Nothing Special   »   [go: up one dir, main page]

Prazo Processual

Fazer download em pdf ou txt
Fazer download em pdf ou txt
Você está na página 1de 19

Prazo Processual

Sumário. Espaço ou lapso de tempo em que se devem praticar os atos


impostos por lei ou determinados pela Justiça, os prazos (legais ou
judiciais) representam verdadeira tortura para os advogados, com exercer
sobre eles verdadeira tirania. É que, uma vez ultrapassados, já não se
restituem.

I. “Todo processo é fonte de angústias, tanto para o Juiz, como para as


partes. Uma das coisas mais angustiantes num processo são os prazos”,
escreveu o douto Magistrado Eliézer Rosa.(1)

Tal era, a esse respeito, o escrúpulo também dos velhos rábulas,


que afirmavam ser pior a perda do prazo que a dos próprios autos do
processo, porque estes podiam restaurar-se, aqueles não. E entoavam
o refrão latino: “Dormientibus non succurrit jus”!

O prazo — “espaço de tempo para o ato processual ser praticado”(2) —


tem mais forte relevo no processo criminal, onde poderá interferir na
liberdade do réu. (Aqui vem a ponto notar que, para quem está preso,
um dia não monta menos que uma eternidade!).

Isto mesmo sentiu o profundo Vieira: “Não há maior tormento no


mundo que o esperar”.(3) Coisa dificílima, em verdade, é unir a dor à
paciência: quem sofre não pode (e não deve) esperar!

A demora, ou excesso de prazo na formação da culpa do réu


preso, no entanto, só importará constrangimento ilegal, remediável
por “habeas corpus”, se provocada pela incúria ou desídia do Magistrado
ou do Promotor de Justiça.

Por fim, pequena delonga no encerramento da instrução, por


motivo de força maior, que não estava nas mãos do Juiz prevenir nem
conjurar, sempre se haverá de admitir e relevar, pois ninguém é
obrigado ao impossível: “Nemo tenetur ad impossibilia”!

II. Foi essa matéria, de muito peso e alcance, objeto do acórdão do


Tribunal de Alçada Criminal do Estado de São Paulo, em seguida
transcrito:
2

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE A LÇADA CRIMINAL

D ÉCIMA QUINTA C ÂMARA

Recurso em Sentido Estrito nº 1.249.863/4


Comarca: Rio Claro
Recorrente: JC
Recorrido: Ministério Público

Voto nº 3102
Relator

– Das decisões proferidas pelo Juízo de Direito


da Vara das Execuções Criminais cabe, em
princípio, agravo, por força do preceito do
art. 197 da Lei de Execução Penal.
– Se o Estado, por seus agentes, não revela,
durante largo trato de tempo, interesse
algum em cumprir ordem de prisão
expedida contra réu já reintegrado no
convívio social (e afastado da esfera do
crime), decai do direito de fazê-lo à véspera
da consumação do prazo prescricional da
pretensão executória de sua pena. Por ferir
de frente o sentimento de justiça e a lógica
do razoável, a cega obediência à lei, em tal
caso, seria rematado arbítrio e vingança;
mas justiça excessiva não é senão injustiça,
proclamou com assaz de razão o eloquente
Cícero: “Summum jus, summa injuria” (De
Officiis, I, 10).
3

– Ao Estado não pode interessar mais


a expiação do delito cometido pelo infrator
do que sua recuperação, fim último da pena.
–“Não há vinculação à lei que seja suficientemente
forte para romper o compromisso que todo Juiz
Criminal deve ter com a equidade e, portanto, com
a própria Justiça” (Alberto Silva Franco, in
JTACrSP, vol. 76, pp. 307-308).

1. Da r. sentença que proferiu o MM. Juízo de Direito da Vara das


Execuções Criminais da Comarca de Rio Claro, indeferindo-lhe pedido
de extinção da punibilidade pela prescrição da pretensão punitiva,
interpôs recurso para este Egrégio Tribunal, com o intuito de reformá-
-la, JC.

Alega, nas razões de recurso elaboradas por sua esforçada e


digna patrona, que, prescrita sua pena em execução, era força julgar-
-lhe extinta a punibilidade.

Acrescenta, com efeito, que, por infração do art. 157, § 2º, ns. I e
II, do Código Penal, foi condenado pelo MM. Juízo de Direito da 17a.
Vara Criminal da Comarca da Capital à pena de 5 anos e 4 meses de
reclusão e 13 dias-multa (proc. nº 546/90).

Afirma também que, desde a data do trânsito em julgado da


sentença condenatória — 3.7.92 — até à data de sua prisão — 2.7.98
(fl. 30) —, decorreu lapso temporal suficiente à prescrição da
pretensão executória da pena.

