactadores que suportam
aproximadamente 10 toneladas de resíduos por carrada, e cada veículo conta com três
funcionários sendo um motorista e dois garis responsáveis pelo recolhimento do material
na área urbana. Vale ressaltar que os resíduos coletados pelo carro coletor são destinados
diretamente ao lixão a céu aberto localizado a três quilômetros da cidade nas proximidades
da estrada que liga a cidade de Oiapoque ao Distrito de Clevelândia do Norte.
O Lixão ou vazadouro a céu aberto foi a solução encontrada por gestores públicos como
a melhor forma de fazer a destinação final dos resíduos sólidos urbanos. O único critério
adotado em alguns anos atrás era somente a escolha de um local adequado para a disposição
final dos resíduos, além de levar em consideração a distância dos centros urbanos para não
causar impactos negativos para a população, mas esses critérios deixaram de existir, visto que
em dias atuais é necessária a construção de um aterro sanitário (PRS, 2013).
A área do lixão da cidade de Oiapoque é uma propriedade privada locada à prefeitura
que fica distante aproximadamente 3 km da sede do município. Nesse lixão, é descartado
todo material da coleta diária. É constante ver a presença de catadores que segregam
materiais recicláveis para serem vendidos. Nesse local são depositados todos os tipos
de resíduos (exceto o hospitalar) e por esse motivo o forte odor vem prejudicando a
população em especial dos bairros próximos do lixão como o Russo e o Planalto.
Na tentativa de amenizar esse problema, atualmente os resíduos são colocados em valas
feitas pela Secretaria de Obras, onde são cobertos periodicamente com uma camada de terra ou
queimado pelos catadores, o que acaba prejudicando o trabalho realizado pela gestão municipal.
As características físicas da área são consideradas impróprias para os devidos fins,
pois apresenta declividade no terreno e está situado nas proximidades de uma nascente
e de mata nativa da região. Hoje é destinado para o lixão um número aproximado de 27
toneladas/dia de resíduos. O aumento na geração de resíduos em Oiapoque evidencia a
necessidade e a urgência de uma solução para esse problema, tendo em vista as possíveis
questões ambientais daí decorrentes (DLP, 2017).
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Gerenciamento de resíduos sólidos urbanos na fronteira franco-brasileira: impactos socioambientais
Os problemas mais decorrentes do lixão estão o forte odor que exala na cidade
e na proliferação de animais causadores de doenças, as quais estão relacionadas com
a inexistência do saneamento básico na cidade. A Tabela 2 mostra os números de
doenças que atingiram a população entre os anos de 2014 e 2017, decorrentes do mau
acondicionamento e manejo e destinação final dos resíduos na cidade.
NÚMEROS DE CASOS
AGRAVOS TOTAL
2014 2015 2016 2017
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Francinete Viana da Silva Corrêa • Valmir Corrêa e Corrêa • José Mauro Palhares
possuem ensino superior incompleto, 13 com ensino médio completo, 7 com ensino médio
incompleto, 10 com ensino fundamental completo e 26 com ensino fundamental incompleto.
Em relação ao número de pessoas por residências apresentou-se em média 3 a 4 pessoas.
Considerou-se a importância da participação da população em responder acerca
do conhecimento dos resíduos sólidos gerados em suas residências, e que os mesmos,
quando não acondicionados adequadamente, podem contribuir para o aparecimento de
doenças e colocando em risco a saúde de seus familiares.
No bairro Central, 85% dos moradores afirmaram que a coleta e a limpeza nas ruas
ocorrem diariamente, enquanto que 15% responderam que as coletas são realizadas em
dias alternados. No Bairro Paraíso, 65% dos moradores responderam que o serviço de
coleta acontece em dias alternados, enquanto que 35% dos moradores responderam que a
coleta só ocorre uma vez na semana. No bairro do Russo, 78% das pessoas responderam
que as coletas ocorrem somente em dias alternados, enquanto que 22% das pessoas
responderam que a coleta só acontece uma vez na semana.
Portanto, as informações obtidas pelos moradores demonstram que os serviços realizados pela
prefeitura apresentam falhas, principalmente nos bairros Paraíso e Russo que estão localizados em
áreas de ressaca. De acordo com Portilho (2010), as áreas de ressaca são aquelas que sofrem os efeitos
da ação das marés, por meio da rede formada de canais e igarapés e ciclos sazonais da chuva.
Outra pergunta inclusa no questionário aos moradores foi sobre a destinação final
dos resíduos produzidos em suas residências. O que os moradores faziam com os resíduos
que não eram coletados pelo carro coletor? Vale ressaltar que o bairro do Centro respondeu
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Gerenciamento de resíduos sólidos urbanos na fronteira franco-brasileira: impactos socioambientais
A partir das respostas dos moradores, foi possível observar que muitos ainda não têm
conhecimento dos impactos ambientais que a destinação final dos resíduos não adequada podem
provocar ao meio ambiente, sobretudo na saúde humana, visto que alguns moradores despejam
seus resíduos em nascentes, assim como enterram e/ou depositam em lixeiras viciadas.
A degradação socioambiental urbana é um tipo de degradação ambiental ainda
praticada, isto é, há pouco conhecimento por parte das pessoas. Cabe aos gestores realizar
ações efetivas de educação ambiental para melhorar o conhecimento e a qualidade de vida
urbana. Mucelin e Bellini (2007) destacam que dentre os impactos negativos ao meio
ambiente a maioria é decorrente dos RSU, em especial o domiciliar, resultados da prática
de disposição inadequada de resíduos ao redor de canais, às margens de ruas ou cursos
d’água. Essas práticas podem provocar a contaminação do meio ambiente, além de causar
poluição visual, e assim prejudicar a saúde dos próprios moradores.
Nos três bairros estudos foram observados resíduos espalhados pelo chão e
acondicionados de forma inadequada, muitas vezes as lixeiras são formadas através de
pontos estratégicos que os moradores utilizam para facilitar na hora da coleta. A falta de
conhecimento prejudica as condições estéticas e sanitárias da cidade, além do bem-estar
dos próprios moradores, pois acaba agravando os riscos à saúde pública.
Uma das opções encontrada pelos gestores foi a Lei Orgânica Municipal nº
322/2009- GAB/PMO, que tem como objetivo fiscalizar e multar as pessoas pegas em
flagrante desrespeitando o cumprimento das competências municipais. Porém, há várias
reclamações de moradores quanto ao serviço de limpeza pública: sabe-se que a própria
população deposita resíduos em locais inadequados, atraindo animais como os cachorros,
os ratos, os mosquitos, os urubus, entre outros.
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De acordo com Grippi (2006), a maioria da população não coopera com as questões
ambientais devido à falta de informação. Ainda com o mesmo autor, não pode haver conservação
ambiental sem a educação, pois a mesma constrói no indivíduo e na coletividade uma consciência
de mudança de comportamento de atitude e de hábitos, que visam priorizar o meio ambiente.
Assim, é preciso realizar campanhas educativas para sensibilizar os moradores a conhecer o que
se deve ou não fazer com seus resíduos domésticos sem agredir o meio ambiente.
Impactos socioambientais
A partir das respostas dos moradores em relação à questão dos impactos provocados
ao meio ambiente e à saúde humana decorrentes do mau acondicionamento dos resíduos
sólidos, verificou-se que os entrevistados dos três bairros possuem conhecimento do
perigo. Porém, não realizam de forma adequada os RSU, pois não adianta conhecer
os impactos se não prevenir para que futuramente não venham resultar em problemas.
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Gerenciamento de resíduos sólidos urbanos na fronteira franco-brasileira: impactos socioambientais
Foi perguntado aos entrevistados sobre a destinação final dos resíduos produzidos
em suas residências, onde 84% das pessoas afirmaram que sabiam onde eram depositados e
mencionaram o lixão da cidade, enquanto que 16% das pessoas não tinham conhecimento,
como mostra o Gráfico 4.
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Gerenciamento de resíduos sólidos urbanos na fronteira franco-brasileira: impactos socioambientais
Impactos na saúde
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
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Gerenciamento de resíduos sólidos urbanos na fronteira franco-brasileira: impactos socioambientais
REFERÊNCIAS
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Compartimentação das bacias dos rios Uraricoera e Tacutu, Roraima, com base em parâmetros geomorfométricos do relevo
RESUMO: O presente artigo analisa os aspectos morfométricos das bacias dos rios Uraricoera
e Tacutu, as quais formam o sistema de drenagem do alto rio Branco, principal rio que drena
o Estado de Roraima. A metodologia utilizada foi com base nas análises de parâmetros
geomorfométricos obtidos dos modelos de elevação da SRTM. Os resultados obtidos foram
dados como área, perímetro, comprimento, índice de compacidade, amplitude, comprimento
do canal, sinuosidade, índice de circularidade, densidade de drenagem e rugosidade. A partir
das análises, consideramos o sistema hidrográfico do Uraricoera sendo o principal do alto
rio Branco, cuja drenagem abrange uma área de 49.630 km², com perímetro de 1.525 km, e
comprimento de 499.506 km. A bacia do rio Tacutu possui uma drenagem que abrange 42.528
km², com perímetro de 1.412 km, comprimento de 255.726 km. Os dados em análise nos
permitem uma melhor compreensão da dinâmica hidrogeomorfológica do sistema do alto rio
Branco, que diferentemente das demais regiões amazônicas, nas quais os rios são alóctones
na maioria, em Roraima o sistema de drenagem em grande parte é autóctone. Estes rios
atravessam diferentes unidades morfoestruturais que compõem a região de Roraima, sendo
fundamental a caracterização, compartimentação e análise fisiográfica dessas bacias.
ABSTRACT: This paper analyze the morphometric features of Uraricoera and Tacutu
drainage basin, both drainage basins form the upper Branco river drainage system, main
river of Roraima. The methodology used was based on the analysis of geomorphometric
1 Geógrafa, Laboratório de Métricas da Paisagem. Universidade Federal de Roraima, Departamento de Geografia. E-mail:
tatianesilvaufrr@gmail.com.
2 Professor do Departamento de Geografia, Laboratório de Métricas da Paisagem. Universidade Federal de Roraima. E-mail:
thiago.morato@ufrr.br.
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 655
Tatiane Ferreira da Silva • Thiago Morato de Carvalho
parameters obtained from SRTM elevation models. The results were data geomorphometric
parameters basins, such as area, perimeter length, compactness index range, the channel
length, tortuosity, circularity index drainage density and roughness. The results consider
the hydrographic system of Uraricoera river covers an area of 49,630 km², with a
perimeter of 1.525 km, and length of 499,506 km. The basin of the Takutu river has
a drainage covering the area of 42,528 km², with a perimeter of 1,412 km, length of
255,726 km. The results allows a better understand the hydrogeomorphological dynamics
of the upper Branco system, which unlike the other amazonian regions where rivers are
allochthonous mostly in Roraima the drainage system is largely autochthonous. These
rivers run through the different morphostructural units of Roraima, it is fundamental to
identify, compartmentalization and physiographic analysis of these basins.
INTRODUÇÃO
656 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
Compartimentação das bacias dos rios Uraricoera e Tacutu, Roraima, com base em parâmetros geomorfométricos do relevo
MATERIAIS E MÉTODOS
Área de estudo
A bacia hidrográfica do rio Branco possui uma drenagem abrangendo 187.540 km,
perímetro de 3.253 km, drenando 78% de Roraima, dos quais 12.310 km² são pertencentes
às nascentes na região oeste da Guiana. Considera-se o rio Branco a partir da confluência
dos rios Uraricoera e Tacutu, cerca de 30 km a montante da cidade de Boa Vista, formando
uma planície fluvial de 3.419 km² (CARVALHO, 2015).
No entanto, do ponto de vista geomorfológico, o rio Branco é a extensão do rio
Uraricoera, tendo como afluente, na margem esquerda, o rio Tacutu. De acordo com
critérios geomorfológicos, como largura da planície de inundação, largura do canal e
fluxo (vazão), tornam o rio Uraricoera mais expressivo que o Tacutu, sendo que estes
dois sistemas formam a alta bacia hidrográfica do rio Branco, com uma área de 92.622
km² (Figura 1), dados os quais estão em análises no Laboratório de Métricas da Paisagem
(MEPA), Departamento de Geografia/UFRR.
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 657
Tatiane Ferreira da Silva • Thiago Morato de Carvalho
658 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
Compartimentação das bacias dos rios Uraricoera e Tacutu, Roraima, com base em parâmetros geomorfométricos do relevo
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Compartimentação das bacias dos rios Uraricoera e Tacutu, Roraima, com base em parâmetros geomorfométricos do relevo
RESULTADOS E DISCUSSÃO
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Tatiane Ferreira da Silva • Thiago Morato de Carvalho
Através dos perfis longitudinais (Figura 5) ao longo dos rios Uraricoera e Tacutu,
nota-se as quebras dos gradientes, sendo possível auxiliar na compartimentação da alta,
média e baixa bacias hidrográficas.
662 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
Compartimentação das bacias dos rios Uraricoera e Tacutu, Roraima, com base em parâmetros geomorfométricos do relevo
Com relação aos compartimentos da bacia hidrográfica do rio Tacutu, estes possuem
os seguintes seguimentos: alta bacia corresponde a uma área de 1.735 km², com perímetro
de 217 km; a média corresponde a uma área 10.881 km², com perímetro correspondente
a 578 km; a baixa bacia abrange 29.912 km², com perímetro de 1.100 km. Sua área total
é de 42.528 km², um perímetro de 1.412 km e o comprimento corresponde a 255,72 km.
O comprimento do perfil longitudinal ao longo do rio corresponde a 415 km (Figura 7).
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Tatiane Ferreira da Silva • Thiago Morato de Carvalho
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Compartimentação das bacias dos rios Uraricoera e Tacutu, Roraima, com base em parâmetros geomorfométricos do relevo
Tabela 1. Parâmetros morfométricos das bacias hidrográficas dos rios Uraricoera e Tacutu.
Compr. Densidade
Área Perím. Comp. Índice de Amplitude Índice de
Bacia do canal Sinuosidade de drenagem Rugosidade
(km²) (km) (Km) compacidade (m) circularidade
(Km) (km/km²)
Uraricoera
Alta 11.800 687 - - - - - - - -
Média 13.650 791 - - - - - - - -
Baixa 24.180 910 - - - - - - - -
Total 49.630 1.525 499,50 1,9 1088 522 1,04 0,26 0,35 2,17
Tacutu
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Compartimentação das bacias dos rios Uraricoera e Tacutu, Roraima, com base em parâmetros geomorfométricos do relevo
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Essa pesquisa teve como foco as análises geomorfométricas das bacias dos rios Uraricoera e
Tacutu, uma área pouco explorada deste ponto de vista, porém, o qual possibilita dados riquíssimos
para a geografia. Em relação aos aspectos geomorfológicos e fisiográficos da paisagem das bacias
hidrográficas dos rios Uraricoera e Tacutu, nota - se que na sua morfologia predomina o sistema
denudacional, sendo uma área que está em contato com o sistema Parima-Pacaraima e várias
outras serras, possuem forte controle estrutural, com forte dissecação do relevo. Porém, também
é possível observar áreas com sistema agradacional, tendo destaque os aspectos atrelados às áreas
úmidas, como os sistemas lacustres e planícies fluviais intercaladas por igarapés.
Nota-se drenagens bem definida e com características diferentes entre as bacias. Na
drenagem da bacia do rio Uraricoera é possível encontrar drenagens dendrítica, retangular
e sub-dendrítica, já na bacia do Tacutu encontramos drenagem paralela, sub-dentrítica,
retangular e dentrítica.
Com base nas análises de parâmetros geomorfométricos obtidos dos modelos de elevação
da SRTM, foi possível gerar produtos de fundamental importância para ambas as bacias, com isso
os resultados obtidos foram dados atualizados e mais precisos dos parâmetros geomorfométricos,
como área, perímetro, comprimento, índice de compacidade, amplitude, comprimento do canal,
sinuosidade, índice de circularidade, densidade de drenagem e rugosidade.
Estes são parâmetros importantes para posterior caracterização geomorfológica
e fisiográfica da região com base na compartimentação dos sistemas denudacionais e
agradacionais de Roraima.
Os aspectos físicos foram utilizados nessa pesquisa para entender melhor o
funcionamento das duas bacias estudadas, obtendo dados qualitativos, e assim conhecendo
os aspectos fisiográficos e geomorfológicos dessa região.
Os produtos base utilizados no estudo e os resultados servirão para criação de um
banco de dados geográficos com os aspectos descritivos sobre o meio físico, aspectos
fisiográficos e geomorfométricos das áreas úmidas de Roraima.
REFERÊNCIAS
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Tatiane Ferreira da Silva • Thiago Morato de Carvalho
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“Geografias Imaginárias”: o rio e as representações discursivas na (des) construção do espaço pan-amazônico
RESUMO: O estudo teve como tema, inserido na Geografia Humana e Cultural, os rios,
ou, das estradas aquáticas no Espaço da Pan-Amazônia, mais precisamente, inserida nela, à
1 Apoio: Projeto “Geografia e marcadores territoriais: sentidos e representações socioculturais amazônicas” - Edital: Chamada
003/2017 - PQR - Termo de Outorga: 042/2017; Processo: 01.1331.00031-00.042/2017.
2 Professor do Departamento de Geografia e da Pós-Graduação Mestrado e Doutorado em Geografia da Universidade Federal de
Rondônia-PPGG/UNIR; Doutor em Geografia pela Universidade Federal do Paraná-UFPR. Líder do Grupo de Pesquisa Geografia,
Natureza e Territorialidades Humanas – GENTEH/UNIR. E-mail: adnilson@unir.br.
3 Haitiano graduado em Filosofia pela Faculdade Católica de Rondônia. Mestre em Geografia pelo PPGG/UNIR. Pesquisador do Grupo de Estudos
e Pesquisas Modos de Vidas e Culturas Amazônicas. – GEPCULTURA/UNIR. E-mails: jcharlot64@yahoo.com, charlotcj03@gmail.com.
4 Professor da Faculdade Centro Integrado de Pesquisa e Educação da Amazônia- CIPEAMA. Mestre em Letras pela Universidade Federal
do Acre- UFAC e Doutor em Geografia pela Universidade Federal de Rondônia- UNIR. E-mail: jeffersonhenriquecidreira@gmail.com.
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Adnilson de Almeida Silva • Charlot Jn Charles • Jefferson Henrique Cidreira
fronteira MAP – Madre de Dios no Peru, Assis Brasil no Brasil e Pando na Bolívia. Como
tais estradas interligam essa região ao restante do Brasil e de outros países, se tornam lugares
de encontros e desencontros, de produção cultural. Assim, o rio vai se tornando elemento
crucial para desnudar representações de uma Amazônia vista como “inferno verde”, lugar
do “isolamento”, visão esta instituída pelo “outro”. Nessa acepção, procuramos identificar
e (des) construir o mito fundador do isolamento da Amazônia através da análise nas obras
de Euclides da Cunha e outros autores por ele influenciados. Para isso, utilizaremos como
aporte teórico/metodológico o os Estudos Culturais, a Fenomenologia e a Análise do
Discurso francesa para mostrarmos o papel crucial dos rios no processo (des) construtivo de
discursos cimentados no imaginário social e cultural brasileiro.
ABSTRACT: The theme of the study is to insert into the Human and Cultural Geography, the
rivers, or the waterways of the Panamazonian space, more precisely the border MAP - Madre de
Dios in Peru, Assis Brasil in Brazil and Pando in Bolivia. These roads that connect this region
to the rest of Brazil and to other countries become places of encounter, conflict and cultural
production. Thus, the river becomes a crucial element to denude representations of an Amazon
seen as “green hell”, place of “isolation”, a view instituted by the “other”. In this sense, we
seek to identify and deconstruct the founding myth of the isolation of the Amazon through the
analysis in the works of Euclides da Cunha and other authors influenced by him. For this, we
will use as theoretical/methodological contribution the Cultural Studies, Phenomenology and
French Discourse Analysis to show the crucial role of rivers in the deconstructive process of
cemented discourses in the Brazilian social and cultural imaginary.
INTRODUCTION
La Pan-Amazone, comme lieu de hétérogénéité, “l’Amazone” fut un sujet très present dans
l’agenda des rencontres, colloques, seminaires e Programmes des Études Supérieures Stricto Sensu
dans l’echelle planetaire aux regards des chercheurs, critiques e theoriques s’etendent par les couches
discursives les plus diverses possibles: culture, géographie, litteratura, historiographie, philosophie,
antropologie, textualités, indigènes, corps noirs, mots blancs, diaspora, hybridisme, metissage, frontière,
bord (rive), deplacement, entre-lieu, regional, nacional, global, entre tant d’autres forme de lecture.
Pour eviter une discussion très générale et abstraite, le present article sous le titre
“Géographies imaginaires”: la rivière et les représentations discursives dans la déconstrution
de l’espace Pan-amazonien”, delimite comme thème de recherche la figuration de l’autre
dans l’écrit litteraire qui a institué, forgeait des représentations en relation a ce lieu, de
comment l’imaginaire de l’autre a renforcé et influencé le discours de constitution d’une
identité à l’Amazone et fut le lieu fondateur du mythe d’isolament, partant toujours de
l’orchestration ideologique de son lieu, ainsi comme nous remet Bakhtin, où atravers de lui,
nous observons que le mot, l’ennonciation, “não existe fora de um contexto social, portanto é
ideológica” (BAKHTIN, 1995, p. 16)5, comme ésclaircit Marina Yaguello dans introduction
qu’elle fasse à l’oeuvre Marxismo et Philosophie du Langage, de l’auteur mentionné.
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“Geografias Imaginárias”: o rio e as representações discursivas na (des) construção do espaço pan-amazônico
Comme on avait construit et cimenté des figurations sur l’Amazone, et, comme
surgit en nous la volonté et art quotidiens de représenter nouveaux regards, déconstruire,
fouiller documents officiaux, des narratives, textes canonics et theoriques pour donner
une nouvelle représentation à l’imaginé c’est le point de départ de cette étude. En plus de
représenter le regard de femme et d’homme amazonien, sa relation “embryonnaire” avec
la nature, ses valeurs, sentiments (émotions, affectivités etc.), motivations et perceptions
pour comprendre la configuration de l’espace Pan-amazonien. C’est nécessaire apporter
comme perspective l’idée de découvrir les représentations de “l’autre”, qui, selon Homi
Bhabha (1998), en observant et analysant les modes de vie, la culture, et, après, l’espace,
émit ses perceptions, ses representations elevées dans ses cultures d’origines. Ces
représentations chargées de jugements de valeurs, par consequence, interférant dans la
compréension de l’espace, des coutumes et modes de vie étranges à sa culture.
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Adnilson de Almeida Silva • Charlot Jn Charles • Jefferson Henrique Cidreira
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“Geografias Imaginárias”: o rio e as representações discursivas na (des) construção do espaço pan-amazônico
Importa menos aqui discutir se essas pessoas que foram desterradas eram de fato
criminosas ou se tiveram participação na(s) revolta(s). A questão principal é que o
governo mais uma vez, como em 1904, e agora em 1910, encontrou um ambiente
propício para se desfazer de seus indesejados sociais. (SILVA, 2010, p. 122)7
Mais quelles relations ces revoltes ont-elles avec la perpétuation des représentations
instituées à l’Amazone comme un lieu de “chaos”, “enfer vert”? Ces représentations figurent
dépuis le XVI siècle, avec l’arrivée des colonisateurs dans la region. Et ce colonialisme
a représenté beaucoup plus la violência symbolique que physique, une colonisation et/ou
domination epistemologique, conforme élucide Boaventura de Souza Santos,
Ces formes de savoir qui avaient colonisées sont les formes confortables de
représentations de l’Amazone comme “terre sans histoire”, “isole” dans l’imagerie
culturelle et sociale des brésiliens eux-mêmes, leur acceptation passive et leur reproduction
discursive de ces figures. En accord à la pensée de Thompson (2009), auteur dont le
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 673
Adnilson de Almeida Silva • Charlot Jn Charles • Jefferson Henrique Cidreira
Source: Revista O MALHO, ano IX, nº 432, de 24/12/1910, p. 15. Acervo da Fundação Biblioteca Nacional-FBN.
Figure 2. Limpando águas.
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“Geografias Imaginárias”: o rio e as representações discursivas na (des) construção do espaço pan-amazônico
A ida dos mal afamados ‘reclamantes’ era, nessa perspectiva, mais uma remessa de
pessoas adequadas às características negativas do lugar para onde iam, conforme
acreditavam as autoridades e parte da imprensa na época. Se os ‘reclamantes’ não
se adaptavam às normas da cidade considerada moderna e aprazível, ao declamado
progresso e à cultura da belle èpoque, o lugar mais indicado a eles seria exatamente
as terras ditas ‘incultas’ dos ‘sertões’ ao norte do país. (SILVA, 2010, p. 187)13
Source: Charge do Jornal do Brasil, ano XIII, nº 334, 29/11/1904, p. 01. Acervo da Fundação Biblioteca
Nacional-FBN.
Figure 3. Geographia política.
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 675
Adnilson de Almeida Silva • Charlot Jn Charles • Jefferson Henrique Cidreira
maçaranduba, la seringa, la sorva, la balata etc. ce sont les travailleurs déplacés pour
l’Amazone dépuis la moitié du siècle. Il n’y a pas de difference de traitement pour les
insubordonnés, pour les populations originaires et ni pour les travailleurs.
Nous entrons dans les especificités des Études Culturelles et de l’Analyse discursive sur
les représentations de la region, procurant, ainsi, analyser des textes coloniaux et pos-coloniaux.
Ce são des textes avec une vision “d’autrui” et de rapports oraux avec la vision d’intérieur de
l’Amazone, que, selon Silviano Santiago (2000), ils reconnaient, ils absorbent le texte “d’autrui”
et ils créent un entre-lieu. De cette forme nous pourrons déconstruire les représentations fondées
de cannons litteraires, partant du lieu de femme et d’homme amazonien, de son regard. Entretant,
autre question nous surgit, qu’est-ce qui a de nouveau dans les recherches amazoniennes, quelle
est l’origine du mythe fondateur d’isolement de la region?
L’idée de construire une Amazonie géographiquement isolée est née de la formation d’un
complexe discursif d’objectivation de la région, qui date du XVIe siècle, avec les voyageurs,
les scientifiques, les commerçants, considérés comme “enfer vert”, “désert occidental”,
“exotique” etc. Mais surtout, c’était au XXe siècle que cette figuration est devenue plus claire.
L’origine du discours d’isolement produit sur l’Amazone peut être lu dans le texte de
l’espagnol Gaspar de Carvajal, 1541, traduit par Antônio Porro, mais, revient à Euclides
da Cunha la consolidation de l’idée d’isolement de l’espace amazonien à partir de son
expédition de reconnaissance au Alto Purus, 1905, et, plus tard, la publication de son livre
“Sur les marges de l’histoire” (À margem da história).
Selon Michel Foucault, dans son texte intitulé “Qu’est-ce qu’un auteur?”, Il existe
une reflexion qu’il y a certains auteurs qui fondent des caractéristiques aussi frappantes qui
donnent origine et/ou consolident des discours. Nous présentons donc comme thèse, dans le
présent travail, l’origine et/ou la consolidation de ce discours sur l’isolement, l’origine du
mythe fondateur de l’isolement amazonien chez Euclides da Cunha (1975, 2000).
Euclides était un ingénieur, républicain, défenseur des idées libérales et du progrès.
À partir de ces perspectives qui reflètent sa vision du monde et de son voyage au Purus,
il a formulé certaines analyses les plus significatives de la région amazonienne: “terre
sans histoire”, “coin sauvage” et “coin isolé” (ALBUQUERQUE, 2015). Là où, l’homme
“amazonien” est à l’attente du fleuve et de la nature, un “Judas ahsverus”, condamné de ne pas
avoir culture et rien à produire, isolé dans l’immensité de ce “désert vert”, entouré de dangers.
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“Geografias Imaginárias”: o rio e as representações discursivas na (des) construção do espaço pan-amazônico
Euclides da Cunha a laissé ces échos discursifs chez plusieurs auteurs entre eux
citons Leandro Tocantins (1983, 2003), entre autres, qui ont continué à hégémoniser la
région et à la représenter isolée. Notre proposition repose donc sur l’examen du thème des
figurations instituées à l’Amazonie – comme “enfer vert”, lieu d’isolation - et, élaborer,
à mettre en place des stratégies discursives qui le dévoilent, le renversent, le nient. Ayant
comme intention de comprendre que ces constructions de la région étaient chargées
d’intérêts économiques, civilisationnels et idéologiques.
C’est donc en ce sens que nous proposons un espace ouvert de débat et de déconstruction
des représentations attribuées d’un lieu d’isolement, ainsi que d’analyser le fleuve en tant
que lieu de transits, lieu de culture, comme genèse communicative et élément de voie et /
ou de déconstruction représentation. De la manière dont il existe une relation intime entre
la femme et l’homme amazonien et la nature, l’une reformant la vie de l’autre, et de cette
corrélation pour comprendre les perceptions, les valeurs, les sentiments qui invitent o
“homem a dar à realidade geográfica um tipo de animação e de fisionomia em que ele revê
sua experiência humana, interior ou social” (DARDEL, 2011, p. 5)15.
Nous avons inséré dans cette étude, Claude Raffestin, en conservant les différences
théoriques et méthodologiques avec d’autres auteurs ici cités, en montrant comment ces
représentations ont été construites en Amazone, pour, au moment de reconstuire des chemins: le
fleuve et le processus de déconstruction de L’Espace amazonien, nous pouvos les deconstruire.
Raffestin (2008) élucide que les territoires constituent un monde matériel perçu et
deviennent la ‘matière première’ offerte à l’imagination, pour qu’il ‘travaille’ et puisse
produire des images ou des représentations pouvant se manifester à travers différents
types de langage. Ainsi Comme nous observons dans le langage littéraire d’Euclides
et d’autres sur l’Amazone, c’est-à-dire, des représentations imaginaires basées sur les
perceptions du monde que chaque individu porte.
Nous allons mettre à la lumière nos analyses de textes qui renforcent l’idée de la
façon dont la région est représentée par le regard de l’autre, qui construit, à travers son
prisme, des configurations géographiques, sociales et culturelles, comme c’est le cas de
l’oeuvre Orientalisme de E.W. Said (1995, 2001). Cette oeuvre nous fait comprendre
l’utilisation de renforcer et de construire des représentations face à l’autre, dans une sorte
de reflexion de l’image à travers le miroir où sa supériorité est renforcée. Cohérent avec
cette idée, le géographe Paul Claval (1995) souligne que la Géographie s’intéresse à toutes
les formes de perception de lieux, de construction de l’autre et de fixation de la frontière
entre nous et les étrangers. Nous observons ainsi, la représentation de ces stéréotypes
négatifs sur l’Amazone, cette “ségrégation spatiale” résultant d’une capacité imaginative
des individus et des cultures, c’est-à-dire, d’une imagination géographique.
Claval (1995) apporte également une contribution au dialogue avec les études
culturelles, dans la mesure où l’approche culturelle cherche à comprendre les expériences
des hommes dans l’environnement, à comprendre les significations qu’ils imposent à
l’environnement et le sens donné à leurs vies.
Par conséquent, un autre courant théorique nous saute aux yeux, et est cruciale pour
notre processus déconstructif, la phénoménologie. Um tel courant, Selon Holzer (1998),
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Adnilson de Almeida Silva • Charlot Jn Charles • Jefferson Henrique Cidreira
reflète les expériences intentionnelles de la conscience des hommes pour savoir comment se
produit le sens des phénomènes, des constructions d’une représentation littéraire du passé.
Ainsi, il ne nie pas les représentations du passé, les constructions, mais montre qu’il existe
d’autres regards, d’autres essences qui partent de la rélation de l’être et de la nature.
La rélation avec la nature que l’être humain établit est exactement ce que nous
intéresse à comprendre, la façon dont l’être humain réagit à la nature et à partir de ses
perceptions, il (l’homme) l’influence en créant des significations, des symbologies, comme
illustre Dardel (2011). En lui, l’homme est influencé par l’environnement géographique:
“il subit l’influence du climat, des reliefs et de la flore. Il est montagneux sur la montagne,
nomade dans la steppe, terrestre ou marin. La nature géographique le jette sur elle-même,
donne la forme à ses habitudes, à ses idées” (DARDEL, 2011, p. 9). On observe ainsi
une interaction de l’homme avec son environnement extérieur, l’homme répondant à ses
influences, comme Eric Dardel l’a expliqué, et em conséquence, il l’influence atravers de
ses sens et ses pensées, formant ainsi de nouvelles perceptions de comprendre le monde.
Ces perceptions qui nous intéressent dans ce processus deconstructif, les perceptions de
femme et de l’homme amazonien dans la figuration de leur espace.
L’espace pour la figuration de cette déconstruction ce sont les fleuves Pan-
amazoniens. La géographie des rivières passerá à être notre genèse à l’insertion des
moyens de communication dans la région, il est un élément deconstructeur crucial des
représentations faites à l’espace amazonien en tant que lieu de “retard”, “enfer vert”, ces
constructions sont faites par des regards venus d’autres endroits, avec d’autres intérêts,
principalement liés à la question capitaliste le “temps, c’est de l’argent”. Cependant, le
fleuve ici a représenté et represente lieu de rencontres, où des gens commercialisent, où la
vie se réalisait, des lieux de passage et de communication et, c’est à travers de la rivière,
que nous tracerons une “continuité” pour comprendre l’insertion d’autres voies et/ou des
moyens de communication qui renforçaient la démystification de telles représentations.
La géographie des rivières est d’une importance capitale au processus de
déconstruction de ces représentations, car les rivières sont devenues des lieux d’échange
d’identité, lieux de flux et de mouvements qui ont permis aux habitants de cette vaste
région, les “gens de la forêt”, de se déplacer, de se commercialiser, de survivre, enfin, “le
fleuve commande la vie”, ou du moins, permet à la vie de s’épanouir.
Pendant de nombreuses années, la rivière a joué un rôle primordial en tant que route.
Étant le principal moyen de transport permettant le transport de tous les types de navires
dans la région, que permetait la communication entre les habitants de la région et le reste
du pays, atravers des cartes, des journaux, des mesages, nouvelles. La rivière déterminait
678 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
“Geografias Imaginárias”: o rio e as representações discursivas na (des) construção do espaço pan-amazônico
également le lieu des habitations, car c’était elle-même le point d’entrée et de sortie. Elle
guidait l’établissement humain dans la région comme Aziz Ab’Sáber nous elucide dans
sa préface à l’œuvre de Warren Dean, A luta pela borracha no Brasil (1989), les noyaux
- humains liés à de puissants stratèges portugais et missions religieuses - ont cessé d’être
des colonies de possession, “estabelecendo projeções demográficas para todos os rios e
igarapés da porção nuclear da bacia amazônica. Foi a grande diáspora meio índia e meio
cabocla, na conquista do beira-rio” (DEAN, 1989, p. 8)17.
Cependant, une interrogation se pose à ce moment. Comment le processus de
communication s’est-il déroulé dans le Sud Occidental de l’Amazone et à la frontière
du MAP avant la construction des routes? Comme nous l’avons déjà signalé, les routes
étaient les voies de rivière. Il n’y avait pas encore d’autoroutes. C’était à travers des
rivières que les “automobiles” fluviales (gaiolas, canots, etc.) ils se déménageaient, ils
faisaient du va-et-vient, ils apportaient la nouvelle, à travers eux et, bien sûr, à travers
les rivières que la communication avait lieu. (CIDREIRA, 2015). Le fleuve, dans notre
analyse est toujours considéré comme un chemin, c’est-à-dire un lieu où les personnes
marchent. Selon les peuples natifs de l’amazone que l’igarapé (petit ruisseau) est un petit
chemin de canot. En le comparant avec la route et la rue, (LOUREIRO, 1995).
Cependant, l’isolement a toujours été l’une des symbologies majeures attribuées à
l’Amazone, l’auteur Leandro Tocantins, qui, malgré à faire une analyse fantastique des
rivières dans son célèbre livre O rio comanda a vida (1983), de la manière dont ceux-
ci permettaient/permettent la locomotion, la communication et relations sociales et de
subsistance, c’est l’un des auteurs qui partage cette idée, influencée par le discours euclidien
et, qui en aucun moment mis en lumière la déconstruction de cette vision de la région.
“Condenados a um terrível isolamento, os habitantes dessas circunscrições [...] um povo
que se viu insulado do país e da própria comunidade de seu Território” (TOCANTINS,
1983, p. 111)18. Cependant, en utilisant encore ce que Silviano Santiago (2000) nous a
affirmé, en défendant le rôle de l’écrivain latino-américain, “vivendo entre a assimilação do
modelo original, isto é, entre o amor e o respeito pelo já-escrito, e a necessidade de produzir
um novo texto que afronte o primeiro e muitas vezes o negue” (SANTIAGO, 2000, p.
23)19, nous saisissons et nous harmonisons les écrits de Tocantins pour la libération de cette
stigmatisation de l’isolement, de ce mythe figuratif à la Pan-Amazone.
Où nous observons que les nouvelles, la communication, le commerce, les relations
sociales entre l’homme entre si et la nature ont été établis dans ces rues.
Os rios são as estradas naturais, permitem a mobilidade humana. Sem eles não haveria
nada [...] Pelos rios navegam, num constante navegar, todos os tipos de embarcações,
que trazem alimentos e utilidades, para as vidas implantadas na selva. Pelos rios se
fazem as relações sociais importantes, porque, à beira destes estão os barracões dos
senhores da terra, e, através dos rios, eles mantêm seus vínculos. Nos rios estão as
esperanças de chegar e de sair [...] (TOCANTINS, 2003, p. 40)20
La rivière en tant que lieu de transaction était encore consolidée, comme lieu de
communication, ne réduisant pas l’espace à ses déterminations, mais comme les hommes
ici l’ont compris et ont appris à l’utiliser en leur faveur, donnant un autre sens à leur
destin, se libérant de l’errance. Selon Tocantins, (1983), grâce à la nature l’homme en
tire le profit dans le paysage.
