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Tópico I
Tópico I
Tópico I
da Arte Brasileira
Arte e Sexualidade
Revisão Textual:
Maria Cecília Andreo
Arte e Sexualidade
OBJETIVOS
DE APRENDIZADO
• Compreender os conceitos de gênero na Arte – Atributos relacionados às questões da sexualidade;
• Conhecer os aspectos históricos da presença da mulher na arte brasileira e seu papel como artista;
• Refletir sobre a cultura visual contemporânea de afirmação dos sexos e dos corpos sexuados, cru-
zando os mais diversos campos artísticos, como a fotografia, performances, pintura e escultura;
• Compreender esse novo olhar contemporâneo na arte sobre a diversidade e a sexualidade
na forma de lidar com o corpo como objeto e o imaginário.
UNIDADE Arte e Sexualidade
Conforme a expressão artística segue sua trajetória na história, a pintura também evolui,
sobretudo se pensarmos que a fotografia, a partir de 1840, desempenhará um importante
papel. De um lado, como novidade, a fotografia passa a desempenhar uma função que até
então era da pintura; de outro, o uso da fotografia permite à pintura trilhar novos caminhos,
abrindo espaço para as Vanguardas Históricas no final do século XIX na Europa.
Dessa forma, a representação fiel deixa de ser uma necessidade, e essas novas ver-
tentes, a partir do Impressionismo, testarão novos potenciais da pintura como meio de
expressão. Assim, a pesquisa com a luz e a cor no Impressionismo chegará ao Abstra-
cionismo (quando o que vemos na pintura não é um signo que faz referência a algo do
mundo real) e finalmente ao Surrealismo (1924), possivelmente a última das Vanguardas
Históricas, cujos desdobramentos se revelarão importantes para nossos estudos.
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Depois da Segunda Guerra Mundial, há uma grande mudança: o eixo cultural e artís-
tico passa da Europa para os Estados Unidos e surgem novas tendências, novos meios
de expressão. No Brasil, as mudanças demoram um tanto a chegar. A Semana de Arte
Moderna abriu um caminho importante, mas a mudança demora um pouco a aparecer.
Nos anos 1950, considera-se que o nosso País acompanhou de perto o que existia de
novo no universo da arte.
A partir dos anos 1960, temos uma série de eventos que ganharam destaque por redis-
cutir questões que estavam, até então, de certa forma tidas como o “normal”, que estavam
cristalizadas pela tradição. Os movimentos pelos direitos civis, nos Estados Unidos, o Maio
de 68, na França, os Movimento Feministas, entre outras importantes iniciativas, que che-
garam ao Brasil um pouco abafadas, em razão da ditadura militar. Ainda assim, essa onda
chegou até nós, sobretudo, em 1968, ano em que seria assinado o AI-5, o mais brutal dos
atos institucionais do regime militar, que vigorou entre nós de 1964 a 1985.
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espaço. Uma das bases desse fenômeno está na publicação, em 1949, de O segundo
sexo, de Simone de Beauvoir (1908-1986), escritora e obra que têm uma importância
notável no despertar de diversas partes da sociedade para o feminismo.
No Brasil, até a virada para o século XIX, ainda não havia o reconhecimento de mulhe-
res artistas. Isso também ocorria em outras áreas, devido ao modelo patriarcal instalado
em todo o Ocidente. Somente a partir de Angeline Agostine (1888-1973), Nicolina Vaz de
Assis (1874-1941) e Abgail de Andrade (1864-1890) – primeira mulher premiada na 26ª
Exposição Geral de Belas Artes, em 1884 – foi dada maior visibilidade às mulheres artistas
brasileiras. Essas três artistas, em particular, foram alunas do pintor e desenhista Henrique
Bernardelli (1858-1936). Foram aceitas como artistas, entretanto, somente para os cursos
domésticos oferecidos na escola Nacional de Belas Artes do Rio de Janeiro.
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A emancipação das mulheres se dá paulatinamente também em outros campos da
economia, devido ao desenvolvimento da indústria. No início do século XX, a repressão
feminina, como sinônimo da coerção do corpo e da consciência da sexualidade, foi o
ponto mais elucidativo na arte. As mulheres artistas buscavam um discurso emancipador
por meio de suas expressões artísticas contra o conservadorismo e o preconceito com
a palavra “feminismo”.
