Science">
Psicodiagnóstico
Psicodiagnóstico
Psicodiagnóstico
Embora a psicometria (difundida pelas escalas de Binet) tenha sido fundamental para a
garantia de cientificidade dos instrumentos do psicólogo, é importante estabelecer a
diferença entre o psicometrista e o psicólogo clínico: o primeiro tende a valorizar os aspectos
técnicos da testagem, visando obter dados, enquanto no psicodiagnóstico há a utilização de
testes e outras estratégias, para avaliar o sujeito de forma sistemática e cientifica, visando a
resolução de problemas.
Kraepelin, no século XIX, se notabilizou por seu sistema de classificação dos transtornos
mentais, especialmente seus estudos diferenciais entre esquizofrenia e psicose maníaco-
depressiva. Assim também Freud, que contribuiu decisivamente para caracterizar a diferença
entre estados neuróticos e psicóticos, dentre os transtornos classificados como funcionais
(não-orgânicos). Logo em seguida, o teste de associação de palavras, de Jung, completou o
lastro para o lançamento posterior das técnicas projetivas. O psicodiagnóstico surgiu, assim,
como conseqüência do advento da psicanálise, que ofereceu novo enfoque para o
entendimento e classificação dos transtornos mentais.
f) Entendimento dinâmico – há uma integração dos dados anteriores com base teórica,
permitindo a explicação de aspectos comportamentais nem sempre acessíveis na
entrevista, assim como a antecipação de fontes de dificuldades na terapia e a
definição de focos terapêuticos (entendimento da problemática do sujeito numa
dimensão mais profunda, na perspectiva histórica do desenvolvimento).
O problema
Quando as mudanças percebidas são de natureza qualitativa, chamam a atenção por seu
cunho estranho, bizarro, idiossincrásico, inadequado ou esquisito e geralmente são
associadas com dificuldades mais sérias. No entanto, um comportamento ou experiência
subjetiva definidos como sintomáticos em um contexto podem ser aceitáveis em outro,
devendo-se observar que um sintoma único não tem valor diagnóstico em si, sendo
necessário que o paciente apresente um certo número de características sintomatológicas,
durante um certo período de tempo, para se chegar a uma decisão diagnóstica.
Transtorno mental pode ser conceituado como uma síndrome ou padrão comportamental
ou psicológico clinicamente importante, que ocorre no indivíduo, associado com sofrimento
ou incapacitação.
b) aspecto autocrático – na medida em que diz ao paciente o que deve fazer, de que
forma e quando;
b) perda de controle sobre a situação – por se sentir à mercê do psicólogo, o paciente passa
a adotar uma postura defensiva;
A entrevista clínica
O entrevistador deve estar atento aos processos no outro, e a sua intervenção deve orientar
o sujeito a aprofundar o contato com sua própria experiência. Todos os tipos de entrevista
têm alguma forma de estruturação, na medida em que a atividade do entrevistador
direciona a entrevista no sentido de alcançar os seus objetivos, sendo dele a
responsabilidade pela condução do processo.
Os tipos de entrevista podem ser classificados (no geral) a partir de dois eixos: quanto a
forma (estrutura) e segundo o objetivo. Quanto ao aspecto formal, as entrevistas podem ser
divididas em estruturadas, semi-estruturadas e de livre estruturação. As primeiras
privilegiam a objetividade e geralmente se destinam ao levantamento de informações
específicas, definidas pelas necessidades de um projeto (ex. entrevista epidemiológica).
Quanto aos objetivos, deve-se considerar primeiramente que a finalidade maior de uma
entrevista é sempre a de descrever e avaliar para oferecer alguma forma de retorno,
requerendo sempre uma etapa de apresentação da demanda, de reconhecimento da
natureza do problema e da formulação de alternativas de solução e encaminhamento. Além
desses objetivos-fins, existem objetivos instrumentais, que são muitos e variados (p. ex.,
quando se pretende avaliar um quadro psicopatológico, é necessário um exame detalhado
dos sintomas; na entrevista psicodinâmica, é importante a investigação do desenvolvimento
psicossexual etc). Por isso, estratégias diferentes de avaliação podem ser utilizadas para
atingir os objetivos de cada situação, ou combinadas, para atingir objetivos diversos, além
de considerar as variações de abordagem, de problemas apresentados e da clientela
atendida.
Alguns tipos de entrevistas quanto à sua finalidade, no entanto, devem ser ressaltados: de
triagem, de anamnese, diagnósticas (sindrômicas ou dinâmicas), sistêmicas e de devolução.
História clínica
Pressupõe uma reconstituição global da vida do paciente, devendo ser enfocada conforme
os objetivos do exame e dependendo do tipo e da idade do paciente. De acordo com a
problemática e a estrutura de personalidade do paciente, certas áreas e conflitos deverão
ser mais explorados do que outros, com atenção em certos pontos que possam indicar
explicações para a emergência e o desenvolvimento do transtorno atual. Alguns tópicos
podem servir de referência: contexto familiar, primeira infância (até 3 anos), infância
intermediária (3 a 11 anos), pré-puberdade, puberdade e adolescência, idade adulta e fontes
subsidiárias (familiar ou familiares, exames anteriores etc).
Avaliação dinâmica
Geralmente integrada com a história, busca-se relação entre os problemas específicos atuais
e as experiências passadas da pessoa, colocando a problemática numa perspectiva histórica
que permita compreender o transtorno dentro de um processo vital, em um contexto
temporal, afetivo e social, com base num quadro referencial teórico. Partindo-se de queixas,
são identificados conflitos e causas, interrelacionados conteúdos, reunidos e integrados
informações que embasam o entendimento dinâmico no fluxo da história do paciente.
Atenção – é um processo psíquico que permite concentrar a atividade mental sobre um fato
determinado, sendo importante considerar a capacidade de concentração; quanto tempo é
mantida a atenção (persistência/fatigabilidade); em quantos objetos é capaz de estar focada
simultaneamente (distribuição; quanto tempo demora para começar a efetiva atenção
(excitabilidade). São considerados transtornos de atenção a aprosexia (ausência de atenção),
hipoprosexia (atenção diminuída), hiperprosexia (atenção exagerada) e distraibilidade
(atenção inconstante). A distração, entendida como a impossibilidade de manter constante
atenção e também quando o indivíduo estão tão concentrado que não percebe o que se
passa ao seu redor, é chamada de desatenção seletiva.
Memória – é a função que garante o elo temporal da vida psíquica. Costuma ser analisada
em três dimensões: a fixação, a evocação e o reconhecimento.A fixação é a capacidade de
gravar os dados; a evocação é a capacidade de atualizar os dados já fixados (esquecimento é
1
Sensação de distanciamento e diminuição dos objetos que se movem. È um dos fenômenos de alteração
perceptiva observados na epilepsia, onde os objetos parecem retroceder no espaço, sem modificar
aparentemente o seu tamanho.
a impossibilidade de evocar); e reconhecimento é a capacidade de recordar uma imagem
(engrama).
Orientação – é uma das expressões da lucidez psíquica pela qual se identifica a capacidade
de consciência temporo-espacial. Examina-se a orientação autopsíquica, relativa à
identidade pessoal e as relações com o grupo social, e a orientação alopsíquica, referente à
consciência do lugar, do tempo e da situação. As desorientações são classificas em seis tipos:
apática (falta de interesse); amnésica (alterações da memória); confucional (turvação da
consciência); delirante (ajuizamento patológico da realidade); histriônica (desorientação
temporo-espacial limitada) e oligofrênica (dificuldade de aprender ou entender).
Consciência – capacidade de o indivíduo dar conta do que ocorre dentro e ao seu redor. O
estado de consciência é suscetível de alterar-se quanto à sua continuidade, amplitude e
claridade, nos estados de obnubilação (ou turvação); estados de coma; estados de
estreitamento da consciência (epilépticos) e estados de dissociação da consciência (casos de
histeria).
d) dislalia – quando a linguagem resulta defeituosa, sem que haja lesão central.
a) mutismo;
d) parafrasia – quando são inseridas numa frase correta uma ou mais palavras sem
correspondência com as demais.
Inteligência – diz-se que um indivíduo será tanto mais inteligente: 1) quanto melhor, mais
rápido e mais facilmente compreenda: 2) quanto maior, mais extenso e variado for o
número de enlaces e associações que estabeleça entre os dados da compreensão; 3) quanto
mais pronta e espontaneamente elabore novas e originais idéias; 4) quanto melhor saiba
ajuizar com segurança e raciocinar com lógica; 5) quanto melhor se adapte às exigências das
situações vitais. As patologias mais freqüentes são os estados deficitários, congênitos ou
adquiridos da atividade intelectual e os métodos utilizados para aferição são feitos por
testes específicos.
2
Rigidez provocada por espanto; paralisia causada por espanto. Em sentido amplo, desmaio passageiro
provocado por vivência emocional.
3
Ressecamento incômodo da boca; sede compulsiva, frequentemente de origem psicológica.
4
Abuso periódico do álcool (bebedeira trimestral).
5
Consiste em regurgitar repetidamente o alimento ingerido, voltando a mastigar para voltar a engolir.
6
Gosto perverso. Prazer de comer coisas esquisitas e estranhas (ex. giz).
associados a episódios de agitação psicomotora em pacientes oligofrênicos7, portadores de
quadros demenciais e portadores de afecções do lobo frontal e temporal.
7
Oligofrenia – deficiência congênita ou precoce de qualquer origem. Idiotia. Debilidade mental.
8
9
O prazer como causa e fim último.
abordagens, como a terapia cognitivo-comportamental, terapia sistêmica, terapia centrada
na pessoa, combinando elementos diretivos e não-diretivos.
Na EM os clientes são estimulados a articular para si mesmos suas razões para mudar, por
meio de técnicas de aconselhamento, de feedback adequado e de análise de custo-benefício,
entre outros. A balança decisional é uma estratégia fundamental, utilizada para mostrar os
dois lados do conflito. Outro princípio norteador da EM é o modelo transteórico, composto
por vários conceitos teóricos destinados a descrever os processos demudança do
comportamento humano, baseado na premissa de que a mudança comportamental é um
processo e que as pessoas têm diversos níveis de motivação, de prontidão para mudar. Este
modelo está atualmente sendo empregado nos comportamentos sadios, na área de
educação e da promoção da saúde.
ENTREVISTA LÚDICA
Freud foi o primeiro estudioso que refletiu sobre a função e o mecanismo psicológico da
atividade lúdica infantil. É na situação do brinquedo que a criança procura se relacionar com
o real, experimentando-o a seu modo, procurando construir e recriar sua realidade. Graças
ao processo de projeção dos perigos internos sobre o mundo externo, ela domina a
realidade e realiza seus desejos. O brinquedo é, então, um meio de comunicação; é a ponto
que permite ligar o mundo externo e o interno, a realidade objetiva e a fantasia. Assim,
Freud estabeleceu os marcos referenciais da técnica do jogo, demonstrando que brincar não
é só um passatempo prazeroso, mas também uma maneira de elaborar circunstâncias
traumáticas.
Para Melanie Klein, o brincar é a linguagem típica da criança, equiparada à associação livre e
aos sonhos dos adultos, portanto a neurose de transferência desenvolve-se da mesma
maneira. Anna Freud, ao contrário, afirmava que a criança não possui consciência de sua
doença, pelo que não pode estabelecer uma neurose de transferência com o terapeuta.
Embora divergentes, o trabalho de ambas muito contribuiu para o desenvolvimento da
psicoterapia infantil.
Arminda Aberastury, por sua vez, afirma que a criança não estabelece uma transferência
positiva com o psicoterapeuta, como também é capaz de estruturar, através dos brinquedos,
a representação de seus conflitos básicos, suas principais defesas e fantasias de doença e
cura. Evidenciou, assim, o valor diagnóstico da entrevista lúdica, considerando que qualquer
tipo de brinquedo oferece possibilidades projetivas.
Uma entrevista lúdica consiste em oferecer à criança oportunidade para brincar, como
deseje, com todo o material lúdico disponível na sala, esclarecendo sobre o espaço onde
poderá brincar, o tempo disponível, os papéis dela e do psicólogo, bem como sobre os
objetivos dessa atividade, que possibilitará conhecê-la mais para posteriormente ajudá-la.
7. tolerância à frustração e (8) adequação à realidade são indicadores que têm relação
com a aceitação ou não de limites, do próprio papel e do papel do outro, assim como
das possibilidades egóicas e do princípio de prazer e realidade.
2) Contrato de trabalho
Roteiro:
- Motivos de encaminhamento
- Descrição
- Plano de avaliação
- Observação
- História clínica
- Entendimento dinâmico
- Discussão sobre os achados nas técnicas e testes, em função das hipóteses e perguntas
iniciais
- Laudo psicológico
Todo psicólogo solicitado a intervir num dado problema, deverá, em primeiro lugar, situar o
ponto do ciclo vital em que o solicitante se encontra. Esse ciclo é constituídos pelos
momentos mais significativos da vida pessoal/familiar, onde existem zonas de estabilidade
e/ou inestabilidade, correspondentes a mudanças na organização pessoal/familiar,
geradoras tanto de equilíbrio como de desequilíbrios.
A organização da família está formada por uma rede de relações que é preexistente ao
sujeito. O ser humano mantém vinculação com seus semelhantes, para uma adequada
satisfação de suas necessidades múltiplas e diferenciadas e cada família desenvolve uma
estrutura característica, um padrão de regras e papéis, dentro dos quais seus membros
funcionam. São as regras ou normas estabelecidas pela família que nortearão a conduta de
seus membros. Os ritos são moldados pelas regras estabelecidas pela família, cujos hábitos
são exteriorizados através de ritos e ancorados nas regras por ela definidas.
Cf. Vilhena (1988), a família não é apenas entidade grupal ou social mas também uma
entidade psíquica, onde os mecanismos de projeção são constantes e maciços, sendo as
projeções múltiplas próprias do sistema, do grupo familiar. A família elabora uma imagem
interiorizada, comum ao grupo, unindo seus membros em um projeto comum. Assim sendo,
a perspectiva intergeracional considera os problemas individuais como familiares – com sua
raiz em fatos passados, constituindo a história natural da família – transmitidos de geração
em geração, por meio de condutas repetitivas.
A abordagem intergeracional, desta forma, procede a uma análise da transmissão dessa
cultura familiar, de uma geração para outra e entre os membros da mesma geração,
identificando padrões, costumes, segredos, mitos e problemas que determinam o
funcionamento pessoal/familiar. Assim, o psicólogo trabalha em dois eixos, o vertical, ou
transgeracional, onde são identificados papéis e funções característicos da família, bem
como o nível de autonomia e diferenciação de cada elementos face à sua família de origem;
e o eixo horizontal, que inclui o estudo dos padrões da interação pessoal e familiar, bem
como o modo como o indivíduo e/ou grupo familiar lida com as dificuldades da vida.
AVALIAÇÃO PSICOMÉTRICA
c) Método das metades – é utilizado quando uma única forma do teste ou escala foi
aplicada numa única sessão. O conjunto de itens do teste é dividido em duas
metades e os escores para as duas metades são correlacionados.
Sempre que questões de decisão judicial são colocadas, elas se referem a capacidades
individuais físicas, mentais e/ou sociais, relacionada à vida passada, corrente ou futura do
sujeito. As decisões na área criminal ou cível relacionam-se com a avaliação de competências
legais. O objetivo é atribuir ou não ao sujeito um status de debilidade ou insuficência, que é
percebido como comprometedor do bem-estar do indivíduo ou da sociedade. A construção
dos limites da competência está ligada aos valores da sociedade e serve para reforçar ou
restringir os direitos das pessoas para determinados propósitos.
O papel do psicólogo junto ao pedido de uma avaliação forense pode se dar: a) como perito
oficial, quando designado pelo juiz no decorrer do processo; b) em função de seu
desempenho profissional, em uma instituição pública; c) a pedido de uma das partes
litigantes, quando é conhecido como perito assistente. A legitimação do papel do psicólogo
como perito se encontra no Decreto-lei 53.664, de 21 de janeiro de 1964. O cliente do
psicólogo poderá ser tanto o sujeito (periciado) como o sistema mais amplo (sociedade).
