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A Sabedoria Zen

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Resumo da Doutrina Buddhista

Giovanni Kakugen
As Quatro Nobres Verdades

1. Existe o Sofrimento. Sofrimento é: nascimento, velhice, doença, morte, estar na


presença do que se detesta, estar longe do que se gosta, não obter o que se deseja,
perder o que se deseja.
2. Causas do sofrimento. Os três venenos são sua causa: ignorância, desejo e aversão
3. A Cessação do Sofrimento. Cessando os três venenos
4. O Caminho para Cessação do Sofrimento. É o Nobre Caminho Óctuplo

O Nobre Caminho Óctuplo

1. Compreensão Correta. Saber distinguir os nutrientes saudáveis dos não saudáveis, o


pensamento errôneo do correto, a fala errônea da correta, etc. Compreender as Quatro
Nobres verdades, o karma, a impermanência e o não-eu. É também uma profunda
confiança no Caminho, e uma visão adequada da realidade.

2. Pensamento Correto. É o pensamento que está de acordo com a compreensão


correta. Reflete a realidade das coisas, sem distorções subjetivas. É o pensamento que
não leva aos três venenos desejo ou ao ódio. É cultivar a mente de altruísmo, a mente
que busca a iluminação para beneficiar a todos os seres.

3. Fala Correta. Falar de forma calma e amorosa e ouvir com atenção e compaixão.
Não mentir, caluniar, distorcer os fatos ou exagerar. Não ferir nenhum ser através de
nossas palavras. Não falar inutilmente. Não semear a discórdia. Não falar mal dos
outros. Nossas palavras devem sempre estar de acordo com o Caminho, devem sempre
serem benéficas.

4. Ação Correta. Não-violentar; não roubar; não ter má conduta sexual; comer, beber
e consumir apropriadamente.

5. Meio de Vida Correto. Encontrar uma forma de viver que não o obrigue a matar,
fraudar, mentir, vender armas, drogas, bebidas ou escravos; não tirar a sorte

6. Esforço Correto. É diligência, a perseverança no Caminho. Há quatro práticas ligadas


ao esforço correto: não alimentar sementes não-sadias em nossa consciência;
abandonar as sementes não-sadias já manifestas; alimentar as sementes sadias;
manter as sementes sadias já manifestas. Esforço correto é abandonar a visão errônea
e adotar a visão correta; abandonar o pensamento, a fala e a ação errônea e adotar o
pensamento, a fala e a ação correta . Esforço correto , acima de tudo, é domar a sua
mente.

7. Atenção Plena Correta. Atenção plena significa estar em pleno contato com o nosso
corpo, sensações, emoções, pensamentos, formações mentais, e estado de consciência.
É a prática de observar e cuidar de tudo o que aparece em nós, seja positivo ou
negativo
8. Concentração Correta. É a prática da meditação, zazen. É permanecer
profundamente absorto no momento presente, onde sujeito e objeto desaparecem. A
concentração correta é o resultado natural da prática dos outros itens do Caminho.

Cada um dos aspectos do Caminho contém os outros sete. Os itens 1 e 2 correspondem


à Sabedoria; os itens 3, 4, 5 à Ética; e os itens 6, 7, 8 à Meditação. Os oito aspectos do
Caminho estão interligados – cada um contém os outros sete.
Elementos Básicos do Budismo

* Impermanência: Todas as coisas são impermanentes. Tudo muda o tempo todo


sem parar. Nada é igual nem por um instante. Nada é estável. Um minuto atrás, nós
éramos diferentes tanto física quanto mentalmente . O que nos faz sofrer não é a
impermanência em si, mas o nosso desejo de que as coisas sejam permanentes
enquanto elas não o são. Impermanência é movimento, é vida. As coisas só existem na
sua forma e cor presentes.
* Vazio (ou Não-eu): Nada que existe tem existência em si mesmo, separada e
independente. Cada coisa precisa estar ligada com todo o universo para poder existir.
Cada coisa é uma junção de elementos que não são ela mesma. Não existe nada que é
separado do resto, que possa existir de forma independente e definitiva. Tudo pertence
à mesma onda de Vida.
* Interdependência: Nada pode existir por si só. Tudo é criado por várias condições,
e todos os fenômenos estão interrelacionados. É a Unicidade. Quem compreende
profundamente esta verdade pratica a compaixão, pois vê que é um com tudo o que
existe. Tal pessoa compreende um segredo da vida: que a felicidade só pode ser
encontrada na compaixão e no altruísmo, e que seguir os nossos desejos egoístas só
nos traz sofrimento e perturbação. A interdependência pode ser resumida no seguinte
ensinamento do Buddha: “Vos ensinarei o Dharma: se isso existe, aquilo vem à
existência; do surgir disso, surge aquilo; se isso não existe, aquilo não vem à
existência; da cessação disto, aquilo cessa”.
* Samsara: Todos os seres estão sujeitos à roda do nascimento e da morte
sucessivos. O Budismo acredita em reencarnação: as energias kármicas geradas por
nossas ações boas e más fazem com que a nossa consciência busque novos corpos
para ter novas experiências. Samsara muitas vezes é usado como sinônimo de
sofrimento.
* Karma: É a lei de causa e efeito. Construímos karma através das nossas ações de
corpo, da fala e da mente. As ações virtuosas geram bons resultados e felicidade; as
ações não-virtuosas geram más condições e sofrimento. A retribuição kármica se dá em
três etapas do tempo: nessa mesma vida, na próxima vida, em vidas posteriores.
* Nirvana: Nirvana é a Liberdade Incondicionada. É a liberação total do sofrimento,
um estado de paz inabalável e de indescritível felicidade. É um estado além de todos os
conceitos.
* As Três Práticas: Ética; Meditação; Sabedoria.
* Os Cinco Desejos Básicos: comida/bebida; sono; sexo; riquezas; fama.
* Os Três Tesouros: Buddha: O ser iluminado, ou o Absoluto; Dharma: os
ensinamentos, o Caminho; Sangha: a comunidade de praticantes
* Os Cinco Preceitos: Não matar; não roubar; não mentir; não ter conduta sexual
imprópria; não lidar com intoxicantes.
Não seguir os preceitos não é “pecado”; é, simplesmente, ignorância. “Enquanto a má
ação está verde, o perverso nela se satisfaz; mas, uma vez amadurecida, ela lhe traz
frutos amargos.” – Dhammapada, 119
As Duas Verdades

É a verdade absoluta e a relativa. Em termos relativos, é preciso praticar para extinguir


o sofrimento; em termos absolutos, não há sofrimento, nem caminho, nem realização –
a onda já é a água. Absoluto e relativo se encaixam perfeitamente, e as duas verdades
se complementam. Devemos viver em contato tanto com o absoluto quanto com o
relativo.
As Três Qualidades do Dharma

1. Impermanência: Todas as coisas são impermanentes. Tudo muda o tempo todo


sem parar. Nada é igual nem por um instante. Nada existe que possa ser considerado
um eu permanente. Um minuto atrás, você era diferente do que é agora, tanto física
quanto mentalmente. O que nos faz sofrer não é a impermanência em si, mas o nosso
desejo de que as coisas sejam permanentes enquanto elas não o são. Impermanência é
movimento, é vida.
2. Não-eu, ou Vazio: Nada que existem tem existência em si mesmo, separada e
independente. Cada coisa precisa estar ligada com todo o resto para poder existir.
Cada coisa contém todo o universo, todo o passado e todo o futuro. Cada coisa é uma
junção de elementos que não são ela mesma. Tudo pertence à mesma onda de Vida.
3. Nirvana: Nirvana é a substância de tudo o que existe, a base da existência.
Nirvana é a água, o oceano; os fenômenos são as ondas. Samsara é Nirvana. Nirvana é
o estado de absoluta liberdade e de completo silêncio do coração, além de todos os
conceitos. Nós já estamos no Nirvana, já somos Buddhas, só precisamos é
compreender e manifestar a nossa natureza.

As três qualidades são uma só. Estão profundamente interrelacionadas.


As Três Portas da Liberação

1. Vazio (Sunyata): O vazio é o Caminho do Meio entre a existência e a não-


existência. Vazio significa que nada possui um eu. Quando agimos baseados no vazio,
nossas ações passam a estar de acordo com a realidade.
2. Ausência de Imagens (Animitta): Imagem é qualquer sinal que está na nossa
consciência (sinal provindo de um dos seis sentidos). A realidade encontra-se além dos
sinais. Tudo se manifesta através de imagens, mas as imagens nos enganam.
3. Ausência de Objetivo (Apranihita): Nada existe a ser feito ou realizado. Já somos
Buddhas, só precisamos expressar nós mesmos livremente. Nada nos falta, nada
precisa ser alcançado. Nada há para se fugir ou se correr atrás. A ausência de objetivos
é o que permite viver o momento, e ser felizes aqui e agora.

Os Três Corpos de Buddha

1. Dharmakaya: é a fonte da iluminação, a personificação do Dharma. Todo o


universo é Dharmakaya.
2. Sambhogakaya: é o corpo da beatitude, da bem-aventurança.
3. Nirmanakaya: é o Buddha histórico.
As Três Jóias

1. Buddha: o ser iluminado, ou o Absoluto.


2. Dharma: os ensinamentos, a Verdade.
3. Sangha: a comunidade de praticantes.

As três jóias são uma só. Nosso cuidado com um é o cuidado com todos.
Os Quatro Pensamentos Incomensuráveis

1. Amor: é o desejo de que os outros sejam felizes, e a ação nesse sentido. Tem o
sentido de amizade, pois é o amor incondicional, que nada em espera em troca. Sem
compreensão, não há amor.
2. Compaixão: é o desejo de que os outros não sofram e a ação para aliviar a dor
alheia. Quando entramos em contato com o sofrimento do outro, a compaixão brota em
nosso coração. Para isso precisamos de atenção plena.
3. Alegria: se o amor não traz alegria para quem ama e para o ser amado, não é o
verdadeiro amor.
4. Equanimidade: é o desapego aos opostos, olhá-los de forma igual. Equanimidade
significa imparcialidade, não discriminação, equilíbrio mental. É não discriminar “eu ” e
“outros”. É permanecer imóvel ao sofrer palavras e ações injustas, e ao ouvir elogios. É
não permitir que surja a irritação, a amargura, o desânimo. É experimentar todas as
sensações sem deixar surgir desejo ou aversão.

As Cinco Lembranças

1. Eu tenho a natureza daquilo que envelhece. Não há como escapar da velhice.


2. Eu tenho a natureza daquilo que adoece. Não há como escapar da doença.
3. Eu tenho a natureza daquilo que morre. Não há como escapar da morte.
4. Tudo que me é caro e todas as pessoas que amo tem a natureza daquilo que
muda. Não há como me separar deles.
5. Minhas ações de corpo, fala e mente são meus únicos pertences verdadeiros. Não
há como escapar da conseqüência de minhas ações. Elas são o chão no qual eu piso.

Os Cinco Agregados

1. Forma (rupa): é o nosso corpo físico.


2. Sensação (vedana): elas podem ser agradáveis, desagradáveis ou neutras. Todas
as sensações são impermanentes e sem substância (como todos os outros quatro
Agregados).
3. Percepções (samja): nossas percepções são sempre distorcidas por nossas aflições
mentais já presentes: o medo, o desejo, a raiva.
4. Formações Mentais (samskara): existem 51 tipos de formações mentais, e duas
delas são as sensações e as percepções. Esse Quarto Agregado é composto por todas
as outras 49 formações mentais. Tudo que é feito de um outro elemento é uma
“formação”.
5. Consciência (vijnana): é o alicerce sobre o qual erigimos nossas formações
mentais.
Os Cinco Agregados não são sofrimento em si, mas produzem sofrimento ao nos
apegarmos a eles.
As Seis Perfeições

1. Dana (Generosidade): é o doar, a caridade, a abertura do coração. É dar sem


apego. Podemos dar coisas materiais, ensinamentos, ou a nossa presença, estabilidade
e paz. Fazer algo com a consciência de seu valor absoluto também é dar.
2. Sila (Ética): é viver de acordo com os preceitos buddhistas.
3. Kshanti (Paciência): é a capacidade de tudo aceitar e de perdoar, sem rancor, as
injustiças que nos foram cometidas. É alargar o nosso coração para que um punhado
de sal não deixe nossa água salgada. É ser como a terra, que tudo acolhe sem reclamar
ou discriminar. É absorver tudo o que nos acontece na vida. É semelhante à
equanimidade.
4. Virya (Esforço): determinação, energia, perseverança. É não desanimar ou
desistir. Não vacilar. Avançar sem recuar, decididamente. Nosso esforço deve ser
correto, e não devemos nos apegar aos resultados.
5. Dhyana (Meditação): é a prática do zazen, a prática da atenção plena. É clarear e
libertar a mente. É consumir-se por completo naquilo que se está fazendo, estando
totalmente presente e consciente.
6. Prajna (Sabedoria): é a sabedoria da não-discriminação. É a capacidade de ver as
coisas como elas são. Prajna Paramita é a mãe de todas as paramitas. Sem ela as
outras não vão muito longe. Prajna é a compreensão do vazio.

