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Historia de Etica
Historia de Etica
Historia de Etica
Conhecimento e prática são inseparáveis. Um não existe sem o outro. Daí que, para o
nosso filósofo, o conhecimento e a virtude são idênticos. Por isso, não existe o mal
voluntariamente desejado; se alguém pratica o mal, é por erro, por ignorância.
Entretanto, para que conhecimento e virtude se deem reciprocamente, é necessário
que se ame o bem. Somente o amor pelo bem é que possibilita não só seu
conhecimento, mas o agir de acordo com ele. A isso se convencionou chamar de
intelectualismo ético de Sócrates. (BORGES,1999, p. 45)
De acordo com o ensinamento socrático, aquele que comete o mal, o faz com o juízo
de que estaria a realizar algo para o alcance de sua felicidade. É ignorante em relação
ao bem por ter seu juízo «falseado» por aparências externas, meras impressões.
Cabe, portanto, ao homem, exercer sua função racional para alcançar o
conhecimento do bem e, uma vez alcançado, praticá-lo. Dessas considerações
podemos entender que Sócrates considera possível o agir ético a partir do seu
conhecimento.
Descreveremos essa relação, com a distinção que Platão faz acerca da alma humana.
Para o discípulo de Sócrates, a alma estaria dividida em três partes, sendo que a
parte racional deveria estar em primazia diante das outras. Essa ideia significa que a
virtude maior da harmonia seria alcançada quando a racionalidade contida na parte
superior da alma dominasse os instintos irascíveis, e estes por sua vez dominassem
os apetites baixos do corpo.
Aristóteles
O ideário aristotélico tem como fundamento a ideia de que todas as coisas tendem a
um fim, e este fim, por sua vez, seria o bem a ser realizado por aquela coisa. Aliás é
com esse pensamento que inicia sua Ética a Nicômaco. Toda arte e toda investigação,
bem como toda ação e toda escolha, visam a um bem qualquer; e por isso foi dito,
não sem razão, que o bem é aquilo a que as coisas tendem.
Nesse sentido e reconhecendo a inarredável característica de ser relacional, que é
constituinte do homem, necessitamos perscrutar dentro do pensamento aristotélico
qual seria o fim a que o homem aspira em sua vivência com o outro. Toda atividade
humana tem como finalidade um bem. No caso da ética, este bem se manifesta no
indivíduo que se prepara para viver com os outros na pólis, pois, conforme ensina
Aristóteles, o bem propriamente humano é o fim da política:
A ética, para Aristóteles, é uma investigação que constitui uma forma de política, em
outras palavras, o indivíduo de quem ela trata é o homem vivendo na pólis, onde o
bem a que todo homem aspira é a felicidade. A felicidade é o conteúdo do bem
ético, da ação moral.
Para Aristóteles um bem pode ser maior que o outro, e tal grandeza se mede pelo
grau de autossuficiência alcançado por este bem, isto é, aquilo que é parte de todo o
resto, torna a vida desejável e não carece de nenhum outro, o bem maior é a
felicidade, que se enquadra em todos os requisitos.
O bem é sempre uma excelência, e o bem ético consiste numa atividade da alma de
acordo com a virtude, isto é, numa vida virtuosa realizada plenamente, desse modo,
a felicidade não pode ser obra de um só dia, nem de pouco tempo, ao contrário, a
felicidade é obra de uma vida inteira. O bem ético, ou seja, a felicidade, é, portanto
obra de toda uma vida, não sendo alcançada imediatamente e tampouco de forma
definitiva, sendo, portanto um exercício cotidiano que a alma realiza durante todo
tempo de seu existir.
Esse raciocínio nos direciona ao entendimento de que esse bem aspirado pelo
homem, indivíduo ou comunidade -, seria a felicidade e, que ao agir bem e viver
bem, o homem seria feliz. No entanto, esse não seria o ponto mais complicado da
questão. O problema que envolve a questão é mesmo de ordem filosófica e requer
um tanto mais de apuro: concordar acerca de que a felicidade é o fim último a que
aspira o homem, não nos parece tarefa difícil. A dificuldade está em saber o que
significa isso a que buscamos, a felicidade.
