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FIGUEIREDO, Residências Ecléticas em Santa Teresa

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Residências Ecléticas em Santa Teresa:

A Rua Joaquim Murtinho entre 1910-1920

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO


Programa de Pós-graduação em Arquitetura
PROARQ – FAU/UFRJ

Postulante
Ana Maria Mendes de Figueiredo

Orientadora
Prof.ª Drª. Beatriz Santos de Oliveira

Dissertação de Mestrado apresentada ao


Programa de Pós-graduação em Arquitetura,
Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, da
Universidade Federal do Rio de Janeiro, como
parte dos requisitos necessários à obtenção do
título de Mestre em Arquitetura.

Maio, 2011.

1
FOLHA DE APROVAÇÃO

FAU / UFRJ – PROARQ: Programa de Pós-graduação em Arquitetura

Residências Ecléticas em Santa Teresa:


A Rua Joaquim Murtinho entre 1910-1920

Postulante
Ana Maria Mendes de Figueiredo

Orientadora
Prof.ª Drª. Beatriz Santos de Oliveira

MEMBROS DA BANCA

Profª. Drª. Beatriz Santos de Oliveira (Orientadora)

Profª. Drª. Cláudia Nóbrega (PROARQ)

Profª. Drª. Cláudia R. de Carvalho (Fundação Casa de Rui Barbosa)

Profª. Drª. Elizabete Rodrigues de C. Martins (PROARQ)

II
DEDICATÓRIA:

A minha mãe e ao meu pai (in memoriam), por tudo.


Aos meus irmãos Alberto Henrique e José Eduardo e
as minhas cunhadas Márcia e Maria Helena,
pelo carinho e compreensão.

III
AGRADECIMENTOS

Primeiramente, à professora Beatriz Santos de Oliveira pela sua orientação


competente e pelo seu incentivo nos momentos mais difíceis da pesquisa.
Aos proprietários da Rua Joaquim Murtinho que me dedicaram enorme atenção
durante as visitas realizadas.
À Coordenadora de Ensino, Professora Rosina Trevisan Ribeiro, pelo inestimável
apoio nas reuniões realizadas pelo Conselho do PROARQ.
Às funcionárias da Secretaria do PROARQ, Maria da Guia, Rita e Wanda pela
atenção sempre dispensada.
Aos funcionários e estagiários do Arquivo Geral da Cidade do Rio de Janeiro
pelo atendimento e presteza no fornecimento das cópias dos projetos apresentados
neste trabalho.
Ao profissional Bruno Lopes pelo competente trabalho gráfico realizado.
Aos colegas de turma, pelo bom relacionamento proporcionado, e aos
professores das disciplinas cursadas durante o Mestrado pelos ensinamentos
transmitidos.

IV
F475 Figueiredo, Ana Maria Mendes de,
Residências ecléticas em Santa Teresa: a Rua Joaquim
Murtinho entre 1910-1920/ Ana Maria Mendes de Figueiredo.
– Rio de Janeiro: UFRJ/FAU, 2011.
ix,229 f. Il.; 30 cm.

Orientador: Beatriz Santos de Oliveira.


Dissertação (Mestrado) – UFRJ/PROARQ/Programa de
Pós-Graduação em Arquitetura, 2011.
Referências bibliográficas: p.223-229.

1. Arquitetura – Teoria. 2. Arquitetura – História. 3.


Ecletismo na arquitetura – Rio de Janeiro, RJ). I. Oliveira,
Beatriz Santos de. II. Universidade Federal do Rio de
Janeiro, Faculdade de Arquitetura e Urbanismo,
Programa de Pós-Graduação em Arquitetura. III. Título.

CDD 720.1

V
RESUMO

O objetivo da presente dissertação é compreender a maneira como, diante da


especificidade local, foi exercido o ecletismo presente nas casas edificadas na Rua
Joaquim Murtinho, em Santa Teresa, entre 1910 e 1920, período em que se deu a
ocupação efetiva do lugar, conforme constatado nos projetos encontrados e
consultados no Arquivo Geral da Cidade do Rio de Janeiro. Foi necessário investigar os
fatores vinculados às decisões projetuais, no que diz respeito à relação histórica e física
entre contexto e projeto, à ordenação espacial, à concepção volumétrica e ao emprego
das tendências estilísticas. Este estudo procurou cumprir uma das etapas necessárias
ao desenvolvimento de um trabalho crítico em arquitetura, que consiste em dar ênfase
à obra a partir de uma análise formal. Esta metodologia de investigação morfológica
teve como suporte a seleção das categorias recorrentes nos trabalhos desenvolvidos
por autores como Geoffrey Baker, Philippe Boudon e Francis Ching.
Este estudo foi estruturado em três capítulos. O primeiro focaliza aspectos
históricos referentes ao bairro, alem de analisar a rua e seus primeiros proprietários, a
casa do início do século e particularidades da arquitetura local. O segundo capítulo
apresenta os quinze projetos selecionados dentre aqueles encontrados no AGCRJ, e
destaca dados gerais sobre os mesmos com base em análise comparativa. O terceiro e
último focaliza cinco dentre esses quinze, levantando as informações contidas nos
mesmos, a fim de formular os argumentos necessários interpretados na conclusão.

VI
ABSTRACT

The purpose of this dissertation is to understand how, before the local specific
characteristics, was exercised the eclectism in the buildings of Rua Joaquim Murtinho in
Santa Teresa, between 1910 and 1920, period in which happened the occupation of that
place as evidenced in the projects found and consulted in the Arquivo Geral da Cidade
do Rio de Janeiro. It was necessary to investigate factors related to the project decisions
with respect to the relationship between physical and historical context and design,
spatial ordering, volumetric design and employment of the stylistic trends. This study
sought to fulfill one of the steps needed to develop a critical work in architecture, which
is to give emphasis on the work from a formal analysis. This methodology of
morphological investigation has been supported by the selection of recurrent categories
in the works developed by authors such as Geoffrey Baker, Philippe Boudon and
Francis Ching.
This study was organized into three chapters. The first focuses on the historical
aspects concerned with neigborhood, and, also, analyses the street and its first owners,
the house of the beginning of the century and the particularities of local architecture. The
second chapter presents fifteen projects selected among those found in AGCRJ, and
highlights some general data about them based on comparative analisys. The third and
final chapter focuses on five of these fifteen, raising information in these projects in
order to formulate the necessary arguments interpreted in the conclusion.

VII
SUMÁRIO

Introdução 1

Capítulo 1: O Bairro de Santa Teresa e a Rua Joaquim Murtinho 8


1.1 – Considerações sobre a ocupação do morro de Santa Teresa 8
1.2 – A Rua Joaquim Murtinho 16
1.2.1 – A ocupação e os proprietários que nela se instalaram 16
1.2.2 –As residências ecléticas: Santa Teresa e a casa do
Início do século 23

Capítulo 2 : Os projetos residenciais da Rua Joaquim Murtinho (1910-1920) 34

Capítulo 3: Projeto e análise de cinco residências 83


3.1 – Casa de Marcolino Rodrigues 90
3.2 – Casa de João Pedro de Fraga Lourenço 117
3.3 – Casa de Tobias Correa do Amaral 143
3.4 – Casa de José Ferreira Macedo Terra 165
3.5 – Casa de Mário Aurélio da Silveira 187

Conclusão 208
Lista de figuras 213
Referências Bibliográficas 223

VIII
Introdução

A motivação em desenvolver um estudo sobre a arquitetura eclética carioca está


na minha antiga admiração pela paisagem arquitetônica que, felizmente, ainda hoje
compõe o cenário histórico do centro da cidade do Rio de Janeiro. Procurei, durante o
processo seletivo do Curso de Mestrado, conhecer um pouco melhor a história da
arquitetura produzida na cidade no início do século XX e percebi que o Bairro de Santa
Teresa, que já conhecia de visitas esporádicas, tinha se transformado em um dos
principais redutos da elite carioca desse período. Foi assim que surgiu um conjunto de
sobrados de inegável valor histórico, admirado por pesquisadores, artistas e turistas, e
que, desde 1984, encontra-se preservado pela Área de Proteção do Ambiente Cultural
(APAC), um dos principais instrumentos governamentais de execução da política de
valorização do patrimônio cultural.
Interessada pelo tema, comecei a levantar o estado da arte sobre o assunto e
encontrei, em relação ao bairro, o relevante trabalho de doutorado da professora
Elizabete Rodrigues de Campos Martins1, no entanto, sobre os imóveis lá construídos,
embora exista uma boa bibliografia a respeito do ecletismo no Brasil 2, pouco material foi

1
MARTINS, Elizabete Rodrigues de Campos. Santa Teresa, entre a cidade e a floresta: a estruturação e
preservação de um bairro carioca. 2002. Tese de Doutorado. Ecole des Hautes Estudes em Sciences Sociales,
Paris.
2
AMARAL, Aracy (Org.). Arquitectura Neocolonial: América Latina, Caribe, Estados Unidos. São Paulo:
Memorial: Fondo de Cultura Econômica, 1994.
DEL BRENNA, Giovanna Rosso. Ecletismo no Rio de Janeiro (século XIX-XX). Em Ecletismo na Arquitetura
Brasileira. São Paulo, Nobel – EDUSP, 1987.
FABRIS, Annateresa (org.). Ecletismo na arquitetura brasileira. São Paulo: Editora Nobel – EDUSP, 1987.
FILHO, Nestor G. R. Quadro da arquitetura no Brasil. 5ª ed. São Paulo: Perspectiva, 1983.
CZAJKOWSKI, J. (Org.). Guia da Arquitetura Eclética no Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Casa da Palavra:
Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro, 2000.
HOMEM, Maria Cecília Naclério. O Palacete Paulistano e Outras Formas Urbanas de Morar da Elite Cafeeira –
1867/1918. São Paulo, Nobel, 1996.
LEMOS, Carlos A.C. Alvenaria Burguesa. São Paulo: Nobel, 1985.
SÁ, Marcos Moraes de. A mansão Figner: o ecletismo e a casa burguesa no início do Século XX. Rio de Janeiro:
SENAC, 2002.
SANTOS, Paulo F. Quatro séculos de arquitetura. Rio de Janeiro, 1977.
SILVA, Geraldo Gomes da. Arquitetura do ferro no Brasil. São Paulo: Nobel, 1988.
1
encontrado, dentre eles o catálogo realizado pela professora Maria Cristina Fernandes
de Mello, o qual apresenta registro de plantas, com pequeno texto histórico, mas sem
informações mais aprofundadas sobre eles. Em vista da ausência de estudos que
pudessem esclarecer melhor as obras do lugar e do período de meu interesse,
determinei, a partir deste momento e dentro do tema já delineado, o objeto de estudo
da presente dissertação, qual seja, a arquitetura residencial eclética edificada no bairro
de Santa Teresa, na Rua Joaquim Murtinho, uma das principais vias do lugar, entre
1910 e 1920, período ao qual pertencem os projetos concebidos para esta rua e
encontrados no Arquivo Geral da Cidade do Rio de Janeiro.
A escolha da Rua Joaquim Murtinho não foi aleatória e deve-se a sua
importância na história na ocupação do bairro e ao grupo de casas edificadas.
Corresponde ao início do antigo Caminho do Aqueduto aberto no século XVIII, e
atualmente a principal entrada do bairro. No final do século XIX, este caminho recebeu
os trilhos do bonde, facilitando o acesso ao local, que aliado à localização na parte alta
do morro, à distância em relação ao adensamento da área central e à vista
deslumbrante da cidade, transformaram a rua em local atraente para uma classe de
elevado poder aquisitivo que decidiu construir ali suas residências, muitas ainda
existentes, cujos projetos encontrados e analisados revelam a pertinência ao ecletismo
da época, bem como com a posição social do grupo de proprietários que resolveram se
instalar no bairro.

Fig.1: Rua Joaquim Murtinho, Santa Teresa. Pintura de Antonio Esteves, 2002.
Fonte: Arquivo da autora, 2010.

2
Ao analisar mais atentamente esses projetos, percebi que, ao lado dos arquitetos
e engenheiros já conhecidos e sobre os quais existem importantes estudos
historiográficos, outros agentes haviam atuado de forma efetiva nesse efervescente
campo profissional do início do século XX. Foram os construtores imigrantes, em sua
grande maioria de origem portuguesa e não diplomados, que acabaram despertando o
meu interesse e redirecionando a pesquisa para este tema. Infelizmente, a dificuldade
em se obter informações específicas e consistentes sobre os construtores se refletiu no
material que havia sido pesquisado, compilado e redigido para o exame de qualificação.
Neste momento, o foco voltou a ser as construções residenciais nas quais esses
profissionais haviam atuado. Estabeleci, então, definitivamente, o objeto de estudo da
dissertação.
Cabe esclarecer que o objetivo deste trabalho foi o de compreender o modo
como o ecletismo foi ali exercido na especificidade do lugar e da obra construída.
Importava, portanto, investigar os fatores envolvidos nas decisões dos projetistas e
relacioná-los com o resultado, de modo a se ter uma noção mais clara das
especificidades da produção local, ou seja, desvendar as fases pelas quais os
profissionais passaram durante a concepção dos projetos, e que envolvem,
necessariamente, a relação histórica e física entre contexto e projeto, as decisões
relativas à ordenação espacial, concepção volumétrica e emprego das tendências
estilísticas. Espera-se, então, através deste estudo, aprofundar o conhecimento sobre
o casario eclético de Santa Teresa e, conseqüentemente, tornar relevante a sua
preservação para a memória arquitetônica deste período, a fim de se evitar situações
que possam, no futuro, constituir em ameaça a esse patrimônio.
Entendo, em concordância com Montaner, que a atividade crítica e interpretativa
deve ser estruturada em duas ações complementares: a contextualização do objeto em
uma leitura tanto diacrônica quanto sincrônica e a análise estritamente formal 3. É
preciso sublinhar que, dada a limitação de tempo imposta a um trabalho de mestrado,
este estudo pretendeu cumprir parte das etapas necessárias ao trabalho crítico em
arquitetura, dando mais ênfase ao conhecimento da obra a partir da análise formal.

3
MONTANER, Josep Maria. Arquitectura y crítica. Barcelona : Gustavo Gili, 1999, p. 18-19.

3
Esta certamente contribuirá, mesmo que singelamente, para o desenvolvimento de
futuros trabalhos sobre o assunto. Ir às obras mesmas e verificá-las enquanto
documentos físicos e gráficos atendia à hierarquia analítica recomendada por
Montaner:

(...) toda crítica arquitectónica tiene que entrar a fondo en el análisis


estrictamente formal, superando aquellas lecturas que se quedan sólo en
interpretaciones generales. Las características espaciales, la relación entre
lógica estructural y composición, las cuestiones funcionales, los itinerarios y las
percepciones, los leguajes y materiales utilizados, deben ser los patrones
esenciales del juicio. Tal como exigía Susan Sontag, se deve prestar una
atención central a la forma y, siguiendo las consideraciones de Peter Bürger,
toda crítica debe ser dialéctica. Esto significa que no ha de adoptar una postura
dogmática, externa y ajena al objeto de análisis, sino que debe entrar de lleno
en la sustancia misma del objeto que va a ser citicado, recibiendo estímulos
sensibles de sus mejores cualidades, de sus propias contradicciones y de los
problemas irresueltos que permanecen escondidos en la obra. Una obra es una
criatura viviente y vivida; una pieza que cada generación verá e interpretará de
maneras distintas. La mejor crítica, por lo tanto, es la que concilia las
consideraciones sobre el contenido con las consideraciones sobre la forma.4

Para uma implementação da metodologia de investigação formal valorizando os


aspectos resultantes dos fatores que intervieram no processo de projeto, assinala
Bernard Leupen que

Desde finales de los años sesenta, conceptos tales como los de análisis de
proyectos y análisis morfológico han ido adquiriendo importância em la
enseñanza y la investigación sobre el diseño. Por uma parte, hemos asistido al
despliegue del discurso sobre la tipologia em los países mediterrâneos, en
especial en Itália y Francia, por parte de Muratori, Aymonino, Rossi, Panerai y
Castex, entre otros. En los países anglosajones, por otra parte, figuras como
las de Rowe, Ching y Bacon, entre otros, han desarrollado el análisis de la

4
Idem, ibidem, p.19.

4
estructura arquitetónica. En ambos planteamientos se explota el dibujo como
valiosa herramienta de análisis de los diseños arquitectónicos y urbanos5.

