Nothing Special   »   [go: up one dir, main page]

ISLA - Declaração Universal Dos Direitos Humanos Do Islã PDF

Fazer download em pdf ou txt
Fazer download em pdf ou txt
Você está na página 1de 24

A Universalidade dos Direitos Humanos no

Mundo Muçulmano
Hidemberg Alves da Frota∗

Resumo: Este trabalho se debruça sobre polêmicas atuais


concernentes aos direitos humanos no mundo islamita. Averigua-se
tanto a repercussão na comunidade islâmica da Declaração Universal
dos Direitos Humanos, de 1948, quanto a mais atual formulação
muçulmana do Direito Internacional dos Direitos Humanos, plasmada
na Declaração do Cairo sobre os Direitos Humanos no Islã, de 1990.
Medita-se, ainda, acerca da liberdade religiosa nos Estados de maioria
muçulmana e se aventa o federalismo comunitário como modo de
aprimorar a deferência aos direitos humanos em países de maioria
islâmica onde alastram se conflitos étnico-religiosos.

Introdução
Este texto esquadrinha questões essenciais envolvendo os direitos
humanos no mundo islâmico da atualidade.
Perscrutam-se os aspectos favoráveis e desfavoráveis à eficácia da
Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948, na comunidade
islâmica internacional, discutindo-se ainda, a legitimidade no mundo
muçulmano da proposta universalista da DUDH e seus pontos de
convergência e divergência com a cultura islamita.
Coteja-se o conteúdo dessa Declaração da ONU com o teor da
Declaração do Cairo sobre os Direitos Humanos no Islã de 1990, além
de se comparar o contexto histórico no qual ambas floresceram e se

∗ Bacharel em Direito pelo Centro Universitário de Ensino Superior do Amazonas,


CIESA.
Dedico este artigo ao Prof. J. M. Othon Sidou, pelas entusiasmadas lições de
Direito Comparado, pela firme convicção de que o Direito possui princípios gerais
universais e por defender a unicidade jurídica universal.

43 Alves da Frota.indd 55 7/4/06 10:52:24 AM


56 Revista IIDH [Vol. 43

destrinchar as fontes jurídicas que inspiraram a elaboração dos atos


internacionais em debate.
Analisa-se o respeito à liberdade de religião e correlatas nos 44
Estados nacionais de maioria islamita, ao se estudar o disposto em suas
respectivas ordens constitucionais, inclusive o feitio religioso ou laico
de tais aparelhos estatais.
E propõe-se o federalismo comunitário como meio de nações
de maioria islâmica, marcada por históricos embates de intolerância
étnico-religiosa, se transformarem em países mais arejados para a
promoção dos direitos humanos e a reconciliação nacional.

1. O Debate em torno do Discurso Universalista da


Declaração Universal dos Direitos Humanos
Adotada e proclamada pela Resolução nº 217 A (III) da  Assembléia
Geral das Nações Unidas em 10 de dezembro de 1948, a Declaração
Universal dos Direitos Humanos, DUDH, tem sua legitimidade
questionada no mundo muçulmano, nomeada a partir da Revolução
Islâmica do Irã em 1979, que derrubou a monarquia pró-Ocidente do
Xá Reza Pahlevi e instaurou República islâmica com contornos de
teocracia de orientação xiita.
Membros mais conservadores da comunidade muçulmana mundial
passaram a pôr em xeque de forma mais vigorosa a “validade
transcultural” de normas contidas na DUDH que ressoam princípios
sedimentados no Direito ocidental, todavia estranhos ao Direito
muçulmano (Shari’a) e à tradição islamita, a começar pela liberdade
religiosa (Art. 18) –que implica a separação entre o Estado e o clero,
autoridade secular e religiosa– e pela liberdade de matrimônio (Art.
16). O exercício de tais liberdades concederia ao ser humano grau de

 Organização das Nações Unidas. Declaração Universal dos Direitos Humanos


(1948). Disponível em: http://www.mj.gov.br. Acesso em: 17 set. 2004.
 Ignatieff, Michael. “The attack on human rights”. Foreign Affairs, New York, v.
80, nº 6, nov.-dec. 2001, p. 103.
 Ibid., tradução nossa.
 Serajzadeh, Seyed Hossein. “Islam and crime: the moral community of muslims”.
Journal of Arabic and Islamic Studies, Bergen, v. 4, jan. 2001-dec. 2002, p.
121.
 Ignatieff, Michael. Op. cit., p. 103.
 Organização das Nações Unidas. Declaração Universal dos Direitos Humanos
(1948). Disponível em: http://www.mj.gov.br. Acesso em: 17 set. 2004.

43 Alves da Frota.indd 56 7/4/06 10:52:25 AM


2006] Revista IIDH 57

discricionariedade pessoal blasfemo na ótica do Alcorão e o discurso


da universalidade dos direitos humanos à moda ocidental teria como
substrato a ideologia materialista do capitalismo globalizado.
Não se trata de posicionamento uníssono no mundo islâmico. Em
países norte-africanos integrados à economia global e com classe
média considerável, a opinião pública se revela mais aberta a valores
ocidentais. Setores relevantes da sociedade egípcia, por exemplo,
tendem a enxergar com relativa parcimônia o direito feminino ao
divórcio10. Não obstante, no Sudeste Asiático nações muçulmanas com
economias de mercado –a exemplo da Malásia– repelem os direitos
humanos à moda ocidental em nome da primazia dos interesses da
família e da coletividade, sobre o materialismo individualista11.
Em contraponto, avulta-se nova maneira de vislumbrar a
universalidade da Declaração Universal dos Direitos Humanos: embora
não goze de aceitação universal, traz em seu bojo direitos universais,
que têm como destinatários precípuos os hipossuficientes, aqueles cuja
esfera de autonomia individual se vê tolhida por poderosas autoridades
estatais, tribais, religiosas e familiares12. Em todo o globo, os direitos
humanos à moda ocidental, ofereceriam meios de se harmonizem os
interesses sociais e individuais, com o fito de que aqueles não aniquilem
estes13.
Não representariam adesão à civilização ocidental e sim, a
indispensável proteção da integridade pessoal ante excessos do
comportamento alheio, inclusive do corpo social (v.g., clamor das
mulheres do meio rural paquistanês contra o queima de esposas
desobedientes), e a melhor integração do ser humano em sua sociedade
(e.g., reclamações de mulheres afegãs a organismos internacionais, em
prol de haver no Afeganistão, à época do regime talibã, a possibilidade

 Ignatieff, Michael. Op. cit., p. 104.


 Ibid., p. 111.
 Ibid., p. 104.
10 Ibid., loc. cit.
11 Ibid., p. 105.
12 Ibid., p. 109.
13 Ibid., p. 110.

43 Alves da Frota.indd 57 7/4/06 10:52:26 AM


58 Revista IIDH [Vol. 43

das mulheres conjugarem o culto às tradições locais com o acesso a


serviços profissionalizados de educação e saúde)14.
A reverência aos direitos humanos irradiados pela DUDH,
significaria proporcionar vazão aos anseios da população posta
na base da pirâmide social15, de influir na cultura e nos rumos da
sociedade16.
Ainda como contra-argumento, recorda-se a militância em benefício
dos direitos humanos, à moda ocidental, feita por organizações
internacionais não-governamentais (ONG), contra interesses de vultosas
empresas multinacionais, a exemplo das ONG, que lutam pelo respeito
aos direitos trabalhistas de empregados da Nike e da Royal Dutch/Shell
em países subdesenvolvidos17.

