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Universidade Federal Do Rio Grande Do Sul
Universidade Federal Do Rio Grande Do Sul
Universidade Federal Do Rio Grande Do Sul
FACULDADE DE EDUCAÇÃO
FUNDAMENTOS PSICOSSOCIAIS DA
FORMAÇÃO DE EDUCADORES DO CAMPO
Porto Alegre
2007
Eliete Ávila Wolff
FUNDAMENTOS PSICOSSOCIAIS DA
FORMAÇÃO DE EDUCADORES DO CAMPO
Porto Alegre
2007
W857
CDD: 370.71
Catalogação: Iraci Borszcz – CRB 14/372
AGRADECIMENTOS
Aos meus professores, cujo projeto de vida se eleva sobre o cotidiano e sobre o
senso comum, em busca de um mundo melhor para a humanidade.
À Carmem Machado, que nos acompanhou nos primeiros anos de doutorado, nos
primeiros contatos com o Instituto de Educação Josué de Castro – IEJC, Veranópolis/RS,
e nos primeiros passos desta pesquisa. Por estar na luta por uma universidade
comprometida. Por ousar ser uma educadora séria e de compromisso.
À Regina Tcheli, Vera Corazza, Júlia Petri, Minazi, Fátima com quem tive
momentos de debates verdadeiramente enriquecedores e apaixonados, sobre o
materialismo dialético e sobre o marxismo que jamais esquecerei. Foi um privilégio,
como estudante da pósgraduação compartilhar de debates tão profundos.
À Nair Casagrande, Naná, quem admiro por sua determinação e força. Por
estarmos juntas. Por seu companheirismo, por compartilharmos sonhos, idéias, formas de
entender a vida. Por estar ao meu lado em momentos difíceis, por abrirme caminhos, em
minha aproximação ao IEJC, por sua fé na vida e seu compromisso.
Á Carmem Andaló, por sua leitura do projeto, suas excelentes correções, por ter
me apontado importantes caminhos.
Ao professor Alceu, que junto com Marlene Ribeiro, Carmem Machado, Paulo
Tumolo e Célia Vendramini apoiaram e nos ajudaram a realizar um curso intensivo de
formação em marxismo, que se tornou um marco para nós.
À Andréa Zanella, por sua leitura da parte metodológica de meu trabalho e suas
importantes contribuições.
À Lílian. Pelo carinho e interesse com que se dedicou em cada etapa destes
últimos anos de minha vida. Tenho aprendido com seu compromisso político e com a
seriedade com que conduz seu trabalho. Foi um apoio generoso.
Aos irmãos e irmãs e suas famílias. Obrigado pelo carinho e apoio. Por estarem
sempre disponíveis para mim e minha filha.
Aos meus pais (Ruy Wolff e Áurea Wolff), que tem sido uma fonte de exemplos.
Eles nunca desistiram. Renovam todos os dias a vida e lutam por seus ideais de forma
radical. Agradeço pela perseverança, por estarem sempre dispostos a oferecer condições
para meu trabalho. Por suportarem minhas angústias, dúvidas, e os silêncios que esta
tarefa impõe. Por seu apoio incondicional, o amor e força.
À minha filha Júlia, fonte imensa de vida, que mesmo em sua meninice soube
compreender minhas ausências, com generosidade, saúde e alegria. Ao seu pai, Nildo
Ouriques, que me deu apoio incondicional. Pelas leituras cuidadosas e profundas. Pelas
contribuições teóricas e de caráter político, livros, materiais. Pelo exemplo de
compromisso político e por ter gerado comigo este projeto, compartilhado sonhos,
angústias e por ser um generoso e amado pai.
RESUMO
The research presented here contains a study carried out on a training course for
educators, promoted by the Technical Institute of Qualification and Agrarian Reform
Research ITERRA in accordance with UERGS – The State University of Rio Grande
Do Sul. This study specifically approached the first group on the course of Rural
Pedagogy that took place between 2002 and 2005, in the Educational Institute Joshua de
Castro IEJC, situated in Veranópolis, Rio Grande Do Sul State. The research was
concerned with the psychosocial fundaments of the educators’ training. We tried to
identify the ways in which psychology appears during the course and the psychosocial
pedagogical fundaments proposed by the Movement. In addition we could observe, to
what degree the socialhistoric theory of psychology, based on Vygotski, Luria and
Leontiev, contribute to the framework of the rural educators’ training course. In such a
way, we analyzed the theoretical matrices of the MST Pedagogy and its present
psychological theories. We carried out a study establishing the relation between the
conceptual proposals for the Pedagogy of the Movement and their own conceptions of
culturalhistoric socialhistoric theories. We approached the categories in terms of
relation, searching to perceive them in movement, in the interviews, documents and what
the educators produced. They are: collective individual/; activity/language;
learning/development. We found that the culturalhistoric psychology is still approached
in a limited manner, in the materials that the Movement utilizes and also in the curricular
productions. However, in the Pedagogical Method and many of the contents present in
the course, we found epistemological fundaments similar to the culturalhistoric theory,
approximating the author’s present research to the pedagogical proposal in question.
Key Words: Teacher Training, Vygotski, collective, activity, migration, Rural Social
Movements, culturalhistoric psychology
1
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO.........................................................................................................
.3
CAPÍTULO I
INTRODUÇÃO
1
Educador/a é o termo utilizado pelo movimento, por ser mais abrangente que o termo professor,
destinado à educação escolar. O Movimento trabalha com a educação popular e formação de quadro.
4
Em nossa tese, perguntamos se haveria uma psicologia própria para ser adotada
por uma proposta de educação que se assume a tarefa de ser transformadora. Nós
consideramos que sim. Há uma psicologia cujos fundamentos se sustentam na crítica ao
mundo capitalista; esta é a psicologia baseada no materialismo histórico e dialético. Por
outro lado, estão as psicologias que, pelo contrário, ocultam as contradições sociais
essenciais, pois suas propostas teóricas dificultam a compreensão das razões do
sofrimento e limitam as ações de superação e, ao mesmo tempo, reduzem a constituição
do ser humano aos processos e mecanismos de adaptação ao ambiente e à realidade social
vista como dada.
Em termos formais, a tese inicial deste trabalho poderia ser formulada da seguinte
maneira: Os fundamentos psicossociais presentes nos Movimentos Sociais do Campo,
especialmente em sua proposta pedagógica, concretizada na formação dos educadores
do campo, apresentam caracteres que não coincidem teoricamente, de forma precisa com
a proposta do MST. Tal suposição serviu de referência para avaliar a experiência em
questão. Encontrei nela avanços significativos e entusiasmantes. O método e sua relação
com a formação configuram elementos inovadores e de grande importância para a escola
pública. No entanto, apontamos também para as contradições presentes neste processo,
que, em alguns momentos, incorporou de forma pouco crítica, concepções da psicologia
individualista.
5
Para desenvolver esta pesquisa foi necessário entrar em contato com o Instituto
Técnico de Capacitação e Pesquisa da Reforma Agrária – ITERRA. Minha relação com o
ITERRA iniciou em maio de 20032. Até abril de 2005 ocorreram mais quatro visitas que
2
28 de Julho de 03. Conversa na sala de reuniões do ITERRA, no Seminário São José doado pelos freis
capuchinhos. No dia 28/07/03, com alunos da Profª Carmen e meus orientandos: Leni, Eliete, Nair. O
grupo constituíase de 12 pessoas. Chegamos às 9:00 horas e saímos às 14:30 horas do ITERRA. A
educadora designada para nos atender chamase Matilde. E é ela quem começa a nos explicar o
funcionamento dos cursos. Outubro de 2003. Entrevistada: Isabela Camini. Coordenadora do curso de
Magistério de nível médio, do ITERRA e Assessora na Formação de educadores no Setor de Educação do
MST. Entrevistadoras: Doutorandas: Silvana Gritti, Nair Casagrande, Eliete Ávila Wolff e a mestranda
Leni Hack.. A partir do encontro ocorrido no curso de PósGraduação da Faculdade de Educação com
Isabela Camini, onde cursávamos disciplina Clássicos Brasileiros, com a professora Doutora Carmem
6
Machado, foi que propusemos a entrevista. Fizemos uma reunião na casa de uma das colegas – Silvana
Gritti – para realizarmos uma primeira conversa informal com Isabela.
3
. Daiane Fiorini (MAB, Mariano Moro/RS), com a monografia “Metodologias e práticas educacionais
em uma escola no campo” e Janes Carra. (MMC/RS) com a monografia “Dificuldade de Aprendizagem e
gênero”, ambas defendidas em novembro de 2006, no ITERRA. As orientandas Marlene Ana Schmitt
(MMC/RS); Neusa Rodrigues Galvão (MST/GO) tiveram que se afastar.
7
4
Movimento internacional que, no Brasil, congrega o Movimento dos Pequenos Agricultores – MPA; o
Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra – MST; o Movimento dos Atingidos por Barragens –
MAB; o Movimento das Mulheres Camponesas – MMC; a Pastoral da Juventude Rural – PJR; a
Comissão Pastoral da Terra – C PT e a Federação dos Estudantes de Agronomia do Brasil – FEAB.
8
CAPÍTULO I
O que ainda hoje persiste no campo é resultado de um século de descaso com sua
população e de ações deliberadas para a manutenção ordem social. Como exemplo do
descaso, está o fato de que para educadores/as que trabalham no campo ainda hoje restam
os piores salários, para as crianças as piores escolas. A história da educação do campo,
suas melhorias, avanços e retrocesso, são conseqüência e acompanham a história da
estruturação e distribuição de terras. Neste capítulo trato de aspectos históricos do
desenvolvimento capitalista, das migrações e do surgimento dos Movimentos Sociais do
Campo que hoje trabalham por uma proposta para a educação do campo.
10
Não é objeto deste estudo a análise sobre o caráter migrante destes Movimentos,
porém, vale destacar que migração e classe social estão relacionadas e determinam a
constituição humana de seus integrantes, pois, por motivos econômicos ou mesmo pela
violência, as classes populares estão obrigados a migrar de suas regiões de origem. A
migração afeta integralmente o ser humano que a sofre; porém, provoca também
modificações no ambiente, nas relações de trabalho e humanas do lugar, busca instalarse
para reconstituir sua vida.
5
Para Castel (1998, p. 473), o migrante está situado no chamado “bloco periférico”. O bloco “popular”
estaria para ele “formado por operários e por empregados que ocupam um lugar subordinado na
configuração salarial”. É uma aproximação, sem dúvida, colocar no mesmo “bloco” operários e
empregados. Entretanto, na década de 1960, assistese à “transformaç ão de uma classe operária extensa e
renovada, incorporando cada vez mais empregados”. Neste sentido, na medida em que o MST organiza os
trabalhadores do “bloco periférico”, parece, de acordo com o pensamento de Castel, não ser possível
trabalhar com o conceito de classe.
6
Termo utilizado por Mészáros (2001).
11
7
Marx (1980) Cap. XXXVIII sobre a Renda Fundiária.
8
Marx critica a Hegel em sua concepção sobre o direito à propriedade privada (1980, p. 706): “Nada
mais cômico que a argumentação de Hegel sobre a propriedade privada. O homem como pessoa deve
transformar em realidade sua vontade, a alma da natureza externa, e por isso deve se apossar dessa
natureza como sua propriedade privada. Se essa é a destinação “da pessoa”, do homem como pessoa,
concluirseia daí que todo ser humano tem de ser proprietário de terra, para se realizar como pessoa. A
livre propriedade da terra, produto dos tempos modernos, não é, segundo Hegel, determinada relação
social, mas relação entre o homem como pessoa e a “naturez a”, “direito absoluto que tem o ser humano
de apropriarse de todas as coisas” (Hegel, Philosophie des Rechts, 1840, p.79). “Antes de tudo está claro
que o indivíduo não pode se proclamar proprietário por sua “vontade”, contra a vontade alheia que
também queira se corporificar no mesmo pedaço do planeta”.
9
Os cercamentos de terra aconteceram para expulsar os camponeses e “eram chamados, de forma
adequada, de revolução dos ricos contra os pobres. Os senhores e os nobres estavam perturbando a ordem
social, destruindo as leis e os costumes tradicionais, às vezes pela violência, às vezes por pressão e
intimidação. Eles literalmente roubavam o pobre na sua parcela de terras comuns [...].” Polanyi (2000, p.
53).
10
Somente sob Henrique VIII, 72 mil “pobres” foram exterminados (MARX, 1984).
12
11
Marx (1984), V. 1, Tomo 2, Cap XXIV, A chamada acumulação primitiva, pp. 829882.
12
Como demonstra o Censo do IBGE de 2000.
13
Como foi assinalado anteriormente, o migrante não sai de sua terra a não ser devido à necessidade de
sobrevivência. Por esta razão toda migração é de alguma forma forçada.
14
Castel (1998, p. 453), demonstra que os migrantes foram chamados para o trabalho urbano, na França,
sobretudo a partir de 1968, quando desapareceram, do campo, mais de 375.000 trabalhadores agrícolas.
15
O conceito de trabalho produtivo não encerra de modo algum apenas uma relação entre a atividade e
efeito útil, entre trabalhador e produto do trabalho, mas também uma relação de produção
especificamente social, formada historicamente, a qual marca o trabalhador como meio direto de
valorização do capital. Ser trabalhador produtivo não é, portanto, sorte, mas azar (MARX, 1984, p.106).
16
Castel (1998 p.472), em seu estudo sobre a sociedade salarial traz importantes contribuições para a
compreensão das transformações ocorridas no mundo do trabalho em várias épocas do desenvolvimento
do capitalismo, e, em particular nas últimas décadas. Castel (Idem, p.4756) situa os migrantes no “bloco
periférico ou residual”, pois dentro da sociedade salarial não constitui um grupo com salário mensal,
quando encontram trabalho.
13
viriam a substituir os escravos (Ibidem, p. 72). Estes migrantes, do início do século XX,
impedidos de cultivar suas próprias terras, ficavam limitados à condição de peões das
fazendas de café.
Para Oliveira (2001), este processo marcou, no Brasil, a identidade entre o capitalista
urbano e o grande proprietário de terras ou latifundiário. Ao contrário do que ocorreu em
outros países, os proprietários de terra não se tornaram um problema para o desenvolvimento
capitalista, mas sua principal fonte de renda. Desde a colonização, os grandes capitalistas são
também donos de grandes propriedades rurais.
No Brasil, esta aliança fez com que, ao invés de a burguesia atuar no sentido
de remover o entrave (a irracionalidade) que a propriedade privada da terra
traz ao desenvolvimento do capitalismo, atuasse no sentido de solidificar,
ainda mais, a propriedade privada da terra. Foi em decorrência desta mesma
aliança que, na Assembléia Constituinte de 1988, o único capítulo da
Constituição a ter recebido praticamente a unanimidade dos votos dos
representantes dessas elites, foi aquele sobre a Reforma Agrária. Ressaltese
que tal comportamento não ocorreu com relação a outros capítulos da
Constituição brasileira. Dessa forma, a concentração da propriedade privada
da terra no Brasil não pode ser compreendida como uma excrescência à
lógica do desenvolvimento capitalista. Ao contrário, ela é parte constitutiva
do capitalismo que aqui se desenvolve (OLIVEIRA, 2001).
No que diz respeito aos trabalhadores, no entanto, Martins (1982, p. 14) alerta
para a particularidade do trabalhador do campo, ou seja, onde os lavradores, os posseiros
e arrendatários, os colonos, os parceiros, os pequenos proprietários atuam de forma
17
Ver também Castel (1998, p. 4556).
14
distinta dos operários, pois sua experiência com a penetração das relações capitalistas é
inversa à dos trabalhadores da cidade. Os trabalhadores no campo são expulsos da terra e,
na cidade, eles são mantidos no trabalho sob forte grau de exploração. O trabalhador da
cidade é explorado, o do campo, expropriado. Segundo o autor, a mercadoria do operário
é a sua força de trabalho, a mercadoria do lavrador é o produto do seu trabalho. É através
do mercado que a mercadoria perde a sua individualidade, que ela se socializa. O
agricultor comparece perante a sociedade, perante o mercado, sozinho, dono das coisas
que produziu, quando muito junto com sua família.
vida. Isso é ilustrado pela pesquisa de uma educadora do MTD18 e educanda da Pedagogia
da Terra, curso oferecido em convênio entre UERGS e ITERRA, a qual afirma que:
Classe, para Thompson, é um conceito que não pode ser compreendido de forma
separada da luta de classes. O autor critica fortemente um conceito de classe estático,
definido dentro de uma totalidade estrutural, e propõe uma leitura contextualizada do
conceito de classe na obra de Marx19. É o movimento de “formação de classe" que revela
sua constituição, sua história, força e projeto.
Marx, em sua obra O Dezoito Brumário de Luiz Bonaparte (1982, p. 403) sobre a
realidade dos camponeses parcelários da França afirma que quando a “si militude de
interesses entre os pequenos camponeses não cria entre eles comunidade alguma, ligação
nacional alguma, nem organização política, nessa exata medida não constituem uma
classe”. E é na medida em que a classe em si se apropria de sua própria condição,
identificando em seu entorno aqueles que compartilham da mesma história e lugar social
que se alcança a formação da classe para si 20.
18
Movimento dos Trabalhadores Desempregados.
19
O conceito de classe althusseriano, cuja raiz histórica se encontra na interpretação stalinista do
marxismo, tem sido alvo de duras críticas, inclusive da esquerda.
20
Esta formulação já aparece em Marx (1989).
16
Fernandes e Molina (2004, p.60) afirmam que, nos últimos 20 anos, a história das
lutas pela terra e pela reforma agrária, “prom oveu mudanças importantes no campo
brasileiro, modificando a paisagem, construindo um jeito próprio de fazer e de pensar este
território”. E que o podemos denominar esta prática de “especialização e territorialização
da luta pela terra”. Ao longo de quase duas décadas, foram realizadas mais de duas mil
ocupações por cerca de 300 mil famílias, hoje assentadas, conquistando 7 milhões de
hectares. Porém, apesar destes dados, não é possível evidenciar um processo inverso ao
da concentração da propriedade rural, pois, segundo Vendramini (2004, p. 154), o Plano
Nacional de Reforma Agrária (PNRA) do governo Lula (20032006) propõe timidamente
o assentamento de 450 mil famílias. Não obstante, milhões de famílias ainda vivem no
campo e em suas proximidades, impondose uma atenção para a questão, caso contrário,
os conflitos no campo não existiriam.
21
Em visita ao Assentamento de Friburgo, no estado de Santa Catarina, membros do MST relataram que
havia um trabalho sendo desenvolvido na cidade para oferecer para os antigos agricultores a opção de
lutar pela terra.
17
22
Kuenzer (2002) identifica, no modelo capitalista atual, estratégias de exclusão do trabalhador do
mercado, associadas às estratégias de inclusão, sob condições cada vez mais precárias. No entanto, é
preciso, para desenvolver qualquer forma de resistência, que o trabalhador, primeiro, tenha sua
sobrevivência garantida. Isto significa uma convivência contraditória com o trabalho capitalista, unida a
uma luta pela superação do mesmo. O campo experimenta uma forma de exclusão educacional, pois não
corresponde aos padrões necessários de qualidade exigidos pelo capitalismo; neste sentido, é preciso
primeiro que a escola vá para o campo, para que em seguida se possa criar experiências de superação.