EFE – Entrevista Familiar Estruturada – avaliação das relações familiares facilitadoras ou não
de saúde emocional.
Escala de Ideação Suicida de Beck (BSI) – identificação da presença ou não de ideação suicida
ou intensidade (gravidade) da ideação.
HISTÓRIA DO PSICODIAGNÓSTICO
1 – Introdução:
Segundo Trinca (1984) na avaliação psicológica houve uma procura de integração das
diversas abordagens e quando olhamos concretamente para a Psicologia Clínica, verificamos
grandes variações de conhecimentos e atuações, e, portanto, na prática do psicodiagnóstico,
temos também várias formas de atuação, muitas das quais não podem ser consideradas
decorrentes de exclusivamente uma ou outra abordagem.
O psicólogo trabalhou durante muito tempo com um modelo similar ao do médico clínico
que, para proceder com eficiência e objetividade, toma a maior distância possível em relação
a seu paciente a fim de estabelecer um vínculo afetivo que não lhe impeça de trabalhar com
a tranqüilidade e objetividade necessárias. Ocampo (1981) atribui este fato à falta de uma
identidade sólida por parte do psicólogo, que lhe permitisse saber quem era e qual era seu
verdadeiro trabalho dentro das ocupações ligadas à saúde mental. Neste momento os testes
eram utilizados no psicodiagnóstico como se eles constituíssem em si mesmos o objetivo do
psicodiagnóstico e como escudo entre o profissional e o paciente, para evitar pensamentos e
sentimentos que mobilizassem afetos.
Assim podemos perceber, como nos mostra Ocampo (1981), que o psicólogo teve que
percorrer as mesmas etapas que um indivíduo percorre em seu crescimento. Buscou figuras
boas para se identificar, aderiu ingênua e dogmaticamente a certa ideologia e identificou-se
com outros profissionais, até que pôde questionar-se sobre a possibilidade de não ser como
eles. Por fim entrou em um período de maturidade ao perceber que utilizava uma “pseudo” -
identidade que distorcia sua identidade real, conseguindo assim uma maior autonomia de
pensamento e prática.
O psicodiagnóstico nasceu (derivou) da Psicologia Clínica que foi criada sob a tradição da
psicologia acadêmica e da tradição médica e é um ramo da Psicologia que tem por finalidade
básica o desenvolvimento e a aplicação das técnicas de diagnóstico e psicoterapêuticas para
a identificação e tratamento de distúrbios do comportamento. Entre essas técnicas ¾
usualmente designadas pelo nome de método clínico ¾ salientam-se as entrevistas, os
testes, as técnicas projetivas e a observação diagnóstica.
A tradição psicométrica (medida quantitativa dos fenômenos psíquicos) foi desta maneira
fundada e ficou sedimentada pela difusão das escalas de Binet que em 1905 apresenta um
teste de inteligência para separar crianças com retardo mental, seguidas pela criação dos
testes do exército americano em 1906 que foi o primeiros teste coletivos para selecionar
recrutas.
Por outro lado, na medicina, após a reabilitação moral dos casos psiquiátricos (abolição dos
métodos terapêuticos brutais ¾ eletrochoque), iniciada por Philippe Pinel, a necessidade de
compreender o doente mental, obrigou o meio médico a estudar a doença mental. Como
seria de esperar, as causas da doença mental foram buscadas no organismo e, em especial,
no sistema nervoso, e, como decorrência disso, “os pacientes psiquiátricos, não mais
considerados lunáticos, se tornaram ” nervosos “ou” neuróticos “.
É importante lembrar que ao mesmo tempo Freud publica “A interpretação dos sonhos”,
que provinha da melhor tradição neurofisiológica, mas que representou o primeiro elo de
uma corrente de conteúdo dinâmico, logo em seguida com o aparecimento do teste de
associação de palavras, de Jung, fornecendo a base para o lançamento, mais tarde, das
técnicas projetivas.
A expressão psicodiagnóstico é utilizada pela primeira vez por Hermann Rorschach quando
publica em 1921 seu teste de manchas de tinta. O teste passou a ser utilizado como um
passo essencial (e, às vezes, único) do processo psicodiagnóstico. A grande popularidade
alcançada nas décadas de quarenta e cinqüenta é atribuída ao fato de que os dados gerados
pelo método eram compatíveis com os princípios básicos da teoria psicanalítica.
Esse foi o tempo áureo das técnicas de personalidade. Embora o teste de Rorschach e o
Teste de Apercepção Temática (Apercepção ¾ a partir da apresentação de um estímulo em
forma de tema por exemplo, leva o sujeito a aperceber nele necessidades e motivos que
existiam no seu inconsciente e que projeta no tema, assim facilitando o diagnóstico de seus
ajustamentos e desajustamentos) fossem os instrumentos mais conhecidos, começaram a se
multiplicar rapidamente as técnicas projetivas, como o teste da figura humana, o Szondi
(protótipo do BBT: teste de fotos de profissões) e tantos outros. Entretanto, a partir de
então, as técnicas projetivas começaram a apresentar certo declínio em seu uso, por
problemas metodológicos, pelo incremento de pesquisas com instrumentos alternativos,
como o MMPI e outros inventários de personalidade, por sua associação com alguma
perspectiva teórica, novamente a psicanalítica e pela ênfase na interpretação intuitiva
apesar de esforços para o desenvolvimento de sistemas de escores. Apesar disso, essas
técnicas ainda são bastante utilizadas, embora com objeções por parte dos psicólogos que
lutam por avaliações de orientação condutista (behaviorista) e biológica.
Por outro lado, pode-se afirmar, que “o campo da avaliação psicológica da personalidade
tem feito contribuições vitais para a teoria, prática e pesquisa clínica”.
Mas alguns autores propõem uma questão: terá o psicodiagnóstico o impacto que merece?
Neste sentido, algumas pesquisas foram desenvolvidas, uma delas com 70 pacientes,
encontrando concordância entre as recomendações diagnósticas do psicólogo e do
psiquiatra, em 94% dos casos, mesmo quando havia ocorrido uma discordância inicial.
Considera que o reconhecimento da qualidade do psicodiagnóstico tem que ver, em primeiro
lugar, com um refinamento dos instrumentos e, em segundo lugar, com estratégias de
marketing de que o psicólogo deve lançar mão para aumentar a utilização dos serviços de
avaliação pelos receptores de laudos.
Também se levantou outra questão: observando que muitas vezes psicólogos competentes
acabam por “fornecer uma grande quantidade de informações inúteis para as fontes de
encaminhamento”, por falta de uma compreensão adequada das verdadeiras razões que
motivaram o encaminhamento ou, em outras palavras, por desconhecimento das decisões
que devem ser tomadas com base nos resultados do psicodiagnóstico.
As sugestões apontadas, de conhecer as necessidades do mercado e de desenvolver
estratégias de conquistas desse mercado, parecem se fundamentar na pressuposição de que
o psicólogo, sobrecarregado com suas tarefas, não está avaliando a adequabilidade de seus
dados ao público consumidor.
Mas que público é este? Que profissionais ou serviços podem ter necessidade de solicitar
psicodiagnósticos? Primeiramente, vejamos onde costuma trabalhar um psicólogo que lida
com psicodiagnósticos. Mais comumente exerce suas funções numa instituição que presta
serviços psiquiátricos ou de medicina geral, num contexto educacional ou legal ou numa
clínica ou consultório psicológico, em que o psicólogo recebe encaminhamento
principalmente de psiquiatras, de outros médicos (pediatras, neurologistas, etc.), da
comunidade escolar (de orientadores, professores, etc.), de juízes ou de advogados, ou
atende casos que procuram espontaneamente um exame, ou são recomendados por algum
familiar ou amigo.
A questão básica com que se defronta o psicólogo é que, embora um encaminhamento seja
feito, porque a pessoa necessita de subsídios para basear uma decisão para resolver um
problema, muitas vezes ela não sabe claramente que perguntas levantar ou, por razões de
sigilo profissional, faz um encaminhamento vago para uma “avaliação psicológica”. Em
conseqüência, uma das falhas comuns do psicólogo é a aceitação silenciosa de tal
encaminhamento, com a realização de um psicodiagnóstico, cujos resultados não são
pertinentes às necessidades da fonte de solicitação.
“Os psicólogos, hoje em dia, não apenas administram testes; eles realizam avaliações”.
Um diagnóstico psicológico tão preciso quanto possível é imprescindível por diversas razões:
• Para saber o que ocorre e suas causas, de forma a responder ao pedido com o qual
foi iniciada a consulta.
Por estas razões explica-se a importância da etapa diagnóstica, sejam quais forem os
instrumentos científicos utilizados na mesma. Freud já falava da importância desta etapa, à
qual ele dedicava os primeiros meses do tratamento. Coloca que ela é vantajosa tanto para o
paciente quanto para o profissional, que avalia assim se poderá ou não chegar a uma
conclusão positiva.
Vejamos agora, segundo Arzeno (1995) com quais finalidades pode ser utilizado o
psicodiagnóstico.
Meninger foi durante muitos anos chefe da clínica que leva seu nome. Ele apoiou e animou a
criação e o desenvolvimento dos testes tanto projetivos como objetivos. Cada paciente que
ingressava na clínica era submetido a uma bateria completa de testes.
Ainda hoje esse modelo de trabalho é eficiente, porque a entrevista clínica não é uma
ferramenta infalível, a não ser quando em mãos de grandes mestres, e às vezes, nem mesmo
nesses casos. Os testes tão pouco o são. Mas se utilizarmos ambos os instrumentos de forma
complementar há uma margem de segurança maior para chegar a um diagnóstico correto,
especialmente se incluirmos testes padronizados.
A bateria de testes utilizada deve incluir instrumentos que permitam obter ao máximo a
projeção de si mesmo. Por isso, se pedirmos ao paciente que desenhe uma figura humana,
sabemos que haverá uma projeção, mas muito mais se lhe pedirmos que desenhe uma casa
ou uma árvore, já que ele não pode controlar totalmente o que projeta.
Como dito antes, é importante incluir testes padronizados porque nos dão uma margem de
segurança diagnóstica maior.
Outro elemento importante que nos é dado pelo psicodiagnóstico refere-se à relação de
transferência-contratransferência.
Porém, nem todos os psicólogos, psicanalistas e psicólogos clínicos concordam com esse
ponto de vista. Alguns reservam a utilização do psicodiagnóstico para casos nos quais
surgem dúvidas diagnósticas ou quando querem obter uma informação mais precisa, diante,
por exemplo, de uma suspeita de risco de suicídio, dependência de drogas, desestruturação
psicótica, etc. Em outras ocasiões o solicitam porque têm dúvidas sobre o tratamento mais
aconselhável, se a psicanálise ou uma terapia individual ou vincular. Finalmente, existe outro
grupo de profissionais que não concordam em absoluto com este ponto de vista e
prescindem totalmente do psicodiagnóstico. Ainda mais, não concedem valor científico
algum aos testes projetivos. Alguns vão mais longe, dizendo que de forma alguma é
importante fazer um diagnóstico inicial, que isso chega com o tempo, ao longo do
tratamento.
Todas as posições são respeitáveis, porém devem ser fundamentadas cientificamente e, até
o momento, não foram encontradas demonstrações, baseadas na teoria da projeção e da
psicologia da personalidade, que os testes projetivos carecem de validade.
Algumas vezes isto é feito para apreciar os avanços terapêuticos de forma mais objetiva e
também para planejar uma alta. Em outras palavras é para descobrir o motivo de um
“impasse” no tratamento e para que, tanto o paciente como o terapeuta possa falar sobre
isso, estabelecendo, talvez, um novo contrato sobre bases atualizadas. Em outros casos
ainda, é porque existe disparidade de opiniões entre eles. Um deles acredita que pode dar
fim ao tratamento, enquanto que o outro se opõe.
Estes casos representam um trabalho difícil para o psicólogo, pois passa a ocupar o papel de
um árbitro que dará a razão a um dos dois. É então conveniente esclarecer ao paciente que o
psicodiagnóstico não será realizado para demonstrar-lhe que estava enganado, mas, como
um fotógrafo, ele registrará as situações para depois comentá-las. O mesmo esclarecimento
deve ser dado ao terapeuta. Obviamente, é conveniente que a entrevista de devolução seja
feita por aquele que realizou o estudo, tendo um cuidado muito especial em mostrar uma
atitude imparcial e fundamentando as afirmações no material dado pelo paciente.
Nos tratamentos particulares, o terapeuta é que decide o momento adequado para um novo
psicodiagnóstico (ou, talvez, para o primeiro). No entanto, nos tratamentos realizados em
instituições públicas ou privadas, são elas que fixam os critérios que devem ser levados em
consideração. Algumas deixam isto a critério dos terapeutas, outras, decidem pautá-lo
considerando tanto a necessidade de avaliar a eficiência de seus profissionais quanto a de
contar com um banco de dados úteis, por exemplo, para fins de pesquisa. Assim, é possível
que o primeiro psicodiagnóstico seja indicado quando o paciente entra na instituição, e o
outro de seis a oito meses após, dependendo isto do período destinado a cada paciente.
Por isso seria grotesco ficar em silêncio por um longo período, apoiando-se no princípio de
que a entrevista é livre e é o cliente que deve falar. Como seria também grotesco
interrompê-lo enquanto está relatando algo importante para impor-lhe a tarefa de
desenhar.
O psicodiagnóstico possui um fim em si mesmo, mas é também um meio para outro fim:
conhecer esta pessoa que chega porque precisa de nós. A finalidade é conhecê-la de forma
mais profunda possível. Para isso o bom rapport é imprescindível.
Um exemplo do primeiro caso é o que fez o próprio Hermann Rorschach quando criou as
manchas e selecionou entre milhares aquelas que demonstravam ser mais estimulantes.
Para dar validade a este teste mostrou as lâminas a um grupo de pacientes selecionados
aleatoriamente e, após, a outro grupo já diagnosticado com o método da entrevista clínica
(esquizofrênicos, fóbicos, etc.). Assim pôde estabelecer as respostas populares (próprias da
maioria estatística selecionada aleatoriamente) e as diferentes “síndromes” ou perfil de
respostas típico de cada quadro patológico.
A criação de um teste não é uma tarefa fácil. Não podem ser colhidos alguns registros e deles
extraídas conclusões com a pretensão de que sejam válidas para todos. É necessário
respeitar aquilo que a psicoestatística indica como modelo de investigação para que as suas
conclusões sejam aceitáveis.
Logo após, administraremos este psicodiagnóstico assim planejado: por um lado, a uma
amostra de homossexuais, dependentes de drogas, etc., e, por outro lado, o mesmo
psicodiagnóstico, a outra amostra chamada de controle, que não registra a mesma patologia
do grupo em estudo. Em uma terceira
Foram usados exemplos simples com a finalidade de transmitir claramente em que consiste
essa tarefa. A utilidade destas pesquisas varia muito e as mais importantes são aquelas que
permitem identificar indicadores que servirão para detectar precocemente problemas
clínicos, trabalhistas, educacionais, etc., com a conseqüente economia de sofrimento,
problemas e até complicações institucionais.
O psicodiagnóstico inclui, além das entrevistas iniciais, os testes, a hora de jogo com
crianças, entrevistas familiares, vinculares, etc. As conclusões de todo o material obtido são
discutidas com o interessado, com seus pais, ou com a família completa, conforme o caso e o
sistema do profissional.
Um diagnóstico psicológico tão preciso quanto possível é imprescindível por diversas razões:
Para saber o que ocorre e suas causas;
Porque iniciar um tratamento sem o questionamento prévio do que realmente ocorre
representa um risco muito alto;
Para proteger o psicólogo, que ao iniciar o tratamento contrai automaticamente um
compromisso em dois sentidos:
clínico e ético.
Finalidades do psicodiagnóstico:
diagnóstico, avaliação do tratamento;
meio de comunicação;
investigação.
