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Unidade 2 - Complexidade narrativa na


televisão contemporânea
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Introdução da unidade
Nesta unidade, conheceremos um pouco mais os aspectos que envolvem a
construção de narrativas seriadas, seu processo histórico formativo, sua evolução
ao longo das décadas, a forma de absolvição em diferentes contextos e as novas
maneiras que esse formato vem apresentando nas últimas décadas. Além disso,
nos aprofundaremos nas formas atuais de produções voltadas para os canais de
streaming e a produção na internet. Esse percurso teórico e histórico nos dará a
oportunidade de compreender de forma ampla esse formato, predominante nos
meios televisivos desde seu surgimento, e garantirá os conhecimentos para lidar
com os novos formatos e suas alternâncias.

Como veremos logo mais, as narrativas seriadas são o formato que predomina na
programação televisiva: as séries, as telenovelas, os vídeos em plataformas como
YouTube, ou até mesmo os aplicativos de microvídeos, como TikTok ou Kwai. São
formatos que basicamente têm a intenção de contar uma história ampla, mas de
forma condensada, garantindo que tenhamos uma compreensão mais generalizada
acerca do conteúdo que está sendo disponibilizado. Porém esse não é um formato
exclusivo dos meios televisivos ou da internet. As narrativas seriadas são criadas
muito antes dessas tecnologias sequer existirem, ainda no cinema. Iremos nos
aprofundar nos aspectos históricos que envolvem o formato e a sua evolução ao
longo do processo histórico.

Nosso foco estará centrado na compreensão da linguagem específica para


formulação de narrativas seriadas voltadas principalmente para os produtos
audiovisuais veiculados nos meios televisivos. Compreende-se por meio televisivo
as produções veiculadas em serviços de internet, como as plataformas de
streaming e os canais veiculados em outras plataformas como YouTube e
aplicativos, como já citado anteriormente. Vamos começar a explorar as dinâmicas
das narrativas seriadas?

Afinal, o que são narrativas seriadas?

Todos nós, em algum momento, já fomos impactados por uma produção narrativa
audiovisual seriada, seja ela uma série, que vem se popularizando no Brasil nas
últimas décadas, principalmente com a chegada e a dominância das plataformas
d e streaming, como Netflix, Amazon Prime, Globoplay, HBO Max, entre tantas
outras. Além disso, na nossa produção cultural, estamos acostumados a estar
envolvidos com as telenovelas, produto cultural que já faz parte do DNA brasileiro
há sete décadas, marcando a nossa programação televisiva desde o surgimento do
aparelho eletrônico. A televisão ocupa um lugar central não somente em nossas
salas de estar mas também na nossa formação cultural

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FIGURA 1 - A televisão
Fonte: ZLATKO_PLAMENOV / FREEPIK.

Todas essas produções que intentam ilustrar uma história ao longo de diversos
segmentos, que podem ser chamados de capítulos ou episódios, a depender do
formato narrativo em que se encaixa, como nos alude Arlindo Machado (2000), são
narrativas seriadas. Mas não só elas como também aquela longa sequência de
filmes que exige a constante presença do espectador no cinema ano após ano,
acompanhando a trajetória e o desenvolvimento dos personagens, também podem
ser compreendidos como narrativas seriadas, da mesma forma que aqueles
pequenos vídeos que dominam as redes sociais de microfilme, como TikTok e Kwai,
por exemplo, também são narrativas seriadas, organizadas de modo dinâmico
muito característico não só do nosso tempo atual como também da evolução da
linguagem crescente da internet.

Ou seja, acompanhar uma história ampla que se desenvolve ao longo de vários


segmentos é acompanhar uma narrativa seriada, independentemente de onde está
sendo desenvolvida e divulgada. Como dito anteriormente, no Brasil, temos o
produto cultural de maior impacto para a sociedade, as telenovelas, que já
acumulam sete décadas de produção, mantendo elevados índices de audiência,
além de serem produtos que atingem quase a totalidade do território nacional,
podendo ser entendida como a narrativa de uma nação (LOPES, 2002).

Já nos Estados Unidos, o desenvolvimento de narrativas seriadas na televisão se


concentrou nos produtos com formatos um pouco diferentes. As séries, ou
seriados, exibidos uma vez por semana e com número predefinido de episódios,
são os formatos dominantes do modo de fazer televisivo no País. Por sua
hegemonia política, esses formatos acabam sendo absolvidos por outros países,
ganhando novos aspectos ao se encontrarem com os diferentes modos de
produção.

Em relação aos formatos das emissões transmitidas pela televisão, Arlindo


Machado nos alude que:

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Chamamos de serialidade essa apresentação


descontínua e fragmentada do sintagma televisual.
No caso específico das formas narrativas, o enredo é
geralmente estruturado sob a forma de capítulos ou
episódios, cada um deles apresentados em dia e
horário diferentes e subdividido, por sua vez, em
blocos menores, separados um do outro por breaks
para a entrada de comerciais ou de chamadas para
outros programas (MACHADO, 2000, p. 83).

Ainda sobre essas narrativas, é importante entender de que forma elas estão
estruturadas. O autor considera especificamente o modelo de televisão linear, ou
seja, as emissoras de canais abertos e a cabo, nesta discussão, não são
consideradas as formas de transmissão dos elementos televisivos pelas
plataformas de streaming . Mais adiante, veremos como esses elementos estão
sendo modificados. Conforme a estrutura clássica, consagrada de programação
televisiva, podemos compreender como:

Existem basicamente três tipos de narrativas seriadas


na televisão. No primeiro caso, temos uma única
narrativa (ou várias narrativas entrelaçadas e
paralelas) que sucede(m) mais ou menos linearmente
ao longo de todos os capítulos. É o caso dos
teledramas, telenovelas e de alguns tipos de séries ou
minisséries. Esse tipo de construção se diz
teleológico, pois ele se resume fundamentalmente
num (ou mais) conflito(s) básico(s), que estabelece
logo de início um desequilíbrio estrutural, e toda
evolução posterior dos acontecimentos consiste num
empenho em restabelecer um equilíbrio perdido,
objetivo que, em geral, só se atinge nos capítulos
finais (MACHADO, 2000, p. 84).

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Esse primeiro modelo narrativo informado por Arlindo Machado pode ser
facilmente encontrado nas narrativas das telenovelas brasileiras, em que, em um
primeiro momento, pode durar alguns capítulos, apresentam-se as motivações dos
personagens e a estrutura do mundo a ser desenvolvido. Geralmente, um grande
evento é apresentado, no caso das narrativas das telenovelas, é o momento em
que o herói e a heroína se conhecem e se apaixonam, mas são impedidos de
vivenciar esse amor de forma plena, e esta será basicamente a história que
acompanharemos. No caso das séries ou das minisséries, esse primeiro evento
desenvolvedor da narrativa está localizado no primeiro capítulo. Por exemplo, na
série estadunidense “Lost”, em que, no primeiro episódio, conhecemos os
personagens, sobreviventes de um acidente aéreo que caíram em uma misteriosa
ilha.