No caso da presente análise, foram realizadas leituras de alguns trabalhos


desenvolvidos por três desses autores, cuja metodologia é de conhecida eficácia, são
eles: Geoffrey Baker, Francis Ching e Phillipe Boudon
Para Baker, a análise de um edifício não deve nunca prescindir dos fatores de
ordem local e cultural, haja vista serem essenciais, ao lado do programa de
necessidades, ao desenvolvimento das soluções arquitetônicas. Por outro lado, Ching
afirma que o projetista, ao definir claramente os problemas de projeto, depende do seu
nível de conhecimento sobre o vocabulário arquitetônico e de uma análise de suas
possíveis articulações para alcançar as soluções necessárias. Quanto a Boudon, o seu
método conhecido como arquiteturologia consiste em compreender a elaboração das
soluções projetuais segundo critérios ou escalas distintas relacionadas, dentre outras,
aos aspectos técnico, funcional, simbólico, geográfico, de visibilidade e sócio-cultural.
Tais referências metodológicas, que serão detalhadas no terceiro capítulo,
possibilitaram a fixação dos critérios empregados no desenvolvimento das análises
morfológicas implementadas nesta dissertação, quais sejam, a relação do projeto com o
contexto físico e cultural, o vínculo com as referências da arquitetura do presente e do
passado, e a utilização de vários conceitos extraídos dos trabalhos apresentados por
esses autores, que se tornaram fundamentais na estruturação das análises das cinco
casas, cujos projetos, complementados pelas fotos, foram utilizados como material de
estudo. Foram consideradas também as observações oriundas das visitas realizadas in
locus, das entrevistas - quando possível com pessoas vinculadas aos primeiros
proprietários das casas - das informações sobre estes, e do levantamento documental
desses exemplares.
A abordagem sobre os edifícios não podia, no entanto, prescindir de uma breve
preleção sobre o lugar ao qual estão vinculados, cuja investigação consistiu no
levantamento de material a partir de uma pesquisa bibliográfica. Desse modo, a
dissertação foi dividida em três capítulos, onde a apresentação do conteúdo pesquisado

5
LEUPEN, Bernard et al. Proyeto y análisis: evolución de los princípios em arquitectura. Barcelona: Gustavo
Gilli, 1999, p. 9.

5
focaliza, primeiramente, o todo, ou seja, o bairro, aproximando-se, em seguida, da rua
e, por último, das respectivas casas.
O primeiro capítulo trata da ocupação do bairro, focalizando aspectos históricos
como a instalação do Convento, o abastecimento de água da cidade do Rio de Janeiro
e a construção do aqueduto, a representação aristocrática adquirida no século XIX com
a vinda da Família Real, e o avanço da tecnologia no setor de transportes com a
chegada do bonde elétrico. Analisa, ainda, a rua e sua ocupação pelos primeiros
proprietários, além de caracterizar a casa do início do século, a presença dos
construtores imigrantes e as peculiaridades arquitetônicas inerentes ao local.
O segundo capítulo refere-se à apresentação das pranchas dos quinze projetos
de arquitetura edificados na Rua Joaquim Murtinho no período estudado, e
selecionados dentre os dezenove encontrados no Arquivo Geral da Cidade do Rio de
Janeiro.
Devido à impossibilidade de abordar os quinze projetos, apresento, no terceiro
capítulo, a análise morfológica dos cinco selecionados: do lado par, nos terrenos em
declive, Casa de Marcolino Rodrigues, nº 552 (1916); Casa de João Pedro de Fraga
Lourenço, nº 598 (1916), Casa de Tobias Corrêa do Amaral, nº 716 (1914); do lado
ímpar, nos terrenos em aclive, Casa de Mario Aurélio da Silveira, nº 273 (1912); Casa
de José Ferreira Macedo Terra, nº 531 (1916). Quanto aos critérios adotados para esta
seleção, levei em consideração, primeiramente, a escolha de exemplares em aclive e
declive para revelar que propostas foram adotadas diante de condições topográficas
distintas. Tomei como critério também a existência de um projeto de arquitetura
completo do imóvel. Por último, interessei-me pelos exemplares que apresentavam
fachadas com vocabulário correspondente a diferentes opções estilísticas. Neste
momento, exponho os argumentos deste estudo, ou seja, as informações necessárias
que justificam as propostas arquitetônicas adotadas nestas casas em relação às
categorias já mencionadas. Na conclusão, procuro atingir o objetivo da dissertação,
apoiada na interpretação dos argumentos apresentados no capítulo precedente.
Ofereço, deste modo, um estudo sobre um dos principais conjuntos
arquitetônicos existentes na cidade, seguindo o caminho já traçado pelos trabalhos

6
existentes sobre o ecletismo carioca e dando continuidade à fase de reconhecimento e
preservação desta arquitetura no Rio de Janeiro.

7
Capítulo 1: O Bairro de Santa Teresa e a Rua Joaquim Murtinho

Inicialmente, antes de abordar os projetos propriamente ditos, é essencial que se


façam algumas considerações sobre o lugar, de modo que se compreenda o motivo da
presença daquele conjunto arquitetônico em um sítio tão diferenciado do restante da
cidade. Sendo assim, este capítulo propõe mostrar como ocorreu a ocupação do bairro
a partir do século XVII, com a construção do Convento de Santa Teresa, bem como a
abertura do caminho do aqueduto e a construção do mesmo para resolver o
abastecimento de água da cidade do Rio de Janeiro. Destaca também, a partir do
século XIX, a representação do bairro como área pitoresca, de grande beleza natural e
propícia para agradáveis passeios, e a sua efetiva ocupação, devido às epidemias do
centro da cidade, à imagem gerada pelo seu ambiente de clima saudável e à
especulação imobiliária. No final do século, revela como se deu a introdução do bonde
elétrico no local.
Após o bairro, o capítulo se detém na Rua Joaquim Murtinho, sua origem,
ocupação e destaca a classe sócio-econômica de elevado poder aquisitivo que nela se
instalou, revelando informações sobre o primeiro proprietário de algumas residências, a
fim de atestar a posição ocupada por eles na sociedade carioca. Revela alguns
aspectos atribuídos às residências ecléticas do início do século, dentre eles a existência
de imigrantes de origem portuguesa trabalhando como construtores e, em alguns
casos, também como projetistas contratados por esses proprietários. Este capítulo
ressalta, ainda, as singularidades do lugar no que diz respeito à arquitetura.
.
1.1 – Considerações sobre a ocupação do morro de Santa Teresa

O início da ocupação do morro de Santa Teresa, habitado pelos míticos índios


tamoios e pelos escravos fugidos, área considerada impenetrável e que exercia forte
atração sobre os colonizadores portugueses, foi motivada por dois acontecimentos de
naturezas bem distintas: uma religiosa vinculada ao aparecimento da ermida de N. S.
do Desterro no primeiro quartel do século XVII, e que deu nome ao lugar; e outra
humanística de cunho administrativo associada à necessidade de abastecimento de
água e, consequentemente, à construção do aqueduto.
8
Conforme relata Joaquim Manuel de Macedo em “Um passeio pela cidade do Rio
de Janeiro”,

A antiguidade dessa ermida excede a era de 1629. Não se sabe ao certo o


ano da sua fundação; ao menos, porém, conservaram as memórias daquela
época o nome do bom católico a quem se deveu esse templozinho que se
mostrava, no seio do deserto, como um santelmo da fé no meio da solidão
tenebrosa. Foi Antônio Gomes do Desterro o fundador da ermida que mais
6
tarde teve de transformar-se em um mosteiro de freiras.

Além da capelinha, o proprietário da Chácara do Desterro construiu uma casa de


romeiros e a sua modesta residência de ermitão, atraindo uma grande quantidade de
devotos e peregrinos que subiam o morro pela atual Ladeira de Santa Teresa, para
obter as graças através da intercessão de Nossa Senhora, e para assistir às cerimônias
que ali eram realizadas regularmente. É importante frisar que essa concepção
teológica de se erguer igrejas e conventos em meio à natureza exuberante se deve à
mentalidade que havia se disseminado pela Europa, em séculos anteriores, de se
associar sentimentos religiosos com o recolhimento, equilíbrio e harmonia
proporcionados pela natureza primitiva e intocada pelo homem.
Quase um século depois, por volta de 1714, alguns religiosos vindos de Salvador
e conhecidos por frades marianos se instalaram nessa ermida, que na época estava em
mau estado e abandonada. Durante a permanência desses religiosos, que durou pouco
mais de dois anos, já freqüentava as missas uma devota fervorosa de Santa Teresa, de
nome Jacinta Rodrigues Aires, pertencente a uma destacada família da época, e
conhecida pelo seu acentuado espírito religioso.

6
MACEDO, Joaquim Manuel de. Um passeio pela cidade do Rio de Janeiro. Brasília: Senado Federal, Conselho
Editorial, V.42. Edição revisada por Gastão Penalva, 2005, p. 137.

9
Fig. 2: Imagem de Jacinta Rodrigues Aires.
Fonte: http://capeladomeninodeus.blogspot.com/p/historia.html

Vivaldo Coaracy revela que

certa manhã, ao regressar da missa que lá fora ouvir, passando pelo Caminho
de Mata-Cavalos (Rua do Riachuelo), impressionou-a a tranqüila solidão da
semi-abandonada Chácara da Bica, imaginando o local propício para um
recolhimento consagrado à vida religiosa.7

A jovem obteve a chácara mediante a intervenção de seu tio materno Manoel


Pereira Ramos que a comprou do Coronel Domingos Rodrigues Távora, proprietário na
época. Ali, se recolheu na casa em ruína, juntamente com sua irmã Francisca,
erguendo, mais tarde, uma pequena capela consagrada ao Menino-Deus. Em 1742, as
devotas mudaram os nomes, ficando conhecidas, a partir de então, como Jacinta de
São José e Francisca de Jesus Maria.
Comovido com tão expressiva devoção, o Governador Gomes Freire de
Andrade, o Conde de Bobadela, resolveu auxiliar Jacinta com a construção de um
convento de carmelitas sob a Ordem de Santa Teresa. O local escolhido foi a ermida
do Desterro, e em 1750 foi lançada a primeira pedra da edificação da Igreja e do
convento, sob a direção de um dos mais importantes nomes da arquitetura do século
7
COARACY, Vivaldo. Memórias da cidade do Rio de Janeiro: quatro séculos de história. 4ª ed. Rio de Janeiro:
Documenta Histórica, 2008. p. 132.

10
XVII, Brigadeiro José Fernandes Alpoim. Um ano depois, Jacinta e suas discípulas
deixaram a Chácara da Bica e se instalaram no convento. O Conde de Bobadela doou,
à Ordem das Carmelitas, a Chácara das Mangueiras adquirida por ele com o intuito de
aumentar o patrimônio da instituição. O morro que era do desterro logo passou a se
chamar de Santa Teresa.
Antes do término do século XVII, o local já havia sido ocupado por chácaras, e
por grandes propriedades agrícolas favorecidas pela água farta na Região do Maciço
da Tijuca.
Os recursos hídricos presentes na região e a carência de abastecimento de água
na cidade deram origem ao empreendimento público de canalização dessas águas em
direção à várzea. Somente em 1720, durante o governo de Aires de Saldanha, após
vários percalços, foi concretizado o plano de levar as águas do Rio Carioca até o
chafariz provisório localizado no Campo da Ajuda. Este local foi substituído pelo
Campo de Santo Antônio (Largo da Carioca) para onde foi enviado um chafariz de
mármore com 16 bocas de bronze que jorrou água pela primeira vez em 1723.
No entanto, segundo Maurício de Abreu,

O epílogo dessa longa história só iria ocorrer (...) no governo de Gomes Freire
de Andrada. Autorizado pela Carta Régia de 28 de Abril de 1744, resolveu o
governador dar novo direcionamento ao aqueduto da carioca, abandonando o
sinuoso traçado antigo, que percorria a atual Rua Evaristo da Veiga para
depois, infletindo em direção ao norte, atingir o Largo da Carioca. Construiu,
então, o novo aqueduto da Carioca , (...) que ainda se mantém até os nossos
dias, embelezando a área central da cidade.8

Foi a partir deste momento, já na segunda metade do século XVIII, que o


morro de Santa Teresa passou a ser ocupado de forma mais efetiva ao longo do
traçado correspondente ao Caminho do Aqueduto.

8
ABREU, Maurício de Almeida. Natureza e sociedade no Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Secretaria Municipal de
Cultura, Turismo e Esportes. Departamento Geral de Documentação e Informação Cultural, Divisão Editoração, 1992,
p.58.

11
Fig. 3: Arcos e Convento de Santa Teresa, Richard Bate, 1º metade do
século XIX.
Fonte: http://www.pintoresdorio.com/userFiles/Image

A vinda da Família Real introduziu a prática contemplativa da exuberância


paisagística através dos passeios aristocráticos e da instalação de chácaras de fim de
semana, resultado da influência das villas que se espalharam pelos arredores das
grandes cidades européias. Segundo Keith Thomas, a apreciação da natureza
selvagem proporcionava “uma fuga do burburinho crescente das cidades e fábricas”9
Além disso, as recomendações dos médicos sanitaristas diante das epidemias que
assolavam o centro da cidade elegeram as regiões mais altas como ideais para
moradia, transformando o morro de Santa Teresa em um dos locais preferidos da
aristocracia carioca.
A partir de então, observa-se uma relação direta entre natureza e civilidade. A
existência de parques e jardins na cidade, o hábito de se passear ao ar livre em locais
de exuberante beleza natural, a presença de jardins residenciais e de casas em lugares
considerados salubres e higiênicos eram aspectos que definiam o grau de civilidade ao
qual estava vinculada uma cidade ou um grupo social. Consequentemente, o costume
de passar a vida dentro de casa, um resquício da sociedade tradicionalista colonial, era
criticado pela literatura local como no artigo de 1908 de Mário Perdeneiras, escrito para

9
THOMAS, Keith. O homem e o mundo natural: mudanças de atitudes em relação às plantas e aos animais
(1500-1800). São Paulo: Companhia das Letras, 1996, p.318.

12
a Revista Kosmos e intitulado “O Quintal e a Porta”. Neste artigo, o autor ressaltava a
falta de costume do carioca em usufruir os benefícios da vida ao ar livre oriundos dos
melhoramentos do início do século. Seguindo a mesma temática, em 1912, a Revista
Fon Fon lançava o artigo “O Rio Civiliza-se”, que comentava sobre o costume
retrogrado do carioca em continuar dentro de casa, deixando os jardins e a orla da
cidade, praticamente, vazios.
Um dos passeios mais concorridos da cidade e que atraía cariocas e viajantes
estrangeiros era a caminhada em direção ao pico do Corcovado, passando por Santa
Teresa e Silvestre, um belvedere único ao longo do Caminho do Aqueduto, hoje
denominada Almirante Alexandrino.

Fig. 4: Caminho do Aqueduto na região de passeio conhecida como Silvestre.


Fonte: Coleção Augusto Malta, Museu da Imagem e do Som.

O relato sobre este passeio vivenciado pela francesa Adele Toussanint- Samson,
que morou no Rio durante doze anos e que, em 1883, publicou um livro sobre os
costumes da cidade carioca, reflete o deslumbramento provocado por esse trajeto.

A partir da Mãe d’água, é preciso escalar estreitas e mal traçadas veredas a


pique; e, enfim, depois de cinco ou seis horas de caminhada, chaga-se ao alto
do corcovado. O mais magnífico panorama estende-se então diante de seus

13
olhos: é um espetáculo grandioso. Contudo, confessarei, fui tomada de mais
entusiasmo no meio da montanha do que em seu cume. Eu pudera imaginar
um pouco a esplêndida vista que me esperava em tal altura, mas não pudera
pressentir a emoção profunda que sentiria à visão de uma natureza saindo
10
virgem das mãos de Deus.

