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(5.3.1) Mensagens12 - DP - (QA-L)
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Lê o texto.
O vento da Estrela
Relembro com clareza e paixão uma fria manhã de janeiro em que caminhava pelos lameiros
que ladeiam as estradas desertas entre Gouveia e Folgosinho, observando o feno a dançar com
o vento que me fustigava a pele do rosto. Fecho os olhos para o sentir e aceno ao milhafre que
vigia todos os meus movimentos, desenhando círculos por cima de mim.
5 Ao fim de meia hora de caminho, sentei-me no meio da estrada abraçado às pernas e com
o queixo pousado nos joelhos. Não me cruzei com vivalma desde que comecei a caminhada a
partir de Gouveia, a Princesa da Serra, em direção a Folgosinho. Sempre a subir na ida, sempre
a descer no regresso. Se tudo na vida fosse assim tão certo. Fechei os olhos para ouvir o vento.
À lembrança, chegaram-me as palavras de Alberto Caeiro: «Outras vezes oiço passar o
10 vento, / E acho que só para ouvir passar o vento vale a pena ter nascido.» A dada altura, senti
uma presença junto a mim. Resisti a abrir os olhos, acreditando tratar-se do espírito da serra
que me invadia. Respirei fundo, preenchendo-me daquele vento ímpar.
Os ventos são sempre iguais e sempre diferentes (como as pessoas). O vento da serra não é
igual ao vento do mar ou do rio, ao vento da planície ou do deserto, e muito menos ao da cidade.
15 Diferenciam-se na voz, na intensidade, no cheiro, no rumo. Aproximam-se no livre-arbítrio.
Quando abri os olhos, um enorme cão serra da Estrela mirava-me a menos de meio metro.
Chegara silencioso, certamente intrigado por ver-me imóvel no meio da estrada, e aproximou-
-se para me cheirar. Mantive-me quieto, sentindo-lhe também o cheiro, até que se desinteres-
sou e seguiu estrada abaixo. Voltei a fechar os olhos. Pensei no cão e na lembrança já enraizada
20 da sua brevíssima presença. Nunca é a duração do evento que deixa marcas.
Desde miúdo que gosto de andar ao vento, ao contrário da maioria das pessoas que conhe-
ço, que preferem apontar-lhe os defeitos. Que os tem, e muitos. Mas eu sempre preferi olhar
para o seu sentido figurado: vassouradas que separam o trigo do joio, levando o supérfluo e o
lixo, separando o essencial. Discutível, claro.
25 O contrário também sucede – poucas coisas na vida são tão «pão, pão, queijo, queijo» como
as subidas e as descidas de uma serra. E, por vezes, o vento leva mesmo para longe aquilo que é
importante, a saúde, a alegria ou o amor, deixando o superficial, a doença, a tristeza, o desamor.
Lembro-me de gostar de correr na rua quando estava vento. «Não vás lá para fora, João, está
muito vento», ralhava a minha mãe. «É por isso mesmo que vou», pensava eu, correndo contra
30 o vento com as lágrimas a fugirem dos olhos e o cabelo penteado pela ventania. Quando me
cansava, montava-me às cavalitas do vento e voava.
3. No primeiro parágrafo, para evidenciar os efeitos do vento, o cronista recorre a sensações 40 pts.
A. visuais e táteis.
B. gustativas e táteis.
C. gustativas e olfativas.
D. visuais e olfativas.
5. O gosto por «andar ao vento» (linha 21) leva João Silva a 40 pts.