2. Os Antecedentes da Declaração Universal dos Direitos


Humanos e da Declaração do Cairo, sobre os Direitos
Humanos no Islã
Após a Segunda Guerra Mundial, a Declaração Universal dos
Direitos Humanos da ONU de 1948, recendeu na cena internacional,
a promoção dos direitos individuais (civis e políticos) herdados do
constitucionalismo ocidental da alvorada do Estado Liberal de Direito,
que, no final do século XVIII, na esteira das Revoluções Americana de
1776 e Francesa, de 1789, gerou diplomas constitucionais antológicos
(respectivamente, a Constituição dos Estados Unidos de 1787, e a
Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789)18. Também
regurgitou o contributo do parlamentarismo britânico, inserto na
Carta Magna de 1215, e na Carta de Direitos (Bill of Rights), de
1689 (“documentos de natureza materialmente constitucional”19).

14 Ibid., p. 110-111.
15 Ibid., p. 112.
16 Ibid., p. 113.
17 Ibid., p. 111-112.
18 Morrison, Heidi. Beyond universalism. Muslim World Journal of Human Rights,
Berkeley, v. 1, nº 1, jan.-dec. 2004, p. 1-2.
19 Pinheiro, Luís Felipe Valerim. “O devido processo legal e o processo
administrativo”. Fórum Administrativo: Direito Público. Belo Horizonte, ano
2, n. 20, out. 2002, p. 1.324.

43 Alves da Frota.indd 58 7/4/06 10:52:26 AM


2006] Revista IIDH 59

Seguiu ainda, os passos dos movimentos missionários oitocentistas


antiescravagistas e pró-sufrágio universal20.
Dentre as apontadas raízes históricas da DUDH, enfatizam-se dois
legados de suma importância:
1. Da Constituição estadunidense e da Declaração Francesa dos
Direitos Humanos, em face de ambas aclararem que “todos os
homens são seres humanos”21 e fazem jus a direitos políticos22.
Examinando-se Emendas à Carta Constitucional dos EUA, sublinha-
se seja a extensão a todos os seres humanos do devido processo legal
(Emenda V), seja a proibição de escravidão (Emenda XIII, seção 1,
1ª parte) e de obstar-se o direito a voto com base em critérios raciais
(Emenda XV, seção 1). No Diploma Maior da Revolução Francesa,
ressalta-se a concepção de que todos os homens tanto nascem (e
devem ser) livres, quanto possuem direitos iguais (Art. 1º, 1ª parte),
inclusive políticos, em se tratando de cidadãos (Art. 6º);
2. E dos missionários cristãos do século XIX, pioneiros em
materializarem a filosofia da solidariedade a estranhos e em
cultivarem a idéia de que todos temos alma e, em conseqüência,
todos somos humanos23.
Emergindo em uma ordem internacional sob os escombros da
recém-terminada Segunda Guerra Mundial, a Declaração Universal
dos Direitos Humanos da ONU almejou fortalecer o Direito Natural de
maneira a precaver a humanidade contra experiências similares ao do
nazifascismo, em que o Direito Positivo, agasalhou arbitrariedades do
Poder Público24. O Código Penal italiano de 1930 (“Código Rocco”)
considerava “delito contra a personalidade do Estado injuriar ‘a honra
ou o prestígio do chefe de governo’ (Art. 282)”25. Em 1935 o princípio
da legalidade foi extirpado do Código Penal alemão, cujo Art. 2º passou
a prescrever a punição de quem “comete um ato que a lei declara

20 Morrison, Heidi. Op. cit., p. 1.


21 Ibid., p. 2, tradução nossa.
22 Ibid., p. 2.
23 Morrison, Heidi. Op. cit., p. 2.
24 Ibid., loc. cit.
25 Zaffaroni, Eugenio Raúl; Pierangeli, José Henrique. Manual de direito penal
brasileiro: parte geral. 3. ed. São Paulo: RT, 2001, p. 333.

43 Alves da Frota.indd 59 7/4/06 10:52:27 AM


60 Revista IIDH [Vol. 43

punível ou que, conforme a idéia fundamental de uma lei penal e ao


sentimento do povo, merece ser punido”26.
Já a Declaração do Cairo sobre os Direitos Humanos no Islã, de
1990, foi precedida pela desilusão de setores da comunidade muçulmana
com o Ocidente e pelo ressurgimento dos movimentos islâmicos
conservadores, ambos resultados, quer da busca pela preservação da
identidade islamita em meio aos embates ideológicos da Guerra Fria
entre os Estados Unidos e a União Soviética, quer da derrota árabe (do
Egito, Jordânia e Síria) para Israel na Guerra Árabe-Israelita de 1967, a
nominada Guerra dos Seis Dias ou Guerra de Junho (ao cabo da qual,
Israel assumiu o controle da Península do Sinai da Faixa de Gaza, das
Colinas do Golã, da Cisjordânia e anexou Jerusalém Oriental)27, cujos
reflexos jurídicos, antes de se fazerem presentes na Declaração do
Cairo, de 1990, manifestaram-se no aparecimento da Constituição da
República Islâmica do Irã, de 1979, e da Declaração Universal Islâmica
dos Direitos Humanos, DUIDH, de 198128.
A atual Constituição iraniana fundou a República Islâmica no
senso de justiça corânico (Art. 1º), submeteu o Direito Legislado aos
comandos de Deus (Art. 2º [1], [2] e [4]) e sujeitou todo o ordenamento
jurídico irânico aos critérios do Islã, inclusive matérias civil, penal,
financeira, econômica, administrativa, cultural, militar e política (Art.
4º).
Apesar de terem sido reconhecidas como minorias religiosas apenas
as comunidades zoroástrica, judaica e cristã do Irã (Art. 1329), a
Constituição iraniana de 1979, em relação aos não-muçulmanos que se
abstêm de atuarem contra o Islã e a República Islâmica do Irã, positivou
o dever desta e de todos os muçulmanos de serem tanto tratados de
acordo com as normas éticas e os princípios de justiça e eqüidade
islâmicos, quanto respeitarem seus direitos humanos (Art. 1430).
Estipulou a inviolabilidade da dignidade, da vida, da propriedade,
dos direitos, da residência e da ocupação do indivíduo, salvo nos casos

26 Ibid., p. 335.
27 Heritage, Andrew; Cavanagh, Louise. Enciclopédia Geográfica Universal. Rio
de Janeiro, Globo, 1995, v. 5, p. 306-307; Preece, Warren E. (Ed.). The New
Encyclopaedia Britannica Macropaedia. Chicago, 15th ed., 1980, v. 9, p. 774-
775.
28 Morrison, Heidi. Op. cit., p. 13.
29 Ibid., loc. cit.
30 Ibid., loc. cit.

43 Alves da Frota.indd 60 7/4/06 10:52:28 AM


2006] Revista IIDH 61

previstos em lei (Art. 22). Proibiu investigações sobre as crenças do ser


humano ou punições em função de se esposar determinada crença (Art.
23). Restringiu a liberdade de expressão da imprensa se, nos termos da
lei, evidencia-se detrimentosa aos princípios fundamentais do Islã e aos
direitos do público (Art. 24).
Dentre as normas entalhadas na atual Constituição do Irã,
sobressaem estas quatro:
1. O princípio comunitário (Art. 8º31) extraído do início do versículo
71 da 9ª Surata do Alcorão, segundo o qual “os fiéis e as fiéis são
protetores uns dos outros; recomendam o bem, proíbem o ilícito”32,
além de consubstanciar dever universal e recíproco, aplica-se ao
povo e ao governo e às relações estabelecidas entre ambos;
2. O princípio da independência (Art. 9º), a indissociação da liberdade,
a independência, a unidade e a integridade territorial do Irã,
constitui norma obrigatória para o governo e os cidadãos iranianos
e veta qualquer indivíduo, grupo ou autoridade de, a pretexto de
exercer dada liberdade, maltratar a independência (política, cultural,
econômica e militar) e a integridade territorial do Irã, como também
proíbe qualquer autoridade de ab-rogar liberdades legítimas, a fim
de garantir a independência e a integridade territorial nacional;
3. O princípio da família (Art. 10), que ve na família a unidade
fundamental da sociedade islâmica e atribui às leis, regulamentos
e programas pertinentes a finalidade de facilitarem a formação da
família e salvaguardarem sua santidade e a estabilidade das relações
familiares, com base nas normas do Islã;
4. O princípio da unidade do Islã (Art. 11), que marca o versículo
92 da 21ª Surata 33, –“Esta vossa comunidade é a comunidade
única e Eu sou o vosso Senhor. Adorai-Me portanto (e a nenhum
outro)!”–, preconiza a existência de uma única nação para todos os
muçulmanos e marca como encargo da República Islâmica do Irã
formular políticas gerais voltadas a cultivar a amizade e a unidade
entre todos os islâmicos e se empenhar na construção da unidade
política, econômica e cultural no mundo islamita.