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CONSIDÉRATIONS FINALES
Dans ce XXI siècle, quel est l’isolement qui est encore en vigeur dans l’imaginaire
social et culturel de la population des autres régions du Brésil, l’idée de l’Amazone Sud
Occidentale et adjacente la frontière avec le Pérou et la Bolivie, insérée dans le grand
Pan-Amazonien, vu comme “l’enfer vert”, la fin du monde et d’autres stéréotypes qui
sont encore proférés à travers leurs discours?
Au vu de cela, nous comprenons que les habitants de cet endroit, aux régards d’autrui
comme des “prisonniers” d’un ‘isolement naturel, se sont appropriés les éléments naturels
et les affaires quotidiennes pour se libérer de cette stigmatisation, c’est-à-dire qu’il a
utilisé ses relations avec la nature amazonienne, des “façons de faire” quotidiennes à la
subversion et/ou à la déconstruction de cet isolement, à sa libération de cette stigmatisation,
des adversités imposées par la nature, mais qui, en aucun moment, n’ont servi de barrière
à la vie, à la production culturelle, à leur bonheur, à leurs émotions.
Il est important de souligner encore une fois que, de cette corrélation, principalement
avec le fleuve, que l’homme en est influencé, il l’utilise pour se libérer de ces stigmates, de
ces représentations stéréotypées, de l’art quotidien, comme dit Certeau (1998), pour ainsi
l’influencer et le “dessinant” avec un autre regard à travers ses perceptions, de sa place.
L’espace amazonien devient une partie de leur vie, où les frontières territoriales sont
perméables. Là, face à l’espace, l’homme inséré dans la nature, se perd, pour être mélangé
entre égaux, indépendamment de la nationalité, dans une douce touche de la brise, des
rayons de soleil, des arbres, de la faune, des rivières, enfin, de la nature gigantesque,
influence réciproque, l’un donnant du sens à l’autre.
Dans cet espace les frontières deviennent liquides, se dissolvent entre la société de
chaque pays, vivant de la même subsistance, nourrissant de la nature, la pêche, la chasse, de
l’extraction des bénédictions de la nature, de la plantation. Là les “nationalités” se dissipent,
lieu de réunions, d’influence culturelle. Le brésilien apprend avec le contact de l’autre, se
surgit ce qu’on appelle le “portunhol” (mélange d’éspagnol et le portugais), les relations
d’amitié, de subsistance et d’affectivité. Les identités sont façonnées au-delà des frontières,
les delimitations des territoires de ces trois pays insérés dans le grand Pan-Amazonien.
Donc, nous avons fait de la rivière un élément des relations humaines, de la société
et de la nature, un élément très important pour la région, tant pour le transport, que pour les
relations sociales, commerciales, de la communication et, principalement, surtout, comme
élément deconstructeur de la symbologie attribuée à espace Pan-amazonien, l’isolement.
NOTAS
5 “Il n’existe pas hors d’un contexte social, donc c’est idéologique” (BAKHTIN, 1995,
p. 16). Traduction de l’auteur.
6 [...] des brutalités antiques du processos civilisatoire, dans la region amazonique, en vide
historique, fantasmagorie pâlement réfletées dans les parcours sinueux et tumultuaire de
ces ‘rivières en abandon’ [...] fantasmagorie alors projectée comme ‘terre sans histoire’,
‘paradis perdu’ ou paysage reculé dans l’espace e/ou dans le temps, qui reste ainsi comme
simple plinthe [...] dans cette large operation d’oubli que, de toute façon, laisse traces et
ruines [...]. (HARDMAN, 2009, p. 62). Traduction de l’auteur.
7 Importe moins ici discuter si ces personnes qui avaient exilés étaient réellement criminelles ou
680 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
“Geografias Imaginárias”: o rio e as representações discursivas na (des) construção do espaço pan-amazônico
s’elles participaient dans la (les) revolte (s). La question principale c’est que le gouvernement
plus d’une fois, comme en 1904, et maintenant en 1910, a rencontré un environnement propice
pour se defaire de ses non-desirés sociaux. (SILVA, 2010, p.122). Traduction de l’auteur.
8 Le colonialisme, au delà de toutes les dominations comme c’est connu, c’était aussi
une domination épistémologique, une relation extrèmement inégale entre savoirs qui ont
conduit à la suppression de plusieures formes de savoir propres des peuples et nations
colonisés, relégant beaucoup d’autres savoirs pour l’espace de subalternité (SANTOS;
MENESES, 2010, p. 11). Traduction de l’auteur.
9 “Culturel ou symbolique qui naît dans l’activité de la production, de la transmission et de la
réception du sens des formes symboliques” (THOMPSON, 2009, p. 24). Tradution de l’auteur.
10 “Peuvent provoquer réactions, donner réponses de determiner tereur, suggerer chemins
e decisions, induzir à croire et de ne pas croire, apuyer les affaires d’état ou de soulever
les en une revolte collective. (THOMPSON, 2009, p. 24). Traduction de l’auteur.
11 “Le gouvernement a protegé de les proportionner, dans ces regions, le travail
indispensable à la subsistance” (JORNAL DO COMMERCIO. Os actos do estado de
sítio. 28/05/1911, ano 85, nº 147, p. 04, apud SILVA, 2010). Traduction de l’auteur.
12 “Que la moitié d’eux remet à la Comission Télegraphique 273 dirigée par le colonel
Cândido Rondon, qui les donnerait servisse; e l’autre moitié à la Compagnie constructive
de la Route de Madeira-Mamoré” (Ibidem). Traduction de l’auteur.
13 La rentrée des mal afamados ‘reclamantes’ était, dans cette perspective, plus d’une
remassa de personnes adequates aux caracteristiques negatives du milieu par lá ils allaient,
conforme que les autorités croyaient et partie de l apresse à l’époque. Si les ‘reclamantes’
ne s’adaptaient pas aux normes de la ville considerée moderne et aprazível, au declarado
progrès et à l aculture de la belle époque, le lieu plus indique a eux serait exatement les terres
dites ‘inculte’ des ‘sertões’ au nort du pays (SILVA, 2010, p. 187). Traduction de l’auteur.
14 Il (l’homme), perméable avec les préceptes vulgaires pour réagir contre la température
élevée et l’humidité excessive que lui frappé la tension artérielle et l’activité, le bloquent les
valves de sécurité des pores et lui fatiguent le cœur et les nerfs, créant enfin, l’imminence
morbide pour les maux qui se développent de l’impaludisme qui lui mine la vie, aux
dermatoses qui lui ont dévasté la peau - ils apparaissent, plus efficaces et décisifs, ceux
qui le préparent à réagir au découragement, à la mélancolie de l’existence monotone
et primitive; aux amertumes croissantes du chagrin (saudade); à L’irritabilité provienne
des airs intensément électrifiés et brillants; à l’isolement - et, surtout, à la rupture de la
volonté dans une décadence spirituelle profonde et subitânea(sublime), qui semble être
l’unique maladie de tels lieux, où les autres sont dérivés comme symptômes exclusifs
(CUNHA, 2000, p. 147). Traduction de l’auteur.
15 “L’homme à donner à la réalité géographique un type d’animation et la physionomie dans
lesquelles il passe en revue son expérience humaine, intérieure ou sociale “(DARDEL, 2011, p. 5).
16 Le fleuve [...] symbole des symboles, symbole d’expériences temporelles, la rivière
est aussi un symbole d’expériences spatiales, par la contemplation (errant (devaneante),
poétique des hommes) et l’obtention de la survie, car dans la rivière: ‘L’homme pêche a lida
(le lida) / et ses miracles. / Ici, le temps a été fondé. / Ici, l’âge a été légendé’. Mais dans la
rivière aussi ‘l’homme se pêche plus que le poisson (...)’, c’est-à-dire qu’il construit avec et
à partir de l’interaction avec le fleuve son identité. Mais si l’homme se reconnaît au bord du
fleuve, dans le fleuve qu’il connaît en Amazonie: ‘La nature et l’homme se prospectent’, car
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 681
Adnilson de Almeida Silva • Charlot Jn Charles • Jefferson Henrique Cidreira
du fleuve il survit, dans le fleuve aussi il rencontre sa mort, l’incertitude du destin et le sens
de la vie (PEREIRA, 2008, p. 184). Traduction de l’auteur.
17 ”Etablissant des projections démographiques pour tous les fleuves et cours d’eau de la
portion nucléaire du bassin de amazonique. C’était la grande diaspora moitié indienne et
moitié cabocla, à la conquête du front de mer “ (DEAN, 1989, p. 8).
18 ”Condamnés à un terrible isolement, les habitants de ces circonscriptions [...] un peuple
qui a vu s’isoler du pays et de la propre communauté de son territoire” (TOCANTINS,
1983, p. 111).
19 Vivant entre l’assimilation du modèle original, c’est-à-dire, entre l’amour et le respect
du déjà écrit, et la nécessité de produire un nouveau texte qui confronte le premier et le
nie solvente (SANTIAGO, 2000, p. 23).
20 Les rivières sont des routes naturelles, qui permettent la mobilité humaine. Sans eux,
il n’y aurait rien [...] À travers les rivières, ils naviguent, en navigation constante, tous
les types de bateaux qui apportent nourriture et utilités pour les vies implantées dans
la jungle. Des relations sociales importantes sont établies sur les rivières, car au bord
de celles-ci se trouvent les hangars des seigneurs de la terre et, grâce aux rivières, ils
maintiennent leurs liens. Dans les rivières il y a les espoirs d’arriver et de partir [...]
(TOCANTINS, 2003, p. 40).
RÉFÉRENCES
682 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
“Geografias Imaginárias”: o rio e as representações discursivas na (des) construção do espaço pan-amazônico
RÉFÉRENCES COMPLÉMENTAIRES
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 683
Maria de Fátima da Silva • Mircia Ribeiro Fortes • Mônica Barbosa de Castro Delgado
ABSTRACT: The present work aims to present the environmental impacts generated by the
irregular extraction of sand in the Água Preta/Areal side road, located in the rural area of the
municipality of Manaus, Amazonas State. The branch line was built in the mid-1970s and
was later occupied by people from the interior of the State of Amazonas with the intention
of obtaining work, housing and improving the quality of life. Among the anthropic actions,
sand mining activity deserves to be highlighted, which in recent years has been the main
1 Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Federal do Amazonas (UFAM). E-mail: msf-fatima@outlook.com.
2Professora Adjunta do Departamento de Geografia e do Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Federal do
Amazonas (UFAM). E-mail: mirciafortes@ufam.edu.br.
3Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Federal do Amazonas (UFAM). E-mail: mbcdel@gmail.com.
684 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
A extração irregular de areia e os impactos ambientais no ramal Água Preta/Areal, zona rural de Manaus-AM
factor of environmental degradation in the area. As it is a side road with low population
density and low income families, the community does not meet to report, making the side
road a suitable target for this type of environmental crime. The research was motivated from
the observation of the high rate of degradation. Irregular sand extraction, combined with a
lack of inspection, results in silting up of the water ways, formation of erosion processes and
suppression of vegetation, making the environment more vulnerable to impacts.
INTRODUÇÃO
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 685
Maria de Fátima da Silva • Mircia Ribeiro Fortes • Mônica Barbosa de Castro Delgado
Nesse contexto, para minimizar as ações antrópicas e sociais que transformam o ambiente,
criaram-se regras e metas para gerir as ações no ambiente. No entanto, é importante destacar que
as legislações ambientais contêm algumas lacunas técnicas, substancialmente na sua execução.
Para Marion (2013), vivemos com a problemática contemporânea da crise ambiental
global, e por mais que a questão ambiental seja algo importante, deve-se ter ciência que
os recursos são finitos, mesmo definindo estratégias para conservá-los.
Nota-se que, mundialmente, com as demandas socioeconômicas não existe uma legítima
preocupação com o cumprimento das legislações ambientais, pois estas frequentemente são
postas em segundo plano, principalmente quando a sustentabilidade ambiental entra em
desacordo com os interesses políticos e econômicos, quer do setor estatal, quer do privado.
Desde a década de 1970 o potencial mineral da região amazônica é explorado em razão de sua
conjuntura geológica. A Amazônia, nas últimas décadas do século XX, teve um novo significado
geopolítico mundial, se transformou na grande fronteira de capital natural (BECKER, 2005).
Diante dessa realidade, especificamente no município de Manaus, ainda existe exploração
mineral altamente predatória, mesmo após a criação da Secretaria de Meio Ambiente (SEMA),
em 1979, e a implantação da Secretaria de Defesa do Meio Ambiente (SEDEMA), em 1989,
que asseguravam a proteção contra os impactos ambientais por exploração mineral.
Por mais que se tente uma fiscalização incisiva, voltada para a zona rural da Região
Metropolitana de Manaus, alguns empreendimentos insistem em atuarem de forma
clandestina. Nota-se que os órgãos ambientais como a Secretaria Municipal de Meio
Ambiente e Sustentabilidade (SEMMAS), criada em 2009, o Instituto de Proteção Ambiental
do Amazonas (IPAAM), criado em 1995, e o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos
Recursos Naturais Renováveis (IBAMA), responsáveis pelo licenciamento e fiscalização,
há dificuldade no monitoramento e controle das atividades danosas ao ambiente.
Tal fato é demonstrado na extração de areia irregular no ramal Água Preta/Areal.
Essa atividade de extração gerou, ao longo do tempo, tanto dano ambiental quanto a
alteração da paisagem, pois é possível verificar o assoreamento de igarapés, a compactação
do solo, a retirada da vegetação, a movimentação de terra, a modificação do relevo e a
perda da biodiversidade local.
Entre as degradações observadas ao longo do ramal é possível afirmar que
devido à extração de areia de forma irregular, permanecem em constante crescimento o
desmatamento, a caça ilegal, os descartes inapropriados de resíduos sólidos às margens do
ramal, a extração de madeira, o assoreamento de cursos d’água e os processos erosivos.
Para Ahmed e Sánchez-Triana (2009, p. 2) “las políticas públicas constituyen una
herramienta clave para atender la degradación ambiental actual y futura y el uso de los
recursos naturales”. Todavia, as iniciativas ambientais nem sempre são prioridades nas
ações políticas-econômicas, pois existem divergências entre grupos de interesses distintos
e, nesse sentido, como foi citado anteriormente, a sustentabilidade ambiental vem sendo
perpassada do crescimento econômico.
Assim sendo, este artigo tem o objetivo de apresentar os impactos gerados através
da extração de areia e, por conseguinte, das ações antrópicas ao longo do ramal Água
Preta/Areal, que interliga o Km 32 da Rodovia AM-010 ao Km 10 da Rodovia BR-174, na
zona rural da Região Metropolitana de Manaus. Essa abordagem justifica-se em virtude
do descaso do Poder Público em relação à degradação ambiental da área, onde ocorre
intensa exploração do minério de areia, de forma irregular, por empresas da construção
civil e/ou de materiais de construção.
686 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
A extração irregular de areia e os impactos ambientais no ramal Água Preta/Areal, zona rural de Manaus-AM
Face ao exposto, o referido ramal, ainda que tenha ocupação rarefeita, principalmente
sítios, tem sido uma área com intensa exploração de recursos, sendo a extração do material
arenoso a principal atividade.
Elaborado por: SILVA, Fredson e CAMPOS, Jean. Organizado por: SILVA, Fátima
Figura 1. Mapa da área de pesquisa com a localização do ramal Água Preta/Areal (2019).
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 687
Maria de Fátima da Silva • Mircia Ribeiro Fortes • Mônica Barbosa de Castro Delgado
688 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
A extração irregular de areia e os impactos ambientais no ramal Água Preta/Areal, zona rural de Manaus-AM
Elaborado por: SILVA, Fredson e CAMPOS, Jean. Organizado por: SILVA, Fátima
Figura 2. Mapa das curvas de nível do ramal Água Preta/Areal (2019).
MATERIAIS E MÉTODOS
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 689
Maria de Fátima da Silva • Mircia Ribeiro Fortes • Mônica Barbosa de Castro Delgado
RESULTADOS E DISCUSSÕES
Reis et al. (2006) destacam que a areia é um bem mineral muito usado na indústria
da construção civil sendo composta por grãos de quartzo (SiO2), e que a empregada na
região de Manaus “é proveniente de depósitos formados por processos de podzolização
de rochas cretáceas da Formação Alter do Chão” (p. 103). Para esses autores, a areia
tem sido extraída de forma irregular e clandestina, geralmente sem obedecer à legislação
ambiental, mineral e ao código de postura municipal, ou seja, apenas uma parcela da
lavra de areia pode ser considerada legal. Para tanto, o Artigo 10 da Lei n.6938/1981
deixa claro que a construção, instalação, ampliação e funcionamento de estabelecimentos
e atividades utilizadores de recursos ambientais, efetiva ou potencialmente poluidores ou
capazes de causar degradação ambiental dependerão de prévio licenciamento ambiental.
O uso da areia para construção civil acha-se dividido entre as lojas de materiais
de construção, concreto pré-misturado, fabrico de pré-moldados de concreto, argamassa,
concreto asfáltico e material para compor a base/sub-base de rodovias (BRASIL, 2016).
De acordo com o Anuário Mineral Brasileiro (BRASIL, 2010), a produção bruta de
areia no Amazonas com licença ambiental, no ano de 2009, foi de 2.946.531 t, com nove
minas a céu aberto. Os principais setores de consumo/uso são os da construção civil (81.12%)
e construção/manutenção de estradas (18.88%). Os principais mercados consumidores
em 2016, de acordo com o DNPM (BRASIL, 2016), foram: 35% para argamassa para
construção, 20% concreteiras, 15% construtoras, 10% pré-fabricados, 10% revendedores/
lojas, 5% pavimentadoras/usinas de asfalto, 3% órgãos públicos e 2% outros.
Sendo um recurso barato, indispensável, acessível, abundante e disponível ao longo
do ramal Água Preta/Areal, principalmente no baixo curso do igarapé do Leão e de seus
afluentes, a extração de areia é a atividade que mais degrada o ambiente (Figura 3), pois as
etapas de uma lavra (método em cava seca a céu aberto) são: decapeamento ou raspagem
do solo superficial, retirando a vegetação (principalmente de campinarana), usando trator
de esteira, retroescavadeiras e caminhões basculantes; remoção de galhadas; desmonte;
transporte e carregamento de areia.
690 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
A extração irregular de areia e os impactos ambientais no ramal Água Preta/Areal, zona rural de Manaus-AM
É importante destacar que a areia extraída na cava além de produzir uma significante
alteração na topografia e a retirada da camada superficial do solo (Figura 3), faz com que
os animais silvestres migrem para outras áreas na busca por alimentos e água. Nesse caso,
portanto, a atividade de extração de areia tem consequências em cadeia.
No Artigo 225 da Constituição de 1988 consta a obrigação de recuperar o
ambiente degradado derivado de qualquer intervenção ambiental, por aqueles que
explorarem recursos minerais.
Em virtude de o recurso mineral estar disponível no entorno do ramal, as áreas de
lavras representam um conjunto de polígonos irregulares, interligados através de pontos
específicos. A Figura 4 exemplifica uma área de lavra desativada e que proporciona
acesso à outra lavra. Abandonada, são visíveis as formas de erosão e perda do horizonte
superficial do solo e da cobertura vegetal, gerando ônus para a sociedade e o ambiente.
De acordo com Cardoso (2008) a vegetação protege o solo dos danos causados pela
exposição ao sol e às chuvas, evitando a degradação ambiental.
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 691
Maria de Fátima da Silva • Mircia Ribeiro Fortes • Mônica Barbosa de Castro Delgado
692 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
A extração irregular de areia e os impactos ambientais no ramal Água Preta/Areal, zona rural de Manaus-AM
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 693
Maria de Fátima da Silva • Mircia Ribeiro Fortes • Mônica Barbosa de Castro Delgado
revegetação deve ser balizada com os usos futuros potenciais” (p. 17), ou seja, a vegetação
deve ser semelhante ao de antes da lavra. Mas, para isso é necessário ter um conhecimento
profundo das características ambientais da área e das técnicas disponíveis.
De acordo com Cardoso (op. cit., p. 11), na região de Manaus, os recursos minerais
explorados para uso na construção civil são a areia quartzosa, o arenito e o argilito.
Por conta da extração destes, o solo fica exposto diretamente aos processos erosivos,
ocasionando o assoreamento e a turbidez dos cursos d’água. Nesse sentindo, as áreas
exploradas precisam ser recuperadas, mas nada é feito pelas empresas mineradoras.
Segundo Barth (1989, apud PEREIRA; TOMAZZOLI, 1998), a recuperação da
área degradada não ocorre em um período determinado. É um processo lento e oneroso,
que se inicia antes da mineração e termina depois do processo de exploração.
Pode-se concluir que, embora tenha uma importância socioeconômica para o
desenvolvimento, o minério de areia é um recurso e sua extração sem licenciamento
ambiental e medidas mitigadoras, causam danos ambientais irreversíveis, principalmente
quando o ecossistema é restrito e frágil, como é o caso das campinaranas.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
694 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
A extração irregular de areia e os impactos ambientais no ramal Água Preta/Areal, zona rural de Manaus-AM
NOTAS
4 Caseiros são pessoas que prestam serviços em pequena propriedade rural (sítio familiar).
5 Igarapé, do Tupi Guarani ” ir-r´apé” = caminho d´água, é a denominação regional para
curso d´água, disposto hierarquicamente (1ª, 2ª ou 3ª ordem).
6 Campinarana significa “falso campo”, em Tupi Guarani. É um termo regional para uma formação
vegetal adaptada ao solo espodossolo, rica em espécie endêmica, isolada em manchas, formada por
três tipos: arbustiva (de 2 m de altura e algumas árvores de até 5 m), arbórea e florestada.
REFERENCIAS
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 695
Maria de Fátima da Silva • Mircia Ribeiro Fortes • Mônica Barbosa de Castro Delgado
696 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
A extração irregular de areia e os impactos ambientais no ramal Água Preta/Areal, zona rural de Manaus-AM
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 697
Maria Madalena Lemes Mendes Moreira • Mirian Pereira Suave • Maria das Graças Silva Nascimento Silva
ABSTRACT: The Brazilian prison system did not organize its structures thinking about
resocialization, the right to education is often seen as a “privilege”, which becomes an
1 Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Federal de Rondônia – UNIR. Pesquisadora do Grupo de
Estudos em Geografia, Mulher e Relações Sociais de Gênero – GEPGÊNERO. E-mail: mariamadalena_mendes@hotmail.com.
2 Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Federal de Rondônia – UNIR. Pesquisadora do Grupo de
Estudos em Gestão Territorial e Geografia Agrária – GTGA. E-mail: miriansinai@hotmail.com.
3 Doutora em Ciências Sócio Ambiental e Desenvolvimento Sustentável pela Universidade Federal do Pará, mestra em Geografia (Geografia
Humana) pela Universidade de São Paulo. Professora Associada ao Departamento de Geografia da Universidade Federal de Rondônia.
Coordenadora do Grupo de Estudos e Pesquisas em Geografia, Mulher e Relações Sociais de Gênero. E-mail: gracinhageo@hotmail.com.
698 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
O contexto geográfico da educação prisional na Pan-Amazônia: desafios e avanços
INTRODUÇÃO
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 699
Maria Madalena Lemes Mendes Moreira • Mirian Pereira Suave • Maria das Graças Silva Nascimento Silva
700 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
O contexto geográfico da educação prisional na Pan-Amazônia: desafios e avanços
A metodologia submetida neste trabalho foi realizada com uma pesquisa bibliográfica
em artigos, livros, sites, que retratam a temática ressocialização e Educação. Foi desenvolvido
entrevistas em âmbito prisional, no interior do Estado de Rondônia. E, a partir disso, fez-se
um estudo sobre os desafios de implantar o ensino prisional em algumas unidades prisionais.
Para nortear a pesquisa, foi necessário escolher um método que tratasse melhor
com os fenômenos pesquisados, após várias análises, verificou-se que o método
fenomenológico de Gaston Bachelard, intitulado em sua obra “A Poética do Espaço”
onde o autor nos traz uma reflexão sobre a fenomenologia, a mesma sendo capaz de levar
em conta a observação da imagem numa consciência individual, sendo possível restituir
o que se vê, medir sua amplitude, a força e seu sentido (BACHELARD, 1993) seria o
norteador para a pesquisa sobre a qualidade da educação prisional em Rondônia.
A fenomenologia transformou as perspectivas dos geógrafos porque observaram que
os lugares não são pontos anônimos num espaço neutro; a Terra não é apenas uma superfície
geométrica, é feita de meios físicos, onde a vida está por toda parte presente e os homens
moldaram à sua imagem. Para Claval (2011), a partir do momento em que os geógrafos partem
da experiência que as pessoas têm do espaço, a idade e o sexo tornam-se variáveis chaves.
Kant discursa que os fenômenos se apresentam a nós e por isso são fundamentais. Para
Kant o conhecimento se dá através da união da razão e a experiência. A priori – estrutura
para o conhecimento/nasce na experiência. E, Posteriori – o conhecimento em si/nasce
na experiência, mas encerra na razão (KANT, 2001). Assim, a pesquisa fenomenológica
descreve o fenômeno com maior relevância, sem envolver opiniões próprias ou preconceitos,
mas, busca o verdadeiro conceito e significado daquilo que se vê (KOZEL, 2018).
A pesquisa sobre a Educação carcerária quando passa ser visto pela visão das mulheres,
é maior em sua trajetória no cárcere, os preconceitos e rejeição da própria sociedade. Diante
disso, a metodologia utilizada, baseou-se numa pesquisa qualitativa, o caminho do pensamento
para que a prática seja exercida com coerência (MINAYO; DESLANDES; GOMES, 2001).
A pesquisa qualitativa trabalha com interpretações das realidades sociais, apresenta-
se como um empreendimento autônomo de análises, num contexto de vários projetos.
Ela se desenvolve reforçando a autonomia e a credibilidade da pesquisa em si, tornando
procedimentos claros, capazes de identificar práticas boas ou ruins nos diversos contextos
pesquisados (BAUER; GASKELL; ALLUM, 2015).
O desenvolvimento da pesquisa foi em dois momentos, o primeiro baseou-se em
leituras bibliográficas sobre a educação no sistema prisional. E na segunda etapa, realizou-
se entrevistas com duas pessoas privadas de liberdade, sendo uma mulher e um homem.
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 701
Maria Madalena Lemes Mendes Moreira • Mirian Pereira Suave • Maria das Graças Silva Nascimento Silva
Uma das ferramentas utilizadas para a coleta de dados foi a história Oral, uma metodologia
que permitiu através das narrativas dos indivíduos, interpretar conteúdos socioespaciais.
A História Oral, são as narrativas sobre as experiências dos sujeitos entrevistados, cada relato
tem um valor, e por meio das entrevistas foi possível alcançar informações e construir uma relação
de diálogo entre pesquisadores e entrevistados, por meio da responsabilidade na transcrição das
escritas, na intenção de tornar os estudos baseados na ética (TURRA NETO, 2011).
Outra técnica usada durante a pesquisa foi a observação participante, a qual,
permitiu o reconhecimento da importância na interação humana, os relatos apresentados
pelos sujeitos foram carregados de emoção e sentimentos (TURRA NETO, 2011), isso
foi possível, por entender que, o espaço representado pelas pessoas não é construído
apenas objetivamente, cada detalhe é vivenciado de forma subjetiva. Para isso, o (a)
pesquisador(a) precisa utilizar a técnica da escuta, facilitando um diálogo próprio.
A educação prisional na Pan-Amazônia, mais precisamente no Estado de Rondônia
é carente de políticas públicas voltadas ao ensino. Por acreditar que, a educação é capaz
de permitir ao ser humano maiores possibilidades de ressocialização. Homens e mulheres,
precisam de assistência de qualidade dos órgãos públicos, para contribuir na erradicação
dos preconceitos às pessoas privadas de liberdade.
Analfabeto
14% 15%
Alfabetizado (sem cursos
regulares)
Ensino Fundamental
Incompleto
9%
Ensino Fundamental
Completo
1% Ensino Médio Incompleto
0%
Ensino Médio Completo
0%
4% Ensino Superior
incompleto
51%
6% Ensino Superior Completo
702 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
O contexto geográfico da educação prisional na Pan-Amazônia: desafios e avanços
O Gráfico acima confirma que, quanto menor o nível de escolaridade maior número
de criminalidade, a maior parte dos indivíduos que cometem crime não possuem o ensino
fundamental completo. Por outro lado, os que apresentam o ensino médio correspondem 9% e
já o ensino superior apenas 1%. Os dados constituem índices de que a educação pode ser fator
contributivo para a diminuição da criminalidade. Geralmente as populações carcerárias alem,
de pouca escolaridade a maioria são negros e pobres. Vejamos o que diz Julião (2007, p. 23):
O perfil dos presos reflete a parcela da sociedade que fica fora da vida econômica.
É uma massa de jovens, pobres (95%), não brancos (afrodescendentes) e com
pouca escolaridade. Acredita-se que 70% deles não chegaram a completar o
Ensino Fundamental e 10% são analfabetos absolutos. Cerca de 60% têm entre 18
e 30 anos, idade economicamente ativa e, em sua maioria estavam desempregados
quando foram presos e viviam nos bolsões de miséria das cidades.
Diante dessa realidade, a expectativa do preso/a para reintegrar a uma vida social
mediante as exigências do mercado de trabalho se torna distante. Na tentativa de amenizar
essa situação o Conselho Nacional de Educação-CNE (BRASIL, 2010), produziu em 2010,
as Diretrizes Nacionais de Educação para Jovens e Adultos em situação de privação de
liberdade nos estabelecimentos penais. Essas diretrizes apontam possibilidades de interagir
com mais confiança na Educação prisional, sendo o EJA-Educação de Jovens e Adultos
responsável por essa operacionalização, ressaltando a pretensão de contribuir na reinserção
ao meio social. Assim diz o Conselho Nacional de Educação, sobre o direito a educação.
...ao se abordar a educação para este público é importante ter claro que os
reclusos, embora privados de liberdade, mantêm a titularidade dos demais direitos
fundamentais, como é o caso da integridade física, psicológica e moral. O acesso
ao direito á educação lhe deve ser assegurado universalmente na perspectiva acima
delineada e em respeito ás normas que o assegura (BRASIL, 2010, p. 317).
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 703
Maria Madalena Lemes Mendes Moreira • Mirian Pereira Suave • Maria das Graças Silva Nascimento Silva
cedo a escola por algum motivo e entram para a vida do crime motivada quase sempre
por melhores condições de vida. Já meninas, por exemplo que moram em bairros menos
favorecidos é alto o risco de namorarem um ladrão, ex-presidiário ou assaltante membro
de facção criminosa, porque estes são os únicos a ter motos potentes, tênis de qualidade,
óculos escuros, jeans da moda, cordão de ouro, revólver no cinto e dinheiro no bolso,
bens inacessíveis aos que estudam ou trabalham (VARELLA, 2017).
As mulheres apenadas com 25 anos são comuns à maioria terem de dois, até quatro ou cinco
filhos. A gravidez na adolescência é uma epidemia disseminada nas favelas e comunidades pobres
o que por muitas vezes não são vistos pelo poder público. A menina que engravida na adolescência
e abandona a escola para cuidar do bebê compromete o futuro dela, do filho/a, empobrece os pais e
podem somar para os números exorbitantes da população carcerária (VARELLA, 2017).
Sendo assim, a educação é vista como ferramenta importante no processo de humanização,
de sociabilidade e ressocialização. E mesmo estando as pessoas reclusas em regime aberto ou
semiaberto em unidades prisionais, os indivíduos devem ficar privados de liberdade e nunca da
dignidade humana, garantindo o direito a saúde, educação e justiça, haja vista que é notório o
retorno destes para a sociedade independente do tempo que terão que permanecer dentro de uma
cela confinados ao futuro que muitos deixaram de projetar (AGUIAR JUNIOR, 2014).
Atualmente é abordada a incapacidade nos sistemas prisionais de oferecer as pessoas
privadas de liberdade condições para o retorno a sociedade. Percebe-se que os presos/as
são onerosos para o estado e muitos deles ao saírem do cárcere regressam em condições
piores de quando entraram. Por isso é importante compreender que uma vez as políticas
públicas educacionais implantadas no sistema carcerário e se estas forem trabalhadas com
o objetivo de reintegrar essas pessoas a vida social, se torna uma ferramenta eficaz no
processo de ressocialização. (ALMEIDA, SANTOS, 2016).
A educação no Brasil começou a ser vista como uma forma de solucionar problemas
de questões sociais e os acordos internacionais tem dado lugar as discussões para melhor
garantia desse direito e pela qualidade do ensino, inclusive as pessoas privadas de
liberdade. Segundo a Lei 13.005/14, que institui o Plano Nacional de Educação (BRASIL,
2014), onde se definem metas educacionais para o Brasil de 2014-2024.
No que diz respeito designadamente à educação no cárcere, o CNE/CEB, por meio
da Resolução 2/10, (BRASIL, 2010), estabelece as diretrizes nacionais, para a oferta de
educação à jovens e adultos, em situação de privação de liberdade nos estabelecimentos
penais, em seu ART. 2º defende que:
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O contexto geográfico da educação prisional na Pan-Amazônia: desafios e avanços
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 705
Maria Madalena Lemes Mendes Moreira • Mirian Pereira Suave • Maria das Graças Silva Nascimento Silva
Infelizmente mudou a direção, entrou pessoas que não são a favor da reinserção
e acabou tudo, o que conquistamos não valeu nada. Ou seja, nada, acabamos
morrendo na praia. Os projetos estão parados, o material chegou, mas nada
iniciou. Achei que a juíza iria pressionar para voltar o projeto Kaspar6, ela quer,
mas se não exigir, simplesmente, o projeto não retornará. Fazíamos vários
projetos no decorrer do período com o antigo diretor. Hoje você não tem o
direito nem de falar, porque você é apenado (Beatriz, 37 anos).
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O contexto geográfico da educação prisional na Pan-Amazônia: desafios e avanços
O cargo de diretor é cargo político, chama-se dança das cadeiras, um governo se afastou,
o diretor saiu e entrou esse atual. Até o antigo diretor chegar não existia remissão aqui,
quando ele entrou na direção essa caixa era cheia de papeis (nesse momento, Beatriz
me mostrou uma caixa de papelão grande), organizamos tudo e a partir daí passamos a
ter direito a remissão. Acredito que a reincidência é maior pela falta de oportunidade, se
já é difícil arrumar um emprego, imagina o preso (Beatriz, 37 anos).
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 707
Maria Madalena Lemes Mendes Moreira • Mirian Pereira Suave • Maria das Graças Silva Nascimento Silva
.... Aqui na cadeia onde cumpro pena, os apenados do regime fechado são separados
dos detentos de regime semiaberto e, havia na época adolescentes fechados em uma
cela separada, naquela época tinha uma mulher também separada apenas por uma
grade. Neste período, havia 28 presos nos regimes aberto e semiaberto, para dividir
uma cela de aproximadamente 4,00 x 5,00 metros (20,00 M²), que possuía 06 camas
do tipo beliche. Para dormir, tínhamos que colocar colchões no relento, e esperar a
chuva passar, em certos casos a espera era uma noite inteira. Tanto os apenados do
regime fechado e os apenados menores viviam sem assistências, pouquíssimas eram
as atividades para fazer durante o dia. (João, agosto de 2015)7.
Quanto aos detentos menores relatados no depoimento acima, eles foram transferidos
para o Centro de Ressocialização no município vizinho, e a mulher, foi transferida para
a Penitenciária Regional em outra cidade próxima. Portanto, evidencia que a falta de
espaço físico e a inexistência de atividades educacionais dificultavam a convivência dos
presos e, na maior parte do tempo ficavam ociosos, segundo o diretor do presídio, a
reincidência de presos neste município, interior de Rondônia era de 30%, ou seja, a cada
dez presos em liberdade três retornavam à cadeia.
Diante dessa realidade, Fraccaro e Zuin (2018) afirmaram que, o Sistema Penitenciário
Brasileiro não consegue atingir seu objetivo maior: a Ressocialização. Por muitas vezes por
precariedade e insalubres instalações, superlotação e a falta de treinamento dos profissionais
responsáveis pela reeducação das pessoas privadas de liberdade. Os autores concluem que a
adesão dos presos a uma modalidade de ensino pode resolver os problemas de superlotação
e auxiliar no processo de reinserção destes na sociedade.
Essa seria uma vantagem em Rondônia, pois, o Estado apresenta a maior taxa de
pessoas no sistema prisional por 100 mil habitantes, registrando 3,3 vezes a taxa nacional
(DEPEN, 2016). Além de Rondônia estar no terceiro ranking dos estados brasileiros com
maior número de pessoas jovens presas (DEPEN, 2016).
Conclui-se que, o princípio fundamental no sistema penitenciário não pode ser
entendido como privilégio, benefício ou, menos recompensa oferecida em troca de um
bom comportamento. Educação é direito previsto na legislação brasileira. A pena de prisão
é definida como sendo um recolhimento temporário suficiente ao preparo do indivíduo
ao convívio social e não implica a perda de todos os direitos (TEIXEIRA, 2007, p. 15).
Logo, para a taxa de aprisionamento reduzir na Pan-Amazônia, é necessário trabalhar
com políticas públicas de qualidade, e oferecer aos reeducandos(as) a oportunidade e
708 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
O contexto geográfico da educação prisional na Pan-Amazônia: desafios e avanços
CONSIDERAÇÕES FINAIS
NOTAS
4 Normas para o atendimento da Educação EJA nas Unidades Prisionais, a fim de obter
registro para possíveis remições.
