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Arquivo Secreto 0 3 - Uma Noite em Black Tower - Silver Kane
Arquivo Secreto 0 3 - Uma Noite em Black Tower - Silver Kane
Arquivo Secreto 0 3 - Uma Noite em Black Tower - Silver Kane
Silver Kane
Disponibilizao: Luka
Digitalizao: Marina
Reviso: Meg
Formatao: Edina
Captulo I
Embora parea mentira, uma das coisas mais amargas
deste mundo estar farto de tudo, tendo provado tudo,
estar cansado de rir, de viver, de sentir todas as emoes
boas e ms geralmente ms que encontramos neste
mundo.
Algo assim acontecia com Paulus.
Paulus, a quem seus pais deixara uma fortuna mais que
regular, uma dessas fortunas que no terminam nunca, por
mais que se gaste, era um caso tpico do jovem para quem
a vida j no tem emoo, surpresa, nem segredo algum.
Desde os dezesseis anos no fizera outra coisa, a no ser
gastar e divertir-se.
E dos dezesseis aos trinta e cinco anos um rapaz pode
divretir-se muito, se tem dinheiro e s pensa nisto.
Para Paulus no existiam mulheres virtuosas, nem
jovens inocentes, nem artistas de teatro que s se
preocupassem com sua arte. le sabia que com dinheiro
tudo se compra e se vende. Tambm comprava carros
magnficos s pelo prazer de viver novas emoes, e aos
vinte e oito anos, desejoso de ser um jovem intelectual
comeou a escrever poesias de estilo grosseiro e amoral.
Apresentou-se num concurso, comprou todos os
membros do jri e obteve meno honrosa.
Logo dedicou-se a viajar. Percorreu o mundo todo,
vrias vezes, procurando sempre emoes diferentes com
mulheres de diversas raas.
Por fim, como j nada lhe restasse para experimentar,
dedicou-se s drogas, porm muito cautelosamente, porque
Paulus era um desses tipos inteligentes e frios que gozam
serenamente e sem qualquer despreendimento. Um desses
fulanos duplamente repulsivos que ante um prazer, reservam-se todas as vantagens.
Captulo II
Um DIA mais tarde, no extremo oposto do Londres, nas
ruas silenciosas e tranqilas que rodeavam Regente Park,
um homem encontrava-se diante da morte.
Era um tipo parecido com Paulus, embora um pouco
mais forte. Vestia um elegante roupo leve de seda e uma
echarpe. Seus dedos estavam cheios de anis, e todas
aquelas jias eram incrustadas de ofuscantes brilhantes. A
abotoadura da camisa, tambm, trabalhada em curo e
pedras preciosas.
O homem que se postava diante dele, era alto, moreno,
de feies retas e apontava-lhe um revlver .
Os dois encontravam-se numa sala, luxuosamente
mobiliada, cheia de quadros de pintores famosos, em cuja
lareira, crepitavam umas toras de madeira.
Uma estranha atmosfera de intimidade e sensualidade
envolvia aquela pea onde se mesclavam os quadros de
excelentes pintores, os mveis bem talhados e os desenhos
mais atrevidos que um desenhista possa conceber.
O homem do roupo, gemeu:
No dispare. . . No aperte o gatilho, por favor!
Somos homens inteligentes e isto ter por fora uma
razovel soluo! No atire!
O homem do revlver negaceou lentamente com a
cabea.
No penso em atirar. Quero entreg-lo vivo, mas,
depois de assinar uma confisso completa .
Na. . . nada ganhar com isso.
Farei com que a verdade triunfe e que se reconhea
a inocncia de meu pai.
Dan... Voc um menino esperto.. . Seu pai no era,
sabe ? Era um homem destes que sempre caminham em
linha reta e no percebem as oportunidades que surgem a
seu lado. Por isto acabou mal! Eu lhe disse que devamos
continuar o negcio e le empenhou-se em desfaz-lo... Foi
Captulo III
K.AN conhecia bem a Esccia, mas nunca estivera por
aquela regio inspita e onde todos os elementos do mal
pareciam ter marcado encontro.