O psicodiagnóstico possui um fim em si mesmo, mas é também um meio para outro fim:
conhecer esta pessoa que chega porque precisa de nós.
A finalidade é conhecê-la de forma mais profunda possível.
A avaliação psicológica é mais ampla que o psicodiagnóstico, e seu objeto de estudo pode
ser um sujeito, um grupo, uma instituição, uma comunidade, daí a importância dos trabalhos
interdisciplinares já que o objeto a avaliar é sempre um sistema complexo, integrado por
subsistemas diversos: biológico, psicológico, social, cultural, em interação permanente.
O psicodiagnóstico está mais vinculado com a clínica, está vinculado com temas de interesse
clínicos, tais como nosologias psicopatólogicas, critérios de saúde psíquica, enfoques
patogênicos e saudáveis. Logo, diagnosticar supõe situarmo-nos no plano do processo
saúde-enfermidade e poder determinar em que medida se está ou não em presença de uma
patologia ou transtorno que necessita de um determinado tipo de intervenção.
O plano de avaliação é estabelecido com base nas perguntas ou hipóteses iniciais, definindo-
se não só quais os instrumentos necessários, mas como e quando utilizá-los.
Pressupõe-se, evidentemente, que o psicólogo saiba que instrumentos são eficazes, isto é,
quais instrumentos podem ser eficientes, se aplicados com propósitos específicos, para
fornecer respostas a determinadas perguntas ou testar certas hipóteses. Por este grande
motivo, é que o psicólogo deve conhecer os diferentes instrumentos de avaliação
psicológica.
Depois da administração de uma bateria de testes, nós obtemos dados que devem ser
articulados com as informações da história clínica, da história pessoal ou com outras, a partir
do elenco das hipóteses iniciais, para permitir uma seleção e uma integração, rodeada pelos
objetivos do psicodiagnóstico, que determinam o nível de inferências que deve ser
alcançado.
Para Ocampo (1981) o processo psicodiagnóstico pode ser visto como uma situação com
papéis bem definidos e com um contrato no qual o cliente pede uma ajuda, e o psicólogo
aceita o pedido e se compromete a satisfazê-lo na medida de suas possibilidades. Ela ainda
caracteriza o processo como
uma situação bi-pessoal, de duração limitada, cujo objetivo é conseguir uma descrição e
compreensão, o mais profunda e completa possível, da personalidade total do paciente ou
do grupo familiar. Enfatiza também a investigação de algum aspecto em particular, segundo
a sintomatologia e as características da indicação. Abrange os aspectos passados, presentes
(diagnóstico) e futuros (prognóstico) desta personalidade, utilizando para alcançar tais
objetivos certas técnicas. (pg.17)
5 - OBJETIVOS DO PSICODIAGNÓSTICO
• Classificação nosológica;
• Diagnóstico diferencial;
• Avaliação compreensiva;
• Entendimento dinâmico;
• Prevenção;
• Prognóstico;
• Perícia forense.
As perguntas mais elementares que podem ser formuladas em relação a uma capacidade,
um traço, um estado emocional, seriam: “Quanto?” ou “Qual?” Aqui, o objetivo seria de
classificação simples. Um caso comum de exame com este objetivo seria o de avaliação do
nível intelectual. O examinando é submetido a testes, adequados à sua idade e nível de
escolaridade. São levantados escores (valor quantitativo obtido pela soma ou total de
pontos creditados a um indivíduo em situação de prova ou teste), consulta de tabelas e os
resultados são fornecidos em dados quantitativos, classificados sinteticamente
(resumidamente).
Mas, é raro que um exame psicológico se restrinja a este objetivo, uma vez que os resultados
dos testes, os escores dos subtestes e as respostas intratestes praticamente nunca são
regulares e as diferenças encontradas são susceptíveis de interpretação. Pode-se, então,
identificar forças e fraquezas, dizer como é o desempenho do paciente do ponto de vista
intelectual. Neste caso, o objetivo do psicodiagnóstico é descritivo.
Basicamente, podem não ser utilizados testes. A não utilização de testes é um objetivo
explícito ou implícito nos contatos iniciais do paciente com psiquiatras, psicanalistas e
psicólogos de diferentes linhas de orientação terapêutica. Ao passo que, se o objetivo é
atingido através de um psicodiagnóstico, obtêm-se evidências mais objetivas e precisas, que
podem, inclusive, servir de parâmetro para avaliar resultados terapêuticos, mais tarde,
através de um reteste.
Um exame deste tipo requer entrevistas muito bem conduzidas, cujos dados nem sempre
são consubstanciados pelos passos específicos de um psicodiagnóstico, portanto, não sendo
um recurso privativo do psicólogo clínico. Freqüentemente, se combina com os objetivos de
classificação nosológica e de diagnóstico diferencial. Porém, quando é um objetivo do
psicodiagnóstico, leva não só a uma abordagem diferenciada das entrevistas e do material
de testagem, como a uma integração dos dados com base em pressupostos psicodinâmicos.
Não obstante, num exame individual, que pode requerer uma dimensão mais profunda,
especialmente envolvendo uma estimativa de condições do ego frente a certos riscos ou no
enfrentamento de situações difíceis, seria indicado um psicodiagnóstico.
Por fim, o psicodiagnóstico com o objetivo de perícia forense. Com esta finalidade, o exame
procura resolver questões relacionadas com “insanidade”, competência para o exercício de
funções de cidadão, avaliação de incapacidade ou de comprometimentos psicopatológicos
que etiologicamente (na sua origem) possam se associar com infrações da lei, etc.
... os dados descrevem o que uma pessoa pode ou não fazer no contexto da testagem, mas o
psicólogo deve ainda inferir (concluir, julgar, deduzir) o que ele acredita que ela (pessoa)
poderia ou não fazer na vida cotidiana. (Groth-Marnat, 1984, p.25).
As respostas fornecem subsídios para instruir decisões de caráter vital para o indivíduo.
Conseqüentemente, a necessidade de chegar a inferências que tenham tais implicações pode
se tornar até certo ponto ansiogênica para o psicólogo.
Ocampo (1981) afirma que a investigação psicológica deve conseguir uma descrição e
compreensão da personalidade do paciente, onde é importante explicar a dinâmica do caso
tal como aparece no material recolhido, integrando-o num quadro global. Uma vez
alcançado um panorama preciso e completo do caso, incluindo os aspectos patológicos e os
adaptativos, trataremos de formular recomendações terapêuticas adequadas.
6 - PASSOS DO PSICODIAGNÓSTICO
Por isso, é muito importante saber claramente qual é o objetivo do psicodiagnóstico que
vamos realizar.
Quando o cliente chega dizendo: “Me mandaram...” sabemos em primeiro lugar que o que
está sendo dito não é verdade, pois ninguém consulta exclusivamente por esse motivo. Em
algum recanto de si mesmo existe o desejo de fazer a consulta. Em segundo lugar, a
motivação é muito inconsciente e não a percebe, por isso a colocação soa muito superficial.
De forma que, antes de iniciar a tarefa, o psicólogo deve esclarecer com o cliente qual é o
motivo manifesto e mais consciente do estudo e intuir qual seria o motivo latente e
inconsciente do mesmo. É importante dedicar a isto todo o tempo que for necessário e não
iniciar a tarefa se o cliente insistir na idéia de que o faz por mera curiosidade, já que se
refletira negativamente no momento da devolução de informação.
O primeiro passo ocorre desde o momento em que o cliente ou seus responsáveis fazem a
solicitação da consulta até o encontro pessoal com o profissional.
O segundo passo ocorre na ou nas primeiras entrevistas nas quais tenta-se esclarecer o
motivo latente e o motivo manifesto da consulta, as ansiedades e defesas que a pessoa que
consulta mostra (e seus pais ou o resto da família), a fantasia de doença, cura e análise que
cada um traz e a construção da história do indivíduo e da família em questão.
Foi deixado totalmente de lado o tipo de inquérito exaustivo e entediante, tanto para o
profissional como para os clientes, e vamos nos guiamos na entrevista mais pelo que vai
surgindo conforme o motivo central da consulta.
Para Cunha (2000), é nesse momento que devemos fazer o contrato de trabalho, que
envolve um comprometimento de ambas as partes em cumprir certas obrigações formais.
O paciente ou seus responsáveis, por sua vez, se comprometem a comparecer nas horas
marcadas, nos dias previstos e implicitamente a colaborar para que o plano de avaliação seja
realizado sem problemas.
Com o plano de avaliação pronto, procuramos identificar recursos que permitam estabelecer
uma relação entre as perguntas iniciais e suas possíveis respostas. O plano de avaliação
consiste em traduzir as perguntas em termos de técnicas e teste, isto é, consiste em
programar a administração de uma série de instrumentos adequados ao sujeito específico e
especialmente selecionados para fornecer subsídios para que se possa chegar às respostas
para as perguntas iniciais. Os dados resultantes, portanto, devem possibilitar confirmar ou
infirmar as hipóteses, com um grau satisfatório de certeza.
O elenco de hipóteses deve ser norteado e delimitado pelo objetivo do psicodiagnóstico. Isto
significa que nem todas as hipóteses levantadas devem necessariamente testadas, sob pena
de o processo se tornar inusitadamente longo ou interminável.
A bateria de testes é utilizada por duas razões principais. Primeiramente, considera-se que
nenhum teste, isoladamente, pode proporcionar uma avaliação abrangente da pessoa como
um todo. Em segundo lugar, o emprego de uma série de testes envolve a tentativa de uma
validação intertestes dos dados obtidos, a partir de cada instrumento em particular,
diminuindo, dessa maneira, a margem de erro e fornecendo melhor fundamento para se
chegar a inferências clínicas.
Há dois tipos principais de baterias de testes: as baterias padronizadas para avaliações
específicas e as não padronizadas, que são organizadas a partir de um plano de avaliação.
No primeiro caso, a bateria de testes não resulta de uma seleção de instrumentos de acordo
com as questões levantadas num caso individual, pelo psicólogo responsável pelo
psicodiagnóstico, a não ser quando se trata de bateria padronizada especializada.
O quinto momento é aquele dedicado ao estudo do material para obter um quadro o mais
claro possível sobre o caso em questão. É um trabalho árduo que freqüentemente desperta
resistências, mesmo em profissionais de boa formação e que trabalham com seriedade. É
necessário buscar recorrências e convergências dentro do material, encontrar o significado
de pontos obscuros ou produções estranhas, correlacionar os diferentes instrumentos
utilizados, entre si e com a história do indivíduo e de sua família. Se forem aplicados testes,
eles devem ser tabulados corretamente e deve-se interpretar estes resultados para integrá-
los ao restante do material.
Não se trata de um tratado mecânico de montar um quebra-cabeça, mesmo tendo alguma
semelhança com essa tarefa. É mais uma busca semelhante à do antropólogo e do
arqueólogo ou à de um interprete de uma língua desconhecida pelo paciente e sua família
cuja tradução ajuda a desvendar um mistério e reconstruir uma parte da história que
desconhecem a nível consciente, mas que se refere a quando foi gerada a patologia.
Independente das informações dos testes, nesse momento, o psicólogo já possui um acervo
de observações que constitui uma amostra do
Esta última entrevista está impregnada pela ansiedade do paciente, da sua família e, por que
não dizê-lo, muitas vezes também pela do psicólogo, especialmente nos casos mais
complexos.
O psicólogo não deve assumir a posição daquele que “sabe” diante dos que não “sabem”.
Primeiro, porque isso não é verdade. Segundo, porque essa posição contém muita
onipotência e dá lugar a reações que atrapalham o trabalho. É insustentável afirmar que em
umas quantas entrevistas tenhamos esgotado o conhecimento de um indivíduo e, ainda
mais, de um casal ou família. Mas é possível dizer que conseguimos desvendar, com a maior
certeza possível, o motivo que provoca o sintoma que dá origem à consulta.
Às vezes o próprio indivíduo ou seus pais podem assumir o papel daquele que pergunta e
esperar que todas as suas dúvidas sejam respondidas, como se o profissional tivesse uma
“bola de cristal”. Nesse caso é necessário reformular os respectivos papéis, especialmente o
do profissional, que não é propriamente um vidente.
Os sujeitos ou seus pais podem não ter mencionado algo que surge no material registrado, e
aproveitaremos essa entrevista para perguntar. Muitas vezes esta informação pode mudar
radicalmente as hipóteses levantadas pelo profissional, e sua presença é um bom sinal
porque aumenta o grau de sinceridade e confiança do cliente.
Além do mais, em alguns casos específicos, especialmente em uma família com crianças,
dependendo do que tenhamos percebido na ou nas entrevistas familiares diagnósticas, pode
ser adequado realizar a entrevista de devolução com uma técnica lúdica que se alterne com
a verbal, especialmente naqueles casos nos quais o indivíduo ou a família são movidos mais
por códigos de ação que de verbalização.
Segundo Scheeffer (1968), o teste psicológico pode ser definido como uma situação
padronizada que serve de estímulo a um comportamento por parte do examinando; esse
comportamento é avaliado, por comparação estatística com o de outros indivíduos
submetidos à mesma situação, permitindo assim sua classificação quantitativa e qualitativa.
Ocampo (1981) nos chama atenção: no planejamento da bateria temos que pensar que o
processo psicodiagnóstico deve ser suficientemente amplo para compreender bem o
paciente, mas ao mesmo tempo, não se deve exceder porque isto implica uma alteração no
vínculo psicólogo - paciente.
Para planejar uma bateria é necessário pensar em testes que captem o maior número
possível de condutas (verbais, gráficas e lúdicas), de maneira a possibilitar a comparação de
um mesmo tipo de conduta, provocada por diferentes estímulos ou instrumentos e
diferentes tipos de conduta entre si. É muito importante discriminar a seqüência em que
serão aplicados os testes escolhidos. Ela deve ser estabelecida em função de dois fatores: a
natureza do teste e a do caso em questão. O teste que mobiliza uma conduta que
corresponde ao sintoma nunca deve ser aplicado primeiro. Utilizar estes testes em primeiro
lugar supõe colocar o paciente na situação mais ansiógena ou deficitária sem o prévio
estabelecimento de uma relação adequada. Recomendamos como regra geral reservar os
testes mais ansiógenos para as últimas entrevistas.
Os testes gráficos são os mais adequados para começar um exame psicológico, por diversas
razões, entre elas por abarcarem os aspectos mais dissociados, menos sentidos como
próprios, e permitirem que o paciente trabalhe mais aliviado, além de serem econômicos
quanto ao tempo gasto em sua aplicação, ou seja é uma tarefa fácil.
Numa bateria - padrão, segundo Ocampo (1981), devem ser incluídos, entre os testes
projetivos, aqueles que promovam condutas diferentes. Portanto, a bateria projetiva deve
incluir testes gráficos, verbais e lúdicos. Quanto aos testes de inteligência, sua inclusão na
seqüência da bateria não pode ser arbitrária, o momento exato de sua inclusão deve ser
decidido de acordo com o caso.
No planejamento da bateria temos que pensar que o processo psicodiagnóstico deve ser
suficientemente amplo para compreender bem o paciente, mas ao mesmo tempo, não se
deve exceder porque isto implica uma alteração no vínculo psicólogo - paciente.
Numa bateria - padrão, segundo Ocampo (1981), devem ser incluídos, entre os testes
projetivos, aqueles que promovam condutas diferentes. Portanto, a bateria projetiva deve
incluir testes gráficos, verbais e lúdicos. Quanto aos testes de inteligência, sua inclusão na
seqüência da bateria não pode ser arbitrária, o momento exato de sua inclusão deve ser
decidido de acordo com o caso.