5 Nome fictício escolhido pela reeducanda.
6 Projeto desenvolvido na penitenciária Regional de Rolim de Moura – RO e consiste em
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 709
Maria Madalena Lemes Mendes Moreira • Mirian Pereira Suave • Maria das Graças Silva Nascimento Silva
atividades de leituras pelos (as) reeducandos (as) no presídio, dando direitos aos mesmos
a remissão de dias da condenação.
7 João, nome fictício dado ao um ex-detento que ficou preso na Cadeia Pública de Santa
Luzia d’Oeste - RO, no período de 2017 a 2009.
REFERÊNCIAS
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O contexto geográfico da educação prisional na Pan-Amazônia: desafios e avanços
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 711
Francisco Emerson Vale Costa • Antonio Cezar Leal • Carlos Alexandre Leão Bordalo • Edson Vicente da Silva
ABSTRACT: This paper presents the current scenario of water resources management in
Pará, as part of the results of doctorate research carried out in the Post Graduate Program
in Geography at “Faculdade de Ciência e Tecnologia” in “Universidade Estadual Paulista”,
Presidente Prudente - SP, through the Interinstitutional Doctorate DINTER-UNESP-
UFPA-UEPA, carried out with the support of CAPES and presented at the VII International
Workshop on Sustainable River Basin Planning and Development in 2019 in the city
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Gestão dos recursos hídricos no estado do Pará-Brasil: uma análise de quinze anos de promulgação da lei nº 6.381/2001 (2001 – 2016)
of Manaus - AM. This research aims to analyze the policy and the current management
of water resources in the State of Pará. For this, an approach was made about the Legal
Framework for the Management of Water Resources of the State, followed by an analysis of
Pará State Water Resources Policy and System, with emphasis on the instruments contained
in state legislation. Emphasizing the advances and challenges of the Law No. 6,381/2001
establishing the Policy and Water Resources Management System of the State of Pará.
INTRODUÇÃO
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 713
Francisco Emerson Vale Costa • Antonio Cezar Leal • Carlos Alexandre Leão Bordalo • Edson Vicente da Silva
Por outro lado, os objetivos da PERH estão dispostos no Art. 2º da Lei nº 6.381/2001:
Para Pompeu (2006), de maneira geral a PERH seguiu o modelo da Lei Federal nº
9.433/1997, que instituiu a Política Nacional dos Recursos Hídricos (PNRH), contendo
disposições similares de outras normas. Bordalo e Costa (2013) também ressaltam que a PERH
procura reproduzir na íntegra os artigos contidos na Lei Federal. Contudo, a Lei Estadual inova
ao definir que cabe ao Estado, fomentar e coordenar ações integradas nas bacias hidrográficas,
tendo em vista garantir que o tratamento de efluentes e esgotos urbanos, industriais e outros,
realizados pelos respectivos usuários, ocorra antes do lançamento nos corpos d’água.
Além disso, a lei paraense dedica um título específico destinado às águas subterrâneas
(compreendendo os Artigos. 64 a 77), mostrando a relevância do assunto. Para efeito
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Gestão dos recursos hídricos no estado do Pará-Brasil: uma análise de quinze anos de promulgação da lei nº 6.381/2001 (2001 – 2016)
desta Lei, são consideradas águas subterrâneas as que ocorrem natural ou artificialmente
no subsolo, de forma suscetível de extração e utilização (Lei n° 6.381/2001, Art. 64).
A lei estadual visa de forma mais sistêmica se adequar com a PNRH, uma vez que
já existiam anteriormente duas leis que tratavam do tema água, sendo ela as seguintes: Lei
nº 5.630/1990 e Lei nº 5.793/1994. Nesse contexto, é também importante mencionar que
os cinco instrumentos presentes PNRH fazem parte da PERH, e mais dois instrumentos
particulares da legislação estadual que são a compensação aos municípios e a capacitação,
desenvolvimento tecnológico e educação ambiental.
Quadro 1. Comparação entre os instrumentos de gestão presentes na Lei Federal n° 9.433/1997 e na Lei
Estadual n° Lei n° 6.381/2001.
CAPÍTULO IV – DOS INSTRUMENTOS DA POLÍTICA CAPÍTULO IV – DOS INSTRUMENTOS DA POLÍTICA
NACIONAL DE RECURSOS HÍDRICOS ESTADUAL DE RECURSOS HÍDRICOS
Art. 5° São instrumentos da Política Nacional de Art. 5° São instrumentos da Política Estadual de
Recursos Hídricos: Recursos Hídricos:
II – o enquadramento dos corpos de água em classes, II- o enquadramento dos corpos de água em classes,
segundo os usos preponderantes da água; segundo os usos preponderantes da água;
III – a outorga dos direitos de uso de recursos hídricos; III – a outorga dos direitos de uso de recursos hídricos;
IV – a cobrança pelo uso de recursos hídricos; IV- a cobrança pelo uso dos recursos hídricos.
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Francisco Emerson Vale Costa • Antonio Cezar Leal • Carlos Alexandre Leão Bordalo • Edson Vicente da Silva
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Gestão dos recursos hídricos no estado do Pará-Brasil: uma análise de quinze anos de promulgação da lei nº 6.381/2001 (2001 – 2016)
das praias sobre a qualidade da água, que deve se ajustar às exigências da Resolução nº
274/2000 do Conselho Nacional de Meio Ambiente (CONAMA).
Dos sete instrumentos que estão dispostos na PERH, a Outorga de Direito de Uso
dos Recursos Hídricos é único instrumento implantado no Estado do Pará, através da
Resolução do CERH nº 003, de 03 de setembro de 2008.
No território paraense existem rios de domínio do Estado do Pará e rios de domínio da
União. Para os rios de domínio do Estado do Pará, bem como para as águas subterrâneas, a
outorga é emitida pela Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Sustentabilidade (SEMAS) e
nos rios de domínio da União as outorgas são emitidas pela Agência Nacional de Águas (ANA).
Uma análise dos processos de outorga no Estado do Pará, vigentes até dezembro de
2015, de acordo com dados disponibilizados pela SEMAS, reproduzidos na (Tabela 1), que
totalizam 408 processos outorgados quanto ao uso dos recursos hídricos, principalmente
para a tipologia de captação de água subterrânea (execução de poços) muito vinculado
ao abastecimento industrial, onde se destacam empresas de grande porte do setor
minero-metalúrgico instalado no Estado, sendo importante identificar, também, o baixo
quantitativo de processos outorgados para o lançamento de efluentes, o que evidencia a
falta de fiscalização e controle sobre o real número de lançamento de efluentes nos rios do
Estado do Pará. Isto também aponta esse indicador de saneamento básico como um dos
grandes problemas socioambientais do Estado do Pará.
Superficial 39 14 24 01 0
Lançamentos de
10 10 0 0 0
efluentes
Total 408 369 26 01 12
Fonte: Costa (2017) com base em SEMAS (2015).
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 717
Francisco Emerson Vale Costa • Antonio Cezar Leal • Carlos Alexandre Leão Bordalo • Edson Vicente da Silva
A cobrança pelo uso dos recursos hídricos enquanto instrumento da política estadual
de recursos hídricos ainda não foi implementada no Estado. Sendo importante destacar
que através da Lei n° 8.091 de 29 de dezembro de 2014 se instituiu a Taxa de Controle,
Acompanhamento e Fiscalização das Atividades de Exploração e Aproveitamento de
Recursos Hídricos – TFRH.
Nesse sentido, é importante perceber a distinção entre a cobrança pelo uso dos
recursos e a Taxa de Controle. A taxa não é um instrumento correspondente à cobrança pelo
uso dos recursos hídricos, e a taxa não garante necessariamente que os valores arrecadados
voltem para a gestão de recursos hídricos, o que se prevê no instrumento da cobrança é que
o recurso retorne preferencialmente para a bacia hidrográfica onde ele foi gerado.
A cobrança pelo uso dos recursos hídricos tem o escopo de criar condições de
equilíbrio entre as forças da oferta e da procura, promovendo a harmonia entre os usuários
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Gestão dos recursos hídricos no estado do Pará-Brasil: uma análise de quinze anos de promulgação da lei nº 6.381/2001 (2001 – 2016)
competidores. Bem como, serve os valores arrecadados nessa cobrança para financiar as
ações, como os estudos, os programas, os projetos e as obras contidas nos planos de recursos
hídricos. E ainda, financia as despesas de implantação e o custeio administrativo dos órgãos
e das entidades que integram o Sistema Estadual de Gerenciamento de Recursos Hídricos.
De acordo com o Art. 29º da Lei n° 6.381/2001, poderão ser estabelecidos mecanismos
compensatórios aos Municípios. Tal instrumento possui como finalidade ressarcir
financeiramente ou de qualquer outra forma, os Municípios que tivessem áreas inundadas por
reservatórios ou que tivessem sujeitos a limitações de uso do solo com a finalidade de proteção
dos recursos hídricos, este instrumento de gestão previsto na política estadual encontra-se
sem regulamentação. É interessante destacar que este instrumento também estava previsto
na Lei que regulamenta a Política Nacional de Recursos Hídricos, no entanto, houve um veto
presidencial a este instrumento, que deixou assim de compor a PNRH.
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 719
Francisco Emerson Vale Costa • Antonio Cezar Leal • Carlos Alexandre Leão Bordalo • Edson Vicente da Silva
ressalta que maior parte dos dados hidrológicos utilizados pelo estado são gerenciados
pela Agência Nacional de Águas (ANA); que mantém em território nacional uma rede
de estações hidrometeorológicas que medem variáveis hidrológicas (nível fluviométrico,
vazão) e meteorológicas (temperatura, umidade, pressão e umidade atmosférica), sendo
disponibilizadas posteriormente na Plataforma HidroWeb (http://hidroweb.ana.gov.br/).
A Política de Recursos Hídricos do Estado do Pará tem entre suas diretrizes “a execução
e manutenção de campanhas educativas visando à conscientização da sociedade para a
utilização racional de recursos hídricos” (Art. 33º, inciso X, Lei nº 6.381/2001), e entre seus
instrumentos a capacitação, desenvolvimento tecnológico e educação ambiental. Dentro
dessa perspectiva de acordo com a SEMAS/PA, a Diretoria de Recursos Hídricos - DRH
desenvolve o Programa de Sensibilização e Mobilização Social pelas Águas, aliado a um
Programa de Capacitação e Educação Ambiental em Recursos Hídricos para profissionais
(professores, técnicos das prefeituras, entre outros), representantes da sociedade civil e para
usuários de recursos hídricos em geral, tendo como base a participação e integração dos
diversos segmentos sociais como coautores do processo de gestão das águas.
A Lei nº 6.381/2001, além de instituir a PERH, também em seu Art. 41º, cria o
Sistema Estadual de Gerenciamento de Recursos Hídricos – SEGRH/PA com os objetivos
de: coordenar a gestão integrada dos recursos hídricos; arbitrar administrativamente os
conflitos relacionados com os recursos hídricos; implementar a Política Estadual de
Recursos Hídricos; planejar, regular e controlar o uso, a preservação e a recuperação dos
recursos hídricos; promover a cobrança pelo uso dos recursos hídricos. Considerando o
que está previsto nestaa lei o SEGRH deveria apresenta uma articulação em cinco níveis
institucionais distintos, com identidade e instrumentos próprios de atuação (Figura 2).
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Gestão dos recursos hídricos no estado do Pará-Brasil: uma análise de quinze anos de promulgação da lei nº 6.381/2001 (2001 – 2016)
O Conselho Estadual de Recursos Hídricos (CERH/PA) foi criado pela Lei Estadual
n° 6. 381/2001 e regulamentado pelo Decreto nº 276, de 02 de dezembro de 2011 que
revoga o Decreto nº 2.070, de 20 de fevereiro de 2006. O Art. 1° desse decreto estabelece
o Conselho Estadual de Recursos Hídricos do Estado do Pará (CERH/PA) como órgão
consultivo, deliberativo e normativo vinculado ao órgão Gestor da PERH. O Conselho
Estadual de Recursos Hídricos representa a instância superior do SEGRH.
Após três anos de discussão da proposta, em 21 de março de 2007 foi assinado o Decreto
nº 2.070/2007 que regulamenta o Conselho Estadual de Recursos Hídricos, tendo a 1° reunião
ocorrida em 26 de março de 2007. Na segunda e terceira reuniões houve uma definição em
relação à composição das Câmaras Técnicas (CT’s) sendo configurada em três:
A i) Câmara Técnica de Assuntos Legais e Institucionais (CTIL), que passou a
discutir sobre a Outorga de Direito de Uso dos Recursos Hídricos; ii) A Câmara Técnica
do Plano de Recursos Hídricos (CTPERH) ficou com a competência de avaliar a divisão
do Estado em regiões hidrográficas, o Plano Estadual de Recursos Hídricos e o cadastro
de usuários de recursos hídricos; e iii) A Câmara Técnica de Capacitação e Educação
Ambiental de Recursos Hídricos (CTCEAR), ficou responsável por tratar da capacitação,
desenvolvimento tecnológico e educação ambiental em recursos hídricos.
Considerando os dois períodos de gestão (2007/2011) e (2012/2014) o CERH-PA
realizou 25 reuniões ordinárias e 05 reuniões extraordinárias, conforme a (Tabela 2).
Sendo aprovado quatorze (14) resoluções e quatro (04) moções.
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Francisco Emerson Vale Costa • Antonio Cezar Leal • Carlos Alexandre Leão Bordalo • Edson Vicente da Silva
Quadro 3. Implementação dos Instrumentos de Gerenciamento dos RH no Estado do Pará – Lei nº 6.381/2001.
INSTRUMENTOS DA PERH IMPLEMENTAÇÃO CONDIÇÕES EXISTENTES
(Lei N° 6.381/2001)
I- Planos de Recursos Hídricos; Regulamentado Planos de Recursos Hídricos Interestaduais:
Resolução CERH nº 5 de Margem Direita do Rio Amazonas
03/09/2008 Plano Estratégico Tocantins-Araguaia
Não implementado
Fonte: Elaborado por Costa (2017) com base em ANA (2013) em SEMAS (2016).
724 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
Gestão dos recursos hídricos no estado do Pará-Brasil: uma análise de quinze anos de promulgação da lei nº 6.381/2001 (2001 – 2016)
O Estado do Pará enfrenta inúmeros desafios voltados para a gestão dos recursos
hídricos, como a falta de recursos financeiros associados à falta de prioridade do Estado
na tomada de decisões que efetivamente contribuam para a implementação da PERH.
É importante ressaltar que no Estado do Pará as Aagendas Verde7 e Marrom8 ocupam
mais espaço na agenda política do Estado, tendo consequentemente mais recursos tanto
financeiros quanto humanos, com isso a agenda Azul9 não constitui uma pauta com
demandas que assuma um caráter prioritário.
Também outro desafio na gestão dos recursos hídricos diz respeito à questão cultural.
Para a maioria da população do Estado do Pará, a água não se configura como um problema,
pelo menos do ponto de vista de escassez quantitativa. A abundância de água na região e
no Estado impede aos seus habitantes a percepção sobre a escassez do bem fundamental e
isso contribui para que não haja uma pressão social sobre o Estado, tal realidade contribui
também ao desperdício e ao uso sem controle, não prevendo as consequências em termos
de quantidade e qualidade. Portanto, nesse aspecto se faz necessário uma mudança de
pensamento em relação à necessidade de gestão e preservação dos recursos hídricos, em
todos os níveis, do institucional, passando pelo setor usuário, até a sociedade civil.
Nesse sentido, para o Coordenador10 de Planejamento, Informação e Apoio a Gestão
de Recursos Hídricos (CIP) da SEMAS (2016), o papel da SEMAS é tentar sensibilizar um
maior número de pessoas para que o debate vá sendo gerado e contribua para formação de
uma massa crítica. Ressalta ainda que o papel das universidades também é importante neste
processo. E acrescenta que a visão externa à realidade amazônica, se dá em uma escala na
qual não se percebe nem a escassez e nem os conflitos, portanto, um olhar bem distante da
realidade. No entanto, com uma análise sobre a gestão dos recursos hídricos a partir de uma
escala local é possível perceber a existência de problemas relacionados a escassez quantitativa
em decorrência do grau de comprometimento da qualidade das águas superficiais, conflitos
e a problemática ambiental. Constituindo assim um problema relacionado diretamente
à gestão dos recursos hídricos, que tanto no âmbito do Estado, quanto ao nível de bacia
hidrográfica, o debate em torno dessa necessidade é muito incipiente.
Assim é um fator desafiador relacionar a gestão dos recursos hídricos no Estado do Pará
com a grande disponibilidade. Podemos mencionar que os Estados brasileiros das Regiões
Nordeste e Sudeste, com a gestão dos recursos hídricos mais avançados são aqueles que
enfrentam problemas relacionados principalmente a disponibilidade hídrica, ou seja, motivados
pela escassez quantitativa, contrastando com a realidade dos Estados da região amazônica,
principalmente ao nível de implementação das políticas estaduais de recursos hídricos.
Nesse contexto, podemos questionar o modelo de gestão dos recursos hídricos que
pauta tanto a Política Nacional como as Políticas Estaduais de Recursos Hídricos. Ao se
considerar os seis (06) fundamentos da PNRH, percebe-se que em dois deles se enfatiza
a água como recurso limitado e se impõem usos prioritários em situações de escassez
para dirimir conflitos. E com relação aos cinco (05) instrumentos de gestão de recursos
hídricos preconizados pela PNRH, podemos destacar que dois deles se baseiam em um
contexto de escassez. É o caso da outorga dos direitos de usos dos recursos hídricos e da
cobrança pelo uso dos recursos hídricos.
A outorga é um instrumento cuja aplicação de forma racional remete à escassez uma
vez que o controle das autorizações e concessões, em suas diversas fases, é mais urgente
onde a água está escassa. Um indicador importante disso é o fato de que a própria ANA não
possui nenhuma outorga no Estado do Amazonas, e apenas sete outorgas no Estado do Pará.
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Francisco Emerson Vale Costa • Antonio Cezar Leal • Carlos Alexandre Leão Bordalo • Edson Vicente da Silva
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Gestão dos recursos hídricos no estado do Pará-Brasil: uma análise de quinze anos de promulgação da lei nº 6.381/2001 (2001 – 2016)
CONCLUSÕES
NOTAS
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 727
Francisco Emerson Vale Costa • Antonio Cezar Leal • Carlos Alexandre Leão Bordalo • Edson Vicente da Silva
tais como poluição do ar, da água e do solo, a coleta e reciclagem de lixo, o ordenamento
urbano, a segurança química, etc.
9 E a Agenda Azul (aquela que se refere à gestão de recursos hídricos (disponível www.
ibama.gov.br. Acesso em: 15 nov. 2016).
10 Entrevista concedida pelo Coordenador da CIP, em 23 de setembro de 2016, em Belém
na sede da SEMAS/PA para o autor desta pesquisa.
11 O equivalente deste item na Legislação Nacional foi vetado. Conforme conta na Mensagem
nº 870, de 6 de agosto de 1997: “Razões do veto: ‘A redação do artigo é falha. É impositiva em
relação aos beneficiários para que estes participem do rateio dos custos das obras, obrigação
a que estes não estão necessariamente sujeitos. Não parece razoável, na tarefa de legislar, a
inclusão de situações que possam, eventualmente, não ocorrer na prática [...]”.
REFERÊNCIAS
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em bacias hidrográficas na Amazônia. In: SILVA, Christian et al. (Org). Sociedade, espaço
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Hídricos, cria o Sistema Estadual de Gerenciamento de Recursos Hídricos. Diário Oficial
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Cultura. São Paulo, v. 55, n. 4, 2003.
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Agronegócio, dinâmica territorial e re-territorialização no médio-norte mato-grossense - o município de Diamantino
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INTRODUÇÃO
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Agronegócio, dinâmica territorial e re-territorialização no médio-norte mato-grossense - o município de Diamantino
Ao longo dos séculos, desde a Antiguidade até aos dias atuais, poder e território
caminham nos ideais políticos dominantes nas sociedades. Nessa longa caminhada o
Estado-Nação delimitou um processo jurídico-político do território no intuito de legitimar
entre outros, o domínio sobre os recursos naturais. O território tornou-se, portanto, base
e fundamento do Estado-Nação. Deste modo, a geografia política desencadeou um papel
importante com as ideias de Ratzel no momento em que Estado e território consolidavam
uma ideologia de segurança nacional e concepção de território.
Sobre essa concepção e ideologia do Estado em relação ao território, Raffestin
(1993, p. 13) afirma que Ratzel partiu da ideia que existia uma estreita ligação entre o solo
e o Estado. Para Ratzel, “o elemento fundador, formador do Estado, foi o enraizamento
no solo de comunidades que exploraram as potencialidades territoriais”. Ora, o Estado
era então, o centro de todas as atenções, sendo assim, qualquer projeto político ou social
o tinha como base de gerenciamento das propostas.
Mas, recentemente, há elementos que mostram mudanças nas trajetórias da
Geografia Política, como demonstra Oliveira (2002, p. 75) quando hoje se fala em uma
nova Geografia Política.
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longo dos tempos, definiram novas formas, compreendendo dinâmicas de apropriação efetiva
e afetiva, ou seja, uma combinação específica das variáveis econômicas, políticas e culturais
locais, que determinam a intensidade da vantagem competitiva de um território e passam a
cobrir aspectos como informação, produção, mercado de trabalho e governança institucional.
Esse estreitamento de relações entre a produção agrícola e o restante da economia
é, portanto, um fator extremamente importante quando se quer distinguir a agricultura
contemporânea daquela existente antes da revolução tecnológica, quando grande parte dos
circuitos espaciais de produção, se esgotavam no interior do próprio estabelecimento agrícola.
Michel Foucault ressalta que o poder está em todas as relações sociais, pois todas
as relações são relações de poder. O autor afirma que o poder do Estado é apenas uma de
suas formas, ao passo que dessa forma, todas as relações são relações de poder e estão
presentes em todos os lugares (FOUCAULT, 1988, p. 89):
Não porque tenha o privilégio de agrupar tudo sob sua invencível unidade,
mas porque se produz a cada instante, em todos os pontos, ou melhor, em
toda relação entre um ponto e outro. O poder está em toda parte; não porque
englobe tudo e sim, porque provém de todos os lugares.
Para esse autor o poder não é algo que se possa obter, mas ele é exercido por este ou
aquele indivíduo, não se resume nas relações entre dominantes e dominados. O que existem
são redes de poder que, ao se unificarem, formam grandes dominações que estão na família,
nos grupos restritos, nas instituições, dentre outras, e que as formam, sendo estas possuidoras
de resistências, pois ainda segundo Foucault (1988), o poder convive com a resistência.
Desta forma, podemos afirmar que o processo de modernização da agricultura
existente em determinadas regiões e suas territorialidades, consiste em redes de poder,
regidas por agentes hegemônicos do capital agroindustrial, agricultores, a agroindústria
e o Estado. Ao se relacionar poder consistindo em atos, decisões que representam o mal,
porém engloba outros elementos que determinam à dinâmica do poder, ou seja, o poder
não se estabelece pelo ou a partir do Estado. O poder se manifesta por ocasião da relação.
Para Raffestin (1993, p. 53):
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Agronegócio, dinâmica territorial e re-territorialização no médio-norte mato-grossense - o município de Diamantino
Assim, através do acirramento das interações entre os lugares, uma espacialização dos
lugares e necessidade das redes, as fronteiras tornaram-se mais porosas (CATAIA; SILVA,
2003), portanto, é através delas que há uma regulação do território e suas regiões de modo
que, o conjunto de técnicas só pode funcionar ou atravessar um determinado compartimento
público se estiver em consonância com as normas de organização política local.
É nesse sentido que se percebe as diferenciações e os significados do território. A
partir daí, o campo e a cidade, espaços de apropriação contínua das territorialidades tomam
novas configurações socioespaciais nesse processo da interação agricultura/indústria
e relações de poder, já que, com o processo global da economia capitalista o campo
viabilizado pela agroindústria passou a exercer atividades não propriamente urbanas,
mas atividades e elementos que criaram uma dinâmica unilateral de funcionamento. A
agricultura passa a depender bem menos das condições naturais para obtenção de seus
bens, constituindo-se como elemento determinante de sua dinâmica, ela incorpora a
agroindústria e o meio técnico-cientifico-informacional.
As relações sociais também se intensificam na medida em que o processo ganha
complexidade. Trabalhadores rurais e urbanos interagem territorializando campo e cidade
configurando uma unidade, manifestando-se ações de caráter comercial, administrativo,
político e culturais. Nesse contexto, do território como objeto de análise social, é que ele
adquire uma dinâmica multiescalar, ganhando sentido nas várias formas de se analisar,
ficando bem claro o resgate do velho território e o novo. Porém, a riqueza geográfica que
se estabelece aqui só é vista pelo olhar do geógrafo.
Cabe aqui, um bom momento para apresentarmos a definição de outro termo
anteriormente utilizado, a desterritorialização que, segundo Corrêa (1994), é entendida
como a perda do território apropriado e vivido em razão de diferentes processos derivados
de condições capazes de desfazerem o território. Haesbaert (2002) enriquece a análise
sobre o processo de territorialização e desterritorialização, através de uma perspectiva
mais ampla, dando vários exemplos usando diferentes versões das quais são compatíveis
à dinâmica territorial, aqui em especial ao caso mato-grossense. Mas, antes, ele parte de
uma perspectiva de um discurso que distingue território e rede, seja como referencial
unilateral ou separadamente, mas, como componente importante da territorialidade.
Para o entendimento das novas territorialidades, Corrêa (1994, p. 252) apresenta a
seguinte contribuição:
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Santos apud Bernardes e Freire (2006) aponta que esta profunda ligação entre
técnica, ciência e informação vai constituir o que Santos denominava de meio técnico-
científico-informacional, resultando na cientifização e na tecnicização da paisagem, que
é rapidamente alterada, em função de determinado produto, atendendo aos interesses
dos atores hegemônicos, vinculados às correntes de globalização, conferindo uma nova
qualidade a essa fronteira, e segundo ele, resultando na produção de uma nova geografia.
Deste modo, essa cultura, conseguiu atingir, principalmente nas últimas duas décadas,
grande importância nacional e internacional. Com isso, atraiu muitos investimentos, tanto
para o aumento de sua atividade primária no campo, quanto para competitividade final do
grão de soja e de seus principais derivados, o farelo e o óleo, nos mercados internacionais
(MORENO; SOUZA-HIGA, 2005).
O que motivou a implantação da produção da soja, inicialmente, na região Sudeste
e, posteriormente, na noroeste e norte do estado de Mato Grosso, foram, as condições
favoráveis relacionadas à temperatura, distribuição de chuvas e luminosidade, e ainda
a topografia, a vegetação aberta do cerrado e de fácil exploração e a dimensão da área,
já que se trata de maiores áreas planas contínuas do Brasil. Bernardes e Freire (2005)
afirma que tais condições naturais apresentavam vantagens competitivas em nível do
mercado internacional, constituindo o cerrado uma significativa fronteira para a ciência e
a tecnologia, onde coexistiam interesses diversos de ordem econômica e política.
Em Mato Grosso, o complexo da soja é constituído por um conjunto de atividades
que, articuladas, integram diferentes setores da economia, definindo uma cadeia produtiva
altamente tecnificada. Assim, a apropriação territorial de Mato Grosso pelos projetos de
colonização, urbanização, instalação de serrarias e a implantação e instalação agroindustrial
para atender a cultura de grãos, como a soja, trouxe uma mudança significativa na
paisagem natural, substituindo a vegetação natural pela cultivada. Ainda mais pelo fato
de que a característica mais evidente da produção de grãos é a da necessidade de grandes
extensões de terras para criar escalas requeridas para a competição internacional.
Sob esse prisma, Freire Filho (2003, p. 57) afirma que:
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Vale ressaltar que as cidades surgem e crescem mais rapidamente que a própria fronteira
agrícola, de modo que, com frequência, os distritos são desmembrados dos municípios de
origem, tornando-se grandes produtores individuais de soja, ou seja, seguramente pode-se
afirmar que o processo de produção e expansão da soja é o principal fator responsável pelo
notável surgimento e crescimento das áreas urbanas no estado de Mato Grosso, onde ocorre
uma grande mudança estrutural e econômica, devido ao surgimento de comércios varejistas,
atacadistas, representações comerciais, bancos, escolas, universidades, faculdades, entre
outros. Esses estabelecimentos, em sua maioria, estão ligados ao surgimento e manutenção
do complexo socioeconômico-espacial criado pela soja.
O município de Diamantino, que até os anos 50, tinha mais de 100.000 km2,
perdeu grande parte de seu território com a formação de novos municípios.
Sua estrutura fundiária também sofreu profundas transformações. Os pequenos
estabelecimentos rurais, com menos de 100 hectares, diminuíram em número.
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Além do objetivo já citado, o PIN previa também o esvaziamento de áreas de tensão social,
caracterizadas pelos conflitos fundiários, nas regiões Sul e Sudeste. Esse processo teve início
com a atração dos imigrantes, através da farta propaganda, ofertando terras férteis, incentivos
fiscais e financeiros na região Centro-Oeste, principalmente no Norte do estado de Mato Grosso.
A partir da década de 1960, o município de Diamantino sofreu uma intensa migração. Um dos
fatores de maior importância e incentivo para efetivação do plano de colonização do Médio Norte
mato-grossense foram os investimentos em obras de infraestrutura, como por exemplo, as rodovias.
Estas obras constituíam-se pré-requisitos para a ocupação de onde se buscavam, além de tudo, uma
produção futura de bens e serviços que fixassem as populações nos novos centros urbanos.
A Rodovia Cuiabá – Santarém possui 1.700 km, disposta no sentido Norte – Sul.
Iniciada em 1971, foi inaugurada em 1976, pelo então Presidente da República General
Ernesto Geisel. Sua construção pode ser considerada como um fator positivo, pois,
facilitou as migrações, as instalações humanas e estimulou o desenvolvimento econômico
através da possibilidade do escoamento da produção agrícola e pecuária.
Com o plantio no Cerrado, a moderna tecnologia aplicada à agricultura, à abertura
das BR’s 163 e 364 e com a intensa migração advinda principalmente do Sul do país, a partir
de 1976 ocorreu o maior desenvolvimento de todos os tempos, colocando Diamantino,
antes conhecido por sua grande riqueza mineral, como destaque não só na região, mas
também no contexto do Estado como município produtor de grãos (soja e algodão).
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Através das figuras apresentadas a seguir, pode-se ter noção da dimensão territorial
original do Município de Diamantino e sua desterritorialização no processo de criação de
novas municipalidades neste território. Desta forma encontramos na Figura 2, a seguir,
a representação da primeira constituição territorial do município de Diamantino, onde
se observa toda a magnitude e extensão do território original. Pode-se observar que num
período de 231 anos, o território manteve-se intacto, sem mudanças em sua totalidade.
Durante o período entre 1719 e 1950 o território manteve-se intacto. Pode-se avaliar
a dimensão territorial original do Município de Diamantino e sua desterritorialização no
processo de criação de novas municipalidades neste território. Observa-se que num período
de 231 anos, o território se manteve intacto, sem mudanças em sua totalidade.
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Porém, vale ressaltar que entre os 16 municípios da área de estudo nem todos são
produtores de soja, como por exemplo, Juara, Novo Horizonte do Norte e Santo Afonso, nos
mostrando que nem todos os municípios desmembrados de Diamantino surgiram ou vivem
em função da soja, tendo como base para seu desenvolvimento econômico outros produtos.
Foram levantadas ainda, algumas informações a respeito destes municípios,
conforme o Quadro 1, a seguir, o qual engloba dados que nos apresentam condições
básicas para a análise destes territórios criados, modificados e consolidados, em função
da produção de soja.
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Pautada nos estudos realizados por Becker (2004, 2005 apud ESCADA, 2005)
apresentam algumas hipóteses sobre a nova fronteira de ocupação, tendo sua gênese
em um contexto diferenciado daquele das décadas de 1960 e 1970, quando o governo
induziu a formação da fronteira agrícola na Amazônia e a intensificação da ocupação
destas regiões que se prolongou até as décadas de 1980 e 1990. A nova fronteira estaria se
constituindo por frentes localizadas, impulsionadas por uma maior diversidade de atores
e por diferentes motivações econômicas: terra, soja, pecuária e exploração madeireira.
Considerando que a compreensão da dinâmica e a formação da fronteira podem auxiliar
na construção de políticas públicas para a região.
Desta forma, o desenvolvimento produtivo do território compreende a articulação
de diferentes atividades urbanas e rurais, a integração das micros e pequenas empresas
em cadeias produtivas e, mais amplamente, a formação de redes de cooperação, tendo a
economia informal como um potencial a ser desenvolvido e articulado a este conjunto.
Envolve ainda a mobilização da poupança local, como oportunidade de geração de
trabalho e renda, através de investimentos no sistema produtivo local.
Para Santos (1993, p. 197):
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Agronegócio, dinâmica territorial e re-territorialização no médio-norte mato-grossense - o município de Diamantino
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Como visto, no processo de divisão do território, ganham destaque as áreas que passaram
a produzir produtos agropecuários industrializados ou semi-industrializados, voltados em grande
parte para a exportação, gerando uma situação de privilégio econômico e uma nova classe de
empresários agrícolas e agroindustriais, com grande concentração de terras e de renda.
Mesmo diante da busca de melhorias e novas técnicas para melhor aproveitamento e
menor impacto sob essas áreas produtoras, tem-se ainda que ressaltar a questão ambiental,
já que a indiscriminada retirada da cobertura vegetal implica no comprometimento da
biodiversidade, bem como coloca em risco o desenvolvimento de inúmeras espécies animais
dependentes do meio para se alimentar, reproduzir, abrigar. Daí um dos aspectos que asseguram
a insustentabilidade desse modelo de desenvolvimento do ponto de vista ambiental. Não se
pode deixar de lembrar ainda, que as florestas da área no entorno da BR-163 possuem um
vasto estoque de madeira, que, se exploradas de forma manejada, podem gerar uma economia
florestal sustentável. Entretanto, a problemática se encontra no fato de que a maioria da
exploração madeireira praticada na área adjacente à da BR-163 é ainda largamente predatória.
Desta forma a pavimentação e recuperação da Cuiabá-Santarém cria a oportunidade
de negociação e formação de um pacto entre os atores e áreas inseridas em seu espaço,
para o estabelecimento de um novo modelo de desenvolvimento para a região, desde que
esse modelo pressuponha o estabelecimento e conservação ampla de recursos naturais
através da expansão de Unidades de Conservação (mesmo nas propriedades privadas), o
respeito às populações tradicionais e os povos indígenas, e a edificação de uma economia
diversificada incluindo o agronegócio, a agricultura familiar e o manejo florestal.
Outro problema oriundo dessa dinâmica territorial e da produção em grande escala do
commoditie soja, é a perda de grandes volumes de solos anuais por erosões, desestruturação,
compactação, concentração de agro-químicos nos primeiros horizontes etc. Esses problemas, uma
vez instaurados, são responsáveis por desencadear tantos outros. A compactação, por exemplo,
implicará no processo de redução de absorção das águas das chuvas, aumentando consequentemente
o escoamento superficial e, em longo prazo, o rebaixamento do nível dos lençóis freáticos.
Verifica-se que a dinâmica territorial na região estudada atinge todos os âmbitos da
produção do espaço geográfico, sendo que a mesma modificou/criou estruturas físicas, sociais,
econômicas, ambientais e humanas na região, produzindo um espaço, onde atores de diferentes
culturas e níveis de conhecimento interagem na manutenção do território. É necessário que se
aparem arestas, a fim de direcionar as ações, trabalhos e pesquisas para que a realidade dessa
área, no futuro, apresente menores disparidades sociais, econômicas e ambientais.
Para finalizar, no decorrer deste trabalho, pode-se verificar através dos mapas
históricos elaborados, uma dinâmica territorial imensa na região estudada, essa dinâmica,
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NOTAS
REFERÊNCIAS
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Agronegócio, dinâmica territorial e re-territorialização no médio-norte mato-grossense - o município de Diamantino
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Ademilso Sampaio de Oliveira • Maria Aparecida Pereira Pierangeli • Humbelina Silva Siqueira Lopes •
Juberto Babilônia de Sousa • Antônio Carlos Silveiro da Silva • Carla Galbiati
ABSTRACT: The objective of this work was to evaluate the concentrations of trace
elements in different environments in the Teles Pires River Basin in the city of Alta Floresta
- MT. Simple soil samples were collected at depths of 0-0.2 and 0.2-0.4 m, totaling 36
soil samples along the right and left banks of the Teles Pires River in six environments,
accounting for 18 sampling points. The pH showed the lowest value at Fazenda São
José in the 0-0.2 m layer. Organic matter showed higher levels in the surface layer in
all environments. The aluminum contents were higher in the 0-0.2 m layer at Encanto
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Panorama geral de fertilidade e teores de elementos-traço na bacia hidrográfica do curso médio do rio Teles Pires
da Natureza farm and the base saturation was high only in the Teles Pires River with
values of 68% from 0-0.2 m. All ETs presented values below the prevention guidelines
established by CONAMA 420/2009.
INTRODUÇÃO
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MATERIAIS E MÉTODOS
Área de estudo
Figura 1. Localização na bacia hidrográfica do Médio Curso do Rio Teles Pires, no município de Alta
Floresta/MT.
