Estudos de Literatura - Ensino Médio e Vestibulares
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Literatura para o
Ensino Médio e
Vestibulares
Honneur Monção
CopyMarket.com
Título: Literatura Brasileira para Vestibulares
Todos os direitos reservados.
Autor: Honneur Monção
Nenhuma parte desta publicação poderá ser
Editora: CopyMarket.com, 2000
reproduzida sem a autorização da Editora.
As Gerações
É ponto pacífico que, na literatura brasileira há, pelo menos três romantismos: o nacionalista, o individualista e o
social. Para explicar esse fato, Karl Mannhein oferece-nos um enfoque sociológico. As transformações
resultantes da Revolução Francesa, em diversos planos da vida, geraram o descontentamento de vários
segmentos sociais:
1 - A aristocracia foi deslocada do centro do poder e elege o passado como fulcro de suas aspirações de
recuperação da glória e do esplendor perdidos. Seu conservadorismo ressentido desconfia do progresso e da vida
coletiva. Daí o mergulho nos temas que elegem o heroísmo, o medievalismo, a religiosidade, a tradição, o
passado remoto em geral, a natureza e a idealização dos personagens e do amor.
2 - A burguesia em ascensão dividiu-se em dois segmentos, se não antagônicos, pelo menos divergentes:
a) os que, tendo ficado marginalizados do poder, mergulharam no pessimismo, no negativismo, no
escapismo, na exasperação egótica; seus temas prediletos são a morbidez, o tédio, o satanismo, a boêmia,
o sonho, o erotismo irrealizado.
b) os que assumiram a atitude liberal-progressista, rebelando-se contra as instituições anacrônicas.
Engajados nas grandes causas sociais, os temas constantes são: a liberdade, os proletários oprimidos pela
Revolução Industrial na Europa, os escravos na América, a causa republicana, a exaltação do progresso.
O Brasil da 2ª metade do séc. XIX é uma nação agrária, atrasada, periférica no contexto mundial — veja o leitor
que nada mudou desde então —, não se podendo transplantar cabalmente a realidade européia para o contexto
brasileiro. Os temas literários, contudo, são praticamente idênticos e possibilitam essas aproximações:
A 1ª geração — década 1840/50 — (Indianista ou Nacionalista), de Gonçalves de Magalhães, Gonçalves Dias
(inclusive a ficção de Alencar).
A 2ª geração — década 1850/60 — (Byroniana, do Mal-do-Século, Individualista ou Ultra-Romântica), de
Álvares de Azevedo, Casimiro de Abreu, Fagundes Varela etc
A 3ª geração — década 1860/70 — (Condoreira, Social ou Hugoana), representada, principalmente, por
Castro Alves.
Castro Alves (1847-1871) surgiu para a literatura numa época particularmente agitada da vida política brasileira. A
efervescência ideológica do período contaminou a literatura e fez da poesia um púlpito em que se veiculavam
idéias novas e se procurava atrair adeptos e correligionários. O teatro e as praças públicas tornaram-se palco de
inflamados discursos poéticos, declamados ardorosamente pelos próprios autores.
Nesses precursores dos “showmícios” modernos, discutia-se a proclamação da república, a Guerra do Paraguai, a
reforma do ensino, a abolição da escravatura e os demais problemas políticos, sociais, filosóficos e ideológicos
que afligiam a intelectualidade do Império do Brasil.
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Castro Alves, jovem, bonito, galante, inflamado, culto e indiscutivelmente genial, chegou e empolgou as platéias
com seu discurso de tom elevado e sua figura bela e empolgante, o poeta chegava na hora certa. Foi consagrado
principalmente porque sua eloqüência agradava muitíssimo ao público da época em que viveu.
Seu tema predileto, mas não único, foi a escravidão. Os poemas de cunho social abarcam quase todo o rosário
preferido pela poesia da época. Na poesia abolicionista, é insuperável a marca do gênio baiano. Seu clamor por
liberdade e suas invectivas contra a mancha obscena da escravatura não encontram paralelo em nenhuma época e
em nenhum autor da literatura brasileira.
As imagens grandiosas, hiperbólicas, reforçadas por apóstrofes e antíteses provocantes, a linguagem enfática e
altissonante são marcas da escola condoreira — hugoana — de que ele é o representante maior em nossas letras.
No poeta das Espumas Flutuantes, essas características não se encontram apenas em poemas de temática que se
pode chamar épica, porque abordam grandes questões coletivas, mas aparece também em poemas propriamente
líricos, seja os de tema amoroso, seja os que nos revelam o poeta como um admirável pintor de paisagens.
Suas imagens, quase sempre arrojadas e intensas, costumam alternar o pequeno e o grandioso e têm uma espécie
de atração cósmica e telúrica indiscutível — uma preferência pelos magnos elementos da natureza, como
oceanos, céus, noite, estrelas, montanhas e tufões.
{©O poeta exercitou seu estro também na poesia lírico-amorosa, de forma dissonante em relação aos demais
românticos, pois revela-se por uma poesia sensual e, por vezes, extremamente erótica. Sua expressão amorosa é
prenhe de sensualidade, e a configuração da mulher, nos momentos mais marcantes de seus poemas eróticos, é
destacada por uma realidade, uma "carnalidade" inexistente na poesia de seus coetâneos e predecessores
próximos ou distantes, que tendiam à pura idealização feminina, seja na figura da mulher-anjo, seja na da mulher-
demônio.
Castro Alves, diferentemente, fala de mulheres reais, mulheres que são, por assim dizer, motivo de lubricidade;
de realização e de frustração amorosa, mas palpáveis, virtuosas ou pecaminosas.
A leitura dos poemas de Castro Alves remete-nos para um momento eletrizante da vida brasileira, em que várias
correntes de pensamento se entrecruzavam em choques ideológicos marcantes e apaixonantes. O poeta bem
soube erigir o seu monumento literário que tem o dom de congregar homens de diferentes épocas na reflexão
sobre uma realidade de profunda significação humana e social.
A poesia de Gonçalves Dias reveste-se de maior elaboração estética e já dentro dos padrões românticos. Mais
conhecido como poeta indianista, escreveu também poemas lírico-amorosos da mais perfeita extração de
sentimentalidade romântica.
O mais famoso dos poemas de Gonçalves Dias, cantado em prosa e verso, imitado, plagiado, parafraseado,
parodiado e admirado desde que foi escrito, a Canção do Exílio, fala-nos bem próximo do amor exagerado à terra
natal. Lembrando a Carta de Caminha, podemos dizer que o sentimento ufanista perpassa a literatura brasileira
numa constante bem perceptível e este poema é um de seus modelos mais bem acabados.
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TEXTO I — Canção do Exílio
Kennst du das Land, wo die Zitronen blühn,
Im dunkeln Laub die Gold-orangen glühn,
...................................................
Kennst du es wohl? - Dahin! Dahin!
Möcht ich ... ziehn.
(Goethe)
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(1) O mesmo que Pajé. Espécie de médico e sacerdote.
(2) O gênio do mal.
(3) Divindade dos índios norte-americanos e canadenses. Eqüivale a Tupã, o deus maior.
Entretanto também explora um veio questionador do sofrimento em razão do amor. Numa linguagem vibrante,
mas destituída do descabelamento e das lágrimas tão presentes em outros autores românticos, Gonçalves Dias
estabelece constantes reflexões poéticas em torno do “mal-de-amor”, lembrando, e preservando de maneira
admirável, as mais caras tradições líricas da poesia medieval portuguesa;
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Na poesia lírico-amorosa o sentimento constante é o da incerteza, da dúvida diante do sentimento amoroso.
Incapaz de fixar-se no objeto de seu amor, o sujeito-poético manifesta seu inconformismo pela dor da
irrealização plena, da posse do objeto de seu amor.
Se é cobiçar-te, querer-te
Como uma bênção dos céus
A ti somente na terra
Como lá em cima a Deus;
A obra poética de GD destaca-se no panorama do Romantismo brasileiro como a de maior equilíbrio entre os
planos da forma e do conteúdo. Representa ele o manancial em que se vão abeberar os mais diferentes autores
românticos e posteriores, servindo de modelo e inspiração para um sem número de composições — boas e más
— que constituem nosso acervo cultural.
A chamada Segunda Geração Romântica marca o apogeu, na literatura brasileira, do egocentrismo e da emoção
exacerbada. Voltados inteiramente para o seu próprio interior, os poetas dessa fase produziram poemas
pessimistas, entediados da existência e profundamente desencantados da vida. A temática predominante é a
morte, a solidão, a tristeza, a melancolia e o sofrimento amoroso. Escritos, por assim dizer, ao correr da pena,
sem a preocupação em reformar o texto, e por jovens poetas que, quase todos, morreram na flor da idade, os
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textos dessa geração revelam, às vezes, um sentimentalismo piegas e exagerado que compromete a qualidade do
trabalho artístico.
Perpassando tais textos, encontramos:
Observe no texto o erotismo que, como característico da poesia de Álvares de Azevedo, só se realizava no
sonho, na fantasia.
QUESTÃO 01 — Na temática de Casimiro de Abreu, como ilustra a estrofe acima, salientam-se os sentimentos
de:
A) ternura e desencanto.
B) timidez e melancolia.
C) amor e medo.
D) amargura e revolta.
E) alegria e encantamento.
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QUESTÃO 03 — Tipicamente romântico, o fragmento do poema acima revela-nos:
A) a atitude panteísta.
B) a idealização da mulher.
C) o tom egocêntrico e o senso do mistério.
D) a fé no poder criador.
E) a consciência da solidão e a proximidade da morte.
QUESTÃO 05 — Na época da independência do Brasil, quando nosso país precisava auto-afirmar-se como
nação, entrou em vigência entre nós um estilo de época que, pelos ideais de liberdade que professava através de
sua ideologia, se prestava admiravelmente a expressar esses anseios nacionalistas. Tal estilo foi o Romantismo.
Assinale a alternativa que melhor representa o nacionalismo romântico.
A) Meu canto de guerra / Guerreiros ouvi. / Sou filho das selvas, / Nas selvas cresci.
B) Quando eu te fujo e me desvio cauto / da luz de fogo que te cerca, ó bela!
C) Deus, ó Deus, onde estás que não respondes? / Em que mundo, em qu’estrela tu
t’escondes?
D) Ó que saudades que eu tenho, / Da aurora da minha vida.
E) Dormir aos berros da arenosa praia / da ruinosa Alcântara, evocando...
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prenhe de sensualidade, e a configuração da mulher, nos momentos mais marcantes de seus poemas eróticos, é
destacada por uma realidade, uma "carnalidade" inexistente na poesia de seus coetâneos e predecessores
próximos ou distantes, que tendiam à pura idealização feminina, seja na figura da mulher-anjo, seja na da mulher-
demônio.
Castro Alves, diferentemente, fala de mulheres reais, mulheres que são, por assim dizer, motivo de lubricidade;
de realização e de frustração amorosa, mas palpáveis, virtuosas ou pecaminosas.
A leitura dos poemas de Castro Alves remete-nos para um momento eletrizante da vida brasileira, em que várias
correntes de pensamento se entrecruzavam em choques ideológicos marcantes e apaixonantes. O poeta bem
soube erigir o seu monumento literário que tem o dom de congregar homens de diferentes épocas na reflexão
sobre uma realidade de profunda significação humana e social.
QUESTÃO 02. Levando em conta a estruturação sintático—semântica do poema, pode-se afirmar que:
(1) O primeiro verso da segunda estrofe caracteriza uma figura de linguagem denominada animismo.
(2) Os vocábulos pugna (v. 1) e pugilato (v. 23) apresentam o mesmo semantema.
(3) O tema fundamental do poema é o episódio de Canudos, também retratado por Euclides da Cunha
em sua mais célebre obra: "Os Sertões".
(4) Todas as rimas do poema são ricas e consoantes.
(5) A segunda estrofe é bom exemplo de paralelismo em todos os níveis de organização do idioma:
fônico, lexical, sintático e semântico.
QUESTÃO 03 — Julgue os itens a seguir, com base no texto "Ode ao Dous de Julho".
(1) No período "O mundo perguntava erguendo um grito", a oração grifada é subordinada adverbial
modal reduzida de gerúndio.
(2) A oração "Qual dos gigantes morto rolará?!..." é subordinada substantiva objetiva direta.
(3) O núcleo do sujeito da oração do item (1) é gigantes.
(4) Em "Qual dos gigantes mortos rolará?!..." e "Não sei qual é o seu nome", o pronome interrogativo
QUAL é adjunto adnominal, no primeiro período e predicativo do sujeito, no segundo período.
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(5) A segunda oração do segundo período do item (3) é subordinada substantiva objetiva direta
justaposta.
QUESTÃO 04. Julgue os itens a seguir, com base no texto "Ode ao Deus de Julho".
(1) Em "A pugna imensa travara-se nos cerros da Bahia", o termo grifado é pronome apassivador.
(2) Transpondo para a voz passiva analítica a oração do item (1), temos: A pugna imensa fora travada
nos cervos da Bahia.
(3) Em "Não! Não eram dous povos, que abalavam / Naquele instante o solo ensangüentado..." Que é
pronome relativo com função sintática de sujeito.
(4) A segunda oração do período supracitado é subordinada adjetiva explicativa.
(5) Na palavra ensangüentado, há 13 letras, 10 fonemas e três dígrafos vocálicos.
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A Literatura do Simbolismo
Honneur Monção
A arte literária é, por sua própria natureza, essencialmente simbólica. Por isso mesmo, falar de símbolo, em
Literatura não é nenhuma novidade.
No final do século XIX surgiram várias correntes estéticas que se entrecruzavam na busca de uma nova forma de
expressão artística. O Simbolismo foi uma delas, aprofundando o subjetivismo romântico, purificado do excesso
de lágrimas e de pieguice, e teve uma curta duração na Literatura brasileira, já pelo seu elitismo e refinamento, já
pelo "sufocamento" a que foi submetido pela avalanche da poesia parnasiana.
Aprofundando o sentimentalismo e o emocionalismo românticos, o Simbolismo vem instaurar uma espécie de
"tomada de consciência" dos estados emocionais, numa atitude que entrelaça a afetividade com a cognição. Esta
atitude promove a chamada "busca do eu-profundo" em que o poeta mergulha dentro de si mesmo e examina os
desvãos íntimos do inconsciente, sentindo-os, e examinando-os e perquirindo-os .
Na revelação dos resultados desta introspecção, os textos vêm carregados de uma linguagem nova, enriquecidos
por neologismos, arcaísmos, exotismos e grafismos indispensáveis à comunicação da novidade estética.
Percebe-se, por conseguinte, que se trata de uma mudança radical da forma de expressão literária, elevando a
Literatura a cimos ainda não alcançados em qualquer estética anterior em sua original forma de manifestar-se.
Origens e Caracterização
Encontram-se nos poemas de As Flores do Mal, de Charles Baudelaire, em 1857, as origens mais notáveis e
próximas da estética simbolista. É consensual a idéia de que praticamente toda a poesia moderna — e não só o
Simbolismo — teve origem nessa profunda alteração na arte da elaboração poética que veio desmitificar a poesia,
incorporando-a à existência de um homem já sem mitos e sem deuses.
O satanismo irreverente e corrosivo de Baudelaire é a matriz de uma poesia que anseia por libertação de todas as
limitações e "insulamentos" da expressão poética. Sua "Teoria das Correspondências" entende que os sentidos
corpóreos, a emoção e a espiritualidade interagem no momento exato da percepção da realidade exterior. Assim,
as cores, os aromas, o pensamento incorporam-se em sinestesias insólitas e sugestivas da realidade.
CORRESPONDÊNCIAS
Os conceitos embutidos neste soneto são fundamentais para o entendimento da estética simbolista. A imagem da
correspondência de cores e sons, da integração sensorial representam de fato o ideal de expressão poética
perseguido pelos poetas do movimento.
Em poemas simbolistas é sempre presente uma camada sonora extremamente rica, pela aproximação obsessiva
da poesia com a música. O ideal estético simbolista estabelecia uma relação íntima dos sons das palavras com a
música, daí a presença constante das assonâncias e aliterações que, associadas às sinestesias e ao cromatismo,
corporificam a "Teoria das Correspondências" e conferem ao poema um caráter sugestivo-sensorial de extrema
beleza.
