Os Lusíadas em Quadrinhos - Fido Nesti e Os Recursos Da Adaptação PDF
Os Lusíadas em Quadrinhos - Fido Nesti e Os Recursos Da Adaptação PDF
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Itabaiana – SE
Janeiro de 2015
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Itabaiana – SE
Janeiro de 2015
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AGRADECIMENTOS
Aos meus pais, Mª de Lourdes e Paulo, pelo apoio, pela compreensão, pelo amor
incondicional, pelo incentivo.
Resumo
Este estudo teve por finalidade investigar os recursos de adaptação de um texto
literário para a HQ utilizados pelo cartunista Fido Nesti em Os Lusíadas, de Luís
de Camões. Buscou-se compreender, a partir da observação detalhada da obra
original, o que se ganha e o que se perde na transição do poema camoniano para
a HQ, observando, além disso, a utilização dos recursos gráficos na transposição
de um gênero para o outro, e a redução e a simplificação do enredo do texto
original. Baseando-me nas relações entre a teoria épica do discurso, de Anazildo
Vasconcelos da Silva, e a obra Poemas épicos: estratégias de leitura (2013), de
Christina Ramalho, ressaltei a permanência ou não de peculiaridades épicas de
Os Lusíadas na adaptação de Nesti. Evidenciei, em seguida, que essa adaptação
de Os Lusíadas pode ser utilizada em determinados níveis de ensino, para
promover um contato indireto inicial com a obra camoniana de estudantes não
acostumados às leituras épicas. Nesse sentido, Maria do Rosário Mortatti
Magnani (2001) oferece uma reflexão sobre a formação do gosto literário e
Silvério Benedito (1997), algumas considerações críticas sobre a épica de
Camões. Para abordar o gênero HQ, tive como base as formulações teóricas de
Scott McCloud (1995), Moacy Cirne (2005), Will Eisner (1999, 2001 e 2005),
assim como foram consideradas as reflexões de Túlio Vilela (2009), de Lielson
Zeni (2009), Morgana Kich (2008), Gonçalves (2009) e Ramos e Panozzo (2009)
sobre a adaptação de textos literários, algumas delas com foco especial na obra
camoniana, para a linguagem dos quadrinhos.
SUMÁRIO
Introdução – pág. 6
Introdução
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Extraído de texto disponibilizado no site www.cimeep.com. Consulta realizada em 10/10/2014.
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esse episódio, Benedito (1997) elucida o fato de o poeta voltar-se para um caso
com carga sociotrágica de um amor infeliz, depois de ter narrado a bravura de D.
Afonso IV na vitória do Salado. Em suma, de acordo com Benedito, o episódio
consiste na invocação e divinização do “amor”, ou ainda, estado feliz de Inês; a
decisão sobre a morte de Inês, cenário e personagens; discurso de Inês e sua
execução; e a “morte escura” de Inês de Castro.
Benedito refere-se ao episódio “Velho do Restelo” como sendo a
ultrapassagem da condição humana e seu castigo. Segundo o crítico, a sugestão
do velho para que os portugueses se atenham a explorar o Norte da África
carrega uma crítica implícita à ambição expansionista portuguesa. Para o
estudioso, o que está em questão é a tragédia do homem, levada pelo desejo de
exceder os limites impostos à condição humana. Segundo Moisés, esse é um dos
episódios em que o poeta “se viu obrigado a colocar maior ênfase” (2004, p. 59),
por ser “excrescente ou meramente marginal ao eixo central da epopeia” (2004,
p.59).
Com suas inovações, Camões edifica uma epopeia renascentista, ou seja,
moderna, contrária aos ensinamentos antigos, e voltada para a nova idade do
homem.
De acordo com Benedito, “o mito do Adamastor diz respeito à
personificação dos mistérios, dos perigos e dos castigos do mar” (1997, p. 53). O
crítico ainda destaca que fatores como a língua, os recursos estilísticos, a
colocação certa das palavras, a fluência organizada da dicção, os tons
sentimentais como: o medo, a raiva e a alegria, a rima dos decassílabos e a
variedade dos sons conforme as ideias e sentimentos, contribuem para que o
Gigante Adamastor seja o mais destacado símbolo de medo e perigo do mar, bem
como o preço a pagar pela extrapolação dos limites humanos. Já Moisés (2004)
ressalta que é possível percebermos ao longo do poema a presença de Camões
transferindo para os personagens seus próprios sentimentos e suas frustrações.
