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Benveniste
Benveniste
Benveniste
ne Teixeira
A lingüística comporta a enunciação:
Émile Benveniste
I!l Em PLG r:6 "Estrutura das relações de pessoa no verbo" (1946), "A
natureza dos pronomes" (1956), "Da subjetividade na linguagem" (1958),
"As relações de tempo no verbo francês" (1959), "Os verbos delocutivos"
(1958), "A filosofia analítica e a linguagem" (1963), "Os níveis da análise
lingüística" (1964);
Isso fica bem mais claro em A natureza dos pronomes, em que o autor
ratifica a oposição anterior. A diferença entre a pessoa e a não-pessoa reside
A lingüística comporta a enunciação: Émile Benveniste 33
("
t~ada locutor se apresenta como sujeito, remetendo a ele mesmo como eu no
Lseu discurso?" e ao outro como um "tu".
Gostaríamos de insistir na leitura desse texto porque, com base nele, é corrente
uma interpretação psicologista da subjetividade na obra de Benveniste. Ora, isso
não é possível de sustentar devido, ao menos, a algumas observações.
Benveniste é bastante claro em fazer distinção entre o que é da ordem
da linguagem e o que é da ordem da língua. 13 A intersubjetividade está para a
linguagem assim como a subjetividade está para a língua.
A linguagem é condição de existência do homem e como tal ela é sempre
referida ao outro, ou seja, na linguagem se vê a intersubjetividade como
condição da subjetividade. 14 Nesse ponto, vale repetir Benveniste em algumas
[
passagens em que a distinção língua/linguagem é bem nítida: 15
sintático, já que tem por função combinar-se com uma referência objetiva de
forma independente da instância enunciativa que a contém. A diferença é,
portanto, de natureza e de função. As propriedades da não-pessoa são:
Notas
I Em agosto de 2004, ocorreu em Porto Alegre o 10 colóquio Leituras de Émile Benveniste, cujas atas
encontram-se reunidas no n. 138 da revista Letras de Hoje. Consta da publicação uma série de artigos
apresentados e discutidos por ocasião do colóquio que testemunham a atualidade do pensamento do autor
nas mais diferentes intersecções.
2 L. Hjelmslev, Prolegômenos: a uma teoria da linguagem, Rio de laneiro, Perspectiva, 1975.
3 Sobre Benveniste, vale ainda lembrar o depoimento de Merquior: "Benveniste era um mestre extremamente
culto que escondia sua enorme erudição sob uma modéstia exemplarmente discreta. Digno aluno do
maior discípulo de Saussure, Antoine Meillet, morreu pobre, respeitado por seus colegas, mas totalmente
esquecido pela fama um tanto ou quanto exagerada desfrutada pelos gurus estruturalistas (ainda me lembro
como calávamos, reverentes, ao passar pela porta de sua sala no caminho para o concorrido seminário de
Lévi-Strauss no Collêge de France)" (De Praga a Paris: o surgimento, a mudança, a dissolução da idéia
estruturalista, Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1991, p. 27).
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4 Não se pode deixar de registrar que Benveniste é um lingüista que mantém fortes laços com outras áreas,
como a Filosofia analítica, a Psicanálise, a Sociologia, a Antropologia, entre outras. A esse respeito vale
lembrar os textos Observações sobre a função da linguagem na descoberta freudiana (1956) e Estrutura
da línguo estrutura da sociedade (1968).
5 Isso não quer dizer que Benveniste deixe de ampliar muitas das idéias estruturalistas ou até mesmo de
subvertê-Ias. Nonnand (1996) considera-o um continuador de Saussure ao mesmo tempo em que, com a
inclusão das questões de subjetividade, tenta ultrapassá-lo,
6 Serão referidas, neste momento, as datas originais dos textos para que o leitor possa visualizar uma cronologia
da obra de Benveniste, no entanto, sempre que se fizer alguma citação será das publicações brasileiras.
7 A seguir, trataremos com mais especificidade da noção de referência na obra de Benveniste.
8 Resta ainda acrescentar que os termos "frase" e "palavra", em uma perfeita confirmação das reflexões do
autor, adquirem, nesse contexto, o sentido amplo de "discurso" ou de "língua em ação" e não o sentido
canônico dado pelas teorias do léxico ou da sintaxe.
, É. Benveniste, Problemas de lingüística geral I, Campinas, Pontes, 1988, p. 255 [grifos do autor].
,oIdem, p. 285.
"Idem, p. 286 [grifos do autor].
"Idem, ibidem [grifos do autor].
"Essa diferença aparece em vários momentos da obra do autor, entre os quais citaremos, aqui, apenas um a
título de ilustração. Em "A natureza dos pronomes", diz ele: "a universalidade dessas formas e dessas noções
faz pensar que o problema dos pronomes é ao mesmo tempo um problema de linguagem e um problema
de línguas, ou melhor, que só é um problema de línguas por ser, em primeiro lugar, um problema de
linguagem" (idem, p. 277) [grifos nossos].
14 Em Flores (2004), encontra-se o argumento para defender um kantianismo em Benveniste. 'l.. ]o kantianismo
aparece em Benveniste precisamente no momento em que há a recusa do em si. O sujeito não é uma coisa.
Independentemente do lado que se olhe, ele é uma condição formal para que o homem exista. Mas, para
que exista como linguagem, porque opor o homem à linguagem é opô-lo a sua própria natureza. O sujeito
é linguagem, e a intersubjetividade é a sua condição. Eis o a priori radical de Benveniste" (p. 221).
15 Os destaques são nossos.
I6Idem, p. 8.
"Idem, p. 17.
"Idem, p. 285 [grifos nossos].
"Tdem, p. 287 [grifos nossos].
~Oldem, ibidem [grifos nossos].
'e. Norrnand, Os termos da enunciação em Benveniste, em S. L. Oliveira; E. M. Parlato (org.), O
falar da linguagem, São Paulo, Louise, 1996, p. 145.
22É. Benveniste, Problemas de lingüística geral 11, Campinas, Pontes, 1989, p. 82.
"Idem, p. 84.
24Cf. V. Flores; S. Silva, "Aspecto verbal: uma perspectiva enunciativa do uso da categoria no português
do Brasil", em Letras de hoje, Porto Alegre, EDIPUCRS,2000.
"Gostaríamos de registrar que não achamos adequado tratar da enunciação, em Benveniste, apenas nos
textos especificamente a ela dedicados, pois acreditamos que esse seja um eixo de articulação de toda a
obra do autor. Lembremos os estudos sintáticos, lexicais, históricos, bem como aqueles ligados
a outras áreas como a psicanálise e a filosofia da linguagem que integram a bibliografia benvenistiana.
Defendemos a idéia de que Benveniste nunca perdeu de vista o princípio de que não se pode conceber a
linguagem em separado do homem. Opô-lo à linguagem é opô-I o a sua própria natureza, como ele mesmo
diria. É verdade que a denominação de lingüista da enunciação é bastante adequada a esse autor, porém
é injusta quando aqueles que a empregam esquecem a grande parte de sua obra dedicada aos estudos
comparativistas, sintáticos e culturais, apenas para citar estes. Parece-nos oportuno esse registro já que,
há alguns anos, fomos brindados com a publicação brasileira do Vocabulário das instituições indo-européias
e sua referência ainda é rara na literatura da área (cf. Flores, 2004).
26Benveniste, op. cir. p. 82.
"Idem, p. 84.
"Idem, p. 231.
29Idem, p. 84.