O filósofo de Estagira liga de forma intrínseca o bem à ética, considerando-o como
um fim perfeito, que basta por si só, tornando a vida desejável, e para ele uma vida
desejável é sem dúvidas uma vida feliz. Desse modo, a felicidade é um conjunto de
bens, sendo, portanto, a finalidade das ações humanas. Para Aristóteles, a felicidade
estava afastada dos prazeres, tidos para ele como uma baixeza escrava, tanto da
plebe como da nobreza. A felicidade não é sinônimo de riqueza, pois esta era
somente motivo de canseira humana, sendo um meio, e não um fim da atividade
humana.
Para Aristóteles, o objetivo da ética era alcançar a felicidade. A felicidade, para ele,
era a vida boa compreendida como a vida digna. Para tal objetivo, a ética deve estar
subordinada à política, pois somente esta seria capaz de proporcionar vida digna e
feliz a seus cidadãos. Em sua obra Ética a Nicômaco, mais precisamente no Livro II,
Aristóteles expressa de maneira clara o intuito, o propósito, o objeto e o sujeito do
estudo da ética:
Estou falando da excelência moral, pois é esta que se relaciona com as emoções e
ações, e nestas há excesso, falta e meio termo. Por exemplo, pode-se sentir medo,
confiança, desejos, cólera, piedade, e, de um modo geral, prazer e sofrimento,
demais ou muito pouco, e, em ambos os casos, isto não é bom: mas experimentar
estes sentimentos no momento certo, em relação aos objetos certos e às pessoas
certas, e de maneira certa, é o meio termo e o melhor, e isso é característico da
excelência.
Há também, da mesma forma, excesso, falta e meio termo em relação às ações. Ora,
a excelência moral se relaciona com as emoções e ações, nas quais o excesso é uma
forma de erro, tanto quanto a falta, enquanto o meio termo é louvado como um
acerto; ser louvado e estar certo são características da excelência moral. A excelência
moral, portanto, é algo como equidistância, pois, como já vimos, seu alvo é o meio
termo. Ademais é possível errar de várias maneiras, ao passo que só é possível
acertar de uma maneira (também por esta razão é fácil errar e difícil acertar; fácil
errar o alvo, e difícil acertá-lo); também é por isso que o excesso e a falta são
características da deficiência moral, e o meio termo é uma característica da
excelência moral, pois a bondade é uma só, mas a maldade é múltipla (ARISTÓTELES,
2004, p.42).
Por virtude, Aristóteles compreende uma prática, os homens não nascem virtuosos,
as virtudes são adquiridas ao longo da existência, assim como os vícios. Para
Marilena Chauí, a virtude, na visão de Aristóteles, seria:
O que é a virtude? A medida entre os extremos, a moderação entre os dois
extremos, o justo meio, nem excesso nem falta. Moderar, em grego, se diz medo,
ação que impõe o médio/medida, méson. É uma ação-decisão de impor limites ao
que, por si mesmo, não conhece limites. Moderar (medo) é pensar, ponderar,
equilibrar e deliberar. A ética é a ciência da moderação ou, como diz Aristóteles, da
prudência (phrónesis). A virtude é virtude de caráter ou de força de caráter educado
pela moderação para o mesotes, o justo meio ou a justa medida. (CHAUÍ, 1994, p.
312).
Kant
Como exemplo, o autor nos ensina a respeito dessa isenção que só a uma boa
vontade é possível: o sangue frio de um celerado não só o torna muito mais
perigoso, como também, a nossos olhos, muito mais detestável do o que teríamos
julgado sem ele.
O que Kant quer nos ensinar com o exemplo trazido é que existem coisas boas, tais
como o equilíbrio, a harmonia, a coragem, mas que estes valores não têm uma
bondade intrínseca a si, ora, podem a qualquer momento servir a fins que não os
mais interessantes para o homem, haja vista o exemplo acima.
O fundamento ético então torna-se, nos dizeres de alguns autores, uma virtude
formal. Por essa via, direcionamos o pensamento para a cristalização do pensamento
da ética kantiana, qual seja, o imperativo categórico, que será alvo de discussão
adiante.
Por ora, importa mencionar a natureza formal dessa categoria ética da boa vontade.
A boa vontade assim o é então, por qual motivo?