Sustenta, à derradeira, que, menor de 21 anos ao tempo do


crime, o prazo de prescrição, nos termos do art. 115 do Código Penal,
reduzia-se de metade, convém a saber: 6 anos.

Destarte, espera que a colenda Câmara lhe proveja o recurso


para o efeito de julgar-lhe extinta a punibilidade (fls. 2/18).

Apresentou contrarrazões a douta Promotoria de Justiça:


repeliu a pretensão da nobre Defesa, sob color de que se não
aperfeiçoara o lapso prescricional (fl. 62).
4

O r. despacho de fl. 77 manteve, por seus próprios


fundamentos, a r. decisão agravada.

A ilustrada Procuradoria-Geral de Justiça, em incisivo e


ponderado parecer do Dr. Shiozo Tanaka, opina seja conhecido o
recurso como agravo em execução, negando-se-lhe, todavia,
provimento (fls. 80/82).

É relatório.

2. Acho razão ao culto e diligente subscritor do parecer (fl. 81),


quando observa ser o agravo em execução o recurso adequado a
impugnar decisão que indefere pedido de extinção da punibilidade
pela prescrição da pretensão executória.

Esta, com efeito, é a melhor interpretação do texto legal,


segundo o escólio de Julio Fabbrini Mirabete:

“Para a jurisprudência majoritária cabe o recurso de agravo em todas as


decisões do juiz da execução no procedimento judicial diante do disposto
nos artigos 66 e 197 da LEP” (Execução Penal, 5a. ed., p. 458).

Destarte, pelo princípio da fungibilidade dos recursos (art. 579


do Cód. Proc. Penal), conheço como agravo em execução do que interpôs o
sentenciado.

3. No rigor do cálculo aritmético e segundo o preceito da lei, a


decisão está sobranceira a toda a censura, uma vez que o recorrente,
para seu infortúnio, foi preso à véspera do dia da consumação do
prazo prescricional.

De feito, lançadas boas contas, desde o termo inicial do prazo


prescribente — i.e., a data do trânsito em julgado da sentença para o
Ministério Público: 3.7.92 (cf. fl. 62) — e a sua prisão em 2.7.98 (causa
interruptiva), não decorreu o trato de tempo de 6 anos, em que se
daria a prescrição da pena de 5 anos e 4 meses, observada a
circunstância do art. 115 do Código Penal.
5

Ora, segundo a regra do art. 10 do referido estatuto, inclui-se no


cômputo do prazo de prescrição o dia do começo — no caso, 3.7.92
(data do trânsito em julgado da sentença condenatória para a
Acusação e Defesa, pois gênese do título penal executório).

Mas, preso aos 2.7.98, nesse dia se interrompeu o lapso


prescricional da pretensão executória (art. 117, nº V).

Donde a conclusão implacável, mas escorreita, do parecer da


douta Procuradoria-Geral de Justiça (fl. 81): preso o recorrente em 2 de
julho de 1998, o prazo extintivo de sua punibilidade decorreria tão
somente “à meia-noite de 2 de julho de 1998”.

Assim, à conta de algumas horas, não pôde o recorrente


subtrair-se ao império da Justiça punitiva.

À data do crime — 7.1.90 (fl. 145) —, tocava o réu por 19 anos


(fl. 128).

4. No caso, porém, a aplicar textualmente a norma penal, estará o


juiz ferindo de rosto o princípio que lhe deve reger todas as decisões e
que o legislador mandou gravar no pórtico de bronze do Código Civil:
“Na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às
exigências do bem comum” (art. 5º, da Lei de Introdução ao Código Civil).

Mandado de prisão havia sido expedido, fazia 6 anos, contra o


agravante e apenas à última hora, quando iminente a perda de sua
eficácia, o Estado pôs timbre em executá-lo.

Mas, ao presente, o condenado já não é o mesmo indivíduo de


antanho: reintegrou-se na comunhão social e tem profissão lícita.

Enviá-lo ao cárcere, por obediência formal e cega à vontade da


lei, seria quebrar-lhe o propósito de regeneração e deitá-lo a perder.

Ao Estado não pode interessar mais a expiação do delito


cometido pelo infrator do que sua recuperação, fim último da pena.
6

5. A jurisprudência — afirmou o sábio e preclaro Magistrado


Eliézer Rosa — é “a errata que os Tribunais escrevem para corrigir os excessos
dos Códigos que devem ser feitos para o Homem, mas na verdade, por ocasião de
sua feitura, é como se o Homem é que fora feito para os Códigos” (apud Heleno
Cláudio Fragoso, Jurisprudência Criminal, 1973, vol. II, p. 374).

