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PÂMELA ANNE BAHIA VIEIRA DA SILVA

DETERIORAÇÃO DAS PEDRAS DA


ARQUITETURA MORTUÁRIA DO CEMITÉRIO
NOSSA SENHORA DA SOLEDADE
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ
INSTITUTO DE TECNOLOGIA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ARQUITETURA E URBANISMO

DETERIORAÇÃO DAS PEDRAS DA ARQUITETURA


MORTUÁRIA DO CEMITÉRIO NOSSA SENHORA DA
SOLEDADE

Discente: Pâmela Anne Bahia Vieira da Silva


Orientadora: Prof.ª Dr.ª Thais A. B. Caminha Sanjad
Coorientador: Prof. Dr. Rômulo Simões Angélica

BELÉM-PA
2014
PÂMELA ANNE BAHIA VIEIRA DA SILVA

DETERIORAÇÃO DAS PEDRAS DA ARQUITETURA MORTUÁRIA DO CEMITÉRIO


NOSSA SENHORA DA SOLEDADE

Dissertação de mestrado apresentada ao Curso de


Mestrado do Programa de Pós-Graduação em
Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal
do Pará, na linha Patrimônio, Restauro e Tecnologia
como parte dos requisitos necessários à obtenção do
grau de Mestre em Arquitetura e Urbanismo.

Orientadora: Prof.ª Dr.ª Thaís Alessandra Bastos


Caminha Sanjad
Coorientador: Prof. Dr. Rômulo Simões Angélica

BELÉM-PA
2014
Dados Internacionais de Catalogação-na-Publicação (CIP)
Sistema de Bibliotecas da UFPA

Da Silva, Pâmela Anne Bahia Vieira, 1986-


Deterioração das pedras da arquitetura mortuária do
cemitério nossa senhora da soledade / Pâmela Anne Bahia
Vieira Da Silva. - 2014.

Orientadora: Thaís Alessandra Bastos


Caminha Sanjad;
Coorientador: Rômulo Simões Angélica.
Dissertação (Mestrado) - Universidade
Federal do Pará, Instituto de Tecnologia,
Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e
Urbanismo, Belém, 2014.

1. Monumentos - Conservação e restauração.


2. Monumentos funerários - Belém (PA). 3.
Cemitérios - Belém (PA). 4. Cemitério da
Soledade. I. Título.
CDD 23. ed. 720.288
Pâmela Anne Bahia Vieira da Silva

Deterioração das pedras da arquitetura mortuária do cemitério Nossa Senhora


da Soledade

Dissertação de mestrado apresentada ao Curso de


Mestrado do Programa de Pós-Graduação em
Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal
do Pará, na linha Patrimônio, Restauro e Tecnologia
como parte dos requisitos necessários à obtenção do
grau de Mestre em Arquitetura e Urbanismo.

Data de aprovação: _____/_____/_____

Banca examinadora:

__________________________________________ - Orientadora
Profª. Dra. Thais Alessandra Bastos Caminha Sanjad
PPGAU/ UFPA

__________________________________________ - Coorientador
Prof. Dr. Rômulo Simões Angélica
PPGAU/ PPGG/UFPA

__________________________________________ - Membro externo


Profª. Dra. Eliane Aparecida Del Lama
IGc/USP

__________________________________________ - Membro interno


Prof. Dr. Fernando Luiz Tavares Marques
PPGAU/ UFPA

__________________________________________ - Membro interno


Prof. Dr. Márcio Santos Barata
PPGAU/ UFPA
À Marcela Ribeiro Vieira da Silva, minha
afilhada, que chegou ao mundo em meio às
loucuras finais dessa dissertação, pra me
encher de amor e alegria.
AGRADECIMENTOS

A Deus, em quem creio com todas as forças, a quem recorro e busco em todos os
momentos e por quem sou agraciada e abençoada diariamente.

À minha família, pelo suporte e apoio de sempre, por quem eu busco ser melhor e
motivo de orgulho.

Ao meu namorado, meu amor, Rafael Veiga, pela reciprocidade de sentimentos,


pelos puxões de orelha, por toda ajuda (incluindo idas ao cemitério, mesmo a contra
gosto) e pela presença, mesmo que nem sempre física, que me deu a força
necessária para seguir adiante.

À minha orientadora, Prof.ª Dr.ª Thaís Sanjad, por toda confiança depositada em
mim para o cumprimento dessa pesquisa; pelo apoio, dedicação e amizade de
sempre e pra sempre.

Ao meu coorientador, Prof. Dr. Rômulo Simões Angélica, por toda atenção dedicada
a essa pesquisa e por ter me introduzido o mundo da geologia de forma tão didática
e interessante.

Aos professores do LACORE, Rose Norat, Flávia Palácios e Márcio Barata, por toda
ajuda, suporte e apoio inesgotáveis dedicados não só a mim, mas a todos que
compõem esse laboratório.

Ao Prof. José Delgado, do LNEC/Portugal, por todo conhecimento e experiência


repassados durante suas estadias em Belém.

Ao Prof. Dr. Fernando Marques, pela ajuda com a revisão bibliográfica e pela
companhia essencial, sempre paciente e disposta, durante a viagem à Chapada
Diamantina.

Ao Professor biólogo Rosildo Santos Paiva, pela ajuda na identificação dos


microrganismos presentes nas amostras de películas biológicas.

À Prof.ª Dr.ª Eliane Del Lama, da USP, pelo empréstimo do aparelho de ultrassom,
pelo auxílio nas medições feitas in loco e pelas considerações sempre pertinentes.

Aos professores Mário Mendonça de Oliveira e Cybèle Celestino Santiago, da UFBA,


pela hospitalidade, apoio e ensinamentos durante a Missão de Estudos em
Salvador.

Ao químico do NTPR/UFBA, Allard Monteiro, pelo auxílio com as análises


laboratoriais e por ter me ensinado a fazer o emplastro de bentonita.

Aos bolsistas de Iniciação Cientifica do NTPR/UFBA, Lucas Ribeiro e Francisco


Oliveira, por todo apoio no laboratório e, principalmente, nas aventuras da Chapada.
Aos tios Mascarenhas e Áurea e Gondim, pelo apoio incansável durante minha
estadia em Salvador para a Missão de Estudos.

Às arquitetas colegas de LACORE e companheiras de viagem em Salvador,


Stephanie Mendes e Mayra Martins, pela companhia maravilhosa, pelos momentos
incríveis (outros nem tanto...) que dividimos e por me aguentarem um mês inteirinho.

Ao arquiteto “lacoreto” Alexandre Máximo, por estar sempre disposto a ajudar


quando mais precisei.

À arquiteta Salma Nogueira, quando ainda bolsista de Iniciação Científica, por toda
ajuda com as análises das películas de degradação e pela companhia divertida e
engraçada durante a pesquisa.

À Saskya Brandão, bolsista do programa Jovens Talentos para a Ciência, por toda
ajuda com as imagens de infravermelho e por acolher atentamente minhas
orientações na sua pesquisa.

A todos os integrantes do LACORE, além dos já citados, em especial: Amanda


Monteiro, Carolina Gester, Djanira Oliveira, Renata Gríbel, Juliana Moreira e Virgínia
Diniz com quem compartilhei as várias etapas da pesquisa e também trabalhos
extras e organizações de eventos, que mesmo cansativos, se tornaram prazerosos
por causa deles.

Aos zeladores do Cemitério da Soledade, Seu Valter e Seu Antônio, por toda ajuda
nos trabalhos em campo.

À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – CAPES, pela


bolsa concedida.

Ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), pelo


auxílio financeiro concedido em Missão de Estudos em Salvador/BA via
Casadinho/PROCAD.

Aos Laboratórios: Laboratório de Conservação, Restauração e Reabilitação-


LACORE/UFPA, Laboratório de Caracterização Mineral- PPGG/UFPA, Laboratório
de Mineralogia e Geoquímica Aplicada- PPGG/UFPA, Núcleo de Tecnologia da
Preservação e da Restauração – UFBA, pelo suporte à pesquisa quanto à execução
dos ensaios laboratoriais.

A todos que contribuíram direta ou indiretamente para a conclusão desta pesquisa.


“Uma cidade que cresce não se pode dar o luxo criminoso de despersonalizar-se,
destruindo os valores que a caracterizam.”

Mário Barata (1963)


RESUMO

A cidade de Belém do Pará contém um espaço que abriga inúmeros monumentos


pétreos históricos, os quais configuram e marcam a identidade da sociedade
belenense do século XIX. Esse espaço é o Cemitério da Soledade, que se configura
como um museu a céu aberto. Além do intemperismo, que faz com que as pedras
estejam constantemente sendo alteradas, o Soledade sofre com saques e
vandalismos ao longo de seus mais de 150 anos de existência. A presença de
deteriorações nos revestimentos pétreos de túmulos e mausoléus desse que é
primeiro cemitério público de Belém, fere a qualidade e a integridade do material,
interferindo de forma negativa na leitura da imagem do espaço, o qual é tombado
como Patrimônio Nacional Paisagístico desde 1964, pelo IPHAN. A partir disso, e
considerando a importância da conservação e restauração de edifícios e
monumentos antigos para a preservação da memória de um povo, a pesquisa
buscou avaliar as deteriorações de origem intempérica e antrópica nas diferentes
pedras utilizadas nos túmulos e mausoléus do Cemitério Nossa Senhora da
Soledade, por meio do conhecimento das características das rochas usadas, do seu
estado de alteração e das causas das deteriorações visando gerar subsídios para a
sua conservação e restauração. A partir das análises e investigações tecnológicas
foi possível caracterizar o granito, o lioz e o mármore e determinar agentes e
mecanismos de deterioração como a ação química, as altas temperaturas e a ação
microbiológica. O diagnóstico do estado de conservação, por meio do mapeamento
de danos baseado no Glossário Ilustrado de Padrões de Deterioração em Pedra do
ICOMOS, confirmou o nível avançado das manifestações patológicas nas superfícies
das pedras, que internamente também apresentam falta de coesão e
descontinuidades, conforme resultados do ultrassom. Para contribuir com ações de
conservação futuras, foram realizados testes de procedimentos restaurativos, com
polimento e aplicação de emplastro de bentonita, que se mostraram eficientes na
limpeza dos monumentos pétreos. Os resultados ratificam o caráter de urgência da
necessidade de ações conservacionistas que diminuam a velocidade das
deteriorações e amenizem o atual estado avançado das mesmas. Com os dados
obtidos, busca-se a oposição à situação de abandono do Cemitério da Soledade,
promovendo a importância de mantê-lo conservado para as gerações futuras.

Palavras-chave: Deterioração; Pedras; Cemitério da Soledade; Conservação e


Restauro.
ABSTRACT

The city of Belém do Pará contains an area that harbors numerous stone monuments
which mark and identify the Belém’s 19th century society. This area is the Cemetery
of Soledade, which now function as an outdoor museum. Besides the weathering,
wich makes stones change constantly, Soledade has suffered with looting and
vandalism throughout its more than 150 years of existence. The presence of
deterioration on the stones of tombs and mausoleums of the first public cemetery in
Belém damages the quality and integrity of the material, interfering negatively in the
reading of the spatial image. The Cemetery has been listed as a National Heritage
Landscape since 1964 by IPHAN. Considering the importance of conservation and
restoration of ancient buildings and monuments to preserve the memory of a society,
this research sought to assess the deterioration by weathering and anthropogenic
origin in the different stones used in tombs and mausoleums of Cemetery of
Soledade. In order to generate subsidies for the conservation and restoration of
these stones, the characteristics of rocks used, its state changes and the causes of
deterioration were assessed. The analysis and technological investigations allowed
for the identification of granite, limestone and marble and for the determination of
agents and mechanisms of deterioration such as chemical action, high temperatures
and microbiological action. The diagnosis of the conservation condition throrough the
mapping of damages based on the Illustrated Glossary on Stone Deterioration
Patterns of ICOMOS confirmed the advanced level of the pathological manifestations
on the surfaces of stones, which also present lack of internal cohesion and
discontinuities according with ultrasound results. To contribute to future conservation
actions, restoration procedure tests to clean the monuments such as the polishing
and application of bentonite plaster were performed efficiently. The results highlight
the urgent need for conservation actions to reduce the rate of deterioration and
mitigate the current advanced state of the same. With the data obtained, this study
try to be an alert to the the situation of abandonment of the Cemetery of Soledade,
promoting the importance of keeping it preserved for future generations.

Keywords: Deterioration; stones; Cemetery of Soledade; Conservation and


Restoration.
LISTA DE FIGURAS

Figura 01: Camadas da Terra .................................................................................. 21


Figura 02: Quadro de classificação dos minerais quanto importância para
classificação das rochas ........................................................................................... 22
Figura 03: Desagregação granular em granito ......................................................... 26
Figura 04: Exemplo de crosta negra em substratos de calcário em área protegida . 29
Figura 05: Vista aérea do cemitério da Soledade..................................................... 41
Figura 06: Vista aérea do cemitério da Soledade..................................................... 42
Figura 07: Vista frontal da Capela com o cruzeiro à frente, Cemitério da Soledade 43
Figura 08: Semelhança entre mausoléus do Cemitério dos Prazeres em Portugal
(imagens em preto e branco) e mausoléus do Soledade .......................................... 43
Figura 09: Área ocupada pela Irmandade da Santa Casa de Misericórdia no
Cemitério da Soledade com as ruínas do muro de delimitação ................................ 44
Figura 10: Planta do Cemitério N. Srª da Soledade, com a delimitação dos terrenos
das irmandades nos cantos, sendo 1: Irmandade de Santo Cristo, 2: Irmandade de
São Francisco, 3: Irmandade da Santa Casa de Misericórdia e 4 : Irmandade da
Ordem Terceira do Carmo......................................................................................... 44
Figura 11: Contraste entre túmulos e mausoléus no Cemitério da Soledade .......... 46
Figura 12: Mausoléu em memória do General Hilário Maximiliano Gurjão .............. 46
Figura 13: Pórtico de entrada do Cemitério da Soledade ......................................... 47
Figura 14: Culto às almas no Cemitério do Soledade .............................................. 49
Figura 15: Oferendas e velas deixadas nos túmulos e mausoléus .......................... 49
Figura 16: Interior de mausoléus no Cemitério da Soledade ................................... 50
Figura 17: Placa indicativa da reforma de 1912, na entrada do Cemitério da
Soledade ................................................................................................................... 52
Figura 18: Projeto de restauração proposto pela R2 Arquitetura ............................. 54
Figura 19: Simbolismo funerário no Cemitério da Soledade .................................... 57
Figura 20: Cemitério da Soledade em 1902 e atualmente, respectivamente ........... 60
Figura 21: Divisão de quadrantes............................................................................. 63
Figura 22: Marcação (em vermelho) dos túmulos e mausoléus já selecionados ..... 64
Figura 23: Túmulos e mausoléus selecionados no lado esquerdo ........................... 65
Figura 24: Túmulos e mausoléus selecionados no lado direito ................................ 66
Figura 25: Quadro de formas de deterioração do grupo “Fissura e Deformação”
encontrados no Soledade ......................................................................................... 67
Figura 26: Quadro de formas de deterioração do grupo “Destacamento” encontrados
no Soledade .............................................................................................................. 68
Figura 27: Quadro de formas de deterioração do grupo “Descoloração e Depósito”
encontrados no Soledade ......................................................................................... 70
Figura 28: Quadro de formas de deterioração do grupo “Perda de material”
encontrados no Soledade ......................................................................................... 70
Figura 29: Quadro deformas de deterioração do grupo “Colonização biológica”
encontrados no Soledade ......................................................................................... 71
Figura 30: Câmera infravermelha Flir ....................................................................... 72
Figura 31: Edição de imagens no programa FLIR QuickReport 1.2 SP2 ................. 72
Figura 32: Coleta de material de origem A) biológica no túmulo F42 e B) inorgânica
no mausoléu F31....................................................................................................... 77
Figura 33: Difratômetro do LCM/PPGG/UFPA ......................................................... 78
Figura 34: Microscópio óptico Carl Zeiss, no LACORE/UFPA ................................. 78
Figura 35: (A) Amostra armazenada em recipiente com água destilada, (B)
Deposição em lâmina da solução composta por amostra e água destilada, (C)
Lamínula que reveste a amostra a ser analisada, (D) Análise e registro fotográfico
das amostras ............................................................................................................. 79
Figura 36: Seções polidas com fragmentos de pedra .............................................. 79
Figura 37: Amostras submersas em água em recipiente acoplado à bomba de vácuo
.................................................................................................................................. 80
Figura 38: Procedimentos do ensaio de densidade: (A) pesagem da amostra seca;
(B) amostra inserida no picnômetro com mercúrio; (C) pesagem do picnômetro com
mercúrio + amostra ................................................................................................... 81
Figura 39: Aparelho de ultrassom V-Meter MK III .................................................... 82
Figura 40: Transdutores exponenciais(A)e plano (B) de 54kHz ............................... 82
Figura 41: Transmissão direta .................................................................................. 82
Figura 42: Transmissão indireta ............................................................................... 83
Figura 43: Transmissão semidireta .......................................................................... 83
Figura 44: (A) transdutor com acoplante e (B) acoplante utilizado ........................... 84
Figura 45: Medição de distância em coluna de granito com uso do compasso
externo ...................................................................................................................... 84
Figura 46: Procedimentos de limpeza ...................................................................... 85
Figura 47: Material usado no preparo do emplastro ................................................. 86
Figura 48: Pesagem dos ingredientes e acréscimo de água destilada .................... 86
Figura 49: Túmulo escolhido para receber aplicação de emplastro de bentonita, com
a área de aplicação em destaque ............................................................................. 87
Figura 50: Procedimentos seguidos na aplicação de emplastro de bentonita, com as
etapas identificadas ................................................................................................... 87
Figura 51: Área escolhida para teste de polimento no túmulo J20 ........................... 88
Figura 52: Polimento de área carbonizada ............................................................... 88
Figura 53: Exemplares de túmulos considerados de pedra para contagem: A)
totalmente em pedra, B) com ornamento em pedra e C) tampos em pedra ............. 90
Figura 54: Quantitativo de túmulos e mausoléus em pedra no Cemitério da
Soledade ................................................................................................................... 90
Figura 55: Exemplo de túmulo com ardósia ............................................................. 91
Figura 56: Imagens macro e microscópica do mármore .......................................... 91
Figura 57: Difratograma da amostra MA-B13 ........................................................... 92
Figura 58: Imagens macro e microscópicas de lioze, com indicação de microfissuras
.................................................................................................................................. 93
Figura 59: Difratograma da amostra LI-G34 ............................................................. 94
Figura 60: Imagens macro e microscópica do granito .............................................. 95
Figura 61: Difratograma da amostra GR-F31 ........................................................... 95
Figura 62: Exemplos de preenchimento de lacunas e fissuras em túmulos do
Cemitério da Soledade ............................................................................................ 100
Figura 63: Exemplos de mausoléus do Soledade com grafite ............................... 100
Figura 64: Mapeamento de danos túmulo F36, com destaque para o grupo
descoloração e depósito marcado em azul e danos em destaque .......................... 101
Figura 65: Mapeamento de danos túmulo K03, com destaque para o grupo
colonização biológica, marcado em verde e para as variadas cores e tipos de
camadas biológicas ................................................................................................. 102
Figura 66: Mausoléus sofrendo a ação de plantas superiores, cujas raízes
penetraram as estruturas ........................................................................................ 102
Figura 67: área sombreada no Cemitério da Soledade, a partir da ferramenta
GoogleEarth ............................................................................................................ 103
Figura 68: Concentração de películas mais recorrentes ........................................ 104
Figura 69: Mapeamento de danos no túmulo B09 com marcação em amarelo de
danos do grupo fissura e deformação e microfissuramentos em destaque ............ 104
Figura 70: Mausoléus com lacunas de elementos decorativos .............................. 105
Figura 71: Erosão diferencial no mármore do túmulo G22 ..................................... 106
Figura 72: Danos do grupo destacamento encontrados no Soledade: A)
destacamento das juntas, B)peeling, C) sugaring e D) delaminação-esfoliação ..... 107
Figura 73: Desagregação granular no granito ........................................................ 108
Figura 74: (a)área de coleta no mausoléu B3 (b) e (c) áreas de coleta do mausoléu
F2 ............................................................................................................................ 109
Figura 75: (a)alga filamentosa e fragmentos de fungos (b) algas filamentosas e
colônias de cianofíceas em destaque (c) algas com fragmentos da rocha de área de
coleta do túmulo F2 ................................................................................................. 109
Figura 76: (a)foto evidenciando que o local de coleta estava sob vegetação (b) área
de colelta no túmulo D3 (c) e (d) áreas de coleta do túmulo F42 ............................ 110
Figura 77: (a)alga filamentosa (clorofícia), (b) líquen (associação simbiótica de algas
e fungos), (c) rotífera .............................................................................................. 110
Figura 78: (a) Coleta de amostra PEN-F31 (b):Coleta de amostra PEN-F36 ......... 111
Figura 79 a e b: Difratogramas referentes a materiais da amostra PEN-F31......... 112
Figura 80: Difratograma referente à amostra PEN-F36.......................................... 113
Figura 81: Comparativo de imagens dos túmulos B09 acima e K03 abaixo, nos dias
14/02, 10/04 e 23/06/2014, respectivamente .......................................................... 115
Figura 82: Mausoléu G34, com uma das faces dividida em área abrigada com
temperaturas amenas e área exposta com temperaturas mais elevadas ............... 116
Figura 83: Imagens de infravermelho do túmulo J20 com destaque para área
fissurada próxima as chamas de velas ................................................................... 117
Figura 84: Imagem de infravermelho do túmulo K03 com destaque para área
fraturada próxima as chamas de velas .................................................................... 117
Figura 85: Lateral do túmulo B-46 com áreas analisadas em destaque ................. 118
Figura 86: Pontos de medição no túmulo B46, pelo método indireto ..................... 119
Figura 87: Valores obtidos dos pontos 2 ao 5 ........................................................ 120
Figura 88: Valores obtidos dos pontos 7 ao 14 ...................................................... 120
Figura 89: Fachadas frontal e posterior do mausoléu F-31, com áreas analisadas em
destaque ................................................................................................................. 121
Figura 90: Pontos de medição nas colunas e na peça da fachada posterior do
mausoléu F31.......................................................................................................... 122
Figura 91: Gráfico com comparativo dos valores de velocidade de propagação de
ondas ultrassônicas nas colunas do mausoléu F31 ................................................ 123
Figura 92: Marcação da área analisada no mausoléu F-02 ................................... 125
Figura 93: a) Marcação dos pontos na área analisada no mausoléu F-02; b)
marcação dos pontos e direção das medições em planta ....................................... 125
Figura 94: Camada de carbonização dissolvida pelo emplastro e retirada com a
lavagem ................................................................................................................... 127
Figura 95: Resultado obtido com o emplastro de bentonita em áreas carbonizadas
no túmulo F42: em seu estado original, antes de todo o processo; após a primeira
lavagem e após a retirada do emplastro, respectivamente ..................................... 128
Figura 96: Resultado obtido com o emplastro de bentonita em áreas afetadas pela
ação biológica ......................................................................................................... 128
Figura 97: Processo do teste de aplicação do emplastro de bentonita e resultado
final.......................................................................................................................... 129
Figura 98: Resultado obtido após primeiro polimento ............................................ 130
Figura 99: Aspecto final da área analisada após aplicação de emplasto de bentonita
e polimento .............................................................................................................. 131
Figura 100: Subsídios tecnológicos para conservação e restauração das pedras do
Soledade................................................................................................................ 141
LISTA DE TABELAS