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Panorama geral de fertilidade e teores de elementos-traço na bacia hidrográfica do curso médio do rio Teles Pires
Procedimentos metodológicos
Ao longo das margens direita e esquerda do Rio Teles Pires, foram determinados
seis ambientes. Para cada ambiente foram escolhidos aleatoriamente 18 áreas, distanciadas
entre 5 e 10 km. Foram coletadas amostras simples nas profundidades de 0-0,2 e 0,2-0,40
m totalizando 18 pontos de amostragem (Figura 2).
Figura 2. Pontos de coletas de amostragens de solo na Bacia Hidrográfica do Médio curso do Rio Teles
Pires no município de Alta Floresta – MT.
As coletas das amostras de solo foram feitas na Fazenda Encanto da Natureza (Cambissolo
Háplico), Fazenda São José (Latossolo Vermelho), Rio Teles Pires (Gleissolo Háplico), Fazenda
Estrada do Espanhol (Argissolo Vermelho-Amarelo), Comunidade Bonfim (Argissolo Vermelho-
Amarelo) e Fazenda Vaca Branca (Latossolo Vermelho) com auxílio do trado holandês.
Foram determinados os atributos químicos relacionados à fertilidade do solo conforme a
metodologia da EMBRAPA (2017), sendo determinadas as variáveis: pH H2O, cátions trocáveis
(Ca2+, Mg2+ e K+), acidez trocável (Al3+); acidez potencial (H + Al), fósforo disponível e matéria
orgânica (MOS), via úmida pela oxidação com K2Cr2O7 0,0667 mol L-1 e posterior titulação com
sulfato ferroso amoniacal. Fósforo (P) e potássio (K+) foram extraídos com a solução Mehlich-1;
magnésio (Mg2+), cálcio (Ca2+) e alumínio (Al3+) extraídos com KCl 1 mol L-1.
A partir dos resultados das análises químicas de solo, foram calculados os valores
de soma de bases (SB), CTC efetiva (t), CTC total (T), saturação por alumínio (m) e
saturação por bases (V). As interpretações dos atributos químicos da fertilidade do solo
foram feitas utilizando-se os critérios adotados por Souza e Lobato (2004), Villar (2007)
e Ribeiro, Guimarães e Alvarez (1999).
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Entre os atributos físicos, foram determinadas a granulometria (areia, silte e argila) pelo
laboratório da Empresa Mato-grossense de Pesquisa, Assistência e Extensão Rural (EMPAER-MT).
As análises granulométricas foram determinadas pelo método da pipeta, conforme
descrito pela EMBRAPA (2017).
As análises de Cr, As, Cd, Pb e Zn foram realizadas no laboratório Campo – Centro
de Tecnologia Agrícola e Ambiental de Paracatu - MG seguindo o método USEPA 3050B,
da Agência de Proteção Ambiental dos EUA (USEPA, 1998).
Para testar o conjunto de variáveis entre os ambientes foi realizado o teste não-
paramétrico de Kruskal-Wallis (p < 0,05) e quando significativo, foi aplicado o teste post-hoc
de Dunn (p < 0,05). Todas as análises estatísticas foram realizadas utilizando o Software R.
RESULTADOS
Tabela 1. Classes Texturais e granulometria nos diferentes tratamentos e suas profundidades na Bacia
Hidrográfica do curso Médio do Rio Teles Pires no município de Alta Floresta – MT.
Classificação do solo --Classes Texturais-- Granulometria (%)
Ambientes
próximos aos ambientes 0-0,2 m Areia Silte Argila
Faz. Encanto da Natureza Cambissolo Háplico Franco 61,3 16,0 22,7
Faz. São José Latossolo Vermelho-Amarelo Franco-argilo-arenosa 60,0 14,0 26,0
Rio Teles Pires Gleissolo Háplico Franco-argilo-arenosa 68,7 11,3 20,0
Faz. Estrada do Espanhol Argissolo Vermelho Amarelo Franco-arenosa 76,0 67,0 17,3
Comun. Bonfim Argissolo Vermelho Amarelo Franco-argilo-arenosa 63,3 87,0 28,0
Faz. Vaca Branca Latossolo Vermelho Argilo-arenosa 55,3 87,0 36,0
Classificação do solo
Ambientes 0,2-0,4 m Areia Silte Argila
próximos dos ambientes
Faz. Encanto da Natureza Cambissolo Háplico Franco-argilo-arenosa 59,3 14,7 26,0
Faz. São José Latossolo Vermelho Amarelo Franco-argilosa 50,7 13,3 36,0
Rio Teles Pires Gleissolo Háplico Franco-argilo-arenosa 56,0 12,0 32,0
Faz. Estrada do Espanhol Argissolo Vermelho Amarelo Franco-argilo-arenosa 71,4 73,0 21,3
Comun. Bonfim Argissolo Vermelho Amarelo Franco-argilo-arenosa 56,0 93,0 34,7
Faz. Vaca Branca Latossolo Vermelho Argilosa 45,3 87,0 46,0
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Panorama geral de fertilidade e teores de elementos-traço na bacia hidrográfica do curso médio do rio Teles Pires
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Panorama geral de fertilidade e teores de elementos-traço na bacia hidrográfica do curso médio do rio Teles Pires
Os teores de alumínio (Al3+) encontrados neste estudo foram maiores nas Fazendas
Encanto da Natureza e São José. Consequentemente, a acidez trocável, potencial e saturação
por alumínio também apresentaram maiores valores nestes dois ambientes (Tabela 2).
A disponibilidade do Al3+ está associada à acidez do solo, sendo neste estudo as
Fazendas Encanto da Natureza, São José, Comunidade Bonfim e Fazenda Vaca Branca
apresentaram acidez elevada (pH <5,0) e os ambientes Rio Teles Pires e Fazenda Estrada
do Espanhol acidez média (pH 5,2 a 5,5), conforme Souza e Lobato (2004).
De acordo com Primavesi (2006), solos ácidos são comuns em regiões tropicais
devido às elevadas precipitações, que são capazes de lixiviar quantidades apreciáveis
de bases trocáveis da camada superficial do solo. A acidez potencial caracteriza o poder
tampão de acidez do solo e sua estimativa acurada é fundamental para se estimar a
capacidade de troca catiônica a pH 7,0 (CTC) (CAMPOS et al., 2018).
Observou-se, na Tabela 2, que não houve diferença significativa para os teores de
matéria orgânica (MOS), porém, as concentrações foram maiores nas camadas superficiais
quando comparadas com as camadas subsuperficiais. Os teores de MOS foram baixos em
todos os ambientes e entre profundidades. As concentrações médias neste estudo variaram
de 1,03 - 1,43 dag kg-1.
Para Brady (1989), a textura do solo parece exercer influência sobre a quantidade de
matéria orgânica. O autor explica que um solo arenoso contém, em geral, menor quantidade
de matéria orgânica do que outro com textura mais fina. Isto, provavelmente, devido ao
menor teor de umidade e à oxidação mais rápida ocorrerem em solos mais arenosos.
Neste estudo observou-se que teores maiores de MOS foram encontrados na Fazenda
Vaca Branca, cuja textura é argilosa, porém não foi observado o mesmo efeito na Fazenda
São José que apresenta também textura argilosa. Esperava-se que por serem solos de
mesma classificação (Latossolos), mesma textura (argilosa) e áreas que cultivam soja
fossem apresentar as maiores concentrações de MOS em relação aos demais ambientes.
Portanto neste caso não houve somente a influência da textura, mas a relação com outros
fatores como o manejo do solo, a cobertura vegetação no local e entre outros fatores
responsáveis pela degradação acelerada da MOS.
Para Soma de base (SB), Capacidade de Troca Iônica Efetiva (t) e Capacidade
de Troca Catiônica a pH 7,0 (T), não houve diferença significativa entre ambientes e
profundidade. Porém a SB variou entre 1,60 - 4,43, sendo registrado o menor valor na
Fazenda São José e o maior na Fazenda Vaca Branca. A Capacidade de Troca Iônica
Efetiva (t) e Capacidade de Troca Catiônica a pH 7,0 (T) registaram maiores valores na
Fazenda Encanto da Natureza na camada de 0-20 cm.
Na área em estudo, a saturação por bases em todos ambientes foi abaixo de 50%,
indicando fertilidade baixa, exceto no Rio Teles Pires, classificando-o como solo fértil, V
com valores de 67,73% de 0-0,2 m e 54,07% no 0,2-0,4 m.
De acordo com Moreira (2016) os solos do bioma amazônico podem ser divididos
em solos de várzea e de terra firme. Para Guimarães et al. (2013) os solos de várzea como
Gleissolos e Neossolos Flúvicos são eutróficos, com elevados teores de Ca2+ e Mg2+ e
CTC elevada, sendo essa maior fertilidade relacionada à presença de minerais do tipo
2:1, como vermiculita, montmorilomita e ilita. Já os solos de terra firme são de baixa
fertilidade, com teores de Ca2+, Mg2+, K+ e P baixos e teores elevados de Al3+ trocável. Essa
baixa fertilidade está relacionada à pobreza do material de origem e à intensa lixiviação
de bases nesses solos (QUESADA et al., 2011).
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 753
Ademilso Sampaio de Oliveira • Maria Aparecida Pereira Pierangeli • Humbelina Silva Siqueira Lopes •
Juberto Babilônia de Sousa • Antônio Carlos Silveiro da Silva • Carla Galbiati
Vale Junior et al. (2011) afirma que em solos da Amazônia além das características
de extrema pobreza em fósforo; apresentam também acidez elevada; saturação por
alumínio alta; baixa CTC; pobreza em macro e micronutrientes; reduzida fixação de
fósforo; densidade do solo elevada; adensamento e susceptibilidade à compactação.
Os resultados de teores micronutrientes são apresentados na Tabela 3 na profundidade
de 0-0,2 m apenas os teores de Cu e Zn apresentaram diferenças significativas, sendo os
demais semelhantes entre si. Já na profundidade de 0,2-0,4 m, apenas os teores de Fe e
Mn apresentaram diferenças significativas pelo pós teste de Dunn (p < 0,05).
Os teores de Cu e Fe foram altos na Fazenda Entrada do Espanhol, na profundidade
de 0-0,2 m, sendo os teores de Cu médios nos demais ambientes. Já os teores de Fe foram
baixos em todos os ambientes em ambas as profundidades, conforme Tabela 3.
Tabela 3. Teores de micronutrientes do solo na bacia hidrográfica do médio curso do Rio Teles Pires no
município de Alta Floresta – MT.
Prof. Tratamentos
Caraterística Faz. Faz.
(mg dm-3) Faz. En. da Faz. São Rio Teles Com.
(m) Estrada do Vaca
natureza José Pires Bonfim
Espanhol Branca
0-0,2 0,39 b 1,13 ab 2 ,04 a 1,90 ab 0,65 b 0,87 b
Cu
0,2-0,4 0,55 b 0,62 b 1,84 a 0,63 b 0,86 ab 0,29 b
0-0,2 11,58 a 9,30 a 6,26 a 7,16 a 8,26 a 6,80 a
Fe
0,2-0,4 7,20 a 5,96 a 7,63 a 6,13 a 7,73 a 5,30 a
0-0,2 3,11 a 1,56 a 3,96 a 3,26 a 2,49 a 2,53 a
Mn
0,2-0,4 5,70 a 1,13 a 4,33 a 1,18 a 1,40 a 1,47 a
0-0,2 1,68 a 0,82 a 1,57 a 1,06 a 0,40 b 3,90 a
Zn
0,20-0,4 0,58 b 0,26 b 0,83 a 0,36 b 0,15 b 0,67 b
0-0,2 0,76 a 0,80 a 0,73 a 0,77 a 0,86 a 0,94 a
B
0,2-0,4 0,81 b 0,80 b 0,74 b 0,81 b 0,86 b 0,99 a
Médias seguidas de mesma letra minúscula na linha não diferem pelo teste de Kruskal-Wallis com pós
teste de Dunn a 5% de significância.
754 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
Panorama geral de fertilidade e teores de elementos-traço na bacia hidrográfica do curso médio do rio Teles Pires
Tabela 4. Elementos-Traços na Bacia hidrográfica do Curso Médio do Rio Teles Pires no município de
Alta Floresta – MT
Ambientes (mg kg-1)
Prof
Variável Faz. Enc. da Faz. São Rio Teles Faz. Estrada Comun. Faz. Vaca
(m)
natureza José Pires do Espanhol Bonfim Branca
Cr 3,23 a 11,67 a 9,40 a 3,60 a 5,27 a 9,07 a
As 0,80 a 0,37 a 0,70 a 0,33 a 0,33 a 0,63 a
0-0,2 Cd 0,57 a 0,73 a 0,76 a 0,50 a 0,57 a 0,80 a
Pb 30,40 a 43,03 a 27,61 a 21,83 a 39,40 a 26,47 a
Zn 37,77 a 46,73 a 35,35 a 26,83 a 10,87 a 44,17 a
Cr 4,60 a 7,90 a 7,86 a 5,50 a 5,51 a 10,19 a
As 1,27 a 8,80 a 0,43 a 0,40 a 0,33 a 1,27 a
0,2-0,4 Cd 0,55 a 1,37 a 0,61 a 0,67 a 0,52 a 0,69 a
Pb 33,28 a 42,20 a 33,61 a 38,03 a 30,45 a 25,48 a
Zn 31,84 a 70,80 a 15,18 a 10,13 a 27,79 a 25,90 a
Médias seguidas de mesma letra minúscula na linha não diferem entre si pelo teste de Kruskal Wallis com
pós teste de Dunn a 5% de significância.
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 755
Ademilso Sampaio de Oliveira • Maria Aparecida Pereira Pierangeli • Humbelina Silva Siqueira Lopes •
Juberto Babilônia de Sousa • Antônio Carlos Silveiro da Silva • Carla Galbiati
Tabela 6. De acordo com alguns autores Valores de Referência de Qualidade (VRQ) dado em mg kg-1
para solos
Santos e Alleoni Preston et al. Consonni
ET (2012) (2014) (2015)
MT e RO RN SP
Cd <0,3 0,07 1,53
Pb 8,16 10,99 -
As - - -
Cr 59,1 23,04 47
Zn 9,3 17,98 61
756 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
Panorama geral de fertilidade e teores de elementos-traço na bacia hidrográfica do curso médio do rio Teles Pires
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 757
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regionais (SOUZA, 2015). O autor ainda acrescenta que esses valores refletem o teor
natural de determinado elemento no solo sem introdução via atividade antrópica e são
importantes no sentido da identificação de locais suspeitos de contaminação.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A maioria dos solos das áreas avaliadas apresentou textura média, sendo a textura
argilosa foi encontrada nos ambientes Fazenda São José e Vaca Branca.
Em todos os ambientes, que o pH se apresentou como baixo à profundidade de 0,2-
0,4 m, exceto no Rio Teles Pires, cuja acidez apresenta-se média. Frise-se que há maiores
concentrações, de acordo com os estudos efetuados, de P e K no Rio Teles Pires e baixa
concentração de Ca na camada de 0-0,2 m.
Ademais, os teores de Al3+, acidez potencial e saturação por alumínio mostraram-se
altos, consoante a pesquisa, nos ambientes das Fazendas Encanto da Natureza e São José. Cabe
destacar que todos os ambientes denotam baixa fertilidade do solo, com exceção do ambiente do
Rio Teles Pires, este com solo que pode ser considerado fértil de acordo os parâmetros utilizados.
Pode-se constatar que a concentração dos elementos-traço não apresentou diferença
significativa entre as profundidades e ambientes, bem como as concentrações de Cd, Pb, Zn, Cr e
As, em todos os ambientes estudados, pois estiveram abaixo dos valores de prevenção estabelecida
pelo CONAMA 420/2009, exceto Cd na Fazenda São José que excedeu o estabelecido.
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758 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
Panorama geral de fertilidade e teores de elementos-traço na bacia hidrográfica do curso médio do rio Teles Pires
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 759
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Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 761
Natan Gurkewicz Nunes • Evaldo Ferreira
762 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
Análise da concentração demográfica na cidade de Vilhena-RO por meio da política de polarização regional
INTRODUÇÃO
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 763
Natan Gurkewicz Nunes • Evaldo Ferreira
contexto político histórico do Território Federal do Guaporé, passando pelo Território Federal
de Rondônia até chegar ao Estado atual. Isso quer dizer, como o subtítulo referência, que parte
da abordagem formal, documentada e planejada, que resultaram nas ações posteriores, que
produziram Rondônia e que ressignificaram seus elementos planejadamente, incluindo, por
conseguinte, o mesmo modelo, para suas partes constituintes (cidades e regiões), revelando
ser um processo sofisticado de controle e reprodução de um modo de formação da sociedade.
Machado (1982) enxerga nesse contexto das “fronteiras”, a necessidade de redefinição
do termo Geopolítica, pois, para ela, o Governo Militar, que estava em voga na época,
utilizou de práticas e conhecimentos que necessitaram atualizar o termo. Para a autora:
764 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
Análise da concentração demográfica na cidade de Vilhena-RO por meio da política de polarização regional
Oliveira (1993) observa que a Amazônia Legal foi criada para efeito de ação
governamental do Governo Militar relacionada a um ato político nacionalista.
Transcorridos alguns anos coube ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária
(Incra) estruturar a colonização. Na região de Vilhena verifica-se apenas uma ação nesse
sentido: o Projeto Integrado de Colonização – Paulo de Assis Ribeiro, com Colorado do
Oeste como cidade principal de uma área de 293.580 hectares, que começou a receber
famílias desde 1974. Entretanto, destaca o autor, “Vilhena, na BR-364, é o centro urbano
mais importante próximo ao projeto” (idem, p. 104).
Para Oliveira (p. 91-93), os “[...] projetos de colonização na Amazônia têm obedecido
a processos diversos, porém todos com raízes fincadas na questão da estrutura fundiária
concentrada do país”. Nesse contexto, os grandes grupos econômicos enxergaram os
projetos de colonização como a terra equivalendo à mercadoria.
Para Batista (2014), o Plano de Integração Nacional (entre 1965 e 1974) focou no
sistema rodoviário como modo de interligar o Território Federal do Guaporé ao restante
da Nação, por meio da BR-364 (antiga BR-029, de Juscelino Kubitschek). Souza (2011),
por sua vez, destaca que já havia uma rota hidrográfica pelo rio Amazonas desde a
época colonial e que a abertura das BRs 364 e 425 “seriam as bases para a modificação
radical do cenário social e humano do Território” (p. 22). De fato, ao voltar os olhos para
Vilhena de hoje, nenhum vislumbre de desenvolvimento seria possível, caso o sistema de
escoamento e mobilidade fosse de base hidrográfica.
Resolvido o problema do traslado, era necessário planejar a forma como seria alcançado
o desenvolvimento do Território Federal de Rondônia. O modo germinal escolhido foi o
Programa de Polos Agropecuários e Agrominerais da Amazônia (Polamazônia) (1974 a 1980)
que, em pleno “milagre econômico” do Governo gerido por militares, eram polos privados,
subsidiados com benefícios fiscais pelo Estado, reafirmava a ocupação (desmatamento) e
incentivava a implantação de agricultura. (BATISTA, 2014, p. 22). Nesse contexto, observa
Kohlhepp (2002, p. 39): “investidores de capital nacional e internacional foram atraídos por
reduções consideráveis de taxas tributárias e também por outros benefícios”.
Ainda para Kohlhepp (2002), problemas ambientais graves foram surgindo graças
a esse tipo de projeto, como queimadas, dizimação de ecossistemas, erosões, exploração
de recursos minerais sem controle, além de problemas sociais oriundos da especulação
sobre a terra. Outro equívoco que acabou acarretando na organização das regiões desde
então foi, segundo o autor:
A “Amazônia Legal”, a partir dos anos de 1980, passou a ser visada pelo Governo
Militar devido a vários potenciais. Surge então o Programa de Desenvolvimento Integrado
do Noroeste do Brasil (Polonoroeste), financiado pelo Banco Mundial, que focava no
agora estado de Rondônia (torna-se Estado em 1981) e na porção noroeste de Mato
Grosso, implantando um novo conceito de desenvolvimento, focado numa classe rural
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 765
Natan Gurkewicz Nunes • Evaldo Ferreira
mais pobre e de zona pioneira, baseando-se nas seguintes premissas: grupo alvo rural
pobre, em estratégias para satisfação de necessidades básicas e incentivos para métodos
participativos. (KOHLHEPP, 2002, p. 40-41).
Ocorre que transcorrida toda a década de 1980 o saldo do Polonoroeste era de
desmatamento desenfreado e inúmeros conflitos territoriais, além de outros sérios
problemas constados em relatórios, reconhecido pelo próprio Banco Mundial, devido o
perfil do Projeto. (BORGES, 2012, p. 80).
Em contraponto ao modo operante de expansão desregrada desse Projeto, o Governo
Federal elabora e implanta, em 1986, o Plano Agroflorestal e Agropecuário do Estado de
Rondônia (Planafloro), que, para Acserald (2002, p. 53), “foi pensado como forma de tornar
compatíveis o desenvolvimento econômico e a preservação ambiental nas zonas florestadas
do estado de Rondônia” devido o resultado do desmatamento oriundo do Polonoroeste.
O que se verifica é a modificação de postura ante aos problemas sociais e ambientais
da época, que suscitaram uma nova abordagem institucional, apoiada pelo próprio Banco
Mundial (pois a preocupação ecológica era de nível global), de um Polonoroeste que
focava na “[...] intensa ocupação e criação de núcleos urbanos”, para um Planafloro, com
“[...] tom conservacionista, porém incentivando ainda a produção e inserção do Brasil em
mercados internacionais”. (BORGES, 2012, p. 84).
Entretanto, ainda que a orientação dos financiadores desfocassem na construção
das estradas como forma de diminuição do desmatamento, como era esperado devido à
aceitação do plano mais conservacionista, não foi o que ocorreu na prática, e os produtores
agropecuários juntamente com os governos (federal e estadual) continuaram a avançar
fronteira. (BORGES, 2012, p. 86).
Retomando a pauta, apresenta-se o Estado como foco pelo aspecto gestor e legislador
de ações que viabilizam a estratégia de capacitar a estrutura regional, se emulando em
forma de políticas e planos que orientam as funções e principalmente as aspirações
das localidades, em que a estratégia regional se materializa como meio de gestão mais
próximo dos predicados setorizados.
De modo que as regionalizações são políticas e ideológicas, seus engendradores
utilizaram do positivismo quantitativista para criarem um organismo articulador de modo a
tender seguir uma hierarquia arbitrária para cada região, que Perroux postula pela existência
de uma indústria motriz, chave ou o complexo (WILTGEN, 1991, p. 533), o que hoje não é a
regra, pois existem diversificados polos, seja de bens, serviços ou produção. No caso em tela,
pode-se dizer que Vilhena-RO possui, como força motriz um combo formado por localização,
características ambientais e econômicas, que a tornaram e a tornam um centro centrípeto.
Analisando o Produto Interno Bruto (PIB) da região, referente ao ano de 2017 (IBGE,
2020b), nota-se que dos pouco mais dos R$4 bilhões gerados, aproximadamente 60% (R$2.555
bi) corresponde ao de Vilhena. No montante, a agropecuária representou apenas 18% do PIB
da região. Em valores totais, Corumbiara foi o maior gerador de PIB na agropecuária, nesse
município, entretanto o setor representou 68,74% do PIB total. Em Vilhena a agropecuária
representou apenas 6,37%. Em nível regional foi o segundo maior valor, aproximadamente
R$162 milhões, inferior apenas ao de Corumbiara (aproximadamente R$227 milhões).
Chama a atenção em Vilhena a concentração industrial, sendo que 78% do PIB
regional desse setor foi proveniente somente de Vilhena. Contudo, em relação ao PIB
total do município, o setor da indústria correspondeu a somente 16,14%, evidenciando
assim, que a indústria na região é pouco representativa.
766 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
Análise da concentração demográfica na cidade de Vilhena-RO por meio da política de polarização regional
Moreira (2014, p. 5), discutindo sobre formação social, faz a seguinte colocação sobre
a geografia mundial: “a peculiaridade da geografia mundial é o combinado de fragmentação
política e unidade econômica”. A paráfrase no contexto regional se encaixa muito bem, sendo
a peculiaridade da formação regional o combinado de fragmentação político-administrativa
municipal e a unidade em torno de uma economia, nesse caso, leia-se agronegócio.
Corrêa (2006), em sua análise sobre a rede urbana na Amazônia, realizada em 1987,
descreve como decorre o processo de urbanização concentrada focado nas capitais dos
estados do Norte do País e discorre:
Tal descrição, ao passar de mais de três décadas, pode ser posta em paralelo ao
que se verificou em uma escala maior: a Região de Vilhena (Figura 1). Dado este que
reflete um modo reprodutivo de urbanização “em face das mudanças na esfera produtiva
e nas relações de produção, envolvendo a ocupação espontânea ou dirigida da região [...]”
(CORRÊA, 2006, p. 230), no caso em tela, trata-se de uma ocupação dirigida.
A região de Vilhena é o caso mais centralizador do Estado (se não levarmos em
consideração a capital), dos 31.449 habitantes de aumento populacional que a região
apresentou no período (2008-2019), 28.110 foram no polo (Tabela 1).
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 767
Natan Gurkewicz Nunes • Evaldo Ferreira
768 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
Análise da concentração demográfica na cidade de Vilhena-RO por meio da política de polarização regional
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 769
Natan Gurkewicz Nunes • Evaldo Ferreira
A Tabela 2 demonstra que Vilhena tem diversos atributos vantajosos em relação ao restante
dos integrantes da região, ainda que possua em seu território o parque indígena Aripuanã, que
corresponde a 57,15% do território do município (TERRAS INDÍGENAS, 2018). O segundo
maior em área, Pimenteiras do Oeste, é o município com a menor população do Estado, grande
parte de sua extensão territorial situa-se na “Planície fluvial dos rios Madeira-Mamoré-Guaporé”
e na “Depressão do rio Guaporé”, é composta em grande parte por várzeas nas planícies fluviais e
áreas embrejadas da planície fluviolacustre do rio Guaporé (DANTAS; ADAMY, 2010, p. 42-46).
Outros municípios que também possuem em seus territórios tais características
são Cerejeiras e Corumbiara, entretanto situam-se com maior proporção no Alto Vale
do Guaporé, área com presença de avanço da fronteira agrícola (idem, p. 46). Nota-
se que Vilhena possui elementos históricos, demográficos e fisiógrafos vantajosos em
comparativo com seus conterrâneos de região definida pelo Estado.
Uma fonte histórica que colabora com esse entendimento é o boletim da Embrater
de 1987. Nessa cartilha produzida pelo Governo do Estado, aparece uma espécie de aval
para a produção da soja em Vilhena, dado que a madeira na região já estava em saturação.
(EMBRATER, 1987, p. 7-8).
No Quadro 2 observa-se a organização da estrutura da região de influência em que
Vilhena está inserida. Cabe destacar que esta localiza-se num “vazio” entre cidades, em
que o núcleo equivalente ao de Vilhena mais próximo é a cidade de Cacoal que está a uma
distância de 226,2 km, via BR-364. Além de apresentar certa distância entre os próprios
componentes da sua região de influência, influenciando ainda duas cidades do estado do
Mato Grosso (Comodoro e Campos de Júlio).
770 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
Análise da concentração demográfica na cidade de Vilhena-RO por meio da política de polarização regional
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Por mais que as orientações administrativas possuam contradições, é certo que são
necessários o envolvimento e a intervenção político-administrativa para orientarem e tornarem
concretas quaisquer propostas de desenvolvimento. Contudo, a crítica a ser feita é quanto à altivez
e à qualidade de desenvolvimento social de tais planos, que deveriam seguir um tratamento menos
economicista e focado mais no bem estar social, quando possível, isonômico. O regional e a
polarização nesse sentido se colocam como ferramentas úteis se bem elaborados e concretizados.
Para tanto, é fundamental que se conheça as características do objeto que se pretende planejar.
Dentro dos resultados apresentados tem-se o entendimento de que a concentração
demográfica se deu pelo sistema de ações: força de trabalho, inserção de capital e
intenções político-ideológicas, resultando na produção de monocultura como sistema de
objetos, que por sua vez demanda uma estrutura, ou, uma nova forma de sistema de ações,
que retroalimentam a estrutura, entretanto, reservado a cada objeto (cidade) dentro do
sistema uma função, uma finalidade, um valor, ou seja, uma ação intencionada pautada na
produção econômica e no consumo.
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 771
Natan Gurkewicz Nunes • Evaldo Ferreira
REFERÊNCIAS
772 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
Análise da concentração demográfica na cidade de Vilhena-RO por meio da política de polarização regional
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 773
Hélio Marques de Lira • Almir Mateus Melo • Siane Cristhina Pedroso Guimarães Silva
1 Licenciado e Bacharel em Geografia. Pesquisador do Grupo de Pesquisa de Geografia e Cartografia -LABCART/UNIR. Universidade
Federal de Rondônia, Porto Velho, RO. E-mail: heliounir@gmail.com.
2 Licenciado em Geografia. Pesquisador do Grupo de Pesquisa de Geografia e Cartografia -LABCART/UNIR. Universidade Federal
de Rondônia, Porto Velho, RO. E-mail matehusmello36@gmail.com.
3 Docente no Departamento de Geografia e no PPGG/UNIR. Pesquisador do Grupo de Pesquisa de Geografia e Cartografia
-LABCART/UNIR - www.labcart.com.br. E-mail: sianecpg@unir.br.
774 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
Alterações na espacialidade da cobertura vegetal no projeto de
assentamento florestal Jequitibá detectados por imagens de satélites de média e alta resolução
since its creation in 2003, 33.48% of the Jequitibá Forest Settlement Project vegetation
cover has already been changed.
INTRODUÇÃO
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 775
Hélio Marques de Lira • Almir Mateus Melo • Siane Cristhina Pedroso Guimarães Silva
776 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
Alterações na espacialidade da cobertura vegetal no projeto de
assentamento florestal Jequitibá detectados por imagens de satélites de média e alta resolução
PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 777
Hélio Marques de Lira • Almir Mateus Melo • Siane Cristhina Pedroso Guimarães Silva
778 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
Alterações na espacialidade da cobertura vegetal no projeto de
assentamento florestal Jequitibá detectados por imagens de satélites de média e alta resolução
A área de estudo que abrange o PAF Jequitibá contém um total de duas cenas do
Satélite Sentinel 2/MSI, que são as órbitas 20 LMR e 20 LNR. As imagens de satélite
foram obtidas entre os meses de junho a setembro, devido a menor cobertura de nuvens.
A análise das imagens de satélites dos anos de 2015 a 2019, período de nosso projeto e
processadas com o auxílio do Software Livre QGis 2.18.28 instalado em um computador forneceu
uma grande quantidade de dados geocodificados. Os dados gerados foram utilizados para a criação
de um Banco de Dados geocodificados da área de estudo, que por sua vez nos possibilitou delimitar
e quantificar as áreas com alterações na cobertura vegetal no período de 2015 a 2019, e ainda na
análise do uso e ocupação do solo na área do PAF Jequitibá a luz da legislação vigente conforme
o Decreto 6514/2008, Lei de Crimes Ambientais 9605/1998, as Portarias 1.141/2003 e 37/2007,
Portaria INCRA 215/2006 e a Lei 233/2000 alterada pela Lei 312/2005 (Figura 2).
Após todo o tratamento das imagens dos satélites Landsat 8 OLI/TIRS e Sentinel-2
MSI ainda utilizando o software QGis 2.18.28, na imagem do satélite Landsat 8 gerada
do ano de 2015, foram calculadas as áreas com alterações da cobertura vegetal em
comparação com as áreas ainda com cobertura vegetal de floresta nativa, onde essas áreas
com alterações na espacialidade se constituem no acumulado dos anos anteriores, não
sendo somente referente ao ano de 2015.
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 779
Hélio Marques de Lira • Almir Mateus Melo • Siane Cristhina Pedroso Guimarães Silva
Paisagem e espaço não são sinónimos. A paisagem é o conjunto de formas que, num
dado momento, exprimem as heranças que representam as sucessivas relações localizadas entre
homem e natureza. O espaço são essas formas mais a vida que as anima. (SANTOS, 2006).
Segundo Milton Santos (1980) “A natureza se encontra em estado de movimento
permanente e cada um dos seus momentos é fugaz”. Entretanto, o crescimento das comunidades
não só concentrou o impacto ambiental das ações antrópicas, como também significou que
seria muito mais difícil para a humanidade escapar das consequências de seus atos.
A história da humanidade não pode ser compreendida como se fosse um espaço vazio
e nem o espaço pode ser compreendido como se fosse desgarrado de outros elementos.
O espaço, afetado pela ação antrópica em largo período de tempo, embora a quantidade
de terra no globo tenha permanecido essencialmente constante, sua distribuição tem sido
radicalmente alterada. Havendo em diversos períodos uma transição da forma de ser do
homem conforme as mudanças culturais e climáticas.
Os movimentos da sociedade, atribuindo novas funções às formas geográficas,
transformam a organização do espaço, criam novas situações de equilíbrio e ao mesmo
tempo novos pontos de partida para um novo movimento. Por adquirirem uma vida,
sempre renovada pelo movimento social, as formas — tornadas assim formas-conteúdo
— podem participar de uma dialética com a própria sociedade e assim fazer parte da
própria evolução do espaço (SANTOS, 2006).
Estratégias de inserir o espaço amazônico no contexto do desenvolvimento
nacional se iniciaram na década de 1970 pelo Governo Federal, onde foi desenvolvido
um conjunto de ações que visavam atrair produtores rurais de todas as regiões do Brasil,
com o intuito de ocupar a Amazônia. Com o objetivo de abrir uma nova fronteira agrícola
e diminuir tensões sociais em outras regiões do país, o Governo Federal incentivou um
intenso processo de ocupação territorial em Rondônia, causando uma aceleração no
desmatamento sem precedentes (BECKER, 1982).
Foi criado pelo Governo Federal, através do INCRA, um modelo de assentamento
específico para a região amazônica, denominado Projeto de Assentamento Florestal-PAF
(Figura 3). Rondônia foi o precursor com o PAF Jequitibá, que é voltado para o manejo
de recursos florestais em áreas com aptidão à produção florestal familiar comunitária e
sustentável. O PAF é balizado na promoção do desenvolvimento rural e no fortalecimento
da agricultura familiar, combinando viabilidade socioeconômica com sustentabilidade
ambiental. Tal modelo tem por finalidade possibilitar a transição das práticas atuais
de agricultura, ainda baseadas no sistema de derrubada e queima, para modelos de
sustentabilidade, com o agricultor interagindo com a floresta e dela retirando parte do que
precisa para a sua sobrevivência (MIRANDA et al., 2010).
780 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
Alterações na espacialidade da cobertura vegetal no projeto de
assentamento florestal Jequitibá detectados por imagens de satélites de média e alta resolução
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 781
Hélio Marques de Lira • Almir Mateus Melo • Siane Cristhina Pedroso Guimarães Silva
782 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
Alterações na espacialidade da cobertura vegetal no projeto de
assentamento florestal Jequitibá detectados por imagens de satélites de média e alta resolução
limitada a no máximo 10ha por família. As atividades florestais de muito baixo impacto,
desenvolvidas por comunidades tradicionais para subsistência com sobra residual para
o comércio, que dispensarem licenciamento, deverão ser preservadas (BRASIL, 2006).
Na implantação definitiva do PAF no ano de 2007 os lotes foram delimitados com
áreas de 100ha na porção norte e de 500 ha na porção sul, não respeitando o que indicava
a Portaria INCRA nº 215 de 06 de junho de 2006 que previa área de 150 a 300ha para cada
unidade produtiva de exploração individual.
Melhores métodos de avaliação e planejamento surgiram, devido ao crescente aumento nas
alterações na espacialidade da cobertura vegetal na superfície terrestre. Em decorrência surgiram
benefícios no gerenciamento dos recursos naturais, como é o caso da integração do sensoriamento
remoto, sistemas de informações geográficas e cartografia digital, que proporcionou meios para
se obter, armazenar e manipular grandes quantidades de dados geocodificados, visualizá-los e
analisá-los, com um custo relativamente baixo, ampliando a eficiência da fiscalização e reduzindo
os custos operacionais para realizar o mesmo trabalho através de verificações em campo.
O monitoramento das alterações na cobertura vegetal da área do PAF Jequitibá forneceu
grande quantidade de dados geocodificados que pode, após suas análises, subsidiar futuras ações
de fiscalização tornando-as mais eficientes e com custos operacionais mais reduzidos. Pode,
também, identificar os lotes do que estão respeitando ou não a legislação ambiental em vigor e
em consonância com legislação específica do Projeto de Assentamento Florestal, instituída pela
Portaria/INCRA nº 1.141/2003 e aprovado pela Portaria/INCRA nº 37 de 18 de julho de 2007.
Legislação
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 783
Hélio Marques de Lira • Almir Mateus Melo • Siane Cristhina Pedroso Guimarães Silva
Art. 12. Todo imóvel rural deve manter área com cobertura de vegetação nativa,
a título de Reserva Legal, sem prejuízo da aplicação das normas sobre as Áreas
de Preservação Permanente, observados os seguintes percentuais mínimos em
relação à área do imóvel:
I - Localizado na Amazônia Legal:
a) 80% (oitenta por cento), no imóvel situado em área de florestas.
Então o novo código florestal brasileiro obriga que todas as propriedades e/ou
ocupações na Amazônia legal brasileira tenha 80% de sua área a título de reserva legal,
podendo ser explorada somente com autorização do órgão ambiental competente e depois
de ter um plano de manejo florestal aprovado, caso contrário serão tomadas as medidas
criminais e administrativas por parte dos órgãos ambientais e polícia ambiental.
A Lei nº 9605, de 12/02/1998 – Lei de Crimes Ambientais dispõe sobre as sanções
penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente, e
dá outras providências.