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O período Moderno no País se estenderia até a década de 1940, em pelo menos duas
fases. Na segunda fase, representada principalmente pelo chamado Grupo Santa Helena,
as obras artísticas encontram contornos mais sociais e um menor espaço para a arte ex-
perimental da primeira fase Modernista. Nas artes vigorava a antropofagia de Oswald de
Andrade e Tarsila do Amaral, entre outros modernistas. Nesse cenário, as reflexões sobre a
produção artística feminina no Brasil, de modo geral, têm especificidades muito diferentes da
de outras partes do mundo, como na Europa e nos Estados Unidos, em que logo na primeira
década do século XX já articulavam intenções no viés do Surrealismo como um gênero de
expressão da sexualidade. No México, destaca-se a figura de Frida Kahlo, artista de um estilo
muito peculiar e que, embora não tenha mantido laços iniciais com o movimento surrealista
europeu, foi considerada surrealista pelo próprio André Breton. A artista, no entanto, não se
colocou em definitivo como surrealista, pois dizia que não pintava sonhos, mas sua própria
realidade trágica.
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Importante!
O Surrealismo foi um movimento artístico que aconteceu originariamente na França, sob
a batuta de André Breton, na década de 1920. A representação das obras se dá por meio
das emoções e da liberação do inconsciente, sem nenhum controle da razão. O nome do
movimento foi dado por Guillaume Apollinaire, escritor e crítico de arte, e significa uma
arte que ultrapassa as aparências, desobrigada o artista da fidelidade do real e traz,
sobretudo, a atmosfera do sonho, em que as rígidas regras da realidade não valem.
Entre nossas artistas brasileiras, Maria Martins (1894-1973) se consagra como a prin-
cipal escultora de expressão surrealista. Viveu grande parte de sua trajetória em um am-
biente em que conheceu artistas europeus ligados ao Dadaísmo e ao Surrealismo, quando
manteve um relacionamento amoroso com Marcel Duchamp, um dos maiores artistas do
século XX. Em suas obras, a artista se apropria da linguagem ambígua relacionada ao
desejo e à sexualidade, própria do Surrealismo, e cria imagens de forte impacto visual,
de erotismo, violência e lirismo notáveis. Entretanto, devido às suas arrojadas ideias, de
influência internacional, inicialmente a artista não é bem aceita no Brasil, ainda muito
conservador à época.
Para entender melhor a diversidade e a relevância da obra de Maria Martins, acesse o docu-
mento a seguir, no site do Museu de Arte Contemporânea (MAM). Nele, você encontrará ima-
gens da exposição Metamorfoses, de Maria Martins, realizada em 2013.
Disponível em: https://bit.ly/2W3WD1W
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UNIDADE Arte e Sexualidade
No Brasil, o Surrealismo ainda não era muito bem recebido, e Maria Martins acaba
sofrendo várias críticas em sua primeira exposição na primeira Bienal de São Paulo,
realizada em 1951. A obra de Martins era claramente influenciada pelo Surrealismo, as-
sim como é possível notar nas obras de Tarsila do Amaral e de Anita Malfatti uma clara
influência dos movimentos modernos europeus, como o Cubismo peculiar de Léger, na
obra de Tarsila, e o Expressionismo, na obra de Anita. Buscava-se, desde a Semana de
Arte Moderna, em 1922, uma “atualização” da arte brasileira, e o modelo era a Europa.
É certo, é claro, que a cultura brasileira se faz presente nas obras modernistas. Essa
junção “antropofágica” é justamente o que caracteriza o movimento.
O movimento feminista sofreu e sofre muitos desgastes e críticas. Por isso, para melhor
fundamentar o tema, leia o texto sugerido “Feminismo no Brasil”.
Disponível em: https://bit.ly/2UmlNIn
A Pinacoteca do Estado de São Paulo é uma das instituições que se sensibilizam com
as temáticas femininas e feministas, mesmo nesse cenário crítico. A instituição promoveu,
em 2004, a exposição Mulheres Pintoras, a casa e o mundo, um recorte de obras de
artistas brasileiras que vai do século XIX até meados do século XX.
