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Botelho e Libby

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Filhos de Deus*

Batismos de crianças legítimas e naturais na Paróquia


de Nossa Senhora do Pilar de Ouro Preto, 1712-181 O

Children of God
Baptisms of legitimate and illegitimate infants in lhe Parish of Nossa
Senhora do Pilar de Ouro Preto, 1712-1810

00UGLAS COLE LIBBY


Professor Adjunto de História - UFMG

TARC{S/0 R. BOTELHO
Professor de História - PUC-MG

RESUMO O artigo analisa as características dos registros de batis-


mos de crianças na paróquia de Nossa Senhora do Pilar de Ouro Pre-
to (Minas Gerais) ao longo do século XVIII. Inicialmente, acompanha-
se a evolução dos batismos segundo a condição social da mãe (livre,
forra ou escrava), mostrando o predomínio de cativas ao longo da
primeira metade do século. A legitimidade segundo a condição da
mãe mostra que os filhos de mulheres livres eram predominantemen-
te legítimos, enquanto o inverso ocorria com as escravas, apesar do
aumento da taxa de legitimidade dessas últimas nas décadas finais
do período observado. A partir do cruzamento das informações do
nome das mães, conjugado com o nome do senhor para o caso das
escravas, é possível observar o número médio de filhos por mulher
segundo seu estado conjugal e sua condição social. Com os dados
daquelas mães com mais de um filho, estabeleceu-se o intervalo mé-

Artigo recebido em· 20/12/2003 - Aprovado em: 20/12/2003

VARIA HISTORIA, nº 31 Janeiro, 2004 69


dio entre os batismos . Finalmente , realizou-se o cruzamento dos re-
gistros de filhos de escravas das últimas décadas com o recensea-
mento de Ouro Preto de 1804.
Palavras-chave família, legitimidade, escravidão, demografia histórica

ABSTRACT This article analyzes the characteristics of infant baptismal


records from the parish of Nossa Senhora do Pilar de Ouro Preto (Minas
Gerais) during the eighteenth century. lnitially it examines the evolution of
baptisms according to the social condition of the mothers (freeborn , fre-
ed or slave) and demonstrates that slave were a majority of ali mothers
throughout the first half of the century. In looking at rates of legitimacy
according to the social condition of mothers it is shown that children born
to freeborn women were predominately legitimate , while the opposite
obtained for those born to slaves and freedwomen , although the data
indicate that legitimacy among slave infants was on the rise in the final
decades of the period studied . lt also proved possible to observe the
average number of children baptized per mother among married and
single women according to their social condition . The data on mothers of
two or more children allowed for an estimate of the average length of
childspacing . Finally, data from the registers of slave infants born in the
final decades of the period were intersected with data from a census of
Ouro Preto dating from 1804.
Keywords family, legitimacy, slavery, demographic history

Introdução
Os editores deste número especial enfocando a riqueza dos dados
disponíveis no arquivo da paróquia de Nossa Senhora do Pilar de Ouro
Preto solicitaram dos autores uma análise dos registros de batismos de
crianças legítimas e naturais datados entre 1712 e 181 O. Trata-se de um
conjunto de 8.287 registros. Entretanto, este conjunto não corresponde
ao total de batismos celebrados ao longo do período em tela, pois en-
contram-se excluídos os registros referentes aos batismos de escravos
recém-chegados da África e considerados pela Igreja como adultos,1
bem como os batismos de crianças abandonadas, designadas como
expostas na linguagem dos séculos XVIII e XIX. Nestes casos , por ra-
zões óbvias, faltam informações acerca da mãe e do pai dos batizados ,

1 Para a Igreja, as crianças - inocentes, na terminologia da época - se tornavam adultos aos sete anos de
idade quando faziam a primeira comunhão e confessavam . A entrada para as Minas de cativos africanos
com menos de sete anos parece ler sido extremamente rara.

70 VARIA HISTORIA, nº 31
bem como não era determinada a sua legitimidade ou naturalidade. 2
Assim, tais registros não permitem abordar uma série de aspectos de-
mográficos e sociais ligados à formação de famílias que figuram entre os
principais objetos do presente ensaio.
Apesar do vulto deste conjunto de registros e da amplitude do perío-
do de perto de um século- ambos quase que inéditos na historiografia
brasileira especializada - é preciso frisar desde logo a existência de
algumas lacunas , ora temporais , ora em termos das informações anota-
das, as quais limitam o escopo das interpretações pretendidas. Como
seria de esperar, por exemplo, alguns livros de registros se perderam ao
longo do tempo , resultando na falta quase total de informações para a
década de 1720 e a primeira metade da década de 1730. Isto significa
dizer que o período de 1736 a 181 O é o que oferece a possibilidade de
interpretações cronológicas e diacrônicas mais seguras, mas não se pre-
tende desprezar os dados disponíveis para a década de 171 O para qual
cada fonte que ainda sobrevive tem de ser valorizada . Da mesma forma,
falta uniformidade e consistência às anotações referentes à etnia ou cor
dos adultos envolvidos de uma forma ou outra na celebração dos batis-
mos. Por razões que não ficam claras , os párocos e seus subordinados
freqüentemente omitiam referências à raça ou origem da mãe ou do pai
das crianças livres, enquanto as informações sobre os proprietários de
crianças escravas e seus pais e mães ficaram ainda mais inconsisten-
tes . Dessa forma, a análise baseada na etnia e das complexas relações
entre as raças não pôde ser empreendida aqui, a não ser topicamente.
Mesmo assim, o banco de dados fornecido aos autores consiste em
variáveis ligados a cada ato de batismo, formando um conjunto de infor-
mações que nos permite retratar vários aspectos da realidade do perío-
do em tela, bem como levantar algumas hipóteses que procuram expli-
car aquela realidade . A primeira variável do banco é a data do batismo
- um dado essencial para o empreendimento de análises temporais
que tratam das mudanças e/ou continuidades detectáveis entre as de-
mais variáveis. Estaremos utilizando as datas de batismos como a me-
lhor aproximação possível da data de nascimento de cada criança, mui-
to embora seja óbvio que as datas apenas muito raramente coincidiam.

2 Até a década de 1760, os expostos correspondiam a menos de 4,2% do tota l de batismos, mas de 1780 até
1810 em diante a participação ficaria em torno de 10,0%. Esse número é bastante inferior ao encontrado para
o século XIX no Rio de Janeiro, mas assemelha-se ao observado em Salvador (Venâncio, 1999, p. 46). A
análise de uma pequena paróquia de Minas Gerais de 1775 a 1875, no entanto, revela um quadro semelhante
ao observado para Ouro Preto. Em Catas Altas do Mato Dentro, os expostos passaram de 2,5% dos batismos
de crianças livres no final do século XVIII para cerca de 15% ao longo da primeira metade do século XIX
(Venâncio, 2000). Entre 1730 e 1770, os africanos recém-chegados tiveram um peso considerável no total de
batismos (44,2% no primeiro decênio, 36,5% no segundo, 37,5% no terce1ro, caindo para 20,1% na década
de 1760), mas durante o resto do período em tela esta participação ficou bastante reduzida (8, 7% na década
de 1770 e meros 2,1% entre 1801 e 181 O). Dado que os números absolutos de africanos caíram sensivelmen-
te no sub-período do final do século XVIII e XIX, trata-se de forte evidência demonstrando a vertiginosa queda
na Importação de novas "peças" via o tráfico negreiro internacional.

Janeiro, 2004 71
Com relação à criança batizada temos uma série de dados: o seu
prenome; a sua condição de legítima ou natural perante a lei e a Igreja; o
sexo da criança (deduzido através do prenome); a sua condição social
de livre, escrava ou alforriada; e, finalmente, sua "idade", sendo que do
nosso banco de dados apenas constam as crianças inocentes (ou seja,
com menos de sete anos de idade). Não foi encontrado nenhum caso do
uso de mais de um prenome, mas é interessante observar aqui que o
registro de batismo não serve para indicar qual o nome completo da
criança. Com efeito, no mundo luzo do Setecentos parece ter sido co-
mum a prática de escolher eventuais outros prenomes e o(s) sobrenome(s)
somente depois da criança ter atingido oito ou nove anos. 3 Para a crian-
ça ser considerada como legítima, os pais teriam de ser casados em
uma união reconhecida pela Igreja e que, portanto, preenchia todos os
requisitos exigidos pela legislação em vigor (no caso, as Ordenações
Filipinas), inspirada nos preceitos tridentinos . As crianças naturais eram
frutos de vários tipos de uniões não reconhecidas pela Igreja, muito em-
bora, uma vez reconhecidas pelo pai , tivessem seus direitos garantidos
quando da partilha dos bens deste. No caso dos registros da paróquia
de Nossa Senhora do Pilar de Ouro Preto, de modo geral foi a ausência
do lançamento do nome do pai que determinou a naturalidade da crian-
ça. Como se sabe, por várias razões a instituição do matrimônio "de pa-
pel passado" não se disseminou entre largas parcelas da população
mineira do Setecentos, o que tornou a naturalidade uma condição bas-
tante comum. 4 Com efeito, ao designar a criança como natural , a Igreja
também deixava claro que não haveriam quaisquer impedimentos para
um eventual casamento entre os seus pais, casamento este muito alme-
jado pela Igreja nas Minas durante a Colônia. O que cabe notar aqui é a
total ausência nos registros levantados de crianças designadas como
espúrias- nascidas de relações adulterinas ou incestuosas- ou sacrí-
legas - cujos pais pertenciam ao clero. Já na dicotomia entre livres e
escravos, tão cara à historiografia tradicional, figura a vastíssima maioria
dos batizados da antiga Vila Rica, pois a alforria concedida na pia batis-
mal era um evento bastante raro. No momento oportuno este fenômeno
será objeto de considerações mais detalhadas.
A quase totalidade dos registros se refere a batismos celebrados
dentro da própria freguesia de Nossa Senhora do Pilar de Ouro Preto,
embora existam alguns poucos que aparentemente constituem re-confir-
mações de batismos de crianças inocentes realizados em paróquias dis-
tantes - em Portugal ou na capitania do Rio de Janeiro, por exemplo. O