31 Ibid., loc. cit.


32 Alcorão. Disponível em: http://www.culturabrasil.org/alcorao.htm. Acesso em:
30 abr. 2005.
33 Alcorão. Disponível em: http://www.culturabrasil.org/alcorao.htm. Acesso em:
30 abr. 2005.

43 Alves da Frota.indd 61 7/4/06 10:52:28 AM


62 Revista IIDH [Vol. 43

Assinado por Salem Azzam, à época Secretário-Geral do Conselho


Islâmico, o prefácio da Declaração Islâmica Universal dos Direitos
Humanos de 1981, percebe que em Deus reside o pólo irradiador dos
direitos humanos, a conferir honra e dignidade à humanidade e a
eliminar exploração, opressão e injustiça34.
A Declaração Universal Islâmica dos Direitos Humanos, cujo campo
de incidência abarca todos os homens e mulheres da comunidade
islâmica mundial (Ummah Islamia), reverbera os direitos humanos
revelados por Deus por meio do Direito muçulmano (Shari’a) e os
deveres a eles correspondentes, esclarecem as Notas Explicativas do
mencionado ato internacional, em seus itens 1 e 235.
Do ponto de vista da DUIDH, os direitos humanos se condicionam
aos contornos delineados pelo Shari’a e deste, dimamizam o
fundamento para a condenação criminal do indivíduo (Art. 5º, alínea
“d”), o tratamento justo e generoso a ser conferido aos trabalhadores
(Art. 17), o direito e o dever de se socorrer dos dispositivos legais
para a defesa contra lesões ou danos pessoais injustificados (Art. 4º,
alínea “b”, 2ª parte), o direito à vida, à integridade física e à liberdade
lato sensu (Arts. 1º e 2º, gênero no qual se encartam as liberdades
física, cultural, econômica e política, Art. 2º, alínea “b”, incluindo-se
a liberdade de crença, pensamento, expressão, Art. 12, alínea “a”, 1ª
parte; informação, Art. 12, alínea “d”; residência e locomoção, Art. 23,
alínea “b”) e a moldura a que se circunscrevem os direitos à subsistência
(Art. 15, alínea “b”), ao exercício de atividades econômicas (Art. 15,
alínea “g”), à distribuição de renda (Art. 15, alínea “d”), ao casamento,
a constituir família e a criar os filhos em sintonia com sua religião,
tradição e cultura (Art. 19, alínea “a”), além dos direitos da esposa viver
na residência onde mora o marido (Art. 20, alínea “a”), ser municiada
de meios de subsistência não-inferiores ao do marido (inclusive
enquanto aguarda o divórcio, Art. 20, alínea “b”), ao divórcio (Art. 20,
alínea “c”), à herança (Art. 20, alínea “d”) e à confidencialidade das
informações do conhecimento do marido ou ex-marido, cuja revelação
seja deletéria aos interesses da esposa ou ex-esposa (dever equivalente

34 Conselho Islâmico. Universal Islamic Declaration of Human Rights. Disponível


em: http://www.alhewar.com. Acesso em: 26 abr. 2005.
35 Ibid., loc. cit.

43 Alves da Frota.indd 62 7/4/06 10:52:29 AM


2006] Revista IIDH 63

possui a consorte ou ex-consorte em relação ao esposo ou ex-esposo,


Art. 20, alínea “e”).
A DUIDH reverencia os interesses comunitários ao abranger, seja
o direito e dever de cada indivíduo de lutar pelo respeito aos direitos
de quaisquer outras pessoas e os da comunidade (Art. 4º, alínea “c”),
seja a proibição das atividades econômicas e dos meios de produção
que contrariarem os interesses da comunidade (Art. 15, alíneas “e” e
“g”).
Por outro lado, a DUIDH ressalta o dever da comunidade, quer seja
de fomentar condições para o pleno desenvolvimento da personalidade
humana (Art. 14, alínea “b”), quer seja de assistir pessoas temporária
ou permanentemente incapacitadas (Art. 18, 2ª parte).
No tocante ao direito à (e ao dever de) resistência, a Declaração
Universal Islâmica dos Direitos Humanos agasalha não só o direito a (e
o dever de) desobedecer a comandos afrontosos ao Direito muçulmano
(Art. 4º, “e”), como também o direito a (e o dever de) protestar e lutar
contra a opressão, mesmo se procedente de altas autoridades estatais
(Art. 12, alínea “c”).
Por outro lado, a DUIDH ressalta o dever da comunidade, quer seja
fomentar condições para o pleno desenvolvimento da personalidade
humana (Art. 14, alínea “b”), quer seja assistir pessoas temporária ou
permanentemente incapacitadas (Art. 18, 2ª parte).
No tocante ao direito à (e ao dever de) resistência, a Declaração
Universal Islâmica dos Direitos Humanos agasalha não só o direito a (e
o dever de) desobedecer a comandos afrontosos ao Direito muçulmano
(Art. 4º, “e”), como também o direito a (e o dever de) protestar e lutar
contra a opressão, mesmo se emanada de altas autoridades estatais
(Art. 12, alínea “c”).

3. O Cotejamento entre a Declaração Universal dos


Direitos Humanos e a Declaração do Cairo sobre os
Direitos Humanos no Islã
3.1 Direito à igualdade e ao devido processo legal
A Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948, da
Assembléia Geral das Nações Unidas, esclarece que todas as pessoas
nascem livres e iguais em dignidade e direitos (Art. 1º, 1ª parte), têm
capacidade para gozar os direitos e as liberdades nela estabelecidos,

43 Alves da Frota.indd 63 7/4/06 10:52:29 AM


64 Revista IIDH [Vol. 43

sem quaisquer discriminações (v.g., raça, cor, sexo, língua, religião,


opinião, origem nacional ou social, riqueza e nascimento, Art. 2º).
Emoldurada pelo Direito muçulmano (Art. 24), à luz da qual
deve ser interpretada (Art. 25), a Declaração do Cairo sobre Direitos
Humanos no Islã de 1990, da 19ª Conferência Islâmica dos Ministros
das Relações Exteriores, estipula que todos os seres humanos formam
família única, subordinada a Alá e descendente de Adão (Art. 1º [a], 1ª
parte), que todos os homens são iguais em termos de dignidade humana,
direitos e obrigações básicos, sem quaisquer discriminações (e.g., raça,
cor, língua, crença, sexo, religião, filiação política e status social, Art. 1º
[a], 2ª parte), que a religião verdadeira (o islamismo) assegura o alcance
de tal dignidade essencial e da integração da humanidade (Art. 1º [a],
in fine) e que os seres humanos mais amados por Alá são aqueles mais
benéficos a Seus súditos e ninguém é superior a ninguém, salvo quanto
ao grau de piedade e boas ações.
A Declaração da ONU de 1948, reconhece para todos o direito
de serem em todos os lugares, pessoas perante a lei (Art. 6º),
receberem tributos nacionais aptos a remediar o menosprezo a direitos
fundamentais (tenham estes amparo constitucional ou apenas legal,
Art. 8º) e auferirem da lei de proteção e tratamento igualitário (sem
distinção alguma, Art. 7º), em andamento de devido processo legal
material e formal, o que importa seja efetuarem-se de maneira não-
arbitrária prisões (Art. 9º), exílios (Art. 9º), desapropriações (Art.
17 [2]) e mitigações ao direito à nacionalidade (Art. 15 [2]), seja
haver audiências justas e públicas perante tribunais independentes e
imparciais (Art. 10), respeitados o estado (ou a presunção) de inocência
e a ampla defesa (Art. 11 [1]), vetados tanto imputar-se delito imprevisto
no direito nacional ou internacional, como impor-se pena mais forte
do que aquela que, no momento da prática, era aplicável ao ato
delituoso, assim como tortura, tratamento ou castigo cruel, desumano
ou degradante (Art. 5º).
A Declaração Islâmica de 1990 assegura a todos, sem distinções
entre soberano e súdito, a igualdade perante a lei (Art. 19 [a]) e acesso
à Justiça (Art. 19 [b]), a responsabilidade essencialmente pessoal (Art.
19 [c]), o estado (ou a presunção) de inocência e o julgamento rápido
(franqueadas as garantias de defesa, Art. 19 [e]) e a proibição de crimes
e punições desprovidas de apoio no Shari’a (Art. 19 [d]), de sanções e
restrições à liberdade, carentes de legitimidade, de maus-tratos físicos
e psíquicos, de experimentos médicos e científicos sem consentimento
ou prejudiciais à saúde ou à vida e de medidas estatais executórias de

