No dia 11 de outubro de 1967, uma quarta-feira, os jornais brasileiros noticiaram a confirmação da morte de Ernesto Guevara de la Serna ocorrida dois dias antes. Logo no dia seguinte à notícia, Claudio Tozzi iniciava um painel, Guevara,...
moreNo dia 11 de outubro de 1967, uma quarta-feira, os jornais brasileiros noticiaram a confirmação da morte de Ernesto Guevara de la Serna ocorrida dois dias antes. Logo no dia seguinte à notícia, Claudio Tozzi iniciava um painel, Guevara, vivo ou morto¿, em homenagem ao guerrilheiro e à revolução propagada por ele. Em dezembro do mesmo ano, esse trabalho foi violentado por policiais que forçaram a retirada da obra do IV Salão de Arte Moderna do Distrito Federal. A partir disso, esta dissertação inicia com uma fala, ancorada em uma abordagem fenomenológica, sobre o painel de Tozzi, aborda-o como vítima e testemunha do terrorismo de Estado operado pela ditadura militar brasileira (1964-1985), bem como ato de resistência a esse regime. O artista, estudante de arquitetura na época, aproximou-se de um pensamento específico ligado ao paradigma construtivo em relação ao fazer artístico, o que o levou a pensar a obra de arte enquanto um produto do trabalho realizado sobre um campo estruturado. Ademais, Tozzi esteve envolvido com o movimento estudantil, com os protestos de rua e também frequentou grupos que formaram alguns dos quadros da luta revolucionária de libertação nacional como resistência à ditadura militar instaurada no Brasil com o golpe de 1964, principalmente a partir de seu envolvimento com a Ação Libertadora Nacional (ALN) de Carlos Marighella. Sendo assim, o painel, que foi o primeiro de uma série de trabalhos dedicados ao "Che", iniciou o memorial do artista ao comandante da Revolução Cubana e operou dois desígnios conectados: homenagem ao ideólogo do foco guerrilheiro e trabalho do luto. Sobre o segundo, podemos dizer que a repetição das imagens de Guevara, que ocorre em vários trabalhos produzidos por Claudio Tozzi no período 1967-1968, estava relacionada à tarefa psíquica de desprendimento do objeto da perda. Entretanto, os Guevaras, assim como as Marilyns de Andy Warhol, são marcados por um caráter paradoxal: há o desligamento da libido em relação ao objeto perdido, ao mesmo tempo que há uma fixação obsessiva neste e, talvez, uma identificação com este, que resultaria em uma abertura para o significado traumático. A seguir, identificamos uma série de trabalhos realizados por outros artistas a partir da apropriação de fotografias de "Che" Guevara, como os argentinos Antonio Berni, Roberto Jacoby e Carlos Alonso, com os quais efetuamos algumas aproximações e distanciamentos em relação às obras de Tozzi. Desde uma leitura comparativa efetuada entre obras que apresentam cadáveres em diversos períodos da história da arte, concluímos que as fotografias de Guevara morto nos propõem, de um lado, uma narrativa do martírio, tal qual o de Jesus Cristo, mas que, por outro lado, reforçam a imagem do cadáver como exemplo de uma advertência política. Por fim, ao desenharmos um histórico das proposições de arte engajada, tratamos de algumas questões para um debate sobre essa no Brasil dos anos 1960.