Na segunda metade do século XIX, as epidemias que castigavam a cidade


converteram Santa Teresa em um dos principais refúgios da aristocracia carioca, dando
início à ocupação de forma mais efetiva do morro. As chácaras, que antes eram apenas
destinos temporários de descanso nos finais de semana, transformaram-se em
residências fixas. Teve início, então, um processo de loteamento do espaço por parte
dos proprietários com a abertura de várias ruas. Ao invés do abastecimento de água e
da procura por lugares propícios ao cultivo de produtos de exportação, o processo de
adensamento do lugar estava atrelado, agora, ao lucro proveniente dos negócios
imobiliários.
Esse ambiente pitoresco serviu não apenas como local de moradia e de passeios
turísticos, mas também como instância termal terapêutica, estimulando o investimento
em casas de recuperação em meio ao clima agradável e à higiene do lugar.
A introdução do bonde à tração animal em 1872 reforçou a ocupação promovida
pela classe mais abastada, a qual passou a deixar definitvamente o centro da cidade
para moradia dos mais pobres. A empresa responsável pela concessão da linha de
carris entre Santa Teresa e o centro instalou um plano inclinado que ligava a Rua do
Riachuelo às proximidades do Largo dos Guimarães, ponto inicial dos bondes que dali
partiam para o curvello.
No entanto, o grande investimento estava por vir e em 1896 foi inaugurado o
primeiro trecho de tração elétrica da Companhia Ferro Carril Carioca até o Largo do
França, dando início, nesta data, ao tráfego dos bondes elétricos em Santa Teresa.
Tudo começou em 1892 quando o presidente da companhia, Casimiro José Pereira de
Meneses, firmou contrato pelo prazo de 35 anos com o poder público municipal. Em
1895, a Diretoria de Obras e Viação autorizou a passagem da linha sobre os arcos da
Lapa e, em abril deste mesmo ano, foi concedida à Companhia “o direito de

10
SAMSON-TOUSSAINT, Adéle. Uma parisiense no Brasil. Rio de Janeiro: Editora Capivara, 2003, p. 92.

14
desapropriação, por utilidade pública, dos terrenos necessários aos traçado de suas
linhas, segundo os planos aprovados pela prefeitura, respeitado o edifício e
dependências do hospital da Ordem Terceira do Carmo” 11. No entanto, essa questão
não foi tão tranquila quanto parece, já que no relatório apresentado à Assembléia Geral
em 1896, a Diretoria destacou o destino de alguns recursos “para instruir as questões
de desapropriação e outras pendentes e liquidadas com os ganaciosos proprietários
dos morros de Santa Thereza e Santo Antônio”.12
Elogios e perplexidade não faltaram na fala de Vieira Fazenda em 1896, sobre a
inauguração do bonde elétrico em Santa Teresa.

Vê os bondes que parecem carrinhos de crianças. Vê o povo embasbacado, de


ante deste bonde que nos leva sem ser puxado por burros.
(...)Chega o jornal, e este anuncia aos seus leitores que tudo isso custa a
módica quantia de mil réis (ida e volta) amanhã será um Deus nos acuda no
Largo da Carioca, em frente à casa, onde se toma leite de Minas. Conta tudo
isso, e a companhia Ferro Carril se tornará em breve um colosso.13

Fig. 5: Na foto, o traçado tortuoso da rua e os trilhos do bonde elétrico.


Fonte: Coleção Augusto Malta, Museu da Imagem e do Som

11
Decreto nº 134, 10 de abril de 1895. Diário Official, p. 1653, 11 abril 1895.
12
Relatório da Diretoria apresentado à Assembléia Geral Ordinária da Companhia Ferro Carril Carioca. Diário
Oficial, p. 1350, 19 Março 1896.
13
FAZENDA, Vieira J. Antiqualhas e memória do Rio de Janeiro. Revista do Instituto Histórico e Geográfico
Brasileiro, vol. Tomo 86, volume 140, 1921, p. 400.

15
1.2 –A Rua Joaquim Murtinho

O trajeto por onde passa o bonde elétrico corresponde ao traçado que serpenteia
toda a montanha e que ficou conhecido como Rua do Aqueduto, fruto da ampliação do
caminho que serviu de passagem ao encanamento das águas em direção ao chafariz
do Largo da Carioca. Com base em informações levantadas por Hilda Machado junto
ao livro não publicado de Neyde Gomes de Oliveira14, percebe-se que o trecho inicial
chamado de Ferro Carril, hoje Rua Joaquim Murtinho, foi aberto, em quase sua
totalidade, nas terras pertencentes às chácaras da Bica e do Desterro, que passaram a
constituir no século XVIII, ao lado da Chácara das Mangueiras, o patrimônio do
Convento de Santa Teresa. Na verdade, esse trecho era uma das vertentes do
encanamento por onde desciam as águas, sendo que a outra passava pela Rua do
Curvello, atual Dias de Barros. Nesta bifurcação, ficavam os primeiros Dois Irmãos, dois
obeliscos piramidais em pedra que demarcavam a mudança no percurso do rio carioca
que descia do aqueduto e que foram destruídos pela conveniência do traçado da linha
de bonde. O segundo conjunto dos Dois Irmãos ficava no Silvestre.

1.2.1 – A ocupação e os proprietários que nela se instalaram

Com o intuito de custear as despesas, as freiras carmelitas começaram a lotear e


arrendar suas propriedades já no final do século XVIII. Em 1898, o engenheiro M.
Brandão realizou o projeto de loteamento de um trecho de terras foreiras ao Convento e
cortadas pela Rua Ferro Carril Carioca. Até hoje, os proprietários, que possuem
apenas o domínio útil, são obrigados a pagar, anualmente, o foro devido pela aquisição
do imóvel. Esses lotes ainda eram estreitos, porém mais largos que os oriundos de
períodos precedentes. O traçado curvilíneo da rua permitiu obter, nas extremidades do
trecho, terrenos com configuração diferenciada e testadas bem maiores, características
que interferiram, de certa forma, na concepção dos respectivos projetos.

14
MACHADO, Hilda. Laurinda Santos Lobo: mecenas, artistas e outros marginais em Santa Teresa. Rio de
Janeiro: Casa da Palavra, 2002, p.21.

16
Fig. 6: Projeto de Loteamento de terras pertencentes ao Convento, datado de
1898, realizado na Rua Ferro Carril.
Fonte: Arquivo do Sr. Gilberto Perdeneiras, 2010.

17
Rua Joaquim Murtinho

Traçado sinuoso da Rua Joaquim


Murtinho

Pousada Mango Mango, antiga


residência da escritora Júlia Lopes de
Almeida

Fig. 7: Trecho correspondente ao projeto de loteamento de 1898, entre os


números 273 e 491.
Fonte: Planta Cadastral de 2000. Secretaria Municipal de Urbanismo.

18
É bem provável que este não tenha sido o primeiro loteamento da rua, pois a
casa da escritora Júlia Lopes de Almeida e de seu marido Filinto, que ficava em outro
trecho, já existia no último quartel do século XIX, tendo em vista os movimentados
salões de literatura promovidos pela escritora em seu famoso jardim durante este
período. Atualmente, esta casa refere-se ao número 587, sede da pousada “Mango
Mango”. A título de ilustração, a escritora Hilda Machado reproduziu em seu livro sobre
Laurinda Santos Lobo um pequeno trecho de um texto de autoria de João do Rio, onde
este dizia que a casa de Filinto ficava “a dez minutos da cidade e é como se estivesse
perdida num afastado bairro. Não havia vizinhos: não há trânsito pela estrada, a não ser
o bond de quarto em quarto da hora...”15
A tese da professora Elizabete Martins já havia observado que a ocupação do
bairro de Santa Teresa seria um reflexo da concepção do pitoresco no urbanismo
brasileiro, antecipando “certas soluções presentes não só nos discursos de Ebenezer
Howard sobre as gardens cities como nos exemplos inspirados por ele que proliferaram
nas primeiras décadas do século XX na Europa nos exemplos de bairros-jardins”16.
Desde meados do século XIX que o bairro era visto como boa opção de moradia
pela elite carioca. Os lotes oferecidos nas partes elevadas do morro e mais distantes do
centro, ou seja, nas ruas Almirante Alexandrino e na própria Joaquim Murtinho,
apresentavam encostas íngremes, mas também uma bela vista panorâmica da cidade
do Rio de Janeiro, e foram os preferidos dessa elite, segundo Lysia Bernardes:

“Constituiu-se, mesmo, uma verdadeira zonação social em função do relevo,


pois enquanto as classes mais afortunadas predominam no alto do espigão,
onde há belas residências, uma classe remediada se localizou nos declives
intermediários das ruas que descem para a planície No contato com essa, se
processou uma degradação corrente da vizinhança com a própria área de
deterioração do centro da cidade que envolve Santa Teresa.” 17

15
MACHADO, op.cit., p.66.
16
MARTINS, Elizabete Rodrigues de Campos. Santa Teresa, entre a cidade e a floresta: a estruturação e
preservação de um bairro carioca. 2002. Tese de Doutorado. Ecole Des Hautes Etudes em Sciences Sociales,
Paris, P.73.
17
BERNARDES, Lysia M. C. e SOARES, Maria Therezinha de Segadas. Rio de Janeiro: Cidade e Região. Rio de
Janeiro: Secretaria Municipal de Cultura. Biblioteca Carioca, 1987, p.109.

19
Essa camada sócio-econômica de elevado poder aquisitivo que se instalou na
Rua Joaquim Murtinho formada por pessoas que exerciam atividades de importância na
época como a medicina, advocacia, política, comércio em geral, exportação de café e
engenharia.
Com o propósito de caracterizar esse grupo de proprietários que ocupou a rua no
início do século XX, destacarei alguns, a começar pelo engenheiro civil Manoel
Amoroso Costa. Com bacharelado em ciências físicas e matemáticas, livre docente em
astronomia e geodésia, com livros publicados e internacionalmente conhecido, foi um
dos pioneiros em pesquisas matemáticas no Brasil. Seu pai, imigrante português e
comerciante já estabelecido, adquiriu o terreno em 1910 e deu ao seu filho Manoel que
morava em Botafogo, na Rua Dona Mariana. Ali construiu, em 1913, a casa que hoje
corresponde ao número 582.

Fig. 8: Engenheiro e matemático Manoel Amoroso Costa.


Fonte: http://www.brasilescola.com/biografia/manuel-amoroso-costa.htm

O português João Pedro de Fraga Lourenço, proprietário da casa construída em


1917 no terreno de número 598, era diretor-presidente dos Armazéns Gerais do
Comércio de Café S/A. Morava em Copacabana, mas devido a problemas de sua
esposa com a água do mar, resolveu se mudar para Santa Teresa. Comprou o lote de
Cypriano Amoroso Costa, irmão de Manoel Amoroso Costa.

20
O espanhol Juan Gatell Solá nasceu em Barcelona, era engenheiro civil e
inventor. Em 1899, o Ministério da Indústria Viação e Obras Públicas concedeu –lhe
privilégios de invenção, por 15 anos, por conta de uma nova caixa higiênica para lixo.
Trabalhou também para a prefeitura realizando desenhos relativos a projetos públicos.
Morava em Laranjeiras, e comprou alguns lotes na Rua Joaquim Murtinho, residindo em
dois desses imóveis por ele projetados, o primeiro construído no nº 307, e o segundo
edificado em 1921 no nº 491. É autor também do projeto referente à Casa de João
Pedro de Fraga Lourenço, nº 598, e à Casa de Antônio da Costa Lage, nº 668. Foi
sócio, até 1917, na firma “Rodrigues Esteves & Comp.” do construtor Manoel Rodriguez
Esteves com quem trabalhou em vários projetos.

Fig. 9: Engenheiro Juan Gatell Solá


Fonte: Acervo de Maria Inês G. de Souza, 2010.

A casa de número 654, construída em 1920, teve como primeiro proprietário o


médico Domingos de Góes e Vasconcellos Filho. Era filho do Dr. Domingos de Góes e
Vasconcellos, membro da Academia Nacional de Medicina e um dos grandes nomes da
neurocirurgia moderna que teve início no final do século XIX no Rio de Janeiro. Exerceu
o magistério na Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro. Sua esposa, Paulina
Armsbrust de G. e Vasconcellos, era parente, provavelmente filha, do também médico
Dr. Gustavo Armsbrust, proprietário da Villa Lúcia, número 636, e vizinho de Domingos.

21
Nascido em Fortaleza, o engenheiro Tobias Correa do Amaral era casado com
Maria Thereza de Moura Brazil, filha do mais famoso oftalmologista da época Dr. José
Cardozo de Moura Brasil. Em 1905, era engenheiro de circunscrição, e em 1913 foi
nomeado para ocupar o cargo de sub-diretor da Diretoria Geral de Obras em Viação
Municipal. Morava, nesta época, na Rua Guanabara, atual Pinheiro Machado. Em
1912, comprou dois lotes na Rua Joaquim Murtinho e construiu, em 1914, a casa de nº
716.
Italiano, depois naturalizado brasileiro, Evaristo Bianchini foi representante
comercial, no Rio de Janeiro, da Companhia Melhoramentos de São Paulo (atual
Editora Melhoramentos). Era considerado, pela diretoria, como experimentado homem
de negócios e grande conhecedor da organização industrial da companhia. Proprietário
da casa de nº 335, mudou-se para a Praia do Flamengo e dividiu entre os filhos o direito
de propriedade sobre a casa de Santa Teresa.
Primo de Joaquim Murtinho, Juvenal Murtinho Nobre adquiriu lote na rua e
construiu sua casa em 1913. Foi fundador do Touring Club do Brasil em 1923. Seu
casamento virou notícia na coluna social da Revista Fon Fon em 190718.
Adolpho Pereira Burgos Ponce de Leon foi deputado federal pelo Rio de Janeiro
no período de 1899 a 1901. Em 1913, já era proprietário da casa de nº 641 da Rua
Joaquim Murtinho. Em 1921, a casa foi doada por sua filha Maria Sebastiana Ponce de
Leon à Congregação das Religiosas de Maria Imaculada, de origem espanhola.
Júlia Lopes de Almeida, a mais importante escritora do final do século XIX e
início do XX, casou-se com o escrito português Filinto de Almeida, na época diretor da
revista “A Semana”. Morou em Santa Teresa, na casa de nº 587, onde realizava os
seus famosos salões de literatura.

18
Notas Mundanas – Enlace Murtinh-Lobo. Revista Fon Fon. Rio de Janeiro, abril de 1907.

22
Fig. 10: Escritora Júlia Lopes de Almeida
Fonte:http://www.amulhernaliteratura.ufsc.br/catalogo/juliaLopes_vida.html

Apesar de ter sido proprietário da casa de nº 20, Joaquim Duarte Murtinho,


membro de uma tradicional família matogrossense, morava em uma rua próxima, atual
Murtinho Nobre. No Rio, acabou não se formando em engenharia, mas se tornou o
mais disputado homeopata carioca do final do século XIX. Foi também um famoso
político brasileiro, um das figuras mais importantes da Velha República, exercendo o
cargo de senador e ministro. Construiu uma respeitável fortuna, vindo a falecer em
1911. Em 1917, a prefeitura, através do Decreto 1165, deu seu nome à antiga Rua do
Ferro Carril.

1.2.2 – As residências ecléticas: Santa Teresa e a casa do início do século

A maioria dos projetos da Rua Joaquim Murtinho, encontrados no Arquivo


Geral da Cidade do Rio de Janeiro, foi edificada na segunda década do século XX.
Algumas casas foram modificadas, outras não existem mais, no entanto ainda se tem o
registro de um conjunto bastante representativo da arquitetura eclética residencial
erguida pela burguesia carioca no início do século. Deve-se ressalvar que a
característica pitoresca deste bairro, assim como os da zona sul da cidade, ensejou
uma liberdade arquitetônica que já era comum em cidades balneárias européias, e que
passou a ser visto também nesses recantos cariocas. Além disso, tais regiões,
ocupadas pelos mais abastados, nasceram já sob a vigência das mudanças projetuais
e construtivas aplicadas à arquitetura residencial a partir do final do século XIX e início
do século XX, conforme assinala Nestor Goulart,
23
“Naquela época [1900-1920], nos bairros da zona sul do Rio de Janeiro, em
Higienópolis e Campos Elísios em São Paulo, os arquitetos mais ousados
orientavam a construção de casas com soluções arquitetônicas mais
atualizadas, com jardins amplos, porões altos e programas mais complexos,
que conseguiam ser, a um só tempo, chácaras e sobrados. 19

Dentre essas soluções atualizadas está a distribuição espacial resultante de


programas mais diversificados, oriundos das novas necessidades do homem da época.
Naclério Homem, no seu trabalho sobre os palacetes paulistanos, definiu essa nova
distribuição nas casas de luxo da seguinte maneira:

...não havia superposição de funções. Destinou-se um cômodo para cada


função ou atividade, o que resultou em espaços específicos. O estar
desmembrou-se em salão de recepção, salão de visitas, sala de música, estar,
sala de senhora, de fumar, biblioteca, gabinete, etc. Entre a cozinha e sala de
jantar, surgiram a copa, sala de almoço e sala de refeição das crianças,...20

Outro elemento importante na concepção do espaço arquitetônico foi o jardim,


também citado por Nestor Goulart, mas não tão amplo no caso específico de Santa
Teresa, devido à configuração dos lotes. Resultado dos afastamentos obrigatórios, sua
presença procurou reproduzir, no ambiente urbano, o caráter rural e a proximidade com
a natureza das antigas chácaras, vinculando-se, deste modo, ao estilo de vida moderno
e saudável caracterísitico de uma sociedade civilizada. A título de ilustração, o relatório
do engenheiro Everardo Backheuser voltado para as habitações populares pode ser
aplicado às construções de um modo geral no que diz respeito à importância dos
jardins nas habitações residenciais.