Os episódios líricos, segundo Silva (2007), rompem com o afastamento
entre o narrador e a narrativa, de modo a fazer a passagem do herói do plano
histórico para o maravilhoso, com a função de desempenhar no modelo épico
renascentista, a mesma grandiosidade do modelo clássico. Assim, podemos dizer
que, através desses episódios, acontece a transfiguração do herói e do relato.
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O épico foi considerado no século XVIII por uma boa parte da crítica
ocidental como um gênero estagnado, e ainda, por muitos teóricos, como extinto.
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de uma elaboração literária. Sendo que, no primeiro caso, a matéria épica se trata
de uma construção coletiva, gerada no seio de uma dada cultura, por meio de
uma adição de aderência mítica a um fato histórico, que, por obter uma
característica inesperada, foge do comum conhecimento, passando a ser um feito
maravilhoso mais abrangente, ultrapassando os limites reais e a compreensão
humana na época do acontecimento. Surge, assim, uma dimensão mítica, que,
com o passar do tempo, vai se desfazendo como história, constituindo uma
matéria épica.
No segundo caso, a matéria épica se trata de uma construção literária,
gerada pela interferência criativa do artista no seio das representações
socioculturais de uma dada comunidade, resultando de uma ação criativa
específica constituída a partir do plano literário, que capta os referentes históricos
e simbólicos de sua cosmologia. Isto é, a partir dessas colocações, é possível
identificar como épico ou epopeia todo poema que desenvolva uma matéria épica
por meio da dupla instância de enunciação lírica e narrativa, sem importar se a
origem da matéria épica é espontânea ou resultante de uma ação criativa.
Nesse contexto, Silva (2007) argumenta que epopeia é uma realização
literária específica de uma matéria épica, e que apresenta três planos estruturais,
sendo eles: o histórico, em que se manifesta a dimensão real da matéria épica; o
maravilhoso, em que se manifesta a dimensão mítica; e o literário, em que se
reconhece a intervenção criativa do artista. Dessa maneira, podemos considerar
que a matéria épica constitui-se de uma ideia ou temática resultante do imaginário
de uma determinada sociedade, acarretando as mais diversas manifestações
discursivas, tais como: epopeias, romances, pinturas, inclusive relatos de cunho
científico investigativo e etc. A epopeia, por sua vez, existe somente como criação
literária.
Em face dos argumentos apresentados, torna-se pertinente abordar os
parâmetros críticos e as categorias que melhor subsidiassem a identificação dos
textos épicos, estabelecidos por Christina Ramalho em Poemas épicos:
estratégias de leitura (2013), visto que tais categorias, consoante a autora,
“integram-se harmonicamente ao plano literário da epopeia e permitem, quando
analisadas isoladamente, compreender os mecanismos de que poetas e poetisas
fizeram para consolidar a estrutura épica de seus textos” (2013, p.30). Destarte,
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faz um pedido de inspiração para que possa constituir seu texto, se dispondo
agora a um estilo e a uma linguagem de superioridade. Dessa maneira, invocando
a musa num pedido de inspiração, de refúgio para que o resultado se adeque à
matéria épica em foco.
A invocação se faz presente em Os Lusíadas no momento em que o
narrador pede ajuda às ninfas do Tejo, as Tágides, para compor sua obra:
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As longas citações que se seguirão buscam destacar o estudo estrutural da epopeia camoniana
feito por Sena, e inserir, neste trabalho, parâmetros que possam conduzir o leitor à compreensão
da análise da adaptação em foco.
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oposição a esta aventura com a voz do bom senso do Velho do Restelo. Durante
a viagem destacam-se os temerosos perigos que tem o mar desconhecido, e
também o caso das Cousas do Mar: fenômenos característicos das águas
quentes dos trópicos, o Fogo de Santelmo e a Tromba Marítima, que vem
juntamente com a Tempestade. Diante desses fenômenos, é possível perceber a
mitificação do herói, que reside no desvendar dos segredos da natureza e no
poder de superação do medo.