{©O Simbolismo português tem seu marco inicial nos poemas publicados nas revistas "Os Insubmissos" e "Boêmia
Nova", ambas em 1889, com colaborações de Eugênio de Castro, Antônio Nobre, Camilo Pessanha e outros.
Seguindo os passos de Baudelaire, Mallarmé, Rimbaud e Verlaine, os autores portugueses elaboraram poemas
carregados de musicalidade, espiritualidade e sugestões da realidade. Apartados da técnica fria típica do
Parnasianismo, mas conscientes do valor do plano da expressão, souberam casar a forma e o conteúdo de tal
maneira que o resultado são poemas que falam bem de perto ao espírito e não descuram da riqueza expressiva da
língua portuguesa.
Antônio Nobre
Soneto
Na praia lá da Boa Nova, um dia,
Edifiquei (foi esse o grande mal)
Alto Castelo, o que é a fantasia,
Todo de lápis-lazúli e coral!
NOBRE, Antônio. In TORRES, Alexandre Pinheiro (org.). Antologia da poesia portuguesa. Porto:
Lello & Irmão, 1977.
A poesia de Antônio Nobre revela opulenta musicalidade e ritmo, alternando um vocabulário refinado, próprio
da estética simbolista, com um registro mais coloquial e familiar. Explorou temas mais ligados ao pessimismo, ao
tédio existencial, ao confessionalismo intimista e à morte
SONETO
1. Ó Virgens que passais, ao Sol-poente,
2. Pelas estradas ermas a cantar!
3. Eu quero ouvir uma canção ardente,
4. Que me transporte ao meu perdido Lar.
Eugênio de Castro
UM SONHO
Na messe , que enlourece, estremece a quermesse ...
O sol, o celestial girassol, esmorece ...
E as cantilenas de serenos sons amenos
Fogem fluidas, fluindo à fina flor dos fenos...
As estrelas em seus halos
Brilham com brilhos sinistros ...
Cornamusas e crotalos
Cítolas, citaras, sistros,
Soam suaves, sonolentos,
Sonolentos e suaves,
Em suaves,
Suaves, lentos lamentos
De acentos
Graves,
Suaves ...
CASTRO, Eugênio de. In: TORRES, Alexandre Pinheiro (org.). Antologia da poesia portuguesa:
Porto, Lello & Irmão, 1977.
Já a partir do título o poema sugere uma situação que transcende a realidade palpável. A presença maciça das
aliterações e assonâncias; as sinestesias e o vocabulário refinado incorporam claramente a arte poética típica do
Simbolismo.
O autor é considerado o iniciador e um dos mais expressivos exemplos do Simbolismo português.
Camilo Pessanha
Soneto
Profundamente pessimista, incorporando a filosofia budista, segundo a qual o mundo é feito de ilusão e
sofrimento, Camilo Pessanha, em seus poemas, explora o prazer magoado de contemplar a passagem
inconsistente da vida. São textos sofridos, doentios, e marcado pelas imagens fluidas e efêmeras.
O Simbolismo no Brasil
Honneur Monção
Sob a influência dos simbolistas franceses, já na década de 1880 aparecem poemas antecipadores do Simbolismo,
que se foi desenvolvendo em grupos espalhados por praticamente todo o país.
É bem verdade que os livros didáticos restringem sua apreciação a dois principais poetas dessa fase — Cruz e
Sousa e Alphonsus dos Guimarãens — relegando ao esquecimento pelo menos uma meia centena de outros
bons autores. Este fato se deve, principalmente, em razão da concomitância do Simbolismo e do Parnasianismo,
de grande apelo popular em nosso meio.
A mera leitura de textos-propostas dos autores revela sua visão poética, preferência vocabular e temática, como
se percebe nos textos a seguir.
TEXTO II — AEIOU
{©João da Cruz e Sousa nasceu a 24 de novembro de 1862, na cidade do Desterro, atual Florianópolis, capital da
então província de Santa Catarina. Filho de dois negros escravos, trazia nas artérias sangue sem mescla da África,
e no profundo psiquismo milenárias forças adormecidas de angústia e sonho. Tiro a esta referência todo acento
literário, pois que de fato significa um puro dado positivo, indispensável à compreensão do destino e do canto do
Poeta Negro. Morreu a 19 de março de 1898, na cidade de Sítio, Minas, para onde fora transportado às pressas
vencido pela tuberculose. Nos seus trinta e seis anos de existência terrena, percorreu todo um ciclo de
experiências tremendas de sofrimento. Mas umas tantas circunstâncias propiciatórias, entre as quais essas
próprias experiências, salvaram para o Brasil, talvez mesmo para o mundo, toda uma soberba florada de Beleza
que, sem elas, não se haveria produzido.
Essas circunstâncias foram: a de haver sido amparado, na infância, por uma família de linhagem fidalga, que o
mandou instruir e o educou num sentimento grave da vida; a de haver sido combatido, desprezado, humilhado
quando extremamente já se lhe condensara na alma a energia criadora, o que deu lugar a que esta não se
dispersasse ao doce afago das alegrias do mundo; a de haver, no entanto, encontrado, no seio mesmo da
universal hostilidade, o apoio de miraculosas mãos compreensivas, que lhe afastaram os passos do desespero
definitivo; a de haver sido perpetuamente pobre e não ter conhecido nunca senão a face trágica de tudo, o que
serviu a dar estrutura e forma profundamente "funcionais" ao mundo de sonho, dor e desejo que nesse "núbio
contemporâneo de Davi" como que existia "desde toda a eternidade".
Inútil longamente explorar, no sentido biográfico, uma vida que só pela sua repercussão numa alma antiga de
poeta se revestiu de significação comovente. A Cruz e Sousa, de fato aconteceu apenas que, vindo para o Rio já
homem feito, após uma peregrinação pelo norte e o sul do país como "ponto" de uma companhia dramática,
nesta cidade lutou, casou, teve filhos, viu a mulher enlouquecer, sofreu miséria, amargou ultrajes e, por fim,
entisicou, saindo à última hora para morrer sob o benigno céu mineiro; vida esta que se reproduz em milhões de
exemplares no seio da população miserável do Brasil. Havia, porém, essa "alma antiga". Houve a conjunção de
circunstâncias que resultaram no seu canto imortal. Este canto é que, no fim de contas, nos importa.
A obra de Cruz e Sousa, afora alguns inéditos de importância mínima, se compendia nos seguintes volumes:
Missal e Broquéis, publicados em 1893, o primeiro de prosa, o segundo de poemas, únicos livros aparecidos ainda
em vida do poeta; depois de sua morte, por diligência de amigos, principalmente de Nestor Vítor, vieram a lume:
Evocações, prosa, em 1898; Faróis, poemas, em 1900; Últimos Sonetos, em 1905.
O crítico literário francês Roger Bastide catalogou, na obra de Cruz e Sousa, a ocorrência de 169 (cento e
sessenta e nove) ocorrências de imagens associadas à cor branca. Tanto bastou para que se imaginasse logo que o
poeta tinha a fixação pela cor, numa ânsia de se "branquear" por intermédio de sua poesia. Esta hipótese — e
não passa de uma hipótese — pode ser contraditada por uma verdade observável na obra de outros simbolistas
de relevo.
A cor branca, na cultura ocidental, sempre foi símbolo de pureza ou de purificação. Simbolicamente, as noivas
casam-se de branco e com flores brancas ornando suas frontes. Uma estética que busca evadir-se de um mundo
considerado impuro, defeituoso, manchado não poderia deixar de eleger a cor branca como uma de referências
prediletas. Assim, é comum encontrar-se em poemas simbolistas imagens emolduradas por nuvens, estrelas,
brilhos, neve, névoa, cristais, espuma, pérolas, cascatas, véus, marfim, lírio, linho, lençóis e outras que
lembram o branco.
O exotismo da linguagem é próprio da preferência por um universo misterioso, sugestivo e que foge a qualquer
tipo de percepção racional:
FLORES DA LUA
O poema Siderações, a seguir, revela a obsessão pela cor branca, e o desejo de transcendência, ao ponto de
suprema integração psíquica e espiritual, ao mistério da noite infinda.
A tortura moral diante do preconceito; o acúmulo de incertezas, o tumulto psicológico, o erotismo contido e a
visão trágica e pessimista da vida podem ser percebidas nos versos a seguir.
TÉDIO
Um vocabulário sinistro, tétrico, fúnebre, cadavérico, cuja contundência verbal e temática são agressivamente
"pouco poéticas" conferem ao texto um sentido mais de asco que de tédio existencial como sugere o título. Esta
linha poética anticonvencional será retomada mais tarde, vigorosamente, por Augusto dos Anjos.
O exotismo da linguagem é próprio da preferência por um universo misterioso, sugestivo e que foge a qualquer
tipo de percepção racional:
FLORES DA LUA
O poema Siderações, a seguir, revela a obsessão pela cor branca, e o desejo de transcendência, ao ponto de
suprema integração psíquica e espiritual, ao mistério da noite infinda.
SIDERAÇÕES
A tortura moral diante do preconceito; o acúmulo de incertezas, o tumulto psicológico, o erotismo contido e a
visão trágica e pessimista da vida podem ser percebidas nos versos a seguir.
Um vocabulário sinistro, tétrico, fúnebre, cadavérico, cuja contundência verbal e temática são agressivamente
"pouco poéticas" conferem ao texto um sentido mais de asco que de tédio existencial como sugere o título. Esta
linha poética anticonvencional será retomada mais tarde, vigorosamente, por Augusto dos Anjos.
A obsessão da morte, em Alphonsus dos Guimaraens, difere da atitude mórbida de outras estéticas. A morte é
vista e ansiada como libertação e como possibilidade de reaproximação da amada na esfera em que o absoluto —
Deus — oferece a superação da dor de viver.
SONETO XIV
Poeta realmente religioso, devoto da Virgem Maria, assume sua religiosidade emocional, mas contida, numa
atitude de aceitação e êxtase místico.
SEGUNDA DOR
OBSERVAÇÃO:
O Setenário das Dores de Nossa Senhora constitui-se de 49 sonetos dedicados às Sete Dores da Virgem Maria,
conforme a tradição ritual católica. É obra referencial do lirismo mariano e litúrgico de Alphonsus.
ROSAS
Rosas que já vos fostes, desfolhadas
Por mãos também que já se foram, rosas
Suaves e tristes! Rosas que as amadas,
Mortas tombam, beijaram suspirosas ..
Mão e a Luva
Honneur Monção
DO AUTOR
Machado de Assis, na atualidade, transformou-se em uma das raras unanimidades nacionais. Raramente passa-se
uma semana sem que algo de novo em torno do autor e de sua obra seja publicado, republicado, discutido,
analisado por críticos, entendidos ou meros curiosos.
O Autor é praticamente inseparável do conceito de Literatura brasileira. Nascido, criado e radicado por toda sua
vida no Rio de Janeiro, seus romances, crônicas, contos, poemas e peças teatrais, que foi um de nossos mais
perfeitos polígrafos, elegem como cenário a então capital do Brasil, na segunda metade do século XIX.
Entretanto, mesmo com esse cenário e tempo histórico imutável, explora sua temática com tal maestria e
propriedade que o texto torna-se anaespacial e atemporal, fazendo o leitor passar despercebido por limites que
em outras circunstâncias “datariam” a obra.
DA OBRA
Fazendo parte da obra dita “romântica” de Machado de Assis, A Mão e a Luva inova o romance romântico
tradicional, no sentido de criar situações e personagens em que o móvel das ações humanas não mais se restringe
ao amor puro e simples, mas volta-se para o aspecto social em que o desejo de ascender socialmente, mesmo à
custa do sacrifício afetivo, ético e moral. Basta essa visão para perceber-se a mudança radical: Guiomar, a
heroína, em que pesem os dotes físicos de extrema feminilidade e beleza — o que é típico do romance romântico
—, revela um comportamento em que a determinação, a frieza, a hipocrisia governam as atitudes que têm
sempre o fito de atingir o objetivo delineado e perseguido implacavelmente.
A linguagem, o vocabulário, a tessitura e algumas atitudes são, claramente, românticos. Entretanto os
protagonistas — Guiomar e Luís Alves — seriam facilmente, se isso fosse possível, transplantados para um
“romance realista” sem que houvesse necessidade da qualquer mudança em sua caracterização psicológica e
comportamento social. Percebe-se, por conseguinte, que os romances dessa fase são como o “treinamento” para
o grande ficcionista que viria a seguir.
"ADVERTÊNCIA DE 1814
Esta novela, sujeita às urgências da publicação diária, saiu das mãos do autor capítulo a capítulo, sendo natural
que a narração e o estilo padecessem com esse método de composição um pouco fora dos hábitos do autor. Se a
escrevera em outras condições, dera-lhe desenvolvimento maior e algum mais aos caracteres, que aí ficam esboçados.
Convém dizer que o desenho de tais caracteres, — o de Guiomar sobretudo, — foi o meu objeto principal,
se não exclusivo, servindo-me a ação apenas de tela em que lancei os contornos dos perfis. Incompletos embora, terão
eles saído naturais ou verdadeiros?
Mas talvez estou eu a dar proporções muito graves a uma cousa de tão pequeno tomo. O que vai aí são umas
poucas páginas que o leitor esgotará de um trago, se elas lhe aguçarem a curiosidade, ou se lhe sobrar alguma hora
que absolutamente não possa empregar em outra cousa, — mais bela ou mais útil."
"O destino não devia mentir nem mentiu à ambição de Luís Alves. Guiomar acertara; era aquele o
homem forte. Um mês depois de casados, como eles estivessem a conversar do que conversam os
recém-casados, que é de si mesmos, e a relembrar a curta campanha do namoro, Guiomar
confessou ao marido que naquela ocasião lhe conhecera todo o poder da sua vontade.
— Vi que você era homem resoluto, disse a moça a Luís Alves, que, assestado, a escutava.
— Resoluto e ambicioso, ampliou Luís Alves sorrindo; você deve ter percebido que sou uma e
outra cousa.
— A ambição não é defeito.
— Pelo contrário, é virtude; eu sinto que a tenho, e que hei de fazê-la vingar. Não me fio só na
mocidade e na força moral; fio-me também em você, que há de ser para mim uma força nova.
— Oh! sim! exclamou Guiomar.
— È com um modo gracioso continuou:
— Mas que me dá você em paga? um lugar na câmara? uma pasta de ministro?
— O lustre do meu nome, respondeu ele.
Guiomar, que estava de pé defronte dele, com as mãos presas nas suas, deixou-se cair lentamente
sobre os joelhos do marido, e as duas ambições trocaram o ósculo fraternal. Ajustavam-se ambas,
como se aquela luva tivesse sido feita para aquela mão.
ENREDO
Guiomar é moça de origem humilde, órfã, mantida em uma escola para formação de professores por uma
protetora rica. Surge um pretendente — Estevão — e ela o descarta porque ele não encarnava o ideal de homem
que ela imaginara para marido. Deixando a escola e indo viver como filha, em casa de sua protetora, reencontra o
antigo namorado que procura, por todos os modos, reatar o namoro.
Guiomar tivera humilde nascimento; era filha de um empregado subalterno não sei de que repartição do Estado,
homem probo, que morreu quando ela contava apenas sete anos, legando à viúva o cuidado de a educar e manter. A
viúva era mulher enérgica e resoluta, enxugou as lágrimas com a manga do modesto vestido, olhou de frente para a
situação e determinou-se à luta e à vitória.
A madrinha de Guiomar não lhe faltou naquele duro transe, e olhou por elas, como entendia que era seu dever. A
solicitude, porém, não foi tão constante a princípio como veio a ser depois; outros cuidados de família lhe chamavam
a atenção.
Guiomar anunciava desde pequena as graças que o tempo lhe desabrochou e perfez. Era uma criaturinha galante e
delicada, assaz inteligente e viva, um pouco travessa, decerto, mas muito menos do que é usual na infância. Sua
mãe, depois que lhe morrera o marido, não tinha outro cuidado na Terra, nem outra ambição mais, que a de vê-Ia
prendada e feliz. Ela mesma lhe ensinou a ler mal, como ela sabia, e a coser e bordar, e o pouco mais que possuía
de seu ofício de mulher. Guiomar não tinha dificuldade nenhuma em reter que a mãe lhe ensinava, e com tal afinco
lidava por aprender, que viúva, — ao menos nessa parte, — sentia-se venturosa. Hás de ser minha doutora, dizia-
lhe muita vez; e esta simples expressão de ternura alegrava a menina e lhe servia de incentivo à aplicação.