43 Alves da Frota.indd 64 7/4/06 10:52:30 AM


2006] Revista IIDH 65

caráter emergencial a incidirem em quaisquer dos aludidos vetos (Art.


20). Proscreve ainda, todas as modalidades de seqüestro (Art. 21) e a
desapropriação ilegal (Art. 15 [b]) desprovida do sinete do interesse
público e da pronta e justa indenização (Art. 15 [a]).

3.2 Direito às liberdades civis, à vida privada e à


vida familiar
A Declaração da ONU de 1948 se posiciona contra a escravidão, o
tráfico escravagista e a servidão (Art. 4º). Confere a todas as pessoas, o
direito à vida (Art. 3º), à liberdade (Art. 3º), à segurança pessoal (Art.
3º) e à nacionalidade (Art. 15 [1]). Protege a vida privada de intrusões
e a honra de ataques (Art. 12). Alberga a liberdade de locomoção e
residência dentro das fronteiras estatais (Art. 13 [1]), o direito de asilo
(salvo em caso da prática de crimes comuns ou infringência a propósitos
e princípios das Nações Unidas, Art. 14) e de deixar (e regressar a)
qualquer país (Art. 13 [2]). Acolhe as liberdades de pensamento (Art.
18), consciência (Art. 18), religião (Art. 18), opinião (Art. 19), expressão
(Art. 19), reunião (Art. 20 [1]) e associação pacíficas (Art. 20 [1]; no
entanto, é contra obrigar-se alguém a fazer parte de uma associação,
Art. 20 [2]). Preceitua o direito ao matrimônio e de fundar família,
mediante livre escolha dos nubentes e direitos iguais entre homens e
mulheres, sem quaisquer discriminações (Art. 16).
A Declaração Islâmica de 1990 encerra em suas fileiras, o direito à
vida de todos os seres humanos, vê nele dom divino a ser salvaguardado
pelos indivíduos, sociedades e Estados (salvo as exceções contidas
no Shari’a, Art. 2º [a]), proíbe o emprego de meios a propiciarem o
genocídio da humanidade (Art. 2º [b]), preconiza tanto a preservação da
vida durante o tempo permitido por Alá (Art. 2º [c]). Quanto a proteção
da integridade física pelo Estado (dispensável apenas se contar com
a chancela do Direito muçulmano, Art. 2º [d]), corrobora o direito à
segurança do indivíduo e de seus dependentes (Art. 18 [a]) e dentre os
direitos post-mortem, inclui a proteção da honra do de cujus e do seu
cadáver (e do local de sepultamento) contra profanações (Art. 4º).
A Declaração do Cairo incorpora normas de Direito Internacional
Humanitário. Exclui do alvo de conflitos armados a população não-
beligerante (v.g., homens velhos, mulheres e crianças). A feridos e
doentes, apregoa o direito a tratamento médico. A prisioneiros de
guerra, o direito a alimentos, abrigo e vestimenta. Aos mortos, o direito
de não ter o cadáver mutilado ou desmembrado. Propugna a troca de

43 Alves da Frota.indd 65 7/4/06 10:52:31 AM


66 Revista IIDH [Vol. 43

prisioneiros de guerra e visitas ou reuniões de familiares separados por


circunstâncias de guerra (Art. 3º [a]). Ainda sobre conflitos armados,
repele o corte de árvores e a destruição de plantações e granjas,
edificações e instalações civis (Art. 3º [b]).
Na ótica dessa Declaração Islâmica, todos os seres humanos nascem
livres. A ninguém é dado o direito de escravizar, humilhar, oprimir e
explorar. Submissão só existe a Alá (Art. 11 [a]). Insere o colonialismo
entre as mais maléficas formas de escravidão. Àqueles objetos do
colonialismo, reconhecem o direito de liberdade e autodeterminação.
Tem como dever dos povos de todos os Estados, apoiarem a luta dos
povos colonizados contra qualquer espécie de ocupação (Art. 11 [b]).
Abona o direito à livre residência e movimento dentre e fora do país
do indivíduo (Art. 12, 1ª parte). Para a Declaração do Cairo, o Estado
a quem se pede asilo possui o dever de concedê-lo, exceto se disser
respeito a crime capitulado no Shari’a (Art. 12, 2ª parte).
A Declaração do Cairo sobre os Direitos Humanos no Islã abraça
o exercício do direito de propriedade (Art. 18 [a] c/c Art. 15 [a]; desde
que não prejudique o proprietário, outrem e a sociedade, Art. 15 [a]),
do direito à vida privada segura (Art. 18 [b]), vendo na esfera privada,
o espaço onde se preza pela inviolabilidade do lar (Art. 18 [c]), dos
assuntos privados (Art. 18 [b]), da honra (Art. 18 [b]) e da propriedade
(Art. 18 [b]), amparando-se a família (Art. 18 [b]), os relacionamentos
privados (Art. 18 [b]) e a liberdade religiosa (Art. 18 [a]). Vislumbra
na família, a fundação da sociedade, enxerga no casamento o
alicerce da família e imuniza o exercício do direito a matrimônio, de
discriminações de raça, cor ou nacionalidade (Art. 5º [a]). Exige que
a sociedade e o Estado removam todos os obstáculos ao casamento,
facilitem-no, salvaguardem a família e seu bem-estar (Art. 5º [b]).
Equipara a mulher ao homem em dignidade, propõe ao sexo feminino
direitos, deveres e estatuto civil próprios, independência financeira,
direito a nome e à linhagem (Art. 6º [a]). Incumbe ao marido o dever
de manutenção e bem-estar familiar (Art. 6º [b]).
A DCDHI sustenta a liberdade de opinião alinhada aos princípios
islâmicos (Art. 22 [a]) e o direito de defender o correto, fazer o bem
e alertar contra o errado e o mal, observadas as normas do Direito
muçulmano (Art. 22 [a] e [1]).

43 Alves da Frota.indd 66 7/4/06 10:52:31 AM


2006] Revista IIDH 67

3.3 Direito às liberdades políticas e à democracia


A Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948, permite a
toda pessoa tomar parte no governo de seu país por meio da democracia
direta ou representativa (Art. 21 [1]), eleger seus representantes por
meio de pleitos periódicos e legítimos (por sufrágio universal, voto
secreto ou processo equivalente, assegurada a liberdade de voto, Art.
21 [3]) e ter acesso ao serviço público de sua nação (Art. 21 [2]).
A Declaração do Cairo sobre os Direitos Humanos no Islã, de
1990, proporciona a todos o direito à elegibilidade (se perdida ou
prejudicada, o eleitor pode se fazer representar por curador), em seus
direitos e deveres (Art. 8º), o direito à informação (caso não viole a
dignidade dos Profetas e valores morais e éticos, não seja maléfica à
sociedade, nem enfraqueça sua fé, muito menos instigue discriminação
racial e ódios nacionais ou doutrinários, Art. 22 [c] e [d]), o direito de
participar direta ou indiretamente na administração pública do seu país
e de assumir cargos públicos (em conformidade com o Shari´a, Art.
23 [b]) e o dever de qualquer autoridade se abster de praticar abusos
ou exploração maliciosa (Art. 23 [a]).

