Nothing Special   »   [go: up one dir, main page]

Alma e Finalidade Da Vida Humana

Fazer download em pdf ou txt
Fazer download em pdf ou txt
Você está na página 1de 5

Alma e finalidade da vida humana em Aristóteles

Resumo.

O presente projeto visa fazer um apontamento entre os conceitos de alma humana e a teleologia
de Aristóteles. Para tal, abordaremos considerações sobre as potências da alma, sua relação com
a virtude, felicidade e a sua realização através de uma ética que contemple a plena atualização
das faculdades superiores da alma humana.

Palavras-chave: ensino, ciência, filosofia, história, alma, aristóteles,

Aristóteles afirma que a alma e a causa final estão intimamente relacionadas. Ele divide a
alma em: vegetativa, sensitiva e racional, que é própria do ser humano. A razão consiste no
que é excelente ao homem e o diferencia dos outros seres. Tal faculdade o possibilita julgar,
imaginar e operar de acordo com suas deliberações. (DA, III, 12-13)
Assim como todas as coisas possuem uma finalidade, os atos e a própria vida humana também
propendem para um fim. Utilizando faculdade da razão como ordenadora das virtudes, o
homem tende a essa finalidade que, segundo Aristóteles, é a felicidade.
“Tal como diz o Filósofo no princípio da Metafísica, é próprio do sábio ordenar. O
motivo é que a sabedoria é a mais elevada perfeição da razão, cuja finalidade é
conhecer a ordem. De fato, ainda que as potências sensitivas conheçam algumas
realidades de modo absoluto, conhecer, porém, a ordem de uma coisa em relação à
outra é próprio apenas do intelecto ou da razão. ” (Aquino, 2015)
Em sua filosofia moral, Aristóteles afirma que a finalidade do ser humano é a felicidade,
alcançada na utilização das potências de sua alma de maneira virtuosa. A intenção do projeto
é portanto, investigar como as faculdades da alma humana se relacionam com as virtudes e
como deve agir um ser humano para alcançar este fim.
Ao analisar essas reflexões, pode-se observar esta psicologia, que abarca o ser humano num
espectro amplo, num contexto existencial que tem muito a oferecer a psicologia do século XXI.

Os fatores que determinaram a escolha deste tema estão ligados principalmente ao desejo de
seguir a carreira acadêmica e também das minhas observações atuando como psicólogo.
Trata-se de uma realização a possibilidade de participar do Programa de Pós-Graduação em
Filosofia da UFBA, dentro de uma linha de pesquisa tão relevante.

Sendo a psicologia atual uma ciência derivada da filosofia, e literalmente significando o


estudo da alma, desde a minha formação percebi que aquele que apresentar o desejo de
compreender a psicologia, em suas diversas configurações, deve acompanhar o processo pelo
qual esta ciência foi gestada. Para obter a psicologia além da técnica, é importante
compreendê-la na sua concepção, incluindo as manifestações dialéticas que conceberam a
alma como objeto de estudo. Tomei então como inspiração o próprio Aristóteles, pois para
conhecer uma coisa é necessário conhecer sua causa.

É sabido que a psicologia atual é calcada principalmente nos moldes experimentais


estabelecidos a partir do final do século XIX, oriundos do modelo cartesiano. Essa
configuração de ciência, progressivamente afastada da filosofia e mais voltada à matriz
cientificista, promoveu saberes que aplicaram o estudo psicológico nos sistemas cognitivos e
subjetivistas. Aristóteles, no entanto, tem uma visão diferente do ser humano, abarcando toda
a sua forma e finalidade, toma o homem no seu conjunto, através de algo presente em todos os
indivíduos da espécie. Apesar dessa concepção, à primeira vista parecer um tanto infactível,
ao meu ver, é de grande importância para as questões psicológicas do homem atual.

Para justificar a relevância do pensamento de aristotélico na atualidade, e a própria pesquisa


em si, é necessário que observemos as características da subjetividade do homem moderno,
assim como fez o estagirita no seu tempo. Um dos estudiosos que pode nos trazer mais a
respeito dessas características é Zygmund Bauman. Sua teoria da modernidade líquida afirma
que as individualidades atuais são caracterizadas pela fluidez. Bauman (2001) pontua que no
mundo atual nada é sólido, não há uma valorização do permanente e sim do instantâneo. A
característica psicológica do sujeito moderno como se aproxima de um processo de
liquidificação, a concepção clássica do sujeito composto por uma essência deu lugar ao sujeito
fluido em suas identificações e com uma subjetividade muitas vezes contraditória.
Os fluidos, por assim dizer, não fixam o espaço nem prendem o tempo. Enquanto
os sólidos têm dimensões espaciais claras, mas neutralizam o impacto e,
portanto, diminuem a significação do tempo (resistem efetivamente a seu fluxo
ou o tornam irrelevante), os fluidos não se atêm muito a qualquer forma e estão
constantemente prontos (e propensos) a mudá-la; assim, para eles, o que conta é
o tempo, mais do que o espaço que lhes toca ocupar; o espaço que, afinal,
preenchem apenas “por um momento” (BAUMAN, 2001)

Guy Debord, no seu trabalho sobre a sociedade espetáculo, faz um paralelo com o
consumismo e afirma que a sociedade atual valoriza o ter acima do ser. Só há sentido
naquilo que puder ser mostrado e reconhecido pelos outros. O sujeito para realizar-se
precisa ser reconhecido como possuidor. O que predomina na sociedade do espetáculo é a
imagem e a mimetização daqueles que são reconhecidos sobre algum aspecto. “O mundo
sensível é substituído por uma seleção de imagens que existem acima dele” Debord (1997).