De que ao juiz, em casos de todo especiais, seja lícito atenuar os


ápices da lei, concedem os mais opinados exegetas.

Do livro clássico de Carlos Maximiliano extraio este passo, que


merecia perpetuado em lâminas de ouro:

“Hoje a maioria absoluta dos juristas quer libertar da letra da lei o julgador,
pelo menos quando da aplicação rigorosa dos textos resulte injusta dureza,
ou até mesmo simples antagonismo com os ditames da equidade. Assim,
vai perdendo apologistas na prática a frase de Ulpiano — durum jus, sed
ita lex scripta est — duro Direito, porém assim foi redigida a lei — e
prevalecendo, em seu lugar, o summum jus, summa injuria — do excesso
de direito resulta a suprema injustiça” (Hermenêutica e Aplicação do
Direito, 16a. ed., p. 170).

Também o exímio Alberto Silva Franco, honra e glória da


Magistratura pátria (que não somente paulista), em brilhante voto
vencedor, não se correu de expender estas notáveis palavras a respeito
de hipótese muito semelhante à de que tratam os autos:

“Julgo seres humanos, gente, enfim. E se meu campo de trabalho se situa


nesse nível, não posso, nem quero — meu compromisso de Juiz com a lei
é menos importante do que minha compreensão a respeito do sentido da
justiça e minha visão do mundo — sacrificar a liberdade de pessoas como
se estas fossem coisas, paradas no tempo, estáticas.

Não compreendo como possa, ao mesmo tempo, cumprir a lei e ser


justo condenando, quase sete anos depois da prática da infração penal,
indivíduos que estão hoje perfeitamente integrados no convívio social.
A mora na entrega da prestação jurisdicional torna, no momento, a
imposição de pena privativa de liberdade um ato de profunda injustiça. No
espaço de tempo em que o aparelhamento judiciário deixou em suspenso
uma definição sobre a ação criminosa, os apelantes transformaram-se.
7

Não são as mesmas pessoas que executaram a infração penal. E se já são


outras pessoas, não me sinto, portanto, em condições de privá-los de sua
liberdade para o cumprimento de uma pena absurda de cinco anos e
quatro meses de reclusão. Tal condenação tem para mim a sensação
amarga de apenar pessoas que são totalmente estranhas ao delito. E, nesse
caso, não há vinculação à lei que seja suficientemente forte para romper o
compromisso que todo Juiz Criminal deve ter com a equidade e, portanto,
com a própria Justiça” (JTACrSP, vol. 76, pp. 307-308).

Isto mesmo pratica a generalidade dos Tribunais do País,


conforme se extrai do ven. acórdão do Tribunal de Justiça do Ceará,
abaixo reproduzido em sua parte fundamental:

“A respeito da matéria, cumpre trazer à tona as lições de Mauricio Antonio


Ribeiro Lopes que, ao estudar tal princípio (‘scilicet’, da razoabilidade),
após invocar ensinamento de Recaséns Siches — para quem a lógica
dedutiva é imprópria para a solução dos problemas jurídicos e humanos,
ao contrário da lógica do razoável, que realiza operações que a lógica
formal não comporta, especialmente aquelas de valorização e adaptação à
realidade concreta —, assevera: ‘A própria noção de razoabilidade adquire
um contorno próprio e específico no Direito, sendo mesmo erigida à
categoria de princípio geral informativo do sistema jurídico positivo. E não
se pense que tal procedimento pode gerar uma ruptura intrassistêmica ao
Direito, porquanto o princípio (talvez mais acertadamente o principado)
da razoabilidade é que dá consistência à possibilidade material da
realização da justiça na aplicação concreta da lei, sobretudo da lei penal’
(Teoria constitucional do direito penal. São Paulo, Ed. RT, 2000, p. 450-
451)” (Rev. Tribs., vol. 787, p. 515; rel. Des. Fernando Luiz
Ximenes Rocha).

6. Destarte, o cumprimento de seu mandado de prisão (seis anos


após expedido e às vésperas da consumação do prazo prescricional)
pode satisfazer à lógica da Matemática, mas ofende de frente as
normas do Direito e da Justiça, que assentam na lógica do razoável;
pelo que, tenho por francamente injusto e desarrazoado deixar de
8

reconhecer ao réu a extinção de sua punibilidade, “por questão de


algumas horas ou quiçá em função de alguns minutos” (fl. 82).

A severa obrigação do Estado de meter em ferros


ao autor de um crime torna-se ilegítima quando, por desmarcada
omissão e inércia de seus agentes, não provê às diligências necessárias
para efetivá-lo a seu tempo.