3.4 Direitos sociais, econômicos e culturais e o


direito ao meio ambiente sadio
A Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948, entende que
toda pessoa tem direito a padrão de vida capaz de assegurar a si e a sua
família saúde e bem-estar (inclusive alimentação, vestuário, habitação,
cuidados médicos e os serviços sociais indispensáveis) e direito à
segurança (em caso de desemprego, doença, invalidez, viuvez, velhice
ou outros casos de perda dos meios de subsistência em circunstâncias
fora de seu controle, Art. 25 [1]).
Para a Declaração de 1948, a maternidade e a infância têm direito
a cuidados e assistência especiais, de forma que todas as crianças
nascidas dentro ou fora do matrimônio, gozem da mesma proteção
social (Art. 25 [2]), que toda pessoa possua direito à instrução (gratuita,
pelo menos nos graus elementares e fundamentais, obrigatória em nível
elementar, acessível a todos no ensino técnico-profissional e superior,
este baseado no mérito, Art. 26 [1]).
Conforme dispõe a DUDH, a instrução será orientada para o
pleno desenvolvimento da personalidade humana e o fortalecimento
do respeito aos direitos humanos e às liberdades fundamentais,

43 Alves da Frota.indd 67 7/4/06 10:52:32 AM


68 Revista IIDH [Vol. 43

promovendo-se a compreensão, a tolerância e a amizade entre todas


as nações e grupos raciais ou religiosos, a coadjuvar as atividades das
Nações Unidas em prol da manutenção da paz (Art. 26 [2]). Os pais
passam a ter direito à escolha do gênero de instrução a ser ministrado
a seus filhos (Art. 26 [3]).
No sentir da DUDH, toda pessoa tem o direito de participar
livremente da vida cultural da comunidade, de fruir as artes e de
participar do processo científico e dele se beneficiar (Art. 27 [1]), o
direito à proteção dos interesses morais e materiais decorrentes de
qualquer produção científica, literária ou artística da qual seja autor
(Art. 27 [2]) e o direito a uma ordem social e internacional em que os
direitos e liberdades estabelecidos na presente Declaração possam ser
plenamente realizados (Art. 28).
A Declaração do Cairo sobre os Direitos Humanos no Islã de
1990, encarrega a sociedade e o Estado de viabilizar a busca pelo
conhecimento (Art. 9º [a], 1ª parte). Ao aparelho estatal, cabe fomentar
a educação e o interesse humano pela religião islâmica e pelos segredos
do universo (Art. 9º [a], 2ª parte). Estimula a família, as instituições
educacionais e os meios de comunicação a divulgarem, em moldes
integrados e equilibrados, o conhecimento religioso e temporal (Art. 9º
[b]). Repudia todas as formas de pressionar o ser humano ou explorar
a pobreza ou ignorância humana com vistas a convencê-lo a mudar de
religião, ou aderir ao ateísmo (Art. 10).
A DCDHI aventa a assistência médico-hospitalar e a educação
(inclusive referente à higiene e à moral) das crianças, bem como o
auxílio especial ao feto e à sua genitora (Art. 7º [a]). A educação deve
ser apropriada aos interesses e ao futuro da criança, em sintonia com
os valores éticos e os princípios do Shari’a (Art. 7º [b]). Os direitos
dos pais e dos familiares sobre as crianças, se norteiam pelos dogmas
do Direito muçulmano (Art. 7º [c]).
A Declaração do Cairo respalda o direito ao sustento legítimo
(limpo de usura, monopolização, fraude ou danos ao indivíduo que o
exercita e aos demais, Art. 14), o direito à assistência médica e social
(permitida a ajuda da sociedade e do Estado, na proporção dos recursos
disponíveis, Art. 17 [b]) e aos direitos trabalhistas fundamentais (Art.
13):
1. A sociedade e o Estado devem assegurar o direito de trabalho a
todas as pessoas aptas a trabalhar;

43 Alves da Frota.indd 68 7/4/06 10:52:32 AM


2006] Revista IIDH 69

2. Livre escolha do trabalho que melhor serve aos interesses do


trabalhador e da sociedade;
3. Benefícios da segurança do trabalho e da seguridade social;
4. Desenvolver o trabalho na medida da capacidade do trabalhador,
sem trabalho compulsório, explorativo ou danoso;
5. Concessão de promoções merecidas, bem como pagamento célere
de salários justos e retribuição pecuniária correspondente aos dias
de feriados.
A par disso, elenca o dever seja do trabalhador ser dedicado e
meticuloso (Art. 13), seja do Estado intervir na resolução dos dissídios
trabalhistas (Art. 13).
Cabe ao Estado catalisar condições de vida que contemplem as
necessidades do ser humano e de seus dependentes (inclusive no que
concerne à alimentação, vestimenta, moradia, educação e assistência
médica, Art. 17 [c]).
Em relação aos direitos culturais, a Declaração do Cairo apregoa
que todos tenham direito aos frutos do seu trabalho autoral (científico,
literário, artístico ou técnico), garantida a proteção dos seus interesses
morais e materiais a ele relacionados, obedecidas as balizas do Direito
muçulmano (Art. 16).
O dever social e estatal de se assegurar o meio ambiente sadio
corresponde à obrigação da sociedade e do Estado proporcionarem
ambientes depurados de vícios e corrupção moral e adequados ao
desenvolvimento ético saudável do ser humano (Art. 17 [a]).

4. A Liberdade de Religião no Direito Constitucional dos


Estados de Maioria Muçulmana
4.1 O perfil dos Estados de maioria muçulmana
Estima-se existirem no globo atualmente 1,3 bilhões de
muçulmanos36. Cerca de 1 bilhão desse contingente de islamitas vive

36 Stahnke, Tad; Blitt, Robert C. The Religion-State Relationship and the Right
to Freedom of Religion or Belief: A Comparative Textual Analysis of the
Constitutions of Predominantly Muslim Countries. Washington D.C., U. S.
Commission on International Religious Freedom, 2005, p. 6.

43 Alves da Frota.indd 69 7/4/06 10:52:33 AM


70 Revista IIDH [Vol. 43

em 44 países de maioria muçulmana 37, adiante especificados em


conformidade com a região do planeta considerada:
1. Oriente Médio e África do Norte38: Argélia, Barein, Egito, Irã,
Iraque39, Jordânia, Kuwait, Líbano, Líbia, Marrocos, Omã, Qatar,
Arábia Saudita, Síria, Tunísia, Emirados Árabes Unidos (EAU) e
Iêmen;
2. Ásia Meridional 40 : Afeganistão, Bangladesh, Maldivas e
Paquistão;
3. Ásia Oriental41: Brunei, Indonésia e Malásia;
4. África42: Burkina Faso, Chade, Camarões, Djibouti, Gâmbia, Guiné,
Mali, Mauritânia, Níger, Senegal, Serra Leoa, Somália43 e Sudão;
5. Europa e Eurásia44: Albânia, Azerbaijão, Quirguistão, Tadjiquistão,
Turquia, Turcomenistão e Uzbequistão.
Examinando-se o Direito Constitucional Positivo desses 44 Estados
nacionais de maioria muçulmana, verifica-se que a metade declara
o Islã a religião oficial45. Dessa parcela, 10 se consideram Estados
islâmicos46. Afora esses 22 Estados de religião oficial muçulmana,
sobra a outra metade, composta por 11 Estados cujas Constituições não
especificam se são seculares ou islâmicos e 11 Estados seculares47.
Encontram-se 602,5 milhões de islâmicos (58% da população
muçulmana mundial) em 22 Estados de religião oficial muçulmana
(Afeganistão, Barein, Brunei, Irã, Maldivas, Mauritânia, Omã,
Paquistão, Arábia Saudita, Iêmen, Argélia, Bangladesh, Egito,

37 Ibid., loc. cit.


38 Ibid., p. 29-37.
39 Cita-se neste trabalho o Diploma Constitucional provisório do Iraque sob
ocupação norte-americana, a Lei Administrativa Transitória (Transitional
Administrative Law-TAL). Cf. ibid., p. 1.
40 Ibid., p. 38-42.
41 Ibid., p. 43-44.
42 Ibid., p. 45-49.
43 A Somália se encontra sem Constituição. Cf. ibid., p. 48.
44 Ibid., p. 50-52.
45 Ibid., p. 7.
46 Ibid., loc. cit.
47 Ibid., loc. cit.