Tabela 01: Composição das rochas………………………………………………….… 21


Tabela 02: Diferenças entre mármore e calcário.......................................................25
Tabela 3: Efeitos de poluentes em algumas rochas..................................................28
Tabela 04: Métodos de preservação e conservação.................................................31
Tabela 05: Amostragem de material pétreo - granito................................................73
Tabela 06: Amostragem de material pétreo- mármore..............................................74
Tabela 07: Amostragem de material pétreo- lioz.......................................................75
Tabela 08: Amostragem de películas biológicas coletadas de áreas externas
....................................................................................................................................75
Tabela 09: Amostragem de películas biológicas coletadas em áreas internas de
mausoléus. ................................................................................................................76
Tabela 10: Amostragem de películas inorgânicas. ...................................................76
Tabela 11: Amostragem para o ensaio de ultrassom................................................85
Tabela12: Resultados obtidos para absorção e densidade.
....................................................................................................................................96
Tabela 13: Valores obtidos no túmulo B46 com o aparelho de ultrassom, com
transdutor plano de 54kHz.......................................................................................120
Tabela 14: Valores de velocidade de propagação de ondas ultrassônicas obtidos
nas colunas do mausoléu F31, com transdutores exponenciais de
54hHZ......................................................................................................................123
Tabela 15: Valores de velocidade de propagação de ondas ultrassônicas obtidos em
peça da fachada posterior do mausoléu F31, com transdutores planos de 54kHZ e
150kHZ.....................................................................................................................124
Tabela 16: Valores de velocidade de propagação de ondas ultrassônicas obtidos no
mausoléu F-02, com transdutores planos de 54kHZ.
..................................................................................................................................125
SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO ............................................................................................... 17
2. REVISÃO DA LITERATURA ......................................................................... 21
2.1. TIPOS DE ROCHAS................................................................................... ..21
2.2. PRINCIPAIS MANIFESTAÇÕES PATOLÓGICAS EM MATERIAIS
PÉTREOS.............................................................................................................. 25
2.3. PRÁTICAS E PROCEDIMENTOS DE CONSERVAÇÃO E RESTAURAÇÃO
EM MONUMENTOS DE PEDRA ........................................................................... 30
2.4. CONSERVAÇÃO EM CEMITÉRIOS HISTÓRICOS ..................................... 35
2.5. CARACTERIZAÇÃO CLIMÁTICA DE BELÉM ............................................. 38
3. ÁREA DE ESTUDO- Cemitério Nossa Senhora da Soledade........................... 41
3.1 HISTÓRICO .................................................................................................... 41
3.2 CRONOLOGIA.................................. ..............................................................51
3.3 CONSERVAÇÃO E RESTAURAÇÃO: CONTRIBUIÇÕES DA TEORIA .........55
4. MATERIAIS E MÉTODOS ................................................................................... 63
4.1. ELENCO E ESTRATÉGIA DE ESCOLHA ...................................................... 63
4.2. REGISTRO FOTOGRÁFICO E MAPEAMENTO DE DANOS DOS TÚMULOS
E MAUSOLÉUS ..................................................................................................... 66
4.3. MAPEAMENTO TÉRMICO ............................................................................. 72
4.4. AMOSTRAGEM .............................................................................................. 73
4.5. ANÁLISES LABORATORIAIS ........................................................................ 77
4.6. TESTES DE TRATAMENTOS RESTAURATIVOS……………………………..86

5. AS PEDRAS DO SOLEDADE ............................................................................ 90


5.1. QUANTITATIVO E TIPOS DE PEDRA…..………………………………………90

5.2. ANÁLISE PETROGRÁFICA……………………………………………………....91

5.2.1. Quanto ao mármore ........................................................................... 91

5.2.2. Quanto ao calcário lioz ...................................................................... 92

5.2.3. Quanto ao granito .............................................................................. 94

5.3. CARACTERIZAÇÃO FÍSICA..................................................................……..96

6. AS ALTERAÇÕES............................................................................................ ....99
6.1. DIAGNÓSTICO……………………………………………………………………..99

6.1.1. Quanto ao grupo "Descoloração e Depósito".................................100


6.1.2. Quanto ao grupo "Colonização Biológica" ................................... 101

6.1.3. Quanto ao grupo "Fissura e Deformação" .................................... 104

6.1.4. Quanto ao grupo "Perda de material" ............................................ 105

6.1.5. Quanto ao grupo "Destacamento".................................................. 106

6.2. A AÇÃO MICROBIOLÓGICA ………………………………..…………………109

6.3. A AÇÃO QUÍMICA.........................................................................................111

6.4. A EXPOSIÇÃO ÀS ALTAS TEMPERATURAS .......................................... 113

6.5. COESÃO E DESCONTINUIDADES INTERNAS ........................................ 118

7. TESTES DE TRATAMENTOS RESTAURATIVOS ........................................... 127

7.1. LIMPEZA QUÍMICA COM EMPLASTRO DE BENTONITA ......................... 127

7.1.1. Quanto à remoção das camadas de sujidades e carbonização ...127

7.1.2. Quanto a remoção de camadas microbiológicas ......................... 128

7.2. REMOÇÃO DO PRODUTO DE CARBONIZAÇÃO …................................. 130

8. CONCLUSÕES…………..…………………………………………………………….133
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS…………………………….....……………….. ...142
APÊNDICES
APÊNDICE A – Quantitativo de túmulos e mausoléus do Cemitério Nossa Senhora
da Soledade
APÊNDICE B – Mapeamento de danos de túmulos e mausoléus do Cemitério Nossa
Senhora da Soledade

ANEXOS

ANEXO A – Artigo de Mário Barata publicado em 29 de dezembro de 1963, no jornal


"A Província do Pará".
Deterioração das pedras da arquitetura mortuária do Cemitério Nossa SILVA, Pâmela A. B. V. da
Senhora da Soledade

1. INTRODUÇÃO

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1. INTRODUÇÃO

O uso de rochas pelo homem faz parte da história da civilização desde os


seus primórdios e elas vêm sendo empregadas desde então, na construção de
obras e monumentos. Quando operado e trabalhado pelo homem, como na
arquitetura, o material rochoso recebe a designação de pedra.

Mesmo os monumentos pétreos estando inseridos entre a sociedade há tanto


tempo, a conservação da pedra em bens do patrimônio histórico ainda é tema da
atualidade, que mobiliza importantes esforços de investigação em prol da
salvaguarda dessas obras.

A cidade de Belém do Pará contém um espaço que abriga inúmeros desses


monumentos históricos, os quais configuram e marcam a identidade de uma
sociedade, o Cemitério da Soledade. Um ‘museu a céu aberto’ que reúne
verdadeiras obras de arte do século XIX, monumentos pétreos na forma de
túmulos e mausoléus carregados do rico simbolismo funerário. Lugares de
sepultamento como esse, mais do que instituições responsáveis por catalogar e
asilar os restos mortais humanos, compreendem ‘campos sagrados’ onde
ocorrem manifestações socioculturais múltiplas do homem perante a morte
(MUNIZ, 2006). A importância dessa arquitetura funerária está nas várias formas
e meios que esses espaços revelam através dos tempos.

Por seu valor cultural, artístico e histórico para a cidade de Belém, o referido
Cemitério foi tombado como Patrimônio Nacional Paisagístico em 1964, pelo
IPHAN (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional). Foi o primeiro
Cemitério da Região Norte do Brasil a ser oficialmente reconhecido como
patrimônio cultural e, até hoje, ainda é o único no Estado do Pará. É o mais antigo
cemitério municipal belenense e abriga túmulos de personagens históricos ilustres
do século XIX dessa cidade, como o General Hilário Maximiliano Gurjão,
importante combatente da Guerra do Paraguai, o Cônego Siqueira Mendes,
Visconde de Arari, além do capitão Joaquim Vitorino de Sousa Cabral, idealizador
do Cemitério.

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Infelizmente, o tombamento não tem assegurado a sua preservação, uma vez


que diversos processos de deteriorações atuam nos monumentos dia após dia, ao
longo de seus mais de 150 anos de existência, em virtude da escassez de
medidas prevencionistas e restaurativas no espaço. O caráter de abandono e a
presença de patologias nos revestimentos pétreos deste Cemitério ferem a
qualidade e integridade do material, sendo uma agressão à sua imagem e
comprometendo a leitura do espaço e a visitação.

O homem destruindo, degradando ou desnaturando


os monumentos históricos apaga suas raízes, deturpa
a própria memória, deforma as lições deixadas pelo
passado, condenando-se a nunca ir além do
empirismo. Uma sociedade deturpando sua cultura e
sua memória, destrói os instrumentos que são seus
próprios meios de expressão como seres vivos, com
incidências sobre a memória individual e coletiva,
podendo gerar problemas para a identidade como
comunidades, povo ou nação (KÜHL,2006).

O intemperismo, processo de alteração de uma rocha que começa desde seu


lugar de origem e envolve processos físicos, químicos e biológicos relacionados
com as condições ambientais do local, faz com que as rochas estejam
constantemente sendo alteradas, confirmando a necessidade de um cuidado
criterioso com esses bens.

As deteriorações sofridas pelas obras, como manchas, escamações e


fissuras, poderiam ser amenizadas conhecendo-se em profundidade esses
materiais de construção e as condições ambientais às quais os revestimentos
estão sujeitos. Sendo assim, são de suma importância estudos sobre a
resistência das rochas e sua alterabilidade, quando usadas no exterior, de modo a
se garantir a qualidade pela qual foram adotadas, já que, uma vez instalada a
patologia, o impacto negativo passa a ser também econômico, visto que, com o
passar do tempo e piora dessas degradações, fazem-se necessárias medidas
corretivas mais significativas.

Sendo esses monumentos históricos parte do patrimônio de um povo, as


suas manutenção e conservação são a garantia de que as próximas gerações
poderão usufruí-los. Tais medidas, porém, devem ser minuciosamente

18
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elaboradas, já que por vezes são as próprias intervenções de reparo a causa do


problema. Segundo Lourenço (2003), cumpre salientar ainda, que nenhum
tratamento é indefinidamente eficaz. Só por meio de uma monitoração e
manutenção continuadas se pode conservar com sucesso monumentos,
garantindo uma efetiva gestão do patrimônio.

Confirmando o que disseram Reys et al. ( 2007), ao afirmarem que qualquer


patrimônio histórico, esteja onde estiver, deve ser salvaguardado, pois os
monumentos permitem a ‘leitura’ dos fatos ocorridos, representando um precioso
testemunho do passado, o estudo proposto visa evidenciar a importância do
conhecimento tecnológico atrelado à teoria como item indispensável para o
correto diagnóstico das deteriorações em materiais pétreos, servindo de apoio na
geração de subsídios para a adoção de futuras medidas restaurativas.

Utilizando como objeto de estudo as pedras de túmulos e mausoléus e o


produto de suas alterações, a pesquisa tem como objetivo geral, a partir de
amostras coletadas, avaliar a ação intempérica e antrópica nas diferentes pedras
utilizadas no Cemitério Nossa Senhora da Soledade, por meio da identificação,
classificação e caracterização desses materiais pétreos; da percepção e
documentação das formas de alteração encontradas com mapeamento de danos
do elenco selecionado, e do reconhecimento e compreensão dos processos e
causas dessas degradações, assim como seus agentes causadores. Por fim,
pretende-se testar técnicas restaurativas para a limpeza de superfícies pétreas.

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2. REVISÃO DA
LITERATURA
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2. REVISÃO DA LITERATURA

2.1TIPOS DE ROCHA

As principais camadas (Figura 01) que constituem o planeta Terra, da


superfície até o núcleo, são constituídas de rochas, principalmente a crosta e o
manto.

Figura 01: Camadas da Terra


Fonte: Centro de ensino e pesquisa aplicada/ USP. Disponível em: http://cepa.if.usp.br/

Rocha é um agregado sólido que ocorre naturalmente e é constituído por um


ou mais minerais. Sendo mineral um componente sólido, de ocorrência natural
(inclusive extraterrestre) e inorgânica, que tem uma composição química definida
e organizada, segundo uma determinada estrutura cristalina.

A composição mineralógica média das rochas da crosta terrestre é a seguinte


(Tabela 01):

Tabela 01: Composição das rochas


Minerais Porcentagem
Feldspatos e feldspatóides 60% em volume
Piroxênios e anfibólios 16% em volume
Quartzo 12% em volume
Micas 4% em volume
Outros minerais 8% em volume
Fonte: COSTA, 1996

21
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Fica claro, então, a predominância dos feldspatos e não do quartzo, como


pode-se imaginar a priori (COSTA, 1996). A classificação de uma rocha está
intrinsicamente relacionada com as espécies minerais que ela contém e com a
quantidade deles presente nas mesmas (Figura 02).

Minerais Essenciais Principais ou mais importantes na


classificação
Minerais Secundários Mais ou menos importantes
Minerais Acessórios Algumas vezes importantes
Minerais Traços Sem importância na classificação
Figura 02: Quadro de classificação dos minerais quanto importância para classificação das
rochas
Fonte: COSTA, 1996

No processo de caracterização de rocha, é importante reconhecer que,


enquanto algumas rochas têm uma composição semelhante, seus
comportamentos podem ter poucas coisas em comum (DOEHNE; PRICE, 2010).

De acordo com a sua formação, as rochas podem ser classificadas em três


grandes grupos:

- Magmáticas ou ígneas: provenientes da consolidação do magma;

- Sedimentares: oriundas da sedimentação e posterior consolidação de


partículas de outras rochas existentes ou de materiais orgânicos. O intemperismo
é fundamental como passo inicial para a formação das rochas sedimentares
(COSTA, 1996). É comum encontrar nessas rochas, restos de animais e vegetais,
denominados fósseis;

-Metamórficas: originárias de rochas pré-existentes que sofreram alterações


mineralógicas, texturais, estruturais e até químicas em decorrência de altas
pressões e temperaturas.

Segundo Costa (1996), a distribuição dos diferentes tipos de rocha na crosta


terrestre até 16km de profundidade, é de 95% para rochas magmáticas, 4% para
rochas metamósficas e 1% para rochas sedimentares.

22
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Nessa pesquisa, o estudo foi aprofundado nos principais grupos de rochas


encontrados nos túmulos e mausoléus do Cemitério Nossa Senhora da Soledade.
Sendo eles:

- Calcário
O termo calcário deriva do nome latino calcarius e significa “o que contém
cal”. Sendo assim, os calcários são rochas sedimentares carbonáticas1
compostas principalmente de calcita, cuja composição química é o carbonato de
cálcio (CaCO3). Na superfície da crosta terrestre, são mais frequentes os
calcários de origem orgânica. É rico, além de calcita, em aragonita e mesmo
dolomita (COSTA, 1996).
A maior parte das rochas carbonáticas tem origem biológica, já que a
precipitação dos íons dissolvidos em ambiente aquoso é ocasionada pela atividade
de organismos. Formam-se em ambientes marinhos, sendo recifes de corais,
conchas, algas, protozoários, briozoários, os principais responsáveis pelos
depósitos provenientes de organismos sintetizantes do carbonato dissolvido em
meio aquoso. Essas conchas e esqueletos são preservados como fósseis
fragmentados, perfeitamente reconhecíveis nas rochas, compondo calcários
fossilíferos.

- Lioz

De acordo com Aires-Barros et al. (2006) o Lioz é um calcário cretácio com


grande quantidade de fósseis rudistas (moluscos que viveram em colônias
coralíferas e que podem ser identificados pelos seus contornos espiralados).

A qualidade da rocha pode variar de acordo com a pedreira e o nível de onde


foi extraída. Conforme Santiago (2000), a presença de fósseis, por vezes, pode
criar zonas de descontinuidade que facilitam o processo de degradação.

O Lioz típico é uma rocha muito compacta de aspecto ceroso, praticamente


branca e de tom ligeiramente amarelado quando polida, podendo apresentar-se
1
As rochas carbonáticas são formadas a partir de processos químicos, bioquímicos e aloquímicos
envolvendo a deposição e decomposição de organismos ricos em cálcio, como algas, conchas,
corais e moluscos. As rochas carbonáticas são formadas por minerais carbonáticos como a calcita
(CaCO3), a dolomita (CaMg(CO3)2), a siderita (FeCO3) e a Magnesita (MgCO3), entre outras
(CAMBIER, 2011).

23
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também em tons rosados. É essencialmente constituída por calcita com grãos


ocasionais de quartzo e alguns óxidos de ferro e minerais argilosos, que muitas
vezes conferem veios corados, amarelados ou avermelhados ao Lioz.

- Granito

Segundo Delgado Rodrigues (1996), os granitos têm sido usados, desde a


antiguidade, como materiais de construção e algumas variedades adquiriram boa
reputação pela sua beleza, dureza e durabilidade e tem sido extensivamente
usado em sepulturas, elementos arquitetônicos ou simples silhares em edifícios e
outras estruturas.

São rochas ígneas plutônicas (formadas pelo resfriamento lento do magma


em grandes profundidades da crosta). Têm textura granular fanerítica2 (grãos
visíveis) e são principalmente compostos por quartzo (20-40%) e feldspatos,
podendo ainda ocorrer biotita e muscovita. Apresentam como minerais acessórios
zircão, apatita, magnestita e outros também podem estar presentes.

Os granitos são rochas que, pela sua dureza, apresentam maior dificuldade
quer na exploração na pedreira quer na execução de cantarias e peças
escultóricas, tendo sido, sempre que possível, preteridas em favor de rochas mais
brandas e mais facilmente trabalháveis como os calcários, mármores e arenitos
(BEGONHA, 1997).
Sendo assim, é sabido que devido a dificuldades de meios técnicos, a
exploração em pedreiras de granito era, sobretudo, efetuada em zonas
superficiais de maior acessibilidade, mais afetadas pelo intemperismo e exibindo
menor dureza em relação à rocha sã (ALMEIDA, 2007).

Por isso Delgado Rodrigues (1996), afirma que nem todas as rochas
graníticas podem ser consideradas de alto nível de qualidade. Fato esse
identificado com bastante frequência em vários monumentos, deixando evidente
que seus construtores não puderam dispor em sua seleção somente das

2
Tipo de textura de rocha ígnea em que os constituintes mineralógicos principais, cristais
individuais, são visíveis e identificáveis a olho nu, pois o resfriamento lento possibilita o
crescimento de cristais maiores, bem desenvolvidos (faneros=visível).

24
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melhores partes da pedra. Desde então, os monumentos apresentam, alta


diversidade de variações de pedra, tanto em composição quanto performance.

- Mármore

São rochas formadas a partir de um metamorfismo dinamotermal (pressão e


temperatura) em áreas de calcário. Quanto mais puros os calcários mais puros os
mármores. Têm veios mais evidentes e são mais suscetíveis a manchas e
desgaste que os granitos.

Esse tipo de rocha é comumente cristalina, de granulação grossa, formada


normalmente de calcita e menos frequentemente dolomita e magnesita e não tem
estrutura planar, a não ser quando apresenta impurezas. A textura é granular
sacaroide.

Para diferenciar o mármore do calcário, a rocha que lhe deu origem no


metamorfismo, usam-se as características da tabela abaixo:

Tabela 02: Diferenças entre mármore e calcário


Rocha metamórfica: Rocha sedimentar:
Mármore (autêntico) Calcário
Textura granular grossa Granulação fina, em geral
Placas translúcidas Placas não translúcidas
Não tem cavidades Tem cavidades
Não tem fósseis Contém fósseis
Fonte: COSTA, 1996

2.2 PRINCIPAIS MANIFESTAÇÕES PATOLÓGICAS E CAUSAS


ASSOCIADAS EM MATERIAIS PÉTREOS

As rochas aplicadas em monumentos, em contato com a atmosfera, tornam-


se sedes de ações e reações que se desencadeiam sem cessar, alterando-se de
modo a procurar novas condições de equilíbrio (DIONÍSIO et al. 2004).

A partir disso, as diferentes características próprias das rochas conduzirão a


diferentes respostas frente às situações às quais estarão expostas. Fatores
intrínsecos e extrínsecos de maior influência serão determinantes na
susceptibilidade dessas rochas às alterações.

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Entre fatores extrínsecos, tem-se o intemperismo. É o conjunto de processos


que ocasionam a desintegração e a decomposição (processos de alteração) das
rochas, que ocorre através da atuação de processos físicos, químicos e biológicos
originados em função das características locais. O intemperismo faz com que as
rochas estejam constantemente sendo alteradas e a forma como se apresenta
depende muito do clima. Em clima quente e úmido, predomina o intemperismo
químico, com destaque para a ação da água da chuva, fenômeno recorrente na
cidade de Belém.

A água pode constituir um importante fator de deterioração das rochas


aplicadas aos monumentos. Trata-se do principal veículo de agressão das rochas,
uma vez que atua como veículo de transporte de outras substâncias como sais
solúveis, contaminantes atmosféricos e organismos vivos.

Entende-se por patologia da pedra, as modificações em sua morfologia. A


pedra aplicada no patrimônio histórico construído encontra-se sujeita ao
aparecimento de diferentes tipos de patologias, resultado de fatores ambientais,
pelo uso de materiais incompatíveis, por ações de manutenção inadequadas, por
medidas de conservação inapropriadas ou por atos de vandalismos.

Um dos problemas inerentes na discussão dos tipos de deterioração nas


pedras é encontrar uma linguagem comum. Há uma série de termos que podem
significar aspectos diferentes, dependendo da pessoa. Em virtude disso, a
publicação de um glossário de formas de deterioração da pedra por parte do
ICOMOS, foi um avanço significativo nessa área (DOEHNE; PRICE, 2010).

Dependendo das condições ambientais e das características dos materiais


estudados, diferentes formas de intemperismo podem ocorrer, tais como: fissuras,
crostas negras (relacionadas à poluição atmosférica), desintegração (ou
desagregação) granular (Figura 3), erosão, eflorescência, colonização biológica,
placas e esfoliação.

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Figura 03: Desagregação granular em granito.


Fonte: BEGONHA, 2009.

O intemperismo das rochas é um processo natural, mesmo nos


monumentos históricos, processo esse que pode acelerar-se em atmosfera
urbana, como a do Cemitério da Soledade. Concentração de poluentes, o teor de
partículas que aderem à superfície das obras e o vandalismo são fatores que
influenciam nessa aceleração.

Dionísio et al. (2004), também afirmam que o processo de deterioração,


veio se acentuando com as quantidades cada vez maiores de contaminantes
atmosféricos, que são concentrações anômalas de gases, libertados por
processos de combustão, como as centrais de produção de energia, o tráfego
urbano e as atividades industriais, que podem depositar-se diretamente nas
superfícies ou interagir com as mesmas sob a forma de chuvas.

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A Tabela 3 elenca os efeitos de alguns poluentes nos materiais rochosos.


Tabela 3: Efeitos de poluentes em algumas rochas
POLUENTE MATERIAIS ATACADOS DEGRADAÇÕES
Dióxido de carbono Especialmente mármore Deterioração
Lixiviação, perda de
Calcários, mármores,
Óxidos de enxofre coesão, queda de
ardósia, arenitos
resistência mecânica
Partículas sólidas Rochas e materiais de
Sujeira, manchamentos
(fuligem, alcatrão) construção em geral
3
Fonte: Kupchella; Hyland (1992) apud Frascá (2003).

A exemplo, a crosta negra ocorre em ambientes urbanos poluídos, em que


os gases de enxofre se combinam com o carbonato de cálcio da pedra, dando
origem ao sulfato de cálcio (gipsita).

As crostas negras podem começar a partir da superfície, mas progridem


rapidamente para dentro, dissolvendo o carbonato de cálcio e redepositando
sulfato de cálcio, sendo o resultado a transformação de uma camada fina (preta)
na parte mais externa da pedra, criando uma zona frágil muito frequentemente
seguida por uma camada subjacente (branca) pulverulenta e friável, rica em
gipsita (DELGADO RODRIGUES, 2014).

A camada correspondente à crosta negra é dura e pouco porosa e se a


crosta se desprender, o processo repete-se, levando à erosão da pedra. A
ocorrência de tal patologia somente é possível em áreas abrigadas das chuvas,
uma vez que, nos lugares constantemente lavados pelas águas pluviais, a rocha
mantém sua cor original, já que a gipsita é dissolvida pela chuva, dada a sua
solubilidade (Figura 04).

3
KUPCHELLA, C.E.; HYLAND, M.C. (1992) Origin and classification of chemical sediments in terms of pH and
oxidation-reduction potentials. Journal of Geology, v.60, n.1, p.1-33.

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Figura 04: Exemplo de crosta negra em substratos de calcário em área protegida.


Fonte: DELGADO RODRIGUES, 2014.

Dionísio et al. (2004) dividem os processos de deterioração nas rochas em


três tipos:

● Química, que resulta de reações químicas que ocorrem à superfície e


nas descontinuidades das rochas, originando minerais secundários. Thomas4
(1994) apud Sanjad (2007), afirma que nas rochas localizadas em climas
tropicais, a temperatura pode acelerar quatro vezes mais as reações químicas
intempérica, do que em regiões de alta latitude e altitude elevada;

● Física, que resulta de fenômenos de expansão e/ou retração provocados


por variações térmicas, abalos sísmicos e ainda por expansão devido à gênese
de minerais secundários por recristalização;

● Biológica, que é provocada pelo crescimento de microrganismos e


organismos, como ainda pela ação de aves. Segundo Dionísio et al. (2004), em
áreas úmidas e com elevada precipitação atmosférica, os agentes biológicos são
relevantes nos processos de degradação, uma vez que nessas condições é
facilitado o desenvolvimento de microrganismos, assim como organismos de
outros grupos como plantas, fungos, algas e líquens.

