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Artigo MC
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Artigo MC
“Sinto que fiz algo que talvez no futuro se prove como tendo sido uma
grande contribuição a compreensão da mente humana” (Klein, 1959)
No prólogo do livro Por que Klein (2018), Elias Rocha Barros, nos informa
sobre um levantamento patrocinado pela IPA, feito pelos editores/coordenadores do
Dicionário Enciclopédico Internacional de psicanálise, com cerca de 400 autores de três
continentes, sobre quais eram os cinco conceitos mais importantes da clínica, o de
identificação projetiva de Melanie Klein está entre eles. Indago a vocês, Melanie Klein
é atual? Respondo que sim, seu pensamento está vivo e presente na clínica
contemporânea.
Klein acredita que esta confusão de identidade e do ego pode se processar desde
o início da vida, diferente das questões edipianas. Rosenfeld (1947), Segal (1950) usam
a dinâmica da identificação projetiva para trabalhar o funcionamento do ego na
esquizofrenia. Money-kyrle (1956) descreve esta dinâmica em um paciente normal, que
não conseguia trabalhar em seu escritório, sente-se vago, inútil. Sonhou que tinha
esquecido o “radar” numa loja e que seria impossível buscar. O analista pensou que o
paciente tinha deixado em fantasia partes de seu self, se sentiu incerto, o paciente
começou a rejeitar suas interpretações com raiva e desprezo. Atualmente a dimensão
intrapsíquica da identificação projetiva se transformou na dimensão interpessoal, é vista
como um tipo normal de transação entre subjetividades, como processo no campo bi
pessoal, grupal, social.
Klein (1960) escreve um artigo sobre saúde mental. Descreve que ela tem uma
natureza multifacetada, se baseia num Inter jogo entre amor, ódio, onde a capacidade de
amor é predominante. Suas raízes estão na boa relação do bebê com a mãe, no
desenvolvimento emocional saudável e estável. Diz que a base da saúde mental é uma
personalidade integrada, que apresenta maturidade emocional, força de caráter,
capacidade de lidar com emoções conflitantes, equilíbrio entre vida interna e externa. A
maturidade emocional significa elaborar os sentimentos de perda, de luto e aceitar
substitutos. Se o ressentimento se mantem, perturba as relações pessoais e sociais. A
força do caráter se baseia em processos de internalizar uma mãe boa, que guia e protege,
bem como os pais bons. Na identificação com eles subjaz a lealdade para com as
pessoas. Indivíduos aparentemente equilibrados, não significa que tem força de caráter.
Eles procuram facilitar a vida, evitando conflitos, negando, buscando o que é
conveniente. Muita negação e baixa tolerância a dor, impede insight sobre a vida
interior, traz insegurança, falta de confiança em si mesmo. Perde a capacidade de dar e
receber, de ser grato e generoso, de compreender a complexidade da vida. A saúde
mental não é compatível com superficialidade, que se liga a negação do conflito interno
e dificuldades externas. Ter equilíbrio não significa evitar conflito e sim ter um certo
insight sobre a variedade dos impulsos e sentimentos contraditórios e fazer face a eles.
Supõe força para atravessar emoções penosas e lidar com elas. Cisões excessivas leva a
inibições de talento, de simbolização. A pessoa que suporta viver a tristeza
profundamente é capaz de estabelecer empatia com o sofrimento do outro, de confiar
em si, de tolerar frustração e com amor mitigar o ódio e agressividade, sem medo de
retaliação e perseguição. Há uma correlação entre saúde mental e modificação de
atitudes idealizadas, indicando menos rigidez de defesas. Quando o insight não é
sufocado, a saúde mental se torna possível. Há integração de diferentes partes do self.
Não há integração completa. A saúde mental deve ser constantemente reconquistada,
acompanhada do sentimento de solidão.
Klein (1963) escreve o artigo Sentimento de solidão, referindo que não é estar
privado da companhia do outro e sim estar só, independente das circunstâncias
exteriores. É um estado interno, com um sentido de integração (introjeção do objeto
bom) de mitigar o ódio através do amor. Na vida há um conflito entre buscar integração
e ao mesmo tempo temê-la. O sofrimento acompanha os processos de integração e
contribui para a solidão. O sentimento de realidade diminui a onipotência e aumenta a
esperança. Não há integração plena e cada um experimenta a solidão de uma forma.
Trata-se de restaurar a capacidade de estar só, entrar em contato consigo e com o outro
sem “virar uma coisa só”. Um estado mental semelhante ao encontro analítico, de
entregar-se ao livre fluxo de associações sem memória, sem desejo, nos dizeres de Bion,
um estar bem acompanhado. A sensação é de uma intimidade prazerosa. Winnicott
(1958) também escreve em seu artigo “A capacidade de estar só”, um estado semelhante
ao do brincar. Um ambiente humano pacífico e pais que puderam autorizar-se um ao
outro, favorecem a interiorização de figuras femininas e masculinas que se mantem em
contato e diferenciação.
Vamos dormir.
Referências
Bion, Wilfred. (1962) Uma teoria do pensar In Melanie Klein Hoje, vol 1. Rio de
Janeiro: imago, 1991.
Kriteva, Julia. O gênio feminino; a vida, a loucura e as palavras. Tomo II Melanie Klein.
Rio de Janeiro: Rocco, 2002
Ogden, Thomas. Os sujeitos da psicanálise. São Paulo: Casa do psicólogo, 1996.
Petot, Jean-Michel. Melanie Klein II. São Paulo: editora perspectiva, 1992.
Prado. Adélia. Prado – Poesia Reunida. São Paulo: Ed. Siciliano, 1991, pág. 252.