Em relação aos outros formatos de narrativas seriadas:

No segundo caso, cada emissão é uma história


completa e autônoma, com começo, meio e fim, e o
que se repete no episódio seguinte são apenas os
mesmos personagens principais e uma mesma
situação narrativa. [...] Já o terceiro tipo de
serialização, em que a única coisa que se preserva
nos vários episódios é o espírito geral das histórias ou
temáticas; porém, em cada unidade, não apenas a
história é completamente diferente das outras, como
diferentes também são os personagens, os atores, os
cenários e, às vezes, até os roteiristas e diretores
(MACHADO, 2000, p.84).

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Como exemplo do modo narrativo do segundo tipo, podemos destacar as séries


policiais e focadas em plantão médico, como “CSI”, “ER”, e o seriado brasileiro
clássico “Malu Mulher”. No terceiro caso narrativo, podemos destacar “Quarta
dimensão” e “Comédia da vida privada" como exemplos. De acordo com esses
tipos de narrativa, cada seguimento exibido é nomeado conforme os elementos
narrativos de que são estruturados. Capítulo é usado para definir uma narrativa do
primeiro tipo, episódios seriados, do segundo, e episódios unitários, do terceiro. Há
ainda outra nomenclatura que pode ser utilizada. Séries seriadas para as
narrativas do primeiro tipo e séries procedurais para as do segundo e do terceiro.
Essa nomenclatura está mais entrelaçada às narrativas seriadas estadunidenses e
também pode ser compreendida para as produções exibidas nas plataformas de
streaming .

Ter essas definições de nomenclatura e elementos que estruturam as narrativas


seriadas é fundamental para compreender seu aspecto histórico e sua formatação
ao longo das décadas. Desse modo, podemos traçar um paralelo entre o que vem
sendo produzido e as novas formas de fazer e pensar televisão para além das
plataformas já conhecidas. Além disso, para compreender o que são e de onde se
origina o que chamamos de “narrativas complexas”, é preciso estar ciente dessas
colocações.

Mas antes é preciso compreender que o histórico das narrativas seriadas vem de
muito antes do surgimento dos meios eletrônicos a que iremos nos deter mais
atentamente, eles surgem, como basicamente todos os elementos do audiovisual,
a partir do desenvolvimento do cinema. Ainda em seu período de surgimento, os
filmes apresentavam histórias curtas, os diretores e as pessoas técnicas
envolvidas na elaboração do formato elaboravam sobre a linguagem que
dominaria a produção cinematográfica ao longo das décadas seguintes. Contudo,
de imediato, o cinema foi bem recebido pelo público e rapidamente tornou-se
atividade popular, atraindo cada vez mais público.

Os valores cobrados pelos ingressos nas salas conhecidas como “nicklodeons ”


eram muito baixos, apenas algumas moedas de centavos, daí o nome das salas e
dos formatos. Desse modo, os produtores necessitavam dividir as produções em
partes para manter o público atraído e continuar voltando às salas de cinema.
Mesmo cobrando ingressos baratos, essa possibilidade de divisão trazia margem
de lucro maior, além de fidelizar o público, que, curioso para saber mais sobre as
aventuras dos heróis e das heroínas que eram exibidos na tela, retornavam a cada
nova incursão. Ao longo dos anos, os formatos foram ganhando outros contornos, à
medida que a formatação de longa-metragem, ou seja aqueles filmes com duração
maior, juntando mais de um rolo de câmera, surge também a necessidade de se
apropriar de algumas histórias e repetir seus formatos, criando assim as séries
cinematográficas que ficaram conhecidas ainda na primeira fase do fazer
cinematográfico.

Aspectos históricos da Narrativa Seriada

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Além da fundamentação galgada a partir da construção histórica do cinema


clássico, as narrativas seriadas têm fundamentação histórica em outra forma
cultural: o teatro e a literatura. É por meio do folhetim e do gênero melodramático
que vários fundamentos que conferem base para esses formatos narrativos foram
retirados. Principalmente nos produtos nacionais, como as telenovelas e os nossos
produtos ficcionais seriados, mesmo aqueles que têm estrutura narrativa próxima
ao do que é compreendido como formatos clássicos de produção estadunidense.

FIGURA 1 - Antenas de televisão capturam os sinais do dia a dia


Fonte: JORCHR / WIKIMEDIA COMMONS.

O melodrama é um gênero que se mantém sempre em transformação, aliado às


mudanças sociais pelas quais cada sociedade passa, dessa forma os produtos
melodramáticos estão sempre atualizando a sua raiz e buscando mudanças que
provoquem novas adequações ao gênero, ocasionando uma mudança no formato.
Essa relação pode ser facilmente observada ao longo da história da telenovela no
Brasil, que passa pelos principais momentos históricos enfrentados pelo país,
sempre elencando os personagens e as situações enfrentadas por eles em forma
de narrativa, conferindo veracidade e comprovação à trama a ser desenvolvida.
Mas onde nasce o melodrama e como o formato chegou ao audiovisual?

(Clique nos (•) para visualizar o conteúdo)

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O gênero historicamente reflete as novas estruturas sociais a ir contra os


posicionamentos fixos de outros gêneros comuns, que apresentam as posições da
realeza e da igreja como a centralidade do poder. O melodrama reflete uma nova
ordem politica e social que se manifesta a partir das revoluções ocorridas na
França, rapidamente se espalhando pela Europa. Com sua fórmula rápida e ágil, e
de forte apelo popular, aliada à maneira simples com que a sociedade conseguia
se ver reproduzida nos espetáculos, o gênero alcançou elevado público, mantendo-
se forte por séculos.

Na América Latina, o gênero encontra outras formas culturais bastante populares,


além de se aproximar dos formatos narrativos das histórias orais. Desse modo
consegue rapidamente ser absolvido pela produção cultural do continente. Com a
chegada do rádio e sua consequente ampliação e popularização, o gênero ganha
espaço por meio das narrativas seriadas que ficaram conhecidas como rádio-
novelas, bastante populares por todo continente. Essas produções são um dos
pilares das telenovelas. Mas, para compreender um pouco mais a fundo essas
imbricações, ainda é necessário conhecer outro formato narrativo vindo da
literatura: o folhetim.

O folhetim é um formato literário que, da mesma forma que o melodrama, tem sua
fonte inicial na França, eventualmente se espalhando por outros continentes. O
formato nasce a partir da produção de textos ficcionais veiculados em um espaço
do jornal intitulado rodapé, em geral, reservado para outras informações que não
as costumeiras notícias. Essas histórias eram apresentadas de forma dividida em
capítulos e sempre encerravam com um clímax, provocando a curiosidade dos
leitores, que se viam obrigados a comprar a edição seguinte para então conhecer
um pouco mais dessa narrativa.