23
Segundo Caldart (2000, p.24) “ser Sem Terra hoje significa mais, ou não significa o mesmo, do que ser
trabalhador rural ou camponês que não possui terra para cultivar, muito embora não seja possível
entender a identidade Sem Terra sem compreender sua raiz na cultura camponesa e nas questões do
campo. Entre os trabalhadores sem terra há trabalhadores rurais de uma ou até de duas gerações que não
chegaram a ter uma relação mais tipicamente camponesa com a terra e com a produção, afirma a autora.
Os semterra assentados, afirma Caldart (idem, p. 25), por sua vez, podem até ser considerados uma nova
forma de camponês, mas nunca serão os mesmos camponeses de antes. Ser Sem Terra é ser coletivo,
esclarece, pertencente aos Movimentos Sociais do Campo e é simbólico pois representa a resistência e,
por esta razão, se distingue do agricultor familiar. Conforme Caldart (Op. cit., p. 26) o termo Sem Terra,
escrito com as iniciais em letras maiúsculas, representa o sujeito coletivo em movimento, formador de
sujeitos singulares.
18
24
A noção de sustentabilidade, também incorporada pelo MST, nasce da necessidade de combinar
desenvolvimento econômico com uma política de preservação ambiental que garanta a disponibilidade de
recursos por longo tempo. Porém, esta ainda está envolta em um “emaranh ado”, pois contém correntes
distintas e às vezes excludentes. Segundo Neto e Canavasi (2001), uma das noções defende a neutralidade
cultural e de uma natureza universal e desabitada. Outra noção está ligada às formas de agricultura
tradicional. Para o MST, a noção de sustentabilidade incorpora a idéia da agricultura ou produção por
cooperativas. Já Ribeiro (2002) considera que, o "discurso oficial" do desenvolvimento sustentável,
pronunciado pelos capitalistas, é apenas uma carta de intenções que não altera as relações sociais de
produção baseadas na propriedade privada da terra e dos meios de produção e na exploração da força de
trabalho de homens, mulheres e crianças. Define o desenvolvimento sustentável como "satisfação das
necessidades de uma geração sem comprometer a capacidade das gerações futuras para satisfazer suas
próprias necessidades".
25
A última palavra hoje em política agrícola é a valorização do agronegócio e a dependência da
biotecnologia em detrimento da agricultura familiar, do fortalecimento de matrizes e sementes crioulas e
da sobrevivência dos agricultores. Por esta razão, é tão complexa a tarefa dos Movimentos Sociais do
Campo de debaterem e realizarem um projeto de educação do campo, que não seja subserviente ou alheio
à sua população.
26
Vale dizer que uma parte da ocupação atual do campo se refere aos trabalhadores da cidade que não
produzem no campo. Eles “ocupam” a terra para fugir do caos da cidade, o que implica em uma espécie
de urbanização do campo. Monteiro (2006), ao analisar distintas concepções de ecologia, distingue duas
principais, sendo uma delas uma visão ecológica que exclui o ser humano e possui uma concepção de
natureza pura, como já identificamos antes.
19
No entanto, entendo que somente um projeto social popular poderá realizar uma
Reforma Agrária radical. O projeto defendido pelos movimentos sociais populares está
fundamentado em cinco princípios: a soberania, a solidariedade, o desenvolvimento, a
sustentabilidade e a democracia popular (KOLLING et alii, 1999). A busca da
organização representa, segundo Caldart (2000, p. 216), uma forma de reenraizamento. A
ocupação da terra e, atualmente, também da escola, é uma condição para que aconteça a
formação humana. Ela própria deve ser considerada um processo educativo. Caldart
(2000, p. 217) considera o “enraizamento na terra, no lugar, mas, sobretudo, o
enraizamento no grupo” , uma necessidade vital, parte do resgate daquele ser humano que,
ao migrar em busca de terra e trabalho, vai deixando pedaços de si mesmo e de sua
história espalhados pelo país.
Para Adam Smith, economista do século XVIII, (1974, p. 21), a natureza humana
é econômica (homus economicus), pois segundo ele, a troca de mercadorias, o mercado e
o desenvolvimento das relações capitalistas de produção são a demonstração e o resultado
do próprio caráter econômico inerente ao ser humano e às suas relações27. Este autor
procurou demonstrar que a riqueza das nações resultava do trabalho de seres individuais
que, seguindo os seus interesses particulares, promoviam a ordem e o progresso da nação.
Polanyi (2000), por sua vez, recorreu à história e à antropologia demonstrando que,
originalmente, o homem não vivia do mercado, mas de trocas simples. Em sua obra
27
Para este autor a tendência à troca, inerente à natureza humana, leva à divisão do trabalho que
possibilita a formação de diferentes hábitos, diferentes ocupações e, como conseqüência, diferentes
talentos. Em seu livro, A Riqueza das Nações, publicado em 1776, afirma que “se não existisse em cada
homem a tendência para a troca e para a compra, este verseia obrigado a produzir todas as coisas
necessárias e úteis para a sua vida. Todos teriam os mesmos deveres e realizariam o mesmo trabalho;
nessas condições, nunca poderia existir a enorme diferença de ocupações que, por si só, dá origem à
diversidade das aptidões.”(SMITH, 1974, p.21).
20
descreve toda a resistência das cidades para não se submeter à especulação mercantil e,
em sua obra publicada obra em 1944, descreve os processos de expulsão dos camponeses
de suas terras para dar lugar à ordem e às relações sociais capitalistas.
1. 4 – Trabalho e educação
Para Gramsci (idem, p. 120), o sentido da escola é tornar o trabalho não somente
menos árduo, mas possibilitar ao trabalhador a socialização do conhecimento e o domínio
das possibilidades libertadoras do trabalho. O princípio educativo supõe o
desenvolvimento da ciência e a socialização do conhecimento para este fim. O papel
democratizador da escola, de socialização do conhecimento, não pode servir apenas para
qualificar o trabalhador de forma técnica e instrumental, mas sim para que, “cada
‘cidadão’ possa se tornar ‘g overnante’ e que a sociedade o coloque, ainda que
‘abs tratamente’, nas condições gerais de poder fazêlo” (Ibdem, p.120). Fonte de riqueza
28
Artigo elaborado para fundamentar a palestra Educação e Movimentos Sociais, proferida em
07/11/2001, durante o Seminário Regional A educação pública no mundo globalizado, organizado pela
28ª Coordenadoria Regional de Educação da SEC/RS.
22
material e espiritual, então a riqueza espiritual depende da riqueza das relações sociais
reais, afirmam Marx e Engels em A Ideologia Alemã (1985, p. 39).
29
Kuenzer (2002) se apóia no conceito de princípio educativo de Gramsci e mostra que o regime de
acumulação flexível, ao aprofundar as diferenças de classe, aprofunda também a dualidade estrutural da
educação como expressão da polarização das competências.
30
Ver Capítulo II.
31
A Escola funciona em regime de alternância que será explicado adiante, com três turmas por vez, em
períodos de aproximadamente sessenta dias.
23
urbano, como vem sendo feito até hoje e pois, mesmo nas cidades, os empregos
assalariados estão bastante escassos.
Assim também hão de ser as políticas educacionais direcionadas aos filhos dos
agricultores. Se para os trabalhadores urbanos a educação transformouse em preparação
para uma mera adaptação aos processos produtivos, de comércio e de serviços, para os
trabalhadores rurais a educação quase não foi pensada. Quando o foi, encobria os
objetivos de formação de uma força de trabalho para as fábricas ou de implantação de
uma agricultura mecanizada, como nos revela o trabalho de Gritti (2003).
Neste sentido,
32
A autora realizou seu estudo no Estado de Santa Catarina, e aí encontra algumas especificidades,
porém, ela assinala que as tendências observadas em seu estudo se assemelham às das demais regiões do
país.
24
fugir ao controle do capital. Impõese uma contradição entre a luta pela sobrevivência na
terra conquistada e a continuidade do Movimento, através de propostas coletivistas e
cooperativistas de trabalho que, como afirma Mohr (2006, p. 37), pressupõem a superação
do trabalho individual/familiar, e da produção agroecológica como contraposição ao
modelo convencional de agricultura33.
Para Caldart, a escola está sendo “ocupada” pelo MST. Em seu segundo livro,
Pedagogia do Movimento Sem Terra (2000, p. 145), a autora descreve o compromisso e a
luta realizada por assentados e acampados para garantir seu direito à educação. A
educação na escola, aos poucos, tem produzido uma cultura escolarizada no Movimento.
Nas últimas décadas, os movimentos sociais populares têm aumentado sua influência no
debate sobre a educação do campo, através de experiências que vêm desenvolvendo tanto
na área de educação básica como de educação de nível médio e técnico, além da formação
superior de educadoras/es.
33
Mohr (2006) esclarece que este modelo se caracteriza pelo alto grau de dependência de insumos
externos, como os agrotóxicos, adubos químicos, sementes industrializadas, etc.
25
Outra questão associada à introdução, ainda que precária, das escolas no interior
do país, se deveu à necessidade de impedir o crescimento, em algumas regiões, das
escolas dos imigrantes. Como afirmam Hentz e Herter (2001, p. 90), no período do
“Es tado Novo” (período compreendido entre 1937 e 1945 em que vigorou uma Ditadura
civil), a nacionalização do ensino consistiu na sistemática destruição das iniciativas
educacionais comunitárias, criadas pelos imigrantes, com professores próprios, dedicados
a ensinar a língua e a cultura de origem. Foi estabelecida a obrigatoriedade do ensino da
língua portuguesa como forma de domínio sobre as regiões ocupadas por italianos e
alemães, sobretudo nos estados do sul do Brasil. Neste período, as políticas educacionais
estavam fortemente influenciadas pelo pensamento liberal, representadas na concepção de
Escola Nova, que abordaremos posteriormente. Um período posterior de importância para
as políticas educacionais foi o de 1964 a 1985, quando vigorou a Ditadura militar e o
tecnicismo substituiu a hegemonia da Escola Nova na formação de professores35.
34
Assim como o conceito de migração adquire uma especificidade no contexto do capitalismo, o
conceito de êxodo rural também. Ambos estão ligados à noção de que as populações se movem por
vontade própria. A noção de êxodo, termo usado na bíblia para referirse à busca da terra prometida,
contribui para esta interpretação equivocada destes fenômenos. Defendemos a idéia de que toda migração
e todo êxodo supõe a expulsão do lugar de origem, devido à falta de condições de sobrevivência, como
temos mostrado amplamente neste trabalho.
35
Para Saviani (1987) os professores formavamse pelo ideário da Escola Nova, mas, por falta de
condições aplicavam a pedagogia tradicional; pressionados pelas exigências de “resultados” submetiam
26
39
Na segunda metade do século XX, o projeto capitalista de desenvolvimento rural chamado "revolução
verde" e de desenvolvimento urbanoindustrial de "substituição de importações" significaram, na verdade,
a criação de indústrias, na sua maior parte, dependentes de matérias primas importadas, desenraizadas,
descoladas da nossa produção agrícola; de outro, criavase a necessidade de um mercado de força de
trabalho para as fábricas que aqui se instalavam. Os agricultores eram expulsos da terra pela pressão de
fazendeiros, madeireiras, mineradoras, e pela falta de uma política agrícola de valorização de seus
produtos ou pela falta de acesso às novas tecnologias e maquinário (RIBEIRO, 2004).
40
Entrevista, Isabela Camini, em 10/10/2003
28
41
Segundo dados do IBGE, do Censo Demográfico de 2000, 20,82% da população brasileira de 12 a 18
anos estão no campo. Isto significa que 5.205.438 pessoas nesta faixa etária vivem no meio rural.
Comparando a escolaridade, observamos que os jovens urbanos estão 50% mais escolarizados do que os
que moram no campo. Do total da população brasileira que trabalha na área urbana, 7% tem entre 10 e 14
anos. No campo, 16, 3% dos que trabalham estão na mesma faixa etária.
42
Em 1990 o Brasil participou da Conferência Mundial de Educação para Todos, em Jomtien na
Tailândia, convocada pela Unesco, Unicef, PNUD e Banco Mundial (LDBEN nº 9.394/96)
43
Atualmente, dos 5507 municípios brasileiros, 4089 possuem menos de 20 000 habitantes, ou seja,
74,2% ou 3/4 do total dos municípios brasileiros podem ser considerados como de características rurais
abrigando uma população de 31.845 211 (trinta e um milhões e oitocentos e quarenta e cinco mil e
duzentos e onze) habitantes, correspondendo a 18,77 % da população total. Fonte: IBGE, 2000.
29
44
Houve uma consolidação de uma cultura mercadológica, de dependência dos adubos, das sementes
híbridas, dos venenos que afetou o desenvolvimento de uma agricultura ecológica e da organização entre
os assentados do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST). Ver: Ribeiro (2001a, p. 133 – 162).
30
CAPÍTULO II
A seguir abordarei aspectos históricos que deram origem ao curso que estamos
analisando. Os fundamentos psicossociais, presentes no currículo oficial, não são, ainda,
45
Um dos aspectos que se revelaram fundamentais no curso foi a sistematização da memória de todas as
atividades desenvolvidas, das análises e avaliações sobre o processo de aprendizagem, funcionamento e
desenvolvimento do curso. Os educandos/as do curso de Pedagogia da Terra tiveram que elaborar, além
da Monografia, o Memorial das Aprendizagens do Curso, a Memória da Turma e os Relatórios de
Estágio. Outra atividade realizada a cada início de etapa, era o Seminário da Memória do Tempo Escola
anterior, um resgate das atividades desse período.
32
2. 1 – A Pedagogia da Terra.
46
BENJAMIN (2000).
47
Entrevista, agosto de 2004.
33
48
Cadernos do ITERRA, nº 6, 2002. Este caderno registra as experiências das turmas de Pedagogia da
Terra que foram desenvolvidas em convênio com as seguintes universidades: “Universidade Regional do
Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul – UNIJUÍ, Universidade Federal do Espírito Santo – UFES,
Universidade Estadual do Estado do Mato Grosso – UNEMAT, Universidade Federal do Pará – UFPA e
Universidade Estadual do Rio Grande do Sul – UERGS” Além destes, um novo convênio está sendo
iniciado com a Universidade Federal do Rio Grande do Norte. (ITERRA, 2002b, p. 6).
49
Diante de dificuldades políticas ou burocráticas a opção do Movimento foi sempre exigir o
funcionamento através da mobilização e da ocupação – com acampamentos das universidades
conveniadas.
50
Silvana Gritti, em seu trabalho de Doutorado (Inédito), afirma que, nas escolas agrícolas onde o
currículo responde às expectativas do agronegócio, evidenciase a forte contradição entre teoria e prática.
Esta contradição mostrase na falácia da interdisciplinaridade, que, segundo a autora, corresponde
justamente ao seu oposto no cotidiano escolar, pois se consolida pela falta de condições e de
conhecimento dos educadores/as a própria fragmentação do conhecimento. Desencadeia, diz a autora, um
processo de significativo fortalecimento da histórica divisão entre as disciplinas, pois em uma mesma
matéria, mais de um educador/a pode estar trabalhando. Como exemplo cita a divisão entre o educador/a
que trabalha com a aula teórica e aquele que trabalha com a prática (GRITTI, 2003).
34
51
Benjamin (2000, p. 27) descreve as duas décadas, de 1980 e 1990, como décadas que nada
acrescentaram para a população brasileira. Afirma que “as elites pedem que comemoremos a segunda
década perdida, o crescimento zero em 1999, um desemprego de 20%, um “ajuste fiscal” construído com
o corte dos salários e dos serviços essenciais, uma enxurrada de capital estrangeiro que vem aqui para
ganhar juros de agiota ou comprar um país barato”.
35
52
Texto não publicado, produzido a partir da exposição “A construção da identidade da Educação do
campo”, desenvolvida no Seminário de Educação do Campo, ITERRA, 2000.
36
Isto não quer dizer que o MST tenha inventado uma nova pedagogia, mas ao
tentar produzir uma educação do jeito do Movimento, os sem terra acabaram
criando um novo jeito de lidar com as matrizes pedagógicas ou com as
pedagogias já construídas ao longo da história da humanidade. Em vez de
assumir se “ filiar” a uma delas, o MST tenta pôr todas elas em movimento, e
deixa que a própria situação educativa específica se encarregue de mostrar quais
precisam ser mais enfatizadas, num momento ou no outro.
53
A pedagogia da cooperação deve ser uma pedagogia experimental, ligada ao trabalho cooperado e ao
movimento, “é permitir que a ajuda mútua e a ação cooperada perpassem as atividades da Escola”
(CERIOLI, 2005, p.182).
54
A alternância, anteriormente chamada “pedagogia da alternância”, é entendida hoje, não como uma
pedagogia, mas como um jeito de funcionamento da escola, um “detalhe” (CERIOLI, 2005, p. 181).
Consiste em que um tempo o educando passa, integralmente, na escola e é chamado Tempo Escola; No
outro, ele passa na comunidade, ou seja, Tempo Comunidade. Em ambos os tempos o educando realiza
tarefas escolares. No tempo escola há o tempo para estudo, para trabalho, para lazer, etc. Não tratarei
desta questão porque iria além dos meus objetivos, porém não existe correspondência ou igualdade entre
esta alternância e a alternância, praticada nas Casas Familiares Rurais – CFR, vinculadas à Confederação
dos Trabalhadores da Agricultura e, no Rio Grande do Sul, à Federação dos Trabalhadores da Agricultura
– F ETAG/RS.
55
A proposta que estamos analisando foi formulada pelo MST. Portanto, apesar de que existem
particularidades nas experiências específicas de cada Movimento que compõe a turma estudada, não nos
dedicaremos a elas. Significa que o resultado da formação da Pedagogia da Terra, para cada um destes
movimentos, poderão ser avaliadas em outras pesquisas. Abordaremos, neste estudo, particularmente os
documentos produzidos pelo MST.
37
56
A Via Campesina constituise a partir da primeira Conferência Mundial de Organizações Camponesas
em maio de 1993 (LIMA, 2004).
57
Assentamentos rururbanos são assentamentos do Movimento dos Trabalhadores Desempregados –
MTD, localizados em zona próximas às cidades, com características rurais e urbanas. “ Temos o
entendimento que os assentamentos rururbanos são mais uma alternativa que visa amenizar a situação de
miséria da população brasileira. O MTD sabendo disso vem trazer para a sociedade o debate da reforma
agrária e também da reforma urbana”, (http://www.midiaindependente.org/pt/blue/2004/06/283460.shtml
consultada em 20/out/2006).
38
Como afirma Lima (2004, p. 11), a partir dos cursos de Pedagogia realizados no
ITERRA, em 2002, reunindo vários Movimentos Sociais “ficou mais presente no Instituto
os desafios da construção da Via Campesina”. Significou também o aprofundamento da
consciência dos limites desta conquista, no âmbito da sociedade atual59.
58
Através do PRONERA estão sendo desenvolvidos vários projetos educacionais junto aos Movimentos
Sociais. Este certamente é um fator de unidade entre os Movimentos Sociais.
59
É importante destacar que, durante o governo da Frente Popular cujo governador era do Partido dos
Trabalhadores, no RS, foi possível desenvolver diversos projetos educacionais, ainda que com limitações.
A saída do Governo de esquerda implicou no retrocesso de tais projetos.
39
A UERGS nasce, em 2001, com uma proposta pedagógica crítica, vinculada aos
Movimentos Sociais. Conforme Paludo (s/d), “sua estrutura multicampi e descentralizada
favorece o cumprimento dos propósitos institucionais e a gestão democrática”, com
controle da comunidade universitária, local e regional.