As seis perfeições, ou paramitas são, em última análise, uma só.


Os Sete Fatores do Despertar

1. Atenção Plena
2. A investigação dos fenômenos
3. Esforço
4. Serenidade
5. Alegria
6. Concentração
7. Equanimidade

Buddha disse que, praticando a Atenção Plena, os Sete Fatores do Despertar se fazem
presentes.

Outros

* Os Três Mundos: passado, presente, futuro.


* Os Três Reinos: o reino dos desejos, o reino da forma, o reino da não-forma.
* Os Três Tipos de Orgulho: achar-se superior aos outros; achar-se inferior aos
outros; achar-se tão bom quanto qualquer um.
* Os Quatro Tipos de Apego: apego aos prazeres dos sentidos, apego às opiniões,
apego às regras e ritos, apego à noção de um “eu ”.
* Os Cinco Poderes: fé, esforço, atenção, concentração, sabedoria.
* Os Seis Sentidos: visão, audição, olfato, paladar, tato e mente.
* Os Seis Grandes Elementos: terra, água, ar, fogo, espaço (akasha) e consciência.
* As Oito Consciências: As cinco primeiras consciências (os cinco sentidos);
manovijnana (consciência mental); manas (intelecto, consciência discriminativa);
alayavijnana (consciência armazenadora, mente inconsciente).
* Os Oito Aspectos da Iluminação: livre da ganância, capacidade de satisfazer-se;
quietude; esforço diligente; memória correta; concentração; sabedoria; evitar
discussões à toa.
* Os Doze Elos da Originação Interdependente: ignorância (avidya); ação intencional
(samskara); consciência (vijnana); nome e forma (nama rupa); os seis sentidos;
contato; sensação; desejo; apego, vir-a-ser ; nascimento; velhice e morte.

Giovanni Kakugen, discípulo de Moriyama Roshi.

A Sabedoria Zen

(Estes textos foram retirados do livro Histórias Zen, compiladas por Paul Reps, da
Editora Teosófica.)

Se Você Ama, Ame Abertamente

Vinte monges e uma monja, cujo nome era Eshun, estavam praticando meditação com
um certo mestre zen.

Eshun era muito bonita, embora sua cabeça estivesse raspada e sua vestimenta fosse
simples. Vários monges apaixonaram-se secretamente por ela. Um deles escreveu a ela
uma carta de amor, insistindo em um encontro reservado.

Eshun não respondeu. No dia seguinte, o mestre deu uma palestra para o grupo, e
quando a palestra terminou Eshun levantou-se. Dirigindo-se àquele que tinha lhe
escrito, ela disse: “Se você realmente me ama tanto, venha e me abrace agora.”

A Lua Não Pode Ser Roubada

Ryokan, um mestre zen, vivia o tipo mais simples possível de vida em uma pequena
cabana no sopé de uma montanha. Uma noite, um ladrão visitou a cabana e
surpreendeu-se ao descobrir que não havia nada nela para ser roubado.

Ryokan voltou e o pegou. “Você provavelmente veio de longe para me visitar”, disse
ele ao gatuno, “e você não deve voltar com as mãos vazias. Por favor, tome minhas
roupas como um presente”.

O ladrão ficou completamente desnorteado. Ele pegou as roupas e escapuliu.

Ryokan sentou-se nu, observando a Lua. “Pobre rapaz”, ele pensou, “eu gostaria de
poder ter dado a ele essa bela Lua.”

Estrada Lamacenta
Tanzan e Ekido estavam uma vez viajando juntos por uma estrada lamacenta. Uma
chuva forte caía persistentemente.
Numa das curvas da estrada, eles encontraram uma moça adorável, vestida com um
quimono de seda e com uma faixa, que não conseguia atravessar o cruzamento.

“Venha cá, menina”, disse Tanzan imediatamente. Levantando-a em seus braços, ele
carregou a moça através da lama.

Ekido não falou mais nada até aquela noite em que eles chegaram a um templo com
pousada. Ele então não pôde mais se conter. “Nós, monges, não nos aproximamos de
mulheres”, disse ele a Tanzan, “sobretudo não das jovens e graciosas. É perigoso. Por
que você fez aquilo?”

“Eu deixei aquela menina lá”, disse Tanzan. “Você ainda a está carregando?”

Sovina no Ensinamento

Um jovem médico em Tóquio chamado Kusuda encontrou um amigo da faculdade que


havia estudado zen. O jovem médico perguntou a ele o que era o zen.

“Eu não posso lhe dizer o que é”, respondeu o amigo, “mas uma coisa é certa: se você
compreender o zen, você não terá medo de morrer”.

“Está certo”, disse Kusuda. “Eu vou tentar. Onde eu posso encontrar um instrutor?”

“Vá ao mestre Nan-in”, disse-lhe o amigo.

Assim, Kusuda foi visitar Nan-in. Ele levou consigo uma adaga de 25 centímetros de
comprimento para determinar se o próprio instrutor tinha ou não medo de morrer.

Quando Nan-in viu Kusuda ele exclamou: “Olá, amigo. Como está você? Nós não nos
vemos há longo tempo!”

Isso deixou Kusuda perplexo, que respondeu: “Nós nunca nos encontramos.”

“Correto”, respondeu Nan-in. “Pensei que você fosse um outro médico que está
recebendo instrução aqui.”

Com um tal começo, Kusuda perdeu sua oportunidade de testar o mestre, e então com
relutância perguntou se poderia receber instrução sobre o zen.

Nan-in disse: “O zen não é uma tarefa difícil. Se você for um médico, trate seus
pacientes com amabilidade. Isso é o zen.”

Kusuda visitou Nan-in três vezes. A cada vez Nan-in lhe dizia a mesma coisa. “Um
médico não deveria perder o seu tempo aqui. Vá para casa e tome conta de seus
pacientes.”

Não estava claro para Kusuda como um tal ensinamento poderia remover o medo da
morte. Assim, em sua quarta visita ele reclamou: “Meu amigo me disse que, quando se
aprende zen, se perde o medo da morte. Cada vez que venho aqui tudo o que você me
diz é para que eu tome conta de meus pacientes. Isso eu já sei. Se isso é o seu dito
zen, eu não vou mais visitar você.”

Nan-in sorriu e deu um tapinha nas costas do médico. “Tenho sido muito rigoroso com
você. Deixe-me lhe dar um koan.” Ele deu a Kusuda o Um de Joshu para ele refletir, o
qual é o primeiro problema para a iluminação da mente, contido no livro O Portal Sem
Portões.

Kusuda refletiu sobre esse problema de Um (“a não-coisa”) por dois anos. No fim desse
período ele pensou ter alcançado a certeza mental. Mas seu instrutor comentou: “Você
ainda não a alcançou.”

Kusuda continuou em concentração por mais um ano e meio. Sua mente tornou-se
plácida. Os problemas se dissolveram. A Não-Coisa tornou-se a verdade. Ele servia
seus pacientes bem e, sem sequer saber, estava livre da preocupação sobre a vida e a
morte.

Então, quando visitou Nan-in, seu velho instrutor apenas sorriu.

Meu Coração Arde Como o Fogo


Soyen Shaku, o primeiro instrutor de zen a vir para os Estados Unidos, disse: “Meu
coração arde como o fogo, mas meus olhos são tão frios como cinzas apagadas.” Ele
fez as seguintes regras, as quais ele praticava todos os dias de sua vida:

De manhã, antes de vestir-se, acenda incenso e medite.

Recolha-se a uma hora certa. Alimente-se em intervalos regulares. Coma com


moderação e nunca até o ponto de satisfação.

Receba o convidado com a mesma atitude que você tem quando está sozinho. Quando
sozinho, mantenha a mesma atitude que você tem ao receber convidados.

Observe o que você diz, e o que quer que você diga, pratique-o.

Quando uma oportunidade surgir, não a deixe passar, contudo sempre pense duas
vezes antes de agir.

Não se lamente sobre o passado. Olhe para o futuro.

Tenha a atitude destemida de um herói e o coração amoroso de uma criança.

Ao se recolher, durma como se você tivesse ingressado em seu último sono. Ao


despertar, deixe sua cama para trás instantaneamente, como se você tivesse jogado
fora um par de sapatos velhos.

O Ladrão que se Tornou um Discípulo


Num entardecer, quando Shichiri Kojun estava recitando sutras, um ladrão com uma
espada afiada entrou, exigindo o seu dinheiro ou a sua vida.

Shichiri lhe disse: “Não me incomode. Você pode encontrar o dinheiro naquela gaveta.”
Ele então continuou sua recitação.

Pouco depois ele parou e disse: “Não leve tudo. Preciso de algum dinheiro para pagar
impostos amanhã.”

O intruso recolheu a maior parte do dinheiro e começou a sair. “Agradeça à pessoa de


quem você recebe um presente”, acrescentou Shichiri. O homem agradeceu e foi
embora.

Poucos dias depois o homem foi preso e confessou, entre outras coisas, o crime contra
Shichiri. Quando Shichiri foi chamado para testemunhar ele disse: “Esse homem não é
um ladrão, pelo menos no que me diz respeito. Eu dei a ele o dinheiro e ele me
agradeceu.”

Após ter terminado seu período na prisão, o homem foi até Shichiri e tornou-se seu
discípulo.

Certo ou Errado

Quando Bankei realizava suas semanas de retiro de meditação, estudantes de muitas


partes do Japão compareciam. Durante um desses encontros, um estudante foi pego
roubando. O assunto foi relatado a Bankei com a solicitação de que o estudante fosse
expulso. Bankei ignorou o caso.

Mais tarde o estudante foi pego em um ato semelhante, e mais uma vez Bankei
desconsiderou a questão. Isso irritou os outros estudantes, que redigiram uma petição
pedindo o afastamento do ladrão, afirmando que, caso contrário, eles iriam embora em
grupo.

Quando Bankei leu a petição, ele convocou todos para comparecerem à sua presença.
“Vocês são irmãos sábios”, ele lhes disse. “Vocês sabem o que é certo e o que não é
certo. Vocês podem ir para algum outro lugar para estudar se quiserem, mas esse
pobre irmão não sabe nem mesmo distinguir o certo do errado. Quem lhe ensinará se
eu não o fizer? Vou mantê-lo aqui mesmo que todos vocês partam.”

Uma torrente de lágrimas limpou o rosto do irmão que tinha roubado. Todo o desejo de
roubar havia desaparecido.

A Sujeição de um Fantasma

Uma jovem esposa adoeceu e estava para morrer. “Eu o amo tanto”, disse ela a seu
esposo, “não quero deixá-lo. Não me troque por nenhuma outra mulher. Se fizer isso,
voltarei como fantasma e lhe causarei infinitos problemas”.
Logo depois a esposa faleceu. O marido respeitou o seu último desejo por três meses,
mas depois encontrou uma outra mulher e se apaixonou por ela. Eles ficaram noivos e
iam se casar.

Imediatamente após o noivado, um fantasma passou a aparecer todas as noites ao


homem, culpando-o por não ter mantido sua promessa. O fantasma também era
esperto. Ele lhe disse exatamente o que havia se passado entre ele e sua nova amada.
Sempre que dava um presente à sua noiva, o fantasma o descrevia em detalhes. Ele
até mesmo repetia conversas e importunava tanto o homem que este não conseguia
dormir. Alguém lhe aconselhou a levar o seu problema a um mestre zen que vivia
próximo da vila. Finalmente, em desespero, o pobre homem foi até o mestre pedir
ajuda.