Já agora há outro que — Jorge —, sobrinho e protegido da madrinha de Guiomar. Jorge conta, em suas
investidas, com o auxílio poderoso de Mrs. Oswald, dama de companhia da baronesa.
Era um rapaz de vinte e cinco a vinte e seis anos. Jorge chamava-se ele; não era feio, mas a arte estragava um pouco
a obra da natureza. O muito mimo empece a planta, disse o poeta, e esta máxima não é só aplicável à poesia, mas
também ao homem. Jorge tinha um lindo bigode castanho, untado e retesado com excessivo esmero. Os olhos, claros
e vivos, seriam mais belos, se ele não os movesse com afetação, às vezes feminina. O mesmo direi dos modos, que
seriam fáceis e naturais, se os não tornasse tão alinhados e medidos. As palavras saíam-lhe lentas e contadas, como
a fazer sentir toda a munificência do autor. Não as proferia como as demais pessoas; cada sílaba era por assim
dizer espremida, sendo fácil ver ao cabo de alguns minutos, que ele fazia consistir toda a beleza da elocução nesse
alongar do vocábulo. As idéias orçavam pelo modo de as exprimir; eram chochas por dentro, mas traziam uma
côdea de gravidade pesadona, que dava vontade de ir espairecer o ouvido em cousas leves e folgazãs.
Tais eram os defeitos aparentes de Jorge. Outros havia, e desses, o maior era um pecado mortal, o sétimo. O nome
que lhe deixara o pai, e a influência da tia podiam servir-lhe nas mãos para fazer carreira em alguma cousa
pública; ele, porém, preferia vegetar à toa, vivendo do pecúlio que dos pais herdara e das esperanças que tinha na
afeição da baronesa. Não se lhe conhecia outra ocupação.
Não obstante os defeitos apontados, havia nele qualidades boas; sabia dedicar-se, era generoso, incapaz de
malfazer, e tinha sincero amor à velha parenta. A baronesa, pela sua parte, queria-lhe muito. Guiomar e ele eram
as suas duas afeições principais, quase exclusivas.
Tal era a pessoa cujos interesses defendia Mrs. Oswald, por amor da baronesa, e não menos de si própria. A
baronesa também tinha os seus sonhos, como ela mesma disse, e esses eram deixar felizes aquelas duas crianças.
Jorge pela sua parte estava disposto a estender o colo ao sacrifício; e, bem examinadas as cousas, talvez amasse
sinceramente a moça. A diferença entre ele e Estevão é que seu amor era medido como os seus gestos, e tão
superficial como as suas outras impressões.
A este triângulo amoroso, formado por Jorge, Estevão e Guiomar, acrescenta-se Luís Alves, amigo de Estevão e
vizinho de Guiomar, que passa a assediá-la de maneira discreta e eficiente.
Durante três dias deixou Luís Alves de ir à casa da baronesa, estando aliás a morrer por isso. Entrava porém no
plano esta ausência; era das instruções que ele mesmo dera ao seu coração; não havia, remédio senão observá-las.
No quarto dia recebeu um bilhete da baronesa que o cumprimentava pela eleição. A mala do Norte chegara, e com
ela a notícia da vitória eleitoral. Estava Luís Alves deputado; ia enfim dar a sua demão no fabrico das leis.
Estêvão foi o primeiro que o felicitou; era o antigo companheiro dos bancos da academia; tanto ou mais do que os
outros devia aplaudir aquela boa fortuna. Não lhe escondeu, entretanto, a inveja que ela lhe metia:
— Deputado! suspirou ele. Oh! eu também podia ser
deputado.
Estêvão dizia isto, como a criança deseja o dixe que vê no colo de outra criança, nada mais. Eram os seus sonhos
de outrora, que renasciam tais quais eram, inconsistentes, vagos, prestes a dissiparem-se com o primeiro raio da
manhã.
Mrs. Oswald toma o partido de Jorge e tenta convencer Guiomar a dar-lhe a preferência, pois, segundo ela, a
baronesa faria muito gosto nesta união. Guiomar, entretanto, tem outros planos. Ela não aceita que ninguém,
nem nada, tolha seus planos de grandeza. Deseja um marido que seja ambicioso, forte, atrevido, inescrupuloso,
capaz de vencer todos os obstáculos para manter-se sempre em posição privilegiada e superior. Este homem é
Luís Alves e ela o incentiva a pedir sua mão à baronesa, preterindo os pretendentes que não preenchiam os
requisitos que ela traçara para o seu futuro marido.
Podia dar-lhe Luís Alves este gênero de amor? Podia; ela sentiu que podia. As duas ambições tinham-se
adivinhado desde que a intimidade as reuniu. O proceder de Luís Alves, sóbrio, direto, resoluto, sem
desfalecimentos, nem demasias ociosas, fazia perceber à moça que ele nascera para vencer e que a sua ambição tinha
verdadeiramente asas, ao mesmo tempo, que as tinha ou parecia tê-las o coração. Demais, o primeiro passo do
homem público estava dado; ele ia entrar em cheio na estrada que leva os fortes à glória. Em torno dele ia fazer-se
aquela luz, que era a ambição da moça, a atmosfera, que ela almejava respirar. Estêvão dera-lhe a vida
sentimental, Jorge a vida vegetativa; em Luís Alves via ela combinadas as afeições domésticas com o ruído exterior.
O destino não devia mentir nem mentiu à ambição de Luís Alves. Guiomar acertara; era aquele o homem forte.
Um mês depois de casados, como eles estivessem a conversar do que conversam os recém-casados, que é de si mesmos,
e a relembrar a curta campanha do namoro, Guiomar confessou ao marido que naquela ocasião lhe conhecera todo
o poder da sua vontade.
— Vi que você era homem resoluto, disse a moça a Luís Alves, que, assestado, a escutava.
— Resoluto e ambicioso, ampliou Luís Alves sorrindo; você deve ter percebido que sou uma e outra cousa.
— A ambição não é defeito.
— Pelo contrário, é virtude; eu sinto que a tenho, e que hei de fazê-la vingar. Não me fio só na mocidade e na
força moral; fio-me também em você, que há de ser para mim uma força nova.
— Oh! sim! exclamou Guiomar.
E com um modo gracioso continuou:
— Mas que me dá você em paga? um lugar na câmara? uma pasta de ministro?
— O lustre do meu nome, respondeu ele.
TEMPO NARRATIVO
Predomina o tempo cronológico, determinando uma narrativa lenta, compassada, arrastando-se por detalhes
muitas vezes dispensáveis, como se pode observar nos fragmentos a seguir.
Luís Alves acudiu-lhe com as pastilhas a consolação passou; nova palestra, novo riso, novo desespero, e assim se
foram escoando as horas da noite, que o relógio da sala de jantar batia seca e regularmente, como a lembrar
aos dous amigos que as nossas paixões não aceleram nem moderam o passo do tempo.
A aurora para os dous acadêmicos coincidiu com as badaladas do meio-dia, o que não admira, pois só
adormeceram quando ela começava a apagar as estrelas. Estêvão passou a noite, a manhã, quero dizer,
muito sossegado e livre de sonhos maus. Quando abriu os olhos estranhou o aposento e os objetos que o rodeavam.
Logo que os reconheceu, despertou-se-lhe, com a memória, o coração, onde já não havia aquela dor aguda da
véspera. Os sucessos, embora recentes, começavam a envolver-se na sombra crepuscular do passado.
A natureza tem suas leis imperiosas; e o homem, ser complexo, vive não só do que ama, mas também (força é dizê-
lo) do que come. Sirva isto de escusa ao nosso estudante, que almoçou nesse dia, como nos anteriores,
bastando dizer em seu abono que, se o não fez com lágrimas, também o não fez alegre. Mas o certo é que a
tempestade serenara; o que havia era uma ressaca, ainda forte mas que diminuiria com o tempo. — Luís Alves
evitou falar-lhe de Guiomar. Estêvão foi o primeiro a recordar-se dela.
Dá tempo ao tempo, respondeu Luís Alves, e ainda te hás de rir dos teus planos de ontem. Sobretudo,
agradece ao destino o haveres escalado tão depressa. E queres um conselho?
A promessa cumpriu-se pontualmente. Luís Alves apresentou Estêvão à baronesa, na seguinte noite, como
seu companheiro e amigo, como advogado capaz de zelar os interesses da ilustre cliente. A recepção foi geralmente
boa, salvo por parte de Guiomar, que pareceu aborrecida de o ver naquela casa. Quando Estêvão a saudou, como
quem a conhecia de longo tempo, ela mal pôde retribuir-lhe o cumprimento; em todo o resto da noite não lhe
deu palavra. Daquela parte o acolhimento não podia ser pior; mas Estêvão sentia-se feliz, desde que vê-Ia, respirar
o mesmo ar, nada mais pedindo por ora, e deixando o resto à fortuna.
Estêvão meteu a mão nos cabelos com um gesto de angústia; Luís Alves sacudiu a cabeça e sorriu. Achavam-se os
dous no corredor da casa de Luís Alves, à Rua da Constituição, — que então se chamava dos Ciganos; — então,
isto é, em 1853, uma bagatela de vinte anos que lá vão, levando talvez consigo as ilusões do leitor, e deixando-
lhe em troca (usurários!) uma triste, crua e desconsolada experiência.
Eram nove horas da noite; Luís Alves recolhia-se para casa, justamente na ocasião em que Estêvão o ia
procurar; encontraram-se à porta. Ali mesmo lhe confiou Estêvão tudo o que havia, e que o leitor saberá daqui a
pouco, caso não aborreça estas histórias de amor, velhas como Adão, e eternas como o céu. Os dous amigos
demoraram-se ainda algum tempo no corredor, um a insistir com o outro para que subisse, o outro a teimar que
queria ir morrer, tão tenazes ambos, que não haveria meio de, os vencer, se a Luís não ocorresse uma transação.
Eram nove horas da noite; Luís Alves recolhia-se para casa, justamente na ocasião em que Estêvão o ia
procurar; encontraram-se à porta. Ali mesmo lhe confiou Estêvão tudo o que havia, e que o leitor saberá daqui a
pouco, caso não aborreça estas histórias de amor, velhas como Adão, e eternas como o céu. Os dous amigos
demoraram-se ainda algum tempo no corredor, um a insistir com o outro para que subisse, o outro a teimar que
queria ir morrer, tão tenazes ambos, que não haveria meio de, os vencer, se a Luís não ocorresse uma transação.
Pois sim, disse ele, convenho em que deves morrer, mas há de ser amanhã. Cede da tua parte, e vem passar a
noite comigo. Nestas últimas horas que tens de viver na Terra dar-me-ás uma lição de amor, que eu te
pagarei com outra de filosofia.
ESPAÇO
O espaço é físico com declarações explícitas sobre alguns logradouros que identificam o Rio de Janeiro.
Estêvão meteu a mão nos cabelos com um gesto de angústia; Luís Alves sacudiu a cabeça e sorriu. Achavam-se os
dous no corredor da casa de Luís Alves, à Rua da Constituição, — que então se chamava dos Ciganos;
— então, isto é, em 1853, uma bagatela de vinte anos que lá vão, levando talvez consigo as ilusões do leitor, e
deixando-lhe em troca (usurários!) uma triste, crua e desconsolada experiência.
(...)
A baronesa escreveu nesse mesmo dia ao sobrinho, comunicando-lhe a resposta de Guiomar. Os leitores não terão
dificuldade de admitir que o coração de Jorge não sentiu o golpe profundamente, mas sentiu alguma cousa. Não foi
nessa noite à casa da tia; não foi também na segunda; na terceira chegou a descer as escadas; na quarta embicou
para Botafogo.
RESUMINDO
Três pretendentes e uma só prenda: Guiomar é uma jovem de origem humilde, mas com uma ambição
desmedida. Controla os impulsos de seu coração de forma absolutamente racional. Aparenta fragilidade e pureza,
quando é apenas interesseira e determinada. Afilhada de uma rica baronesa, desperta o interesse de três
pretendentes completamente diferentes um do outro:
Estevão é sentimental, doidivanas, ingênuo, piegas. Amaria a primeira mulher que o olhasse. Não se valoriza e
por isso não mereceu a preferência de Guiomar. Embora sincero, é superficial, inseguro, volúvel, fragilizado por
sua futilidade e isso o coloca como carta fora do baralho.
UM DIA DE MANHÃ acordou Estêvão com a resolução feita de dar o golpe decisivo. Os corações frouxos têm
destas energias súbitas, e é próprio da pusilanimidade iludir-se a si mesma. Ele confessava que nada havia feito, e
que a situação exigia alguma cousa mais.
"Nunca as circunstâncias foram mais propícias do que hoje, pensava o rapaz; Guiomar trata-me com afabilidade
de bom agouro. Demais, há nela espírito elevado; há de reconhecer que um sentimento discreto e respeitoso, como este
meu, vale um pouco mais do que lisonjarias de sala."
A resolução estava assentada; restava o meio de a tornar efetiva. Estêvão hesitou largo tempo entre dizer de viva
voz o que sentia ou transmiti-lo por via do papel. Qualquer dos modos tinha para ele mais perigos que vantagens.
Ele receava ser frio na declaração escrita...
A baronesa não perdeu tempo em circunlóquios. Apenas viu o sobrinho interpelou-o diretamente.
— Disseram-me, foi Mrs. Oswald quem me disse, que tu gostas de Guiomar.
Jorge não contava muito com semelhante interrogação; todavia, não era tão ingênuo que corasse, nem tão
apaixonado que lhe "tremesse a: voz. Puxou gravemente os punhos da camisa, consertou a gravata, e respondeu
singelamente:
— Não me atrevia a falar-lhe destas cousas.
— Por que não? — interrompeu a baronesa; são assuntos que se podem tratar entre mim e ti, sem desar para
nenhum de nós. É então verdade o que me disse Mrs. Oswald?
— É.
— Amas deveras, ou...
Deveras. Recuaria, se visse que uma aliança entre nós ficava mal ao lustre de nossa família; mas, posto que ela
seja...
— Guiomar é minha filha, apressou-se a dizer a baronesa.
— Justamente; não pode haver melhor título.
— Tem ainda outro, continuou a baronesa; é uma alma angélica e pura. Henriqueta não teve melhor coração nem
mais amor aos seus. Além disso, a natureza deu-lhe um espírito superior, de maneira que a fortuna não fez mais do
que emendar o equívoco do nascimento. Finalmente é de uma beleza pouco comum...
— Rara, titia, pode dizer que é de uma beleza rara, acudiu Jorge, pela Primeira vez lhe luziu nos olhos alguma
cousa, que não era gravidade de costume.
— Já vês, prosseguiu a baronesa, que ela possui todos os direitos ao amor e à mão de um homem, como tu.
A baronesa tinha um coração ingênuo e liso...
Luís Alves é frio, metódico, reservado, ambicioso. “Corre” por fora, mas sabe o que quer. Não revela seus
sentimentos a ninguém. Só se decide em pedir Guiomar quando tem o domínio total da situação e sabe que o
sucesso de sua empreitada está assegurado. Mesmo assim, deixa a ela a decisão sobre o momento e a
conveniência de pedi-la em casamento ou não. É um jogador calculista que só aposta com a certeza de ganhar.
Luís Alves compreendera toda a expressão dos olhos de Guiomar; era, porém, homem frio, resoluto. Inclinou o
busto com toda a graça correta e de bom-tom, e disse-lhe na voz mais branda que lhe permitia o seu órgão forte e
severo:
— Parece-lhe que fui um pouco audaz, não é? Fui apenas sincero; e ainda que a sua delicadeza me condene, estou
certo de que há em seu coração misericórdia de sobra...
Guiomar tinha readquirido toda a posse de si mesma.
— Está enganado, disse ela, não o condeno, pela simples razão de que o não entendi.
Tanto melhor, redargüiu Luís Alves sem pestanejar; o meu delito nesse caso não passou da esfera da intenção.
OUTROS PERSONAGENS
Mrs. Oswald é uma espécie de governanta da casa da velha baronesa. Intrometida, ambiciona eternizar-se como
“agregada” na família. Subserviente e ardilosa, faz tudo para estar bem com todos, particularmente com a
baronesa. Move-a unicamente a preocupação com sua segurança no esquema familiar e na ocupação de uma
posição importante e influente. Suprime facilmente suas vontades e projetos, para se ajustar às novas situações. É
aliada de Jorge na empresa de conquistar o amor de Guiomar, mas quando esta dá sua preferência a Luís Alves,
acomoda-se rapidamente a esta realidade.
