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Sintese Sessão Seis

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Universidade Estadual do Ceará – UECE

Mestrado Acadêmico em Sociologia - PPGS


PROGRAMA 2023.1
DISCIPLINA: Sociologia Brasileira
PROFESSORA: Dra. Lia Pinheiro Barbosa

SÍNTESE de “Atitudes Raciais de Pretos e Mulatos em São Paulo” de Virgínia Leone


Bicudo e dos textos de Lélia Gonzalez “A Categoria Político-Cultural da
Amefricanidade” e “Racismo e Sexismo na Cultura Brasileira”

GUILHERME XIMENES CASTELO BRANCO

FORTALEZA – CE
2023
SÍNTESE de “Atitudes Raciais de Pretos e Mulatos em São Paulo” de Virgínia Leone
Bicudo e dos textos de Lélia Gonzalez “A Categoria Político-Cultural da
Amefricanidade” e “Racismo e Sexismo na Cultura Brasileira”
A presente síntese busca apresentar os principais pontos que identifiquei nos referidos textos.
Virgínia Leone Bicudo, nascida na cidade de São Paulo, em 1910, e faleceu em 2003.
Filha de imigrante Italiana e pai negro, Teófilo Bicudo. Sua dissertação de mestrado “Atitudes
Raciais de Pretos e Mulatos em São Paulo”, defendida em 1945 após quatro anos de pesquisa,
rompe com o pressuposto que o preconceito racial estaria atrelado ao de classe.
Seu trabalho se estrutura de forma bem organizada. Na introdução a autora deixa
explicito que utilizou na metodologia estudos de caso, entrevistas e exame de documentação.
Ela afirma se tratar te um trabalho inicial com a finalidade de levantar hipóteses que deverão
ser aprofundadas em estudos posteriores. Assumindo a posição de observador, e utilizando o
conceito de Atitudes Sociais de Faris (1937, p. 133), procuraram conhecer as condições
individuais e uma associação de “homens de cor” a partir das técnicas assinaladas.
A partir da entrevistas com mais de 30 pessoas e tinha por finalidade conhecer as
atitudes do individuo de cor referente ao preto, ao mulato e ao branco. Posterioremente o
material recolhido foi distribuído em quatro grupos: pretos de classe baixa (grupo A), pretos
de classe intermediária (grupo B), mulatos de classe baixa (grupo C) e mulatos de classe
intermediária (grupo D).
Se segue no texto os relatos da entrevistas e suas análises dividias em cada grupo. Das
conclusões das entrevistas Bicudo identifica que:
Grupo A: “as atitudes do preto da classe social “inferior” para o preto e para o bran­ co
estariam baseadas em sentimento de inferioridade, o qual determinaria sentimento de
antagonismo contra o preto e de simpatia para o branco. A atitude de antagonismo do negro
resultaria em falta de solidariedade entre pretos, enquanto a atitude de simpatia para o branco
não somente torna o pre-to mais tolerante, como indiretamente concorre para atenuar qualquer
manifestação de antagonismo da parte do branco, de onde maior convívio entre
pretos e branco” (BICUDO, 2010, p. 72).
Grupo B: A variação com os homens pretos de classe intermediária varia de acordo com a
biografia de cada entrevistado. As resposta desse grupo são maiores, narrando a
infância(criação), relações de trabalho, relacionamento, movimento social, etc. Nesse grupo,
aqueles que foram criados por brancos demonstraram ter mais consciência de cor. Os pretos
desse grupo, apesar de subirem na classe da estratificação social, não deixam de sofrer o
racismo e buscaram isolar-se e a terem uma vida “sóbria” para evitar julgamentos. Essa
constatação refuta a premissa que o preconceito racial e de classe não estão atrelados.
Grupo C: para esse grupo ser associado ao negro é uma ofensa. Esse grupo age sempre
pensando na cor. Comparado com os pretos da mesma classe social, os entrevistados desse
grupo demonstraram possuir mais consciência de cor.
Grupo D: “Os casos apresentados demonstram que não temos o preconceito racial no sentido
de uma atitude de antagonismo de toda a população, atingindo a todos os indivíduos descentes
da raça dominada, mesmo quando remotamente. Entre nós, é suficiente que os traços raciais
sejam atenuados e que o indivíduo apresente valores da classe dominante para ser integrado
entre os brancos. O mulato é discriminado na medida em que lembre sua origem africana,
principalmente pela cor” (BICUDO, 2010. P . 121).
Sobre a “associação de Negros Brasileiro”, a autora afirma se apresentarem como um