“Sua antiga esposa tornou-se um fantasma e sabe tudo o que você faz”, comentou o
mestre. “O que quer que você faça ou diga, o que quer que você dê à sua amada, ela
sabe. Ela deve ser um fantasma muito sábio. Você, na verdade, deveria admirar um tal
fantasma. Na próxima vez que ela aparecer, barganhe com ela. Diga-lhe que ela
conhece tanto que você não pode esconder nada dela, e que, se ela responder-lhe uma
pergunta, você promete que desmanchará o noivado e permanecerá solteiro.”

“Qual é a pergunta que devo fazer a ela?”

O mestre respondeu: “Pegue um punhado de grãos de soja e pergunte a ela


exatamente quantos grãos você tem em sua mão. Se ela não puder lhe responder,
você saberá que ela é apenas uma invenção da sua imaginação e não lhe perturbará
mais.”

Na noite seguinte, quando o fantasma apareceu, o homem a bajulou e disse-lhe que


ela sabia tudo.

“Isso mesmo”, respondeu o fantasma, “e sei que você foi ver um mestre zen hoje”.

“E já que você sabe tanto”, perguntou o homem, “diga-me quantos grãos eu tenho
nesta mão!”

Não havia mais nenhum fantasma para responder a pergunta.

Hora de Morrer
Ikkyu, o mestre zen, era muito inteligente até mesmo quando era apenas um menino.
O seu instrutor possuía uma preciosa xícara de chá, uma peça antiga rara. Ikkyu
acabou quebrando essa xícara e ficou completamente perplexo. Ouvindo os passos de
seu instrutor, ele segurou os pedaços da xícara atrás de si. Quando o mestre apareceu,
Ikkyu perguntou: “Por que as pessoas têm que morrer?”

“Isso é natural”, explicou o homem mais velho. “Tudo tem que morrer e tem um tempo
determinado para viver.”

Ikkyu, mostrando a xícara despedaçada, acrescentou: “Era tempo da sua xícara


morrer.”
Do livro "Utsukushi Hitoni, da Rev. Shundo Aoyama Roshi,
Abadessa do Mosteiro Aichi Senmon Nisodo (Nagoya - Japão)

Certa vez, folheando os anais dos monges Zen da dinastia T'ang, ao ler o provérbio
"Ajudar burros a atravessar, ajudar cavalos a atravessar", fiquei muito surpresa pela
semelhança do provérbio com meu trabalho. Devo ser como uma ponte, possibilitando
a todos atravessar. No grupo que dirijo, existem pessoas em diferentes estágios de
prática e, mesmo monges, são pessoas comuns, com momentos de delusão. Estas
palavras surgiram quando ainda tinha muitas dificuldades na função, e elas passaram a
ser um preceito para mim.

Anos mais tarde, quando soube que o Imperador Showa escolhera a palavra "ponte"
para o tema de poesias de Ano Novo, na festa do Palácio Imperial, lembrei-me do
provérbio. Não fui convidada para a festa, mas escrevi um poema sobre o tema,
incorporando o provérbio.

Ajudar burros a atravessar


Ajudar cavalos a atravessar:
Gostaria de ser esta ponte,
Entretanto, estou sendo ajudada a atravessar.

Durante a dinastia T'ang, na China, o grande mestre Zen Joshu Jushiro Zenji era abade
do templo Kannon-in. Para chegar ao seu templo era necessário cruzar uma ponte, que
foi chamada de Ponte de Joshu. Certa vez um monge noviço perguntou: "A Ponte
Joshu, o que é?" Ele não estava mencionando a ponte para se chegar ao templo, mas
sobre a prática budista de Joshu. Joshu respondeu: "Passa burro, passa cavalo."

Há pessoas das quais gostamos e pessoas das quais não gostamos, amigos e inimigos.

Pela ponte passam pessoas boas como Budas, como também ladrões, assassinos,
gente perversa e louca. A todos permite atravessar, sem pedir nada em troca, sem
selecionar. Há quem reclame "que ponte ruim, que ponte mal feita, difícil de passar",
vão reclamando, batendo os pés, dando chutes, e pode haver até aqueles que urinem
na ponte. Poucos atravessam com gratidão dizendo "Obrigada" ou "Graças a você pude
atravessar". Seja qual for a maneira que atravessem, a todos a ponte permite passar
sem fazer discriminação. Joshu em sua prática de grande bodisatva‚ o símbolo dessa
ponte, a imagem dessa ponte.

E eu? Cavalo atravessa... Burro não... Pessoa que gosto sim, pessoa que não gosto
não. Fico escolhendo, selecionando de acordo com minhas conveniências. Quero que
me elogiem "Que ponte bonita!", "Obrigada", "Graças a você". Fico mal humorada e
não quero deixar atravessar aqueles que me xingam ou urinam na ponte.

No meu trabalho encontro sempre monjas, noviças, praticantes leigos e tenho de


lembrar-me sempre do provérbio "Ajudar burros a atravessar/ Ajudar cavalos a
atravessar", como se estivesse inúmeras vezes invocando o nome de Buda. Certo dia
ocorreu-me que ser uma ponte não era suficiente... Mesmo que poucas pessoas
utilizem o Ponte do Budismo, preciso fazer com que as pessoas deludidas percebam a
Outra Margem, e que é necessário atravessar esta ponte.

Talvez sejam muitos os que não saibam que há uma Outra Margem. É preciso
despertar neles o desejo de alcançá-la: se querem fama, dar-lhes fama; se querem
pão, dar-lhes pão; se querem dinheiro, dar-lhes dinheiro; se querem relacionamento,
dar-lhes relacionamento, até perceberem que este é um universo maravilhoso. Para
isso é preciso ter o coração de avós bondosos, ser capaz de despir o hábito monástico,
sujar as mãos com excrementos, estar entre todos, chorar, ficar deludido, rir juntos,
até fazê-los perceber o Verdadeiro Caminho e puxá-los para cá.

Esse é o meu voto simbolizado pelas trinta e três faces e cem corpos de Kanon. Está
escrito no Sutra de Kanon: "Nas terras do universo não há local onde não se
manifeste." Sempre e em toda parte, a atividade de Kannon se revela. Abrindo o olho
do coração-mente, vejo que a pessoa da qual penso não gostar existe para que eu
perceba meu próprio ego - é Kanon se revelando. Doente, fracassada ou separada de
quem amo devo abandonar minhas auto-indulgências e perceber que a verdade da vida
é atividade de Buda.

Vendo tudo pela perspectiva de Buda fiquei envergonhada da minha própria arrogância
e pude perceber que ao invés de ser uma ponte, estou sendo ajudada a atravessar.

Cento e Oito Entradas Para o Maravilhoso Dharma


Cento e Oito Portais da Lei Maravilhosa

Este texto se refere aos Sutra lido ao bater as 108 badaladas do sino na passagem de
ano e também se refere as 108 contas do juzo, espécie de terço budista. Diz respeito
aos obstáculos que precisamos vencer para chegar a Iluminação.

Um certo sutra diz (1):

"Quando Bodisatva Hu-ming (2) estava para descender entrou e vasculhou a casa onde
iria nascer. Assim tendo feito, instruiu todos os seres celestiais de Tsusita para que se
reunissem no imenso palácio Kao-ch'uang de sessenta iojanas quadradas, a fim de
expor o Dharma para eles como fizera muitas vezes no passado.

"Seres Celestiais! Estou para descender ao mundo humano; antes de fazê-lo quero
expor as várias entradas do Dharma Maravilhoso, os métodos provisionais de alcançar
o estado de todas as coisas. Aqui os reuni para dar este meu último ensinamento. Se
vocês o seguirem certamente serão felizes."

Quando o Bodistava Hu-ming completou estas palavras iniciais todos os seres celestiais
do Céu de Tsusita, incluindo as virgens celestiais e suas atendentes, se reuniram. Em
bora o Bodisatva desejasse iniciar os ensinamentos, vendo a multidão decidiu usar seus
poderes miraculosos para construir outro palácio celestial em cima do atual. A altura e
largura desse novo palácio eram tão imensas, cobrindo todo o universo com
indescritíveis linhas bem proporcionadas, beleza exótica, fonte de alegria para os que o
viam. Decorado com muitas jóias, era de majestade incomparável a qualquer outro
palácio celestial no mundo do desejo. Se os seres celestiais do mundo da forma vissem
esse castelo, miraculosamente criado, perceberiam que seus próprios castelos
comparados a este não eram nada mais do que sepulcros.

Hu-ming era um Bodisatva que possuía tanto fortuna quanto mérito, resultante de seu
bom passado e de suas ações honradas. Instalou-se no assento do leão (3), decorado
com inumeráveis jóias de todas as espécies. Vários panos celestiais foram estendidos
no assento e várias flores de fragrância rara colocadas no chão à sua volta. O doce
cheiro de incenso especial, num incensário enorme e magnífico pendurado no ar, se
espalhava e o castelo estava cheio de luz, reflexo das inumeráveis jóias de sua
decoração.

O exterior do castelo estava coberto por uma rede magnífica com muitos sinos de ouro
amarrados, todos ressoando em tons doces. O palácio emitia uma infinita variedade de
luzes com centenas de milhares de bandeiras coloridas, canópias e borlas presas em
seus cantos, guardado pelos Reis dos Quatro Quartos do Universo e vários Budas e
Bodisatvas. Era também respeitosamente venerado pelos Reis S'akrendra e Brahma.

As vozes de inumeráveis donzelas celestiais podiam ser ouvidas dentro do palácio,


cantando elogios ao Bodisatva Hu-ming, acompanhadas por instrumentos musicais.
Cada uma delas, mantendo os sete tesouros, falava dos indescritíveis e vastos méritos
do Bodisatva: indescritivelmente vastos, porque eram resultado da boa fortuna com
que fora abençoado, boa fortuna sendo resultado de longos kalpas de treinamento no
passado.

Sentando-se no trono do leão o Bodisatva Hu-ming finalmente começou seu discurso


aos seres celestiais. Ele disse:

"Seres Celestiais! Um Bodisatva do mais alto nível de Iluminação, vivendo no palácio de


Tsusita, desejar descender ao mundo humano é requerido que não apenas exponha os
cento e oito portais da Lei Maravilhosa a todos os seres celestiais, mas também que
tenha certeza de que estes, deles sempre se lembrem. Seres Celestiais! Eu vos peço
que ouçam atentamente o que vou dizer."

"Quais são, então, os cento e oito Portais da Lei Maravilhosa?

"Crença correta é o primeiro, pois mantém a mente firme.