Como vimos, atualmente nos parece distante o conceito de felicidade presente no


pensamento do estagirita. Aristóteles acreditava que todas as ações humanas propendiam a
um bem absoluto. Tal pensamento pode parecer estranho, pois é distante das concepções
individuais contemporâneas. Atualmente a visão é de que cada pessoa tem consciência do
que é melhor para si e a ideia de que exista um bem supremo para todos os seres humanos é
impossível. No entanto, observando a argumentação de aristotélica, podemos constatar que
ele se refere a uma concepção da própria natureza humana, segundo a qual devemos
realizar para alcançar a felicidade.

Para comprovar seu pensamento, Aristóteles apresenta certos estilos de vida como candidatos
ao alcance da Eudaimonia, o primeiro exemplo é o da vida dedicada aos prazeres sensíveis. É
inegável que aparentemente, uma vida concentrada na obtenção de prazer corpóreo pareça ser
uma vida feliz, completa num desfrutar de situações aprazíveis. No entanto, como essa vida é
fundamentada em nossa parte sensitiva, elemento dos aspectos físicos da nossa existência e que
é compartilhada com outros animais, não pode ser algo exclusivamente humano e nem
representar a utilização de todas as potencialidades superiores da sua alma.

Outros exemplos são: a glória, a fama e a riqueza. Para tais possibilidades, Aristóteles nos
expõe o problema em fazer repousar a felicidade em algo que não dependa de nós como
indivíduos, pois todos estes exemplos ou são atribuídos por outros, ou também dependem
de realizações externas para sua consumação. Para Aristóteles, a felicidade, a máxima
realização do indivíduo, deve ser algo que compete apenas a ele mesmo.
Mesmo dentro da psicologia atual, algumas terapias, ainda que fundadas em outras bases
epistemológicas, utilizam algo do que é considerado por Aristóteles como a aplicação
dapotências superiores a fim de alcançar a felicidade. Por exemplo: A Terapia Cognitivo-
Comportamental utiliza a análise racional das situações como um instrumento ordenador
do comportamento. A Logoterapia acredita que se sofre quando não se consegue identificar
o “significado” próprio da sua vida. Neste caso, Viktor Frankl, no seu livro “Em busca de
Sentido” dá um exemplo interessante a respeito de como a noção de sentido da própria vida
é importante:

“Dependendo da atitude que tomar, a pessoa realiza ou não os


valores que lhe são oferecidos pela situação sofrida e pelo seu pesado destino. Ela
então será "digna do tormento", ou não. Ninguém pense que essas reflexões estejam
distantes da realidade da vida e do mundo. Sem dúvida, poucas e raras são as pessoas
capazes e à altura dessa elevada proposta. Pois poucos foram os que no campo de
concentração mantiveram a sua plena liberdade interior e puderam alçar-se à
realização daqueles valores possibilitada pelo sofrimento. E mesmo que tivesse sido
um único apenas - ele bastaria como testemunho para o fato de que a pessoa
interiormente pode ser mais forte que seu destino exterior, e isto não somente no
campo de concentração. Sempre e em toda parte a pessoa está colocada diante da
decisão de transformar a sua situação de mero sofrimento numa produção interior de
valores.” Frankl 2006

A aspiração deste estudo é, portanto, descrever como o pensamento aristotélico é relevante


no sentido nos inclinar, através da análise e da justa medida das coisas, à felicidade. É
preciso salientar que, para o estagirita, a virtude não repousa num racionalismo frio, mas na
prática da justa medida das coisas realizáveis em nossas potências que, estando em
harmonia, nos faz atingir nossas excelências de acordo com as inclinações individuais.
Assim, o fim último comum a todos os seres humanos, é atingido num processo individual
em busca da felicidade.

REFERÊNCIAS
AQUINO, São Tomás de. COMENTÁRIO À METAFÍSICA DE ARISTÓTELES I-
III:.
Tradução de Paulo Faitanin e Bernardo Veiga. São Paulo: Edipro, 2015.
ARISTÓTELES. De Anima: Livros I, II e III. Apresentação, tradução e notas de Maria
Cecília
Gomes dos Reis. São Paulo: Ed. 34, 2007.
ARISTÓTELES, Aristotle De Anima, text and commentary, Ed. W.D. Ross. Oxford, 1961
ARISTÓTELES, Ética a Nicômaco. In: Os Pensadores vol.II. Trad. Leonel Vallandro &
Gerd Bornheim da versão inglesa de W.D. Ross. São Paulo. Abril Cutural, 1979.
ARISTÓTELES, Metafísica vols. I, II, III, 2ª edição. Ensaio introdutório, tradução do
texto grego, sumário e comentários de Giovanni Reale. Tradução portuguesa Marcelo
Perine. São Paulo. Edições Loyola. 2002.
BARNES, Aristotle`s concept of mind In: Articles on Aristotle: 4. Psychology &
Aesthetics. Editado por J. Barnes, M. Schofield e R. Sorabj. Londres, Duckworth, 2003,
pp. 32-41. BAUMAN, Zygmunt.. Modernidade líquida. Rio de Janeiro: Zahar, 2001

DEBORD, Gui. A sociedade do espetáculo. Rio de Janeiro: Contraponto, 1997

FRANKL, V. E. (2006). Em busca de sentido: um psicólogo no campo de


concentração.
Petrópolis: Vozes.

HALL, Stuart. A Identidade cultural na pós-modernidade. Rio de Janeiro: DP&A, 2011

ZINGANO, M. Aristóteles: tratado da virtude moral. Ethica Nicomachea I 13-III 8. São


Paulo: Odysseus Editora, 2008.

Você também pode gostar