Nothing Special   »   [go: up one dir, main page]

16972-Texto Do Artigo-41869-1-10-20131019

Fazer download em pdf ou txt
Fazer download em pdf ou txt
Você está na página 1de 19

82

A EDUCAÇÃO LIBERTADORA E OS FATORES QUE


INTERFEREM NOS PROCESSOS EDUCATIVOS

Terezinha Sueli de Jesus Rocha 1


Sérgio Rogério Azevedo Junqueira 2

Resumo

Este artigo objetiva percorrer a trajetória da educação libertadora na realidade social


brasileira, refletindo sobre a necessidade de se repensar a sua ação no contexto atual. Ao se
fazer a articulação entre a realidade da época em que a educação libertadora nasceu tendo
como objetivo responder aos apelos de libertação destes povos, com a realidade dos tempos
atuais e suas implicações, busca-se um caminho para as respostas às questões da sua ação na
atualidade. Quando tratadas as funções do processo educacional dentro do contexto de uma
sociedade, necessário se faz considerar as abordagens que dão conta de cada situação. O
desafio deste tema é enorme, pois esta concepção de educação extrapola os ambientes
acadêmicos tendo o ser humano como referência. Para a realização deste trabalho, utilizou-se
pesquisa bibliográfica e consultas de artigos científicos.

Palavras-chave: Conscientização, Emancipação, Educação Libertadora

Abstract
This article aims to walk the path of liberating education in the social reality of Brazil,
reflecting on the need to rethink their actions in the current context. By making the link
between the realities of time that liberating education was born with the aim to respond to
calls for release of these people with the reality of the times and its implications, one way to
search for the answers to the questions of its action at present. When treated the functions of
the educational process within the context of a society, need to do is consider the approaches
that account for every situation. The theme of this challenge is enormous, because this
conception of education goes beyond the academic environment with the human being as a
reference. For this work, we used a literature search and consultation papers.
Keywords: Awareness, Emancipation, Education Liberating

1
Mestre em Teologia da PUC/PR. E-mail: terezinhasuelirocha@yahoo.com.br
2
Doutor em Ciência da Religião, líder do grupo de Pesquisa Educação e Religião. E-mail:
srjunq@uol.com.br

Último andar [22] – Outubro de 2013


83

Introdução

A sociedade atual está exigindo posicionamentos diferenciados em relação aos mais


diversos aspectos, mas especialmente aos aspectos educacionais. A humanidade vive hoje a
era dos tablets, laptops, celulares e computadores, processos avançados da informatização e
da informação criando redes sociais que transformam expressivamente, as relações entre os
seres humanos. Pensar em rede é um dos meios mais modernos de se criar conhecimentos e
articulá-los no cotidiano, facilitando as relações sociais. Esses avanços tecnológicos em geral
colocam a sociedade em alerta constante, com as novidades que chegam a cada instante
impactando a vida de um grande número de pessoas e exigindo sua constante atualização.

O domínio tecnológico constituído pelas ações e instituições cresceu enormemente e


expandiu-se superando o conhecimento e a cultura tecnológica, assumindo assim, função de
grande importância no que se refere à estrutura e organização da sociedade. Libânio define
esta situação, extremamente avançada, da seguinte forma: “Todos os desejos se tornam
possíveis pela magia da tecnologia. Não se precisa criar nenhuma alternativa quando o
presente enche todas as medidas dos sonhos.” (LIBÂNIO, 2003, p. 31) Esta é a realidade dos
tempos atuais, que desafia educadores e famílias no sentido de discernir quais passos devem
ser tomados em vista do bem maior para a humanidade.

Na década de 1950, surgiu com George Friedman, a expressão: escola paralela. Este
sociólogo francês concebeu esta expressão, como sendo o conjunto das informações e
mensagens cognitivas, proporcionadas pelos meios de comunicação de massa. Na época, a
escola paralela acontecia através do cinema, rádio, televisão, livros, discos, desenhos
animados e imprensa em geral. Hoje os avanços tecnológicos proporcionam para toda a
humanidade, a vida em tempo real. Essa realidade extraescolar, extraeducacional e muitas
vezes extraoficial, a escola paralela, produz mudanças pontuais na atualidade. E o que mais
preocupa é que promove verdadeiras mutações chegando a interferir na essência dos
mecanismos de percepção e conhecimento, assim como também afeta diretamente as relações
humanas, que passam a ser fragilizadas e isso constitui um grande desafio à cultura e à
estrutura educacional, especialmente quando se luta pela liberdade e dignidade da vida dos
seres humanos.

Em diversos eventos sobre o modelo de educação melhor apropriado para o século


XXI, são constantes os temas educacionais e a reflexão sobre a pressão dos problemas a partir
do ajuste econômico e as características do novo patamar de exigência no mercado de
84

trabalho em relação à escolaridade e à versatilidade humana. Portanto para o novo século, há


maior probabilidade de ser exigido, além de todas as outras habilidades já conhecidas, o
desenvolvimento da capacidade de estabelecer relações, a aquisição de habilidade no uso dos
recursos tecnológicos, a utilização do conhecimento especificamente científico, a conquista
do agir de forma autônoma e o exercício do pensamento crítico e reflexivo em cada situação.
O ambiente escolar e educacional, é a realidade que passa a ser somente uma das muitas
fontes de transmissão do conhecimento científico. As outras fontes estão à disposição, no
universo de situações existentes e na experiência individual, que ganha proporções de acordo
com a maturidade, pois quando tudo ganha espaço na sociedade, o ser humano necessita
inferir e raciocinar logicamente, a fim de agir com coerência, ética, segurança e competência.

