CLT e A Carta Del Lavoro
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DOI: 10.5433/2176-6665.2014v19n1p84
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RESUMO
O debate sobre a influência do corporativismo fascista na “Era Vargas” polariza-se em
torno do confronto entre aqueles que apoiam a tese de que a legislação trabalhista dos
anos 1930 seria apenas uma cópia da “Carta del lavoro”, e aqueles que querem
libertá-la do modelo italiano. Neste trabalho pretendemos seguir um percurso
metodológico e conceitual diferente. O objetivo é abrir um dialogo entre o debate
sobre o fascismo como “fenômeno em andamento” e aquele processo de “circulação-
compartilhada” de ideias em nível global entre as duas guerras mundiais, de forma a
analisar como a “Carta del lavoro” foi recebida e reelaborada na via brasileira para o
corporativismo autoritário da década de 1930.
Palavras-chave: Corporativismo. Fascismo. Autoritarismo. Era vargas. Carta del
lavoro.
1
Professor adjunto do departamento de Ciências Sociais da Universidade Federal do Ceará. Brasil.
fabio_gentile@ymail.com
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FASCISM AS A MODEL: INCORPORATING THE “CARTA DEL
LAVORO" INTO THE BRAZILIAN WAY FOR THE AUTHORITARIAN
CORPORATISM OF THE 1930S
ABSTRACT
The debate about the influence of fascist corporatism in the “Vargas Era” is polarized.
It features a confrontation between some who support the thesis that the labor
legislation of the 1930s was a mere copy of the “Carta del lavoro” and others who want
to liberate Brazil’s law from the Italian model. In this study, we intend to follow a
different methodological and conceptual route. Our objective is to open a dialogue
between the debate about fascism as a “phenomenon in progress” and the process of
the “shared circulation” of ideas at the global level between the two world wars to
analyze how the “Carta del lavoro” was received and redrafted in the Brazilian way for
the authoritarian corporatism of the 1930s.
Keywords: Corporatism. Fascism. Authoritarianism. Vargas era. Carta del lavoro.
INTRODUÇÃO
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metodológico e analítico mais produtivo para o avanço do debate. O objetivo é
abrir um dialogo entre o debate sobre o fascismo como “fenômeno em
andamento” (Paxton, 2005), pensado no “cerne da modernidade do século XX”
(Mann, 2004), e aquele processo de “circulação-compartilhada” de ideias em
nível global entre as duas guerras mundiais, de forma a analisar como, a partir do
modelo italiano, ele foi recebido e reelaborado no nacionalismo autoritário
brasileiro entre o final dos anos 1920 e os anos 1930.
O corporativismo, nas suas várias dimensões (econômica, política, social e
jurídica), torna-se então um campo privilegiado de análise para dar uma imagem
mais dinâmica do ciclo evolutivo fascista, desde o seu nascimento na Itália
durante a Primeira Guerra Mundial até a tragédia da Segunda Guerra Mundial,
uma vez que nas intenções de Mussolini e dos seus colaboradores o estado
corporativo devia ser a essência do “Estado novo”, a ser exibido com orgulho
diante todo o mundo através da fórmula da "terceira via" fascista,
verdadeiramente "revolucionária" entre liberalismo e socialismo. Basta pensar
que não só o Portugal de Salazar e a Espanha de Franco, mas também alguns
países do Leste Europeu, a Áustria de Dollfuss, a Alemanha nazista por alguns
aspectos, e a Argentina peronista apreciaram e utilizaram os princípios da “Carta
del lavoro” na construção de seu projeto de governo autoritário e totalitário.
Tendo em conta o estado atual do debate, pretende-se analisar a
incorporação da “Carta del lavoro” na construção da via brasileira para o
corporativismo autoritário, que foi um dos pilares da "Era Vargas" entre a
"Revolução de 1930" e a Segunda Guerra Mundial. A escolha desta periodização é
necessária, a fim de mostrar que a assimilação do modelo italiano na criação do
Estado autoritário e corporativo brasileiro não se limitou apenas à fase ditatorial
do “Estado Novo” (1937-1945), mas foi uma operação gradual, cujas raízes
teóricas já são detectáveis no debate ideológico e político da Primeira República.