8 - AS ENTREVISTAS
Examinando os elementos dessa definição podemos dizer que técnica é entendida como
uma série de procedimentos que possibilitam investigar os temas em questão. A
investigação possibilita alcançar os objetivos primordiais da entrevista, que são descrever e
avaliar, o que pressupõem o levantamento de informações, a partir das quais se torna
possível relacionar eventos e experiências, fazer inferências, estabelecer conclusões e tomar
decisões. Essa investigação se dá dentro de domínios específicos da psicologia clínica e leva
em consideração conceitos e conhecimentos amplos e profundos nessas áreas. Esses
domínios incluem, por exemplo, a psicologia do desenvolvimento, a psicopatologia, a
psicodinâmica, as teorias sistêmicas. Aspectos específicos em cada uma dessas áreas podem
ser priorizados como, por exemplo, o desenvolvimento psicossexual, sinais e sintomas
psicopatológicos, conflitos de identidade, relação conjugal, etc.
Afirmamos ainda que a entrevista é parte de um processo. Este deve ser concebido,
basicamente como um processo de avaliação, que pode ocorrer em apenas uma sessão e ser
dirigido a fazer um encaminhamento, ou a definir os objetivos de um processo
psicoterapêutico. Muitas vezes, o aspecto avaliativo de uma entrevista inicial confunde-se
com a psicoterapia que se inicia, devido ao aspecto terapêutico intrínseco a um processo de
avaliação e ao aspecto avaliativo intrínseco à psicoterapia. Outras vezes, o processo de
avaliação é complexo e exige um conjunto diferenciado de técnicas de entrevistas e de
instrumentos e procedimentos de avaliação, como, por exemplo, além da entrevista, os
instrumentos projetivos ou cognitivos, as técnicas de observação, etc. A importância de
enfatizar a entrevista como parte de um processo é poder vislumbrar o seu papel e o seu
contexto ao lado de uma grande quantidade possível de procedimentos em psicologia.
Definimos ainda a entrevista clínica como tendo características de ser dirigida. Afirmar que a
entrevista é um procedimento pode suscitar alguns questionamentos. Mesmo nas chamadas
entrevistas “livres”, é necessário o reconhecimento, pelo entrevistador, de seus objetivos.
Como afirmamos antes, os objetivos de cada tipo de entrevista definem as estratégias
utilizadas e seus limites. É no intuito de alcançar os objetivos da entrevista que o
entrevistador estrutura suas intervenção. O entrevistador precisa estar preparado para lidar
com o direcionamento que o sujeito parece querer dar à entrevista, de forma a otimizar o
encontro entre a demanda do sujeito e os objetivos da tarefa. Em síntese, concluímos que
todos os tipos de entrevista têm alguma forma de estruturação na medida em que a
atividade do entrevistador direciona a entrevista no sentido de alcançar seus objetivos.
Supõe-se que a entrevista clínica deve ter como beneficiário direto as pessoas entrevistadas.
Por outro lado, isso nem sempre é claro nos dias de hoje, quando os psicólogos têm que se
haver, cada vez mais, com terceiros envolvidos, como juízes, empregados, empresas de
seguros, etc. Nesse sentido é necessário o psicólogo definir em que sentido quem é o cliente
(empresa ou empregado, por ex.) e que demandas são apropriadas ou não.
Adrados (1982) afirma que a entrevista é tida como uma técnica, dentre outras de extrema
relevância, principalmente porque subexiste ao dia-a-dia tornando-se cada vez mais
eficiente e imprescindível, constituindo-se como ponto fundamental para o alcance de uma
visão global e conseqüentemente de uma conclusão diagnóstica, a respeito do cliente.
Existem diversos tipos de entrevistas, que irão se diferenciar de acordo com seu objetivo
principal e com o trabalho que está sendo realizado. Para cada processo há um tipo de
entrevista, que podem ser classificadas de várias maneiras: segundo o seu aspecto formal,
segundo os objetivos e segundo a estruturação.
Quanto a classificação das entrevistas a partir dos seus objetivos podemos dizer que há uma
grande variedade. Dentre as mais estudadas vamos citar:
Existem diversos tipos de entrevistas, que irão se diferenciar de acordo com seu objetivo
principal e com o trabalho que está sendo realizado. Para cada processo há um tipo de
entrevista, que podem ser classificadas de várias maneiras: segundo o seu aspecto formal,
segundo os objetivos e segundo a estruturação.
Quanto a classificação das entrevistas a partir dos seus objetivos podemos dizer que há uma
grande variedade. Dentre as mais estudadas vamos citar: triagem, anamnese, diagnóstica,
sistêmicas e devolução.
O bom uso da técnica deve ampliar o alcance das habilidades interpessoais do entrevistado e
vice-versa. Para levar uma entrevista a termo de modo adequado, o entrevistador deve ser
capaz de:
No caso de ser a primeira consulta que os pais (ou paciente adulto) fazem, a primeira
entrevista é o primeiro passo do processo psicodiagnóstico e deve reunir certos requisitos
para cobrir seus objetivos, tais como: no começo ser muito livre, não direcionada, de forma
que possibilite a investigação do papel que cada um dos pais desempenha, entre eles e
conosco; o papel que cada um parece desempenhar com o filho, a fantasia que cada um traz
sobre o filho, a fantasia de doença e cura que cada um tem, a distância entre o motivo
manifesto e o latente da consulta, o grau de colaboração ou de resistência com o
profissional, etc.
Para isso, serão levados em consideração tanto elementos verbais como não verbais da
entrevista, a gesticulação dos pais, seus lapsos, suas ações, como por exemplo, ir ao
banheiro, esquecer algo ao partir, segurar uma bolsa ou pasta o tempo todo, fazer
comentários profissionais, fazer alguma queixa (mesmo parecendo justificada pode estar
encobrindo uma queixa de outra natureza), desencontro do casal ao chegar para a primeira
entrevista, trocar o horário por engano, trazer uma lista escrita com dados excessivamente
detalhados, olhar o teto o tempo todo, pedir um conselho rapidamente, etc.
Foi dito antes que o primeiro requisito da entrevista projetiva é de que seja livre. Um
segundo requisito é que em um outro momento, quando for mais oportuno, segundo o
julgamento do profissional que está fazendo o trabalho, seja bastante dirigida de forma a
poder elaborar uma história clínica completa do paciente. Deve-se solicitar dados, colher
informação exaustiva sobre a história do sintoma e também deixar estabelecido um contrato
para esta etapa do trabalho diagnóstico. Por exemplo, quantas entrevistas serão feitas,
quem deve participar, em que horário, que ordem será dada ao filho, quais serão os
honorários, qual o objetivo de todo o estudo, em que vamos centrá-lo, qual é o motivo mais
profundo, que destino terá a informação que obtivermos (se será transmitida a eles ou ao
filho, ou além deles ao pediatra, à professora, a um juiz, etc.).
É importante detectar na primeira entrevista, seja com os pais, com o filho, com o
adolescente ou com o adulto que chegam pela primeira vez, o nível de angústia, o nível de
preocupação que provoca isso que está ocorrendo com eles. É necessário e saudável que se
produza num momento determinado da entrevista, quando o paciente ou seus pais tenham
insight de que o que ocorre é triste, preocupa ou assusta, notar que surja neles algum indício
de tais sentimentos, pois se não for assim pode predominar um clima de negação parcial da
verdadeira importância do conflito, ou um clima maníaco de negação total e projeção, como
quando tudo parece ser preocupação da professora ou do pediatra, mas não dos pais.
Não tem o mesmo significado que os pais de uma criança entrem numa crise da qual nós
dificilmente poderemos tirá-los, que se vemos que eles mesmos são capazes de conter a
própria angústia ou um deles é capaz de conter a angústia do outro, também o é se eles
reagem positivamente à ação moderadora do psicólogo.
Quando isso ocorre, essa criança tem um respaldo, uma contenção muito mais forte que
aquela que os pais negadores oferecem, ou aqueles que estão atravessando sua própria crise
de angústia. Nestes casos, também eles deverão receber uma ajuda pertinente, porque não
há alguém capaz de resgatar o grupo familiar da situação angustiante. Existe um nível de
angústia ou ansiedade cujo aparecimento é saudável, mas exacerbação é negativa, pois o
paciente entra numa crise de angústia da qual não consegue se afastar, e não podemos de
maneira alguma pensar em aplicar algum teste; podendo isto ser, inclusive, uma conduta
pouco humana, absurda e iatrogênica. Ocorre frequentemente sob algum comando, ou
diante de determinada lâmina de algum teste que o paciente as associa automaticamente
com alguma morte ou com algum acontecimento que desencadeou o seu conflito. Nestes
casos pode ocorrer um bloqueio total, uma crise de choro ou uma rejeição violenta, talvez se
negando a realizar a tarefa. Todas estas reações têm importância diagnóstica, porque
indicam quais são as reações do paciente quando tocamos seus pontos mais vulneráveis e
dolorosos. É provável que nesses casos tenhamos que suspender a tarefa, escutar o que ele
precisa nos contar, o que lembrou ou associou, sendo que nesse momento teremos então
uma nova etapa de entrevista aberta, mesmo já estando na fase de aplicação de algum
teste.
Cabe aqui uma recomendação. Não devemos esquecer que estamos desde o início incluindo
aspectos transferenciais da relação do paciente ou dois pais conosco, e também (mesmo se
não as verbalizamos) contratransferenciais. Não devemos esquecer também que aquilo que
se reestrutura, seguindo a teoria da Gestalt, é um campo no qual cada um dos integrantes
(no qual nós incluídos) terá uma constante mobilidade dinâmica, de tal modo que o que vier
a ocorrer é algo além do mero somatório de condutas individuais.
Se os pais forem um casal bem estruturado, os sentiremos unidos e haverá uma distância
ideal entre eles e nós. Se o casal não estiver bem unido poderemos notar que um deles quer
excluir o outro e fazer uma aliança conosco. Ou então, que um deles se exclui desce o início,
não vindo à entrevista, ou tentando ser uma presença ausente (por exemplo, olhando para o
teto o tempo todo), fazendo que o outro não tenha outra solução que falar conosco
constantemente. Pode ocorrer também que não queiram vir juntos. No caso de já existir a
separação, devemos aceitar esta situação, mas deveremos tentar de todas as formas
possíveis que assistam juntos à entrevista final para que tomem uma decisão conjunta, pois
trata-se de compreender o que está acontecendo com o filho e decidir o seu futuro. Parecem
consultar com a finalidade de desqualificá-lo repetidamente e não buscando a sua ajuda.
A diferença entre uma entrevista clínica habitual e aquela que é o ponto de partida para um
estudo psicodiagnóstico com os testes projetivos é que nesta deveremos manter um duplo
papel: no início, um papel de não intervenção ativa, limitando-nos a sermos um observador
da situação que está se desenvolvendo no campo do qual estamos participando. Tentaremos
manter o nosso papel de observador que escuta e registra (através do material do paciente e
dos efeitos contratransferenciais).
Na entrevista com um adulto ocorreria o mesmo. Tecnicamente, isto pode ser feito
simplesmente assinalado alguns pontos, sem fazer interpretações, o que não é
recomendável na primeira entrevista. Mas o grau de permeabilidade é muito variável.
Alguns pais (ou adolescentes ou adultos) vêm com muito insight e possibilitam-nos trabalhar
desde o primeiro contato, de uma maneira muito mais ágil e terapêutica. Isso, no entanto,
não é o usual, e às vezes ocorre totalmente o contrário.
Com crianças, o equivalente á entrevista projetiva inicial é a hora do jogo diagnóstico. Tanto
com eles quanto com adolescentes e adultos, continuaremos logo com os testes, e na
maioria dos casos teremos que fazer os respectivos inquéritos. Espera-se que o mesmo
modelo se repita: no início colheremos a produção espontânea do paciente e logo faremos
um inquérito para especificar detalhar das respostas (solucionar ambigüidades ou
contradições, completar, esclarecer, etc.) e isso exige de nós ma atitude abertamente
dirigida.
É por isso que dizemos que a atitude do profissional que realiza o estudo da personalidade
com testes projetivos, é composta: não é totalmente de laissez faire, nem tampouco uma
atitude absolutamente fechada ou de dirigismo rígido. E é bastante difícil esgotar todas as
possibilidades, porque cada caso é um psicodiagnóstico único e que não se repete, devido a
que, como já se disse, não pode existir um modelo único e rígido. A atitude do psicólogo
deve ser ao mesmo tempo plástica, aberta, permeável e concretamente precisa e
centralizada em um objetivo que não podemos ignorar ou perder de vista em momento
algum. Ficarmos com uma resposta ambígua significa não podermos chegar às conclusões
necessárias para realizar o diagnóstico ou prognóstico, nem tomar uma decisão ou dar
sugestões quanto à estratégia terapêutica confeccionando um bom informe.
Por essa razão, se um paciente resiste a realizar uma tarefa determinada, podemos trocá-la
por outra equivalente, mas não omiti-la. Podemos encontrar outro teste paralelo ou propor-
lhe uma outra atividade. Podemos, inclusive, não aplicar nenhum teste no momento,
simplesmente dedicar horas de jogo com uma criança, ou realizar entrevistas com um
adolescente ou adulto, mas isso não significa que deixaremos de fazê-lo mais adiante, no
momento mais oportuno.
Nestes casos pode acontecer que não se inclua o contato individual nem a relação
transferência-contratransferência, ou seja, o campo dinâmico que é criado em uma
entrevista individual. Tudo isso é excluído para poder-se obter informações sobre um grupo
muito maior no menor tempo possível. Se estivermos trabalhando em escolas, por exemplo,
é muito importante detectar patologias sérias e posteriormente, seriam convocados os
indivíduos cujo material apresenta o que é chamamdo de indicadores de conflito ou de
patologia. Será então necessário entrevistar os pais e fazer um estudo mais minucioso e
individual de cada um. Não podemos esquecer que objetivo de uma pesquisa assim realizada
é ajudar um número grande de pessoas, detectando precocemente a patologia, e esta é uma
técnica extremamente útil.
• Alguma hipótese inicial sobre o motivo profundo do conflito, a qual será ratificada
ou modificada, segundo o material projetivo dos testes e da entrevista de devolução;
Apesar de ter afirmado que o processo psicodiagnóstico consta de vários passos (e estes de
fato ocorrem), nunca se pode afirmar que um vem antes e o outro vem depois de uma forma
mecânica, fixa e estática. Tudo depende de diversas razões.
O primeiro consiste na primeira tomada de contato. Isto significa que nessa primeira etapa
teremos recebido o telefonema do paciente ou o pedido de um profissional para realizar o
estudo de um paciente determinado. Se quem nos solicita o estudo é o terapeuta que vai se
encarregar do tratamento, nosso papel ficara restrito basicamente à aplicação de testes
pertinentes.
Nestes casos é necessário tomar cuidado para não interferir demais na relação transferencial
que o paciente já tenha estabelecido com seu terapeuta. Numa consulta dessa natureza
tentaremos reduzir a entrevista inicial ao mínimo possível. Em alguns casos é bom trabalhar
praticamente às cegas, com dados mínimos de identidade do grupo familiar, motivo da
consulta, e muito especificamente o motivo que levou o terapeuta a solicitar o estudo. Seria
preferível que a devolução (que é um dos passos finais do processo) fosse feita pelo próprio
terapeuta na medida e no momento que considerasse adequado, e somente seria feita pelo
profissional que realizou o psicodiagnóstico se aquele o considera mais conveniente,
explicitando a razão.
O informe que enviaremos a esse profissional tem uma relevância especial, pois ali deve
estar contida toda a informação que ele necessita. Devemos então realiza-lo com dedicação
especial para poder cumprir com a finalidade a que se destina o estudo.
Se não for possível atingir os objetivos, será importante continuar com mais uma entrevista.
Isto acontece frequentemente com os pais de uma criança, pois cinqüenta minutos podem
ser insuficientes para todo esse trabalho. Podemos então prolongá-la ou fazer mais de uma
entrevista inicial.
No caso contrário, a situação é pouco promissora e seria aconselhável pensar que a terapia
individual do filho exclusivamente não é o mais adequado. Deve ser complementado com
orientação dos pais, ou indicação de terapia de casal, familiar, vincular, etc.
O enquadre pode ser mais estrito, mais amplo, mais permeável ou mais plástico, conforme
as diferentes modalidades do trabalho individual ou conforme as normas da instituição na
qual se trabalhe. Varia de acordo com o enfoque teórico que serve como marco referencial
predominante para o profissional, conforme a sua formação, suas características pessoais e
também conforme as características do cliente.