Ao se fazer uma análise dos processos educativos, abordando a história da educação


libertadora no Brasil e também na América Latina, percebe-se a grande influência de uma
série de fatores que interferem nesta caminhada e mostram a existência de proposições e
postulados teóricos emergentes, delimitando o conceito de educação. No geral, o conceito de
educação pressupõe a relação da pessoa consigo mesma e com os outros buscando o
crescimento em todos os aspectos da sua vida e da vida dos outros cidadãos. Nessa busca está
presente também a consciência do aspecto da transcendência que na liberdade, pressupõe a
responsabilidade pessoal e comunitária.

A educação sendo entendida como o esforço das pessoas em vista da conquista de sua
humanidade, retoma a questão de como pensar o processo de libertação na sociedade atual.
Colocada essa questão na perspectiva de detectar possibilidades existentes no real processo de
libertação, pergunta-se, que instrumental teórico possibilitaria a compreensão da sociedade
atual com probabilidades de uma práxis libertadora e emancipatória? Dalmo Dallari
escrevendo sobre a caminhada histórica da convivência humana afirma: “que tem havido uma
complexidade crescente da vida social. A convivência humana se tornou complexa, porque o
próprio ser humano complicou essa convivência. Progressos, conquistas e avanços
tecnológicos acabaram se convertendo em fatores de dependência.” (DALLARI, 1989, p. 75)
O que seria um salto de qualidade para a vida da humanidade, pode acabar desvirtuando o seu
objetivo. O que fazer para mudar essa situação?

Um dos maiores desafios da educação libertadora continua sendo o de trabalhar na


elaboração de propostas em que se levem em conta os aspectos da crítica reflexiva,
preparando para o enfrentamento da desigualdade social, marcadamente presente na
85

sociedade. Quando se manifesta a dimensão cultural da educação valorizando a consciência


de cidadania e a transformação social, torna-se possível visualizar processos educativos e
práticas educacionais em busca da autêntica libertação. A ação educativa libertadora mantém
uma relação de troca horizontal, cujo objetivo é aprofundar conhecimentos com a finalidade
de intervir nos acontecimentos, em benefício da humanidade, através da transformação da
realidade. Essas mudanças e transformações, quando realizadas de forma socializada e
consciente, integram-se na vida das pessoas evidenciando a importância dos processos
formativos eficazes e, consequentemente aparecem os resultados proporcionados pelo
comprometimento necessário, fruto da consciência de cidadania.

Na história de uma nação ou um continente ficam sempre as marcas da situação


anterior enquanto são construídas as marcas da situação atual. A educação fazendo parte
intrínseca da sociedade assume também as consequências de todas as transformações sociais.
Conforme escreve Oliveira: “A situação histórica vivida na América Latina levou os teóricos
da educação em nosso continente, a repensar a partir de nossa situação epocal, a temática
fundamental das teorias humanistas - Kant, Hegel, Humboldt - da educação na modernidade:
a emancipação humana.” (OLIVEIRA, 1989, p. 15) Portanto, a educação sempre mereceu um
pensar diferente por ser fundamentalmente, um processo em direção à liberdade.

Em cada época vivida na sociedade, se faz necessária a adequação à realidade desse


momento, assim escreve com muita propriedade Pulo Freire: “Não é possível à sociedade
revolucionária atribuir à tecnologia as mesmas finalidades que lhe eram atribuídas pela
sociedade anterior. Consequentemente, nelas varia igualmente, a formação dos homens.”
(FREIRE, 2005.p.181) Este pensamento reforça a teoria de que a ciência e a tecnologia
somente serão verdadeiramente éticas, se estiverem constantemente a serviço da sociedade,
em busca de sua permanente libertação e humanização. Nesse aspecto mais uma vez, a
educação libertadora tem importante papel a desempenhar junto à sociedade.

A educação libertadora possibilita a tomada de consciência da situação social e


procura dar condições de atuação transformadora dentro da realidade. O objetivo desta forma
de educar é fazer com que, cada pessoa se torne sujeito do próprio processo e seja responsável
pelas ações e determinações da sua caminhada tanto individual, quanto comunitária. Portanto
são necessárias inovações por meio de ferramentas pedagógicas, no trato da dimensão cultural
no fazer pedagógico, buscando a reflexão sobre as constantes transformações, sabendo-se
86

preservar as identidades em um processo formativo que respeite e valorize o ser humano na


sua dignidade.

Um dos aspectos de grande relevância, principalmente para a pastoral da


evangelização é o compromisso com os que vivem em situação de maior vulnerabilidade
social. Devido à diversidade cultural existente em todos os ambientes, as respostas às
exigências pastorais se tornam um grande desafio. Junqueira escreve sobre as respostas
pastorais da Igreja Católica, que: “por seu compromisso com os pobres se abrira aos valores
das culturas oprimidas, se defronta cada vez mais com os desafios da evangelização da cultura
moderna. O pluralismo cultural, vivido dentro mesmo da Igreja, exige respostas pastorais
diversificadas.” (JUNQUEIRA, 2001, p.207) As considerações da Igreja sobre o papel da
educação contemporânea são realmente necessárias, a fim de identificar o processo
educacional de libertação, como instrumento essencial de transformação das realidades sociais
e como consequência, torná-la imprescindível para o processo libertador e emancipador.

A análise crítica da realidade juntamente com a prática democrática, propicia a


constante mudança de atitude e possibilita a transformação na sociedade. Através da dimensão
social e das práticas pedagógicas, torna-se possível sinalizar o que contribui para o
fortalecimento das ações e a valorização do processo de cidadania em vista de uma autêntica
educação libertadora. A realidade de uma educação que sirva aos interesses do cidadão, capaz
de transcender seu real sentido e, verdadeiramente transforme vidas, sendo libertadora,
consequentemente desenvolve o espírito de luta, o sentimento de esperança e promove ações
de cidadania consciente.