Mente pura é o segundo, pois não tem aviltamento.
Alegria é o terceiro, pois é o resultado de uma mente tranquila.
Necessicidade da verdade é o quarto, pois promove uma mente pura.
Conduta correta é o quinto, pois é o resultado de ações puras: físicas, da fala e do
pensamento.
Falar com pureza é o sexto, pois afasta a mente que leva aos quatro reinos maus do
inferno, espiritos famintos, animais e assuras (espíritos guerreiros).
Pensamento puro é o sétimo, pois afasta a ganância, raiva e ignorância.
Manter os Budas em mente é o oitavo, pois contemplar os Budas é um ato puro.
Manter o Dharma em mente é o nono, pois contemplar a lei é um ato puro.
Manter a Sangha em mente o décimo , pois garante a realização do Caminho.
Manter ofertas em mente é o décimo primeiro, pois tais ofertas são feitas sem esperar
nada em troca.
Manter os preceitos em mente é o décimo segundo, pois os preceitos englobam todos
os votos.
Manter o céu em mente é o décimo terceiro, pois faz surgir a mente cósmica.
Benevolência é o décimo quarto, pois faz com que todos os seres façam o bem.
Eliminação de sofrimento é o décimo quinto, pois protege os seres contra ferimentos.
Felicidade é o décimo sexto, pois elimina a infelicidade.
Abnegação é o décimo sétimo, pois termina com os cinco desejos.
Transciência é o décimo oitavo, pois expõe aos apegos mundanos.
Contemplação do sofrimento é o décimo nono, pois extingue todos os desejos.
Contemplação do não eu é do vigésimo, pois elimina os apegos ao eu.
Contemplação da quiescência é o vigésimo primeiro, pois preserva a mente tranqüila.
Vergonha é o vigésimo segundo, pois promove a mente tranqüila.
Timidez é o vigésimo terceiro, pois extingue os males externos.
Sinceridade é o vigésimo quarto, pois não engana nem seres celestiais nem humanos.
Honestidade é o vigésimo quinto, pois previne decepção própria.
Agir de acodo com o Dharma é o vigésimo sexto, pois tal ação está de acordo com a
verdade.
Refugiar-se nos Três Tesouros é o vigésimo sétimo, pois purifica os três reinos maus de
inferno, espíritos famintos e animais.
Gratidão é o vigésimo oitavo, pois promove bondade.
Retribuição de bondade é o vigésimo nono, pois não engana os outros.
Não decepção própria é o trigésimo, pois previne elogio próprio.
Bem feitoria a todos os seres é o trigésimo primeiro, pois previne contra ofensa a
outros.
Praticar o Dharma é o trigésimo segundo, pois está de acordo com a verdade.
Conhecimento do tempo é o trigésimo terceiro, pois previne conversas frívolas.
Controle do orgulho é o trigésimo quarto, pois desenvolve sabedoria.
Ausência de mente má é o trigésimo quinto, pois protege a si mesmo e aos outros.
Livre de enganos é o trigésimo sexto, pois evita que dúvidas surjam.
Crença e compreensão são o trigésimo sétimo, pois são as bases da Iluminação.
Contemplar a imundí ce é o trigésimo oitavo, pois extingue desejos.
Amizade é o trigésimo nono, pois previne contra a raiva.
Conhecimento é o quadrasésimo, pois previne contra tirar a vida.
Seguir o Dharma é o quadragésimo primeiro, pois significa procurar pela verdade.
Amar o Dharma é o quadragésimo segundo, pois garante percepção da Lei Verdadeira.
Vontade de ouvir o Dharma é o quadragésimo terceiro, pois o estado de todas as coisas
é assim revelado.
Corretos meios expedientes são o quadragésimo quarto, pois englobam prática correta.
Reconhecer que o eu é os cinco elementos é o quadragésimo quinto, pois remove
dúvidas.
Remover a causa da delusão é o quadragésimo sexto, pois garante a Iluminação.
Desapego aos sentimentos de amargura ou afeição é o quadragésimo sétimo, pois a
união desses dois sentimentos é assim promovida.
Reconhecer que sofrimento é resultado da união temporária dos cinco agregados é o
quadragésimo oitavo, pois revela a verdadeira natureza das várias aflições.
Reconhecer a existência separada dos quatro elementos é quadragésimo nono, pois
elimina a idéia (falsa) de que todas as coisas tem uma natureza unificada e
independente.
Reconhecer os estado de todas as coisas é o quinquagésimo, pois revela a verdadeira
natureza da Iluminação.
Reconhecer que nem nascimento e morte existem é o quinquagésimo primeiro, pois
assim a Iluminação é autenticada.
Conhecimento da impureza do corpo é o quinquasémimo segundo, pois todas as coisas
manifestam a Iluminação.
Conhecimento de que toda a sensação é sofrimento é o quinquagésimo terceiro, pois
elimina todas as sensações (delusivas).
Conhecimento da transciência da mente é o quiquaséssimo quarto, pois reconhece a
natureza ilusória da mente.
Conhecimento da não substancialidade de todas as coisas é o quinquagésimo quinto,
pois exprime a perfeita sabedoria.
As quatro espécies de esforço correto (4) são o quinquagésimo sexto, pois eliminam
todo o mal e promovem todo o bem.
Os quatro do poderes sobrenaturais (5) são o quinquagésimo sétimo, pois previnem
crença em ensimentos não budistas.
Crença é o quinquagésimo oitavo, pois previne a crença em ensinamentos não
budistas.
Prática assídua do caminho é o quinquagésimo nono, pois promove a realização de toda
a sabedoria.
Manter os ensinamentos de Buda em mente é sexagésimo, pois é a base da boa
conduta.
Samadhi é o sexagésimo primeiro, pois purifica a mente.
Sabedoria é o sexagésimo segundo, pois permite ver todas as coisas como são.
Poder de crença é o sexagésimo terceiro, pois é superior ao poder dos vários demônios.
Poder de prática assídua é o sexagésimo quarto, pois previne negligência.
Poder de concentração é o sexagésimo quinto, pois promove o espírito independente.
Poder de Samadhi é o sexagésimo sexto, pois extingue todos os pensamentos.
Poder da sabedoria é o sexagésimo sétimo, pois elimina as duas visões extremistas (6).
A sabedoria de atenção é o sexagésimo oitavo, pois permite que a natureza de todas as
coisas seja conhecida.
A sabedoria do Dharma é o sexagèsimo nono, pois ilumina todas as coisas.
A sabedoria da prática assídua é o septuagésimo, pois permite que a verdade seja
conhecida.
A sabedoria da felicidade é o septuagésimo primeiro, pois permite que todas as formas
de Samadhi se manifestam.
A sabedoria da confiança é o septuagésimo segundo, pois permite a liberdade de ação.
A sabedoria do Samadhi é o septuagésimo terceiro, pois reconhece a equanimidade de
tudo.
A sabedoria do não apego é o septuagésimo quarto, pois elimina apego a todos os
fenômenos.
Correta compreensão é o septuagésimo quinto, pois garante a realização da
Iluminação.
Correto pensar é o septuagésimo sexto, pois elimina pensamentos discriminatórios e
não discriminatórios.
Correto falar é o septuagésimo sétimo, pois elimina o apego a nomes, sons e palavras.
Correta forma de vida é o septuagésimo oitavo, pois elimina todos os atos maléficos.
Correta ação é o septuagésimo nono, pois leva à outra margem.
Correta memória é o octuagésimo, pois está além do pensamento dualista.
Correto Samadhi é octuagésimo primeiro, pois promove a mente tranquila.
A mente Bodhi é o octuagésimo segundo, pois preserva os Três Tesouros.
Dependência na Mahayana é o octuagésimo terceiro, pois previne dependência nos
ensinamentos menores.
Verdadeira crença é o octuagésimo quarto, pois garante a realização da Lei Suprema.
Promoção é o octuagésimo quinto, pois acelera a realização de todo o bem.
Paramita (7) de ofertas é o octuagésimo sexto, pois promove a aparência momento a
momento das trinta e duas marcas que destinguem Buda, decora o mundo da
Iluminação e salva seres da ganância.
Paramita de preservar os preceitos é o octuagésimo sétimo, pois elimina a dureza que
os atos maus produzem e previnem os seres de quebrarem os preceitos.
Paramita da perseverança é o octuagésimo oitavo, pois salva seres da raiva, orgulho,
bajulação, ridículo e frivolidade.
Paramita de prática assídua é o octuagésimo nono, pois garante a realização de todo o
bem e previne os seres de se tornarem negligentes.
Paramita de Samadhi é o nonagésimo, pois apressa a manifestação de todas as formas
de Samadhi e de poderes sobrenaturais promovendo tranquilidade nos seres humanos.
Paramita da Sabedoria é o nonagésimo primeiro, pois salva seres da ignorância e do
apego.
Ensimamentos de meios expedintes são o nonagésimo segundo, pois permitem aos
seres compreenderem a verdade de acordo com suas capacidades individuais.
As quatro maneiras de guiar os seres (8) são o nonagésimo terceiro pois garantem que
todos alcancem a Iluminação própria e de todos os outros.
Ensinar seres é o nonagésimo quarto pois previne a procura de prazeres pessoais e
promove interesse em ensinar.
Aceitar a lei verdadeira é o nonagésimo quinto, pois elimina todas as delusões dos
seres.
Acumular méritos é o nonagésimo sexto, pois beneficia todos os seres.
Prática de Samadhi é o nonagésimo sétimo, pois apressa a manifestação dos dez
poderes (9).
Quiescência é o nonagésimo oitavo, pois engloba a Iluminação do Tathagata.
Sabedoria é o nonagésimo nono, pois permite que a essência de todas as coisas seja
realizada.
Livremente ensinar o Dharma é o centésimo, pois clarifica a essência da Lei.
Verdadeira prática é o centésimo primeiro, pois clarifica a essência da Lei.
Obter que engloba tudo em um é o centésimo segundo, pois preserva os ensinamentos
de Buda.
Obter o poder de ensinar livremente é o centésimo terceiro, pois traz alegria a todos os
seres.
Agir de acordo apenas com o Dharma é o centésimo quarto, pois está de acordo com a
verdade.
Perceber que tudo está além da vida e da morte é o centésimo quinto pois garante a
futura realização do estado de Buda.
O estágio no qual o resultado é imutável é o centésimo sexto, pois engloba os
ensinamentos de todos os Budas do passado.
Avançar nos vários níveis de Bodisatva é o centésimo sétimo, pois antecipa à cerimônia
e marca o avanço e a percepção de toda a sabedoria.
O mais alto nível de Bodisatva é o centésimo oitavo, pois garante a entrada na Sangha
e a realização da Iluminação."

Tendo terminado esta explicação o Bodisatva Hu-ming conclui sua palestra a todos os
seres celestiais ali reunidos dizendo:

"Seres Celestiais! Vocês devem perceber que eu, agora, os presentei com os Cento e
Oito Portais da Lei Maravilhosa. Lembrem-se deles continuamente pois não podem ser
esquecidos. Estes são então os cento e oito portais da Lei Maravilhosa."

Quando um Bodisatva de um nível mais elevado de percepção está para descender ao


mundo humano, invevitavelmente ensina estas cento e oito entradas a todos os
habitantes celestiais do Céu Tsusita.

O Bodisatva Hu-ming era o nome dado a Xaquiamuni Buda quando vivia no Céu de
Tsusita como um Bodisatva do mais alto nível de Iluminação.

Estes cento e oito portais estão enumerados no T`ien-shêng Kuang - Têng- Lu,
compilado por Li Fu- ma (10). Entretanto, apenas poucos os que treinam em budismo
sabem de sua existência, enquanto os que não sabem são tão numerosos como plantas
de arroz, cânhamo, bambu e grama. È por esta razão que agora os compilei nesta
seção. Aqueles iniciados em budismo que esperam algum dia alcançar o estado de
Buda e se tronar mestres de seres humanos e celestiais, devem cuidadosamente os
estudar. Aqueles que nunca viveram no Céu de Tsusita como Bodisatva do mais alto
nível de Iluminação, não podem ser considerados Budas. Estudantes budistas, logo,
não devem se orgulhar de seus feitos. Bodisatvas que uma vez viveram no Céu de
Tsusita, se tornaram Budas sem passar pelo mundo intermediário.

Shoboguenzo. Ippyaku-hachi Hômyô-mon.


De Mestre Eyhei Dogen de data desconhecida
Tradução do inglês pela Monja Coen em junho de 1994
Transcrito por Soen em dezembro de 2002.

Notas:
1. o nome deste sutra é desconhecido embora seja provavelmento o chinês T`ien-
chêng Kuang - Têng-lu e não um sutra.

2. Não se sabe mais nada sobre este Bodisatva, a pronûncia chinesa é usada pois o
sânscrito se perdeu.
3. Uma plataforma elevada, a vontade de um Bodisatva, é análoga à de um leão.
4. As quatros espécies de esforço correto são: prevenir erros antes que ocorram,
abandonar faltas quando ocorrem, produzir méritos, aumentar mérito produzido.
5. As quatro bases de poder sobrenatural são: vontade, esforço, pensamentos e
investigação.
6. Uma é a visão extremista da existência, que errôneamente mantém, que todo
fenômeno é real; a outra é a visão extremista da não existência que mantém, que todo
o fenômeno é não exitente e vazio.
7. Paramita se refere a cruzar desta margem de nascimento e morte para a margem de
Nirvana, também significa compleição. Aqui o termo é usado para designar uma das
práticas que levam a este objetivo.
8. As quatro maneiras de guiar seres a iluminação: ofertas espirituais e materiais,
palavras amáveis, benevolência, identificação.
9. Os dez poderes de um Bodisatva: devoção aos ensinamentos de Buda e não apego a
nada, aumentar sua própria devoção, habilidade expediente de instruir pessoas e
alterar sua conduta, compreender o que as pessoas pensam, satisfazer pessoas com o
que querem, não cessar de exercer, incluir todos os veículos sem abandonar o
Mahayana, poder misterioso de mostrar as aparências dos Budas em cada mundo e em
cada poro de seu corpo, fazer com que virem em direção aos ensimanentos de Buda e
os liderar a perfeição, satisfazer todas as espécies de pessoas mesmo com uma só
frase.
10. Nada mais se sabe sobre ele.