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Figura 5 – Mulher do Pará, de Anita Malfatti, 1927 Figura 6 – Tomie Ohtake, 1975, de Madalena
(reprodução fotográfica de Leonardo Crescenti) Schwartz (digitalizado a partir do original)
Fonte: itaucultural.org Fonte: itaucultural.org
É oportuno e de extrema importância citar as artistas que fizeram parte de uma gera-
ção que passou por forte repressão e que influenciou e reforçou, com a temática feminista
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Não é demais lembrar, a essa altura, uma característica da arte contemporânea, que
é o seu internacionalismo. Até o período moderno, os centros produtores de arte eram
facilmente isoláveis: Paris, durante as Vanguardas Históricas, e Nova York, após a Se-
gunda Guerra Mundial. Nos dias atuais (e a tecnologia colabora com isso, certamente),
produz-se arte contemporânea, em tese, em qualquer lugar do globo.
Artistas brasileiras têm, assim, também um apelo internacional. São muitos os exem-
plos. Um deles é Mira Schendel e sua série Droguinhas.
Veja mais imagens de Droguinhas, de Mira Schendel, no site do Museu de Arte Moderna de
Nova York (MoMa), disponível em: https://mo.ma/3yUOj2P
Assista, ainda, ao vídeo da Fundação Serralves, do Porto, em Portugal, por ocasião da ex-
posição de Mira Schendel por lá em 2014. Disponível em: https://youtu.be/CefVFj6VGW0
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Figura 7 – A Negra, de Carmela Gross, 1997
Fonte: Divulgação
Cabe ressaltar que o movimento feminista teve ampla abordagem de ordem social,
política e cultural, sendo permanentemente readequado à sua época e região, incor-
porando novas discussões. Contudo, o enfoque dessa abordagem no universo da arte
brasileira não se trata de uma luta direta e competitiva de igualdades entre homens e
mulheres, está no questionamento da sexualidade, do feminino e de gênero, na inser-
ção das mulheres artistas no âmbito do mercado de arte, quase sempre preconceituoso
(quando a arte e as suas relações, ainda que mercadológicas, não deveriam ser). De certo
modo, essas iniciativas feministas não tinham como propósito um teor estético, mas sim
a busca pelo diálogo e o posicionamento da mulher com a sociedade na arte, bem como
sua liberdade de expressão.
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Michel Foucault é um pensador francês que encarou esse debate. A importância dele
pode ser percebida sobretudo a partir da segunda metade do século XX, quando as obras
do autor ganharam notoriedade por discutir o que até então era “impensável”, temas que
estavam na marginalidade. O autor discute, entre muitos assuntos, a frustração do projeto
moderno, considerando as duas guerras mundiais (1914-1918 e 1939-1945). Essas discus-
sões tornaram Foucault, para muitos, um dos mais importantes pensadores do século XX.
A partir dos anos 1970, sua fama aumenta, e Foucault visita o Brasil algumas vezes.
Escreveu sobre temas como psiquiatria, medicina, sexualidade, família, educação e as
instituições de poder. Em 1984, Michel Foucault vem a falecer, em razão de complica-
ções por ter sido contaminado com o vírus HIV.
No Brasil, esses conceitos e discussões não entram por meio dos movimentos sociais
como nos Estados Unidos, mas pelas universidades.
Para ilustrar um pouco mais essas questões, vamos analisar o trabalho do curador
e historiador Tadeu Chiarelli sobre esses temas que abordam a seguinte questão: onde
colocar o desejo? Sob esse olhar, Chiarelli realiza uma mostra de arte que chamou
de Erótica – Os Sentidos na Arte, em São Paulo (2005), no Centro Cultural Banco
do Brasil, que contou com mais de cem obras de 52 artistas brasileiros e estrangeiros.
A mostra, itinerante, depois de São Paulo foi para o Rio de Janeiro e Brasília.
Chiarelli foi buscar nas experiências dos surrealistas o conceito de beleza convulsiva e
vulgar como apropriação da pornografia. Selecionou as obras não com o tema “Erótica”,
necessariamente, mas sobretudo, escolheu trabalhos que tematizaram o erótico na
maneira de lidar com os materiais, na sua fatura pictórica. Obras de artistas como Newton
Mesquita, Fernanda Preto, Marcelo Krasilcic, Ismael Nery, Rosangela Rennó, Eric Fischl,
Alair Gomes, entre outros, fizeram parte da mostra. Artistas já muito conhecidos do
grande público, como o brasileiro Almeida Junior (1850-1899) e o espanhol Pablo Picasso
(1881-1973), também integraram o recorte da curadoria. O tema do autorretrato também
remete à dupla leitura sexual e artística.
