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Velocímetros - Quando o Travamento Da Agulha Pode Retratar A Velocidade de Colisão
Velocímetros - Quando o Travamento Da Agulha Pode Retratar A Velocidade de Colisão
Velocímetros - Quando o Travamento Da Agulha Pode Retratar A Velocidade de Colisão
v. 5, n. 3, p. 39-48, 2016
ISSN 2237-9223
DOI: http://dx.doi.org/10.15260/rbc.v5i3.130
Resumo
Estudo do travamento do ponteiro do velocímetro de veículos decorrente de colisões frontais, uma análise da validade de se atribuir
como indicação da velocidade de colisão a partir do travamento da agulha em alguma posição da escala do velocímetro. Para
embasar o estudo foi feita uma revisão bibliográfica na literatura internacional que trata do assunto, visando suprir inclusive uma
deficiência na literatura brasileira especializada em acidente de trânsito que é extremamente carente desse tema. Também
apresentamos como complementação e verificação da teoria, resultado de testes práticos realizados em laboratório de calibração do
velocímetro a fim de demonstrar quais os casos em que o ponteiro trava para os vários tipos de velocímetros existentes, bem como
sua evolução ao longo dos tempos. Sugerimos uma análise pormenorizada do travamento do ponteiro nos casos em que o
reconstrucionista de acidente de trânsito se deparar com esse fenômeno, entender quais são os principais aspectos envolvidos e os
pré-requisitos mínimos que deverão ser observados para se descartar ou validar, como meio de prova da indicação da velocidade de
colisão.
Abstract
Study of vehicles speedometer pointer locking due to frontal collisions, an analysis of the validity of assigning the pointer locking in
a position of the speedometer scale as an indication of the collision speed. To support this study a bibliographic review was made
using international literature that addresses this subject, aiming to fulfill a deficiency in the Brazilian literature specialized in traffic
accidents that is extremely scarce about this matter. Results of practical tests performed in a speedometer calibration laboratory are
also presented as complementation and theory proof to certify which are the cases that the pointer locks, given different types of
existing speedometers, as well as in its evolution over time. A detailed analysis about the pointer locking is suggested in cases where
the traffic accident reconstructionist faces this phenomenon, as well as understanding what are the main aspects involved and the
minimum prerequisites that must be observed to discard or validate, as an evidence for the collision speed indication.
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quantidade de movimento, nos casos em que o método é lanternas com freqüências definidas, lupas e filtros
pertinente. especiais.
Técnicas de análises probabilísticas dos parâmetros O travamento do ponteiro do velocímetro carece de
utilizados para se entender um determinado fenômeno estudo aprofundado na comunidade pericial brasileira.
com melhor nível de confiança, também podem ser Em uma pesquisa em sites de busca como o
aplicadas no estudo dos acidentes de trânsito. Por www.google.com.br com a expressão “travamento do
exemplo, Carvalho et al. [1], utiliza o Método de ponteiro do velocímetro”, ou qualquer expressão
simulação de Monte Carlo para um caso real no qual similar, encontra-se muito pouco, em termos de artigos
uma das variáveis analisadas é a velocidade dos de estudos dos velocímetros. Você com certeza
veículos colidentes, onde foi possível estimar a encontrará muitas notícias e alguns fóruns, como
probabilidade associada a essas velocidades com www.autoforum.com.br que discutem o assunto de
intervalo de confiança de 95%. maneira muito superficial.
Outros métodos, como o cálculo da velocidade pela Contudo, se você fizer uma pesquisa em inglês, por
energia dissipada na colisão baseada nos coeficientes de exemplo, a coisa muda muito de figura. Desta forma,
deformação em geral não são utilizados, e os motivos podem ser encontradas dezenas de artigos e estudos do
são vários, dentre eles a alegação de que não se sabe os travamento do velocímetro e do princípio de
coeficientes de deformação dos veículos funcionamento destes instrumentos, bem como
comercializados no Brasil e até mesmo a desculpa de discussões com relação à validade dessa leitura para
que a licença de softwares como WinSmash, que é uma estimar a velocidade de colisão nas pericias de acidente
evolução do programa CRASH 3, que utilizam de transito.