Além do parque comum que as necessidades de sociabilidade exigem, cada


casa deve, desde que o terreno não seja caro, ser provida de um jardim na
frente sem que isto encareça o aluguel. Devemos nos acostumar e acostumar

19
FILHO, Nestor Goulart Reis. Quadro da arquitetura no Brasil. Perspectiva. 8ª ed. São Paulo: Perspectiva, 1997,
p. 56.
20
HOMEM, Maria Cecília Naclério. O palacete paulistano e outras formas urbanas de morar da elite cafeeira.
São Paulo: Martins Fontes, 1996, p.125.

24
a população a julgar o proletario como um homem civilizado e não como um
ser bruto inacessível às vantagens sociais.21 (grifo da autora)

Esses afastamentos, que possibilitaram a projeção dos jardins, surgiram no final


do século XIX, primeiramente com o deslocamento do edifício em relação aos limites
laterais, e, em seguida, em relação ao logradouro público. A partir de 1903, por
determinação imposta pelo Decreto 391, que passou a regulamentar as construções e
as reconstruções realizadas na cidade do Rio de Janeiro, tais afastamentos aparecem
como decisões obrigatórias nos projetos de construção. Cabe salientar que essas
exigências resultaram da ação de profissionais, sobretudo dos médicos sanitaristas, em
buscar soluções para o problema da insalubridade urbana. Como conseqüência, as
fachadas laterais passaram a receber aberturas de janelas e portas e, em alguns casos,
tratamentos decorativos mais cuidadosos.
Quanto ao espaço interno, a legislação determinava também pé direito mínimo
para os pavimentos, ou seja, 4,0 m para o primeiro pavimento, 3,80m para o segundo
e 3,60m para os demais. No porão, a altura não poderia ser menor que 0,60 m e maior
que 3,00m. O Decreto limitou a altura total do prédio, o qual não poderia exceder uma
vez e meia a largura da rua onde fosse edificado, com exceção de algumas ruas do
centro. Além disso, instituiu a obrigatoriedade do sobrado para algumas ruas da cidade
situadas no centro e na zona sul, mas a excluiu para as construções em morro. As
aberturas deveriam ser proporcionais e, por conta da higiene, não poderiam ser
inferiores a 1/5 da área do cômodo. A colocação de venezianas em todos os
dormitórios, latrinas e banheiros era obrigatório.
O Decreto exigia que todos os cômodos apresentassem aberturas para o
exterior. Era obrigatória a presença de área livre no terreno com prédios destinados à
habitação, não podendo ser inferior a 6,0m² nos edifícios de um pavimento, 8,0m² nos
edifícios de dois pavimentos e 10,0m² nos edifícios de três ou mais pavimentos.
Quanto às revivescências arquitetônicas empregadas, as soluções presentes nos
projetos ecléticos tiveram como referência o decorativismo dos estilos históricos
europeus utilizados pelos arquitetos nacionais e por muitos estrangeiros que aqui se

21
BACKHEUSER, Everardo. Relatório sobre habitação popular apresentado à comissão nomeada pelo
Ministro da Justiça e Negócios Interiores. Diário Official, p.80, 1904.

25
instalaram22. O ápice deste período foi a reforma urbanística empreendida por Pereira
Passos no Rio de Janeiro no início do século XX. As construções da Avenida Central
foram aclamadas pelas revistas ilustradas, as quais se transformaram em grandes
defensoras do ecletismo e passaram a exercer um importante papel, de caráter
educativo e orientador, na construção das residências burguesas cariocas. Poucos
anos depois, a Exposição Nacional de 1908 também surgiu como vitrine para a nova
arquitetura.

Ao lado dessa influência inspirada nos estilos classicizantes, houve também a


difusão do Art Nouveau, um estilo novo que procurou na natureza, e não no passado,
um modelo para exprimir a sua época, bem como o aparecimento de outra tipologia
arquitetônica, o estilo vitoriano, cuja origem está no English Domestic Revival de
Richard Norman Shaw e de seus contemporâneos europeus, e que passou a fazer
parte da paisagem da arquitetura residencial pitoresca das principais cidades
brasileiras.

Fig. 11: Fotos do Bairro de Santa Teresa. Ao fundo, o casario da Rua Joaquim Murtinho.
Fonte: Coleção Augusto Malta, Museu da Imagem e do Som.

22
Alguns arquitetos que atuaram neste período: Heitor de Mello, Adolfo Morales de Los Rios, Rafael Rebechi,
Armando da Silva Teles, Antonio Jannuzzi, Joseph Gire, Archimedes Memória e Antonio Virzi.

26
Fig. 12: Fotos do Bairro de Santa Teresa. Ao fundo, o casario da Rua Joaquim Murtinho.
Fonte: Coleção Augusto Malta, Museu da Imagem e do Som.

Fig. 13: A arquitetura eclética da Rua Joaquim Murtinho.


Fonte: Coleção Augusto Malta, Museu da Imagem e do Som.

27
Cabe considerar, ainda, em relação à arquitetura eclética carioca, na qual
encontram-se inseridas as casas da Rua Joaquim Murtinho, que os projetos concebidos
segundo os preceitos legais e as transformações citadas anteriormente, teve a
participação, não apenas no campo construtivo, mas também no projetual, de
profissionais conhecidos na época como construtores. Eram imigrantes portugueses
que exerciam esse ofício sem diploma, mas que haviam adquirido o conhecimento
necessário ou através da prática profissional, ou através de uma educação formal
administrada pelas instituições de ensino técnico disponíveis na época. A aceitação
pelo poder público não evitou que a atuação desse profissional, neste contexto, fosse
extremamamente polêmica, gerando um grande esforço, por parte dos arquitetos e
engenheiros, no sentido de criar uma legislação que regulamentasse a profissão.

Quanto às peculiaridades arquitetônicas do lugar, nota-se que no sistema


construtivo de alvenaria portante observado nas casas da Rua Joaquim Murtinho, a
pedra foi um material usado não apenas como embasamento para constituir os porões
ou os pavimentos localizados abaixo do nível da rua, mas também, em alguns casos, foi
utilizada para executar as próprias paredes estruturais da casa. É bem provável que
essas pedras tenham sido fornecidas por pedreiras exploradas no próprio bairro, pois,
segundo informações obtidas com familiares do proprietário Manoel Amoroso Costa,
este assinalava que era mais fácil descer a pedra do que subir o tijolo, o que explica as
paredes estruturais da sua casa terem sido concebidas, integralmente, com esse
material. Além disso, o construtor Carlos Leal, que participou de dois projetos na rua,
era sócio da firma “Carlos Leal & Filhos”, que obteve licença da prefeitura para a
exploração de duas pedreiras, sendo uma delas situada na Rua do Aqueduto, nº 687.
A Villa Lúcia, edificada pelo médico Gustavo Armsbrust e que atualmente se
encontra em ruínas, apresenta o primeiro pavimento em pedra e o segundo em tijolo.
Da mesma forma, a casa em ruínas e de grandes dimensões localizada no início da
rua, provavelmente o número 15 e que pode ter sido do deputado Adolpho Pereira
Ponce de Leon, foi concebida em pedra até a laje do segundo pavimento.

28
Fig. 14: Casa situada no nº 15 da Rua Fig. 15: Villa Lúcia do Dr. Gustavo Armsbrust
Joaquim Murtinho. Fonte: arquivo da autora, 2010.
Fonte: arquivo da autora, 2010.

Já na casa do português João Pedro de F. Lourenço e do engenheiro Juan Gatell


Solá, a pedra foi introduzida até a metade das paredes estruturais do primeiro
pavimento, segundo informação dos próprios familiares.

Fig. 16: Segunda residência de Juan Gatell Solá na Rua Joaquim Murtinho. A primeira
ficava no número 307
Fonte: arquivo da autora, 2010.

29
Fig. 17: Casa de João Pedro de F. Lourenço. Foto tirada alguns anos
após a construção.
Fonte: arquivo de Maria Inês G. de Souza, 2010.

A pedra era um material mais caro que o tijolo, no entanto a facilidade de


encontrá-la no local, a dificuldade em se subir o tijolo e a própria topografia que
demandava uma estrutura reforçada, devem ter estimulado a sua utilização nas
construções da rua.
Por sua vez, a topografia constitui outra particularidade em relação a esses
imóveis. Os aclives e declives que caracterizam os terrenos localizados na Rua
Joaquim Murtinho obrigaram os construtores a realizar aterros e desaterros, criando
patamares sobre os quais eram erguidas as casas. Manoel Amoroso Costa em seu
pedido de Licença de Obras de 1913 citava a forte inclinação do seu terreno que o
“obrigou a projetar o seu prédio com dois porões sobrepostos, o que já vinha sendo
permitido em iguais circunstâncias”23.
O documento datado de agosto de 1917, preenchido pelo engenheiro Juan
Gatell no final da obra e referente ao imóvel de João Pedro F. Lourenço, cujo projeto foi

23
Projeto original da Casa de Manoel Amoroso Costa, 1913. Doc. 3775, caixa 83, AGCRJ.

30
aprovado em novembro de 1916, ilustra a difícil tarefa realizada e o grande volume de
terra necessários a esses aterros. No caso específico, o responsável pela obra, Juan
Gatell, relata a quantidade de 2191 “carrocinhas de terras” transportadas para o local
no período de quase 44 dias entre maio e agosto. É bem provável que este serviço
tenha sido realizado a medida em que a construção avançava sobre a superfície
inclinada do terreno.

Fig. 18: Documento preenchido por Gatell para informar ao proprietário o custo
referente ao aterro da casa.
Fonte: Arquivo do Sr. Gilberto Perdeneiras, neto do engenheiro Gatell, 2010.

Vale destacar outra singularidade que a rua acabou impondo aos projetistas, ou
seja, a irregularidade da configuração dos lotes resultante do traçado curvilíneo da rua,
que acabou introduzindo uma implantação, onde o eixo do terreno, na grande maioria,

31
não coincidia com o da casa. O caso mais emblemático é a residência de Tobias Correa
do Amaral, que, sem alternativa, teve a sua fachada principal praticamente oblíqua em
relação à rua.

Fig. 19: Lote e implantação da casa de Tobias Correa do Amaral.


Fonte: Planta cadastral de 1953. Secretaria Municipal de Urbanismo.

Compreender a produção arquitetônica desenvolvida em um determinado


período histórico requer o conhecimento do local onde foi erguida, bem como das
pessoas responsáveis pela sua existência, conforme foi visto neste capítulo. A
característica de local aprazível atribuído à Santa Teresa durante o período da sua
ocupação atraiu, para os locais elevados do morro, um grupo de considerável poder
aquisitivo, que havia decidido fixar moradia com a construção de casas ecléticas, as
quais se transformaram em exemplares de um novo estilo de morar, e de uma nova
fase na evolução arquitetônica residencial carioca. Sendo assim, alguns dados aqui
expostos também contribuirão para compor as informações formuladas nas análises
morfológicas mais adiante.
O capítulo a seguir tem como objetivo estreitar o foco do estudo, até então
dirigido para o bairro e a rua, registrando a produção arquitetônica local através da

32
apresentação dos quinze mais representativos projetos erguidos na Rua Joaquim
Murtinho no início do século XX e encontrados no AGCRJ.

33
Capítulo 2 : Os projetos residenciais da Rua Joaquim Murtinho (1910-1920)

Se a legislação dirigida à atividade construtiva no século XIX se limitou a impor,


apenas, um padrão estético às fachadas urbanas, no período eclético, a ascensão da
burguesia promoveu transformações arquitetônicas mais profundas, atingindo também
o espaço interno, tendo em vista o novo estilo de morar e os avanços tecnológicos
oriundos da Europa. A força motriz dessas transformações foi o conceito de
modernidade aplicado à residência, e divulgado pelas publicações e construções
oficiais e abastadas da época, o que gerou uma nova cultura arquitetônica, guiando os
projetistas na concepção das casas. Sendo assim, com o objetivo de apresentar alguns
exemplares cariocas resultantes desse período, e de registrar a arquitetura eclética
residencial da Rua Joaquim Murtinho, este capítulo apresenta, na íntegra, os quinze
projetos mais representativos dentre os dezenove encontrados no acervo do Arquivo
Geral da Cidade do Rio de Janeiro (AGCRJ), e informa, a partir de uma análise
comparativa entre os mesmos, dados gerais relativos aos códigos de representação do
desenho arquitetônico, à organização espacial, à técnica empregada e aos ornamentos.
Estes projetos foram concebidos na segunda década do século XX, conforme
informa a tabela e o gráfico a seguir, revelando um significativo impulso imobiliário
ocorrido na rua durante este período, sobretudo em 1913 e 1916 com a edificação de
quatro imóveis em cada ano.
A ordem de apresentação é a mesma das tabelas e da Planta Cadastral de 1953
obtida na Secretaria Municipal de Urbanismo, e a forma de identificação refere-se ao
nome do proprietário registrado nos respectivos projetos. Com exceção dos projetos
referentes às casas de Leonel Ávila Leal, Antonio Olintho Lassance, Américo Gouveia
Mourão, Manoel Amoroso da Costa e João Pedro de Fraga Lourenço, que tiveram
como fonte o trabalho intitulado “Arquitetura da Rua Joaquim Murtinho”, realizado em
2003 pela professora Maria Cristina Fernandes Mello, os demais são cópias dos
originais. Quanto à documentação fotográfica, o acervo de imagens foi realizado pela
própria autora.

34
Tabela 1: Projetos residênciais ecléticos na Rua Joaquim Murtinho
Início do século XX

Nº Lote Nº da casa
no
Projeto Primeiro Proprietário Data Construtor Arquiteto/ Gabarito
de Antigo Novo Engenheiro
1898

1 35 e 36 109 273 Mário Aurélio da Silveira 1912 Ferro A. Luiz desconhecido 2 pavimentos e 1
porão

2 45 143 383 Leonel Ávila Leal 1913 Carlos Leal desconhecido 1 pavimento e 1
porão

3 47 155 405 Antonio Olintho Lassance 1918 Francisco Antônio Eng e arquiteto L. 2 pavimentos
Pricarice Kastrup

4 48 159 417 Manoel Gouveia Mourão 1915 Manoel Severino desconhecido 2 pavimentos
Pereira

5 49 161 425 Américo Gouveia Mourão 1915 Joaquim Pereira desconhecido 2 pavimentos
Gomes

6 205 531 José Ferreira Macedo 1916 desconhecido 2 pavimentos


Terra (Villa Aurora)

7 202 552 Marcolino Rodrigues 1916 Manoel Rudriguez Arquiteto Augusto dos 2 pavimentos e 1
Esteves Santos porão

8 219 569 Manuel Alves de O. Lopes 1913 Andrade Lima desconhecido 1 pavimento e 1
porão

9 212 582 Manoel Amoroso da Costa 1913 F. Roume Desconhecido 2 pavimentos e 1


porão
35

1
10 218 598 João Pedro de Fraga 1916 Manuel Rudriguez Engenheiro Juan 2 pavimentos e 1
Louenço Esteves Gatell Solá porão

11 240 654 Domingos de Góes e Engenheiro 2 pavimentos e 1


Vasconcellos Filho 1920 J. Travassos Filho J. Travassos Filho porão

12 246 668 Antônio da Costa Lage 1919 Manuel Rudriguez Engenheiro Juan 2 pavimentos e 1
Esteves Gatell Solá porão

13 256 686 Albino de Almeida Cardozo 1915 João da Cunha desconhecido 2 pavimentos e 1
porão

14 277 711 Juvenal M. Nobre 1913 Gabriel Laureano desconhecido 2 pavimentos

15 268 716 Tobias Correa do Amaral 1914 Carlos Leal desconhecido 3 pavimentos e 1
porão

Obs: O lote 49 (nº 129) ficava a 40 metros do nº 117 que foi a primeira numeração da casa do Leonel Ávila.
O lote 48 era o nº 127
O lote 47 era a casa de Olintho Lassance que ficava junto e antes do nº 127
Os projetos originais correspondentes aos imóveis localizados acima do número 491 não apresentam indicação de
lote. Além disso, não foi encontrado projeto de loteamento vinculado a esses imóveis.
A casa de Albino de Almeida Cardozo, nº 686, foi demolida. O terreno encontra-se vazio.

