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Trabalho Final - A Atuação Do Psicólogo em Instituições Psiquiátricas

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL

SEMINÁRIO DE INTRODUÇÃO À PSICOLOGIA

A atuação do psicólogo em
instituições psiquiátricas

Alessandra Richter Neves

Fábio Luiz Viegas

Guilherme Lannig de Souza

Novembro, 2011
INTRODUÇÃO
A origem dos hospitais psiquiátricos

Os manicômios, assim como acabam denominados os hospitais destinados aos pacientes


que enfrentam sofrimento psíquico, atravessaram séculos na cultura ocidental como a
instituição habilitada na correção de indivíduos inadequados às normas e condutas
sociais estabelecidas em diversos períodos da História.
Em meados do século XVIII, com o estabelecimento na Europa de grandes instituições
de ensino e universidades, a moral civilizada acabou encontrando maior apelo e as
atitudes consideradas inconvenientes tornaram-se não apenas contestadas, mas também
temidas. O mundo da loucura torna-se o mundo da exclusão. O próprio conceito de
loucura não implicava a condição necessariamente patológica de sofrimento mental;
bastava apenas a inobservância das convenções éticas e reguladoras para o bem estar
civilizado. Dessa forma, assaltantes, ébrios, mendigos, deficientes físicos acabaram
confinados em instituições moralizadoras ao lado dos deficientes mentais formando um
grupo polimorfo de anormais habitando os primeiros hospitais psiquiátricos europeus do
século XIX.
No Brasil, em meados do século XIX, não havia qualquer assistência específica aos
doentes mentais. Apenas em 1853, no Rio de Janeiro, é fundado o primeiro hospital
psiquiátrico do país – o Hospício Pedro II. Em Porto Alegre, no ano de 1884, é
inaugurado o Hospital Psiquiátrico São Pedro, para o atendimento específico dos
sujeitos em sofrimento psíquico que perderam sua autonomia e podem representar um
risco tanto para sua própria vida como para as vidas de outros.

A reforma psiquiátrica no Brasil

No final da década de 70, profissionais na área de saúde mental e familiares de


pacientes internados em hospitais psiquiátricos divulgam uma série de maus tratos e
verdadeiras violações às mínimas condições de reabilitação e tratamento dentro dessas
instituições. Nasce o movimento da Reforma Psiquiátrica que, além das denúncias,
propõe uma reformulação na rede de atendimento ao doente mental, aliando um
tratamento humanitário e atividades inclusivas e libertárias aos pacientes.
Dentro desse novo conceito e método de enxergar o indivíduo portador de transtorno
mental, novas instituições além do hospital psiquiátrico surgem como alternativa no seu
tratamento e acompanhamento, como as clínicas especializadas em atendimento
psiquiátrico.

Neste trabalho, abordaremos a atuação do psicólogo no atendimento ao paciente


portador de transtorno psíquico através de duas entrevistas em diferentes instituições e
períodos da história. Através do relato sobre as atividades em um hospital psiquiátrico
durante o período de luta anti-manicomial e, também, nos trabalhos desenvolvidos
atualmente em uma clínica especializada em atendimento psiquiátrico – resultado dos
esforços na obtenção de uma rede voltada à saúde mental – analisaremos as
semelhanças e diferenças metodológicas das atribuições do psicólogo no serviço
multidisciplinar de atendimento em saúde mental.
O PSICÓLOGO NO HOSPITAL PSIQUIÁTRICO
Nossa primeira entrevistada, psicóloga Mara, recebeu-nos em seu consultório na cidade
de Porto Alegre e tivemos uma excelente conversa por aproximadamente 50 minutos.

Caracterização profissional

Formou-se em psicologia pela PUCRS, em 1982 e finalizou uma pós-graduação em


saúde mental coletiva pela UFSM, em 1992.
Ao longo do curso fez estágios em psicopatologia e psicologia clínica, mais
especificamente dentro da área de seu interesse há época: infância e adolescência.
Passou um ano e meio realizando estágio na unidade infantil do Hospital Espírita.
Após concluir a graduação, prestou concurso para a Universidade de Santa Maria,
ingressando no hospital psiquiátrico da universidade.