60
Conceição Paludo é coordenadora das turmas conveniadas da Universidade Estadual do Rio Grande do
Sul com os Movimentos Sociais do Campo.
40
61
Entrevista, Conceição Paludo, 20, setembro, 2005).
62
Informações sobre a UERGS poderão ser obtidas no site www.uergs.rs.gov.br/
41
63
Formada por Conceição Paludo e Andréia krug.
64
Segundo Paludo, este grupo estava integrado por Roseli Caldart, representante do Setor de Educação
do MST, Nilda Alves, Andréia Krug e Conceição Paludo.
65
O curso de Desenvolvimento Rural e Gestão, que tinha como foco a participação comunitária, foi
transformado pelo novo governo do Estado em um curso de Administração Rural, na modalidade que
vem sendo oferecido pelas universidades e voltado ao empresariamento do campo. Perdeu, portanto,
grande parte de seu caráter de formação do trabalhador do campo, na perspectiva dos Movimentos
Sociais, e de seu envolvimento com as necessidades dos trabalhadores do campo. No entanto, não houve
iniciativa por parte dos Movimentos Sociais para garantir a UERGS como uma Universidade
comprometida com as camadas populares
42
2.3.2 – O IEJC
66
Esta autonomia relativa se limitou a definição de alguns educadores/as, conhecedores da educação do
campo e da Pedagogia da Terra. (Carmem Castro, entrevista, educadora Iterra,15/09/2005). Com isso o
ITERRA obteve a colaboração de educadores/as como Miguel Arroyo, João Pedro Stédile, Roseli
Caldart, Cecília Luedman, Luiz Carlos de Freitas e outro.
67
Todos os documentos do MST são historicamente situados. Novos documentos apresentam a
superação de contradições, limites e compreensões, que vão sendo incorporadas na prática pedagógica e
no funcionamento do Instituto. (ITERRA, 2004a).
68
A CONCRAB (Confederação das Cooperativas de Reforma Agrária do Brasil Ltda.) é um sistema
cooperativista dos assentados. É a promotora do curso, sendo mediado pelo Instituto Técnico de
Capacitação e Pesquisa ITERRA, que é uma entidade educacional ligada ao MST. O ITERRA foi criado
em 12 de janeiro de 1995, em VeranópolisRS, para ser a mantenedora do Curso Técnico em
Administração em Cooperativas (TAC). São sócios fundadores: a CONCRAB e a ANCA Associação
Nacional de Cooperação Agrícola.
43
Segundo Lima (2004, p. 11) tanto a forma de criação do ITERRA, como do IEJC,
é resultado de uma combinação entre a ocupação da escola com a luta legal pelo seu
reconhecimento. O modelo pedagógico adotado no IEJC corresponde aos interesses de
formação dos Movimentos Sociais do Campo, que se unem para compartilhar e aprimorar
a experiência iniciada pelo MST.
69
Outras informações sobre a criação do IEJC e ITERRA podem ser encontradas na monografia de
LIMA (2004) e em documentos do MST.
70
Segundo Isabela Camini, integrante do Coletivo Nacional de Educação do MST (Entrevista realizada
em 27/04/2004)
44
Trabalhadores Sem Terra – MST. O trabalho externo dos educandos serve apenas, em
parte, para melhorar esta relação71.
Com este cenário introduzi questões gerais relacionadas com esta pesquisa. Para
realizála, descrevo os fundamentos e os procedimentos metodológicos nos quais me
baseio no item que se segue, para posteriormente entrar em aspectos específicos do objeto
de pesquisa.
71
limpando terrenos, capinando, colhendo, entre outros.
72
“O Instituto tem uma Ciranda Infantil que funciona permanentemente e atende crianças de 0 a 4 anos,
filhos e filhas de educandos/as, trabalhadoras/es e educadores/as do Instituto”. (LIMA, 2004, p. 13)
73
A mística é um momento cerimonial, onde se realiza uma pequena encenação, simbolizando uma
mensagem, vivenciada coletivamente, antes das atividades cotidianas. No IEJC a mística acontece todos
os dias pela manhã, a pós o café e a formatura. Adquire maior ou menor profundidade, conforme o
envolvimento e o compromisso do grupo com a proposta pedagógica e política. Para o Movimento a
mística tem o propósito educativo. É, como afirmam “a alma do sujeito coletivo Sem Terra que se revela
como uma paixão contagiante, que nos ajuda a ‘sacudir a poeira e dar a volta por cima’, que nos coloca
no caminho de aprender a estabelecer objetivos a serem alcançados, aprender a formular métodos para
transformar a realidade e a empenharse na tarefa de realizar os rumos traçados. A mística é a alma da
identidade Sem Terra. (Caderno de Educação n. 9 – nov/1999, p 23).
74
“A estrutura foi sendo reformada e, de certo modo, reconstruída. São 104 cômodos [...]” (LIMA, 2004,
p. 12).
45
2. 4 – Abordagem Metodológica
Constitui um grave erro pensar que a ciência somente pode estudar o que nos
brinda a experiência direta. Como estuda o psicólogo o inconsciente, como
investiga o historiador e o geólogo o passado, o físicoótico os raios
invisíveis, o filólogo as línguas clássicas? Os estudos baseados na análise de
marcas de influências em métodos de interpretação e reconstrução, na crítica
da indagação do significado têm sido tão úteis como os baseados no método
da observação ‘empírica’ direta (Ibidem, p. 310).
75
Tradução minha, doravante abreviada por T.M.
48
Sendo difícil precisar as linhas que separam as etapas, Lüdke e André (1986,
p.23), ao se referirem a um estudo de caso, alertam que estas se superpõem em diversos
momentos. Segundo estas autoras a revisão dos caminhos percorridos, dos elementos
encontrados, permite um melhor aproveitamento do trabalho de campo. O próprio campo
nos colocou novas problemáticas. Não é possível fazer, sem variações, as aproximações
que pensávamos inicialmente, pois depende dos espaços, interlocutores, tempos e
condições do pesquisador e do campo de estudo.
76
Os grifos foram dados por mim.
77
Devido à minha aproximação gradativa ao IEJC, foi possível estabelecer uma contribuição como
orientadora da Turma II do curso de Pedagogia.
49
conversar também com os coordenadores do curso e solicitar seu apoio para realizar a
pesquisa naquele local. Obtive entrevistas iniciais com alguns dos educadores e
educandos78, além de leituras de documentos relacionados com a Pedagogia da Terra,
registros da experiência de 20 anos do MST.
78
Entrevistas com a educadora I. C., e as educandas S e M.P (Educanda da Turma II). Inicialmente nossa
pesquisa seria com este grupo e posteriormente, devido a questões de tempo, houve uma mudança para a
Turma I, que terminaria o curso no ano de 2005, facilitando acesso ao material produzido na escola), M.
(Educanda da Turma I )
79
A unificação do objeto de estudo com a orientação da pesquisa causou, desde o início, uma certa
confusão. O que deveria fazer quando pesquisa e orientação da Turma II se misturassem? Este problema
somente foi superado no ano de 2005, em abril. Decidimos pela substituição da Turma II pela Turma I. A
partir de então, separados o objeto de estudo do objeto de trabalho, muitas dificuldades se diluíram e o
trabalho de pesquisa tomou outro rumo.
50
80
Os roteiros de entrevistas estão em ANEXO I.
81
Roseli Caldart; Carmem Castro; Edgar Kolling; Conceição Paludo.
51
4) o funcionamento da escola.
As entrevistas tiveram a duração de mais ou menos uma hora cada uma, com a
possibilidade de que os entrevistados pudessem ser novamente solicitados, com o objetivo
de esclarecer ou aprofundar algum tema. Aquelas realizadas com os educandos/as da
turma aconteceram, na maioria, no período do Tempo Escola, no IEJC, (entre 18 de
52
82
O currículo inclui, além dos conteúdos, uma experiência de gestão, que envolve as turmas no
funcionamento e gerenciamento do trabalho. O trabalho pedagógico ocorre dentro e fora da sala da aula,
ampliando do currículo.
53
uma escola diferente não basta trocarmos os conteúdos das disciplinas e alterarmos a
metodologia da sala de aula. O jeito de organizar a escola e as relações sociais que este
jeito gera são tão importantes como o conteúdo e a didática”.
O currículo, para nós, é uma prática que se expressa nas funções que cada um
desempenha de forma socializada e, mediante a qual o grupo assegura a
gestão, a aquisição de experiências, os conhecimentos, social e
historicamente acumulados e culturalmente organizados no coletivo da
Escola. O currículo, apresentado desta forma, é uma prática social e
83
O Caderno do ITERRA Nº 3 está dedicado ao MST e a Pesquisa (outubro, 2001). Ali se encontram
orientações, necessidades do Movimento, quanto aos temas de pesquisa, e aos fundamentos
metodológicos assim como graus de profundidade esperados nos trabalhos realizados por pesquisadores
do Movimento ou comprometidos com o Movimento, em nível de graduação, mestrado ou doutorado. No
Caderno Nº 4, MST Levantamento Bibliográfico (março, 2002), estão relacionados os trabalhos de
pesquisa realizados até o ano 2002, nestes três níveis, no Brasil. Também nos Cadernos do ITERRA
numero 1, encontramos a Memória Cronológica do Instituto de Educação Josué de Castro.
54
O método utilizado no IEJC, por sua vez, ocupa a quase totalidade do Tempo
Escola e grande parte do Tempo Comunidade. Como afirma Cheptulin (1982, p. 268),
toda forma está organicamente ligada ao conteúdo, portanto, dependem um do outro. “O
papel determinante nas relações – afirma o autor – conteúdo/forma é desempenhado pelo
conteúdo; ele determina a forma e suas mudanças acarretam mudanças correspondentes
da forma. Por sua vez, a forma reage sobre o conteúdo, contribui para seu
desenvolvimento ou o refreia”. Um dos aspectos relevantes do fazer pedagógico, segundo
Oliveira (1992), é a relação conteúdoforma deste fazer. Na análise desta autora
(OLIVEIRA 1992, p. 1416), a ausência de conteúdo em um processo educativo, que
privilegia o método, gera dificuldades no processo de aprendizagem. O método,
cuidadosamente constituído, repensado e aprimorado, pelos educandos/as e educadores/as
do ITERRA, adquire sentido através das reflexões que proporcionam sua apropriação86, o
que provoca a transformação e o desenvolvimento humano e aprendizagens, necessárias
para o Movimento:
84
Em alguns casos, o projeto do curso de Pedagogia da Terra passou a demandar disciplinas tais como
“sociologia rural, economia agrícola rural, comunicação social, alfabetização de jovens e adultos,
educação infantil” (ITERRA, 2002b, p.16).
85
A avaliação une os critérios da UERGS, com o Método do IEJC. Para a UERGS a avaliação se dá no
âmbito das disciplinas/conteúdos e o IEJC avalia vários aspectos da formação humana, sendo a vivência
social, as relações estabelecidas dentro do Instituto e o desempenho na gestão e no trabalho de
funcionamento da escola (MEMÓRIA DA TURMA, 2005).
86
Conforme Duarte a produção humana (objetivação), transforma o mundo e o ser biológico em ser
humano (apropriação) (1993, p. 8). O Educador/a dispõe de instrumentos forjados social e culturalmente
– mediações que possibilitam a relação com o educando/a. O educando não está isolado, é o indivíduo
concreto, determinado por suas relações sociais, afirma Saviani (1991, p. 8586). O educador/a cumpre
um papel fundamental – de mediação – ao possibilitar ao educando/a o acesso ao conhecimento
produzido socialmente
55
Hoje, eu até poderia afirmar, que o ITERRA é onde a gente experimentou que
é possível essa combinação da escolarização com a capacitação técnica, com
a formação políticoideológica e que agora não é uma atribuição do setor de
formação apenas, a formação política. Mesmo que isso seja mais a
responsabilidade do MST. Assim como não é só responsabilidade do setor de
educação dar continuidade na escolarização porque, o setor de saúde ta
fazendo, o setor de produção ta fazendo, agora a formação começou também a
fazer cursos formais. É por isso que nós estamos hoje, em setembro de 2005,
com em torno de 3000 jovens e adultos em processo de formação escolar, no
nível médio, técnico e profissional, e no nível superior[...]. É verdade que o
PRONERA, o Programa Nacional de Educação da Reforma Agrária,
conquistado em 98, move recursos que permitiu alavancar essa formação mais
do nível médio e superior (Entrevista Educador/a K, 20/9/2005).
87
Gritti (2003) mostra como na concepção oficial de educação a ênfase técnicoinstrumental na
Educação Profissional oferecida para os técnicos agrícolas esvazia a compreensão e a formação político
filosófica e humana dos currículos. Há uma noção de que apenas conteúdos ligados à formação para o
trabalho técnicoagrícola são os que preenchem as necessidades de formação do povo do campo. Nesta
noção está embutida uma compreensão de formação e de agricultura que não estão direcionadas aos
agricultores e agricultoras que vivem do trabalho da terra.
56
As pessoas saem daqui com uma bagagem, uma capacidade boa organizativa,
porque não basta a consciência crítica, não adianta só criticar, tem que ter
uma capacidade de análise e a capacidade organizativa de solucionar os
problemas, tem toda essa parte da dimensão humana, o que é conviver numa
família, onde tu tem crianças, jovens e adultos, onde tu tem gente de diferentes
lugares, de diferentes culturas. Então [...] no nosso coletivo político
pedagógico, já está claro que a gente tem que qualificar esse processo de
reflexão sobre a prática cotidiana do próprio instituto, junto com os
educandos, no sentido de que isso vire práxis, ou seja, que eles se apropriem
do por que as coisas são assim ou são assado (K, entrevista: 15/09/2006)
Para fins de situarmos este currículo em relação a outros do país, tomei como
referência outros dez88 currículos de pedagogia vigentes em universidades públicas, das
distintas regiões do país. Busquei, com isso, uma aproximação da presença da psicologia
nos mesmos em relação às outras disciplinas que compõem os Fundamentos da
Educação89.
88
UFRN, UFRGS, UFES, UFPR, UNICAMP, UNB, UFRJ, UERGS, UEM e UDESC
89
Os Fundamentos da Educação referemse àquelas disciplinas que formam o curso básico de
educadores/as, que são psicologia, filosófica, sociologia e história da educação. Dentre estes fundamentos
destacamos a psicologia da educação, vista desde uma perspectiva psicossocial.
58
Bibliografia
Etapa I (2002.1)
Disciplina: Estudos sóciopsicoantropólogicos sobre jovens e adultos.
Carga horária: 60h/a
90
Foram destacadas as bibliografias da psicologia e áreas afins. Bibliografias de história da educação,
sociologia da educação e outras áreas foram colocadas em anexo.
59
______. O povo brasileiro: a formação e o sentido social do Brasil. 2ª ed. São Paulo:
Companhia das Letras, 1995.
Etapa II (2002.2)
Disciplina: Teoria do Conhecimento e da Aprendizagem
Carga Horária: 60h/a
Etapa V (2004.1)
Disciplina: Leitura e escrita Anos Iniciais e EJA: conteúdo e método
Carga Horária: 30hT/30hP = 60h
Bibliografia:
60
91
Ver QUADRO V SEMINÁRIOS COMPLEMENTARES.
62
92
Currículo de Pedagogia, UERGS.
93
Importante destacar que a não se trata de questionar o trabalho dos educadores mas de refletir sobre a
contradição entre a opção teórico/metodológica do curso e as teorias nele estudadas.
94
A educação brasileira, a partir do ano de 96, vem sendo considerada segundo novas regulamentações
legais. No período de 95 a 98, o Ministério da Educação e Desportos elaborou os Parâmetros Curriculares
Nacionais (PCNs) que, vinculados à Nova LDB – 9.394, visam estabelecer diretrizes para o currículo do
ensino fundamental (1ª a 8ª série) e servir como referência nacional, seja para a prática educacional, seja
para as ações políticas no âmbito da educação.
95
Em 1990 o Brasil participou da Conferência Mundial de Educação para Todos, em Jomtiem, na
Tailândia, convocada pela UNESCO, Unicef, Pnud, Banco Mundial. Nesta conferência forma delineados
63
grandes temas que ferem, de maneira mais ostensiva a vida social humana, como a grande
desigualdade de classes, reproduzida através da exploração. Claro está, por tais razões,
que a formação de educadores se vê obrigada a contemplar estes temas, a fim de
possibilitar sua abordagem. No entanto, estes tornamse periféricos, se forem abordados
como substitutos das questões de classes e das concretas necessidades humanas do
trabalhador do campo.
os parâmetros para as Reformas Educacionais, que seriam aplicadas a todos os países Membros da ONU.
96
Ver distribuição por etapas dos seminários complementares em ANEXO
97
Os nomes das disciplinas foram retirados dos livros de controle dos cursos ministrados.
64
linguagem e a atividade humana, dos efeitos da ação sobre o mundo (ver capítulos III e
IV). Uma formação de educadores/as não pode prescindir dos conceitos desta área de
conhecimento. A psicologia históricocultural, por outro lado, aparece em alguns
objetivos das disciplinas e seminários complementares.
No currículo ampliado observamos os documentos produzidos pelo Movimento,
no que se refere à educação, buscando seus fundamentos psicossociais. Encontramos uma
enorme complexidade nas elaborações referentes à relação teoria e prática, e um avanço
considerável nos aspectos que se referem ao método, e à prática pedagógica do
Movimento. Também há um desenvolvimento bastante elaborado a respeito dos conceitos
de formação humana, de aprendizagem em vários os materiais estudados. É possível
observar um aprofundamento e uma evolução nas formulações ao longo do tempo,
sobretudo no que se refere ao método. No entanto, não encontramos uma presença mais
aprofundada de teóricos como Vigotsky (mais ausente nos documentos do Movimento) e
Leontiev (mais ausente nos conteúdos curriculares – oficiais e ampliados da formação
de educadores/as).
Os conceitos destes autores estão, ainda, em processo de apropriação nos
documentos do MST. Tal como explicitarei mais adiante, no capítulo III, o entendimento
sobre estes autores no Brasil, principalmente de Vygotski, tem sido bastante polêmico,
pois muitos estudos foram realizados a partir de traduções questionáveis de seus
trabalhos. Dito isto, passemos agora ao método, já amplamente elaborado em um
importante documento do MST no qual nos basearemos a seguir.
98
“A escola, local onde acontece o desenvolvimento do processo educativo/formativo, funciona no
regime ou sistema de alternância. Cada turma de educandos/as tem um período em que a maior influência
é a da escola e um período em que a maior influência é a da comunidade, entendida como o Movimento
ao qual pertence. Não confundir com a Pedagogia da Alternância utilizada pelas EFAs –Escolas Famílias
Agrícolas” (ITERRA, 2004a, p. 19), que não possuem esse vínculo com os Movimentos Sociais.
99
Abordado no Processo da Turma.
100
Este tema foi abordado nos capítulos I.