4
THOMAS, M.MF. 1994. Geomorphology in the tropics: a study of weathering and denudation in low
latitudes. New York: John Willey & Sons, 460p.

29
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2.3. PRÁTICAS E PROCEDIMENTOS DE CONSERVAÇÃO E


RESTAURAÇÃO EM MONUMENTOS DE PEDRA

No passado, os reparos nas pedras aplicadas aos monumentos eram feitos


apenas descartando-se a rocha degradada e recolocando-se um novo material
parecido com o anterior, o que destruía toda a originalidade do monumento
(REYS et al., 2007).
As práticas na conservação e restauração de monumentos pétreos, porém,
com o passar do tempo, ganharam novas metodologias menos invasivas e com
conhecimentos mais aprofundados que permitem reparações mais eficazes.
Sabendo que a degradação da pedra pode conduzir a uma redução substancial
nas propriedades de força do material, a busca é sempre por métodos que evitem
que as pedras cheguem a necessitar de procedimentos de conservação drásticos.
Deve-se ter informações técnicas a respeito dos tipos de rochas que foram
utilizadas e suas respectivas condições de uso e do ambiente em que se
encontram, as quais subsidiam o planejamento de medidas de restauro e
conservação, para evitar-se o uso de métodos inapropriados que possam resultar
em mais deterioração.
Um grande número de métodos de investigação foram recentemente
desenvolvidos, e tem sido frequentemente adaptados de outras disciplinas e
modificados para aplicação em monumentos de pedra. Fitzner e Heinrichs (2002),
afirmam que a otimização de procedimentos de diagnóstico e uma bem orientada
avaliação de resultados científicos para fins de preservação do monumento
continuam a ser uma tarefa importante de pesquisa. Tais autores dividem os
métodos usados como estratégia e medida de preservação e conservação, como
pode ser observado na Tabela 04:

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Deterioração das pedras da arquitetura mortuária do Cemitério Nossa SILVA, Pâmela A. B. V. da
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Tabela 04: Métodos de preservação e conservação


Etapas Procedimentos

LEVANTAMENTO DE Identificação do monumento, localização, pesquisa histórica,


DADOS utilização, meio ambiente.
Investigações In situ:
Mapeamento do
monumento, medições,
Materiais do edifício,
amostragem
propriedades dos materiais,
Análises laboratoriais:
estado de deterioração,
propriedades do material:
DIAGNÓSTICO fatores e processos de
físicas, químicas e
deterioração, necessidade e
mecânicas
urgência de procedimentos de
Simulação do
preservação
intemperismo: exposição
ao ar livre, testes em
câmaras
Cálculo, concepção, teste de aplicação, execução e
TRATAMENTO controle/ certificação de preservação, medidas; observação
e manutenção de monumentos a longo prazo

Fonte: adaptado de FITZNER e HEINRICHS, 2002.

O diagnóstico considera a informação obtida a partir do levantamento de


dados e fornece a base para o tratamento adequado, a fim de preservação do
monumento.
Dentre as etapas de diagnóstico mais utilizadas têm-se:
1- O mapeamento das deteriorações: compreende a descrição, registro e
apresentação do estado de conservação das rochas. Na representação gráfica do
mapeamento in situ empregam-se fotografias e/ou desenhos esquemáticos do
monumento e suas formas de intemperismo predominantes e subordinadas
Com o mapeamento, o estado de degradação de um monumento pode ser
determinado de acordo com o tipo, intensidade, extensão e distribuição dos danos
(SILVA e ROESER, 2003).
Comumente são usados atlas de fotos das deteriorações para apoio na
classificação, como na pesquisa de Grossi e Del Lama (2012), em que o
mapeamento das formas de alteração do Monumento a Ramos de Azevedo, em
São Paulo, foi realizado com base no Glossário Ilustrado de padrões de
deterioração em pedra do ICOMOS (ICOMOS, 2008), escolhido pela sua fácil
utilização e descrição detalhada das terminologias.

31
Deterioração das pedras da arquitetura mortuária do Cemitério Nossa SILVA, Pâmela A. B. V. da
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Somente este procedimento permite um registro quantitativo,


documentação e avaliação de monumentos completos, estruturas de pedra ou
esculturas individuais de acordo com os litotipos e a intensidade, tipo e
distribuição das formas intempéricas, que representam a resposta
fenomenológica das pedras naturais aos processos de intemperismo.

Categorias de dano e índices de danos foram introduzidos como novas


ferramentas para a quantificação e consequente classificação de danos em pedra
como um importante contribuição científica para diagnóstico de danos e
preservação de monumento. Estudos de Fitzner et al. (2003) comprovam que as
categorias de danos e os índices de danos são indicadores muito adequados para
a necessidade e urgência de medidas de preservação. Os mapas de categorias
de danos localizam aquelas partes de um monumento que as intervenções devem
focar.

O mapeamento de danos pode ser aplicado a todos os tipos de pedra e para


todos os tipos de construções em pedra que vão de esculturas e pedra individuais
até estruturas para fachadas ou monumentos inteiros.

2- Caracterização tecnológica – análises e ensaios laboratoriais: fornecem


parâmetros químicos, físicos, mecânicos e petrográficos que permitem a
qualificação da rocha. Entre eles: determinações colorimétricas, porosidade,
absorção de água e avaliação microbiológica. Fornecem parâmetros para
medidas preventivas que evitem/retardem o “envelhecimento” da rocha (FRASCÁ,
2002).

Quanto aos tratamentos, podem citar-se:

A-Limpeza: tem como objetivo remover todas as substâncias que


efetivamente causam o processo de deterioração da pedra ou contribuem para
isso, como sais solúveis, incrustações, más intervenções feitas anteriormente,
sujidades, infestação de vegetação e dejetos de animais, isso se respeitando a
textura e a cor originais.

Conforme Doehne e Price (2010), entretanto, muitas vezes, a razão primária


para a limpeza é a mudança drástica na aparência que pode ser conseguida. Um

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Senhora da Soledade

edifício ou um monumento sujo não parece bem cuidado e a sujeira pode muito
bem esconder detalhes finos e de maior apreço arquitetônico.

A escolha do método a ser usado dependerá da natureza das substâncias


a serem removidas e do tipo de superfície a ser limpa (IPHAN, 2000). Tendo-se
noção que uma escolha equivocada pode acarretar prejuízos, uma vez que,
métodos de limpeza aplicados sem uma pesquisa técnica foram durante muito
tempo causadores de diversas patologias em edifícios (LOURENÇO, 2003).

Há uma grande variedade de técnicas disponíveis para a limpeza de


pedras, variando das que se destinam a utilização em grandes fachadas para
aquelas que são destinadas ao uso meticuloso sobre uma escultura delicada,
finamente esculpida (DOEHNE; PRICE, 2010).

Entre os vários tipos de limpeza, tem-se a limpeza com água, seja por
jateamento ou vaporização; limpeza a laser, que não implica qualquer contato
físico com a pedra e assim presta-se para a limpeza de superfícies mais delicadas
e a limpeza química, feita com pastas, em que os produtos utilizados são argilas
absorventes, quando a limpeza com água não conseguir remover todos os
depósitos de sujeira da superfície.

As argilas usadas são sepiolitas e atapulgitas ou bentonitas, mais


especificamente no Brasil. Bentonita é uma argila absorvente constituída
principalmente do argilomineral montmorilonita. Estudos quanto à possibilidade de
aplicação de bentonitas brasileiras para limpeza de superfícies começaram em
1986, no NTPR,5 com a ajuda do Professor Lorenzo Lazzarini (OLIVEIRA et al.,
1993), como forma de introduzir o uso da bentonita para limpeza dos materiais
porosos por um baixo custo, como uma opção além de sepiolitas e atapulgitas,
mais onerárias.

A influência da troca iônica na limpeza de incrustações já foi amplamente


discutida na literatura, já que materiais com essa característica apresentam maior

5
Núcleo de Tecnologia da Preservação e Restauração/UFBA.

33
Deterioração das pedras da arquitetura mortuária do Cemitério Nossa SILVA, Pâmela A. B. V. da
Senhora da Soledade

poder de limpeza devido à sua capacidade ativa sobre os componentes das


crostas negras (TABASSO6, 1989 apud OLIVEIRA et al., 1993 ).

Com base neste princípio, e considerando que montmorilonitas tem uma


elevada capacidade de troca catiônica, mais elevada do que a de sepiolitas e
atapulgitas, além de alta capacidade de sorção, fica clara a possibilidade de
utilização deste material em conservação, para a dessalinização e limpeza,
estando o mesmo disponível a partir da indústria brasileira.

B - Proteção: criação de uma camada protetora superficial que irá sofrer os


processos de desgaste no lugar da pedra. Recomendado toda vez que o fator de
alteração da pedra agir principalmente na superfície externa do material, de forma
preventiva ou após um trabalho de limpeza e/ou consolidação. Esta medida tem
vida útil limitada e tem que ser substituída periodicamente (LOURENÇO, 2003).

Para estabelecer uma proteção contra as modificações cromáticas, deve-se


adicionar à solução a ser empregada, produtos filtrantes de raios UV. Existem
produtos de filtro UV específicos para cada uma das soluções empregadas
(IPHAN, 2000).

C - Reconstituição: reconstituição das perdas ocorridas na cantaria, através


da aplicação de materiais que substituam a parte perdida. Segundo o IPHAN
(2000), tais materiais podem ser:

•Próteses: de pedra com as mesmas características físicas da original.


Considerando a cor e a textura, que deverão ser o mais semelhante possível com
as da cantaria a ser reconstituída;

•Argamassas: atualmente usadas no preenchimento de fissuras. São


usualmente confeccionadas com cal hidráulica como aglomerante;

•Polímeros: utilização superficialmente de pastas feitas in situ, tomando-se


como base as características da pedra a ser recomposta.

6
Tabasso, M. L. (1989) Conservation treatment of stone, in The Deterioration and Conservation
of Stone, UNESCO (eds L. Lazzarini and R. Pieper), Venice, pp.276.

34
Deterioração das pedras da arquitetura mortuária do Cemitério Nossa SILVA, Pâmela A. B. V. da
Senhora da Soledade

D - Consolidação: impregnação de produtos que penetram na pedra,


melhorando e aumentando a coesão do material alterado em seu substrato,
resultando na melhor resistência aos processos de deterioração (IPHAN, 2000),
pelo preenchimento dos ocos entre os grãos de pedra, com um material
apropriado. Existem vários materiais disponíveis no mercado, porém um dos
grandes problemas de eficácia dos consolidantes é a profundidade de
penetração.

Deve-se atentar para o fato de que consolidantes de pedra, mesmo os mais


suaves, não são reversíveis, uma vez que a extração de um produto a partir do
interior de uma pedra desintegrada é uma operação quase impraticável. Nestas
circunstâncias, a escolha de qualquer consolidante é uma decisão de muito risco
e, portanto, deve ser baseada nos melhores critérios de decisão. Testes em
laboratório de pedras tratadas ainda é uma ferramenta insubstituível para fazer a
escolha (DELGADO RODRIGUES, 1996).

Além de possíveis dificuldades relacionadas a aspectos de interpretação


sobre a necessidade de aplicação de um consolidante ou levantadas por
implicações éticas de tal ação de conservação, existem verdadeiras questões
técnicas que tornam este procedimento o problema maior na pesquisa de
conservação da pedra.

Delgado Rodrigues (1996), afirma que a aplicação de tratamentos de


consolidação pode ser justificada em situações em que um incremento na coesão
da pedra é necessário, mas a decisão de ir mais longe nesta aplicação é
altamente controversa e, portanto, apenas em situações extremas esta aplicação
é acatada sem restrições.

2.4. CONSERVAÇÃO EM CEMITÉRIOS HISTÓRICOS

No âmbito da conservação do patrimônio funerário, é interessante salientar as


importantes iniciativas e ações nacionais e internacionais que visam preservar os
cemitérios históricos.

Ainda que, atualmente, haja resistências quanto à frequentação de cemitérios


para atividades culturais, boa parte dos projetos de preservação do patrimônio

35
Deterioração das pedras da arquitetura mortuária do Cemitério Nossa SILVA, Pâmela A. B. V. da
Senhora da Soledade

funerário concilia suas propostas, com a possibilidade de incluir os cemitérios em


rotas culturais para aproveitamento turístico (CASTRO, 2010).

Ações e iniciativas conservacionistas são de suma importância para fomentar


o potencial turístico de cemitérios históricos. Hoje em dia, há cemitérios como
Mont Auburn (Massachusetts, E.U.A.), Highgate (Londres, Inglaterra), Père
Lachaise (Paris, França), Recoleta (Buenos Aires, Argentina), entre outros, com
destaque a nível mundial e inclusos em guias turísticos das suas respectivas
cidades, com visitas monitoradas e websites com tour virtual.

Em 2009, organização australiana National Trust of Australia, lançou um guia


de preservação cemiterial (“Guidelines for cemetery conservation”), com diretrizes
que visam fornecer informação pública e incentivar o feedback de todos os
interessados em conservação de cemitérios. As várias partes do guia incluem o
porquê de se preservar os cemitérios históricos, valores patrimoniais de um
cemitério, além de um passo a passo rigoroso para ações de conservação.

Na Europa, existe uma rede internacional de organizações com 22 países,


sem fins lucrativos, chamada Associação dos Cemitérios Significativos da Europa
(ASCE- Association of Significant Cemeteries in Europe ) que engloba 179
cemitérios, abrangendo as organizações públicas e privadas que cuidam de
cemitérios considerados de importância histórica ou artística.

Essa organização visa sensibilizar os cidadãos europeus participando de


vários projetos em conjunto, para promover cemitérios como uma parte
fundamental do património da humanidade, fomentando a importância da
investigação, das restaurações e novas tecnologias.

Na Inglaterra, especificamente, há o órgão English Heritage que é o assessor


legal do governo sobre ambientes históricos, cujo papel envolve, entre outras
coisas: melhorar a compreensão do passado por meio de pesquisa e estudo,
fornecer subsídios de conservação, assessoria, serviços de educação e identificar
e ajudar a proteger os edifícios e sítios arqueológicos de importância nacional.

Por tal motivo, essa organização também foca seus esforços na preservação
de cemitérios históricos, tendo produzido um guia intitulado Paradise Preserved:

36
Deterioração das pedras da arquitetura mortuária do Cemitério Nossa SILVA, Pâmela A. B. V. da
Senhora da Soledade

An Introduction to the Assessment, Evaluation, Conservation and Management of


Historic Cemeteries, que destaca a importância de cemitérios históricos como
verdadeiros oásis verdes dentro de áreas urbanizadas, onde há a aliança da
natureza com a arte, permitindo a contemplação e oferecendo um espaço de ar
fresco apto até para o exercício (WHITE e HODSON, 2007).

Esse guia aborda todas as principais questões relacionadas à conservação


dos cemitérios ingleses, desde a sua história; planos de gestão conservacionista;
inspeção, cuidado, manutenção e reparo dos monumentos e considerações de
ações práticas da conservação.

No Brasil, merece destaque a Associação Brasileira de Estudos Cemiteriais


(ABEC), criada em 2004, que congrega pesquisadores de todo o Brasil em prol do
levantamento e estudo de cemitérios em suas mais diversas manifestações. Essa
associação promove encontros bianuais que visam “agrupar pessoas que tenham
interesse em pesquisar o cemitério como lugar de memória, de produção artística
e de patrimônio cultural”7.

A exemplo, o Cemitério Municipal São Francisco de Paula, fundado em 1854


em Curitiba, entrou para o roteiro turístico da cidade com visitas guiadas pela
pesquisadora Clarissa Grassi, presidente da ABEC.

Há também iniciativas brasileiras estaduais na forma de grupos de estudos e


pesquisas, a exemplo do Interditus – Grupo de Estudos Cemiteriais de Santa
Catarina, fundado em 2009, e que tem por finalidade promover os estudos em
torno da temática cemiterial e da morte, como também, ações de preservação
relacionados com o patrimônio funerário local.

Em Belém, o potencial e a promoção turística do património cemiterial, como


meio de salvaguardá-lo, ainda são pouco explorados. A iniciativa de conservação
fica por conta do tombamento do Cemitério da Soledade, que por si só não
garante a valorização do espaço. Ações esporádicas como ciclos de palestras e
visitas monitoradas também são realizadas.

7
Texto extraído do blog da ABEC. Endereço eletrônico: http://abecbrasil.blogspot.com.br/.

37
Deterioração das pedras da arquitetura mortuária do Cemitério Nossa SILVA, Pâmela A. B. V. da
Senhora da Soledade

2.5. CARACTERIZAÇÃO CLIMÁTICA DE BELÉM

Conforme Frascá (2003) os dados climáticos fornecem informações


relevantes para o entendimento e possíveis previsões das deteriorações. Seus
principais componentes ativos, que afetam particularmente uma construção são:
radiação solar, mudanças de temperatura sazonais, chuvas, vento e transporte de
partículas do solo.
O clima de Belém é quente e úmido. A temperatura média anual fica em torno
de 25º C. A umidade relativa do ar chega a 90% nos meses mais chuvosos. Sem
estações climáticas definidas, possui dois períodos sazonais: chuvoso (dezembro
a maio) e menos chuvoso (julho a novembro). A precipitação média anual varia de
2.500 a 3.000 mm, fazendo de Belém uma das cidades mais chuvosas do Brasil
(NASCIMENTO, 1995).

Segundo a classificação de Köppen, o clima da região de Belém é do tipo Afi.


Onde “A” designa um clima tropical chuvoso, com temperatura média do mês
mais frio superior a 18°C; “f” indica ocorrência de chuva durante todo o ano,
propiciando o desenvolvimento de vegetação conhecida como selva tropical e “i”
indica que o clima não conhece variação de estação, já que a oscilação anual de
temperatura é inferior a 5°C (ANJOS, 2005).

Em termos de radiação solar global, a condição de baixa latitude de Belém faz


com que a altura do sol seja sempre elevada às doze horas, com a menor altura
acima de 60°, condicionando assim a um elevado potencial de radiação solar
incidente nos meses de maior altitude solar (BASTOS et al., 2002).

As temperaturas máximas médias a partir de 1951 até 2005 estiveram num


intervalo de 30,4°C a 33,1°C, sendo que a partir de 2000 houve um aumento
considerável. As temperaturas altas estão associadas ao elevado potencial de
radiação solar incidente. Quanto às temperaturas mínimas médias estiveram
entre 21,1°C a 23,6°C. A nebulosidade é sempre alta, geralmente 6 numa escala
de 0 a 10. Os ventos predominantes são de E a NE, com intensidade nas horas
de temperatura máxima (SANJAD, 2007).

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Deterioração das pedras da arquitetura mortuária do Cemitério Nossa SILVA, Pâmela A. B. V. da
Senhora da Soledade

Como Belém se caracteriza por apresentar temperaturas sempre altas, forte


convecção, ar instável e alta umidade do ar, favorece a formação de nuvens
convectivas. A forte convecção, a instabilidade e a alta umidade do ar favorecem
a formação de nuvens convectivas, dando origem a uma grande incidência de
precipitação na forma de pancadas, principalmente à tarde, situação característica
de regime de chuva do tipo continental (BASTOS et al., 2002).

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Deterioração das pedras da arquitetura mortuária do Cemitério Nossa SILVA, Pâmela A. B. V. da
Senhora da Soledade

3. ÁREA DE
ESTUDO
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Deterioração das pedras da arquitetura mortuária do Cemitério Nossa SILVA, Pâmela A. B. V. da
Senhora da Soledade

3. ÁREA DE ESTUDO - Cemitério Nossa Senhora da Soledade

. A área de estudo da presente pesquisa corresponde ao Cemitério Nossa


Senhora da Soledade, localizado na zona urbana de Belém do Pará, no centro da
cidade, no bairro Batista Campos. O cemitério ocupa hoje uma área de
aproximadamente 24.000m² (Figura 05), que compreende as Avenidas Serzedelo
Corrêa, Gentil Bittencourt, Conselheiro Furtado e a Travessa Doutor Moraes.

N N

Figura 05: Vista aérea do Cemitério da Soledade.


Fonte: Elaborado a partir da ferramenta Google Earth

3.1 HISTÓRICO
Em 1850, diante de um quadro de epidemias de febre amarela, cólera e
varíola que dizimaram milhares de pessoas na cidade de Belém, surgiu a
necessidade da construção de um cemitério.

Antes das epidemias, os mortos eram enterrados nas igrejas 8, com


exceção dos escravos que já eram sepultados em cemitérios. Porém, tal prática
acarretava grandes males sanitários e não era suficiente para comportar a
demanda de enterramentos. Assim, a proibição dos enterramentos nas igrejas e
seus adros, com punição para quem desrespeitasse tal ordem, também contribuiu
para a solução imediata de inauguração, por parte do governo, do Cemitério
Nossa Senhora da Soledade em 8 de Janeiro de 1850, localizado à Avenida
Serzedelo Corrêa, no centro de Belém. Com a Resolução nº 181 de 09 de
dezembro do mesmo ano, ficou estipulada a obrigatoriedade do enterramento no
8
No final do século XIX as capelas laterais das igrejas eram de uso funerário.

41
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Senhora da Soledade

cemitério da Soledade de todas as pessoas falecidas na cidade de Belém. Surgia


então, efetivamente o primeiro cemitério público da cidade já que, como
mencionado anteriormente, somente escravos, condenados à morte, acatólicos e
os excomungados eram enterrados em cemitérios, os quais eram improvisados,
sem delimitação de muros (ARRAES, 2008).

O cemitério ocupa atualmente uma quadra arborizada com palmeiras e


árvores da terra, que se integra harmoniosamente à paisagem urbana de Belém
(Figura 06) como elemento artístico, paisagístico e histórico de grande valia para
a cidade, quebrando de modo estético, a repetição das casas e edificações dos
quarteirões vizinhos (BARATA,1963).

Figura 06: Vista aérea do cemitério da Soledade.


Autor da foto: CARDOSO, Octavio apud SILVA, 2010.

Foi construído em terreno cercado e com uma capela central, que é


característica marcante dos cemitérios deste tipo, evidenciando a ligação desses
espaços com o sagrado. Em frente à capela foi erguido um cruzeiro em pedra
Lioz (Figura 07).

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Deterioração das pedras da arquitetura mortuária do Cemitério Nossa SILVA, Pâmela A. B. V. da
Senhora da Soledade

Figura 07: Vista frontal da Capela com o cruzeiro à frente, Cemitério da Soledade.

Inaugurado no auge do Romantismo, o estilo eclético do Soledade tem o


caráter estético de sua arte funerária intimamente ligado ao estilo de cidades
europeias como Paris, Roma e Portugal, seguindo o molde, em menor escala, dos
famosos cemitérios monumentais europeus (Figura 08). Em plena belle époque,
os recursos financeiros advindos da próspera Era da Borracha financiaram o
trabalho de famosos artistas plásticos que enalteceram o espaço com túmulos e
mausoléus com extrema riqueza de detalhes e simbolismos, que representam a
história social da Belém do século XIX, tornando esse espaço digno de
perpetuação para usufruto de gerações futuras por meio de visitação e turismo.

BELÉM PORTUGAL BELÉM PORTUGAL

Figura 08: Semelhança entre mausoléus do Cemitério dos Prazeres em Portugal


(imagens em preto e branco) e mausoléus do Soledade.
Fonte: FERREIRA, 2009

43
Deterioração das pedras da arquitetura mortuária do Cemitério Nossa SILVA, Pâmela A. B. V. da
Senhora da Soledade

O terreno do cemitério ficou dividido em quadrantes com a presença de


quatro Irmandades: da Ordem Terceira do Carmo, da Santa Casa de Misericórdia
(Figura 09), a qual ficou responsável pela administração do cemitério, a de Santo
Cristo e a de São Francisco da Penitência, dispostas nas quatro extremidades do
terreno (Figura 10). Essas confrarias recebiam doações em troca de sepulturas
para que os doadores pudessem ser enterrados, sendo responsáveis também
pelos ritos funerários. Financiadas pelas elites, por meio das doações, eram
responsáveis também pelos enterros dos escravos e pobres sem condições de
pagar pelo sepultamento.

Figura 09: Área ocupada pela Irmandade da Santa Casa de Misericórdia no Cemitério da
Soledade com as ruínas do muro de delimitação.

Figura 10: Planta do Cemitério N. Srª da Soledade, com a delimitação dos


terrenos das irmandades nos cantos, sendo 1: Irmandade de Santo Cristo, 2: Irmandade de São
Francisco, 3: Irmandade da Santa Casa de Misericórdia e 4: Irmandade da Ordem Terceira do
Carmo.
Fonte: Adaptado de levantamento realizado pelo escritório R2 Arquitetura para o IPHAN, 2008.