A madrinha baronesa é uma velhota bondosa que tudo faz pela felicidade da afilhada, que considera filha adotiva.
Personalidade idealizada, reunindo em si a pureza de intenções, o instinto maternal, a ingenuidade e a renúncia;
representa o mais forte toque genuinamente “romântico” de toda a narrativa.
Quer fazer de sua vida e de seus dois “amores” — Jorge, o sobrinho e Guiomar, a afilhada — um conto de fadas
com final feliz. Quando percebe que estava a intrometer-se indevidamente no destino e nos anseios da afilhada,
muda seu projeto e aceita resignadamente a preferência de Guiomar por Luís Alves.
CONCLUINDO
Mesmo tendo sido repudiado pelo autor que, taxativamente, afirmou “melhor seria não tê-lo publicado”, o livro
tem a marca inconfundível do mestre. Situações ambíguas, ironia, hipocrisia, falsidades, interesses escusos, todos
os ingredientes usados sobejamente para realizar um estudo da alma humana com a “pena da galhofa e a tinta da
melancolia” num meio riso que mais parece um ríctus de amargura a revelar o desencanto e o desalento ante a
miséria física e moral do ser humano irremediavelmente condenado à pequenez.
SERVIÇO: A Mão e a Luva faz parte do rol de obras recomendadas pelo Programa de Avaliação Seriada
(PAS — UnB), para leitura pelos alunos do 2º ano do Ensino Médio, neste ano de 1.999.
BIBLIOGRAFIA:
ASSIS, Machado de. A Mão e a Luva Rio de Janeiro - RJ: Nova Aguillar, 1997.
BOSI, Alfredo. História Concisa da Literatura Brasileira. São Paulo – SP: Ed. Cultrix, 1985.
BOSI, Alfredo e outros. Machado de Assis. São Paulo – SP: Ed. Ática, 1982.
MONÇÃO, Honneur. PAS-UnB-Literatura – 2º ano do 2º Grau. Brasília – DF: Ed. do Autor, 1.999.
TEXTO I
Um mês depois de chegar Estêvão a São Paulo, achava-se a sua paixão definitivamente morta e enterrada,
cantando ele mesmo um responso, a vozes alternadas, com duas ou três moças da capital, todas elas, por
passatempo. Claro é que dous anos depois, quando tomou o grau de bacharel, nenhuma idéia lhe restava do
namoro da Rua dos Inválidos. Demais, a bela Guiomar desde muito tempo deixara o colégio e fora morar com a
madrinha. Já ele a não vira da primeira vez que veio à corte. Agora voltava graduado em ciências jurídicas e
sociais, como fica dito, mais desejoso de devassar o futuro que de reler o passado.
A corte divertia-se, como sempre se divertiu, mais ou menos, e para os que transpuseram a linha dos cinqüenta
divertia-se mais do que hoje, eterno reparo dos que já não dão à vida toda a flor dos seus primeiros anos. Para os
varões maduros, nunca a mocidade folga como no tempo deles, o que é natural dizer, porque cada homem vê as
cousas com os olhos da sua idade, Os receios da juventude não são decerto igualmente nobres, nem igualmente
frívolos, em todos os tempos; mas a culpa ou o merecimento não é dela, — a pobre juventude, — é sim do
tempo que lhe cai em sorte.
A corte divertia-se, apesar dos recentes estragos do cólera bailava-se, cantava-se, passeava-se, ia-se ao teatro. O
Cassino abria os seus salões, como os abria o Clube, como os abria o Congresso, todos três fluminenses no
nome e na alma. Eram os tempos homéricos do teatro lírico, a quadra memorável daquelas lutas e rivalidades
renovadas em cada semestre, talvez por um excesso de ardor e entusiasmo, que o tempo diminuiu, ou transferiu,
- Deus lhe perdoe, - a cousas de menor tomo. Quem se não lembra, - ou quem não ouviu falar das batalhas
feridas naquela clássica platéia do Campo da Aclamação, entre a legião casalônica e a falange chartônica, mas
sobretudo entre esta e o regimento lagrüísta? Eram batalhas campais, com tropas frescas, — e maduras também,
— apercebidas de flores, de versos, de coroas, e até de estalinhos. Uma noite a ação travou-se entre o campo
lagrüísta e o campo chartonista, com tal violência, que parecia uma página da Ilíada. Desta vez, a Vênus da
situação saiu ferida do combate; um estalo rebentara no rosto da Charton. O furor, o delírio, a confusão foram
indescritíveis; o aplauso e a pateada deram-se as mãos, — e os pés. A peleja passou aos jornais. "Vergonha eterna
(dizia um) aos cavalheiros que cuspiram na face de uma dama!" — "Se for mister (replicava outro) daremos os
nomes dos aristarcos que no saguão do teatro juraram desfeitear Mlle. Lagrua!" — "Patuléia desenfreadas—
"Fidalguice balofa!" (...)
01 - Após uma leitura atenta do fragmento, analise os itens a seguir e julgue-os como certos ou errados.
(1) Infere-se que Estevão fosse um rapaz volúvel, dado a namoricos inconseqüentes.
(2) O aforismo popular "O tempo é o senhor da verdade" encontra respaldo no primeiro parágrafo.
(3) A atração que Estevão sentira por Guiomar foi apagada com o distanciamento espacial e temporal.
(4) No segundo parágrafo, o Autor elabora uma digressão em torno do saudosismo sempre presente em
pessoas mais velhas.
(5) Infere-se do terceiro parágrafo que as classes abastadas participassem ativamente das preocupações
governamentais com o estado sanitário da população em geral.
(6) Em "eram os tempos homéricos do teatro lírico..." há uma impropriedade semântica em relação à
caracterização dos gêneros literários.
(7) Em "tropas frescas e maduras também..." há uma referência a verduras e legumes consumidos na época.
(8) Lagruístas são partidários dos lemas da revolução francesa.
(9) Infere-se que alguém cuspira no rosto de senhora da alta sociedade carioca da época.
TEXTO II
1. Uma tarde, havendo algumas pessoas a jantar em casa da baronesa, foram passear à chácara. Estêvão
que, como Luís Alves, era dos convivas, afastou-se gradualmente dos outros grupos, e aproximou-se
daquela cerca histórica onde, após dous anos de ausência e esquecimento, vira, já transformada, a
formosa Guiomar. Era a primeira vez que ele punha os olhos nesse sítio, depois da conversa, que aí
tivera com ela. A comoção que sentiu foi naturalmente grande; ressurgia-lhe o quadro ante os olhos, a
hora, o céu brilhante, o doce alento da manhã, e por fim a figura da moça, que ali apareceu, como a alma
do quadro, trazendo-lhe recordações, que ele julgava mortas, esperanças que supunha impossíveis.
11. Estêvão curvou a cabeça ao doce peso daquelas memórias, a alma bebeu, a largos haustos, a vida toda
que a imaginação lhe criava e talvez a noite o tomasse na mesma atitude, se a voz maviosa de Guiomar
lhe não dissesse a poucos passos de distância:
— Sr. doutor, perdeu alguma cousa?
15. O rapaz volveu rapidamente a cabeça, viu a moça, que atravessara uma das calhes próximas, a olhar e a
sorrir para ele. Estêvão sorriu também, e com uma presença de espírito assaz rara em namorados,
sobretudo em namorados como ele era, prontamente respondeu:
— Não perdi nada, mas achei uma cousa.
EXERCÍCIOS PROPOSTOS
01) Assinale a alternativa incorreta.
(A) O fragmento é narrado por um narrador onisciente.
(B) O Autor utiliza-se da forma canônica de apresentar o discurso direto.
(C) O foco narrativo de 3ª pessoa confere maior verossimilhança ao narrado.
(D) O cenário é francamente favorável ao idílio e às declarações amorosas.
(E) O vocabulário é refinado, tendendo para a ostentação intelectual.
TEXTO III
1. Durante uma inteira e comprida semana, deixou Estêvão de aparecer no escritório onde
trabalhava com Luís Alves; não apareceu também em Botafogo. Ninguém o viu em todo esse tempo nos
lugares onde ele era mais ou menos assíduo. Foram seis dias, não digo de reclusão absoluta, mas de
completa solidão, porque ainda nas poucas vezes que saiu, fê-lo sempre a horas ou em direção que a
ninguém via, e de ninguém era visto.
8. Mas não fora essa crua e malfadada crise, e é quase certo que ele meteria uma lança na África
daqueles dias, que era um ponto muito sério e grave, a questão magna da Rua do Ouvidor e da casa do
José Tomás, a ponderosa, crespa e complicada questão de saber se a Sthephanoni estrearia no Ernani.
Esta questão, de que o leitor se ri hoje, como se hão de rir os seus sobrinhos de outras análogas
puerilidades, esta pretensão a que se opunha a Lagrua, alegando que o Ernani era seu, pretensão que fazia
gemer as almas e os prelos daquele tempo, era cousa muito própria a espertar os brios do nosso Estêvão,
tão marechal nas cousas mínimas, como recruta nas cousas máximas.
18 Infelizmente ele não aparecia, não sabia sequer do conflito e do debate, ocupado como estava
em travar o áspero e sangrento duelo do homem contra si mesmo, quando lhe falta o apoio, ou a
consolação dos outros homens. Todo ele era Guiomar; Guiomar era o primeiro e o último pensamento
de cada dia. A sombra da moça vivia ao pé dele e dentro dele, no livro em que lia, na rua solitária onde
acaso transitava, nos sonhos da noite, nas estrelas do céu, nas poucas flores de seu inculto jardim.
24 Um leitor perspicaz, como eu suponho que há de ser o leitor deste livro, dispensa que eu lhe
conte os muitos planos que ele teceu, diversos e contraditórios, como é de razão em análogas situações.
Apenas direi por alto que ele pensou três vezes em morrer, duas em fugir à cidade, quatro em ir afogar a
sua dor mortal naquele ainda mais mortal pântano de corrupção em que apodrece e morre tantas vezes a
flor da mocidade. Em tudo isto era o seu espírito apenas um joguete de sensações contínuas e variadas.
A força, a permanência do afeto não lhe bastava a dar seguimento e realidade às concepções vagas de
seu cérebro, enfermo, ainda quando estava de saúde.
03) Explique a relação existente entre "... ou a consolação de outros homens... "com as duas orações anteriores.
TEXTO IV
1. A idéia do suicídio fincou-se-lhe mais a dentro no espírito, certa tarde em que ele saiu a espairecer, e viu
um enterro que passava, caminho do Caju. O préstito era triste, — ainda mais triste pela indiferença que
se lia no rosto dos que iam piedosamente acompanhando o morto. Estêvão descobriu-se e sinceramente
desejou ir ali dentro, metido naquelas estreitas tábuas de pinho, com todas as suas dores, paixões e
esperanças.
— Não tenho outro recurso, pensou ele; é necessário que morra. É uma dor só, e é a liberdade.
9 Ao voltar para casa, uma criança que brincava na rua, em camisa, com os pés na água barrenta da sarjeta,
fê-lo parar alguns instantes, invejoso daquela boa fortuna da infância, que ri com os pés no charco. Mas
a inveja da morte e a inveja da inocência foram ainda substituídas pela inveja da felicidade, quando ao
recolher-se viu as janelas abertas de uma casa vizinha, e a sala iluminada, e uma noiva coroada de flores
de laranjeira, a sorrir para o noivo, que sorria igualmente para ela, ambos com o sorriso indefinível e
único da ocasião.
17 Os cinco dias correram-lhe assim, travados de enojo, de desespero, de lágrimas, de reflexões amargas, de
suspiros inúteis, até que raiou a aurora do sexto dia, e com ela, — ou pouco depois dela, uma carta de
Botafogo. Estêvão quando viu o criado da baronesa, à porta da sala, com uma carta na mão, sentiu
tamanho alvoroço, que não ouviu nada do que ele lhe disse. Suporia que a carta era de Guiomar? Talvez;
mas a ilusão durou os poucos instantes que ele gastou em romper a sobrecarta e desdobrar a folha de
papel que vinha dentro.
A carta era da baronesa.
EXERCÍCIOS PROPOSTOS
01 – Assinale a alternativa incorreta.
(A) A visão da morte despertou em Estevão o sentimento de autocomiseração típico das pessoas sem
fibra para enfrentar os percalços da vida.
(B) A indiferença dos que acompanhavam o enterro lembrou a Estevão sua solidão e falta de amigos
com quem compartilhar o sofrimento.
(C) A morte seria uma fuga. O personagem não enfrenta o mundo e suas dificuldades, mas evade-se
derrotado e incapaz de reagir.
(D) A morte, a infância perdida e o futuro esperançoso são três aspectos de um mesmo sentimento
romântico presentes no terceiro parágrafo do fragmento.
(E) As flores de laranjeira na coroa da noiva representavam a felicidade sonhada e perdida por
Estevão.
TEXTO I
01 -: CCCCECEEE.
02 -: C.
03 -: E.
TEXTO II
01 -: E.
02- : E.
03 -: CCEEECCC.
TEXTO III
01 -: B
02 -: C.
03 - : LIVRE
04 - : LIVRE
05 -: CCCEECCEE.
TEXTO IV
01 -: E.
02 -: A.
03 -: CCEECEEEC.
A Moreninha
Honneur Monção
O romance romântico brasileiro desenvolve temas que se prendem à vida social do grande centro urbano da
época: a cidade do Rio de Janeiro. As convenções sociais, as relações familiares, os usos e costumes e os
problemas decorrentes do desenvolvimento da cidade, tudo isso serviu de matéria prima para nossos primeiros
romancistas.
Joaquim Manuel de Macedo tem sido acusado de ser um "escritor menor", por ter escrito obra que "atendeu ao
gosto do público da época", como isso fosse um pecado imperdoável. Acreditamos que todo escritor escreve
para o público e se o público aprova o que ele escreve, tanto melhor. O defeito, se houver, é do público e não do
escritor ou da obra.
{©A verdade é que uma conjuntura social, em que as oportunidades de lazer eram extremamente restritas,
proporcionou o surgimento do romance "folhetim", importado da França, em que situações pitorescas eram
encadeadas nos capítulos semanais destinados a jovens da classe endinheirada, que vibravam apaixonado(a)s com
as peripécias vividas pelos heróis e heroínas, odiavam terrivelmente os vilões, choravam caudalosas lágrimas com
o sofrimento que o destino, ou os homens, impunham aos pares enamorados. Qualquer semelhança com as
atuais novelas de televisão não é mera coincidência.
Descoberto o filão do sucesso, Macedo utilizou a receita em mais de duas dezenas de obras. O esquema era
sempre o mesmo: um grande amor vivido por jovens bonitos e bondosos; um complicador que tumultuava a
felicidade do par amoroso; a separação e o sofrimento decorrente; o esclarecimento do fato causador da
separação; o final feliz ou o trágico.
Cumpre observar que o tema central era sempre o casamento. Essa característica é fruto da preocupação do
autor em se manter fiel ao que observava a sua volta. Naquele tipo de sociedade e com aquele público-alvo para
seus escritos, o Autor mostra-se bastante pragmático, escolhendo um assunto que era a aspiração — e a
destinação — natural dos jovens prestes a se iniciar na vida adulta.
Resumindo
A Moreninha, o romance de estréia e de maior sucesso, tem uma história bastante simples: Três jovens (Augusto,
Leopoldo e Fabrício) estudantes de medicina (atente para o fato de que "estudantes de medicina", na época,
representam os estratos mais elevados da pirâmide social) vão passar as férias em uma ilha, propriedade da
família de um colega de escola. Em suas conversas e planos, Augusto afirma que jamais se apaixonaria por
apenas uma mulher, por ter uma incomensurável capacidade de amar. Chega a fazer uma aposta em que, caso se
apaixonasse, escreveria um romance contando a história de sua paixão. Da permanência na ilha, Augusto termina
por se enamorar de Carolina — A Moreninha.
A narrativa tem seqüência com uma série de ações conflitantes em que o amor de Augusto nem sempre é
correspondido de forma clara por Carolina. Terminam por separar-se, já que Augusto revela o verdadeiro motivo
de sua incapacidade de amar: ele está preso a uma jura de amor eterno, feita na adolescência, a uma menina cujo
nome desconhece e de quem nunca mais tivera notícia.