Alguns profissionais afirmam que trabalham sem enquadre. Esta afirmação, no entanto,
encerra uma falácia, pois essa posição de não-enquadre já é por si mesma uma forma de
enquadre, em todo caso do tipo laissez-faire.
Cada profissional assume um sistema de trabalho que o caracteriza, além das variáveis que
possa introduzir no caso.
A qualidade e o grau da patologia do cliente nos obrigam a adaptar o enquadre a cada caso.
Não é possível trabalhar da mesma forma com um paciente neurótico, com um psicótico ou
com um psicopata grave. Cada caso implica diferentes graus de plasticidade. Uma pessoa
absolutamente dependente exigirá esclarecimentos permanentes do que deve ou não fazer,
enquanto que outros sentirão nossas intervenções como interferências desagradáveis. Um
psicopata precisa ser limitado constantemente. O psicótico exige de nossa parte uma total
concentração. Precisa ser limitado, mas também cuidado e protegido e também precisamos
proteger-nos.
A idade do paciente também influi no enquadre escolhido. Com uma criança pequena,
sentaremos para brincar no chão se ela assim solicitar. Com adolescentes, sabemos que
precisamos ser mais tolerantes quanto à sua freqüência, sua pontualidade e suas
resistências para realizar certos testes dos quais “não gostam”. Talvez queiram antes acabar
de escutar uma música em seu mp3. Deixamos escutá-la até ele dizer que podemos começar.
Talvez também fizéssemos o mesmo com uma criança ou com um adulto psicótico.
Conclusão: é impossível trabalhar sem um enquadre, mas não existe um único enquadre.
Quando questionados sobre o enquadre que usamos, muitas vezes acontecerá que a
reflexão vem a posteriori da prática clínica. Em primeiro lugar, agimos, e depois refletiremos
sobre como e por que trabalhamos daquela forma. Bion recomenda trabalhar com absoluta
atenção flutuante e liberdade, e depois de terminada a sessão, então sim, é aconselhável
tomar notas e pensar sobre o ocorrido. No psicodiagnóstico isto se aplica principalmente à
entrevista inicial. Nas seguintes já é necessário agir de outra forma para atingir nosso
objetivo.
Seja com um adolescente, com um adulto ou com os pais de uma criança, a primeira
entrevista nos dará subsídios que facilitarão o enquadre a ser escolhido. Seu
comportamento, seu discurso, suas reações, são indicadores que nos ajudam a resolver que
tipo de enquadre usaremos, se mais estrito ou mais permissivo.
O enquadre inclui não somente o modo formulação do trabalho, mas também o objetivo do
mesmo, a freqüência dos encontros, o lugar, os horários, os honorários e, principalmente, o
papel que cabe a cada um.
O papel do psicólogo não é o de quem sabe, enquanto que o do paciente é o de quem não
sabe. Ambos sabem algo e ambos desconhecem muitas coisas que irão descobrindo juntos.
O que marca a assimetria de papéis é que o psicólogo dispõe de conhecimentos e
instrumentos de trabalho para ajudar o paciente a decifrar os seus problemas, a encontrar
uma explicação para os seus conflitos e para aconselhá-lo sobre a maneira mais eficiente de
resolvê-los.
Quando alguém chega pela primeira vez, perguntamos: “Em que posso ajudá-lo?” e com a
resposta obtemos a primeira chave sobre a forma de encarar o caso. Se a resposta for:
“Venho porque estou preocupado, estou muito nervoso, não consigo dormir, não me
concentro no trabalho e não sei porque isso acontece”, não nos provoca a mesma reação do
que se o indivíduo respondesse: “Não sei, foi o médico que me mandou porque estou com
úlcera e ele diz que é psicológico”. Perguntaríamos: “mas você, o que pensa. Acha que o
médico esta certo?” sua resposta pode ser afirmativa, o que abre uma perspectiva mais
favorável, ou pode responder: “Não, eu não acredito nessas coisas”. Essa resposta deixa
pouquíssima margem para encarar qualquer tipo de trabalho. Se o médico nos enviou seu
paciente e espera receber um informe psicológico, devemos explicar-lhe que mesmo que ele
não acredite faremos alguns testes para poder enviar ao médico uma resposta conforme o
que ele espera de nós.
Não sendo assim, é muito difícil realizar o psicodiagnóstico e, quase é conveniente colocar
que, o prorrogaremos até que ele sinta a necessidade de fazê-lo, até que esteja convencido
de que seu médico esta com razão. Do contrário, mesmo que ele faça de boa vontade o que
lhe pedirmos, as conclusões que obtivermos não terão valor nenhum para ele, e a entrevista
de devolução poderia tornar-se uma espécie de desafio no qual queremos convencê-lo de
algo que ele se nega a aceitar.
Alguns autores afirmam que existem certos aspectos do enquadre que permanecem
“mudos” até que alguma circunstância nos obriga a rompê-los, e então aparecem com
clareza.
Suponhamos que o terapeuta tenha sido sempre pontual, até que um dia um problema no
trânsito o obriga a chegar vinte minutos mais tarde. O paciente está esperando furioso,
quase o insulta e grita “porque o senhor deve estar aqui quando eu chego”. Se não houvesse
surgido esta “ruptura” do enquadre, essa reação teria permanecido sempre encoberta pela
seriedade do comportamento do terapeuta.
Sabemos em que tanto o profissional como o paciente, trazem para o encontro um aspecto
mais infantil e outro mais maduro. Se o contrato do psicodiagnóstico é feito sobre a base dos
aspectos infantis de ambos, os resultados serão negativos e perigosos.
Bleger, citado por Arzeno (1995), coloca em seu artigo La entrevista psicológica (publicação
interna da Faculdade de Filosofia e Letras da Universidade de Buenos Aires):
Para obter o campo particular da entrevista que descrevemos, devemos contar com um
enquadre fixo que consiste na transformação de certo conjunto de variáveis em constantes.
Dentro deste enquadre inclui-se não somente a atitude técnica e o papel do entrevistador
como o temos descrito, mas também os objetivos, o lugar e a duração da entrevista. O
enquadre funciona como um tipo de padronização da situação estímulo para ele, mas que
deixe de oscilar como variável para o entrevistador. Se o enquadre sofre alguma modificação
(por exemplo, porque a entrevista é realizada em um lugar diferente) essa modificação deve
ser considerada como uma variável sujeita à observação, tanto como o próprio entrevistado.
Cada entrevista possui um contexto definido (conjunto de constantes e variáveis) devido ao
qual ocorrem os emergentes e estes só fazem sentido e são significativos em relação e
devido a esse contexto. O campo da entrevista também não é fixo, mas dinâmico, o que
significa que está sujeito a uma mudança permanente, e a observação deve se estender do
campo específico existente a cada momento à continuidade e sentido dessas mudanças...
Cada situação humana é sempre única e original, sendo assim também o será a entrevista,
mas isso não se aplica somente aos fenômenos humanos, mas também aos fenômenos da
natureza, o que já era do conhecimento de Heráclito. Esta originalidade de cada
acontecimento não impede o estabelecimento de constantes gerais, ou seja, das condições
em que os fatos se repetem com maior freqüência. O individual não exclui o geral nem a
possibilidade de introduzir abstração e categorias de análise... a forma de observar bem é ir
formulando hipóteses enquanto se observa, e no transcurso da entrevista verificar e retificar
as hipóteses durante o seu próprio transcurso em função das observações subseqüentes
que, por sua vez, vão ser enriquecidas pelas hipóteses previas. Observar, pensar e imaginar
coincidem totalmente e fazem parte de um único processo dialético.
Como vemos, Bleger enfatiza a importância do enquadre para manter o campo da entrevista
de forma que uma série de variáveis (aquelas que dependem do entrevistador) se
mantenham constantes. Isso contribui para uma melhor observação.
Como colocamos anteriormente, tanto o terapeuta como o paciente, trazem um lado infantil
e ou outro mais maduro. O enquadre, ponto de partida de importância decisiva para o
processo psicodiagnóstico, tanto como para o terapêutico, se torna ainda mais complicado
quando consideramos que cada um dos pais e filhos também trazem ambos os aspectos. Por
isso, advertimos sobre o risco de que se estabeleçam situações nas quais são colocadas em
jogo as partes infantis (primitivas e onipotentes) de cada um, inclusive do próprio
profissional.
Perto do final da primeira entrevista, costumamos explicar ao paciente (ou aos seus pais)
que deverá fazer alguns desenhos, inventar algumas histórias, etc. e que logo após nos
reunimos para conversar sobre os resultados. Quando estiver prevista uma entrevista
familiar, devemos também adverti-lo com o tempo. Geralmente não há resistência quando é
dito que desejamos conhecer como é a família quando estão todos juntos.
Durante a hora do jogo diagnóstico e das entrevistas familiares diagnósticas, nosso papel
será o de um observador não participante. O mesmo acontece no momento de aplicar os
testes. Somente após colher a produção espontânea do indivíduo deveremos intervir mais
ao fazer algum inquérito e inclusive algum exame de limites.
Nosso papel é muito mais ativo durante a entrevista final, na qual o esperado é justamente
que demos a nossa opinião sobre o que ocorre. A recomendação da estratégia terapêutica
mais adequada deve ser formulada e devidamente fundamentada pelo profissional, dada a
autoridade que o seu papel lhe confere. Quando, para o paciente, é muito difícil assimilar
toda a informação que temos para dar-lhe, é aconselhável marcar mais de uma ou duas
entrevistas.
Cada instituição pode (e deve) fixar os limites dentro dos quais vai se desenvolver o trabalho
do psicólogo. Por exemplo, a duração de cada entrevista, o tipo de diagnóstico que se
espera, o modo de deixar registrado e arquivado o material, o tipo de informe final, etc. Mas
o tipo de bateria a ser usada e a sua seqüência é de responsabilidade exclusiva dos
psicólogos. Eles decidirão de comum acordo o modus operandi. Do contrário, podem ocorrer
situações ridículas, iatrogênicas e até legalmente objetáveis.
Seja com um adolescente, com um adulto ou com os pais de uma criança, a primeira
entrevista nos dará subsídios que facilitarão o enquadre a ser escolhido. Seu
comportamento, seu discurso, suas reações, são indicadores que nos ajudam a resolver que
tipo de enquadre usaremos, se mais estrito ou mais permissivo.
O enquadre inclui não somente o modo formulação do trabalho, mas também o objetivo do
mesmo, a freqüência dos encontros, o lugar, os horários, os honorários e, principalmente, o
papel que cabe a cada um.
Nesses casos, a primeira entrevista pode ser mais curta e centralizada na descrição daquilo
que causa preocupação no momento. Uma segunda consulta pode ser o mais indicado para
encontrar os indivíduos menos tensos e mais colaboradores. Se isso não ocorrer, a situação
será menos alentadora. Talvez tenham passado por uma experiência anterior muito
negativa, ou realmente não acreditem que possam ser ajudados por um psicólogo. Este é um
ponto no qual devemos deter-nos todo o tempo necessário, evitando assim que o estudo
precise ser interrompido mais adiante.
Quando se trata de um paciente de outro profissional, a primeira entrevista pode-se ter uma
breve conversa sobre dados de filiação, constelação familiar primária e atual, profissão, etc.
Se o cliente tem conhecimento do motivo pelo qual foi enviado e se já fez algo semelhante
antes. Esse momento deve levar entre dez e quinze minutos, e devemos evitar que se
transforme em um relato detalhado e prolongado da história da vida do paciente, já que é
isso que tende a estabelecer um vínculo transferencial que interfere naquele estabelecido
previamente com o seu terapeuta, confundindo o paciente. Nestas circunstâncias, o
psicólogo deve controlar a sua curiosidade e manter uma distância ideal que possibilite um
clima agradável para trabalhar, sem fomentar falsas expectativas no sentido de criar um
vínculo que muito brevemente será interrompido.
Retomando agora o assunto da primeira entrevista, tal como ela é realizada em termos
gerais, ou seja, depois de um primeiro contato telefônico com alguém que inicia a consulta
diretamente conosco.
A palavra estratégia não se refere a um plano rígido nem a uma dinâmica de entrevista
previamente planejada. Ao contrário, refere-se a resposta a essa pergunta que vai dar uma
pauta que dirigirá a nossa atenção para um ou outro caminho, dando-nos a possibilidade de
fazermos novas perguntas. Estabelece-se assim um diálogo e não um monólogo.
No início da primeira entrevista, nossas perguntas devem ser mínimas, para dar mais
liberdade ao sujeito ou casal de pais, mas à medida que formos elaborando hipóteses
presuntivas sobre o que estiver ocorrendo será imprescindível fazer comentários e perguntas
pertinentes.
É aquilo que está mais próximo da consciência e o que o indivíduo prefere mencionar em
primeiro lugar. Talvez, ao ter mais confiança, venha a mencionar outros motivos de
preocupação mais difíceis de comunicar. Estes são chamados de motivo latente ou
inconsciente da consulta, que poderá surgir à medida que formos realizando o estudo, e será
ou não transmitido ao paciente dependendo das circunstâncias.
Para sermos bem precisos, devemos esclarecer que existe uma distância enorme entre o
grau de consciência de doença com o qual o paciente chega para a primeira entrevista e
aquele que é obtido no início do tratamento, ou quando este já está bem adiantado. É nesse
momento que o paciente, a criança, o adolescente ou adulto, poderá falar de seus conflitos,
depois de tornar consciente o que era inconsciente, ou seja, quando à consciência de doença
original tenham sido incorporados aspectos importantes que pertenciam ao plano mais
inconsciente.
Isto significa que todo aquele que consulta percebe, mesmo a nível inconsciente, que há algo
mal e causa dor, mal-estar, etc. dramatizando-o ou visualizando-o como um sonho,
justamente para detectar este matéria.
Poderíamos agora acrescentar que não somente o sujeito que consulta tem a sua própria
fantasia inconsciente de doença, mas também cada um dos pais e o psicólogo possuem as
suas.
A fantasia inconsciente de doença é aquilo que o sujeito sente, sem dar-se conta disso, o que
passa por baixo do nível consciente. Tem relação com o sentimento de responsabilidade e
compromisso com o sintoma descrito consciente e se refere ao que está mal e à sua causa.
Se o paciente diz que: “Estou me sentindo mal porque não consigo me concentrar” e nós
perguntarmos o que ele acha sobre esse problema de não conseguir concentrar-se,
estaremos a caminho de descobrir algo sobre a sua fantasia inconsciente de doença.
O desfecho dos testes projetivos verbais com histórias é um elemento que dá uma
informação valiosa a respeito, e por isso é imprescindível incluir alguns deles na bateria de
testes.
Poderíamos dizer, em geral, que as fantasias iniciais de cura possuem um marcante toque
mágico onipotente que vão adquirindo características mais realistas e menos onipotentes à
medida que o sujeito amadurece.
Mesmo tendo que fazer uso do inquérito, principalmente sobre fatos que os pais ou o
próprio sujeito nos relataram, tentando fazer com que estes sejam amenos e,
principalmente, que mantenha certa lógica em relação ao assunto que está sendo tratado.
Uma vez conhecido o motivo manifesto da consulta, faremos perguntas sobre tudo o que
possa estar relacionado com ele. Por exemplo, se os pais dizem que a criança de sete anos
ainda molha a cama à noite, perguntaremos se ele tem um sono muito pesado, se bebe
muito liquido antes de dormir, qual é a atitude deles diante desse acontecimento, se o
menino está preocupado ou não com a sua enurese e aos poucos iremos entrando em níveis
mais profundos. Perguntaremos então se na família há algum membro enurético. Se tiverem
mencionado que o levam para a cama do casal porque assim ele não urina, perguntaremos
se isto interfere ou não nas relações sexuais do casal e finalmente indagaremos se, pelo
contrário, o levam para a sua cama para preencher um vazio que existe no casal e essa
super-estimulação provoca o sintoma. Se assim for, isso explicaria por que não consultaram
antes. Mas se agora, quando o menino se queixa de que assim não pode acampar nem
dormir na casa de algum amigo, a vergonha do menino encobre os seus sentimentos de
culpa por ser um terceiro incluído no casal ao qual realmente separa. Aqui, aparece então, o
motivo manifesto e o motivo latente da consulta. Ao mesmo tempo, os pais trazem como
motivo a enurese do filho, mas logo a seguir colocam as suas próprias cartas sobre a mesa. É
como se nos dissessem: “Viemos devido aos nossos conflitos sexuais”.