Ao direito-dever de punir do Estado, que, por dilatado espaço de


tempo, não demonstrou interesse em executar o castigo imposto ao
réu, prevalece o direito deste de eximir-se da sanção penal e do rigor
do cárcere se, havendo aborrecido a vida de crimes, plenamente se
reintegrou no convívio da sociedade.

Exigir, no caso, o cumprimento mecânico da lei não seria ato de


justiça, mas puro arbítrio e vingança. Mas, justiça excessiva não é
senão injustiça, proclamou com assaz de razão o grande Cícero:
“Summum jus, summa injuria” (De Officiis, I, 10).

7. Pelo exposto, conheço do recurso como agravo em execução e dou-lhe


provimento para, com base nos arts. 107, nº IV, 109, nº III, 110 e 115 do
Código Penal, julgar extinta a punibilidade do réu pela prescrição da
pretensão executória da pena (proc. nº 546/90; 17a. Vara Criminal).
Expeça-se-lhe alvará de soltura, se por al não estiver preso.

São Paulo, 20 de dezembro de 2001

Carlos Biasotti
Relator

III. Repertório de ementas e extratos de doutrina acerca do prazo


processual:

1. Assaz de razão teve o ínclito Eliézer Rosa para penalizar-se dos


advogados, “cuja grande tortura profissional é a constante vigilância em
matéria de prazos” (Cadernos de Processo Civil, 1973, vol. I, p. 69).
Sabia o profecto Magistrado que ainda o advogado mais
9

diligente lá um dia terá de recolher seu tributo a essa esfinge sem


entranhas (os prazos processuais), que lhe devora os frutos do
trabalho.

2. No caso de dúvida sobre sua tempestividade, é entendimento do


STF que se deve admitir o recurso interposto (cf. Rev. Trim. Jurisp.,
vol. 89, p. 779; apud Damásio E. de Jesus, Código de Processo Penal
Anotado, 13a. ed., p. 404).

3. “Justiça atrasada não é justiça, senão injustiça qualificada e manifesta”


(Rui, Oração aos Moços, 1a. ed., p. 42). Tal exortação naturalmente
sobe de ponto, em se tratando de réu preso: perdida a liberdade
— bem supremo do homem —, o anseio de recobrá-la não sofre
nem admite dilação desarrazoada. Aqui toda delonga parece
funesta, pois “mata a esperança, que é o último remédio que deixou a
natureza a todos os males”, como afirmou o elegante Vieira
(Sermões, 1682, t. II, p. 87).

4. Não cabe censura à decisão que inadmite, por intempestiva,


apelação da Defesa. Como em tudo o mais nas relações
jurídicas, prevalece aqui o adágio “Dormientibus non succurrit jus”
(art. 593, nº I, do Cód. Proc. Penal).

5. Superior à crítica é o despacho que deixa de receber, por


intempestivo, recurso em sentido estrito interposto pelo
Ministério Público fora do quinquídio legal (art. 586 do Cód. Proc.
Penal).

6. O prazo para recorrer é preclusivo; se não praticado o ato no


momento legal, já não haverá abrir nova oportunidade ao
interessado, sem manifesta violação da ordem jurídico-
-processual.

7. A Justiça deve fazer timbre de não retardar a apuração da


responsabilidade criminal de réu preso, porque maior mal que a
privação da liberdade, só a morte! “Ao mesmo Demônio se deve fazer
justiça, quando ele a tiver”, sentenciou o polido Vieira (Sermões,
1696, t. XI, p. 295).
10

8. O “habeas corpus” não é meio idôneo para apressar a entrega de


prestação jurisdicional relativa a incidente de execução de pena.
A Justiça, entretanto, deve olhar não se viole um dos mais
sagrados direitos do preso: o de lhe serem despachados com
presteza os requerimentos (que é coisa mui difícil unir a dor à
paciência!).

9. A contagem dos prazos, notadamente os de decadência ou de


prescrição, deve obedecer às normas de Direito Penal, por mais
favoráveis ao réu. O “dia do começo inclui-se no cômputo do prazo”
(art. 10 do Cód. Penal).

10. Irresignado com o teor da decisão, dela agravou o patrono da


peticionária; fê-lo, porém, intempestivamente. Quando
recorreu, já fluíra o quinquídio legal (art. 586 do Cód. Proc. Penal).
Portanto, ao tempo em que a agravante pretendeu reagitá-la
na Superior Instância, a questão já estava sob o selo da coisa
julgada.