Segundo artigo publicado à época pelo jornal Folha de S.Paulo, foi realizado, ainda
(em duas etapas), um ciclo de conferências denominado “Arte, Cultura e Erotismo”. Essa
é uma prova do quanto a academia e os pesquisadores têm se interessado em discutir
esse e outros temas, que para muitos ainda são considerados tabu (justamente assuntos
que Michel Foucault e outros de sua geração se interessam em discutir/rediscutir). Entre
os participantes da conferência estavam o próprio Tadeu Chiarelli, José Miguel Wisnik,
Ulpiano Bezerra de Menezes, Nicolau Sevcenko, Sérgio Augusto de Andrade e Luiz
Tenório de Oliveira Lima.
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Em entrevista para o jornal o Estado de S. Paulo, em 12 de outubro de 2005, o
curador Tadeu Chiarelli sublinha os seguintes pontos:
[...] “Trata-se de uma exposição de arte; são objetos artísticos vistos como
estéticos por nossa sociedade”, explica o curador Tadeu Chiarelli, mos-
trando assim que resistiu à tentação de abrir outras portas como as da psi-
canálise e antropologia para abordar tema tão complexo. O surrealismo,
escola em que a questão dos impulsos inconscientes e a sexualidade em
particular tiveram papel central, funciona como ponto de partida. Ques-
tões caras aos surrealistas como o automatismo psíquico e a noção de
“beleza convulsiva” – quando a representação é tomada como realidade,
uma imagem funcionando como índice de outra coisa – estão fortemente
presentes. [...] “Muitos que já produziram autorretratos afirmam que são
poucas as relações eróticas tão ou mais intensas do que o autoerotismo
implícito nessa ação: tradicionalmente, o espelho faz a intermediação en-
tre o olho que observa e a mão que representa”, conta Chiarelli. Com 109
obras de diferentes origens, a mostra reúne desde artistas ainda pouco
conhecidos, como o goiano Pitágoras, até estrelas internacionais como
Rodin, Picasso, Picabia e Marquet. (ESTADÃO, 2005)
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Importante!
“Queer”, termo em inglês, que vem sendo apropriado no Brasil de diversas maneiras,
quer dizer algo como objeto, excluído, disruptivo, fora de lugar, fora do eixo, fora da
instituição – logo, fora do museu.
Acredita-se que o movimento feminista tenha aberto as portas para o que chamamos
de movimento Queer. Sem dúvida, a luta pela igualdade de gêneros, tão necessária nos
tempos atuais, deve ter colaborado para que outras questões surgissem no horizonte
dessas discussões. Trata-se de um pensar diferente, que não aceita as convenções sociais
impostas por uma sociedade que diz às pessoas como elas devem agir e, sobretudo,
exercer sua liberdade, inclusive sexual. Assim, a teoria Queer propõe uma forma dife-
rente de olhar o mundo, aberta e não normativa.
O Sesc São Paulo realizou, em 2015, o Primeiro Seminário Queer, realizado com trans-
missão ao vivo pelo portal e posterior disponibilização dos vídeos no YouTube. O evento,
que durou dois dias, teve curadoria do professor Doutor Richard Miskolci, pesquisador da
cultura e subversão das identidades. O evento nasceu de uma ideia da filósofa e jornalista
Daysi Bregantini, diretora da revista Cult. Essa é uma amostra do quanto alguns setores da
sociedade, ao menos, estão preocupados em ouvir as demandas de grupos que ainda hoje
sofrem uma discriminação muito grande, por não aceitarem as convenções que são impos-
tas a eles, o que é de extrema valia, certamente.
Se há dúvida sobre a relevância de um evento como esse, é bom lembrar que as vagas
para o seminário foram todas preenchidas em 45 minutos apenas, ou seja, há desejo,
vontade e necessidade de discutir abertamente o assunto.
Segundo Miskolci (2015), existem várias origens possíveis para o termo Queer, em
diferentes locais. Um fator que deve ser considerado nessa cultura, portanto, é uma
origem global, e não localizada exclusivamente nos Estados Unidos, como o termo em
inglês pode nos fazer acreditar. As iniciativas, portanto, são diversas.
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escreve a obra O que é AIDS, em 1987. Perlongher morre em 1992, justamente em
razões de complicações decorrentes da AIDS.