A cada nova edição do jornal, novos elementos da história eram apresentados,


sempre mantendo a curiosidade dos leitores, que começavam a comprar os jornais
para conferir essas histórias. Eventualmente, ao final da apresentação da
narrativa, essas histórias divididas eram apresentadas em forma de livro, como o
clássico "Madame Bovary", de Gustave de Flaubert, entre outros.

Os romances-folhetim começaram a ser veiculados nos rodapés de jornais na


França, a prática se espalhou pelo mundo, chegando, inclusive, ao Brasil. Alguns
autores clássicos da literatura mundial e de romances consagrados tiveram suas
primeiras publicações em formato de folhetim. Dentre eles, podemos destacar: "A
moreninha", de Joaquim Manuel de Macedo, "O Guarani", de José de Alencar,
"Memórias póstumas de Brás Cubas", de Machado de Assis, "O conde de monte
cristo", de Alexander Dumas, entre muitos outros.

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SAIBA MAIS

A forma folhetinesca causou revolução no modo de fazer literatura,


influenciando até mesmo a maneira como outras narrativas em diferentes
áreas seriam contadas, como o audiovisual e a influência do folhetim nas
narrativas seriadas. Para entender um pouco mais dos aspectos históricos
que nortearam a chegada e a consagração do gênero na literatura,
passando pela reação crítica suscitada na época, sugerimos a leitura do
artigo "As origens do romance-folhetim: do espaço textual ao recorte de
uma obra de ficção.", de Jean-Yves Mollier. Dessa forma você terá uma
imersão muito mais ampla das perspectivas circundantes às narrativas
seriadas que estamos estudando nesta unidade, compreendendo outros
elementos narrativos a partir da utilização desses elementos em outros
formatos narrativos.

Sugerimos a leitura do artigo completo (páginas 1 a 10). Clique em


expandir pdf.

O folhetim aproxima-se bastante da linguagem melodramática, trazendo dos


palcos teatrais as caracterizações dos personagens, que já tinham absolvição e
aceitação popular bastante elevada, o que garantia uma identificação mais rápida
e certeira com o público consumidor. Além disso, as temáticas melodramáticas
também se repetem nas histórias folhetinescas, garantindo, de certa forma, o
acesso das massas a essas histórias, o que também pode ser compreendido pelo
baixo valor dos jornais. Essa forma de contar história se espalha por outros países,
chegando, inclusive, ao Brasil. Importantes escritores, como Machado de Assis e
José de Alencar, publicaram obras no formato folhetinesco. A telenovela é
chamada popularmente de folhetim eletrônico justamente por apresentar as
características mais marcantes do formato, o gancho ao final de cada capítulo,
fazendo com que a audiência se mantenha atenta ao que acontecerá a seguir, as
características dos personagens e as disputas de classe, entre outros.

Temos então, de modo sucinto, dois importantes aspectos formadores das


narrativas seriadas, as colocações acerca dos formatos folhetinescos e a influência
do gênero melodramático. Essas características ficam evidentes ao analisarmos os
formatos narrativos predominantes no Brasil e na América Latina, as telenovelas,
mas também podem ser encontrados em outros formatos predominantes em
países europeus e até mesmo nos Estados Unidos. Posteriormente, analisaremos
melhor essas questões destacando algumas narrativas.

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Como apontado antes, as rádio-novelas alcançaram grande sucesso no Brasil e


na América Latina no geral, chegando também a outros países. O formato tem
característica muito determinante que se assemelha à forma de contação oral
de história, bastante comum nos países latinos, como nos alude Jesus Martin
Barbero, ao analisar o desenvolvimento do melodrama no continente.

A partir desse apanhado histórico, conseguimos ter as bases de formação das


narrativas seriadas no Brasil. Voltaremos, um pouco mais à frente, mas antes,
precisamos compreender de forma breve a organização em outros lugares,
especificamente nos Estados Unidos, país que exerce enorme influência em
relação ao modo como produzimos narrativas seriadas, sobretudo com a chegada
e a consolidação de plataformas de vídeo on demand, os streamings , como Netflix,
Amazon Prime, HBO Max, entre outros.

Sabemos que o desenvolvimento do cinema nesse país contou com as exibições


divididas de modo seriado, seguindo padrões similares ao que já era veiculado nas
narrativas folhetinescas dos romances clássicos desde o século XVIII. Com a
complexificação da linguagem cinematográfica e o aumento da popularidade da
nova tecnologia, tornaram-se mais comuns a divisão em estruturas seriadas em
filmes populares. As séries de filmes que narravam as trajetórias de heróis e
heroínas conquistavam cada vez mais a popularidade das grandes massas.

Nesse mesmo período, um importante fator que unifica as temáticas que


estamos abordando é o acolhimento e o desenvolvimento da linguagem
melodramática como uma das formas de desenvolvimento narrativos
dessas produções.

Em meados da década de 1930, já com a consolidação da indústria


cinematográfica, começam a se popularizar narrativas seriadas cinematográficas
que abordam as heroínas femininas de forma não estereotipada. Eram melodramas
clássicos, mas atualizados para as vivências enfrentadas pela população naquele
período histórico específico. Como vimos, essa adaptabilidade é uma das marcas
do melodrama, além disso, as narrativas seriadas, mesmo antes da veiculação na
televisão, já se apropriavam dessas determinações.

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À medida que a indústria cinematográfica se fortalecia cada vez mais, e Hollywood


se centralizava como polo de produção industrial, os formatos de filmes seriados
foram ganhando outros contornos, deixando de ser considerados narrativas
simples e buscando outras maneiras de contar a história, dando preferência para
as histórias únicas. Aquelas que exigiam continuações começam a ser trabalhadas
de forma distinta. A indústria cinematográfica passa a relegar o formato de
narrativas seriadas de estilo folhetinesco, e passa também a aprimorar ainda mais
a linguagem melodramática, sobretudo em filmes da década de 1950, tendo
centralidade no diretor Douglas Sirk. É nesse momento que a televisão surge como
um novo meio de entretenimento audiovisual.

A Televisão

Produzir conteúdos para a televisão difere da produção para o cinema. Essa


afirmação pode parecer bastante óbvia quando comparamos os dois formatos, mas
é necessário reafirmar e compreender esses meandros para podermos ilustrar de
forma clara o espaço das narrativas seriadas nas grades de programação das
emissoras televisivas. Assista ao vídeo a seguir e conheça um pouco mais sobre a
televisão. Vamos la?

Recurso Externo
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Agora que você já conheceu um pouco mais sobre a produção de conteúdo para
televisão, acesse o Saiba Mais, a seguir, e veja sobre a produção de telenovelas,
garanto que você vai gostar muito.

SAIBA MAIS

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As novelas são uma das paixões nacionais, as narrativas marcaram e ainda


continuam marcando gerações. Com certeza, todo mundo tem alguma
memória afetiva relacionada a alguma história marcante, ou conhece
algum vilão de uma das tramas. O youtuber Thiago Guimarães, neste
vídeo, responde a algumas perguntas sobre novelas, relacionando seu
formato, personagens, hibridização e processos históricos. Com respostas
bem-humoradas, conseguimos nos aprofundar um pouco mais em alguns
temas pertinentes para pensar as narrativas seriadas.