Levinas
A rota de fuga dessa violência simbólica fica apontada com a ideia levinasiana de
responsabilidade. Ao referirmos a essa ideia, precisamos estabelecer, aliás, como já
anunciado, que a existência do eu não se funda propriamente na percepção dada
pelo cogito. O outro me antecede na relação com o mundo. Nesse sentido, a
existência do humano é não apenas mediada pelo outro, mas, em verdade, temos
nele a condição primeva de minha colocação no mundo. Estabeleço-me no mundo a
partir e através do outro. No encontro com a face do outro me responsabilizo por ele
e por todos os outros que vierem, ora, o mundo constitui-se desta e por essa
possibilidade. Assim, a existência do humano restaria dada a partir do encontro com
o outro. O outro que me permite habitar o mundo enquanto me dou a ele em
condição de refém, mesmo sem querer, mesmo sem que tenha anuído por essa
responsabilidade de maneira antecipada.
Seguimos por um via inversa daquilo que o pensamento ilustrado nos quis ensinar.
Não uma anunciação do que está por vir, a experiência com o rosto nos dá apenas a
sensação daquilo que escapa, nesse momento, estamos em vias de afirmar a
santidade, aquilo que não é palatável aos olhos, ao nariz e à boca do humano, aquilo
que o torna humano: sua inapreensão, seu ocultamento, sua surpresa e sua
transcensão.
Captar o outro a partir de uma descrição do rosto é não perceber o vulto que é o
rosto. Categoria por si só arredia aos conceitos que trazemos a ele, que impomos a
ele, se quisermos ainda nos manter no terreno da violência simbólica que agora quer
categorizar sua procedência, sua ascendência. Pensar o rosto a partir de categorias
que o expliquem, que o estabeleçam, seria negá-lo na infinitude que é, na obra
inacabada que é o humano, se quisermos nos referir a Nietzsche. O humano quando
se coloca ainda nessa condição de mistério contra o qual nada posso. É isso mesmo o
que vimos a anunciar como hipótese para um desvencilhar da teia conceitual que o
logos ocidental concebeu para fazer nascer a categoria de homem.
Nesse sentido, se mais uma vez quisermos falar sobre a violência simbólica, uma
relação de igualdade estribada nos moldes logocêntricos, é, em verdade, uma
igualdade falaciosa, ora, para que haja, de fato, uma possibilidade não violenta e,
portanto, de justiça, a tentativa de alocar o outro dentro de qualquer molde de
igualdade seria mais uma vez uma violência. Por isso, reiteramos, a igualdade se dá
mesmo na precedência do outro sobre mim, pois, uma vez que nos entendemos em
uma relação de simetria, de alguma forma, alguém deixou de ser alguém e já ser
tornou parte distinguida naquela relação. Distinguir aqui, seria uma forma violenta
de conhecimento, e, por tudo que vimos a dizer, conhecer é, neste sentido, uma
forma de violência simbólica na raiz.
O dizer o infinito é aqui um corolário das perspectivas que anunciamos. Quando a
relação com o humano resta perpassada por essa via, um sinal de luz nos abre o
olhar. Mirar o horizonte é um bom exercício para essa concepção. O mesmo
horizonte é um infinito de possibilidades que soçobra as nossas condições discursivo-
intelectuais. Não há apreensão possível que não seja aniquiladora, redutora e
violenta dessa mirada. As condições que a experiência com o horizonte nos
permitem são elas, assim como o outro, o rosto do outro, questões que transbordam
a cada piscar de olhos. O infinito com que o outro me interpela em um primeiro
momento me permite mesmo estar no eu e de outro lado, e por isso mesmo, me
responsabiliza por ele de maneira perpétua, como condição minha mesma. Não há
reflexão bastante para essa absorção. Assim, não há mais que se considerar que uma
vida sem exame não valha a pena ser vivida. Na senda que estamos a trilhar, a
constituição de autenticidade não é uma criação e/ou uma possibilidade de
construção. De fato, o próprio infinito que é o outro enquanto categoria que me
coloca no mundo, é ele em verdade que não pode ser esquecido pelo humano. Ou,
dito de outro modo, esse infinito é um imperativo sem categorias a que me devo
submeter pela minha condição mesma. Pela minha condição limitada enquanto ser
de logos que se entrega ao outro em uma realização que transcende o discurso e se
realiza agora em vias de devoção. A fé no outro é que permite o entendimento do
infinito. Nem ela, nem a santidade do outro têm limites, assim, a heteronomia com
que o outro me impõe se dá mesmo pela ideia de que o seu infinito é impossível a
mim, que sua condição de santidade é inquestionável pelo eu. Um eu que agora é
vassalo e servo, refém do infinito que o transcende, que o supera e que por isso
mesmo é um impossível. Aporia, utopia.