11. O processo, conforme a comum opinião dos doutores, “é


movimento dirigido para diante” (Vicente de Azevedo, Curso de
Direito Judiciário Penal, 1958, vol. I, p. 24).

12. “As férias forenses, previstas na legislação estadual, não interrompem os


prazos processuais, que são contínuos e peremptórios” (Damásio E. de
Jesus, Código de Processo Penal Anotado, 23a. ed., p. 569).

13. Até pela via fax a jurisprudência do STF tem admitido a


interposição de recurso; não há razão plausível, portanto, para
que o apelante oponha embargos de declaração a destempo (art.
619 do Cód. Proc. Penal). Trata-se de prazo preclusivo, que não
pode o Juiz nem o Tribunal reabrir. É a implacável sanção do
tempo, consumidor de todas as coisas: “Tempus edax rerum”
(Ovídio, Metamorfoses, liv. XV, v. 234).

14. “A ordem e a disciplina do processo exigem que a manifestação da


inconformidade com a decisão e o desejo de interposição de recurso, para
provocar o novo exame da causa, se verifiquem dentro do lapso de tempo
11

previamente fixado” (Vicente de Azevedo, Curso de Direito Judiciário


Penal, 1958, vol. II, p. 285).

15. O decurso do tempo apaga a memória do fato punível e a


necessidade do exemplo desaparece (cf. Abel do Vale; apud
Ribeiro Pontes, Código Penal Brasileiro, 8a. ed., p. 154).

16. Nos ilícitos penais cometidos após o advento da Lei nº 9.099/95,


o prazo decadencial para a representação da vítima, nos casos
que prevê, é o que assina o art. 38 do Cód. Proc. Penal: 6 meses.

17. Devem ser rejeitados “in limine” embargos de declaração que não
atendem ao pressuposto geral dos recursos: tempestividade
(art. 619 do Cód. Penal).

18. Não configura constrangimento ilegal sanável por “habeas


corpus” a demora determinada por doença do réu (art. 403 do Cód.
Proc. Penal), visto que não está nas posses do Juiz evitar os efeitos
de força maior.

19. Passa por verdade irrefutável que, entre os mais respeitáveis


direitos do preso, conta-se o de ser processado, rigorosamente,
nos prazos que lhe fixa a lei. A razão bem se entende: é iníquo
dilatar, sem motivo justo e relevante, o sofrimento e o desespero
do encarcerado.

20. A complexidade da causa tem-na geralmente interpretado a


Jurisprudência por motivo de força maior, que justifica eventual
demora na prática dos atos processuais. É que, segundo dispõe o
798, § 4º, do Cód. Proc. Penal, em caso de força maior “não correrão
os prazos”.

21. A autoridade judiciária não perdoará a tempo nem a diligências


por alcançar, com a maior brevidade que couber no possível, o
termo da instrução criminal, pondo destarte cobro a eventual
constrangimento do réu preso.

22. Embargos de declaração opostos depois do segundo dia são


considerados intempestivos à luz do art. 619 do Cód. Proc. Penal,
pelo que deles não se conhece.
12

23. “(…) parece-nos, portanto, mais consentâneo com o espírito da


Constituição entender-se não ser aplicável a limitação temporal de cento e
vinte dias para o exercício da garantia constitucional do mandado de
segurança (…)” (Nélson Nery Jr., Código de Processo Civil Comentado,
9a. ed., p. 1.300).

24. Isto de não haver a Defesa apresentado suas razões não obsta ao
conhecimento da apelação; o ponto está em que tenha sido o
patrono do réu regularmente intimado a fazê-lo (art. 600 do Cód.
Proc. Penal).

25. A jurisprudência dos Tribunais orçou em 81 dias o prazo


máximo para a apuração da responsabilidade criminal de réu
preso; esse é o padrão temporal que estrema a legalidade do
arbítrio. Mas, ainda que se não deva remeter o disco assim longe
— que se considere fatal e peremptório esse trato de tempo —, é
de todo o ponto inadmissível permaneça alguém preso durante
6 meses, à espera da formação de sua culpa, sem que lho tenha
dado causa. Entre os mais sagrados direitos do réu preso está o
de ser processado, rigorosamente, nos prazos previstos em lei.

26. A jurisprudência dos Tribunais, por atenuar o gravame que


padece todo o que decaiu do “status libertatis”, assentou em
81 dias o prazo máximo para a apuração da responsabilidade
criminal do réu preso. A inobservância injustificada desse
marco temporal importa constrangimento ilegítimo, que será
força remediar, em bem de respeitabilíssimo direito do réu: o de
ver-se processar, estritamente, dentro nos prazos que lhe
estipulam os cânones legais.