O Decreto nº 6.514, de 22/07/2018 dispõe sobre as infrações e sanções administrativas
ao meio ambiente, estabelece o processo administrativo federal para apuração destas
infrações, e dá outras providências. Deste modo, o Decreto nº 6.514/08 regulamenta a
Lei nº 9.605/98, lei essa dos crimes ambientais, em que o decreto estabelece o processo
administrativo federal para apuração destas infrações.
Conforme o Zoneamento Socioeconômico - Ecológico do Estado de Rondônia – ZSEE
instituído pela lei complementar n.º 233, de 06/06/2000 alterada pela Lei Complementar n.º
312, de 06/05/2005, a área do PAF Jequitibá está localizada na Zona 2, Subzona 2.1. A Zona
2 é composta de áreas de uso especial, abrangendo 34.834,42 km², equivalentes a 14,60 % da
784 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
Alterações na espacialidade da cobertura vegetal no projeto de
assentamento florestal Jequitibá detectados por imagens de satélites de média e alta resolução
área total do Estado de Rondônia, destinada à conservação dos recursos naturais, passíveis de
uso sob manejo sustentável. A Subzona 2.1 é composta de áreas que apresentam inexpressiva
conversão das terras florestais, abrange 25.653,37 km², equivalentes a 10,75 % da área total
do Estado de Rondônia, também apresenta potencialidades naturais, sobretudo a florestal,
em condições satisfatórias de exploração madeireira e não-madeireira, apresentando o custo
de oportunidade de preservação entre baixo e médio. No ordenamento da Subzona 2.1 será
priorizado o aproveitamento dos recursos naturais, mantendo as atividades agropecuárias
existentes, sem estímulo a sua expansão, fomentando as atividades de manejo florestal e do
extrativismo, do ecoturismo e da pesca em suas diversas modalidades.
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 785
Hélio Marques de Lira • Almir Mateus Melo • Siane Cristhina Pedroso Guimarães Silva
Art. 12. Todo imóvel rural deve manter área com cobertura de vegetação nativa,
a título de Reserva Legal, sem prejuízo da aplicação das normas sobre as Áreas
de Preservação Permanente, observados os seguintes percentuais mínimos em
relação à área do imóvel:
I - localizado na Amazônia Legal:
a) 80% (oitenta por cento), no imóvel situado em área de florestas (BRASIL
Lei 12.651, 2012).
786 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
Alterações na espacialidade da cobertura vegetal no projeto de
assentamento florestal Jequitibá detectados por imagens de satélites de média e alta resolução
de desflorestamento, sendo um lote com 77,49ha e outro com 23,44ha. Nos dois lotes
houve alteração na espacialidade da cobertura vegetal e descumprimento da legislação
ambiental em vigor, conforme prevê crime ambiental na Lei nº 9.605/98 em seu artigo 40,
e infração administrativa conforme o Decreto nº 6.514/08 em seu artigo 91.
Art. 40. Causar dano direto ou indireto às Unidades de Conservação e às áreas de que trata o art.
27 do Decreto nº 99.274, de 6 de junho de 1990, independentemente de sua localização: Pena -
reclusão, de um a cinco anos. § 1o Entende-se por Unidades de Conservação de Proteção Integral
as Estações Ecológicas, as Reservas Biológicas, os Parques Nacionais, os Monumentos Naturais
e os Refúgios de Vida Silvestre (Redação dada pela Lei nº 9.985, de 2000). § 2o A ocorrência
de dano afetando espécies ameaçadas de extinção no interior das Unidades de Conservação de
Proteção Integral será considerada circunstância agravante para a fixação da pena). § 3º Se o
crime for culposo, a pena será reduzida à metade (BRASIL, 1998).
Art. 91. Causar dano à unidade de conservação: Multa de R$ 200,00 (duzentos reais)
a R$ 100.000,00 (cem mil reais) (BRASIL Decreto 6.514, 2008).
Fonte: LIRA/2014
Figura 5. Fotografias aéreas da Linha 21 (A, B e C) e Linha P 25 (D).
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 787
Hélio Marques de Lira • Almir Mateus Melo • Siane Cristhina Pedroso Guimarães Silva
Fonte: LIRA/2016
Figura 6. Fotografias de desflorestamentos irregulares no PAF Jequitibá no ano de 2016 (A, B, C e D).
788 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
Alterações na espacialidade da cobertura vegetal no projeto de
assentamento florestal Jequitibá detectados por imagens de satélites de média e alta resolução
Lei 12.651 de 25 de maio de 2012 em seu Artigo 12, Inciso I, letra a: Todo imóvel
rural deve manter área com cobertura de vegetação nativa, a título de Reserva
Legal, sem prejuízo da aplicação das normas sobre as Áreas de Preservação
Permanente, observados os seguintes percentuais mínimos em relação à área do
imóvel: I - localizado na Amazônia Legal: a) 80% (oitenta por cento), no imóvel
situado em área de florestas (BRASIL Lei 12.651, 2012).
Lei nº 9.605 de 12 de fevereiro de 1998 no Art. 50-A: Desmatar, explorar
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 789
Hélio Marques de Lira • Almir Mateus Melo • Siane Cristhina Pedroso Guimarães Silva
790 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
Alterações na espacialidade da cobertura vegetal no projeto de
assentamento florestal Jequitibá detectados por imagens de satélites de média e alta resolução
Fonte: LIRA/2007
Figura 8. Acampamento na Linha P 35, margem esquerda do Igarapé Ajuricaba (A, B, C e D).
Fonte: LIRA/2007
Figura 9. Mata ciliar (APP) completamente desflorestada e queimada (A e B).
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 791
Hélio Marques de Lira • Almir Mateus Melo • Siane Cristhina Pedroso Guimarães Silva
Fonte: LIRA/2007
Figura 10. Igarapé Ajuricaba (A) e barracão de reuniões do acampamento (B).
Fonte: LIRA/2007
Figura 11. Fazenda na Linha P 35 (B e C), marco (A) e igarapé (D).
792 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
Alterações na espacialidade da cobertura vegetal no projeto de
assentamento florestal Jequitibá detectados por imagens de satélites de média e alta resolução
Fonte: LIRA/2007
Figura 12. Pasto, Curral, cercas e gado (A, B, C e D).
Fonte: LIRA/2010
Figura 13. Fotografias de áreas sendo queimadas na Linha P 35 (A e D), casa do lote (C) e criação de gado (B).
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 793
Hélio Marques de Lira • Almir Mateus Melo • Siane Cristhina Pedroso Guimarães Silva
Fonte: LIRA/2010
Figura 14 - Fotografias na Linha P 45.
794 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
Alterações na espacialidade da cobertura vegetal no projeto de
assentamento florestal Jequitibá detectados por imagens de satélites de média e alta resolução
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 795
Hélio Marques de Lira • Almir Mateus Melo • Siane Cristhina Pedroso Guimarães Silva
NOTAS
REFERÊNCIAS
796 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
Alterações na espacialidade da cobertura vegetal no projeto de
assentamento florestal Jequitibá detectados por imagens de satélites de média e alta resolução
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 797
Hélio Marques de Lira • Almir Mateus Melo • Siane Cristhina Pedroso Guimarães Silva
798 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
Análise multivariada para estabelecimento de relações de uso e cobertura
da terra e dos tipos de solos nos municípios da bacia do Rio do Sangue - MT/Brasil
RESUMO: Este trabalho tem como objetivo verificar como se estabelecem as relações de uso
e cobertura da terra e dos tipos de solo nos municípios da bacia hidrográfica do Rio do Sangue
utilizando a análise de agrupamento. Foram utilizadas imagens do Landsat-5, de 1990 e 2010,
processadas nos softwares Spring e Arcgis. Foram mapeadas cinco classes de uso e cobertura da terra
e quantificados os tipos de solos presentes nos municípios da bacia, bem como se realizaram análises
de agrupamento utilizando a distância euclidiana como método de dissimilaridade. A pastagem e a
agricultura são os principais tipos de uso nos municípios localizados na bacia hidrográfica do Rio
do Sangue, que vêm suprimindo a vegetação natural e acelerando o processo de desmatamento
na Amazônia Legal brasileira. A análise de agrupamento revela a relação entre as características
pedológicas e de uso da terra nos municípios da bacia hidrográfica do Rio do Sangue.
ABSTRACT: This study was performed in order to verify how to establish the relationships of
land use/land cover and soil types are established in the municipalities of the Rio do Sangue (Blood
Agradecimento:
À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) pelo apoio em forma de bolsa de mestrado.
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 799
Edineia Aparecida dos Santos Galvanin • Jéssica Cocco • Diego de Lima Nascimento
River) basin, using cluster analysis. Images of Landsat-5 from 1990 and 2010, were processed
using Spring and ArcGis software. Five classes of land use/land cover were mapped and soil types
were quantified. Cluster analyses were performed using Euclidean distance as a dissimilarity
method. The pasture and agriculture are the main types of land use in the Rio do Sangue basin,
which have been suppressing the natural vegetation and accelerating the process of deforestation
in the Brazilian Legal Amazon. The cluster analysis demonstrates the relationship between the
pedological characteristics and the land use in the municipalities of the Rio do Sangue basin.
RESUMEN: Este trabajo tiene como objetivo verificar cómo se establecen las relaciones de
uso de la tierra y la cobertura y los tipos de suelo en los municipios de la cuenca hidrográfica de
Rio do Sangue mediante el análisis de conglomerados. Se utilizaron imágenes de Landsat-5,
de 1990 y 2010, procesadas en el software Spring y Arcgis. Se mapearon cinco clases de
uso de la tierra y cobertura y se cuantificaron los tipos de suelos presentes en los municipios
de la cuenca. Por otra parte, se realizó el análisis de conglomerados utilizando la distancia
euclidiana como método de disimilitud. Los pastos y la agricultura son los principales
tipos de uso en los municipios de la cuenca del Río do Sangue. Su avance significó un
retroceso de la vegetación natural acelerando el proceso de deforestación en la Amazonía
Legal brasileña. El análisis de conglomerados revela la relación entre las características
pedológicas y el uso del suelo en los municipios de la cuenca del Río do Sangue.
INTRODUÇÃO
800 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
Análise multivariada para estabelecimento de relações de uso e cobertura
da terra e dos tipos de solos nos municípios da bacia do Rio do Sangue - MT/Brasil
MATERIAL E MÉTODOS
A BHRS situa-se na região noroeste do estado de Mato Grosso, ocupando uma área de
aproximadamente 2.890.412,65 ha (Figura 1), e compreendendo os municípios de Tangará da
Serra, Campo Novo do Parecis, Diamantino, Nova Marilândia, Nova Maringá, Brasnorte e Juara.
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 801
Edineia Aparecida dos Santos Galvanin • Jéssica Cocco • Diego de Lima Nascimento
de uso da terra circunscreveu-se aos municípios que se encontram dentro dos limites da BHRS; nesse
sentido, fez-se o recorte do shapefile dos municípios do estado de Mato Grosso, adquiridos do site da
Agência Nacional de Águas (ANA), por meio do shapefile da BHRS, delimitado pelo modelo digital
de elevação (MDE), utilizando o software ArcGis, versão 9.2 (ESRI, 2007).
Para a análise temporal de uso da terra foram adquiridas imagens de resolução
espacial de 30 m do sensor Thematic Mapper (TM) a bordo do satélite Landsat 5 do
Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) das órbitas/pontos 227/69 e 70, 228/68,
69 e 70. As imagens são datadas de julho e novembro de 1990 e de junho de 2010.
As imagens foram processadas e analisadas no Sistema de Processamento de
Informações Georreferenciadas (Spring), versão 4.1.8. (CAMARA et al., 1996), utilizando
o sistema de coordenadas UTM, datum WGS 84. Na sequência, fez-se o registro das
imagens Landsat usando as imagens Geocover em formato GeoTiff, utilizando as bandas
3, 4 e 5 com resolução espacial de 28,5 m, de 2001, no modo tela a tela.
Posteriormente, foi realizado o mosaico das cenas para cada ano e o recorte da área de
estudo. Em seguida, fez-se a segmentação da imagem através do algoritmo de crescimento
de regiões, utilizando os valores de similaridade 8 e área 16 (MAURANO et al., 2013).
A classificação, para o ano de 2010, foi estabelecida a partir das séries temporais,
disponibilizadas pelo Laboratório de Sensoriamento Remoto em Agricultura e Floresta
(LAF/INPE), que possibilitam distinguir os diferentes tipos de vegetações presentes em
determinada região (FREITAS et al., 2011).
No entanto, visto que não existem séries temporais anteriores a 2000 (FREITAS et al., 2011),
para realizar a classificação do ano de 1990, foi necessário analisar, além das cenas do período seco,
as cenas do período chuvoso, visto que, na época da seca, a vegetação perde as folhas e dificulta a
distinção desta vegetação com outros usos (FELFILI; CARVALHO; HAIDAR, 2005).
Seguiu-se com a classificação usando o classificador de regiões Bhattacharrya
(XAUD; EPIPHANIO, 2014). As classes de uso da terra foram definidas por meio da
metodologia proposta por Silva et al. (2011). Desse modo, foram consideradas cinco
classes, sendo elas: vegetação natural (florestas e savanas), agricultura (agricultura perene,
temporária e sistema agrossilvipastoril), massas d’água (lagos, rios e lagos artificiais),
pastagem (todos os tipos de pastagem, sendo pecuária ou área abandonada) e outros usos
antrópicos (manchas urbanas, sedes rurais e obras de engenharia civil).
Ao final do processo de classificação, avaliou-se sua exatidão por meio do índice Kappa
(COHEN, 1960). Os mapas gerados foram exportados como arquivo shapefile ao software
ArcGis para realizar a edição do mapa temático e quantificação das classes temáticas.
A análise dos tipos de solos em cada município da BHRS, foi realizado no software
ArcGis, utilizado como referência o mapa de solo do Mato Grosso na escala de 1:250.000,
elaborado pela Secretaria de Estado de Planejamento (SEPLAN, 2001), seguindo a
classificação do Sistema Brasileiro de Classificação de Solos (EMBRAPA, 2006).
Por fim, realizou-se a análise de agrupamento (AA) com o intuito de investigar
como os municípios, que compreendem a BHRS, relacionam-se quanto às diferentes
formas de uso da terra em relação aos diferentes tipos de solos.
As análises foram realizadas por meio do pacote “vegan” (OKSANEN et al., 2011)
no software livre “R”, versão 2.12.2 (R CORE TEAM, 2011), utilizando a distância
euclidiana como método de dissimilaridade, que é dada pela equação (1):
802 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
Análise multivariada para estabelecimento de relações de uso e cobertura
da terra e dos tipos de solos nos municípios da bacia do Rio do Sangue - MT/Brasil
p
(1)
d ij (Y
k 1
ik Y jk ) 2
n 1
c c sij s
n
ij
i 1 j i 1
rcof , (2)
n 1 n 1
c c s s
n n
2 2
ij ij
i 1 j i 1 i 1 j i 1
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 803
Edineia Aparecida dos Santos Galvanin • Jéssica Cocco • Diego de Lima Nascimento
Figura 2. Distribuição das classes temáticas do uso da terra, em 1990 (a) e 2010 (b), nos municípios da
BHRS, Mato Grosso – Brasil.
804 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
Análise multivariada para estabelecimento de relações de uso e cobertura
da terra e dos tipos de solos nos municípios da bacia do Rio do Sangue - MT/Brasil
a maior área dos municípios da BHRS (Tabela 1). De acordo com Sousa e Lobato
(2007), esse tipo de solo é utilizado no cultivo de culturas anuais, perenes, pastagem
e reflorestamento. São solos porosos, profundos e bem drenados e bem permeáveis,
geralmente, estão situados em relevo plano e suave-ondulado.
Esses solos apresentam baixa fertilidade e alta saturação por alumínio, sendo esses os
principais problemas para o uso agrícola e pecuário. Nesse caso, para obter boa produtividade,
há necessidade de fazer a aplicação de fertilizantes químicos minerais, matéria orgânica e
correção de solo. Possibilitando, dessa forma, o amplo uso desse tipo de solo nos municípios
com atividades como agricultura e pecuária (SPERA et al., 2000; SOUSA; LOBATO, 2007).
Tabela 1. Área de uso da terra e dos tipos de solos em cada munícipio presente na BHRS, Mato Grosso
– Brasil. (VN) Vegetação Natural; (P) Pastagem; (OUA), Outros usos antrópicos; (MDA) Massas d’água
e (A) Agricultura. (RQ) Neossolos Quartizarênicos; (LV) Latossolo Vermelho (LVA) Latossolo Vermelho-
amarelo e (PVA) Argissolo Vermelho-amarelo.
Classes Área das Classes de uso da terra (%)
Municípios Área município Tipos de Área dos
de uso da
da BHRS (ha) Solos solos (%)
terra 1990 2010
RQ 13,19 A 1,92 7,65
LV 70,88 MDA 0,63 0,72
Brasnorte 1.156.181,56 LVA 13,18 OUA 0,06 0,08
PVA 2,73 P 7,37 26,58
-- -- VN 90,02 64,94
RQ 11,49 A 26,58 46,37
LV 65,41 MDA 0,54 0,58
Campo Novo
519.236,12 LVA 23,08 OUA 0,15 0,36
do Parecis
PVA 0 P 7,83 22,21
-- -- VN 64,88 30,45
RQ 0,64 A 31,53 74,81
LV 75,78 MDA 0,21 0,08
Diamantino 121.070,18 LVA 23,58 OUA 0,21 0,24
PVA 0 P 12,61 23,54
-- -- VN 55,43 1,3
RQ 0 A 0,22 10,85
LV 77,22 MDA 0,28 0,42
Juara 473.197,39 LVA 0 OUA 0,02 0,07
PVA 22,77 P 12,54 24,78
-- -- VN 86,93 63,85
RQ 0 A 42,38 79,12
LV 90,77 MDA 0 0
Nova
2.099,72 LVA 9,22 OUA 0,21 9,54
Marilândia
PVA 0 P 8,84 6,12
-- -- VN 48,55 5,21
continua
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 805
Edineia Aparecida dos Santos Galvanin • Jéssica Cocco • Diego de Lima Nascimento
continuação
Classes Área das Classes de uso da terra (%)
Municípios Área município Tipos de Área dos
de uso da
da BHRS (ha) Solos solos (%)
terra 1990 2010
RQ 8,23 A 0,41 11,35
LV 40,58 MDA 0,47 0,34
Nova Maringá 603.469,22 LVA 51,18 OUA 0,08 0,14
PVA 0 P 5,09 19,62
-- -- VN 93,93 68,53
RQ 0 A 24,85 95,4
LV 98,38 MDA 0 0
Tangará da
15.158,46 LVA 1,62 OUA 2,14 1,36
Serra
PVA 0 P 15,54 1,19
-- -- VN 57,46 2,02
Figura 3. Dendrograma do agrupamento, pelo método de ligação de “average” dos municípios da BHRS,
em relação ao uso da terra do ano de 1990 (a), 2010 (b) e dos municípios em relação ao tipo de solo (c).
806 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
Análise multivariada para estabelecimento de relações de uso e cobertura
da terra e dos tipos de solos nos municípios da bacia do Rio do Sangue - MT/Brasil
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 807
Edineia Aparecida dos Santos Galvanin • Jéssica Cocco • Diego de Lima Nascimento
(MATO GROSSO, 2011), dessa forma, o aumento de órgãos como as DUDs pode ser uma
boa estratégia para controle do desmatamento nos municípios dessa área.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
REFERÊNCIAS
808 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
Análise multivariada para estabelecimento de relações de uso e cobertura
da terra e dos tipos de solos nos municípios da bacia do Rio do Sangue - MT/Brasil
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 809
Edineia Aparecida dos Santos Galvanin • Jéssica Cocco • Diego de Lima Nascimento
SILVA, J. S. V. et al. Quantificação das áreas mapeadas e listas de espécies. In: SILVA, J.
S. V. et al. Projeto GeoMS: cobertura vegetal e uso da terra no estado de Mato Grosso do
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SINDICATO DA CONSTRUÇÃO, GERAÇÃO, TRANSMISSÃO E DISTRIBUIÇÃO
DE ENERGIA ELÉTRICA E GÁS-SINDENERGIA. Localização de centrais de
geração de energia em relação às Bacias Hidrográficas do Mato Grosso. Escala
1:1.500.000, 2014.
SOKAL, R. R.; ROHLF. F. J. The comparison of dendrograms by objective methods. Taxon,
v. 11, n. 1, p. 33-40, 1962.
SOUSA, D. M. G.; LOBATO, E. Latossolos, Argissolos e Neossolos. Empresa Brasileira de
Pesquisa Agropecuária-Embrapa, 2007 Disponível em: http://www.agencia.cnptia.embrapa.
br/Agencia16/AG01/arvore/AG01_96_10112005101956.html. Acesso em: 10 jun. 2014.
SPERA, S. T. et al. Características físicas de um Latossolo Vermelho, no Cerrado de
Planaltina, DF, submetido à ação do fogo. Pesquisa Agropecuária Brasileira, v. 35, n.
9, p. 1817-1824, 2000.
XAUD, M. R.; EPIPHANIO, J. C. N. Dinâmica do uso e cobertura da terra no sudeste de
Roraima utilizando técnicas de detecção de mudanças. Acta Amazônica, v. 44, n. 1, p.
107–120, 2014.
810 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
A emergência do Brasil profundo: o papel da Amazônia nesse processo
RESUMO: Há um Brasil vindo à tona trazido pela onda do agronegócio. Uma faixa que
cobre o oeste até a região norte, englobando estados cujas capitais lideram uma constelação
de cidades médias dinamizadas pela produção de commodities, que são responsáveis pela
pauta de exportação e pelo consumo interno, dado o peso que exercem na economia
brasileira. Porém há um preço a ser pago por essa dinâmica de produção e de ocupação
de terras do oeste e do norte do país. São os impactos no cerrado e na floresta amazônica.
Dois biomas que precisam ser cuidados. Então, discute-se esse dilema: como modernizar
e preservar ao mesmo tempo. Dá-se ênfase ao contexto amazônico.
ABSTRACT: There is a Brazil coming to the fore brought by the agribusiness wave.
A belt that covers the west to the north, encompassing states whose capitals lead a
constellation of medium-sized cities energized by the production of commodities, which
are responsible for export tariffs and domestic consumption, given the weight they exert
in the Brazilian economy. But there is a price to be paid for this dynamic of production
and occupation of land in the west and north of the country. These are the impacts on
the cerrado and the Amazon rainforest. Two biomes that need to be taken care of. Then,
this dilemma is discussed: how to modernize and preserve at the same time. Emphasis is
placed on the Amazonian context.
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 811
Carlos Santos
INTRODUÇÃO
O extremo oeste brasileiro, configurado por capitais estaduais como Campo Grande,
Cuiabá, Porto Velho e Rio Branco, tendo como coadjuvantes Goiânia, Palmas, Manaus
e Boa Vista, está em contraposição ao Brasil Atlântico por ser o Brasil Profundo. Cada
capital citada lidera uma rede de cidades médias que explodem em vitalidade face a onda
agro-econômica. Imensos campos de soja, pastos pecuários sem fim, extensos tapetes
de milho e de algodão, oceanos de cana de açúcar, além de usinas de processamento de
soja e de cana, frigoríficos, ou enclaves industriais como a Zona Franca amazonense.
Tal cornucópia de riqueza despeja um enxame de carretas geminadas, como se fossem
trens com rodas de pneu, pelas artérias asfálticas até os portos marítimos tanto atlânticos
quanto quiçá pacificanos (a saída para o Pacífico pelo Acre já é plenamente viável), ou
os fluviais como Santarém (Tapajós), Itacoatiara (Amazonas) e Porto Velho (Madeira),
como terminais hidroviários, de onde partem ou aportam fileiras de barcaças carregadas,
impulsionadas por potentes rebocadores. Enquanto não desatam o nó da ferrovia Norte-
Sul, que certamente dinamizará mais ainda o escoamento. De vez que ela se interligará
ao projeto sino-brasileiro de uma ferrovia transoceânica, ligando o Pacífico (os portos
peruanos de San Juan, Matarini e Ilo).ao Atlântico (os portos brasileiros do Açu no Rio de
Janeiro, de Santos em São Paulo e os de Ilhéus e Salvador na Bahia).
Está vindo à tona um Brasil recôndito, que Euclides da Cunha (1902/1998)
já chamara atenção com seu Os Sertões, nos remetendo à saga rebelde de Antônio
Conselheiro, no drama de Canudos. Região que o geógrafo alemão Léo Waibel (1955)
também nomearia de sertão, dentro do contexto de seu estudo sobre o que ele denominou
de As zonas pioneiras do Brasil. Ambiente do personagem Jeca Tatu do livro Urupês
de Monteiro Lobato (1918). Personagem que nos remete ao clássico estudo de Antônio
Cândido (1975), Os Parceiros do Rio Bonito, sobre o modo de vida caipira. Enfim, a
marcha para o Oeste cria as novas veredas que substituem aquelas que Guimarães Rosa
(1990) cantou em seu Grande Sertão: Veredas.
Esse Brasil que foi delineado pelos bandeirantes nos séculos XVI e XVII, mas só
efetivamente integrado a partir de Vargas, que ecoou o brado de Cassiano Ricardo (1959)
de se marchar para o Oeste, consolidado com JK (Brasília e os grandes eixos rodoviários) e
finalizado pelo regime militar nos anos de chumbo, seguindo diretrizes traçadas por Golbery
do Couto e Silva (1967) em seu Geopolítica do Brasil. Esse Brasil caipira se moderniza a
passos largos. E se impõe economicamente ao Brasil Atlântico. Inclusive, surfando na onda
do agronegócio, explode repaginada a música caipira, agora batizada de moda sertaneja.
Há uma mesclagem (matuchos?) de sul-sudestinos, caboclos e indígenas. Um outro
tipo de brasileiro está surgindo em substituição ao sertanejo.
Modernidade que assusta os ribeirinhos, as matas, os bichos e as águas. Portentosas
hidrelétricas (Tucuruí, Belo Monte, Santo Antônio e Jirau) invadindo florestas e terras
indígenas sagradas, quebrando o encanto sacromágico dos igarapés, ou desalojando
ribeirinhos. Rodovias conspurcando a intimidade bravia das matas (como a inacabada e
problemática Transamazônica ou a Cuiabá-Santarém). E gente e mais gente ocupando,
desbravando, plantando e criando, transformando um Brasil extrativista em um Brasil
agrícola-pecuário urbanizado, cheio de máquinas e de cidades. Uma antiga soterrada
brasilidade está emergindo em sofisticadas espacialidades!!!
Então, conforme a canção de Sá & Guarabira: O sertão vai virar praia?
812 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
A emergência do Brasil profundo: o papel da Amazônia nesse processo
E A AMAZÔNIA?
Desde o projeto de integração dos anos sessenta que, como lembra Kitamura (1994, p. 36):
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 813
Carlos Santos
814 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
A emergência do Brasil profundo: o papel da Amazônia nesse processo
Na segunda metade do século XIX, uma nova injunção econômica internacional incide
sobre a região. Trata-se da valorização da borracha no mercado internacional; seu impacto causa
a expansão das áreas produtoras, impõe mudança no regime de trabalho e pressiona a abertura
do vale amazônico à navegação internacional. Como consequências dessas transformações,
pode-se listar a preocupação oficial pela demarcação das fronteiras externas, a ênfase em novas
expedições científicas para aprimorar o conhecimento da região e, importante, a inserção da
Amazônia na divisão internacional do trabalho. Por outro lado, a economia gomífera produziu
um intenso povoamento regional responsável por uma incipiente rede urbana. É no contexto da
economia da borracha e de suas consequências para o povoamento do sudoeste da Amazônia
que se dá, por exemplo, a segunda tentativa de ocupação da atual Rondônia.
Após o período de estagnação a que foi levada a região devido à queda do preço da
borracha, com breve lampejo de recuperação durante a Segunda Guerra Mundial, o contexto
amazônico só volta a ter importância no cenário nacional com a construção de Brasília, dentro
do programa viário do Plano de Metas de JK, tomando ênfase com os governos militares pós-
64. Então, uma série de políticas, inspiradas sob o signo da “segurança nacional”, promovem
a abertura de diversas vias de penetração, cria diversos incentivos fiscais, e estimula a
migração em massa, deflagrando vários projetos de colonização. O Estado direciona vultosos
investimentos em parceria com o grande capital, instalando imensos empreendimentos que
vão desde a extração mineral, como Carajás, a extensos estabelecimentos agro-pecuário-
industriais e madeireiros (SANTOS, 1980; BECKER et al., 1990; PANDOLFO, 1994).
D. Mahar (1978) estabelece cinco fases estratégicas de integração da Amazônia ao contexto
econômico nacional. A primeira fase acontece com a criação em 1912 do Plano de Defesa da
Borracha e vai até o final da segunda guerra. Esse Plano, segundo Roberto Santos (1980),
constituiu uma verdadeira estratégia de desenvolvimento regional, englobando sete setores básicos:
heveacultura e extração da borracha; industrialização; imigração; saúde; transportes; produção
agrícola-alimentar; e pesca. Porém, sua implementação foi problemática e quase não saiu do papel.
Com a criação de uma nova estratégia, no segundo governo Vargas, em 1953, através
da Superintendência do Plano de Valorização da Amazônia (SPVEA), é dada uma ênfase
à produção agrícola, visando-se o abastecimento interno e a exportação. Não saiu do
papel. No governo de Juscelino Kubitschek (1955-60, marcado pelo slogan “Cincoenta
Anos em Cinco”), foi quando a “marcha para o oeste”, lançada por Vargas em 1940, toma
um ímpeto decisivo, através da implantação de Brasília e dos grandes eixos rodoviários
que a ligam ao Pará e ao Acre, induzindo a mobilização migratória. Começa, então, o
período de ocupação massiva da franja amazônica.
Em 1964, a partir da instalação do regime militar, no bojo de preocupações de ordem
geopolítica e de segurança, é criada, em 1966, a Operação Amazônia. Em 1967 é estruturado o
Grupo de Trabalho para a Integração da Amazônia (GTINAM). Conforme Lima (1971, p. 25):
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 815
Carlos Santos
816 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
A emergência do Brasil profundo: o papel da Amazônia nesse processo
A Amazônia hoje
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 817
Carlos Santos
818 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
A emergência do Brasil profundo: o papel da Amazônia nesse processo
Ou seja, há uma visão tecnocrática que permeia o discurso sobre a Amazônia. Essa
visão se pauta pela ênfase no valor de troca e não no valor de uso das reservas naturais. Isto
é, a transformação de todo e qualquer patrimônio natural em mercadoria. O paradoxo, no
caso, é que se faz sempre a apologia do astronômico valor da biodiversidade amazônica,
e, no entanto, o desmatamento avança para alocação da pecuária e da soja.
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 819
Carlos Santos
820 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
A emergência do Brasil profundo: o papel da Amazônia nesse processo
Ora, temos uma prática cultural de uso e abuso da natureza que é milenar e que
foi intensificado pela Revolução Industrial (o ambiente não fazia parte do balanço de
nenhuma empresa), ao passo que a nova mentalidade ecológica tem no máximo quarenta
anos. Portanto, há um difícil e urgente caminho a ser percorrido.
NOTAS
2 De acordo com Carlos Nobre (2002): “A bacia amazônica contém uma gama variada de
ecossistemas e grande riqueza em termos de diversidade biológica e étnica. Inclui a maior
extensão de floresta tropical da Terra, mais de 5 milhões de km² e responde por aproximadamente
um quarto das espécies animais e vegetais do planeta. Hoje, apenas algumas espécies são usadas
pelo homem. A região tem recursos hídricos abundantes. A precipitação atmosférica anual é de
2,3 m, em média, e a descarga média do rio Amazonas no oceano Atlântico é de cerca de 220.000
m3/s, o que corresponde a 18% da descarga total de água fresca nos oceanos do mundo”.
3 Proposto inicialmente pelo zoólogo Paulo Emílio Vanzolini, mas formulado conceitualmente
pelo alemão Jürgen Haffer em 1969 e aplicado à realidade brasileira pelo geógrafo Aziz Ab’Sáber,
esse cenário – conhecido como Teoria dos Refúgios – representou durante pelo menos três
décadas a visão mais aceita da porção sul do continente americano, incluindo o Brasil.
4 Segundo o FIBGE (2003), já foram identificadas na Amazônia Legal em torno de 650 espécies
vegetais farmacológicas e de valor econômico. Só Rondônia possui 350 dessas espécies.
REFERÊNCIAS
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 821
Carlos Santos
822 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
Comunicação socioambiental: a JBS e sua estratégia discursiva em Rondônia
COMUNICAÇÃO SOCIOAMBIENTAL:
A JBS E SUA ESTRATÉGIA DISCURSIVA EM RONDÔNIA
SOCIO-ENVIRONMENTAL COMMUNICATION:
JBS AND ITS DISCURSIVE STRATEGY IN RONDÔNIA
Larissa Zuim Matarésio1
Maria das Graças Silva Nascimento Silva2
RESUMO: Este trabalho apresenta algumas das estratégias da JBS, conhecida como
Friboi e classificada como a maior processadora de carnes do mundo, utilizadas no Estado
de Rondônia, na Amazônia, como forma de demarcação territorial onde se instala por
meio de práticas discursivas com foco na comunicação socioambiental. Tem-se como
objetivos: identificar o funcionamento desses discursos, analisar se a empresa cumpre
com os princípios inerentes à comunicação socioambiental após a instalação da empresa
em Rondônia. Para isso se utiliza da metodologia analítica-descritiva e de referencial
bibliográfico, recortes jornalísticos e dados iconográficos que auxiliam na formação do
quadro teórico-investigativo. Pelo viés jornalístico, reflete sobre o modelo de comunicação
socioambiental, que, segundo as diretrizes das políticas públicas urbanas e da educação
ambiental, propõe saberes interligados para enxergar os desafios do desenvolvimento
sustentável por meio da produção de comunicações responsáveis e sem manipulações, a
fim de que o acesso à informação contribua para a consciência crítica.
ABSTRACT: This paper presents some of the strategies of JBS, known as Friboi and classified
as the largest meat processor in the world, used in the State of Rondônia, in the Amazon, as
a form of territorial demarcation where it is installed through discursive practices focused
on socio-environmental communication . The objectives are: to identify the functioning of
these speeches and to analyze if the company complies with the principles inherent to socio-
1 Doutoranda pelo Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Federal de Rondônia – PPGG/UNIR. Pesquisadora do Grupo
de Estudos e Pesquisas em Geografia, Mulher e Relações Sociais de Gênero – GEPGENERO/UNIR. E-mail: larizuim@gmail.com.
2 Pós-doutora em Geografia pela Universidade Estadual de Ponta Grossa - UEPG. Professora do Departamento de Geografia e do
PPGG/UNIR. Líder do GEPGÊNERO/UNIR. E-mail: gracinhageo@hotmail.com.
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 823
Larissa Zuim Matarésio • Maria das Graças Silva Nascimento Silva
INTRODUÇÃO
824 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
Comunicação socioambiental: a JBS e sua estratégia discursiva em Rondônia
Sendo assim, quais são as principais estratégias utilizadas pela empresa nomeadas
como ‘desenvolvimento econômico sustentável’ em sua instalação no estado de Rondônia,
anos atrás? Será que realmente houve desenvolvimento regional a partir destas estratégias?
É o que pretende-se analisar.
Dentre os objetivos específicos, tem-se um que vai ao encontro das atividades da
JBS, qual seja: identificar a cultura alimentar do estado de Rondônia, levando em conta se
o consumo da carne produzida pela referida empresa contribui para a soberania alimentar
do estado; identificar se os produtos produzidos pela empresa no estado atendem às
especificidades de padrão de qualidade; e, se os produtos que são produzidos no território
rondoniense, mas que são exportados, servem ao desenvolvimento econômico e social local.
Para isso se utiliza da metodologia analítica-descritiva e de referencial bibliográfico,
recortes jornalísticos, dados iconográficos que auxiliam na formação do quadro teórico-
investigativo. Pelo viés jornalístico investigativo tem o propósito de formular o modelo
de comunicação socioambiental que, segundo as diretrizes das políticas públicas urbanas
e da educação ambiental, esse modelo de comunicação propõe saberes interligados
(interdisciplinaridade); possibilita a educação e a comunicação cidadã apontando
alternativas viáveis para os desafios do desenvolvimento regional, por meio das
informações responsáveis e sem manipulações, a fim de que o acesso à comunicação
social e as suas funções contribuam à formulação da cidadania e da consciência crítica.
De acordo com a história da empresa, a origem do grupo teve início em 1953, quando o
então Senhor José Batista Sobrinho iniciou as “operações de uma pequena planta com capacidade
de processamento de cinco cabeças de gado por dia, na cidade de Anápolis, em Goiás, na região
Centro-Oeste do Brasil” (3). Nesse ano foi fundada a Casa de Carnes Mineira, em Anápolis (GO).
De 1970 a 2001, a JBS expandiu significativamente as suas operações no setor
de carne bovina no Brasil, pelo método de aquisições e investimentos nas unidades da
família, alcançando a capacidade de abate diária de 5,8 mil cabeças.
De 2001 a 2006, o grupo JBS passou a operar 21 plantas no Brasil e cinco na
Argentina e aumentou a sua capacidade de abate para 19,9 mil cabeças por dia. Em 2005,
a companhia iniciou seu processo de internacionalização e adquiriu 100% do capital
social da Swift-Armour, maior produtora e exportadora de carne bovina na Argentina.
A companhia, no ano de 2008, adquiriu a Tasman Group, na Austrália, a Smithfield
Beef, divisão de bovinos da Smithfield Foods, nos EUA, e os confinamentos da Five
Rivers, com capacidade para engordar dois milhões de animais por ano, de acordo com
os dados retirados do histórico da JBS.