43 Alves da Frota.indd 70 7/4/06 10:52:34 AM


2006] Revista IIDH 71

Iraque, Jordânia, Kuwait, Líbia, Malásia, Marrocos, Qatar, Tunísia e


EAU48)49.
Situam-se 285,5 milhões de islamitas (28%) em 10 Estados que,
além de terem como religião oficial o islamismo, expressamente se
reputam Estados muçulmanos (Afeganistão, Barein, Brunei, Irã,
Maldivas, Mauritânia, Omã, Paquistão, Arábia Saudita e Iêmen50)51.
Localizam-se 287,5 milhões (28,5%) de muçulmanos em 11 Estados
que não possuem dispositivos constitucionais a esclarecerem se são
ordens estatais seculares ou muçulmanas (Albânia, Líbano, Síria,
Indonésia, Camarões, Djibouti, Gâmbia, Serra Leoa, Somália, Sudão
e Uzbequistão)52.
Por fim, restam 140 milhões (13,5%) de islâmicos, circunscritos a 11
Estados seculares (Burkina Fasso, Chade, Guiné, Mali, Níger, Senegal,
Azerbaijão, Quirguistão, Tadjiquistão, Turquia e Turcomenistão53)54.

4.2 A adequação aos padrões internacionais mínimos


de liberdade religiosa
Na presente análise adotam-se os “padrões mínimos”55 de liberdade
de religião (ou crença) e culto acolhidos pelo Direito Internacional
dos Direitos Humanos de matriz ocidental, típicos das democracias

48 Constituições do Afeganistão, Art. 2º; do Barein, Art. 2º; do Brunei, Art. 3º (1);
do Irã, Art. 12; de Maldivas, Art. 7º; da Mauritânia, Art. 5º; de Omã, Art. 2º;
do Paquistão, Art. 2º; da Arábia Saudita, Art. 1º; do Iêmen, Art. 2º; da Argélia,
Art. 2º; de Bangladesh, Art. 2º; do Egito, Art. 2º; do Iraque, Art. 7º (A); da
Jordânia, Art. 2º; do Kuwait, Art. 2º; da Líbia, Art. 2º; da Malásia, Art. 3º (1);
do Marrocos, Art. 6º; do Qatar, Art. 1º; da Tunísia, Art. 1º; e do EAU, Art. 7º.
Cf. ibid., p. 29-52.
49 Ibid., loc. cit.
50 Constituições do Afeganistão, Art. 1º; do Barein, Art.1º; do Brunei, Art. 3º (2);
do Irã, Art. 1º; das Maldivas, Art. 1º; da Mauritânia, Art. 1º; de Omã, Art. 1º; do
Paquistão, Art. 1º (1); da Arábia Saudita, Art. 1º; e do Iêmen, Art. 1º. Cf. ibid.,
p. 29-52.
51 Ibid., p. 7.
52 Ibid., loc. cit.
53 Constituições da Burkina Fasso, Art. 31; do Chade, Art. 1º; da Guiné, Art. 1º; do
Mali, Art. 25; do Níger, Art. 4º c/c 136; do Senegal, Art. 1º; do Azerbaijão, Art. 7º
c/c 18 (I) e (III); do Quirguistão, Art. 1º (1) c/c Art. 8º (3) e (4); do Tadjiquistão,
Arts. 1º, 8º e 100; da Turquia, Art. 2 c/c 174; e do Turcomenistão, Art. 1º. Cf.
ibid., p. 29-52.
54 Stahnke, Tad; Blitt, Robert C. Op. cit., p. 7.
55 Ibid., p. 12.

43 Alves da Frota.indd 71 7/4/06 10:52:34 AM


72 Revista IIDH [Vol. 43

ocidentais e esboçados quer pela Declaração Universal dos Direitos


Humanos de 1948 (Art. 18), DUDH, quer pelo Pacto Internacional sobre
os Direitos Civis e Políticos (Art. 18), de 1966, PIDCP.
Consoante tais parâmetros, as liberdades de religião, crença e culto
devem se estender a todos os indivíduos, independente de sua religião
ou crença, os quais podem exercitá-las pelo ensino, pela prática, pelo
culto e pela observância, isolada ou coletivamente, em público ou em
particular, sem discriminações, favorecimentos ou coações, sendo
admissíveis temperamentos a esse direito civil, apenas se respeitadas
as balizas do Direito Internacional dos Direitos Humanos (de matriz
ocidental)56.
O contraste entre os critérios traçados pelo DUDH (Art. 18), pelo
PIDCP (Art. 18) e pelo Direito Constitucional Positivo de 44 Estados
nacionais de maioria islâmica conduz à percepção de que 21 desses
países se adequam ao padrão internacional de liberdade de religião
(ou crença) e culto (Iraque, Bangladesh, Paquistão, Indonésia, Malásia,
Chade, Djibouti, Gâmbia, Guiné, Mali, Níger, Senegal, Serra Leoa,
Sudão, Albânia, Azerbaijão, Quirguistão, Tadjiquistão, Turquia,
Turcomenistão e Uzbequistão57)58.
Dentre os 21 Estados favoráveis à liberdade de religião e culto,
10 desfrutam de explícitas garantias constitucionais contra a coerção
religiosa (Iraque, Bangladesh, Paquistão, Malásia, Serra Leoa, Sudão,
Albânia, Azerbaijão, Turquia e Uzbequistão59)60.
Contudo, desses 44 Estados-nações, 22 possuem disposições
constitucionais aquém da garantia da liberdade de religião (ou crença)

56 Stahnke, Tad; Blitt, Robert C. Op. cit., p. 12.


57 Constituições do Iraque (Arts. 7 [A], Bangladesh [Arts. 39 e 41], Paquistão [Arts.
20 a 22], Indonésia [Arts. 28E [1], [2] e [3], 29 [1] e [2] e 28I [1]), Malásia (Arts.
11 [1], [2], [3], [4] e [5] e 12 [2] e [3]), Chade (Arts. 27 e 54), Djibouti (Arts. 25 [1],
[b] e [c] e [4], 32 e 212 [3], Gâmbia (Arts. 25 [1], [b] e [c], [4], 32 e 212 [3]), Guiné
(Arts. 7º e 14), Mali (Arts. 4º e 18), Níger (Arts. 8º, 14 e 16), Senegal (Arts. 8º e 24),
Serra Leoa (Art. 24 [1], [2], [3], [4], [5], [a] e [b]), Sudão (Arts. 24 e 27), Albânia
(Arts. 20 e 24), Azerbaijão (Arts. 48 e 71), Quirguistão (Arts. 16 e 82), Tadjiquistão
(Art. 26), Turquia (Arts. 14 e 24), Turcomenistão (Art. 11) e Uzbequistão (Arts.
31 e 61). Cf. ibid., p. 53-74.
58 Ibid., p. 15.
59 Constituições do Iraque (Arts. 7 [A], 13 [F] e 15 [C]), Bangladesh (Arts. 39 e 41),
Paquistão (Arts. 20 a 22), Malásia (Arts. 11 [1], [2], [3], [4] e [5] e 12 [2] e [3]),
Serra Leoa (Art. 24 [1], [2], [3], [4], [5], [a] e [b]), Sudão (Arts. 24 e 27), Albânia
(Arts. 20 e 24), Azerbaijão (Arts. 48 e 71), Turquia (Arts. 14 e 24) e Uzbequistão
(Arts. 31 e 61). Cf. ibid., p. 53-74.
60 Ibid., p. 15.