Vamos tratar, portanto, o triunfo do corporativismo durante a era de
Getúlio Vargas, tentando responder a algumas das questões que surgiram ao longo
da pesquisa.
Como e através de que fontes as ideias corporativas fascistas, tais como
"questão social", "nacionalismo social", "Estado nacional do trabalho", "categoria",
"contrato coletivo", "Justiça do trabalho", "corporações", "enquadramento
sindical", "sindicato único", "produtores da nação", "conselhos técnicos",
circularam no Brasil entre os decênios de 1920 e 1930? Como e em que medida
os intelectuais e os juristas que auxiliaram Vargas na construção do Estado
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apresentaram a industrialização como a via para reconstruir a economia nacional,
após a crise de 1929 – que havia mostrado a dependência do café, o principal
produto da economia agroexportadora brasileira, expondo a fragilidade da
economia nacional frente ao mercado global. E o Estado corporativo autoritário se
tornou o principal instrumento para governar a transição para a civilização
industrial.
Um dos principais fundamentos teóricos dessa visão foi o conceito de
corporativismo “integral” e “puro” do economista e político romeno Mihail
Manoilescu (1938)2, elaborado de acordo com os diferentes níveis econômicos e
políticos de cada país para resolver tanto a crise econômica das áreas avançadas,
quanto para coadjuvar o take off industrial da “periferia” do capitalismo. Com
base na ideia de que as nações periféricas do capitalismo poderiam romper o
vínculo de dependência semicolonial que tinham em relação aos países mais
desenvolvidos, Mihail Manoilescu previa a implantação de um Estado forte, capaz
de organizar integralmente todos os recursos nacionais para projetar a
transformação necessária e irreversível da sociedade agrária para a sociedade
industrial. Embora as massas trabalhadoras da “periferia” do capitalismo ainda
não tivessem chegado num nível de organização e consciência de classe
comparável aos dos países mais industrializados, também nessa área a transição
pela era industrial, dominada pela organização e pela técnica, devia ser
coadjuvada por uma política preventiva, orgânica à centralização capitalista, de
incorporação da classe operária, ainda em embrião, no Estado, para evitar a
reprodução do conflito de classes da sociedade europeia durante a Primeira
Guerra Mundial.
Nesta perspectiva, o corporativismo fascista – em suas múltiplas dimensões
de catalogação jurídica do social, dirigismo econômico, organização da nação e
harmonização do conflito capital-trabalho – encaixou-se perfeitamente no projeto
nacional desenvolvimentista, autoritário e estadocêntrico de Getúlio Vargas de
modernização corporativa da sociedade brasileira entre as duas guerras mundiais.
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Seguidor do fascismo italiano, Manoilescu foi um dos autores mais populares do debate brasileiro
dos anos 1930. Sua obra mais famosa - O século do corporativismo (1934) - foi traduzida do
francês para o português por Azevedo Amaral, um dos principais ideólogos do Estado Novo, em
1938. Por "integral" entende-se um modelo de corporativismo não limitado apenas ao dirigismo
econômico, mas que engloba todas as forças sociais e culturais da nação. Por "puro" refere-se à
centralidade das corporações como fontes de poder do Estado.
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Mas como é reelaborado no pensamento nacionalista e depois naquele
fascista o conceito da auto-obrigação do Estado em relação às próprias leis?
Enquanto na tradição jurídica liberal a ideia de autolimitação do Estado é a base
legal sobre a qual fundamenta-se a liberdade do cidadão no Estado de Direito,
Rocco opera uma verdadeira torção do positivismo jurídico, sendo que a
autolimitação do Estado, codificada pela escola organicista alemã e pela tradição
italiana, assume a forma de um Estado nacional que transcende a vida de cada
individuo e de sua liberdade. O conceito de nação, associado a uma ideia de
Estado autoritário, dotado de um poder executivo depositário e órgão de todas as
funções do Estado genericamente consideradas, termina por negar tanto a
tradição liberal democrática quanto o socialismo.