Conta ainda no seu histórico que em 2009, a JBS incorporou o frigorífico Bertin,
até então segundo maior no Brasil, e adquiriu o controle acionário da Pilgrim’s Pride,
ingressando no mercado norte-americano de aves. Além disso, a companhia ampliou a
sua capacidade diária de abate no Brasil com a aquisição de cinco novas unidades.
Em 2010, o grupo JBS adquiriu a Tatiara Meats e os ativos da Rockdale Beef,
na Austrália, além do Grupo Toledo, na Bélgica. Também anunciou a aquisição do
confinamento McElhaney nos Estados Unidos e ampliou sua participação na Pilgrim’s
Pride para 67,27%. Realizou entre abril e maio daquele ano uma oferta pública primária
de 200 milhões de ações ordinárias, equivalente a R$ 1,6 bilhão.
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 825
Larissa Zuim Matarésio • Maria das Graças Silva Nascimento Silva
Mas, foi em 2012 que a JBS deu um grande salto no negócio agroalimentar, quando
nos Estados Unidos, a JBS aumentou novamente sua participação na Pilgrim’s Pride,
assumindo 75,3% do capital social da empresa. No Brasil, ampliou a capacidade anual de
processamento de bovinos em 2 milhões de cabeças e iniciou sua operação no segmento
de aves, expandindo em 15% sua capacidade global de produção nessa categoria, por
meio do aluguel dos ativos da Frangosul. A Vigor deixou de ser uma subsidiária da JBS e
passou a realizar a abertura de seu capital, passando a ter uma estrutura corporativa própria
e independente. Em 2013, adquiriu a Seara Brasil e se consolidou como líder global no
processamento de aves. O negócio eleva em 33% a capacidade diária de produção de frango,
em 30% a de suínos, 14% a de couro e em 30% o número de colaboradores. Assim, o grupo
passaria a atuar no segmento de alimentos industrializados, se transformando na segunda
maior plataforma brasileira de produção e distribuição de produtos de valor agregado.
Segundo observou-se, há um hiato no histórico internacional da empresa entre os
anos de 2010 e 2012. Significa que, de acordo nossas análises, nesse período o grupo
passou a investir seu planejamento em ações mais específicas para o território brasileiro.
Em 9 de maio de 2012, o grupo J&F chegou a afirmar que o Brasil seria seu principal foco
de investimentos nos dois anos seguintes (4).
No estado de Rondônia, localizado na região Norte do Brasil, com importância na
Amazônia Ocidental brasileira, a JBS começou os investimentos por meio da compra do
Grupo Independência, anunciado em 23 de abril de 2012 (VAZ, 2012).
826 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
Comunicação socioambiental: a JBS e sua estratégia discursiva em Rondônia
estreitamente vinculado a ela, deve-se ter em mente que comunicação não é exclusivamente
“medida, quantidade” da ação de um sujeito em interação com outro. Comunicar é colocar em
prática o exercício da interação social, porque a sociedade é mais que “massa manipulada”,
é um agrupamento de sujeitos de consciência. Nessa inter-relação, muito significativo é o
enlace entre comunicação e geografia. Para Milton Santos, a sociedade atual passa por um
período técnico-científico e informacional, divididos pela tecnosfera e a psicosfera, que
são conectadas e influenciam uma à outra. Na psicosfera encontra-se o plano das ideias,
das paixões, da geração de sentido, enquanto que na tecnosfera dá-se a instrumentalização
necessária para a expressão da psicosfera, e as mídias se enquadram nesse processo.
Para entender um pouco o processo comunicacional, várias teorias surgiram desde
a década de 1940, do século XX, quando os meios de comunicação de massa invadiram
os modos de vida da sociedade moderna de modo mais intenso. Dentre as teorias, temos
a conhecida Teoria da Agulha Hipodérmica.
A teoria hipodérmica parte da ideia behaviorista de que toda resposta corresponde a
um estímulo, pois não há resposta sem estímulo ou estímulo sem resposta. Os indivíduos,
por essa perspectiva teórica, são estudados e compreendidos de acordo com suas reações
aos estímulos recebidos. Nesse contexto, é por demais conhecida a experiência de Pavlov
com o cãozinho. À visão da comida, o cachorrinho respondia salivando - uma reação do
organismo preparatória para o ato de digerir a comida. Pavlov passou a tocar uma sineta
toda vez que alimentava o animal. Por fim, tocava apenas a sineta. Mesmo não havendo
comida, o cão respondia ao estímulo (som da sineta) com uma resposta (salivando). O
esquema E - R (Estímulo - Resposta) é essencial para a Teoria Hipodérmica. Assim, os
meios de comunicação de Massa (MCM) enviariam estímulos que seriam imediatamente
respondidos pelos receptores. A audiência é vista como uma massa amorfa, que responde
de maneira imediata e uniforme aos estímulos recebidos.
Dentre alguns teóricos da Teoria da Comunicação encontra-se Paul Lazarsfeld. Para ele,
o mais importante nos estudos dos mass communication era a investigação de acordo como
seguinte esquema: “Comunicação = quem diz o quê, a quem, por que meio, e com que efeitos?”
Esse aporte teórico tem a ver com a necessidade de reflexões sobre o que é dado a informar
para um povo, uma nação, um grupo, etc., porque o que lhe for dado como informação poderá
ser a única verdade que atingirá sua formação crítica. Por isso, este trabalho vai ao encontro
dessa preocupação no sentido de analisar como o grupo JBS se instalou no estado de Rondônia
levando em conta um discurso de “desenvolvimento econômico” e “desenvolvimento
sustentável” gerando um capital comunicacional. Com a comunicação se tornando um capital,
em que grandes conglomerados transnacionais detém o poder, os espaços comunicativos vão
se manifestar cada vez mais regidas por uma psicosfera demandada por discursos em favor
do capital financeiro, manipulados por estratégias comerciais que atingem a população de
maneira incisiva e com contradições que vão aparecendo nos discursos.
Assim, de sua prática comunicacional pressupõe-se o objetivo da visibilidade, o
qual possui políticas e estratégias de comunicação, bem como, o aumento do alcance
comunicacional que a ele é típico.
Em relatório formulado pela Câmara Legislativa do estado de Rondônia, cujo
objeto foi a investigação por meio da Comissão Parlamentar de Inquérito – CPI, em 2015,
de cartel praticado pelo Grupo JBS em Rondônia, verificou-se algumas incongruências
relativas às atividades econômicas implantadas pela empresa no estado.
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 827
Larissa Zuim Matarésio • Maria das Graças Silva Nascimento Silva
De acordo com Teixeira (2009, p. 5), “o cartel é visto como uma conduta praticada
por particulares que se reúnem com o intuito de elidir a livre concorrência ou restringi-
la; com essa prática aniquila a liberdade de escolha do consumidor”. Uma vez que não
há concorrentes, e a vontade de inovar torna-se cada vez imprópria, já que a presença de
um mercado consumidor efetivo e presente garantem os lucros desses empresários, e em
troca, não modernizam o setor cartelizado, não investem nos empregados, em melhorias
para o consumidor, etc. “Temos o cartel como uma das condutas que mais prejudicam o
interesse público e o seu bem-estar, assim como o próprio desenvolvimento econômico
regional e nacional” (TEIXEIRA, 2009, p. 5).
Os cartéis constituem, assim, um dano não apenas para os consumidores, mas também
para a economia onde o cartel se instala, porque é necessária a defesa da concorrência,
base da disputa entre os agentes econômicos. Nesse sentido, a livre concorrência é um
elemento importante para as práticas de mercado, pois, na Constituição brasileira de 1988
ao definir a livre iniciativa como fundamento da ordem econômica no artigo 17 caput,
passou a garantir a propriedade privada dos meios de produção como direito individual
fundamental, o estabelecimento da livre concorrência como princípio da ordem econômica
(art. 170, IV) e, finalmente, a liberdade de atuação como base da economia nacional (art.
170, §único); regem o referido artigo em questão.
De acordo com o presidente da CPI da Câmara Legislativa do estado de Rondônia:
(...) grupo JBS-Friboi S/A foi responsabilizado pelo cartel de preços do boi
gordo em Rondônia. “Em Ariquemes, região onde mais se mata gado, a JBS
dá as cartas no mercado, marcando dia, horário e preço para abater o boi”,
disse Adelino. Segundo ele, a conclusão da CPI, apontado o realinhamento
de preços, foi encaminhada ao CADE (Conselho Administrativo de Defesa
Econômica), Ministério Público Estadual, Ministério Público Federal, Comissão
de Agricultura do Senado, Secretaria de Agricultara do Estado (Seagri) e nesta
semana o documento também será enviado ao BNDES, já que a JBS possui
vultosos empréstimos do banco estatal.
Tem-se, portanto, que ao confirmar o cartel por parte da empresa JBS está além de ferir
os princípios constitucionais da livre concorrência, impede o desenvolvimento econômico e
prejudica o consumidor por não ter opção para a compra de bens de outros agentes econômicos.
De acordo com o texto de Itamar Ferreira (2015) intitulado: “A falácia do JBS
Friboi sobre falta da matéria-prima, o fechamento de frigoríficos em Rondônia e o cartel
da carne”; dita:
... o todo poderoso JBS Friboi está fazendo os pecuaristas de Rondônia reféns
de um cartel que está sendo ardilosamente consolidado, pois com o seu mega
poderio econômico e com predomínio na exportação de carnes o gigante quer
828 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
Comunicação socioambiental: a JBS e sua estratégia discursiva em Rondônia
ditar as regras ao mercado em Rondônia. Dentro desta estratégia este ano ele
já fechou as unidades: de Ariquemes, 267 trabalhadores demitidos, e Rolim de
Moura, com 469 demissões (estas demissões foram suspensas pela Justiça).
A estratégia do JBS Friboi parece ser bem clara, ele se instala numa região,
“quebra” a concorrência e depois fecha a unidade e transfere a produção
daquele lugar para outro frigorífico da empresa mais próximo. Mas o “pulo
do gato” é que ele “condena” a região em que foi fechado o seu frigorífico a
não ter um outro instalado, pois ele mantém no local sua planta de produção
instalada e pronta para entrar em operação caso algum outro grupo empresarial
queira investir naquele município... (FERREIRA, 2015)
Em outro documento, sobre a tecnologia usada pela JBS, é ressaltada a maior eficiência
do sistema utilizado para contenção de gastos energéticos. Em Rondônia, a energia elétrica
é um assunto muito discutido em diversas esferas, inclusive na política socioambiental.
Nessa lógica, as informações sobre a empresa também passam a ser uma prática
socioambiental e cultural, haja vista que a comunicação é o elemento de consagração dos
princípios instituídos na Constituição Federal, reforçando aquilo que é da “ordem econômica,
fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos
existência digna, conforme os ditames da justiça social”, como previsto no Artigo 170.
Porém, os princípios listados no Art. 170, como defesa do consumidor, livre
concorrência, defesa do meio ambiente, redução das desigualdades regionais e sociais,
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 829
Larissa Zuim Matarésio • Maria das Graças Silva Nascimento Silva
não são plenamente atendidos em todos os seus aspectos pela JBS em suas práticas
socioambientais, apesar de suas práticas discursivas quererem levar a população a crer
nisso. Isso porque a empresa compreende o poder que a comunicação de massa exerce
sobre as pessoas, e investe pesado em propagandas regionais, nacionais e internacionais,
usando personagens marcadamente conhecidos pelos receptores, como forma de atestar
sua confiabilidade. Enquanto isso, a empresa cresce, movimenta economia, influi na dieta
local, no setor trabalhista, na comunicação.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
[...] nós chamaremos articulação qualquer prática que estabeleça a relação entre
elementos tal que suas identidades sejam modificadas como um resultado da
prática articulatória. À totalidade estruturada resultante da prática articulatória,
nós chamaremos de discurso. As posições diferenciais na medida em que elas
aparecem articuladas dentro do discurso, nós chamaremos de momentos.
Por contraste, nós chamaremos elementos qualquer diferença que não seja
discursivamente articulada. (LACLAU; MOUFFE, 1985, p. 105).
Já que, no nesse entendimento, essas práticas são definidas pelas relações sociais que se
articulam entre população e a empresa, a ideia que fica marcada são os pontos nodais que estruturam
estas práticas. Sendo assim, as diferentes ações e atuações da JBS passam a ser ressignificadas
no âmbito público, formando contratos de comunicação entre empresa e sociedade por meio da
enunciação, um ato instaurador de sentido na interação entre esses sujeitos do discurso.
No que expressa Laclau (2013) em sua teoria, o discurso que não se sustenta na
aplicação de seus próprios valores é o discurso em si, que por não apresentar elementos
com significados definitivos possuem certa ambiguidade em sua tentativa de alcançar o
todo social e é por meio das práticas articulatórias que se definem os sentidos que se quer
que o discurso assuma.
Assim, o cidadão que consegue “encarnar” o discurso da JBS sobre o “projeto
econômico sustentável”, buscará elementos discursivos que corroborem tal prática, porque
aqui se presentifica os valores emanados na constituição dessa construção argumentativa.
830 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
Comunicação socioambiental: a JBS e sua estratégia discursiva em Rondônia
NOTAS
REFERÊNCIAS
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 831
Larissa Zuim Matarésio • Maria das Graças Silva Nascimento Silva
832 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
O açaí como referência sociocultural para pensar, refletir e construir
conhecimentos geográficos nas escolas ribeirinhas da Amazônia brasileira
ABSTRACT: In the riverside communities of the Brazilian Amazon, açaí is part of the socio-
cultural and economic dynamics of these populations. Based on a case study at the Alexandre
Ferreira da Silva School, located on the Island of Ipanema, in the municipality of Afuá/Pará,
focused on the importance of açaí as a cultural reference, we sought to understand how this
element could contribute to the process of teaching learning of school geographic subjects. The
postulates of important authors on the national scene were used as theoretical-methodological
foundations. Through fieldwork, application of collaborative research, it was possible to
verify that the element of sociability (açaí), constitutes a relevant tool in the construction of
geographic knowledge, adding meanings to teaching learning and enhancing knowledge.
1 Geógrafa, Mestre em Desenvolvimento Regional (UNIFAP) e Doutora em Geografia (UFG). Professora da Universidade Federal do
Amapá (UNIFAP). Atua no curso de Graduação em Geografia (Licenciatura). E-mail: rtorrinha@unifap.com.
2 Geógrafa, Mestre em Desenvolvimento Sustentável (CDS/UnB) e Doutora em Ciências Sociais (UFPA). Professora da Universidade
Federal do Amapá (UNIFAP). Atua nos cursos de Graduação em Geografia (Licenciatura e Bacharelado) e Programas de Pós Graduação em
Geografia e Ciências Ambientais (UNIFAP). E-mail: dagnete@uol.com.br.
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 833
Rosana Torrinha Silva de Farias • Daguinete Maria Chaves Brito
INTRODUÇÃO
Um dos maiores desafios dos professores da disciplina Geografia, que atuam nas escolas
ribeirinhas da Amazônia brasileira, é o de trabalhar temáticas que se distanciam da realidade
sociocultural e espacial destas comunidades, pois se trata de grupos sociais que apresentam
práticas cotidianas criadas e recriadas sócio-historicamente, mantendo suas peculiaridades e
particularidades espaciais. A grande maioria das escolas das ribeiras amazônicas apresentam
carência em relação à disponibilidade de material didático-pedagógico para auxiliar no
processo de ensino-aprendizagem, tanto em relação as ferramentas midiáticas, tais como:
projetores de slides, vídeos e televisores, quanto aos materiais de apoio como mapas e
impressos de modo geral, em muitos casos pela indisponibilidade de energia para o uso de
instrumentos que necessitam desta fonte ou por falta de recursos financeiros.
Diante do exposto, encontrar ferramentas e elementos didático-pedagógicos capazes de
fortalecer e dar maior significado ao ensino e aprendizagem se torna um dos maiores desafios dos
professores de Geografia que atuam nas escolas ribeirinhas da Amazônia brasileira. Trabalhar
as abordagens sobre as relações sociais, econômicas e culturais articulando o lugar ribeirinho
à região Amazônica e ao mundo, visando potencializar o processo de ensino e aprendizagem
na construção dos conhecimentos geográficos instigou a pesquisa apresentada neste artigo.
Estudos já realizados apontaram que elementos da referência cotidiana, relacionados aos
aspectos da formação sociocultural e econômica das populações ribeirinhas, a realidade vivida
e conhecida pelos alunos amazônicos, fomenta e enriquece o ensino e a aprendizagem.
Assim, vislumbrou-se o açaí, fruto do açaizeiro Euterpe oleracea Mart., como
importante viés na construção do conhecimento geográfico, pelo fato de se constituir como
um dos elementos sociocultural e econômico na dinâmica cotidiana das comunidades
ribeirinhas, ainda, representará mais um caminho didático-pedagógico como auxílio
nas abordagens dos temas curriculares. O açaí agrega valores na cultura e economia dos
grupos sociais que habitam nas margens dos rios e igarapés3 da Amazônia Brasileira.
Este fruto permeia na construção de redes de sociabilidade e de identidades, faz parte do
hábito alimentar das populações ribeirinhas, muito apreciada como uma bebida misturada
à farinha d’água e acompanhada com carnes, geralmente, de peixe e camarão.
A dinâmica sociocultural do açaí compõe parte do patrimônio tangível e intangível
dos grupos amazônicos, pois, os derivados da palmeira do açaizeiro se fazem presentes
nas brincadeiras e atividades domésticas dos ribeirinhos. Diante da importância do açaí
no cotidiano dos grupos que residem nas ribeiras amazônicas, utilizou-se este elemento
sociocultural e econômico como mais um componente a ser inserido no processo
pedagógico para melhor auxiliar o professor no ensino de Geografia, este entendimento está
em conformidade com o pensamento de vários autores que trabalham com esta temática.
A pesquisa ocorreu na Escola Municipal Alexandre Ferreira da Silva, localizada na
comunidade do Ipanema, nas Ilhas Queimadas, situada no município de Afuá, estado do
Pará, conforme demonstrado na Figura 1. O acesso as Ilhas é somente por via aquática,
está a aproximadamente 15 km de distância da cidade de Macapá/AP e 135 km da cidade
de Belém/PA, por este fato as relações sociais e comerciais ocorrem diretamente com a
cidade de Macapá ou com os compradores ambulantes que vão de porto em porto.
834 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
O açaí como referência sociocultural para pensar, refletir e construir
conhecimentos geográficos nas escolas ribeirinhas da Amazônia brasileira
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 835
Rosana Torrinha Silva de Farias • Daguinete Maria Chaves Brito
836 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
O açaí como referência sociocultural para pensar, refletir e construir
conhecimentos geográficos nas escolas ribeirinhas da Amazônia brasileira
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 837
Rosana Torrinha Silva de Farias • Daguinete Maria Chaves Brito
838 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
O açaí como referência sociocultural para pensar, refletir e construir
conhecimentos geográficos nas escolas ribeirinhas da Amazônia brasileira
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 839
Rosana Torrinha Silva de Farias • Daguinete Maria Chaves Brito
entre eles para contar as histórias lendárias e também ofertarem seus frutos, caças e pescados.
Traços socioculturais: casas em forma de palafitas, construídas de madeira, ligadas ao
rio e a outras casas próximas por pontes também de madeiras; o principal alimento que
não pode faltar na mesa é o açaí com a farinha d’água acompanhado de carnes salgadas,
representa a base alimentar; os contos, as lendas e as histórias, principalmente relacionadas
a aparições de visagens, a lenda do boto e de animais gigantes que engolem pessoas estão
sempre nas rodadas de conversas; a moda, os usos e utensílios é o reflexo do fluxo de
mercadorias e tecnologias globalizados, a exemplo do uso de produtos industrializados
como: fogão à gás, antena parabólica, televisores, aparelhos de som, energia solar, roupas
e objetos de uso pessoal, máquina de bater o açaí para retirar a polpa, dentre outros.
As diversas abordagens estavam relacionadas ao modo de vida, ao cotidiano e a tudo
que representa referência e experiência de vida para as populações residentes. Destaque para a
cultura do açaí, a qual agrega valor social, cultural, ambiental e econômico. Como resultados das
abordagens sobre a construção do espaço ribeirinho, o professor e as pesquisadoras organizaram
um texto denominado ‘A construção do espaço geográfico das Ilhas Queimadas’, o texto foi
amplamente debatido com o objetivo de compreender conceitos importantes, tais como: espaço
geográfico, rede de sociabilidade, também discutir como as diversas sociedades constroem seus
espaços. Todos os debates foram referenciados pela realidade espacial dos alunos - a Amazônia.
Com as aulas expositivas foi possível construir conhecimentos sobre a geografia do
lugar, também de possibilitar aos alunos a interpretação e a análise do contexto econômico,
social e cultural amazônico em que vivem, para além disso, terem consciência de que
são produtores desse espaço, também compreender que não estão isolados, mas sim, em
conexão com outras realidades espaciais formando uma rede de sociabilidade, durante as
discussões o açaí foi utilizado como um exemplo prático da criação dessa rede.
840 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
O açaí como referência sociocultural para pensar, refletir e construir
conhecimentos geográficos nas escolas ribeirinhas da Amazônia brasileira
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 841
Rosana Torrinha Silva de Farias • Daguinete Maria Chaves Brito
CONSIDERAÇÕES FINAIS
NOTAS
842 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
O açaí como referência sociocultural para pensar, refletir e construir
conhecimentos geográficos nas escolas ribeirinhas da Amazônia brasileira
determinado grupo de pessoas para que possam expor suas ideias acerca do tema. As
ideias são sistematizadas gerando textos, conceitos, conhecimentos diversos, etc. de
acordo com o objetivo que se propõe.
REFERÊNCIAS
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 843
Luana Rodrigues de Carvalho • Leila Nalis Paiva da Silva Andrade •
Célia Alves de Souza • Carla Galbiati • Maria Aparecida Pereira Pierangeli
1 Mestre em Geografia pela Universidade do Estado de Mato Grosso. Pesquisadora do Laboratório de Pesquisa e Estudos em Geomorfologia
Fluvial “Sandra Baptista da Cunha” – UNEMAT. E-mail: lunas2rc@gmail.com.
2 Doutora em Ciências pela Universidade Federal de São Carlos. Professora Adjunta do Curso de Geografia da Universidade do Estado
de Mato Grosso, Campus de Cáceres. Pesquisadora do Laboratório de Pesquisa e Estudos em Geomorfologia Fluvial “Sandra Baptista da
Cunha” – UNEMAT. E-mail: leilaandrade@unemat.br.
3 Professora no Curso de Geografia da Universidade do Estado de Mato Grosso. E-mail: celiaalvesgeo@globo.com.
4 Professora na Universidade do Estado de Mato Grosso – UNEMAT. E-mail carla@unemat.br.
5 Professora adjunta do Departamento de Zootecnia, Universidade do Estado de Mato Grosso. E-mail: mapp@unemat.br.
Agradecimentos:
Ao projeto “Bacia hidrográfica do rio Teles Pires: dinâmica fluvial e empreendimentos hidroelétricos entre os municípios de Nova Canaã
do Norte e Itaúba, Mato Grosso”, financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Mato Grosso (FAPEMAT), pelo apoio
financeiro para a realização da atividade de campo; à Universidade do Estado de Mato Grosso (UNEMAT) pela concessão de Bolsa de
Iniciação Científica ao primeiro autor, nos anos de 2016 e 2017; e ao Laboratório de Pesquisa e Ensino em Geomorfologia Fluvial “Antonio
Christofoletti” (LAPEGEOF), pelo apoio logístico e disponibilidade dos equipamentos necessários para as análises laboratoriais.
844 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
Elementos ambientais, fisiografia e feições deposicionais
na bacia hidrográfica do rio Tapaiúna, Nova Canaã do Norte, Mato Grosso
da bacia sem um manejo adequado. Para tanto, estudos futuros mais detalhados são
necessários para o subsídio da gestão da bacia.
ABSTRACT: The study area corresponds to the hydrographic basin of the Tapaiúna
River, a tributary of the left bank of the Teles Pires River, located in the rural area of
the municipality of Nova Canaã do Norte, Mato Grosso. This article aimed to gather
information about the environmental elements, analyze some parameters related to the
basin’s physiography and characterize the depositional features present in the Tapaiúna
river. The methodological procedures adopted were: survey of environmental elements;
making the cartographic base (map of the river hierarchy); calculations of morphometric
indices; field work for observation and collection of sediment samples; laboratory
analysis and data tabulation. The basin is of fifth order, has a low degree of branching,
low drainage density and rivers associated with the environmental components of the
basin. The main river is winding and can be classified as meandering. The granulometric
analysis of depositional features sediments showed a predominance of fine sand (values
above 84%). These features have a genesis related to the contribution of bottom sediments,
and their occurrence may increase due to the use of land developed in the slopes of the
basin without proper management. To this end, more detailed future studies are needed to
support the management of the basin.
INTRODUÇÃO
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 845
Luana Rodrigues de Carvalho • Leila Nalis Paiva da Silva Andrade •
Célia Alves de Souza • Carla Galbiati • Maria Aparecida Pereira Pierangeli
MATERIAL E MÉTODOS
Área de estudo
Entre as coordenadas geográficas 10º 24’ 27” e 11º 06’ 05” de Latitude Sul, e 55º
55’ 30” e 56º 35’ 31” de Longitude Oeste localiza-se a bacia hidrográfica do rio Tapaiúna,
situada na porção sudeste do município de Nova Canaã do Norte, no norte do estado de
Mato Grosso. A bacia do rio Tapaiúna integra a bacia hidrográfica do rio Teles Pires, que
em macroescala pertence a grande bacia Amazônica (Figura 1).
846 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
Elementos ambientais, fisiografia e feições deposicionais
na bacia hidrográfica do rio Tapaiúna, Nova Canaã do Norte, Mato Grosso
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 847
Luana Rodrigues de Carvalho • Leila Nalis Paiva da Silva Andrade •
Célia Alves de Souza • Carla Galbiati • Maria Aparecida Pereira Pierangeli
(1)
Dr = (2)
(3)
IS=100(L-Lr)÷L (4)
Melo Neto e Mello (2015) explicam que para a densidade de drenagem, Lt representa
o comprimento de todos os canais e A é a área da bacia; para calcular a densidade dos
cursos d’água, o N corresponde ao número de cursos d’água e A refere-se a área da bacia;
para a declividade média do rio Tapaiúna, o ∆H representa a diferença da cota altimétrica
entre a nascente e foz do rio, enquanto l representa a extensão do rio principal (km) e, por
fim, para o índice de sinuosidade, o L corresponde ao comprimento do rio principal e Lr
é o comprimento em linha reta da nascente mais distante até a foz.
Trabalho de campo
Feições deposicionais
848 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
Elementos ambientais, fisiografia e feições deposicionais
na bacia hidrográfica do rio Tapaiúna, Nova Canaã do Norte, Mato Grosso
Barra de
10º41’27,1” S 55º57’01,6” O
confluência
Barra de pontal
10º41’27,7” S 55º57’03,9” O
direita
Barra de pontal
10º41’31,6” S 55º57’04,0” O
esquerda
Em que: ponto em amarelo indica a barra de confluência, os pontos em vermelho as barras de pontal e o
círculo vermelho o meandro que está em processo de abandono.
Análise em laboratório
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Características ambientais
Clima
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 849
Luana Rodrigues de Carvalho • Leila Nalis Paiva da Silva Andrade •
Célia Alves de Souza • Carla Galbiati • Maria Aparecida Pereira Pierangeli
Geologia
Geomorfologia
Estrutural - S Sf - Preservado - p
850 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
Elementos ambientais, fisiografia e feições deposicionais
na bacia hidrográfica do rio Tapaiúna, Nova Canaã do Norte, Mato Grosso
Solos
Vegetação
A área de estudo está situada em uma zona de Tensão Ecológica. Segundo Camargo
(2011) essa zona se estende entre os paralelos 10°00’ e 14°00’ S e é caracterizada pelo o contato
entre os dois Domínios, o Amazônico e dos Cerrados. Dessa forma, as formações vegetais e suas
tipologias de contato encontradas na bacia do rio Tapaiúna estão dispostas no Quadro 3.
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 851
Luana Rodrigues de Carvalho • Leila Nalis Paiva da Silva Andrade •
Célia Alves de Souza • Carla Galbiati • Maria Aparecida Pereira Pierangeli
Vale ressaltar que na bacia há extensas áreas com diversos usos antrópicos,
com destaque ao uso agropecuário em pequenas, médias e grandes propriedades com
predomínio de pastagens que promovem significativas alterações nas formações vegetais
originárias, inclusive às margens do rio principal, onde em alguns trechos a vegetação foi
suprimida para que o gado pudesse ter acesso ao rio para dessedentação, o que acentua
os processos erosivos e incremento na carga de fundo do canal fluvial. Além disso, é
observado o uso antrópico pelas atividades de pesca nas margens do rio Tapaiúna, com
destaque ao baixo curso que é de mais fácil acesso (Figura 2).
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Elementos ambientais, fisiografia e feições deposicionais
na bacia hidrográfica do rio Tapaiúna, Nova Canaã do Norte, Mato Grosso
A) Pisoteio de gado; B) Casa de veraneio com suporte para subida e descida de barcos.
Figura 2. Usos das margens do rio Tapaiúna.
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 853
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Elementos ambientais, fisiografia e feições deposicionais
na bacia hidrográfica do rio Tapaiúna, Nova Canaã do Norte, Mato Grosso
O índice de densidade de drenagem aponta a velocidade com que o volume d’água das
chuvas escoam para o exutório da bacia (CARDOSO et al., 2006). Nessa perspectiva, a bacia
do rio Tapaiúna apresenta uma baixa densidade de drenagem, com 0,70 km.km-2, constituindo
uma bacia de reduzida capacidade de drenagem, o que contribui para a permanência da
água na bacia por um maior período de tempo. Tal fato pode estar relacionado à geologia da
área de estudo, composta por rochas areníticas (permeáveis) da Formação Dardanelos que
favorecem para a percolação da água e para o abastecimento subterrâneo da bacia.
A densidade de rios da bacia é de 0,30 rios.km-2, índice considerado baixo para uma bacia de
grande dimensão espacial, ou seja, a bacia possui baixa capacidade de formar novos canais. Esse
valor pode estar associado às características geoambientais da bacia, podendo citar as propriedades
do substrato rochoso, a geomorfologia, permeabilidade do solo e outros. A declividade média do
rio principal reflete na velocidade do escoamento da água ao longo do perfil longitudinal da bacia,
nesse sentido, o valor encontrado para a área de estudo foi de 1,41 m.km-1.
O rio Tapaiúna apresentou índice de sinuosidade de 44,88%, enquadrando na classe
“sinuoso” (Tabela 1). Assim, considera-se como um rio de padrão meandrante devido sua
sinuosidade, mesmo apresentando alguns trechos do rio com padrão retilíneo (Figura 4). De
acordo com Cunha (2009), os canais de morfologia retilínea são pouco comuns na natureza,
à exceção daqueles que possuem controle por linhas tectônicas (seja por linhas de falhas
ou fraturas). A condição básica para a existência de um trecho de rio com essa caraterística
está relacionada a um leito rochoso que proporciona igual resistência à ação das águas,
configurando assim, um segmento de rio encaixado como o encontrado no baixo curso do rio
Tapaiúna, com aproximadamente três quilômetros de extensão.
Corroborando com o exposto, há uma Falha encoberta na porção do baixo curso do rio
Tapaiúna conforme informações contidas no levantamento geológico-estrutural realizado pelo
PRODEAGRO (MATO GROSSO, 2001) para a folha Ilha Vinte Quatro de Maio – MT (escala
1:250.000), que considerando a natureza geológica do Complexo do Xingu e Formação Iriri,
justificaria a existência de segmentos encaixados e retilíneos na área de estudo.
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 855
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Feições deposicionais
O rio Tapaiúna descreve curvas sinuosas com processo erosivo predominante em suas
margens côncavas e formações barras arenosas em suas margens convexas. Essa dinâmica
fluvial contribui para a migração lateral do canal, refletindo nos diques marginais e nos
meandros abandonados presentes na planície de inundação.
Essas feições deposicionais presentes no canal estão associadas ao aporte de sedimentos
do rio Tapaiúna. Estas feições podem variar de tamanho e de posição de um ano para outro,
pois estão sujeitas a modificações conforme a intensidade dos eventos de inundação e estiagem
que remobilizam os sedimentos depositando-os mais a jusante. Dessa forma, as duas barras
de pontal e a barra de confluência, ambas situadas no baixo curso, foram escolhidas como
referência amostral das feições deposicionais presentes no rio Tapaiúna.
A barra de confluência localizada a jusante de uma ilha formada pelo corte do colo
do meandro apresentou área de 185,64 m2, registrando altura de 0,62 m. Foi encontrada
abundante presença de material orgânico proveniente da rápida colonização vegetal composta
de gramíneas e herbáceas, constituindo a vegetação pioneira nesse ambiente de deposição.
Segundo Stevaux e Latrubesse (2017) a presença dessa cobertura de gramíneas aumenta a
rugosidade e possibilita a sedimentação de material fino por decantação (Figura 5).
A gênese dessa barra pode ser reflexo da baixa energia hidráulica do canal que circunda
a ilha, possibilitando a sedimentação e deposição dos sedimentos de fundo nesse ambiente
de confluência com o canal principal. Com o tempo essa barra pode tornar-se uma ilha com
sucessão da cobertura herbácea por vegetação arbustiva e arbórea. A evolução desta barra
pode ocasionar a conexão desta com a margem esquerda do rio Tapaiúna e à extremidade
jusante da ilha, resultando na obstrução da saída do meandro em processo de abandono.
As análises granulométricas indicaram a predominância de areia fina com porcentagens
acima de 84%, apontando uma tendência crescente em direção jusante da barra, alcançando
96,8% do total das amostragens. A composição dos materiais finos, silte e argila, apresentou
decréscimo no sentido jusante, sendo de 14,14% para 2,94% de silte e 0,93% para 0,26% de
argila, respectivamente. Não houve registro de areia média e/ou grossa (Tabela 2).
856 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
Elementos ambientais, fisiografia e feições deposicionais
na bacia hidrográfica do rio Tapaiúna, Nova Canaã do Norte, Mato Grosso
A barra de pontal situada na margem convexa direita apresentou área de 457,72 m2,
com altura aproximada de 1,90 m. A feição encontra-se em processo de estabilização
associada à presença de vegetação, o que indica que a barra está evoluindo para a formação
de um novo dique marginal (Figura 6A).
A) Barra de pontal direita; B) Barra de pontal esquerda. Setas indicando o sentido do fluxo.
Figura 6. Aspectos das barras de pontal.
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 857
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de estabilização pela ocorrência de vegetação gramínea e herbácea (Figura 6B). Esta feição
deposicional apresentou área de 731,4 m² e altura aproximada de 1,20 m.
As amostras analisadas apontaram, assim como nas feições abordadas anteriormente,
a predominância de areia fina, com valores entre 92,6% a 97,5%. A fração silte variou entre
1,84% a 6,97% e a fração argila entre 0,43% a 0,66% (Tabela 2). Vale frisar que foi registrada
a presença de areia média e grossa.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
REFERÊNCIAS
858 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
Elementos ambientais, fisiografia e feições deposicionais
na bacia hidrográfica do rio Tapaiúna, Nova Canaã do Norte, Mato Grosso
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 859
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860 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
O novo modelo de governança do povo Paiter Suruí frente às novas tecnologias da informação
RESUMO: Alguns povos indígenas amazônicos têm buscado novas maneiras de gerenciar
seus territórios, dentre eles os Paiter Suruí ou Paiterey Garah, da Terra Indígena Sete de
Setembro, em Cacoal, RO (TISS), que criou um Plano de Gestão Etnoambiental para
monitorar as ameaças às florestas, divulgar suas riquezas naturais e culturais com adoção
de novos aparatos tecnológicos como ferramenta de auxílio. Os avanços deste plano têm se
mostrado relevantes após ser considerados referência para outros povos quanto à temática
gestão territorial. O objetivo é abordar o modelo de governança criado por Paiter Suruí,
utilizando novas tecnologias como assistentes para este projeto. Para análise dos fatos como
práxis humanas adotamos a dialética como método tendo como técnica a fonte oral.
ABSTRACT: Some Amazonian indigenous peoples have sought new ways to manage their
territories, among them the Paiter Suruí or Paiterey, of the Terra Indígena Sete de Setembro,
Cacoal, RO (TISS), who established the Environmental management plan to monitor the threats
1 Apoio: Programa de Apoio ao Pesquisador Rondoniense (PQR), Chamada Nº. 003/2017/FAPERO, por meio do projeto “Geografia e
Marcadores Territoriais: Sentidos e Representações Socioculturais Amazônicas”.
2 Trata-se de artigo revisto e ampliado a partir do trabalho “Ameaças, conflitos e resistências: as novas tecnologias como ferramentas de auxílio
ao Plano de Gestão do povo Paiter Suruí em Cacoal Rondônia diante a coação de seu território”, apresentado no III Simpósio Internacional
de Geografia Política e Territórios Transfronteiriços (GEOTRANS) e V Simpósio Nacional de Geografia Política, Território e Poder
(GEOSIMPOSIO) “Conflitos e desigualdades territorial na sociedade contemporânea”, em Alfenas – Minas Gerais, 2019.
3 Mestrando em Geografia pelo Programa de Pós-Graduação Mestrado e Doutorado em Geografia da Universidade Federal de Rondônia –
PPGG/UNIR. E-mail: paulo.barros.pereira12@gmail.com.
4 Mestre em Geografia pelo Programa de Pós-Graduação Mestrado e Doutorado em Geografia da Universidade Federal de Rondônia –
PPGG/UNIR. E-mail: liziane.souza.silva@hotmail.com.