Vídeo: https://www.youtube.com/watch?v=HAT6-FoqTFQ&t=1s

Seguindo sobre o assunto, vamos conhecer um pouco mais sobre as narrativas


complexas?

As narrativas complexas

A questão envolvendo a complexidade de narrativas nasce a partir dos estudos


literários, que consideram "Dom Quixote" como o percursor dessa complexificação
(CALATRAVA, 2008 apud PELEGRINI; MUNGIOLI, 2013). Entende-se, a partir disso, a
narrativa complexa como a escrita que não se preocupa apenas em apresentar
estritamente o enredo, ou seja, contar apenas a história, mas vai além, incluindo
elementos autorreferenciais sobre o processo de construção narrativo, além de
mobilizar uma série de agentes que fazem o leitor ir além do que está consumindo.

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FIGURA 1 - A variedade de opções em relação ao que assistir hoje em dia é uma


marca da evolução do modelo narrativo
Fonte: FREEPIK.

A complexidade das narrativas seriadas audiovisuais veiculadas na televisão pode


ser entendida a partir da análise de uma série de fatores. Defende-se atualmente
que a sua principal causa está justamente no processo evolutivo do meio em que
está sendo apresentada, a televisão. À medida que novos instrumentos
tecnológicos ampliam as possibilidades, seja aumentando o tamanho da tela que
garante melhor visualização, seja até mesmo melhoria da qualidade da imagem,
essas mudanças ampliam as perspectivas criativas, proporcionando um dinamismo
na linguagem televisiva, o que acaba gerando novas formas de desenvolvimento
dessas narrativas.

O pesquisador Jason Mittel define as narrativas complexas como:

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Mas o que é exatamente a complexidade narrativa?


Em seu nível mais básico, é uma redefinição de
formas episódicas sob a influência da narração em
série – não é necessariamente uma fusão completa
dos formatos episódicos e seriados, mas um equilíbrio
volátil. Recusando a necessidade de fechamento da
trama em cada episódio, que caracteriza o formato
episódico convencional, a complexidade narrativa
privilegia estórias com continuidade e passando por
diversos gêneros (MITTEL, 2012, p. 36).

Entender o caminho que as narrativas seriadas percorrem até chegar nesse ponto
de complexificação necessita de um breve apanhado histórico relacionando os
estudos de televisão. Os primeiros trabalhos acadêmicos que apontavam relação
de complexidade em narrativas seriadas dos Estados Unidos tinham como objetos
de análise as soap-opera "Dynasti" e "Dallas". A saber: soap-opera são os gêneros
de narrativas seriadas mais próximos a telenovelas brasileiras, o uso da linguagem
melodramática é muito mais acentuada, além disso, são narrativas exibidas
diariamente ao longo de décadas.

Os pesquisadores observaram que essas duas tramas apresentavam elementos


que se afastavam da estrutura clássica do gênero e se aproximavam mais das
séries, apresentando situações mais complexas e personagens bem desenvolvidos.
Um dos pontos observados foi em relação ao uso da ironia para criar uma narrativa
que, ao mesmo tempo em que se afasta do seu gênero, se aproxima. Esse uso
sofisticado da linguagem televisiva fazia com que o telespectador se aproximasse
ainda mais dessas narrativas, garantindo certa diversidade. Podemos destacar
essas produções como divisores de águas no modo de construção de narrativas.

Para Mittel, pesquisador que cunhou o termo “narrativas complexas”, em relação a


esse fenômeno de evolução das tramas, sua explicação está baseada no conflito
entre duas formas de construção, as narrativas episódicas, aquelas que contam
uma história evoluindo a cada novo episódio, e as procedurais, aquelas que, em
cada novo episódio, tem-se uma história com início, meio e fim. Ao começar a
estruturar tramas que misturam as duas formações, e buscando outros aspectos
que vão desde melhorias técnicas até a aproximação dos personagens e das
situações enfrentadas por eles, obtêm-se novas formas de narrativas,
caracterizadas pela utilização e pela ampliação dos elementos desenvolvidos pela
linguagem televisiva.

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Para o autor, a complexidade narrativa não está associada a um modelo importado


do cinema, tampouco está baseado naquilo que vem sendo comumente
apresentado como a estrutura narrativa consagrada na televisão, que inclui os
formatos episódicos e procedurais em oposição. Ele destaca a década de 1990
como momento de ruptura em relação ao que vinha sendo elaborado na televisão
estadunidense, considerando os avanços provocados pela construção de uma
linguagem estritamente televisiva. Ou seja, podemos compreender a própria
estrutura das narrativas seriadas como fonte para avanços dessa linguagem, sem
que fosse preciso recorrer a outras linguagens, como a literatura ou o cinema. O
autor pontua algumas séries como exemplo dessa narrativa complexa, algumas
delas seriam "Twin Peaks", "Seinfeld", "Arquivo X", "Lost", "The West Wing", entre
outras.

Essas séries estariam rompendo com os elementos estruturais característicos


até aquele momento, inaugurando, de certa forma, um novo padrão narrativo,
o das narrativas seriadas complexas. Ao efetuar sua análise, Jason Mittel
considera aspectos que estão além das narrativas analisadas, buscando
compreender todos os contextos de produção, as construções sociais e os
modos de recebimento desses produtos. Dessa forma é possível ter ampla
visão do fenômeno garantindo a tridimensionalidade necessária para
compreensão.

Há ainda mais uma questão a ser considerada sobre a narrativa seriada complexa,
a participação dos fãs. Como já pontuado, essas narrativas exigem que o público
espectador esteja realmente interessado e engajado com a trama, essa
movimentação pode ser explicada a partir de alguns aspectos, como a evolução
dos meios tecnológicos, que cria espaços para que o público discuta amplamente
sobre as obras consumidas, são os fóruns na internet, por exemplo. Mas também
podemos analisar por meio da ampliação da oferta de narrativas, fazendo com que
seja mantido amplo leque de obras, tornando esse espectador cada vez mais
preparado e disposto a se aprofundar cada vez. Essa perspectiva de compreensão
da narrativa complexa considera diversos fatores, não apenas um único aspecto,
como o aperfeiçoamento da escrita televisiva.

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Um dos pontos destacados ao analisar a complexidade narrativa na televisão


estadunidense é a chegada de profissionais do cinema começando a realizar
trabalhos na televisão, pois esse espaço oferece uma estrutura possível para
experimentação — considerando as características do meio, como o tempo de
desenvolvimento dos personagens e das tramas, por exemplo — uma vantagem
em relação à indústria cinematográfica. Esses diferentes profissionais, atuantes
nas mais distintas áreas, movimentam a indústria televisiva nos últimos 20 anos,
ao ponto de que esse período, para o autor, poderá ser reconhecido como a era da
narrativa complexa.