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Senhora da Soledade

Àquela época, a ideia da salvação da alma do falecido estava intimamente


ligada ao local de sepultamento, não tendo a construção do novo cemitério
agradado de imediato a boa parte da elite, pois somente o enterro em espaço
sagrado poderia garantir rapidamente o caminho da vida eterna .

Porém, os nobres perceberam depois que os cemitérios permitiam mais


condições de ostentação do que as lápides sepulcrais do interior das igrejas e
começaram a proliferar, nos primeiros cemitérios, a exemplo do Soledade, os
grandes mausoléus, com o objetivo único de mostrar a posição de destaque
econômico, social e político dos seus ocupantes.

Segundo Valladares (1972), era e sempre foi o desejo dos mais abastados,
distinguir-se por meio de uma marca perene, de um objeto de consagração - o
túmulo. A morte agora era um grande espetáculo e o cemitério passava a ser um
lugar privilegiado para demonstrações de força e poder sem precedentes.

Com o enterramento dentro das igrejas já era nítida a existência de uma


discriminação, pois quem mais houvesse contribuído com donativos para a
mesma, teria o direito incondicional de ser enterrado mais próximo do altar-mor.

Tal realidade desigual acompanhou os enterramentos para fora das igrejas.


No Cemitério da Soledade, as famílias mais favorecidas economicamente
importavam os túmulos e mausoléus da Europa, sobretudo de Portugal, e
ocupavam as proximidades da alameda central, enquanto os mais pobres e
escravos espalhavam-se em áreas menos privilegiadas, aos fundos.

Hoje, esses túmulos e mausoléus mais suntuosos que exaltam diversas


linhas arquitetônicas, entre as quais a neoclássica e a neogótica, conferem ao
cemitério o caráter de museu a céu aberto, agregando ao mesmo valores culturais
e artísticos incalculáveis. Em contraste com as sepulturas mais simples, a
ostentação dos mais abastados traduzida em diferentes expressões da arte
tumular evidencia uma segregação social no cemitério, favorecida pela não
padronização em seus sepulcros (Figura 11).

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Deterioração das pedras da arquitetura mortuária do Cemitério Nossa SILVA, Pâmela A. B. V. da
Senhora da Soledade

Figura 11: Contraste entre túmulos e mausoléus no Cemitério da Soledade.

O Cemitério da Soledade abriga túmulos de personagens ilustres do século


XIX da cidade, como o General Hilário Maximiliano Gurjão, importante
combatente da Guerra do Paraguai, cujo mausoléu (Figura 12) foi construído nas
oficinas de Lombardi em Bréscia, na Itália e o trabalho de escultura foi feito pelo
professor Allegretri do Instituto de Belas Artes de Roma (BARATA, 1963). Além
dele, repousam na necrópole o Cônego Siqueira Mendes, o Visconde de Arari,
assim como o capitão Joaquim Vitorino de Sousa Cabral, idealizador do cemitério,
cujos restos mortais se encontram em um Mausoléu construído na área da
Irmandade do Senhor Santo Cristo, a cuja ordem ele pertencia.

Figura 12: Mausoléu em memória do General Hilário Maximiliano Gurjão.

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Deterioração das pedras da arquitetura mortuária do Cemitério Nossa SILVA, Pâmela A. B. V. da
Senhora da Soledade

O pórtico do Cemitério foi talhado em pedra de Lioz, lavrada e escovada,


tendo sido a parte de cantaria executada em Portugal (Figura 13). O encarregado
pelo seu desenho em estilo neo-egípsio, foi o engenheiro e arquiteto italiano
Pezerat, responsável também pelo gradeamento de ferro com suas bases de
pedra oitocentista encomendado na Inglaterra por intermédio da firma Singlehust,
Muller & Cia, de Belém (BARATA, 1963).

Figura 13: Pórtico de entrada do Cemitério da Soledade.

No ano de 1875, o cemitério era considerado limpo e decente, no entanto


já era tido como mal situado e não comportava mais enterramentos, em virtude do
aumento populacional e da alta mortalidade por epidemias. Porém, só dois anos
depois, em 1877, a Santa Casa que administrava os enterramentos nos
cemitérios da cidade, declarou que o Soledade já não tinha espaço suficiente para
enterramentos. Além disso, uma Portaria de 5 de agosto de 1880, do então
presidente da Província Dr. José Coelho da Gama e Abreu, Barão de Marajó -
geógrafo e historiador - suspendia os enterramentos no Nossa Senhora da
Soledade. Segundo análise, o terreno (misto de argila e areia) mostrou-se
impróprio para inumações, conforme Barata (1963).

Desse modo, em 14 de agosto de 1880 foram cessados os enterramentos


no Soledade, onde durante 30 anos foram enterrados mais de 30.000 cadáveres,
ficando autorizados apenas enterros cujos jazigos de família ainda permitissem
(ARRAES, 2008). Foi então, imediatamente substituído pelo Cemitério Santa
Izabel, inaugurado dois anos antes, em 1878.

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Deterioração das pedras da arquitetura mortuária do Cemitério Nossa SILVA, Pâmela A. B. V. da
Senhora da Soledade

Já tendo sido decretada a secularização dos cemitérios no início da


República, em 1890, a Santa Casa então passou a direção, administração e o
custeio do Cemitério da Soledade à Intendência Municipal de Belém.

Na metade do século XX, em virtude do interesse imobiliário na extensa e


então valorizada área do cemitério, o seu tombamento já havia sido proposto pelo
Instituto Histórico do Patrimônio Artístico e Nacional (IPHAN) em 1948 tendo sido
negado pela então Divisão de Estudos e Tombamento, em virtude do grande
número de outros cemitérios de igual ou mais valor ainda sem tombamento, não
justificando assim, o tombamento isolado do Soledade (SILVA, 2010). O
Cemitério da Soledade então, foi efetivado como patrimônio paisagístico nacional
apenas em 1964, o único do Brasil tombado pelo IPHAN e pelo Ministério Público
Federal, com a ajuda de um artigo de autoria de Mário Barata (Anexo A), parte de
um movimento pela preservação do antigo cemitério para evitar que o poder
público usasse seu terreno para outros fins, extinguindo a necrópole.

Mesmo desativado, nos dias atuais, o Cemitério da Soledade ainda é


cenário de manifestações religiosas, como novenas, orações às almas e
agradecimentos de graças alcançadas, ou mesmo atividades apenas
contemplativas, face à predominância marcante de verdadeiras obras de arte
presentes, principalmente, no pórtico, cruzeiro e nos mausoléus.

O Soledade ainda hoje se mantém frequentado graças ao culto às almas


(Figura 14), realizado todas as segundas-feiras, único dia em que o cemitério é
aberto às visitações. São muitos os devotos de várias figuras lá enterradas, como
o Menino Zezinho, o Menino Cícero, a Menina Januária, os Gêmeos, a Preta
Domingas e a Escrava Anastácia, que utilizam o espaço para praticar o
catolicismo e outras religiões afro-brasileiras, com formas tipicamente brasileiras
de demonstrar fé. Habitualmente, velas e oferendas somam-se ao cenário da
necrópole.

48
Deterioração das pedras da arquitetura mortuária do Cemitério Nossa SILVA, Pâmela A. B. V. da
Senhora da Soledade

Figura 14: Culto às almas no Cemitério do Soledade.


Autor da foto: Tarso Sarraf, 2010.

A mesma atividade que o mantém fora do estado de total e completo


abandono, porém, não raro, também é a mesma que contribui significativamente
para o avançado estágio de degradação de inúmeros túmulos e mausoléus de
riqueza estética inigualável. Velas são acesas sem controle algum e oferendas de
todo o tipo são depositadas em qualquer lugar (Figura 15). Como o acesso é livre
e descontrolado, sem vistoria, é fácil deparar-se com túmulos depredados,
saqueados, com peças arrancadas, pichações, tentativas de limpeza mal
sucedidas, fora os restos de cera, alimentos, dentre outros, provenientes dos
ritos. Além disso, infelizmente, como o cemitério ganha atividade somente uma
vez por semana, essa baixa frequência não é capaz de fazê-lo digno de
manutenção permanente e criteriosa perante as autoridades responsáveis.

Figura 15: Oferendas e velas deixadas nos túmulos e mausoléus (em destaque).

Como a grande maioria dos cemitérios públicos de Belém, o Soledade vem


sofrendo, no decorrer do tempo, com abandono e negligência, resultando em
carência de manutenção regular e eficiente. Os mausoléus, com toda sua riqueza
artística e material, encontram-se desgastados e alguns tiveram seus ornamentos
furtados e/ou viraram depósitos (Figura 16). É nítida também a falta de limpeza e

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Deterioração das pedras da arquitetura mortuária do Cemitério Nossa SILVA, Pâmela A. B. V. da
Senhora da Soledade

reparos, no cemitério como um todo. A vegetação abundante, que não recebe


cuidados paisagísticos, evidencia ainda mais o caráter de abandono.

Figura 16: Interior de mausoléus no Cemitério da Soledade.

A competência da administração e manutenção desse Cemitério cabe nos


dias atuais, à Prefeitura Municipal de Belém, a partir da Fundação Cultural do
Município de Belém (FUMBEL) na esfera municipal, à Secretaria de Estado de
Cultura (SECULT) na esfera estadual e ao Instituto do Patrimônio Histórico e
Artístico Nacional (IPHAN) na esfera federal. Mesmo assim, é constatada a
omissão do Poder Público quanto a sua obrigação na conservação do patrimônio
histórico

Em 1994 a FUMBEL (Fundação Cultural do Município de Belém) já


idealizava ao Soledade a proposta de um cemitério parque sob coordenação da
professora e arquiteta Jussara Derenji. Em 2007 a proposta foi retomada pelo
IPHAN (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) que financiou o
projeto intitulado “Conservação, Consolidação, Restauração e Adaptação do
Soledade em Cemitério-Parque”, executado pelo escritório R2 Arquitetura LTDA e
com o apoio do Museu Paraense Emílio Goeldi (MPEG) por meio da investigação
arqueológica coordenada pelo pesquisador Fernando Marques.

Atualmente, está em estudo mais uma proposta de restauração do


Soledade, por meio da SECULT.

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Deterioração das pedras da arquitetura mortuária do Cemitério Nossa SILVA, Pâmela A. B. V. da
Senhora da Soledade

3.2. CRONOLOGIA HISTÓRICA DAS INTERVENÇÕES

Mesmo com a proteção dada pelo tombamento em 1964, no Cemitério da


Soledade as intervenções que ocorreram foram pontuais e pouco significativas,
geralmente reparos ou reforços estruturais (LACORE, 2014). Com mais de um
século de existência, pouco se tem notícia de efetivos melhoramentos na
necrópole municipal mais antiga de Belém, fato atestado pela cronologia de
intervenções baseada, sobretudo, nos estudos de Arraes (2008) e Silva (2010).

• 1850 – Entra em vigor o regulamento do Cemitério da Soledade, estabelecendo


seu regime e forma de administração, sob os cuidados da Santa Casa de
Misericórdia.

• 1852 - Já sob a administração da Santa Casa de Misericórdia, as obras do


cemitério estavam em andamento.

• 1853 - O cemitério estava quase concluído, faltando ainda o pórtico com portão
de ferro, o lajeamento do parapeito e o gradil.

• 1854 - Andamento das obras e quase conclusão, faltando apenas acabar o


pórtico de entrada.

• 1863 – Primeira grande reforma no Soledade: foi derrubado o arvoredo de


casuarina que enfeitava as alamedas, as grades de madeira existentes na
passarela, foram substituídas por parapeitos de tijolinhos côncavos e a capela foi
retelhada e caiada.

• 1877 - Conservava-se limpo e decente, porém a Santa Casa já havia declarado


que o local já era insuficiente para enterramentos.

• 1880 – Em agosto cessam os enterramentos no Cemitério da Soledade, tendo


sido este Cemitério imediatamente substituído pelo Cemitério Santa Izabel,
inaugurado dois anos antes, em 1878.

• 1890 – A administração e custeio do Soledade passam à Intendência Municipal,


em virtude da secularização dos cemitérios, por meio de Decreto do governo da
República.

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Deterioração das pedras da arquitetura mortuária do Cemitério Nossa SILVA, Pâmela A. B. V. da
Senhora da Soledade

• 1906 – Intenção por parte do Intendente de Belém, Antônio Lemos de realizar


reformas no cemitério em complementação ao projeto de alargar a Avenida
Serzedelo Correa, incluindo remodelação do gradeamento original, substituição
da capela por uma mais moderna e eliminação das sepulturas mais modestas. Tal
projeto não seguiu adiante.

• 1912 – O então Intendente Virgílio Mendonça, na intenção de fazer a


restauração que Lemos não fez, ordenou a reconstrução do passeio central
mandando colocar em seguida uma placa indicativa “RECONSTRUÍDO EM 1912”
(Figura 17), porém de fato não houveram trabalhos do porte de uma restauração
efetiva, apenas consertos e limpezas, conforme Vianna9 apud Arraes (2008).

Figura 17: Placa indicativa da reforma de 1912, na entrada do Cemitério da Soledade.

• 1948 – Foi recusada a proposta de inscrição do Cemitério da Soledade no Livro


do Tombo Nacional.

• 1964 – Tombamento pelo IPHAN do Conjunto Paisagístico do Cemitério Nossa


Senhora da Soledade em 23 de Janeiro.

• 1994 – Torna-se Patrimônio da cidade de Belém por meio da Lei Municipal 7.709
de 18 de Maio de 1994. No mesmo ano, o Departamento de Patrimônio
Histórico/DEPH/FUMBEL propõe projeto de restauração para transformar o local
em um Cemitério Parque, porém sem continuidade (LACORE, 2014).

9
Jornal “A Província do Pará” Arthur Vianna. Recortes de Jornais do Arquivo do Museu Santa
Casa de Misericórdia do Estado do Pará.

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Deterioração das pedras da arquitetura mortuária do Cemitério Nossa SILVA, Pâmela A. B. V. da
Senhora da Soledade

• 1996 - Ação capitaneada pelo DEPH/FUMBEL sob a consultoria do Profº. Mário


Mendonça de Oliveira. Os trabalhos incluíam serviços de limpeza dos túmulos em
pedra localizados nas primeiras fileiras do passeio principal nos dois quadrantes
frontais, com a aplicação de emplastro de bentonita. Tal intervenção teve bons
resultados, cujo efeito foi perceptível por vários anos (LACORE, 2014).

• 2000 – Execução de iluminação para alguns monumentos do cemitério.

• 2009 – Concluído projeto de restauração e readequação do Cemitério da


soledade, cuja elaboração começou em 2007. O IPHAN contratou o escritório R2
Arquitetura para desenvolver a proposta, incluindo levantamento dos túmulos e
mausoléus e diagnóstico de conservação, uso museológico com visitas guiadas e
criação de áreas de convivência, construção de mobiliário adequado à prática dos
cultos e remanejamento do barracão da feira construído rente ao muro do
Cemitério na Trav. Dr. Morais para abertura de novo acesso (Figura 18). O projeto
não foi executado, a obra seria realizada com verba federal proveniente do
programa PAC Cidades Históricas10, mas a execução do projeto está parada
porque a prefeitura possui pendências com o Governo Federal que impedem a
transferência dos recursos11.

“O Poder Público Federal encontra-se impedido de


celebrar convênio visando o repasse de verbas
federais diante da situação de inadimplência da
municipalidade com a União, não podendo receber
recursos através do PAC Cidades Históricas”
(BRASIL, 2012).

10
O PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) das Cidades Históricas é um programa
lançado no Governo Lula, cuja ação é voltada para investimentos das três esferas do Governo na
preservação do patrimônio cultural no Brasil, financiando a recuperação de imóveis privados,
monumentos e imóveis públicos.
11
Informações do portal eletrônico do Ministério Público do Pará – Procuradoria da República do
Pará. Disponível em: <http://www.prpa.mpf.mp.br/news/2012/prefeitura-de-belem-pode-ser-
obrigada-a-restaurar-cemiterio-da-soledade>. Acesso em: maio/2014

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Deterioração das pedras da arquitetura mortuária do Cemitério Nossa SILVA, Pâmela A. B. V. da
Senhora da Soledade

Figura 18: Projeto de restauração proposto pela R2 Arquitetura.


Fonte: IPHAN/R2 Arquitetura.

• 2012 – Decisão Liminar ajuizada pelo Ministério Público Federal, em virtude da


inércia do Poder Público Municipal em restaurar o bem sob sua custódia, não
obstante a existência de projeto elaborado pelo IPHAN objetiva o cumprimento da
obrigação de se restaurar integralmente o Cemitério Nossa Senhora da Soledade.
O relatório de vistoria técnica realizado no bem tombado pelo IPHAN, atestando o
avançado estágio de degradação no local corroborou para a decisão. O pedido
liminar ateve-se unicamente na execução de obras visando a estabilização
estrutural da Capela do Cemitério da Soledade (BRASIL, 2012).

• 2013 – O prefeito de Belém, Zenaldo Coutinho, garante a aprovação de 15 obras


belenenses no PAC- Cidades Históricas, incluindo o Cemitério da Soledade12.

• 2014 – Novamente, agora por meio da SECULT, é proposto um projeto


executivo de restauração e conservação dos monumentos da arquitetura
mortuária do Cemitério Nossa Senhora da Soledade, visando revitalizar o espaço.
O projeto encontra-se em processo de aprovação.

12
Informações extraídas do portal eletrônico da Prefeitura Municipal de Belém. Disponível em:
<http://ww3.belem.pa.gov.br/www/?p=12022>. Acesso em: maio/2014

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Deterioração das pedras da arquitetura mortuária do Cemitério Nossa SILVA, Pâmela A. B. V. da
Senhora da Soledade

3.3. CONSERVAÇÃO E RESTAURAÇÃO: CONTRIBUIÇÕES DA TEORIA

Os lugares de sepultamento, assim como quaisquer lugares nas cidades,


são espaços construídos por meio de práticas sociais, traduzindo leituras sociais
de uma época, ou seja, são o espelho das atitudes de uma dada sociedade.
Considerando-se monumento “a criação arquitetônica isolada bem como o sítio
urbano ou rural que dá testemunho de uma civilização particular, de uma
evolução significativa ou de um acontecimento histórico” (CARTA DE VENEZA,
1964), os túmulos e mausoléus do Cemitério da Soledade são monumentos,
símbolos indissociáveis do período e das sociedades que os produziram,
patrimônio que alimenta a memória da herança coletiva de Belém.

Boa parte do patrimônio histórico e cultural da cidade de Belém encontra-


se em risco por sofrer ora com o descaso, ora com intervenções, ditas
restaurativas, que muitas vezes são feitas deliberadamente e não cumprem a
função de conservar e preservar a obra. Cabe salientar, então, a importância de
um juízo crítico, baseado nas contribuições das teorias do restauro, para que o
restaurador diante de um leque de múltiplas possibilidades possa legitimar as
suas escolhas quanto aos procedimentos de restauro.

A noção de que se deve preservar um patrimônio histórico como o


Soledade, não vem de hoje, mas ainda se mantém um tema atual e, desde então,
diversas formas de intervir sobre o mesmo foram propagadas. Entre elas, as de
dois grandes nomes da restauração: Alois Riegl (1858 – 1905) e Cesare Brandi
(1906 – 1988). Os dois protagonizaram a história do restauro tendo seus preceitos
teóricos servido de embasamento à prática do restaurador, considerando suas
grandes obras: “O culto moderno aos monumentos: sua essência e sua gênese”,
escrito em 1903 e “Teoria da restauração”, escrito em 1963, respectivamente.

Riegl, um historiador da arte vienense, fundamenta sua teoria muito mais


no valor dado ao monumento do que no monumento em si. O valor que é
atribuído ao monumento irá direcionar a forma específica que o seu tratamento
deve assumir. De modo que o cemitério da Soledade e seus monumentos, a
exemplo, apresentam valor de rememoração do passado, por fazer lembrar
atitudes, fatos, crenças que não existem mais.

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Deterioração das pedras da arquitetura mortuária do Cemitério Nossa SILVA, Pâmela A. B. V. da
Senhora da Soledade

Em sua obra, Riegl (2006), classifica esses monumentos em intencionais


ou não, cabendo aos túmulos e mausoléus do Soledade o caráter intencional, já
que os mesmos foram erguidos, pela vontade de seus criadores, para
homenagear os mortos, com a intenção clara de conservar viva e presente a
lembrança dos falecidos, servindo posteriormente como lugares de oração e
adoração a eles. E esse valor de rememoração intencional “não reivindica menos
para o monumento que a imortalidade, o eterno presente, a perenidade do estado
original” (RIEGL, 2006, p. 86), sendo a restauração o postulado base dos
monumentos intencionais, uma vez que perdendo seus elementos comemorativos
para a ação do tempo e da natureza, o monumento deixaria de ser intencional. A
função desse valor consiste em “impedir quase definitivamente que um
monumento sucumba ao passado, e o guarda sempre presente e vivo na
consciência das gerações futuras” (RIEGL, 2006, p. 85).

Seguindo com os valores adquiridos pelo monumento, o Soledade como


um todo ganha valor histórico à medida que é testemunho da atividade humana
da sociedade belenense do século XIX, sendo o primeiro cemitério municipal da
cidade. Cabe ressaltar que, para Riegl, todo monumento histórico é também um
monumento artístico, não existindo, porém, valor artístico absoluto, apenas um
valor relativo.

“É importante perceber que todo monumento de arte


é, sem exceção e simultaneamente, um monumento
histórico... De modo inverso, todo monumento
histórico é também um monumento artístico” (RIEGL,
2006, p.45).

Artisticamente, esse Cemitério abriga ricos exemplares de obras


esculturais e arquitetônicas, carregados do simbolismo funerário da época (Figura
19) e que também marcam uma era e fatos históricos ao remontarem às técnicas
e costumes funerários antigos e abrigarem personagens ilustres da história de
Belém.

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Deterioração das pedras da arquitetura mortuária do Cemitério Nossa SILVA, Pâmela A. B. V. da
Senhora da Soledade

Figura 19: Simbolismo funerário no Cemitério da Soledade.

De acordo com Riegl (2006), a partir do momento que aquele espaço


transforma-se num documento histórico, ele é de interesse para a pesquisa futura,
interessando a sua forma original e intacta do momento da criação do autor,
sendo então intolerável que o monumento sofra com as alterações futuras da
natureza (incluindo a atividade humana), assim como no valor de rememoração
intencional. O culto ao valor histórico defende a intervenção humana para a
conservação do monumento no seu estado presente, de modo que “os sintomas
de degradação devem ser suprimidos a todo custo” (RIEGL, 2006, p. 77),
garantindo a autenticidade do patrimônio, mesmo levando-se em conta que “uma
conservação eterna é simplesmente impossível” (RIEGL, 2006, p. 83).

Ainda seguindo a teoria de Riegl, pode-se atribuir também ao Cemitério da


Soledade, o valor de contemporaneidade de uso, pertencente ao presente, ao
contrário do valor de rememoração, ligado ao passado. Riegl afirma que “a maior
parte dos monumentos pode responder às expectativas contemporâneas dos
sentidos ou do espírito tanto quanto as criações novas e modernas” (RIEGL,
2006, p.91). O culto a esse valor ganha força à medida que Riegl considera que a
utilização contínua de um monumento antigo, a presença e movimento dos
homens, têm considerável importância para que os mesmos não estejam fadados
ao abandono, agravando assim os sintomas de degradação, de modo que eles
nos pareçam mais antigos do que realmente o são.

O Cemitério foi destituído de sua significação prática inicial (enterramentos)


ainda no século XIX, mas como já relatado anteriormente, a utilização do espaço
para missas e cultos, além de visitações para contemplação, ainda permanece

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Deterioração das pedras da arquitetura mortuária do Cemitério Nossa SILVA, Pâmela A. B. V. da
Senhora da Soledade

atualmente, garantindo o culto ao valor de uso para os seus monumentos. Tal


valor de uso, porém, reivindica a ideia de que “um edifício antigo que continua a
ser utilizado deve poder abrigar seus ocupantes sem colocar em risco suas vidas
ou saúde” (RIEGL, 2006, p.92), o que se contrapõe com a atual situação
degradante do Cemitério.

Assim como no valor histórico, que se adapta facilmente ao valor de uso, é


exigida a integridade das obras, preservando a aparência de sua origem e
combatendo-se as marcas de seu envelhecimento ou de suas fragilidades. Há de
se esperar que as intervenções restaurativas previstas para o Cemitério da
Soledade levem em consideração as exigências a que ele e seus frequentadores
têm direito, mantendo-o apto a ser utilizável com suas características originais
que lhe atribuíram valor específico.