1920 (1) 1912 (1)


1919 (1)
Incidência de construções/ano 1
2
1916 (4) 1913 (4)
3
4
5
6
1914 (1) 7
1915 (3)

36
36
Tabela 2: Casas cujos proprietários foram identificados, mas
não tiveram seus projetos localizados no AGCRJ

Nº da casa
Primeiro Proprietário

antigo novo

16 115 297 Humberto Duarte

17 117 307 Juan Gatell Solá

18 127 335 Evaristo Bianchini

19 189 491 Juan Gatell Solá

20 231 587 Júlia Lopes de Almeida

21 220 616 Alberto Moreira da Rocha

22 232 632 Gustavo Ambrust

23 247 641 Adolpho Pereira B. Ponce de Leon

Obs: A casa de Adolpho Pereira B. Ponce de Leon, nº 641, foi demolida. Neste terreno, foi construído
um prédio residencial.

1
37
LOCALIZAÇÃO DAS RESIDÊNCIAS NA PLANTA CADASTRAL DE 1953

10

10
21 9
22 7
22

12 11

13
20 8
23

15
19 1
6
14
16

18 17
5 4 2
3

Projetos
localizados

Projetos não
localizados

1
LOCALIZAÇÃO DAS RESIDÊNCIAS NA PLANTA CADASTRAL DE 1953
22
22

10

10
7

15
1
6

Projetos
analisados no
3º capítulo

1
1- Casa de Mário Aurélio da Silveira

Arquiteto/engenheiro: desconhecido
Construtor: Ferro A. Luiz
Data do projeto: 1912
Localização: Rua Joaquim Murtinho, 273 (antigo 109)

1
40
41
42
2- Casa de Leonel Ávila Leal

Arquiteto/engenheiro: desconhecido
Construtor: Carlos Leal
Data do projeto: 1913
Localização: Rua Joaquim Murtinho, 383 (antigo 143)

43
44
3- Casa de Antonio Olintho Lassance

Arquiteto e engenheiro: L. Kastrup


Construtor: Francisco Antonio Pricarice
Data do projeto: 1916
Localização: Rua Joaquim Murtinho, 405 (antigo 155)

45
46
4- Casa de Manoel Gouveia Mourão

Arquiteto e engenheiro: desconhecido


Construtor: Manoel Severino Pereira
Data do projeto: 1915
Localização: Rua Joaquim Murtinho, 417 (antigo 159)

47
48
49
5- Casa de Américo Gouveia Mourão

Arquiteto e engenheiro: desconhecido


Construtor: Joaquim Pereira Gomes
Data do projeto: 1915
Localização: Rua Joaquim Murtinho, 425 (antigo 161)
50
51
6- Casa de José Ferreira Macedo Terra

Arquiteto e engenheiro: desconhecido


Construtor: Manoel Rudriguez Esteves
Data do projeto: 1916
Localização: Rua Joaquim Murtinho, 531 (antigo 205)
52
53
54
7- Casa de Marcolino Rodrigues

Arquiteto: Augusto dos Santos


Construtor: Manoel Rudriguez Esteves
Data do projeto: 1916
Localização: Rua Joaquim Murtinho, 552 (antigo 202)
55
56
8- Casa de Manoel Alves de Oliveira Lopes

Arquiteto e engenheiro: não


Construtor: Andrade Lima
Data do projeto: 1913
Localização: Rua Joaquim Murtinho, 569 (antigo 219)
57
58
59
9- Casa de Manoel Amaroso da Costa

Arquiteto e engenheiro: desconhecido


Construtor: F. Roume
Data do projeto: 1913
Localização: Rua Joaquim Murtinho, 582 (antigo 212)
60
61
62
10- Casa de João Pedro de Fraga Lourenço

Engenheiro: Juan Gatell Solá


Construtor: Manoel Rudriguez Esteves
Data do projeto: 1916
Localização: Rua Joaquim Murtinho, 598 (antigo 218)

63
64
65
11- Casa de Domingos de Góes e Vasconcellos Filho

Engenheiro: J. Travassos Filho


Construtor: J. Travassos Filho
Data do projeto: 1920
Localização: Rua Joaquim Murtinho, 654 (antigo 240)
66
67
68
12- Casa de Antonio da Costa Lage

Engenheiro: Juan Gatell Solá


Construtor: Manoel Rudriguez Esteves
Data do projeto: 1919
Localização: Rua Joaquim Murtinho, 668 (antiga 246)
69
70
13- Casa de Albino de Almeida Cardozo

Arquiteto/Engenheiro: desconhecido
Construtor: João da Cunha
Data do projeto: 1914
Localização: Rua Joaquim Murtinho, 686 (antigo 256) – demolida
71
72
14- Casa de Juvenal Murtinho Nobre

Arquiteto e engenheiro: desconhecido


Construtor: Gabriel Laureano
Data do projeto: 1913
Localização: Rua Joaquim Murtinho, 711 (antigo 277)
73
74
75
15- Casa de Tobias Correa do Amaral

Arquiteto/Engenheiro: desconhecido
Construtor: Carlos Leal
Data do projeto: 1914
Localização: Rua Joaquim Murtinho, 716 (antigo 268)
76
77
78
Tendo como base uma leitura comparativa entre os projetos expostos neste
capítulo, foi possível levantar informações gerais sobre alguns aspectos vinculados à
prática projetiva e construtiva observados na atuação dos profissionais responsáveis
pela escolha desses partidos arquitetônicos.
Pôde-se perceber, em planta, que os projetistas procuraram uma solução
descentralizada e frontal para determinar o acesso à casa, tendo em vista a preferência
por uma composição assimétrica atribuída às fachadas. Em relação à organização
espacial, é interessante constatar a presença de espaços que valorizam e ao mesmo
tempo organizam a distribuição e o acesso ao interior da casa, recebendo
denominações diversas como vestíbulo, sala de espera ou entrada, sendo o hall um
termo pouco usado, não sendo visto, inclusive, no projeto da casa vitoriana de Tobias
Correa do Amaral. Da entrada, assim como acontecia com a sala de visitas, os
visitantes tinham acesso direto à sala de jantar, uma área nobre de considerável
dimensão, que também recebia tratamento decorativo mais cuidadoso e que, em alguns
casos, encontrava-se voltada para uma varanda, revelando a existência de uma vida
social em que o ato de receber, e a necessidade de expor o status eram práticas
comuns da família burguesa. Alem disso, dentro do programa residencial, a sala de
jantar poderia estar vinculada às práticas rituais da vida familiar onde as refeições
deveriam ter comparecimento obrigatório de todos. As casas possuíam outras salas,
que podiam ser destinadas a uma atividade particular, como a sala de costura, ou social
como a sala de bilhar, espaço de convivência masculino, ou ainda um salão em um
pavimento inferior.
A existência de uma distribuição interna realizada a partir de um hall ou de uma
circulação longitudinal foi observada com freqüência nesta análise, com exceções que
talvez estejam relacionadas à questão econômica, onde menos espaço construído
significava menos movimentação de terra. Ainda em relação à circulação, a escada
principal ficava próxima à entrada, possibilitando contato direto com a área íntima,
situada no pavimento superior, onde havia no mínimo três quartos, ou mesmo com as
dependências de um pavimento inferior. Quanto às instalações sanitárias, havia
obrigatoriamente um banheiro no setor íntimo e um WC no setor social.

79
Os espaços eram distribuídos, na maioria dos casos, em dois pavimentos. A área
de serviços tinha acesso independente pelas escadas laterais que conduziam aos
fundos da casa.
Em relação aos códigos de representação empregados nos desenhos, as plantas
e os cortes apresentavam as cotas do perímetro interno dos cômodos e do seu pé-
direito, porém dados que seriam imprescindíveis para execução da obra como
dimensionamento de paredes, janelas, portas, acessos através de rampas e escadas e
afastamentos não eram informados, fato que independe da existência do nome, no
projeto, de um profissional diplomado. No caso das paredes, é provável que houvesse
um dimensionamento padrão, de conhecimento dos construtores, já que nos poucos
desenhos que apresentam este elemento cotado, a espessura no primeiro pavimento
era de 0.35, no superior 0.25 e no inferior era de 0.45 ou 0.50. Quanto às aberturas e
às distâncias da casa em relação às divisas, é possível que esse dado fosse informado
no próprio canteiro de obras ou que houvesse uma planta de execução, a qual o
construtor tivesse acesso. Dos projetos analisados, aquele que contém todas as
informações de caráter técnico, inclusive, espessura das fundações, pertence ao
profissional que se apresenta como engenheiro e construtor da obra da casa de
Domingos de Góes e Vasconcellos Filho. Fica constatado que não há correlação entre
a formação do profissional que assina ao projeto – se engenheiro ou arquiteto – e o
nível de informações sobre a estrutura colocado nas peças gráficas. pois no caso do
engenheiro Juan Gatell Solá, os seus projetos pouco ou nada informam sobre a técnica,
talvez pelo fato de ter trabalhado com o mesmo construtor, Manoel Rudrigues Esteves,
com quem tinha sociedade em uma firma de construção, e de passar, para este, dados
no próprio canteiro de obras.
A representação de portas e janelas revela que as paredes espessas eram
chanfradas. As linhas em diagonal do ladrilho e o colorido em vermelho da alvenaria
das paredes são exemplos de padronização dos desenhos de arquitetura da época,
sendo que esta última não foi empregada no projeto da casa de Manoel Amoroso
Costa, pois, conforme foi dito pelo atual proprietário, neto de Manoel, a estrutura, em
preto na planta, foi executada em pedra e não em alvenaria.

80
Quanto à técnica construtiva empregada, os cortes informam que, nesta década,
a estrutura da laje utilizada nas áreas nobres ainda era composta pelos barrotes de
madeira de seção retangular, engastados nas paredes e sobre os quais eram dispostos
o tabuado ou o parquets, enquanto que nas áreas molhadas e nos avarandados
revestidos de ladrilhos hidráulicos decorados, eram as lajes de concreto, formadas por
ferros ou trilhos e tijolos cerâmicos. A exceção quanto à estrutura é a casa do sub-
diretor do Departamento de Obras e Viação da prefeitura, o engenheiro Tobias Correa
do Amaral, onde, segundo o projeto, foi utilizada a viga siegwart, um dos sistemas de
cimento armado existentes na época, que consistia fazer mergulhar um engradamento
metálico na massa do cimento ou concreto.”24
Era um sistema mais sofisticado, já utilizado em prédios oficiais, conforme revela
a concorrência pública de 1911, aberta para a construção do edifício principal do
Hospital Central do Exército. Segundo o edital, neste prédio as galerias deveriam ser
de “armação metallica, com piso de metal distendido ou vigas siegwart, concreto e
ladrilho cerâmico”25. Tal exigência também é verificada na concorrência pública de
1920, aberta pelo governo federal para a construção dos edifícios destinados à Escola
de Aprendizes Artífices do Estado de São Paulo, cujos compartimentos em ladrilho e
varandas deveriam ser pavimentados com vigas de cimento armado do sistema
“siegwart”26. O emprego desta estrutura estava vinculado à situação financeira do
proprietário, pois o construtor que atuou nesta obra, não a utilizou na casa que fez para
Leonel Ávila, outro proprietário da rua.
Outro detalhe interessante constatado neste estudo comparativo é a
preocupação em mostrar, no desenho, os muros de contenção, elementos importantes
na estrutura da casa, devido à topografia, bem como, em alguns casos, informar o seu
dimensionamento. No que diz respeito às fundações, os projetos expõem uma laje em
concreto entre estas e as paredes estruturais, provavelmente impermeabilizada,
conforme assinala o engenheiro Everardo Backheuser em seu Relatório sobre
habitação popular apresentado à comissão nomeada pelo Ministro da Justiça e
Negócios Interiores, em 1904.

24
BARROS, Cornélio Carneiro de. Auxiliar do construtor. 3ª ed. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1908, p. 182.
25
Diário Official, de 11 de julho de 1911, Rio de Janeiro p. 8187.
26
Diário Official, de 29 de junho de 1920, Rio de Janeiro, p. 14145.
81
Em substituição à drenagem, a solução foi collocar-se entre o solo e o edifício
uma camada impermeável para impedir que, por capillaridade, suba a
humidade pelas paredes. Essa camada impermeável póde ser collocada em
torno e por baixo das fundações ou entre as fundações e as paredes. O uso no
Rio de Janeiro é fazê-la de concreto, isto é, de uma mistura de pedra britada e
de argamassa de cimento. Esse concreto só é de fato impermeável quando as
dosagens são feitas de accôrdo com as regras.27

Quanto às fachadas, representavam, geralmente, a principal que era assimétrica,


mostrando os dois principais pavimentos da casa nos lotes em declive, e estes mais o
porão nos lotes em aclive. Estes desenhos, de um modo geral, eram muito
sofisticados, alguns sombreados, apresentando detalhamentos interessantes como o
trabalho em art nouveau de guarda-corpos em ferro de varandas e escadas. Segundo
Paulo Santos, raro era “o prédio do centro da cidade construído, por volta de 1910,
cujas grades não sejam art nouveau”28. Outro dado importante está vinculado às
aberturas, onde se vê diversidade de formatos em uma mesma composição, com
vergas retas, em arco pleno e abatido. No que se refere-se ao tratamento atribuído às
guarnições, a discrição predominou.
Após uma exposição abrangente sobre o conjunto de projetos selecionados e
apresentados neste capítulo, e com o fim de focalizar as informações contidas nos
mesmos para que possam ser alcançados e expostos os argumentos necessários que
tornem possível atingir o objetivo da presente dissertação, será desenvolvido no
próximo capítulo, um estudo mais detalhado das propostas adotadas pelos projetistas
de cinco dos quinze projetos vistos, e que consistirá no levantamento de informações
com base em três grupos de análise: implantação e acesso, composição das fachadas
e volumetria, distribuição espacial. O método de investigação adotado foi a da análise
morfológica, que teve como suporte a seleção das categorias recorrentes nos trabalhos
desenvolvidos por autores como Geoffrey Baker, Philippe Boudon e Francis Ching.

27
BACKHEUSER. Op.cit., p. 84.
28
SANTOS, Paulo F. Quatro séculos de arquitetura. Rio de Janeiro, 1977, p. 89.

82
Capítulo 3: Projeto e análise de cinco residências

Residências edificadas do lado par (declive)

3.1 – Casa de Marcolino Rodrigues, nº 552 (1916)


3.2 – Casa de João Pedro de Fraga Lourenço, nº 598 (1916)
3.3 – Casa de Tobias Correa do Amaral, nº 716 (1914)

Residências edificadas do lado ímpar (aclive)

3.4 – Casa de José Ferreira Macedo Terra, nº 531 (1916)


3.5 – Casa de Mário Aurélio da Silveira, nº 273 (1912)

1
83
Antes de expor a análise morfológica das cinco casas, faz-se necessário abordar
o processo de seleção utilizado para essa escolha, onde os critérios adotados
envolvem o contexto físico e as determinações estilísticas, bem como esclarecer a
metodologia empregada.
Na discussão sobre a arquitetura residencial eclética em Santa Teresa, o
aspecto que mais desperta a curiosidade do profissional arquiteto é, sem dúvida, a
forma como os projetistas responderam aos elementos pré-existentes e específicos do
local. Sendo assim, para se abordar o modo como o ecletismo foi ali desenvolvido,
houve a necessidade de selecionar um grupo de casas que, de preferência, estivessem
situadas em locais distintos ao longo da trajetória sinuosa da rua, bem como em lotes
que, embora padronizados, apresentassem certas particularidades vinculadas à sua
configuração e a sua condição topográfica. Desta forma, o primeiro critério de escolha
adotado foi o contexto físico, e não podia ser diferente, pois esse aspecto sempre
permeia as decisões empregadas durante as fases de um processo projetual. Foram
selecionadas, então, três casas em declive e duas em aclive, sendo quatro lotes
longitudinais, com diferenças dimensionais, e um de esquina.
Os projetos citados no capítulo anterior revelam uma variedade de soluções no
que diz respeito à composição espacial e ornamental das fachadas, apresentando o
emprego, em um mesmo prédio ou não, de elementos de distintas linguagens
arquitetônicas, característica da arquitetura eclética carioca. Além disso, as peças
gráficas destes projetos informam também o quanto era importante para o projetista
deste período representar os elementos de arquitetura e os ornamentos, sobretudo, em
relação àqueles em ferro. Essa preocupação decorativa na representação dos projetos
fez com que este estudo valorizasse a qualidade da opção estilística de cada um,
portanto, outro critério utilizado foi de caráter estético e tem a ver com a composição da
fachada principal, ou seja, com a diversidade de elementos empregados e o arranjo
final obtido pelo projetista, tendo em vista o contato com os manuais de arquitetura e
com os de ornamento veiculados na época. Diante da preocupação em selecionar
projetos que apresentassem essa diversidade e detalhamento, as cinco casas