O sofrimento dos dois vai num crescendo até que a situação se esclarece: Carolina é a própria garota a quem
Augusto jurara amor e fidelidade no passado. Reconciliam e ficarão juntos, num melodramático "happy end",
mas Augusto deverá escrever o romance que relata seu caso de amor e esse romance será: A Moreninha.
DUAS PALAVRAS
Eis aí vão algumas nas escritas, às quais me atrevi a dar o nome de Romance. Não foi ele movido por nenhuma
dessas três poderosas inspirações que tantas vezes soem amparar as penas dos autores: glória, amor e interesse,
Deste último estou eu bem a coberto com meus vinte três anos de idade, que não é na juventude que pode ele
dirigir o homem; a glória só se andasse ela caída de suas alturas, rojando as asas quebradas, me lembraria eu, tão
pela terra que rastejo, de pretender ir apanhá-la. A respeito do amor não falemos, pois se me estivesse o buliçoso
a fazer cócegas no coração, bem sabia eu que mais proveitoso me seria gastar meia dúzia de semanas aprendendo
numa sala de dança, do que velar trinta noites garatujando o que por aí vai. Este pequeno romance deve sua
existência somente aos dias de desenfado e folga que passei no belo Itaboraí, durante as férias do ano passado.
Longe do bulício da corte e quase em ócio, a minha imaginação assentou lá consigo que bom ensejo era esse de
fazer travessura, e em resultado delas saiu — A Moreninha.
Dir-me-ão que o ser a minha imaginação traquinas não é um motivo plausível para vir eu maçar a paciência dos
leitores com uma composição balda de merecimento e cheia de irregularidades e defeitos; mas que querem?
Quem escreve olha a sua obra como seu filho, todo o mundo sabe que o pai acha sempre graças e bondades na
querida prole.
Do que vem dito concluir-se-á que a Moreninha é minha filha: exatamente assim penso eu. Pode ser que me
acusem por não tê-la conservado debaixo de minhas vistas por mais tempo, para corrigir suas imperfeições; esse
era o meu primeiro intento. A Moreninha não é a única filha que possuo: tem três irmãos que pretendo educar
com esmero, e o mesmo faria a ela; porém esta menina saiu tão travessa, tão impertinente, que não pude mais
sofreá-la no seu berço de carteira e, para ver-me livre dela, venho depositá-la nas mãos do público, de cuja
benignidade e paciência tenho ouvido grandes elogios.
Eu, pois, conto que, não esquecendo a fama antiga, o público a receba e lhe perdoe seus senões, maus modos e
leviandades. É uma criança que terá, quando muito, seis meses de idade; merece a compaixão que por ela
implore, mas, se lhe notarem graves defeitos de educação, que provenham da ignorância do pai, rogo que não os
deixem passar por alto, acusem-nos, que daí tirarei eu muito proveito, criando e educando melhor os
irmãozinhos que a Moreninha tem cá.
E tu, filha minha, vai com a bênção paterna e queira o céu que ditosa sejas. Nem por seres traquinas te estimo
menos; e, como prova, vou, em despedida, dar-te um precioso conselho: recebe, filha, com gratidão, a crítica do
homem instruído; não chores se com a unha marcarem o lugar em que tiveres mais notável senão, e quando te
disserem que por este erro ou aquela falta não és boa menina, jamais te arrepies, antes agradece e anima-te
sempre com as palavras do velho poeta:
"Deixa-te repreender de quem bem te ama,
Que, ou te aproveita ou quer aproveitar-te."
ESPAÇO
Como já foi dito, o espaço explorado restringe-se ao Rio de Janeiro, mais explicitamente a uma ilha situada na
Baía da Guanabara. A descrição do cenário das ações revela um espaço físico bem detalhado, sem que haja
necessidade da interferência da imaginação do leitor em sua criação, como se pode perceber claramente nos
fragmentos selecionados.
"Seriam pouco mais ou menos onze horas da manhã, quando o batelão de Augusto abordou à ilha de. , .
Embarcando às dez horas, ele designou ao seu palinuro1 o lugar a que se destinava, e deitou-se para ler mais à
vontade o Jornal do Comércio. Soprava vento fresco e, muito antes do que supunha, Augusto ergueu-se,
ouvindo a voz de Leopoldo que o esperava na praia.
TEMPO
O tempo é fundamentalmente cronológico, com contínuas referências ao relógio e ao calendário. O desenrolar
da peripécia é lento e segue o ritmo metódico da sucessão dos segundos e dos dias, como se observar:
"Como testemunhas - Fabrício e Leopoldo.
Acordantes - Filipe e Augusto.
E eram oito horas da noite quando se levantou a sessão.
A cena que se passou teve lugar numa segunda-feira.
Já lá sé foram quatro dias: hoje é sexta-feira, amanhã será sábado, não um sábado como outro qualquer, mas um
sábado véspera de Sant'Ana.
São dez horas da noite; os sinos tocaram a recolher. Augusto está só, sentado junto de sua mesa, tendo diante de
seus olhos seis ou sete livros, papéis, pena e toda essa série de coisas que compõem a família do estudante."
NARRADOR
O narrador não integra o texto como personagem, utilizando, pois, um ponto de vista externo e um foco
narrativo de 3ª pessoa. Sua capacidade de estar em todos os lugares, como testemunha privilegiada dos
acontecimentos, possibilita grandes trechos descritivos inseridos na narrativa. A predominância dos diálogos,
entretanto, com raras interferências de quem conta a história, faz com que, predominantemente se tenha a figura
do narrador observador.
" Neste momento a sra. d. Ana entrou na sala, e depois, dirigindo-se à grande varanda da frente, sentou-se
defronte do jardim. Batista acabava de dar fim ao jogo da palhinha e começava novo: Augusto pediu que o
dispensassem e foi ter com a dona da casa.
— Não joga mais, sr. Augusto? disse ela.
— Por ora não, minha senhora.
— Parece-me pouco alegre.
PERSONAGENS
É usual neste tipo de obra a criação de personagens planos, sem evolução psicológica no decorrer da narrativa e
assim é em A Moreninha. O comportamento de cada personagem é previsível a partir do delineamento de seu
perfil físico e psicológico feito pelo narrador. A narrativa, como já dissemos, destina-se a um tipo de público bem
definido e sem grandes exigências intelectuais no refinamento da construção do enredo. Nesse particular, o autor
cumpre seu trabalho perfeitamente a contento.
CONCLUINDO
O aparecimento do romance e a sua aceitação, no Brasil, marca a adesão do público à literatura. É evidente que o
público da época é bastante diferente dos leitores de agora. Basta lembrar que o acesso à instrução, já tão
dificultoso hoje em dia, nos meados do século XIX era praticamente impossível a quem não pertencesse aos
estratos sociais privilegiados econômica e financeiramente. O romance romântico dirigia-se primordialmente ao
público feminino da classe dominante, cuja maneira de levar a vida permitia voltar as atenções para a literatura,
mesmo levando-se em conta a estreiteza do horizonte intelectual da mulher inserida em uma sociedade machista,
escravista e patriarcal, que reservava a ela, mulher, um papel secundário e meramente decorativo.
Joaquim Manuel de Macedo percebeu que tal público constituía um filão a ser explorado e a ele dedicou toda sua
obra. Daí a criação de personagens, situações e enredos que se identificam com os cânones da classe dominante
do tempo.
O casamento está no princípio, no meio e no fim de toda a obra. Tudo nos romances de Macedo gira em torno
do casamento, respira casamento, termina em casamento. Essa preocupação é fruto exclusivo da observação da
realidade social do momento histórico. Qual o anseio principal da jovem filha das famílias endinheiradas da
época? Os homens em tal sociedade enxergavam o casamento como uma excelente oportunidade para "subir na
vida". A mulher era um capital a ser conseguido e conquistado a todo o transe. Transforma-se, por conseguinte,
o amor em algarismos, os vínculos sagrados do matrimônio são calculados em cifras dotais e contabilizáveis.
A Moreninha é um romance de costumes e cumpre bem sua tarefa de pintar um quadro representativo das
relações humanas na cidade do Rio de Janeiro dos meados do século XIX. Foi lido e aplaudido por seus leitores
da época e permanece como um documento vivo da produção literária brasileira, naquilo que ela tem de mais
representativo, desde os primeiros escritos do século XVI até os nossos dias.
DO AUTOR
Tendo estreado em livro em 1942, João Cabral de Melo Neto enquadra-se no que a crítica chama de Geração de
45, um grupo de escritores desligados das inovações estéticas defendidas pelos modernistas de 22, marcada
formalmente por apego maior ao rigor formal e ao artesanato poético. No aspecto temático, João Cabral elegeu
três preocupações: o Nordeste, com sua sofrida problemática; a Espanha, naquilo que ela tem de semelhante ao
Nordeste e a própria poesia, numa ação metalingüística que segue os passos de outros grandes poetas que
revelaram a mesma preocupação.
DA OBRA
O subtítulo “Auto de Natal Pernambucano” remete-nos para a tradição medieval ibérica em que a designação
“auto” destinava-se a peças de teatro ao gosto tradicional. Os assuntos podiam ser religiosos ou profanos, sérios
ou cômicos. Os autos, ao mesmo tempo que divertiam, moralizavam pela sátira de costumes e inculcavam de
modo vivo a acessível as verdades da fé. Os autos foram uma constante na literatura portuguesa e tiveram seu
apogeu com o teatro vicentino, no alvorecer do século XVI.
{©Morte e Vida Severina foi composta a pedido de Maria Clara Machado, especialmente para o teatro. Dividida
em dezoito passos, cada um deles narrando partes da grande jornada de um retirante — Severino de Maria —
que foge da seca, em busca da vida no litoral. Esses pequenos passos são as cenas de um auto natalino, com a
descrição final do nascimento de uma criança, mas entremeados pela morte que é o liame entre uma cena e
outra.
Publicado em 1956 e encenado a partir de 1958, o poema-peça teatral tem conseguido repetido sucesso de
público e de crítica, sendo inclusive levado ao cinema. Seu conteúdo crítico-social e o fato de uma de suas
encenações ter sido musicada por Chico Buarque de Hollanda levaram alguns críticos a rotular o Autor de
“engajado”, rótulo que ele repele veementemente, a não ser que esse engajamento seja considerado com a
própria poesia.
DO TÍTULO
O título engloba a mensagem que perpassa todo o poema. Com a mudança da ordem natural (primeiro a vida e
depois a morte) para morte/vida o Autor já antecipa o tipo de vida que pretende descrever: uma vida que
coexiste diuturnamente com a morte. As duas mantêm tal simbiose que o adjetivo comum confere-lhes, a
ambas, a qualidade de severinas, isto é, de extremado rigor em suas relações com o meio.
RESUMINDO
Na parte inicial, o poema narra a peregrinação do protagonista em sua caminhada ainda no sertão e o seu
encontro com a morte em diferentes ocasiões: dois homens carregam um defunto, numa rede, vítima de
emboscada; o segundo encontro com a morte dá-se quando o retirante encontra o rio Capibaribe agonizando,
intermitente em razão da seca; Severino segue viagem só para se deparar com um velório, onde se cantam as
incelências. A partir desse momento, ocorre a reflexão sobre as razões de sua própria vida.
CONCLUINDO
O poema marca-se pelo jogo de palavras entre o substantivo Severino e o adjetivo severina, caracterizando a
vida e a morte presentes no sertão marcado pelo flagelo da seca. O aspecto social típico do Nordeste,
particularmente o problema fundiário, permeia a jornada trágica do protagonista que, na busca da vida, só
encontra a morte por onde passa.
Seguindo a tradição medieval, tão presente no Nordeste, o poema é escrito predominantemente em versos
redondilhos maiores, com um vocabulário que vai do erudito ao regional sem que, nesse espectro, cause grandes
traumas interpretativos.
Autor confessamente adepto do trabalho poético artesanal, João Cabral impõe-se um tema e o explora de todos
os ângulos possíveis, a partir de sua experiência pessoal de homem de seu tempo. Nada é fortuito, Nada é
improviso, Nada é acaso. A poesia para ele não brota expontaneamente a partir de uma inspiração divina dada a
poucos eleitos. Para João Cabral, o trabalho intelectual conjuga-se com a disciplina e com o rigor de quem sabe
o que quer e como o quer. O resultado, naturalmente, é um poema equilibrado, harmônico, seco, duro, direto,
sem quaisquer concessões a soluções simplistas e/ou emocionais.
Podemos concluir afirmando que se trata de um poema bastante representativo da obra do Autor, do momento
e da importância que ela representa para a literatura brasileira.
SERVIÇO
Morte e Vida Severina é obra cuja leitura é recomendada aos alunos candidatos à primeira etapa do PAS-UnB,
neste ano de 1999.
BIBLIOGRAFIA
ANDRADE, Fernando Teixeira de. Morte e Vida Severina, in Os Livros da Fuvest. São Paulo – SP: CERED, 1998.
BOSI, Alfredo. História Concisa da Literatura Brasileira. São Paulo – SP: Ed. Cultrix, 3ª edição, 1995.
MELO NETO, João Cabral de. Morte e Vida Severina – e outros poemas em voz alta. Rio de Janeiro – RJ: Liv. José
Olympio Editora, 1975.
MONÇÃO, Honneur. PAS-UnB – Literatura - 2º Grau. Brasília – DF: Ed. do Autor, 1ª Edição, 1999.
Noite na Taverna
Honneur Monção
Muito se tem falado acerca de Álvares de Azevedo e de sua obra. A crítica, em geral, ressalta a genialidade
precoce; os arroubos adolescentes; a intensa imaginação criadora; o estilo vacilante de quem não teve tempo
suficiente para firmar o domínio sobre o instrumento de trabalho e a influência poderosa dos grandes mestres
europeus, Byron e Musset, de quem o nosso vate frui o demonismo, o pessimismo, o tédio existencial e o
sentido trágico da existência tão do agrado dos românticos da Segunda Geração.
Álvares de Azevedo escreveu intensamente, como se pressentisse a morte prematura. Seu texto é ágil, nervoso,
ciclotímico e com um vocabulário e um estilo nem sempre apurados, como aliás é típico do Romantismo.
Noite na Taverna é um livro de contos trágicos — lembram perfeitamente os contos de horror de Edgard
Allan Poe, o genial escritor do Romantismo norte-americano — em que o real e o fantástico fundem-se para
criar uma atmosfera escurecida pela fumaça dos charutos e pela pátina do meio sono entorpecido dos bêbados,
devassos e impenitentes, que, reunidos em uma taverna lúgubre, desfiam suas experiências existenciais em
narrativas escabrosas. A palavra vai de um personagem a outro e a cada intervenção de um deles, uma nova
história surge, sempre ligada ao sofrimento, ao incesto, ao adultério, ao canibalismo, à prostituição.
1. Johann
Bem ao estilo da segunda geração romântica, o Autor cria um texto fantástico em que coincidências trágicas
unem-se para, num somatório incrível de desgraças e de desencontros existenciais, destruir quatro vidas jovens
que tinham tudo para viver em harmonia.
O enredo, mesmo com toda a dramática tragicidade, é de grande simplicidade:
{©“Johann joga bilhar com um jovem, desentendem-se por motivos fúteis, parte para um duelo e o oponente –
Artur – morre estupidamente; Johann apanha no corpo do adversário um anel e um bilhete com um endereço,
comparece a uma entrevista e passa a noite com uma virgem desconhecida; ao sair, é atacado por um homem,
consegue eliminá-lo e depois descobre que acabara de matar o próprio irmão; volta ao quarto e constata que a
virgem com quem tinha estado era sua irmã, noiva do moço com quem jogara bilhar e matara em duelo.”
Álvares de Azevedo escreveu intensamente, como se pressentisse a morte prematura. Seu texto é ágil, nervoso,
ciclotímico e com um vocabulário e um estilo nem sempre apurados, como aliás é típico do Romantismo.
“JOHANN”
Como se percebe, a visão trágica da existência e o senso do mistério são presenças marcantes no texto: Johann
em uma mesma noite mata o noivo da irmã e seu próprio irmão. Ao lado desses dois crimes hediondos. Comete
incesto — crime moralmente maior — com a irmã, em seqüência tenebrosa de acontecimentos sobre os quais
não tem o mínimo controle. O acúmulo de coincidências fatais faz crer uma alma penada subjugada sob o fardo
de seu carma. Não há, por conseguinte, qualquer possibilidade de redenção e Johann deverá consumir o resto de
seus dias sob o peso esmagador de seus crimes e pecados.Ressalte-se, ainda, o vocabulário e entonação
reveladores da intensa emoção presente na fala da cada personagem. O tratamento cerimonioso, mesmo em
situação crítica e explosiva, entre contendores prestes a se atracar confere, também, um clima de irrealismo e
idealização excessivos que remete claramente para o gênero dramático.