5 Mestre em Saúde pelo Programa de Pós-Graduação do Centro Universitário de Medicina do ABC - PPGCS/ABC. E-mail: gondim.adv@gmail.com.
6 Doutorando em Geografia pelo Programa de Pós-Graduação Mestrado e Doutorado em Geografia da Universidade Federal de Rondônia –
PPGG/UNIR. E-mail: gasodasuruí@hotmail.com.
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 861
Paulo César Barros Pereira • Maria Liziane Souza Silva • José Luiz Gondim dos Santos • Gasodá Wawaeitxapôh Suruí
to forests, disclose their natural and cultural wealth with adoption of new technological devices
as a tool to aid. The advances in this plan have shown the following factors after referring to other
peoples regarding territorial management. The objective is to approach the governance model
created by Paiter Suruí, using new technologies as assistants to this project. For the analysis of
facts as human praxis they adopted dialectics as a method using an oral source as a technique.
CONSIDERAÇÕES INICIAIS
862 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
O novo modelo de governança do povo Paiter Suruí frente às novas tecnologias da informação
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Paulo César Barros Pereira • Maria Liziane Souza Silva • José Luiz Gondim dos Santos • Gasodá Wawaeitxapôh Suruí
O recorte espacial escolhido neste estudo foi a Terra Indígena Sete de Setembro,
ou Paiterey Gãrah (autodenominação em Tupi Mondé) que significa “esta terra é nossa”.
Ancestralmente se autodenominam e reconhecem como “gente de verdade, nós mesmos”,
tradução da língua Paiter Suruí. (SURUÍ, 2019). A Terra está sobreposta em áreas que
incidem, o norte do município de Cacoal até e Rondolândia - Mato Grosso, e possui
247.870 hectares. É uma área que se destaca das demais que estão em seu entorno devido
a existência de densas florestas preservadas, conforme mostra parte superior da Figura 1.
Atualmente eles sobrevivem da caça, pesca, coleta de produtos da floresta, agricultura,
ecoturismo e da produção e venda de carbono. Os homens indígenas são responsáveis pela caça
e pela preparação do terreno para as lavouras. As mulheres cuidam das crianças, cozinham e
fazem cerâmicas, cestarias, colares e brincos tudo com as características do povo, mas ambos os
sexos plantam e pescam. (SURUÍ, 2019). Atualmente existe um posto de vigilância indígena e
20 aldeias, situados às margens nos limites desta TI, conforme mostra parte inferior da Figura 1.
Os Paiterey teriam emigrado da região de Cuiabá (Mato Grosso) para Rondônia,
ainda no século XIX em virtude da perseguição dos não indígenas. Mas no fim do século
XIX até a década de 1920, com a exploração da borracha, a construção da estrada de ferro
Madeira-Mamoré, a instalação de linhas telegráficas por Rondon, e consequentemente o
grande fluxo migratório para Rondônia irá atingir diretamente a população indígena da
região e novamente os Paiterey, gerando muitas lutas e mortes (CARVALHO MELLO e
ALMEIDA SILVA, 2016).
864 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
O novo modelo de governança do povo Paiter Suruí frente às novas tecnologias da informação
Oficialmente, os Paiter Suruí foram contatados pela Funai em 1969 (Figura 2), por meio
dos sertanistas Francisco Meirelles e Apoena Meirelles, no então acampamento da Funai (Sete
de Setembro), quando nesse ano visitaram o acampamento, construído um ano antes. Eles só
passaram a morar de modo mais fixo no posto em 1973, quando vieram buscar assistência
médica em razão de uma epidemia de sarampo que matou cerca de 300 pessoas indígenas. Um
terço de sua população continuou a morar fora da área indígena, e em 1977 migrou para outro
posto da Funai criado então, a Linha 14. (METAREILÁ, 2019; MINDLIN,1985).
A demarcação da Terra Indígena ocorreu em 1976, e a posse permanente foi declarada
pela portaria 1561, de 29 de setembro de 1983, momento em que recebeu o nome oficial de
“Área Indígena Sete de Setembro”. Mas, entre 1982 a 1987, um imenso impacto é sentido por
conta da chegada de milhares de pessoas nesta região impulsionadas pelo Programa Integrado
de Desenvolvimento do Noroeste do Brasil - Polonoroeste, cujo objetivo principal era oferecer
a estrutura para o novo Estado (criado em 1981) que culminou com o asfaltamento da Rodovia
Cuiabá - Porto Velho (ALMEIDA SILVA, 2012). Nessa nova reconfiguração sociopolítica e
territorial, os Paiterey perderam grande parte de seu território para estes projetos e empresas
que desconsideravam a homologação legal da Terra Indígena Sete de Setembro.
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 865
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Fotos: Jesco,1969.
Figura 2. Fotografias do contato.
Os anos passaram e os Paiterey sofreram pressões de toda ordem, seja pela invasão de
suas terras por pequenos agricultores, madeireiros e também pela ação de garimpeiros, forçando-
os cada vez mais a embrenhar-se ao interior de seu território. Essas invasões geraram sérios
desdobramentos também na saúde dos Paiterey, particularmente das crianças e idosos, bem
como outros arranjos de diversas ordens para o povo. Por outro lado, alguns de seus jovens que
já dominavam a língua portuguesa, em razão da necessidade de diálogo com os não indígenas,
passaram a ser interlocutores a conduzir suas reivindicações junto à Fundação Nacional do Índio
– Funai e demais órgãos públicos e entidades não governamentais. (ALMEIDA SILVA, 2012).
Foi justamente isso que fez com que eles se conscientizassem sobre como se constitui e organiza
a sociedade brasileira, e a premente necessidade de lutar pela defesa de seu território. Desde
então passaram a reivindicar seus direitos como cidadãos.
Nos últimos anos os líderes deste povo criaram um plano de gestão territorial, no qual
um dos objetivos principais seria o resgate e a valorização dos conhecimentos ancestrais, a
proteção territorial e a promoção de desenvolvimento com base na relação entre humanos e
o meio ambiente. Para a divulgação deste plano as novas tecnologias da informação entram
como suporte decisivo de suas causas. Eles buscaram parcerias, e receberam cooperação de
grandes organismos nacionais e internacionais de suporte tecnológico.
866 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
O novo modelo de governança do povo Paiter Suruí frente às novas tecnologias da informação
exigem acordos e alianças entre os clãs que compõem os Paiterey, além de dedicação e a busca
de parcerias em âmbito local, nacional e internacional. (SURUÍ, 2020).
As ações do Plano são articuladas, monitoradas e estão subdivididas em cinco
grandes eixos ou categorias e uma série de atividades e indicadores (Quadro 1).
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 867
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Como se vê, a grande finalidade do plano é gerar os benefícios necessários para a valorização
da cultura, fortalecimento identitário e a conservação de sua terra. No tocante aos aspectos
culturais deste plano, notamos que uma das atividades é “Realizar e divulgar exposições sobre a
cultura”. E é justamente aí que entra em ação as novas tecnologias da informação e comunicação,
que vão auxiliar de modo decisivo na divulgação e consequentemente na concretização do Plano.
Por meio de uma entrevista concedida por Labiway Saga (líder maior), Almir
Narayamoga Suruí, ele nos detalhou mais sobre esse processo:
[...] como líder nasci e cresci lá, vendo todos os desafios enfrentado por esse povo e também
na região. Dessa forma junto com outros líderes do sistema de governança do povo Paiter
Suruí, nós criamos o Plano de 50 anos. É uma estratégia de 50 anos, e dentro do plano de
50 anos temos 12 programas maiores. Eu tenho atuado mais no plano do meio ambiente,
hoje também na área de educação [...] eu não vou dizer pra vocês também que o meu
conhecimento e o do meu povo é melhor que o de vocês, como eu tô dizendo aqui, é, uma
sociedade tem de falhas, então precisa avaliar e reverter essas falhas como instrumento
que pode trazer uma grande reflexão e buscar a melhor delas, [...] porque o Brasil tem um
grande potencial que é pega uma parte da Amazônia e não soube valorizar. [...] o Plano/
diagnóstico foi construído com as nossas ideias, com a nossa participação, então, ela tem
que ser um resultado do nosso trabalho. E nós temos que ter protagonismo em relação a
isso. Já tem uns 10 anos que estamos construindo esse plano de 50 anos dos Paiter Suruí.
Ele foi importante para a conquista de alguns momentos da luta dos Paiter Suruí, uma
dessas lutas é o Paiter Suruí sair fora dos madeireiros ilegais de hoje. Também temos alguns
parceiros potencias que estão consolidados ao grupo de parceiros dos Paiter Suruí, como
USAID, GOOGLE, KANINDÉ, ACT, IDESAN, FLOREST TREND, FUNBIO. Então,
o plano pós-diagnóstico, orientou para que pudesse construir essa relação, de diferentes
parceiros (Governos e ONGs) que têm diferentes ideias, isso é uma conquista. (SURUÍ,
ALMIR. Entrevista concedida em 18 de setembro de 2018).
A estratégia dos Paiter foi se aliar às novas tecnologias para alcançar os objetivos do Plano de
Gestão, conforme afirma Almir. Sua fala nos conduz ao que Pinto (2009), afirmara sobre as Tecnologias
da Informação visto que se tornaram para alguns desses povos, objeto de lutas, ferramenta para competir
com os meios de comunicação, para unir povos de vários lugares do Brasil e do mundo. A teoria da
autora aponta para uma reinvenção cultural. Sobre este processo, Almeida Silva (2012; 2015a; 2015b)
acrescenta que vitimados pelo processo de desenvolvimento e da expansão do capital, os indígenas têm
desenvolvido métodos e estratégias de resistências, principalmente nas últimas décadas, e se organizaram
na defesa de seus interesses, inclusive territoriais, direitos estes, elementares.
É nesta disposição que estão os Paiterey quando elaboram o Plano de Gestão. Todavia, havia
outra preocupação, de onde viriam as fontes de captação dos recursos? Nesta busca entenderam
que seria necessário selar algumas parcerias para captação destes recursos focando em doações
de empresas privadas, conforme mostra parte do Plano disposto (Figura 3). Neste caso, como cita
Almir na fala anterior, um dos parceiros potenciais que se dispuseram a ajudar foi a GOOGLE.
Assim, em 2007 o líder solicitou aos executivos da Google que ajudassem seu povo a
monitorar a floresta. No ano seguinte, o Google Earth Outreach, forneceu celular e laptops
equipados com programas de dados capazes de abastecer o povo com informações sobre
a floresta. Uma equipe composta por 30 indígenas foi treinada para monitorar os limites
da Terra Indígena Sete de Setembro com o auxílio de equipamentos tecnológicos (Figuras
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O novo modelo de governança do povo Paiter Suruí frente às novas tecnologias da informação
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 869
Paulo César Barros Pereira • Maria Liziane Souza Silva • José Luiz Gondim dos Santos • Gasodá Wawaeitxapôh Suruí
Nesta reinvenção, entendemos o relato de Almir quando fala que, para combater as
influências provenientes do processo imposto pela modernidade que se abatiam sobre seu povo
foi indispensável a adoção e capacitação de uso de ferramentas tecnológicas de última geração.
Hoje os Paiter Suruí atuam fortemente nas redes sociais divulgando seu povo e sua
cultura. As ferramentas utilizadas são variadas, que vai desde um celular, uma câmera
filmadora, o Google Earth, ou até mesmo a utilização de drones ou VANT (Veículo Aéreo
Não Tripulado) ou VARP (Veículo Aéreo Remotamente Pilotado), uma das tecnologias
que mais tem chamado a atenção nos últimos tempos por possuir diversas utilidades como
por exemplo fazer imagens aéreas em ambientes hostis, conforme Figura 5.
Como vemos, hoje esse povo utiliza as mais modernas ferramentas para divulgar sua
cultura. Os treinamentos recebidos pela Google juntamente com os recursos oferecidos por
ela possibilitaram aos Suruí outra e nova maneira de gestar seu território. As redes sociais
tornaram-se campo fecundo para projetar-se espacialmente de modo prático, principalmente
naqueles ambientes mais longínquos. Esse novo jeito de gerenciamento quebra as fronteiras
geográficas espaciais perpetuadas há décadas. As pressões territoriais sofridas desde o contato
com os não indígenas, fez nascer esse novo modo de gestar sua terra. As novas tecnologias,
tornam-se indispensáveis para o monitoramento do território, razão pela qual o líder Almir
detalha seu pedido de ajuda à empresa Google: “Nós decidimos usar a tecnologia para melhorar
a comunicação, monitorar as ameaças à floresta e divulgar nosso plano de gestão das riquezas
da floresta e preservação da cultura Paiterey”. (SCOFIELD JUNIOR, 2012, p. 01).
Essa preocupação de Almir é pertinente, pois, foi somente após firmar essa parceria
que os Paiterey deram prosseguimento a várias outras ações, dentre as quais concebem o
ambicioso programa de reflorestamento para conter exploração ilegal e recuperar áreas
que foram desmatadas com elevadas antropizações dentro de seu território. O Programa
também almeja conscientizar, por meio de campanhas educativas, os vizinhos do entorno
da Terra Indígena, para tanto, produziram e distribuíram mudas para os agricultores
vizinhos que acreditaram nessa importante ação. (SURUÍ, 2020).
Para além dessa questão, encontramos ainda em outros Paiterey que se destacam
nesse campo tecnológico, com a utilização de ferramentas que permitem ao povo não
somente comunicar entre si, mas usufruir desse aparato para o oferecimento de denúncias,
ao tempo em que divulgam sua cultura e ações que desenvolvem no território. Dentre os
exemplos citamos o de Gasodá Suruí (6), o qual deixou o seguinte registro no dia 24 de
maio de 2012 em sua página de Facebook publicada em 11 de julho de 2012:
A tecnologia passou a fazer parte da vida dos índios, que hoje mantêm um blog e
estão no Twitter. Essa prática deve ser adaptada a distintas realidades, mas sempre faz
com que pessoas e comunidades possam efetivamente se inserir num novo mundo.
Toda essa ciência voltada para o mundo do branco também faz parte da ciência dos
povos indígenas. O computador é um instrumento a mais para a nossa vida, para
podermos mandar a nossa mensagem, receber mensagens e utilizar essa mensagem
de forma estratégica, aprender a lidar com cada um desses mundos diferentes.
Destarte, considera-se que estas novas tecnologias causam impactos, o que poderia
considerar-se positivos ou negativos depende da possibilidade e do modo como acessam
os conteúdos – no caso da informática; em tal perspectiva entendemos até aqui como algo
positivo, visto que reestrutura e auxilia no resguardo territorial e na valorização dos laços
870 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
O novo modelo de governança do povo Paiter Suruí frente às novas tecnologias da informação
culturais, espirituais e sociais, ao tempo que se conecta com o mundo e com isso abre
outras possibilidades de comunicação sobre o que ocorre na Terra Indígena (Figura 6).
Decorrido quase cinco décadas do pós-contato, os Paiter Suruí dizem ter aprendido
com o passado, com as lutas e, com isso, tiram lições para enfrentar novos desafios. Hoje
também atuam através de seu centro cultural compartilhando seus saberes para aqueles
que se permite conhecer o “outro” originário.
O fato de aliar seus arcos e flechas com computadores, notebooks entre outras
ferramentas tecnológicas, de acordo com o que afirmam, trouxe implicações relevantes
para o interior de seu território. Contudo, nem por isso deixaram de ser indígenas. Estas
ferramentas propiciaram, inclusive, que possam contar sua história; sua cultura; suas
realizações como povo, dentro dos princípios; dos valores e da ética dos Paiterey, que é o
respeito à natureza e a todas formas de vida existentes no Planeta.
Se nas duas primeiras décadas do pós-contato os Paiterey ficaram numa condição
bem vulnerável, devido à mortandade de seus membros ocasionadas pelas mais distintas
doenças que até então não conheciam, na década de 1990 em diante experimentam um
crescimento populacional bastante expressivo (Figura 7).
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 871
Paulo César Barros Pereira • Maria Liziane Souza Silva • José Luiz Gondim dos Santos • Gasodá Wawaeitxapôh Suruí
Fonte: Terras Indígenas do Brasil. Organizado por Adnilson de Almeida Silva (2020)
Figura 7. Evolução populacional do povo Paiter Suruí (1992-1994)
APONTAMENTOS FINAIS
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O novo modelo de governança do povo Paiter Suruí frente às novas tecnologias da informação
NOTAS
REFERÊNCIAS
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Paulo César Barros Pereira • Maria Liziane Souza Silva • José Luiz Gondim dos Santos • Gasodá Wawaeitxapôh Suruí
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O novo modelo de governança do povo Paiter Suruí frente às novas tecnologias da informação
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Daniel Delani • Francisco de Assis Mendonça
RESUMO: O artigo objetiva contribuir para uma reflexão sobre as dimensões geográficas
(socioespaciais) e antropológicas das benzedeiras/ores em Porto Velho, capital do
estado de Rondônia. Esses protagonistas tradicionais encontram-se à margem do regime
dominador e influente (medicina moderna). As grandes mudanças ocorridas na Amazônia,
especialmente na cidade de Porto Velho, fazem desta, uma região singular para o estudo
de populações humanas em transição, de um estilo de vida mais tradicional para uma mais
moderna. A Geografia da Saúde aplicada nesse período pode contribuir para o planejamento
de programas capazes de, eficazmente, atender as demandas e necessidades locais. A
coleta de dados ocorreu, principalmente, por meio de entrevistas semiestruturadas com as
benzedeiras/ores e os representantes-chaves. As técnicas de análise de discurso e análise
de conteúdo foram empregadas para interpretação e descrição dos resultados.
1 O artigo é parte da Tese de Doutorado defendida pelo autor no Programa de Pós-Graduação em Geografia da Fundação Universidade
Federal de Rondônia PPGG/UNIR. Dados da pesquisa também foram apresentados e publicados no IX Simpósio Nacional de Geografia da
Saúde, 2019, Blumenau/SC.
2 Mestre em Geografia Humana pela Universidade de São Paulo - USP. Doutor em Geografia pela Fundação Universidade Federal de
Rondônia - UNIR. Professor Adjunto do Núcleo de Saúde (NUSAU) da Fundação Universidade Federal de Rondônia, campus José Ribeiro
Filho. E-mail: danieldelani@unir.br.
3 Mestre e Doutor em Geografia Física pela Universidade de São Paulo - USP. Pós-doutor em Epistemologia da Geografia pela Universite
Paris I - Sorbonne/Pantheon - Institut de Geographie e em Estudo do Ambiente Urbano pela Universidad de Chile - UCHILE. Professor
Titular do Departamento de Geografia da Universidade Federal do Paraná - UFPR. E-mail: chico@ufpr.br.
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Dimensões geográficas e antropológicas das benzedeiras/ores em Porto Velho, Amazônia ocidental brasileira
populations in transition, from a more traditional to a more modern lifestyle. The Geography
of Health applied in this period can contribute to the planning of programs capable of
effectively meeting local demands and needs. The data collection occurred, mainly, through
semi-structured interviews with the folk healers and the key representatives. The techniques
of discourse analysis and content analysis were used to interpret and describe the results.
INTRODUÇÃO
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Daniel Delani • Francisco de Assis Mendonça
DELINEAMENTO METODOLÓGICO
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Dimensões geográficas e antropológicas das benzedeiras/ores em Porto Velho, Amazônia ocidental brasileira
RESULTADOS E DISCUSSÃO
[...] tem 30 anos que eu vivo nesse buraco. Nós chegamos aqui e eles estavam
dando para fazer moradia. Eu vim e rocei. Meu marido vivia pelo mundo,
ele era mecânico. Eu rocei um pedacinho. Pedi para um senhor armar o meu
barraco. Meu primeiro barraco era de madeira. Com o tempo levantei isso
aqui, com ajuda da população que vinha rezar e se dava bem com a reza. Eu
não cobro nada de ninguém, mas a comunidade que ajudou a levantar isso5.
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Daniel Delani • Francisco de Assis Mendonça
Um dos benzedores ressalta que no atual endereço, ele foi “o pioneiro da invasão, antes
disso, o espaço era um sapezal6”. Essas informações sobre o tempo em que os protagonistas
tradicionais residem no mesmo endereço é importante para entender a distribuição geográfica
de algumas destas benzedeiras/ores, localizados em regiões atualmente, privilegiadas, de
Porto Velho, com baixos índices de vulnerabilidade social (Figura 1).
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Dimensões geográficas e antropológicas das benzedeiras/ores em Porto Velho, Amazônia ocidental brasileira
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Daniel Delani • Francisco de Assis Mendonça
Eu não sei nem te explicar, porque desde os doze anos que eu rezo. Faço a
oração, oração da fé. Eu confio mais do que tudo. Uma vez, ainda criança, eu
fui chamada pra fazer uma oração em uma mulher grávida. Quando eu cheguei
lá, depois de fazer a oração, não tive tempo de sair. Eu tive que fazer o parto da
mulher. E assim por diante. [...] Eu não tenho inveja de quem tem estudo, de
jeito nenhum. Eu nunca cobrei nada, comigo é diferente. Se você tem um filho
que está doente, foi no médico e não deu jeito; foi ali e não deu jeito. Chega
aqui, eu olho, oro, entrego nas mãos do Pai e ele é curado10.
Eu era criança quando surgiu esse dom, ainda morava em Manaus. Eu não sei
explicar. Minha primeira vez foi quando chegou uma senhora com uma criança
muito mal. Eu tinha uns doze anos, na época. A criança estava desenganada de
cinco médicos. Ela tinha três meses. Foi então que eu disse: ‘mãe - ainda não
sei por que eu disse -, você acredita em reza?’ Ela disse: ‘eu acredito’. Então
me deixa rezar pelo seu bebezinho. Eu rezei. Ela disse: ‘ele vai morrer?’. Eu
respondi: ‘não, ele vai ficar bom, mas você tem que trazer de novo pra eu
rezar amanhã e depois’. No dia seguinte ela levou e disse que o bebê já estava
bem, já não tinha tido mais febre e já não estava mais com diarreia... Eu disse:
‘graças a Deus!’. Rezei o segundo dia. No terceiro dia, ele já estava bom11.
Outra protagonista tradicional revela que “reza desde pequena, desde que se entende
por gente12”. Ainda sobre essa questão, ela destaca:
Meu pai ia pra roça no Paraná, as minhas irmãs e eu íamos com uma enxadinha
nas costas, atrás. Um dia eu ouvi uma voz que me disse assim: ‘você volta, pega
um ramo verde e para naquele tapiri13 coberto de capim. Lá, tem um menino muito
doentinho. Reze nele’. Eu disse: ‘é pra eu voltar e rezar naquele menino?’ Vou
fazer, faço tudo o que mandam - tem que fazer o que eles disserem. Foi então que
voltei, peguei um raminho verde e bati na porta daquela mulher. Pedi e ela deixou
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Dimensões geográficas e antropológicas das benzedeiras/ores em Porto Velho, Amazônia ocidental brasileira
rezar. Rezei e voltei pra roça. Quando voltei seis horas da tarde, estava fechado. No
dia seguinte ela estava na porta e pediu para eu rezar novamente no filho dela que
ele tinha melhorado, já tinha até se alimentado. Eu agradeci a Deus. Eu tinha doze
anos de idade. Foi a primeira vez que aconteceu. Eu tenho certeza que é Jesus. Eu
fecho os olhos e o vejo com aquela roupinha branca no paraíso dele. Naquele dia
Ele me disse que era essa a minha missão, que a partir daquele dia, eu ia rezar nos
aleijados, nos cegos e tudo mais que chegasse à minha porta.
Curioso perceber que a idade apontada pelas benzedeiras, indica o início de suas
práticas aos doze anos, uma etapa da existência humana caracterizada por alterações
biológicas e psicológicas. Trata-se da fase de transição da criança para adolescência. Já, entre
os benzedores, a idade não pode ser definida com a mesma exatidão. Todavia, indicam ter
ocorrido em período anterior ao que foi observado para as benzedeiras, entre sete e onze anos.
Também é possível observar o uso dos ramos verdes, comum principalmente
entre as benzedeiras que ainda mantêm essa tradição. Nenhum benzedor revelou fazer
uso dessa técnica. Souza (2006), afirma que essa é uma prática muito comum entre as
benzedeiras: utilizar-se de ramos para executar sua oração. Outrossim, o uso de ramos de
ervas no momento da benzeção é confirmado por outros autores que abordam a temática
(CUNHA, 2011; FARINHA, 2011; GOMES, 2010; OLIVEIRA, 1985).
Outro aspecto importante recai sobre a frequência das rezas, usualmente três dias
de orações para fechar o ciclo e alcançar a cura dos males e enfermidades. Situação
igualmente confirmada em Oliveira (1985), Souza (2002) e Trindade (2011).
Outra característica revelada em suas falas diz respeito às práticas vernaculares de saúde
que são desenvolvidas por esses protagonistas tradicionais. Alguns deles acumulam mais de um
ofício, como o de parteira, habitual entre as benzedeiras. Entre os benzedores é mais frequente
observar outras técnicas e procedimentos, como a massagem que trata a desmentidura14.
Todavia, a prática da reza e da oração sobressai-se, de acordo com as benzedeiras/ores, diante
dessas outras técnicas terapêuticas tradicionais que eles desenvolvem.
A respeito da prática do benzimento, os protagonistas tradicionais revelam sempre,
uma origem mística, atribuída a Deus, Jesus Cristo e ao Espírito Santo. Essas três
divindades juntas, na doutrina católica, correspondem a Santíssima Trindade.
Conforme as benzedeiras/ores, essa(s) divindade(s) teria(m) se manifestado no
campo material da vida cotidiana destes protagonistas tradicionais, orienta-os sobre o
modo como desenvolveriam suas práticas. Essa espécie de orientação, procedente de
sua(s) divindade(s), ocorre em todos os seus atendimentos, inclusive, nos dias atuais.
Apenas um benzedor revelou ter tido o auxílio de um índio para o aperfeiçoamento de
suas técnicas de reza e oração, por meio da oralidade. Desta maneira, pode-se admitir que
o ofício da reza e oração realizado pelas benzedeiras/ores trata-se de um dom, um chamado
espiritual próprio de seu sistema de crenças. Souza (2008), confirma essa perspectiva.
Trindade (2011), salienta que o compromisso assumido em fazer o bem, como modo
de reconhecimento do dom recebido, faz com que essas mulheres associem a benzição
com a ação concreta do divino, materializado na bondade de Deus para com as pessoas,
principalmente, para com as crianças. Ainda sobre esse assunto, todos eles destacam que
não são os responsáveis por promover a cura das pessoas, mas sim, essa(s) divindade(s).
Uma benzedeira salienta que: “as pessoas, às vezes, falam que graças a mim, foram
curadas. Eu digo que não. Foi graças ao divino Pai eterno15”. Outro benzedor reforça que
“a gente reza e ajuda a curar, mas quem cura mesmo, é Deus16”.
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Dimensões geográficas e antropológicas das benzedeiras/ores em Porto Velho, Amazônia ocidental brasileira
Em sua fala pode-se observar essa diferenciação das doenças de médico e das doenças
que são tratadas pelas benzedeiras/ores. Inclusive, legitimadas por protagonistas da medicina
moderna, como o próprio médico. Desta maneira, a prática médica oficial promove, ainda que
em parte, um reconhecimento e valorização desses protagonistas e de suas técnicas terapêuticas
para solução de alguns males (doenças) que afetam o estado de saúde do indivíduo.
Apesar dessa característica, todos os protagonistas tradicionais que fizeram parte
desta pesquisa, afirmam que por meio da reza e da oração é possível promover a cura
para qualquer doença. “Trato tudo. Deu uma dor de barriga, vem aqui. Mau jeito no pé,
vem aqui. Está com uma dor, foi no médico e ele não descobriu, vem aqui. O negócio é
assim20”. Outro benzedor reforça esse argumento: “aqui se intercede por todo o tipo de
doença, o mal que atrapalha e todas as coisas que ofendem o ser humano21”. A literatura
também confirma essa afirmação (CUNHA, 2011; FARINHA, 2011; FLORIANI et al.,
2016), especialmente em crianças (MEDEIROS et al., 2013).
A identificação/diagnóstico dessas doenças para as benzedeiras/ores ocorre por meio
de duas perspectivas principais: a primeira, próxima do que é observada e vivenciada no
sistema médico oficial, leva em consideração os relatos dos sujeitos/pacientes – o que
eles trazem de informação, sobre os males que afetam seu estado de saúde. Em alguns
casos, podem-se realizar exames táteis (toque), para auxiliar nessa caracterização. Após o
reconhecimento, procede-se a intervenção adequada. A segunda, por outro lado, revela-se
no campo espiritual para a benzedeira/or. Nesses casos, suas divindades orientam sobre o
mal (doença/enfermidade), que afeta o estado de saúde do individuo, o melhor tratamento
para cada situação e caso, o tipo de reza, etc. Algumas benzedeiras/ores, inclusive, de
acordo do mal trazido pelo seu paciente, neste campo espiritual, realizam a intervenção/
atendimento no quintal de suas casas, para que esse mal não interfira na harmonia interior
do seu lar e coloque em risco, sua segurança e/ou de sua família.
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Daniel Delani • Francisco de Assis Mendonça
[...] a fé é o fundamento das coisas que você não espera, que você não vê. [...]
chega lá e faz uma oração pra um amigo, uma pessoa ruim. Porque tem muita
pessoa ruim que diz: ‘deixa morrer’. Não! Jesus não trabalha assim27.
Esse momento revela, além do destaque sobre a fé, a generosidade com que
esses protagonistas tradicionais desenvolvem suas práticas. Para eles, todas as pessoas,
independente de serem boas ou más, ricas ou pobres, cultas ou não, merecem receber o
alívio da cura de suas enfermidades, por meio da reza e da oração. Estes atendimentos
servem a diferentes pessoas e finalidades. A média diária de atendimentos, realizados
pelas benzedeiras/ores varia de 10 a 15 em Porto Velho.
Outro questionamento que gerou respostas divergentes entre as benzedeiras/ores
diz respeito à participação, contribuição e percepção do Estado sobre esses saberes e
práticas populares de cuidado em saúde, utilizados por elas. Uma delas destacou:
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Dimensões geográficas e antropológicas das benzedeiras/ores em Porto Velho, Amazônia ocidental brasileira
O governo não tem que vir aqui. Esses governantes e esses governos só vêm nos
tempo de política. Nem vem nas casas da gente. O que pessoas como você da área
da saúde quer contar dos rezadores? Porque parteira já não pode mais, foi proibido
de ter filho em casa. Eles cortaram porque agora tem o hospital. [...] Agora, já não
pode mais existir porque eles estão cortando tudo. Eles estão tentando fechar tudo28.
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[...] Nós temos um tempo aqui, e esse tempo não tem médico, não tem sábio, não
tem nada que possa mudar. Até o próprio Jesus que é o filho de Deus, quando ele
se viu mesmo na angústia, na dor, ele falou: ‘Senhor, se for possível, passa de mim
esse cálice, mas que seja feita a sua vontade’. Ele era o filho de Deus, ele podia
dizer: ‘não Pai, eu não quero isso’, mas não o fez. Tem pessoa que estudou; que fez
primeiro ano, segundo ano, terceiro ano, estudou... Mas ainda não é nada33.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
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NOTAS
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Dimensões geográficas e antropológicas das benzedeiras/ores em Porto Velho, Amazônia ocidental brasileira
REFERÊNCIAS
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892 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
Fronteira agrícola e conflitos territoriais nas Amazônias Brasileiras: a expansão
do agronegócio da soja e seus efeitos no planalto de Santarém, Pará-Amazônia-Brasil
ABSTRACT: The research presented in this article aims to analyze the expansion of the
agricultural frontier and the territorial conflicts generated by the arrival of soybeans on the
Santarém plateau, in the state of Pará (Amazonia, Brazil). It is a case study, the methodology
is based on two approaches: the synthesis of the literature and the field work carried out over
the past two decades. The research followed the following stages: state of the bibliographic
art, field work, focusing on direct observations, non-directive interviews with community
members, local leaders, photographic archives, remote sensing and mapping. The main
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Márcio Júnior Benassuly Barros • Otávio do Canto • François Laurent • Andréa Coelho
results show that the introduction of soybean in the municipality of Santarém, from 1996,
led to deep territorial transformations, particularly for the communities lead into a territorial
conflict, faced with the expansion of the agricultural frontier.
INTRODUÇÃO
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Fronteira agrícola e conflitos territoriais nas Amazônias Brasileiras: a expansão
do agronegócio da soja e seus efeitos no planalto de Santarém, Pará-Amazônia-Brasil
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Fronteira agrícola e conflitos territoriais nas Amazônias Brasileiras: a expansão
do agronegócio da soja e seus efeitos no planalto de Santarém, Pará-Amazônia-Brasil
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Fronteira agrícola e conflitos territoriais nas Amazônias Brasileiras: a expansão
do agronegócio da soja e seus efeitos no planalto de Santarém, Pará-Amazônia-Brasil
Polo de produção do Nordeste do Pará: Este polo tem como área de referência a região
do entorno da rodovia Belém-Brasília (BR-010), tendo a cidade de Paragominas como centro de
referência. Nesta região de atuação, houve intensos investimentos por parte do Estado em projetos de
pecuária e extração de madeira que contaram com fomento fiscal principalmente da Superintendência
de Desenvolvimento da Amazônia (SUDAM). Com o fechamento de parte destas atividades
incentivadas no passado, a região passou a ser objeto de atenção para a produção de grãos a partir dos
anos 2000 (PIKETTY et al., 2015). O polo conta com 12 municípios, com solos aptos para o plantio
de grãos e com possibilidade de escoamento da produção pelo porto de Itaqui, no estado do Maranhão,
e porto de Vila do Conde, no estado do Pará (ANDRADE; EL-HUSNY; SILVEIRA FILHO, 2005).
No polo Nordeste, as pesquisas foram executadas pela EMBRAPA e “foram realizadas através das
instalações de dois grupos de ensaios, sendo uma parte em 1996 e outra parte em 1997. Ambos foram
instalados aos arredores da cidade de Paragominas” (EL–HUSNY, 1998, p. 7).
Polo de produção do Sul do Pará: Este polo integra 30 municípios localizados no polígono
limitado ao norte pela BR 222 e BR 230 (Marabá - Pacajá), ao sul pela fronteira com o Mato
Grosso, a oeste pelo rio Xingu e a leste pelo rio Araguaia. Apresenta solos aptos para o plantio
de grãos, inclusive com a presença de terras de cerrado. Na região, está instalada a Ferrovia dos
Carajás, que liga a região ao porto de Itaqui (MA) (ANDRADE; EL-HUSNY; SILVEIRA, 2005).
No sul do Pará “os ensaios da EMBRAPA foram conduzidos na Fazenda Bacaba,
no município de Conceição do Araguaia, em área de propriedade privada (produtor),
localizada a 30 km da cidade de Redenção” (EL–HUSNY, 1999, p. 6).
Polo de produção do Oeste do Pará: Este polo pode ser dividido em dois conjuntos,
um localizado na margem direita, e o outro na margem esquerda do rio Amazonas. O polo da
margem direita do rio Amazonas é formado pelos municípios produtores de grãos do planalto
santareno (Santarém, Belterra, Mojuí dos Campos). Temos como elementos indutores: o porto
de Santarém; a implantação da energia firme da Hidrelétrica de Tucuruí, por meio do Tramoeste;
o asfaltamento da Cuiabá-Santarém (BR-163); além da perspectiva da execução da hidrovia do
Tapajós. O polo da margem esquerda do rio Amazonas é formado pelos municípios de Alenquer
e Monte Alegre que, além de poder disponibilizar do apoio logístico localizado na margem
direita, apresenta solos de muito boa fertilidade natural (ANDRADE; EL-HUSNY; SILVEIRA
FILHO, 2005); porém, até o momento, o agronegócio de grãos não prosperou.
A estratégia da implantação dos três polos de produção de soja no estado do Pará
foi determinante para a instalação e consolidação do agronegócio no estado, uma vez
que, antes de implementar essa forma de produção agrícola, o perfil agrícola estadual era
sobretudo familiar, com grande destaque para o cultivo de mandioca. Esses espaços de
desenvolvimento planejado dos grãos no Pará compartilham solos de fertilidade média
a alta - “argila de Belterra” em Paragominas e em Santarém (TRUCKENBRODT;
KOTSCHOUBEY, 1981) e clima caracterizado por uma estação seca acentuada - áreas
com mais de 5 meses de chuva inferior a 100 mm/mês (SOMBROEK, 2001).
Neste contexto, destaca-se que as políticas públicas conduzidas pelo governo do Estado e
pela Prefeitura Municipal de Santarém foram determinantes para a viabilização desse novo sistema
de produção agrícola em Santarém, além do apoio dos proprietários de terra e pecuaristas, que viram
nesse movimento a oportunidade de valorização das terras e de arrendamentos e incorporação de
áreas que, por diversas gerações, eram utilizadas por pequenos agricultores com base familiar.
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 899
Márcio Júnior Benassuly Barros • Otávio do Canto • François Laurent • Andréa Coelho
As pesquisas executadas pela EMBRAPA nos dois ensaios concluíram que “os
resultados apresentados nos dois anos de avaliação demonstram a adaptação da cultura
na região considerada” (EL–HUSNY, 2001, p. 22). Os estudos técnicos em campos
experimentais realizados pela EMBRAPA em Santarém foram fundamentais para
confirmar o potencial produtivo do polo Oeste do Pará, uma vez que já havia experiência
de plantio no município nos anos anteriores.
Em 1996, “a agrária engenharia e consultoria S\A e o grupo Quincó estabelecem o primeiro
plantio experimental-comercial de soja com 49.4 hectares, na Fazenda Diamantino, localizada
na estrada Curuá-Una, Km 12, no município de Santarém” (HOMMA, 2005, p. 101).
