Psychology">
Nothing Special   »   [go: up one dir, main page]

Livro 06

Fazer download em pdf ou txt
Fazer download em pdf ou txt
Você está na página 1de 15

A EDUCAÇÃO

INFANTIL E A
GARANTIA DOS
DIREITOS
FUNDAMENTAIS
DA INFÂNCIA

Maria Elena Roman de


Oliveira Toledo
Educação infantil: um lugar
de interações e brincadeiras
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

 Reconhecer as interações e as brincadeiras como os dois eixos nor-


teadores da educação infantil.
 Identificar a importância das interações das crianças entre elas e das
crianças com os adultos.
 Analisar a brincadeira como uma das mais potentes linguagens da
infância.

Introdução
A brincadeira e as interações são dois eixos estruturantes das práticas pe-
dagógicas na educação infantil. Brincando e interagindo, com os adultos
e com seus pares, a criança realiza importantes aprendizagens e adquire
instrumentos fundamentais para o seu desenvolvimento. Assim, é funda-
mental que a formação inicial contemple esses temas, instrumentalizando
os futuros professores para que os incorporem em seu planejamento.
Neste capítulo, você vai estudar os referenciais teóricos e a legisla-
ção que fundamentam a valorização da brincadeira e das interações na
educação infantil. Além disso, vai adquirir instrumentos para incluir esses
dois elementos no seu planejamento.

As interações e brincadeiras como eixos


da educação infantil
Em 17 de dezembro de 2009, a Resolução nº 5 fixou as Diretrizes Curriculares
Nacionais para a Educação Infantil, a serem observadas na organização de
propostas pedagógicas na educação infantil. Essas diretrizes articulam-se às
Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação Básica e reúnem os aspectos
2 Educação infantil: um lugar de interações e brincadeiras

fundamentais que devem ser contemplados para a elaboração de políticas


públicas, propostas pedagógicas e curriculares voltadas para a educação
infantil (BRASIL, 2009).
De acordo com as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação
Infantil (BRASIL, 2010, p. 18), a proposta pedagógica das instituições de
educação infantil deve ter como objetivo

[...] garantir à criança acesso a processos de apropriação, renovação e arti-


culação de conhecimentos e aprendizagens de diferentes linguagens, assim
como o direito à proteção, à saúde, à liberdade, à confiança, ao respeito, à
dignidade, à brincadeira, à convivência e à interação com outras crianças.

Para que esse objetivo seja atingido, as interações e a brincadeira são apon-
tadas como eixos norteadores da proposta curricular. As Diretrizes Curriculares
Nacionais para a Educação Infantil se constituíram como ponto de partida
para vários documentos oficiais norteadores da elaboração de currículos. Em
2017, foi aprovada, por exemplo, a Base Nacional Comum Curricular (BNCC)
(BRASIL, 2017).

A educação infantil na Base Nacional Comum Curricular


Na BNCC (BRASIL, 2017), a educação infantil é concebida como a primeira
etapa da educação básica, voltada para o atendimento, em termos de cuidados
e educação, de crianças de 0 a 5 anos e 11 meses. Esse documento propõe
objetivos de aprendizagem e desenvolvimento, de acordo com as especificidades
etárias das crianças. Essas especificidades permitem a organização de três
grupos etários, como você pode ver a seguir.

 As creches devem estar voltadas para o atendimento de crianças de 0 a


3 anos e 11 meses. Nas creches, são consideradas bebês as crianças de
0 até 1 ano e 6 meses, e crianças bem pequenas, as que têm de 1 ano e
7 meses até 3 anos e 11 meses.
 As pré-escolas estão voltadas para o atendimento de crianças de 4
anos até 5 anos e 11 meses. Essas crianças são chamadas de crianças
pequenas.