101
Através da Gestão Democrática, o IEJC busca a superação de práticas como as utilizadas em
assembléias, onde todos se reúnem o tempo todo para tomar decisões, contrapondose ao sistema
presidencialista, quando um decide por todos. “O Instituto se rege pela cogestão entre educadores e
educandos, salvaguardando o papel de cada um, e pela autogestão da coletividade que sofre a influência
orçamentária do ITERRA e política do MST, bem como da influência econômica e ideológica onde ele
está inserido” (ITERRA, 2004a, p.31). Como relata Kolling, (entrevista: 23/09/2005), as primeiras
experiências do Método do IEJC foram radicais no sentido de exigir uma autogestão, uma cooperativa
das turmas, que dependiam totalmente de seu trabalho para sobreviver durante a formação. A proposta
segundo o educador/a, era implementar o modelo de escola de Makarenko: “ No início aqui se radicalizou
o método de fazer o laboratório da cooperação, das cooperativas, então acaba tudo se tornando uma
cooperativa, tinha a passagem de uma turma pra outra. Então, quando era só o TAC, funcionou, tinha suas
contradições, mas, efetivamente funcionou, do ponto de vista do método do laboratório. Nesse primeiro
tempo ele foi mais radical, mais efetivo do que hoje” . Sobre o método de Makarenko afirma “n esse
primeiro momento é exatamente isso ai, tu tem um esforço de tentar construir aqui algo semelhante, dado
toda a singularidade daqui né, mas as experiências é o método do Makarenko o que tem a ver com os
laboratórios”. Este modelo sofreu mudanças e atualmente a gestão envolve todo o funcionamento da
escola, mas não todo o seu financiamento.
68
2.5.3 – A pesquisa
A opção de observar a pesquisa, neste trabalho, está relacionada à função que ela
adquire no processo de formação de educadores/as, de aprendizagem e desenvolvimento.
A partir dela se criam zonas de desenvolvimento, ao possibilitar o estudo sobre a
realidade, a leitura dirigida a um objeto de interesse, o desenvolvimento da escrita (o
domínio da linguagem, como instrumento da atividade). A pesquisa faz parte do Método
Pedagógico (2004a, p.31), e é entendida com uma das condições (“o leito”) necessárias
para estabelecer o rumo da formação, objetivando preparação para a intervenção na
realidade. A pesquisa, como já foi dito, é parte do currículo oficial e do ampliado, porém,
neste último não funciona apenas como uma conclusão de um processo, mas como parte
de todo ele. Através dele é possível superar a idéia de autosuficiência, de achar que já se
conhece tudo. No Instituto, os educandos devem fazer pesquisas que sejam socialmente
úteis para o Movimento (ITERRA, 2005). Com o objetivo de orientar o trabalho de seus
69
Pesquisei então sobre o que eles eram antes, o que essas famílias eram o que
elas tinham enquanto construção e ai eu fui olhar, eu acho que de
aprendizados assim que se coloca é pra ser educador pra trabalhar com povo,
movimento social, tem que pesquisar e ai eu constatei isso na pesquisa porque
a gente achava que conhecia o povo mas, quando tu vai conhece de fato,
entende ele, vê como é que ele vive, tu entende que não sabia, que não
conhecia, né? Que não sabia o jeito de ele viver, daí... E como trabalhar com
ele. Então a primeira constatação: é preciso pesquisar, é preciso entende né
de fato, aquilo que a gente acha que sabe não sabe. [...] outro aprendizado é
de confrontar uma determinada realidade com aquilo que já tava escrito sobre
isso, em outras realidades, que é a teoria né? Teoria é uma sistematização de
uma outra realidade e a reflexão sobre aquilo então como é que eu vou
confrontar essas duas coisas, né? [...] a gente começou a entender que era
uma realidade refletida e eu ia intercalar, ia tentar entender isso né? Acho
que também foi uns dos aprendizados nesse sentido (Educanda A. Entrevista,
15/09/2005).
102
GONÇALVES, Valdemir. Relatório final de práticas pedagógicas com crianças. Curso de Pedagogia.
UERGS/ITERRA, 2005. (documento não público)
70
trabalho de conclusão. Sabe, então houve uma redução daquilo que deveria
ser um eixo do curso todo, para no final do curso a elaboração de um trabalho
de conclusão (Entrevista Educadora C.. 16/09/2005).
Tem gente que acha que pedagogo tem que ter toda uma formação teórica de
análise da realidade, e tem gente que acha que pedagogo tem que ter uma
formação prioritariamente, exclusivamente, instrumental, didática, como dar
aulas. Estas são duas visões, nós nos somamos àqueles que acham que não é
nem uma coisa nem outra, isoladamente, tem que combinar essa duas coisas.
Também precisa de um instrumental. Vê o que a turma está discutindo agora
sobre os estágios: Nós temos a concepção, a concepção e quando a gente
chega lá na sala de aula, ah! Aí a gente se dá conta que está fazendo quase
pior do que aquilo que a gente critica, por quê? Se a gente acredita noutra
coisa. É porque existe mesmo uma ciência experimental, é porque existe um
jeito de fazer, e esse jeito de fazer também tem que ocupar nosso currículo.
Não se trata de determinar uma formação apenas teórica, mas, o exemplo a
pesquisa, a pesquisa não entra em nosso entendimento, e ouvindo agora diz
fazer toda análise, a pesquisa não é de formação teórica, a pesquisa aqui, os
que eles dizem, o que Eles mais destacam da pesquisa é justamente a
formação de postura e habilidades, postura, o olhar para o sujeitos,
habilidades, questão de observação a questão de fazer, pelo menos tentar
fazer a relação de teoria e prática, isto no campo é uma coisa empírica. Você
está lendo. Como ta fazendo pra juntar isso? Oh! São habilidades
fundamentais para um educador/a (Entrevista educadora C: 16/09/2005).
apresentação. A substituição da leitura do senso comum por uma leitura científica exige
um grande esforço de transformação pessoal103.
O MST tem formulado agendas de pesquisa que, por sua vez, orientam as áreas e
linhas de pesquisa e ainda eixos temáticos que foram diagnosticados como necessidades
da população e do Movimento. Em 2000, no Primeiro Encontro de Pesquisadores do
MST, foi elaborada a 4ª versão da Agenda de Pesquisa do Movimento e as áreas de
concentração indicadas como prioridades foram: Educação e Formação; Estratégias de
Construção do Sistema Cooperativista dos Assentamentos; Direito e Questão Agrária;
Organicidade do MST; Desenvolvimento Humano; História e Geografia Camponesas;
Cultura. Para cada um deles foram estabelecidas linhas de pesquisa e eixos temáticos
(ITERRA, 2001, p.1923). A escolha de temas, a formulação do problema, os primeiros
passos são feitos coletivamente, nas primeiras etapas. Como relatam os educandos/as
103
Tanto a nova organização dos Tempos de atividades, que tomam a maior parte das horas do dia,
quanto as novas formas de atividades desenvolvidas se diferenciam muito do que os educandos/as
praticam cotidianamente em suas comunidades. Uma mudança radical no dia a dia é provocada na escola
desorganizando e reorganizando externa e internamente o sujeito.
104
BARTSCH, Inajara Bogo. Relatório final da prática pedagógica com crianças. Estágio acompanhado
com crianças. Veranópolis: ITERRA, 2005 (documento não público).
73
Muitos autores, como refere Triviños (2003)105, que defendem uma proposta de
formação de educadorespesquisadores, não têm a preocupação com um enfoque histórico
da constituição do conhecimento e, tampouco estão voltados para tratar dos grandes
problemas da humanidade ou as necessidades das maiorias. Neste sentido, um projeto
político, que trate destas questões, que oriente o trabalho do/a pesquisador/a é uma
condição sine qua non para a realização da pesquisa, como parte da formação humana
genérica.
105
Triviños (2003) referese a autores positivistas, como Schön (pragmatista) e Perrenoud
(neopositivista). Eles abordam a formação a partir das competências e de famílias de competências, como
se o ser humano tivesse suas capacidades limitadas em dez famílias de competências, ou muitas
competências individuais. Isso é tão absurdo como falar dos saberes que o professor deve dominar, diz
Triviños.
106
Com este termo quero me referir à produção resultante de uma elaboração predominantemente grupal
ou daquelas produções predominantemente individuais.
74
No caso das monografias e dos relatórios de estágio, são obras criadas com marca
predominantemente individual. Do estágio falarei a seguir.
2.5.4 – Os Estágios
nossa escola tem crianças com cinco anos que a gente colocou na primeira
serie. E aí? onde fica a psicologia da aprendizagem e do desenvolvimento da
criança? Então eu faço que a criança queime etapas do seu desenvolvimento?
[...] e quando a criança é superdotada por exemplo? É nos estágios, eu vou
dizer o que a gente percebe assim, é essa falta de conhecimento sobre
criança, porque a gente se volta muito para o principio da realidade, para essa
realidade social, mais ai eu deixo de lado essa outra, esse outro contexto, que
é [...] o desenvolvimento, enquanto sujeito, enquanto sensibilidade, enquanto
psicologia, como é que eu lido com uma criança, se eu não tenho esse
aprendizado?
107
OCAP – Oficina de Capacitação Pedagógica. Está relacionada com a proposta pedagógica de
Makarenko, conforme Luedemann (2002, p.30), também denominada OFOC – Oficina Organizacional de
Capacitação.
108
HAMMEL, Marilene; et al. Relatório do Estágio OCAP. Curso de Pedagogia. ITERRA/UERGS,
2004. (documento não público).
75
109
Observese que aqui se inclui uma análise de comunidade, e não somente dos educandos/as ou escola.
110
SILVA, Adaiane S.; RISSO, Edson; BOGO, Inajara; MENDES, Rosane P. Relatório do estágio
OCAP, ITERRA, 2004, (documento não público).
111
SILVA, Adaiane S.; RISSO, Edson; BOGO, Inajara; MENDES, Rosane P. Relatório do estágio
OCAP, ITERRA, 2004, (documento não público).
76
variados, eram: giz, quadro, lápis, caderno, violão, livros, cola, papel, tesoura, alfabeto
móvel, jornais e revistas, etc. Para iniciar a alfabetização, foram utilizadas palavras que
estivessem ligadas à realidade do acampamento.
112
SILVA, Adaiane S.; RISSO, Edson; BOGO, Inajara; MENDES, Rosane P. Relatório do estágio
OCAP, ITERRA, 2004, (documento não público).
113
ZANG, Cilone, Queiroz, Denize; CUPSINSKI, Marilene; ALMEIDA, Sandro Roque. Relatório do
estágio OCAP. ITERRA, 2004.
114
SILVA, Adaiane S.; RISSO, Edson; BOGO, Inajara; MENDES, Rosane P. Relatório do estágio
OCAP, ITERRA, 2004, (documento não público)
77
perceber que temos que estar preparados para atuar nos diferentes espaços, realidades e
com diferentes sujeitos” (p.2)115.
Outra questão levantada foi a diferença entre a concepção pedagógica dos
educandos da Pedagogia da Terra e os professores da escola onde atuaram nesse estágio:
estes últimos orientavam seus estagiários no sentido de “encher” os alunos de conteúdo, o
que difere das teorias e metodologia ensinadas aos educandos do IEJC. Em alguns relatos
de aprendizado eles nos dizem que
...o mais significativo é ter me dado conta que dar aula é uma tarefa difícil e
precisa muito preparo e dinamismo, pesquisa, e percepção, de como as
crianças aprendem. Não basta planejar e conhecer teorias, é preciso praticar,
para entender o processo de aprendizagem (p.2).116
115
CUPSINSKI, Marilene. Relatório de práticas pedagógicas. Estágio acompanhado com crianças,
ITERRA, 2005. (documento não público).
116
REIS, Maria Santa Amador dos. Relatório de práticas pedagógicas em anos iniciais. Estágio
acompanhado com crianças, ITERRA, 2005. (documento não público)
117
Idem.
78
elas eram muito acostumados só a copiar e produzir nada, até pra escrever
uma frase pra eles era difícil. Eu comecei então com palavras, depois frases e
depois textos, aos pouquinhos eu fui construindo com eles. Também o diálogo
com eles foi bem difícil porque eles não tinham argumento pra nada, porque
todo final de aula eu fazia avaliação com eles da aula. “Foi bom, legal a
aula” , mas por que foi bom? “ Porque foi”. Nunca ninguém ajudou eles a ser
mais críticos a dizer outras coisas e o medo também de dizer que não gostou.
Esse foi um desafio estágios. [...] No primeiro dia eu comecei a trabalhar com
textos, era um pensamento sobre a terra e ai tinha um monte de palavras
sobre o que significava terra, eu pedi pra cada um escolher algumas palavras
daquelas. Sei que nós começamos a tirar palavras daquele texto e escrever
frase, ai depois que tinha escrito as frases tinha que escrever um texto, mas ali
só deu frase, texto mesmo foi sair depois que eu trabalhei todo o tema sobre as
sementes, fizemos um monte de atividades e banco de sementes um monte de
coisa, ai no final cada um escreveu um texto e ai nos construímos um texto
coletivo. Mas toda vez que eles faziam frase ou textinhos eu escrevia o texto
deles no quadro e ai eles diziam o que tinha que mudar lá no texto pra ficar
melhor, onde ficava a vírgula, acento, o grupo todo. Aquilo eles gostavam, de
corrigir lá no quadro, escrever não gostavam muito. É o jeito que tem pra
trabalhar de uma outra forma que eles se construíram ali. (Educanda C:
Entrevista 10/09/2005)
ela não saiu da aula um minuto. Porque ela dizia assim “ eu tô aprendendo um
outro jeito, eu não sei fazer assim” . Trabalhei mapa com eles, eles
construíram os mapas. Pedi pra eles desenharem a casa de cada um. Fizemos
no chão o mapa do assentamento, localizando norte, sul, leste e oeste cada um
tinha que colar onde era a casa dele. Isso também foi uma atividade que
118
GONÇALVES, Valdecir. Relatório final de práticas pedagógicas com crianças. Curso de Pedagogia.
UERGS/ITERRA, 2005 (documento não público).
79
O desafio foi o de entrar e atuar em uma sala da aula, pois todos nós sabemos
que este era um dos nossos desafios durante o curso e neste estágio, foi mais
significativo ainda, pois nenhuma vez tive tanto acompanhamento como
desta vez. Em sala de aula as pessoas foram me observar, [...] puderam
analisar quais são os meus limites e apontálos para mim poder superálos
durante o estágio e estar refletindo para que não aconteça em outros
momentos O acompanhamento procurou estar sempre contribuindo em todos
os momentos, auxiliando em momentos de dificuldades, sempre tentou
prever a adequação do planejamento. Mas eles não conseguiram nos
entender, que as nossas teoria são todas voltadas para uma concepção (Inajara
Bogo Bartsch, Relatório final da prática pedagógica com crianças).
119
Como ocorreu no Acompanhamento externo da turma, durante o curso no IEJC.
80
120
A educadora V. considera que a avaliação realizada conjuntamente entre UERGS e ITERRA, dos
educandos/as de Pedagogia, possibilita um acompanhamento mais adequado, pois a cada semestre
recebem um parecer interno e as notas exigidas pele UERGS. Há, no entanto, falhas e limites na avaliação
dos outros cursos.
81
121
Educação Popular é teoria na medida que orienta rumo à transformação e é método na medida que
intervêm na prática se desdobrando em método, e se expressa como um processo planejado, sistematizado
que possibilita que o sujeito entre em movimento [...], para compreender as causas dos problemas de
existência e lava a formular estratégia de superação/transformação da realidade’ (ALMEIDA, 2005,
p.39).
82
Todos os homens são intelectuais, poderseia dizer então; mas nem todos os
homens desempenham na sociedade a função de intelectuais.[...] Isto
significa que se se pode falar de intelectuais, é impossível falar de não
intelectuais, porque não existem nãointelectuais. [...] Não existe atividade
humana da qual se possa excluir toda intervenção intelectual, não se pode
separar o homo faber do homo sapiens. Em suma, todo homem, fora de sua
profissão, desenvolve uma atividade intelectual qualquer, ou seja, é um
“filósofo”, um artista, um homem de gosto, participa de uma concepção do
mundo, possui uma linha consciente de conduta moral, contribui assim para
manter ou para modificar uma concepção do mundo, isto é, para promover
novas maneiras de pensar (GRAMSCI, 1978, p 7).
Adverte o mesmo autor que esta revolução “jamais poderá ser praticada através da
constituição e da lei ordinária, porque ambos fazem parte do sistema de dominação
social” (FERNANDES, 1989, p.149). Portanto, ele aponta o limite da escola formal e
assinala para o MST, tanto os limites do projeto de educação do campo dentro do âmbito
institucional, como a tarefa dos movimentos sociais, de atuação e resistência neste mesmo
marco. Ou ainda, segundo Gramsci, “se se quiser criar uma nova camada de intelectuais,
chegando às mais altas especializações, própria de um grupo [...], será preciso superar
dificuldades inauditas.” (1978, p. 139).
Voltando a tratar das matrizes, e tratando ainda de intelectuais orgânicos, por sua
predominância e relevância para a noção de formação humana presente na Pedagogia da
Terra, trago Paulo Freire e algumas de suas contribuições. Suas propostas partem de um
entendimento de educação que abrange o sistema, a escola, o educador/a e por fim o
educando/a, alertando para o fato de que não é possível concebêlos separadamente.
122
Em 1964 estava prevista a instalação de 20 mil Círculos de Cultura para dois milhões de analfabetos.
Experiências como estas acabaram por leválo à prisão, acusado de comunista e por exilado durante 16
anos (ANCA, 2002, p. 9).
85
entender o ser humano e sua formação conformam os fundamentos desta Pedagogia. Sua
contribuição para a educação foi
Segundo Fiori (2004, p. 10), a pedagogia de Freire tem como idéia animadora toda
a amplitude humana da “educação como prática de liberdade”, o que, em regime de
dominação, só se pode produzir e desenvolver na dinâmica de uma pedagogia do
oprimido. Em seu livro Pedagogia da Esperança (2003), Paulo Freire reafirma seus
princípios e avalia seu trabalho, a partir de críticas feitas a seu livro Pedagogia do
Oprimido (2004). Como intelectual orgânico das classes populares afirma que “ainda e
possivelmente por muito tempo, não é possível entender a história sem as classes sociais,
sem seus interesses em choque”. (FREIRE, 2003, p. 91)123. Como costumava dizer,
“l ibertandose, os oprimidos podem libertar os opressores” (FREIRE, 1993, p. 97).
Ao tratar do educador/a, o autor alerta que, e esta é uma noção bastante presente
na Pedagogia do Movimento , quando este se especializa em apenas transmitir
conteúdos, perde algumas qualidades necessárias para o trabalho pedagógico, que é a
ação, a reflexão crítica, a curiosidade, o questionamento exigente, a inquietação, a
incerteza. O ato de conhecer pode também, muitas vezes, se deter no outro pólo, ou seja,
o de reduzir a análise da realidade à observação do fato pretensamente objetivo, sem
submetêlo a um olhar crítico, sem estabelecer conexões com o que já foi produzido por
outros autores. O lugar de partida para a relação do aluno com o conhecimento é o lugar
onde ele se encontra para dali seguir por outros caminhos. Encontramos também em seu
trabalho esta posição sobre a relação com o conhecimento.
123
Esta noção de Paulo Freire se diferencia da noção de luta de classe presente nos documentos do
Movimento. (ver contradição interna).
86
e fé nos homens, no seu poder de fazer e de refazer, de criar e de recriar (FREIRE, 1987,
p.81).
Gramsci, por sua vez, estuda a escola tradicional e observa com desconfiança a
Escola Nova, avaliando detalhadamente as características de ambas. Valoriza na escola
tradicional o que ele chamou de educação “desin teressada”, pois ensinava “não para uso e
necessidade imediatos e sim para assimilar valores éticosmorais” (NOSELLA, 1992, p.