84
escolhidas se caracterizam pela presença da linguagem clássica, art nouveau, gótica e
vitoriana como veremos adiante.
Quanto à metodologia, era necessário estudar os fatores envolvidos nas
decisões tomadas em cada fase do processo projetual, ou seja, averiguar ideais e
princípios adotados pelos projetistas. Essa leitura teve como suporte as categorias ou
grupos de análise que orientaram e ordenaram os trabalhos desenvolvidos pelos
renomados autores Geoffrey Baker, Francis Ching e Phillipe Boudon, cujos métodos
são aplicáveis em análises de obras arquitetônicas pertencentes a diferentes períodos
da história da arquitetura, devido ao seu caráter atemporal.
Baker apresenta uma metodologia que evidencia o aspecto perceptivo e
subjetivo da forma, e que procura entender como o arquiteto respondeu ao programa
de necessidades de um edifício, levando em consideração as particularidades do lugar,
o genius loci, e os aspectos culturais envolvidos, inclusive a linha de pensamento do
autor e suas experiências profissionais, bem como referências do passado e do
presente. Afirma, então, a existência de três fatores, aos quais está condicionada a
obra arquitetônica: condições do lugar, requisitos funcionais e fator cultural. O estudo
especulativo apresentado por Baker utiliza muito pouco, como material básico de
análise, os desenhos de projeto, apoiando-se em desenhos próprios estilizados e em
perspectivas que revelam o processo de busca da forma específica a partir da
transformação de uma forma genérica e do conhecimento das relações existentes entre
os elementos constituintes. Este conjunto de elementos gráficos é complementado pelo
conteúdo textual que procura facilitar a compreensão das fases dessa concepção, bem
como as idéias e princípios adotados pelo projetista.
Para Ching, a elaboração de um projeto pressupõe o reconhecimento de uma
situação problemática oriunda dos elementos pré-existentes que se apresentam ao
projetista, e que será resolvida através da aplicação de um vocabulário arquitetônico
previamente apreendido. Propõe, então, a ampliação e o aperfeiçoamento deste
vocabulário a partir do estudo de elementos geométricos básicos da forma e do espaço
aplicados à arquitetura, com a apresentação de soluções projetuais genéricas versando
sobre diferentes aspectos de organização espacial, relações espaciais e princípios
formais, exemplificadas por edifícios de épocas históricas distintas. Com isso, expõe um

85
método de análise que não se atem ao estudo de uma determinada edificação, pelo
contrário, propõe o reconhecimento de atributos formais e conceitos (forma, espaço,
plano, volume, superfície, escala, proporção) com base no saber e no entendimento
dos elementos do vocabulário arquitetônico e de suas articulações, não levando em
consideração especificidades como características do lugar, experiências pessoais do
projetista, sistemas estruturais ou materiais empregados.
Apesar da diferença entre as metodologias abordadas até o momento, o
esquema gráfico é semelhante, pois assim como Baker, Ching confere destaque à
leitura visual através de desenhos esquemáticos e de perspectivas, empregando neste
caso, com freqüência, as plantas dos edifícios.
A metodologia desenvolvida por Boudon, conhecida como Arquiteturologia, tem
como principal característica o conhecimento do processo de concepção projetual a
partir de categorias vinculadas à arquitetura. Este método envolve dois conceitos
básicos: modelo e escala. O primeiro corresponde ao que é repetido ou reutilizado em
um projeto, oriundo do conhecimento e das experiências do projetista, e o segundo é o
que atribui medida ao primeiro, não necessariamente métrica, com a finalidade de
ajustá-lo ao espaço arquitetônico real. No entanto, para que a escala seja definida, é
preciso eleger um ponto de vista, ou seja, é preciso haver relação de pertinência com
determinadas referências como aquelas vinculadas ao local. São vinte as escalas
adotadas pelo autor, e passíveis de identificação no estudo de análise morfológica de
um edifício, dentre elas a escala humana, de modelo, técnica, funcional, de visibilidade,
ótica, geográfica e parcelar. É importante assinalar que, na metodologia de Boudon, a
análise textual se sobressai em relação à análise gráfica.
Tomando como referência algumas recomendações metodológicas empregadas
pelos autores acima, foram definidos os critérios que tornaram possível a análise
morfológica desenvolvida neste capítulo, a partir de três categorias que estão presentes
na estrutura desses trabalhos: implantação e acesso, composição das fachadas e
volumetria, e distribuição espacial.
Tais categorias comparecem em todos os estudos de Baker, correspondendo
aos temas utilizados por ele nas descrições de suas análises. Ao citar o tema forças do
lugar, o qual foi de extrema importância no desenvolvimento deste trabalho, o autor fala

86
não apenas dos fatores físicos condicionantes do lugar, como as vistas, o clima, as vias
de acesso e o perfil topográfico, interferindo na implantação e nos acessos do edifício,
mas assinala a questão cultural (material, técnica, experiência do arquiteto) como fator
que também intervêm na concepção da forma arquitetônica. No estudo sobre a forma
volumétrica do edifício, adota, com freqüência, como procedimento de análise as
transformações partindo de uma forma geométrica básica até alcançar a forma
específica. Analisa também os planos das fachadas, no que diz respeito à forma, à
orientação e à relação com o espaço circundante, bem como as organizações espaciais
internas, destacando sua funcionalidade através de eixos e de perspectivas
axiométricas, a sua configuração e setorização espacial.
Em relação à Ching, seu trabalho de análise também foi estruturado em torno
dessas categorias, através das quais revela princípios que têm como objetivo
esclarecer as distintas maneiras de organização e concepção de uma forma
arquitetônica. Foram úteis alguns destes princípios, como o estudo da transformação
da forma apresentado no segundo capítulo, de onde foram extraídos os conceitos de
forma subtrativa, aditiva e linear. Mais adiante, da relação forma e espaço, foram
observados os elementos retilíneos verticais que, segundo o autor, são capazes de
atribuir foco ao espaço que encerram. Na análise da organização do espaço interno, foi
aplicado o conceito de espaços adjacentes exposto na metodologia de Ching, bem
como o princípio de organização que define o agrupamento de tais espaços ao longo de
um eixo. Foram úteis também os estudos sobre circulação, acesso e entrada, bem
como sobre escalas e proporções, de onde se destacaram as linhas reguladoras como
sistemas de proporcionalidade e a análise das ordens clássicas. Por último, Ching
apresenta os princípios que atribuem ordem à concepção formal, e que foram
empregados neste estudo, como eixo, simetria, hierarquia e ritmo.
No método arquiteturológico de Boudon, as escalas atribuem medidas aos
elementos arquitetônicos referentes às categorias de análise. Para este trabalho,
especificamente, foi importante o estudo das seguintes escalas: escala técnica que
consiste na atribuição de medida com base em considerações dessa ordem; escala
funcional que se apóia na finalidade ao qual se destina o espaço para atribuir medida
ao mesmo; escala de vizinhança que considera a continuidade espacial como

87
referência para atribuir medida à forma arquitetônica; escala de parcelamento que está
vinculada à implantação do edifício e atribui medidas a partir do tamanho, forma e
limites do terreno; escala geográfica que leva em consideração dados não dimensionais
do terreno como o clima, orientação solar e a topografia; escala de visibilidade que se
refere à atribuição de medida a um espaço para que ele seja visto de algum lugar ou
que algum lugar seja visto a partir dele; escala sócio-cultural que consiste em levar em
consideração costumes, convenções ou formas tradicionais na definição do espaço
arquitetônico; escala de modelo que se refere à retomada de modelos do passado, com
modificações de grau e natureza, na atribuição de medidas; e a escala geométrica que
consiste no emprego dessas configurações com o intuito de realçar uma parte ou o todo
de um espaço.
Sendo assim, na definição dos critérios adotados na análise das casas, o estudo
levou em consideração, em primeiro lugar, a relação entre o contexto e o projeto, a
partir do momento em que assinalou as especificidades do lugar e os aspectos culturais
na concepção das casas selecionadas. Além disso, a investigação procurou destacar o
vínculo com modelos arquitetônicos do passado e do presente, bem como utilizou
conceitos extraídos das referências metodológicas citadas anteriormente que facilitaram
e conduziram o desenvolvimento deste estudo, e que se referem a princípios de
organização atribuídos às soluções adotadas pelos projetistas como simetria, eixos,
ordenação, hierarquia, ritmo, orientação espacial, traçado regulador, configuração total
ou parcial, dentre outros. Além disso, foram empregados conceitos que estão
vinculados ao aspecto psicológico da percepção da forma como estabilidade,
movimento, privacidade e visibilidade.
Diferentemente dos métodos que serviram como referência, o material utilizado
nas análises, com exceção dos volumes esquemáticos, não consistiu em
representações gráficas desenvolvidas pela própria autora, mas nos próprios desenhos
arquitetônicos concebidos no início do século, compostos pelas plantas dos
pavimentos, pelos cortes, geralmente dois, e pela fachada principal. Em alguns
momentos, tais desenhos foram desmembrados ou tiveram suas partes constituintes
destacadas, a fim de exemplificar, de forma mais clara, os textos explicativos. O

88
conjunto de fotos serviu como material complementar e ilustrativo das soluções
projetadas.
Sendo assim, com base nos critérios que caracterizam a metodologia descrita
até o momento, serão apresentadas, a seguir, as análises morfológicas das cinco casas
selecionadas.

89
3.1 -Casa de Marcolino Rodrigues
(Villa Alice)

Nome do proprietário: Marcolino Rodrigues


Construtor: Manoel Rudriguez Esteves
Arquiteto: Augusto dos Santos
Localização: Rua Joaquim Murtinho, 552, antigo 202, Rio de Janeiro/RJ
Data do projeto: 1916
Data da construção: 1917
APAC de Santa Teresa: imóvel preservado
Estado atual de conservação: conservado
Área útil: 173,80 m²
Largura da testada:10,00 m
Gabarito: dois pavimentos e um porão

Fig. 20: Foto da fachada principal


Fonte: Arquivo da autora, 2011.

90
Implantação e acesso

Se o loteamento realizado na Rua Joaquim Murtinho e no qual se encontra


inserido o terreno da Villa Alice refletiu, de um lado, a necessidade de se obter testadas
mais largas que aquelas vinculadas ao padrão colonial, por outro deu continuidade a
um esquema de loteamento rentável através de terrenos compridos e estreitos. Essa
característica, associada à declividade que confere dinamismo e direção ao terreno,
induziu o projetista a adotar o lote como referência para atribuir uma solução
longitudinal à implantação da casa, com eixo paralelo a uma das divisas laterais,
situando-a próxima à testada e no ponto mais elevado. Essa implantação ao longo do
declive, afastada dos limites do lote, possibilitou também aberturas em todas as
fachadas e a introdução de um jardim no afastamento frontal, cuja estreita dimensão
estava vinculada à própria topografia que, como em todas as casas deste lado da rua,
obrigava aproximar o edifício da testada para maior economia de aterro e estrutura.
As características topográfica e dimensional do terreno, que mede 10,00 x 35,00,
são alguns dos fatores que constituíram o que Baker 29 chama de forças do local, ou
seja, forças distintivas do contexto responsáveis também pela definição da forma
arquitetônica.

N
acréscimo

Eixo longitudinal
descendente

Fig. 21: A implantação da casa e o acréscimo que não consta no projeto


original de 1916.
Fonte: Planta Cadastral de 1953. Secretaria Municipal de Urbanismo.

29
BAKER, Geoffrey H. Le Corbusier: análise da forma. Barcelona: Editorial Gustavo Gili, 1984.

91
Fig. 22: Corte longitudinal revelando a declividade do lote.
Fonte: Projeto original de 1916, AGCRJ.

Quanto ao acesso da rua em direção à entrada principal da residência, a visão


oblíqua do observador a partir do portão de ferro destaca a volumetria do pórtico
octogonal, o principal elemento da fachada, e, ao mesmo tempo, indica o percurso em
direção a este e às escadas laterais, que possibilitam o acesso ao pavimento inferior.
Deste patamar, desce outro lance de escada para o pavimento onde foi projetado o
antigo porão. Se a visão do observador, ao entrar no terreno através de um portão não
centralizado, estivesse alinhada com o pórtico, a percepção tenderia à planificação da
fachada e não valorizaria tanto tal volumetria.

92
Fig. 23: A imagem revela a visão oblíqua do observador em relação ao
pórtico da entrada, a partir do portão.
Fonte: Arquivo da autora, 2011.

Pórtico de
entrada

Fig. 24: Na imagem, vê-se o portão da rua centralizado no muro curvilíneo da


testada e a visão do pórtico avançado em relação ao plano da fachada.
Fonte: Projeto original de 1916, AGCRJ.

93
Fig. 25: Nesta planta, observa-se o primeiro lance de escadas que
conduz ao patamar inferior, e o segundo lance que conduz ao porão.
Fonte: Projeto original de 1916, AGCRJ

Fig. 26 e 27: As escadas laterais que dão acesso ao pavimento inferior


Fonte: Arquivo da autora, 2011.

94
Composição das Fachadas e Volumetria

A fachada principal revela uma composição assimétrica, definida por uma


configuração total quadrangular, e dividida por duas partes de dimensões distintas e
bem articuladas entre si. Cada parte foi trabalhada separadamente, dentro uma
solução rigorosamente simétrica, sendo uma plana e outra octogonal e avançada que
corresponde ao espaço do vestíbulo. O traçado evidencia o predomínio da
verticalidade, sobretudo, no torreão do vestíbulo e nas janelas e vãos em estilo gótico.

Fig. 28, 29 e 30: A configuração quadrangular, a verticalidade da


fachada e as duas partes que a compõem
Fonte: Projeto original de 1916, AGCRJ

O pórtico de volume octogonal projetado a partir do plano da fachada, coroado


por uma cúpula em ardósia e acessado por uma escada curvilínea, é uma parte que

95
possui movimento e destaque. Cabe salientar que este elemento consistiu em solução
comum nas construções ecléticas oficiais e da alta burguesia, tendo sido abordado
também pelas publicações da época, representadas pelos tratados e manuais de
arquitetura. A título de ilustração, cito dois destes livros impressos em língua
portuguesa e que expuseram as ordens clássicas a partir do Tratado de Vignola:
“Noções Theoricas de Architectura Civil”30, de 1841, do professor substituto de
arquitetura civil da Academia de Lisboa, J. C Sequeira, e o manual “O Vinhola dos
Proprietários”31, publicado em 1853, mas editado também em 1879, obra escrita em
francês por Moisy e traduzida para o português pelo professor de línguas portuguesa e
francesa José da Fonseca. O primeiro descreve a utilização das Ordens nas
decorações dos pórticos e arcadas e o segundo sugere a presença deste elemento em
uma de suas composições de fachadas.
A cúpula apresenta o maior grau de importância neste contexto visual, atraindo a
atenção do observador, não pelo seu dimensionamento, mas pela sua configuração,
transformando-se em elemento de referência de qualquer estudo descritivo da fachada
principal da casa. A escada, solução construtiva que tantas vezes foi utilizada na
história da arquitetura com o objetivo de realçar a entrada, também constitui uma
solução importante neste conjunto. Sendo assim, o autor do projeto acabou adotando
esses elementos para criar um foco visual suficientemente potente para atrair a atenção
do observador sobre a obra.

30
SEQUEIRA, J. C. Noções theoricas de architectura civil. Lisboa: Typografia de José Baptista Morando, 1858.
31
MOISY, Pae. Vinhola dos Proprietários ou as cinco ordens de architectura, segundo J. Barrozio de Vinhola.
Tradução José da Fonseca. Paris: Langlumé Livreiro- Editor, 1853.

96
Fig. 31: A cúpula do pórtico.
Fonte: Arquivo da autora, 2011.

Fig. 32: A escada curvilínea que compõe o pórtico da casa.


Fonte: Arquivo da autora, 2011

97
Uma simulação alterando a composição deste corpo octogonal revela,
claramente, como a ausência dos elementos assinalados anteriormente interfere no
grau de importância deste conjunto, aproximando-o do corpo adjacente. É a importância
atribuída à percepção ótica determinando a escolha do partido arquitetônico, conforme
afirma Boudon32.

Fig. 33 e 34: Projeto da fachada principal. O desenho à direita corresponde


à simulação sugerida na análise.
Fonte: Projeto original de 1916, AGCRJ

32
BOUDON, Philippe. Richelieu, ville nouvelle. Essai d’architecturologie. Paris: Dunod, 1978, p.

98
Por outro lado, o telhado em ardósia, típico dos países de clima frio, foi uma
solução justificada por uma atitude romântica e liberal fundamentada no gosto e na
moda de modelos europeus do passado e presente nos mais renomados edifícios
ecléticos cariocas do período. Sendo assim, não só a cobertura, mas toda a
composição decorativa caracterizada pelo emprego de elementos do vocabulário
clássico e gótico hierarquizaram a fachada, tendo em vista a via de acesso para onde
está voltada.
Obras como a Mansão Figner e o Palácio do Distrito Federal, construído para a
Exposição Nacional de 1908, podem ter sido acionados pelo autor do projeto como
modelos que serviram de inspiração para alguns elementos construtivos introduzidos no
pórtico de entrada.