O trabalho desempenhado no hospital psiquiátrico da UFSM

Trabalhou em todas as áreas da instituição – no ambulatório, com psicoterapia, nas


unidades públicas (masculina e feminina) com pacientes principalmente psicóticos e
dependentes químicos.
As atividades no hospital eram realizadas por uma equipe formada por psicólogo,
assistente social, médico psiquiatra da unidade e residentes. Ela e sua equipe
estruturaram o trabalho com dependentes químicos do hospital, em meados dos anos 80.
Havia a questão dos movimentos sanitários e da luta anti-manicomial em andamento
durante esse período. Baseado nos princípios desses movimentos estruturou-se os
serviços para dependentes químicos em unidades abertas. Tal serviço era prestado em
duas unidades: uma pequena, fechada, de desintoxicação (onde os dependentes
químicos ficavam, aproximadamente, uma semana), e uma aberta, para onde esses
pacientes eram encaminhados após o período de desintoxicação e podiam optar para
realização ou não do tratamento. Porém, a implementação dessa estrutura não foi
simples.

Participação na Reforma Anti-manicomial

Paralelo à suas atividades profissionais, participou ativamente de movimentos políticos


e grandes fóruns de debates como o Fórum Gaúcho de Saúde Mental cujo viés era
justamente anti-manicomial e onde ocorreram discussões acerca do projeto de lei da
reforma psiquiátrica.
Todo paciente internado em hospital psiquiátrico vivia, até a reforma, chaveado. Essa
era a rotina. A principal contribuição da equipe foi a implementação de uma unidade
aberta. A maioria dos pacientes, contudo, não saía. Como em qualquer instituição,
existia uma rotina bastante regrada, mas o diferencial era que os pacientes ficavam
internados somente se escolhessem ficar, o que era totalmente inusitado para a época.
Antes da reforma, quando existia uma indicação de internação, o paciente ficava no
hospital mesmo contra sua vontade. Não foi fácil lidar com tal inovação até mesmo
entre os profissionais da equipe de atendimento, pois estavam acostumados a uma
unidade fechada. Apenas pacientes psicóticos continuavam fechados devido ao
potencial de risco. Os dependentes químicos, assim que saíam da desintoxicação, eram
tratados como pessoas que não tinham distúrbios da percepção e da consciência quando
não sob o efeito de drogas. Ter que lidar com pessoas nessas condições era complicado
no sentido de garantir direitos.
Os pacientes tinham acesso aos prontuários e às anotações sobre seus estados clínicos.
Contudo, as pessoas não sabiam disso e as equipes não disponibilizavam normalmente
esse tipo de informação. Na equipe em que trabalhava, existia uma preocupação no
sentido de disponibilizar as informações aos pacientes. A ideia de atendimento
participativo, que contém um dos princípios da reforma (autor de sua própria história)
era o principal intento da equipe naquela realidade.
Uma verdadeira tentativa de humanização no tratamento aos doentes mentais.

As atividades realizadas pelo psicólogo no hospital

Mara coordenava grupos terapêuticos dentro da unidade de dependência química, bem


como na unidade de pacientes psicóticos (grupos operativos – organização de tarefas,
festas etc.). Coordenou a unidade de desintoxicação, realizava atendimentos individuais
de pacientes internados, avaliações psicológicas, atendimentos psicoterápicos.
Também conduzia seminários para residentes sobre terapias de grupo (trabalho de
extrema importância, uma vez que essas atividades de grupo são constantes na rotina
hospitalar). Junto à Psiquiatria, Mara criou um serviço chamado “Serviço de Apoio
Psicopedagógico a Estudantes de Medicina”, quando eram disponibilizados horários
para os estudantes em busca de apoio e esclarecimentos para suas dúvidas, angústias
etc.
Sua rotina no hospital envolvia as reuniões com seu grupo terapêutico, em que estavam
presentes médicos residentes, enfermagem, assistentes sociais. Essas discussões sobre o
andamento do processo administrativo e terapêutico são fundamentais numa instituição
complexa como um hospital psiquiátrico. Após essas reuniões, havia a necessidade do
preenchimento dos registros dos atendimentos individuais nos respectivos prontuários.
Uma maneira do grupo terapêutico acompanhar a evolução do quadro dos pacientes.
Trata-se, portanto, de uma atividade vital no trabalho do psicólogo em um hospital
psiquiátrico.
Além da rotina com os internos, Mara também atendia no ambulatório, onde eram
atendidos pacientes pelo SUS com plantão 24 horas. Ali, os pacientes eram recebidos
por um médico psiquiatra que analisava os casos. Em situação de crises psicóticas ou
neuróticas, eram encaminhados para a internação. Funcionava como um pronto-
atendimento psiquiátrico.