108). Com esta compreensão ele propõe a superação da escola profissionalizante
tradicional, baseada no caráter unilateral da divisão do trabalho, por uma formação
omnilateral, que, numa concepção socialista de escola, teria seu caráter profissionalizante
somente no 3º grau. Esta proposta foi elaborada por Gramsci, nos anos de 1920, como
uma contribuição ao Partido Comunista Italiano, caso este chegasse ao governo. Segundo
124
Aspectos específico da influência de Paulo Freire na experiência pedagógica do MST também podem
ser encontrados em Andreatta (2005).
88
Machado (1989), em seu estudo sobre a escola unitária, na tradição marxista e nos aportes
de Lênin e Gramsci, os elementos caracterizadores de uma terceira corrente. Esta
contribuição se baseia no pressuposto de que a unificação somente é possível quando
forem suprimidas as causas que originam as diferenciações; o alcance destes objetivos
depende da solução das contradições que constituem as amarras ao desenvolvimento da
sociedade125.
Conforme esta educadora, já em 1990 vários autores, além dos brasileiros, tanto
pedagogos, como psicólogos, eram estudados nos cursos de formação do Movimento. Ela
relata sua experiência em Braga/RS e relembra:
125
Existe, porém, uma unificação proposta pela escola burguesa, que, por sua vez, surge no século XIX
para fortalecer a luta do Estado contra a Igreja no domínio sobre a educação e pela unidade nacional. No
Brasil isto ocorreu no início do século XX. “Marx e Engels vinculavam esta centralização política à luta
da burguesia de sujeição de toda a sociedade do campo e da cidade ao seu comando, como decorrência da
centralização e concentração dos meios de produção em suas mãos” (MACHADO, 1989, p. 47).
89
Este relato indica o esforço de oferecer, para os cursos formais, um conteúdo rico,
com diversos autores da psicologia, destacando entre eles aqueles que possibilitassem
uma visão crítica, no âmbito da psicologia. Esta educadora também faz um destaque para
qualidade da formação dos/as educandos/as – preparados tanto nos cursos de educação
popular quanto na própria militância partidária . Afirma que possuíam, naquela época,
um elevado conhecimento teórico e leituras muito profundas sobre a realidade nacional e
internacional. No que se refere à formação humana e pedagógica, Tragtemberg, no
prefácio à obra de Pistrak (1981), fala sobre a contribuição destes dois autores. Segundo o
autor, a experiência de Makarenko difere da de Pistrak, pois, desenvolveuse em espaços
sociais distintos e com populações distintas. Makarenko teria, por esta razão, fundado
uma pedagogia sem escola, que teria nascido das trágicas circunstâncias da Guerra Civil
que gerou milhares de jovens órfãos e, portanto, pouco teria a dizer sobre a escola.
126
Prefácio de PISTRAK (1981)
91
Pistrak (1981), por sua vez, preferiu optar pela criação de uma nova instituição no
lugar da transformação da velha estrutura. Para isso, utilizou os meios de que dispunha,
dando ênfase às leis gerais que regem o conhecimento do mundo natural e social,
observando a estrutura psicofísica dos educandos e a concepção materialista, histórica e
dialética que atua como uma força organizadora do mundo. Assim estava definida a
“Esco la do Trabalho”, como afirma Maurício Tragtemberg127, Pistrak (1981) privilegia a
teoria marxista como uma nova arma capaz de garantir a transformação da escola, desde
127
A primeira edição do livro de Pistrak Fundamentos da escola do trabalho, no Brasil, em 1981, foi
prefaciada por Maurício Tragtemberg.. Já, em 2000 foi feita a primeira edição pela Expressão Popular do
mesmo livro, prefaciado por Roseli Caldart.
92
que oriente a prática do trabalho escolar; ela se tornará ativa e eficaz na medida em que o
professor colocar em prática os valores de um socialista ativo. Pistrak afirma que seu
objetivo não é formular uma teoria, mas o de analisar seu surgimento em decorrência de
uma prática escolar guiada pelo método dialético. A Escola do Trabalho é apenas o
resultado da prática pedagógica, a sistematização de uma experiência concreta, afirma
Tragtemberg128. Segundo Caldart (PISTRAK, 2000), os três aspectos centrais da obra de
Pistrak sobre a relação entre escola e trabalho são: as reflexões sobre a relação entre
escola e trabalho, a proposta de autoorganização dos estudantes, e a organização do
ensino através do sistema de complexos temáticos, sendo este último o que mais costuma
chamar a atenção dos educadores, pois se aproxima da reflexão sobre os temas
geradores129, propostos por Paulo Freire.
128
Prefácio de PISTRAK (1981)
129
Tal como já dissemos anteriormente (p. 55), o MST questiona a forma como vem sendo praticada o
ensino através de temas geradores, Cerioli (2005, p. 181)
93
CAPÍTULO III
130
Como professor de psicologia da Universidade Católica de El Salvador – UCA, MartínBaró, durante
os anos de conflito armando neste país, dedicouse a estudar, analisar e a denunciar as condições de vida
dos salvadorenhos, as conseqüências da repressão e da migração. É o principal fundador da Psicologia da
Libertação.
94
131
Preconceito no sentido utilizado por Agnes Heller (2004, p. 52), que tem a função de coesão de um
grupo baseado em particularidades. A autora diferencia preconceito e ideologia, pois esta última,
enquanto expressão de aspirações essenciais de classe que motivam a práxis, não faz apelo ao particular e
exige muito de quem a assume. Sua passagem à condição de preconceito se dá a partir do momento em
que deixa de motivar a práxis não respondendo mais a ideais humanogenéricos, afirma Patto (1993, p.
138). Heller (2004, p. 5253) referese aos revolucionários franceses que levantaram suas barricadas em
nome de um ideal humanogenérico, à confiança, não à fé.
95
higienização social almejada era obtida”, nos asilos higiênicos ou pela educação. A escola
não fora ainda universalizada, tal como propunha o ideário dos “sis temas nacionais de
ensino” do século XIX (SAVIANI, 2000a, p. 5). Sob um modelo econômico
agroexportador, a maioria da população vivia na área rural e não tinha acesso à escola. A
educação restringiase a uma pequena clientela, procedente da elite, que tinha o poder
econômico e político. O analfabetismo era grande e a força de trabalho não era
qualificada (FACCI, 2004, p. 102). Até então havia um predomínio da escola tradicional.
No período que vai de 1964 a 1985, durante a Ditadura militar, de acordo com
Hentz e Herter (2001, p. 91), abriramse as portas para a entrada do tecnicismo. Este é
entendido como “um movimento que situará as técnicas educacionais acima dos
conteúdos curriculares”, desencadeando uma compulsiva profissionalização do ensino
médio e também um controle ideológico centrado na educação, e projetado para toda a
sociedade132, através da Lei 5.692 que levou à reforma educacional de 1971. Segundo
Facci, (2004, p. 1067) “ tal reforma, pautada em postulados piagetianos, mais uma vez
vem atender aos interesses das classes dominantes, e o sistema educacional tem o
predomínio de uma função conservadora”. Seu objetivo era o de superar a estrutura do
conteúdo educacional, humanista e intelectualista, inadequada às novas necessidades
geradas pelo desenvolvimento econômico, afirma a autora.
132
Saviani (2000a, p. 15 – 19) faz uma análise semelhante da Pedagogia Tecnicista
97
As teorias críticas deixaram suas sementes pelo caminho, porém, não chegaram a
promover mudanças profundas na psicologia educacional ou mesmo apontar uma
compreensão psicossocial crítica da formação do ser humano. Como afirma Bock (2003,
p. 22), até hoje prevalecem na atuação do psicólogo, no Brasil, visões de um ser humano
natural, individualizado em seu “verdadeiro eu”, dissociado do mundo real em que vive.
No âmbito da psicologia da educação, nesta mesma linha, atualizando esta leitura para a
133
Poderíamos definir o construtivismo como um conjunto de vertentes teóricas que possuem como
núcleo a epistemologia genética de Jean Piaget, formando um ideário filosófico, psicológico e
educacional hegemônico que gerou forte impacto na educação, fortalecendo uma visão ahistórica e
individualista do desenvolvimento humano. Tal ideário vem sendo utilizado para legitimar reformas
educativas em todo o mundo (HOSSLER, 2000, p. 322)
134
Concepção que caracteriza as teorias críticoreprodutivistas de Louis Althusser, Pierre Bourdieu e
JeanClaude Passeron (SAVIANI, 2000).
98
década de 1990 e para os primeiros anos do século XXI, Facci (2004) conclui que o que
pode se chamar de moda, em termos teóricos, representa na verdade uma continuidade da
influência da Escola Nova, reeditada em outro tempo histórico. Desta forma, a autora
inclui na classificação proposta por Saviani (2000a), entre as teorias nãocríticas, o
construtivismo, a teoria do professor reflexivo e a pedagogia das competências.
A psicologia crítica, por sua vez, na busca de repensar sua relação com a
educação, produziu estudos (MACHADO e SOUZA, 1997, p.36; KUPFER, 1997, p.51;
PATTO, 1993, 1997) que questionaram, na década de 1980 e 1990, o papel da psicologia
na escola. Entre outras coisas, foram apontados os elevados números de
encaminhamentos ao atendimento médico e psicológico de crianças com dificuldades de
aprendizagem, mostrando a tendência à psicologização. Foram questionadas também as
características da formação dos professores e especialistas em educação, efetuadas nos
cursos de Magistério e de Pedagogia. A formação recebida enfatizava explicações
psicológicas aos problemas escolares, como afirma Souza (1997, p.23).
Em seu texto sobre a situação dos educadores/as do novo milênio, Nóvoa (1999),
defensor da teoria do professor reflexivo, critica o crescimento de propostas, programas e
projetos que anunciam o papel fundamental dos educadores/as na sociedade do futuro,
sem que cheguem a modificar a vida concreta do educador/a. O autor aponta que, apesar
de se ter generalizado a demanda pela valorização do educador/a, no entanto, mantevese
a “pobreza” de medidas que pudessem traduzir as preocupações levantadas.
A proposta do ensino como prática reflexiva, que valoriza saberes que o professor
adquire na própria a atuação, foi intensificada nos anos de 1980. De acordo com Chakur
(2002), estudos realizados segundo a abordagem cognitivista, intensificados a partir dos
anos 1980, têm defendido o ensino como prática reflexiva e valorizado os saberes que o
professor adquire na própria atuação. Tais estudos, freqüentemente, fazem referência a
dois modelos básicos de formação e atuação do professor: os modelos da racionalidade
135
Apesar de que para fins desta pesquisa elegemos o termo educador/a, devido a que ele represente,
atualmente, a proposta de educação formulada pelos Movimentos Sociais do campo e a educação popular,
será utilizado o termo professor na medida em que esta for a nomenclatura utilizada pelo autor citado.
100
A teoria do professor reflexivo, segundo Facci (2004, p.50) não deixa claro, no
entanto, em que consiste a formação do educador/a, em termos de conteúdos. A
valorização da experiência e a reflexão sobre a prática levam ao “risco de apenas analisar
a subjetividade do professor como se esta fosse produzida na particularidade, ou mesmo
somente entre seus pares”, ao resgatar o coletivo e práticas reflexivas individuais e
reducionistas. Segundo a autora, (Idem, p.70), no lema “aprender a aprender”, adotado
pela pedagogia do professor reflexivo, permanece uma valorização exacerbada da prática,
o que pode conduzir a sua absorção pela racionalidade técnica, através de uma forma
disfarçada.
Nos anos de 1970, a escola pública, ao não enfrentar as verdadeiras razões das
desigualdades sociais, causadoras das desigualdades escolares se apoiava em novas
teorias, como a da carência cultural, para explicálas. A teoria da carência cultural estava
relacionada com a teoria do capital humano (FRIGOTTO, 1984) e a mística
desenvolvimentista da década de 1970. Tais teorias, articuladas, justificavam a falta de
escolas no campo pela falta de capacidade e desinteresse de sua população pela educação
escolar. Justificavam também medidas paleativas e compensatórias que tenderam a
diminuir e enfraquecer as escolas no interior do país. Tais programas mediaram a atuação
educativa com a população marginalizada. Esta passou a ser mais fortemente criticada por
sua falta de “bon s” hábitos e por oferecer ambientes pouco adequados para o
desenvolvimento da infância, responsabilizando milhões de brasileiros por estarem
submetidos à pobreza. O reconhecimento das diferenças culturais adquiriu uma versão
psicológica. Diferenças culturais no grupo significavam déficit psicológico no plano
individual, uma carência nas características necessárias para se obter sucesso na escola,
afirma Connel (Apud GENTILI, 2001, p. 17). No auge do regime de exceção foi
ampliada a formação de outros profissionais da escola, em detrimento da formação de
professores137. Os docentes, no entanto, deveriam, se necessário, atender as necessidades
do ensino de níveis mais elevados que o de sua preparação, caso a oferta de professores,
legalmente habilitados, não bastasse para atendêlas. Dos educadores esperavase que
136
Monteiro Lobato, ao criticar as queimadas realizadas por camponeses no interior do Brasil, desandou
contra estes um ataque feroz, criando a imagem do caipira ignorante, o Jeca Tatu. Lobato se inseria no
confronto campocidade que se estabelecia, então. Em sua época, a expansão empresarial enfrentava o
tradicionalismo agrário.
137
A Lei 5.692/71do Ensino de 1º e 2º grau extinguiu a figura do “pedagogo” e regulamentou,
especialmente através dos artigos nº 33 e nº 39, a formação do especialista através do curso de Pedagogia
(RIBEIRO, 2000).
103
138
Segundo Machado (1989), o capitalismo é, simultaneamente, diferenciador e unificador.
Diferenciador por pressupor, intrinsecamente, um complexo processo de diferenciação do trabalho, com
repercussões amplas e profundas em todos os segmentos da vida social e particularmente na escola. A
hierarquização e o controle da produção e da distribuição dos conhecimentos se estendem do âmbito do
processo de trabalho para a esfera educacional.
139
Conforme a Lei 5692/71.
104
considerações sobre o que a sociedade exigia ou sobre o que o indivíduo precisava para
sobreviver. No caso, a população do campo, necessitava menos do que a da cidade.
Como fica claro no amplo estudo realizado por Gritti (2003, p. 37) sobre a
educação rural, os currículos de ensino de 1º e 2º graus, implementados a partir da Lei
5.692/71, tinham um núcleo comum e uma parte diversificada para atender as
necessidades e possibilidades concretas, atentando às peculiaridades locais, aos planos
dos estabelecimentos, às diferenças individuais dos alunos. Porém, segundo a autora, esta
abertura para a realidade local estava limitada pelo próprio currículo obrigatório nas
escolas estaduais, assim como pela formação dos educadores, na qual cultura e trabalho
urbanos, tomados como abstrações, eram as referências. A obrigatoriedade de um
currículo oficial não pode servir como uma camisa de força que obrigue as escolas a abrir
mão de conteúdos muito importantes e necessários para as populações locais.
140
A Lei 7.044/82 regula a preparação para “o trabalho”, porque o que existe de oferta no mercado é “o
trabalho”, e não “um trabalho” (Parecer no 1 000/84 CEE) Cfr: Gritti (2003, p. 41).
105
A década de 1990 iniciou com uma economia em crise, com o aumento dos
problemas sociais, o desmantelamento das entidades sindicais, o enfraquecimento dos
partidos, o aumento do desemprego142. Consolidase a mercantilização do sistema
educacional com um vertiginoso aumento das escolas no setor privado, tanto de ensino
fundamental e médio, como universitário. A LDBEN nº 9.394/96 oficializou o que já
ocorria na prática, ou seja, a descaracterização de seu caráter público, retirando do Estado
sua central responsabilidade sobre a educação, passandoo às mãos das famílias,
estabelecendo e consolidando uma nova mentalidade, diferenciada da Constituição
Federal de 1988, que apontava o Estado como principal mantenedor da educação, em
todos os níveis. A necessidade do sistema de enfraquecer o Estado e reduzir seus serviços
está apoiada pela perspectiva (neo)liberal de que a educação deve ser, como outras
mercadorias, regulada pelo mercado.
141
Frigotto (2001, p. 89) afirma que as categorias que sugiram foi a sociedade do conhecimento e a de
capital humano. Elas expressam uma mudança na materialidade da crise e das contradições da sociedade
capitalista no final de século, porém, são mudanças secundárias pois não transformaram a essência
desigual desta formação social.
142
Década na qual Fukuyama (1992) defende a tese do fim da história, conforme Frigotto (2001, p. 91).
106
Para o autor, que dedicou sua vida ao povo salvadorenho143, o psicólogo tem uma
tarefa específica, como parte de uma nação. As pesquisas e as contribuições dos
psicólogos são necessárias, inclusive, para o processo de transformação. Porém, se a
tarefa específica do psicólogo não é a de transformar, isoladamente, as estruturas sócio
econômicas, é a de conhecer profundamente os principais problemas que fazem sofrer
este povo e assumir a perspectiva das maiorias populares (idem, p.175). MartínBaró
demonstra a inevitabilidade do envolvimento e do compromisso da psicologia com algum
tipo de sociedade e de constituição de ser humano. Não há uma forma de pensamento
neutra através da qual se possa atuar como psicólogo/a. Sua atuação estará sempre
reforçando algum tipo de interesse, de compreensão de mundo e de organização social.
143
MartínBaró, psicólogo, trabalhou na UCA, Universidade Centro Americana, em El Salvador, onde
foi assassinado em 1989, pela forças para militares contrainsurgentes.
107
está a reticência com que a ideologia oficial soviética via o papel central que
Vygotski atribuía à consciência, [...]. Não nos esqueçamos que Stalin
mantinha a pretensão de ser um indiscutido científico marxista da linguagem
e que não podia ver com simpatia o materialismo dialético, excessivamente
complexo e pouco simplista, por onde Vygotski, e alguns outros teóricos
soviéticos avançavam as explicações sobre a linguagem e sobre o homem”.
Álvares e Del Rio (VYGOTSKI, 1997)146.
144
Troika, significa três. Referiase aos três cientistas que trabalharam juntos: Vygotski, Luria e Leontiev
(DUARTE, 2001).
145
Vygotski (1997, pp. XIIIXXV).
146
Tradução minha..
108
Muitas lendas foram contadas até agora, sobre este intelectual. Na medida em que
vai sendo estudado e conhecido, aos poucos elas têm sido desmistificadas, segundo
Blanck, em prefacio do livro Psicologia Pedagógica (2003), um dos primeiros trabalhos
de Vygotski na área da psicologia da educação, recentemente publicado no Brasil147.
Apesar de tardiamente conhecida e apropriada pelo mundo, a Escola Soviética de
Psicologia crítica oferece uma contribuição revolucionária para esta ciência.
147
Cfr. Blanck, Guilhermo (VYGOTSKI, 2003).
109
148
Palestra proferida em 31/03/2006 em Colóquio “Memória e Imaginação”, organizado pelo Núcleo de
Pesquisa em constituição do Sujeito: Práticas sociais, relações estéticas e processos de criação. Pós
Graduação em Psicologia e PósGraduação em Educação. Universidade Federal de Santa Catarina
UFSC.
149
Data da primeira publicação.