3 A professora Norberta Amorim explicitou esse raciocfnio em relação à metrópole portuguesa em conferência
pronunciada na s• Jornada Setecentista, promovida pelo Centro de Documentação e Pesquisa da Histeria
dos Domfnios Portugueses (CEDOPE), Departamento de Histeria da UFPR, 26 a 28 de novembro de 2003.
4 Ver. entre outros, SOUZA 1982, RAMOS 1993, SCOTI 2000.

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banco de dados também indica o local do batismo. A maioria foi cele-
brada na Igreja Matriz do Pilar, mas as várias capelas espalhadas pela
freguesia também serviram como cenário do ato batismal e, ocasional-
mente , a anotação se reduzia à frase "em casa". Suspeitamos que, nes-
tes últimos casos , visava-se batizar inocentes já moribundos , assim evi-
tando que suas almas puras tivessem que passar pelo Purgatório antes
de chegar ao Céu . De qualquer forma, como não se detectou nenhuma
tendência no que diz respeito ao local de batismo, esta variável será
praticamente desprezada no presente trabalho.
Em se tratando de batismos de crianças legítimas e naturais, o nome
da mãe aparece em virtualmente todos os casos .5 São as qualificações
quanto à condição social destas mulheres que mais subsidiam nossas
investigações e, felizmente , os casos em que não foi possível verificar se
se tratava de mães escravas, livres ou forras somaram menos de duas
dezenas. Mesmo assim , é importante lembrar aqui que na transcrição
dos registros considerou-se a ausência de uma qualificação como indi-
cação de que o indivíduo em questão era livre .6 Não obstante, ao exami-
nar cada registro , os autores verificaram que nem sempre a condição de
forra foi devidamente anotada pelos clérigos . Desta forma, uma mesma
mãe (ou pai , ou até mesmo proprietário) aparecia como livre em um ba-
tismo, mas como forra em outro. Evidentemente que, para os efeitos da
nossa investigação, tais indivíduos são considerados como alforriados
ou libertos, mas é quase certo que a categoria de forras (e de forros) seja
sub-numerada, pois para os casos de registros únicos não há possibili-
dade de verificação . É sintomática da mobilidade social que tanto mar-
cou o Setecentos mineiro que nem sempre os párocos e capelães se
importavam em registrar a condição de alforriado de seus paroquianos.7
Por outro lado, é também característica da sociedade colonial que a con-
dição de cativeiro nunca deixou de ser anotada nos registros envolven-
do mães, pais e batizados escravos.
Nos registros de batizados legítimos sempre havia a anotação do
nome do pai. A qualificação por condição social era quase total, porém
sujeita aos mesmos problemas que acabamos de mencionar. Os nomes
de alguns poucos pais de filhos naturais também aparecem. Várias ve-
zes a mãe era escrava e o pai livre ou forro , mas todos os tipos de casais
eram registrados deste forma. Tais casos obviamente representam um

5 Houve apenas cinco casos em que a anotação do nome da mãe ficou ilegível.
6 Este é um procedimento padrão na interpretação de fontes do perfodo colonial. Freqüentemente associa-se
a ele a suposição de que o mesmo Indivíduo também teria sido branco, suposição esta muitas vezes errônea.
7 Como vem demonstrando um crescente volume de trabalhos, no contexto mineiro do período colonial as
mulheres forras às vezes conseguiam alcançar um prestígio social considerável o qual poderia fazer o clero
"esquecer" as origens humildes. Ver PAI VA 1995, 2000; LIBBY & PAI VA, 2000; FURTADO 2001, 2003; LIBBY
& GRAÇA FILHO 2003

Janeiro, 2004 73
esforço por parte do clero no sentido de apelar para o envergonhamento
público e assim encorajar a regularização de uniões informais. Dez ca-
sos se destacam em particular e a enumeração deles ilustra bem a ri-
queza da nossa fonte e a complexidade da sociedade escravista minei-
ra. No dia 28 de fevereiro de 1714 celebrou-se o batismo de Josefa,
escrava e filha natural da escrava Maria de Mendonça e do proprietário
desta, Bartholomeu Alves . Em 12 de agosto de 1715 foi batizado o es-
cravinho Miguel , filho natural de Maria Guiné e João Vaz Pinto de Casti-
lho, este proprietário da mãe e do filho . Menos de um ano mais tarde (em
7 de março de 1716) celebraram-se os batismos dos gêmeos Joseph e
Domingos, escravos e filhos naturais de Maria com seu dono Luis de
Figueiredo. O mesmo se sucederia ainda em 1716 com Antônio e Maria,
em 1717 com Maximiano e em 1737 com Manoel, todos escravos nasci-
dos de uniões entre suas mães e seus senhores . Já em 29 de outubro de
1714 batizou-se João, filho natural da cativa Maria e seu proprietário Ni-
colau Henriques. João foi alforriado na pia batismal, mas a irmã natural
dele, Florência, de 1716, permaneceu escrava e não se sabe o nome do
pai dela. Da mesma forma, em 19 de fevereiro de 1737, Vicente, o filho
natural da escrava Mariana e seu senhor Manoel de Souza, recebeu ao
mesmo tempo o sacramento do batismo e sua alforria. É digno de nota
que nenhum tipo de qualificação étnica ou relativa à cor de pele foi utili-
zado para descrever estes sete pais/senhores . A implicação é que eles
muito provavelmente teriam sido brancos. Na verdade , em função da
sua excepcionalidade, estas uniões retratam de maneira bem viva a rea-
lidade das primeiras décadas de ocupação das Minas quando imperava
uma crônica escassez de mulheres, muito especialmente potenciais par-
ceiras brancas. 8 Nestas condições, a miscigenação tornara-se inevitá-
vel e a mobilidade social de ex-escravas e seus filhos (freqüentemente
mulatos) um fato corriqueiro .
Como se verá, as informações sobre os proprietários e proprietárias
das mães e, portanto, de todos os batizados - de menos aqueles agra-
ciados com a alforria na pia batismal - ajudaram nossos esforços no
sentido de reconstituir parcialmente mais de 600 posses de escravos
que "produziram" dois ou mais batizados. Estas informações, no entan-
to, podem ser consideradas ainda menos uniformes que as relativas às
mães e aos pais dos batizados. Especificamente, pode-se ter certeza de
que o número de donos e donas de escravos identificados como forros
ou forras é substancialmente sub-estimado. Ao fechar este exame da
nossa principal fonte e o banco de dados gerado a partir dela, cabe

8 Não resta dúvida de que os livros de reg1stro para o período 1720-1734. desaparecidos. deveriam conter
outros tantos (ou mais) casos desta mesma natureza. Para evidências semelhantes e mais completas. ver
BOTELHO. 2004.

74 VARIA HISTORIA, nº 31
observar que o detalhamento das anotações sobre personagens secun-
dárias dentro do rito de batismo dependia das percepções, atitudes e
habilidades do clérigo/escrivão. Para o desgosto dos estudiosos de hoje,
nem sempre estes clérigos de ontem se importavam com características
pessoais que, em conjunto, se tornariam elementos chaves para uma
melhor compreensão de certos aspectos da História.
Foi por isso mesmo que, tal como os autores de outros artigos no
presente número, lançamos mão à obra de Herculano Gomes Mathias,
Um recenseamento na capitania de Minas Gerais. Vila Rica- 1804. Tra-
ta-se de uma transcrição- nem sempre bem feita- de uma série de
listas nominativas relativas a vários dos distritos e vilarejos que compu-
nham Vila Rica no alvorecer do século XIX. A freguesia de Nossa Senho-
ra do Pilar de Ouro Preto correspondia a aproximadamente metade da
vila. Dessa forma, as listas oferecem a possibilidade de identificar algu-
mas famílias que aparecem nos registros de batismos, bem como um
número razoável de domicílios ou fogos- para usar o termo da época
- que incluíam várias combinações de familiares, escravos e agrega-
dos. Este cruzamento de fontes permitiu a reconstituição de algumas
poucas famílias escravas e conduziu a especulações acerca da mortali-
dade infantil e da reprodução natural da população escrava.