Em um dos textos básicos sobre o nacionalismo italiano (ROCCO, 1914),
Rocco expõe os princípios da doutrina nacionalista italiana. O limite fundamental
do liberalismo – assim como do socialismo, que a seu ver, possui a mesma raiz
individualista – está na garantia dos direitos individuais, enquanto que para o
nacionalismo o princípio fundamental reside na ideia que o individuo vive e se
realiza em sua nação, entendida como uma sociedade dotada de existência
transcendente.
Nesta visão, conciliam-se idealismo e positivismo. São ideias que expõem
claramente as bases da ideologia nacionalista, que tende ao fascismo totalitário: a
organização das massas no Estado-nação. As massas emersas na história são
amorfas. Devem ser enquadradas dentro de organismos com fins superiores aos
dos singulares componentes e isto pode ser obtido, somente, através de uma
atividade de paciente organização (nação, sociedade, Estado), onde há uma fusão
total entre a nação e o Estado. Esta é a moldura filosófico-jurídica sobre a qual se
fundamenta o modelo italiano consagrado pela lei de 3 de abril de 1926 “Sobre a
disciplina jurídica das relações coletivas do trabalho”, pela criação do ministério
das Corporações, e pela “Carta del lavoro”, o manifesto programático do projeto
corporativo fascista.
O próprio Rocco ilustrava a arquitetura jurídica das novas relações entre
capital e trabalho: reconhecimento jurídico dos sindicatos, concentração da
representação das categorias num só sindicato, disciplina dos contratos coletivos
estipulados por este sindicato com defesa erga omnes, instituição da magistratura
do trabalho e, finalmente, proibição de greve e bloqueios, punidos como crime
(ROCCO, 2005, p. 311).
De acordo com um trabalho recente (GAGLIARDI, 2010, p. 38), a grande
novidade (e ao mesmo tempo o sentido mais profundo) da lei Rocco foi a
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Neste sentido, Vargas tentava uma conciliação entre a sua visão positivista e
castilhista do indivíduo totalmente absorvido no coletivo e o primeiro modelo de
Estado Nacional que enfrentava a questão social de forma autoritária. Acima de
tudo estava a ideia do superior interesse do Estado (Artigo I da “Carta del lavoro”).
Cabe ressaltar que, nesta organização totalitária do Estado-nação, os
sindicatos não são livres, mas apenas ferramentas criadas para
organizar o trabalho em todas as suas manifestações.
No plano teórico encontramos esse princípio do sindicalismo nacional bem
desenvolvido em Problemas de Política Objetiva (1930) de Vianna, um dos
maiores pensadores do autoritarismo brasileiro. Neste trabalho, um verdadeiro
divisor de águas entre a sua produção dos anos vinte e aquela dos anos trinta,
Vianna, talvez o principal teórico da via brasileira para o Estado corporativo,
encontra inspiração no filósofo do direito italiano Sergio Panunzio (O sentimento
do Estado, 1929). O conceito-chave do livro de Panunzio é o “sindicalismo
nacional”, nascido do encontro entre a teoria orgânica da sociedade de Durkheim
(a divisão do trabalho social), o sindicalismo integral de Georges Sorel e a
valorização do conceito de trabalho em todas as suas articulações no Estado
nacional.
A originalidade política e social do fascismo residia, portanto, na fusão do
sindicalismo e do nacionalismo. E Vianna, ciente de que as formas típicas de
estruturação da sociedade brasileira estavam mudando sob o impulso da
modernização dos anos 1920, assimila pela leitura de Panunzio o conceito de
organização nacional, que será um dos pilares durante o período em que presta
consultoria para o Ministério do Trabalho.
Do encontro com o fascismo, estudado por meio do estado sindical
corporativo de Panunzio, o autoritarismo de Vianna recebe uma nova base teórica
para resolver a crise do Estado liberal, reduzido a um centro de relações políticas
vazias, longe das forças sociais, simples garantia da coexistência interindividual,
sem meios para enfrentar o problema do governo da sociedade de massa.