Nesse contexto, a educação infantil tem por objetivo a ampliação do universo


de experiências, conhecimentos e habilidades das crianças dos diferentes
grupos etários, diversificando e consolidando aprendizagens.
Educação infantil: um lugar de interações e brincadeiras 3

Para que esse objetivo seja atingido, a BNCC retoma os eixos estruturantes
das práticas pedagógicas propostos nas DCNEI (BRASIL, 2010): as interações
e a brincadeira. Essas experiências são concebidas como fundamentais para
que as crianças construam e apropriem-se de conhecimentos. É nas ações e
interações, com seus pares e com os adultos, que as crianças aprendem, se
desenvolvem e se socializam. A brincadeira faz parte do universo infantil e
permite a concretização de aprendizagens importantes.
Tendo em vista os dois eixos estruturantes, estão previstos, na BNCC
(BRASIL, 2017), seis direitos de aprendizagem e desenvolvimento que visam
a assegurar, na educação infantil, as condições ideais para que a construção
de novos conhecimentos ocorra em ambientes desafiadores, estimulantes e
organizados. A ideia é possibilitar aos educandos um papel ativo no processo
de aprendizagem e desenvolvimento.
São direitos de aprendizagem e desenvolvimento na educação infantil:

 expressar;
 conhecer-se;
 conviver;
 brincar;
 participar;
 explorar.

É importante você perceber que conviver e brincar, além de direitos de


aprendizagem, se constituem como eixos estruturantes do trabalho pedagó-
gico. Assim, essas duas experiências devem permear tanto o planejamento
docente como as práticas pedagógicas implementadas na sala de aula. Tendo
em vista que as interações e as brincadeiras fazem parte do universo infan-
til, é importante você atentar para o fato de que, na proposta das DCNEI
(BRASIL, 2010) e da BNCC (BRASIL, 2017), elas não ocorrem apenas de
maneira espontânea.
Como eixos estruturantes das propostas pedagógicas, essas experiências
têm uma intencionalidade educativa. Veja:

Essa intencionalidade consiste na organização e proposição, pelo educador,


de experiências que permitam às crianças conhecer a si e ao outro e conhecer
e compreender as relações com a natureza, com a cultura e com a produção
científica, que se traduzem nas práticas de cuidados pessoais (alimentar-se,
vestir-se, higienizar-se), nas brincadeiras, nas experimentações com materiais
variados, na aproximação com a literatura e no encontro com as pessoas
(BRASIL, 2017, p. 37).
4 Educação infantil: um lugar de interações e brincadeiras

Cabe ao professor criar condições para que as interações e as brincadeiras


aconteçam, organizando tempos e espaços. É ele o responsável por conhecer
as especificidades do grupo com o qual está trabalhando e as particularidades
de cada criança, para contemplá-las em seu planejamento. É ele também
quem deve identificar os saberes prévios de seus educandos e propor boas
intervenções para possibilitar avanços no processo de construção de novos
conhecimentos. Esse processo deve ser acompanhado, individualmente, para
que o planejamento de novas ações, tempos e espaços seja feito de maneira a
atender às necessidades das crianças.

Para saber mais sobre as interações das crianças entre si e com adultos, leia o artigo de
Sandro Vinícius Sales Santos e Isabel de Oliveira Silva “Crianças na educação infantil: a
escola como lugar de experiência social”, disponível no link a seguir.

https://goo.gl/uLPxGR

A importância das interações na educação infantil


A partir dos anos 1980, foram intensificadas as discussões, no Brasil, sobre a
concepção interacionista de aprendizagem. Estudiosos como Piaget, Vygotsky
e Wallon demonstraram, com os resultados de suas pesquisas, que, diferente-
mente do que se acreditava no empirismo, os sujeitos participam, ativamente,
do processo de construção de seus conhecimentos.
Vygotsky (OLIVEIRA, 1997), um dos principais representantes dessa
concepção, demonstrou que o sujeito da espécie humana nasce dotado de
possibilidades de aprendizagem que se concretizarão ou não dependendo das
oportunidades oferecidas pelo meio no qual está inserido. De acordo com a
teoria vygotskyana, a aprendizagem ocorre na interação entre o sujeito e o
objeto de conhecimento. Nesse sentido, a interação tem um lugar privilegiado
nessa teoria.
Soma-se a isso a importância dada ao conceito de zona de desenvolvimento
proximal (ZDP), proposto por Vygotsky. A zona de desenvolvimento proximal
é o espaço intermediário entre a zona de desenvolvimento real (aquilo que o
indivíduo consegue fazer sem ajuda de outro indivíduo) e a zona de desenvol-
vimento potencial (aquilo que o indivíduo consegue fazer desde que ajudado
Educação infantil: um lugar de interações e brincadeiras 5