Do livro Zen Master Dogen de Yuho Yokoi e Dai Sen Victoria,


NY , Weatherhill - Tokio - 1ª edição 1976

FUKANZAZENGI - Regras universais do Zazen


(Manual de meditação do mestre Eihei Dogen - Japão, 1200 - 1253 dC)

Agora, quando procuramos a fonte do Caminho, descobrimos que é universal e


absoluta. Torna-se desnecessário distinguir entre prática e iluminação. O ensinamento
supremo é livre, então por que deveríamos estudar os meios de atingi-lo? Sem dúvida,
o Caminho está bem longe da delusão. Por que, então, preocupar-se com os meios de
eliminá-la?

O Caminho está completamente presente onde você está, então qual a necessidade de
prática e de iluminação? Contudo, se no início houver a menor diferença entre você e o
Caminho, o resultado será uma separação maior do que aquela entre o céu e a terra.

Se surgir o menor pensamento dualista, você perderá sua mente-Buda. Por exemplo,
algumas pessoas se orgulham de sua compreensão, e acreditam que estão ricamente
dotadas com a sabedoria de Buda. Crêem que já alcançaram o Caminho, iluminaram
suas mentes e conquistaram o poder de tocar os céus. Imaginam que estão andando
no reino da iluminação. Mas o fato é que quase perderam o Caminho absoluto, que está
além da própria iluminação.

Ainda se vêem as marcas daquele que por seis anos sentou-se erecto e se ouvem os
ecos do Monte Shaolim onde por nove anos sentou-se de face para a parede aquele
que transmitiu o selo da mente. Já que estes antigos sábios eram tão diligentes, como
podem os praticantes dos dias atuais deixar de praticar zazen? Devemos parar de
correr atrás de palavras e de letras e aprendermos a nos retirar e refletir sobre nós
mesmos. Quando assim fazemos, nosso corpo e mente são naturalmente
transcendidos, e nossa natureza-Buda original se manifesta. Se almejarmos realizar a
sabedoria de Buda, devemos começar a praticar imediatamente.
Para fazer zazen, é desejável um local tranqüilo. Devemos ser moderados no comer e
no beber, abandonando todo relacionamento deludido. Deixando tudo de lado, não
pensemos nem no bem, nem no mal, nem no certo, nem no errado. Assim, tendo
cessado a agitação da mente, abandonamos até mesmo a idéia de nos tornar Buda.
Isto é verdadeiro não só para o zazen, mas para todas as nossas ações cotidianas, sem
apego ao sentar ou ao deitar.

Geralmente, colocamos um acolchoado quadrado no chão, onde vamos sentar, e sobre


ele uma almofada redonda. Podemos sentar na posição de lótus ou na de meio lótus.
Na primeira, colocamos o pé direito sobre a coxa esquerda, e em seguida o pé
esquerdo sobre a coxa direita. Na segunda, apenas colocamos o pé esquerdo sobre a
coxa direita. As roupas devem ser folgadas, mas bem arrumadas. Em seguida,
colocamos o dorso da mão direita sobre o pé esquerdo e o dorso da mão esquerda
sobre a palma direita, com as pontas dos polegares se tocando levemente. Devemos
nos sentar perfeitamente eretos, nem inclinados à direita, nem à esquerda, nem para
frente, nem para trás. As orelhas devem estar alinhadas com os ombros e o nariz
alinhado com o umbigo. A ponta da língua deve ser colocada no palato, os lábios e
dentes devem ficar fechados. Mantendo os olhos entreabertos, respiramos suavemente
pelas narinas. Finalmente, tendo regulado o corpo e a mente fazemos uma respiração
profunda, movendo nosso corpo para a esquerda e para a direita e então, devemos
ficar imóveis, sentados tão firmes quanto uma rocha. Existe o pensar, existe o não
pensar e existe o inconcebível. Esta é a verdadeira base do zazen.

Zazen não é meditação passo a passo. É o portal do Darma da agradável tranqüilidade,


é a prática e a realização da Iluminação, é tornar-se o "koan". A verdade aparece, não
mais havendo delusão. Se compreendermos isto, estaremos completamente livres,
como um dragão na água, ou um tigre recostado na montanha. O Darma Correto surge
naturalmente e ficamos completamente livres de todo cansaço e confusão.
Ao terminarmos o zazen, devemos mover o corpo devagar e nos levantar com calma.
Não devemos nos mover bruscamente.

Pela virtude do zazen, é possível transcender a diferença entre o comum e o sagrado e


obter a capacidade de morrer sentado ou de pé. Além do mais, é impossível para nossa
mente discriminatória compreender como os Budas e Ancestrais do Darma
comunicaram a essência do Zen a seus discípulos, com o levantar de um dedo, com
uma vara, jogando uma agulha ou batendo com o martelo de madeira; ou como eles
transmitiram a iluminação com o levantar de um hossu, de um punho, de um bastão ou
com um grito.

Tampouco, este assunto pode ser compreendido através de poderes sobrenaturais ou


de uma visão dualista de prática e iluminação. Zazen é a prática além dos mundos
subjetivos e objetivos, além do pensamento discriminatório. Assim, nenhuma
discriminação deverá ser feita entre o inteligente e o não-inteligente. Praticar o
Caminho com todo o respeito é, em si mesmo, iluminação. Não existe separação entre
a prática e a iluminação, ou entre o zazen e a vida cotidiana.

Os Budas e Ancestrais do Darma, tanto neste país, quanto na Índia e na China, todos
preservaram cuidadosamente a mente-Buda e incentivaram assiduamente o
treinamento Zen. Devemos, pois, nos dedicar exclusivamente, e sermos
completamente absorvidos pela prática do zazen. Apesar da divulgação de inúmeras
maneiras de se compreender o Budismo, devemos praticar somente o zazen. Não há
motivo para abandonarmos nosso assento de meditação e fazermos viagens inúteis a
outros países. Se nosso primeiro passo for errado, inevitavelmente tropeçaremos.

Já tivemos a boa fortuna de nascer com um corpo precioso, então, não devemos
desperdiçar nosso tempo à toa. Agora que sabemos qual é a coisa mais importante no
Budismo, como podemos ficar satisfeitos com o mundo transitório? Nossos corpos são
como o orvalho sobre a relva, e nossas vidas como o clarão de um raio, que
desaparece num instante.

Sinceros praticantes Zen, não se espantem com o Verdadeiro Dragão, nem gastem
muito tempo inutilmente apalpando apenas uma pequena parte do elefante. Dediquem
seus esforços ao caminho que leva diretamente à natureza-Buda. Respeitem aqueles
que alcançaram o conhecimento completo, que estão sem intenção de intenção.

Tornem-se um com a sabedoria dos Budas e assim, sucessores legítimos da iluminação


dos Ancestrais. Praticando desta maneira, certamente serão capazes de compreender
tudo isto. Então, a casa do tesouro naturalmente se abrirá e vocês poderão se servir à
vontade.

BREVE PARINIRVANA SUTRA

Quando Xaquiamuni Buda girou pela primeira vez a Roda do Dharma, Ajnata-kaundinya
despertou e, em seu último discurso do Dharma, foi Subhadra quem se iluminou. Todos
que deveriam ser despertos assim o foram. Entre duas árvores sala, Buda estava quase
entrando Parinirvana. Era o meio de uma noite calma, sem sons. Para o bem de todos
os seus discípulos, Xaquiamuni Buda fez uma breve explanação dos fundamentos do
Dharma:

Oh, Monges! Depois de minha morte respeitem e compartilhem os Preceitos.


Manter os Preceitos é como encontrar uma luz na escuridão, é como uma pessoa pobre
encontrar um grande tesouro. Saibam que os Preceitos são seu mestre. Manter os
Preceitos é Me manter sempre vivo neste mundo. Aqueles que mantém os Preceitos
não devem se dedicar ao comércio e não devem possuir campos e moradias, não
devem governar sobre outras pessoas, nem manter servos ou animais. Devem evitar
manter plantações e acumular bens, da mesma forma que evitariam uma fogueira. Não
devem cortar grama nem árvores, arar o solo ou cavar a terra. Misturar remédios, ler a
sorte, observar a posição das estrelas, predizer as fases da lua, calcular calendários e
dias auspiciosos, são coisas que não devem ser feitas.

Controlem seus corpos, comam nas horas certas, se conduzam em pureza. Não se
envolvam nos afazeres mundanos, nem ajam como mensageiros. Não façam mágicas,
misturem poções e nem se tornem íntimos com pessoas eminentes. Tudo isso não deve
ser feito. Com a mente clara e correta atenção, vocês devem procurar o despertar.
Vocês não devem esconder seus erros, exprimir pontos de vista errôneos, nem liderar
pessoas erradamente. Ao receber as quatro espécies de ofertas, saibam a quantia
correta e fiquem satisfeitos. Não acumulem ofertas.
Agora vou falar, brevemente, em como proteger os Preceitos.

Os preceitos são a base da verdadeira libertação, porisso são chamados de Pratimoksa


- o que leva a libertação. A confiança nos Preceitos faz surgir todos os dhyanas e a
sabedoria da extinção do sofrimento. Por esta razão, Oh Monges !, vocês devem
manter os Preceitos e não os devem infringir. Se vocês mantiverem os Preceitos
obterão o Bem. Se não os mantiverem, nenhum mérito surgirá. Assim saibam que os
Preceitos são o local onde vive a equanimidade, que é o mérito fundamental.

Oh, Monges! Vocês que mantém os Preceitos devem controlar os cinco sentidos.
Não deixem os sentidos desprotegidos, permitindo que os cinco desejos penetrem. È
como o vaqueiro que brande sua vara para evitar que ogado invada a plantação de
outra pessoa. Se há indulgência nos cinco sentidos os cinco desejos ficarão à solta e
vocês serão incapazes de controlá-los. Novamente repito, é como um cavalo bravo que
não pode ser controlado pelo chicote e cai numa vala levando seu cavaleiro com ele. Da
mesma forma, o sofrimento de ser ferido por um ladrão, dura apenas uma vida;
enquanto que o mal causado pelos cinco sentidos, se estende através de muitas vidas
criando grande dor. Não negligenciem a atenção. É por esta razão que a pessoa sábia
controla seus sentidos, não os segue, mantendo-os guardados, não permitindo que
vagueiem ao léu e mesmo quando os libertam, logo se extinguem.

A mestra dos cinco sentidos é a mente. Por esta razão vocês devem controlar suas
mentes. A mente deve ser mais temida que as cobras venenosas, bestas selvagens ou
assaltantes vingadores, mesmo grandes incêndios e destrutivas enchentes não podem
a ela serem comparadas. É como uma pessoa que, correndo celeremente com uma
jarra de mel nas mãos, olhe apenas para o mel e não veja um grande buraco. Repito, é
como um elefante enlouquecido sem uma corrente ou um macaco pulando nas árvores,
ambos são muito difíceis de se controlar. Dominem a mente, imediatamente, e não a
deixem desembestar. Se cederem, perderão a boa sorte de terem nascido humanos. Se
mantiverem a mente focalizada, não haverá algo que não possam obter. Por esta
razão, Monges, vocês devem se esforçar com muita diligência, para manter a mente
sobre controle.

Oh, Monges! Quando receberem comida e bebida, vocês devem considerá-las como
remédio.

Não peguem mais daquilo que gostam e menos daquilo que desgostam. Apenas
aceitem o suficiente para manter suas vidas e evitar a fome e a sede. Assim como a
abelha apanha apenas a doçura das flores sem lhes manchar a cor ou tirar sua
fragância, assim vocês devem fazer. Aceitem apenas o suficiente das ofertas para
evitar tristezas. Não peçam muito para não destruir boas intenções. Isto pode ser
comparado com a pessoa sábia que conhece a força de seu touro e não o sobrecarrega.