O episódio do Adamastor é um dos mais importantes na mitificação do
herói. Nesse episódio os portugueses descobrem o seu esconderijo, antes nunca
descoberto. A coragem e a determinação de Vasco da Gama, que não se
amedronta diante do gigante, nem das profecias amedrontadoras, impedem que
Adamastor o derrote. Esse fato simboliza a vitória do humano sobre a divindade.
O episódio do Adamastor liga-se ao da “Ilha dos Amores”, uma vez que foi a
paixão do gigante por Tétis que o levou à punição de Júpiter, transformando-o
num rochedo. Vale lembrar que quando os portugueses são recebidos como
deuses na ilha, Tétis une-se a Vasco da Gama, o que representa o heroísmo
épico, através do marco de superação dos portugueses na determinação, na
coragem e no amor.
Outro elemento que colabora para a mitificação do herói acontece quase no
final do episódio da viagem ao Rei de Melinde, em que o homem dá a sua vida
pela pátria. Vasco da Gama narra, de maneira comovente, o sacrifício e a dor dos
navegantes que morreram devido a doenças.
O episódio da Ilha dos Amores constitui o ápice do processo de mitificação
dos portugueses. Nessa parte da narração, o amor é tido como o prêmio e meio
para alcançar a imortalidade. É interessante frisar que são as próprias deusas que
escolhem os navegadores para se relacionarem, comprovando o seu estatuto de
heróis. Desse modo, podemos ressaltar que o aparecimento mágico da Ilha e
toda a estrutura do episódio revelam a construção da mitificação dos heróis. A
descrição bucólica e sensorial da Ilha, os conselhos de Tétis para as ninfas
fazerem jogos de sedução das ninfas após o desembarque dos marinheiros, a
coroação e sagração dos heróis por meio do amor sensual com as ninfas, dentre
outros, culminam em glória e prazer, o que se tinha iniciado com dor.
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Will Eisner (2001) (Apud ARANHA et al., 2009) elucida que as narrativas
em quadrinhos começam a ganhar destaque no século XVIII, após as primeiras
tentativas em meados do século XVI, em que experimentos medievais se
debruçavam em uma composição verbo-icônica, através de publicações
populares e de folhetos, que principiam a circular alguns textos em quadrinhos,
que mais tarde tomariam a forma atualmente conhecida.
Não sem resistência, segundo Moacyr Cirne (2005), as HQs surgiram a
partir dos avanços (tipo) gráficos, por meio de ilustrações sequenciadas, na
primeira metade do século XIX. Nesse sentido, de acordo com Eisner (2001) e
McCloud (1995) (Apud ARANHA et al., 2009), torna-se pertinente destacar que a
compreensão de HQ, como arte sequencial propriamente dita, da maneira
conhecida nos dias atuais, constituído por ícones e texto escrito, tem
historicamente pouco tempo, sendo totalmente aceita a partir do final do século
XIX, composta de um formato mais próximo do que conhecemos atualmente.
Assim, depois de sofrer durante muito tempo enorme resistência, as HQs
foram reconhecidas como concernente ao universo literário. Embora Eisner (2001,
2005) (Apud ARANHA et al., 2009) tenha sido o primeiro na análise do potencial
literário que as HQs possuem, de modo a investigar a gramática narrativa deste
modo, foi Umberto Eco (2000) (Apud ARANHA et al., 2009) o crítico fundamental
nessa situação, pois a reconheceu pela capacidade literária e autêntica forma de
literatura de entretenimento.
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Eisner (1999) define que “escrever” para os quadrinhos é gerar uma ideia,
e, a partir dela, dispor de elementos de imagens, construir uma sequência da
narração e compor o diálogo. Nesse sentido, o autor elucida que “para se
considerar isoladamente o papel do escritor, é necessário limitar arbitrariamente a
‘escrita’ para quadrinhos à função de conceber a ideia e a história, criar a ordem
da narrativa e fabricar o diálogo ou os elementos narrativos” (1999, p.122). Assim,
em termos de HQs que adaptam obras literárias, pode-se perceber a necessidade
de o escritor se preocupar com a interpretação da sua obra pelo quadrinista, que
deve acatar a submissão à história ou à ideia passada pelo escritor. Então, a
separação entre a escrita e a ilustração está diretamente entrelaçada com a
estética de um único indivíduo.