Alguns indicadores gerais


A Figura 1 mostra os batismos registrados ao longo de todo nosso
período de acordo com a condição social das mães. Entendemos que,
diante da parcela mínima de crianças alforriadas na pia batismal e que
será examinada logo em seguida, a dinâmica das tendências demográ-
ficas apareça com maior nitidez quando se comparam os números de
filhos nascidos de mulheres escravas, livres e libertas. O que se verifica
é que, pelo menos até a década de 1760, havia uma predominância
absoluta de crianças cujas mães eram escravas e que, com a exceção
do ano de 1786, estes filhos de cativas continuaram como a maior entre
as três categorias de batizados até cerca de 1790. Mesmo durante as
últimas duas décadas do período a prole de mães escravas quase sem-
pre constituía o segundo maior agrupamento entre os batizados. Talvez
mais surpreendente ainda seja o fato de que a média anual de batizados
cujas mães eram escravas permaneceu numa mesma faixa durante quase
todo o período para qual os dados são mais completos (1736-1805). 9
Neste caso, as quedas nas médias, registradas particularmente nas dé-

9 Acreditamos que o escasseamento de dados para o final do período possa ser atribuído à perda de docu-
mentação (algum livro de registro de batismos). não representando uma tendência de queda da população
em geral. como poder-se-ia inferir.

Janeiro, 2004 75
cadas de 1770 e 1780, ficam mais evidentes diante do crescimento da
população livre. Há uma pequena diminuição do número de nascimen-
tos de escravos 10 , que amplifica a perda de sua representatividade no
universo que passa a ser mais dominado por nascimento de crianças
livres. Ao verificar o posterior aumento das médias anuais, o corolário
das nossas especulações teria de ser a consolidação, por volta de 1790,
de uma geração essencialmente crioula e que era plenamente capacita-
da para a reprodução natural. 11 Quanto à população nascida livre, nota-
se que, do final da década de 1730 até meados da década de 1750, a
média anual de batizados cujos mães eram registradas como livres per-
maneceu em torno de 20. Já as alforriadas representaram uma parcela
muito pequena das mães até a década de 1750 quando passaram a
acompanhar de perto as tendências entre as mães livres .12 Foi a partir
da década de 1760 que se iniciou uma tendência geral de crescimento
dos batismos de filhos de livres e forras os quais, como acabamos de
observar, passariam a superar os batismos de filhos de escravas. Não
obstante, parece-nos interessante observar que esta tendência de cres-
cimento foi marcada por irregularidades nas décadas de 1770 e 1780.
Dificilmente podem ser consideradas fortuitas as quedas pontuais, po-
rém acentuadas , observadas neste período o qual , não custa repetir,
coincidiu com o auge da crise na produção aurífera na capitania. Aqui , a
falta de fontes adicionais que permitissem cruzamentos de dados é par-
ticularmente frustrante , mas não há como deixar de especular que tal
irregularidade provavelmente se relacionava com a saída de parcelas
nada desprezíveis da população livre e forra da empobrecida Vila Rica e
seu entorno imediato em busca de oportunidades em um "interior" mais
agrícola e orientado para o mercado interno, e daí bem menos afetado
pela crise. Seguindo esta lógica, a cifras para a década de 1790 indica-
riam uma certa recuperação econômica e a marcante estabilização da
população nascida livre. Por outro lado, a diminuição repentina e vertigi-
nosa dos batismos de crianças de mães libertas ao redor da virada do
século sugere o envelhecimento da população forra. Este envelhecimento

10 Tais qued as nas médias podem ter resultado da dimi nuição vertiginosa q ue teria se dado nas importações d e
africanos em decorrência da crise generalizada que afetava o setor de mineração. Quer dizer que a falta de
jovens escravas oriundas da África, aliada ao envelhecimento d a população manclpia que permaneceu em
Vila Rica, redundou em menos nasci mentos. Não há indícios de qualquer retomada d as importações antes
da década de 1810. A esse respeito, por enquanto, temos apenas indicadores indiretos: o número de batis-
mos de escravos adultos começou um queda sensível já na década de 1770, chegando a nlveis baixíssimos
nas décadas de 1790 e 1800. Por esta medida indireta, pode-se deduzir que foi somente após a chegada da
Corte ao Rio de Janeiro que as importações teriam recuperado os nlveis da década de 1760.
11 Desde 1980 a questão da reprodução natural da população escrava em Minas Gerais tem-se tornado objeto
de um acirrado debate internacional. Ver, entre outros: MARTINS 1980, GENOVESE & ENGERMAN 1983,
LUNA & CANO 1983, LIBBY 1988, LIBBY & GRIMALDI1988, PAIVA, UBBY & GRIMALDI1988, PAIVA & LIBBY
1993, BERGAD 1994, BOTELHO 1994, PAIVA & BOTELHO 1995, MARTINS 1996, PAIVA 1996, BERGAD
1999, LIBBY & PAIVA 2000, LIBBY 2001. A questão será retomada oportunamente ao longo do presente texto.
12 De novo, é preciso lembrar que nossa fonte Indubitavelmente subestima o número de mães libertas e, portan-
to, inflacionao rol de mães supostamente nascidas livres.

76 VARIA HISTORIA, nº 31
teria resultado da não renovação daquela população, ou seja, foi provo-
cado por uma redução sensível no número de alforrias provavelmente
iniciada uma ou duas décadas antes. Nossa hipótese é perfeitamente
lógica, pois, uma vez que os filhos de libertas nasciam livres, por defini-
ção, a população forra somente se mantinha ou crescia através de con-
tinuados atos de libertação de cativos .13

100

90

80

70

60
e - L.Mu
~ 50 -·-·Forras
z - Escravas
40

30

:A
o~L
~~~~# ~~~~~~'''~~~~~#''''~~~'''' Ano

Figura 1 - Batismos segundo a condição social da mãe, Vila Rica, 1712-181 O

Os dados expostos na Figura 1 também servem para embasar certas


observações relativas à população de Vila Rica como um todo durante o
período em tela. Na verdade, os dados parecem confirmar determinadas
interpretações sobre a composição deste conjunto populacional, interpreta-
ções consideradas meras conjecturas na ausência de fontes censitárias
propriamente ditas. A marcante predominância dos batismos de filhos de
escravas na primeira metade do século XVIII sugere que, já a partir da dé-
cada de 171 O, a população escrava excedia a dos indivíduos livres e liber-
tos, situação esta que somente começou a se inverter durante a década de
1760. Já para as décadas posteriores os dados indicam a predominância
da população nascida livre e liberta. É interessante notar que os dados reu-
nidos por Costa (1982, 27) sobre a outra freguesia de Vila Rica, Antônio
Dias, poderiam conduzir a inferências iguais, embora neste caso a inversão
a favor dos livres e libertos teria ocorrido dez ou quinze anos antes. 14 De

13 Evidências empíricas para outras localidades de Minas Gerais apontam um declínio do número de alforrias na segunda
metade do século XVIII e princípios do século XIX; ver COSTA 1982, HIGGINS 1999, LIBBY & GRAÇA FILHO 2003.
14 Evidências semelhantes foram encontradas para Catas Altas do Mato Dentro ao longo dos séculos XVIII e XIX
em BOTELHO 2003.

Janeiro, 2004 77
qualquer forma, não custa lembrar que historicamente a predominância de
cativos na população total foi uma característica típica das regiões brasilei-
ras mais voltadas para atividades de exportação, o que vem a corroborar a
cronologia das tendências aqui detectada.
Ao examinar a Figura 2, o que mais se destaca é a reduzida escala
das alforrias concedidas na pia batismal. Ao longo do período todo estes
pequenos libertos representaram em torno de 5,6% do total de crianças
nascidas de mães escravas. Reduzida ou não, trata-se de uma taxa cer-
tamente mais alta que o ritmo de libertações da população escrava como
um todo. Schwartz ( 197 4) estima em dois ou três por cento a taxa anual
de manumissão no Brasil setecentista. No "chão movediço" das Gerais,
muito provavelmente, esta taxa foi maior, como atesta o rápido cresci-
mento da população liberta e livre de cor, mas um ritmo acima dos cinco
por cento anuais seria pouco provável. Em termos cronológicos, é difícil
discernir um padrão claro na concessão destas alforrias se bem que é
preciso reconhecer que os maiores picos (na década de 1770 e na pri-
meira metade da década de 1780) coincidiram com os piores efeitos da
crise no setor de mineração. Da mesma forma, não nos parece nada
fortuito que houve um firme declínio a partir de 1785, declínio este que
vem a corroborar nossas observações anteriores acerca da marcante
redução no número de batismos de crianças nascidas de mães libertas
que se deu na virada para o século XIX.

o 5

~
z 4
- Crlancas l