algoritmos de danos, por exemplo, é muito cara, como Com o objetivo de ampliar a discussão entre os
se fosse preciso adquirir um software para realizar os peritos brasileiros, aborda-se aqui uma revisão
cálculos. Seja como for, não é nosso objetivo aqui tratar bibliográfica de artigos internacionais encontrados na
desse tema, aborda-se isso apenas para lembrar outros internet e revista especializada em colisões veiculares
métodos de cálculos. (Collision – The international Compendium for Crash
Com o advento do ABS (Anti Lock Braking Sistem) Research), bem como buscamos apresentar os
e finalmente com a obrigatoriedade de colocação na princípios de funcionamentos dos dois tipos de
linha de produção em série de todos os veículos velocímetros, o eletromagnético/mecânico e o
fabricados no Brasil a partir de 1º de janeiro de 2016, eletrônico/digital. Por fim, apresentamos ainda alguns
progressivamente até 1º de janeiro de 2019, segundo a testes realizados em laboratórios de calibração de
resolução nº 509 do CONTRAN [2] outros métodos de velocímetros e as principais conclusões dos estudos
estimativa de velocidade, que não o comprimento da realizados internacionalmente.
marca de frenagem, precisam ser encarados como
desafios pelos peritos brasileiros, para não correr o risco 2. COMO FUNICIONA UM VELOCÍMETRO
de ficar sem elementos materiais para estimar a
velocidade dos veículos envolvidos nos acidentes de Basicamente existem dois tipos de velocímetros: os
trânsito, uma vez que os freios ABS diminuem mecânicos e os eletrônicos;
sensivelmente as marcas de frenagens, e em muitos Os eletrônicos só apareceram no mercado a partir da
casos não ficam impressas no pavimento durante um década de 1980, enquanto os mecânicos tiveram sua
processo de frenagem. patente registrada em 1902, pelo seu inventor Otto
Nessa esteira, o “Needle Slap” tem sido discutido e Schulze [4].
apresentado como uma alternativa e principalmente tem
chamado a atenção da comunidade pericial para a busca 2.1. Velocímetro mecânico ou de corrente de Foucault
da marca deixada pela agulha no fundo do velocímetro
quando ocorre um impacto violento frontal. O velocímetro faz na realidade uma medida indireta
Técnicas importantes de identificação do efeito da rotação das rodas do veículo. Para a maioria dos
“Needle Slap” podem ser aplicadas em laboratório como modelos existentes, a medida é realizada por um cabo
demonstrado por Andrade et al. [3], são elas: de acionamento que é ligado no sistema de transmissão,
Espectroscopia Ramam, Vídeo Comparador Espectral e captando o movimento de rotação das engrenagens,
Microscopia Ótica. transmitindo ao velocímetro por um mandril ou por um
Andrade et al. [3] ainda apresenta técnicas para a de conjunto de molas helicoidais.
detecção do efeito na cena do acidente, uma alternativa Na ponta do cabo de acionamento existe um imã
quando se tem dificuldades para levar o velocímetro permanente rotacional, à medida que a transmissão gira,
para análise de laboratório, através da utilização de o cabo transmite o giro ao imã. Próximo ao imã
rotacional, porém sem tocá-lo, encontram-se presos por
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A Kawasaki freia por 9 m, deixa um espaço de 1,8m faz a leitura dos dados registrados pela central do Air
e então desliza sobre sua lateral direita por 3,35 m antes Bag do Veículo. A leitura no CDR mostrou que o
de colidir contra a lateral esquerda da Suburban Cavalier estava a 109,4 km/h quando colidiu na traseira
Chevrolet de forma angulada. O piloto é lançado a 17 m do outro veiculo.
a partir do ponto de impacto e sai praticamente ileso.
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Segundo ele:
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maior resistência para o movimento da agulha. Similar vale a pena mencioná-las aqui uma vez que estão
ao Golf, Impala, Silverado, Sienna e Elantra também intimamente relacionadas.
exibiram alta resistência ao movimento pela agulha, Um fenômeno que o perito deve se atentar para o
Anderson relata que: caso de se analisar uma colisão e o painel de
instrumento, é a marca que pode ser deixada pela agulha
Inclinando e rotacionando rapidamente de um lado no fundo do mostrador do velocímetro, conhecido nos
para o outro não se observou nenhum efeito na
Estados Unidos como “Needle Slap”.