Com efeito, o terreno tinha todas as caractersticas que
faria ura mediano agricultor odi-lo. Rodo pela eroso,
rochoso, seco, rido, no crescia nele nenhuma erva,
exceto uns musgos midos que no poderiam alimentar
nem meio-rebanho, inclusive para um pastor, aquela zona
parecia maldita.
Umas poucas rvores secas se estremeciam ao impulso
do ar que chegava dos escarpados O cu era cinzento,
nublado e dava uma opressiva sensao de tenebroso. No
se escutava outros rudos a no ser do vento e o zumbido
do motor, alternado de vez em quando pelo choque de uma
pedra que os pneumticos destroavam bruscamente.
Ao volante de sua Ferrari, Dan comia as milhas de
caminho spero e pedregoso que lhe separava de Black
Tower.
Deixara j muito atrs a ltima aldeia, e se perguntava
se aquele caminho terminaria alguma vez, quando viu o
castelo, no alto de uma suave colina.
No chamava a ateno pela sua situao, j que este
se
encontrava
a
pouca
altura.
Tampouco
pelo
impressionante de suas torres, pois estas eram chatas e
comidas pelos anos. O que mais impressionava no castelo
era sua velhice, a quase absoluta negrura de suas pedras.
Ao que parece no fora habitado durante anos e anos,
e faltavam vidros em muitas janelas. Mas esta impresso
era falsa, porque quando algum se aproximava o
suficiente, podia ver que as portas estavam intactas, assim
como os barrotes das janelas mais baixas, para que
ningum pudesse entrar. Eram as janelas altas, que no
ofereciam perigo, as nicas que pareciam descuidadas.
Esquilo sussurrou:
J esto todos na jaula.
Os quatro?
Sim.
Que temos de fazer?
No momento, esperar. J vi que-esto nos seus
postos. Que horas so?
Sete.
Nesta poca do ano, comea a anoitecer
demasiadamente tarde disse Esquilo, dominado pela
impacincia.
Mas se j no se v nada! Esquilo meditou uns
momentos.
Logo comearemos a funo. s oito em ponto.
Esses tipos se repartiro pelos cmodos e comearo a
procura.
Tem pequenas?
Nenhuma!
Os quatro homens lanaram de uma s vez uma sonora
gargalhada.
Pois que diabo vo encontrar? perguntou um
deles.
Vocs...
A gargalhada se repetiu. Os trs gigantes apalparam
suas armas. Estavam to seguros de si que aquela situao
lhes parecia cada vez mais divertida .
Onde ficaremos?
Esquilo extraiu de um de seus bolsos um papel, que
desdobrou cuidadosamente, colocando-o debaixo da luz da
lmpada. Reproduzia-se ali, um confuso mapa do castelo,
com uns sinais claramente marcados em tinta vermelha.
Junto a cada um daqueles sinais fora escrito um nome.
Cada um dos trs indivduos sabia, assim, qual o lugar que
lhe fora designado.
As oito em ponto e sem ser visto sussurrou
Esquilo. O resto do plano conhecem perfeitamente.
Cada um de vocs sabem o que devem fazer.
Naquele momento, retumbou um trovo nas alturas. A
tempestade comeava.
Captulo IV
Quando Esquilo regressou ao interior de Black
Tower chovia copiosamente, e o fragor dos troves era
quase ininterrupto. Os vidros repica-vam e a paisagem era
iluminada sinistramente pelos reflexos dos relmpados.
Tudo
aquilo
agradava
extraordinariamente
a
Esquilo. At os elementos da natureza estavam a seu
favor. Abriu a grande porta e dirigiu-se diretamente sala
onde deixara seus hspedes. S tava um, o que le pensava
que fosse Mosley.
Encontrou este ltimo perto da porta, examinando
atentamente uns quadros pendurados numa das paredes.
A luz era insuficiente, mas os relmpados, atravs das
janelas, iluminavam ttricamente aqueles rostos de
homens p mulheres que muitos anos antes haviam
atravessado os umbrais do alm-tmulo.