Outro aspecto que determina e caracteriza as narrativas seriadas complexas estar


presente na forma como estruturalmente a história é narrada. Esses programas
não necessariamente obedecem a determinações já usuais e presentes na
trajetória da linguagem televisiva, mas criam maneiras de apresentar situações,
de modo a criar um laço com o espectador fiel. O que apenas reforça a
participação do público na relação dessas narrativas e a sua aplicação. Séries
como “Buffy — a caçadora de vampiros” ou a animação “Os Simpsons” se
apropriam, de maneira criativa, de formas de subverter a narração tradicional,
implementando novos elementos que ora fazem referências à própria história
narrada, ora vão além, criando novos parâmetros e introduzindo maneiras criativas
e engajadas, ou seja, complexa de desenvolver a narrativa.

Dessa forma, a televisão narrativamente complexa


encoraja e às vezes até mesmo precisa de um novo
modelo de engajamento do público. A cultura dos fãs
demonstra engajamento intenso nos mundos
ficcionais, conferindo a consistência das histórias de
fundo, a coesão das personagens e a lógica interna de
programas como Star Trek e Dr. Who; os programas
contemporâneos se concentram numa dissecação
detalhada de questões complexas da trama e dos
eventos além do mundo ficcional e das personagens
(MITTEL, 2012, p. 49).

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Mittel aponta a hibridização entre as formas episódicas e seriadas como um dos


principais pontos em relação à construção de uma narrativa seriada complexa.
Estaria no equilíbrio, ainda que muitas vezes as produções não consigam alcançar
perfeitamente, uma das principais estratégias para compreender essas narrativas.
Os aspectos históricos datam desde o final da década de 1970, mas apenas em
1990, principalmente com a estreia da série “Twin Peaks” no canal ABC, que esse
equilíbrio parece ter de fato chamado atenção para uma nova forma de produção
seriada. Ao longo dessa década, outras produções, como “Arquivo X” estenderam
esse jogo de equilíbrio entre o episódico o seriado, criando modelos narrativos que
vão originar as produções como “Família Soprano”, no canal por assinatura HBO.

É importante destacar, ainda, o papel que os canais de TV por assinatura


tiveram nesse período, conquistando um público diferente daquele esperado
para a programação da TV aberta e experimentando séries a partir de outras
perspectivas. A HBO, por exemplo, aposta em narrativas que se diferenciavam
das produções comumente apresentadas até então, trabalhando com
profissionais diferentes.

Além disso, é importante destacar que as considerações envolvendo as narrativas


complexas na televisão estadunidense, apesar de nos auxiliarem na compreensão
das narrativas atuais, elas fazem sentido dentro deste contexto específico. Porém,
como o país exporta suas produções de forma global e as plataformas de
streaming — que, em sua maioria, são formadas por empresas baseadas nos
Estados Unidos — torna-se relevante conhecer e entender, além de interpretar de
que maneira essas evoluções narrativas estão chegando em nossa produção
nacional, pois estamos sendo constantemente influenciados por essa produção.
Esse aporte teórico nos auxilia na produção de programas de televisão que levarão
à nossa identidade. Então, o que podemos entender por narrativas seriadas
complexas na televisão brasileira?

(Clique na imagem para interagir com o conteúdo)

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Como sabemos, as telenovelas foram as principais produções audiovisuais


seriadas no País, desde a primeira exibição, em 1951 na TV Tupi com “Sua
vida me pertence”, apenas um ano depois da instalação do sistema
televisivo no País. Desde então o formato foi se consolidando e atendendo
a demanda, não só das empresas patrocinadoras como também do público.
Na década de 1960, principalmente com as estreias de “Beto Rockfeller” na
TV Tupi e ‘Véu de noiva” na TV Globo, escritas respectivamente por Braúlio
Pedrozo e Janet Clair, considera-se por pesquisadores da área o início de
uma linguagem moderna na televisão brasileira. As telenovelas, que antes
tinham como principal enfoque os dramas históricos apelidados de
“histórias de capa e espada” que tem como principal expoente a cubana
Glória Magadan, são deixadas para trás em favor de personagens muito
mais próximos dos reais, com questões brasileiras e de fácil compreensão.

MOHAMED HASSAN / PIXABAY

Essa mudança de perspectiva em relação à narrativa seriada brasileira é vista


como um dos pilares de consagração deste gênero tão tipicamente brasileiro. No
período de ditadura militar, coincidente com a ampliação do sistema de televisão
comercial no país, vários autores consagrados de outras áreas artísticas começam
a desenvolver trabalhos para a televisão. Principalmente na telenovela.
Provavelmente, o nome de maior destaque dessa leva de grandes autores
produzindo obras massivas seja Dias Gomes, autor de entre várias obras
marcantes de, “Saramandaia”, “O bem-amado” e “Roque Santeiro”, esta última
marcada pela censura na década de 1970, impedindo de ir ao ar no dia da estreia,
substituída por “Pecado Capital” de Janet Clair. Quando finalmente “Roque
Santeiro” consegue ir ao ar, já na década de 1980, o país está passando pela
abertura politica — período de transição entre o regime militar de secção e a
democracia plena.

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FIGURA 1 - A consagrada autora de telenovelas Janet Clair em seu escritório


Fonte: NELSON DI RAGO / GLOBO, 2022.

Essa movimentação politica é capturada no Brasil por meio das narrativas das
telenovelas, que, considerando o aspecto melodramático — gênero que está
sempre se atualizando em relação às necessidades sociais — consegue traduzir os
anseios e o clima social do momento. Algumas novelas, como “Vale tudo” escrita
por Gilberto Braga, por exemplo, são reconhecidas como ícones que traduzem os
principais problemas enfrentados pelos brasileiros naquele período. Com o fim da
ditadura, as tramas passam a abordar outros elementos, sempre considerando as
demandas sociais. Então, o que isso tem exatamente a ver com as narrativas
seriadas complexas que estamos estudando?

Como as telenovelas foram e continuam sendo o principal produto audiovisual,


como já vimos, nosso meio televisivo desenvolveu-se tendo como base a sua
formatação. As emissoras de televisão de veiculação aberta estruturam as suas
grades de programação considerando a exibição desse tipo de narrativa seriada.
Outros tipos, como as séries e as minisséries, são consideradas narrativas mais
elaboradas, sofisticadas, inclusive, exigindo um ritmo de produção mais
compensado. Essas narrativas, diferentes das telenovelas comuns, apresentam
estrutura narrativa de modo mais detalhado, o que podemos considerar como uma
forma mais complexa de elaboração narrativa, em relação à sua principal
concorrente.