27. É a notar, porém, que unicamente o excesso injustificado


configura constrangimento ilegal, não aquele provocado por
motivo de força maior ou pela dificuldade na realização de
diligência ou ato processual relevante (v.g., inquirição de
testemunha por precatória); esse é sempre escusável, porque
não está nas mãos do Juiz prevenir todos os escolhos que
embarguem o curso normal do processo.
13

28. Maior bem do homem depois da vida, a liberdade sempre


mereceu dos Tribunais mui particulares desvelos, como se
mostra da construção jurisprudencial de que 81 dias são o
prazo máximo para a formação da culpa de réu preso. Rasgo foi
esse de grande sabedoria dos Julgadores, porque, para quem está
preso, um dia não importa menos que uma eternidade! Essa
meta cronológica não é, porém, fatal nem peremptória, antes
está sujeita a temperamentos. O excesso de prazo na instrução
apenas constitui constrangimento ilegal quando injustificado.
A própria lei dispõe que a força maior suspende o curso dos
prazos (art. 798, § 4º, do Cód. Proc. Penal).

29. “Vencido o prazo de interposição do recurso, cria-se, quase sempre, uma


preclusão absoluta no tocante às decisões interlocutórias, e a suma
preclusão (ou coisa julgada formal), relativamente às sentenças definitivas”
(José Frederico Marques, Elementos de Direito Processual Penal, 1a.
ed., p. 203).

30. Todo o excesso é danoso; a própria bondade morre do excesso.


Em tema de restrição da liberdade, bem valiosíssimo do
homem, a parêmia sobe de importância e alcance. A
jurisprudência dos Tribunais, por isso, fixou em 81 dias o prazo
máximo para o término da instrução criminal de réu preso. Esse
é o marco temporal que, em linha de princípio, separa a
legalidade do arbítrio.

31. O escopo do processo é a pesquisa da verdade real; pequena


demora em sua tramitação compreende-se entre as contingências
ou circunstâncias aleatórias a que estão sujeitos os que
transgrediram a ordem jurídica.

32. Visto como importa restrição à liberdade, sumo bem do


indivíduo, a custódia cautelar não pode prolongar-se “in
aeternum”; daqui a razão por que os Tribunais de Justiça do País,
olhando pela intangibilidade da pessoa humana, tiveram a bem
fixar prazo à instrução criminal de processo de réu preso: este é
o último padrão que separa a legalidade do arbítrio.
14

33. Máximo bem do homem, excetuada a vida, a liberdade não


pode sofrer senão as restrições impostas por lei. Daqui veio o
fixarem os Tribunais em 81 dias o prazo para a apuração da
responsabilidade de réu preso. Quanto esteja em suas posses,
portanto, deve o Juiz pôr timbre em que se não ultrapasse
aquele marco de tempo, o qual, todavia, não é fatal nem
peremptório: admite quebra e temperamento, nos casos de
força maior. Aliás, dispõe a lei que, se houver força maior, os
prazos não correrão (art. 798, § 4º, do Cód. Proc. Penal).

34. Pequena demora na formação da culpa não configura


constrangimento ilegal, se lhe deu causa força maior ou motivo
relevante e justificado, que não competia ao Juiz prevenir ou
atalhar (v.g.: falta de apresentação do réu preso ao fórum, se
devidamente requisitado; renúncia de seu advogado ao
mandato, etc.).

35. Conforme inteligência de nossos Tribunais consagrada em


infinitos acórdãos, não constitui constrangimento sanável por
“habeas corpus” a permanência do condenado no regime fechado,
por falta de vaga, enquanto aguarda sua remoção ao semiaberto,
sobretudo se o Juiz da execução da pena proveu pontualmente
que se efetivasse logo, solicitando-o à Coespe.

36. Pequena demora na transferência do sentenciado para regime


prisional mais brando deve entender-se como efeito inexorável
de caso fortuito, ou contingência a que, infelizmente, estarão
sujeitos os que violarem a ordem jurídica.

37. Que se ultrapasse ligeiramente a meta de 81 dias, assinada pela


jurisprudência dos Tribunais como o máximo legal permitido
para a formação da culpa de réu preso, pode sofrer-se, no caso
que o exijam a segurança social e o rigor da lei. Que, no entanto,
sem lhe esteja liquidada a culpa, permaneça o réu em custódia
por tempo superior a 6 meses, é excesso que se não pode
tolerar, sob pena de subversão da ordem legal. Nem ao mais
empedernido facínora deve o Juiz negar a aplicação da lei que o
favoreça (art. 648, nº II, do Cód. Proc. Penal).
15

38. A demora no encerramento da instrução criminal de réu preso,


embora possa configurar, em tese, coação ilegal reparável por
“habeas corpus”, decai de importância com o advento da fase
derradeira do processo, como o proclama a Súmula nº 52 do
STJ: “Encerrada a instrução criminal, fica superada a alegação de
constrangimento por excesso de prazo”.