O sentido e a finalidade da vida é o objetivo mais sublime que o ser humano pode
alcançar e conforme escreve Brighenti: “A pessoa é um ser que comporta em si mesmo um
destino a uma finalidade. É o eterno do temporal, o infinito do finito, o espírito da matéria. E
tudo isso por causa da liberdade que lhe é constitutiva e o torna sujeito de responsabilidades.”
(BRIGHENTI, 2006, p. 160) A liberdade dignifica a vida das pessoas e a educação tem essa
grande missão. Entendida no seu sentido dignificante e transcendental, a educação
transforma-se em instrumento de crescimento pessoal e de aprendizagem para a vida.

A educação se constitui em uma das vias preferenciais de acesso à informação,


informatização e autonomia e traz em si a grande responsabilidade de conscientizar e libertar,
a fim de dignificar o ser humano, que no seu aspecto de transcendência estabelece relações
com todo o universo. Conforme palavras de Antoncich: “a dignidade humana descansa na
87

liberdade, que nos assemelha ao próprio Deus, pela qual a pessoa humana estabelece relações
com o mundo, com os outros e com o próprio Deus.” (ANTONCICH, 1982, p. 58)

Quanto mais se articula o conhecimento frente ao mundo, mais se encontram grupos


que se sentem desafiados a buscar respostas e quanto mais desafiados, mais são alertados pela
consciência crítica e transformadora frente à realidade. Partindo-se destas perspectivas,
pretende-se com este artigo, provocar certa inquietação em torno de ações educativas na
sociedade deste século. No processo de libertação do ser humano através da prática educativa,
reconhecem-se os fatores de interferência e também as contribuições existentes na caminhada,
facilitando o alcance da plenitude do ser e fazendo acontecer a educação verdadeiramente
libertadora.

Fatores importantes que interferem nos processos educativos libertadores

É certo que a educação contribui marcadamente para a inserção social do ser humano
dentro da sua realidade. É certo também que a sociedade influi sensivelmente na vida de cada
cidadão. E tanto a educação, quanto a sociedade caminham lado a lado dentro da realidade, e
é somente na realidade que poderão fazer acontecer a transformação, sem fugir dela e muito
menos dispensá-la. Portanto é importantíssimo achar o fio condutor destes dois pontos fortes e
assim trabalhar corretamente para o bem da humanidade. Diversas foram as formas
experimentadas nesse sentido, ao longo dos anos, mas um dos fatores que conseguiu fazer
frente aos desafios educacionais e sociais, durante mais de duas décadas, foi a união de duas
forças: educação libertadora e planejamento participativo que deram sua grande contribuição
aos processos educacionais. Estas duas forças valorizam a reflexão e a ação na sua
metodologia, propiciando a transformação da realidade.

A dinâmica do planejamento participativo tem a força do enfrentamento das situações,


a reflexão em cima da realidade e a busca de formas adequadas para a solução dos problemas
levantados. Estas são características inerentes ao processo da educação libertadora, que tem
como ponto forte a conscientização de todo o cidadão. Do início dos anos setenta até final dos
anos noventa, a educação libertadora e o planejamento participativo caminharam juntos nos
segmentos educacionais, por existir a convicção de ser o planejamento participativo uma das
melhores formas de se vivenciar o compromisso libertador. Como escreve José Comblin: “O
desafio é assumir a realidade humana com toda a sua complexidade. [...] o modo de sentir e de
88

pensar dos cidadãos de hoje.” (COMBLIN, 2002, p. 9) Dentro do método ver julgar e agir, é
possível averiguar as possibilidades e os limites da ação, dando visibilidade ao conceito de
cidadania e libertação.

A realidade das desigualdades sociais do país pode ser vista não só, mas também, a
partir da perspectiva da modernidade que detêm o controle econômico, político e cultural e o
mais grave é que mantém a situação da maioria marginalizada, sem acesso às conquistas
abertas pela modernização da sociedade. Existe uma perplexidade muito grande em relação ao
período de transição, inovação e transformação social. Transição que vem carregada de
potencialidades positivas para a sociedade, porém caracterizadas por tensões, rupturas e
quedas de valores, provocando insegurança, por se fazer presente em todas as áreas da
sociedade. Outro aspecto preocupante é o de inclusive transformar a concepção de vida de
muitas pessoas, que passam a viver os conceitos de uma sociedade sem solidez. Os valores se
desfazem, e as pessoas sobrevivem na sociedade com o sentimento de isolamento, onde o
comum é deixar o outro em último plano.

Existe uma racionalidade técnica que tem a primazia sobre a relação e o universo das
experiências humanas, essa racionalidade resolve os problemas sociais e deixa ao ser humano
a responsabilidade de procurar um sentido para sua vida. Sobre essa relação, João Batista
Libânio escreve o seguinte:

Esta racionalidade conflita com experiêncuias lúdicas, estéticas, de


gratuidade. Por isso, dificulta ter experiências salvíficas na relação com os
outros, com a natureza, com a história. Obscurece a compreensão de uma
revelação que se fundamenta na gratuidade de oferta e acolhida. Indo mais
fundo, a teoria crítica tenta mostrar que a maior crise da sociedade
ocidental, capitalista e socialista, lhe vem da relação de dominação das
ações teleológicas sobre as ações comunicativas, domínio dos subsistemas
econômico e político sobre o ‘mundo da vida’. Em outras palavras, as
ações que visam a uma intercomunicação entre as pessoas se subordinam
àquelas orientadas para fins previamente definidos. (LIBÂNIO, 2005, p.
124)

O final do século XX se desenvolveu de forma fantástica, nas áreas tecnológicas,


eletrônicas. As intercomunicações, as informações e a informatização, a biotecnologia, o
domínio da energia, os novos materiais, com suas regras que visam dominar os fenômenos
89

físicos enquanto ficam à deriva ações comunicativas referentes à vida humana, ao mundo da
vida. Necessário e interessante seria que a sociedade como um todo, face a estas dificuldades
pudesse construir novas formas de relações mais verdadeiras, mais solidárias, mais
participativas e de maior qualidade, no sentido da fraternidade. Seriam estes, os fatores
educacionais de grande importância para a construção de uma sociedade mais justa e fraterna.