por alguém mais experiente). A intervenção na zona de desenvolvimento


proximal é promotora de novas aprendizagens.
Um aspecto bastante importante da ideia vygotskyana é que o outro social,
promotor de novas aprendizagens, não necessariamente é o adulto. O outro
social de Vygotsky é alguém que tem um conhecimento diferente daquele do
sujeito. Ele pode ser um adulto ou outra criança. Essa visão do outro social
rompe com a ideia de que só o professor é o promotor das aprendizagens. Além
disso, define que as interações entre os pares são fundamentais para avanços
na construção de novos saberes.

O lugar do adulto como parceiro no desenvolvimento


No artigo 8º das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil
(BRASIL, 2010), há alguns norteadores para a relação entre crianças e adultos
nas instituições de educação infantil. Esse artigo afirma que as relações entre
adultos e crianças devem ser pautadas pelo respeito, ficando condenadas ações
violentas, de negligência, repreensão ou castigo que possam causar dados
físicos e/ou psicológicos às crianças.
O respeito dos adultos às crianças deve estar presente em todas as práticas
pedagógicas. Como você já viu, o outro social que promove a aprendizagem
não é, necessariamente, um adulto. Crianças com diferentes saberes atuam,
mesmo que não intencionalmente, na zona de desenvolvimento proximal umas
das outras, promovendo aprendizagens. Contudo, o professor tem um lugar
privilegiado nessa promoção. Ele conhece as expectativas de aprendizagem
em relação ao grupo de educandos, tem o domínio de metodologias capazes
de promover a aprendizagem e está familiarizado com os mecanismos de
avaliação para adequar as estratégias de ensino às necessidades dos educandos.
Além de se constituir como um mediador entre os aprendizes e os objetos
de aprendizagem, o professor é também uma importante fonte das informações
sobre as regras que regem a vida em sociedade e que gradativamente são
incorporadas pelos alunos.

Interação criança-criança
Já na primeira infância, as crianças começam a interagir com outras crianças,
seja em seus grupos familiares, seja nas instituições de educação infantil. Em
alguns grupos culturais, essa interação é garantida pelo convívio em grupos
familiares mais extensos; em outros, a escola é o local onde, prioritariamente,
ela acontece. Segundo Carvalho e Beraldo (1989, p. 56), “[...] na maior parte
6 Educação infantil: um lugar de interações e brincadeiras

das sociedades humanas — e, possivelmente, da história humana — o contato


com outras crianças constitui a experiência social mais frequente e intensa a
partir da primeira infância”.
De acordo com a teoria sociointeracionista de Vygotsky (OLIVEIRA, 1997),
quatro fatores determinam o percurso de desenvolvimento dos indivíduos da
espécie humana. Veja a seguir.

 Filogênese: determina os limites e possibilidades de cada espécie


animal. Torna semelhantes todos os indivíduos que pertencem a uma
mesma espécie.
 Ontogênese: constitui-se como a história de cada indivíduo de deter-
minada espécie, do ponto de vista das etapas pelas quais ele passa. Tem
um caráter biológico e torna semelhantes todos os indivíduos que se
encontram em uma mesma etapa do desenvolvimento.
 Sociogênese: diz respeito aos contextos (social, histórico e cultural)
nos quais o indivíduo se desenvolve. Torna semelhantes os indivíduos
que se desenvolvem em um mesmo contexto.
 Microgênese: é a história de cada aprendizagem, de cada indivíduo. É
o fator de diferenciação de um indivíduo em relação aos demais, mesmo
que pertencentes à mesma espécie, ao mesmo contexto e estando na
mesma etapa de desenvolvimento. É o que torna cada indivíduo único.