É essencial que o profissional esgote todas as perguntas que possam ter relação com este
assunto. Por exemplo, como foi a infância de cada um, que lembranças têm do vínculo com
os seus pais e irmãos, etc. Todo o resto é importante, mas deve ser perguntado como
complemento o assunto anterior.
Poderíamos, assim, dirigir nossas perguntas lembrando o seguinte:
3. Todo sintoma causa um beneficio secundário, sendo importante então calcular o que esse
sujeito obtém nesse sentido e o que ele perderia no caso de que abandonasse o sintoma.
Isso nos ajudará a medir as resistências que ele colocará para a superação do mesmo.
4. Sintoma expressa algo no nível familiar: a entrevista familiar diagnóstica nos dará maior
informação em relação a esse aspecto do que a entrevista inicial, mas mesmo assim,
deveremos estar alertas para captar sinais referentes a isso, desde o início.
Também os psicanalistas decidiram usar esse novo enfoque, familiar, de maneira que o
psicólogo dispõe agora de vários esquemas referenciais entre os quais poderá escolher o
mais convincente, sem omitir essa perspectiva tão importante na atualidade.
O sintoma esta expressando algo que não foi dito, ele ocupa o lugar dessa verdade não dita,
surge com e para outro. Seria inútil, então procurar a etiologia da doença exclusivamente
dentro do sujeito. Devem também ser explorados o contexto atual e a história familiar
dentro dos quais ela surgiu.
A Escola Francesa nos proporciona também outra hipótese de grande valor para
compreender o gênese de muitos problemas: o qual é o lugar do filho no desejo de seus pais:
é um prolongamento narcisístico ou falo da mãe? Ou é reconhecido como um-Outro com
autonomia e vontade próprias? Isso não pode ser objeto de um inquérito direto. É mais fácil
que seja observado nas entrevistas familiares. Se tivermos dúvidas, é indicado realizar uma
entrevista vincular mãe-filho e outra para pai-filho, além da familiar, para registrar fatos que
nos tragam informações a esse respeito.
Estes fatores contribuem para a criação de um conflito interno que provoca angústia e
mobiliza defesas. O sujeito entra então num quadro neurótico com formação e sintomas, os
quais, como afirmamos anteriormente, serão o motivo tanto manifesto como latente da
consulta.
Em relação aos recursos de que dispõe o psicólogo para registrar tudo o que é necessário
desde a entrevista inicial, cabe resumir o seguinte:
2. O registro do não verbal também é essencial e por isso o psicólogo deve ser um
ouvinte atento a gestos, lapsos, atuações, etc., que possuem um valor inestimável,
pois não são produtos de um discurso planejado, mas de um discurso do
inconsciente. Neste momento não é o inquérito, mas a observação atenta que serve
ao psicólogo como fonte de coleta de dados.
3. Finalmente, existe outro nível de registro com o qual o psicólogo pode contar: seu
registro contratransferencial. Para que ele seja confiável, o psicólogo deve ter
realizado uma boa psicanálise de forma a não confundir aquilo que ele registra como
algo do outro com efeitos das suas intervenções em áreas não resolvidas e si mesmo.
Por isso, assinalamos que o mais conveniente é começar pelo motivo manifesto da consulta
passando por todas as áreas que possam ter conexão com o mesmo, para logo investigar as
outras cautelosamente sem descartá-las sob nenhuma hipótese, já que podem surgir dados
muito valiosos.
Lembrar:
O sintoma apresenta um aspecto fenomenológico;
O sintoma apresenta um aspecto dinâmico;
Todo sintoma causa um beneficio secundário;
Sintoma expressa algo no nível familiar;
Todo sintoma implica o fracasso ou a ruptura do equilíbrio intrapsíquico prévio.
11 - REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA
ARZENO, Maria Esther Garcia. Psicodiagnóstico Clínico: novas contribuições. Porto Alegre:
Artes Médicas, 1995.
CUNHA, Jurema Alcides. Psicodiagnóstico V. Porto Alegre: Artes Médicas Sul, 2000.
OCAMPO, Maria Luiza Siquier e Col. O processo psicodiagnóstico e as técnicas projetivas. São
Paulo: Martins Fontes, 1981.
TRINCA, Walter. Diagnóstico psicológico: a prática clínica. São Paulo: EPU, 1984.
PSICOMETRÍA
A psicometria fundamenta-se na teoria da medida em ciências para explicar o sentido que têm
as respostas dadas pelos sujeitos a uma série de tarefas e propor técnicas de medida dos
processos mentais. Neste artigo são apresentados os conceitos e modelos da psicometria
moderna e discutidos os parâmetros de validade e precisão dos testes.
Historicamente, a psicometria tem suas origens na psicofísica dos psicólogos alemães Ernst
Heinrich Weber e Gustav Fechner. O inglês Francis Galton também contribuiu para o
desenvolvimento da psicometria, criando testes para medir processos mentais; inclusive, ele é
considerado o criador da psicometria. Foi, contudo, Leon Louis Thurstone, o criador da análise
fatorial múltipla, que deu o tom à psicometria, diferenciando-a da psicofísica. Esta foi definida
como a medida de processos diretamente observáveis, ou seja, o estímulo e a resposta do
organismo, enquanto a psicometria consistia na medida do comportamento do organismo por
meio de processos mentais (lei do julgamento comparativo).
A psicometria moderna tem duas vertentes: a teoria clássica dos testes (TCT) e a teoria de
resposta ao item (TRI). A TCT foi axiomatizada por Gulliksen(3) e a TRI foi inicialmente
elaborada por Lord(4) e por Rasch(5) e, finalmente, axiomatizada por Birnbaum(6) e por Lord(7).
De um modo geral, a psicometria procura explicar o sentido que têm as respostas dadas pelos
sujeitos a uma série de tarefas, tipicamente chamadas de itens. A TCT se preocupa em explicar
o resultado final total, isto é, a soma das respostas dadas a uma série de itens, expressa no
chamado escore total (T). Por exemplo, o T em um teste de 30 itens de aptidão seria a soma
dos itens corretamente acertados. Se for dado 1 para um item acertado e 0 para um errado, e
o sujeito acertou 20 itens e errou 10, seu escore T seria de 20. A TCT, então, se pergunta o que
significa este 20 para o sujeito? A TRI, por outro lado, não está interessada no escore total em
um teste; ela se interessa especificamente por cada um dos 30 itens e quer saber qual é a
probabilidade e quais são os fatores que afetam esta probabibilidade de cada item
individualmente ser acertado ou errado (em testes de aptidão) ou de ser aceito ou rejeitado
(em testes de preferência: personalidade, interesses, atitudes). Dessa forma, a TCT tem
interesse em produzir testes de qualidade, enquanto a TRI se interessa por
produzir tarefas (itens) de qualidade. No final, então, temos ou testes válidos (TCT) ou itens
válidos (TRI), itens com os quais se poderão construir tantos testes válidos quantos se quiser
ou o número de itens permitir. Assim, a riqueza na avaliação psicológica ou educacional,
dentro do enfoque da TRI, consiste em se conseguir construir armazéns de itens válidos para
avaliar os traços latentes, armazéns estes chamados de bancos de itens para a elaboração de
um número sem fim de testes.
O modelo da TCT foi elaborado por Spearman e detalhado por Gulliksen(3), o modelo é o
seguinte:
T=V+E
Onde,
T = escore bruto ou empírico do sujeito, que é a soma dos pontos obtidos no teste;
V = escore verdadeiro, que seria a magnitude real daquilo que o teste quer medir no sujeito e
que seria o próprio T se não houvesse o erro de medida;
A Figura 1 mostra a relação entre estes vários elementos do escore empírico, onde se vê que
este é a união do escore verdadeiro (V) e do erro (E), ou seja, o escore empírico ou bruto do
sujeito (T – resultado no teste, conhecido como o escore tau – τ) é constituído de dois
componentes: o escore real ou verdadeiro (V) do sujeito naquilo que o teste pretende medir e
o erro (E) de medida, este sempre presente em qualquer operação empírica. Em outras
palavras, estamos aqui assumindo que, diante do fato de que o escore bruto do sujeito difere
do seu escore verdadeiro, esta diferença é devida ao erro ou, melhor, esta diferença é o
próprio conceito de erro.
Assim, a grande tarefa da TCT consiste em elaborar estratégias (estatísticas) para controlar ou
avaliar a magnitude do E. Os erros são devidos a toda uma gama de fatores estranhos,
detalhados por Campbell e Stanley(8), tais como defeitos do próprio teste, estereótipos e vieses
do sujeito, fatores históricos e ambientais aleatórios.
Por outro lado, o modelo da TRI trabalha com traços latentes e adota dois axiomas
fundamentais:
2) A relação entre o desempenho na tarefa e o conjunto dos traços latentes pode ser descrita
por uma equação monotônica crescente, chamada de CCI (Função Característica do Item ou
Curva Característica do Item) e exemplificada na Figura 2, onde se observa que sujeitos com
aptidão maior terão maior probabilidade de responder corretamente ao item e vice-versa (θi é
a aptidão e Pi(θ) a probabilidade de resposta correta dada ao item).
Concretamente, a TRI está dizendo o seguinte: você apresenta ao sujeito um estímulo ou uma
série de estímulos (tais como, itens de um teste) e ele responde aos mesmos. A partir das
respostas dadas pelo sujeito, isto é, analisando as suas respostas aos itens especificados, pode-
se inferir sobre o traço latente do sujeito, hipotetizando relações entre as respostas
observadas deste sujeito com o nível do seu traço latente. Estas relações podem ser expressas
por meio de uma equação matemática que descreve a forma de função que estas relações
assumem.
Tanto na TCT quanto na TRI, os dois parâmetros mais importantes de legitimidade de uma
medida ou teste são a validade e a precisão.
Este caso da astronomia ilustra o que tipicamente acontece com a medida em ciências
psicossociais e, conseqüentemente, torna a prova da validade dos instrumentos nestas
ciências algo fundamental e crucial, ou seja, é uma condição sine qua non demonstrar a
validade dos instrumentos nestas ciências. Isto é particularmente o caso nos enfoques que, em
Psicologia, trabalham com o conceito de traço latente, onde se deve demonstrar a
correspondência (congruência) entre traço latente e sua representação física (o
comportamento). Não causa estranheza, portanto, que o problema de validade tenha tido, na
história da Psicologia, uma posição central na teoria da medida, constituindo-se, na verdade,
no seu parâmetro fundamental e indispensável.
Nos manuais de Psicometria, costuma-se definir a validade de um teste dizendo que ele é
válido se de fato mede o que supostamente deve medir. Embora esta definição pareça uma
tautologia, na verdade ela não é, considerada a teoria psicométrica que admite o traço latente.
O que se quer dizer com esta definição é que, ao se medirem os comportamentos (itens), que
são a representação física do traço latente, está-se medindo o próprio traço latente. Tal
suposição é justificada se a representação comportamental for legítima. Esta legitimação
somente é possível se existir uma teoria prévia do traço que fundamente que a tal
representação comportamental constitui uma hipótese dedutível desta teoria. A validade do
teste (este constituindo a hipótese), então, será estabelecida pela testagem empírica da
verificação da hipótese. Pelo menos, esta é a metodologia científica. Assim, fica muito
estranha a prática corrente na Psicometria de se agrupar intuitivamente uma série de itens e, a
posteriori, verificar estatisticamente o que eles estão medindo. A ênfase na formulação da
teoria sobre os traços foi muito fraca no passado; com a influência da Psicologia Cognitiva esta
ênfase felizmente está voltando ou deverá voltar ao seu devido lugar na Psicometria.
Aliás, a Psicometria clássica entende por aquilo que supostamente deve medir como sendo
o critério, este representado por teste paralelo. Assim, este aquilo que é o traço latente na
concepção cognitivista da Psicometria e é o critério (escore no teste paralelo) na visão
comportamentalista.
Diante destas dificuldades, os psicometristas recorrem a uma série de técnicas para viabilizar a
demonstração da validade dos seus instrumentos. Fundamentalmente, estas técnicas podem
ser reduzidas a três grandes classes (o modelo trinitário): técnicas que visam a validade de
construto, validade de conteúdo e validade de critério(11-12).
A validade de critério de um teste consiste no grau de eficácia que ele tem em predizer um
desempenho específico de um sujeito. O desempenho do sujeito torna-se, assim, o critério
contra o qual a medida obtida pelo teste é avaliada. Evidentemente, o desempenho do sujeito
deve ser medido/avaliado por meio de técnicas que são independentes do próprio teste que
se quer validar.
Costuma-se distinguir dois tipos de validade de critério: (1) validade preditiva e (2) validade
concorrente. A diferença fundamental entre os dois tipos é basicamente uma questão do
tempo que ocorre entre a coleta da informação pelo teste a ser validado e a coleta da
informação sobre o critério. Se estas coletas forem (mais ou menos) simultâneas, a validação
será do tipo concorrente; caso os dados sobre o critério sejam coletados após a coleta da
informação sobre o teste, fala-se em validade preditiva. O fato de a informação ser obtida
simultaneamente ou posteriormente à do próprio teste não é um fator tecnicamente
relevante à validade do teste. Relevante, sim, é a determinação de um critério válido. Aqui se
situa precisamente a natureza central deste tipo de validação dos testes, a saber: (1) definir
um critério adequado e (2) medir, válida e independentemente do próprio teste, este critério.
Quanto à adequação dos critérios, pode-se afirmar que há uma série destes que são
normalmente utilizados quais sejam:
1) Desempenho acadêmico. Talvez seja ou foi o critério mais utilizado na validação de testes de
inteligência. Consiste na obtenção do nível de desempenho escolar dos alunos, seja através
das notas dadas pelos professores, seja pela média acadêmica geral do aluno, seja pelas
honrarias acadêmicas que o aluno recebeu ou seja, mesmo, pela avaliação puramente
subjetiva dos alunos em termos de inteligente por parte dos professores ou colegas. Embora
seja amplamente utilizado, este critério tem igualmente sido muito criticado, não em si mesmo
mas pela deficiência que ocorre na sua avaliação. É sobejamente sabida a tendenciosidade por
parte dos professores em atribuir as notas aos alunos, tendenciosidade nem sempre
consciente, mas decorrente de suas atitudes e simpatias em relação a este ou aquele aluno.
Esta dificuldade poderia ser sanada até com certa facilidade, se os professores tivessem o
costume de aplicar testes de rendimento que possuíssem validade de conteúdo, por exemplo.
Como esta tarefa é dispendiosa, o professor tipicamente não se dá ao trabalho de validar
(validade de conteúdo) suas provas acadêmicas.
5) Diagnóstico subjetivo. Avaliações feitas por colegas e amigos podem servir de base para
estabelecer grupos-critério. É utilizada esta técnica, sobretudo, em testes de personalidade,
onde é difícil encontrar avaliações mais objetivas. Assim, os sujeitos avaliam seus colegas em
categorias ou dão escores em traços de personalidade (agressividade, cooperação, etc.),
baseados na convivência que eles têm com os colegas. Nem precisa mencionar as dificuldades
enormes que tais avaliações apresentam em termos de objetividade; contudo, a utilização de
um grande número de juizes poderá diminuir os vieses subjetivos nestas avaliações.
6) Outros testes disponíveis. Os resultados obtidos por meio de outro teste válido, que prediga
o mesmo desempenho que o teste a ser validado, servem de critério para determinar a
validade do novo teste. Aqui fica a pergunta óbvia: para que criar outro teste se já existe um
que mede validamente o que se quer medir? A resposta se baseia numa questão de economia,
isto é, utilizar um teste que demanda muito tempo para ser respondido ou apurado como
critério para validar um teste que gaste menos tempo.