O italiano Cesare Brandi, um dos principais nomes do restauro moderno,


reconhecido por um restauro crítico, pautado em escolhas restaurativas
embasadas num julgamento criterioso, como já antecipado por Riegl. Ele pauta
sua teoria em dois axiomas, o primeiro: “restaura-se somente a matéria da obra
de arte” (BRANDI, 2008, p.31). A obra de arte é um ato mental que se manifesta
em imagem através da matéria, que é só o que deve ser restaurado. De maneira
que, quando se chega à intervenção prática faz-se necessário um conhecimento
científico da matéria na sua constituição física. Para tratar-se adequadamente
uma questão restaurativa é necessário um conhecimento aprofundado das
características dos materiais, suas formas e causas de alteração.

No segundo axioma, Brandi preconiza que: “a restauração deve visar ao


restabelecimento da unidade potencial da obra de arte, sem cometer um falso
artístico ou um falso histórico, e sem cancelar nenhum traço da passagem da
obra de arte no tempo (BRANDI, 2008, p.33). Para Brandi, cada pedaço de uma
obra faz parte de um inteiro e não de um total. Assim, no processo restaurativo
busca-se desenvolver a unidade potencial dos fragmentos, de modo a reconstituir
a unidade originária da obra de arte. Para Brandi, prevalece a estância estética,
deve assegurar-se a manutenção da integridade imagética da obra, sua
autenticidade.

58
Deterioração das pedras da arquitetura mortuária do Cemitério Nossa SILVA, Pâmela A. B. V. da
Senhora da Soledade

Esse axioma segue alguns princípios práticos, sendo o primeiro referente


às integrações. Os pedaços acrescentados deverão ser sempre facilmente
reconhecíveis, porém sem afetar a unidade da obra, devendo permanecer
invisível à distância. Ressaltando que Brandi acredita que, “o mais grave, em
relação à obra de arte, não é tanto aquilo que falta, quanto o que se insere de
modo indevido” (BRANDI, 2008, p. 49).

No Cemitério da Soledade, o que fica muito claro observando-se os


monumentos pétreos é a temporalidade das mudanças. Tem-se a nítida ideia das
partes modificadas, com reformas estruturais, preenchimento de lacunas com
material diferente e reintegração de partes soltas, o que não configura a
ocorrência do falso histórico, mas tampouco se configuram como as técnicas
restaurativas mais apropriadas a cada caso.

O outro princípio é relativo à matéria, a qual só é insubstituível quando


interferir diretamente na “figuratividade da imagem” como aspecto, tendo o
restaurador maior liberdade para agir na matéria quando configurar estrutura,
suporte e etc.

Por fim, o terceiro princípio, busca garantir a salvaguarda da obra de arte


com boas chances de sofrer intervenções acertadas no futuro, prescrevendo que
“qualquer intervenção de restauro não torne impossível mas, antes, facilite as
eventuais intervenções futuras” (BRANDI, 2008, p. 48).

No Cemitério da Soledade, tal princípio não foi seguido, pois o espaço da


necrópole ao longo dos anos não contou com manutenção e intervenções
restaurativas regulares e embasadas teoricamente, o que apenas fomenta o já
rápido processo de degradação, alterando a imagem dos monumentos e contribui
com o grau de dificuldade das próximas intervenções.

Infelizmente, ainda que a fachada permaneça inalterada (pelo menos,


quanto aos elementos decorativos, desconsiderando pinturas e cores), com o
passar do tempo o Cemitério foi perdendo elementos que compunham a sua
imagem, como muros que delimitavam espaços no interior e a própria vegetação

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Deterioração das pedras da arquitetura mortuária do Cemitério Nossa SILVA, Pâmela A. B. V. da
Senhora da Soledade

(Figura 20). Percebe-se, por parte dos órgãos responsáveis, um demérito dos
valores culturais relacionados com a morte.

Figura 20: Cemitério da Soledade em 1902 e atualmente, respectivamente.

Ainda conforme a Teoria Brandiana, a obra de arte apresenta três


momentos distintos: o primeiro é o de concepção, constituído pelo intervalo que
vai da concepção à exteriorização, pelo artista, de sua obra de arte. O segundo
representa o intervalo que vai do fim do processo de criação ao momento em que
a consciência de cada um atualiza a obra de arte, quando sua unidade potencial
está sendo formada e o terceiro e último é o seu reconhecimento.

E a grande questão é definir em qual tempo em relação à obra de arte, é o


exato instante onde deve ser inserido o restauro. Brandi preconiza então, que o
único momento correto para a restauração é o terceiro momento, aquele do
presente da consciência observadora, onde “a obra de arte está no átimo e é
presente histórico, mas é também passado e, a custo de outro modo, de não
pertencer à consciência humana, está na história” (BRANDI, 2004, p.61), ao
contrário do que pregava Viollet-le duc13 no século XIX: “o melhor a fazer é
colocar-se no lugar do arquiteto primitivo e supor o que ele faria” (VIOLLET-LE-
DUC, 1994, p.32), ou seja, uma intervenção no primeiro tempo, que garantiria
alterações na imagem da obra de arte. Para Brandi, intervir na fase do processo
artístico “é a mais grave heresia da restauração: é a restauração fantasiosa”
(BRANDI, 2008, p. 60).

13
Arquiteto francês do século XIX, um dos primeiros teóricos da preservação do património
histórico.

60
Deterioração das pedras da arquitetura mortuária do Cemitério Nossa SILVA, Pâmela A. B. V. da
Senhora da Soledade

Ao definir conceitos relativos à obra de arte como


matéria, unidade potencial e tempo, Brandi dá
sustentabilidade e credibilidade à sua proposta
intervencionista e antecipa questões que vêm à
mente de todos aqueles que estudam o assunto,
presenteando-os com uma metodologia de
restauração muito bem estruturada. (ARAÚJO, 2006,
p.3)

O Soledade ganhou sua unidade quando do seu reconhecimento como


Patrimônio Nacional Paisagístico por meio do tombamento em 1964, pelo IPHAN
(Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) e, então passou a ter valor
como patrimônio cultural, sendo reconhecido como tal, digno de perpetuação para
as gerações futuras.

Com base nos dois grandes pensamentos supracitados, os quais são


complementares, é relevante enfatizar a importância do estudo e conhecimento
aprofundado do monumento para uma boa restauração, salvaguardando
estruturas do passado sem, no entanto, impedir o surgimento de novas estruturas.
Como preconizava Brandi, “a obra de arte deve condicionar o restauro e não o
contrário (BRANDI, 1994, p.29).

Cabe ao restaurador saber usufruir dessa transmissão de conhecimento,


seja técnico ou social, filtrando o que, de fato terá valor para o sucesso de sua
intervenção. Como a história é dinâmica, a cada geração descobrem-se novos
aspectos de dada obra e tudo depende da maneira pela qual se aborda o
passado, definindo quais questões serão relevantes (GIEDION, 2004).

61
Deterioração das pedras da arquitetura mortuária do Cemitério Nossa SILVA, Pâmela A. B. V. da
Senhora da Soledade

4. MATERIAIS
E MÉTODOS
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Deterioração das pedras da arquitetura mortuária do Cemitério Nossa SILVA, Pâmela A. B. V. da
Senhora da Soledade

4. MATERIAIS E MÉTODOS

Os materiais da seguinte pesquisa correspondem às pedras de túmulos e


mausoléus do Cemitério Nossa Senhora da Soledade, datados do fim do século
XIX, e o produto de suas alterações patológicas resultantes de ações intempérica
e antrópica.

4.1 ELENCO E ESTRATÉGIA DE ESCOLHA

Há 464 túmulos e mausoléus no Cemitério Nossa Senhora da Soledade,


cuja localização baseou-se numa divisão de quadrantes, seguindo a ordem
alfabética, a qual foi usada na presente pesquisa para localização das obras
escolhidas para o elenco (Figura 21).

Figura 21: Divisão de quadrantes


Fonte: Levantamento cadastral da R2 Arquitetura/IPHAN (2008)

Dentre os túmulos e mausoléus em pedra, foi selecionado o total de 30


exemplares para formação do elenco que serviu de base para os mapeamentos
de danos e térmico e coleta das amostras, sendo 15 do lado esquerdo da
alameda central e 15 do lado direito (Figura 22).

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Deterioração das pedras da arquitetura mortuária do Cemitério Nossa SILVA, Pâmela A. B. V. da
Senhora da Soledade

Figura 22: Marcação (em vermelho) dos túmulos e mausoléus selecionados.

Para seleção do elenco (Figura 23 e 24), foram estabelecidos os seguintes


critérios de escolha:

▪ Importância do túmulo ou mausoléu para a unidade estética e histórica do


cemitério;

▪ Localização e orientação dos mesmos na quadra do cemitério, já que tais


fatores influenciam diretamente nas ações intempéricas sofridas pelos materiais a
serem analisados;

▪ Variação das patologias encontradas, de modo a apresentar os principais


e mais variados tipos de deterioração;

▪Abranger os tipos de pedra mais utilizados na construção das obras,


considerando os três principais encontrados: granito, mármore e Lioz.

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Deterioração das pedras da arquitetura mortuária do Cemitério Nossa SILVA, Pâmela A. B. V. da
Senhora da Soledade

B03 B09 B13 B26 B34

B46 E05 F02 F31 F42

F36 I10 J15 J20 Q01

Figura 23: Túmulos e mausoléus selecionados no lado esquerdo.

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Deterioração das pedras da arquitetura mortuária do Cemitério Nossa SILVA, Pâmela A. B. V. da
Senhora da Soledade

C10 C23 D03 G02 G11

G22 G34 H1 H11 K03

K13 K14 K18 S01 T01

Figura 24: Túmulos e mausoléus selecionados no lado direito.

4.2. REGISTRO FOTOGRÁFICO E MAPEAMENTO DE DANOS DOS TÚMULOS


E MAUSOLÉUS
O mapeamento das degradações aparentes foi documentado em forma de
fichas (em apêndice), nas quais os danos foram listados, conforme grupos de
patologias, com marcação sobre imagens das quatro faces de cada obra, além de
ilustrações ampliadas dos danos mais significativos. Foi necessário definir o
método de classificação das morfologias de alteração que seria empregado no

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Deterioração das pedras da arquitetura mortuária do Cemitério Nossa SILVA, Pâmela A. B. V. da
Senhora da Soledade

mapeamento, desse modo, as formas de alteração foram classificadas segundo o


Glossário ilustrado de padrões de deterioração em pedras do International Council
on Monuments and Sites (Figuras 25 a 29) – ICOMOS (2008). Segundo o
Glossário (ICOMOS, 2008), os padrões são divididos em cinco grandes grupos:
Fissura e Deformação, Destacamento, Descoloração e Depósito, Perda de
Material e Colonização Biológica. Três tipos de patologia encontrados no
Cemitério da Soledade, carbonização, preenchimento e destacamento, foram
acrescentados aos do Glossário (ICOMOS, 2008), sendo inseridos, os dois
primeiros no grupo Descoloração e Depósito e o último no grupo Destacamento.

Grupo Nomenclatura Definição Exemplo

Rachadura que atravessa


Fratura
completamente a peça de pedra
FISSURA E DEFORMAÇÃO

Fissura individual visível a olho


Fissura
nu

Fissura capilar Microfissuras

Mudança na forma sem perder a


integridade, levando à flexão,
Deformação
flambagem ou torção de um
bloco de pedra

Figura 25: Quadro de formas de deterioração do grupo “Fissura e Deformação” encontrados no


Soledade.
Fonte: Adaptado de ICOMOS (2008).

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Deterioração das pedras da arquitetura mortuária do Cemitério Nossa SILVA, Pâmela A. B. V. da
Senhora da Soledade

Grupo Nomenclatura Definição Exemplo

Separação física em múltiplas


Esfoliação camadas (lâminas) paralelas à
superfície da pedra

Ruptura parcial ou completa de


uma pedra, em porções de
Fragmentação dimensões variáveis, que são
irregulares na espessura, forma
e volume

Destacamento de grãos aplicado


principalmente para mármore
Desintegração-
branco cristalino, quando perde
sugaring
DESTACAMENTO

os cristais de calcita na
superfície

Desintegração - Destacamento de grãos. Produz


Desagregação detritos referentes à
granular pulverização da pedra

Destacamento de camada
Peeling superficial milimétrica com
aparência de película

Destacamento de peças a partir


Destacamento
das juntas

Figura 26: Quadro de formas de deterioração do grupo “Destacamento” encontradas no Soledade.


Fonte: Adaptado de ICOMOS (2008).

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Deterioração das pedras da arquitetura mortuária do Cemitério Nossa SILVA, Pâmela A. B. V. da
Senhora da Soledade

Grupo Nomenclatura Definição Exemplo


Crosta desenvolvida geralmente em
áreas protegidas da ação direta da
chuva ou de áreas de escoamento
em ambientes urbanos. Adere
Crosta negra
firmemente ao substrato e é
composta principalmente de
partículas da atmosfera presas
numa matriz de gipso.
Acúmulo de material exógeno de
espessura variável. Alguns
exemplos de depósitos: salpicos de
Depósito tinta ou argamassa, cera de vela,
partículas atmosféricas tais como
fuligem ou poeira, vestígios de
materiais de conservação
Mudança de cor na pedra em um
DESCOLORAÇÃO E DEPÓSITO

dos três seguintes parâmetros:


matriz, valor e croma. Matiz:
Descoloração ou característica mais proeminente de
Alteração uma cor (azul, vermelho, amarelo,
cromática laranja etc ..). Valor: escuridão ou
luminosidade de uma cor. Croma:
pureza de uma cor.

Corresponde ao escurecimento
Área úmida de uma superfície devido à
umidade.

Gravuras, cortes ou aplicação de


Grafite tinta ou pintura ou algo similar
sobre a superfície da pedra.

Depósito de uma camada muito


fina de partículas exógenas (por
Sujidade exemplo, fuligem), dando uma
aparência suja para a superfície
da pedra.

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Deterioração das pedras da arquitetura mortuária do Cemitério Nossa SILVA, Pâmela A. B. V. da
Senhora da Soledade

Preenchimento de vazios da
Preenchimento pedra com material
extemporâneo

Escurecimento da pedra em
Carbonização
virtude da queima de velas

Figura 27: Quadro de formas de deterioração do grupo “Descoloração e Depósito” encontradas no


Soledade.
Fonte: Adaptado de ICOMOS (2008).

Grupo Nomenclatura Definição Exemplo

Perda da superfície original. A


Erosão pedra deteriora-se de forma
irregular

Dano mecânico devido ao


PERDA DE MATERIAL

Dano mecânico - impacto


Dano de impacto de um projétil (bala, metralha) ou
de uma ferramenta

Perda superficial causada


Dano mecânico -
manualmente de forma acidental
arranhão
ou intencional

Espaço vazio obviamente


localizado no lugar de alguma
Lacuna
parte da pedra anteriormente
existente

Figura 28: Quadro de formas de deterioração do grupo “Perda de material” encontradas no


Soledade.
Fonte: Adaptado de ICOMOS (2008).

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Deterioração das pedras da arquitetura mortuária do Cemitério Nossa SILVA, Pâmela A. B. V. da
Senhora da Soledade

Grupo Nomenclatura Definição Exemplo


Colonização da pedra por
plantas e micro-organismos
como bactérias, cianobactérias,
Colonização
algas, fungos e líquens.
biológica
Também inclui influências por
outros organismos, como
animais que nidificam na pedra.
São microscópicas, formadas
de organismos vegetais sem
caule nem folhas. Formam-se
verde, vermelho, marrom ou véu
Algas negro em zonas e podem ser
encontradas principalmente em
situações em que o substrato
COLONIZAÇÃO BIOLÓGICA

permanece umedecido durante


longos períodos de tempo.
Organismo vegetal, formando
pequenas almofadas macias e
verdes. Crescem
Musgo
frequentemente na superfície da
pedra, cavidades abertas,
rachaduras

Organismo vegetal formando


manchas arredondadas duras ou
espessas. Muitas vezes tem
aparência de couro, crescendo
Líquen
geralmente em partes exteriores
de um edifício. São mais
comumente cinza, amarelo,
laranja, verde ou preto.
Vida vegetal tendo, quando
completa, raiz, caule e folhas,
embora às vezes consista
Planta
apenas de uma expansão única
frondosa (por exemplo: árvore,
erva, samambaia)
Figura 29: Quadro deformas de deterioração do grupo “Colonização biológica” encontradas no
Soledade.
Fonte: Adaptado de ICOMOS (2008).

71
Deterioração das pedras da arquitetura mortuária do Cemitério Nossa SILVA, Pâmela A. B. V. da
Senhora da Soledade

4.3 MAPEAMENTO TÉRMICO

O mapeamento térmico foi feito com o auxílio da câmera de infravermelho


da marca Flir, modelo T300, série 48805340 (Figura 30), para registrar as
diferentes temperaturas existentes nas pedras em diferentes dias, de modo a
compreender a interferência do calor, tanto natural quanto provocado (proveniente
de velas) para o surgimento de determinadas patologias. O registro da
temperatura superficial das obras foi feito nos meses de Fevereiro, Abril e Junho
de 2014. Além disso, o programa FLIR QuickReport 1.2 SP2 foi utilizado para a
edição das imagens em infravermelho (Figura 31), de modo a melhorar a
apresentação das imagens para posterior análise.

Figura 30: Câmera infravermelha Flir.

Figura 31: Edição de imagens no programa FLIR QuickReport 1.2 SP2.

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Senhora da Soledade

4.4 AMOSTRAGEM

Para fins de análises laboratoriais, foram coletadas amostras de pedras


encontradas no Cemitério da Soledade (Tabelas de 05 a 07). A priori, a
identificação dos materiais pétreos foi feita a partir de observação visual no local.
As amostras foram armazenadas em recipientes de vidro e a nomenclatura
adotada foi baseada na origem petrográfica dos materiais coletados, sendo GR
referente a granito, LI a Lioz, e MA a mármore.

Tabela 05: Amostragem de material pétreo - granito


ÁREA DE COLETA AMOSTRA LOCALIZAÇÃO
(marcação no mausoléu) (material coletado) (quadrante)
F31
GR-F31

Tabela 06: Amostragem de material pétreo- mármore


ÁREA DE COLETA AMOSTRA LOCALIZAÇÃO
(marcação no mausoléu) (material coletado) (quadrante)
Fragmento solto MA-B13 B13

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Tabela 07: Amostragem de material pétreo- Lioz


ÁREA DE COLETA AMOSTRA LOCALIZAÇÃO
(marcação no mausoléu) (material coletado) (quadrante)
Fragmento solto LI-B09 B09

LI-B03 B03

LI2-G34 G34

Fragmento solto LI-B26 B26

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Ressalta-se a dificuldade quanto à coleta de material, visto que não haviam


tantos fragmentos soltos a serem recolhidos, de bom tamanho para análises.
Seguiu-se o critério de uma coleta minimamente invasiva, de pequenos
fragmentos, além dos já disponíveis nas proximidades em virtude de algum tipo
de desagregação, também aqueles que cediam ao menor esforço mecânico, de
modo a não danificar ainda mais a construção histórica e sem implicar na leitura
de sua identidade.

Foram coletadas também amostras de películas (Tabelas 08 a 10) que


cobrem os túmulos e mausoléus, que vão desde deposição de camadas de
poluentes até camadas microbiológicas de fungos, algas ou liquens, depositadas
nas superfícies.

Tabela 08: Amostragem de películas biológicas coletadas de áreas externas.


AMOSTRA LOCALIZAÇÃO DESCRIÇÃO
(nome) (quadrante) (características
macroscópicas)
PVM-D03 D03

Película avermelhada
de colonização
biológica coletada de
ornamento em
mármore.

PVM-F42 F42

Película avermelhada
coletada de cantaria
de Lioz, caracterizada
como colonização
biológica.

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Tabela 09: Amostragem de películas biológicas coletadas em áreas internas de mausoléus.


AMOSTRA LOCALIZAÇÃO DESCRIÇÃO
(nome) (quadrante) (características
macroscópicas)
PVD-B3 B03

Película esverdeada de
colonização biológica
coletada de Lioz em face
interna do mausoléu.

PVD-F02 F02

Película esverdeada de
colonização biológica
coletada de mármore em
face interna do
mausoléu.

Tabela 10: Amostragem de películas inorgânicas.


AMOSTRA LOCALIZAÇÃO DESCRIÇÃO
(nome) (quadrante) (características
macroscópicas)
PEN-F31 F31

Película inorgânica
enegrecida coletada de
área em granito protegida
de chuvas.

PEN-F36 F36

Película inorgânica
enegrecida coletada de
área em Lioz protegida
de chuvas.

76
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A coleta do material foi feita in loco e o mesmo foi armazenado em


recipientes com água destilada (Figura 32). Similar ao já feito com as amostras
pétreas, no caso das películas a nomenclatura seguiu as características
macroscópicas dos materiais, sendo PEN referente à película enegrecida, PVM à
película vermelha e PVD película verde.

Figura 32: Coleta de material de origem: A) biológica no túmulo F42 e B) inorgânica no


mausoléu F31.

4.5 ANÁLISES LABORATORIAIS

Foram realizadas análises laboratoriais para caracterização tecnológica


das pedras, de modo a determinar os parâmetros petrográficos e físicos do
material empregado, assim como do produto das suas alterações.

– Difração de raios-X

As análises por difração de raios-X foram realizadas no Laboratório de


Caracterização Mineral (LCM) do IG/UFPA, utilizando difratômetro (Figura 33)
com controle automático, marca PHILIPS, modelo PW 3710, acoplado a um
microcomputador, com goniômetro PHILIPS, modelo PW 3020, com fenda
automática e monocromador de grafite, tubo de raios-X com ânodo de cobre
(λCuKα1= 1,54060 Å). A interpretação dos difratogramas foi realizada com auxílio
do software X’PERT High Score da PHILIPS.

77
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Figura 33: Difratômetro do LCM/PPGG/UFPA.

– Microscopia óptica

A microscopia óptica foi realizada no Laboratório de Conservação


Restauração e Reabilitação da UFPA (LACORE/UFPA), com o microscópio Axio
Lab.A1 da marca Carl Zeiss, com câmera axiocam (Figura 34).

Figura 34: Microscópio óptico Carl Zeiss, no LACORE/UFPA.

Para o material biológico, foram preparadas lâminas com as amostras


coletadas para serem analisadas no microscópio (Figura 35). Para identificação
dos microrganismos, as imagens obtidas foram comparadas com atlas de
microrganismos, com auxílio do pesquisador Rosildo Santos Paiva, do Instituto de
Ciências Biológicas da UFPA.

78
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A B

C D

Figura 35: (A) Amostra armazenada em recipiente com água destilada, (B) Deposição em lâmina
da solução composta por amostra e água destilada, (C) Lamínula que reveste a amostra a ser
analisada, (D) Análise e registro fotográfico das amostras.

Para os fragmentos de pedras foram preparadas seções polidas com


resina de poliéster, sendo estas polidas em politriz metalográfica com lixas d’água
nº 180, 220, 400, 600 e 1200 (Figura 36).

Figura 36: Seções polidas com fragmentos de pedra.

- Absorção total em água

O ensaio foi feito no NTPR14 e trata-se de uma investigação a respeito da


porosidade do material a partir da relação do peso de sua massa quando
totalmente úmida e quando totalmente seca. As amostras LI-G34, GR-F31, MI-

14
Núcleo de Tecnologia da Preservação e Conservação/UFBA

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Senhora da Soledade

B13 e CA-B03 foram colocadas em estufa a 75ºC por 24 horas, posteriormente


esfriadas em dessecador, para então serem pesadas secas. Após essa pesagem,
as amostras foram colocadas em recipiente acoplado à uma bomba de vácuo
(Figura 37) e ficaram submersas em água a vácuo por 1 hora. Após esse
procedimento, as amostras ficaram no recipiente por 24 horas, para então serem
pesadas novamente. O percentual de absorção é dado pela seguinte fórmula:

Porcentagem de absorção = massa úmida – massa seca x 100


Massa seca

Figura 37: Amostras submersas em água em recipiente acoplado à bomba de vácuo.

- Massa unitária (densidade) pelo picnômetro de Hubbard

Consiste na determinação da massa unitária das amostras a partir da


relação com a massa unitária do mercúrio. Seguiu-se a metodologia da norma
italiana Normal/80.