39. Se o Juiz fez quanto estava e suas posses por executar fielmente
a sentença condenatória do réu, nenhuma censura lhe cabe. É da
condição humana a imperfeição em tudo. Pequena demora na
efetivação da transferência do sentenciado a estabelecimento
compatível com o regime prisional que lhe foi fixado deve
interpretar-se como contingência a que estarão sempre sujeitos
aqueles que transgredirem a ordem jurídica (art. 112 da Lei de
Execução Penal).

40. É princípio geralmente recebido que não configura constrangimento


ilegal a permanência do réu no regime fechado, se o Juiz deu
todas as providências que lhe estavam ao alcance para removê-
-lo ao semiaberto. É que todo processo penal, mesmo na fase da
execução da sentença, está sujeito a contingências inexoráveis,
que não pode o Magistrado prevenir nem remediar.

41. Pequena delonga na transferência do preso para estabelecimento


compatível com o regime de cumprimento de sua pena pode-se
tolerar; não há sofrer, porém, aquela que exceda ao limite do
razoável, o que seria conculcar direito sagrado do réu, demais de
ofender gravemente a lei (art. 185 da Lei de Execução Penal) e
desprestigiar a Justiça.

42. Em respeito à liberdade, atributo fundamental do indivíduo,


fixou a Jurisprudência em 81 dias o prazo máximo para
a formação da culpa de réu preso: o excesso importará
constrangimento ilegal, remediável por “habeas corpus”. É de
advertir, porém, que apenas o excesso de prazo injustificável
caracteriza coação ilegítima, não a demora causada pela falta de
apresentação do réu preso, quando regularmente requisitado
para a audiência, ou pela necessidade de ouvir testemunha fora
16

da terra, que estas se compreendem no conceito de força maior,


em que “não correrão os prazos” (art. 798, § 4º, do Cód. Proc. Penal).

43. Cabe ao Magistrado, com o arbítrio do bom varão e na esfera


de seu poder discricionário, dar as providências necessárias à
busca da verdade real, alma e escopo de todo processo. Se o
paciente não está preso à ordem do Juízo impetrado, mas por
efeito de condenação que lhe foi decretada noutro processo,
improcede a arguição de constrangimento ilegal por excesso de
prazo na formação da culpa (art. 648, nº II, do Cód. Proc. Penal).

44. Inscreve-se entre os mais sagrados direitos do réu o de ser


processado nos prazos que lhe assina a lei. Esta, a razão por que
a Jurisprudência orçou em 81 dias o prazo máximo para a
formação da culpa de réu preso. Nem todo o excesso de prazo,
no entanto, constitui constrangimento ilegal amparável por
“habeas corpus”, senão aquele somente provocado pela desídia ou
incúria do Juiz ou do Promotor de Justiça.

45. A via judicial do “habeas corpus” não é apropriada a apressar


pedido de benefícios ou a obter progressão de regime de
cumprimento de pena. Pequena demora na apreciação de
requerimentos do condenado deve interpretar-se como efeito
das invencíveis dificuldades que gravam a atividade judiciária,
e das contingências a que estarão sujeitos sempre os que
infringirem a ordem jurídica.

46. É inteligência consolidada em todos os Tribunais de Justiça do


País que somente o excesso de prazo injustificado constitui
constrangimento ilegal, não a demora decorrente das magnas
deficiências estruturais do Judiciário, que Juiz algum, ainda o
mais diligente, não pode prevenir nem remediar.

47. A preocupação de mitigar o rigor do cárcere — “casa dos mortos”,


na expressão verdadeira do insigne Eliézer Rosa (in Jurídica,
nº 110, p. 17) — avulta sempre entre as que avassalam o espírito
do Juiz. Nem todo o excesso de prazo, porém, constitui causa
17

e motivo de coação ilegal, senão aquele somente que decorre


da desídia do Magistrado ou do Promotor de Justiça.

48. “A prisão em virtude de pronúncia não está sujeita a prazo” (STF; Min.
Carlos Madeira; Rev. Tribs., vol. 645, p. 367).

49. A demora justificada no encerramento da instrução da causa


não constitui constrangimento ilegal reparável por “habeas
corpus”. É desse número o atraso na formação da culpa de réu
preso decorrente da realização do exame de sanidade mental
requerido pela Defesa. Trata-se de caso de força maior, ou razão
de ordem superior; donde o haver disposto o legislador que, no
caso de força maior, “não correrão os prazos” (art. 798, § 4º, do Cód.
Proc. Penal).