No caso deste tipo de validade, é preciso atender a duas situações bastante distintas.
Primeiramente, quando existem testes comprovadamente validados para a medida de algum
traço, eles certamente constituem um critério contra o qual se pode com segurança validar um
novo teste. Entretanto, quando não existem testes aceitos como definitivamente validados
para avaliar algum traço latente, a utilização desta validação concorrente é extremamente
precária. Esta situação infelizmente é a mais comum. De fato, nós temos testes para medir
praticamente não importa o quê, como atestam os Buro's Mental Measurement Yearbooks,
que são publicados periodicamente com centenas e milhares de testes psicológicos existentes
no mercado. Neste caso, pode-se utilizar estes testes como critérios de validação, mas o risco é
demasiadamente grande, porque se está utilizando como critério testes cuja validade é pelo
menos duvidosa.
O parâmetro da precisão ou da fidedignidade dos testes vem referenciado sob uma série
elevada e heterogênea de nomes. Alguns destes nomes resultam do próprio conceito deste
parâmetro, isto é, eles procuram expressar o que ele de fato representa para o teste. Estes
nomes são, principalmente, precisão, fidedignidade e confiabilidade. Outros nomes deste
parâmetro resultam mais diretamente do tipo de técnica utilizada na coleta empírica da
informação ou da técnica estatística utilizada para a análise dos dados empíricos coletados.
Entre estes nomes, podemos relacionar os seguintes: estabilidade, constância, equivalência,
consistência interna.
A fidedignidade ou a precisão de um teste diz respeito à característica que ele deve possuir, a
saber, a de medir sem erros, donde os nomes precisão, confiabilidade ou fidedignidade. Medir
sem erros significa que o mesmo teste, medindo os mesmos sujeitos em ocasiões diferentes,
ou testes equivalentes, medindo os mesmos sujeitos na mesma ocasião, produzem resultados
idênticos, isto é, a correlação entre estas duas medidas deve ser de 1. Entretanto, como o erro
está sempre presente em qualquer medida, esta correlação se afasta tanto do 1 quanto maior
for o erro cometido na medida. A análise da precisão de um instrumento psicológico quer
mostrar precisamente o quanto ele se afasta do ideal da correlação 1, determinando um
coeficiente que, quanto mais próximo de 1, menos erro o teste comete ao ser utilizado.
O problema da fidedignidade dos testes era tema preferido da psicometria clássica, onde a
parafernália estatística de estimação deste parâmetro mais se desenvolveu, mas ele perdeu
muito em importância dentro da psicometria moderna em favor do parâmetro de validade. De
qualquer forma, dentro da TCT o coeficiente de fidedignidade, rtt, é definido estatisticamente
como a correlação entre os escores dos mesmos sujeitos em duas formas paralelas de um
teste, T1 e T2. Assim o coeficiente de fidedignidade se define como função da covariância
[Cov(T1,T2)] entre as formas do teste pelas variâncias ( e ) das mesmas, isto é, rtt =
onde,
Praticamente, existem duas grandes técnicas estatísticas para decidir a precisão de um teste,
ou seja, a correlação e a análise da consistência interna.
Para o caso da análise da consistência interna existe uma parafernália complexa de técnicas
estatísticas, que finalmente se reduzem a duas situações: a divisão do teste em parcelas - mais
comumente em duas metades - com a subseqüente correção pela fórmula de predição de
Spearman-Brown, e as várias técnicas do coeficiente alfa, sendo o mais conhecido o alfa de
Cronbach. Nesses casos, existe a aplicação de somente um teste numa única ocasião; as
análises consistem em verificar a consistência interna dos itens que compõem o teste. Trata-
se, portanto, de uma estimativa da precisão, cuja lógica é a seguinte: se os itens se entendem,
isto é, covariam, numa dada ocasião, então irão se entender em qualquer ocasião de uso do
teste.
CONCLUSÃO
REFERENCES
1. Stevens SS. On the Theory of Scales of Measurement. Science. 1946;103(2684):677-
80. [ Links ]
4. Lord FM. A theory of test scores. Iowa (IA): Psychometric Society; 1952. (Psychometric
Monograph, n. 7). [ Links ]
5. Rasch G. Probabilistic models for some intelligence and attainment tests. Copenhagen:
Danish Institute for Educational Research and St. Paul; 1960. [ Links ]
6. Birnbaum A. Some latent trait models and their use in inferring and examinee's ability. In:
Loed FM, Lord MR. Novick, statistical theories of mental test scores. Reading: Addison Wesley;
1968. p.17-20. [ Links ]
7. Lord FM. Applications of item response theory to practical testing problems. Hillsdale:
Erlbaum; 1980. [ Links ]
8. Campbell DT, Stanley J. Experimental and quasi-experimental designs for research. Skokie:
Rand McNally; 1973. [ Links ]
11. Pasquali L. Análise fatorial para pesquisadores. Porto Alegre: Artmed; 2005. [ Links ]
13. Cronbach LJ, Meehl PE. Construct validity in psychological tests. Psychol Bull.
1955;52(4):281-302. [ Links ]
14. Pasquali L.Validade dos testes psicológicos: será possível reencontrar o caminho? Psicol
Teor Pesq. 2007; 23 (n.esp):99-107. [ Links ]
15. Pasquali L. Psicometria: teoria dos testes na psicologia e na educação. Petrópolis: Vozes;
2004. [ Links ]
16. Pasquali L. TRI - Teoria de Resposta ao Item: teoria, procedimentos e aplicações. Brasília:
LabPAM/UnB; 2007. [ Links ]
17. Ebel RL. Must all tests be valid? Am Psychol. 1961;16 (10):640-7. [ Links ]
PSICOPATOLOGIA
Psicopatologia é um termo que se refere tanto ao estudo dos estados mentais patológicos,
quanto à manifestação de comportamentos e experiências que podem indicar um estado
mental ou psicológico anormal. O termo é de origem grega; psykhé significa alma e patologia,
estudo das doenças, seus sintomas. Literalmente, seria uma patologia da alma.
A psicopatologia enquanto estudo das anormalidades da vida mental é às vezes referida como
psicopatologia geral, psicologia anormal, psicologia da anormalidade e psicologia do
patológico. É uma visão das patologias mentais fundamentada na fenomenologia (no sentido
de psicologia das manifestações da consciência), em oposição a uma abordagem estritamente
médica de tais patologias, buscando não reduzir o sujeito a conceitos patológicos,
enquadrando-o em padrões baseados em pressupostos e preconceitos.
Karl Jaspers, o responsável por tornar a psicopatologia uma ciência autônoma e independente
da psiquiatria, afirmava que o objetivo desta é "sentir, apreender e refletir sobre o que
realmente acontece na alma do homem".
Andrew Sims
"O que a alma é, não nos cabe saber; com o que ela se parece, quais são suas
manifestações, é de grande importância." (Juan Luis Vives - 1538 - De Anima et Vita)
O que é psicopatologia?
Fenomenologia e psicopatologia
O que uma pessoa obviamente afetada por uma doença mental está realmente sentindo?
De que forma suas próprias experiências assemelham-se ou diferem da experiência dos outros
- tanto daqueles que estão bem quanto dos que estão doentes? É importante haver um
esquema para organizar os fenômenos que ocorrem.
Como podemos usar a palavra observador com relação à experiência interna de outra
pessoa? É exatamente aqui que o processo de empatia torna-se relevante. A psicopatologia
descritiva, portanto, inclui aspectos subjetivos (fenomenologia) e objetivos (descrição do
comportamento).
Como isso funciona na prática? A Sra. Jenkins reclama que é infeliz. É tarefa da psicologia
descritiva tanto obter os pensamentos e ações da paciente sem tentar explicá-los quanto
observar e descrever o comportamento da mesma - seus ombros caídos, o tenso retorcer e
remexer de suas mãos. A fenomenologia exige uma descrição muito precisa de como
exatamente ela sente-se internamente - "este horrível sentimento de não existir realmente" e
"não ser capaz de sentir nenhuma emoção".
Jaspers (1963) escreveu: "A fenomenologia, apesar de ser uma das pedras fundamentais
da psicopatologia, é ainda muito tosca". Um dos grandes problemas da utilização deste
método é a natureza confusa da terminologia. Idéias quase idênticas podem receber
diferentes nomes por pessoas de diferentes bases teóricas- por exemplo, a abundância de
descrições acerca de como uma pessoa pode conceituar a si mesma: auto-imagem, percepção
do corpo, catexia, etc.
A fenomenologia é um método empático que evidencia os sintomas, mas que não pode
ser aprendida por meio de livro. Os pacientes são os melhores professores, mas é bom saber o
que se está procurando, os aspectos práticos, clínicos, pelos quais o paciente descreve a si
mesmo, seus sentimentos e seu mundo. O médico tenta interpretar a natureza da experiência
do paciente – entendê-la suficientemente bem e senti-la tão intensamente a ponto de que o
relato de seus achados permita o reconhecimento do paciente. O método fenomenológico em
psiquiatria é inteiramente voltado para idéia de tornar a experiência do
paciente compreensível (esta é uma palavra técnica em fenomenologia; no entanto, aqui
queremos dizer "a capacidade de colocar-se no lugar do paciente"), de modo a permitir
classificá-lo e tratá-lo.
SAÚDE NORMAL
Saúde / Doença
2 - A doença pode ser considerada em termos físicos, como na afirmação de Griesinger (1845),
de que "doenças mentais são doenças do cérebro". Embora esta alegação ajuste-se aos
estados psiquiátricos orgânicos e possa abranger a deficiência de aprendizagem (retardo
mental), não é muito simples tentar incluir nesta definição todos os transtornos "neuróticos" e
os psicóticos; por outro lado, de forma alguma os transtornos de personalidade não se
encaixam aqui.
3 - De modo semelhante, as doenças podem ser descritas como aquelas condições que o
médico trata. Ao definir isto Kräupl Taylor (1980) declarou: "Para ser paciente é necessário e
suficiente a experiência vivida por uma pessoa ao sentir a necessidade de tratamento, ou, no
seu meio, que deve receber tratamento". Doença mental torna-se, então, um termo para
descrever os sintomas e a condição daquelas pessoas que são encaminhadas a um psiquiatra.
Esta descrição tautológica de doença tem alguma vantagem prática, já que não impede que
ferramentas terapêuticas sejam utilizadas com relação a um amplo espectro de problemas
humanos. Ela apresenta, no entanto, a desvantagem de permitir que a sociedade escolha
quem ela chamará de "doente mental", e, em um sistema social totalitário, o estado pode
decidir quais indivíduos com desvios deverão ser considerados doentes (Bloch e
Reddaway,1977).
4 - A doença pode ser considerada como uma variação estatística da norma, trazendo em si
mesma desvantagem biológica. Isto foi formulado por Scadding (1967) para a doença física e
desenvolvido para a doença psiquiátrica por Kendell (1975). Desvantagem biológica implica
fertilidade reduzida e/ou vida mais curta. Este estado de desvantagem torna-se difícil de
aplicar ao homem moderno, uma vez que ele aprendeu a controlar seu ambiente e sua
reprodução de tal maneira que o próprio termo desvantagem biológica torna-se questionável.
O que é uma vantagem biológica para o indivíduo pode ser uma desvantagem para a espécie, e
vice-versa.
5 - A doença tem implicações legais. Por exemplo, as circunstâncias que resultam em doença
podem dar direito à compensação legal; se o comportamento resulta da doença, isto pode
reduzir a pena. Da mesma maneira, a doença mental é um conceito que pode justificar
detenção compulsória em um hospital (Lei da Saúde Mental, 1983; Blugass, 1983) e criminosos
mentalmente enfermos são tratados pela lei de uma maneira diferente de outros criminosos
(Bluglass e Bowden, 1990).
Esta distinção entre normalidade e doença, saúde e enfermidade, nada tem de trivial.
"Uma grande parte da ética médica e muito de toda a base da política médica atual, privada e
pública, estão baseadas precisamente na noção de doença e normalidade. Por si mesmo, o
médico (dando-se conta ou não) pode fazer seu trabalho muito bem sem uma definição formal
de doença... Infelizmente, o médico não pode trabalhar tranqüilamente usando seu bom-
senso. Ele é atingido por dois ângulos: pelos consumidores vorazes e pelos conselheiros
pretensiosos" (Murphy, 1979).
Normalidade/anormalidade
A norma de valor tem o ideal como seu conceito de normalidade. Assim, a afirmação "é
normal ter dentes perfeitos" está usando a palavra normal em sentido de valor - na prática, a
maioria das pessoas tem, no mínimo, algum problema com seus dentes.
O comum/o esotérico
O método fenomenológico facilita a comunicação; seu uso faz com que seja mais fácil
para o médico entender o paciente. Isto também ajuda o paciente a ter mais confiança no
médico, pois percebe que seus sintomas são entendidos e, portanto, aceitos como “reais”. A
descrição precisa e a avaliação dos sintomas auxilia na comunicação entre os médicos.
Sintoma/sinal
A medicina clínica faz uma clara distinção entre sinais e sintomas. O paciente queixa-se
de sintomas, como se sentir agitado e desconfortável no calor, com
hipertireoidismo. Sinais físicos são detectados no exame: um leve bócio com ruído audível,
perda de peso, pulso rápido e exoftalmia.
Esta distinção não é normalmente feita com os fenômenos do estado mental. A descrição
do paciente de um fenômeno mental anormal é geralmente chamada de sintoma, quer ele
queixe-se de algo que o perturba, ou simplesmente descreva sua experiência mental, que
parece patológica para um observador. Em seu relato acerca de suas experiências, ambos são,
portanto, considerados sintomas. Quando agregados, esses sintomas podem ser considerados
como sinais de qualquer diagnóstico indicado.
O sintoma, pois, considerado como incluindo o sinal, pode ser uma queixa (p.ex., um
sentimento de infelicidade) ou um item de descrição fenomenológica que pode não
representar queixa do paciente (p.ex., ouvir vozes que discutem baixinho sobre o paciente,
com perplexidade e admiração). O sentimento de infelicidade pode ser um sinal de doença
depressiva; as alucinações auditivas podem ser um sinal de esquizofrenia. Há, também,
sintomas ou sinais comportamentais, como no paciente que grita para o teto – isto pode ser
considerado como um sinal que sugere alucinação auditiva. Shneider (1959) considera que
um sintoma, na esquizofrenia, é uma “característica freqüente e, portanto, importante, deste
estado”. Para que um sintoma seja usado no diagnóstico, sua ocorrência deve ser típica desta
condição e deve ocorrer com relativa freqüência na mesma.
Ouvir e observar são cruciais para o entendimento. Deve-se tomar muito cuidado ao se
fazerem perguntas. Os médicos muitas vezes identificam sintomas incorretamente e fazem o
diagnóstico errado pois fizeram perguntas capciosas com as quais o paciente, por meio de sua
submissão ao status do médico e ansiedade para cooperar, está completamente disposto a
concordar.
Pergunta - “Você diz que seus pensamentos estão mudando; o que acontece com eles?”
Resposta – O paciente descreve seus pensamentos recorrentes sobre matar pessoas e a
afirmação de que isto se origina de uma dor em seu estômago.
Pergunta – (Tentando isolar os elementos de sua experiência) “Como é este seu
pensamento de matar pessoas?” (obsessão, delírio, fantasia, chance de se transformar em
atuação, etc.) “Você acredita que seu estômago afeta seu pensamento?; É diferente de uma
pessoa que sabe que fica irritada quando está com fome?; De que maneira isto é diferente?; O
que causa sua dor no estômago?”
Resposta – O paciente descreve os detalhes, que incluirão, entre o material irrelevante, o
tipo de informação essencial para a determinação dos sintomas presentes.
Pergunta – (O convite à empatia) “Estou certo ao pensar que você está descrevendo uma
experiência na qual raios estão causando dor em seu estômago, e que este, de alguma
maneira bastante independente de você, causa este pensamento que o assusta, de que você
deve matar alguém com uma faca?” Isto é um relato dos sintomas relevantes que ele
descreveu na linguagem que pode reconhecer como sua.