110
Podemos resumir, por lo tanto, [...] los tres momentos decisivos que subyacen
en este análisis: análisis del proceso y no del objeto, que ponga de manifiesto
el nexo dinámicocausal efectivo y su relación en lugar de indicios externos
que disgreguen el proceso; por consiguiente, de um análisis explicativo y no
descriptivo; y finalmente un análisis genético que vuelva a su punto de
partida y restablezca todos los procesos del desarrollo de una forma que en su
estado actual es un fósil psicológico (VYGOTSKI, 1995, p. 105106).
150
Tradução minha..
111
151
Tradução minha..
112
Como é possível que um autor marxista seja tão lido em um momento como
o atual em que posições desse tipo estão tão desprestigiadas? Por que isso
ocorre inclusive nos Estados Unidos, onde a educação e toda a cultura
transformaram o individualismo em uma de suas bases teóricas? (LIMA,
1990).
o edifício teórico de Piaget em seu todo, atacando seu foco central, Vigotsky
adota uma atitude incompatível com autores que, como César Coll,
preconizam a incorporação pelos educadores, de partes de distintas teorias,
formando assim um ‘marco referencial psicológico’, expressão essa que na
terminologia de César Coll serve para camuflar o ecletismo pragmático
(Duarte, 2000, p. 227).
Segundo Duarte (2000, p.161 e 2001, p. 25), em alguns estudos realizados sobre
Vygotski existe uma tentativa de neutralizar o caráter marxista da teoria vygotskiana e,
desta maneira, facilitar a assimilação do pensamento de Vygotski ao universo ideológico
do capitalismo contemporâneo. Este autor aponta três procedimentos de diluição,
subordinação e neutralização do caráter marxista da teoria de Vygotski, presente na
bibliografia contemporânea acerca do pensamento deste autor. Além da já mencionada
manipulação nas traduções, o autor afirma, também, que existe uma tentativa de separar a
teoria de Vygotski da teoria de Leontiev e Luria, e, por último, identifica uma tendência a
assemelhar Vygotski aos pensamentos neoliberal e pósmoderno.
Quanto à obra mesma de Vygotski, sabese que nos anos de 1921 a 1923 um
escrito sobre psicologia e educação, Psicologia Pedagógica (2003)152, foi preparado por
este autor para subsidiar suas aulas em forma de um “breve manual” como ele mesmo o
chamou. Ele o escreveu quando tinha 27 anos. O livro aborda muitos aspectos estudados
na formação de educadores/as da época. Segundo Blanck, em prefácio deste livro, seu
destino era o de substituir o velho sistema educacional prérevolucionário.
152
No Brasil a primeira edição de Psicologia Pedagógica (2001) não foi comentada. A edição citada aqui,
a de 2003, é comentada por Guillhermo Blanck, permitindo uma melhor compreensão de sua condição
histórica. Segundo Facci (2004, p. 172173) esta versão é traduzida do espanhol para o português. A
versão de 2001 – afirma – não possui tais comentários, além de que possui o acréscimo de dois capítulos,
que introduzem temas e conceitos desenvolvidos por Vygotski em fases posteriores de sua produção. Tais
mudanças interferem na apropriação de suas informações enquanto documento histórico.
114
entanto, entendia também que a relação entre psicologia e educação se transformaria, pois
haveria uma relação, mais equilibrada, de mútua colaboração e respeito.
El nuevo sistema no tendría que esforzarse pro extraer de sus leyes las
derivaciones pedagógicas ni adaptar sus tesis a la aplicación practica en la
escuela, porque la solución al problema pedagógico esta contenida em su
mismo núcleo teórico, y la educación es la primera palabra que menciona.
Por conseguinte, la propia relación entre psicología y pedagogía cambiaria
considerablemente, sobre todo porque aumentará la importancia que cada una
tiene para la otra y se desarrollarán por tanto, lazos y el apoyo mutuo entre
ambas ciencias (VYGOTSKI, 1997, P144).
Os laços de mútuo apoio entre ambas as ciências, como afirma o autor, estaria
sustentado em uma relação mais íntima entre a teoria e a prática. Com base em seus
avanços teóricos/metodológicos e determinado a aprofundar a saída para o que chamou de
crise da psicologia, tão amplamente descrita por suas análises. Vygotski assim situa a
psicologia:
153
Tradução minha.. “Los giros fructíferos y beneficiosos que acompañan a las crisis científicas llevan
consigo casi siempre otra em la enseñanza y el estudio de esa ciencia. Segundo Marx, em suas Teses
sobre Feuerbach afirma que “toda a vida social é essencialmente prática. Todos os mistérios que levam a
teoria ao misticismo encontram sua solução racional na práxis humana e no compreender desta práxis”
(MARX, 1984, p. 109).
154
Neste caso, Vygotski se referia aos testes de inteligência, ainda hoje utilizados. Sobre os testes
afirmou o seguinte: “Por mais insignificante que seja o valor prático e teórico da escala de medição de
Binet, ou de outras provas psicotécnicas, por pior que seja em si o teste, seu valor como idéia, como
princípio metodológico, como tarefa, como perspectiva, é, no entanto, enorme” (VYGOTSKI, 1997,
P.357).
115
obras que analisava, em nome do que ele defendia: “a filosofia da prática”. Assim
também via a escolarização.
155
Facci (2004, pp. 161170) mostra a influência que o Plano Dalton, criado nos EUA, teve a na
pedagogia soviética. Ela detalha o plano e as controvérsias e críticas geradas devido a importação de uma
versão pedagógica vinda de uma país classista. No entanto, até mesmo o próprio Vygotski foi
influenciado, em certo momento de sua trajetória pelas idéias deste plano também da Escola Nova,
segundo a autora.
116
CAPÍTULO IV
Sabemos que todo processo grupal passa por etapas, mais ou menos semelhantes,
conforme pesquisas realizadas pela psicologia social e grupal. Cada turma é um processo.
E o próprio coletivo de educadores/as da escola, por trabalhar em conjunto, também vive
e desenvolve seu próprio processo. Várias turmas funcionam ao mesmo tempo. Seus
movimentos próprios se entrecruzam com os movimentos das outras, assim como se
organizam dentro de um sistema maior e mais complexo, que é o Instituto. A
intencionalidade relativa à formação humana está contida neste todo, subdividido em
dezenas de pequenos processos, dando corpo à dinâmica geral.
La personalidad del hombre ‘es producida’, o sea, es creada por las relaciones
sociales que entabla el indivíduo en su actividad. El hecho de que, al mismo
tiempo, se vayan transformando y cambiando también algunas de sus
peculiaridades como indivíduo no constituye la causa, sino la consecuencia
de la formación de la personalidad (LEONTIEV, 1995, p 138).
156
De acordo com este princípio a avaliação também deverá expressar a dupla atuação, pessoal e
coletiva.
122
do indivíduo para com as condições particulares de sua existência, mediadas pela relação
consciente com as objetivações do gênero humano.
No entanto, a noção de indivíduo natural, que busca ser superada pela proposta
educacional dos Movimentos Sociais, está no centro da concepção liberal de sociedade, e
seu sentido está representado por um ser que vive de forma isolada, independente da
relação com seu entorno. Segundo Löwy (2003, p.30), Durkheim, um positivista clássico,
passa sem hesitação das leis da seleção natural às ‘leis naturais’ da sociedade, e dos
organismos vivos aos ‘ organismos sociais’. A “naturalização” da sociedade e da ciência
124
Deriva daí uma noção de indivíduo isolado, cuja sobrevivência e êxito dependem,
apenas, de suas características próprias e de seu esforço pessoal. Seguindo esta visão, a
psicologia clássica, dedicase, em geral, a intervir na vida de um ser humano, com o
objetivo de ajudálo a superar individualmente suas próprias limitações para adaptarse
socialmente. Muitas vezes as soluções dos problemas permanecem no nível da
interpretação sem, contudo, haver uma busca de mudanças na vida material.
157
A dialética materialista entende a relação entre o singular e o geral, segundo Triviños (s/d, p.74) da
seguinte maneira: a) Que o singular e o geral estão presentes numa mesma formação material; b) Que o
singular e o geral não existem independentemente nas coisas: estão relacionados. c) Que o singular indica
as diferenças que existem nas formações materiais, e o geral, o que a torna semelhante às formações
materiais; d) A correlação do singular (o que estabelece a diferença entre as formações materiais, o que é
único de uma determinada formação material) e do geral (o que determina a semelhança de uma formação
material com outras formações materiais) constitui o particular. Nestes termos, o particular é a coisa
mesma, é a própria formação material. Isto quer dizer que o singular apresentase sempre como particular.
125
158
A psicologia “sócio histórica toma como base a psicologia Históricocultural de Vygotski (1896
1934)”, afirma Bock (2001, p. 17). A denomi nação “sócio histórica” foi assumida principalmente por um
conjunto de pesquisadores da PUC de São Paulo que considerou que o termo “histórico cultural”
acunhado por Vygotski não representava as características teórica marxistas, presentes na psicologia
soviética e porque o termo cultural contém várias conotações, inclusive sendo utilizado por teóricos que
criticam o marxismo. Por outro lado, um outro conjunto de pesquisadores defende a conceitualização
original, por entender que este foi o termo utilizado por Vygotski justamente para caracterizar sua teoria,
em função dos debates da época e que são considerados atuais. Em meu trabalho, tomarei o termo
original, psicologia históricocultural, utilizado pelo próprio Vygotski.
129
Ainda que esta separação proposta possa ser didática ao enfatizar este ou aquele
aspecto da relação teoria e prática, a noção apresentada dá margem à compreensão de que
ler, estudar teoria não seria, também, uma atividade prática. A escola é um espaço cuja
principal função é a de possibilitar a apropriação do conhecimento produzido pela
humanidade. A linguagem, utilizada pelo educador/a, é seu instrumento de trabalho.
Através das teorias ela possibilita ao educando/a o conhecimento do mundo e da prática.
O educando/a vive nela um processo de aquisição longo e lento, que vai pouco a pouco
modificando sua forma estrutura mental e forma de compreender e atuar no mundo:
Neste momento, a grande questão que norteava meu trabalho era como por
em prática tudo o que estava a aprender, tanto em conhecimento, como em
vivência dentro do curso, no dia a dia do acampamento, dentro da escola e na
minha própria vida (p. 89). A ponte entre conhecimento sistematizado e a
realidade concreta, isto me possibilitou ao longo do curso construir uma
leitura, aperfeiçoando e desconstruindo visões equivocadas que fui
construindo ao longo da vida, a partir disso, reconstruir conceitos e categorias
que me ajudam a reolhar esta realidade, agora não com um olhar ingênuo e
superficial, mas com a historicidade que nesta há e que não podemos ignorar
se queremos transformála (SILVA, 2005, p.2223). 159
Desta forma, a prática não é vista por ela mesma, mas ela se torna resultado
de reflexões, acúmulos teóricos e de relações que ao longo desta construção
vem se configurando. Cabe ressaltar nesta reflexão um aprendizado
159
SILVA, Katiane Machado da. Nunca diga não para um sonho. Memorial dos Aprendizados.
Veranópolis: ITERRA, set/2005.
130
A separação entre teoria e prática é artificial devido a que, na verdade, toda prática
tem, detrás de si, uma forma de compreensão espiritual, mesmo que vinda do senso
comum. Isto não quer dizer que a apropriação de uma nova teoria não implique em
mudanças de fundo, que geralmente tardam a ocorrer, tornando estes processos de
apropriação teórico/práticos temporariamente distanciados. Como afirma Vázquez:
160
LUZ, Marisa de Fátima da. Síntese dos Aprendizados do Curso. Veranópolis: ITERRA, set/2005.
161
Pelo “fato de que nosso conhecimento se encontra vinculado à necessidades práticas, o pragmatismo
deduz que o verdadeiro se reduz ao útil, com o qual mina a própria essência do conhecimento como
reprodução na consciência cognoscente da realidade, mesmo que somente possamos conhecer esta
realidade –reproduzi la idealmente – em nosso trato teórico e prático com ela. É preciso advertir que, por
outro lado que, fiel ao ponto de vista do sentido comum, do “homem da rua”, o pragmatismo reduz o
prático ao utilitário com o qual acaba por dissolver o teórico no útil”. (p. 171). Vázquez reconhece que
alguns marxistas conceberam de modo pragmático a relação entre teoria e prática ou seja, a teoria como
justificativa e não propriamente como esclarecimento e guia de uma práxis que, ao mesmo tempo, a
fundamenta, e enriquece [...].
131
O terceiro, por sua vez, reafirma a idéia de partir da realidade. Porém, como o
próprio documento alerta, este tem sido um tema polêmico e que tem gerado críticas. Para
avançar nesta reflexão, que o próprio Movimento considera “nova” para ele, procura
esclarecer que “a produção do conhecimento sobre a realidade” proposta como princípio,
abrange o mundo como realidade, partindo da vida concreta do assentamento, para quem
mais interessa o conhecimento produzido.
realidade concreta daquele ser que estava em nossa frente” (Zaparoli, 2005,
p.3).162
162
ZAPAROLI, Rita Cristina Riffel. Memorial dos aprendizados. Veranópolis: ITERRA, set/2005.
163
Anotações de Diário de Campo, 3/11/2006.
164
No entanto, Kosik (2002) alerta para o falso concreto, ou a pseudoconcreticidade: "(. . .)a práxis
utilitária imediata e o senso comum a ela correspondente colocam o homem em condições de orientarse
no mundo, de familiarizarse com as coisas e manejálas, mas não proporcionam a compreensão das
coisas e da realidade" (p.10). "No mundo da pseudoconcreticidade aspecto fenomênico da coisa, em que a
coisa se manifesta e se esconde, é considerado como a essência mesma, e a diferença entre o fenômeno e
a essência desaparece" (p.12).
133
sistemática, afirmam Sanches e Kahhale (Ibidem, p. 23), Titchener tinha como objetivo
descobrir a natureza das experiências elementares, reduzir os processos conscientes aos
componentes mais simples ou básicos, determinar as leis mediante as quais estes
elementos se associam, e, finalmente, conectálos às suas condições fisiológicas. Sua
concepção de consciência também estava, assim como a de Wundt, presa à idéia de
natureza humana.
A psicanálise, por sua vez, fundada por Sigmund Freud (18561939), questionou a
consciência como única expressão da natureza humana e como determinante das ações
humanas (SANCHES E KAHHALE, 2001, p. 28). Suas raízes estão na medicina. Freud,
em sua prática clínica, passou a hipotetizar a existência de algo além da consciência como
intrínseco ao ser humano, ou seja, o lado oculto da mente, afirmam os autores. Ignorado
por outras correntes da psicologia, o inconsciente foi um dos aspectos mais relevantes da
psicanálise também influenciada pelo mecanicismo e pelo determinismo, pois
considerava que toda ação humana tinha uma causa, consciente ou inconsciente
(SCHULTZ; SCHULTZ, 1981, p. 259). Mais do que buscar a origem da consciência, a
maioria das teorias psicológicas, na época, posicionavase diante da possibilidade de
abordála cientificamente com restrições.
Duarte (2000, p. 2) mostra, em seu livro Vygotski e o “ap render a aprender”, já referido
anteriormente neste trabalho. O autor crítica às apropriações neoliberais e pósmodernas
da teoria vygotskiana e faz denúncias a respeito da apropriação de Vygotski no Brasil.
Segundo Duarte (1981, p. 81).
Havia pouco espaço para uma psicologia da consciência nos EUA, naquela época,
assim como há pouco espaço para uma psicologia marxista atualmente.
165
A educanda cita Paulo Freire.
166
QUEIROZ, Denise. Relatório de práticas pedagógicas com crianças. Curso de Pedagogia.
UERGS/ITERRA, 2005.
138
somente são utilizados para a comunicação por meio de sinais. Ninguém pensará, afirma,
mediante sinais de bandeiras nem estudará em manuais escritos segundo o alfabeto
Morse.
ou simbólico) é utilizado por outro ser humano, para determinados fins, para mediar sua
relação com o outro e com a natureza. O educador/a, através dos instrumentos de
mediação, é o outro que realiza, segundo Vygotski, uma “at ividade mediata”, indireta
(1995, p. 90). O educador “reorganiza a atenção da criança” (LURIA, 1987, p. 96),
orientando a busca do conhecimento.
Vygotski definia, segundo Luria (1998, p.26) seu modo de estudar a psicologia
como “Ins trumental”, que se refere à natureza basicamente mediadora de todas as funções
psicológicas complexas. “Cult ural”, que
142
“His tórico” que fundese com o cultural. São os instrumentos que o homem usa
para dominar seu ambiente e seu próprio comportamento. Foram inventados e
aperfeiçoados ao longo da história social do homem.
A criança pequena, enquanto realiza algo, o faz em voz alta, e em uma contínua
conversa. Quanto mais complexas as tarefas a serem realizadas, maior necessidade da
linguagem.
167
Nos experimentos de Köhler com os macacos, eles dependiam da visualização de todos os objetos
para realizar a tarefa, o que os tornava, segundo esta pesquisador “escr avos de seu próprio mundo
visual”, (VYGOTSKI , 1995, p. 53)
145
amplia com a linguagem, libertando o ser humano das amarras da percepção imediata da
situação. O emprego de signos auxiliares, de instrumentos simbólicos modifica a relação
com o ambiente e, conseqüentemente, modifica a ação, que se organiza em função da
relação entre diversos elementos, afetando o tempo de resposta e a sua forma e conteúdo.
Ao contrário das concepções identificadas como espontaneístas, para Vygotski (1995, p.
7778), as operações psicológicas não aparecem como resultado de pura lógica. A criança
não as inventa nem descobre sob a forma de uma percepção repentina ou uma brilhante
suposição (a chamada reação “Ah!”). A criança não é capaz de encontrar repentinamente
a relação existente entre o signo e o método para usálo e tampouco desenvolve de
maneira intuitiva uma atitude abstrata, derivada, “de las profundidades de la mente del
niño”. Nesta visão o sistema psicológico e as funções superiores existem antes que
qualquer experiência.
Para alcançar seu objetivo de ser um ambiente educativo o IEJC oferece uma
diversidade de atividades, práticas e teóricas. No método estão descritas várias situações
de aprendizagem exercidas no seu dia a dia, a saber:
168
Nesta passagem é possível perceber uma certa semelhança à influência da Escola Nova, como
aconteceu com a educação Russa, que se contrapunha à escola tradicional.
148
Com base nas pesquisas, Vigotsky aponta a descoberta e uma nova forma de
compreender e de lidar com a relação desenvolvimento e aprendizagem. Assinala que não
desconhece as evidências que demonstram que a aprendizagem deve ser coerente com o
169
Ver ANEXO III.
170
Oficina de Capacitação Pedagógica
149
nível de desenvolvimento da criança. Desta forma, aceita como ponto de partida “o fato
fundamental e incontestável de que existe uma relação entre determinado nível de
desenvolvimento e a capacidade de aprendizagem” (Vigotsky, 1998, p.111).