Oh, Monges! Durante o dia, pratiquem com determinação o bom ensinamento.


Não percam tempo. Da mesma forma, à noite e pela manhã antes do amanhecer, não
negligenciem seus esforços. No meio da noite, recitem os Sutras. Assim vocês devem
ordenar suas vidas. Não deixem que a vida passe à toa, sem obter a realização, apenas
dormindo. Vocês devem se lembrar que o mundo todo está sendo consumido pelo fogo
da impermanência. Rapidamente procurem pelo despertar e não pelo dormir. As
paixões estão sempre prontas para matar uma pessoa, mais do que um inimigo mortal.
Como vocês podem ficar dormindo e abaixar a guarda? As paixões são como uma cobra
venenosa dormindo em sua mente. Não são diferentes de uma cobra negra dormindo
em seu quarto, espante-a com a ponta aguda dos Preceitos. Só depois que a cobra
sair, vocês poderão dormir tranquilos. Se dormirem enquanto a cobra ainda está lá,
vocês estarão agindo sem consciência. Entre as coisas refinadas, a tecedura da
consciência é a melhor. A consciência é como uma agulha de ferro com a qual se
pinçam os enganos. Assim sendo, Monges, sempre sigam sua consciência e não a
ignorem nem por um só momento. Esquecendo-se da consciência, perdem-se todos os
méritos. Aqueles que conhecem o pudor, sabem do bom ensinamento. Aqueles que não
conhecem o pudor, não são diferentes de bestas selvagens.

Oh, Monges! Se alguém vier desmenbrá-los, articulação por articulação, vocês devem
controlar a mente e não permitir que a raiva surja.
Da mesma forma vocês devem proteger suas bocas, caso contrário, palavras más
sairão delas. Se vocês permitirem pensamentos de raiva, vocês estarão obstruindo
seus próprios caminhos e perdendo o benefício de seus méritos. A paciência é uma
virtude que nem mesmo mantendo os Preceitos, nem as práticas ascéticas podem
igualar. As pessoas que praticam a paciência, podem verdadeiramente serem
chamadas de poderosas, de seres superiores. Aquelas pessoas que não podem aceitar
o veneno do abuso com paciência e alegria, como se estivessem bebendo o néctar
celestial, não podem ser chamadas de pessoas que adentraram o Caminho. Por que?
Porque os efeitos maléficos da raiva quebram todos os bons ensinamentos e destroem
o bom nome, de forma que, tanto no presente como no futuro, as pessoas não sentirão
prazer ao vê-los. Vocês devem saber que a raiva é mais poderosa que um fogo
ardente. Sempre se protejam e não permitam que a raiva penetre. Nenhum ladrão
rouba mais méritos do que a raiva. Leigos, cheios de desejos, sem praticar o Caminho,
não conhecem os ensinamentos para se poderem se controlar, mesmo a raiva não é
desculpável neles. Aqueles que deixaram o lar e praticam o Caminho do não desejo
nunca devem permitir que a raiva surja, assim como o trovão e o raio não ocorrem
num céu suave e claro.

Oh, Monges! Lembrem-se de suas cabeças raspadas.


Vocês já abandonaram a ornamentação, usam roupas simples e praticam a
mendicância. Vejam-se assim: se o orgulho surgir, vocês devem extingui-lo
rapidamente. Cultivar o orgulho não é apropriado mesmo para aqueles vivendo na vida
comum, quanto mais para aqueles que deixaram seus lares para entrar no Caminho,
aqueles que controlam seu corpo e praticam o esmolar para obter a libertação.

Oh, Monges! Uma mente desonesta é incompatível com o Caminho.


Por esta razão vocês devem cultivar honestidade. Vocês devem saber que
desonestidade só produz enganos. Alguém que entrou o Caminho, logo, que não vive
neste plano. É por isso, Monges, que vocês devem ter a mente correta e agir baseados
na honestidade.

Oh, Monges! Vocês devem saber que uma pessoa de muitos desejos, procurando
grandiosidade apenas para si mesmo, também sofre muito.
A pessoa de poucos desejos, nem procurando e nem desejando nada, não tem este
pesar, esta é a simples razão pela qual vocês devem praticar o mínimo de desejos.
Mais do que isso: devem praticar poucos desejos porque é a fonte de todos os bons
méritos. Uma pessoa de poucos desejos não manipula a mente dos outros através da
desonestidade, nem é levado pelos seis órgãos dos sentidos. A mente daqueles que
praticam poucos desejos é tranquila e não tem preocupações. Seja o que tiver é
suficiente, nunca há insuficiência. Para aqueles que tem poucos desejos, o Nirvana
existe. Esta é a prática de poucos desejos.

Oh, Monges! Se vocês querem se libertar de todo o sofrimento, vocês devem conhecer
o contentamento.
O estado de contentamento é a condição de prosperidade e bem estar. Aquele que está
contente fica feliz mesmo quando tem apenas a terra para se deitar sobre ela. Aquele
que não fica contente, está insatisfeito mesmo em palácios celestiais. Quem não
conhece o contentamento é pobre, apesar de todas as riquezas que possa ter. Alguém
que é contente é rico, não importando quão pobre possa ser. Quem não conhece o
contentamento é sempre arrastado por desejos provocados pelos seis sentidos e deve
ser apiedado por quem é contente. Esta é a prática do contentamento.

Oh, Monges! Se vocês procuram pela benção da tranquilidade irremovível, vocês


devem abandonar o tumulto da sociedade e viverem a sós em um retiro quieto.
Aqueles que vivem em solidão, são honrados por Indra e por todos os deuses. Por isso
vocês devem deixar tanto as suas como as outras comunidades e viverem a sós em
locais remotos, com a intenção de extinguir a origem do sofrimento. Aqueles que
gostam de companhia, recebem os sofrimentos de estar em companhia, assim como:
quando um bando de pássaros de junta para viver em uma árvore, ela corre o risco de
murchar. Se estiverem apegados ao mundo, irão afundar no sofrimento comum, assim
como um velho elefante se afoga na areia movediça e dali não consegue sair. Tal é a
prática do isolamento.

Oh, Monges! Se vocês diligentemente praticarem o esforço correto, nada será difícil.
Por isso vocês devem diligentemente praticar o esforço correto, assim como o
constante gotejar da água fura uma rocha. Se a mente do praticante for inclinada à
indolência, será como alguém que esfrega a madeira para iniciar o fogo e descansa
antes da madeira ficar quente. Mesmo que esta pessoa queira o fogo, a faisca não
acontece. Tal é a prática do esforço correto.

Oh, Monges! Não percam a atenção quando procurarem por um mestre ou por um
amigo.
Se vocês não perderem a atenção, as paixões não poderão entrar. Por isso, Monges,
sempre mantenham a atenção. Se perderem a atenção, perderão todo o mérito. Se o
poder de sua atenção for forte, você não poderá ser ferido pelos desejos provocados
pelos sentidos, mesmo que surjam. Da mesma maneira que, se entrar numa batalha
usando uma armadura, não terá o que temer. Esta é a prática de não perder a atenção.

Oh, Monges! Se unificarem suas mentes , sua mente estará concentrada.


Quando a mente estiver concentrada, vocês poderão compreender as marcas do surgir
e do extinguir de todas as coisas no mundo. Por isso, Monges, vocês devem sempre e
diligentemente praticar a concentração. Se obtiverem concentração, sua mente não
ficará dispersa. Assim como numa casa, que para se conservar água mantém-se as
barragens em bom estado, o praticante; para o bem da água da sabedoria, deve
concentrar-se em meditação e não permitir que esta vaze. Tal é a prática da
concentração.

Oh, Monges! Se vocês tiverem sabedoria não terão ganância.


Sempre se questionem e não permitam que a sabedoria se perca. Então, através dos
Meus ensinamentos vocês poderão se libertar. Se assim não o fizerem não serão
considerados seguidores do Caminho, nem mesmo leigos serão. Em verdade, a
sabedoria é um navio forte que os leva através do oceano da velhice, doença e morte.
Repito, é uma grande lâmpada iluminando a escuridão da ignorância. É um remédio
maravilhoso para todas as doenças. É um machado afiado que corta a árvore das
paixões. Por isso, Monges, através do ouvir, do pensar e do praticar, vocês devem
aumentar sempre a sabedoria. Se vocês possuirem o brilho da sabedoria poderão ver
claramente, mesmo com seus olhos de carne. Tal é a sabedoria.

Oh, Monges! Se vocês se engajarem de forma leviana em conversas inúteis suas


mentes ficarão confusas.
Mesmo que tenham abandonado sua casa, não poderão obter a libertação. Por isso,
Monges, devem imediatamente abandonar pensamentos confusos e conversas
desnecessárias. Se quiserem obter a benção de Nirvana, vocês devem apenas extinguir
o mal de falar à toa. Tal é a prática de evitar a fala fútil.

Oh, Monges! De todas atividades meritórias vocês devem, de todo coração,


concentrarem-se em afastar qualquer forma de indulgência pessoal, assim como vocês
evitariam um ladrão.

O benéfico Ensinamento de Grande Compaixão do Mais Honrado se completou.

Monges, vocês devem se esforçar diligentemente na prática do Ensinamento. Tanto se


viverem nas montanhas ou à beira d"água, sob uma árvore num local remoto ou num
aposento sossegado, coloquem sua atenção no Ensinamento, com esforço correto. Se
morrerem em vão, sem terem feito nada, vocês se arrependerão no futuro. Sou como
um bom médico que, reconhecendo uma doença, prescreve a receita apropriada. Se o
remédio é tomado ou não, já não é de responsabilidade do médico. Novamente digo:
sou como um bom guia que mostra às pessoas o melhor caminho. Se elas não o
seguirem, sabendo de sua existência, não é culpa do guia.

Oh, Monges! Se tiverem qualquer dúvida sobre as Quatro Nobres Verdades, perguntem
imediatamente. Não guardem as dúvidas sem procurarem resolvê-las.

Por três vezes, o mais Honrado, enxortou os Monges dessa forma. Mas ninguém na
assembléia falou, pois ninguém tinha dúvidas.
Nesse momento Aniruddha, percebendo a mente dos que estavam ali reunidos, disse a
Buda:
- Honrado do Mundo! Todos estes Monges tem certeza e não tem dúvidas em relação
as Quatro Nobres Verdades. Se, nesta assembléia, houver alguém que ainda não
completou sua tarefa ao ver a passagem de Buda, eles se lamentarão. Mesmo aqueles
que apenas agora penetraram o Ensinamento, obterão o despertar ao ouvir as palavras
de Buda. Assim como na escuridão da noite, um raio ilumina a estrada. Se houver
aqueles que já tenham cumprido suas tarefas e cruzado o mar de sofrimento, eles
terão apenas este pensamento: Quão rápida é a passagem do Mais Honrado do Mundo!

Quando Aniruddha falou estas palavras, todos na assembléia claramente


compreenderam o significado das Quatro Nobres Verdades. Mas o Honrado do Mundo,
movido por sua infinita Compaixão, querendo que todos na grande assembléia se
tornassem mais fortes, ainda falou assim:

Oh, Monges! Não se lamentem. Mesmo que Eu vivesse no mundo, tanto quanto um
kalpa, nosso estar juntos um dia acabaria. Não exite encontro sem despedida.
O Ensinamento que beneficia tanto a si próprio como aos outros, se completou. Mesmo
que eu vivesse mais, não haveria nada a adicionar ao Ensinamento. Aqueles que não
foram despertados possuem condições para obter o despertar. Se todos os Meus
discípulos, de geração em geração, a partir de agora, praticarem o Ensinamento, o
Corpo do Dharma do Tathagata existirá para sempre e nunca será destruído. Logo,
saibam que tudo no mundo é impermanente: o que se junta inevitavelmente se separa.
Não se preocupem, pois esta é a natureza da vida. Diligentemente, pratiquem com
esforço correto e procurem a libertação imediatamente. Com a luz da sabedoria,
destruam a escuridão da ignorância. Nada é seguro. Tudo nessa vida é precário.
Agora obtenho Parinirvana. É como se livrar de uma doença maléfica. Esta coisa que
descartamos e que chamamos de corpo, está afogado no mar do nascimento, velhice,
doença e morte. Como poderia haver alguma pessoa sábia que não se alegrasse em se
desfazer disso?