Em 1997, ocorreu a “primeira colheita comercial de 330 hectares de soja em
Paragominas, 30 hectares em Redenção (Leonir Rosseto) e 50 hectares em Santarém. A
agrária engenharia S\A procedeu a exportação de 165 toneladas de soja de Santarém para
Rotterdam” (HOMMA, 2005, p. 101).
O ano de 2003 marca a inauguração do maior instrumento logístico portuário para
exportação de grãos do oeste do Pará: o Porto da Cargill, em Santarém (VALBUENA, 2009). Essa
obra, implantada por meios autoritários, continua sendo questionada por questões ambientais pelo
Ministério Público Federal, por meio da Procuradoria da República em Santarém. Em 2004, o
Greenpeace e organizações da sociedade civil local realizaram intensos protestos nas instalações
portuárias da Cargill, pedindo providências do poder público. Esta situação demonstra claramente
o estabelecimento de forte conflito socioambiental envolvendo o processo de instalação do polo
de produção de grãos, com destaque para a soja no município de Santarém.
O terminal portuário da Cargill e a BR-163 passaram a viabilizar o transporte de
grãos de diversas áreas das Amazônias, a exemplo do sul, oeste do Pará e norte do Mato
Grosso. A empresa francesa Louis Dreyfus Company exporta sua produção de soja do
estado de Mato Grosso utilizando a BR 163 até o porto de Miritituba, em Itaituba, de onde
realiza o transbordo da carga para barcaças até o porto de Santarém, onde é embarcado
em navios tipo panamax para o mercado externo.
Acompanhando esses investimentos, Santarém passou a ter participação importante na
produção de soja, mesmo perdendo parte de seu território, em 2013, para a instalação do município
de Mojuí dos Campos. A área colhida (hectare) de soja do município de Santarém no período de dez
anos, segundo dados oficiais do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), passou de
15.000 hectares, em 2007, para 18.000 em 2017. Destaca-se, entretanto, que a queda significativa de
área colhida 2012/2013 está vinculada ao desmembramento do município de Mojuí dos Campos,
mencionado anteriormente. Há uma clara demostração que o reordenamento territorial, com base
900 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
Fronteira agrícola e conflitos territoriais nas Amazônias Brasileiras: a expansão
do agronegócio da soja e seus efeitos no planalto de Santarém, Pará-Amazônia-Brasil
na introdução do agronegócio, liderado pela soja, no município de Santarém, foi um dos fatores
mais importantes para o desmembramento do seu território e, em poucos anos, o novo município
passou a liderar a produção de soja, evolução que pode ser observada no Gráfico 1.
Gráfico 1. Área colhida (ha) de soja em Santarém e Mojuí dos Campos entre 2007-2017.
Gráfico 2. Quantidade produzida (ton) de soja em Santarém e Mojuí dos Campos entre 2007-2017.
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 901
Márcio Júnior Benassuly Barros • Otávio do Canto • François Laurent • Andréa Coelho
O crescimento da produção de soja foi de 50% entre 2007 e 2017, por um crescimento
de área de somente 20%; isso mostra um aumento forte da produtividade, resultado da
melhoria do sistema tecnológico (fertilizentes, pesticides, OGM, maquinaria agrícola).
De acordo com Censo Agropecuário 2017, havia 34 estabelecimentos de soja em Santarém,
32 em Mojuí dos Campos e 23 em Belterra. O valor da produção de soja em Belterra, em 2017,
foi de R$ 16.174,550. No mesmo ano, o valor da produção de soja em Mojuí dos Campos foi de
R$ 36.849,950 e em Santarém R$ 32.955,910. Embora estes valores sejam relevantes no âmbito
dos municípios, do ponto de vista das exportações, a produção de grãos da região do chamado
Planalto Santareno, envolvendo os municípios de Santarém, Belterra e Mojuí dos Campos,
representa aproximadamente 5% do volume exportado pelo porto da Cargill, em Santarém.
A operação do porto da Cargill tem promovido a ampliação das exportações de
grãos, originárias do Mato Grosso e Rondônia, que representam 95% da carga embarcada.
Destaca-se que entre 2013 e 2018 o volume exportado de soja por este porto passou
de 996.879 toneladas para 2.486.027 toneladas (Gráfico 3). Além disso, por meio dos
trabalhos de campo, observou-se que o porto da Cargill se destaca como um dos principais
indutores do agronegócio de grãos no chamado Planalto Santareno, inclusive é um dos
principais responsáveis pela projeção de conflitos socioambientais, estimulados pelas
disputas entre os donos do agronegócio, formados por grandes proprietários de terra,
grileiros e pecuaristas, e as famílias que viviam há décadas desenvolvendo a agricultura
familiar como estratégia de sobrevivência e mantendo o seu território abrigo; muitas
dessas famílias viviam ou ainda tentam continuar a viver sua vida comunitária neste lugar.
Gráfico 3. Trajetória do volume exportado de soja entre 2013 e 2018 pelo porto da Cargill, em Santarém.
902 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
Fronteira agrícola e conflitos territoriais nas Amazônias Brasileiras: a expansão
do agronegócio da soja e seus efeitos no planalto de Santarém, Pará-Amazônia-Brasil
Sua localização é estratégica, na foz do rio Tapajós com o grande rio Amazonas, entre as
duas principais metrópoles da Amazônia: Belém-Pará, a leste, e Manaus-Amazonas, a oeste.
Além desta localização privilegiada, o município é servido pela Cuiabá-Santarém (BR-163),
rodovia que o interliga ao centro-sul do país, desde a sua abertura na década de 1970.
A introdução do agronegócio, e mais especificamente o cultivo de soja nesse município,
ocorreu a partir de 1996 como opção política do governo do estado do Pará, acompanhando
a política nacional de estímulo à exportação de produtos primários e a órbita do processo de
expansão do agronegócio nas Amazônias, impulsionado pelo mercado mundial de commodities.
Comandado pelo impulso do mercado mundial de commodities, o primeiro
experimento teve sua colheita em 1997, com bons resultados. Este fato acabou por
credenciar a região do chamado Planalto de Santarém para a investida de produtores de
soja originários de diversos estados do Brasil sobre as antigas áreas de pastagens, áreas de
uso pela agricultura familiar e áreas de florestas: de maneira direta, para plantio de soja;
ou indireta, realizada por comunitários que venderam suas terras ou foram expulsos por
falta de documentação. Em busca de novas áreas para se estabelecerem e se reproduzirem
socialmente, passaram a investir sobre áreas de floresta primária.
Essa onda de (re)ocupação do território tem dois eixos principais: a rodovia Santarém-
Curuá-Una (PA-370) e Cuiabá-Santarém (BR-163). Assim, nas pesquisas de campo realizadas
nesses eixos, desde 1997, constataram-se transformações no uso e, por conseguinte, na
cobertura do solo, acompanhadas de conflitos de diversas ordens, como aqueles gerados pela
aplicação de agrotóxicos nas extremas de propriedades, obrigando a saída compulsoriamente
‘negociada’ de comunitários dos seus lotes; ou por meio de intimidações e agressões.
Nas comunidades de Tipizal, São Jorge, Santa Rosa, Secretaria, Curupira, Boa
Esperança, Volta Grande, Paxiúba e Guaraná, todas localizadas às margens da PA-370, o
avanço do plantio da soja foi intenso, implicando em uma série de mudanças de ordem
social, econômica e territorial nelas, que tinham como atividades principais a produção
agrícola de diversas lavouras, tais como mandioca, arroz, feijão e milho.
As comunidades localizadas ao longo da PA-370 foram as primeiras de Santarém
a receberem a introdução da soja em seus territórios, uma vez que foi ao longo desta
rodovia (Serra do Diamantino) que Francisco Quincó introduziu a soja em um plantio
pioneiro em 1996. Estas comunidades, até a inauguração da Usina Hidrelétrica de Curuá-
Una, em 1977, com a abertura da rodovia Santarém-Curuá-Una (PA-370), possuíam
pouca ligação com a sede municipal; portanto, viviam uma temporalidade marcada pela
produção dos seus territórios-abrigos, contribuindo para a diversidade que se manifesta
por meio da pluralidade amazônica, certamente sem viver isolamento absoluto, como se
observou pela antiga exploração do pau-rosa (Aniba rosaeodora).
Com base nos levantamentos de campo nas comunidades das adjacências da PA-
370, até a década de 1940 elas praticavam extração de óleo de pau-rosa. No local, havia
diversas usinas de beneficiamento deste óleo vegetal, que era comercializado para o
mercado interno e externo, tendo como principais compradores indústrias de perfumes
do Brasil e do exterior, com destaque para a França, fundamentalmente para o fabrico do
Chanel nº5, muito conhecido e apreciado mundialmente.
Nas pesquisas realizadas ao longo da rodovia Cuiabá-Santarém (BR-163), no sentido
Santarém-Belterra, o processo de expropriação das comunidades também acompanhou
o ritmo de expansão da soja. Comunidades inteiras desapareceram completamente ou
parcialmente para dar lugar às grandes concentrações de terra para o agronegócio, que
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 903
Márcio Júnior Benassuly Barros • Otávio do Canto • François Laurent • Andréa Coelho
envolve áreas de plantio e a logística necessária. Até hoje ainda é possível ver as marcas
desse processo de subordinação do território-abrigo das comunidades, por meio de registros
como cemitérios, ruínas de escolas e outros objetos remanescentes.
A maneira de (re)apropriação das terras para o agronegócio foi extremamente
agressiva e resultou no esvaziamento da população, uma vez que ocorreu a desestruturação
da vida comunitária e aqueles que, em um primeiro momento, tentaram se manter nas suas
terras, passaram a ter dificuldades, pela ausência de serviços e da solidariedade comunitária,
condição fundamental para a existência dos seus membros. Por outro lado, à medida que as
comunidades se desestruturavam, o município reduzia a sua presença na forma de transporte,
escola, posto de saúde etc. Neste sentido, a pesquisa analisou que o município também
funcionou como um ente desagregador da vida comunitária, ao implementar a sua política
de apoio e fomento do agronegócio no município em detrimento da vida comunitária.
A pesquisa verificou que os conflitos socioambientais, mais especificamente pela
apropriação e uso da terra, são antigos. Eles já eram registrados face às disputas envolvendo
as atividades pecuaristas, madeireiras e outros recursos. Entretanto, a chegada da soja
intensificou os conflitos existentes e os potencializou, uma vez que o poder organizativo
e financeiro dos denominados sojeiros estava amparado pelo projeto político do estado
de transformar o município de Santarém em um polo do agronegócio. Dessa maneira,
as comunidades e, por conseguinte, a agricultura familiar foram deixadas em completa e
absoluta desvantagem no campo das disputas pela “terra de trabalho”. Esta situação deixou
as comunidades completamente desorientadas, sem saber como lidar com a situação.
Por esta razão, a cada retorno do grupo de pesquisa, ao longo do processo de
implantação desse polo agrícola, ocorria dificuldade de localizar os antigos moradores,
que passaram a se deslocar para as periferias das cidades adjacentes ou buscavam
novas áreas de floresta mais distantes para se (re)estabelecerem como comunidade ou
simplesmente como unidade familiar lutando pela sobrevivência, ainda que muitos deles
tivessem procurado por instituições que pudessem lhes prestar orientações e alguns tipos
de auxílio, a exemplo da Comissão Pastoral da Terra (CPT), Sindicatos dos Trabalhadores
e Trabalhadoras Rurais (STTR), Ministério Público, dentre outras.
A pesquisa observou que com a chegada dos sojicultores em Santarém muitos
trabalhadores rurais venderam seus lotes tentando aproveitar a oportunidade de sair do campo
para a cidade, inclusive se deslocando para cidades maiores como Manaus e Macapá, embora
se tenha observado que maior a parte foi para a periferia de Santarém. Outros, entretanto,
foram compelidos a vender as suas propriedades por força da pressão, intimidação e violência.
Aqui vale o registro de que a pesquisa não conseguiu quantificar, em razão da falta de recursos,
o deslocamento dessas pessoas e quais os seus destinos após saírem de suas terras.
O ano de 2018 foi o último ano de levantamentos que deu origem a este artigo. Nesse
período, foi possível constatar que o processo de expansão da sojicultura continua em
andamento. Por exemplo, na Boa Esperança, Paxiúba e Volta Grande, a abertura de novas áreas
para o plantio de soja estava em curso e as áreas desmatadas geralmente ficam escondidas com
uma pequena faixa de vegetação ao longo da rodovia, o que impede a identificação por quem
transita na rodovia; no entanto, ocorreu o processo de identificação por meio de imagens de
satélite que, posteriormente, foi checado pela equipe em campo. Esse processo de crescimento
frenético do agronegócio, com destaque para o cultivo de soja, pode ser observado no mapa
que demonstra a evolução da agricultura, ou seja, mais de 1.300% na área do recorte espacial
definido para análise (os munícipios de Santarém, Belterra e Mojuí dos Campos).
904 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
Fronteira agrícola e conflitos territoriais nas Amazônias Brasileiras: a expansão
do agronegócio da soja e seus efeitos no planalto de Santarém, Pará-Amazônia-Brasil
Em 2005, foram encontrados 3.613 ha de área agrícola; em 2010, passou para 13.993
ha e, em 2018, saltou para 48.312 ha, crescimento sem precedentes na história do Planalto
de Santarém. Assim, esse ritmo de incorporação da terra de trabalho das comunidades e
unidades familiares locais para o agronegócio estimulou problemas sociais, econômicos
e culturais, criando dificuldades de diversas ordens para os modos de vida locais.
A situação dessas áreas agrícolas contrasta com as áreas protegidas da APA Alter-
do-Chão e da FLONA do Tapajós, onde a proteção ambiental permitiu conservar a floresta
e as comunidades nativas e manter a agricultura familiar (COULY; SARTRE, 2012).
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 905
Márcio Júnior Benassuly Barros • Otávio do Canto • François Laurent • Andréa Coelho
Boa Esperança foi uma das comunidades eleitas pelos novos donos da terra como
um lugar possível de moradia e trabalho. Assim sendo, ela passou por significativas
transformações, mas não teve o mesmo destino daquelas que desapareceram completamente
ou parcialmente. Assim, alguns serviços essenciais foram mantidos ou instalados por meio das
políticas públicas. Em Boa Esperança, o “Programa Luz Para Todos” garantiu a presença de
luz elétrica. Há serviços de abastecimento de água mantido pela prefeitura de Santarém, por
meio de um microssistema de abastecimento que atende as residências do núcleo urbano da
comunidade. Além disso, a comunidade passou a contar com diversas igrejas para manter os
comunitários organizados e subordinados à nova ordem imposta pela lógica do agronegócio.
Seguindo esta lógica, Boa Esperança passou a contar com serviços de educação mantidos
pela Secretaria Municipal de Educação de Santarém (SEMED), por meio da Escola Municipal
Francisco Chaves que oferta o ensino fundamental na comunidade e com o ensino médio
mantido pela Secretaria de Estado de Educação do Pará (SEDUC) funcionando em um barracão
construído pelos comunitários localizado em frente da Escola Francisco Chaves. Na área da
saúde, a Prefeitura Municipal de Santarém mantém um centro de saúde com a presença de
médicos para o atendimento de serviços básicos; os casos mais complexos são encaminhados
para a sede municipal, onde existem o Hospital Municipal de Santarém e o Hospital Regional
do Baixo Amazonas, este último mantido pela Secretaria de Estado de Saúde do Pará (SESPA).
A chegada dos sojicultores impôs uma série de mudanças locais, uma vez que maior parte
das terras passou a ser ocupada por plantio de soja, subtraindo substancialmente o tradicional
cultivo de mandioca para a produção de farinha. Dessa maneira, alguns empresários de Santarém
perceberam uma oportunidade de lucrar com a importação da fécula do estado do Paraná, que
passou a ser usada na fabricação de farinha de tapioca nessa comunidade. Apesar disso, muitas
famílias insistem em cultivar mandioca e manter a tradição de produzir farinha amarela e farinha
de tapioca e manter seus produtos como sinônimo de qualidade nas feiras de Santarém. Além
disso, continuam produzindo pimenta do reino, além de derivados da fruticultura.
Quando a pesquisa questionou sobre os possíveis benefícios trazidos pela implantação dos
cultivos de soja na área da comunidade Boa Esperança, em geral, obteve-se como resposta que
antes da chegada da soja existia muita produção de mandioca, milho, arroz, feijão, frutíferas, e que
o plantio de soja não trouxe benefícios para a comunidade, uma vez que o processo de produção é
todo mecanizado e os antigos moradores só ficam olhando as máquinas sendo operadas por poucos
funcionários. As fazendas concentram a terra e não geram emprego para os filhos da comunidade.
Outro aspecto não menos importante ganhou destaque nas análises dos pesquisadores:
o aspecto ambiental, que se manifesta como extremamente preocupante por conta do
acentuado desmatamento, assoreamento de rios e igarapés, poluição de águas superficiais
e uma enorme possibilidade de poluição dos lençóis freáticos pelo uso indiscriminado
de agrotóxicos. Esta situação impõe acompanhamento e monitoramento por parte das
autoridades, pois, caso contrário, nos próximos anos poderemos ter muitos problemas
socioambientais derivados desses problemas apontados por esta pesquisa.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
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Fronteira agrícola e conflitos territoriais nas Amazônias Brasileiras: a expansão
do agronegócio da soja e seus efeitos no planalto de Santarém, Pará-Amazônia-Brasil
REFERÊNCIAS
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 907
Márcio Júnior Benassuly Barros • Otávio do Canto • François Laurent • Andréa Coelho
908 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
Fronteira agrícola e conflitos territoriais nas Amazônias Brasileiras: a expansão
do agronegócio da soja e seus efeitos no planalto de Santarém, Pará-Amazônia-Brasil
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Márcio Júnior Benassuly Barros • Otávio do Canto • François Laurent • Andréa Coelho
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Fronteira agrícola e conflitos territoriais nas Amazônias Brasileiras: a expansão
do agronegócio da soja e seus efeitos no planalto de Santarém, Pará-Amazônia-Brasil
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 911
Rinaldo Marques Padilha • Célia Alves de Souza • Carla Galbiati • Maria Aparecida Pereira Pierangeli
ABSTRACT: The study aimed to analyze the process of occupation and use and land
cover in the hydrographic basin of the Carapá River, in Colíder and Nova Canaã do Norte
- MT. In order to verify the landscape transformation process, searches were made on
bibliographies, public documents, scientific productions and fieldwork. ArcGIS 10.1 was
used for the mappings. It registered several changes in the hydrographic basin, discharging
effluents, mining, urbanization, agriculture and livestock. Approximately 80% of the area
has been deforested and land use, which was initially for agriculture, is currently being
used predominantly by extensive livestock.
912 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
Bacia hidrográfica do rio Carapá, Mato Grosso: ocupação e uso da terra
INTRODUÇÃO
O estudo foi realizado na bacia hidrográfica do Carapá que está inserida na bacia
hidrográfica do Teles Pires e em macro escala compõem a bacia Amazônica. O estudo em
uma bacia hidrográfica é muito importante, pois a partir dele, pode se planejar ações que
contribua para a preservação dos canais, evitando assoreamento, diminuição do fluxo e
extinção de canais fluviais.
Para autores como Vieira, Teixeira e Lopes (2007), Cunha (2008), Cunha e Guerra
(2012) e Santos (2013), as atividades que o homem realiza para fazer uso da terra, como
a remoção da vegetação e o emprego de práticas agrícolas indevidas estão interferindo
de forma direta e negativa sobre as características do ciclo hidrológico em muitas bacias
hidrográficas. As consequências estão afetando a quantidade e a qualidade das águas
superficiais e subterrâneas, provocando mudanças significativas da evaporação no balanço
hídrico, na frequência das secas e das cheias etc.
De acordo com Rodrigues, Malafaia e Castro (2008), as alterações resultantes de ações
antropogênicas aceleram o processo de erosão, destacando-se a ocupação desordenada dos solos
às margens ribeirinhas. A estabilidade das margens está diretamente relacionada à presença de
vegetação, pois, ao retirá-la, proporcionam-se condições favoráveis aos processos erosivos.
Silva e Souza (2012) observam que o uso incorreto da terra (desmatamento,
reflorestamento, queimadas, urbanização, culturas agrícolas, pecuária etc.) promovem
processos de degradação ao ambiente, caso não se apliquem técnicas de manejo adequadas,
que possam garantir o equilíbrio ambiental, principalmente na preservação dos recursos
hídricos e dos solos.
A área de uma bacia hidrográfica está sujeita ao trabalho dos rios, o que caracteriza
a dinâmica fluvial, podendo ser dividida em erosão, transporte e sedimentação do material
detrítico. A falta de manejo adequado do solo e a retirada indiscriminada da vegetação, bem
como a urbanização acelerada próxima dos rios, podem comprometer a dinâmica fluvial
natural da bacia hidrográfica e provocar danos irreversíveis no sistema que a circunda.
Por várias décadas a bacia hidrográfica do rio Carapá, vem sendo alvo de
desmatamento, devido sua localização estratégia nas proximidades da rodovia BR 163,
favoreceu a ocupação nas décadas de 1970 e 1980.
Nesse contexto o presente estudo teve como objetivo analisar o processo de
ocupação e uso e cobertura da terra na bacia hidrográfica do rio Carapá, em Colíder e
Nova Canaã do Norte – MT.
MATERIAIS E MÉTODOS
Área de estudo
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Rinaldo Marques Padilha • Célia Alves de Souza • Carla Galbiati • Maria Aparecida Pereira Pierangeli
Fonte: Elaborado pelo autor a partir de carta geomorfométrica MDE – Topodata INPE na escala
1:250.000 e base cartográfica do banco de dados do IBGE no formato shapefile escala 1:250.000.
Figura 1. Localização da bacia hidrográfica do rio Carapá.
Procedimentos metodológicos
914 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
Bacia hidrográfica do rio Carapá, Mato Grosso: ocupação e uso da terra
RESULTADOS
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 915
Rinaldo Marques Padilha • Célia Alves de Souza • Carla Galbiati • Maria Aparecida Pereira Pierangeli
Fonte: Elaborado pelo autor a partir das imagens Landsat, disponibilizada pelo INPE (2016).
Figura 2. Evolução do desmatamento e uso da terra na bacia do rio Carapá. 1986-2016.
916 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
Bacia hidrográfica do rio Carapá, Mato Grosso: ocupação e uso da terra
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 917
Rinaldo Marques Padilha • Célia Alves de Souza • Carla Galbiati • Maria Aparecida Pereira Pierangeli
918 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
Bacia hidrográfica do rio Carapá, Mato Grosso: ocupação e uso da terra
e borracha, porém são cultivadas diversas outras como: café, castanha-de-caju, guaraná,
palmito (Figura 3), entre outras (IBGE, 2017).
Não foi possível quantificar os números de área plantada e a quantidade em toneladas
de cada tipo de lavoura temporária dentro da área da bacia; porém, o IBGE divulgou
esses dados por município para o ano de 2015. A partir dessas informações percebe-
se que ao longo de 40 anos de cultivo da lavoura nos municípios de Colíder e Nova
Canaã do Norte, as culturas tradicionais, que impulsionaram a colonização e a economia
nas décadas de 1970 e 1980, foram perdendo espaço para a soja (Figura 4). Esse grão,
por sua vez, acompanhou as tendências de crescimento no restante do estado de Mato
Grosso, concretizando-se como principal produto da lavoura temporária. Em 2015, a soja
compreendia uma área de 38.712 hectares e produziu 127.750 toneladas (Tabela 2).
As culturas permanentes também foram quantificadas pela área total dos dois
municípios que se encontram na área da bacia hidrográfica do Carapá. A partir dos dados
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 919
Rinaldo Marques Padilha • Célia Alves de Souza • Carla Galbiati • Maria Aparecida Pereira Pierangeli
disponibilizados pelo IBGE para o ano de 2015, constatou-se que as lavouras permanentes
ocupam um percentual bem menor em relação às temporárias, sendo a cultura da banana
o principal produto. O cultivo dessa fruta tem registrado um crescimento de 160% na área
plantada e 632% na produção em toneladas em relação ao ano de 2006. A área plantada com
a banana em 2015 foi de 65 hectares e sua produção foi de 1.230 toneladas (Tabela 3).
920 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
Bacia hidrográfica do rio Carapá, Mato Grosso: ocupação e uso da terra
Feirantes, nas feiras livres de quartas-feiras e aos sábados em Colíder e em Nova Canaã do
Norte (Figura 6). De acordo com a prefeitura municipal de Colíder, (2017), as feiras livres
proporcionam fomento, trabalho e emprego aos trabalhadores que se ocupam da agricultura
familiar, fortalecendo e valorizando a produção de produtos orgânicos.
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 921
Rinaldo Marques Padilha • Célia Alves de Souza • Carla Galbiati • Maria Aparecida Pereira Pierangeli
Tabela 4. Produção de alevinos em tanque em 2015, Colíder e Nova Canaã do Norte, MT.
Colíder Nova Canaã do Norte
Espécies
kg Reais (R$) Kg Reais (R$)
922 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
Bacia hidrográfica do rio Carapá, Mato Grosso: ocupação e uso da terra
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 923
Rinaldo Marques Padilha • Célia Alves de Souza • Carla Galbiati • Maria Aparecida Pereira Pierangeli
Figura 8. Córrego urbano com presença de residências em APPs. Bairros Jardim Alegre e Jardim
Barbiero – Colíder 2017.
Não foi observada ligação de esgoto in natura das casas sendo despejado no córrego,
mas é visível em alguns trechos o lixo descartado e perceptível o mau cheiro, principalmente
no período da estiagem. A erosão e o assoreamento vêm aumentando gradativamente devido
à falta de vegetação nas suas margens, sendo uma realidade em todo o seu percurso.
O maior canal urbano é o rio Jaracatiá que nasce no sudeste da cidade e percorre toda a parte
leste e nordeste da área urbana. Esse curso de água teve a vegetação de suas margens totalmente
suprimida nas décadas de 1970 e 1980. Suas nascentes estavam totalmente degradadas, por isso
iniciou em 2005 a recuperação delas a partir do plantio de árvores de várias espécies, por alunos das
escolas públicas do município. Na atualidade, a nascente está recuperada e sua área foi transformada
em parque florestal, atrativo de turismo ecológico. Nos dias que correm, o parque está fechado ao
público para estruturação de acessibilidade, iluminação, bancos e trilha de caminhada.
Em 2012 foi construído por parte da prefeitura um lago artificial, com o objetivo
de promover uma opção de lazer à população. Aproximadamente 750 metros abaixo da
nascente, o rio sofreu uma grande alteração em seu leito. Embora o projeto tivesse o objetivo
de revitalizar o rio e valorizar a paisagem urbana na região central da cidade, até hoje
(2018) a obra não foi concluída, ficando a maior parte das margens desse curso d’água sem
cobertura vegetal adequada. A erosão e a sedimentação são constantes, principalmente em
sua margem esquerda, por não haver pavimentação asfáltica na via de acesso, contribuindo
para o escoamento de sedimentos para o lago pela margem com solo exposto.
A jusante do lago, o rio percorre áreas que foram urbanizadas com várias ocupações
irregulares, cujas casas, em sua maioria, têm o seu quintal dentro da APP do rio Jaracatiá.
Em todo o percurso em que o rio atravessa a cidade, não há vegetação natural, o que se
vê são apenas gramíneas que nasceram espontaneamente ou são vestígios de pastagens
da atividade pecuária recente. Carmo, Vieira e Carmo (2016), em seus estudos sobre as
ocupações irregulares nessa área, constataram que a maioria das residências irregulares é
ocupada por pessoas de baixa renda.
924 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
Bacia hidrográfica do rio Carapá, Mato Grosso: ocupação e uso da terra
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A bacia hidrográfica do rio Carapá constitui uma importante rede de drenagem, que
drena os municípios de Colíder e Nova Canaã do Norte, Mato Grosso. Sendo contribuinte
da bacia do rio Teles Pires, estando inserida na bacia do rio Amazonas.
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 925
Rinaldo Marques Padilha • Célia Alves de Souza • Carla Galbiati • Maria Aparecida Pereira Pierangeli
A bacia hidrográfica do Carapá está sofrendo por várias por décadas os efeitos do
uso inadequado da terra, vinculados a atividades realizadas diretamente (abastecimento,
dragagem e lançamento efluentes) e indiretamente (garimpo, urbanização, agricultura e
pecuária), promovendo a degradação (desmatamento, assoreamento, poluição dos cursos
de água, diminuição da vazão, etc...).
Os cursos de fluviais nas áreas urbanas da bacia mostram um intenso processo de
degradação, associado ao desmatamento da mata ciliar; barramento artificial e; lançados
diretamente de restos de materiais de construção, esgoto, animais e lixos são nos córregos
e rios, promovendo o entulhamento e poluição da água.
A ocupação da terra na área da bacia hidrográfica do rio Carapá, na década de1970
foi incentivada por políticas do governo federal, que estimulava o desmatamento acelerado
sob o pretexto de garantir a posse da terra. As primeiras formas de uso da terra foram
realizadas com a agricultura de arroz, feijão, milho e café, culturas que impulsionaram o
desenvolvimento do local, dando origem ao município de Colíder. Na década de 2010,
aproximadamente 80% da área se encontravam desmatadas em virtude de o uso da terra
ser destinado predominantemente à pecuária extensiva.
REFERÊNCIAS
ARANHA, E.A. Colíder e sua formação histórica. Jornal Folha de Colíder: versão
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926 Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV - (2): Janeiro/Dezembro - 2020
Bacia hidrográfica do rio Carapá, Mato Grosso: ocupação e uso da terra
Ciência Geográfica - Bauru - XXIV - Vol. XXIV- (2): Janeiro/Dezembro - 2020 927
Juander Antônio de Oliveira Souza
ABSTRACT: The objective of this research was to analyze the formation of the Agribusiness-
Production Region-RPA in the region of Vilhena in southern Rondônia, with the production
of grains, which led to the transformation of the municipality of Vilhena to an agribusiness
city with modern agriculture. Agricultural activity has been present in Rondônia since the
beginning of its colonization process, with the advance of man over the territory and new
areas appearing for agriculture. With the implantation of the Amaggi Group’s bulk terminal,
on the Madeira Waterway, in 1997, soy emerges in the State as an agricultural product,
bringing new agricultural dynamics to the region. The globalization process establishes
new forms and functions for social processes, from the use of territory by man, bringing
transformations in the geographical space, as has been happening in the state.
1 Engenheiro de Produção. Mestre em Geografia e Doutorando no Programa de Pós-Graduação Mestrado e Doutorado em Geografia da
Fundação Universidade Federal de Rondônia – UNIR. Professor Assistente II da UNIR/Campus de Cacoal. E-mail: juander@unir.br.
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A formação da Região Produtiva do Agronegócio-RPA de Vilhena-Rondônia
INTRODUÇÃO
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A formação da Região Produtiva do Agronegócio-RPA de Vilhena-Rondônia
A RPA de Vilhena, localizada no Sul de Rondônia, possui área territorial de 31.448 km2,
composta por sete municípios, sendo Cabixi, Corumbiara, Colorado do Oeste, Pimenteiras
do Oeste, Cerejeiras, Chupinguaia e Vilhena. Este último, é o maior da região em população
e desenvolvimento econômico, se tornando um polo de referência com o comércio e
prestação de serviços. A principal influência da colonização foram os fluxos migratórios,
com a implantação do Plano de Integração Nacional - PIN que o estado recebeu em seus
ciclos, o que propiciou a criação de Vilhena e outros municípios, seguindo a mesma lógica
de ocupação da região amazônica. A Figura 1 mostra a localização da RPA de Vilhena.
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Juander Antônio de Oliveira Souza
O Quadro 1 traz o resultado dos Censos Demográficos referentes ao ano de 2000 e 2010,
apresentando a variação populacional entre os municípios da RPA de Vilhena. Os municípios
de Cabixi, Cerejeiras, Colorado do Oeste, Corumbiara e Pimenteiras do Oeste, apresentaram
uma redução na população total, sendo mais significativa em termos percentuais a redução da
população rural de Colorado do Oeste com -32,56%. Enquanto que, Chupinguaia e Vilhena
apresentaram um crescimento populacional total de 50,35% e 42,17%, com um aumento da
população rural de 30,03% para Chupinguaia e 32,93% para Vilhena.
Conforme estimativa do IBGE para o ano de 2019, a população total da RPA
de Vilhena continua crescente, com cerca de 156.201 habitantes (IBGE, 2019) e um
crescimento acumulado aproximadamente de 12% entre os anos de 2010 para 2019.
Quadro 2. Rondônia: os dez municípios com maior produção de soja e área plantada em 2018.
Produção em Área em
Ranking dos Municípios
Toneladas hectares
Rondônia 1.000.311 300.816
1. Vilhena 168.540 53.000
2. Corumbiara 121.680 39.000
3. Pimenteiras do Oeste 113.100 32.600
4. Cerejeiras 112.620 29.000
5. Chupinguaia 101.400 26.000
6. Cabixi 86.234 24.780
7. Rio Crespo 50.076 16.146
8. São Miguel do Guaporé 32.010 10.670
9. Porto Velho 30.880 9.650
10. Alto Paraíso 29.966 9.174
Fonte: SIDRA.IBGE (Produção Agrícola Municipal, 2018). Organização: Autor.
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A formação da Região Produtiva do Agronegócio-RPA de Vilhena-Rondônia
RESULTADOS E DISCUSSÕES
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O ano de 2017 teve o maior número de abertura de empresas da série histórica totalizando
1.097. Em 2018 ocorreu uma redução de 47,67% em comparação a 2017 totalizando 574
empresas abertas (Figura 2). Essa redução de abertura de empresas pode ser decorrente da
situação política que o país atravessava após o impeachment da presidente Dilma Rousseff,
somado ao ano eleitoral de 2018, gerando incerteza na economia, considerando os planos
de governo apresentados pelos candidatos com propostas de políticas de desenvolvimento
econômico para a condução do país. Essas propostas políticas podem aumentar ou diminuir
o risco de investimentos para atrair investidores, desaquecendo a economia doméstica e
diminuindo a abertura de novas empresas.
De acordo com a JUCER, o estado fechou o ano de 2019 com 132.159 empresas com
cadastro ativo, sendo que Vilhena comporta 7,18% desse total, correspondendo a 9.493 empresas.
Em 2019, das empresas rondonienses com cadastro ativo, apenas 55.440 unidades empregaram
trabalhadores formais, gerando 235.172 vagas de empregos, em Vilhena são 4.475 empresas
com 18.303 vagas de empregos formais correspondendo a 7,78% (JUCER, 2019).
Vilhena é o terceiro município com maior número de empresas ativas no estado, ficando
atrás de Porto Velho com 45 mil empresas e Ji-Paraná com 11,8 mil empresas, estando a
frente de Cacoal e Ariquemes (as cinco maiores cidades do estado) com 8,9 e 7 mil empresas
(JUCER, 2019). Nem todas as empresas com registro ativo geram emprego formal, muitas são
de micro empreendedor individual-MEI, que se registram para sair da informalidade.
Como cidade do agronegócio, Vilhena apresenta 231 empresas ligadas diretamente
ao ramo agropecuário com registro ativo conforme figura 3, sendo o quarto município com
maior número desse segmento, ficando atrás de Porto Velho com 851, Ariquemes com
291, Ji-Paraná com 228. O forte do agronegócio vilhenense é a agricultura com cultivos
de grãos (soja e milho), enquanto Porto Velho e Ariquemes produzem mais bovinos,
porém apresenta um crescimento na produção de grãos. Ji-Paraná e Cacoal tem forte peso
na atividade pecuária leiteira em estabelecimentos da agricultura familiar, provenientes
do modelo de colonização não sendo destaque com a produção de grãos.
Estratificando as empresas do ramo da agropecuária instaladas em Vilhena com registro
ativo, pode ser observado o crescimento anual conforme Figura 3, que traz a série histórica das
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A formação da Região Produtiva do Agronegócio-RPA de Vilhena-Rondônia
empresas do ramo agropecuário entre os anos de 1997 à 2019, com o total de empresas com
registro ativo e abertura de novas empresas a cada ano. O ano de 2010 foi o que apresentou
maior número de abertura de empresas, com crescimento acentuado a partir de 2014 até 2017.
*Dado não disponível referente a abertura de empresas para 2019. Fonte: Pesquisa de campo, 2019.
Figura 3. Empresas do ramo Agropecuário ativa e abertura em Vilhena, 1997 a 2019.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
REFERÊNCIAS
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Juander Antônio de Oliveira Souza
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Revista Ciência Geográfica
Ensino - Pesquisa - Método
COMISSÃO DE PUBLICAÇÃO
Antônio Francisco Magnoni
944 Ciência Geográfica - Bauru - XVI - Vol. XVI - (1): Janeiro/Dezembro - 2012
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superior e ou de ciências afins. de área igual ou maior que 10x15 cm; caso sejam menores do que 10x15 cm,
2 - Os artigos serão publicados a partir de revisão realizada dentro das normas deverão ser “escaneados” com resolução de 600 dpi’s;
técnicas do periódico, podendo conter, no mínimo 10 (dez) e no máximo 40 g) Fotos deverão ter a resolução mínima de 3MP (Megapíxel) para o formato
(quarenta) páginas, incluindo resumos e referências bibliográficas. Os títulos, original da câmera digital ou devidamente “escaneadas” na resolução de 300
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portuguesa, inglesa e espanhola ou francesa. do que 10x15 cm, deverão ser “escaneadas” com 600 dpi’s, gravados com
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Ciência Geográfica - Bauru - XVI - Vol. XVI - (1): Janeiro/Dezembro - 2012 945
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