Os anos 1980 teriam interrompido, segundo Miskolci, a “revolução sexual” dos anos
1960 e 1970. Isso se deu, em grande parte, em razão de governos de direita conservadores,
como os de Margareth Thatcher, na Inglaterra, e Ronald Reagan, nos Estados Unidos.
A homossexualidade é vista como um perigo social por esse pensamento conservador.
É claro que essa pressão criaria resistência, grupos dissidentes que não aceitam as
imposições sobre como devem viver. Alguns acabam se adaptando a essa sociedade,
mas outros querem rediscutir abertamente essas questões, desejam ser ouvidos e ter
suas demandas atendidas. O movimento Queer surge, então, justamente daqueles que
mantêm a ideia de mudança, segundo o professor Miskolci, que faz, na abertura do já
citado seminário, uma pergunta provocativa, que, sem dúvida, merece nossa reflexão:
como as pessoas veriam a sexualidade se pudessem exercê-la livremente?
O professor destaca, ainda, algumas fontes teóricas importantes, como Gilles Deleuze
e Félix Guattari, autores de O anti-Édipo, e Michel Foucault, que, como vimos publicou
A vontade de saber, primeiro volume de sua História da sexualidade. O movimento
Queer não existiria se não fosse a corrente pós-estruturalista francesa, que traz a ideia,
sobretudo em Foucault, da discussão das ideias vigentes, nas mais variadas vertentes.
O movimento também se alimenta da tradição dos Estudos Culturais ingleses, importante
movimento que visa discutir questões complexas; e do marxismo crítico.
No Brasil, mas também em todo o mundo, as ideias de Judith Butler, autora da obra
Problemas de gênero: feminismo e subversão da identidade, acabaram encontrando
um fértil terreno para essas relevantes discussões (MISKOLCI, 2015). Trata-se de uma
das filósofas mais importantes da contemporaneidade e uma das principais teóricas do
movimento Queer. Butler (2015) afirma que o Brasil está “no mapa” da teoria Queer,
pois tem uma grande resistência coletiva às condições adversas encontradas por aqui
pelo público queer. A autora trata em suas produções de uma série de questões, como
a não culpabilização da vítima (e sim do agressor), e apresenta dados terríveis do Brasil
e do mundo que envolvem problemas como o feminicídio, assassinatos de negros e de
pessoas LGBTQ+; racismo, misoginia, homofobia e transfobia.
Para saber mais sobre o artista Alair Gomes e muitos outros que se reuniram em torno da
teoria Queer, consulte o catálogo da BIEN’ART de 2005. O artigo do catálogo refere-se à ex-
posição Erótica, sob a curadoria de Tadeu Chiarelli. Disponível em: https://bit.ly/3xYWqdj
É claro que as artes plásticas, como forma de expressão, e em muitos casos de enga-
jamento político, refletiria e traria luz a essas questões. No Brasil, a chamada Queer Art
encontra seu lugar a partir dos anos 1990 e justamente aborda também por aqui estéti-
cas e temas voltados para a sexualidade. A estética dispõe de múltiplas linguagens, que
problematizam identidade sexual, gênero, objeto, estranhamento, diversidades. Segundo
a autora Rosa María Blanca:
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Muitas das obras nesse gênero podem ser visitadas no Museu da Diversidade Sexual do
Estado de São Paulo, inaugurado em 2002. Esse foi o primeiro equipamento do governo
a reunir obras de artistas renomados e como espaço de convivência, educação e cultura.
Artistas como Darcy Penteado e Madalena Schwartz (2013) são alguns exemplos.
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underground paulistanos, incluindo as bandas Secos e Molhados e Dzi Croquettes, pelas
quais a artista se apaixonou. Esses registros referem-se a uma série de 34 fotos tiradas
ainda nos anos 1970, como retrato da transgressão e diversidades vividas em um período
de plena ditadura militar. O Instituto Moreira Salles abriga 16.000 trabalhos da artista.