Tal texto, como já afirmou o grande escritor e crítico Adonias Filho, só poderia ter sido escrito no Romantismo,
tal o grau de representatividade daquela estética abarcado por seus parcos limites.
EXERCÍCIOS PROPOSTOS
04 – Transcreva uma passagem que apresente a preferência por lugares ermos e sombrios.
05 – Transcreva uma passagem em que se evidencie o predomínio das emoções e a idealização dos personagens.
2. Solfieri
Seguindo a linha da proposta da obra, este conto também fala da tragicidade da vida, da libertinagem e da
depravação. O ambiente do narrado enquadra-se na perspectiva da preferência pelos lugares ermos, escuros,
amedrontadores e os personagens que nele vagam são seres indefinidos dos quais apenas um contorno é
mostrado. São mulheres e homens misteriosos e difusos num cenário também misterioso e difuso.
Solfieri, o narrador, é um dos boêmios reunidos na taverna e conta aos amigos a história fantástica por ele vivida
na Roma misteriosa e perigosa das vielas e becos tortuosos. Numa noite, surge da janela escura de um palácio o
vulto impreciso de uma mulher. Solfieri a segue até um cemitério e ali amanhece sozinho e desvairado.
Um ano depois reencontra a mulher dentro de um caixão, em uma igreja, despe o cadáver e o profana. Leva-o
para casa. A mulher não está morta, mas apenas sofrera um ataque de catalepsia1. Em casa ela se torna sua
amante e morre louca. Ele a enterra em seu quarto, manda fazer uma estátua que a represente e coloca-a em seu
leito de amante desesperado.
Hoje guarda como relíquia uma grinalda de flores murchas que arrancou da cabeça do cadáver da amada sem
nome.
SOLFIERI
EXERCÍCIOS PROPOSTOS
01 - A segunda geração romântica tem algumas marcas bem nítidas, resultantes das influências sofridas pela
leitura e identificação doentia com escritores europeus, notadamente Byron, Musset e Hofmann. O tédio
existencial; a preferência por lugares ermos e escabrosos; o niilismo schopenhauriano são marcas indeléveis a
matizar os escritos dessa fase.
Assinale V/F, caso a característica presente seja ou não resultado dessas influências.
0) sentido trágico da existência.
1) preferência por ambientes noturnos.
2) angústia existencial, tédio de viver.
3) mulher inatingível.
4) obsessão pela morte.
5) lugares distantes, exotismo.
6) ilogicidade.
02 - Uma narrativa literária constrói-se com elementos bem marcados e definidos- tempo, espaço, ação,
personagens, foco narrativo, narrador, etc.
Examine atentamente os itens a seguir, todos relacionados com o texto lido, e assinale V/F.
0) O narrador e participante e, por conseguinte, onisciente.
1) O foco narrativo é de 3a pessoa.
2) O tempo da narrativa coincide com o tempo narrado
3) A mulher presente no texto é personagem tipo.
4) O espaço é físico.
5) A ação envolve poucos personagens, como é típico do romance romântico.
6) Em “Sonho gelado em que sentem-se os membros...” a colocação pronominal está de acordo com a
atual norma culta.
CopyMarket.com Literatura Brasileira para Vestibulares – Honneur Monção 60
03 - Relendo o texto atentamente, assinale V/F.
0) Nos dois parágrafos iniciais observa-se uma postura anticlerical.
1) No terceiro parágrafo predomina a comparação.
2) No quarto parágrafo, os períodos curtos indicam a simultaneidade das ações.
3) Os dois pontos existentes no parágrafo que se inicia com a expressão “Quando dei acordo de mim...”,
nas duas ocorrências, justificam-se por anteceder expressões de caráter explicativo.
4) Há um corte temporal bem marcado a partir da expressão “Quando entrei no quarto...”.
5) O clima de terror trágico acentua-se no parágrafo que se inicia com a expressão “Súbito abriu os
olhos...”.
6) A colocação pronominal no parágrafo que se inicia com “Quando o escultor saiu...” segue os padrões
da gramática atual.
7) O narrador é perfeitamente racional durante o diálogo com o guarda que o interpelou.
8) A morte, a loucura, a embriaguez e o irreal comandam o restante da narrativa.
9) Pelo que se percebe, Solfieri substitui a amada morta por uma estátua, o que, de qualquer forma
configura o platonismo romântico.
05 - O segundo parágrafo descreve um cenário. De que forma esse cenário enquadra-se dentro da estética
romântica?
06 - No trecho que vai de “Aqui, ali, além eram cruzes que se erguiam” (pág.30), até “canto suavíssimo”,
percebem-se marcos característicos da estética romântica. Quais são eles?
3. Gennaro
A temática desenvolvida permanece dentro daquilo que o autor imaginou para a obra: o aspecto trágico do
relacionamento humano; a ingratidão de uns diante da impotência de outros; a prevalência da força das forças
avassaladoras da carne diante de qualquer juízo de ordem ética.
Um jovem estudante de pintura, vivendo na casa do mestre, desonra-lhe o lar e desgraça-lhe a vida. Gennaro
primeiro relaciona-se intimamente com a filha de Godofredo. Quando esta fica grávida e implora-lhe uma
atitude reparadora de sua honra (estamos no século XIX – lembre-se), Gennaro se recusa. A moça morre e
Gennaro toma a jovem esposa do mestre como amante.
Godofredo sofre, mas não tem como reagir.
Ao final Gennaro encontra os cadáveres de Godofredo e Nauza, já em decomposição, num final trágico e
fantasmagórico.
Gennaro, dormes, ou embebes-te no sabor do último trago do vinho, da última fumaça do teu cachimbo?
— Não: quando contavas tua história, lembrava-me uma folha de vida, folha seca e avermelhada como as do outono e que o vento
varreu.
— Uma história?
— Sim: é uma das minhas histórias. Sabes, Bertram, eu sou pintor... É uma lembrança triste essa que vou revelar, porque é a
história de um velho e de suas duas mulheres, belas como duas visões de luz.
Godofredo Walsh era um desses velhos sublimes, em cujas cabeças as cãs semelham o diadema prateado do gênio. Velho já
casara em segunda núpcias com uma beleza de vinte anos. Godofredo era pintor: diziam uns que este casamento fora um amor
artístico por aquela beleza romana, como que feita ao molde das antigas; outros criam-no compaixão pela pobre moça que vivia de
servir de modelo. O fato é que ele a queria como filha, como Laura, a filha única de seu primeiro casamento. Laura... corada como
uma rosa e loura como um anjo.
Eu era nesse tempo moço: era aprendiz de pintura em casa de Godofredo. (...) Eu tinha quase a idade da mulher do
mestre. Nauza tinha vinte e eu tinha dezoito anos.
Amei-a; mas meu amor era puro como meus sonhos de dezoito anos. Nauza também me amava: era um sentir tão puro!
era uma emoção solitária e perfumosa como as primaveras cheias de flores e de brisas que nos embalam aos céus da Itália.
Como eu o disse: o mestre tinha uma filha chamada Laura. Era uma moça pálida, de cabelos castanhos e olhos azulados;
sua tez era branca, só às vezes, quando o pejo a incendia, duas rosas lhe avermelhavam a face e se lhe destacavam no fundo de
mármore. Laura parecia querer-me como a um irmão.
.......................................................................................................................................
Uma manhã - eu dormia ainda- o mestre saíra e Nauza fora à igreja, quando Laura entrou no meu quarto e fechou a
porta: deitou-se ao meu lado. Acordei nos braços dela.
O fogo de meus dezoito anos, a primavera virginal de uma beleza ainda inocente, o seio seminu de uma donzela a bater
sobre o meu, isso tudo... ao despertar dos sonhos alvos da madrugada, me enlouqueceu...
Todas as manhãs Laura vinha a meu quarto...
Três meses passaram assim. Um dia entrou ela no meu quarto e disse:
— Gennaro, estou desonrada para sempre... A princípio eu quis-me iludir, já não o posso, estou de esperanças...
Um raio que me caísse aos pés não me assustaria tanto.
.......................................................................................................................................
Nunca mais tornou a falar-me em casamento.
.......................................................................................................................................
Laura não me falara mais . Seu sorriso era frio: cada dia tornava-se mais pálida, mas a gravidez não crescia, antes mais
nenhum sinal se lhe notava...
O velho levava as noites passeando no escuro. Já não pintava. Vendo a filha que morria aos sons secretos de uma
harmonia de morte, que empalidecia cada vez mais, o misérrimo arrancava as cãs.
.......................................................................................................................................
Uma noite... foi horrível... vieram chamar-me: Laura morria. Na febre murmurava meu nome e palavras que ninguém
podia reter, tão apressadas e confusas lhe soavam. Entrei no quarto dela: a doente conheceu-me. Ergueu-se branca, com a face úmida
de um suor copioso, chamou-me. Sentei-me junto do leito dela. Apertou minha mão nas suas mãos frias e murmurou em meus
ouvidos:
— Gennaro, eu te perdôo, eu te perdôo de tudo... Era um infame... Morrerei... Fui louca... Morrerei por tua causa... teu filho... o
meu... vou tê-lo ainda... mas no céu... meu filho que matei... antes de nascer.
Deu um grito, estendeu convulsivamente os braços como para repelir uma idéia, passou a mão pelos lábios como para
enxugar as últimas gotas de uma bebida, estorceu-se no leito, lívida, fria, banhada de suor gelado e arquejou... Era o último suspiro.
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EXERCÍCIOS PROPOSTOS
01 - Assinale V/F
0) O fato de Gennaro ser pintor faz com que ele correlacione a beleza das mulheres a um raio de luz.
1) Suspeita-se de que Godofredo Walsh nutria um amor platônico por sua segunda esposa.
2) Gennaro, aos doze anos, era discípulo de Godofredo Walsh.
3) O parágrafo que se inicia por “Eu era nesse tempo...” até “eu tinha dezoito anos.” é coeso e coerente.
4) No parágrafo seguinte predomina a comparação.
5) A relação entre Gennaro e Laura tem algo de incestuosa.
6) A natureza pecaminosa de Gennaro manifesta-se mesmo diante da iminência da morte de Laura.
7) No trecho “Uma noite... foi terrível [... ] Era o último suspiro” tem-se uma situação e um discurso que
fogem à estética romântica.
8) Ao ajoelhar-se diante da amada: “ajoelhei-me junto dela, beijei-lhe as mãos, reguei seu colo de lágrimas.”
o sujeito poético adota uma postura que recupera o amor cortês da literatura medieval.
9) No trecho: “Nauza! Nauza! Uma palavra, tu me amas?
Tudo o mais foi um sonho: a lua passava entre os vidros da janela aberta, batia nela: nunca eu a vira tão
pura e divina.” ocorre a identificação da mulher com a lua, o que não é próprio da estética romântica..
03 – Transcreva uma passagem que revele o platonismo e a evasão que caracterizam o texto romântico.
A obra “Noite na Taverna”, como sabemos, é constituída com a representação de um grupo de devassos,
bêbados e infelizes a desfilar narrativas escabrosas de fatos de suas vidas. O presente conto é o coroamento da
obra. Seguindo uma técnica narrativa peculiar ao livro de contos esta última história é o fechamento da obra. É
o clímax da orgia e da bebedeira desenfreada.
Os personagens estão adormecidos e espalhados pelo chão da taverna. Beberam além da conta e exaustos
entregam-se á letargia do álcool. Eis que chega um vulto fantasmagórico de mulher. É a própria encarnação da
morte. A descrição tétrica ajusta-se á figura tradicional da ceifadora iniludível. Procura entre os bêbados até
encontrar Johann e o executa. Volta-se para Arnold (e revela quem era: Giorgia, a jovem virgem desgraçada pelo
irmão na primeira narrativa da obra que volta para matar o irmão profanador e entregar sua vida ao descanso
final.
EXERCÍCIOS PROPOSTOS
01 - Assinale V/F nos itens abaixo, atentando para o fato de que há intertextualidade entre este conto e os
demais.
04 – Transcreva uma passagem em que está presente o platonismo e a idealização dos personagens.
Narrativa desordenada em que se mesclam o erotismo desenfreado, o assassinato, o canibalismo. Não há uma
seqüência lógica e coerente dos fatos narrados, passando a idéia de um pesadelo nevoento em que os
acontecimentos sucedem se vertiginosamente sem que haja explicação lógica para eles. Bertram é o conto mais
longo da obra Noite na Taverna e dá a impressão de que carecia de uma limpeza, ou seja, de uma depuração
para que se tornasse mais compacto e menos cansativo.
Bertram, o protagonista, é um velho devasso com uma imensa carga de pecados e vícios para expiar.
Relacionou-se, no passado, com três mulheres e nos três relacionamentos o amor físico é intenso, efêmero e de
resultados devastadores.
A linguagem é tipicamente romântica, seguindo o tom declamatório e teatral de um longo solilóquio do
protagonista-narrador
Nos fragmentos a seguir procurou-se manter a linha dos fatos principais, eliminando-se o supérfluo ou
decorativo.
BERTRAM
But why should I for others groan
When none will sigh for me?
Childe Harold. I.
EXERCÍCIOS PROPOSTOS
TEXTO
“Uma noite eu caíra ébrio às portas de um palácio: os cavalos de uma carruagem pisaram-me ao passar e partiram-me a
cabeça de encontro à laje. Acudiram-me desse palácio. Depois amaram-me: a família era um nobre velho viúvo e uma beleza
peregrina de 18 anos. Não era amor decerto o que eu sentia por ela... Não sei o que foi... Era uma fatalidade infernal. A pobre
inocente amou-me; e eu, recebido como o hóspede de Deus sob o teto do velho fidalgo, desonrei-lhe a filha, roubei-a, fugi com ela... E o
velho teve de chorar suas cãs manchadas da desonra de sua filha, sem poder vingar-se.
Depois enjoei-me dessa mulher. A saciedade é um tédio terrível. Uma noite, que eu jogava com Siegfried - o pirata, depois
de perder as últimas jóias dela, vendi-a. A moça envenenou Siegfried logo na primeira noite e afogou-se...”
Uma história absolutamente inverossímil em que Claudius Hermann apaixona-se por Eleonora, a duquesa,
seqüestra-a e confessa seu amor. A seqüência narrativa é desordenada e caótica. Não há um nexo ou uma razão a
justificar as ações do narrador-protagonista. Mais uma narrativa erótica e misteriosa como os vapores nevoentos
dos castelos assombrados das narrativas de terror.
Ao final o duque Maffio, desonrado e enlouquecido com o rapto de sua esposa mata-a e morre sobre o cadáver.
CLAUDIUS HERMANN
...Extacy!
My guise as yours doth
temperately keep time
And maltes a healthful music:
lt is not madness
That I have utter'd.
SHAKESPEARE, Hamlet
E tu, Hermann! Chegou a tua vez. Um por um evocamos ao cemitério do passado um cadáver. Um por um erguemo-lhe o
sudário para mostrar-lhe uma nódoa de sangue. Fala que chegou a tua vez.
Claudius sonha algum soneto ao jeito do Petrarca, alguma auréola de pureza como a dos espíritos puros da Messíada! disse
entre uma fumaça e uma gargalhada Johann erguendo a cabeça da mesa.
Pois bem! quereis uma história? Eu pudera contá-las, como vós, loucuras de noites de orgia; mas para quê? Fora escárnio
Fausto ir lembrar a Mefistófeles as horas de perdição que lidou com ele. Sabeis-las... essas minhas nuvens do passado, leste-lo à farta
o livro desbotado de minha existência libertina. Se o não lembrásseis, a primeira mulher das ruas pudera contá-lo. Nessa torrente
negra que se chama a vida e que corre para o passado enquanto nós caminhamos para o futuro, também desfolhei crenças e me
lancei, despidas as minhas roupas mais perfumadas, para trajar a túnica da saturnal! O passado é o que foi, é a flor que murchou, o
sol que se apagou, o cadáver que apodreceu. Lágrimas a ele? Fora loucura! Que durma com suas lembranças negras! Revivam,
acordem apenas os miosótis abertos naquele pântano! sobreágue naquele não-ser o eflúvio de alguma lembrança pura!