As análises foram realizadas no NTPR15 com as mesmas amostras


utilizadas no ensaio de absorção. As amostras são secas em estufa, resfriadas e
pesadas; posteriormente são inseridas no picnômetro de Hubbard preenchido
totalmente com mercúrio, já previamente pesado sem a amostra e pesadas

15
Núcleo de Tecnologia da Preservação e Conservação/UFBA

80
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novamente (Figura 38). A determinação da massa unitária é dada pela seguinte


fórmula:

ρɑ= M3 ρHg
M1 – M2 + M3

Onde:
ρɑ= Massa unitária aparente da amostra (g/cm³)
ρHg = Massa unitária do mercúrio (13,60g/cm³)
M1 = Massa do picnômetro cheio de mercúrio (g)
M2 = Massa do picnômetro cheio de mercúrio + amostra (g)
M3 = Massa da amostra seca (g)

A B C

Figura 38: Procedimentos do ensaio de densidade: (A) pesagem da amostra seca; (B) amostra
inserida no picnômetro com mercúrio; (C) pesagem do picnômetro com mercúrio + amostra

– Ensaio de ultrassom

O ensaio não destrutivo por ultrassom, com o objetivo de detectar defeitos


ou descontinuidades internas, foi feito in loco no cemitério da Soledade, em peças
pétreas de mausoléus e túmulos, sob a coordenação da Profª. Eliane Del Lama16
e do Prof. José Delgado Rodrigues17.

Durante o ensaio fez-se uso do aparelho V-Meter MK III fabricado pela


JAMES INSTRUMENTS INC. (Figura 39). É um aparelho medidor de impulso
16
Geóloga. Doutora pelo IGCE-UNESP. Professora do IGc-USP.
17
Geólogo. Especialista em Geologia de Engenharia pelo LNEC. Investigador-Coordenador do
LNEC/Portugal.

81
Deterioração das pedras da arquitetura mortuária do Cemitério Nossa SILVA, Pâmela A. B. V. da
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ultrassônico portátil com display digital. Foram utilizados pares de transdutores


exponenciais e transdutores planos de 54 kHz e de 150 kHz (Figura 40).

Figura 39: Aparelho de ultrassom V-Meter MK III.

A B

Figura 40: Transdutores exponenciais (A) e plano (B) de 54kHz.

A inspeção dos materiais rochosos foi feita pelo uso de três métodos ou
técnicas de contato (transdutor diretamente aplicado no objeto). Seguem os
métodos utilizados:
a) técnica de transparência - transmissão direta, com os transdutores nas faces
opostas do material (Figura 41). É necessário acoplar os transdutores nos dois
lados da peça a ser analisada, de forma que estes estejam perfeitamente
alinhados.

Figura 41: Transmissão direta.


Fonte: NBR 8802:1994

b) método de superfície - transmissão indireta, com os transdutores na


mesma face (Figura 42). A localização do transdutor emissor é fixada e a do

82
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receptor é aumentada de forma gradativa e linear à medida que as leituras são


realizadas.

Figura 42: Transmissão indireta.


Fonte: NBR 8802:1994

c) transmissão semidireta, com os transdutores nas faces adjacentes (Figura 43).

Figura 43: Transmissão semidireta.


Fonte: NBR 8802:1994

-Procedimentos do ensaio:

Para iniciar-se o ensaio seguiram-se as seguintes etapas:

-Verificar a carga da bateria do aparelho;


-Conectar os cabos dos transdutores (emissor e receptor) nas saídas, com o
aparelho desligado;
-Conectar os transdutores aos cabos;
-Ligar o aparelho
-Aplicar camada de acoplante18 nas superfícies dos transdutores de forma que
estas sejam preenchidas por completo (Figura 44 a). No ensaio em questão, foi
usado como acoplante o gel da marca Multigel, específico para transmissão ultra-
sônica (Figura 44b).

18
Material a ser utilizado entre as faces dos transdutores e as do material a ser ensaiado, a fim de permitir o
contato contínuo entre as superfícies (NBR 8802:1994).

83
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Figura 44:(A) transdutor com acoplante e (B) acoplante utilizado.

-Calibrar o aparelho, de acordo com as instruções do fabricante. Só então, o


instrumento estará apto para uso;
-Com o aparelho já calibrado, posicionar os transdutores na superfície a ser
analisada conforme o método de execução (direto, indireto e semidireto)
escolhido.

Os valores da velocidade de propagação das ondas em cada ponto


inspecionado, foram calculados conforme a seguinte fórmula:
V=L
t

Onde: V = velocidade de propagação (m/s)


L = distância entre os pontos de acoplamento dos centros das faces dos
transdutores (m)
t = tempo decorrido desde a emissão da onda até a sua recepção (s)

Para medir-se as distâncias das faces dos transdutores nos pontos


definidos nas colunas, utilizou-se um compasso externo (Figura 45). Para
superfícies planas utilizou-se a trena convencional.

Figura 45: Medição de distância em coluna de granito com uso do compasso externo.

84
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Concluído o ensaio em cada túmulo ou mausoléu escolhido, procedeu-se à


limpeza com papel absorvente, água e escova para retirada do excesso de
material acoplante da superfície das pedras (Figura 46).

Figura 46: Procedimentos de limpeza.

Para as análises iniciais foram selecionados dois mausoléus e um túmulo,


são eles (Tabela 11):
Tabela 11: Amostragem para o ensaio de ultrassom.
B-46 F-31 F-02

▪Material analisado: ▪Material analisado: ▪Material analisado:


Pedra de Lioz Granito Mármore branco
▪Método utilizado: ▪Método utilizado: ▪Método utilizado: direto e
indireto direto e indireto semidireto
▪Transdutor: plano ▪Transdutor: ▪Transdutor: plano
54kHz exponencial - 54kHz 54kHz
plano – 54kHZ
plano – 150kHZ

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4.6 TESTES DE TRATAMENTOS RESTAURATIVOS

- Aplicação de emplastro de bentonita

Para teste de limpeza química no Cemitério da Soledade, a bentonita foi


usada na forma de emplastro, conforme receita (Figura 47) de Oliveira (2006):

BENT. + EDTA + NaHCO3 + CH3COOH (5ml)


Bentonita.....................................................123,91g
NaHCO3 ........................................................10,00g
CH3COOH .......................................................5,0ml
EDTA ............................................................12,50g
pH = 7,47

Figura 47: Material usado no preparo do emplastro.

Os ingredientes foram todos pesados e então se deu a mistura com o


acréscimo de 1 litro de água destilada (Figura 48).
BENTONITA EDTA NaHCO3 ÁGUA DESTILADA

Figura 48: Pesagem dos ingredientes e acréscimo de água destilada.

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O túmulo escolhido para a aplicação do emplastro foi o F42, por já estar


bastante comprometido pela ação biológica e depósitos de sujidades (Figura 49).

Figura 49: Túmulo escolhido para receber aplicação de emplastro de bentonita, com a área de
aplicação em destaque.

A aplicação do emplastro de bentonita deu-se conforme os seguintes


procedimentos (Figura 50):
1. Limpeza da área de aplicação com água e sabão neutro;
2. Aplicação do emplastro;
3. Cobertura da área de aplicação com papel alumínio;
4. Proteção da área de aplicação com plástico.

1.LIMPEZA 2.APLICAÇÃO 3.COBERTURA 4.PROTEÇÃO


Figura 50: Procedimentos seguidos na aplicação de emplastro de bentonita, com as etapas
identificadas.

87
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O emplastro foi retirado sete dias após a aplicação. A área de teste


manteve-se protegida por todo o tempo de ação do emplastro. Para obter-se o
resultado final, as proteções com plástico e papel alumínio foram retiradas e em
seguida removeu-se o emplastro para então, proceder-se a lavagem com água e
sabão neutro, novamente.

- Polimento de áreas carbonizadas

Para o teste de remoção de camadas de carbonização com polimento foi


escolhida uma área no túmulo J20, de uma das santas devocionais, alvo
constante de oferendas com velas (Figura 51). Por tal motivo, a área escolhida
para o teste foi reduzida.

Figura 51: Área escolhida para teste de polimento no túmulo J20.

O teste foi feito com lixa de polimento não adesiva de grana 1200 em área
carbonizada. O processo foi manual e feito em superfície constantemente
umedecida (Figura 52), de modo que fosse controlado o desgaste da pedra.
Posteriormente ao polimento da camada superficial de carbonização, foi aplicado
o emplastro de bentonita na área examinada, seguindo-se os mesmos
procedimentos detalhados no item anterior, a fim de analisar-se a eficiência das
técnicas tanto separada quanto conjuntamente.

Figura 52: Polimento de área carbonizada.

88
Deterioração das pedras da arquitetura mortuária do Cemitério Nossa SILVA, Pâmela A. B. V. da
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5. AS PEDRAS
DO SOLEDADE 89
Deterioração das pedras da arquitetura mortuária do Cemitério Nossa SILVA, Pâmela A. B. V. da
Senhora da Soledade

5. AS PEDRAS DO SOLEDADE

5.1. QUANTITATIVO E TIPOS DE PEDRA

Dentre os túmulos e mausoléus catalogados no Cemitério da Soledade,


praticamente metade deles são totalmente feitos em pedra ou apresentam algum
elemento nesse material, seja um tampo ou um ornamento (Figura 53).

A B C

Figura 53: Exemplares de túmulos considerados de pedra para contagem: A) totalmente em


pedra, B) com ornamento em pedra e C) tampos em pedra.

As obras pétreas somam 230 exemplares (Figura 54 e Apêndice A), dentre


os quais 54% são em Lioz e 42% em mármore, o restante são exemplares em
granito (exemplar único), ardósia ou com mais de um tipo de pedra dentre os
citados (misto). Grande parte desses exemplares estão assentados sobre bases
de arenito, porém esse tipo de pedra não foi considerado no quantitativo.

Figura 54: Quantitativo de túmulos e mausoléus em pedra no Cemitério da Soledade.

90
Deterioração das pedras da arquitetura mortuária do Cemitério Nossa SILVA, Pâmela A. B. V. da
Senhora da Soledade

Nos exemplares que contém ardósia (Figura 55), as peças pétreas são
contemporâneas e por tal motivo entraram na pesquisa apenas para fins
quantitativos.

Figura 55: Exemplo de túmulo com ardósia.

5.2. ANÁLISE PETROGRÁFICA

A análise feita a partir de imagens micro e macroscópicas forneceu a


natureza, mineralogia e classificação das rochas empregadas na construção dos
túmulos e mausoléus do Soledade. Tais características são essenciais no que
concerne à resistência, durabilidade e estética do material pétreo.

5.2.1 Quanto ao mármore


O mármore analisado é de coloração branca a cinza claro com estrutura
maciça19 e textura granoblástica20, com granulação média a grossa (Figura 56).
Imagem macroscópica Fotomicrografia (aumento 5x)

B13

Figura 56: Imagens macro e microscópica do mármore.

19
Estrutura de aspecto maciço e compacto sem elementos planares ou lineares.
20
Textura não foliada em que os grãos minerais apresentam aproximadamente as mesmas dimensões sem
orientação.

91
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A forma dos cristais com junção em pontos tríplices evidencia a


recristalização da calcita, típica do metamorfismo do mármore.

Os dados mineralógicos obtidos para o mármore refletem a composição


típica deste material carbonático, composto principalmente por calcita (Figura 57).

Figura 57: Difratograma da amostra MA-B13.

5.2.2 Quanto ao Lioz


Os Lioz do Soledade (Figura 58) são de coloração bege claro a rosado, de
grãos finos e apresentam microfissuramento, o que já é indicativo do aumento da
suscetibilidade do material à alteração, a partir do momento que essa rede de
fissuração facilita percolação de fluidos por entre as fissuras.

92
Deterioração das pedras da arquitetura mortuária do Cemitério Nossa SILVA, Pâmela A. B. V. da
Senhora da Soledade

Imagem macroscópica Fotomicrografia (aumento 5x)

B03

B09

G34

Figura 58: Imagens macro e microscópicas de Lioz, com indicação de microfissuras.

93
Deterioração das pedras da arquitetura mortuária do Cemitério Nossa SILVA, Pâmela A. B. V. da
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Os resultados obtidos com a mineralogia indicam que o Lioz analisado é


constituído apenas por calcita, composição típica de calcários (Figura 59).

Figura 59: Difratograma da amostra LI-G34.

Os difratogramas dos dois principais grupos de pedras do Soledade, Lioz e


mármore, evidenciam a presença de calcita, o que implica um reforço de atenção
nesses materiais, uma vez que a calcita é relativamente solúvel e como em Belém
as chuvas são praticamente diárias, a dissolução desses minerais degrada as
superfícies deixando-as mais rugosas.

5.2.3 Quanto ao granito


O granito do único mausoléu com esse tipo de pedra é de coloração
acinzentada com textura fanerítica inequigranular, com estrutura maciça e
granulação média a grossa (Figura 60).

94
Deterioração das pedras da arquitetura mortuária do Cemitério Nossa SILVA, Pâmela A. B. V. da
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Imagem macroscópica Fotomicrografia (aumento 5x)

F31

Figura 60: Imagens macro e microscópica do granito.

Quanto à mineralogia, essa rocha plutônica de composição poliminerálica,


apresenta a composição típica do granito, formada basicamente por quartzo,
feldspatos (microclínio, ortoclásio e albita), que conferem a cor branca a
acinzentada, e micas (muscovita), que conferem o brilho ao granito (Figura 61).

Figura 61: Difratograma da amostra GR-F31.

95
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Também foram identificados minerais que não fazem parte da composição


mineralógica do granito, sendo minerais posteriores, produtos de alteração, que é
o caso da gipsita e da caulinita.

A caulinita, um mineral secundário, é produto do intemperismo do


feldspato, tendo sido herdada nos processos intempéricos do granito ainda na
pedreira, como também constatado nos estudos de Begonha (2009) em granitos
de duas igrejas em Portugal, provavelmente a mesma procedência do granito aqui
analisado.

Quanto à gispsita, que quimicamente é sulfato de cálcio hidratado, a


mesma provém da reação de componentes cálcicos provenientes da argamassa,
águas das chuvas e do próprio ar com o enxofre advindo da queima de
combustíveis fósseis, e a detecção de sua presença será melhor discutida
posteriormente.

5.3. CARACTERIZAÇÃO FÍSICA

Os dados obtidos de absorção total em água (Tabela 12) indicam maior


porosidade acessível para a amostra de granito do mausoléu F31. Já as amostras
de Lioz apresentam baixa absorção. Ainda que com a mesma composição
mineralógica, a diferença textural influiu nos resultados obtidos para o mármore e
o calcário Lioz.

Tabela 12: Resultados obtidos para absorção e densidade.


Absorção Massa Unitária
Massa
Peso da Peso da Massa das
Amostras Absorção unitária da
amostra seca amostra amostras
(%) amostra
(g) úmida (g) secas (g)
(g/cm³)
LI-G34 18,2 18,3 0,6 2,7 1,53
GR-F31 9,5 9,7 2,1 5,3 2,35
(1) 5,7
LI-B03 13,8 13,9 0,7 2,66
(2) 2,3
MA-B13 9,7 9,8 1 9,6 2,64

96
Deterioração das pedras da arquitetura mortuária do Cemitério Nossa SILVA, Pâmela A. B. V. da
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O índice de absorção depende da granulação, textura e sanidade da rocha,


desse modo, a elevada absorção apresentada pelo granito acarreta baixa
durabilidade e progressiva redução da resistência mecânica desse material
(IAMAGUTI, 2001). Enquanto que, materiais mais densos, como o mármore
analisado no Soledade, são mais resistentes ao desgaste.

Como a taxa de absorção também tem relação com a maior ou menor


conexão entre os vazios, o fato do Lioz LI-G34 apresentar baixa densidade,
mesmo com baixo índice de absorção, pode indicar porosidade cega no interior
do material, ou seja, há poros sem acesso para penetração de líquidos.

97
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6. AS
ALTERAÇÕES
98
Deterioração das pedras da arquitetura mortuária do Cemitério Nossa SILVA, Pâmela A. B. V. da
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6. AS ALTERAÇÕES

Entende-se aqui por alteração, as modificações físicas, mineralógicas e/ou


químicas apresentadas pelas pedras, em resposta à ação intempérica e/ou
humana.

6.1 DIAGNÓSTICO

A análise do estado de conservação dos monumentos confirma a condição


agravante e preocupante dos mesmos quanto à presença de patologias, que
corrobora com a situação do Cemitério como um todo, evidenciando os anos sem
manutenção e conservação. Há vários exemplos de túmulos e mausoléus que
apresentam superposição de vários processos de deterioração com diferentes
graus de severidade. Os exemplares em mármore, entretanto, apresentam-se
visualmente menos deteriorados que os de Lioz.

A partir do mapeamento de danos foi possível determinar as patologias


mais recorrentes nos túmulos e mausoléus do Cemitério da Soledade. Dentre os
grupos definidos no Glossário do ICOMOS (2008), dois deles se destacam por
estarem presentes em todos os exemplares do elenco analisado, são eles:
descoloração e depósito e colonização biológica. Tais grupos, além de se
apresentarem em 100% do elenco, também englobam os danos que atingem os
túmulos e mausoléus em maior extensão de área, ainda que em muitos casos não
sejam os mais severos. Enquanto nos dois principais grupos, todas as patologias
destacam-se como recorrentes, nos demais, as alterações de destaque são
pontuais.

A ação humana como meio de degradação de monumentos, subdividida


em mais de um grupo de danos, é algo bastante presente no Cemitério da
Soledade, seja pela poluição atmosférica ou pelos danos mecânicos sofridos
pelas pedras, a incluir arranhões, danos de impacto, lacunas, depósitos de velas,
preenchimento de fissuras, fraturas e lacunas com materiais contemporâneos
sem o mínimo cuidado ou estudo (Figura 62) e o grafite (Figura 63). O vandalismo
evidencia ainda mais a segurança deficitária dos túmulos e mausoléus e a falta de
consciência conservacionista por uma parte da sociedade.

99
Deterioração das pedras da arquitetura mortuária do Cemitério Nossa SILVA, Pâmela A. B. V. da
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Figura 62: Exemplos de preenchimento de lacunas e fissuras em túmulos do Cemitério da


Soledade.

Figura 63: Exemplos de mausoléus do Soledade com grafite.

Estudos de Ciliberto et al. (2013), em construções históricas pétreas


marcadas pelo grafite, chegaram a concluir que esse tipo de vandalismo não é um
dano somente estético, pois há alterações nas propriedades físico-químicas e no
equilíbrio entre a pedra e o meio ambiente. Quanto maior a porosidade, como no
caso do granito e do mármore estudados aqui, mais profunda é a penetração do
verniz e maior é a resistência do material à remoção e limpeza desse produto.

6.1.1 Quanto ao grupo “Descoloração e Depósito”

No grupo descoloração e depósito, os tipos de danos que se destacaram


foram: o enegrecimento dos túmulos pelo depósito de material particulado
proveniente da poluição, traduzindo-se em sujidades, poeiras e fuligens que
recobrem todos os exemplares, diferenciando-se por camadas mais ou menos

100
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espessas; o depósito de parafina proveniente das velas, o enegrecimento pela


carbonização consequente da ação das chamas; e a presença de crosta negra
(Figura 64).

Crosta negra e sujidades

Depósito de parafina e carbonização

Figura 64: Mapeamento de danos túmulo F36, com destaque para o grupo descoloração e
depósito marcado em azul e danos em destaque.

6.1.2 Quanto ao grupo “Colonização Biológica”

Esse grupo também é expressivo no Cemitério, presente em todos os


exemplares do elenco, o que indica altos teores de umidade no ambiente, fator
primordial para as proliferações.
Foram identificados quase todos os tipos de colonização referidos no
Glossário do ICOMOS (algas, liquens, musgos e plantas). As camadas biológicas
diferenciam-se pelas cores em tons esverdeados e avermelhados, em sua maioria
e brancos ou azulados, em alguns casos (Figura 65). Outra forma de colonização,
encontrada em menor quantidade, mas sempre em condições preocupantes, é a
de plantas superiores, cujas raízes penetram os túmulos e mausoléus
frequentemente em juntas abertas, ocasionando outros danos, como fraturas e
fragmentações (Figura 66).

101
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Figura 65: Mapeamento de danos túmulo K03, com destaque para o grupo colonização biológica,
marcado em verde e para as variadas cores e tipos de camadas biológicas.

Figura 66: Mausoléus sofrendo a ação de plantas superiores, cujas raízes penetraram as
estruturas.

A análise das áreas de incidência das manifestações patológicas mais


recorrentes, feita a partir dos dados obtidos com o mapeamento de danos,
possibilitou que fosse feito um zoneamento dos dois principais grupos de danos,

102
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referidos anteriormente. Observou-se que as camadas de patologias de cada


grupo desenvolvem-se preferencialmente em determinadas áreas. As camadas
biológicas acumulam-se, sobretudo em áreas sombreadas (Figura 67), ao abrigo
das copas das árvores. Tais áreas favorecem esse tipo de intemperismo ao
criarem um microclima propício às colonizações, com maior acúmulo de água e
umidade.

Figura 67: Área sombreada no Cemitério da Soledade, a partir da ferramenta GoogleEarth.

Em áreas desprotegidas da vegetação e expostas mais diretamente à


radiação solar, concentram-se as películas enegrecidas, de sujidades e crostas
negras, sobretudo nas adjacências da alameda principal e do gradeamento da
entrada, onde os túmulos estão mais vulneráveis à deposição de poluentes
atmosféricos e danos físicos.

A partir dessas constatações foi elaborado o zoneamento da incidência de


películas avermelhadas (englobando todos os tipos de biofilmes), frequentes em
áreas abrigadas pela vegetação e películas enegrecidas, frequentes
principalmente em áreas com maior exposição aos ventos e raios solares (Figura
68).

103
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Figura 68: Concentração de películas mais recorrentes.

6.1.3 Quanto ao grupo “Fissura e Deformação”

Em Fissura e deformação, os danos verificados são fissuras, fraturas e


fissuras capilares, estas últimas com maior incidência em Lioz expostos às altas
temperaturas, sejam naturais ou provocadas (Figura 69).

Figura 69: Mapeamento de danos no túmulo B09 com marcação em amarelo de danos do grupo
fissura e deformação e microfissuramentos em destaque.

104
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As fissuras capilares ocupam grandes extensões dos monumentos em Lioz


e facilitam a percolação de água no material, tornando-o ainda mais frágil,
originando novas fissuras e consequentes lacunas após desagregação do
material.

6.1.4. Quanto ao grupo “Perda de material”

No grupo Perda de material, as lacunas de elementos significativos dos


monumentos são os danos que mais afetam a imagem e leitura das obras (Figura
70). Infelizmente, muitas dessas lacunas, em casos de uma ação restaurativa,
não poderão ser repostas, por falta de referências da arte inicial.

Figura 70: Mausoléus com lacunas de elementos decorativos.

Outros danos preocupantes são as erosões, em que os componentes e a


matriz da rocha alteram-se de maneira diferenciada, deixando as superfícies
intemperizadas de forma heterogênea (Figura 71).

105
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Figura 71: Erosão diferencial no mármore do túmulo G22.

6.1.5. Quanto ao grupo “Destacamento”

É o grupo de danos de menor representatividade nas pedras de túmulos e


mausoléus no Cemitério da Soledade, caracterizado por danos em que o
processo de desprendimento de partes da pedra se dá de formas variadas, seja
em camadas, em grãos, em filmes, por quebras ou separação de juntas (Figura
72). São danos mais pontuais, onde os exemplares apresentam geralmente
apenas um tipo de destacamento.

106
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A B

C D

Figura 72: Danos do grupo destacamento encontrados no Soledade: A) destacamento das juntas,
B) peeling, C) sugaring e D) delaminação-esfoliação.

O caso mais sério é a desagregação granular que ocorre nas colunas do


mausoléu F31, em granito (Figura 73). Esse tipo de deterioração acomete as duas
colunas inteiramente.

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Figura 73: Desagregação granular no granito.

Em exemplos como esses em que a deterioração está causando


destacamento, o tamanho dos elementos da pedra em risco de se perder é o
parâmetro crítico na especificação das ações de conservação necessárias. Os
destacamentos podem variar a partir de pó e grãos muito pequenos a grandes
placas e camadas. Todos eles podem exigir ações semelhantes de colagem e
selagem dos contornos externos (Delgado Rodrigues, 2014).

Conforme Delgado Rodrigues (2014), quando o desapego é produzido em


grãos individuais, não somente as questões de tamanho do grão, mas também o
tipo de substrato tem que ser levado em conta, a desagregação granular de
arenitos de alta porosidade tende a ser muito difícil de resolver ou é mesmo
impossível, enquanto que em granitos (e também sugaring, em mármores)
quando os grãos de superfície ainda estão no local pode ter chances de ser
devidamente colados de volta.