Fig. 35: Mansão Figner. Projeto de Fig. 36: Palácio do Distrito Federal.
Gustavo Adolphsson, 1912. Projeto de Oliveira Passos, 1908.
Fonte: SÁ, 2002, p.42 Fonte: LEVY, 2008, p.106

Pode-se dizer que o ecletismo da Villa Alice segue uma tendência estilística
clássica marcada pelo neobarroco representado, aqui, pelos elementos de destaque
cúpula e escada. Ao lado desse classicismo, presente também nos elementos
decorativos em estuque, nota-se a introdução do gótico nas aberturas e na arcada do

99
pórtico, bem com uma influência art nouveau nos elementos em ferro que compõem o
alpendre e nas linhas sinuosas do portão da rua.

Fig. 37: Detalhe do fechamento do degrau da escada do


alpendre lateral.
Fonte: Arquivo da autora, 2011.

Fig. 38 e 39: Detalhes da estrutura do alpendre


Fonte: Arquivo da autora, 2010.

100
Fig. 40: As linhas sinuosas do portão em ferro de
acesso ao lote.
Fonte: Arquivo da autora, 2011.

Alguns elementos decorativos (adereços, guarnições, ornatos) em estuque


constituintes desta fachada podem significar a utilização, por parte do projetista, não
apenas de referências construtivas, mas também de referências ornamentais
encontradas em publicações estrangeiras. Um exemplo disso é o livro “Styles of
Ornament”, publicado no início do século XX pelo alemão Alexander Speltz 33 e cujas
gravuras, em grande parte, foram extraídas do livro “Motifs Historiques D’architecture et
de Sculpture D’ornament” de César Daly (1811-1894). Era uma versão popular de uma
série de outros impressos que surgiram durante o período eclético e se caracterizaram
pela reunião e difusão de ornamentos de diferentes períodos históricos 34. Esses
ornamentos vistos nas fachadas ecléticas eram, na sua grande maioria, produzidos em

33
SPELTZ, Alexander. Styles of Ornament. Nova York: Grosset &Dunlap, s.d.
34
LIMA, Solange Ferraz. O trânsito dos ornatos: modelos ornamentais da Europa para o Brasil, seus usos (e
abusos). Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0101-47142008000100005&script=sci_arttext (acesso
em 10/02/2010).

101
série e comercializados através de catálogos, aos quais os profissionais tinham
acesso35.
Na Villa Alice, o medalhão com figura humana situado acima das janelas góticas
e da entrada do pórtico, bem como as guirlandas presentes nas faces do octógono
foram motivos muito utilizados na época e que podiam ser encontrados em ornamentos
de alguns edifícios históricos do livro de Speltz.

Fig. 41: Detalhe de console com figura humana no interior do Town Hall. Ausgsburg,
Alemanha, século XVII.
Fonte: SPELTZ, s.d, p. 390

Fig. 42 e 43: Alguns exemplos de guirlandas em detalhes presentes no livro de Speltz.


Fonte: SPELTZ, s.d., p. 500 e 551

35
LIMA, op. cit., p. 18.

102
Fig. 44, 45 e 46: detalhes da composição decorativa da Villa Alice.
Fonte: Arquivo da autora, 2010.

103
Ao lado dos medalhões, os demais ornatos eram resultado da estilização de
formas vegetais. Josef Fuler em “Elementos de Modelação de Ornato de Figuras”, de
1905, destaca que, além do acanto, foram comuns também os elementos inspirados na
barra da videira, em flores, na oliveira, bem como aqueles inspirados na fauna 36.
Da mesma maneira, as ordens clássicas a partir das quais foram concebidas as
colunas do pórtico e as pilastras que fingem sustentar o arco decorado que envolve as
janelas estavam presentes também em manuais de arquitetura do período, dentre eles
“Noções Theoricas de Architectura Civil”37, citado anteriormente.

Fig. 47: Detalhe de um capitel compósito. Fig. 48: Foto de uma das colunas que compõem o
Fonte: SEQUEIRA, 1841. pórtico.
Fonte: Arquivo da autora.

Quanto à presença do gótico na fachada, raramente visto em edifícios


residenciais da época, Speltz também apresenta exemplos desses elementos em
edifícios europeus. Além disso, havia referências arquitetônicas importantes na cidade
como o Real Gabinete Português de Leitura. Por outro lado, a possibilidade de contato
do proprietário com outras fontes, através de viagens ou por meio das revistas e jornais
36
FULER, Josef. Elementos de modelação de ornato de figuras. Lisboa: Biblioteca de Instrução Profissional,
1905, p. 17.
37
SEQUEIRA, op. cit., p. 11.

104
nacionais e estrangeiros que circulavam na cidade, ou mesmo através das exposições
nacionais e internacionais que ditavam o padrão a ser seguido, pode ter contribuído
para essa influência.

Fig. 49: Real Gabinete Português de Leitura. Projeto de Fig. 50: Janelas em estilo gótico da fachada
Rafael da Silva e Castro, Século XIX. principal da Villa Alice.
Fonte:http://www.google.com.br/imgres?imgurl=http://1.bp.blogspo Fonte: arquivo da autora, 2010.
t.com/

Aqui, faço um pequeno parêntese para frisar que esse contexto arquitetônico,
dentro do qual a Villa Alice foi concebida, foi fruto, como se sabe, da assimilação de um
gosto importado, e que por isso exigiu mudanças na prática construtiva. A presença de
uma solução arquitetônica e projetual como a cúpula por exemplo, que é um dos
principais elementos da fachada principal, exigiu a importação e o conhecimento de
técnicas e materiais necessários a sua execução. O arquiteto tinha que ter
conhecimento do fazer construtivo ao realizar seus projetos de arquitetura, pois ambos
não podiam estar dissociados. É o que Épron, ao falar sobre a construção e o projeto,
afirma quando diz que “a prática do projeto engloba o domínio da construção”38.
Dando continuidade à análise, o embasamento em pedra de aproximadamente
um metro de altura, cujas aberturas correspondem ao quarto do pavimento inferior,
constituiu, segundo Carlos Lemos, “em peça fundamental, tanto quanto dizia respeito

38
ÉPRON, Jean-Pierre. Comprendre L’Écletisme. Paris: Éditions Norma, 1997, p. 126.

105
aos programas quanto à estética da construção, pois não era elegante a casa estar ao
nível do chão, do jardim...” 39. A presença desta base diferenciada pela aparência
rústica, correspondeu a uma solução de ordem construtiva, mas também à adaptação
de uma antiga tradição clássica de se introduzir no primeiro plano da fachada, ou seja,
no “res-do-chão”, um tratamento deste tipo, de aparência resistente e de concepção
mais singela das aberturas. Segundo Summerson, esta solução surgiu no
renascimento, com a utilização de ordens sobre um andar inferior formado por arcos e
paredes tratadas com rusticação40.

Fig. 51 e 52: Uma das aberturas com gradil de ferro do


embasamento.
Fonte: Arquivo da autora, 2010

A opção por definir a presença apenas do pavimento térreo na sua composição é


uma peculiaridade da Villa Alice, tendo em vista a solução mais comum de dois
pavimentos. Sendo assim, a topografia do terreno, em declive, fez com que o
pavimento inferior e o porão não fossem visualizados da rua. Apesar de possuir
apenas um andar aparente, a Villa Alice impõe presença no contexto visual da rua, pois
o embasamento em pedra citado anteriormente serviu também para inserí-la no meio
circundante, elevando a sua altura e verticalizando a fachada.
39
LEMOS, Carlos A.C. A república ensina a morar melhor. São Paulo: Editora Hucitec, p. 72.
40
SUMMERSON, John. A linguagem clássica da arquitetura. São Paulo: Martins Fontes, 1997, p. 58.

106
Fig. 53: Visão da casa ao se subir a rua. Ao fundo, a casa de dois
pavimentos da Família Faria.
Fonte: Arquivo da autora, 2011.

Pavimento de acesso
Nível da rua

Pavimento inferior

Porão

Fig. 54: Corte longitudinal. A fachada vista da rua corresponde apenas ao


pavimento de acesso.
Fonte: Projeto original de 1916, AGCRJ.

Em relação às fachadas laterais, fatores como a estreita largura do lote, a


possibilidade da construção vizinha encobrir a visão das mesmas e o próprio poder

107
aquisitivo do proprietário podem ter interferido na simplificação do tratamento atribuído
a essas superfícies, limitando-se o projetista, neste caso, a cumprir apenas as
exigências legais quanto à presença e ao dimensionamento das aberturas. Como foi
dito no primeiro capítulo, era obrigatória a colocação de venezianas em todos os
dormitórios, latrinas e banheiros. Em relação à fachada dos fundos, observam-se,
ainda, alguns detalhes construtivos remanescentes como o terraço do pavimento de
acesso, o gradil do guarda-corpo em ferro e a varanda do pavimento inferior que foi
fechada. Foi realizado um acréscimo lateral que se estende em direção ao fundos da
casa e que não consta no projeto original. A localização dos terraços nesta fachada e
não na fachada principal, é uma característica das casas do lado par da Rua Joaquim
Murtinho, ou seja, uma solução determinada pela topografia somada à visão
privilegiada da cidade do Rio de Janeiro.

Fig. 55 e 56: À esquerda, fachada lateral direita, onde a porta localizada entre duas
janelas correspondia à sala de jantar do pavimento inferior. Ao lado, uma das janelas
desta sala, composta de duas folhas, em madeira, com venezianas e vidro
Fonte: Arquivo da autora, 2010

108
Fig. 57 e 58: Fachada dos fundos da casa com o acréscimo lateral à direita. Em destaque, a varanda
que foi fechada, restando apenas um pequeno corredor e o gradil. O terraço acima permanece.
Fonte: Arquivo da autora, 2011.

Fig. 59: Vista da fachada dos fundos.


Fonte: Arquivo da autora, 2011.

109
O volume da casa está intimamente vinculado à configuração alongada do lote
onde está inserido. Este volume é composto pelo agrupamento de um prisma
retangular recortado com um prisma octogonal, sendo este último uma forma aditiva,
independente do corpo principal, cuja função é destacar o acesso principal da casa.

Fig.60: Configuração volumétrica da Villa Alice.

Dimensões aproximadas da casa


Largura : 6,30m
comprimento :17,50 m

110
Distribuição Espacial

Fig. 60, 61, 62, 63: Acima, planta do pavimento de acesso e do pavimento inferior. Abaixo,
Planta do porão e corte longitudinal.
Fonte: Projeto original de 1916, AGCRJ.

111
Os espaços estreitos resultantes do amplo programa de necessidades da família
foram distribuídos, de forma bem peculiar, em dois pavimentos e um porão, implantados
ao longo da topografia acidentada e vinculadas às limitações dimensionais do lote. O
pavimento de acesso foi constituído por três áreas bem definidas e com funções
diferenciadas: um vestíbulo octogonal, um alpendre lateral com colunas e guarda-corpo
em ferro, uma área social composta pela sala de espera e de visitas, e uma área íntima
com três quartos, um toalete e um banheiro, que ocupava a maior parte do pavimento e
ficava, praticamente, isolada do social através de um corredor transversal que era
acessado também pelo alpendre lateral em ferro. Este corredor, perpendicular ao
corredor principal da casa, permitiu ao projetista situar quartos no pavimento de acesso,
dando-lhes total privacidade, já que a solução habitual era isolá-los no pavimento
superior. Já no pavimento inferior, localizado abaixo do nível da rua, os espaços
correspondiam praticamente à disposição do pavimento de acesso, com algumas
dimensões alteradas, devido ao deslocamento de paredes. Este pavimento era
composto por uma sala de costura, dois quartos, uma sala de jantar, um banheiro,
provavelmente social, copa, cozinha, despensa e terraço. No porão, ficava um banheiro
de serviços e a lavanderia.

Fig. 64: O pórtico da entrada principal e o alpendre lateral que davam


acesso à sala e ao corredor transversal.
Fonte: Arquivo da autora, 2011.

112
Fig. 65: Detalhe do alpendre.
Fonte: Arquivo da autora, 2011.

Fig. 66 e 67: As fotos acima mostram o corredor de distribuição do pavimento inferior. Á esquerda, a
porta que dava acesso a um dos quartos da casa. Á direita, a imagem revela o outro lado do
corredor, a antiga copa e o acesso para a cozinha. Nota-se o elevado pé-direito de 4,00m.
Fonte: Arquivo da autora, 2010

113
Os espaços internos, atualmente bastante modificados, se distribuíam no sentido
longitudinal e foram definidos pelo traçado das linhas divisórias transversais
correspondentes às paredes descontínuas, outra singularidade da casa. Eram
quadriláteros adjacentes, organizados ao longo de uma circulação linear. Entre os
pavimentos, a comunicação se dava por meio de uma escada de dois lances.

Fig. 68: Eixo longitudinal e as linhas transversais.


Fonte: Projeto original de 1916, AGCRJ.

Analisando a setorização da casa, observa-se que a área íntima domina a


distribuição dos espaços internos com a presença de um número considerável de
quartos, talvez para acomodar uma família de muitos membros. A área de serviços
corresponde ao menor setor dentro da casa, desta vez não como bloco volumétrico
anexado ao bloco principal da casa, mas inserido nela. Outro detalhe importante é a
distribuição do setor social, ou seja, sala de visitas no pavimento de acesso separada
da sala de jantar no pavimento inferior.

114
N

Área de serviço

Área social

Acesso

Lavabo e
banheiro

Circulação

Área íntima

Fig. 69: A Setorização espacial da Villa Alice.


Fonte: Projeto original de 1916, AGCRJ.

Outro aspecto a ser descrito é a incidência da luz solar sobre as áreas


projetadas, que não chegou a interferir na distribuição interna, tendo em vistas as
limitações do lote. No pavimento inferior, o projeto original revela que a área molhada e
de ocupação temporária, que corresponde à cozinha, ao banheiro e à despensa, ficou
concentrada na fachada noroeste, a mais aquecida, enquanto que o terraço, a sala de
jantar, a escada e o quarto maior foram alinhados na fachada lateral oposta. No
pavimento de acesso, a sala de visitas, que estava voltada para a fachada sudoeste,
teve no alpendre lateral mais um elemento de proteção solar. A característica

115
longitudinal fez com que os quartos fossem situados ao longo das fachadas leste e
oeste.

116
3.2 -Casa de João Pedro de Fraga Lourenço

Nome do proprietário: João Pedro de Fraga Lourenço (comércio de exportação de


café)
Engenheiro: Juan Gatell Solá
Construtor: Manoel Rudriguez Esteves
Localização: Rua Joaquim Murtinho, 598, antigo 218, Rio de Janeiro/RJ
Data do Projeto: 1916
Data da construção: 1917
APAC de Santa Teresa: imóvel preservado
Estado atual de conservação: conservado
Área útil: 217,80 m²
Largura da testada: 17,00 m
Gabarito: dois pavimentos e um porão

Fig. 70: Foto tirada poucos anos depois da construção.


Fonte: Acervo de Maria Inês Garcia de Souza, 2010

117
Implantação e Acesso

O terreno correspondente à casa da família Fraga Lourenço possui,


aproximadamente, 17 metros de largura e 33 metros de profundidade, configurando um
quadrilátero. A tendência direcional da declividade no sentido longitudinal foi uma força
do lugar relevante na implantação da casa e na distribuição dos espaços internos,
tendo sido atenuada, no entanto, pela largura do terreno, que possibilitou uma pequena
expansão neste sentido. Além disso, o imóvel está situado próximo à via de acesso,
logo na região mais elevada do lote.
Esta implantação mantém correspondência com a forma do terreno, distribuindo
os níveis da casa ao longo de um eixo longitudinal não paralelo às divisas laterais do
lote. Nota-se que o projetista, com a intenção de acertar a posição da casa, optou por
alinhar a mesma tomando como linha referencial a divisa dos fundos do lote. Esta
solução fez com que a fachada não assumisse os extremos de proximidade e distância
da testada do lote, o que aconteceria caso estivesse paralela as laterais do mesmo. A
testada corresponde à vista sul, a de acesso pela rua Joaquim Murtinho, já o
alinhamento dos fundos está voltado para a melhor vista do terreno, a da paisagem do
Rio de Janeiro.
Eixo do
terreno

acréscimo

Eixo da casa

Fig. 71: Implantação da casa com acréscimo da


garagem no lado direito que não consta no projeto Fig. 72: Corte longitudinal revelando a declividade
de 1916. do terreno.
Fonte: Planta Cadastral de 1953, Secretaria Municipal Fonte: Projeto original de 1916.AGCRJ.
de Urbanismo
118
Observam-se também os afastamentos dos limites do lote exigidos pelo poder
público, tendo em vista a necessidade de se obter residências mais salubres. Tais
afastamentos, aliados à existência de um pavimento superior e à largura do lote deram
maior visibilidade às fachadas laterais. Na frente, foi introduzido um jardim na área
aterrada, ficando nos fundos um amplo quintal.