Remuneração e especialização

Mara destacou que não reclamava de seu salário na época, embora reconheça a
disparidade da remuneração entre as diferentes esferas do poder público (um psicólogo
do poder judiciário recebe remuneração superior a um mesmo profissional do poder
executivo, como seu caso que era vinculado ao Ministério da Educação).
Também apontou a inexistência de um curso específico para a atuação do psicólogo na
área hospitalar. Contudo, lamenta a inexistência, atualmente, de um estágio em
psicopatologia no curso de habilitação de psicólogo. O contato com pacientes psicóticos
dentro de instituições é muito enriquecedor para a formação.
O PSICÓLOGO NA CLÍNICA PSIQUIÁTRICA
Para destacar e apontar diferenças entre o cenário hospitalar numa época em que os
debates e lutas por uma reforma na área de saúde metal estavam acontecendo e a atual
estrutura disponível na reabilitação do paciente com transtorno psíquico, realizamos
uma segunda entrevista com a psicóloga Roberta que atende atualmente na Clínica São
José de prontopsiquiatria. Ela recebeu-nos em seu consultório em Porto Alegre para a
realização dessa conversa, que durou aproximadamente 20 minutos.

Caracterização profissional

Roberta é psicóloga formada pela ULBRA e ingressou na Clínica São José através de
seu estágio curricular em 2002. Após esse período curricular continuou como voluntária
trabalhando na coordenação dos estágios e comparece para atendimento multidisciplinar
com os pacientes internados.

O trabalho na clínica psiquiátrica

As atividades com os pacientes na clínica envolvem grupos multidisciplinares que


contam com psicólogos, médicos psiquiatras, assistentes sociais, terapeutas
ocupacionais e enfermeiros.
Roberta menciona o caráter integrado entre os diversos profissionais para o atendimento
dos pacientes internados na clinica como modalidade de tratamento fundamental na
clínica. Desenvolve atendimento individual com os internos para avaliar o andamento
do tratamento. De maneira geral, esse atendimento tem duração aproximada de 30 a 45
minutos, pois os pacientes acabam tendo diversas outras atividades na clínica. Esse
contexto de grupoterapia como oficinas de artesanato, jardinagem é supervisionado
pelos psicólogos. Os pacientes chegam até a clínica através de indicações ou pelo pronto
atendimento. São atendidos por psiquiatras que avaliam a necessidade de internação
para melhor acompanhamento ou atendimento ambulatorial.
Numa comparação entre o atendimento prestado na clínica e em um hospital
psiquiátrico, Roberta entende que há diferenças na abordagem ao paciente, mas ambas
as instituições servem-se da mesma ideia de educação e conscientização da melhor
forma de intervenção para pacientes dependentes químicos e psicóticos.

Um outro viés da reforma

Durante a entrevista, Roberta mencionou um ponto interessante sobre a reforma anti-


manicomial. Muito mais que um enfrentamento às instituições psiquiátricas (naquele
contexto em especial, aos hospitais psiquiátricos) os debates e a lei que instituiu
mudanças na rede de saúde mental disponibilizou um olhar humanitário no tratamento
ao doente mental. Desse modo, o problema muda de foco – não são as instituições, mas
os métodos de tratamento.
A clínica possui duas modalidades de internação: uma voluntária e outra involuntária. A
medida de contenção é adotada em casos extremos, como uma coação cautelar em que o
paciente não estaria responsável pelos seus atos e representaria um risco contra sua
própria vida assim como a de outros. Os pacientes não ficam fechados, isolados e sem
nenhum contato. Existe um aparato de grupos de apoio e profissionais para a avaliação
dos quadros patológicos que estão ali para atuar não somente com o paciente mas,
também, com as famílias envolvidas nesse tratamento.