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Por outro lado, Magnani também reflete sobre a pretensa justificativa de ser
fundamental se utilizarem, nas escolas, obras diretamente produzidas para o
público infantojuvenil. Esse padrão estabelece uma espécie de senso comum
acerca de uma suposta “incapacidade” desse público para alcançar a
compreensão de obras literárias tidas como “adultos”. Magnani afirma, ainda, que:
inserir esses versos, o recurso do quadro com o traçado sinuoso, que de acordo
com Eisner (1999) “é o indicador mais comum de passado” (1999, p.44).
Na segunda página, no primeiro quadro é ilustrado o encontro do casal. No
quadro seguinte, Nesti utiliza a expressão: “Bzzz Bzzz Bzzz Bzzz...” (p.10)
inserido num balão sinuoso indicado por Dom João, numa espécie de resmungo.
Embaixo desse balão, há uma vinheta com o versos que representam o povo se
queixando para que Inês seja condenada: “Vendo estas namoradas estranhezas,/
O velho pai sesudo, que respeita/ O murmurar do povo e fantasia/ Do filho, que
casar-se não queria,” (NESTI, 2006, p. 10). No quadro central, cujo tamanho é
maior que os outros, o estereótipo da maldade é representado por dois homens
vestidos de preto com armas de corte, que arrastam cruelmente a personagem. O
rei já estava comovido com a situação, porém, persuadido pelas exigências
históricas, não sucumbirá aos apelos de Inês. Nos dois últimos quadrinhos o
cartunista ilustra a expressão triste, angustiada de Inês e seus dois filhos.
A terceira e quarta página são compostas pelas súplicas de clemência de
Inês, que se derrama em lágrimas. Os versos estão inseridos em balões
ondulados de fala e em vinhetas. As expressões faciais de Inês e de seus filhos,
recursos utilizados, que segundo Eisner, dão “sentido à palavra escrita” (1999, p.
111), exprimem lamento, tristeza. Já as expressões faciais do rei, que aparece
com a mão sobre a consciência, exprimem nervosismo, e as dos soldados,
segurando Inês com os seus filhos chorando, um abraço com a mãe, e outro
tentando conter um soldado, enfatizam a maldade.
Na quinta página não há balões de fala, somente os versos. Apresenta-se
ali a execução da Inês de Castro. Além de cenas escuras, com a ausência da luz
do sol, aparecem também um castelo todo em vermelho com nuvens pesadas e
elementos que remetem à morte, como o desenho de uma caveira, peixes mortos,
galhos secos, entre outros. Por fim, no último requadro, destacado por ser maior,
com cores em tom de cinza, vê-se o rosto cinza-esverdeado de Inês morta. Vale
ressaltar que a cor cinza representada a neutralidade, o desânimo, a falta de
energia. Inês aparece com um emaranhado de galhos secos e cheios de espinhos
postos na cabeça e no rosto, também aparece com uma coroa na cabeça, que
nas ilustrações anteriores não aparecia, e uma flor vermelha posta entre suas
mãos repletas de galhos secos.
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esmeraldas, rubis, tais que presume/ A vista que divino chão pisava.” (NESTI,
2006, p. 41). A deusa Tétis descreve da máquina do mundo e prediz feitos
valorosos, prêmios e fama ao povo português. Nessas páginas, o autor utiliza
quadrinhos do mesmo tamanho e forma, com exceção apenas de um, que possui
um tamanho maior, no qual todas as deusas e navegadores são ilustrados, além
disso, todos os quadrinhos possuem o recurso verbal, inseridos tanto em balões
quanto em vinhetas.
A nona página apresenta as futuras glórias lusitanas no Oriente através de
ilustrações que remete ao Egito, como a imagem de Cleopátra, e também
aspectos que nos lembram o mundo árabe.