~~~~~'''~~,~~~#'''~~'''~
Ano

Figura 2 - Crian ças alforriad as na pia batismal , 1712-1810

Os registros de batismos oferecem poucos indícios sobre as motiva-


ções que conduziam às alforrias. Poder-se-ia imaginar que quando ha-
via a anotação do nome do pai livre de um inocente escravo natural as

78 VARIA HISTORIA, nº 31
chances de alforria na própria pia batismal aumentariam sensivelmente.
Afinal, é mais ou menos consenso na historiografia especializada que
qualquer parentesco de crianças com pessoas livres ou forras revertia,
com uma certa freqüência, em libertação.15 E, com efeito, em 9 de mar-
ço de 1714, Manoel , filho natural de Antônia, escrava de Domingos de
Araújo Dantas, com Custódio Fernandes da Silva, livre, foi alforriado na
pia batismal. Da mesma forma, em 9 de novembro de 177 4, o sacramen-
to do batismo se fez acompanhar da libertação de Maria, filha natural de
Francisca, escrava de José Antônio Le ite , com Manoel Francisco Perei-
ra, aparentemente livre uma vez que faltou uma anotação relativa a sua
condição social. Por outro lado, em 7 de junho de 1736, João, filho natu-
ral de Joana, escrava de Gregório de Mattos Lobo, e de Feliciano da
Costa- este claramente identificado como um homem livre - foi regis-
trado como escravo . Encontramos os seguintes casos em que, tal como
no do João, a condição livre ou forra do pai não conduziu ao resgate do
cativeiro na pia batismal : Antônio de 1714, outro Antônio de 1715, Do-
mingos de 1716, Joana e Vicente , ambos de 1717, Angélica de 1739,
Gonçalo de 17 40 e, finalmente , ainda outro Antôn io, este nascido em
1759. É claro que se trata de uma amostra mínima,16 mas a implicação
seria a de que menos de um quinto dos filhos de escravas com pais
livres ou libertos poderiam ser agraciado com a libertação na pia batis-
mal.
Ao examinar o amplo espectro de todas as alforrias concedidas na
pia batismal , nenhum padrão claro emerge. Acreditamos , mais ou me-
nos intuitivamente , que os proprietários libertos e, em especial , as pro-
prietárias libertas tendiam a ser mais generosos com os atos de alforria
que seus congêneres nascidos livres . Em 1779 e 1787, por exemplo,
Joana Ferreira da Cruz libertou no ato do batismo os dois filhos de sua
escrava, a mina Francisca; estes foram os únicos batismos em que Joa-
na foi registrada como proprietária. Nem todas as ex-escravas demons-
travam a magnanimidade de Joana. Entre 1759 e 1789, Benta Pires, uma
forra cuja etnia não foi indicada, encontrava-se listada onze vezes como
proprietária das mães de crianças batizadas. Benta concedeu alforria
junto com o sacramento do batismo apenas à Maria, filha natural de An -
tônia crioula , nascida em 1776. Realmente excepcional foi o caso de
Francisca de Sequeira Rodrigues- uma forra sem identificação quanto
a sua raça . Entre 1737 e 1785, foram registrados nada menos que 23
batismos de filhos de escravas suas . Feliciana deu luz à Gertrudes em
17 40, à Eufrazia em 17 43 e à Joaquina em 17 49 . De 1758 a 1763, Gertru-
des (que , tal como as irmãs , enquanto mãe era qualificada como "criou-

15 Ver, a esse respeito, PAIVA 1996, 2001, e FARIA 2001, dentre outros.
16 Estes onze casos foram os únicos encontrados que não envolviam pats/senhores.

Janeiro, 2004 79
la") batizaria quatro filhos, dois dos quais alforriados na pia. A "produ-
ção" de Eufrazia começou em 1775 e terminou em 1785 - dos cinco
filhos apenas Eva (1777) permaneceu escrava. Da mesma forma, ape-
nas a primeira filha de Joaquina- Maria de 1764- não foi agraciada
com a libertação na pia. Parece-nos bastante óbvio que, além das lem-
branças da própria escravidão, Francisca de Sequeira Rodrigues foi
motivada a conceder a liberdade a crianças cujas mães ela mesma aju-
dou a criar. A intimidade cotidiana e duradoura, afinal, cria afeto e é ób-
vio que o afeto poderia redundar em atos de generosidade. De qualquer
forma , através de um exame nada sistemático dos registros identifica-
mos duas dezenas de casos em que libertas e libertos alforriaram crian-
ças de suas escravas e temos certeza de que os registros contêm um
bom número de casos semelhantes a espera de uma investigação mais
detalhista.17
Os senhores de escravos nascidos livres também foram motivados
pelos laços de afeto cultivados ao longo de anos de intimidade com seus
cativos . Em 1790, por exemplo, José Vieira da Cruz, libertou na pia batis-
mal Raimundo , filho natural da sua escrava Ana, filha batizada em 1776
de outra escrava sua por nome lzabel. Já em 1762 e em 1763, Custodio
Dias alforriou no ato de batismo dois netos de sua escrava Joana, mãe
de Maria, nascida em 17 40. Até um certo ponto, a constituição de famíli-
as escravas parece ter estimulado a concessão de manumissões . Por
exemplo, entre 1766 e 1770, Antônio Correa Mayrink alforriou na pia ba-
tismal os três filhos legítimos de seus escravos Ana e Caetano, como fez
Simão Carvalho dos Santos com os dois filhos legítimos de Maria e Ale-
xandre , também na década de 1760. Por outro lado , é difícil explicar a
parcimônia com as alforrias de grandes proprietários como José Velloso
Carmo ( 125 batismos de 1762 a 1809) ou do Inconfidente José Álvares
Maciel (46 batismos entre 1752 e 1795 18 ) que viram nascer duas gera-
ções de cativos nas suas posses , posses estas repletas de casais uni-
dos perante a Igreja. Ao longo dos 47 anos em que seu nome aparece
nos registros paroquiais de Nossa Senhora do Pilar de Ouro Preto, Vello-
so Carmo concedeu apenas uma alforria na pia batismal: em 1778 para
lzidoria, a última dos quatro filhos naturais de Vitória, crioula. Da mesma
forma, somente a celebração do batismo em 1752 de Anna, filha natural
da parda Jerônima, foi acompanhada de uma declaração de liberdade
da inocente por parte de Álvares Maciel. Talvez se possa pensar em uma
maior distância entre o senhor e seus escravos dentro de grandes plan-

17 Evidências semelhantes foram encontradas por Faria (2001 , 312) para o Rio de Janeiro a partir da análise de
alforrias de escravos em testamentos de senhores e senhoras forros. Segundo suas conclusões, "ser escrava
de mulher forra era a certeza de ter suas filhas libertas gratuitamente e de ser ela própria libertada, mesmo
que com pagamento"
18 Os cinco registros dos anos 1794 e1795 incluiam a observação de que Álvares Maciel era "já falecido" .

80 VARIA HISTORIA, nº 31
téis, o que dificultaria a construção de laços mais estreitos entre ambos
que justificariam a concessão de alforria.
Esta última alforria é bastante sugestiva, pois envolve uma mãe mu-
lata. As evidências que vão se acumulando indicam que a miscigenação
perpassada por parcerias com brancos tendia a aumentar consideravel-
mente as possibilidades de obtenção de liberdade, ou seja, os escravos
pardos tinham muito mais chance de se tornarem libertos que seus com-
panheiros crioulos ou africanos .19 Como falta aos registros de batismos
de Nossa Senhora do Pilar uniformidade na identificação étnica e de cor
de adultos, fica difícil seguir semelhante linha investigativa. A bem da
verdade, no entanto, para entender as práticas de alforria nas Minas dos
séculos XVIII e XIX , urgem estudos que trabalham intensamente com o
cruzamento de dados provenientes de diversas fontes : cartas de alfor-
ria, testamentos, inventários post mortem, documentação judiciária, cor-
respondência particular e oficial, além dos registros paroquiais. 20
Ao examinar as taxas de legitimidade dos inocentes de acordo com
a condição social das mães, acaba-se confirmando um quadro de rigi-
dez hierárquica notavelmente condizente com as interpretações historio-
gráficas mais tradicionais possíveis . Apesar de uma literatura mais re-
cente sobre Brasil e, em particular, Minas colonial que insiste em enfati-
zar a predominância, em todas as camadas da população, de uniões
consensuais e amancebadas sobre aquelas abençoadas por represen-
tantes da lgreja, 21 os dados da freguesia de Nossa Senhora do Pilar de
Ouro Preto contam uma outra história. A taxa média de legitimidade dos
filhos de mães listadas como livres para todo o período 1712-181 O ficou
em 78,8%, um nível que se aproximava às taxas contemporâneas obser-
vadas em Portugal, sobretudo no Minho, mas também em outras regiões
da Europa. 22 É curioso notar uma aparente tendência de queda na legi-
timidade da prole de mães livres nas décadas de 1780 e 1790 que coin-
cidia nitidamente com um súbito aumento no número de batizados ex-
postos .23 Trata-se de um fenômeno que merece ser estudado de manei-
ra bem aprofundada, algo que foge às possibilidades do presente texto.
De qualquer forma, como se depura na Figura 3, as taxas de legitimida-
de entre os inocentes nascidos de mães escravas e libertas constituíam
o virtual inverso das taxas entre livres. Com efeito, para o período como
um todo a taxa média de legitimidade para filhos de cativas foi de míse-
ros 11 ,1%, enquanto a mesma taxa para os filhos de forras ficou em 21 ,9% .