Considera-se importante também, a conscientização nos meios em que se encontram


pessoas de influência, os formadores de opinião, que sendo multiplicadores dos ideais da
verdade, da fraternidade, da solidariedade e da liberdade, motivam a mudança de atitudes
capazes de transformar a sociedade. Segundo as palavras de Barbosa o movimento de:
“transformação cultural é provocado pela consciência crítica das pessoas, conferindo-lhes
uma capacidade de desvelamento da realidade social, que é resultado da intervenção e
criatividade [...] passível de transformação.” (BARBOSA, 2005, p.69) A educação
libertadora, no seu aspecto político dentro da sociedade em conflito e no seu aspecto
evangelizador, enquanto exigência de um evangelho social possibilita a conquista do poder
autônomo, cultural, social, político e de cidadania. Na interação com a realidade se aprende a
identificar causas de problemas sociais, identificando valores vividos pela população e
buscando alternativas viáveis para cada situação.

As constantes transformações e mudanças da sociedade são provocadas


particularmente pelo progresso tecnológico e pelos avanços científicos, colocando à
disposição da sociedade possibilidades magníficas de ascensão em todos os aspectos. Portanto
na sociedade atual, é urgentíssimo ter presente o resgate do ser, apesar de que tudo ao redor
indique a supremacia do ter. Torna-se a maior prioridade para o bem da sociedade,
harmonizar as dimensões do ser, conhecer, escolher, partilhar e amar, por serem estas
dimensões, o reflexo da própria experiência interior e da experiência com o transcendente.
Paulo Suess escreve sobre a esperança que é dom para a humanidade: “No horizonte da
esperança está uma sociedade que supera a divisão de classes sociais. Essa esperança não é
nossa obra, mas nosso dom.” (SUESS, 2007, p.18) Estes são alguns dos aspectos de grande
responsabilidade social e educacional: provocar a manifestação da dimensão transcendente, já
existente em cada ser humano e resgatar a dimensão do ser na esperança de fazer nascer a
sociedade fraterna.

Uma vivência harmoniosa, a realização na convivência social, a solidariedade para


com os que se encontram em situação de maior vulnerabilidade social e cultural, a promoção
90

da vida digna, são os aspectos mais relevantes para a defesa da dignidade humana. Nas
palavras de Antoncich: “A dignidade da pessoa é inseparável de suas condições de vida. Por
isso a defesa da pessoa é a defesa da vida.” (ANTONCICH, 1992, p. 87) A compreensão dos
fatos da vida, suas causas e consequências, vão permitindo a apreensão da realidade em sua
múltipla dimensionalidade, possibilitando a ação, a articulação e a veiculação de suas
implicações. Aqui cabe a reflexão sobre a educação libertadora que concentra em sua
metodologia muitas destas características e, portanto reúne grande número de quesitos para
atender as demandas da sociedade moderna, atual.

A cada momento aparece na sociedade uma novidade que ganha espaço rapidamente
e, se a pessoa não consegue acompanhar essa dinâmica, acaba perdendo espaço na vida do
grupo social, ficando à margem dos acontecimentos advindos daí. Um dos aspectos de maior
preocupação para a maioria das famílias é o fator transitório na vida atual. Tudo passa muito
rápido, não há vínculos, não há compromissos, não há responsabilidades, tudo vai se
esvaindo, se perdendo como a água entre os dedos. Tudo passa a ser descartável! E a
sociedade passa a viver na incerteza das situações e na precariedade das relações.

O universo está sujeito a um número enorme de crises reais e uma delas é a crise da
vida precária, a vida sem continuidade, causando insegurança na vida da humanidade. Essa
crise de incertezas ganha o cenário mundial e provoca reações de preocupação na sociedade
mais conscientizada. A análise de Zygmunt Bauman sobre as características da vida na
sociedade chamada por ele de vida líquida, que transforma em precária a vida até então
aparentemente segura, mostra que a diferença entre o sólido e o líquido, está no fato de ter o
sólido a dimensão especial que neutraliza o impacto. O líquido por sua vez, não mantém sua
forma, ficando propenso às mudanças: “A vida líquida é uma vida precária, vivida em
condições de incerteza constante.” (BAUMAN, 2005b, p. 8) A modernidade que oferece um
leque de ideologias consistentes produzindo segurança existencial, com objetivos a serem
atingidos, perde espaço para a sociedade líquida que vem com falta de solidez,
inconsequência das ações e irresponsabilidade dos atos.

Fazem-se necessárias rápidas e urgentes respostas aos anseios da sociedade,


decorrentes dessa análise, considerando a relevância, seriedade e profundidade da situação.
Conforme palavras de Libânio: “Nessa sociedade de massas, debilitam-se as relações
interpessoais e os valores fundantes comuns. A s instituições aparelham-se para tratar com
indivíduos em massa.” (LIBÂNIO, 2005, p. 126-127) O que precisaria acontecer nesta
91

realidade seria trabalhar para resgatar a dignidade e a felicidade que vem a partir da liberdade,
em busca da sua identidade perdida através da massificação. Fazendo a reflexão de
importantes assuntos, especialmente os que se referem mais à vida humana, e agindo
conscientemente nesse sentido, poderão ser dados grandes passos na construção de uma
sociedade justa, fraterna e solidária.