Partindo das ideias vygotskyanas, você pode concluir que crianças da


mesma idade podem ter saberes diferentes, por conta da microgênese. Assim,
a interação entre elas se constitui como uma experiência de grande relevância
para os processos de desenvolvimento e de aprendizagem infantis. Além disso,
a interação entre os pares tem a vantagem de facilitar a discussão de ideias,
na medida em que as crianças se sentem mais à vontade para questionarem e
debaterem do que quando estão em contato com um adulto.
Segundo Musatti (1986 apud LORDELO, 1998, p. 35):

[...] na relação entre adulto e criança, o poder e o conhecimento são muito


desiguais. Nessa situação, a criança experimenta maior dificuldade em
reconhecer as diferenças entre sua própria atividade cognitiva e a do outro.
Elas são menos estimuladas a clarificar seus pontos de vista, comparando-
-os com os do outro. Ao contrário, entre crianças, é mais provável haver
verificação e comparação entre pontos de vista e, portanto, cooperação.
O parceiro de idade estimula a socialização do conhecimento porque o
domínio da consciência sobre os mecanismos que operam na cooperação
interpessoal é também estimulado.
Educação infantil: um lugar de interações e brincadeiras 7

As situações de brincadeira, um dos eixos estruturantes do trabalho peda-


gógico na educação infantil, são privilegiadas para a promoção das interações
entre as crianças. Como você já viu, é papel da escola e do professor organizar os
tempos e espaços escolares para que a brincadeira seja oportunizada. É também
papel do professor observar atentamente as relações sociais entre as crianças,
permitindo que ora as interações sejam espontâneas, ora sejam planejadas, de
acordo com os objetivos propostos. Identificar os saberes prévios dos alunos
é um elemento fundamental para que possam ser planejados agrupamentos
de alunos, de forma a possibilitar avanços na construção de conhecimentos.

Agrupamentos produtivos são agrupamentos de alunos, planejados pelo professor,


tendo em vista os objetivos pedagógicos propostos. Os critérios para a sua formação
partem da visão dos alunos como indivíduos que têm saberes diferentes e que, co-
locados para realizar atividades coletivamente, compartilham, discutem, confrontam
e modificam esses saberes.

A brincadeira na educação infantil


Nem sempre a brincadeira teve um lugar de destaque no desenvolvimento in-
fantil. Contudo, desde a década de 1980, várias pesquisas e trabalhos científicos
têm demonstrado que ela possui um papel fundamental no desenvolvimento
infantil, no que diz respeito a questões sociais, culturais e de gênero. Veja:

A brincadeira é uma linguagem infantil que mantém um vínculo essencial


com aquilo que é o “não brincar”. Se a brincadeira é uma ação que ocorre
no plano da imaginação isto implica que aquele que brinca tenha o domínio
da linguagem simbólica. Isto quer dizer que é preciso haver consciência da
diferença existente entre a brincadeira e a realidade imediata que lhe forneceu
conteúdo para realizar-se. Nesse sentido, para brincar é preciso apropriar-se
de elementos da realidade imediata de tal forma a atribuir-lhes novos signi-
ficados (BRASIL, 1998, p. 27).

A brincadeira é uma atividade inerente à infância e ela acontece em di-


ferentes espaços. Contudo, tendo em vista a sua importância nos percursos
de aprendizagem e desenvolvimento infantis, ela deve ter um lugar garantido
nas instituições de ensino voltadas à educação infantil.
8 Educação infantil: um lugar de interações e brincadeiras

Saiba mais

Para saber mais sobre a promoção do brincar na escola, leia “Brincar: diálogo com
escolas”, organizado por Renata Meirelles.