Bravo! Bravíssimo! Claudius, estás completamente bêbado! bofé que estás romântico!
Silêncio, Bertram! Certo que esta não é uma lenda para inscrever-se após as vossas uma dessas coisas que se contem com os
cotovelos na toalha vermelha e os lábios borrifados de vinho e saciados de beijos... Mas que importa?
Vós todos que amais o jogo, que vistes um dia correr naquele abismo uma onda de ouro, redemoinhar-lhe no fundo, como um
mar de esperanças que se embate na ressaca do acaso, sabeis melhor que vertigem nos tonteia então... ideais-la melhor a loucura que
nos delira naqueles jogos de milhares de homens, ou de fortuna. - Aspirações, a vida mesma vão-se na rapidez de uma corrida, onde
todo esse complexo de misérias e desejos, de crimes e virtudes que se chama a existência se joga numa parelha de cavalos!
Apostei como homem a quem não doera empobrecer: o luxo também sacia; e é essa uma saciedade terrível! Para ela nada basta...
Nem as danças do Oriente, nem as lupercais romanas, nem os incêndios de uma cidade inteira lhe alimentarão a seiva de morte, essa
vitalidade do veneno de que fala Byron. Meu lance no turf foi minha fortuna inteira. Eu era rico, muito rico então: em Londres
ninguém ostentava mais dispendiosas devassidões, nenhum nababo numa noite esperdiçava somas como eu. O suor de três gerações,
derramava-o eu no leito das perdidas, e no chão das minhas orgias...
No instante em que as corridas iam começar, em que todos sentiam-se febris de impaciência, um murmúrio correu pelas
multidões, um sorriso,.. e depois eram as fontes que se expandiam e depois uma mulher passou a cavalo.
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A fraqueza era cobarde: e demais, esse homem comprara uma chave e uma hora à infâmia venal de um criado, esse homem
jurara que nessa noite gozaria aquela mulher: fosse embora veneno, ele beberia o mel daquela flor, o licor de escarlate daquela taça.
Quanto a esses prejuízos de honra e adultério, não riais deles - não que ele ria disso. Amava e queria: a sua vontade era como a
folha de um punhal - ferir ou estalar.
Na mesa havia um copo e um frasco de vinho, encheu o copo: era vinho espanhol... Chegou-se a ela, com suas roupas de veludo
desatadas, seus cabelos a meio soltos ainda entremeados de pedraria e flores, seus seios meio-nus, onde os diamantes brilhavam como
gotas de orvalho, ergueu-a nos braços, deu-lhe um beijo. Ao calor daquele beijo, seminua, ela acordou: entre os vagos sonhos em que se
lhe perdia uma ilusão talvez, murmurou "amor!" e com olhos entreabertos deixou cair a cabeça e adormeceu de novo.
O homem tirou do seio um frasquinho de esmeralda. Levou-o aos lábios entreabertos dela e verteu-lhe algumas gotas que ela
absorveu sem senti-las. Deitou-a e esperou. Daí a instantes o sono dela era profundíssimo... A bebida era um narcótico onde se
misturaram algumas gotas daqueles licores excitantes que acordam a febre nas faces e o desejo voluptuoso no seio.
O homem estava de joelhos, o seu peito tremia e ele estava pálido como após uma longa noite sensual. Tudo parecia vacilar-lhe em
torno...
Ela estava nua: nem veludo, nem véu leve a encobria. O homem ergueu-se, afastou o cortinado.
O homem era Claudius Hermann.
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Quando me levantei, embucei-me na capa e saí pelas ruas. Queria ir ter a meu palácio, mas estava tonto como um ébrio.
Titubeava e o chão era lúbrico como para quem desmaia. Uma idéia contudo me perseguia. Depois daquela mulher nada houvera
mais para mim. Quem uma vez bebeu o suco das uvas purpurinas do paraíso mais nunca deve inebriar-se do néctar da terra...
Quando o mel se esgotasse, o que restava a não ser o suicídio?
Uma semana se passou assim: todas as noites eu bebia nos lábios à dormida um século de gozo. Um mês, o mês em que
delirantes iam os bailes do entrudo, em que mais cheia de febre ela adormecia quente, com as faces em fogo...
Uma noite - era depois de um baile - eu esperei-a na alcova, escondido atrás do seu leito. No copo cheio d’água que estava junto à
sua cabeceira derramara as últimas gotas de filtro quando entrou ela com o Duque.
Era ele um belo moço! Antes de deixá-la passou-lhe as duas mãos pelas fontes e deu-lhe um beijo. Embevecido daquele beijo, o
anjo pendeu a cabeça no ombro dele e enlaçou-o com seus braços nus, reluzentes das pulseiras de pedraria. O duque teve sede, pegou
no copo da duquesa, bebeu algumas gotas; ela tomou-lhe o copo, bebeu o resto. Eu os vi assim: aquele esposo inda tão moço, aquela
mulher - ah! e tão bela!... de tez ainda virgem - e apertei o punhal...
— Virás hoje, Maffio? disse ela.
— Sim, minh'alma.
Um beijo sussurrou, e afogou as duas almas. E eu na sombra sorri, porque sabia que ele não havia de vir.
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Aqui parou a história de Claudius Hermann. Ele abaixou a cabeça na mesa, não falou mais. - Dormes, Claudius? por Deus!
Ou estás bêbado ou morto! Era Archibald que o interpelava: sacudia-o a toda força. Claudius levantou um pouco a cabeça, estava
macilento, tinha os olhos fundos numa sombra negra.
— Deixai-me, amaldiçoados! deixai-me pelo céu ou pelo inferno! Não vedes que tenho sono... sono e muito sono?
— E a história, a história? bradou Solfieri.
— E a duquesa Eleonora? perguntou Archibald.
— É verdade... a história. Parece-me que olvidei tudo isso. Parece que foi um sonho!
— E a Duquesa?
— A Duquesa... Parece-me que ouvi esse nome alguma vez... Com os diabos, que me importa?
EXERCÍCIOS PROPOSTOS
“JOHANN”
01 -: VVVVFFFFFFVVV.
02 - “Agora a minha vez, quero lançar também uma moeda em vossa urna.”
“Na verdade que sou maldito! Olá, Archibald, dá-me outro copo...”
03 - Tinha a face fria como o mármore. Os seios nus e virgens estavam parados e gélidos como os de uma
estátua...”
04 - A luta fez-se terrível na escuridão. Eram dois homens que se não conheciam, que não pensavam talvez
terem-se visto um dia à luz, e que não haviam de ver-se por ventura ambos vivos.
06 - Era demais! Caminhei para ele: ressoou uma bofetada. O moço convulso caminhou para mim com um
punhal, mas nossos amigos nos sustiveram.
— Isso é briga de marujo. O duelo, eis a luta dos homens de brio.
O moço rasgou nos dentes uma luva e atirou-ma à cara. Era insulto por insulto, lodo por lodo: tinha de
ser sangue por sangue.
“SOLFIERI”
01 - VVVVVVV
02 - FFFFFFF
03 - VVFVVVFFVV
04 - É uma referência- talvez injuriosa- ao comportamento do clero católico.
GENNARO
01 - VVFFVVVVFV
02 - “...é a história de um velho e de suas duas mulheres, belas como duas visões de luz. Godofredo Walsh era
um desses velhos sublimes, em cujas cabeças as cãs semelham o diadema prateado do gênio...”
03 - Amei-a; mas meu amor era puro como meus sonhos de dezoito anos. Nauza também me amava: era um
sentir tão puro! era uma emoção solitária e perfumosa como as primaveras cheias de flores e de brisas que nos
embalam aos céus da Itália.
04 - Uma noite... foi horrível... vieram chamar-me: Laura morria. Na febre murmurava meu nome e palavras que
ninguém podia reter, tão apressadas e confusas lhe soavam. Entrei no quarto dela: a doente conheceu-me.
Ergueu-se branca, com a face úmida de um suor copioso, chamou-me.
05 - Uma noite eu disse a Nauza que a amava: ajoelhei-me junto dela beijei-lhe as mãos, reguei seu colo de
lágrimas. Ela voltou a face: eu cri que era desdém, ergui-me.
— Então, Nauza, tu não me amas, disse eu.
Ela permanecia com o rosto voltado
“BERTRAM”
01 - FVVFVFVVFFVVVFV.
02 - “Um outro conviva se levantou.
Era uma cabeça ruiva, uma tez branca, uma daquelas criaturas fleumáticas que não hesitarão ao tropeçar
num cadáver para ter mão de um fim.
Esvaziou o copo cheio de vinho, e com a barba nas mãos alvas, com os olhos de verde-mar fixos,
falou:”
CLAUDIUS HERMANN
01 - E tu, Hermann! Chegou a tua vez. Um por um evocamos ao cemitério do passado um cadáver. Um por um
erguemo-lhe o sudário para mostrar-lhe uma nódoa de sangue. Fala que chegou a tua vez.
Claudius sonha algum soneto ao jeito do Petrarca, alguma auréola de pureza como a dos espíritos puros da
Messíada! disse entre uma fumaça e uma gargalhada Johann erguendo a cabeça da mesa.
02 - O passado é o que foi, é a flor que murchou, o sol que se apagou, o cadáver que apodreceu. Lágrimas a ele?
Fora loucura! Que durma com suas lembranças negras! revivam, acordem apenas os miosótis abertos naquele
pântano! sobreágue naquele não-ser o eflúvio de alguma lembrança pura!
Meu lance no turf foi minha fortuna inteira. Eu era rico, muito rico então: em Londres ninguém ostentava mais
dispendiosas devassidões, nenhum nababo numa noite esperdiçava somas como eu. O suor de três gerações,
derramava-o eu no leito das perdidas, e no chão das minhas orgias...
03 - Uma semana se passou assim: todas as noites eu bebia nos lábios à dormida um século de gozo. Um mês, o
mês em que delirantes iam os bailes do entrudo, em que mais cheia de febre ela adormecia quente, com as faces
em fogo...
04 - Um dia Claudius entrou em casa. Encontrou o leito ensopado de sangue e num recanto escuro da alcova um
doudo abraçado com um cadáver. O cadáver era o de Eleonora, o doudo nem o poderíeis conhecer tanto a
agonia o desfigurara! Era uma cabeça hirta e desgrenhada, uma tez esverdeada, uns olhos fundos e baços onde o
lume da insânia cintilava a furto, como a emanação luminosa dos pauis entre as trevas...
05 - VFVFVVFFFFVFFFF.
O Grande Mentecapto
Honneur Monção
Fernando Sabino é autor contemporâneo dos mais importantes. Dono de um estilo inconfundível em que
ressalta o extremo cuidado com a linguagem, é um especialista em criar situações cômicas de profunda beleza
plástica. Sua capacidade descritiva faz com que o leitor, além de se deleitar com a complicação da trama, consiga
visualizar a cena criada pelo narrado. Sua obra é extensa e inclui principalmente crônicas e contos. Seus romances
— O Encontro Marcado; O Menino no Espelho; O Grande Mentecapto — são fruto de profunda preparação e artesanato
impecável. Por isso mesmo cresce a cada dia a importância de sua obra no panorama da atual Literatura
Brasileira.
Nesse romance de 1979, o Autor elabora uma trama com a nítida intenção de homenagear as pessoas humildes,
simples e puras. Já na epígrafe da narrativa, “Todo aquele, pois, que se fizer pequeno como este menino, este
será o maior no reino dos céus.” Nota-se a vontade de elevar os puros, os inocentes e os ingênuos.
{©Na linha da novela picaresca, — vide o Dom Quixote de La Mancha, de Cervantes — em que o personagem
desloca-se por um espaço indefinido, à cata dos conflitos, para resolvê-los heroicamente, Viramundo vive uma
seqüência de peripécias acontecidas no Estado de Minas Gerais, contracenando com personagens dos mais
variados matizes e comportando-se sempre como o bem-intencionado, o puro, o ingênuo submetido às
artimanhas e maldades de um mundo que ainda não está de todo resolvido. Andarilho, louco, despossuído,
vagabundo, idealista. Marginal em uma sociedade que não entende e em que não se enquadra, o Viramundo
instaura um sentimento de ternura e de pena por todos aqueles que, em sua simplicidade, sofrem o descaso, a
ironia, a opressão e a prepotência.
Como o Quixote, com a sua amada Dulcinéia, e como Dirceu, com a sua adorada Marília, Viramundo põe em
suas ações tresvariadas a esperança de realizar-se emocionalmente com a sua idealizada e inalcançável Marília,
filha do governador de Minas Gerais. Sua ilusão alucinada é reforçada pelos pseudo amigos que o enganam com
falsas cartas de amor e incentivam sua loucura mansa e seu sonho impossível.
Viramundo conhece que o mundo é uma grande metáfora e o trata com idealismo como se ele fosse real.
Consertar o mundo é sua missão e ele se dedica a ela com toda a força de sua decisão, não se deixando abalar
pelo insucesso, pelo ridículo, pela violência ou pelo vitupério. Em seu delírio, o irreal e o real andam de mãos
dadas, não há a separação entre o concreto e o abstrato, e por isso o herói não se abala física ou emocionalmente
com nada com que se defronte: não teme os fortes, os violentos; não se assusta com fantasmas e nem com
ameaças; aceita resignadamente o que a vida lhe reserva.
Percebe-se aqui que, além de pícaro, nosso herói pode ser considerado como bufão, pois jacta-se tolamente
sobre supostas capacidades de resolver as injustiças e o desacerto do mundo. Não tem qualquer ligação definitiva
com a vida; não assume compromissos; é desprezado e usado por aqueles com os quais se relaciona.
A pureza deste aventureiro é a crítica à hipocrisia das relações humanas em um mundo que perdeu o sentido da
solidariedade e da fraternidade. Sua alegria ingênua e desinteressada opõe-se ao jogo bruto dos interesses
malferidos, ao conservadorismo e à arrogância. Porta-voz dos loucos, dos mendigos, das prostitutas, o
Viramundo conhece os meandros da enganação e da falsidade dos políticos e dos poderosos.
Viramundo não era conhecido, mas termina por criar fama em razão dos casos incríveis em que envolve. Sob a
aparência imunda de um mendigo está um sujeito com cultura geral incomum. Sua fala de homem conhecedor
surpreende e sua experiência de ex-seminarista e ex-militar confundem e admiram aqueles com quem convive.
Sua esquisitice e suas respostas prontas a todas as indagações fazem com se acredite tratar-se de um louco manso
e inofensivo.
Outro aspecto interessante é a exploração da temática da loucura. O Autor parece convidar o leitor a uma
reflexão sobre a origem e o convívio com a idéia da excentricidade do comportamento humano. Viramundo
pode ser considerado um louco, mas quem não o é? O que a sociedade considera loucura? Como classificar e
tratar os indivíduos que atuam em dissonância com aquilo que se considera normalidade? A sociedade mostrada
no romance está povoada de tipos que comumente chamamos de loucos: os habitantes de Mariana agem
desvairadamente ao tentar linchar Dª. Peidolina; o diretor do hospício é mais estranho que os próprios internos
do manicômio; o capitão Batatinhas é absolutamente alienado. Há no decorrer de toda a narrativa o
questionamento da fragilidade dos limites entre a sanidade e a loucura.
No limiar da consumação de sua caminhada, Viramundo mudou. No começo era idealista e cheio dos
cometimentos da paixão. Manteve-se assim durante muito tempo até encarar a dura realidade da convivência
humana. A série de acontecimentos em que figura como perdedor física e emocionalmente faz com que se
desiluda. Descobre que as cartas de amor eram falsas; os amigos eram falsos; sua crença era falsa. Por todo lado
só encontra sofrimento, opressão, hipocrisia. Está só, absolutamente só, e a solidão é tudo que lhe resta.
Seu fim é emblemático. Morre vitimado pelo próprio irmão. Paga por um crime que não cometeu. A
intertextualidade bíblica é evidente: compara a trajetória e o comportamento de Viramundo com a Via-Sacra do
Cristo, em todos os sentidos, inclusive no sacrifício final.
SERVIÇO: O Grande Mentecapto faz parte do rol de obras recomendadas pelo Programa de Avaliação Seriada
(PAS — UnB), para a leitura pelos candidatos do 1º ano do 2º grau
BIBLIOGRAFIA
SABINO, Fernando. O Grande Mentecapto. Rio de Janeiro – RJ: Record, 44ª edição, 1995.