O modo de utilização da noção de ZDP por alguns autores, adverte Smolka, deixa
entrever uma concepção deste construto como um espaço localizado de atuação, uma
região determinada de aprendizagem. Smolka (2001, p. 282) questiona a relação teoria
empiria em que existe uma tendência a “apl icar” construtos teóricos à realidade empírica,
engessandoos, retirandolhes o movimento. Tanto o desenvolvimento quanto a
aprendizagem estão em contínua relação e influência. Na medida em que os processos de
150
Com estas reflexões penso ter formulado algumas das bases teóricas, no campo
psicossocial, e também da psicologia, principalmente através das teorias de Vygotski e
Leontiev, para a análise da experiência de formação de educadores, no curso de
Pedagogia oferecido pela UERGS/ITERRA, com destaque para os fundamentos
psicossociais desta formação. A noção de desenvolvimento destes autores está presente na
Pedagogia da Terra. Como afirma um educador/a,
crescem os desafios, crescem os esforços para encontrar as saídas. Como relatou o mesmo
educador, há, no momento atual, um esforço no sentido de sistematizar a experiência
acumulada até agora no IEJC, para, a partir de sua análise, poder tomar, coletivamente,
novas decisões. Em suas palavras,
o desenho acho que ta bem posto, mas, na prática as vezes não consegue ser
tão conseqüente, porque tem a dificuldade de a gente firmar... e quinhentas
coisas, etc. [...] a gente ainda não equacionou bem essa parte de como. [...] tu
pega um curso onde quem coordena já tem bastante estrada, e a própria
pessoa que fazia aula com os professores, então é o processo de condução do
processo, de discussão dentro de um processo, mas ali tem a estratégia geral.
Agora quando essa função é delegada pra dentro da escola, onde as pessoas
têm que coordenar três, quatro processos simultâneos, [...] é desumano, exigir
[...] se consiga ir tão fundo na interlocução com os professores, pra
efetivamente conduzir dentro da estratégia mais geral. Claro que há
condução, mas aí não é tão seguro como poderia ser. Então essa é uma
dificuldade histórica que nós temos. Nós temos 11 turmas em andamento aqui,
todos os (educadores/as) internos também são estudantes. Que autoridade nós
temos de exigir que as pessoas além de dar conta de seu curso, dos estágios,
dos filhos [...] todos os internos tem que coordenar duas, três, quatro turmas,
não simultaneamente, mas ao longo do ano elas estão metidas em três, quatro,
cinco processos. (Entrevista Educador K., 23/9/2005).
é importante levar em conta que cada um aprende do seu jeito, no seu ritmo,
pois cada pessoa é resultado de suas experiências vividas e assimiladas como
aprendizado. A aprendizagem depende do meio, das relações e da qualidade
dos estímulos/desafios que as pessoas vão recebendo ao longo de sua vida.
Por isso as pessoas desenvolvem diferentes maneiras de pensar e de trabalhar.
Para compreendermos o desenvolvimento de um educando é necessário
considerar: o espaço em que ele viveu; a maneira como ele construiu e
assimilou significados; a sua atual visão de mundo; as suas práticas culturais,
etc. (Idem, p.67).
171
Tratase de um integrante dos Movimentos Sociais que acompanha o desenvolvimento das atividades
educativas e contribui para o processo de formação da turma. Sua tarefa é a de observar o funcionamento
do grupo, as dificuldades, o cumprimento de objetivos, etc. Em geral esta presença causa estranhamentos
152
no grupo, que com freqüência rejeita a presença deste observador. Por esta razão, a Turma José Martí
alcançou o momento de autoacompanhamento, significando um grau maior de maturidade, e de
capacidade de autoavaliação do processo, como de projeção de ações (Memória da Turma, 2005, p.17).
172
Anotações de Diário de Campo, 14/07/2006: Comentários de educador/a, a respeito do Método
Pedagógico.
153
Mas a gente vai para aprender olhar para as pessoas, a gente mudou o olhar
das relações, a valorizar os seres humanos, entender porque eles são assim,
porque às vezes a gente faz sem perceber... qualquer um pode sair daqui
tranqüilo para dar aula, porque eu também sei fazer esse trabalho, acho o
conhecimento que tem aqui garante isso, mas, mais do que isso, é um
conhecimento político,formação política, de entender a posição de força, a
sociedade, e as classes e conseguir ver mesmo o que realmente tem que ser
feito (Educanda R., entrevistada em 16/09/2005)
O sentido individual, forjado no âmbito coletivo, adquire novas formas, pois seu
significado coletivo também vai se transformando através do método e todas as outras
objetivações cotidianas. Encontramos que as significações, que são o reflexo das relações
sociais internas da escola, impactam o sentido individual e levam o educando/a a tomar
consciência de sua forma de ser na medida em que toma consciência do lugar em que
está, das relações que lhe afetam e das implicações de estar aí.
Leontiev (1978, p. 97) adverte, ainda, que não utiliza o termo motivo para
designar um sentimento de necessidade, mas para designar “aquilo em que a necessidade
se concretiza de objetivo nas condições consideradas e para as quais a atividade se
orienta, o que a estimula”. As necessidades, geradoras de atividades, não determinam o
objeto. Este depende das condições e do motivo. A ação, dirigida a um objeto, define este
último como motivo. Quando está claro o motivo de uma ação, ou seja, aquilo que
realmente motiva um ser humano, temos o sentido pessoal da mesma, constituído
mediante as apropriações das significações, através da atividade.
Ali começava uma nova vivência e experiência do coletivo. Ter que repartir
um quarto com outras companheiras, os objetos, as diferentes espaços, sala
de aula, refeitório, trabalho, casa, enfim tudo era novo, no começo fiquei
muito apavorada, pois nunca pensei, refleti sobre o que é um coletivo, a vida
que eu levava antes de conhecer esta realidade era somente para algumas
pessoas, até vivi a experiência do coletivo, mas nunca foi trabalhado o
coletivo como algo importante na nossa construção enquanto sujeitos do
processo, sem contar minha individualidade, e a dificuldade de partilhar
minhas idéias, angústias, alegrias com outras pessoas, a coletividade é algo
descentralizador (p.1)174.
173
ANDRIOLI, Liciane. Memorial dos Aprendizados. Veranópolis: ITERRA, set/2005. O memorial de
aprendizado é um documento produzido individualmente e avalia os aprendizados ocorridos.
174
ZAPAROLI, Rita Cristina Riffel. Memorial dos aprendizados. Veranópolis: ITERRA, set/2005
(documento não público).
156
A cada dia fomos vivendo novas coisas, como aprender a construir textos
coletivos, produzir conhecimentos juntos, se ajudar, pesquisar, e em
contrapartida, também, aprendermos a dificuldade que é tomar decisões
coletivas como foi o nome da turma (p.4). [...] A vivência neste coletivo tem
me possibilitado reorganizar minha vida, trazendo esta para dentro dos
objetivos comuns que tenho junto ao MST (p.17)175.
175
SILVA, Katiane Machado da. Nunca diga não para um sonho. Memorial dos Aprendizados.
Veranópolis: ITERRA, set/2005.(documento não público)
176
PURPER, Fabiane. Memorial dos Aprendizados. Veranópolis: ITERRA, set/2005. (documento não
público).
157
Cada aspecto abordado tem sua face emocional. Cada momento do curso tem seus
aspectos psicológicos. Cada educando/a decide, escolhe participar do curso diversas
vezes. E cada escolha é uma superação. Aqueles que chegam até o final, apresentaramse
transformados.
158
CAPÍTULO V
177
Ver Ribeiro (1999)
178
Ver sobre Josué de Castro: ITERRA, 2003.
179
A Turma II foi formada por 62 alunos (38 MST; 9 MAB; 9 MMC; 3 PJR; 2 MPA; 1 MTD) e
a faixa etária corresponde à média de 25 anos de idade.
159
QUADRO VI
EDUCANDOS DA TURMA – JOSÉ MARTÍ
PJR – Pastoral da 7 educandos/as
Juventude Rural
MST – Movimento 29 educandos/as 5 desistiram
dos Trabalhadores durante o curso
Rurais Sem Terra
MAB Movimento 7 educandos/as 3 desistiram
dos Atingidos por durante o curso
Barragens
MMC – Mo vimento 11 educandas 5 desistiram
das Mulheres durante o curso
Campesinas
MPA – Movimento 4 educandas 1 desistiu durante o
dos Pequenos curso
Agricultores
MTD – M ovimento 2 educandas
dos Trabalhadores
Desempregados
TOTAL 60 14
Mudanças de uma etapa para outra podem ser observadas através das metas de
aprendizagem quando destacamos os aspectos que dizem respeito à formação humana
presentes no PROMET (Projeto Metodológico), elaborado a cada etapa, para orientar a
atuação do grupo e a avaliação posterior. É possível observar o aumento da complexidade
nas tarefas de aprendizagem, dos conteúdos, das vivências coletivas, assim como de
produção e solução de problemas. A atenção voltada para o fortalecimento do grupo, para
a relação indivíduo/coletivo se aprofunda juntamente com metas de domínio da relação
teoria e prática.
QUADRO VII
Focos do processo pedagógico e metas gerais de aprendizado da etapa
ETAPA I b) Respeitar combinações e decisões tomadas no coletivo;
d) Demonstrar interesse em ajudar na solução de problemas da coletividade
da turma do IEJC.
ETAPA c) Respeitar combinações e decisões tomadas no coletivo;
II e) qualificar a atuação dos grupos de estudo, constituindoos como espaços
de construção coletiva das aprendizagens e de entre ajuda nas dificuldades
encontradas;
163
Etapa I
180
Este elemento da democracia foi analisado mais amplamente por Miranda (2001). O tema dos Núcleos
de Base é um elemento de importância para a compreensão do currículo da Pedagogia da Terra.
181
Cada educando/a assume uma tarefa no funcionamento da escola. Os que saem entregam o posto para
os que chegam.
164
Formamse os NBs, que vão funcionar durante todo o curso. São distribuídas
atividades, responsabilidades, organizados horários, reuniões, etc. Os educandos/as que
estão saindo entregam suas funções para aqueles que estão chegando. Entregam a
responsabilidade sobre cada item do patrimônio, assim como estudam as regras de
funcionamento e relações humanas, comportamentos, indivíduo e coletivo. O impacto da
chegada na escola ocorre devido, em primeiro lugar ao afastamento da família e do lugar
de origem. Muitos deixaram filhos com os companheiros ou parentes.
Eu fiquei sabendo que eu viria pra cá uns quinze dias antes de vir, e aí esse
período que antecedeu a minha chegada aqui foi um período de me organizar
com meu companheiro, com minhas crianças Nesse período nós estávamos
num acampamento dos desempregados em Caxias, o acampamento estava com
sete, oito meses, com oitenta e poucas famílias, lutando por um assentamento
Rururbano, e nós morávamos permanente no acampamento, eu com minhas
crianças e meu companheiro que nesse período tava trabalhando num
esquema que envolvia viajar e ficar fora de casa, tava no Paraná. E ai eu vim
pro curso, acabei deixando as criança com pessoas do acampamento durante
a semana, ai no final de semana meu companheiro vinha, tomava o pé da
situação e tudo. Então uma das coisas que já é marcante é essa relação, de
vim, de sair de casa, de deixar os filhos, de deixar o marido, de sentir que as
coisas não ficavam bem lá do jeito que ficava. Então essa é uma primeira
angústia da vinda. E também[...]ficar sessenta dias fora de casa, então é
muito sofrimento só de pensar. [...] Então dava muita briga aqui dentro, na
primeira etapa não era raro encontrar alguém chorando de saudade, de
tristeza com... e tinha que agüentar o sofrimento.(Entrevista Educanda ,
S.,12/09/2005)
O contato com a escola coloca os educandos/as diante de uma série de tarefas que
têm como objetivo redimensionar o cotidiano, as relações, o caráter. Tudo, desde o
primeiro dia é radicalmente diferente de tudo o que se vivia anteriormente. Ocorrem
reações positivas e negativas. Porém, mesmo para aqueles mais receptivos, existem
dificuldades profundas e reais para enfrentar as novas regras estabelecidas.
Tudo era novo no mundo em que nos propomos a viver e nos construirmos de
um jeito diferente. O IEJC enquanto esse mundo novo, por fazer
conjuntamente a sua gestão também nos colocou desafios. Para o Primeiro
Encontro geral182 do qual participamos, ficaram alguns medos e significações.
Antes do Encontro estudamos nos nossos NBs as prestações de contas do mês
anterior, os orçamentos do mês seguinte e fizemos vivência social. Esta, uma
espécie de crítica e autocrítica para que cada um e cada uma ajudasse e fosse
ajudado pelos demais na sua melhor construção como lutadores/as e como
seres humanos. O Encontro da Coletividade do Instituto tem uma mística
própria e se constitui como um espaço pedagógico de aprendizagem sobre
como gerir uma escola. É a Assembléia para decisões e apontamentos.
Porém, não tínhamos essa compreensão, fazendo com que ficássemos muito
tensos nos momentos do encontro, a própria dinâmica era organizada de uma
maneira formal que dificultava a participação das pessoas nas decisões e
particularmente em nossa participação já que éramos novos no Instituto.
(ITERRA, 2005, p.22).
182
Encontro realizado para prestação de contas e orçamentos.
166
Dentro do NB, no começo nós não entendíamos direito como foi, e nem a sua
função. Mas com o tempo a gente foi percebendo que o NB não era só um
espaço. Até porque dentro do NB as pessoas se falam. E no grande grupo, nós
temos até hoje pessoas que não falam, não se inscrevem, não dão sua opinião.
E dentro do NB é totalmente diferente a relação, é onde são colocadas as suas
opiniões, e levantadas propostas. E outro aspecto é que quando está com
algum problema, acaba levando mesmo para o NB, e que o NB acaba se
ajudando dentro do nosso NB mesmo. O NB que mais tem filhos é o nosso. As
mães falam com muita dificuldade, então vamos discutir também os problemas
das mães, e discutimos; e chegamos à avaliação que o NB teria que contribuir
para as mães (Entrevista Educanda J., 10/09/2005).
tenha participação de fato no coletivo, senão ele vai com as outras, e fica por
isso mesmo (Entrevista, educanda e educadora M., 2/11/2004))
A primeira atividade realizada nos NB´s foi a socialização das histórias de vida,
no intuito de melhorar a convivência. Como resultado, muitos passaram a se comprometer
mais com a coletividade. A Etapa Preparatória183 foi emendada a Etapa I, totalizando 72
dias de Tempo escola. Durante a primeira etapa ainda houve muitos desentendimentos e
individualismo, o que refletiu na construção do Parque Infantil, espaço para ser utilizado
pela Ciranda Infantil. Os primeiros dias no Instituto foram marcados por inúmeros
conflitos entre os educandos/as: problemas em relação a horários, a organização do
coletivo, ao cumprimento das tarefas, etc. A inserção184 e construção coletiva do IEJC
representaram um desafio para os educandos/as, pois muitas vezes havia a sobreposição
dos interesses pessoais sobre os coletivos. Uma grande tarefa era a de apropriarse do
sentido do trabalho coletivo e que este pode estar, de alguma maneira, em sintonia com os
interesse particulares.
183
Todo curso tem uma Etapa Preparatória que dura, em geral, duas semanas, para conhecer o Método e
a estrutura da escola.
184
Tratase de introdução dos educandos/as nas atividades do instituto, da distribuição de tarefas e
responsabilidades, durante o Tempo Escola.
168
185
Avaliação individual, realizada em grupo.
186
O primeiro seminário de Crítica e Autocrítica estava planejado para esta etapa, no entanto, ele só vem
a ocorrer na etapa seguinte (II).
187
É quando a turma que vai para o TC entrega o patrimônio e as responsabilidades.
169
Etapa II
Essa etapa iniciou em 02 de julho de 2002, com o Tempo Escola, após a volta do
TC da Etapa I. nessa fase o processo de inserção no IEJC foi menos difícil, pois os
educandos/as já conheciam o Instituto e seu funcionamento. Foram realizadas Noites
Culturais, geralmente aos sábados à noite, o que se constituiu como importante espaço de
relação com o coletivo. O domingo era dia de organização pessoal, reuniões, atividades
de sobrevivência feita pelos NB´s (limpeza e alimentação, por exemplo).
Os componentes curriculares desta etapa foram ligados a história do Brasil
enquanto formação social e educação. Em alguns destes componentes houve dificuldades
com os educadores/as. Para a realização da pesquisa a turma foi dividida grupos
temáticos: infância, jovens, adultos, educadores/as e idosos. A pesquisa teve continuação
no TC, com a observação dos sujeitos escolhidos para cada grupo. Esta foi a pesquisa de
construção da monografia dos educandos/as. Esta foi a etapa também em que houve a
primeira crítica e autocrítica da turma. Segundo Rosana, uma das educandas,
a critica e autocritica é um sei lá.... parece que tira uma mascara, tira tudo,
tira o pano da frente, porque assim: imagine, chegar nós que é acostumado lá
plantá roça, não existe esse tipo de coisa,nem mesmo no movimento a gente
não tem isso, esse processo de fazer critica e autocrítica e ai a gente sempre se
acha o sabido, porque não tem limites. Na primeira (etapa) nós não tivemos.
Na segunda etapa que nos tivemos a primeira critica e auto critica e que foi
um... foi muito choro, começam a te dizer as verdades,onde nunca ninguém
disse, que você tem esse limite e você tem que mudar nisso, porque esse é o
coletivo se você queria uma coisa individualizada, esse não é o espaço. Mas
que é um processo que hoje eu levo como uma experiência de vida porque é só
ali a gente consegue..., não sei se é só ali, mas ali é um dos espaços muito
interessante (Entrevista Educadora R.; 14/09/2005)
experiência e tornála própria. Surge, ao mesmo tempo, um fascínio pelo método e pelas
propostas da escola, aliado à falta de domínio do mesmo, o que provoca fortes
contradições, próprias da relação entre a aprendizagem e o desenvolvimento. São
contradições entre as novas concepções e as possibilidades de tornálas fonte de leitura da
realidade.
Etapa III
do conflito, um salto de qualidade nas relações. Observase que a cada etapa a turma se
reorganiza e assume, pouco a pouco, com avanços e retrocessos, o caráter de grupo. Após
a etapa em que foi feita a críticaautocrítica a turma adquire outra organização interna,
possibilitando o posicionamento e ações coletivas. Ocorre um importante processo de
aprendizagem que não está presente na base curricular.
Houve uma plenária chamada pela turma de “p lenária dos desabafos” (ITERRA,
2005, p. 30), com o objetivo de socializar os conflitos pelos quais estavam passando.
Várias pessoas mencionaram o cansaço e esgotamento devido às tarefas que tinham que
executar e assim, questionaram o método da escola. Alguns consideravam que o trabalho
era cansativo e por isso dificultava o estudo e a aprendizagem, o que levou todo o coletivo
a discutir sobre o assunto. Nas palavras de uma das educandas, que observa o conflito
entre aqueles que assumem os objetivos do método e os objetivos pedagógicos, e os que
não:
eu acho que é uma situação conflituosa, de tensão, como todo espaço que tem
a relação do individuo e do coletivo, porque o coletivo existe na medida em
que existem vários indivíduos com mesmo objetivo né, é isso, acontece que,
cada indivíduo tem objetivos, alguns estão ligados ao coletivo outros não, e
aqueles que não estão ligados com os objetivos dos outros, que estão em
coletivo, entram em choque, entram em conflito, e aí que se criam os conflitos
aqui dentro por exemplo, um outro espaço também, e é eu acho que a escola, a
partir do método que ela usa ela consegue colocar as pessoas, até no seu
limite, de entender os seus objetivos individuais, e como eles estão ligados
com os objetivos coletivos, e quando ela coloca no limite, é quando o
educando tem que responder, e porque que eu vou optar, porque que eu vou
optar, se eu vou seguir em frente ou, eu acho que a nossa turma aconteceu
isso, no sentido do que muitos desistiram porque não dava pra continuar nesse
conflito. (Entrevista Educanda A.; 10/09/2005)
172
ninguém sai o mesmo depois que passa por aqui. [...]. Tem muitos conflitos,
tem muitas pessoas que demoram até perceber o que é isso tudo, tem
contradições! mas eu não vejo contradição como um problemas, vejo como
algo extremamente saudável desde que eu a perceba e ela me ajude a avançar
pra um novo patamar, mas as vezes a gente se assusta pelo tamanho, pela
grandeza da proposta. Eu me questiono muito, seguidamente me questiono se
estou contribuindo de fato, se eu alcanço aquilo que ta colocado pra ser
implementado pela engenharia toda. [...]as pessoas que saem daqui,
geralmente 80%, assim chutando...elas vão coordenar processos nos estados,
elas vão coordenar nos diferentes setores do movimento, seja o setor de
saúde, seja frente de massas, seja o setor de educação, no de produção, do
curso técnico vai muita gente pra produção. [...] Tem aqueles que a gente não
consegue colocar naquele patamar que a gente gostaria, [...] aí a gente se
pergunta...mas até que ponto a gente conseguiu contribuir nas três dimensões
que nos propomos que uma é a dimensão políticoideológica, a outra é a
capacidade técnica profissional e a formação humana. Mas a gente se
questiona muito, se angustia muito como educador/a, não sabemos até que
ponto estamos de fato contribuindo pra essa luta com esses sujeitos.