É, ainda, preciso considerar o papel que as emissoras de televisão por assinatura


exerceram no Brasil, sobretudo na virada dos anos 1990 para os 2000, quando
movimentação similar acontecia nos Estados Unidos e, como vimos, é uma das
matrizes responsáveis pela complexificação das narrativas seriadas. A
popularização da TV a cabo, ainda que em menor número em relação às emissoras
abertas, apresentou para uma parcela do público as produções de outros países,
principalmente dos Estados Unidos. Apesar de retirar parte da audiência das
emissoras abertas, essa relação não chega a abalar o formato já consagrado. É
apenas nos anos 2010, com a regulação dos canais por assinatura favorecendo a
produção nacional nessas emissoras. Com o aumento da produção, ainda que
tímido em um primeiro momento, tem-se uma ampliação das formas narrativas,
movimento observável de maneira mais perceptível por meio das plataformas de
streaming . Falaremos sobre isso logo mais.

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Outro fator que também devemos considerar ao analisar as narrativas complexas


no contexto nacional são as tramas exibidas pela Rede Globo no horário das 22h, a
chamada “novela das dez” que foi uma faixa de horário fixo na emissora por
algumas décadas, retornando nos anos 2010. A diferença dessa faixa para as
outras já clássicas e para as minisséries está em alinhar as narrativas tipicamente
folhetinescas com elementos de densidade temática e narrativa. Alinhando menor
quantidade de capítulos e núcleos narrativos, eliminando ações dramáticas típicas
e explorando questões políticas, essas narrativas também poderiam ser
complexas, considerando, claro, o contexto da produção nacional. Os autores
consagrados Dias Gomes e Janete Clair tiveram sucesso nessa faixa de horário,
que se tornou clássica da nossa teledramaturgia. A explicação para o surgimento
dessa faixa de horários poderia ser respondida como uma forma de driblar a
censura política no regime ditatorial.

Já o retorno atual dessa faixa de horário poderia estar relacionado à intenção de


explorar outras perspectivas narrativas para além da clássica telenovela, de forma
que seja possível atrair uma nova parcela de audiência qualificada, que consome
muito mais produtos importados, como as séries estadunidenses. Podemos
destacar como exemplo a novela “Verdades secretas”, escrita por Walcy Carrasco,
a trama explora de forma densa temas que não são apresentados de maneira
ampla em outros horários de exibição de narrativas seriadas. Apresentando
personagens complexos, duração breve e menos núcleo, porém, ainda se mantém
de forma presente as estruturas melodramática e folhetinesca. Podemos
compreender que, em nossa realidade local, as narrativas complexas passam por
uma atualização dos elementos já consagrados da forma de contar histórias,
mesclando as influências externas com a realidade local.

Sobre essa obra, é possível identificar a raiz melodramática nas temáticas


abordadas, como as relações amorosas se estruturando em um triângulo amoroso,
os conflitos centralizados pelo romance, a inocência da heroína, a temática da
vingança e muitos outros aspectos. Mas, o que chama a atenção na trama e que
faz com que se aproxime dos conceitos de narrativa seriada é como as
personagens são desenvolvidas e os desfechos dessas situações, que exigem uma
leitura mais apurada do público espectador, como sugere Mittel ao refletir sobre o
leitor ideal de uma narrativa seriada. Podemos compreender “Verdades secretas”
como uma narrativa complexa, mesmo que possua estruturalmente os mesmos
elementos de uma telenovela comum.

Além disso, as minisséries da TV Globo apresentam estrutura narrativa que


também podem ser narrativas complexas nos moldes que nos alude Jason Mittel
ao analisar a televisão estadunidense. É o que confirmam os pesquisadores Maria
Cristina Palma Mugioli e Cristian Pelegrini, ao analisar a trama de “Força-tarefa”,
minissérie produzida pela emissora. Os autores chegam à conclusão de que o
processo histórico resultante da complexificação das narrativas seriadas não é
derivado apenas da imaginação dos roteiristas-autores mas sim de uma série de
mudanças que vão desde o aspecto social e tecnológico no campo comunicacional.
Além disso, chega-se à conclusão de que o que é considerado como narrativa
complexa seria um conjunto de fatores, dentre eles, o desenvolvimento dos
personagens, exigindo maior atenção do público.

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(Passe o mouse no (+) e confira o conteúdo abaixo)

Com este estudo, podemos ter um vislumbre em relação a vários


elementos que formam uma narrativa complexa e entendemos que
inseridos em um contexto de dominação das telenovelas, ainda assim
essas produções podem ser encontradas.

Em sua pesquisa, Jason Mittel enfatiza as diferenças entre as narrativas complexas


e as essencialmente ancoradas a partir do melodrama, como são as telenovelas.
Ele considera a formatação do gênero e o processo histórico centrado em seu país
de origem, os Estados Unidos, que como vimos brevemente, possuem histórico de
formação e influência televisiva diferentes dos nossos. Porém, ao realizarmos uma
comparação relacionando os aspectos históricos das produções, podemos perceber
ser possível expandir as pesquisas que envolvem a narrativa complexa e
considerar também as particularidades da produção nacional, reforçando que o
melodrama é um gênero que se impõe na América Latina, principalmente no Brasil.
Com as recentes mudanças e a absolvição de influências de outros países,
principalmente vindas dos Estados Unidos, podemos notar, como destacada com a
telenovela “Verdades secretas”, mudanças estruturais que vão ao encontro do que
está sendo discutido sobre as narrativas complexas.

Podemos observar por obras atuais, como a série “Rensga hits” e “Turma da
Mônica”, ambas produções da Globoplay, streaming da Rede Globo, o encontro
entre elementos característicos das narrativas complexas, a serialidade episódica,
a complexificação dos personagens associados a uma forte trama, mas sem perder
o foco dos aspectos sentimentais, ou seja, melodramáticos. Além dessas
produções podemos citar também a série nacional produzida pela Netflix, “Coisa
mais linda”, em que o melodrama ganha ares de sofisticação em busca da
complexificação narrativa. Poderíamos pensar essas inovações nacionais como
novas formas de narrativas complexas? Ou talvez uma perspectiva atualizada e
nacional sobre o tema? São questões que ainda se mostram abertas, considerando
que vivenciamos um período de intensas transformações na maneira de produzir e
consumir televisão.

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REFLITA

Agora que você já conhece os principais aspectos


das discussões teóricas sobre as narrativas
seriadas complexas e compreende os aspectos
históricos que originaram tais narrativas, poderá
conseguir classificar os produtos audiovisuais a
que assistir a partir de agora. Aquela novela ou
aquela série a que você assistiu esse final de
semana, ou até mesmo aquele canal do YouTube
que lançou um novo vídeo de humor esses dias,
apresenta que tipo de estrutura? É um episódio ou
capítulo? A narrativa é seriada ou procedural? E
ainda é possível classificar quais estruturas você
aprecia mais, revelando assim seus gostos e
principais motivações de consumo, o que poderá
facilitar na hora de produzir.

Agora que sabemos o que é uma narrativa seriada e como reconhecer seus
principais formatos, conhecemos seus processos de formação histórica e a sua
evolução, por meio dos estudos de narrativas seriadas complexas, é hora de nos
determos brevemente sobre as novas maneiras de apreciar as narrativas seriadas.