É necessário então, buscar formas alternativas capazes de fazer frente aos domínios da
massificação, procurando preservar a originalidade e a singularidade e provocando ao mesmo
tempo, uma exaltação da autenticidade, na luta contra o esvaziamento do verdadeiramente
pessoal. Libertando o ser humano dos empecilhos no exercício de sua autonomia, consegue-se
alcançar os objetivos propostos para uma sociedade mais solidária. Conforme escreve Rossa:
“Sempre que surgem dificuldades na compreensão da própria identidade, é normal voltar ao
passado em busca de fundamentos para legitimá-la e para avançar sob o dinamismo das
mudanças temporais, no respeito às aspirações da origem.” (ROSSA, 2005, p.18)

Dentro desta realidade também nas palavras de Leandro Rossa, o compromisso


libertador é fundamentado na tensão utópica entendida como hipótese histórica fecunda que
não está segura da possibilidade de realizar o que procura: “mas está segura sim de que este
horizonte, este sonho, esta perspectiva é uma fonte de inspiração, constantemente renovada
para buscar cominhos novos, para inventar formas de convivência humana mais fraterna e
para estimular a imaginação criadora e a sensibilidade histórica.” (ROSSA, 1993, p.48)

Todos esses fatores interferem de alguma forma nos processos educativos, tornando
essas ações merecedoras de reconhecimento quando realizadas na verdade, pois exige do
cidadão um comprometimento sério e desprendido de resultados satisfatórios, porque muitas
vezes os resultados frustram os responsáveis por essas realizações. A educação e o
desenvolvimento do ser humano é a busca das pessoas e dos grupos, no sentido de descobrir
sua identidade e a educação libertadora propicia o encontro da verdadeira identidade. Por isso,
é nesse processo libertador que o ser humano e os grupos vão se humanizando, se
personalizando e crescendo no compromisso e na aquisição de meios para atuar na construção
de uma sociedade justa, solidária e fraterna em sua essência. O ponto de referência da
educação libertadora é a transformação do ser humano na busca da nova e verdadeira
sociedade permeada de valores evangélicos.
92

Alternativas viávei s para a ação lib ertadora na atualidad e

Novos espaços e novas modalidades de conhecimento se tornam necessários, a partir


do surgimento das novidades na área da tecnologia da informação e da comunicação. A
história da humanidade alcançou nos tempos atuais, um dos graus de maior evolução com
características inéditas. É esta a fase em que os aspectos cognitivos e de convivência se
transformam com enorme rapidez. Tecer conhecimentos em rede nos contextos diários
transformou-se em uma das melhores formas de transmitir, criar, reproduzir, explicar,
entender e manifestar as relações e reações da humanidade.

Isto se dá graças à mediação das novas tecnologias e às oportunidades de incremento


da sociabilidade. Consequentemente surgem também novos riscos de desumanização e de
discriminação, pois todos esses fatores interferem profundamente na ação social e educacional
libertadora, intensificando a complexidade de cada situação. Conforme palavras de Assmann
e Sung, essa realidade intensifica: “o pensamento complexo, interativo e transversal, criando
novas chaves para a sensibilidade solidária no interior das próprias formas de conhecimento.”
(ASSMANN e SUNG, 2000, p.269)

Com essa nova forma de entender o mundo, o que não se pode perder de vista são os
valores humanos, a proposta do Evangelho de Jesus Cristo e seu projeto de vida e missão que
leva em conta tão somente o resgate da dignidade de vida e vida em plenitude, o sonho de
Deus para a humanidade. A solidariedade precisa ser colocada como uma das prioridades em
todos os espaços educativos, a fim de que esse valor seja vivido na sua integridade e a
exclusão social, aos poucos, possa ir perdendo forças na sociedade. É relevante e necessário
elaborar linguagens sobre a dignidade humana, que sirvam para encaminhar consensos acerca
de melhorias concretas na sociedade.

Nesse sentido, é fundamental que um grande desejo de solidariedade passe a fazer


parte da dinâmica do querer e do sonho das pessoas. A esperança e a sensibilidade solidária
também precisam fazer parte integrante das formas de educar, de aprender, de conhecer e de
viver dos muitos grupos sociais. O modo de educar para a liberdade, a fraternidade e a
solidariedade é o modo que transforma o ser humano e assim transforma também a sociedade.
Nas palavras de Assmann e Sung: “Se há uma palavra que resume os nossos pontos é a
complexidade. A nossa educação, se queremos fomentar a sensibilidade solidária, deve
trabalhar com um conhecimento pertinente, capaz de enfrentá-la.” (ASSMANN e SUNG,
2000, p. 162)
93

A emergência educativa destaca a dimensão ética e religiosa da cultura, objetivando


ativar o dinamismo espiritual na confrontação com os valores absolutos, do sentido da vida. A
caminhada libertadora traz consigo o compromisso com a verdade e a ação educativa, quando
parte e conduz a uma visão implícita e explícita de mundo, de pessoa, de sociedade e de
história, coloca em evidência a centralidade da solidariedade entre os seres humanos. É esta
centralidade, o condicionamento geral e o terreno comunitário da realização pessoal, que
acontece através do resgate da dignidade, da ética e da responsabilidade.