Resposta – “Sim” (nós, então, alcançamos nosso objetivo); “Não” (portanto, devo tentar
evocar novamente os sintomas, experimentá-los por mim mesmo e descrevê-los outra vez ao
paciente).
Para dar exemplos do que isto significa na prática: Como eu, um médico, decido se um
determinado paciente está deprimido ou não? Isto não é feito pela imitação de uma máquina
que poderia registrar unidades de tom vocal ou de expressão facial, chegando a um
diagnóstico de depressão. Para a avaliação clínica, sigo o seguinte processo:
1. Eu sou capaz de sentir-me infeliz, miserável, deprimido e saber como é este sentimento
dentro de mim.
2. Se eu estivesse me sentindo como vejo o paciente se sentindo, falando, atuando, etc,
também me sentiria miserável, deprimido, infeliz.
3. Portanto, eu avalio o humor do paciente como sendo de depressão. É claro que este
processo mental de diagnóstico não é geralmente verbalizado.
Em outro exemplo, um paciente diz: “Os marcianos estão me fazendo dizer palavrões, não
sou eu que estou dizendo isto.” O questionamento empático revela a falsa crença do paciente
de que quando palavrões vêm de sua boca ele acredita que a causa está fora de si mesmo
(marcianos), em vez de dentro de si. O questionamento incluiria: “Você realmente ouve os
marcianos? Como você sabe que são marcianos e ninguém mais?”, etc.
Um outro exemplo não-psicótico seria o de uma garota de 20 anos de idade que desmaia
quando criticada em seu trabalho. O médico precisa colocar-se, mesmo sendo um homem de
55 anos, de uma diferente formação, na posição da paciente, com um conhecimento não
somente de sua história social, mas também da maneira como ela, no presente, percebe a
história. Somente depois disto o desenvolvimento de seus sintomas pode se tornar
compreensível. Quando tomamos conhecimento, por exemplo, de seu pai com abuso de
álcool, das discussões deste com a mãe epiléptica da paciente, da experiência cultural restrita
da família em uma aldeia de pescadores isolada; quando sabemos que a mãe tinha um ataque
quando as discussões com o marido tornavam-se intoleráveis – podemos começar a entender
alguma coisa sobre o desenvolvimento do sintoma da própria paciente. Isto não é alcançado
somente por explicação, como um observador externo, mas pelo entendimento empático e
pela capacidade de experiência subjetiva por parte do médico.
Talvez uma analogia da medicina geral fosse útil aqui. O médico experiente apalpa um rim
aumentado no abdome de seu paciente (Figura 1.2). Ele convida os estudantes de medicina a
apalparem o abdome bimanualmente para que possam aprender a experimentar esta
sensação quase imperceptível, mas ainda assim significativa. O método fenomenológico de
empatia empregado em psiquiatria é mais difícil de ensinar do que este. É como se o médico
tivesse que realizar este exame sem as mãos (Figura 1.3)! Primeiro, ele precisa treinar o
paciente a apalpar seu próprio abdome bimanualmente de maneira correta e, depois,
descrever de forma precisa o que sente. O médico, então, interpreta a descrição do paciente
para decidir se o rim está dilatado sem poder ele próprio colocar a mão no abdome.
O uso da fenomenologia para a avaliação no estado mental pode ser comparado com o
exame do campo no microscópio. Não se pode esperar extrair algum sentido da amostra de
sangue apenas olhando e focalizando. Deve-se mover a lâmina e conseguir um bom exemplo
para demonstrar o ponto de interesse da massa não-diferenciada. Assim, a conversa do
paciente pode ter demonstrado muitas idéias estranhas e delírios bizarros, mas talvez somente
uma vez o entrevistador possa obter uma descrição totalmente satisfatória de determinado
sintoma psicopatológico de particular importância diagnóstica.
Comportamento aleatório/significado
Um leigo qualquer, comentando o “comportamento maluco”, pode dizer que este não
tem sentido; mas, como o significado não é sempre aparente para um observador ou mesmo
para a vítima, não se pode negar que não é real, apesar de psicótico, para o paciente: “Uma
ação é, a princípio, intencional” (Sartre, 1943).
Compreensão/explicação
Iniciamos com a premissa de que o comportamento significa algo, isto é , que surge com
consistência interna, a partir de eventos psíquicos. Embora o comportamento de um paciente
possa ser significativo para ele, pode não ser possível para nós, os observadores externos,
entendê-lo. Existem muitos níveis nos quais podemos entender. Por exemplo, podemos ter
algum entendimento das dificuldades sexuais de um exibicionista reincidente ao saber sobre
sua infância perturbada; mas isto ainda não se explica por que ele regularmente repete o
comportamento que o faz entrar em conflito com a lei, prejudicando-o socialmente e à sua
família. Wittgenstein (1953) afirmou: “Nós explicamos comportamentos humanos dando
razões, não causas”.
Compreensão Explicação
4. A explicação genética consiste na descoberta de conexões causais: ela descreve uma cadeia
de eventos e por que eles seguem esta seqüência. Compreender e explicar são partes
necessárias da investigação psiquiátrica.
Jaspers faz uma distinção importante entre o que é significativo e permite empatia, e o
que é, em última instância, incompreensível – a essência da experiência psicótica. Apesar de o
observador possivelmente empatizar com o conteúdo de um delírio de um paciente em
qualquer situação particular, ele não pode compreender ou ver uma conexão significativa na
ocorrência do delírio por si só. O delírio como um evento não é compreensível: para o médico,
parece incompreensível e irreal. Podemos compreender pelo conhecimento do passado da
paciente porque, caso seu pensamento tiver um transtorno na forma, o conteúdo deste
pensamento refere-se à perseguição pelos nazistas – talvez porque seus pais escaparam da
Alemanha em 1937. Mas não podemos compreender a razão pela qual ela deve acreditar em
algo que é claramente falso: que os perseguidores estão colocando uma substância sem gosto
em sua bebida que a faz sentir-se doente. O delírio, em si mesmo, como forma
psicopatológica, é incompreensível. Conexões significativas, então, mostram o vínculo entre
diferentes eventos psicológicos, pela compreensão de como tais eventos surgem um dos
outros, por um processo de empatia.
Primário: secundário
Estes dois significados distintos do termo primário obscurecem a distinção crucial entre
conexões significativas e conexões causais. Para evitar dúvidas em física e química, fazemos
observações por meio de experimentos e então formulamos conexões e leis causais, ao passo
que, em psicopatologia, experimentamos outro tipo de conexão, na qual eventos psíquicos
emergem uns dos outros de uma maneira que pode ser compreendida – as
chamadas conexões significativas (Robinson, 1984, comunicação pessoal).
A ANÁLISE DE EXPERIÊNCIA
O que o paciente considera importante ao oferecer a história de seus sintomas e causas
de aflição pode não ser necessariamente idêntico ao que o médico ou examinador considera
importante. O médico pode muito bem estar tentando determinar as entidades
psicopatológicas que estão presentes, talvez para fazer um diagnóstico, enquanto o paciente
está preocupado em comunicar a agonia que vive, sua intensidade e a forma como esta é
percebida como uma ameaça.
Predição/quantificação
Na acusação feita à psiquiatria – de não ser científica por não ser quantificável – existem
duas percepções incorretas. Em primeiro lugar, a quantificação não é fundamental para a
ciência, mas secundária. O fundamental, para o conhecimento fatual ou ciência, é que esta
tenha uma qualidade suficientemente boa para ser preditiva. Por exemplo, saber que a maçã,
solta no ar, cairá, é o princípio essencial da ciência: medir e, portanto, quantificar sua
velocidade depende da observação e da previsão inicial. Em segundo lugar, é possível
quantificar a psicologia subjetiva que tem usado a fenomenologia no estágio de formação de
hipóteses. Exemplos disto serão descritos em maiores detalhes posteriormente, incluindo
auto-avaliações para a depressão, localização do self dentro do espaço semântico na Grade de
Repertório; automedições de peso na anorexia nervosa e assim por diante. São necessários
métodos indiretos e criativos para a quantificação da psicopatologia, mas isto é possível e, com
freqüência, vantajoso.
Popper (1959) introduziu o teste de falsificabilidade para a ciência: uma teoria pode ser
falsificável como um critério de definição. A fenomenologia, a descrição do estado subjetivo do
indivíduo, é falsificável: está disponível para a refutação, e parte do método empático diz
respeito a convidar o paciente a refutar o relato do entrevistador sobre a experiência anterior
do primeiro. Portanto, as teorias fenomenológicas podem ser falsificadas a partir das
argumentações do próprio paciente.
Forma: conteúdo
A hipocondria é uma doença de conteúdo, mais do que de forma. A forma pode ser
variada. Ela poderia tomar a forma de uma alucinação auditiva, na qual o paciente ouve uma
voz dizendo: “Você tem câncer”; pode ser um delírio, quando ele acredita falsamente e com
evidência delirante que tem câncer; pode ser, também, uma idéia supervalorizada, quando ele
passa a maior parte do dia checando sua saúde, pois acredita que está doente; pode ser uma
anormalidade de afeto, que se manifesta em extrema ansiedade hipocondríaca ou um
desânimo hipocondríaco de fundo depressivo. De modo semelhante, o ciúme mórbido é um
transtorno do conteúdo, no qual a forma expressa-se de várias maneiras: alucinatória,
delirante, através de uma idéia supervalorizada, como um comportamento compulsivo ou um
pensamento obsessivo; mas o conteúdo é compreensível em termos da situação de vida do
paciente.
Subjetivo/objetivo
A objetividade na ciência passou a ser reverenciada como o ideal, de modo que somente o
que é externo à mente é considerado real, mensurável e válido. Trata-se de um erro, porque
necessariamente avaliações objetivas são subjetivamente carregadas de valor naquilo que o
observador escolhe medir; e é possível tornar este aspecto subjetivo mais preciso e confiável.
Há sempre julgamentos de valor associados a avaliações subjetivas e objetivas. O processo de
fazer uma avaliação científica consiste de vários estágios: receber um estímulo sensorial,
perceber, observar (tornar significativas as impressões), anotar, codificar e formular hipóteses.
Este é um processo progressivo de se descartar informações, e é o julgamento subjetivo do
que é válido que determina a pequena quantidade de cada estágio que é retido para
transmissão à próxima parte do processo. “Não existe algo como uma observação sem idéias
preconcebidas” (Popper, 1974).
Quando alguma coisa vivida tem uma qualidade de “sensação”, diz-se também que tem
uma qualidade de “objetividade” se a pessoa que a vive sente que, sob circunstâncias
favoráveis, ele seria capaz de viver a mesma coisa com outra modalidade de sensação que
aquela que provocou a qualidade de sensação. Quando algo que se experimentou tem uma
qualidade de “ideação”, isto é, não está sendo diretamente percebido no momento, é também
dito que tem uma qualidade de “objetividade” se o experimentador sente que, sob
circunstancias favoráveis, ele seria capaz, ainda assim, de viver a mesma coisa com, no
mínimo, duas ou mais modalidades de sensação.
Algo experimentado tem uma qualidade de “subjetividade” se quem o vive sente que sob
circunstâncias favoráveis ele seria capaz de viver esta coisa com duas ou mais modalidades de
sensação.
Assim, olho para a mesa à minha frente como uma percepção visual ou posso virar minha
cabeça e ainda fantasiá-la como uma imagem visual. Enquanto “vejo a mesa”, em qualquer
destas formas, o fato de eu poder imaginar ouvir um som se eu batesse na mesa com uma
colher e machucar meus dedos se desse um soco nela, confirma sua qualidade de objetividade.
Se eu usar minha imaginação para criar em minha mente uma imagem visual de uma cadeira
que nunca realmente vi, mas que é um composto de objetos e quadros que vi, sei que nunca
serei capaz de sentir ou ouvir esta cadeira de fato – esta é uma imagem subjetiva sem
realidade externa, objetiva.
Processo/desenvolvimento
Da mesma maneira que o entendimento e a explicação dependem da perspectiva do
entrevistador – empaticamente de dentro ou observando de fora - ,
assim processo ou desenvolvimento dependem do modo pelo qual a pessoa vivencia um
acontecimento dentro de seu padrão usual de vida, ou fora do mesmo. O desenvolvimento
significa que uma experiência é compreensível em termos da constituição e da história da
pessoa; transtornos de personalidade seriam vistos como alterações do desenvolvimento. O
processo é visto como a imposição de um evento “de fora”; a epilepsia seria experimentada
como uma ocorrência da doença separada do desenvolvimento normal – o processo da
doença interrompeu o curso normal da vida. De maneira similar, o início de uma doença
esquizofrênica freqüentemente produz uma “ruptura” definitiva na história de vida de um
adolescente.
Esta abordagem para o fenômeno psíquico anormal contrasta de forma acentuada com
outras molduras teóricas da psicopatologia, como a psicanalítica. Na psicanálise, no mínimo
um de vários mecanismos supostamente ocorre, e o estado mental torna-se compreensível
dentro deste referencial. Explicações do que ocorre no pensamento ou no comportamento
baseiam-se nestes processos teóricos subjacentes, como transferência ou mecanismos de
defesa do ego. Por exemplo, no caso de um delírio, a psicopatologia descritiva tenta descrever
aquilo em que a pessoa acredita, como ela descreve sua experiência de acreditar, que
evidências dá para sua veracidade e qual é o significado desta crença para sua situação de
vida. Tenta-se avaliar se sua crença tem as características exatas de um delírio e, se tiver, de
que tipo de delírio. Após esta avaliação fenomenológica, a informação obtida pode ser
utilizada de maneira diagnóstica, prognóstica e, como conseqüência, terapêutica. Alguns dos
contrastes entre psicopatologia descritiva e dinâmica são resumidos na Tabela 1.2.
Descritiva Psicanalítica
Estudo das raízes do comportamento
Avaliação empática da experiência
Resumo atual e experiência consciente por
subjetiva do paciente.
meio de conflitos inconscientes.
Consciente/inconsciente
A fenomenologia não pode estar envolvida com o inconsciente, visto que o paciente não
pode descrevê-lo, e, portanto, o médico não pode sentir empatia. A psicopatologia descritiva
não possui uma teoria do inconsciente, nem nega sua existência. A mente inconsciente está
simplesmente fora de seus termos de referência, e eventos psíquicos são descritos sem se
recorrer a explicações que envolvam o inconsciente. Os sonhos, os conteúdos do transe
hipnótico e os deslizes da língua (atos falhos) são descritos de acordo com o modo como o
paciente experienciou-os, isto é, de acordo com a forma como se manifestam na consciência.
Orgânico: sintomático
Cérebro/mente
René Descartes (1596 – 1650) examinou, formulou e reafirmou pontos de vista sobre a
separação entre corpo e mente. Ele descreveu “L’âme raisonable” – a alma que pensa está
alojada na máquina, tendo sua sede principal no cérebro. Ele descreveu a alma como o
engenheiro que alterava os movimentos da máquina, o corpo (1649). Descartes foi um homem
de seu tempo, refletindo e desenvolvendo concepções dicotômicas da relação cérebro-mente.
Um exemplo deste dualismo cartesiano, que ocorreu antes mesmo de Descartes, é a seguinte
inscrição obituária para Lady Doderidge, que morreu em 1614:
Esta clara afirmação de uma absoluta separação entre corpo e alma encontra-se em seu
túmulo, que pode ser visitado na Catedral de Exerter.
As idéias básicas para o atendimento dos sintomas do paciente são elaboradas usando-se
o método de empatia e significado do comportamento, ou seja, a compreensão e a explicação
dos eventos psíquicos. O comportamento do paciente é analisado, adicionalmente, em termos
de forma e conteúdo, avaliação subjetiva e objetiva. As posições teóricas da psicopatologia
descritiva foram discutidas e comparadas com métodos psicanalíticos e com o enfoque
biológico da doença mental. O conceito de mente foi brevemente discutido.