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Antes de irmos para a produção de websérie , vamos voltar algumas décadas no


tempo, mais precisamente para o período de implementação da televisão no
Brasil. A conhecida história que tem como protagonista o empresário Assis
Chateaubriand como o fundador da primeira emissora, em 1950, fazendo com que
o Brasil fosse um dos primeiros países a ter essa nova tecnologia. Ainda sem
conhecimento técnico específico para lidar com essa nova demanda, foi necessário
exportar profissionais do rádio para gerenciar o novo empreendimento.

DICA

O livro "História da televisão no Brasil" traça, por


artigos, a história da televisão no Brasil, desde sua
chegada até a consolidação e as perspectivas para
o futuro. Organizado por Ana Paula Goulart Ribeiro,
Igor Sacramento e Marco Roxo, o material é um
rico aporte teórico. A leitura dos tópicos
localizados na páginas 13 a 20 ilustrarão uma
perspectiva acerca do início dessa história.

https://plataforma.bvirtual.com.br/Acervo/Publicaca
o/2239

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É importante, além dos temas tratados nesta unidade, se aprofundar em relação


ao processo histórico que levou este aparelho à centralidade de nossas relações.
Conhecendo os aspectos históricos de forma aprofundada, poderemos
compreender melhor os caminhos que a televisão tem percorrido, desse modo
poderemos estar capacitados para compreender os novos recursos.

Websérie e narrativas seriadas para streaming

Com o avanço das tecnologias e a chegada do digital em vários setores


tecnológicos, facilitando o desempenho dos trabalhos voltados à produção
audiovisual, observou-se um crescimento efervescente na produção amadora de
narrativas audiovisuais.

Recurso Externo
Recurso é melhor visualizado no formato interativo

Com base no que você acabou de assistir, as fundamentações discutidas na


unidade fazem melhor correlação com o que até então havia sido apresentado?
Pense sobre isso.

Considerações finais

Nesta unidade, você teve a oportunidade de:

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compreender os aspectos históricos de formatação das


narrativas seriadas, conhecendo seus antecedentes e as
constantes evoluções enfrentadas;
analisar os padrões e os aspectos que configuram as
narrativas complexas, desde seu aporte histórico até as
definições em produções audiovisuais;
ter um breve vislumbre sobre as possibilidades de evolução
futura das narrativas seriadas a partir do seu
desenvolvimento tecnológico.

Nesta unidade, tivemos a oportunidade de nos aprofundarmos nas narrativas


seriadas. Entendemos que são produções inseridas no meio televisivo, estando
associadas desde a televisão linear e clássica até os novos formatos.
Compreendemos suas origens, conhecendo os gêneros que foram fundamentais,
ainda antes do surgimento dos aportes audiovisuais, por meio da literatura, como
o folhetim e o gênero melodrama. Com isso, podemos compreender o modo
nacional de produção de narrativas seriadas, fator que nos auxilia na compreensão
dos nossos modelos narrativos.

Ao nos aprofundarmos na teoria das narrativas seriadas complexas, tivemos a


oportunidade de fazer um resgate histórico do modo de produção em vigor no
Brasil, a partir da produção das telenovelas, as narrativas seriadas de maior
influência em nosso sistema televisivo, comparando com as produções de outros
países, principalmente os Estados Unidos, pela sua ampla penetração social e
cultural. Entendemos que as narrativas seriadas complexas consideram diversos
elementos, dentre eles a interação com o público e seu próprio processo histórico,
sempre tendo como primeiro plano as produções veiculadas na televisão.

Com esse aporte, podemos vislumbrar de forma breve o futuro das narrativas
seriadas, a partir da produção voltada para os meios digitais. Com as webséries,
entendemos que o avanço tecnológico e a diminuição dos valores de produtos
como câmera de vídeo e computador favorecem a larga produção de forma
amadora, gerando assim um novo mercado. É nessa entoada que as plataformas
d e streaming começam a galgar público, associando as narrativas complexas ao
seu modo liberto de produção.

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Agora que finalizamos este conteúdo, vamos testar seus conhecimentos


com o quiz a seguir.

QUIZ

Sabemos que as narrativas seriadas


audiovisuais são derivadas de gêneros
e formatos que vêm desde a
literatura. Esses formatos foram se
modificando ao longo da história e
sempre levando em consideração os
aspectos evolutivos sociais, fazendo
com que os personagens das tramas
sempre estivessem de acordo com as
questões atuais. De acordo com essa
afirmação, assinale a alternativa
correta.

O melodrama é um gênero teatral que não apresenta


a nenhuma influência para as produções audiovisuais,
justamente por ser teatral.

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Resposta Incorreta:
O melodrama, mesmo sendo um gênero teatral,
influencia os meios de produções audiovisuais que o
atualizam ao longo das décadas. Os folhetins eram
publicados nos rodapés de jornais, a cada nova edição
um capítulo era publicado, ao final, se juntava em
forma de livro. As narrativas seriadas são
influenciadas por diferentes gêneros e formas, não
apenas o rádio ou a influência do cinema.

Tanto o folhetim, veiculado em jornais, quanto o


b melodrama carregam aspectos narrativos similares e
influenciam as narrativas seriadas.

Resposta Correta:
O folhetim e o melodrama nascem na França,
aproximadamente no mesmo período do século XVIII,
e têm as características fundantes das narrativas
seriadas, entre elas o mais importante vem do
folhetim, que seria o gancho para o próximo capítulo.

O folhetim refere-se a livros publicados de forma


c resumida em jornais, após a publicação por uma
grande editora.

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Resposta Incorreta:
O melodrama, mesmo sendo um gênero teatral,
influencia os meios de produções audiovisuais que o
atualizam ao longo das décadas. Os folhetins eram
publicados nos rodapés de jornais, a cada nova edição
um capítulo era publicado, ao final, se juntava em
forma de livro. As narrativas seriadas são
influenciadas por diferentes gêneros e formas, não
apenas o rádio ou a influência do cinema.

As narrativas seriadas são influenciadas pelos


d gêneros veiculados no rádio, formatos que são a
essência desse veiculo.

Resposta Incorreta:
O melodrama, mesmo sendo um gênero teatral,
influencia os meios de produções audiovisuais que o
atualizam ao longo das décadas. Os folhetins eram
publicados nos rodapés de jornais, a cada nova edição
um capítulo era publicado, ao final, se juntava em
forma de livro. As narrativas seriadas são
influenciadas por diferentes gêneros e formas, não
apenas o rádio ou a influência do cinema.

As narrativas seriadas são derivadas dos filmes de


e longa metragem, não possuindo nenhuma ligação
com outro meio comunicativo.

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Resposta Incorreta:
O melodrama, mesmo sendo um gênero teatral,
influencia os meios de produções audiovisuais que o
atualizam ao longo das décadas. Os folhetins eram
publicados nos rodapés de jornais, a cada nova edição
um capítulo era publicado, ao final, se juntava em
forma de livro. As narrativas seriadas são
influenciadas por diferentes gêneros e formas, não
apenas o rádio ou a influência do cinema.