Esta dimensão de responsabilidade abrange e condiciona de forma muito exigente a


vida e ocupação das pessoas. Valores como liberdade e responsabilidade só se pode entender,
como compromisso e como risco. Nas palavras de Brighenti, a liberdade é o elemento
essencial da identidade pessoal. Esta é irrepetível, única e possui característica de finalidade
em si mesma, na unidade, integridade e identidade: “diferente de qualquer outro e incapaz de
ser suprimido, com uma vocação e tarefa própria na história. Na pessoa, dá-se a conexão entre
o universal e o particular, a unidade do universal e do infinito, constituindo-se na base de
direitos inalienáveis e fundamento de sua dignidade.” (BRIGHENTI, 2006, p. 160)

A partir da década de 60, foram apresentadas inúmeras análises críticas da situação


educacional, em cada uma das suas épocas, vindas sempre carregadas de preconceitos e com a
orientação de manter as estruturas injustas. Nas palavras de Betinho, Herbert de Souza: “É
fundamental perceber o conjunto de forças e problemas que estão por detrás dos
acontecimentos. Tão importante quanto apreender o sentido de um acontecimento é perceber
quais as forças, os movimentos, as contradições, as condições que a geraram.” (SOUZA,
2000, p. 14-15) Ao mesmo tempo em que há a denúncia das injustiças, é necessário também
haver o anúncio de alternativas para saná-las, dentro do possível e em especial nas situações
de maior vulnerabilidade social e escolar.

Surge então com maior ênfase, a necessidade de uma educação que trate o educando
como sujeito ativo, ciente de seu conhecimento e consciente da sua ação transformadora. Esta
é a dinâmica de uma educação que liberta, tendo como objetivo conscientizar a comunidade
sobre os problemas da desigualdade social, criar autonomia e buscar os meios de superação
desses problemas, a fim de resgatar a importância, a razão e o significado da vida e da vida
em fraternidade, despertando para a dimensão humana da fé. Assumir esta educação é assumir
uma proposta pedagógica gerada nos valores evangélicos e geradora de valores de acordo com
a proposta de Jesus Cristo.
94

A compreensão das exigências da educação libertadora vai se ampliando, na medida


em que avança num processo de ação, com a reflexão voltada para a ação, assumindo todas as
consequências da própria prática dessa ação libertadora e evangelizadora. Na verdade, é muito
difícil conseguir o reconhecimento efetivo dessa prática sem as suas limitações. Portanto é
importante enfatizar de todas as formas que este pode ser sim, um sonho e um sonho que pode
ser realizado. O mais importante nessa caminhada é evitar a dicotomia entre o discurso e a
prática efetiva da ação dignificante. Isto porque existe o risco de se manter uma imagem de
justiça só no discurso, ficando esse discurso longe da prática. A educação como missão
necessita almejar o infinito potencial de expandir fronteiras e possibilidades, sendo seu maior
desafio responder às grandezas potenciais, sem limites ou fronteiras.

Educar, em primeiro lugar, significa educar-se. Significa também, criar condições de


crescimento, desafiar as situações e provocar ações que propiciem a libertação e o
desenvolvimento da consciência de dignidade humana existente em cada pessoa. O aspecto
humanizador do ser humano é a missão da educação que liberta. Buscar a própria identidade e
apropriar-se de instrumentos de participação na sociedade, assumindo um compromisso
social, comprometendo-se com o transcendente e com a proposta de vida que liberta. Trazer à
tona sempre que possível essa realidade e lutar para que o resgate da dignidade humana
aconteça é missão de todo o educador cristão e direito de todo o educando.

Na elaboração de uma análise sobre a dialética dos temas de identificação e de


libertação, é importante distinguir e reforçar os enfoques dos dois temas, mesmo que estes
sejam totalmente indissociáveis. O fim a que se propõe a prática libertadora é a transformação
social na linha da justiça e da participação. E essa libertação precisa acontecer junto com a
descoberta da própria identidade. A pessoa se descobre com sua identidade, dentro da sua
realidade e assim busca a sua libertação dentro da sociedade.

Danilo Gandin escreve sobre o caráter integrador e revolucionário da educação, da


seguinte forma: “Entende-se o caráter ao mesmo tempo integrador e revolucionário da
educação quando se pensa dialeticamente o processo como resultado da identificação em
contínuo conflito com a libertação.” (GANDIN, 1993, p. 52) As alternativas viáveis para uma
educação libertadora, precisa levar em conta todos esses aspectos da sociedade atual, com
suas características massificantes e massificadoras, porém a força da educação que liberta
consegue, com sua atuação, reunir inúmeros benefícios quanto ao alcance de sua ação.
95

A busca importante nos processos pedagógicos estará sempre a serviço do ser, da


pessoa, sujeito do seu próprio desenvolvimento, com todas as consequências pedagógicas e
didáticas daí decorrentes. Buscar a própria identidade supõe um processo de conscientização
que traz como resultado um contínuo conflito com a libertação. Gandin traduz muito bem essa
dialética quando escreve: “Assim, o educar-se entende-se de maneira mais firme e profunda
como o resultado da dialética entre o identificar-se e o libertar-se. É o crescer contínuo, cujo
processo é constituído de momentos sequenciais e interligados de identificação e de
libertação.” (GANDIN, 1993, p.52) Libertação e identificação não podem estar dissociados,
pois quando isso acontece, o resultado é o enfraquecimento tanto de um aspecto quanto de
outro. O cerne da educação libertadora é a busca da própria identidade, entendida como
dimensão pessoal e social e ainda como processo de educação dos próprios grupos em que
estão integradas as pessoas.

Portanto, na sociedade atual os pontos fortes e os pontos de limites, necessitam


somente estar direcionados de forma coerente para trabalhar no sentido do bem social.
Conforme palavras de Freire: “Nesse sentido, a formação técnico-científica não é antagônica à
formação humanista dos homens, desde que a ciência e a tecnologia, na sociedade
revolucionária, devem estar a serviço de sua libertação permanente de sua humanização.”
(FREIRE, 2005, p. 181) Sendo o ser humano, sujeito do seu próprio desenvolvimento, na
educação libertadora busca-se a transformação social rumo à justiça, pela dinâmica da
participação em todos os bens humanos.