movimento coletivo, cujo o objetivo é, após o intimo convívio com o branco (do qual se
sentiam repelidos), agregar negros para juntos conseguir ascensão e acesso a todas as esferas
sociais. As lideranças negras tiveram que lutar contra a falta de sentimento de solidariedade
entre eles, ai mesmo tempo privilegiavam o branco (BICUCO, 2010, p. 154).
Dez anos antes da conclusão de “Atitudes Raciais de Pretos e Mulatos em São Paulo”,
nascia Lélia González. Nos anos 80 Gonzalez publica dois importantes textos: “A Categoria
político-cultural de amefricanidade” e “Racismo e sexismo na cultura brasileira”.
A autora traz um olhar novo sobre a formação sócio-histórica do Brasil. A autora
propõe a partir da discursão racial, a concepção de uma “améfrica ladina”, cuja definição
contempla todos os brasileiros. A neurose da cultura brasileira tem no racismo seu sintoma
por excelência, conforme a auotra. Porém esse racismo é negado, ou melhor, no termos
Freudianos: denegado.
A autora traz o aspecto da linguagem, que no Brasil é falado o “pretoguês”, pois existe
um caráter das línguas africanas que é encoberto pelo véu ideológico do branqueamento. Sim,
o branqueamento e concepções eurocêntricas são ideologias.
A produção cientifica (formal) tradicionalmente se desenvolveu no terreno
etnocêntrico e pré-colonialista que desconsiderava as manifestações culturais dos povos
“selvagens”. Os portugueses já tinham uma tradição histórica de manter povos dominados na
subordinação. Deste modo, diferente do que aconteceu nos EUA, na América Latina o
racismo se dá de maneira sofisticada para manter indígenas e negros na condição de sujeitos
inferiores (para não dizer que lhe negam a condição de pessoa). Comparando com as
identificações que Bicudo fez 40 anos antes, Bicudo percebe uma estraficiação mais explicita
do que, pelo que compreendi, identificado por Gonzalez. No Brasil de Gonzalez já era
consolidado o mito da “democracia racial”, onde não existe racismo, todas as etnias vivem
harmonicamente (mas cada um tem o seu lugar: o do branco, nos locais de privilégio, os
negros na favela levando baculejo da polícia e lutando por subempregos).
A amefricanidade, conforme defende a autora, (diferentemente de afroamericano ou
africano americano, que denotam que só nos EUA existem negros), traz implicações políticas
e culturais mais democráticas, uma vez que o próprio termo ultrapassa as limitações
territoriais, linguístico e ideológico.
Lélia Gonzales, assim como Bicudo, refutam a ideia de uma democracia racial,
mostrando que na história desse país alguém foi senhor e alguém foi escravo, e alguns passos
que deveriam ter sido dados não o foram. Assim, a mulher negra: de doméstica, passa a rainha
da bateria. De objeto sexual (mukama, no sentido da etimologia da palavra), a rainha da
escola de samba – muita festa e alegria. A autora tece severas críticas a Caio Prado Junior, e
acredito que na pessoa dele, tantos homens brancos privilegiados que ousaram a escrever
sobre questões raciais e das mulheres sem romper com a lógica da Casa-Grande.
É difícil falar dos textos de Lélia, porque é possível sentir sua força nas palavras
descritas, que se torna quase impossível sintetizar. A sua “fala” me impactou profundamente.
Oxalá que esses textos chegassem nas mãos de cada brasileiro e brasileira. Fica difícil
elaborar duas questões a partir desses trabalhos, pois o sentimento que me vem é o de (re)ler
com atenção, e me parece quase uma audácia questionar qualquer possível lacuna. Mas a
sociologia vive também disso.
Décadas se passaram desde as publicações de Gonzalez e Bicudo, mas o sintoma do
racismo à brasileira não desapareceu. A questão que apresento é: qual a postura que pessoas
brancas podem assumir para o combate da discriminação étnico-racial na cultura em que o
combate ao racismo virou “lacração” e a denúncia virou “mimimi”? Em 2003 se criou no
Brasil o Ministério da Igualdade Racial, sendo posteriormente suprimido e findado. Retornou
em 2023 junto com o presidente Lula. Mas também assistimos nos últimos ano todas as
formas de preconceito saindo do armário. Poderíamos dizer que, em alguma medida, a
política brasileira retornou ao de Bicudo, onde as estratificações sociais-raciais eram mais
definidas? Ou houve uma tentativa para isso?

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