As narrativas seriadas complexas são


analisadas a partir de algumas
perspectivas, mas possuem alguns
aspectos que podem ser considerados
similares nos estudos realizados.
Sobre isso, assinale a alternativa
correta.

As narrativas seriadas complexas englobam apenas


a
as produções vindas dos Estados Unidos.

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Resposta Incorreta:
As narrativas seriadas complexas englobam
produções televisivas que apresentam padrões de
aprofundamento em seu estilo narrativo e de
construção de personagens que se diferem dos
elementos comumente apresentados na televisão
linear. Apesar disso, não possuem fórmula especifica,
podendo estar associadas aos mais variados formatos,
sendo percebidas, inclusive, em telenovelas
brasileiras. Não seguem nenhum padrão especifico
para a construção de nenhum dos seus elementos
formativos.

As narrativas seriadas complexas estabelecem


b
padrões de produções que são fixados.

Resposta Incorreta:
As narrativas seriadas complexas englobam
produções televisivas que apresentam padrões de
aprofundamento em seu estilo narrativo e de
construção de personagens que se diferem dos
elementos comumente apresentados na televisão
linear. Apesar disso, não possuem fórmula especifica,
podendo estar associadas aos mais variados formatos,
sendo percebidas, inclusive, em telenovelas
brasileiras. Não seguem nenhum padrão especifico
para a construção de nenhum dos seus elementos
formativos.

Uma narrativa recebe a alcunha de complexa em


c
relação à profudidade de seus contextos narrativos.

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Resposta Correta:
Além das diferenças em relação ao que é comumente
apresentado nas produções televisivas, as narrativas
seriadas complexas apresentam padrões de
profundidade em relação aos personagens e à forma
de estruturar as narrativas.

Há um padrão especifico de personagens e situações


d
que precisam ser obdecidos.

Resposta Incorreta:
As narrativas seriadas complexas englobam
produções televisivas que apresentam padrões de
aprofundamento em seu estilo narrativo e de
construção de personagens que se diferem dos
elementos comumente apresentados na televisão
linear. Apesar disso, não possuem fórmula especifica,
podendo estar associadas aos mais variados formatos,
sendo percebidas, inclusive, em telenovelas
brasileiras. Não seguem nenhum padrão especifico
para a construção de nenhum dos seus elementos
formativos.

As narrativas consideradas complexas não podem


e
ser aplicadas às telenovelas.

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Resposta Incorreta:
As narrativas seriadas complexas englobam
produções televisivas que apresentam padrões de
aprofundamento em seu estilo narrativo e de
construção de personagens que se diferem dos
elementos comumente apresentados na televisão
linear. Apesar disso, não possuem fórmula especifica,
podendo estar associadas aos mais variados formatos,
sendo percebidas, inclusive, em telenovelas
brasileiras. Não seguem nenhum padrão especifico
para a construção de nenhum dos seus elementos
formativos.

A evolução das narrativas complexas


alinhadas às narrativas voltadas para
os meios digitais deixa espaço para
que novas produções se desenvolvam,
realimentando o formato. Com relação
a isso, assinale a alternativa correta.

As webséries são narrativas voltadas para o meio


a digital e podem estar inseridas em diversas
plataformas.

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Resposta Correta:
As webséries consideram o meio digital como principal
plataforma de veiculação. Essas narrativas,
justamente por estarem em outros veículos de
comunicação que não a TV linear, apresentam-se de
forma mais livre, criando estruturas narrativas
diversificadas.

Por não possuírem aporte televisivo, essas narrativas


b
não são consideradas como seriadas.

Resposta Incorreta:
As webséries começam a ser produzidas de modo
amador, à medida que as plataformas se organizam e
um maior grupo de pessoas dominam a produção,
essas produções ganham novos aspectos, não sendo
necessário o aporte da televisão para justificar sua
produção, ainda que os streamings possuam
linguagem similar.

É necessária a veiculação anterior à televisão para


c
uma produção ser considerada como seriada.

Resposta Incorreta:
As webséries começam a ser produzidas de modo
amador, à medida que as plataformas se organizam e
um maior grupo de pessoas dominam a produção,
essas produções ganham novos aspectos, não sendo
necessário o aporte da televisão para justificar sua
produção, ainda que os streamings possuam
linguagem similar.

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Os streamings, apesar de poder serem considerados


d narrativas seriadas, possuem estrutura
completamente diferente.

Resposta Incorreta:
As webséries começam a ser produzidas de modo
amador, à medida que as plataformas se organizam e
um maior grupo de pessoas dominam a produção,
essas produções ganham novos aspectos, não sendo
necessário o aporte da televisão para justificar sua
produção, ainda que os streamings possuam
linguagem similar.

As webséries só podem ser produzidas de acordo


e
com os padrões de qualidade televisivo.

Resposta Incorreta:
As webséries começam a ser produzidas de modo
amador, à medida que as plataformas se organizam e
um maior grupo de pessoas dominam a produção,
essas produções ganham novos aspectos, não sendo
necessário o aporte da televisão para justificar sua
produção, ainda que os streamings possuam
linguagem similar.

Referências

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DI RAGO, N. Bastidores. Memória Globo, 2022. Disponível em:


https://memoriaglobo.globo.com/entretenimento/novelas/duas-
vidas/noticia/bastidores.ghtml. Acesso em: 18 out. 2022.

LOPES, M. I. V. Telenovela brasileira: uma narrativa sobre a nação. Comunicação


& Educação, São Paulo, v. 1, n. 26, p. 17-34, 2003.

MACHADO, A. A televisão levada a sério. São Paulo: Senac, 2000.

MITTELL, J. Narrative complexity in contemporary american television. The Velvet


Light Trap, Austin, n. 58, v. 1, p. 29-40, 2006.

MUNGIOLI, M. C. P.; PELEGRINI, C. Narrativas complexas na ficção televisiva.


Revista Contracampo, Niterói, v. 26, n. 1, 2013.

RAMOS, V. A. Tem negra nessa novela? Representação da mulher negra em


lado a lado. 2022. Dissertação (Mestrado em Cinema e Narrativas Sociais) —
Programa de Pós-graduação Interdisciplinar em Cinema, Universidade Federal de
Sergipe, São Cristóvão, 2022.

RESPONDENDO perguntas sobre novelas. [S. l.: s. n.], 2022. 1 vídeo (27 min.).
Publicado pelo canal Ora Thiago. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?
v=HAT6-FoqTFQ&t=1s. Acesso em: 18 out. 2022.

SVARTMAN, R. Televisão em transformação: como a telenovela pode indicar


estratégias para a televisão corporativa diante das transformações da
espectatorialidade, da convergência das mídias e das plataformas
interativas. 2019. Tese (Doutorado em Comunicação) — Universidade Federal
Fluminense / Instituto de Artes e Comunicação Social, 2019.

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