Uns rostos eram nobres, outros amargurados, alguns
cruis. Um par deles, inclusive, era terrorficos. Seus clhos
fitavam das sombras como se quisessem voltar outra vez ao
mundo dos vivos, surgindo de suas esquecidas tumbas.
Esquilo, em silncio, parou, olhando a quem le
julgava ser Mosley, um dos homens mais viciados de
Londres.
A verdade que este no parecia. Tinha as cestas
largas, os braos compridos e era o tipo do atleta. Durante
alguns instantes imaginou se no se teria equivocado. Mas
no, o equvoco no era possvel. le mesmo, Esquilo,
fora falar-lhe em sua casa. E le prprio Mosley lhe abrira
a porta.
Se por acaso soubesse que o verdadeiro Mosley estava,
agora, enterrado em seu jardim, Esquilo Cliss teria um
estremecimento. Mas nem remotamente imaginava uma
ccisa assim.
Aproximou-se de Dan e murmurou:
Que noite terrvel, eh, Senhor Mosley? Mas eu creio
que com um castelo como este, as coisas fiquem mais
divertidas no meio de uma boa tormenta .
Oh!
Que lhe chama a ateno nesses quadros ?
Captulo v
P AULUS foi o primeiro a saud-lo. E o fz de uma
forma aborrecida, como se espantasse moscas.
Os outros dois eram indivduos fortes, bem vestidos e
com aspecto de amantes da boa-vida. Seus olhos turvos
Captulo VI
J OHNSON espreitava entre as sombras. O punhal
brilhava em sua mo direita, como parte de seu prprio
membro.
No sabia qual dos quatro homens se aproximava, mas
era o mesmo. le estava seguro de no falhar.
Viu oscilar, no outro lado do imenso sto, o disco de
luz de uma lanterna.
O que avanava no conhecia o local. Notava-se sua
vacilao no modo irregular de avanar, ora apressado, ora
demasiado lento. Johnson sorriu, enquanto caminhava
sigilosamente e com a astcia de uma raposa para colocarse s suas costas.
O disco de luz era como um sinal que lhe indicava onde
teria que assentar o golpe.
Jamais realizara um trabalho to fcil como aquele e
com tantas garantias de xito.
Situou-se s costas do homem, que renegava em voz
baixa, porque aquela situao, que no princpio lhe
parecera to divertida, comeava a desagrad-lo .
Johnson, sorrindo, levantou o punhal. Acabara de
reconhecer o homem que tinha diante de si,
completamente dsprevenido. Era Kenton. O ladino
Esquilo Cliss o assinalara horas antes, enquanto suas
futuras vtimas iam chegando ao castelo.
Johnson, fazendo mais estreito e cruel seu sorriso,
impulsionou o punhal at o corao de sua vtima. Soou um
espantoso alarido.
Dan encontrara-se numa situao semelhante.
Deram-lhe uma lanterna e inteira liberdade no interior
do castelo. E quando encontrasse uma das garotas, poderia
ter a certeza de que ela colaboraria. Disseram-lhe tambm
que alguns dos cmodos do andar superior estavam
mobiliados e que neles encontraria bebidas e um tocadiscos, para alegrar o hacanal.
No havia dvida de que para os trs malandros, os
trs que acabara de conhecer, a situao no poderia ser
mais divertida.
A le, em troca, produzia-lhe nuseas.
Aquela
mulher,
cujos
cabelos
louros
claros
emolduravam um doce rosto, era uma das mais bonitas que
recordava ter visto em sua vida.
Tinha os olhos escuros e penetrantes. A luz da lanterna
caa em cheio em seus lbios muito vermelhos .
Ao pensar que ela fosse uma das vtimas das drogas,
uma daquelas que naquela noite se afundaria de todo,
sentiu um estremecimento.
Era bonita demais e muito jovem, para que lhe
acontecesse algum mal.
Ela murmurou:
Bem, que faz a parado? Por que me ilumina com
esse foco como se eu fosse uma vedete?
Dan permaneceu em silncio uns instantes.