19 Ver, especialmente, LIBBY & PAIVA 2000.


20 Acerca do século XIX, ver GONÇALVES 2000.
21 Ver, entre outros: SOUZA 1982, VENÂNCIO 1986, RAMOS 1990, LEWKOWICZ 1992, BRÜGGER 2000.
22 A respeito da questão da legitimidade na Europa e da necessidade de se considerar as especificidades de
Portugal, ver ROWLAND 1997 e SCOTI 2000, dentre outros.
23 Sobre os expostos, ver VENÂNCIO 1999.

Janeiro, 2004 81
É bem verdade que, a partir da década de 1780, pode-se detectar uma
ligeira tendência de aumento da legitimidade entre as crianças de mães
mancípias. Já os dados relativos aos filhos de mães libertas parecem
erráticos demais para se chegar a apontar qualquer tendência. 24

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Figura 3- Legitimidade segundo a con dição da mãe{%}, 1712-1810

Como explicar estas enormes discrepâncias nas taxas de legitimi-


dade, principalmente tendo em mente que, como acabamos de obser-
var, tais discrepâncias parecem substanciar interpretações tradicionais
que quase equacionam a sociedade colonial com uma rígida hierarquia
baseada em preceitos raciais e de condição social? Em parte, mas ape-
nas em parte, suspeitamos que a resposta seja que tais interpretações
não são inteiramente infundadas: de fato, a sociedade colonial brasileira
e mesma a mineira- esta inegavelmente marcada por uma ampla mo-
bilidade social- foram caracterizadas por uma organização social pro-
fundamente hierárquica, com convenções tanto racistas quanto classis-
tas. Ao procurar desvendar, corretamente a nosso ver, a agência históri-
ca dos próprios escravos e a heróica independência com a qual os liber-
tos procuravam construir suas vidas fora do cativeiro , é inevitável que a
historiografia revisionista de quando em vez esbarra nesta realidade.
Mesmo assim, aventaríamos duas possíveis explicações para as discre-
pâncias. A primeira se atém às especificidades da sociedade Setecen-
tista mineira que, de acordo com alguns estudos recentes, 25 abrigava

24 Cabe voltar rapidamente à Figura 1 que mostra uma queda violenta no volume de batismos de filhos de forras
na primeira década do século XIX. Tal queda obviamente desautoriza qualquer tentativa de interpretar as
altas taxas de legitimidade destas crianças na mesma década.
25 Por exemplo, ANDRADE 1998, MENESES 2000, MENESES 2003.

82 VARIA HISTORIA, nº 31
um considerável setor "médio" razoavelmente remediado, ou seja, fre-
qüentemente proprietário de alguns escravos. Parece-nos óbvio que a
vasta maioria dos casais "de papel passado" e pais das crianças regis-
tradas como legítimas e livres provinha deste setor dito médio. Em outras
palavras, parece não ser entre a população livre que se deva buscar os
chamados desclassificados do ouro, se é que tal desclassificação pos-
sa ser equacionada com altas taxas de ilegitimidade. Em um trabalho
anterior (Libby & Paiva 2000 , 33-34), mostramos que, no ano de 1795, a
população forra da freguesia da Vila de São José era mais propensa a
sacramentar suas uniões que a população livre. Aquele trabalho foi ba-
seado no estudo de um censo eclesiástico, uma fonte certamente mais
representativa da população como um todo que os registros de batis-
mos. Mesmo assim , a aparente diferença é bastante intrigante e aponta
para a necessidade de novas abordagens investigativas e outros estu-
dos. De qualquer forma , os dados da freguesia de Nossa Senhora do
Pilar de Ouro Preto nos levam a vislumbrar uma rua de mão dupla em
que boa parte da população forra se despreocupou com as formalida-
des de núpcias abençoadas pela Igreja, enquanto esta não se esforçava
tanto assim de cuidar da moralidade de uma camada social considera-
da, por assim dizer, de segunda classe . Já no caso da população escra-
va, acreditamos que a Igreja tendia a evitar interferir nas relações emi-
nentemente privadas que se davam entre senhores e escravos, mesmo
que o resultado pudesse ser considerado altamente pecaminoso. 26 Pelo
menos em Vila Rica parece que a vasta maioria dos senhores pouco se
importava com o estado matrimonial de suas escravas e escravos. 27
Ao voltar ao exame dos casos em que o nome do pai da criança
natural foi anotado no registro do batismo, uma outra perspectiva emer-
ge. Em primeiro lugar, cabe notar que estes registros- uma espécie de
denúncia pública de uniões ilícitas- perfaziam apenas 1,4% do total de
registros de batizados naturais (73 em 5377 casos). Não nos parece que
o clero estivesse exatamente engajado em uma cruzada contra os peca-
dores . Em segundo lugar, 44 casos, ou seja, mais da metade desses
registros/denúncias , datam de 1714 a 1750, sub-período este para qual
existe uma enorme lacuna na fonte. Dos 27 casos envolvendo escravas
ou escravos , 23 datam do mesmo sub-período (e mais três da década
de 1750) e deles apenas cinco se referem a casais escravos . O resto

26 A respeito da atitude da Igreja parece-nos relevante refletir sobre o fato de que dos 26 batismos realizados
entre 1787 e 1808 em que o Reverendo Antônio Gonçalves de Moraes e Castro apareceu como proprietário
das mães, apenas sete das crianças eram legítimas.
27 Também suspeitamos que, especialmente em se tratando do espaço urbano da Vila propriamente dita, os
reg istros "escondem" um bom número de uniões entre escravas e escravos pertencentes a senhores diferen-
tes. Muito embora as Ordenações Filipinas fossem claras em considerar que a propriedade seguia o ventre e
que ao dono da mãe pertenciam os filhos, parece que os desconfiados senhores de escravos mineiros
preferiam desconhecer tais uniões.

Janeiro, 2004 83
destes casos trata de uniões entre escravas e homens livres ou forros . Já
dos 46 casos que lidam com uniões ilícitas entre livres e/ou libertos, 21
datam de 1712 a 1750 e outros dez são da década de 1750. 28 E mais,
para as décadas de 1760 e de 1800 não há nenhum registro/denúncia.
Certamente com relação à população escrava, mas também no que di-
zia respeito aos forros e até mesmos aos livres, quer nos parecer que a
Igreja foi assumindo, ao longo do século XVIII, uma atitude de resigna-
ção diante de tanto desregramento. De acordo com os nossos dados, o
resultado foi que, para cada criança legítima batizada na freguesia de
Nossa Senhora do Pilar de Ouro Preto entre 1712 e 181 O, batizaram-se
duas crianças naturais.29

Outras vertentes de investigação


Uma das estratégias metodológicas empregadas em nossos traba-
lhos com o banco de dados foi a da reconstituição parcial de posses de
escravos através do re-agrupamento de batismos de crianças perten-
centes a um mesmo proprietário. Isso resultou na montagem de um se-
. gundo banco de dados contendo as informações disponíveis para se-
nhores de escravos que aparecem pelo menos duas vezes nos regis-
tros. Apesar das dificuldades apresentadas pela irregularidade da orto-
grafia de nomes, por problemas de legibilidade dos documentos origi-
nais e de transcrição e pela incidência de homônimos, conseguimos iden-
tificar 603 proprietários cujas cativas batizaram pelo menos duas crian-
ças ao longo do nosso período. É óbvio que o número de batismos cons-
titui um indício tosco do tamanho da posse de cativos propriamente dita,
mas parece-nos que a amostra resultante seja bastante representativa
da realidade de Vila Rica durante o século XVIII e início do XIX . Perto de
dois quintos dos casos (229, ou 38,0%) envolvem apenas dois batismos .
Se lembrarmos que outros 1028 casos envolvem um único batismo por
proprietário, tem-se retratada, mais uma vez , a dispersão e a relativa
desconcentração da propriedade de cativos que caracterizaram as Mi-
nas Gerais, tanto no Setecentos, quanto no Oitocentos .30 Por outro lado,
algumas destas recomposições surpreendem pelas elevadas quantida-
des de batismos registrados , indicativas de posses verdadeiramente
grandes. Estes casos , sem dúvida excepcionais, guardam uma notável

28 ~ também interessante observar que os registros de batismos contêm apenas dois casos em que o mesmo
casal aparece duas vezes: Custódia da Costa Braga e João Gonçalves Valéria, ambos aparentemente nasci-
dos livres batizaram seus filhos naturais Anna e Miguel em 1743 e em 1745, respectivamente; em fevereiro de
1754 e em setembro de 1755. foram batizados Andreza e Jozé, filhos naturais da parda forra lgnácia Lopes
de Faria e de Nicolau Borges Pomba. este registrado como nascido livre.
29 Para ser p reciso. foram 5377 batizados naturais em um total de 8287 registros, ou seja 64,9%.
30 Ver, por exemplo, COSTA 1981 , 1982, LIBBY 1988, ALMEIDA 1994, VENÂNCIO 1995, PAIVA 1996, LIBBY &
PAIVA 2000, BOTELHO 2001, GRAÇA FILHO 2002.