Veja mais sobre a artista Madalena Schwartz e sua biografia no site do Instituto Moreira
Salles. Disponível em: https://bit.ly/3yUH8aN
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Outro dos nomes deste gênero Queer foi o já citado Alair Gomes (Valença (RJ),
1921-Rio de Janeiro (RJ), 1992). Seus trabalhos fotográficos exploram, em suas diversas
fases como artista, o voyeurismo e a sexualidade, na maioria masculina, sendo consi-
derado o precursor no viés homoerótico, ou seja, em uma narrativa de imagens ligadas
ao homossexualismo. A produção de Gomes foi se adequando com o tempo devido às
críticas que sofria e ao contexto social. O artista compõe um acervo de mais de 150 mil
registros que realizou a partir janela de seu apartamento no Rio de Janeiro, na praia
de Ipanema. A grande maioria dos fotografados eram esportistas do surfe, canoagem,
natação e futebol, que por ali transitavam diariamente.
Como complementação de seus Diários Eróticos (1966 a 1977), Alair realiza uma
das suas séries de fotografias mais ousadas, a Symphony of Erotic Icons, com mais de
1.700 nus masculinos agrupados em cinco seções: Allegro, Andatino, Andante, Adágio
e Finale. Em artigo publicado na revista Gênero, o pesquisador Wilton Garcia comenta:
O artista Alair Gomes tem uma extensa série de trabalhos fotográficos, e, para melhor ilustrar
sua obra, sugerimos que acessem o site da enciclopédia do Itaucultural.
Disponível: https://bit.ly/37O72Bp
Para este primeiro momento, refletimos sobre algumas questões emblemáticas das
práticas artísticas que operaram na produção de subjetividades, impulsionadas por movi-
mentos de militância histórica em defesa de novos argumentos identitários, sociocultu-
rais e políticos. Sobretudo uma linguagem de arte deslocada do fluxo comum de repre-
sentação aliada ao reconhecimento de temas que abordam a diversidade, o feminismo e
as questões da sexualidade propriamente dita.
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De certa forma, alguns dos artistas aqui apresentados buscaram ressignificar na repre-
sentatividade de suas obras, mesmo que embrionária, uma ordem diferente de posicio-
namento estético e social. Entre elas, as produções artísticas que se apropriam do “nu”
passam a ter uma contestação complexa e requerem um cuidado maior de elaboração e
linguagem. Os artistas são aqui representados como ilustradores de ideias ou ideais que
muitas vezes nos fazem refletir, seja por questões sociais, seja por questões culturais.
Assim, de alguma forma, abriram caminho para uma nova ordem de valores e ressigni-
ficação para os códigos de identidades humanas.
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Material Complementar
Indicações para saber mais sobre os assuntos abordados nesta Unidade:
Livros
História da sexualidade I – A vontade de saber
FOUCAULT, M. História da sexualidade I – A vontade de saber. Trad. Maria Thereza da
Costa Albuquerque; J. A. Guilhon Albuquerque. Rio de Janeiro: Graal, 1988.
Leitura
O feminismo no Brasil: reflexões teóricas e perspectivas
https://bit.ly/2Uo3xOO
Breve história afetiva de uma teoria deslocada
https://bit.ly/3iVnpCE
Dramatização dos corpos: arte contemporânea de mulheres no Brasil e Argentina
https://bit.ly/2XznBiC
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Referências
BLANCA, R. M. Exposição Queer, contextos mundiais e locais. Cadernos de Gênero
e Diversidade, Salvador, v. 3, n. 3, set., 2017. Disponível em: <https://periodicos.ufba.
br/index.php/cadgendiv/article/view/23653>. Acesso em: 20/07/2018.
BUENO, A. O Brasil do século XIX na Coleção Fadel. Rio de Janeiro: Instituto Cultural
Sérgio Fadel, 2004.
CENTRO CULTURAL BANCO DO BRASIL. Erótica: os sentidos da arte. São Paulo: As-
sociação de Amigos do CCBB, 2005. Catálogo de exposição. Curadoria de Tadeu Chiarelli.
I SEMINÁRIO QUEER. J. B. e a Teoria Queer. Com Judith Butler. Disponível em: <ht-
tps://www.youtube.com/watch?v=TyIAeedhKgc>. Acesso em: 20/01/2021.
I SEMINÁRIO QUEER. O que é Queer? Com Richard Miskolci. Disponível em: <https://
www.youtube.com/watch?v=ar19rH0H6lM>. Acesso em: 20/01/2021.
LIPPARD, L. The pink glass swan. Select essays on feminist art. U.S.A. WW Norton,
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SILVA, D. N.; SOUSA, R. G. Feminismo no Brasil. Brasil Escola. Disponível em: <ht-
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