Tudo o que lhe ocorreu dizer, foi:
Como se chama?
Ndia.
Suponho que.. . Bem, suponho que esse porco do
Esquilo Cliss lhe ter dito algo.
Quem Esquilo Cliss?
A surpresa deixou paralisado o jovem.
No o conhece?
Nem sombra.
Ento que faz neste castelo?
Se lhe disser no acreditar. Vai pensar que a
histria de Branca de Neve.
Conte-me tudo direitinho. Pode ser que eu acredite.
Eu sou muito idiota, sabe?
Vim parar aqui, refugiando-me da tormenta
cochichou ela. Esta a verdade.
Como uma confirmao de suas palavras, estourou um
trovo, estremecendo a estrutura de Black Tower. O
relmpago iluminou os mveis da sala, e a figura
harmoniosa da mulher moveu-se como uma esttua viva.
Fugindo da tormenta? sussurrou Dan, quando
cessou o estampido dos troves.
Sim.
Ela se ps de p e acercou-se de uma das janelas . Os
saltos altos eram como um pedestal para sua encantadora
figura. Dan seguiu-a, meio hipnotizado.
Atravs da janela ambos viram um carro estacionado
diante do castelo. Era pequeno e modesto; um Fiat,
Captulo VII
PATRICK HODGES, carteiro rural, que fazia aquela
rota cinco vezes por semana, deixou a bicicleta ao abrigo
do toldo da tenda, desprendeu-se do capuz empapado pela
chuva e entrou bufando no pequeno estabelecimento de
seu amigo Ben Bay-nes, denominado O Descanso Eterno.
Uma vez no seu interior, Hodges despiu-se do
impermevel e acercou-se da lareira.
. Ben Baynes saudou-o do balco.
Que noite horrvel, heim Patrick?
Uma noite de morte.
Homem, no precisa ficar assim...
E como vou ficar? Com esta chuva e ainda tenho que
entregar duas cartas urgentes, chegadas ltima hora.
Para quem so?
Uma para Ralphson e outra para Blint.
Captulo VIII
O CARRO estava tal como Bradley o deixou. Entraram
nele, e Bradley apertou um boto do porta-luvas. Logo
comeou a comer um pequeno sanduche de presunto,
depois de oferecer a Dan, que recusou .
Voc sabe o que representa um carregamento de
herona de vinte e cinco mil dlares? perguntou, de
repente.
Pois.. . vinte e cinco mil dlares.
Que inocente que voc , meu amigo! engoliu um
bocado e olhou-o plcidamente. Um carregamento desta
Captulo IX
ESQUILO, Cliss sentia-se satisfeito. Afundado na
poltrona mais cmoda da biblioteca, contemplava o
crepitar da lenha, j quase extinta, enquanto no interior
crescia mais e mais o fragor da tormenta. Os troves
retumbavam nas grandes salas-vazias de Black Tower, mas
isso no fazia seno acentuar a sensao de placidez e de
conforto que se tinha ali dentro.
Consultou seu relgio.
Eram dez horas. Sem dvida seus homens haviam
terminado j a maior parte do trabalho. E dizer, dava por
descontado que ao menos dois de seus convidados j
estariam mortos.
Teria que fazer uma inspeco pelos lugares onde seus
homens estavam situados, para convencer-se de que tudo
caminhava segundo o plano previsto.
Dobrou uma lista na qual estivera trabalhando e a
guardou em um dos bolsos de seu casaco. Era uma lista de
compradores dos objetos que pensava tirar das casas de
Captulo X
ESQUILO ficou paralisado. Acreditaria em qualquer
coisa no mundo, menos no que acabava de dizer Johnson.
Est louco?
No fui eu.. . Juro!
Cliss pensou que seu subordinado estava a ponto de
sofrer um ataque de nervos e que se sentia afetado por
uma espcie de pesadelo. Certo que aquele poro,
estremecido pelo fragor da tempestade, era para
desenquilibrar qualquer ente, mas le sempre imaginara
que Johnson era um homem de mais tempera.
Bem, bem, tranqilize-se.. .