84 VARIA HISTORIA, nº 31
semelhança entre si: a aparente longevidade dos proprietários em ques-
tão. José Velloso Carmo, como já vimos , aparece como dono em 125
registros que datam entre 1762 e 1809. Antônio Ramos dos Reis assistiu
o batismo de 63 crianças cativas a ele pertencentes de 1736 a 1762.31
Quarenta filhos de escravas de Manuel Rodrigues de Almeida recebe-
ram o sacramento do batismo ao longo de 51 anos (de 1742 a 1793).
Como já mencionado, os 46 batismos da prole das cativas de José Álva-
res Maciel perduraram de 1752 até 1795.
As recomposições desta amostra revelam uma série de variações
que desaconselham qualquer tentativa de generalizar. Típico, por exem-
plo, é o caso de Gualter Moreira que figura como dono de cinco escra-
vas, cada uma a mãe de uma única criança batizada entre 1737 e 1752.
Igualmente típico foi o caso de André Lourenço da Silva, abençoado
com seis filhos naturais de Antônia , mas que não apareceu em nenhum
outro registro de batismo. Repetiam-se casos como o de Antônio Agosti-
nho Lobo Leite Pereira que também apareceu, entre 1783 e 1797, em
apenas seis registros , todos referentes às crianças legítimas dos seus
escravos: três da parda Jacinta com o crioulo Teodoro, duas da crioula
Domingas com o cabinda José e uma da crioula Antônia com o rebolo
Francisco.32 Parecido foi o caso de Domingos Álvares de Oliveira que,
entre 1788 e 1808, celebrou os batismos de 22 crianças escravas legíti-
mas e apenas duas naturais entre a prole de suas escravas. Por outro
lado, encontram-se muitos casos como o de Antônio de Souza Lobo que
testemunhou , como proprietário, 27 batismos de 17 44 a 1784, todos de
crianças naturais; ou o de Domingos da Castro Novais, cujas cativas
produziram 18 filhos naturais e nenhum legítimo entre 1779 e 1806. Em
suma, pode-se afirmar que havia pequenas, médias e grandes proprie-
dades em que, em sua maioria, as crianças eram filhos únicos e outras
tantas em que a maioria fazia parte de uma família, composta, no míni-
mo, por sua mãe e um ou mais irmãos. Como já se demonstrou, a ilegiti-
midade prevaleceu amplamente entre os batizados escravos, porém havia
posses de todos os tamanhos nos quais a maior parte das crianças cati-
vas foi fruto de uniões abençoadas pela Igreja.
O que mais importa para as considerações presentes é que, toma-
das em conjunto, as recomposições de batismos referentes aos mesmos
proprietários permitem vislumbrar um núcleo pelo menos potencialmen-
te reprodutor da população escrava. As crianças nascidas em posses
para os quais registraram-se dois ou mais batismos representavam nada

31 É quase certo que Ramos dos Reis teria testemunhado batismos anteriores para os quais, infelizmente, faltam
fontes.
32 Nota-se na composição destes três casais a complexidade das relações étnicas que tanto marcava a popu-
lação escrava mineira no período em tela. Só podemos lamentar. mais uma vez, a Irregularidade das anota-
ções sobre a etnia e cor da pele dos indivíduos arrolados nos registros.

Janeiro, 2004 85
menos que 73,6% de todos os filhos de escravas arrolados nos registros
da freguesia. Já a prole das mães cativas de dois ou mais batizados
foram responsáveis por respeitáveis 53,1% do mesmo total. 33 A ilação
lógica parece-nos ser a de que existiam propriedades nas quais o ambi-
ente era, de alguma forma, mais propício à procriação escrava- daí a
referência acima a um provável núcleo reprodutor. O problema é que os
registros, por si sós, não oferecem dados para nenhuma explicação plau-
sível sobre o surgimento deste núcleo. Diante das altíssimas taxas de
ilegitimidade, certamente o casamento formal não pode ser considerado
como um fator importante, muito embora estivesse obviamente contribu-
indo para a reprodução, como veremos adiante. Só para ficar entre as
mães campeãs, podemos contrapor o casal pertencente a Domingos
Fernandes dos Santos , a mina Luisa e o cabo verde Francisco Fernan-
des, que entre 1765 e 1785 teve oito filhos legítimos , ou Maria e Valéria
da Silva, escravos de Francisco da Silva Neto, que produziram nove fi-
lhos de 1736 a 1756, à crioula solteira Maria, integrante da posse de
José Velloso Carmo, que, de 1789 a 1807, deu luz a dez escravinhos, ou
à também crioula solteira Micaela, propriedade de Domingos Barros da
Costa, que teve oito filhos naturais entre 1765 e 1780. Os dados tampou-
co sugerem qualquer clara tendência cronológica a favor da reprodução
da população escrava, ou seja, pelo menos a partir da segunda metade
da década de 1730 a proporção de posses denominadas propícias não
aumenta com o passar dos anos. Neste caso , ao aceitar a tese de Ber-
gad (1994 e 1999) de que a população escrava da região de Vila Rica e
Mariana já estaria se reproduzindo naturalmente por volta de 1780 ou
1790, seria mister atribuir tal fenômeno em grande parte à queda vertigi-
nosa nas importações de novas peças africanas que teria se dado mais
ou menos concomitantemente. Em outras palavras, e sem nos preocu-
parmos em confrontar os registros com outras fontes, a hipótese que se
apresenta é a de que a remoção dos efeitos negativos associados ao
tráfico negreiro internacional, em particular do marcante desequilíbrio
entre os sexos constantemente realimentado por sucessivas importações,
pesaria mais na consolidação da reprodução natural do que a pré-exis-
tência de núcleos propensos à reprodução.
Pode-se examinar esta questão sobre o prisma da condição social
das mães e de seus respectivos estados civis . A Tabela 134 mostra o
número de mães e filhos para cada categoria de condição social e cal-

33 Segundo os nossos dados. o total de filhos de escravos foi de 3898; desses, 2870 nasceram em posses de
dois ou mais batismos e 2069 se referem a batismos de dois ou mais irmãos.
34 O total de casos que aparece na Tabela 1 é reduzido primeiro em função da exclusão de casos em que não
foi possível determinar a condição social da mãe e/ou seu estado civil e segundo por causa da impossibilida-
de de distinguir entre mulheres solteiras homônimos das três categorias de condição social (mas principal-
mente entre as escravas e forras).

86 VARIA HISTORIA, nº 31
cuia o número médio de filhos para cada uma. Como seria de esperar, as
solteiras ficaram para trás em todas as três categorias e as escravas
tiveram um número médio de filhos mais baixo tanto entre as solteiras,
quanto entre as casadas. O que mais se destaca dos dados expostos,
no entanto, são as médias de filhos por cada mãe das forras, pois as
solteiras libertas tinham, em média, mais filhos até que as livres casadas .
Com efeito, os dados indicam que a condição social , especificamente a
de alforriada, parecia pesar mais no nível de fecundidade das mulheres
da paróquia de Nossa Senhora do Pilar de Ouro Preto do Setecentos e
início do século XIX que o fato delas serem ou não casadas. 35 Esta ten-
dência se altera um pouco quando examinamos o mesmo conjunto de
dados reunidos na Tabela 2, que se refere apenas às mães de dois ou
mais filhos. Enquanto as solteiras das três categorias continuaram com
as médias mais baixas, as mulheres livres ficaram com a média total
mais alta, apesar das forras casadas e de estado civil misto36 terem mé-
dias bem acima das de suas congêneres livres. Trata-se de um fenôme-
no estatisticamente interessante, pois foi provocado pelo grande peso
das solteiras entre as mães libertas e pelo peso predominante das livres
casadas (cuja média, afinal , ficou bem inferior à das libertas casadas e
mesmo à das forras "mistas"). Ademais, com uma média de 3,20 filhos
por mãe, parece-nos evidente que uma boa parcela das forras solteiras
diante das regras tridentinas na verdade tinham parceiros regulares . Mais
uma vez , urge o cruzamento com outras fontes para se chegar mais per-
to de uma realidade que às vezes se mostra quimérica.

Tabela 1 - Batismos segundo condição social e o estado civil das


mães, 1712-1810

Estado Mães Escravas Mães Livres Mães Forras


Civil Mães Filhos Filhos/Mães Mães Filhos Filhos/Mães Mães Filhos Filhos/Mães
Solteiras 2253 3296 1,46 147 233 1,56 464 994 2,14
Casadas 368 577 1,57 1439 2778 1,93 212 605 2,85
Total 2621 3973 1,48 1586 3011 1,90 676 1599 2,36

35 Deve-se lembrar que não se trata de dados resultantes de reconstituição de famílias, conforme a metodologia
desenvolvida por Louis Henry e amplamente adotada como meio para determinação direta de fecundidade
entre populações do passado: HENRY 1977, NADALIN 1994. Nesse sentido, nossos dados podem estar
influenciados pela mobilidade da população, que implicaria em perda de informações sobre nascimentos
porventura ocorridos fora da paróquia estudada. No caso das escravas, a observação também pode ser
afetada pela mobilidade entre plantéis, já que o nome dos senhores foi utilizado como meio para encontrar
batismos múltiplos de uma mesma cativa. Deve-se ponderar, contudo, que não há razões para acreditar em
uma maior mobilidade de livres frente às forras, o que garante a validade do argumento aqui exposto.
36 Misto aqui se refere ao fato da mãe ter tido pelo menos um filho fora do casamento formal. Obviamente que
esta categoria somente apareceu na medida em que se deteve no conjunto de mães de dois ou mais filhos.

Janeiro, 2004 87
Tabela 2 - Batismos em que a mãe teve dois ou mais filhos,
segundo a condição social e o estado civil das mães, 1712-1810

Estado Mães Escravas Mães Livres Mães Forras


Civil Mães Filhos Filhos/Mães Mães Filhos Filhos/Mães Mães Filhos Filhos/Mães
Solteiras 578 1636 2,85 29 81 2,79 245 784 3,20
Casadas 68 218 3,21 341 1319 3,87 99 444 4,48
Mistas 26 86 3,27 8 32 4,00 15 63 4,20
Total 672 1939 3,90 378 1432 3,79 359 1291 3,60

Uma análise dos intervalos entre batismos pode nos ajudar a enten-
der possíveis diferenças de fecundidade de mulheres de condições so-
ciais e estados civis distintos, bem como apontar para determinadas prá-
ticas cotidianas ligadas ao cuidado das crianças durante a infância.
Considera-se aqui o intervalo entre batismos como equivalente ao inter-
valo entre nascimentos , embora, como já observado, aquele fosse um
pouco mais extenso que este . A Tabela 3 expõe os intervalos médios em
número de meses entre batismos de acordo com a condição social e o
estado civil das mães. O que salta aos olhos de imediato é o prolongado
intervalo de três anos e meio ou mais que separava os batismos de filhos
de mulheres solteiras escravas, livres e forras. É difícil não concluir aqui
que a maioria destas solteiras não teve parceiros regulares , nem rela-
ções estáveis. Com relação às solteiras forras, tal evidência parece con-
tradizer nossa interpretação dos dados referentes ao número médio de
filhos . No caso , pode-se arriscar a hipótese de que as forras teriam inici-
ado suas vidas sexuais mais cedo que as mulheres livres e escravas e
daí teriam aproveitado mais plenamente o período de fecundidade de-
las. Seja como for, o outro dado que mais se destaca na Tabela 3 é o
intervalo médio relativamente mais baixo calculado para as mulheres li-
vres casadas . Como se sabe, a lactação tem um certo efeito contracep-
tivo, 37 de modo que variações no período de amamentação podem ex-
plicar, em parte, diferenças nas taxas de fecundidade entre distintos gru-
pos de mulheres. A bem da verdade, principalmente no que diz respeito
às mulheres casadas das três condições sociais, as diferenças não se
mostram particularmente significativas , sugerindo que as experiências
de vida de cada segmento não deveriam ser essencialmente diferentes
em termos de regime alimentício ou de hábitos de higiene. Mesmo as-
sim , pode-se aventar o argumento de que o emprego de amas-de-leite

37 Para um excelente resumo da literatura sobre este assunto ver: KLEIN & ENGERMAN 1978.

88 VARIA HISTORIA, nº 31
(quase que exclusivamente escravas) poderia ter "libertado" a mulher
livre e casada para engravidar por intervalos menores entre os partos.
Como muito bem lembra Furtado (2003), o corolário deste emprego de
amas-de-leite pela elite poderia ser uma redução no tempo de amamen-
tação necessário das próprias crianças delas e, portanto, um aumento
nas já altíssimas taxas de mortalidade infantil na população escrava. Do
mesmo modo, pode-se pensar em um aumento do período de lactação
das escravas, com a conseqüente diminuição das suas possibilidades
de engravidar.

Tabela - 3 Intervalo médio entre batismos, segundo a condição


social e estado civil das mães, 1712-1810

Estado Civil Mães Escravas Mães Livres Mães Forras


Solteiras 42,32 48,27 41 ,04
Casadas 38.48 32,89 35,30
Mistas 45,17 32,38 41,31
Total 41 ,99 33,64 38,93
2 672 378 359
Casos (N )

É em uma perspectiva comparativa que os achados sobre intervalos


entre batismos na freguesia de Nossa Senhora do Pilar de Ouro Preto se
tornam mais interessantes. É consensual na Demografia Histórica que
nas sociedades pré-industriais intervalos entre nascimentos de menos
de 24 meses eram extremamente raros (Wrigley 1978, 136), de modo
que nossos achados parecem perfeitamente factíveis . No caso específi-
co das populações escravas do Novo Mundo, os estudos têm enfocado
o Caribe e o sul das colônias britânicas no continente norte-americano
(de 1776 em diante, a parte meridional dos Estados Unidos), e, até aon-
de sabemos, esta questão nunca foi objeto de investigação no Brasil. De
qualquer forma, a população escrava do chamado Velho Sul se destaca-
va por ser caracterizada por taxas de fecundidade marcantemente mais
altas que as taxas encontradas para as populações mancípias caribe-
nhas. Com efeito:

Os estudos dos acervos de plantations 'realizados até agora su-


gerem que, nos Estados Unidos, o intervalo entre filhos sobrevi-
ventes era algo em torno de 2,9 anos, enquanto o intervalo nas
Índias Ocidentais Britânicas variava entre três e quatro anos. Estas

Janeiro, 2004 89
diferenças entre os intervalos poderia explicar parte da diferença
nas taxas de fecundidade verificadas para as duas regiões. (Klein
& Engerman 1978, 368)

Todos os quatro intervalos calculados para as mulheres escravas de


Vila Rica do século XVIII e a primeira década do XIX ficam acima de três
anos - com um certo destaque para o intervalo das escravas casadas,
razoavelmente mais baixo que os demais. A óbvia ilação é que, pelo
menos no quesito intervalo entre nascimentos/batismos, o comportamento
demográfico da população escrava de Minas colonial se assemelhava
mais ao do contingente mancípe do Caribe britânico que ao dos escra-
vos sulistas. Dado que estes se distinguiram das demais populações
cativas das Américas por se reproduzirem naturalmente desde a terceira
década do século XVIII (Menard 1975), os intervalos achados nesta aná-
lise não parecem apoiar a já mencionada hipótese de Bergad acerca da
reprodução natural nas Minas Gerais. Fica como uma curiosidade que
os intervalos calculados para as mães livres de Vila Rica se aproximam
aos das escravas sulistas. Parece-nos bastante claro que, para os estu-
dos da sociedade escravista brasileira, este é um campo que merece
muito mais investigação e temos esperanças de que alguns colegas se
juntarão a nós na tarefa de aprofundar nossa compreensão de uma com-
plexa realidade histórica.
Para um pequeno grupo de mulheres, os registros de batismos per-
mitem determinar a idade quando do nascimento do primeiro filho . O
grupo é composto por 54 escravas cujos próprios batismos foram regis-
trados e que ainda pertenciam aos mesmos proprietários quando batiza-
ram os primeiros filhos . Desnecessário dizer que se trata de uma amos-
tra muito pequena e, portanto, de pouco valor explicativo no que diz
respeito ao conjunto populacional enfocado. Não obstante, pode-se su-
por que o comportamento destas mulheres seja ao menos indicativo dos
hábitos da população escrava nascida no Brasil ou , para usar a termino-
logia da época, dos crioulos , já que não seria de se esperar mudanças
muito profundas na idade média ao primeiro filho em uma população
anterior à transição demográfica. A idade média do grupo quando do
batismo do primeiro filho era de exatos 19,0 anos, sendo que as idades
variavam entre 14 e 31 anos.38 Trata-se de uma média muito baixa em
termos comparativos. Por exemplo, a idade média quando do início da
parturição para as escravas das colônias britânicas do sul norte-ameri-

38 Na verdade. classificamos o grupo de acordo com a legitimidade das jovens mães e de seus filhos. No caso,
a idade média quando do batismo do primeiro filho das jovens nascidas naturais ficou em 18, 7; a das 40 que
também tiveram filhos naturais. 18,9, e a das que deram luz a filhos legítimos, 17,0. Já as jovens reg1stradas
como legítimas tiveram seus primeiros filhos em média aos 21,1 anos; a média das que também tiveram filhos
legítimos foi de 21.3 e a das que não estavam casadas na época do batismo do primeiro filho. 21.0.

90 VARIA HISTORIA, nº 31
cano era de 20 a 21 anos, enquanto a mesma média no Caribe britânico
ficava entre 22 e 23 anos (Klein & Engerman 1978, 367). Gutman (1976 ,
50, 75, 114, 124, 607) encontrou uma idade média quando do primeiro
nascimento de 18,4 anos para uma série de amostras de mães que figu-
ram em registros de nascimentos de escravos provenientes de plantati-
ons em várias localidades do Velho Sul entre 171 O e 1863. Ao estudar a
mesma Vila Rica e utilizando listas nominativas de 1804 e 1838, Ramos
calculou as seguintes idades de mulheres quando do nascimento do
primeiro filho: mulheres brancas 22,5 anos, mulheres pardas 22,4 anos e
mulheres negras 22,8 anos (Ramos 1978, 370). A nosso ver, as diferen-
ças reveladas não são nada insignificantes . Poder-se-ia argumentar que
estas diferenças se devem ao fato de que nós estamos verificando a
idade das mulheres quando do primeiro batismo enquanto os outros es-
tudiosos utilizam cálculos baseados principalmente na idade do filho
sobrevivente mais velho arrolando como ainda residindo junto com a mãe
nas respectivas listas nominativas. No entanto, seria igualmente plausí-
vel argumentar que as mulheres crioulas tendiam a iniciar suas ativida-
des sexuais com uma certa precocidade- ainda mais em se tratando
de jovens crioulas que faziam parte de posses médias e grandes reple-
tas de potenciais parceiros. Se se aceita o segundo argumento, é preci-
so reconhecer que seria bastante compatível com a hipótese de Bergad,
o que demonstra nitidamente a natureza ambígua da fonte em si e das
várias maneiras de interpretá-la.
A tentativa de cruzar os dados dos registros de batismos com os de
Um recenseamento na Capitania de Minas Gerais, de 1804 (Mathias,
1969), provou-se, ao mesmo tempo, frustrante e bastante reveladora. A
frustração se deu em função das dificuldades em identificar, no Recen-
seamento, indivíduos constantes dos registros. Os esforços ficaram limi-
tados à tentativa de encontrar proprietários de escravos batizados nos
registros arrolados como chefes de fogos no Recenseamento. No caso,
conseguimos identificar apenas 54 proprietários/chefes de fogo 39 - uma
amostra muito pequena diante do tamanho dos registros e da população
arrolada no Recenseamento e que, por isso mesmo, não merece um tra-
tamento estatístico. Melhor, então, é relatar o resultado de algumas das
reconstituições as quais acabam por salientar a fragilidade da vida no
período em tela e, sobremaneira, a tragédia das altíssimas taxas de mor-
talidade infantil. No fogo de Francisca da Rocha Campos, que vivia "de
sua costura" , encontramos a escrava Serafina que, em 1795, havia bati-
zado a filha Rita, que não consta do arrolamento. Bernarda também era
escrava de Francisca da Rocha Campos , e encontramos seus filhos An-

39 MATHIAS 1969. 45,61-62,64,66-68,70,75,77-82,85,91,93,95-96,98-100, 103-111, 154-155,158, 162,


164-165,168,173,175,178- 179, 191 .

Janeiro, 2004 91
tônio, batizado em 1794, e Ana, batizada em novembro de 1803, mas a
filha Maria, de 1800, aparentemente havia falecido.
Em 1804, na casa da doceira Genoveva Machado morava a escrava
mina Joana e sua filha de dez meses, Eva, mas Maria, nascida em 1801,
não aparece. Bebiana dos Passos de Jesus também vivia de costura e
era proprietária da parda Luiza que morava com seus filhos Pedro e Fe-
lix, de 13 e de oito anos, respectivamente; os irmãos Francisco, de 1793,
Sebastião, de 1794, e Joana, de 1802, não constam como residentes do
fogo. A crioula Tereza e seu filho pardo, Maximiniano, de seis anos de
idade, pertenciam ao Padre Joaquim Pereira de Magalhães. Não cons-
tam do arrolamento três filhas de Tereza: Brígida, Mariana e Clara, bati-
zadas em 1792, 1794 e 1804 respectivamente . Nenhum dos quatro filhos
registrados como batizados da crioula cozinheira Francisca, escrava do
Quartel Mestre e serralheiro Euzébio da Costa Ataíde , constam do Re-
censeamento. A crioula Escolástica e seu marido José angola eram es-
cravos do Alferes Custódio Francisco Pequeno. O casal tivera filhos em
1784, 1787, 1788, 1792 e 1793, mas nenhum deles foi arrolado em 1804.
Como já vimos , entre 1762 e 1809, José Velloso Carmo figurou como
proprietário em nada menos que 125 batismos. No Recenseamento a
posse de Velloso Carmo era composta por 74 escravos e 49 escravas.
Conseguimos identificar no Recenseamento 16 mães que aparecem nos
registros e alguns filhos de outras sete mães aparentemente já falecidas
em 1804. Para estes 23 conjuntos familiares encontraram-se arrolados
no Recenseamento 35 filhos com registro batismal ; outros 23 não apare-
ceram, presumivelmente porque haviam falecido. 40
Reconhecemos que nossos esforços de cruzamento de dados aqui
foram toscos. No futuro gostaríamos de, entre outras coisas, tentar esti-
mar as taxas de mortalidade infantil na freguesia de Nossa Senhora do
Pilar de Ouro Preto no final do século XVIII e início do XIX. A idéia seria de
procurar localizar no Recenseamento todos os batizados registrados
desde 1794 até o mês de agosto de 1804 quando se realizou o arrola-
mento. Antes disto, no entanto, seria necessário submeter os documen-
tos originais do Recenseamento a nova transcrição paleográfica e a co-
dificação para entrada em banco de dados informatizado. A versão im-
pressa claramente apresenta uma série de erros que dificultam sua inter-
pretação, além de estar em um formato que impossibilita o seu uso de
maneira ágil e segura.

40 Estamos tratando de escravos que, enquanto mercadorias, eram sujeitos à venda para terceiros. Embora o
funcionamento do mercado interno de escravos ainda seja muito pouco estudado para nosso período, a
impressão que se tem é que a participação de crianças teria sido pequena. Dai nossa suposição de que o
não arrolamento de batizados quase certamente ind1cava um falecimento.

92 VARIA HISTORIA, nº 31
Considerações finais
Na verdade, nem de longe se esgotou aqui a potencialidade dos
registros de batismo de Nossa Senhora do Pilar. Esperamos que este
trabalho preliminar com o banco de dados possa indicar outros cami-
nhos analíticos e novas maneiras de se pensar a realidade de Minas
colonial. Já passou a hora da historiografia especializada debruçar-se
de maneira mais sistemática sobre questões tais como as taxas de ferti-
lidade dos vários segmentos da sociedade escravista, os mecanismos
de crescimento da população como um todo, o impacto do tráfico ne-
greiro internacional, a expectativa de vida de escravos, livres e forros,
bem como de grupos étnicos e miscigenados e as várias estruturas fa-
miliares, entre tantas outras.
As potencialidades de uso desse material se ampliam enormemente
quando se puder cruzar os registros de batismos com os de óbitos e os
de casamentos. Para a população livre, há a possibilidade de se traba-
lhar com o método de reconstituição de famílias, ainda pouco utilizado
no Brasil. 41 Em relação aos escravos, o cruzamento de diversos registros
poderiam aclarar algumas das questões aqui levantadas. Além disso, há
a possibilidade de incorporar as informações contidas em inventários e
testamentos, aumentando a riqueza e o alcance das conclusões sobre a
demografia cativa no século XVIII mineiro. Tanto para os livres quanto
para os escravos, o uso agregado das listas nominativas de habitantes
que sobreviveram para Ouro Preto podem gerar novas e ricas possibili-
dades de trabalho .

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