50. Não tem direito ao “habeas corpus”, com base em constrangimento


ilegal por excesso de prazo na solução do feito, o paciente que
o provocou, atribuindo-se falsa identidade ao ser preso. A
necessidade de se lhe apurar a verdadeira identidade justifica a
demora no curso da ação penal, sem ofensa do direito de
locomoção, pois ninguém pode beneficiar-se da própria malícia
(“Turpitudinem suam allegans, non est audiendus”).

51. O Juiz que, por evitar se prolongue escusadamente o cárcere do


réu, faz tudo o que está a seu alcance (suposto debalde), não
pode ser obrigado a mais. Nisto de alegação de excesso de prazo,
importa muito o princípio da razoabilidade. Faz ao propósito
a lição do competente Damásio E. de Jesus: “(…) é admissível o
excesso em determinadas circunstâncias; a contagem do prazo não deve
ser rigorosa” (Código de Processo Penal Anotado, 22a. ed., p. 560).

52. Não configura constrangimento ilegal a demora na apreciação


do pedido de liberdade provisória, se motivada pela necessidade
de realização de diligência imprescindível à instrução do feito,
como o procedimento de legitimação do réu, pois o primeiro
dever de quem pleiteia perante a Justiça é comprovar sua real
identidade.
18

53. Como lhe compete presidir as audiências e prover à instrução


dos processos, não será decerto o Juiz um conviva de pedra ou
um espectador inerte. Fatos existem, no entanto, que lhe
excedem a jurisdição; denomina-os a tradição jurídica motivos
de força maior, a cujo número pertence a necessidade de
expedição de carta precatória para o interrogatório do réu.
Ainda que lhe exaspere a sorte carcerária, tal fato não
caracteriza constrangimento ilegítimo por excesso de prazo no
encerramento da instrução criminal, uma vez que nem sempre
o Juiz o pode dispensar ou prevenir. Eis a razão por que, no caso
de força maior, dispõe a lei que “não correrão prazos” (art. 798, § 4º,
do Cód. Proc. Penal).

54. Proferida a sentença condenatória, já não colhe o argumento da


coação ilegal por excesso de prazo na formação da culpa, visto
que outro o título prisional: a condenação do réu (art. 393, nº I,
do Cód. Proc. Penal). “Julga-se prejudicado o pedido, se à impetração
sobreveio sentença condenatória” (STF; HC nº 1.959-8; rel. Min. José
Dantas; DJU 23.8.93, p. 16.585).
55. “Não se configura coação ilegal quando o excesso de prazo na formação da
culpa decorre de incidentes processuais não imputáveis ao juiz do
processo ou ao Ministério Público” (cf. Jurisp. do STJ, vol. 8, p. 236).

56. O prazo para recorrer da decisão de pronúncia é preclusivo;


pelo que, se a Acusação não interpõe recurso em sentido estrito
no quinquídio legal (art. 581, nº IV, do Cód. Proc. Penal), já não
haverá reagitar na Superior Instância — por amor da autoridade
da coisa julgada — a controvérsia entretida nos autos.

57. Grave que lhe seja o crime de que acusado, e abjeto o seu caráter,
nenhum réu decai nunca da proteção da lei, que a todos iguala.
A Constituição da República, em cláusula imperativa, assegura a
todo o acusado o direito à “razoável duração do processo” (art. 5º, nº
LXXVIII).

58. Um processo não “se arrasta”: “tramita”, e nunca o faz sem


dignidade.
19

59. Eventual retardamento na conclusão do sumário de culpa


inscreve-se entre as contingências ou vicissitudes a que estão
sujeitos os que, acusados de violar a lei penal, devam aguardar,
sob custódia, o pronunciamento da Justiça.

60. Passa por iniquidade manter preso, enquanto lhe tramita o


processo, réu — que poderá, no caso de condenação, ter
cumprido já a máxima parte de sua pena — recolhido no lugar
que se reputa o pior do mundo antes do cemitério: o cárcere, a
que o portentoso Vieira chamou, com igual elegância que
verdade, “meia sepultura” (cf. Sermões, 1748, t. XV, p. 244).

Notas

(1) Novo Dicionário de Processo Civil, 1986, p. 214.

(2) José Frederico Marques, Elementos de Direito Processual Penal, 2009,


vol. II, p. 92; Millennium Editora.

(3) Sermões, 1959, t. V, p. 210; Lello & Irmão – Editores; Porto.

Você também pode gostar