O Feijão e o Sonho
Honneur Monção
O Autor
Nascido no interior paulista, no início deste século, Orígenes Lessa revelou desde muito cedo uma atração
incoercível pelos livros. Participou de vários jornais escolares e essa atividade influiu positivamente na formação
do futuro escritor.
Militou profissionalmente na imprensa e na publicidade e seu primeiro romance — exatamente O Feijão e o
Sonho — foi distinguido na Academia Brasileira de Letras com uma láurea de grande prestígio nos meios
literários: O Prêmio Alcântara Machado.
Autor traduzido para vários idiomas e com várias obras adaptadas para o cinema e para a televisão, seu texto é
límpido e de fácil assimilação, com histórias que marcam pela profunda humanidade e lirismo que transmitem ao
leitor um sentimento de familiaridade aconchegante e envolvente do qual é difícil escapar. Nunca foi um escritor
destacado nas “igrejinhas” e rodas literárias, dirigindo a maioria de suas obras para o público infanto-juvenil, no
que reside seu grande mérito como autor que de fato incentiva e desperta o gosto pela leitura.
Conjunto das obras do Autor
- O Feijão e o Sonho
- João Simões Continua
- A Escada de Nuvens
- Napoleão Ataca Outra Vez
- Confissões de um Vira-Lata
- A Desintegração da Morte
- o 13º Trabalho de Hércules
- A Cabeça de Medusa
- O Minotauro
- Dom Quixote (resumo para a juventude)
- Memórias de um Cabo de Vassoura
- O Barão de Münchhausen
- O Palácio de Circe
- Napoleão em Parada de Lucas
- Aventuras do Moleque Jabuti
- Memórias de um Fusca
- Os Homens de Cavanhaque de Fogo
- A Floresta Azul
- As Letras Falantes
- Juca Jabuti, Dona Leôncia e a Superonça
- Procura-se um Rei
- As Árvores Aflitas e A Multiplicação Milagrosa
- Chore não, Taubaté...
- O Mundo é Assim, Taubaté
- Cachorro sem Nome
- o Rei, o Profeta e o Canário
- Podem me Chamar de Bacana
- É Conversando que as Coisas se Entendem
- Alegres Desventuras de um Relógio de Pulso
- A Greve das Bolas.
Tempo e Espaço
A narrativa tem como espaço o Estado de São Paulo, materializado em três cidades: São Paulo, a capital, início e
término da caminhada de Campos Lara; Sorocaba, cidade natal de Maria Rosa e Capinzal, lugarejo perdido no
interior onde Campos Lara foi lecionar e se indispôs com praticamente toda a população. É um ambiente
geográfico bem definido e as descrições, mesmo não sendo minuciosas e detalhadas, proporcionam uma clara
visão do cenário onde se desenrolam as ações. A narrativa progride em flash-back, com o tempo indo e vindo ao
passado e ao presente, numa espécie de ziguezague que por vezes confunde o leitor desavisado. Naturalmente o
resultado é o tempo psicológico que flui elasticamente, ora acelerando, ora tornando-se lento para ajustar-se a
momentos especiais do narrado, como se pode observar no trecho seguinte:
“Campos Lara deu alguns passos. O murmúrio recomeçou. Parou, voltou-se, olhou. O murmúrio cessou.
— Gostei de você, Juca! — disse Maria Rosa, que surgiu da treva, tomando-lhe o braço.
(...)
— Lá vem Literatura outra vez!
Era aquele o maior inconveniente de São Paulo. Em Capinzal, pelo menos, Campos Lara dera uma folga, livrara-
a de aturar a fauna odiosa de artistas e escritores. Era uma gente desordenada, palradora, que enchia a casa
fumando, falando alto, rindo ruidosamente, como se fosse dona do mundo.”
Personagens
- Campos Lara: o protagonista sonhador, poeta renomado, vive para a literatura. Sua ligação com o
mundo real é de alheamento e desinteresse. Sacrifica a própria segurança da família para comprar livros e
objetos artísticos sem qualquer utilidade prática. Ambiguamente, adora a família, mas nada faz para
proporcionar-lhe conforto material e perspectivas de futuro. Normalmente calmo e cordato, só uma única vez
perdeu as estribeiras: quando foi vítima da maledicência dos desocupados moradores de Capinzal. É um
desajustado, em razão de viver em uma sociedade que não valoriza a cultura e a literatura considerada um
luxo desnecessário e, portanto, dispensável.
Debalde Maria Rosa o chamava à realidade. Em vão acusava-lhe a poesia, ridicularizava seus modos, verberava
sua incapacidade para a vida, mostrando os filhos famintos, as roupas velhas, os móveis gastos, a louça quebrada
e a biblioteca, sempre em ascensão, cada vez mais sortida.
Um dos livros mais vitoriosos de Campos Lara tinha este nome simples: Conchego. Poemas de uma doçura infinita,
para além de cristã, em que o poeta cantava a calma remansosa do lar, a alegria e a glória dos filhos turbulentos,
promessas de sonhos, dádivas divinas. Maria Rosa perpassava por ele idealizada, como o anjo protetor, a boa fada, a
suave inspiração. Irene, Anita, Joãozinho, viviam, pulavam, cantavam naqueles versos simples, serenos, alados.
A própria Maria Rosa se espantava de que o marido, sempre desatento, sempre alheado, fora do mundo e da
terra, houvesse visto, sentido tanto. Frases, gestos, graças, muxoxos, que havia olvidado, renasciam agora com
tanta espontaneidade, com tal arte, com tamanha verdade, envolvidos em tal paixão, numa tão doce auréola de
ternura, que ficou comovida. Aquele Juca era um mistério. Mas quando o viu exaltado, quando os jornais e
revistas o alcandoraram às nuvens, como o poeta máximo, como o poeta do lar, como um São Francisco de
Assis de bondade e de amor, Maria Rosa lembrou-se do pouco ou do nada que o marido passava em casa. E da
miséria que na casa passavam, ele, ela, os filhos.
“Culpa dele, bem o sabia. Um inadaptado, um incapaz para a vida prática. Homem como ele não nascera para o
casamento, para a vida do lar. Não tinha jeito para ganhar dinheiro, incapaz de prover às necessidades da família.
Maria Rosa tinha razão, quase sempre. Ela era o Bom Senso. Ele, o Sonho. Nunca vão juntos os dois. Ouvia
humildemente, com resignação fatalista, os destemperos da esposa. Maria Rosa não era uma inimiga. Maria Rosa
era o outro lado da vida. O lado em que não daria coisa nenhuma, em que ele sempre fracassaria. O duro. O difí-
cil. Sem cadência nem rima. O do seu permanente naufrágio. Lado onde jamais deveria ter ingressado. Mas já era
tarde. Não podia recuar. Tentava reagir. Procurava adaptar-se à situação, arquitetava planos, fazia projetos, havia
de ganhar dinheiro, de arrumar a vida, de ser um chefe de família, útil e exemplar, já que assim o destino o exigia.
Análise Crítica
O texto, como bem sugere o título, sustenta-se sobre duas linhas básicas: o feijão é o lado prático da vida. A
necessidade de o indivíduo prover o próprio sustento e o da família. A luta pela sobrevivência que se desenvolve
em cada momento da trajetória do homem pela vida afora. O sonho é a fantasia, a quimera que cada um tem
dentro de si. A aspiração de grandeza, de desligamento dessa realidade tão dura e desagradável. As duas linhas
formam a grande antítese alicerçadora da vida. Os que se fixam no feijão tornam-se amargos, desagradáveis,
agressivos. A obsessão pelo lado prático da existência os impede de tomar uma atitude carinhosa, compreensiva,
aconchegante diante daqueles que deles se aproximam. Os adeptos do sonho perdem o senso da realidade e
tornam-se desajustados em um mundo excessivamente materialista. São criticados, espezinhados, humilhados e
sua vida é um rosário de sofrimentos e de dor.
Exercícios Propostos
Texto I -
Irene não foi a Paz. Foi mais trabalho, foi mais pobreza, foi miséria. O orçamento, dificilmente equilibrado,
rebentou de uma vez. A menina era fraquinha, chorava dia e noite, um tormento sem fim. Campos Lara, que
tinha adoração pela filha, perdia logo a paciência, exasperava-se. Não podia trabalhar em casa, não podia ler. À
noite, apesar do choro da criança, dormia como pedra. Não havia jeito de fazê-lo acordar, de conseguir-lhe uma
ajuda. Isso quando não perdia o sono, agitado por algum livro em perspectiva. E então explodia. Ralhava,
gritava, protestava. Abrandava de repente, pegava a criança nos braços, punha-se a passear pelo quarto. Aquilo
inquietava ainda mais Maria Rosa. Quando Campos Lara cantarolava, andando pelo quarto, para ninar a filha,
esquecendo os versos, deixava-se tomar por uma sonolência invencível. O ninado era ele. E Maria Rosa
precisava ficar alerta para, quando os esbarrões se amiudavam, quando a voz baixava, cada vez mais lenta, correr
em auxílio da criança.
— Vá dormir, meu filho. Eu tomo conta...
Juca obedecia, metia-se nas cobertas, ressonava logo.
Com dois meses faltou o leite a Maria Rosa. Novas angústias, novas despesas. E a vida do casal foi afundando
cada vez mais. Aberto o caminho, um ano mais tarde, vinha Anita. Dois anos mais tarde, Joãozinho, nome do
avô. E assim como Rosinha se acostumara com os versos do marido, banalizados pela freqüência e pela
facilidade, Campos se acostumou com o sofrimento da esposa. Via nela os repentes de fundo econômico, a
diversidade de gênios, a diferença de educação e de temperamento. E como eram males insanáveis, à prova de
esforço, resignou-se, passou a viver no seu mundo, dentro das suas fórmulas livrescas, das suas criações mentais,
ouvindo sem revolta, fatalisticamente, os protestos, as censuras, as acusações, refugiado, para sempre, na sua arte.
Debalde Maria Rosa o chamava à realidade. Em vão acusava-lhe a poesia, ridicularizava seus modos, verberava
sua incapacidade para a vida, mostrando os filhos famintos, as roupas velhas, os móveis gastos, a louça quebrada
e a biblioteca, sempre em ascensão, cada vez mais sortida.
Um dos livros mais vitoriosos de Campos Lara tinha este nome simples: Conchego. Poemas de uma doçura
infinita, para além de cristã, em que o poeta cantava a calma remansosa do lar, a alegria e a glória dos filhos
turbulentos, promessas de sonhos, dádivas divinas. Maria Rosa perpassava por ele idealizada, como o anjo
protetor, a boa fada, a suave inspiração. Irene, Anita, Joãozinho, viviam, pulavam, cantavam naqueles versos
simples, serenos, alados.
A própria Maria Rosa se espantava de que o marido, sempre desatento, sempre alheado, fora do mundo e da
terra, houvesse visto, sentido tanto. Frases, gestos, graças, muxoxos, que havia olvidado, renasciam agora com
tanta espontaneidade, com tal arte, com tamanha verdade, envolvidos em tal paixão, numa tão doce auréola de
ternura, que ficou comovida. Aquele Juca era um mistério. Mas quando o viu exaltado, quando os jornais e
revistas o alcandoraram às nuvens, como o poeta máximo, como o poeta do lar, como um São Francisco de
Assis de bondade e de amor, Maria Rosa lembrou-se do pouco ou do nada que o marido passava em casa. E da
miséria que na casa passavam, ele, ela, os filhos.
1. I e II.
2. I e III.
3. I e IV.
4. II e IV.
5. Nenhuma delas.
Texto III
Tinha sido um erro. Campos Lara não devia descer até aquela gente. Era pôr-se à altura deles, emparelhar com
aquela pequenina canalha sem espinha. Uns pobres-diabos irresponsáveis, ignorantes, boçalizados. Aparecer na
Bigorna para tomar satisfações ao Drogueiro, ao Venâncio, àquele vil e intrigante Matraca, era infantilidade. Sua
atitude devia ser outra. Deixar a cainçalha ladrar. Tantas vezes outros lhe haviam ladrado aos pés sem que lhes
desse a honra de um simples olhar. E eram cães maiores e mais ilustres. Agora, por uma pobre intrigalhada de
aldeia, perdia, dessa maneira, o controle. Sim. Fizera mal. Que o fel corresse. Que o veneno se espalhasse.
Devia procurar o padre. Justo. Ele tinha direito a uma explicação. Verdade ou não, Campos Lara não o
conhecia, não tinha a mais ligeira sombra de provas e de razão para falar. Nem tinha nada com isso. Mas fora
calúnia. Acusavam-no de ter falado. Não falara. Diria ao padre. Ao padre, sim. Se era um homem, veria,
compreenderia, apertar-se-iam as mãos. Vivendo no interior há muito tempo, o vigário devia estar acostumado
àquele ambiente de mexericos e de maldade mal aproveitada. Mas nunca deveria ter procurado os supostos
caluniadores. E Campos Lara arrependia-se do repente enfurecido que o levara à farmácia. Nem sabia bem
como para lá se dirigira. Era sujeito a esses gestos bruscos, violentos, próprios dos grandes tímidos, dos
inadaptados como ele.
07 – Após uma leitura atenta do fragmento, julgue os itens como certos ou errados.
1. As frases curtas, entrecortadas são reveladoras de grande alteração psicológica por que passa o personagem.
2. O narrador onisciente presencia o acúmulo de pensamentos contraditórios presentes na mente do
personagem.
3. Campos Lara se recrimina, principalmente por haver descido de sua dignidade de homem superior em
relação àqueles que freqüentavam a Bigorna.
4. Infere-se do texto que o motivo da irritação de Campos Lara tem a ver com o Padre da cidade.
5. Infere-se que o problema resumia-se a mexericos surgidos entre os freqüentadores da Bigorna e que
comprometiam Campos Lara.
6. A reação de Campos Lara fora fulminante e nem ele mesmo sabia como explicá-la.
7. Campos Lara tem consciência de que era um inadaptado e tímido.
8. O arrependimento de Campos Lara tem a ver com o papelão que faria quando se confessasse com o padre.
9. Infere-se do texto que nas pequenas cidades do interior é comum as pessoas se preocuparem com o modo
de vida dos outros.
Texto IV
O pai via os olhos tristes do filho, contava as espinhas no seu rosto. Era amor. Com certeza era amor. Estava
na idade. E esperava a confidência.
Uma tarde, o rapaz se atreveu.
— Papai, eu estava querendo falar com o senhor.
— Fale, meu filho.
Decerto ia pedir licença para casar-se. Que loucura! Naquela idade ... Mas o menino hesitava. Afinal, criou
coragem. E contou que estava escrevendo umas coisas. Não sabia se prestavam, se tinha jeito. Não queria fazer
papel ridículo. Estava há muito para lhe falar. Queria a sua opinião franca. Estava disposto a ver a bobagem?
Campos Lara empalideceu.
— Estava.
E muito vermelho, trêmulo, o rapaz lhe estendeu uma folha. Era um poema. O pai sentiu uma turvação na
vista, percebeu que o coração lhe batucava no peito. Correu os olhos pelo poema, versos livres, linguagem nova,
imagens febris, uma revelação inquietante de poeta, voltado para os problemas que eram a angústia da sua
geração.
10 – Após uma leitura atenta do texto, julgue os itens a seguir como certos ou errados.
1. Infere-se que o pai já percebia um drama íntimo que o filho tinha dificuldade em confessar.
2. Não querer “fazer papel ridículo” revela auto crítica e senso de responsabilidade.
3. Infere-se que o “novo poeta” escrevia sem o necessário respaldo técnico-teórico, sendo mais intuitivo que
artesanal.
4. “Campos Lara empalideceu” de tristeza por saber que o filho se encaminharia para o mesmo rosário de
sofrimentos por que tinha passado.
5. A emoção do momento contagia os dois personagens envolvidos.
6. O filho de Campos Lara produziu versos engajados com a problemática social de seu tempo.
7. Em “O rapaz lhe estendeu uma folha.” O termo em destaque é utilizado em sentido próprio.
8. Em “Seu filho era um poeta.”, o verbo, mesmo estando no imperfeito do indicativo, denota o aspecto
temporal de presente.
9. Campos Lara deplora ter sacrificado a família à arte.
10. Campos Lara antevê uma vida mais problemática para Joãozinho em razão de sua inexperiência de vida.