Oh, Monges! Vocês devem sempre, de todo o coração, procurar o Caminho da


Libertação.
Todas as coisas no mundo, tanto as que se movem como as que não se movem, são
caracterizadas por instabilidade e desaparecimento.
Parem, agora!
Não falem!
O tempo passa.
Atravesso.
Este é o Meu Ensinamento final.

Tradução do inglês para o português de Monja Coen - São Paulo, Brasil, fevereiro de
2002.
Tradução do japonês para o inglês de Kazuaki Tanashi e Jonathan Condit - São
Francisco, EUA, Maio de 1980.

Sandokai

A Identidade do Relativo e Absoluto

A mente do Grande Sabio da Índia


estava intimamente ligada de Leste a Oeste.
Entre seres humanos há sábios e tolos,
Mas no Caminho não há Fundador do Sul ou do Norte.
A fonte sutil é clara e brilhante.
As correntes tributárias fluem através da escuridão.
Apegar-se às coisas é ilusão,
Encontrar o absoluto ainda não é iluminação.
Um e todos, as esferas subjetiva e objetivas são relacionadas
E ao mesmo tempo independentes.
Relacionadas e ainda assim funcionam diferentemente.
embora cada um mantenha seu lugar.
Forma faz com que o caráter e a aparência difiram.
Os sons distinguem conforto e desconforto.
O escuro faz de todas palavras, uma;
A claridade distingue frases boas e más.
Os quatro elementos voltam à sua natureza,
Assim como uma criança para a sua mãe.
Fogo é quente, vento é movimento,
Agua é úmida e terra é dura.
Olhos vêem, ouvidos escutam, narinas cheiram,
língua sente o salgado e o azedo.
Cada um independe do outro.
Causa e efeito devem retornar à grande realidade,
As palavras alto e baixo são usadas relativamente.
Dentro da luz há escuridão,
mas não tente compreender essa escuridão;
Dentro da escuridão há luz,
mas não procure por essa luz.
Luz e escuridão são um par,
Como o pé na frente e o pé detrás ao andar.
Cada coisa tem seu valor intrínseco
e está relacionada a tudo o mais em função e posição.
Vida comum se encaixa no absoluto como uma caixa à sua tampa.
O absoluto trabalha com o relativo,
Como duas flechas se encontrando em pleno ar.
Lendo estas palavras apreenda a grande realidade.
Não julgue por nenhum valor.
Se você não vê o Caminho,
não o vê mesmo ao andar nele.
Quando você caminha,
não é perto nem longe.
Se estiver deludido, estará há rios e montanhas de distância.

Respeitavelmente digo àqueles que querem ser iluminados:


"Noite e dia, não percam tempo."

Viva o Presente

Uma vez um jovem que havia mudado de emprego muitas vezes veio me visitar, e me
contou seus sonhos. Ele queria ser isto e ele queria aquilo. É bom ter sonhos sobre o
futuro. Você pode ir além dos seus limites e conseguir mais. Mas não é sábio esquecer
que, embora uma visão do futuro seja necessária para colocar você no caminho agora,
se você mantiver seus olhos focados no horizonte muito adiante, você não verá o
buraco aos seus pés. E você cairá de costas sem ter para onde ir. Se os seus sonhos
vão ser apenas sonhos ou se os sonhos se tornarão realidade, depende de como você
está vivendo agora.

Mestre Dôgen (1200-1253) expressou iluminação com esta frase: "O desabrochar da
ameixeira é a primavera". Mais tarde essas pétalas caem no chão. Se a maneira na
qual vivemos nos dá a alegria da primavera também pode levar embora a alegria da
primavera e trazer a dureza do inverno. Mesmo que o grande caminho da vida se abra
à nossa frente, a nossa maneira de viver pode não usar as oportunidades. Por outro
lado, um grande portão de aço, sem nenhum sinal de abertura, pode abrir-se de par
em par devido a algum esforço que hoje fazemos. As pessoas cujas vidas têm sido
infelizes ou cheias de atos vergonhosos geralmente ficam esmagadas pelo grande peso
do seu passado e é difícil para elas recomeçarem. Mas não são os erros que arruínam
uma pessoa, é o constante pensar sobre eles. Seja quão maravilhosa tenha sido sua
vida no passado, quando o presente não é bom, simplesmente não é bom. E também é
verdadeiro que seja quão infeliz ou vergonhosa sua vida tenha sido no passado, se
você está bem agora, você está bem. Se você se desanima por causa dos enganos
passados, isto, na verdade, depende de sua atitude atual em relação a eles. Você tem
que aceitar que o seu passado fez o que você é, mas não determina como viver o
presente. Assim não existe realmente uma má experiência. É importante ser capaz de
aceitar essas experiências como valiosas, digeri-las para que se tornem alimento do
presente. Se pessoas de muita idade ou doentes com pouca esperança no futuro
compararem sua fragilidade presente com o vigor de sua juventude, apenas se
tornariam mais frágeis, tristes. Não é sábio comparar.

Sermão sobre a Mente Una


Bassui Tokusho

Se alguém se liberta dos sofrimentos do samsara, deverá aprender o caminho direto


para transformar-se em Buddha. Este caminho não é diferente daquele da
compreensão de sua própria mente. Agora, o que é a mente? É a verdadeira natureza
de todos os seres sencientes, aquela que existiu antes de nossos pais nascerem e por
isso antes de nosso próprio nascimento, e existe presentemente, imutável e eterna.
Então, é chamada a face de alguém antes de seus pais terem nascido. Esta mente é
intrinsecamente pura. Quando nascemos ela não é criada de novo, e quando morremos
ela não se extingue. Não faz distinção entre masculino e feminino, nem possui
nenhuma coloração do bom ou do mau. Não pode ser comparada com coisa alguma, e
por isso é chamada de natureza búddhica. Não obstante, incontáveis pensamentos
surgem dessa natureza do "eu", como as ondas levantam-se no oceano ou as imagens
se refletem no espelho. Se quiser compreender sua própria mente, você deverá em
primeiro lugar olhar para dentro da fonte de onde brotam os pensamentos. Dormindo
ou trabalhando, em pé ou sentado, pergunte-se profundamente "O que é minha
mente?" com um desejo intenso de resolver este problema. E a isto que se chama
"treinamento", "prática", "desejo da verdade" ou "sede de percepção". O que se
denomina zazen nada é mais do que olhar para dentro de sua própria mente. E melhor
buscar sua própria mente com devoção do que ler e recitar inumeráveis sutras e
dharani cada dia durante anos incontáveis. Tais esforços que não passam de
formalidades, redundam em méritos, mas este mérito acaba e de novo você terá de
experimentar o sofrimento dos três caminhos do mal. Porque o fato de alguém buscar
sua própria mente leva finalmente à iluminação, esta prática é um pré-requisito para
que se torne um Buddha. Não importa se cometeu ou as dez ações más ou os cinco
pecados mortais; ainda assim, se você fizer voltar sua mente e se iluminar,
instantaneamente um Buddha. Mas não cometa pecados e espere ser salvo pela
iluminação [por efeito de suas próprias ações. Nem a iluminação] nem um buddha nem
um ancestral poderá salvar uma pessoa que, iludida, segue por caminhos maus.

Imagine uma criança dormindo ao lado de seus pais e sonhando que está sendo batida
ou sofrendo uma doença. Os pais não podem ajudar a criança, não importa o quanto
sofra pois não há quem possa entrar na mente de alguém que sonha. Se a criança
pudesse acordar-se, conseguiria libertar-se
do seus sofrimentos, automaticamente. Da mesma forma, alguém que compreende que
sua mente Buddha, liberta-se instantaneamente dos sofrimentos que surgem da
[ignorância da lei da] mudança incessante do nascimento e da morte. Se um buddha
pudesse evitar, você pensa que ele permitiria que um único ser sensível caísse no
inferno?. Sem a auto percepção não se pode compreender coisas como estas.

Que espécie de mestre é este, que agora mesmo vê cores com os olhos e escuta vozes
com os ouvidos, que agora levanta as mãos e move os pés? Sabemos que estas são
funções de nossa própria mente, mas ninguém sabe precisamente como são efetuadas.
Pode-se assegurar que por detrás destas ações não existe entidade, entretanto é óbvio
que estão sendo realizadas espontaneamente. Pelo contrário, poder-se-á assegurar que
estes são os atos de alguma entidade; contudo, esta entidade está invisível. Se alguém
encara este problema como incompreensível, todas as tentativas de raciocinar [para
encontrar uma resposta] cessarão e ele ficara perdido sem saber o que fazer. Neste
estado favorável, aprofunda-se sempre mais o anseio incansavelmente, até o extremo.
Quando o profundo questionamento penetrar até o fundo, e o fundo for arrombado,
não permanecerá nem a menor das dúvidas de que sua mente é o próprio buddha, o
universo-vazio. Então não haverá mais ansiedade sobre a vida e a morte, nem verdade
alguma a buscar.

Num sonho você poderá perder-se e não saber mais o caminho para casa. Você pede a
uma pessoa que lhe indique como voltar ou você reza a Deus ou a Buddha que o ajude,
mas mesmo assim não consegue voltar para casa. Logo que sai do estado de sonho,
porém, descobre que está na sua própria cama e compreende que o único meio que
teria para voltar a casa, seria o de acordar-se. Esta [espécie de despertar espiritual] é
chamada "volta à origem" ou "renascimento no paraíso". É a forma de percepção
interior que se pode conseguir com algum treinamento. Virtualmente todos os que
gostam do zazen e se esforçam na sua prática, sejam leigos ou monges,
compreenderão até este grau. Mas mesmo esse despertar [parcial] não pode ser
conseguido, exceto pela prática do zazen. Você estaria porém cometendo um grave
erro, se achasse que isto foi uma verdadeira iluminação na qual não há dúvida alguma
sobre a natureza da realidade. Seria como um homem que, tendo encontrado cobre,
abandonasse o desejo de procurar ouro.

A respeito dessa percepção, questione-se sempre mais intensamente desta maneira:


"Meu corpo é como um fantasma, como bolhas num riacho. Minha mente olhando-se
intimamente, é tão informe quanto um espaço vazio, ainda que em alguns lugares
dentro dela sejam percebidos sons. Quem está escutando?" Se você questionar-se
desta forma com profunda absorção, nunca diminuindo a intensidade de seu esforço,
sua mente racional acabará por se exaurir e somente o questionamento no nível mais
profundo permanecera. Finalmente, perderá a consciência do seu próprio corpo. Suas
idéias e concepções há muito tempo sustentadas, extinguir-se-ão depois do absoluto
questionamento da mesma forma que cada gota de água desaparece de um barril com
o fundo arrombado, e seguir-se-á a perfeita iluminação, como flores que se abrem
repentinamente nas arvores secas.

Com essa percepção você conquista a verdadeira emancipação. Mas, mesmo agora,
abandone sempre de novo o que foi compreendido, voltando-se para aquilo que
compreende, isto é, para a raiz mais profunda, e resolutamente vá avante. Sua
natureza do "eu" então ficara mais brilhante e mais transparente a medida que seus
sentimentos ilusórios se desfazem como uma pedra preciosa que adquire brilho sob
repetidos polimentos, até que finalmente ilumina o universo inteiro. Não duvide disto!
Se seu desejo for excessivamente fraco para conduzi-lo a este estado na vida presente,
você indubitavelmente chegará com facilidade à compreensão do "eu" na próxima,
contando que ainda esteja engajada neste questionamento na ocasião da morte, assim
como o trabalho de ontem feito pela metade, é terminado hoje facilmente.