As alternativas viáveis para as ações libertadoras nascem e crescem a partir da


percepção da realidade e ganham espaço na conscientização, na identificação e na relação
com o universo. Segundo escreve Speyer: “Constatamos, pois que um sistema educacional
que mantenha íntimas relações com a cultura estará inserido não só na comunidade local
como também na comunidade humana maior.” (SPEYER, 1983, p. 83) A educação
libertadora procura ter sempre presente essa exigência desafiadora, que mantém o ser humano
na sua consciência, na sua dignidade e na sua liberdade.

Com o advento das novas tecnologias a educação necessita, urgentemente, assumir


uma postura adequada diante dos grandes desafios. Tudo precisa ser muito bem pensado e as
ações na medida certa é que poderão trazer os frutos desejados. Na educação cristã, o conceito
de desenvolvimento sustentável é inseparável do desenvolvimento humanista. É próprio do
ser humano, pela sua centralidade ser ele mesmo a finalidade de todo esforço educativo. A
96

sustentabilidade é um dos meios de realização humana. Quanto mais próximas estiverem as


realidades da sociedade, mais perto estará de realizar-se o projeto de Jesus Cristo para a
humanidade.

A dimensão de identidade, dimensão que é possível a partir da unidade consigo, da


autenticidade e da integridade dentro da liberdade e muito especialmente a dimensão de
transcendência, experiência que une a criatura ao Criador, são o objeto e o objetivo da
educação libertadora. A dimensão comunitária na qual há a participação e vivência da
fraternidade e da justiça traz em si o caminho para a efetiva ação de libertação. A dimensão
ecológica que integra os seres com a natureza, com o cosmos, a dimensão artística que leva a
admiração da beleza em todas as suas manifestações e a criação de obras que preenchem a
profunda necessidade de expressão humana, revelam as potencialidades do ser humano na
missão de resgatar a sua dignidade de filho de Deus.

Embora os recursos tecnológicos propiciem quase tudo para os espaços educacionais,


os diversos aspectos da realidade física e social, ainda não podem substituir a vivência, a
experiência com a natureza e a sociedade em toda a sua complexidade. Tudo está conectado
com tudo e tudo está interligado, mas se não houver a relação ética e sadia entre os seres
humanos não haverá desenvolvimento sustentável. A educação libertadora quer antecipar a
nova sociedade, fazendo com que o ser humano seja o protagonista da própria história. A
intencionalidade na educação é fundamental para se alcançar os objetivos e na relação de
liberdade buscar a verdadeira fraternidade.

O desafio educacional necessita discernimento constante sobre o que nos processos


educativos contribui para a humanização, para em seguida assumir posições coerentes com as
exigências do Evangelho de Jesus Cristo, comprometendo-se com a transformação social e
sendo elemento de articulação com os diversos setores da sociedade. Gandin escreve que: “A
escola pode, nesta perspectiva, envolver-se na luta social de transformação, junto com todos
os setores da atividade humana que o estão fazendo.” (GANDIN, 1993, p.58) É necessário
partir do que existe, questionando, sendo radical na tranquilidade e apresentando as novas
possibilidades, sobretudo as que já fazem parte da vida, pois é assim que se busca a própria
identidade na liberdade.

Este artigo quer contribuir com esta caminhada de esperanças e sonhos de ver a
educação e a sociedade no patamar que merecem, acreditando que a dinâmica da educação
libertadora é a que mais se aproxima deste ideal. Portanto uma das missões da comunidade é,
97

juntamente com a evolução tecnológica, primar por uma educação que resgate os valores
fundamentais da vida humana e criar ambiente propício onde a solidariedade possa ser
vivenciada e a justiça seja buscada. A esperança seja preservada e seja projetado um Brasil
socialmente justo, culturalmente plural, politicamente democrático e ético, espiritualmente
aberto ao transcendente e às dimensões da dignidade, da fraternidade e do respeito a todo o
ser humano.

A caminhada e os esforços empreendidos nesse sentido evidenciam que o ideal de


transformação permanece vivo e que o sonho de uma sociedade justa e democrática é
possível, desde que buscada com afinco e colocada diligentemente em prática. Vivendo um
momento caracterizado com o aparente fim das utopias e esperanças, é neste contexto que a
educação libertadora atesta de forma surpreendente, a existência de um leque de alternativas
viáveis, no meio social e educacional.

Considerações Finai s

Ao final destas reflexões estão em evidência inúmeras inquietações vindas de dentro


da sociedade moderna, altamente competitiva e com todas as condições de se perder na
caminhada se não for conduzida adequadamente. O ser humano pode construir livremente o
seu destino em todos os aspectos de sua existência. Na transcendência, na vida solidária e no
processo educacional o ser humano está constantemente fincando os alicerces para a sua vida.

As manifestações humanas, tanto explícitas quanto implícitas continuam aguardando


respostas para os problemas mais complexos e urgentes, especialmente os que tratam das
exigências concretas de sua subsistência física. Mas, simultaneamente continuam inquietando
e angustiando a consciência humana, os mistérios deste extraordinário universo. A tecnologia
moderna, os progressos da informática e da ciência, em pouco tempo abriram perspectivas
para um estilo novo de relacionamento entre as pessoas do universo inteiro, muitas vezes
superficial, pela influência midiática e também pela rapidez e amplitude de informações
disponíveis a todo o instante.

E como fica a resposta ao amor infinito de Deus para com a humanidade? Essa
resposta manifesta-se pela busca de dignidade, pelo exercício da liberdade iluminada pela
inteligência e no indispensável convívio com os semelhantes. Nesse sentido, a educação é
considerada um dos principais meios de transformação e libertação. E a transformação é o
98

elemento chave da educação que tem como objetivo libertar e transformar. A grande missão
educacional libertadora é transmitir a Boa Nova e assim contribuir com o projeto de vida
digna que Jesus Cristo veio trazer para a humanidade.