108
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6.2- A AÇÃO MICROBIOLÓGICA

Nos mausoléus em que foram analisadas camadas de material biológico


em seu interior (Figura 74), as imagens microscópicas mostram a presença de
liquens com associação de algas filamentosas (clorofíceas) e fragmentos de
fungos, além de colônias de cianofíceas ou cianobactérias, envoltas em bainha de
mucilagem, que retém água aumentando o seu volume e consequentemente, a
expansão das mesmas (Figura 75). Na imagem (c) da figura 75 é possível ver
fragmentos da própria rocha, já danificada e em processo de desagregação dos
minerais.

a) b) c)

Figura 74: (a) área de coleta no mausoléu B3 (b) e (c) áreas de coleta do mausoléu F2.

a) b) c)

Figura 75: (a) alga filamentosa e fragmentos de fungos (b) algas filamentosas e colônias de
cianofíceas em destaque (c) algas com fragmentos da rocha de área de coleta do túmulo F2.

Já nos túmulos e mausoléus cujas áreas coletadas foram externas (Figura


76), as imagens microscópicas mostraram a presença de algas, líquens e
rotíferas (Figura 77), estes últimos são animais aquáticos microscópicos, que se
alimentam das microalgas e cuja excreção rica em amônia, nitrogênio e fósforo
favorece a fotossíntese das cianofíceas, consequentemente a sua proliferação.

109
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a) b)

c) d)

Figura 76: (a) foto evidenciando que o local de coleta estava sob vegetação (b) área de colelta no
túmulo D3 (c) e (d) áreas de coleta do túmulo F42.

a) b) c)

Figura 77: (a)alga filamentosa (clorofícia), (b) líquen (associação simbiótica de algas e
fungos), (c) rotífera.

Guiamet et al. (2013), confirmam em seus estudos que o crescimento e a


atividade metabólica destes organismos são controlados por meio de parâmetros
naturais, tais como a luz e umidade, além do gás carbônico, essenciais para sua
sobrevivência. O processo metabólico desagrega os minerais da rocha e favorece
processos químicos que resultam na dissolução do material. Áreas com
proliferação de liquens tendem a ficar mais porosas e áreas com elevada
porosidade criam ambientes para instalação de outros agentes biológicos, tais
como briófitas, musgos e pteridófitas.

110
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Guiamet et al. (2013) ainda alertam para as presenças de excremento de


aves e restos de vários artrópodes que podem proporcionar nutrientes para
favorecer a colonização microbiana e o subsequente desenvolvimento de biofilme.

Além dos já citados, entre o efeitos dessa ação microbiológica estão as


alterações cromáticas sobre o substrato da pedra produzido por pigmentos
biogênicos, que, dependendo do tamanho da área que ocupam, podem alterar o
aspecto estético e, portanto, a interpretação da obra de arte; as tensões
mecânicas sobre a estrutura mineral , que aumentam com os sucessivos ciclos
de hidratação e secagem; e acumulação de poluentes atmosféricos adsorvidos
pelos biofilmes (GUIAMET et al., 2013).

6.3 - A AÇÃO QUÍMICA

As amostras de películas PEN-F31 E PEN-F36 foram submetidas à


difração de raios-x com o intuito de comprovar a suspeita de presença de crosta
negra nos respectivos exemplares. As amostras dos dois exemplares foram
tiradas de áreas protegidas da incidência das chuvas diárias da cidade de Belém
(Figura 78 a e b).

a)

b)

Figura 78: (a) Coleta de amostra PEN-F31 (b):Coleta de amostra PEN-F36.


.

111
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O resultado da análise por difração de raios-x comprovou que o material


coletado trata-se de crosta negra gipsífera. Tal fato é justificado pela presença de
gipsita nas amostras (Figuras 79 e 80). A formação de gipsita deu-se em virtude
da reação do dióxido de enxofre (SO2) abundante, proveniente das partículas
atmosféricas poluentes, com os constituintes cálcicos provavelmente da
argamassa, das águas pluviais e/ou do ar, em áreas abrigadas da lavagem
contínua das águas das chuvas, resultando em uma camada de crosta negra já
bastante endurecida. Os difratogramas a seguir indicam a presença de gipsita e
de minerais constituintes das rochas analisadas. O fato da crosta já estar bastante
agregada ao material rochoso, acabou contribuindo para que fragmentos das
pedras granito e Lioz, também estivessem presentes na amostra.

a) Ab – Albita
Cal- Calcita
Gp – Gipsita
Qtz – Quartzo
Mc – Microclínio
Ms – Muscovita
Or - Ortoclásio

Gp - Gipsita
b)

Figura 79 a e b: Difratogramas referentes a materiais da amostra PEN-F31.

112
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Figura 80: Difratograma referente à amostra PEN-F36.

Como essas crostas negras, disseminadas em ambientes urbanos, são o


resultado da interação de poluentes com o substrato, não podem ser comparadas
ou confundidas com outros tipos de crostas que são somente acumulações de
depósitos exógenos sobre a superfície da pedra. O que implica dizer que elas
não podem ser removidas como qualquer outro depósito superficial.

Conforme Delgado Rodrigues (2014), o conjunto dos três componentes: o


depósito preto na superfície + zona frágil + camada subjacente de pó, é o que
constitui a camada inteira da crosta negra, e é a presença de uma zona tão frágil
que é de suma importância na conservação da pedra, requerendo soluções muito
exigentes.

Esse fato é preocupante à medida que o Cemitério não recebe manutenção


periódica, o que acelera os processos de deterioração como as crostas negras,
que muitas vezes tornam-se irreversíveis.

6.4 - A EXPOSIÇÃO ÀS ALTAS TEMPERATURAS

O clima local, característico de umidade e temperaturas elevadas, aliado ao


constante depósito de velas nas superfícies tumulares, como ocorre no chamado
“Culto às Almas”, são exemplos da recorrente exposição ao calor em que os
monumentos pétreos do Soledade estão suscetíveis.

113
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Por meio do mapeamento térmico por infravermelho em túmulos e


mausoléus totalmente expostos, parcialmente expostos e totalmente protegidos
da radiação solar, é possível ter-se ideia das diferenças de temperaturas atingidas
nas superfícies dos monumentos. Essa análise ganha importância pelo fato de o
calor ser responsável pela dilatação das rochas, podendo causar, além do
aparecimento de fissuras e microfissuras, a ruptura do material, assim como a
perda de brilho (SANTIAGO, 2000).

Conforme observado no comparativo de imagens da Figura 81, os


monumentos ao abrigo de árvores, a exemplo do túmulo K03, ainda que mais
sujeitos ao ataque biológico, apresentam temperaturas bem mais amenas,
estando menos propícios aos danos físicos causados pelas variações de
temperatura. Considerando que o clima de Belém caracteriza-se por temperaturas
elevadas o ano inteiro, os túmulos e mausoléus desprotegidos, como o B09, estão
naturalmente sempre suscetíveis a esses tipos de danos, tendo sua resistência
mecânica comprometida.

As imagens do túmulo B09, em Lioz, indicam que os contornos e saliências


atingem as maiores temperaturas, sendo mais facilmente degradados.

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Figura 81: Comparativo de imagens dos túmulos B09 acima e K03 abaixo, nos dias 14/02, 10/04 e
23/06/2014, respectivamente.

Afora as condições expostas acima, há os túmulos e mausoléus que


encontram-se nas duas situações, ou seja, estão parcialmente protegidos e
parcialmente expostos, o que acarreta comportamentos diferentes numa mesma
superfície (Figura 82). Esses exemplares irão apresentar faces comprometidas
com estágios e tipos de degradação heterogêneos, dificultando ainda mais uma
ação restaurativa e/ou conservacionista.

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Figura 82: Mausoléu G34, com uma das faces dividida em área abrigada com temperaturas
amenas e área exposta com temperaturas mais elevadas.

Além do calor natural a que são submetidos os monumentos pétreos do


Cemitério da Soledade, todas as segundas-feiras fiéis depositam velas acesas
sobre as pedras, aumentando consideravelmente a temperatura superficial por
meio das chamas. Em pouco tempo, a temperatura pode aumentar o valor em até
cinco vezes em áreas nas proximidades das chamas.

Tais variações térmicas bruscas propiciam a dilatação e contração


constantes do material em questão. Considerando que, o principal mineral
constituinte dos mármores e calcários usados no Soledade é a calcita, tal fato
requer atenção. Os cristais de calcita apresentam uma anisotropia térmica em
que, quando aquecidos, expandem-se numa direção e contraem-se em outra,
resultando no aparecimento de fissuras (Figura 83) e consequente fraturas
(Figura 84), aumento da porosidade e perda de coesão nas pedras. Além dos
danos físicos a queima das velas acarreta danos químicos como a carbonização
da pedra.

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Figura 83: Imagens de infravermelho do túmulo J20 com destaque para área fissurada próxima as
chamas de velas.

Figura 84: Imagem de infravermelho do túmulo K03 com destaque para área fraturada próxima as
chamas de velas.

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6.5 - COESÃO E DESCONTINUIDADES INTERNAS

Por meio dos valores das velocidades de propagação de ondas


ultrassônicas alcançadas durante o ensaio de ultrassom feito in loco, buscou-se
avaliar o grau de alterabilidade interna das pedras (Lioz, granito e mármore) dos
três exemplares de túmulos e mausoléus escolhidos.

-Lioz
No túmulo B-46 em Lioz, foram auferidos 14 pontos em duas áreas
diferentes (Figuras 85 e 86) pelo método indireto, com transdutor plano de 54kHz
e diâmetro de 5 cm. As áreas escolhidas já se apresentavam visualmente
intemperizadas.

Figura 85: Lateral do túmulo B-46 com áreas analisadas em destaque.

118
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Obs: cotas em cm

Figura 86: Pontos de medição no túmulo B46, pelo método indireto.

As peças analisadas atingiram valores de velocidade altos (Tabela 13),


indicando um baixo grau de alteração interna, porém considerando que em todos
os pontos a medição foi realizada com os mesmos transdutores e com o mesmo
método, indireto, a significativa variação de velocidade entre os pontos (Figuras
87 e 88) sinaliza a perda de homogeneidade no interior da pedra, com desgastes
distribuídos disformemente.
Há discrepâncias quanto aos pontos entre si e quanto às áreas analisadas.
A área superior atingiu velocidades menores que a área inferior. Tal situação
pode ser explicada pelo fato de se acenderem velas na parte superior, que
apresenta microfissuramento acentuado e erosões.
Entre os pontos P3 e P4, ficou nítido também o decréscimo no valor da
velocidade atingida, muito possivelmente em decorrência da fissura que se
estende, praticamente, por toda a peça e que compromete a coesão da pedra.

119
Deterioração das pedras da arquitetura mortuária do Cemitério Nossa SILVA, Pâmela A. B. V. da
Senhora da Soledade

Tabela 13: Valores obtidos no túmulo B46 com o aparelho de ultrassom, com transdutor
plano de 54 kHz.
Distância Tempo V de propagação V de propagação
Pontos
(mm) (s¯³) (m/s) média(m/s)
P1 emissor
P2 100 17 5882,35
P3 200 33 6060,61 4899,46
P4 300 83 3614,46
P5 400 99 4040,40
P6 emissor
P7 100 20 5000,00
P8 200 58 3448,28
P9 300 76 3947,37
P10 400 94 4255,32 2983,31
P11 emissor
P12 80 89 898,88

P13 160 48 3333,33


P14 240 83 2891,57

V de propagação (m/s)
6000,00
4000,00
V de propagação
2000,00 (m/s)
0,00
P2 P3 P4 P5

Figura 87: Valores obtidos dos pontos 2 ao 5.

Figura 88: Valores obtidos dos pontos 7 ao 14.

120
Deterioração das pedras da arquitetura mortuária do Cemitério Nossa SILVA, Pâmela A. B. V. da
Senhora da Soledade

- Granito
No mausoléu F-31, todo em granito, na análise visual foi possível constatar
que as colunas eram a parte mais intemperizada do monumento, por
encontrarem-se com acentuada desagregação granular, em que os grãos
desprendem-se da rocha ao menor esforço mecânico, enquanto as demais partes
apresentavam-se mais firmes. A partir dessa constatação, foram realizadas
medições nas duas colunas e em um bloco de pedra da parte posterior (Fig. 89),
a fins de comparação entre peças com grau de intemperismo visualmente
diferentes. Foram auferidos 7 pontos em cada coluna e 5 pontos no bloco de
pedra (Figura 90).

c c

Figura 89: Fachadas frontal e posterior do mausoléu F-31, com áreas analisadas em destaque.

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Deterioração das pedras da arquitetura mortuária do Cemitério Nossa SILVA, Pâmela A. B. V. da
Senhora da Soledade

COLUNAS

BLOCO

Obs: Cotas em cm.

Figura 90: Pontos de medição nas colunas e na peça da fachada posterior do mausoléu F31.

Como as colunas estavam com as superfícies bastante irregulares, foram


usados no ensaio os transdutores exponenciais de 54 kHz, enquanto que na peça
da fachada posterior, com uma superfície mais plana e regular, foram feitas
medições com os dois transdutores planos, sendo um de 54 kHz com diâmetro de
5cm e outro de 150 kHz e diâmetro de 2,2cm.
As velocidades de propagação atingidas (Tabela 14) nos pontos das
colunas foram muito baixas, poucas vezes passando de 1200m/s, o que ratifica o
elevado grau de intemperismo observado na análise visual. As velocidades
díspares dos pontos (Figura 91) também evidenciam a perda de homogeneidade
da pedra.

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Deterioração das pedras da arquitetura mortuária do Cemitério Nossa SILVA, Pâmela A. B. V. da
Senhora da Soledade

Tabela 14: Valores de velocidade de propagação de ondas ultrassônicas obtidos nas colunas do
mausoléu F31, com transdutores exponenciais de 54kHz.
V de V de
Distância Tempo
Pontos propagação propagação
(mm) (s¯³)
coluna esquerda (m/s) média(m/s)
P15 272 317,2 857,50
P16 272 277,8 979,12
P17 276 237,4 1162,59
P18 276 285,4 967,06 1292,54
P19 274 159,3 1720,03
P20 271 220,5 1229,02
P21 262 205,5 1274,94
P22 280 249 1124,50
coluna direita

P23 284 258 1100,78


P24 290 380 763,16
P25 290 288 1006,94 1013,14
P26 290 260 1115,38
P27 286 259 1104,25
P28 278 317 876,97

Figura 91: Gráfico com comparativo dos valores de velocidade de propagação de ondas
ultrassônicas nas colunas do mausoléu F31.

Na peça da fachada posterior, os valores atingidos de velocidade de


propagação de ondas ultrassônicas (Tabela 15) com os dois tipos de transdutores
foram correspondentes e, diferentemente do que se esperava, apenas sutilmente
superiores aos valores atingidos nas colunas, o que reflete a perda de coesão do
material pétreo do mausoléu como um todo.

123
Deterioração das pedras da arquitetura mortuária do Cemitério Nossa SILVA, Pâmela A. B. V. da
Senhora da Soledade

Tabela 15: Valores de velocidade de propagação de ondas ultrassônicas obtidos em peça da


fachada posterior do mausoléu F31, com transdutores planos de 54 kHz e 150 kHz.
V de
V de propagação
Distância Tempo (s¯³) propagação
Pontos (m/s)
(mm) média(m/s)
54 kHz 150 kHz 54 kHz 150 kHz 54 kHz 150 kHz
P1 100 61 47 1639 2128
P2 200 140 107 1429 1869
P3 300 189 160 1587 1875 1568 1842
P4 400 262 232 1527 1724
P5 500 302 310 1656 1613

Tal estágio avançado de intemperismo pode dar-se pela alteração herdada


do granito usado na construção do monumento, o mesmo possivelmente já saiu
da pedreira de origem com algum grau de alteração, como visto anteriormente na
análise petrográfica. O fato das colunas apresentarem-se ainda mais desgastadas
pode ser explicado pela morfologia arquitetônica adotada, em que elas são mais
salientes e nervuradas, ou seja, mais expostas à ação dos ventos e das chuvas e
com forma propícia ao desgaste.
Begonha (2009), também constatou que a desagregação granular era a
deterioração dominante nos granitos de seu estudo, sobretudo em áreas
permanentemente úmidas ou expostas aos ventos associados a episódios de
precipitações.
Frascá (2003) confirma que a alternância de ciclos de saturação e
secagem permite a continuidade das reações hidrolíticas, podendo conduzir à
desagregação da rocha, com a quebra das ligações físicas.

- Mármore

Optou-se pela análise do mármore no mausoléu F-02, também em uma


coluna (Figura 92), de modo a fazer um comparativo com a coluna em granito.
Como a forma do material (retangular) permitia, foram utilizados os métodos
direto e semidireto na medição em três pontos, com transdutores planos de 54kHz
(Figura 93).

124
Deterioração das pedras da arquitetura mortuária do Cemitério Nossa SILVA, Pâmela A. B. V. da
Senhora da Soledade

c c

Figura 92: Marcação da área analisada no mausoléu F-02.

a)

b)

A D
B C

Figura 93: a) Marcação dos pontos na área analisada no mausoléu F-02; b) marcação dos pontos
e direção das medições em planta.

O mármore, visivelmente menos alterado que os outros materiais


analisados atingiu valores de velocidade de propagação de ondas ultrassônicas
bem mais elevados (Tabela 16), evidenciando que a pedra está sã e sofre bem
menos com o intemperismo local.

Tabela 16: Valores de velocidade de propagação de ondas ultrassônicas obtidos no mausoléu F-


02, com transdutores planos de 54 kHz.

V de V de
Distância Tempo
Método Pontos propagação propagação
(mm) (s¯³)
(m/s) média(m/s)

Direto AD 343 53 6471,70 6471,70


AB 95 13 7307,69
AC 265 41 6463,41
Semi- direto 6965,21
DB 257 39 6589,74
DC 90 12 7500

125
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7. TESTES DE
TRATAMENTOS
RESTAURATIVOS 126
Deterioração das pedras da arquitetura mortuária do Cemitério Nossa SILVA, Pâmela A. B. V. da
Senhora da Soledade

TESTES DE TRATAMENTOS RESTAURATIVOS

7.1. LIMPEZA QUÍMICA COM EMPLASTRO DE BENTONITA

Os resultados obtidos no teste de limpeza com a aplicação de emplastro de


bentonita foram bastante satisfatórios. A superfície pétrea comprometida pela
ação biológica, pelo depósito de sujidades e pela carbonização apresentou
melhoras na aparência, com redução significativa de manchas.
7.1.1. Quanto à remoção das camadas de sujidades e carbonização
Após a retirada do emplastro e lavagem da área analisada com água e
sabão neutro, as áreas enegrecidas pelo processo de carbonização foram
dissolvidas, saindo facilmente com a lavagem (Figura 94). O emplastro
apresentou-se eficiente quanto à retirada de camadas de carbonização
superficiais (Figura 95).
Não houve dificuldade quanto à remoção de depósitos de sujidades,
incluindo de cera de velas, tendo sido consideravelmente removidos ainda na
primeira lavagem, antes da aplicação do emplastro.
Ao final do processo, restaram poucas evidências desses dois tipos de
deterioração.

Figura 94: Camada de carbonização dissolvida pelo emplastro e retirada com a lavagem .

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Senhora da Soledade

ESTADO ORIGINAL APÓS A 1ª LAVAGEM APÓS AÇÃO DO EMPLASTRO

Figura 95: Resultado obtido com o emplastro de bentonita em áreas carbonizadas no túmulo F42:
em seu estado original, antes de todo o processo; após a primeira lavagem e após a retirada do
emplastro, respectivamente.

7.1.2. Quanto a remoção de camadas microbiológicas


As áreas afetadas pelo avançado estágio de colonização microbiológica
apresentaram melhora significativa. A coloração avermelhada da pedra, por conta
desse tipo de degradação, antes bastante acentuada, foi visivelmente minimizada
(Figura 96).
APÓS A 1ª LAVAGEM APÓS AÇÃO DO EMPLASTRO

Figura 96: Resultado obtido com o emplastro de bentonita em áreas afetadas pela ação biológica.

Embora a melhora no aspecto da pedra já fosse consideravelmente melhor,


para amenizar a alteração de cor causada pelos pigmentos biogênicos, optou-se
por lavar a área de análise com água e hipoclorito de sódio (NaClO), na
proporção 1:1. O resultado final obtido, após o processo completo de aplicação do
emplastro, foi a redução quase completa de manchas, seja por conta da ação
biológica ou por carbonização e recuperação da boa aparência da pedra (Figura
97).

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Deterioração das pedras da arquitetura mortuária do Cemitério Nossa SILVA, Pâmela A. B. V. da
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ESTADO 1ª EMPLASTRO APÓS AÇÃO DO APÓS AÇÃO


ORIGINAL LAVAGEM APLICADO COBERTURA EMPLASTRO NaClO

RESULTADO FINAL

Figura 97: Processo do teste de aplicação do emplastro de bentonita e resultado final.

Conforme explanado nos estudos de Guiamet et al. (2013), procedimentos


de limpeza semelhantes foram realizados em mausoléus de mármore com
presença de biofilme no Cemitério da Recoleta em Buenos Aires, Argentina,
também obtendo resultados satisfatórios. Nesses estudos, toda a superfície de
cada monumento tratado foi escovada com biocida a base de cloreto de
benzalcônio (diluição de 3% em água destilada), que diminuiu a flora microbiana
que colonizava os monumentos e removeu microrganismos acidificantes que
poderiam alterar o material, permitindo interpretações completas das imagens dos
monumentos. Foi ressaltado, porém, a grande importância em realizarem-se tais
tratamentos com biocidas periodicamente.

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Deterioração das pedras da arquitetura mortuária do Cemitério Nossa SILVA, Pâmela A. B. V. da
Senhora da Soledade

7.2. REMOÇÃO DO PRODUTO DE CARBONIZAÇÃO

Os testes feitos com polimento e aplicação de emplastro de bentonita para


remoção de camada de carbonização em estágio avançado apresentaram bons
resultados, com níveis diferentes de eficiência entre as duas técnicas.

O primeiro procedimento realizado foi o polimento manual de parte da área


carbonizada. A camada superficial mais espessa de carbonização foi retirada,
restando apenas uma mancha mais clara, de alteração mais profunda (Figura 98).
Os resultados foram consideráveis, porém a técnica exigiu grande esforço físico
para limpeza de uma área reduzida.

ESTADO ORIGINAL APÓS POLIMENTO MANUAL

Figura 98: Resultado obtido após primeiro polimento.

Com a obtenção desse primeiro resultado, seguiu-se à aplicação de


emplastro de bentonita tanto em área carbonizada sem polimento quanto na área
já polida, a fim de compararem-se as técnicas.
Após a ação do emplastro, a camada mais superficial de carbonização
dissolveu-se e saiu mais facilmente, com uso de espátula e lixa, com menor
esforço físico do que somente com a técnica anterior. O resultado final, porém, foi
o mesmo obtido antes, com o polimento.

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Deterioração das pedras da arquitetura mortuária do Cemitério Nossa SILVA, Pâmela A. B. V. da
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Quanto ao resultado alcançado com a aplicação do emplastro de bentonita


na camada de alteração mais profunda, anteriormente polida, a superfície
continuou com o mesmo aspecto, levando a crer que esse é o ponto máximo de
limpeza que se consegue chegar com esses dois procedimentos em áreas com
estágio de carbonização muito avançado (Figura 99).

APÓS POLIMENTO MANUAL +


APÓS AÇÃO DO EMPLASTRO EMPLASTRO

Figura 99: Aspecto final da área analisada após aplicação de emplasto de bentonita e polimento.

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8.CONCLUSÕES
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Deterioração das pedras da arquitetura mortuária do Cemitério Nossa SILVA, Pâmela A. B. V. da
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8. CONCLUSÕES
Diante do quadro de estágio avançado de deteriorações, o Cemitério da
Soledade, ainda que seja um bem patrimonial tombado, só sofreu intervenções
pontuais e, apesar dos vários estudos e projetos para uma restauração efetiva,
ações de conservação não foram postas em prática.

Tal situação se opõe ao preconizado nas teorias do restauro, que


defendem a intervenção humana para conservação dos monumentos, suprimindo
sintomas de degradação e assegurando a manutenção da integridade e
autenticidade das obras (RIEGL, 2006; BRANDI, 2008).