43 Alves da Frota.indd 72 7/4/06 10:52:35 AM


2006] Revista IIDH 73

ou seus comandos constitucionais se circunscrevem à proteção da


liberdade de culto (Argélia, Barein, Egito, Irã, Jordânia, Kuwait,
Líbano, Líbia, Marrocos, Omã, Qatar, Arábia Saudita, Síria, Tunísia,
EAU, Iêmen, Afeganistão, Brunei, Maldivas, Camarões, Mauritânia e
Somália61)62.
Ademais, 12 não estão providos de normas constitucionais que
positivem direitos individuais correlatos ao da liberdade religiosa ou
possuem normas constitucionais a restringirem o exercício de tais
direitos por determinado(s) grupo(s) (Barein, Egito, Irã, Jordânia,
Líbano, Líbia, Omã, Síria, EAU, Afeganistão, Maldivas e Burkina
Fasso63)64.
Por último, 15 limitam as liberdades de religião, crença e culto
além do permitido pelo Direito Internacional dos Direitos Humanos
de matriz ocidental (Barein, Irã, Jordânia, Kuwait, Líbia, Omã, EAU,
Afeganistão, Brunei, Maldivas, Djibouti, Gâmbia, Níger, Serra Leoa
e Turquia65)66.

5. A Opção do Federalismo Comunitário


Nos Estados de maioria muçulmana e árabe convém, levar em
conta a possibilidade de se adotar a forma federativa de Estado como
meio de se apaziguarem conflitos étnico-religiosos e com isso melhor
se homenagearem os direitos humanos, cujo respeito se mostra árduo

61 Constituição da Argélia (Art. 36), Barein (Art. 22), Egito (Art. 46), Irã (Arts. 12 a
14 c/c Arts. 23 e 26), Jordânia (Arts. 14 e 19), Kuwait (Art. 35), Líbano (Arts. 9º
a 10), Líbia (Art. 2º), Marrocos (Art. 6º), Omã (Art. 28), Qatar (Art. 50), Arábia
Saudita (Arts. 9º e 26), Síria (Art. 35 [1] e [2]), Tunísia (Art. 5º), EAU (Art.
32), Iêmen (Arts. 41 e 51), Afeganistão (Arts. 2º, 45 e 54), Brunei (Art. 3 [1]),
Maldivas (Art. 25), Camarões (preâmbulo) e Mauritânia. (Somália se encontra
sem Constituição.) Cf. ibid., p. 53-74.
62 Ibid., p. 15.
63 Constituições de Barein (Art. 22), Egito (Art. 46), Irã (Arts. 12 a 14 c/c Arts.
23 e 26), Jordânia (Arts. 14 e 19), Líbano (Arts. 9º a 10), Líbia (Art. 2º), Omã
(Art. 28), Síria (Art. 35 [1] e [2]), EAU (Art. 32), Afeganistão (Arts. 2º, 45 e 54),
Maldivas (Art. 25) e Burkina Fasso (Art. 7º). Cf. ibid., p. 53-74.
64 Ibid., p. 15.
65 Constituições do Barein (Art. 22), Irã (Arts. 12 a 14 c/c Arts. 23 e 26), Jordânia
(Arts. 14 e 19), Kuwait (Art. 35), Líbia (Art. 2º), Omã (Art. 28), EAU (Art. 32),
Afeganistão (Arts. 2º, 45 e 54), Brunei (Art. 3 [1]), Maldivas (Art. 25), Djibouti
(Arts. 25 [1], [b], [c] e [4], 32 e 212 [3], Gâmbia (Arts. 25 [1], [b], [c] e [4], 32 e
212 [3]), Níger (Arts. 8º, 14 e 23), Serra Leoa (Art. 24 [1], [2], [3], [4] e [5], [a] e
[b]) e Turquia (Arts. 14 e 24). Cf. ibid., p. 53-74.
66 Ibid., p. 15.

43 Alves da Frota.indd 73 7/4/06 10:52:36 AM


74 Revista IIDH [Vol. 43

em ambientes marcados pelo enraizado ódio étnico e lancinante


antagonismo religioso.
Em vez do federalismo tradicional de cunho geográfico, calçado na
divisão do território estatal em unidades regionais com autogoverno
(reflexo da autonomia política, normativa, financeira e administrativa)
e repartidas por fronteiras fictícias, o federalismo ora indicado, possui
caráter comunitário, centrado em fornecer às comunidades étnico-
religiosas papéis nitidamente demarcados, de modo a não haver entre
elas, conflitos de competência (ou atribuições) e guerras civis pelo
controle do Poder Público, sem separá-las em territórios como se
fossem compartimentos estanques, uma vez que, a partição geográfica
de comunidades étnico-religiosas poderia redundar em apartheids e se
esqueceria do fato de que muitas vezes, elas compartilham o mesmo
espaço físico (cidade ou região)67.
Exemplo de Estado de maioria muçulmana apropriado ao
federalismo comunitário é o Iraque, onde a população se triparte
em árabes xiitas (60%), árabes sunitas (20%) e curdos sunitas (20%).
Existem históricas contendas tanto entre árabes e curdos, quanto entre
árabes sunitas e xiitas e não há como se traçar uma linha geográfica
razoável, para separar, em territórios distintos, árabes sunitas e
xiitas68.
Entretanto, dentre os Estados de maioria muçulmana, o Líbano
se sobressai por alojar os primeiros precedentes jurídicos para o
federalismo comunitário69. Reformada em 1927, 1928, 1947 e 1990,
a Constituição libanesa, de 1926, Art. 24 (1), alínea “a”70, preceitua
número igual de assentos para muçulmanos e cristãos na Câmara
dos Deputados (o Parlamento libanês é unicameral, Art. 16). O Pacto
Nacional de 1948 (não-escrito)71 firmou o costume seguido até hoje:
o Presidente da República é cristão maronita; o primeiro-ministro,

67 Mallat, Chibli. “Federalism in the Middle East and Europe”. Case Western
Reserve Journal of International Law, Cleveland, v. 35, nº 1, set.-dec. 2003, p.
12.
68 Ibid., p. 11.
69 Mallat, Chibli. Op. cit., p. 12-13.
70 Líbano. Lebanon constitution. Disponível em: http://www.oefre.unibe.ch/law/
icl/le00000_.html. Acesso em: 5 mai. 2005.
71 Jelloun, Mohammed Ben. “What’s consociational patriotism?: from Lebanon to
Iraq”. Disponível em: http://swans.com/library/art11/jelloun2.html Acesso em:
5 mai. 2005.

43 Alves da Frota.indd 74 7/4/06 10:52:36 AM


2006] Revista IIDH 75

muçulmano sunita; e o Presidente da Câmara dos Deputados,


muçulmano xiita72.