As funções da brincadeira
A brincadeira fornece a base para o desenvolvimento das habilidades sociais
e intelectuais necessárias para que o indivíduo adulto atue em uma sociedade
cada vez mais complexa. De acordo com Brock et al. (2011, p. 25), “[...] a
brincadeira é uma experiência flexível e autodirecionada, que serve tanto
para as necessidades de uma criança individualmente como para a sociedade
futura na qual ela viverá na vida adulta”.

A brincadeira na evolução da espécie

Indivíduos jovens de diferentes espécies animais, incluindo a espécie humana,


brincam. Se a brincadeira não fosse importante para a manutenção da espécie,
essa atividade não estaria presente nos indivíduos jovens. Segundo Brock et
al. (2011, p. 25):

[...] é generalizado entre os psicólogos do desenvolvimento e os etólogos


que a brincadeira proporciona uma experiência prática essencial para os
animais jovens: que eles podem usar os comportamentos que envolvem
a brincadeira para desenvolver habilidades que utilizarão na vida adulta
para ter uma vantagem quanto ao potencial para sua sobrevivência e da
sua própria prole.

É interessante você notar que, quanto mais complexas as sociedades adultas,


mais tempo os jovens permanecem no período de desenvolvimento. Além
disso, mais complexas são as atividades características de suas brincadeiras.
Exemplos característicos de indivíduos dessas sociedades são os orangotangos,
os chimpanzés e o homem.
Educação infantil: um lugar de interações e brincadeiras 9

A brincadeira no desenvolvimento psicológico

Teóricos importantes da psicologia do desenvolvimento, como Piaget e


Vygotsky, atribuem um papel de grande relevância às brincadeiras no per-
curso de desenvolvimento infantil. Para esses estudiosos, a brincadeira é um
elemento fundamental para a construção de um conjunto de representações
mentais do mundo ao redor da criança.
Como você já viu, um dos principais conceitos da teoria de Vygotsky
(OLIVEIRA, 1997) é a zona de desenvolvimento proximal. Ela se constitui
como o espaço intermediário entre aquilo que o indivíduo já consegue fazer
sozinho (a zona de desenvolvimento real) e aquilo que só consegue fazer
auxiliado por alguém mais experiente (zona de desenvolvimento potencial).
Esse conceito é importante, tendo em vista que é na zona de desenvolvimento
proximal que as aprendizagens ocorrem.
Vygotsky enfatiza, em sua teoria, a importância de um tipo específico de
brincadeira: a brincadeira de faz de conta. Segundo esse autor, a brincadeira
de faz de conta incide na zona de desenvolvimento proximal das crianças,
na medida em que possibilita novas aprendizagens. A criança, ao brincar
de médico, se antecipa ao seu desenvolvimento. Ela não é um médico, mas
experimenta as regras sociais do exercício dessa profissão. Nesse sentido:

[...] o brinquedo cria uma zona de desenvolvimento proximal da criança. No


brinquedo, a criança sempre se comporta além do comportamento habitual
de sua idade, além de seu comportamento diário; no brinquedo é como se
ela fosse maior do que é na realidade. Como no foco de uma lente de au-
mento, o brinquedo contém todas as tendências do desenvolvimento sob
forma condensada, sendo, ele mesmo, uma grande fonte de desenvolvimento
(VYGOTSKY, 1991, p. 117).

Para Piaget (KISHIMOTO, 2003), a construção de novos conhecimentos


se dá por um processo contínuo de desestabilização do equilíbrio cognitivo,
assimilação e/ou acomodação e reequilibração cognitiva. Para esse autor, o
indivíduo que conhece o que está à sua volta encontra-se em estado de equi-
líbrio cognitivo. Ao se deparar com um novo elemento, esse novo elemento
gera conflito cognitivo e, consequentemente, desequilíbrio cognitivo.
A primeira tentativa do indivíduo é de atribuir significados ao novo ele-
mento, por aproximação com os conhecimentos previamente construídos. A
esse processo, Piaget dá o nome de assimilação. Quando a estrutura mental
10 Educação infantil: um lugar de interações e brincadeiras

é reorganizada para dar conta do novo elemento do ambiente externo, ocorre


a acomodação. A teoria piagetiana destaca o papel das situações de brinca-
deira no percurso de aprendizagem tendo em vista que, nessas situações, os
indivíduos assimilam eventos e objetos ao seu eu e à sua estrutura mental.