(Entrevista, Educadora S., 02/06/2006).
Etapa IV
Esta etapa iniciou em 06 de junho de 2003. Em todo início de etapa havia o Ato de
Abertura e neste dezenove pessoas faltaram, o que prejudicou na inserção da turma no
processo e na organicidade. Quatro educandos/as desistiram do curso, aumentando para
treze o número de desistentes. Com essa diminuição também foi destituído um mais um
NB, ficando cinco núcleos na turma.
Etapa V
188
Novamente o seminário sobre sexualidade e afetividade estava no PROMET, além do seminário sobre
relações humanas, e gênero e classe.
175
questão foi o grave descumprimento dos tempos educativos e falta de disciplina, levando
a turma a “di scutir e tirar encaminhamentos de como tratar o assunto” (p. 38).
Os componentes estudados iniciaram a preparação da turma para as didáticas dos
processos pedagógicos da OCAP189, que ocorreu nesta mesma etapa. Como a coletividade
trouxe muitos conflitos, foi programado um seminário intitulado “Contradições, conflitos
e tensões na construção de uma coletividade”.
Etapa VI
Esta etapa começou em 22 de julho de 2004, faltando 14 educandos, dos quais seis
chegaram durante o Ato de abertura e sete apenas depois. Alguns dias depois a turma teve
a notícia da desistência de mais uma colega, ficando com 45 educandos.
A turma teve um seminário que os ajudou a entender melhor o método do IEJC,
bem como sua inserção nesse espaço. Novamente foram discutidos problemas com a
pontualidade da chegada nos tempos educativos. O currículo sofreu uma mudança nesse
período, aumentando uma etapa, a justificativa era de que, como a formação deles era em
duas áreas (crianças/ jovens e adultos), teriam que fazer 400 horas com crianças e 400
com jovens e adultos. Como componentes curriculares eles tiveram conteúdos centrados
em legislação e políticas públicas.
A turma foi convidada a fazer a mística de abertura da II Conferência Nacional de
Educação do Campo – CNEC. Durante este evento a turma teve contato com turmas de
cursos dos movimentos de outros estados.
Nesta etapa 22 educandos apresentaram suas monografias e todos foram
aprovados. Os que não apresentaram continuariam seus trabalhos para apresentar na etapa
seguinte.
Esta foi uma etapa de poucos componentes curriculares e muitos seminários.
Também foi realizado o estágio em Anos Iniciais, em Pontão, Rio Grande do Sul, em sete
escolas da rede municipal e estadual.
Etapa VII
189
Oficina de Capacitação Pedagógica
176
eu ainda não consegui... pra mim essa palavra não existe, só existe
acompanhamento. Porque acompanhar não quer dizer que é uma pessoa que
acompanha outra... chamam de autoacompanhamento porque quer dizer que
não tem pessoa de fora, por isso se diz que a turma se autoacompanha, que
também não é nada muito construído isso, é uma experiência nova. Muito
positiva, a turma parece que se assume mais, mais responsabilidade dos
núcleos por seus membros, e até a noção de todo, ter que fazer essa análise,
que antes também era convidado a fazer, mas que não se detinha tanto a fazer
porque tinha outros responsáveis pra fazer isso. A coordenação ficava mais
em encaminhar as tarefas, encaminhar as discussões, porque a coordenação é
uma instancia e a coordenação dos NBs do Instituto é outra. Então quando
tem um assunto referente ao instituto, tem que ir pra coordenação geral.
Então na lógica de antes a CNBT, que é a coordenação da turma, ficava só
essa ponte pra turma....pra eles fazerem a análise (Entrevista Educanda C.;
10/09/2005)
190
Coletivo de Acompanhamento Político Pedagógico
177
Além de todos esses desafios, os educandos tinham mais um que era a construção
da memória da turma. Grande parte do tempo os educandos deveria ser envolvida na
organização da formatura que seria em 23 de setembro de 2005. Como na etapa anterior,
nesta também houve apresentações de monografias, dezenove pessoas no total.
Ainda nessa etapa, os educandos realizaram mais um estágio, porém, desta vez um
pouco diferente: foi com crianças de escolas urbanas de Veranópolis, o que demandou
muita preparação através de seminários, aulas e discussões. No relato da experiência de
estágio de alguns dos educandos, aparece que:
191
SILVA, Alexandra Borba da. Estágio acompanhado: práticas pedagógicas em anos iniciais com
crianças. Estágio acompanhado com crianças, ITERRA, 2005. (documento não público) .
192
ALMEIDA, Sandro Roque de. Relatório final de estágio realizado em anos iniciais. Estágio
acompanhado com crianças. ITERRA, 2005. (documento não público).
193
RISSO, Edson. Relatório final de práticas pedagógicas com crianças. Estágio acompanhado com
crianças. ITERRA, 2005. (documento não público).
178
A turma teve um estudo intenso sobre o Projeto Político Pedagógico PPP. Eles
fizeram uma reflexão sobre quais elementos teriam sido mais importantes na sua
formação. Os elementos encontrados foram:
Etapa VIII
pelo fato de ser internato, pelo fato de ter a dimensão do trabalho como
intencionalidade, pelo fato de conviver turmas com ênfases diferentes, que dá
um olhar alargado. Pelo fato de as pessoas conviverem aqui e ter que levar
aqui a vida por inteiro, as pessoas não vem aqui só com a cabeça né, elas vem
de corpo inteiro, e com os filhos muitas vezes. Então, o que fica bastante pras
180
Relatar este processo teve um propósito. Dar uma forma, uma identidade para o
grupo que me possibilitou este estudo. Muitos outros aspectos e debates ricos poderiam
ter sido acrescentados, pois possibilitariam uma apropriação mais profunda da riqueza
desta desafiante experiência. Ao mesmo tempo que ela parece ser tão especial e tão
impossível de ser reproduzida para outras realidades, ela possibilita a análise de
limitações da escola pública que são debatidas a partir de experiências ocorridas em
outros países, distantes da nossa realidade. O MST ousou desafiar as condições e fazer
acontecer, concretizar, ocupar o latifúndio do saber. Agora temos um contraponto que nos
desafia a reavaliar a organização do trabalho educativo, nos desafia a rever a educação e,
tal como proponho neste estudo, nos desafia a rever os fundamentos psicossociais que
orientam o trabalho pedagógico, atualmente.
181
ALGUMAS CONCLUSÕES
para os filhos. Atualmente a sua ocupação inicia com os acampamentos que, com a luta
são transformados em assentamentos de Reforma Agrária, adentrando as escolas
municipais, estaduais e, atualmente, ocupando universidades do país.
Como afirmava Leontiev, para encontrar o sentido pessoal de uma ação devemos
descobrir o motivo que lhe corresponde (1978, p. 97). O sentido também está relacionado
às significações que são, por um lado, constituídas nas condições históricas atuais, mas
que, no espaço do Instituto, são retomadas através desta pedagogia. Com isso,
assinalamos que o coletivo toma, na prática pedagógica, na vivência do trabalho e,
sobretudo, nas reflexões, uma nova significação. O aprofundamento do estudo aparece de
forma consistente, tanto nos relatos de aprendizagem, quanto nas monografias dos
educandos/as, que traduzem esta leitura para suas próprias experiências e reflexões.
Uma viva relação das atividades do IEJC com a realidade dos Movimentos
Sociais do Campo, mais do que com a realidade do Campo. A relação dos
educandos/as com suas comunidades acontece em grande medida através dos
184
Podese dizer, portanto, que há uma tensão entre as demandas práticas dos
Movimentos Sociais e as exigências da equipe educadora, que valoriza e
privilegia, em certos momentos, a formação teórico/científica.
A complexidade de Marx não impede que ele seja estudado diretamente nos textos
do Instituto. O mesmo pode acontecer com Vygotski, Luria e Leontiev, e outros
investigadores da mesma concepção histórica, sobretudo nos seminários.
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______. Educação, do senso comum à consciência filosófica, 14ª ed. Campinas, S. P.:
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SMITH, A. A riqueza das nações: investigação sobre a natureza e suas causas. São Paulo:
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SMOLKA, Ana Luiza B.; LAPLANE, Adriana Lia Freszman. Posfácio. In: Vygotsky em
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SOARES, Eliane Veras. A recepção do pensamento de Jean Piaget no Brasil: uma análise
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SOUZA, Marilene Proença Rebello de. A queixa escolar e o predomínio de uma visão de
Mundo. In: MACHADO, Adriana Marcondes; SOUZA, Marilene Proença Rebello de.
Psicologia escolar: em busca de novos rumos. São Paulo: Casa do Psicólogo, 1997.
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TUMOLO, Paulo Sergio. Trabalho: categoria sociológica chave e/ou princípio educativo?
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203
_____. Psicologia Pedagógica: edição comentada. Porto Alegre: Artes Médicas, 2003.
MONOGRAFIAS
ALMEIDA, Rosimeire Pan D´Arco de. A dimensão formativa do trabalho de base nos
acampamentos do MST no município de Iaras. (Trabalho de Conclusão do Curso de
Graduação: Pedagogia da Terra, ITERRA/UERGS), Veranópolis, 2005.
ANDRIOLI, Joceli Jaison José. A luta do Movimento dos Atingidos por Barragens na
Bacia do Rio Chopin: contribuições para o processo de formação dos sujeitos do campo.
(Trabalho de Conclusão do Curso de Graduação: Pedagogia da Terra, ITERRA/UERGS),
Veranópolis, julho de 2004.
REIS, Maria Santa Amador dos. A participação das crianças no MTD Assentamento Belo
Monte. (Trabalho de Conclusão do Curso de Graduação: Pedagogia da Terra,
ITERRA/UERGS), Veranópolis, maio de 2005.
SIGLAS UTILIZADAS
ANEXOS
2
ANEXO I
. Você mudou sua forma de dar aula depois que começou a trabalhar com o MST?
. Sentiu necessidade de estabelecer um tratamento distinto ao conteúdo?
. Percebe a existência de demandas diferenciadas de outros cursos? (ex?)
. Mudou sua forma trabalhar tais temas diante do debate sobre a pedagogia do campo?
. Está familiarizado com a pedagogia do movimento? com os princípios filosófico e
pedagógicos?
. Considera que existem teorias mais afins com o movimento?
. Qual o papel da atividade no processo de aprendizagem? Quais os aspectos pedagógicos
considera mais relevantes para nesta nova pedagogia?
. Qual o papel da linguagem, do coletivo e do indivíduo na formação do educador?
. Como o método pedagógico pode influenciar no processo de formação de um ser
humano integral, omnilateral?
. De que movimento é?
. Motivo de escolha do curso?
. Como foi seu processo de formação, aqui?
4
ANEXO II
CONSENTIMENTO INFORMADO
e Pesquisa da Reforma Agrária – ITERRA, que acontece entre os anos 2002 a 2005, no
Grande do Sul.
ANEXO III
b) Oficinas de capacitação
ao longo da etapa serão realizadas oficinas nas Unidades de trabalho, sempre que
necessário para qualificar a execução das atividades cotidianas do Instituto, e a partir das
demandas apresentadas na organização dos postos de trabalho
8
2) CURSO DE PEDAGOGIA
2.1 Visão geral do curso
O curso de Pedagogia Anos Iniciais do Ensino Fundamental e Educação de Jovens
e Adultos, aqui identificado também como “ Pedagogia da Terra”, é resultado de uma
parceria entre a UERGS e o ITERRA, representando uma conquista política e educacional
dos Movimentos Sociais da Via Campesina/Brasil.
11. Formar, através de nossa prática sujeitos com iniciativa, livres e sensíveis em
busca de sua emancipação humana.
12. Termos uma prática que estimule em nossas organizações o debate sobre a
importância e o papel da educação.
13. Sermos coerentes com as expectativas e os objetivos pelos quais somos
indicados a fazer este curso.
14. Comprometermonnos com a educação popular, compreendendoa como meio
para libertação do povo.
15. Formar educadores/as para atuar a partir das demandas estratégicas da Via
Campesina.
16. Desenvolvemos a compreensão do trabalho e da coletividade como princípios
organizativos e de militância.
17. Desenvolvermos a consciência e a compreensão de que o trabalho, a cultura, o
movimento Social e a experiência da opressão são matrizes que formam e
educam o ser humano, e que é preciso levar em conta estas experiências dos
sujeitos envolvidos.
10
Etapa I (2002.1)
Disciplina: Estudos sóciopsicoantropólogicos sobre a infância
Carga horária: 60h/a
Bibliografia
ARIÉS, Philippe. História Social da Criança e da família. Rio de Janeiro: LTC editora,
1981.
BUJES, Maria Isabel E. Puxando pelo fio da história: A educação infantil em foco.
Polígrafo, 1999.
______. O povo brasileiro: a formação e o sentido social do Brasil. 2ª ed. São Paulo:
Companhia das Letras, 1995.
Etapa II (2002.2)
Disciplina: Teoria do Conhecimento e da Aprendizagem
12
Etapa V (2004.1)
Disciplina: Leitura e escrita Anos Iniciais e EJA: conteúdo e método
Carga Horária: 30hT/30hP = 60h
13
Bibliografia:
ABAURE, maria Bernadete Marques. Cenas de aquisição: o sujeito e o trabalho com o
texto. Campinas: São Paulo. Associação da Leitura do Brasil (ALB); Mercado de
Letras, 1997.
AZENHA, Maria da Graça. Construtivismo de Piaget a Emilia Ferreiro. São Paulo:
Ática, 2001. (construtivismo piagetiano)
BRAGIO, Silvia L. B. Leitura e alfabetização: da concepção mecanicista à
sociolinguística. Porto Alegre: Artes Médicas, 1992.
CAGLIARI, Luiz Carlos. Alfabetização e Linguística. São Paulo: Scipione, 1989.
CHARTIER, AnneMarie et alli. Ler e escrever^entrantdo no mundo da escrita. Porto
Alegre: Artes Médicas. 1996.FERREIRO, Emília & TEBEROSKY. Psicogênese a
língua escrita.. Porto Alegre: Artes Médicas, 2001.
FREIRE, Paulo. A importância do ato de ler. São Paulo: Cortez, 1984
UERGS/ UFES UEM UFRJ UNIFAP UFPR UNICAMP UERN UNB UDES UFRGS
ITERRA C
Sociologia Estudos Geral; Geral; I Introd; Geral; Geral; I e II Fundam. I Geral (I Geral; I
da Histórico I I I e II I Sociol.; e II); e II
educação sóciopsico I I e II
antropológico
s sobre
infância; I
Filosofia I Introd; I I e II Filosofia Introd; I e II I e II Fundam. Invest. Geral (I Introd; I
da I; I e II Filos; Filos. e II); e II
educação I e II I e II Educaçã I e II
o;
I;
Filos.co
m
crianças.
História Estudos I e II I, II e III I e II I e II I e II I, II e III I e II* I e II* I e II I e II*
da Histórico
educação sóciopsico
antropológico
s sobre
infância; Hist.
form.
social; Hist.
form. social
brasileira;
Hist.
form.social do
RS; I e II*
15
Univers UERGS/ITER UFES UEM UFRJ UNIFA UFPR UNICAMP UERN UNB UDESC UFRGS
RA P
Psicologia Estudos Introd; I e II; I e II I, II I e II; Introd; I; Fundam. I; Geral (I e Introd;
da Histórico Educ. Proble e III Fundamentos Psicologia, Psicologia Psicologia II); ICriança pré
educação sócio psicomot mas da educ. educ. e Psico da social na I e II; escolar;
psico ora de especial. pesquisa; Criança; educação; Psi.Des.
antropológ na aprendi Pensamento Psico do Perspecti Infantil I IICriança
icos sobre infância; zagem Linguagem Adolesc; va des. e II; séries iniciais;
infância; Introd a e Des. Psico da humano; IIITeorias da
I educ. Humano; Aprendiz; O educan. aprend.;
especial; Fundamen Educ. com Psicogênese
Bases tos especial. necessidad da leitura e
psicológi da educ. es escrita; Introd.a
cas da especial. especiais; educ.especial;
educ. Avalalia. Psicopedagogia
jovens e educ. do terapêutica I e
adultos; I defic. II.
e II mental.
16
Estudos históricopsico 1 enfoque no desenvolvimento refletir sobre a condição da infância em diferentes contextos;
Antropológicos sobre infância humano na infância; aspectos entender contribuições da psicologia;
históricos, sociais, a criança no desenvolvimento humano;
psicológicos e antropológicos; refletir e interpretar as teorias do desenvolvimento.
contexto sóciocultural.
Estudos históricopsico 1 análise da relação entre existência social e o refletir sobre sua identidade como sujeito do campo;
Antropológicos sobre jovens e modo de ver o mundo, de ler as situações; despertar para um olhar específico às questões da juventude.
adultos
Teoria do conhecimento e da 2 Identificar teorias do conhecimento e suas resgatar o processo de aprendizagem dos MS do campo;
aprendizagem reações com teorias e práticas de análise da aprendizagem no curso;
aprendizagem.
Leitura e escrita nos AI e EJA 3 Compreensão das concepções de Estudo sobre Vygotski;
alfabetização e as formas de linguagem no Pensamento e linguagem;
processo de apropriação da escrita (jovens, Aprendizagem e desenvolvimento.
adultos e crianças).
Leitura e escrita nos AI e EJA – 5 ensino de leitura e escrita com crianças, ampliar compreensão do processo de alfabetização nas
conteúdo e método jovens e adultos a alunos com necessidades dimensões lingüística e psicogenética.
especiais;
Fundamentos da educação especial 7 estudos das políticas públicas e pressupostos compreender a deficiência como fenômeno socialmente
teóricometodológico da educação especial no construído;
Brasil. identificar os tipos de deficiência e necessidades especiais.
Psicologia da educação 8 estudo das principais teorias contemporâneas estudo dos principais sistemas psicológicos contemporâneos;
que buscam explicar os processos de conhecer principais aspectos das teorias do desenvolvimento
desenvolvimento da aprendizagem; e aprendizagem;
analisar criticamente relações entre psicologia e educação;
analisar as práticas pedagógicas desenvolvidas nos estágios
formais do curso identificando questões de aprendizagem e
ensino.
17