A décima e última página do epísodio “Ilha dos Amores” aborda a partida
da embarcação de Gama de volta à terra lusitana, depois do descanso merecido,
ou, ainda, depois do desfrute do prêmio que os navegantes receberam. Nesti
ilustra essa cena em nove quadrinhos iguais na forma e tamanho,
disponibilizando dos recursos visuais, sonoros e verbais. Nos dois últimos
quadrinhos dessa mesma página, o quadrinista anuncia o “Epílogo”: “Sim,
bravíssimo leitor, as cortinas se fecham... Me parece que este é mesmo o fim...”;
“Mas... Espere! Creio que ainda tenho algumas falas...” (NESTI, 2006, p. 44).
Ramos e Panozzo (2009), ainda ressaltam que a expressão “as cortinas se
fecham...” nos lembra o final de uma peça. Desse modo, Fido Nesti insere ao
texto um aspecto próprio de um terceiro gênero, o dramático.
O “Epílogo”, que compreende as estrofes 145 a 156 do Canto X, é
adaptado em duas páginas, sendo que a primeira possui o quadro inicial maior do
que os outros seis requadros, que são iguais na forma e tamanho. Essa parte
constitui o grande lamento de Camões, que critica, num tom melancólico, o fato
de sua "voz rouca" não ser ouvida com mais atenção ao criticar a corte que
cercava D. Sebastião e a perda dos bons costumes da sociedade, a corrupção
que levaria o país ao caos, como notamos no primeiro requadro que inicia o
Epílogo: “Nô mais, Musa, nô mais, que a Lira tenho/ Destemperada e a voz
enrouquecida,/ E não do canto, mas de ver que venho/ Cantar a gente surda e
endurecida./ O favor com que mais se acende o engenho/ Não no dá a pátria,
não, que está metida/ No gosto da cobiça e na rudeza/ Düa austera, apagada e vil
tristeza.” (NESTI, 2006, p. 45).
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A ilustração é condizente com esses versos, pois Nesti utiliza a cor cinza
como predominante, representando a neutralidade, o desânimo, a falta de
energia. Inês aparece com um emaranhado de galhos secos e cheios de espinhos
postos na cabeça e no rosto, também aprece com uma coroa na cabeça, que não
aparecia nas ilustrações anteriores, o que justifica os versos recitados ao final da
introdução pelo narrador-personagem ao apresentar o episódio Inês de Castro:
“Acontece da mísera e/ Mesquinha que depois/ De ser morta foi rainha!...”
(NESTI, 2006, p.8).
A fonte “dos Amores de Inês”, destacada por Benedito (1997) como sendo
resultado das lágrimas choradas pelas “filhas do Mondego”, “constitui um
espetáculo para olhar o espanto dos leitores-ouvintes que, por invocação, são
convidados a contemplar” (1997, p.88):
O que Nesti possivelmente tentou passar ao leitor com essas imagens nas
quais aparece o Velho afundando na água, é a tentativa em vão de conter a
embarcação, que abre as velas e segue viagem. Ao final do episódio, novamente
a ilustração de Camões aparece para, como já dito, preparando leitor para o
próximo capítulo: “Sim, prezado leitor, pode apostar que este oceano esconde
uma encrenca da grossa...” (NESTI, 2006, p.20).
De acordo com Benedito (1997), “o mito do Adamastor diz respeito à
personificação dos mistérios, dos perigos e dos castigos do mar” (1997, p. 53). O
crítico ainda destaca que fatores como a língua, os recursos estilísticos, a
colocação certa das palavras, a fluência organizada da dicção, os tons
sentimentais como: o medo, a raiva e a alegria, a rima dos decassílabos e a
variedade dos sons conforme as ideias e sentimentos, contribuem para que o
Gigante Adamastor seja o mais destacado símbolo de medo e perigo do mar, bem
como o preço a pagar pela extrapolação dos limites humanos. Já Moisés (2004)
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inseridos versos que lembram o mar vasto que tinham navegado e os obstáculos
vencidos. Por exemplo, a estrofe 19 do Canto IX:
observados na Ilha, utilizando as estrofes 22, 38, 39, 40, 41, 42, 42 e apenas
parte da estrofe 43. Observamos, novamente, que o cartunista não utiliza as
estâncias consideradas pelo crítico como sendo a representação dessa descrição.
O momento das Ninfas com os navegantes é representado por Nesti com
destaque para os elementos visuais. Destacamos a estrofe 64 inserida num
requadro estreito que se estende por todo comprimento da página:
Considerações Finais
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