Aprender A Ler e A Escrever - Expectativas Da Familia e Escola
Aprender A Ler e A Escrever - Expectativas Da Familia e Escola
Aprender A Ler e A Escrever - Expectativas Da Familia e Escola
1. Iniciando o diálogo
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Você já percebeu que a família vem mudando com o tempo. Novas configu-
rações são socialmente construídas. Elas não são certas nem erradas... São
as diferentes formas como nós, enquanto sociedade, conseguimos nos orga-
nizar. E isso traz grandes desafios para a nossa atuação como professoras,
principalmente se pensamos nas expectativas que as famílias têm em rela-
ção à escola e à apropriação da leitura e da escrita. Como podemos enfrentar
esses desafios?
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Em outras etapas da educação, foi constatado que nem sempre a crença de que
a participação da família é condição para o sucesso escolar tem consequências
positivas, uma vez que a instituição educativa pode atribuir a causa de proble-
mas escolares das crianças à não participação de suas famílias na vida escolar
delas. Como afirma Oliveira (apud OLIVEIRA; MARINHO-ARAÚJO, 2010, p. 101),
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Ainda hoje se pode constatar esse tipo de percepção quanto ao papel subs-
tituto da instituição de Educação Infantil nos comentários de profissionais
que lá atuam, como uma coordenadora ouvida por Maranhão e Sarti (2008,
p. 191): para ela, era “engraçado” que, mesmo “não precisando”, algumas
famílias fossem usuárias da creche.
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Pesquisadora: Na reunião?
Eu digo a ela: “Dani, você tem que estudar que é pra você aju-
dar a mamãe”. (D. Eroneide)
Essas falas foram ouvidas durante a década de 1980 (CRUZ, 1987), mas,
com poucas alterações, nos dias atuais, elas estão presentes nos contatos
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De fato, vários outros trabalhos têm constatado que as famílias das classes
populares atribuem grande importância à educação como forma de ascen-
der a “uma vida melhor”. A pesquisa de Zanella e colaboradores (1997, p.
145) conclui “que todos os pais querem ver seus filhos bem-sucedidos aca-
demicamente; não querem que eles abandonem a escolaridade antes do
tempo previsto e veem a escola como uma única oportunidade de ascensão
social e um futuro melhor”. Daniela de Figueiredo Ribeiro e Antonio dos San-
tos Andrade (2006) também confirmam, em sua pesquisa, que há uma gran-
de valorização das escolas por parte dos pais, uma vez que ela é percebida
como o principal meio de ascensão social e também como pode se constituir
como uma continuidade dos valores passados pela família.
Para quem precisa continuar nas instituições públicas, o empenho muitas ve-
zes se dá no sentido de se adequar ao que a escola exige. Esse esforço inclui
buscar ajuda na escola, mas, principalmente, tentar mudar a criança, não só
através de conselhos, mas até de castigos físicos (CRUZ, 1997).
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Vistos “de fora”, isto é, de forma não contextualizada, fatos como esse po-
dem reforçar a ideia, entre as professoras, de que os pais de crianças pobres
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Desde a década de 1970, a pré-escola tem sido vista como uma maneira de
prevenir o fracasso escolar das crianças pobres em face da sua “carência
cultural”. Nas décadas seguintes, essa “teoria” continuou angariando adep-
tos, a despeito de um grande volume de publicações que mostravam a inade-
quação dessa perspectiva. Havia na “teoria da carência cultural” um caráter
preconceituoso em relação às crianças pobres, colocando nelas a responsa-
bilidade pelo fracasso escolar e desconsiderando os grandes desafios que
são colocados para que a própria escola consiga dar conta da sua tarefa de
promover a aprendizagem e o desenvolvimento das crianças. O próprio dis-
curso que exalta a necessidade de investir na Educação Infantil para diminuir
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As famílias pobres, que, como foi referido, percebem a escola como uma pos-
sibilidade de alcançar melhor posição social, assumem com certa facilidade
esse discurso. Assim, não é incomum que a pré-escola seja vista, principal-
mente, como uma preparação para o Ensino Fundamental. Para a maioria das
famílias com crianças de cinco anos de idade entrevistadas por Lima (2013),
saber ler e escrever consiste na principal expectativa de aprendizagem, tanto
em relação à Educação Infantil quanto em relação ao Ensino Fundamental,
visto como uma fase mais difícil, com “mais exigências e mais conteúdo”.
Por isso, muitas famílias esperam que as professoras desenvolvam atividades
que, na sua ótica, levarão a isso. Então, D. Osmarina acha que é preciso
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Nesse sentido, pela sua importância histórica e legal, merece destaque es-
pecial o artigo 29 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN)
(BRASIL, 1996). Toda a legislação nacional e as locais (como as resoluções
sobre a Educação Infantil elaboradas pelos conselhos estaduais e municipais
de educação) passaram a reafirmar a finalidade de “promover o desenvolvi-
mento integral da criança” e detalhar como isso deveria ser alcançado.