Conclusão
1. Conquanto a Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948,
da Assembléia Geral das Nações Unidas careça de legitimidade
plena por reverberar o Direito ocidental e destoar de tradições
seculares do Direito muçulmano (a exemplo do exercício da
liberdade de matrimônio e da separação entre Estado e clero), traz
em seu conjunto de direitos universais, que têm como destinatários
precípuos os seres humanos cuja esfera de autonomia individual se
vê tolhida por poderosas autoridades estatais, tribais, religiosas e
familiares;
2. A Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948, influenciada
pela Constituição dos Estados Unidos de 1787, pela Declaração dos
Direitos do Homem e do Cidadão de 1789, pela Magna Carta de
1215, pelo Bill of Rights de 1689 e pelos movimentos missionários
oitocentistas antiescravagistas e pró-sufrágio universal, vem a tona
no Pós-Segunda Guerra Mundial, visando revigorar os direitos
naturais como barreiras às normas do Direito Positivo, contrárias aos
direitos humanos e favoráveis a regimes ditatoriais ou totalitários;
3. Já a Declaração do Cairo sobre os Direitos Humanos no Islã de
1990, da 19ª Conferência Islâmica dos Ministros das Relações
Exteriores, antecedida pela Constituição da República Islâmica
do Irã de 1979, e pela Declaração Universal Islâmica dos Direitos
Humanos de 1981, ressoa a desilusão de setores da comunidade
muçulmana com o Ocidente e o ressurgimento dos movimentos
islâmicos conservadores, ambos resultados, quer da busca pela
preservação da identidade islamita em meio aos embates ideológicos
da Guerra Fria entre os Estados Unidos e a União Soviética, quer
da derrota árabe (do Egito, Jordânia e Síria) para Israel na Guerra
Árabe-Israelita de 1967;
4. A Declaração do Cairo sobre os Direitos Humanos no Islã continua
o esforço antes iniciado pela Declaração Universal Islâmica dos
Direitos Humanos, de ajustar ao Direito muçulmano os direitos
humanos historicamente afinados com os tratados e as Constituições
de matriz ocidental, em particular no que se refere ao direito à

72 Mallat, Chibli. Op. cit., p. 12-13.

43 Alves da Frota.indd 75 7/4/06 10:52:37 AM


76 Revista IIDH [Vol. 43

igualdade e ao devido processo legal, ao direito às liberdades civis,


à vida privada e à vida familiar, ao direito às liberdades políticas e à
democracia, aos direitos sociais, econômicos e culturais e ao direito
ao meio ambiente sadio;
5. Embora a Declaração do Cairo sobre os Direitos Humanos no
Islã se aproxime da Declaração Universal dos Direitos Humanos
quando aloja direitos de caráter civil, político-democrático, social,
econômico e cultural, distancia-se dela ao submeter os direitos
humanos à moldura teológica do Direito muçulmano e vai além
da Declaração da ONU de 1948 ao catalogar o direito ao meio
ambiente sadio;
6. Averiguando-se o Direito Constitucional Positivo dos 44 Estados
nacionais de maioria muçulmana, nota-se que metade declara o Islã
a religião oficial (10 desses 44 se consideram Estados islâmicos) e a
outra metade se divide em 11 Estados seculares e 11 Estados cujas
Constituições não especificam se são seculares ou islâmicos;
7. Dos 44 Estados de maioria muçulmana, 21 contemplam o
padrão internacional de liberdade de religião (ou crença) e culto.
Desse grupo de 21, 10 Estados desfrutam de explícitas garantias
constitucionais contra a coerção religiosa. Por outro lado, desses
44 Estados-nações, 22 possuem disposições constitucionais aquém
da garantia da liberdade religião (ou crença) ou seus comandos
constitucionais se circunscrevem à proteção da liberdade de culto;
12 estão providos de normas constitucionais que não positivam
direitos individuais correlatos ao da liberdade de religião ou
possuem normas constitucionais a restringirem o exercício de tais
direitos por determinado(s) grupo(s); 15 limitam as liberdades de
religião, crença e culto além do permitido pelo Direito Internacional
dos Direitos Humanos de matriz ocidental;
8. Nos Estados de maioria muçulmana e árabe nos quais setores
expressivos da sociedade nutrem entre si ódio étnico e antagonismo
religioso, o federalismo comunitário ressai como mecanismo a
arrefecer tais animosidades e assim pavimentar o caminho para
a maior difusão da reverência aos direitos humanos, ao fornecer
às comunidades étnico-religiosas papéis nitidamente demarcados,
de forma a não haver entre elas, conflitos de competência (ou
atribuições) e guerras civis pelo controle do Poder Público,
sem separá-las em territórios como se fossem compartimentos
estanques, uma vez que, a partição geográfica de comunidades

43 Alves da Frota.indd 76 7/4/06 10:52:37 AM


2006] Revista IIDH 77

étnico-religiosas, poderia redundar em apartheids e se esqueceria o


fato de que muitas vezes elas compartilham o mesmo espaço físico
(cidade ou região).

Referências Bibliográficas
Alcorão. Disponível em: http://www.culturabrasil.org/alcorao.htm.
Acesso em: 30 abr. 2005.
19ª Conferência Islâmica de Ministros das Relações Exteriores. The
Cairo Declaration on Human Rights in Islam. Disponível em: http://
www.humanrights.harvard.edu. Acesso em: 26 abr. 2005.
Conselho Islâmico. Universal Islamic Declaration of Human Rights.
Disponível em: http://www.alhewar.com. Acesso em: 26 abr. 2005.
Estados Unidos da América. Constituição dos Estados Unidos da
América. Disponível em: http://www.embaixada-americana.org.br.
Acesso em: 26 abr. 2005.
França. Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão. Disponível
em: http://www.direitoshumanos.usp.br. Acesso em: 26 abr. 2005.
Heritage, Andrew; Cavanagh, Louise. Enciclopédia Geográfica
Universal. Rio de Janeiro, Globo, 1995, v. 5.
Ignatieff, Michael. “The attack on human rights”. Foreign Affairs, New
York, v. 80, nº 6, p. 102-116, nov.-dec. 2001.
Irã. The Constitution of the Islamic Republic of Iran. Disponível em:
http://www.oefre.unibe.ch. Acesso em: 26 abr. 2005.
Jelloun, Mohammed Ben. “What’s consociational patriotism?: from
Lebanon to Iraq”. Disponível em: http://swans.com/library/art11/
jelloun2.html. Acesso em: 5 mai. 2005.
Líbano. Lebanon constitution. Disponível em:
http://www.oefre.unibe.ch/law/icl/le00000_.html. Acesso em: 5 mai.
2005.
Mallat, Chibli. “Federalism in the Middle East and Europe”. Case
Western Reserve Journal of International Law, Cleveland, v. 35, nº 1,
p. 1-14, set.-dec. 2003.
Morrison, Heidi. “Beyond universalism”. Muslim World Journal of
Human Rights, Berkeley, v. 1, nº 1, p. 1-21, jan.-dec. 2004.

43 Alves da Frota.indd 77 7/4/06 10:52:38 AM


78 Revista IIDH [Vol. 43

Organização das Nações Unidas. Declaração Universal dos Direitos


Humanos (1948). Disponível em: http://www.mj.gov.br. Acesso em: 17
set. 2004.
_____. Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos (1966).
Disponível em: http://www.dhnet.org.br. Acesso em: 11 out. 2004.
Preece, Warren E. (Ed.). The New Encyclopaedia Britannica:
Macropaedia. Chicago, 15th ed., 1980, v. 9
Pinheiro, Luís Felipe Valerim. “O devido processo legal e o processo
administrativo”. Fórum Administrativo: Direito Público, Belo
Horizonte, ano 2, n. 20, p. 1.323-1.333, out. 2002.
Serajzadeh, Seyed Hossein. “Islam and crime: the moral community
of muslims”. Journal of Arabic and Islamic Studies, Bergen, v. 4, p.
111-131, jan. 2001-dec. 2002.
Stahnke, Tad; Blitt, Robert C. The Religion-State Relationship and the
Right to Freedom of Religion or Belief: A Comparative Textual Analysis
of the Constitutions of Predominantly Muslim Coutries. Washington
D.C., U. S. Commission on International Religious Freedom, 2005.
Zaffaroni, Eugenio Raúl; Pierangeli, José Henrique. Manual de direito
penal brasileiro: parte geral. 3. ed. São Paulo: RT, 2001.

43 Alves da Frota.indd 78 7/4/06 10:52:39 AM

Você também pode gostar