Vários são os fatores que contribuem com os processos degradativos nas


pedras do Soledade, além da incipiência de ações conservacionistas e
restaurativas. Os estudos realizados mostram que as pedras da arquitetura
mortuária do Cemitério da Soledade apresentam diversos padrões de
deterioração e sofrem com o agravo e o aumento da velocidade das alterações
desde sua aplicação na forma de monumentos, há mais de 150 anos.

Os principais agentes são a ação intempérica e a ação humana. A


exposição às condições ambientais específicas de Belém, com chuvas
abundantes e elevados índices de temperatura e umidade, contribui
significantemente com o intemperismo, que é diferenciado conforme a natureza
litológica das pedras.

A atividade antrópica, seja por meio de cultos religiosos ou vandalismo,


envolve a deposição de oferendas, principalmente alimentos e velas e ainda,
arranhões, grafite e danos de impacto causadores de lacunas. Ainda cabe incluir
a poluição atmosférica, cujas partículas depositam-se nas superfícies e cujos
gases reagem com constituintes pétreos.

• A suscetibilidade do material pétreo às deteriorações

A grande maioria das pedras aplicadas na arquitetura mortuária do


Soledade é carbonática. O Lioz e o mármore aplicados são formados
essencialmente por calcita. Ambos diferem, porém, quanto às questões texturais

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Deterioração das pedras da arquitetura mortuária do Cemitério Nossa SILVA, Pâmela A. B. V. da
Senhora da Soledade

e granulação e aos índices físicos. Tal fato permite uma diferenciação quanto ao
potencial de intemperismo dessas pedras, garantindo suscetibilidades distintas às
alterações.

Quanto ao granito, as análises comprovaram que o mesmo já se


encontrava intemperizado desde a sua extração nas pedreiras, conforme
detecção da caulinita via difração de raios-x. Quando da rocha já aplicada ao
monumento, os processos de alteração continuaram a se desencadear sem
cessar, tendo sido identificados outros minerais de intemperismo, como a gipsita,
cujo aparecimento foi facilitado pela argamassa de assentamento.

Além disso, o granito apresenta características físicas, alta absorção e


densidade reduzida, que reduzem sua durabilidade e resistência, contribuindo
para o estado avançado das deteriorações encontradas.

• Quanto às alterações

Os túmulos e mausoléus apresentam grande diversidade de manifestações


patológicas, sendo comum a presença de áreas com sobreposição de patologias,
com diferentes estágios de deterioração e com alterações associadas, em que um
tipo acarreta outro: fissuras originam lacunas e aumento da porosidade,
proliferação microbiológica favorece crescimento de plantas, crostas negras
evoluem para destacamentos e assim por diante.

Os padrões mais recorrentes pertencem aos grupos “descoloração e


depósito” e “colonização biológica”, sustentando a informação visual de
abundância de deteriorações decorrentes da deposição de filmes, sejam eles
orgânicos ou não.

Os danos agravantes desses grupos são:


- Descoloração e depósito: Crosta negra, sujidades e carbonização;
- Colonização biológica: proliferação de bactérias, algas, fungos e liquens, além
do crescimento de plantas superiores por entre as estruturas dos monumentos.

Apesar da extensão desses danos mais recorrentes, em área, não se pode


afirmar que os mesmos são os de maior grau de intensidade, sendo proposto

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para trabalhos futuros a adoção de padrões que definam a escala de severidade


dos danos, assim como mapeamentos baseados não somente nos danos, mas
em unidades homogêneas quanto aos problemas e necessidades de
conservação, distinguindo-se prioridades quanto urgência de reparos, conforme
proposto por Delgado Rodrigues (2014) e Fitzner et al. (2003).

Outros grupos de danos, ainda que com menor incidência, tiveram


determinadas patologias com destaque, sendo elas:
- Fissuras e deformação: fissuras capilares, com grande incidência no Lioz;
- Destacamento: desagregação granular, avançada nas colunas do mausoléu em
granito;
- Perda de material: lacunas e erosões, atingem número expressivo de
exemplares.

• Quanto aos mecanismos de deterioração

- A biodeterioração:

Foram identificados diversos organismos microscópicos nas camadas


biológicas analisadas, sendo eles: bactérias, algas, liquens, além de animais
aquáticos. O ambiente no qual está inserido o Cemitério da Soledade é propício
para o desenvolvimento de tais microrganismos, uma vez que reúne os elementos
(vegetação abundante, luz, água, sombra e gás carbônico) necessários para a
fotossíntese, promovendo o crescimento e proliferação desses seres.

Estabelecida essa situação, o aparecimento de biofilmes torna-se


recorrente e, de certa forma, inevitável. Entretanto, lavagens e limpezas
periódicas podem ajudar a controlar a expansão desses biofilmes.

A atividade metabólica microrgânica favorece a dissolução do material


pétreo, o aumento da porosidade, a alteração cromática, o fissuramento, além de
propiciar a instalação de plantas superiores.

A penetração das raízes de plantas superiores por entre as estruturas dos


monumentos acarreta danos severos, comprometendo a estabilidade,
fragmentando e fraturando peças, eventualmente ocasionando lacunas.

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Deterioração das pedras da arquitetura mortuária do Cemitério Nossa SILVA, Pâmela A. B. V. da
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- A reação aos poluentes atmosféricos:

Os níveis de poluição do meio urbano no qual está inserido o Cemitério da


Soledade ocasionam alterações nas pedras de túmulos e mausoléus. Além de
originarem a deposição por via seca nas superfícies de todos os monumentos,
contribuem para a formação de crostas negras, a partir da interação dos gases
com componentes cálcicos nas pedras.

Quanto maior o tempo decorrido do processo de deterioração, mais


complexas são as soluções para remoção desse dano. Como a limpeza e
estabilização das áreas afetadas são de extrema dificuldade (DELGADO
RODRIGUES, 2014), indica-se para trabalhos futuros, a identificação de outras
áreas passíveis ao aparecimento de crostas negras e a análise do produto de
alteração dessas áreas para comprovação científica via ensaio laboratorial.

- A exposição às altas temperaturas

As repetidas dilatações e contrações térmicas causadas pelas elevadas


temperaturas diárias, somadas ao calor provocado pelas chamas de velas geram
esforços suficientes para ocasionar fissuras e fraturas, além de propagar as pré-
existentes. A composição mineralógica influi no comportamento das pedras frente
essas variações, devido à anisotropia da calcita.

As medições de temperatura obtidas com a termografia chegaram a atingir


154ºC em locais expostos ao calor elevado das chamas. As temperaturas
possivelmente podem atingir valores ainda maiores, conforme o volume da
concentração de velas.

Consequentemente, o processo químico de carbonização acarreta o


aparecimento de camadas enegrecidas sobre as superfícies pétreas, cujas
espessuras variam conforme a demanda periódica, sendo as mais profundas de
difícil remoção. Quanto mais avançado o estágio de carbonização, maior a
desintegração do material.

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- A perda de coesão

Os mecanismos de alteração da pedra, como as altas temperaturas, o


acesso facilitado de água, a colonização biológica, não alteram somente as
superfícies do material. O ensaio de ultrassom permitiu a avaliação, ainda que
indiretamente, do grau de alteração e coesão internas das pedras analisadas. Os
valores de velocidade de propagação de ondas ultrassônicas atingidos mostraram
que a coesão das pedras está comprometida, sobretudo no único exemplar em
granito. Esse mausoléu como um todo está alterado e a perda na sua coesão
permite com mais facilidade a rápida transferência capilar de água das chuvas,
favorecendo ainda mais a desagregação dos minerais.

O mármore foi o que melhor respondeu ao ensaio de ultrassom, atingindo


altas velocidades, ratificando o diagnóstico do estado de conservação que
também indicou esse material como mais resistente que o Lioz, sobretudo quanto
ao fissuramento.

• Caminhos para a preservação dos monumentos pétreos do Soledade

A partir do conhecimento dos agentes e mecanismos de deterioração, os


testes de tratamentos restaurativos foram realizados com o intuito da busca de
soluções para duas das patologias mais evidentes no Cemitério da Soledade: os
biofilmes e a carbonização, para a recuperação da autenticidade e integridade
dos monumentos.

Os resultados atingidos servem como referencial para futuras ações de


conservação, já que se obteve êxito nos efeitos finais, tendo melhora significativa
na aparência estética dos túmulos, resgatando a imagem que lhes confere valor
histórico e artístico.

Uma vez que a resistência dos materiais aos agentes climáticos diminui
com a exposição e a idade (FRASCÁ, 2003), cabe salientar que os efeitos obtidos
com os testes aplicados, evidenciam que com limpeza e manutenção continuadas
é possível a melhora do estado de conservação dos monumentos pétreos. Vale
lembrar que tais tratamentos têm um tempo de vida útil limitado, devendo haver

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monitoração das condições da pedra após os resultados, para que se sustente o


bom desempenho a longo prazo.

A prova disso é que, durante o processo de aplicação do emplastro de


bentonita, após a primeira lavagem com água e sabão, o túmulo já apresentou
melhora significativa na aparência, com redução das películas de deterioração.
Para trabalhos futuros é recomendável que se estenda o tempo de ação do
emplastro, havendo a possibilidade de que se aumente a eficiência quanto à
remoção das camadas biológicas, consequentemente reduzindo a alteração
cromática.

O hipoclorito de sódio usado por ser facilmente encontrado no mercado, foi


utilizado de forma controlada e cautelosa, de modo a não alterar a coloração
original da rocha.

As técnicas testadas para remover camadas de carbonização, com


polimento e aplicação de emplastro, ainda que tenham apresentado um bom
resultado, não foram suficientemente eficientes na remoção de manchas de
alteração mais profunda, principalmente a execução somente de polimento
manual, dado o acentuado esforço físico empregado. Considerando tais fatores,
ao chegar-se ao ponto de limpeza atingido neste trabalho, é recomendável que se
prossiga com outras opções, a exemplo do uso de laser.

Em face do exposto, o presente trabalho reforça a premissa de que o


binômio teoria e prática sempre esteve e sempre deverá estar presente na
atividade da conservação “efetiva” da memória, de modo a aumentar a
longevidade da ”matéria” dos artefatos de valor cultural (OLIVEIRA, 2008).

Considerando que a deterioração das pedras aplicadas no patrimônio


construído pode ser entendida como a tentativa de adaptação a um ambiente
diferente daquele de origem, na busca de retorno ao equilíbrio (DIONÍSIO et al.,
2004), essa pesquisa ratifica que a importância do processo de preservação está
na busca do conhecimento das características intrínsecas do material, que
condicionam seu comportamento ao longo do tempo, precedido de reflexão e

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aprofundamento do juízo crítico, que irão guiar os limites da intervenção


(OLIVEIRA, 2008).

A compreensão dos processos de deterioração da pedra é baseada na


observação sistemática e estudo de dados de campo (DELGADO RODRIGUES,
2014), os quais fundamentaram as análises posteriores. No presente trabalho,
ensaios laboratoriais complementaram a capacidade de pesquisa e foram um
diferencial no aprofundamento das análises, permitindo a incorporação de
conhecimentos de outras áreas da ciência para que fossem identificados os
mecanismos de deterioração. É de suma importância a multidisciplinaridade para
a busca das soluções da problemática encontrada.

As informações aqui divulgadas quanto ao porquê, como e onde se dão as


deteriorações nas pedras da arquitetura mortuária do Soledade, cumprem com o
papel de gerar subsídios para a preservação e conservação desse patrimônio
belenense (Figura 100). Uma vez que foi reconhecido como tal, a partir do seu
tombamento, este deve ser mantido para as gerações futuras, com sua imagem e
aparência preservadas, assim como a integridade dos monumentos.

Ademais, é fundamental que se fomente o aproveitamento turístico cultural


local que se pode obter com iniciativas como a do estudo em questão, na busca
de que seja garantida a salvaguarda da memória da história e cultura belenenses,
na forma de patrimônio construído.

Por meio da divulgação da importância do Soledade como herança


histórica e cultural de sociedades passadas, a pesquisa também serve de impulso
e incentivo à criação de organizações e associações em prol do patrimônio
cemiterial, como as enaltecidas no decorrer do texto. A conscientização da
população é um passo importante no incentivo à preservação e a mesma deve
ser estimulada com serviços de educação patrimonial.

É ainda proposta uma continuidade dos estudos aqui iniciados, como forma
de aprofundamento das análises, que podem ser complementadas com buscas
de novas alternativas de tratamento, a exemplo: testes de produtos para remoção
de grafite; limpeza a laser de crostas negras e carbonização; consolidação de

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áreas pouco coesas; reconstituição de peças com uso de argamassa polimérica;


e uso de outros produtos para remoção de camadas biológicas ou resquícios das
mesmas, de modo a dificultar novas colonizações.

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Figura 100: Subsídios tecnológicos para conservação e restauração das pedras do Soledade.

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REFERÊNCIAS
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Deterioração das pedras da arquitetura mortuária do Cemitério Nossa SILVA, Pâmela A. B. V. da
Senhora da Soledade

APÊNDICES
Deterioração das pedras da arquitetura mortuária do Cemitério Nossa SILVA, Pâmela A. B. V. da
Senhora da Soledade

ANEXOS
Deterioração das pedras da arquitetura mortuária do Cemitério Nossa SILVA, Pâmela A. B. V. da
Senhora da Soledade

ANEXO A – Artigo de Mário Barata publicado em 29 de dezembro de 1963, no


jornal "A Província do Pará".

VALOR URBANÍSTICO DO CEMITÉRIO DA SOLEDADE

BELÉM – PARÁ

Mário Barata

Crítico e historiador de arte, jornalista, professor e


escritor. Secretário geral da AICA, professor da
EMBRA e do curso do Museu Histórico Nacional, de
1952 a 1962. É autor de dezenas de monografias,
ensaios e textos de apresentação. Vice-Presidente
do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro.

Uma cidade que cresce não se pode dar ao luxo criminoso de despersonalizar-se,
destruindo os valores que a caracterizam. Entre os resultados do bom trabalho de
administrar do passado, dando nota inconfundível à paisagem urbana de Belém do Pará,
está o cemitério da Soledade, em quadra arborizada com palmeiras e árvores da terra e
ainda as "mangueiras de cemitério", a que se refere liricamente Eneida no seu Banho de
Cheiro, com a face principal dando para a larga e ensolarada avenida Serzedêlo Corrêa.
Talvez nenhuma outra cidade do Brasil possua uma área urbana de antigo
cemitério desafetado, com tal qualidade e tão específico como elemento artístico
paisagístico. Quando bárbaros iconoclastas pensam hoje na própria Belém do Pará, em
destruir o tradicional cemitério a fim de substituí-Io por edificações residenciais, cumpre
levantar viva voz para protegê-lo e salvá-lo dêsses ímpetos comercialistas, desprovidos
de compreensão e de amor pela cidade e do respeito aos mortos.
Belo pela sua implantação de verde, pelos gradis externos de ferro, pelo traçado
neo-clássico das muradas de sua área central com estátuas de cerâmica e alguns
túmulos-capela do mesmo estilo, com os nomes e os despojos das famílias tradicionais
do Grão-Pará: fazendeiros de Marajó, comerciantes, militares, políticos, estudiosos. E os
remanescentes dos túmulos rasos de azulejos, que a avidez dos colecionadores atuais
dessas cerâmicas está cada vez mais arrancando ao abandono do local. E necrópole
importante também pelo lado sociólogo, sobretudo no momento em que Gilberto Freyre
conclui a sua Introdução à História da Sociedade Patriarcal no Brasil com o anunciado
Jazigos e Cevas Rosas (sepultamento e comemoração dos mortos no Brasil - patriarcal e
semi-patriarcal).
Percy Lau, ao fazer, neste 1963, o mapa Pitoresco e Resumido da Cidade de
Belém do Grão Pará - possivelmente sob indicações de Tocantins e inserto no bom lucro
sobre a capital paraense dêste autor, coloca entre as poucas coisas ali anotadas como
sugestão aos turistas, o Soledade e, em sua frente, o cemitério dos Ingleses. Realmente,
aos visitantes interessam aos valores paisagísticos e históricos daquela quadra verde
que quebra, respeitosa e espiritualmente, mas também de modo estético, a repetição de
casas dos quarteirões fronteiros ou vizinhos, já imaginados profeticamente pela
insaciabilidade vampiresca dos especuladores, como áreas de futuros arranhacéus de
apartamentos. Só a consciência pública - espiritual e artística -, poderá deter mais uma
Deterioração das pedras da arquitetura mortuária do Cemitério Nossa SILVA, Pâmela A. B. V. da
Senhora da Soledade

vez espontâneamente, os resultados das ofertas e lentações do "vil mental", no caso da


preservação do cemitério da Soledade, cuja proposta de tombamento estou renovando
neste mês, à Diretoria do Património Histórico e Artístico Nacional, acompanhando e
ampliando, ante fatos novos, a antiga formulação de 1948, feita por Ernesto Cruz.
No décimo quinto capítulo do Santa Maria de Belém do Grão Pará, Leandro
Tocantins ressalta, por duas vêzes, os magníficos gradis do "Soledade", vindos, ao que
parece, da Inglaterra, em meados do século passado, gradis cuja largueza de ritmo e
valor plástico são levemente indicados pelo desenho de Lau. Realmente com as suas
bases de pedra oitocentista e as pilastras laterais, afirmam valor de beleza.
Estudioso da categoria de Arthur Vianna, considerado recentemente por Artur C.
F. Reis como um dos quatro maiores historiadores do Pará, desde fins do século
passado, dedicou atenção ao "Soledade", em sua monografia A Santa Casa de
Misericórdia Paraense / Notícia Histórica / 1650-1902, editado em Belém nesse último
ano. Por ali se sabe que o local do cemitério e o seu início foram estabelecidos pelo
notável presidente conselheiro Jerônimo Francisco Coelho, em 1850, durante grande
epidemia de febre amarela, no meio de restrições surgidas das classes mais ricas da
cidade, habituais às inumações nas igrejas.
Só em 1874 nascera a necrópole de Santa Isabel, cujas obras de muramento
externo e gradis foram orçados então, a pedido da Santa Casa, pelo engenheiro Antônio
Manuel Gonçalves Tocantins - também estudioso da geografia paraense e autor, entre
outros trabalhos, de uma viagem ao Trombetas.
Portaria de 5 de agôsto de 1880, do presidente da Província, dr. José Coelho da
Gama e Abreu, Barão de Marajó - geógrafo e historiador - suspendia os enterramentos
no Nossa Senhora da Soledade, visto que a análise de terreno, misto de argila e areia,
revelava-o, sob diversos aspectos, impróprio ao fim nobre a que o destinavam até então.
O estudioso que reuniu, todavia, maior documentação sôbre a necrópole foi já
citado Ernesto Cruz, que se baseou em códices manuscritos da Biblioteca e Arquivo
Público do Pará e em livros de assentamentos do Cemitério. Intitulou-se o seu trabalho,
terminando ao que parece em abril de 1946 e ao que tudo indica ainda inédito, de O
Cemitério de Nossa Senhora da Soledade, enviando-o datilografado e acompanhado de
fotografias, à Diretoria do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, em cujo arquivo se
encontra.. Documenta, o mesmo, póstigo em cantaria que foi projetada pelo artista
Pezerat, de formação neo-clássica, que trabalhou no Rio de Janeiro - na antiga Escola
Central (hoje de Engenharia) e na Quinta da Boa Vista- sendo essa prova de sua
atividade no extremo norte do país importante e curiosa para a História da Arte do nosso
período imperial. E também apresenta a sóbria e elegante capela néo-clássica, com
sineira separada, posterior, em largo arco, no qual elementos de sobrevivência formal
barrôco-pombalina se ajustam a uma base bem clássica.
Isolado pelas quatro faces, o "Soledade", incluindo pequenos campos santos de
Ordens Terceiras, é área urbanísticamente significativa, na capital paraense.
Divulgarei a seguir informações a respeito do tradicional cemitério
fundamentando-me essencialmente no referido trabalho de meu amigo Ernesto Cruz.
Em dezembro de 1850, já estando a Provincia sob nova administração, do
Presidente Fausto Augusto de Aguiar, o cemitério passou à propriedade da Santa Casa,
com a obrigação desta pagar à Câmara de Belém o fôro anual de cem réis por braça de
frente que tivesse o ter reno.
Deterioração das pedras da arquitetura mortuária do Cemitério Nossa SILVA, Pâmela A. B. V. da
Senhora da Soledade

Da construção da Soledade foi inicialmente encarregado o capitão Joaquim


Vitorino de Sousa Cabral, cujos restos mortais nêle repousam.
O pórtico e o gradeamento do Soledade foram feitos por projeto do engenheiro-arquiteto
Pezerat, tendo sido a parte de cantaria executada em Portugal em pedra de lióz.
A 28 de janeiro de 1853, fôra firmado contrato entre a Mesa Administrativa da Santa
Casa, e o construtor Joaquim Maria Osório, da cidade de Lisboa. representado no ato
pelo cidadão Francisco Antônio Fernandes, .para o fornecimento dêsse material. Vieram
400 pedras e o portão de ferro, tendo sido aquela "lavada" com ferramentas reais fina nos
enfeites e nas guarnições. O gradeamento de ferro encomendado na Inglaterra, por
intermédio da firma Singlehurst, Muller & Cia, de Belém, veio pelas barcas "PRINCESS
ROYAL" e "EMILY" chegados a 8 de julho e 19 de setembro de 1853.
Em 1854 eram inaugurados os melhoramentos.
Ainda segundo Ernesto Cruz, entre os monumentos funerários mais importantes
ou dígnos de interêsse, no "Soledade" podem citar-se:
I - o jazigo do major Gaspar Leitão da Cunha, pai do presidente da Provícia do Pará,
Ambrósio Leitão da Cunha;
II - o de Vicente Antônio de Miranda, comendador da Ordem de Cristo e Oficial da
Imperial Ordem da. Rosa, que deixou um vultoso legado à Santa Casa de Misericórdia do
Pará, com o qual foi possível a construção do pórtico e do gradeamento da Soledade;
III - o monumento onde estão as cinzas do general Hilário Maximiliano Antunes Gurjão,
herói da ponte de Itororó. Foi construido nas oficinas de Lombardi em Bréscia. O trabalho
de escultura foi feito pelo professor Allegretri do Insttuto de Belas Artes de Roma.
IV - O túmulo do capitão de mar e guerra José Joaquim da Silva;
V - o do cônego Siqueira Mendes;
VI - o de Manoel Coelho de Souza e outros jazigos como os das famílias Chermont,
Barata, Antônio Teodorico da Silva Pena, Visconde de Arari, Joaquim Marcelino Rosa,
Joaquim Roberto da Silva e a sepultura de azulejos portuguêses de Raimunda Chermont
Picanço, que é tida como milagrosa.
Com o início da República deu-se a secularização dos cemitérios - aliás sem
indenização à Santa Casa Paraense dos capitais ali empregados, ao lado dos da
Província. Um termo de entrega em 1891 das citadas necrópoles belenenses,
autorizadas aos 17 de outubro de 1890, vem reproduzido na íntegra no livro de Arthur
Vianna. Ali se relacionam as alfaias e imagens de capela da Soledade. Achar-se-ão ainda
no local?
O representante da Diretoria do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional
propusera, como vimos no início de 1948, as inscrições em Livro do Tombo, do
tradicional cemitério.
Passados mais de 15 anos, circunstâncias novas deram maior realce às
importância dessa necrópole - sobretudo no plano urbanístico-paisagístico, -relativamente
à cidade de Belém, que ora se transforma com rapidez nêsse particular e no de sua
arquitetura em geral.
O fato do cemitério haver funcionado somente durante cêrca de 30 anos lhe
confere especial unidade de concepção e de realização de valores arquitetônicos e
escultóricos que ampliam o seu sentido espiritual e histórico.
Situado dois quarteirões por detrás do largo da Pólvora (hoje Praça da República) êle se
acha em zona residencial ainda, baixa, mas perto do centro. Fornece à cidade um
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Senhora da Soledade

elemento de meados do século passado dígno de perservação para as gerações futuras,


por êsse caráter urbanístico-paisagistico, além dos motivos anteriormente considerados.
umpre ao povo de Belém - do Pará, do país inteiro - lutar pela preservação do antigo
cemitério. Entre tantos erros urbanísticos dos últimos anos - na sêde cega de dinheiro,
que caracteriza os homens de hoje - não se cometa mais êste.
Que a Serzedêlo Corrêa e suas travessas, ao alcance do largo da Pólvora,
tenham o seu velho cemitério, a mostrar um pouco da antiga Belém, da grande Belém de
outras épocas, com o respeito devido aos ancestrais e ao passado.

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