Captulo XI
Eram quatro homens, Esquilo, Johnson, Paul e
Lonas, contra dois s, Bradley e Dan.
Nenhum desses dois, suspeitava que iam ser atacados.
O que faziam na realidade era procurar as moas que
supunham estar em Black Tower.
De repente um curto som metlico advertiu Dan. Era
um som que produz um gatilho de uma arma ao ser
montada.
Captulo XII
H MOMENTO em que no desespero das foras,
momentos em que fazemos o que em circunstncias
normais no teramos feito nunca. Dan tinha motivos para
cair cem vezes fulminado por terra, mas ainda se manteve
em p porque pensou que se casse j no voltaria a
levntar-se.
O liquidariam como a um co enfermo.
Tateando, avanou uns passos pelo corredor,
procurando afastar-se do inimigo que tinha s suas costas.
Este repetiu o golpe, descarregando de novo a culatra de
sua arma sobre o crnio de Dan, mas j o jovem se afastara
o suficiente e o impacto s o alcanou no ombro.
Embora sentisse uma viva dor, esta mais contribuiu
para reanim-lo.
Correu de novo, sem saber onde estava. Nem sequer
percebeu que, ao receber o primeiro impacto, soltara sua
arma.
Estava desarmado e com pelo menos, dois inimigos s
suas costas.
Agora a luz dos relmpagos era contnua, incessante,
como um holofote contnuo.
Seus olhos olharam as potas que havia sua direita, e
reconheceu uma delas. Era a porta do quarto em que
estavam as duas moas.
Dan ouvia passos rpidos atrs dele. Percebeu que
seus inimigos voltavam.
De repente suas foras falharam um instante s.
Apoiou na folha de madeira, para recuperar-se,
sabendo que aquela porta estava fechada.
Mas, de repente, a folha de madeira cedeu!
Dan encontrou-se no interior do quarto antes de ter
percebido o que verdadeiramente sucedia.
Ali no havia duas mulheres. Sim uma s. No viu
Ndia em parte alguma. Em troca Nora, a que tinha uma
face queimada, estava l dentro.
Pelo visto, Ndia desaparecera.
Dan viu sobre uma das prateleiras que adornavam as
janelas uma garrafa. No podia contar com mais armas que
aquela. Quebrou-a brutalmente, segurando-a pelo gargalo,
Captulo XIII
D E REPENTE, as foras de Dan tornaram a falhar.
Caiu de joelhos.
Viu que Esquilo Cliss levava na mo direita uma
arma e na esquerda um delgado bambu.
Cliss aproximou a ponta do bambu dos olhos de Dan.
- E' um trabalho delicado explicou com prazer.
Furam as plpebras e no se pode arranc-lo. O operado
sofre muito, mas sobretudo pensa no que vai sofrer mais
adiante e isso o faz falar como um vendedor ambulante.
Que diz voc, Dan?
Que maldita seja toda sua famlia.
Dan sentia-se dolorido pelos golpes. Respirava
angustiosamente.
Esquilo encostou. O fz suavemente e colocando
nisso um diablico prazer. Dan estremeceu, pensando que
poderia atravessar Os seus olhos. Se ficasse cego, j no
queria viver.
E tinha que ficar quieto, porque se fizesse um
movimento em falso o bambu lhe entraria at o fundo do
globo ocular.
Tentou reunir suas foras.
Esquilo comeou a rir. Movia o abdome a cada
gargalhada. E dobrava e apertava a cintura de riso, ao ver
como Dan estava quieto.
Brotou o sangue e ento as gargalhadas de Esquilo
fizeram estremecer o ar.
Johnson estava vigilante, como um co atento a
qualquer rudo que pudesse chegar do exterior. Dan s
esperava uma boa ocasio. Tinha as mos livres e o caco da
garrafa entre os dedos.
Captulo XIV
D AN no soube dizer quanto tempo ficara sem conhecimento.
Sua testa doia horrivelmente quanto seus olhos
comearam outra vez a vislumbrar algum objeto. Procurou
levantar-se e no foi possvel. Teve que respirar
afanosamente alguns minutos, at que pouco a pouco foi
recobrando uma lucidez relativa.