O saber progressivamente acumulado com o passar do tempo na história necessita ser


dinamizado, pois o repertório cultural, científico e tecnológico da experiência humana, são os
fundamentos das conquistas futuras. O processo social da humanidade amplia-se com a
complexidade das sociedades permitindo uma constante formação, especialização e aumento
da produtividade, na sociedade atual, cada vez mais exigente e diversificada. O saber se
concretiza em técnicas que conduzem a uma maior contribuição a partir de atividades
múltiplas, na produção comum e no sustento das inúmeras aspirações da sociedade.

Todas as manifestações correm o mundo, com os recursos das novas tecnologias. As


formas de convivência e de relações entre as pessoas são testadas e não existe mais distância
que não possa ser alcançada pela ciência e a tecnologia. Situando as questões educacionais
num panorama amplo e futurista, pela análise do que se passa no mundo, os esforços de todas
as áreas da sociedade se concentram na busca de alternativas viáveis para o sucesso da era
tecnológica. São tecnologias que possibilitam mudança de vida para a população e
transformam a vida e a sociedade. Especialmente a internet, as comunicações e atualizações
em ritmo frenético, que dependendo da consciência do cidadão poderão isolá-lo, pois com
esses avanços a humanidade tende a perder-se no individualismo, desvalorizando a
convivência e tendo dificuldades de viver a solidariedade, priorizando o tecnológico em
detrimento do humano.

E nesse ambiente de valorização exagerada das áreas tecnológicas é que se faz


necessário ter presente que somente com uma relação solidária e autêntica a humanidade
poderá sobreviver com dignidade e paz. A ética, a fraternidade, o respeito pelo ser humano e a
paz entre as nações só se consegue através do diálogo. O diálogo precisa ser cultivado, como
forma de resolver os impasses criados na convivência humana.

Os posicionamentos diferenciados que a sociedade atual exige em relação a todos os


aspectos e especialmente os aspectos educacionais são proporcionados pela ênfase na ética
humana, nas condições de relacionamento pessoal, na solidariedade, na fraternidade e busca
de vida digna para toda a humanidade. A sociedade precisa reaprender a se relacionar com
segurança, abertura e autenticidade. Assim é primordial a busca do ideal de vida que Cristo
99

veio trazer ao mundo. Ideal de vida em plenitude para cada pessoa, amada por Deus até as
últimas consequências.

É importante visualizar que todas as questões trazidas pelos avanços científicos e


tecnológicos, mostram que há muitos motivos para redefinirmos o papel da educação
libertadora na atualidade. No contexto da sociedade atual, a educação libertadora continua
com maior intensidade a sua missão de construir relações sólidas e solidárias entre os seres
humanos, a fim de resgatar a sua dignidade de filhos de Deus.

Referências

ANTONCICH, R.; SANS, J. M. M. Ensino Social da Igreja: a Igreja, sacramento de


libertação, Petrópolis: Vozes, 1992.

ANTONCICH, R. Direção dos exercícios: uma resposta aos problemas do nosso meio latino-
americano. São Paulo: Loyola, 1982.

ASSMANN, H. SUNG, Jung Mo. Competência e sensibilidade solidária: educar para a


esperança. Petrópolis: Vozes, 2000.

BAUMAN, Z. Vida líquida. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2005.

BARBOSA, M. A. O desencontro entre a AEC e as escolas católicas: uma análise da


proposta pedagógica e projeto histórico da associação de educação católica do Brasil.
Dissertação de Mestrado em Ciência da Religião da PUC/SP: São Paulo, 2005.

BOFF, L. Saber cuidar – Ética do humano- Compaixão pela terra. Petrópolis: Vozes, 2001.

BRIGHENTI, A. A pastoral dá o que pensar: a inteligência da prática transformadora da fé.


São Paulo: Paulinas, 2006.

COMBLIN, J. Os desafios da cidade no século XXI, São Paulo: Paulus, 2002.

DALLARI, D. O educador e o compromisso sócio-político. Cadernos da AEC do Brasil.


Brasília: AEC Brasil, 1989.

FREIRE, P. Pedagogia do Oprimido. Rio de Janeiro:Paz e Terra, 2005.

FREIRE, P. Educação e Mudança. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1976.


100

GANDIN, D. A dialética identificação-libertação. Revista da AEC. Brasília: AEC do Brasil,


1993.

JUNQUEIRA, S. R. A. Um ideal, um caminho, uma proposta. Curitiba: Champagnat, 2001.

LIBÂNIO, J. B. Crer num mundo de muitas crenças e pouca libertação. São Paulo: Paulinas,
2003.

LIBÂNIO, J. B. Teologia da revelação a partir da modernidade. São Paulo: Loyola, 2005.

OLIVEIRA, M. A. de. Escola e sociedade: a questão de fundo de uma educação libertadora.


Revista de educação AEC. Brasília: AEC do Brasil, 1989.

ROSSA, L. AEC do Brasil – 60 anos. Uma Presença Católica na Educação Brasileira.


Brasília: AEC, 2005.

ROSSA, L. Educação libertadora e planejamento participativo. Revista de educação AEC.


Brasília: AEC do Brasil,1993.

SOUZA, H. J. de. Betinho. Como se faz análise de conjuntura. Petrópolis: Vozes, 2000.

SPEYER, A. M. Educação e campesinato: uma educação para o homem do meio rural. São
Paulo: Loyola, 1983.

SUESS, P. Introdução à teologia da missão. Convocar e enviar: servos e testemunhas do


Reino. Petrópolis: Vozes, 2007.

Você também pode gostar