O papel do professor na promoção do brincar


A importância da brincadeira no desenvolvimento e na aprendizagem infantil
é inegável. Veja:

O brincar apresenta-se por meio de várias categorias de experiências que são


diferenciadas pelo uso do material ou dos recursos predominantemente impli-
cados. Essas categorias incluem: o movimento e as mudanças da percepção
resultantes essencialmente da mobilidade física das crianças; a relação com
os objetos e suas propriedades físicas assim como a combinação e associação
entre eles; a linguagem oral e gestual que oferecem vários níveis de orga-
nização a serem utilizados para brincar; os conteúdos sociais, como papéis,
situações, valores e atitudes que se referem à forma como o universo social
se constrói; e, finalmente, os limites definidos pelas regras, constituindo-se
em um recurso fundamental para brincar (BRASIL, 1998, p. 29).

Nas instituições de educação infantil, devem coexistir dois tipos de brincadeiras:


as espontâneas e aquelas que atendem a propósitos pedagógicos. Nas brincadeiras
em que há um propósito didático, é o professor que assume a responsabilidade pela
estruturação desse campo no dia a dia das crianças. Assim, cabe a ele a oferta de
diferentes objetos, fantasias, brinquedos e jogos, diversidade de situações, bem
como a organização de tempos e espaços voltados para o brincar.
As situações de brincadeira oportunizam ao professor a observação cui-
dadosa das crianças, percebendo seus saberes, suas capacidades linguísticas
e de socialização, bem como sua autonomia moral e intelectual. A partir
dessa observação e com base nos dados obtidos, boas intervenções podem ser
realizadas. Boas intervenções são aquelas que têm o potencial de promover
novas aprendizagens. Elas podem se constituir, por exemplo, como a oferta
de materiais adequados, a reorganização do espaço e a mediação na escolha
dos papéis a serem desempenhados por cada um.
As intervenções docentes podem contribuir para o enriquecimento das
competências imaginativas, criativas e organizativas das crianças. Assim:

Cabe ao professor organizar situações para que as brincadeiras ocorram de


maneira diversificada para propiciar às crianças a possibilidade de escolherem
Educação infantil: um lugar de interações e brincadeiras 11

os temas, papéis, objetos e companheiros com quem brincar ou os jogos de re-


gras e de construção, e assim elaborarem de forma pessoal e independente suas
emoções, sentimentos, conhecimentos e regras sociais (BRASIL, 1998, p. 29).

Nas situações de brincadeira espontâneas, o professor tem um papel de


observador, de organizador de espaços, tempos e materiais, bem como de
mediador de eventuais conflitos que possam surgir.

No vídeo disponível no link a seguir, conheça a experiência de seis escolas brasileiras que
reconfiguraram suas práticas, assumindo um novo olhar para o brincar de suas crianças.

https://goo.gl/DjnjBo

BRASIL. Ministério da educação. Base nacional comum curricular. Brasília: MEC, 2017.
Disponível em: <http://basenacionalcomum.mec.gov.br/wp-content/uploads/2018/12/
BNCC_19dez2018_site.pdf>. Acesso em: 2 jan. 2019.
BRASIL. Ministério da Educação. Diretrizes curriculares nacionais para a educação in-
fantil. Brasília: MEC, 2010. Disponível em: <http://ndi.ufsc.br/files/2012/02/Diretrizes-
-Curriculares-para-a-E-I.pdf>. Acesso em: 2 jan. 2019.
BRASIL. Ministério da Educação e do Desporto. Referencial curricular nacional para a
educação infantil. Brasília: MEC/SEF, 1998. v. 1. Disponível em: <http://portal.mec.gov.
br/seb/arquivos/pdf/rcnei_vol1.pdf>. Acesso em: 2 jan. 2019.
BRASIL. Ministério da Educação. Resolução n. 5, de 17 de dezembro de 2009. Fixa as Di-
retrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil. 2009. Disponível em: <http://
www.seduc.ro.gov.br/portal/legislacao/RESCNE005_2009.pdf>. Acesso em: 2 jan. 2019.
BROCK, A. et al. Brincar: aprendizagem para a vida. Porto Alegre: Penso, 2011.
CARVALHO, A. M. A.; BERALDO, K. E. A. Interação criança-criança: ressurgimento de
uma área de pesquisa e suas perspectivas. Cadernos de Pesquisa, n. 71, p. 55-61, 1989.
Disponível em: <http://publicacoes.fcc.org.br/ojs/index.php/cp/article/view/1169>.
Acesso em: 2 jan. 2019.
KISHIMOTO, T. M. O jogo e a educação infantil. São Paulo: Pioneira, 2003.
12 Educação infantil: um lugar de interações e brincadeiras