Enquanto você estiver fazendo o zazen, nem despreze nem acaricie os pensamentos
que surgem; apenas busque sua mente, a própria fonte destes pensamentos. Deve
compreender que tudo o que aparece na sua consciência, ou é visto por seus olhos, d
uma ilusão, de uma realidade que não dura. Por isso não deve nem amedrontar-se nem
fascinar-se por tais fenômenos. Se conservar sua mente tão vazia quanto um espaço,
sem manchar-se com assuntos estranhos, nenhum mau espírito poderá perturbá-lo,
mesmo no seu leito de morte. Enquanto se empenhar no zazen, porem, não conserve
nenhum

Kannon Bodhisattva é assim chamado porque atingiu a iluminação pela percepção [isto
é agarrando a fonte] dos sons à sua volta.

No trabalho, no descanso, nunca deixe de se esforçar por compreender quem é que


escuta. Mesmo que seu questionamento se torne quase inconsciente, você não
descobrirá quem é que escuta, e todos os seus esforços serão frustrados. Entretanto,
os sons poderão ser escutados, por isso questione-se num nível ainda mais profundo.
Finalmente cada vestígio de consciência do "eu" desaparecera e sentir-se-á como um
céu sem nuvens. Dentro de si mesmo não encontrará mais o "eu", nem descobrirá
ninguém que escute. Essa mente é como um vazio entretanto não tem nenhum ponto
que possa ser chamado de vazio. Este estado muitas vezes tomado erroneamente por
auto-compreensão. Mas continue a perguntar-se ainda mais intensamente, "Agora,
quem é que escuta?" Se você penetrar e penetrar no fundo desta questão, esquecido
de tudo mais mesmo esta sensação de vazio desaparecerá e ignorará tudo mais - uma
total escuridão prevalecerá. [Não pare aqui, mas] continue a perguntar com toda sua
energia, "O que é que escuta?" Somente quando exauriu completamente o
questionamento é que a pergunta irromperá: agora sentir-se-á como um homem que
volta da morte. S a verdadeira percepção. Verá os buddhas de todos os universos face
a face e os ancestrais do passado e do presente. Examine-se com este kôan: "Um
monge perguntou a Joshu: "Qual é o sentido da vinda de Bodhidharma à China?" Joshu
respondeu: "O carvalho no jardim". Se este kôan deixá-lo com mínima dúvida, precisa
recomeçar a questionar-se, "O que é que escuta?"

Se você não chegar à compreensão nesta vida presente, quando chegará? Tendo
morrido não será capaz de evitar um longo período de sofrimento nos três caminhos do
mal. O que está obstruindo a realização? Nada além de seu pusilânime desejo de
verdade. Pense nisto e esforce-se ao máximo.

(Tokusho, Bassui. O Sermão. In: Kapleau, Philip. Os Três Pilares do Zen. Coleção Corpo
e Alma.
Belo Horizonte: Editora Itatiaia, 1978. Pág. 170-173. Clique aqui para adquirir o livro.)

Ryûgin
O Rugido do Dragão

Um dia o Grande Mestre Jisai do Monte Tosu, em Joshu, recebeu uma pergunta de um
monge praticante: "Gostaria de saber se uma velha árvore ressequida pode rugir como
um dragão. Pode ou não pode?" O mestre replicou: "No meu Caminho do Buddha até
uma caveira tem capacidade de falar sobre o grande Dharma." Quem está por fora do
ensinamento buddhista gosta de dizer que uma árvore ressequida é apenas uma árvore
ressequida, e que cinzas não podem ser brasas. Mas as opiniões destas pessoas não
contam muito quando comparadas ao que dizem os buddhas e ancestrais. Este conceito
de "árvore ressequida" só pode ser discutido por quem está por dentro do Caminho do
Buddha. Pessoas que não estão dentro do Caminho do Buddha ficariam mais
assustados ainda com o rugido do dragão. Pessoas comuns acham que uma árvore
seca está morta e que na próxima primavera não terá novos brotos.

Buddhas e ancestrais compreendem a árvore ressequida da seguinte maneira: Mesmo


que o oceano viesse a ficar privado de toda água, mesmo assim não lhe poderíamos
enxergar o fundo. "Que o oceano secasse" é a mesma coisa que "a árvore secasse". A
"árvore ressequida" é aquela que estará cheia de folhagem na primavera que vem. Por
"ressequida" queremos dizer a continuidade da árvore. Todas as árvores nas
montanhas, oceanos e no céu, são todas "ressequidas". Brotar de novo na primavera é
próprio da árvore "ressequida". A forma, força, característica e natureza de uma
"árvore seca" no Caminho do Buddha é a mesma da conhecida história do "poste seco".
Este termo, ressequido, pode ser aplicado às árvores no vale ou às árvores no mundo
dos deuses e homens; podemos chamar aquela árvore do vale de conífera, e aquela do
mundo dos homens e dos deuses, de ressequida.

O Mestre Zen Sekito uma vez disse o seguinte: "Porque a raiz existe, aparecem as
folhas." Este dito se refere aos buddhas e ancestrais. A raiz e as folhas são uma só
coisa na realidade. Devemos estudar isto.

Nesta "árvore seca" comprido é comprido e curto é curto. Se a árvore não for
ressequida este rugido de dragão não pode ocorrer, mesmo que a árvore esteja além
do rugido. "Muitas estações se sucedem mas a natureza da árvore ressequida não
muda jamais". Além disto, devemos saber que o rugido do dragão está além de notas
musicais, mas em si o rugido tem todos estes sons.
Quando o monge fez sua pergunta, pela primeira vez mostrou este seu desejo de saber
a verdade. A resposta que ouviu de Tosu, "Mesmo uma caveira proclama a Grande Lei",
resume tudo sobre o Caminho do Buddha e confirma a pergunta que lhe foi feita. A
atitude de Tosu é a verdadeira atitude buddhista: aquela que coloca o bem-estar dos
outros acima do nosso mesmo: mas isto é o rugido do dragão, bem como a caveira.

Uma vez um monge perguntou ao Grande Mestre Ryuto de Kyogengi: "Em que consiste
o Caminho do Buddha?" O mestre retorquiu: "O rugido de um dragão numa árvore
seca." O monge comentou então: "Não consigo compreender". O mestre encerrou:
"São os olhos refulgentes de uma caveira".

De outra feita, um certo monge perguntou ao Grande Mestre Sekiso: "Por favor, diga-
me o que vem a ser o rugido do dragão numa árvore seca?"

"Eis que reténs uma mente que busca o prazer", assim lhe respondeu o Grande Mestre.
O monge perguntou novamente: "O que então são os olhos refulgentes de uma
caveira?". O mestre respondeu: "Eis que ainda reténs aquela consciência distorcida".

De outra feita, um monge perguntou ao Grande Mestre Sozan Honjaku4 : "O que vem
a ser o rugido de um dragão numa árvore ressequida?" Ao que Sozan disse: "A energia
vital nunca parou de fluir". "E quanto aos olhos refulgentes de uma caveira?", indagou
novamente o monge. "Uma árvore ressequida nunca estanca a seiva, nunca fica seca".
Mas o monge foi persistente: "Não consigo compreender. Existe alguém que o possa
compreender?" "Todos, no mundo inteiro, o podem compreender", lhe respondeu
Sozan. O monge perguntou: "Ainda não cheguei a uma compreensão. Poderá talvez
haver alguma palavra que possa adequadamente descrever o que é o rugido de um
dragão?" O mestre replicou: "Nem eu mesmo compreendo o significado das palavras".
O monge não pescou o significado, e não passou pelo teste.

Todos estes diálogos usam uma forma que é tão diferente do discurso comum quanto o
rugido de um dragão é de uma voz humana. "Na árvore ressequida" ou "Na caveira"
não significam dentro ou fora, si mesmo ou outros; este discurso compreende o
presente bem como o passado. Quando Sekiso disse ao monge que ele retinha uma
mente que buscava o prazer, ele estava somente tentando mostrar uma forma mais
completa do rugido do dragão, e a segunda resposta, a saber, "Eis que ainda reténs
aquela mente," tentava dar-lhe um gosto da liberação.

"A energia vital nunca estanca" de Sozan tenta expressar o que é inefável, que não
pode ser expresso através de palavras. "Nunca estanca" é a mesma coisa que "o fundo
do oceano não pode ser visto". Estanca infindavelmente. Quando o monge indagou se
havia alguém que o pudesse compreender, Sozan lhe disse que absolutamente todos
no mundo o podiam compreender. Isto é, todos são capazes de ouvir o rugido do
dragão; ele existe por toda parte. Vamos um pouco mais além nisto. Deixando de lado
por ora se alguém nunca tenha ouvido o rugido do dragão, consideremos onde está o
rugido do dragão quando todos absolutamente o ouvem.

O rugido do dragão é um som feito como a respiração nasal. Sozan quis dizer que
apesar de não poder expressar o rugido do dragão com palavras, na verdade sua
própria voz era o rugido do dragão. O monge não conseguiu alcançar isto, e
conseqüentemente perdeu-se. Isto é deveras lastimável.

Estes diálogos trocados entre Kyogen, Sekiso, e Sozan no que diz respeito ao rugido do
dragão nos mostram suas forças. Falando ou não, com olhos refulgentes ou com a
caveira, todos estes são diferentes formas da voz do dragão, o sangue vital dos
buddhas e ancestrais. Este grande fluxo sempre está se transmitindo para outros, e
nunca cessa. Uma pilastra redonda fica grávida, e uma lanterna de pedra se encontra
com outra.

Capítulo 25 do Shôbôgenzô de Dôgen Zenji (1200-1253).


Adaptado da tradução do monge Ryokyu Marcos Beltrão.

Ecos do Silêncio — Textos Zen

No instante de um pensamento,
Minha mente turbulenta chegou a um descanso.

O interior e o exterior,
Os sentidos e seus objetos,
São completamente lúcidos.

Em uma volta completa,


Esmaguei a grande vacuidade.

As dez mil manifestações


Surgem e desaparecem
Sem qualquer razão.

— Han-shan

Um monge perguntou para o mestre, "Mestre, por favor, me ensine o segredo do


buddhismo."

"Ah sim, mas hoje tem muita gente, quando tiver mais ninguém, vou te ensinar", disse
o mestre.

No dia seguinte, o monge chegou de novo, "Mestre, tem mais ninguém, me ensine
agora."

"Ah, vem cá." E foi para o jardim. Aí o mestre disse:


"Está vendo? Esta árvore é alta e aquela outra é baixa. Este é que é o segredo do
buddhismo."

(Ryotan Tokuda Igarashi, Psicologia Budista)

Por que palavras?

Conto Zen

Um monge aproximou-se de seu mestre — que se encontrava em meditação no pátio


do templo à luz da Lua — com uma grande dúvida:

"Mestre, aprendi que confiar nas palavras é ilusório; e diante das palavras, o
verdadeiro sentido surge através do silêncio. Mas vejo que os sutras e as recitações são
feitas de palavras; que o ensinamento é transmitido pela voz. Se o Dharma está além
dos termos, porque os termos são usados para defini-lo?"

O velho sábio respondeu: "As palavras são como um dedo apontando para a Lua; cuida
de saber olhar para a Lua, não se preocupe com o dedo que a aponta."

O monge replicou: "Mas eu não poderia olhar a Lua, sem precisar que algum dedo
alheio a indique?"

"Poderia," confirmou o mestre, "e assim tu o farás, pois ninguém mais pode olhar a lua
por ti. As palavras são como bolhas de sabão: frágeis e inconsistentes, desaparecem
quando em contato prolongado com o ar. A Lua está e sempre esteve à vista. O
Dharma é eterno e completamente revelado. As palavras não podem revelar o que já
está revelado desde o Primeiro Princípio."

"Então," o monge perguntou, "por que os homens precisam que lhes seja revelado o
que já é de seu conhecimento?"

"Porque," completou o sábio, "da mesma forma que ver a Lua todas as noites faz com
que os homens se esqueçam dela pelo simples costume de aceitar sua existência como
fato consumado, assim também os homens não confiam na verdade já revelada pelo
simples fato dela se manifestar em todas as coisas, sem distinção. Desta forma, as
palavras são um subterfúgio, um adorno para embelezar e atrair nossa atenção. E
como qualquer adorno, pode ser valorizado mais do que é necessário."

O mestre ficou em silêncio durante muito tempo. Então, de súbito, simplesmente


apontou para a lua.

(Enviado por Tam Hao Van para a Lista Chungtao)

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