Soldados Da Borracha
Soldados Da Borracha
Soldados Da Borracha
Publicado em 2015 pela editora da PUC-RS, Além de ser um trabalho de quase servidão, a
o livro é de autoria de Gary e Rose Neeleman, um extração de látex era uma tarefa extremamente
casal de jornalistas norte-americanos que moraram solitária, perigosa e instável. Cada seringueiro era
no Brasil como correspondentes da United Press. responsável por uma área que continha de 100-200
Outros livros dos autores incluem: “Trilhos na Selva: árvores borracheiras. Ele precisava acessá-las, no
O Dia a Dia dos Trabalhadores da Ferrovia Madeira- meio da floresta, com uma espingarda e um facão. A
Mármore”, e “A Migração Confederada ao Brasil: extração de borracha durava até o anoitecer e era
Estrelas e Barras sob o Cruzeiro do Sul”. preciso defumar esse látex sob um fogo. A borracha
só era extraída durante o verão, obrigando os
O PRIMEIRO CICLO DA BORRACHA E A seringueiros a viver de agricultura de subsistência
BIOPIRATARIA DA HEVEA BRASILIS durante o resto do ano. Além do endividamento
perpétuo, precisavam conviver com a ameaça de
Neeleman começa o livro rememorando a animais selvagens, índios e doenças. Esses
importância da borracha no final do século XIX, trabalhadores voltaram pobres para o sertão
quando começa o Primeiro Ciclo da Borracha: “até nordestino, mas as elites de Manaus e Belém
1900, o Brasil produziu 95% de toda a borracha no enriqueceram como nunca.
mundo…, [em 1910] a borracha era responsável por
40% de todas as exportações do Brasil…, [e] até Diante da dominância brasileira da borracha,
1922 os Estados Unidos usaram 70-80% de toda a o Império Britânico começou a recrutar interessados
produção de borracha do mundo”. A melhor e mais na tarefa de contrabandear borracheiras brasileiras
cara borracha no mercado se chamava Pará Hard para a Inglaterra. Neeleman narra a saga do inglês
Fine, extraída da árvore borracheira Hevea Henry Wickham, um botânico amador que
Brasiliensis, nativa da Bacia Amazônica. Os conseguiu contrabandear 70 mil sementes da Hevea
seringueiros responsáveis pela extração de toda essa Brasilis, em 1876. Wickham pagou para que pessoas
borracha eram camponeses importados do Nordeste locais ajudassem na coleta das sementes, em seguida
especialmente do Ceará – que trabalhavam em escondidas no porão de um navio, que foi lacrado
regime de escravidão por dívida (peonagem): com pregos. O roubo contou com a participação do
cônsul honorário britânico, que atuou junto às
autoridades alfandegárias brasileiras para que o
navio fosse liberado sem que a carga fosse
inspecionada e as sementes descobertas. Ao chegar Amazonas e estabeleceu a ampla indústria de
em Londres, somente 20 mil das sementes plantação de borracha.”
sobreviveram. Foi o suficiente para que os britânicos
passassem a dominar o cultivo da Hevea Brasilis e A SEGUNDA GUERRA MUNDIAL E OS
criassem plantações de borracha em suas colônias ACORDOS DE WASHINGTON
asiáticas (Índia, Malásia, Singapura, e Sri Lanka).
Quando os Estados Unidos foram instados a
Diferentemente dos experimentos em entrar na guerra, em 1941, Neeleman explica que
Fordlândia, onde o cultivo de borracha não resistiu “97% de toda a borracha natural do mundo estava na
às pragas locais, a tentativa de criar plantações mão dos japoneses”. Nessa época, os industriais
industriais de Hevea Brasilis na Ásia deu certo. Com norte-americanos já produziam borracha sintética,
isso, o Primeiro Ciclo da Borracha se encerrou em mas o custo ainda era excessivamente caro. Também
1912, quando as plantações de borracha do Sudeste existem produtos estratégicos para os quais o uso da
asiático substituíram os seringais brasileiros no borracha natural é necessário até hoje, como pneus
fornecimento mundial da borracha. Dez anos depois, de aviões. Neeleman ilustra a importância da
em 1922, o Brasil responderia por somente 6% da borracha na fabricação do material para o esforço de
produção mundial de látex natural. guerra: