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O Apolineo e o Dionisiaco Paradoxos Comp
O Apolineo e o Dionisiaco Paradoxos Comp
O Apolineo e o Dionisiaco Paradoxos Comp
Por
Jouberto Heringer
Aluno do Curso de Mestrado em Ciências da Literatura
(Programa de Poética)
Índice
INTRODUÇÃO 3
1. O APOLÍNEO E O DIONISÍANO 5
BIBLIOGRAFIA: 18
O APOLÍNEO E O DIONISÍACO 3
Introdução
“Os verdadeiros sábios
não têm outra missão
que aquela de nos fazer rir
por meio de seus pensamentos
e de nos fazer pensar
por meio de seus xistes”
Octávio Paz
in “Variações Sobe a Vida e a Morte”1
entre estas duas ‘forças’ inerentes e necessárias em cada ser humano. O ponto de partida
para esta obra de Nietzsche para muitos estudiosos de foi o descobrimento do livro de
1865. Para estes, a influência desse livro na vida do jovem Nietzsche é inegável. “O
dessa filosofia? Será que há algo em Nietzsche que não foi ainda revelado? Será que
uma nova metafísica da arte? Essas e outras questões serão levantas, pensadas e
“- Ousarei
Perturbar o universo?
Em um minuto apenas há tempo
Para decisões e revisões
que um minuto revoga.”
T.S.Eliot, in
“The Love Song of J.Alfred Prufrock”
1
ALVES, Rubem Azevedo, “Variações Sobre a Vida e a Mort”, São Paulo: Edições Paulinas, 1964.p.
149.
O APOLÍNEO E O DIONISÍACO 5
1. O Apolíneo e o Dionisíano
Não quero incluir o tempo no meu esquema.
Não quero pensar nas cousas como presentes; quero pensar nelas como cousas.
Não quero separá-las de si próprias, tratando-as por presentes.
Eu nem por reais as devia tratar.
Eu não as devia tratar por nada.
Eu devia vê-las, apenas vê-las;
Vê-las até não poder pensar nelas,
Vê-las sem tempo, nem espaço.
Ver podendo dispensar tudo menos o que se vê.
É esta a ciência de ver, que não é nenhuma.
(Pessoa 5, p. 244-5).
pois “A tragédia grega” depois de ter atingido sua perfeição pela reconciliação da
tragédia” onde estabelece a dualidade dos dois princípios, visando uma síntese. Essa
obra vai representar a união desses dois elementos, onde Nietzsche vai encontrar a
unidade. Apolo não é o contrário de Dionísio, mas sim uma unidade, onde um é uma
parte distinta do outro. Ele concebe de maneira bem diversa a natureza e o destino
“Deus brilhante da claridade do dia, revelava-se no Sol. Zeus, seu pai, era o Céu de
onde nos vem a luz, e sua mãe, Latona, personificava a Noite de onde nasce a Aurora,
O APOLÍNEO E O DIONISÍACO 6
anunciadora do soberano senhor das horas douradas do dia.(...) Apolo, soberano da luz,
era o Deus cujo raio fazia aparecer e desaparecer as flores, queimava ou aquecia a
Poesia e da Inspiração.”2
tensão entre contrários, como a do arco e lira”, Apolo foi o grande harmonizador dos
contrários, por ele assumidos e integrados num aspecto novo. A serenidade apolínea
espírito.
deus da mania e da orgia configura a ruptura das inibições, das repressões e dos
recalques. Dionísio simboliza as forças obscuras que emergem do inconsciente, pois que
se trata de uma divindade que preside à liberação provocada pela embriaguez, por todas
as formas de embriaguez, a que se apossa dos que bebem, a que se apodera das
loucura com que o deus pune aqueles que lhe desprezam o culto. Desse modo, Dionísio
2
MEUNIER, Mário. “Nova Mitologia Clássica” Ed. Ibrasa, 1976. p.31 e 38
3
BRANDÃO, Junito de Souza. “Mitologia Grega”. Vol. III Ed. Vozes, Petrópolis, 1989. p. 140
O APOLÍNEO E O DIONISÍACO 7
devenir, no fluxo das coisas, a verdadeira dimensão dos fatos; a vida é um jogo
constante atirada ao destino de suas forças. O pathos trágico se nutre do saber que tudo
é uno. A vida e a morte são irmãs gêmeas arrastadas num ciclo misterioso. O caminho
trágico conhece Apolo e Dionísio como idênticos. Nietzsche descobre na tragédia grega
realidade está num recriar, numa renovação constante; os valores estão em jogo
introduzir nos atos humanos mais acréscimos de força, mais movimentação, mais
como princípios de natureza estética e inconscientes, porém, sem deixar de ter como
A relação entre Apolo e Dionísio será de criação, pois a incessante luta entre eles
A arte vai ser a maneira pela qual o homem poderá ultrapassar o devir do
suma, o apolíneo e o dionisíaco são apresentados como saídas estéticas. Nietzsche pensa
a vida como devir e este como beleza, assim pode através do dualismo
se separe do sofrimento. Como foi dito antes, Apolo é o deus do Sol, liga-se a arte
plástica devido a sua afinidade com a visão, tornando-se o deus da imagem, obtendo
uma arte figurada. Ele reina nas belas aparências do mundo da fantasia, pois todo
homem produz imagens através do sonho e da realidade. E assim como o sonho tem um
superior.
apaixonado pela idéia grega de eternidade onde a vida se potencializa de tal modo que
de perda de si nos remete à de terror. Essa experiência vai selar o laço que une pessoa a
este produz formas. Eles através desse movimento atuam juntos para produzir o mundo,
devir, a vida.
explosivo tentando uma síntese precária que tende a dominar as demais, incorporá-las,
crescer às expensas delas, aumentamos, assim, o setor próprio de dominação, pois tal é
tragédia” – “... A seus dois deuses da arte, Apolo e Dionísio, vincula-se a nossa
cognição de que no mundo helênico existe uma enorme contraposição, quanto a origens
novas, para perpetuar nelas a luta daquela contraposição sobre a qual a palavra comum
“arte” lançava apenas aparentemente a ponte; até que, por fim, através de um
outro, e nesse emparelhamento tanto a obra de arte dionisíaca quanto a apolínea geraram
a tragédia ática...”.4
4
NIETZSCHE, Friedrich “O Nascimento da Tragédia”. Companhia das Letras, São Paulo,1996. p.27
O APOLÍNEO E O DIONISÍACO 11
o princípio de luz que faz surgir o mundo a partir do caos originário; é o princípio
ordenador que, tendo domado as forças cegas da natureza, submete-as a uma regra. Dá
forma às coisas, delimitando-as com contornos precisos, fixando seu caráter distintivo e
imprimindo a cada um a cadência – a forma do tempo –. Apolo impõe ao devir uma lei,
uma medida.
a força tensão proposta por Nietzsche. Dioniso, o nome grego para o êxtase, é o deus do
e da noite criadora do som: é o deus da música, arte universal, mãe de todas as artes.
Seu espaço está sob o mundo das aparências, das formas, da beleza, da justa medida.
Nascido da fome e da dor, perseguido e dilacerado pelos deuses hostis, Dioniso renasce
homem, em êxtase, sente que todas as barreiras entre ele e os outros homens estão
rompidas, que todas as formas voltam a ser reabsorvidas pela unidade mais originária e
O APOLÍNEO E O DIONISÍACO 12
fundamental – o Uno primordial (das Ur-Eine) – onde só existe lugar para a intensidade.
Nesse mundo das emoções inconscientes, que abole a subjetividade, o homem perde a
e da morte.
Não é necessária uma atenção redobrada para se ver que a distinção do apolíneo
razão suficiente; Dioniso, identificado como deus da fúria sexual e do fluxo de vida,
como figura que reúne em sua natureza dor e prazer, manifesta o Uno Primordial, a
pode ser pensado como repousando em si mesmo, impassível ou pacífico, mas que traz
5
Op. Cit 96. p.4
O APOLÍNEO E O DIONISÍACO 13
incessante dor, esse ser não pode permanecer por muito tempo indeterminado. Uma
fenomênica.
marcas da dor, do despedaçamento do uno primordial e, para se libertar dessa dor, faz
por meio do sonho para criar a bela aparência. Esse não é o único, nem o mais
fundamental estado fisiológico pelo qual a natureza realiza seus impulsos artísticos. O
dos impulsos primaveris, a natureza se manifesta em sua força mais poderosa: ela reúne
novamente os indivíduos e faz com que se sintam como uma só unidade, de tal modo
vontade. Quanto mais debilitada estiver a vontade, mais o todo se fragmentará em partes
O APOLÍNEO E O DIONISÍACO 14
isoladas; quanto mais o indivíduo for egoísta e arbitrário, mais fraco será seu
"soluço da criatura" pelas coisas perdidas; no prazer supremo, ressoa o grito de espanto,
mesmo tempo, suas saturnais e suas exéquias. (...) As dores despertam prazer, o júbilo
arranca do peito gritos cheios de dor. O deus, o liberador, desatou, em torno dele, todas
individuationis pela intensificação das emoções dionisíacas, tudo volta a seu ponto de
prazer supremo, um êxtase delicioso que ascende desde o íntimo de seu ser e mesmo da
danças, esse ser entusiasmado, possuído por Dioniso, manifesta seu júbilo. Dá voz e
movimento à natureza. Voz e movimento que não se acrescentam a ela como algo de
constatar, por exemplo, que as artes apolíneas "tornam a vida digna e possível de ser
6
Op. Cit 96. p.1
O APOLÍNEO E O DIONISÍACO 15
Essas pontuações no texto de Nietzsche nos sugerem que ele encontra nos
gregos duas vias artísticas: uma, através da arte apolínea; outra, através da arte
dionisíaca.
"o radiante sonho de nascimento dos olímpicos". Em suas histórias dos deuses,
glorificaram a vida humana. É desse modo que os gregos homéricos seduziram a
si mesmos para continuarem existindo. A existência sob o sol brilhante dos
deuses é olhada como desejável em si mesma”.9
fundir-se em suas figuras. Deslumbrados com a contemplação das formas e figuras, eles
Os gregos sabem, porém, que o apolíneo não oferece a total verdade sobre o
mundo e que a sua solução contra o pessimismo é superficial. Se a solução que oferece
a arte apolínea é superficial, o que se pode dizer da solução dada pela arte dionisíaca?
Para Nietzsche, a tragédia grega tem uma perspectiva melhor. Ela pertence ao mais alto
estágio da cultura grega e "oferece uma visão mais profunda do mundo que a arte
7
Op. Cit 96. § 17
8
Op. Cit 96. § 16
O APOLÍNEO E O DIONISÍACO 16
apolínea"10. Enquanto a arte apolínea tenta nos convencer da alegria da existência pela
glorificação da realidade fenomenal, a arte dionisíaca nos ensina que não devemos
buscar a alegria nos fenômenos, mas atrás deles.11 Mas como isso se dá? Essa é a
questão a que Nietzsche pretende responder com o efeito trágico. Na arte dionisíaca, na
embora forçados a testemunhar a catástrofe trágica, não ficam cheios de terror, mas, ao
da mudança das figuras. Por um breve momento, a vida, no fundo das coisas, a despeito
nitidez corporal com o coro de sátiros, coro de seres naturais que vivem
gerações e da história dos povos, permanecem os mesmos. Com esse coro, consola-se o
heleno profundo, o único igualmente apto para as dores mais suaves e mais cruéis, que
viu o horror da natureza e corre perigo de aspirar a uma negação budista da existência,
que penetrou com olhar afiado até o fundo da terrível tendência ao aniquilamento, o
estado de náusea, "estado negador da vontade", em afirmação, de modo que esse horror
possa ser experimentado não como um horror, mas como algo sublime, e esse absurdo
9
Op. Cit 96. § 13
10
Op. Cit 96. § 10
11
Op. Cit 96. § 17
O APOLÍNEO E O DIONISÍACO 17
Essa função terapêutica da tragédia, que Nietzsche define como o poder que
"excita, purifica e descarrega" a vida inteira de um povo, não é vista da mesma forma
por Aristóteles, que, na Poética, atribui à ação trágica um poder catártico e paradoxal,
cômico, é gerado um mais poderoso, que está associado à experiência estética dionisíaca
– o sentimento da alegria.
O APOLÍNEO E O DIONISÍACO 18
Bibliografia:
PESSOA, F. Obra Poética. Rio de Janeiro, Companhia José Aguilar Editora, 1974.
SCHOPENHAUER, A. Le Monde comme volonté et comme répresentation. Trad. de
A. Burdeau. Paris, PUF, 1966.