LORDELO, E. R. O papel do adulto e da criança como parceiros do desenvolvimento


em Vygotsky. Revista Brasileira de Crescimento e Desenvolvimento Humano, v. 8, n. 1/2,
1998. Disponível em: <www.journals.usp.br/jhgd/article/download/38574/41421/>.
Acesso em: 2 jan. 2019.
OLIVEIRA, M. K. Vygotsky: aprendizado e desenvolvimento: um processo sócio-histórico.
São Paulo: Scipione, 1997.
VYGOTSKY, L. S. A formação social da mente. São Paulo: Martins Fontes, 1991.

Leituras recomendadas
BRASIL. Ministério da Educação. Diretrizes curriculares nacionais gerais da educação
básica. Brasília: MEC, 2013.
HORN, M. G. S. Brincar e interagir nos espaços da escola infantil. Porto Alegre: Penso, 2017.
LUZ, I. R. Relações entre crianças e adultos na educação infantil. In: SEMINÁRIO NA-
CIONAL: CURRÍCULO EM MOVIMENTO – Perspectivas Atuais, 1., 2010. Anais... Belo
Horizonte, 2010. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/docman/dezembro-2010-
-pdf/7156-2-4-artigo-mec-relacoes-criancas-adultos-educacao-infantil-iza-luz/file>.
Acesso em: 2 jan. 2019.
MEIRELLES, R. (Org.). Território do brincar: diálogo com escolas. São Paulo: Instituto Alana,
2015. Disponível em: <http://territoriodobrincar.com.br/wp-content/uploads/2014/02/
Territ%C3%B3rio_do_Brincar_-_Di%C3%A1logo_com_Escolas-Livro.pdf>. Acesso em:
2 jan. 2019.
PASQUALINI, J. C. O papel do professor e do ensino na educação infantil: a perspec-
tiva de Vigotski, Leontieve e Elkonin. In: MARTINS, L. M.; DUARTE, N. (Org.). Formação
de professores: limites contemporâneos e alternativas necessárias. São Paulo: Editora
UNESP; São Paulo: Cultura Acadêmica, 2010.
SANTOS, S. V. S.; SILVA, I. O. Crianças na educação infantil: a escola como lugar de ex-
periência social. Educação e Pesquisa, v. 42, n. 1, p. 131-150, jan./mar. 2016. Disponível
em: <http://www.scielo.br/pdf/ep/v42n1/1517-9702-ep-42-1-0131.pdf>. Acesso em: 2
jan. 2019.
TERRITORIO DE BRINCAR. Diálogos com escolas. Youtube, mar. 2016. Disponível em:
<https://www.youtube.com/watch?v=HvxvZQfDbPI&list=PL1IlaKMcWzeyUAkYGxHJ
CJWx5hMxO7VVD&index=3>. Acesso em: 2 jan. 2019.
UNIVESP. Organização do espaço e do tempo: legislação, pesquisas e práticas. You-
tube, mar. 2011. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=Gdg2j_Y-BsQ>.
Acesso em: 2 jan. 2019.
Conteúdo:

Você também pode gostar