Percebeu ento em que classe de embrulho estava
metido at o pescoo. Viu que em volta dele havia dois
cadveres, o de Johnson e o de Esquilo Cliss. Sabia que
Ela no contestou. Continuou com a cabea tenazmente virada para o outro lado, de modo que le s
podia ver uma de suas faces.
Cliss lhe disse do que se tratava, no?
Ela no contestou tampouco.
A sensao de timidez era cada vez mais intensa, e isso
infundia a Paulus extremos insuspeitos.
Os mais canibalescos desejos perdem seus sentidos,
fazendo-se insuportvel a espera.
Todo o seu corpo vibrava, como um arco prestes a
arrebentar. Seus olhos obsecados no perdiam detalhe dos
formosos relevos daquela mulher. A nica ccisa que
desejava era t-la em seus braos e ver bem todo o seu
rosto.
Por isso insistiu:
Sabe que logo ter um prmio, no? Cliss ser bom
com voc, e inclusive eu tambm. Mas se no aceita.. .
Ela tampouco contestou. Paulus comeou a sentir-se
irritado ante aquele silncio.
Por que no fala? balbuciou.
Ento ela abriu os lbios pela primeira vez, mas sem
girar nem meia polegada a sua cabea.
Aqui h pouca luz. Paulus soltou uma gargalhada.
Voc tem razo. . . Claro que tem pouca luz! E'
preciso que voc e eu nos vejamos, que nos conheamos
bem.. . Suponho que esta condenada habitao tenha
instalao eltrica.
Creio que no.
Uma cachorrada dessas espcies no perdoarei ao
malandro do Cliss.
Posso trazer um lampio.
Paulus distendeu seus lbios numa espcie de sorriso.
As coisas iam melhor do que le imaginara .
A jovem colaborava!
Sabe onde encontrar isso? perguntou.
Claro que sim. . .
Traga-o. Eu esperarei aqui mesmo. Mas no demore
muito, boneca.. .
E' s um minuto.
Eu estarei ansioso de impacincia.
Mas por que tinha ela as mos unidas atrs das costas?
Por qu?
Talvez para levantar o busto e fazer que este ficasse
mais agressivo?
Facilidades demais para uma mulher que nunca se
dedicara a agradar aos homens.
Uma chispa de receio brilhou nos olhos de Paulus pela
primeira vez. Mas anulou-a em seguida.
Ela queria lhe dar toda espcie de facilidades para
assim obter maior poro de droga. E por que no?
Paulus sabia que por umas gramas de cocana, a
pessoa viciada se corrompe, se vende, mata e morre.
le aproveitaria a situao.
O mesmo morboso desejo de atrasar o instante ansiado
o fz enfiar todavia, o rosto.
Queria saber antes o que aquelas mos ocultavam .
Por que as esconde? sussurrou. Que segredo
oculta a?
Ela disse suavemente.
Segredo? Nenhum. Olhe...
Mostrou a mo esquerda. Nela rebrilhava um anel. Um
reflexo de luz emanou daquela imensa pedra vermelha.
E olhe. . .
E a mo direita apareceu tambm. Aquela mo
empunhava um afiado punhal, de lmina comprida .
No queria me ver bem, queridinho? Por que no me
olha agora?
A lanterna tremia entre as mos de Paulus, que agora
precisava apert-la com os dez dedos.
O reflexo ia de um lado a outro, iluminando
espectralmente o corpo da mulher, a pedra vermelha do
anel e o punhal que rebrilhava sinistramente .
Logo viu os olhos.
Aqueles olhos quietos, sinistros, opalinos, que
pareciam olhar para o alm tmulo.
Paulus no teve mais foras nem para mover-se .
Seus ps pareciam cravados na terra.
Sua garganta apenas foi capaz de soltar um grito de
horror.
Viu que ela avanava e estremeceu ao receber em seu
corpo, um, dois, trs impactos.
No princpio no sentiu dor.