leitura. Impactando o velocímetro transversalmente
ao eixo da agulha foi observado um mínimo efeito No Brasil a norma NBR 7817 que tratava das
em todos exceto no Golf [8]. condições para aceitação dos medidores de velocidade
(velocímetros) foi cancelada em setembro de 2012, e até
Outro aspecto citado pelo autor foi que existe uma o momento nenhuma outra norma foi editada pelo órgão
faixa de valores em que o ponteiro fica parado quando para substituí-la.
solta-se o ponteiro numa determinada posição, alguns
dos testes mostraram que a faixa em que a agulha fica 4. EVOLUÇAO DOS MODELOS DE
parada varia de instrumento para instrumento. VELOCÍMETROS
Alguns paravam em qualquer posição entre 50 e
70 mph, outros a faixa ficou entre 65 e 70 mph. A maior A seguir, ilustramos três tipos de velocímetros que
faixa em que o ponteiro ficou posicionado foi entre 30 e retratam bem sua evolução no tempo:
90 mph, quando o soltava naquela posição, isso sempre
acontece para o grupo de velocímetros cujo ponteiro 4.1. Modelos mecânicos / eletromecânicos
apresenta maior resistência ao movimento.
Nos demais casos, as leituras tinham grande Seu funcionamento se dá pelo giro do imã na ponta
propensão a mudar sua posição, devido a vibrações ou do cabo de acionamento (ver Figs. 16-20), que induz as
movimento do instrumento. chamadas correntes de Foucault no disco solidário ao
Comparando os testes com seus estudos de casos no ponteiro. Importante lembrar, que nesse caso, o ponteiro
travamento do ponteiro do velocímetro, Anderson é solidário a uma mola helicoidal, que fará seu retorno
percebeu que os resultados em que os velocímetros para a posição zero, quando o imã parar de girar.
apresentaram leituras diferentes de zero, são muito
maiores do que aqueles que apresentam a leitura correta,
uma vez que, a maioria dos instrumentos utilizados nas
rodovias Americanas é do primeiro tipo, ou seja, com as
agulhas que tem baixa resistência ao movimento, e não
ficam paradas quando solta-se o ponteiro em uma
posição diferente de zero.
Contudo, o estudo parece sugerir que, no outro
grupo de velocímetros que tem alta resistência ao
movimento do ponteiro, haveria uma propensão maior
de manter a posição do ponteiro, quando a energia ou a
força eletromagnética é desligada no caso de uma
colisão. Desde que a perda de energia coincidisse com o
Figura 16. Modelo mecânico.
momento da colisão, então é lógico, que nesse caso, o
ponteiro registraria a velocidade de colisão.
Um fato importante a ser mencionado, é que existe
um “delay”, entre o instante da colisão e a perda da
energia no velocímetro, o que irá permitir ao ponteiro
girar certo ângulo, antes de travar, indicando uma
velocidade menor de pós-colisão. Além da possibilidade
de forte frenagem, guinadas bruscas e outras
explicações, uma vez que, em um dos estudos de casos
de Anderson, a velocidade reconstruída, ficou de 10 a
15 mph acima da velocidade lida no ponteiro travado do
velocímetro.
Existem, ainda, outras considerações a serem
abordadas, que fogem ao escopo deste trabalho, mas que Figura 17. Conexão na parte traseira do velocímetro por uma espécie
de mandril.
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Os eletromecânicos também têm seu funcionamento bancada em laboratório, visitamos uma empresa
pela indução magnética do imã, que gira na ponta do autorizada para aferição e conserto de velocímetros e
cabo de acionamento, a diferença é só no comando que tacógrafos, de um fabricante de velocímetros da marca
é transmitido por um sensor no lugar de um mandril. VDO na cidade de Campo Grande/MS.
Figura 19. Conexão por sensor hall. Figura 22. Parte de traseira controlada por motor de passo.
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velocímetro os ponteiros voltavam para a posição zero, exata em que estava quando foi retirada a alimentação,
quase que instantaneamente. Já, para o velocímetro da no caso 60 km/h (ver Figs. 27-30)
F-350, o ponteiro ficou parado na posição de 120 km/h
(ver Fig. 23), no entanto, aplicando simples solavancos
na parte superior do equipamento com a mão, o ponteiro
começou a voltar para a posição zero aos poucos (ver
Fig. 24).
Figura 24. Ponteiro retornado aos poucos para a posição zero devido
às batidas com a mão na parte superior de equipamento.
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