A estrutura da clínica

O ambiente para o tratamento na clínica acaba sendo bastante diferente do encontrado


nos hospitais. A clínica dispõe de uma área de 8 hectares em que se encontram unidades
de cuidados especiais (equivalentes a UTIs de hospitais gerais) e outras estruturas para
casos como dependentes químicos, transtornos afetivos e emocionais até transtornos de
humor e de personalidade. Alguns pacientes chegam a relatar que se sentem num SPA,
não numa clínica psiquiátrica.
Pacientes que estão se estabilizando podem ficar em unidades abertas, com espaços para
diversas atividades disponíveis como jardinagem, academia, plantações, caminhadas.
Porém, para deixar as dependências da clínica apenas com a autorização do médico
responsável pela unidade de atendimento.

Remuneração e especialização

Roberta destacou que está plenamente satisfeita tanto profissionalmente quanto


financeiramente com essa área de atuação.
Existe a necessidade de especialização constante para melhor atuar nas atividades
clínicas. Anualmente acontece uma jornada de saúde mental, com palestras e seminários
teóricos e uma pós-graduação com ênfase na área cognitivo-comportamental também
pode proporcionar melhores condições de trabalho na clínica hospitalar.
CONCLUSÃO
Através da análise comparativa entre as duas entrevistas, é possível destacar na fala de
nossas entrevistadas muitas semelhanças na metodologia de intervenção do psicólogo
nas diferentes instituições de saúde mental. Tanto o hospital como a clínica psiquiátrica
trabalham com uma equipe multidisciplinar envolvendo médicos, enfermeiros,
assistentes sociais e terapeutas que respaldam suas ações e condutas através de reuniões
técnico-administrativas que visam ao melhor atendimento aos pacientes internados.
Grande parte de nossas atenções para essa área de atuação é justamente esse constante
contato entre diferentes áreas da saúde, proporcionando uma troca de conhecimento em
torno de um objetivo comum que é a busca por melhores condições e tratamentos para
os transtornos mentais. A mútua ajuda e a interdisciplinaridade envolvendo diversos
profissionais, o que acontece tanto nos hospitais de outrora como nas clínicas atuais,
proporciona maiores possibilidades de um tratamento efetivo das doenças mentais.
Aspecto mencionado também nas entrevistas, convém ressaltar a importância que a
reforma psiquiátrica teve na busca por uma humanização nos métodos de atendimento
aos doentes mentais. Aqueles que antes representavam uma ameaça à sociedade,
errantes nas normas e convenções sociais, necessitam de um atendimento especializado
que os proporcione condições de tratamento de suas enfermidades psíquicas e alívio de
suas angustias como qualquer cidadão. Graças aos esforços do passado, as instituições
especializadas em saúde mental estão, gradualmente, buscando um tratamento cada vez
mais efetivo e humanitário aos anormais tão normais de nossa sociedade.
REVISÃO BIBLIOGRÁFICA
LOPES, M. H. I. (2001). Pesquisa em Hospitais Psiquiátricos
http://www.ufrgs.br/bioetica/psiqpes.htm

FERNANDES, F. (2009). História da Psiquiatria no Brasil


http://artigos.psicologado.com/psicopatologia/psiquiatria/historia-da-psiquiatria-no-brasil

STREB, L. G. (2007). Santa Casa de Misericórdia, Hospício São Pedro e loucura: notas
sobre os primórdios da psiquiatria em Porto Alegre. In: Revista de psiquiatria do Rio
Grande do Sul, v.29, n.1
http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0101-81082007000100001&script=sci_arttext

FOUCAULT, M. (1999). Doença mental e psicologia. 6. Ed. Rio de Janeiro: Tempo


Brasileiro

ALAMY, S. (2007). Ensaios de psicologia hospitalar: a ausculta da alma.

http://www.ccs.saude.gov.br/vpc/reforma.html

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