Também sob o aspecto mais prático, os conceitos de “superior interesse da
nação”, “sindicalismo nacional” e “colaboração entre as classes” exerceram
profunda influência após a Revolução de 1930. No discurso do Rotary Club
(ocorrido em dezembro de 1930), o Ministro do Trabalho, Lindolfo Collor,
argumentava que:
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imprescindível necessidade de enquadrar no Brasil o fenômeno da organização
coletiva dos interesses e do conflito capital/trabalho, assim como estava
acontecendo no plano internacional.
Ficava claro, portanto, que os problemas jurídicos tornaram-se problemas
de “categoria”. Após a crise do liberalismo, o Estado contemporâneo estava
retomando todas as suas prerrogativas – governo, poder e corporativismo – para
organizar o fenômeno moderno das “pluralidades coligadas” em uma catalogação
total do “social” baseada nas “categorias”, dando continuidade à tradição do ius
positum e ultrapassando o férreo modelo totalitário italiano.
Por fim, não nos parece muito produtivo retomar as trinta declarações da
“Carta del lavoro”, comparando-as com os artigos nº. 136-140 da Constituição do
Estado Novo (de 1937), ou com o decreto lei n° 1237 (de 1939, que organiza a
justiça do trabalho) ou ainda com o decreto n° 1402 (também de 1939, que
institui o sindicato único) para comprovar a tese da cópia, porque o próprio
fascismo italiano se apropriou de forma original do debate francês e alemão sobre
o Estado social, a questão da “democracia social” e a teoria jurídica do contrato
coletivo de trabalho.
O que nos interessa é entender como e em que medida as ideias de
fascismo e corporativismo foram incorporadas aos processos de ruptura da ordem
liberal da Primeira República e contribuíram para a formação do Estado brasileiro
contemporâneo durante a “Era Vargas”.
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Estado corporativo como modelo estatal, visto como uma possibilidade de impor
ordem à crise do capitalismo e à crise do Estado liberal, sem necessariamente cair
no totalitarismo fascista.
Ao lado da “questão social”, que constitui o leitmotiv da revista ao longo da
sua existência, o tema central enfocado para o recorte 1937-1944 é o problema da
introdução do princípio fascista do poder normativo da magistratura do trabalho.
Essa foi a principal acusação do jurista Waldemar Ferreira à Oliveira Vianna. Sobre
o assunto, a revista toma uma posição bem firme em defesa da justiça do trabalho
como corolário da grande obra social da revolução de 1930. O outro grande tema
é o decreto-lei n°.1.402 que institui o sindicato único. Aqui os artigos da revista
defendem a originalidade do modelo sindical brasileiro, mistura harmoniosa dos
Direitos privado e público.
Precisamos então ver como estes juristas, durante os anos 1930, adaptam o
modelo corporativo fascista, criado por A. Rocco, à realidade brasileira. A maioria
dos textos utiliza o léxico e as argumentações reelaboradas pela principal literatura
jurídica fascista da época. Desde os primeiros artigos, o tom da autodefesa frente à
acusação de ter copiado o fascismo é presente. Nele percebe-se uma hábil e fina
tentativa de desenganchar o corporativismo e o sindicato do férreo modelo do
Partido-Estado totalitário fascista (PIMENTA, 1934, p. 15-17), levando o discurso
no âmbito da relação entre a tradição jurídica e o novo Direito corporativo, que se
afirmou em consequência da imprescindível necessidade de colher o fenômeno
da organização coletiva dos interesses e do conflito capital-trabalho a nível
internacional e, portanto, não limitado ao caso do fascismo italiano (VIANNA,
1933, p. 13).
Com base nas melhores contribuições da ciência jurídica italiana
(CARNELUTTI, 1927; RANELLETTI, 1937), este pessoal mostra como o modelo
corporativo quer resolver, no mesmo jeito do modelo liberal no século XIX, o
problema da ordem social no século XX, indo além das fronteiras da tradicional
lógica dicotômica: ou privado ou público, ou lei ou contrato.