Pareceu-lhe que ela golpeara com o punho simplesmente, e quis ento dar um passo atrs.
As foras no lhe responderam.
Sentia agora, de repente, que a pele lhe queimava, mas
que em suas entranhas havia como um frio de gelo.
Levou as mos ao ventre, onde a mulher lhe cravara o
punhal, e ento ela lhe acertou na garganta o golpe
definitivo.
O fz suavemente, com elegncia, fazendo com a faca
um artstico movimento.
Da garganta de Paulus surgiu um jorro de sangue.
A mulher afastou-se, para que o lquido vermelho no
manchasse seus sapatos imaculados, e contemplou durante
alguns instantes a silenciosa agonia do malandro.
Deixou a faca cravada, como um macabro adorno e
logo esfregou as mos silenciosamente.
Dan escutou aquele grito de agonia.
Afundara nos corredores de Black Tower, aqueles
imensos corredores que pareciam no terminar nunca,
pareceu-lhe que aquele grito repercutira em todas as
paredes que havia s suas costas.
Virou-se.
Esteve a ponto de tropear com uma gigantesca teia de
aranha que tampava em parte aquele lado do corredor. No
centro, espreitando, uma aranha monstruosa, imensa,
parecia a ponto de saltar sobre le.
Dan fz um gesto de repulsa e de alarme.
Gostosamente teria disparado contra o repulsivo
animal, mas produziu-lhe nuseas a viso antecipada
daquele pequeno monstro partido pelas balas em vrios
pedaos que saltariam em todas as direes.
Preferiu retirar-se de vagar, procurando o lugar onde
brotara aquele grito de agonia.
Encontrou-o pouco depois, ao entrar numa das peas.
Viu um homem banhado em um charco de sangue.
O disco de luz iluminou tambm as bonitas pernas da
mulher, que junto ao morto, contemplava-o a lvida
claridade que penetrava pelas janelas .
Dan elevou um pouco sua lanterna.
A luz se projetou sobre o formoso rosto de Ndia, um
rosto muito diferente do de Nora. Porque Nora tinha uma
face queimada, e Ndia no.
Captulo XV
F OI ento que soou aquele disparo.
Foi ento quando Dan abriu os olhos de novo e viu que
uma lanterna iluminava fantasmagricamente Ndia. O
jorro de luz descobriu seu gesto de agonia, suas feies
crispadas, seu ltimo trejeito antes de atravessar a
fronteira do alm. Dan percebeu que a bala lhe atravessara
o corao, e de que aquele disparo providencial lhe salvara
a vida . A pessoa que acabara de disparar da porta no
tivera outra escolha para tratar de evitar um novo crime.
Ndia caiu silenciosamente, soltando sua faca e sua
lanterna. Foi essa lanterna que iluminou fugazmente a
figura de Nora, uma figura que continha os soluos e que
acabara de deixar cair a arma bruscamente por terra.
Mas no foi isso s que aturdiu Dan.
Foi tambm seu rosto.
Porque agora aquele rosto no apresentava nenhuma
cicatriz e nenhuma queimadura! Porque era o rosto puro e
limpo de uma maravilhosa mulher!
Ela, sem dizer uma palavra, aproximou-se de Dan e
libertou-o de suas ligaduras. Os dedos do homem foram
molhados pelas lgrimas de Nora, que soluava
espasmdicamente. S quando le ficou livre, quando pde
ficar de p e sust-la em seus braos, ela deixou de chorar.
No tinha outro remdio. Um segundo mais e ela
teria conseguido mat-lo.. . At agora no vi qual era o
mistrio dessa casa.. . Perdoa-me pela desconfiana de
antes, Dan.
Compreendo, Nora. E talvez tenha sido melhor
assim. Para Ndia, a vida se transformara num inferno,
como em certo modo o era. Mas que fz de suas
queimaduras ? Como possvel qu.. . ?
Tratava-se de matria plstica aderida pele. Agora
muito fcil conseguir esses efeitos,
Que pretendia?
A melhor reportagem de minha vida. Queria
averiguar a verdade sobre a lenda de Black Tower.
Fim