Tendo em vista o tema que discutimos aqui, vale destacar que nas DCNEI (BRA-
SIL, 2009a) o currículo da Educação Infantil é concebido como “um conjunto
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Cada instituição e cada professor de Educação Infantil precisa ter clareza so-
bre quais são as suas expectativas sobre a apropriação da leitura e da escrita
pelas suas crianças, que lugar esse tema assume no contexto das suas pre-
ocupações acerca do bem-estar, das aprendizagens e do desenvolvimento
das crianças.
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3. Compartilhando experiências
Num artigo escrito há quase 20 anos, Madalena Freire (1996) conta como foi a
sua experiência como professora de 35 crianças de três a seis anos num salão de
uma paróquia num bairro pobre da cidade de Carapicuíba, parte da grande São
Paulo. Ele tem sido muito útil para promover discussões sobre vários aspectos
da prática pedagógica na Educação Infantil. Entre eles está a relação que ela es-
tabeleceu com as famílias, integrando-as ao seu trabalho, inclusive o que desen-
volveu tendo em vista a aquisição da leitura e da escrita pelas crianças.
Diante do grande desafio que a nova situação lhe colocava, foi muito impor-
tante reconhecer as dúvidas, preocupações e possíveis dificuldades. Mas, por
outro lado, foi crucial uma percepção positiva das crianças e de suas famílias:
a certeza de que as crianças tinham capacidade para pensar e que suas fa-
mílias sabiam muito sobre a realidade em que viviam (“quem é ignorante lá
sou eu...”). Essa percepção, aliada ao respeito pelas diferenças e ao desejo de
construir uma boa relação, está explícita nas seguintes afirmações da autora:
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Entre os fatos que Madalena conta ao longo do texto, vale destacar os rela-
tivos a uma cobra, trazida num vidro por “Pedrão”, pai de uma das crianças
(“lembrei que vocês gostam de bicho”, ele justifica, explicitando a ligação que
já existia entre as famílias e aquele grupo). A partir da discordância de Glória,
uma mãe, de que aquela cobra não era uma jararaca, como o pai afirmava,
mas sim uma surucucu, a professora se propõe a trazer um livro onde a dúvida
pode ser esclarecida. No dia seguinte, a mãe já cobrou o livro. Madalena narra:
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4. Reflexão e ação
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• fazer uma lista do que, ao final do ano, lhe deixará mais con-
tente e o que lhe provocará mais chateação em relação ao
aprendizado e ao desenvolvimento das crianças. Discuta essa
lista com os outros cursistas;
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Trazemos dois artigos que nos ajudam a pensar um pouco mais sobre os te-
mas que discutimos aqui.
2. Pensando nas relações que você estabelece com as famílias das suas
crianças, você acha que leva em consideração os vários aspectos para
os quais a autora chama a nossa atenção e que o texto procurou abor-
dar (diversidade de arranjos familiares, desejos e valores, relações de
poder, classe social, gênero, etc.)?
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6. Ampliando o diálogo
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Ficha técnica
Gênero: Documentário
Direção e produção executiva: Fernanda Heinz Figueiredo
Roteiro: Renata Meirelles e Fernanda Heinz Figueiredo
Produção: Julie Lockley
Fotografia: Dado Carlin e Mariano Kweller
Sonorização: Espaço Cachuera!
Duração: 115 min.
Ano: 2012
Esse é um documentário sobre uma escola bem diferente, a Te-Arte, que en-
sina as crianças de forma lúdica, com brincadeiras, sem separação de idades,
e em contato com a natureza e com os animais. Sua idealizadora é Thereza
Soares Pagani, que vive a escola como seu maior objetivo de vida e ensina a
valorização da infância brasileira.
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Parte 1: <https://goo.gl/V4E0qR>
Parte 2: <https://goo.gl/cqTygC>
Parte 3: <https://goo.gl/8kS0kv>
7. Referências
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CAMPOS, Maria Malta; COELHO, Rita de Cássia; CRUZ, Silvia Helena Vieira.
Consulta sobre a qualidade na Educação Infantil: relatório técnico final.
São Paulo: Fundação Carlos Chagas, 2006. (Textos FCC, 26).
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PATTO, Maria Helena Souza. Para uma crítica da razão psicométrica. Psicolo-
gia USP, São Paulo, v. 8, n. 1, 1997.
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TOBIN, Joseph J.; WU, David Y. H.; DAVISON, Dana H. Educação Infantil em
três culturas: Japão, China e Estados Unidos. São Paulo: Phorte, 2008.
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