Se a Primeira guerra mundial havia declarado o fim da velha ordem do
século XIX, o novus ordo do século XX, caracterizado pela ampliação das forças
sociais e dos grupos de interesse, necessitava de uma reconsideração completa das
modalidades da relação entre indivíduo, sociedade e Estado. Mas se o modelo de
corporativismo teorizado na “Revista do trabalho” recalca em boa medida o
modelo corporativo da “lei Rocco” e da “Carta del lavoro”, como os juristas
colaboradores da legislação social varguista podem sair do impasse de “imitar”
uma organização corporativa estatal, que nas intenções explícitas de seu criador A.
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conflito individual do trabalho no plano do conflito coletivo, entendido como
aglomeração de uma série homogênea de conflitos individuais (CARNELUTTI,
1927, p. 43; VIANNA, 1938, p. 150). A ideia baseia-se no princípio de interesse de
categoria. Para Carnelutti, o interesse coletivo não se distingue pelo interesse dos
trabalhadores. Logo, a grandeza da lei de 1926 está no fato de ter harmonizado
pacificamente a sociedade. Esse é seu juízo:
CONCLUSÕES
A nossa tese é que o fascismo atualizou o autoritarismo brasileiro, em
busca de um novo modelo de ordem social e de organização dos processos de
modernização que estavam atravessando o Brasil entre o final dos anos 1920 e os
anos 1930. Nesta perspectiva, podemos concluir dizendo que a “Era Vargas” foi
essencialmente uma “modernização autoritária”, disponível, porém, para receber
elementos totalitários, entre os quais o modelo corporativo fascista de Alfredo
Rocco foi um dos mais importantes. Foi então uma apropriação criativa dentro de
um contexto histórico diferente daquele da Itália fascista da época.
Com base no modelo italiano, desde a Revolução de 1930, Vargas e os
arquitetos da legislação trabalhista montaram de forma original a “via brasileira
para o estado autoritário de cunho corporativo”, na qual se entrelaçam várias
dimensões, inspiradas pelo "corporativismo puro e integral" de M. Manoilescu: a
dimensão econômica. O corporativismo como uma "terceira via" para responder
eficazmente à crise capitalista de 1929, através da intervenção do Estado na
economia, com uma perspectiva necessariamente nacionalista-desenvolvimentista
e industrialista, com o objetivo de quebrar a dependência do mercado
internacional. A dimensão ideológico-política. O corporativismo como momento
de máxima expressão do Estado autoritário, surgido para nacionalizar as massas
amorfas e sem educação. Para a direita nacionalista e autoritária brasileira, o
Estado corporativo era o modelo mais “adequado” para resolver o problema da
distância entre o Brasil cristalizado na Constituição de 1891 e o Brasil real,
lidando com a pobreza, a ignorância, a falta de cultura política e de educação. A
dimensão social. O Estado corporativo como resposta preventiva para o perigo de
uma revolução comunista no Brasil. Nesta perspectiva, era necessário neutralizar
o conflito de classes que, inevitavelmente, surgiu a partir do processo de
industrialização, como aconteceu nos países mais avançados, incorporando o
sindicato no Estado em troca de uma legislação protetora do trabalho, para dar
uma nova representação social em nome da solidariedade, da reconciliação e da
harmonia entre as classes.
Ao mesmo tempo foi, como vimos, uma longa e complexa incorporação da
“Carta del lavoro”, separada do rígido contexto do partido-estado totalitário, em
uma extensa legislação social, concebida à luz da nova dimensão do coletivo e
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focada na ideologia do “trabalhismo”, personificada pela figura benevolente de
Getúlio Vargas como "pai dos pobres".
Por estas razões, enfim, é extremamente simplificador falar de uma "cópia"
do corporativismo fascista, porque se é verdade que a estrutura básica do modelo
sindical brasileiro foi o sindicalismo corporativo italiano, é também verdade que o
estadismo dirigista de Rocco foi adaptado de forma específica para o nacional
desenvolvimento industrialista de cunho autoritário no Brasil, que garantiu
também alguns direitos fundamentais, ao passo que as leis anteriores em matéria
de proteção do trabalho eram poucas e atrasadas.
REFERÊNCIAS
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