Fig. 73: A largura do terreno permitiu a visualização das fachadas laterais


Fonte: Acervo de Maria Inês G. de Souza, 2010

Quanto ao acesso, observa-se uma solução descentralizada do eixo dominante


da casa, mas que revela claramente a entrada através do alinhamento do portão da rua
com o acesso localizado do lado esquerdo da fachada. Devido à necessidade de se
buscar maior privacidade, a porta de entrada foi situada na lateral, não sendo revelada
na esquina marcada pelo alpendre. Na parede, que é vista do portão da rua, foi
introduzida uma delicada pintura de mulher, de traço art nouveau, realizada pelo pintor
espanhol Colon. Parece que o projetista quis colocar o visitante, primeiramente, diante
de um símbolo cultural de status destacando o ar sofisticado da casa e o nível social do
proprietário, uma pessoa abastada, que muito viajava. O jardim pequeno, mas pitoresco

119
e o requintado alpendre recebiam o visitante que, só então, teria acesso à porta da
casa. Esta solução referente à localização do portão não corresponde ao projeto
original, onde o mesmo encontra-se centralizado e coincidindo com o eixo da porção
principal da fachada
Outra divergência em relação ao projeto diz respeito ao arco pleno que destaca
esta entrada. A solução escolhida foi um entablamento com revestimento
provavelmente cerâmico em tom laranja, que acabou sendo substituído pelo arco,
talvez pelo fato deste elemento já estar presente também nas vergas das janelas da
fachada.

Fig. 74: Na imagem à esquerda, o portão centralizado no projeto


original. Á direita, a fachada projetada.
Fonte: MELLO, 2003, p.25

120
Alpendre
de
entrada

Portão da rua

Fig. 75 e 76: Detalhe do portão e do alpendre.


Fonte: Acervo Maria Inês G. de Souza, 2010

Fig. 77 e 78: Pintura realizada pelo artista Colon na parede do alpendre à direita.
Fonte: Arquivo da autora, 2011.

121
Além da entrada principal, a casa apresentava também uma escada de serviço
que conduzia à cozinha nos fundos e por onde entravam os empregados, tendo sido
retirada pelas atuais proprietárias devido ao seu mal estado de conservação. Há
também acesso por uma longa escada de pedra de cantaria, pelo lado esquerdo,
colada na parede da divisa do lote, que desce do jardim da frente, pára no patamar do
porão e continua para os demais pisos externos.

Fig. 79 e 80: A foto à esquerda mostra a escada que percorre todos os


patamares do terreno pelo lado esquerdo do lote. À direita, a porta da
cozinha na fachada dos fundos da casa, de onde saía a escada.
Fonte: Arquivo da autora, 2011.

122
Composição das Fachadas e Volumetria

Segundo Baker, a proximidade da via de acesso constitui uma das forças


dominantes que influenciam direta ou indiretamente a forma arquitetônica, podendo,
conseqüentemente, determinar tratamento hierarquizado das fachadas.

Este princípio de desenvolvimento, segundo o qual a forma que adotam os


organismos está de acordo com as forças que o envolvem, se assemelha ao
modo como a forma arquitetônica é parcialmente fruto da resolução de um
problema particular, como também das forças distintivas do contexto donde se
encontram. A relação entre edifícios e entorno se estabelece de forma mais
positiva, considerando fatores tais como as vistas, a trajetória solar, a
proximidade de vias de acesso. 41

A fachada principal recebeu um tratamento hierarquizado em relação às demais,


devido, justamente, ao acesso pela Rua Joaquim Murtinho. A solução assimétrica
compõe-se de duas partes: uma localizada à esquerda e um pouco mais recuada, e
uma hegemônica constituída por dois elementos prismáticos e verticais avançados, que
emolduram uma superfície central recuada, originando uma alternância rítmica e
dinâmica na distribuição dos elementos compositivos. Na história da arquitetura, essa
variação rítimica é observada a partir do barroco e do manerismo, tendo em vista que,
no Renascimento, as fachadas mantinham uma estrutura modular linear, caracterizada
pela regularidade e monotonia na inserção de portas, janelas e elementos ornamentais.
Summerson, ao analisar a Igreja de Gesu do arquiteto Vinhola (1507-1573), assinala
que “se tentarmos soletrar a arquitetura do edifício em terrenos da Alta Renascença,
logo encontraremos dificuldades”42

41
BAKER, Geoffrey H. Le Corbusier: análise da forma. Barcelona: Editorial Gustavo Gili, 1984, p. 4.
42
SUMMERSON, op. cit., p.65 .

123
+

1 2 1

Fig. 81: Parte mais recuada à esquerda e a composição hegemônica da fachada


à direita com alternância rítimica.
Fonte: Projeto original de 1916, AGCRJ

A largura da porção principal da fachada no pavimento de acesso corresponde


não apenas à sala de visitas, mas também ao vestíbulo, o que faz com que o seu eixo
de simetria não coincida com o eixo da sala de visitas, revelando a ausência de
correspondência entre forma e função, ou seja, entre plano da fachada e organização
interna. A Mesma situação ocorre no andar superior, em relação ao quarto.

124
Fig. 82 e 83: O eixo da porção principal da fachada não coincide com o
eixo da sala de visitas e do quarto, apesar de parecer que sim.
Fonte: MELLO, 2003, p. 25

Apesar da configuração total se aproximar da forma quadrangular, não há


equilíbrio entre as linhas que definem os planos da fachada principal. Pelo contrário, há
o predomínio da orientação vertical sobre a horizontal, por conta das estreitas aberturas
e dos elementos avançados que abrangem os dois pavimentos, e aos quais o resto da
composição está subordinada.

125
Fig. 84 e 85: Notam-se as linhas verticais dominando o traçado da
composição da fachada
Fonte: Projeto original de 1916, AGCRJ.

Quanto à composição decorativa, o telhado dos elementos verticais e avançados


é arrematado por um pináculo em madeira, da onde parte um elemento decorativo em
ferro que reforça a linha da cumeeira. No projeto, entre esses elementos havia, sobre o
beiral, uma faixa decorativa e enfeitada por lambrequins recortados. Na verdade, o que
se observa aqui, e que foi observado também no pórtico de entrada, são desenhos
cuidadosamente realizados referentes a soluções que, apesar de não terem sido
concretizadas, revelam a intenção do projetista Gatell em embelezar a composição da
fachada, tornando-a mais suntuosa. Apesar destas referências decorativas terem sido
procuradas em catálogos da época, as mesmas não foram encontradas.

Fig. 86: Telhado da fachada principal.


Fonte: Arquivo da autora, 2010.

126
Fig. 87: Detalhe da cumeeira e do pináculo que arremata o frontão.
Fonte: Arquivo da autora, 2011.

A fachada recebeu influência do estilo art nouveau, presente nos vitrais


coloridos, no elemento em ferro do telhado citado anteriormente, bem como nos beirais
decorados.

Fig. 88: Beiral decorado da fachada principal.


Fonte: Arquivo da autora, 2011.

127
Fig. 89: Vitral presente na fachada.
Fonte: Arquivo da autora, 2011.

Notam-se, também, soluções provenientes da linguagem clássica como a


separação dos pavimentos através de uma solução decorativa inspirada nos
entablamentos jônicos e coríntios, conhecida como dentículo, que consiste em uma
série de formas retangulares, pouco espaçadas, que fazem parte da cornija. Outro
destaque é o conjunto correspondente ao vão da janela da sala de visitas. Caracteriza-
se pela presença de uma arcada constituída por três arcos plenos sustentados por
delicadas colunas, correspondente aos três vãos da janela, e envolvida por uma
moldura que se projeta em relação ao plano fachada. O alpendre também adota a
solução em arco pleno apoiado sobre duas pilastras engastadas na parede, e sobre
uma coluna em estilo coríntio. Neste estilo, também são as duas pequenas colunas que
ladeam a janela do pavimento superior, situada acima do alpendre.

128
cornija

friso

arquitrave

capitel

Fig. 90: Esquema de entablamento jônico em manual do século XIX


Fonte: MOISY, 1853, prancha 17

Fig. 91: A solução em dentículo que assinala a separação entre os


pavimentos
Fonte: Arquivo da autora, 2011.

129
Fig. 92 e 93: A arcada correspondente à sala de visitas do pavimento de acesso.
Fonte: arquivo da autora, 2011

130
Fig. 94: A foto mostra a janela situada acima do alpendre,
emoldurada por um arco pleno e colunas em estilo coríntio.
Fonte: Arquivo da autora, 2011.

Quanto às fachadas laterais, a possibilidade de serem vistas fez com que


recebessem o mesmo tratamento dado à fachada principal em relação aos beirais, no
entanto, com motivo decorativo diferente.

131
Fig. 95: Detalhe do motivo decorativo do beiral das fachadas laterais.
Fonte: Arquivo da autora, 2011.

Fig. 96: Ao fundo, o beiral da fachada principal. Mais


abaixo, o beiral de uma das laterais.
Fonte: Arquivo da autora, 2011.

132
Fig. 97: A varanda ao lado era um espaço Fig. 98: Foto atual da mesma fachada e a
privativo das salas, limitado por um gradil de ferro. garagem que substituiu a varanda.
Fonte: Acervo de Maria Inês G. de Souza, 2010. Fonte: Arquivo da autora, 2011.

Em relação aos fundos, a fachada foi contemplada com uma varanda no


pavimento de acesso, junto à sala de jantar, e um terraço no pavimento superior que
servia aos dois quartos dos fundos e correspondia ao espaço ocupado pela cozinha e
banheiro. A estrutura de pé-direito duplo em arco pleno correspondia ao porão e à
lavanderia aberta, logo abaixo, onde havia dois tanques em pedra de cantaria. Nota-se,
ainda, o elevado platô da onde se tem visão total do quintal dos fundos.

133
Pav. superior

Pav. de acesso

Porão

Lavanderia

Platô elevado, de
onde se avista o
quintal.

Fig. 99: Desenho da fachada dos fundos com o terraço e a varanda.


Fonte: Acervo de Maria Inês G. de Souza, 2010

Fig. 100: Desenhos que revelam como eram os guarda-corpos em madeira da


varanda e do terraço da fachada dos fundos.
Fonte: Acervo de Maria Inês G. de Souza, 2010.

134
terraço
varanda

Fig. 101: Nesta foto, observa-se que o terraço e a varanda foram


fechados.
Fonte: Arquivo da autora, 2011

Fig. 102: O espaço aberto de pé-direito duplo e os arcos


plenos que compõem a estrutura.
Fonte: Arquivo da autora, 2011.

A configuração volumétrica da casa consiste no agrupamento de prismas, um


maior de base retangular e dois delgados. Há ainda uma forma aditiva não estrutural
definindo a volumetria do pavimento de acesso na parte dos fundos, abrigando a
cozinha e o banheiro.

135
Bloco anexado

Fig. 103: Configuração volumétrica da casa.

Dimensões aproximadas da casa:


Largura: 9,50m
Comprimento: 14,40m

136
Distribuição Espacial

Fig. 104, 105, 106, 107: Acima, planta do pavimento de acesso e do pavimento
superior. Abaixo, planta do porão e o corte longitudinal.
Fonte: MELLO,2003, p.25

137
O espaço interno foi concebido conforme o programa reduzido destinado à
família do primeiro proprietário, um homem de negócios que trabalhava com exportação
de café, casado e sem filhos. Pela fachada principal, é possível acessar, diretamente,
às salas e o pavimento superior através da escada em “U”. Segundo o engenheiro
português José Emílio dos Santos Segurado, autor do manual “Edificações”43,
publicado no início do século e dirigido ao público português e brasileiro, essa escada
deveria ficar próxima ao vestíbulo ou entrada, às vezes, fazendo corpo com ele.
O pavimento de acesso é constituído por uma área social composta pela sala de
visitas voltada para a via principal, pela sala de jantar contígua à de visitas e próxima à
cozinha e à copa, e pela sala de bilhar, que atualmente teve seu uso transformado, mas
que na época destinava-se ao convívio social masculino. Verifica-se também a área de
serviços na parte dos fundos da casa, uma varanda na frente alinhada à fachada
principal, que atualmente não existe, mas que funcionava como espaço intermediário
entre o interior e exterior, e uma varanda e um terraço nos fundos funcionando como
mirantes. A área íntima localiza-se no segundo andar e compreende três quartos, um
toalete, uma capela e um banheiro.

Fig. 108: Sala de estar e Sala de jantar


Fonte: arquivo da autora, 2010

43
SEGURADO, João Emílio dos Santos. Edificações. Rio de Janeiro: Francisco Alves, [ s.d].

138
Os ambientes descritos no pavimento de acesso foram definidos através de um
eixo longitudinal, e também através da divisão da casa em duas partes de dimensões
próximas no sentido transversal a esse eixo, formando uma espécie de retícula, que
delimitou as áreas de acesso e social. Anexado a este núcleo principal, foram
distribuídas a área de serviço, a varanda e o terraço. O pavimento superior corresponde
ao arranjo observado no pavimento de acesso, com a introdução do banheiro na
mesma prumada do lavabo, e do toalete e capela a partir de uma divisão da área
correspondente ao acesso.

Fig. 109: O corte acima revela a continuidade das paredes internas e a correspondência
entre as dimensões espaciais definidas nos pavimentos da casa.
Fonte: MELLO, 2003, p.25

139
Eixo longitudinal
N

Volume anexado ao
núcleo principal

Núcleo principal

Divisão da casa em
duas partes.

Fig. 110 e 111: Composição dos espaços internos do pavimento


de acesso e do superior.
Fonte: Projeto original de 1916, AGCRJ.

Na setorização da casa, nota-se uma ampla área social no pavimento de acesso,


reflexo de uma vida social mais intensa do primeiro proprietário. O espaço ocupado
pelo setor íntimo, também bastante amplo, corresponde à área do setor social, solução
projetual bastante comum na época. O espaço destinado ao serviço, no entanto, ocupa
uma pequena parcela da área total.

140
Área de serviço Área íntima

Área social banheiro

Acesso (hall) Toalete e capela

Lavabo circulação

circulação

Fig. 112: Setorização espacial da casa.

Quanto à incidência do sol, na fachada dos fundos o volume anexado que


corresponde à cozinha e à copa no pavimento de acesso, bem como ao terraço
descoberto no pavimento superior, está direcionada para o Norte. Nas fachadas leste e
sudeste, estão localizados os setores social e íntimo, que recebem o sol mais ameno
pela parte da manhã
Observa-se, aqui, também o decorativismo que já havia sido assinalado
anteriormente na análise da casa. As paredes das salas eram revestidas com pinturas
figurativas e estilizadas. Com exceção das pinturas observadas na sala de jantar, as
demais foram retiradas devido ao estado de conservação. Os quartos ainda conservam
as faixas decorativas com motivos de rosas, localizadas na altura da bandeira das
janelas.

141
Fig. 113: Detalhe da faixa decorativa de um dos quartos
da casa.
Fonte: Arquivo da autora, 2010.

Fig. 114:Detalhe da pintura original que reveste a sala de jantar.


Fonte: Arquivo da autora, 2010.

142
3.3 - Casa de Tobias Correa do Amaral

Nome do proprietário: Tobias Correa do Amaral (Engenheiro e funcionário público)


Engenheiro ou arquiteto: desconhecido
Construtor: Carlos Leal
Localização: Rua Joaquim Murtinho, 716, antigo 268, Rio de Janeiro/RJ
Data do Projeto: 1914
Data da construção: desconhecida
APAC de Santa Teresa: imóvel preservado
Estado atual de conservação: modificado
Área útil: 297,00 m²
Largura da testada: 16,00 m
Gabarito: três pavimentos e um porão

Fig. 115: Na foto de 1916, nota-se a casa construída conforme o projeto


original de 1914, mas sem o torreão.
Fonte: Coleção Augusto Malta, Museu da Imagem e do Som.

143
Implantação e Acesso

A declividade e, sobretudo, a configuração irregular do terreno não deixaram


outra alternativa ao projetista a não ser uma implantação longitudinal e oblíqua em
relação à testada, posicionando a frente da casa no sentido contrário de quem sobe em
direção ao bairro. É uma solução peculiar, onde a localização de esquina de uma casa
em relação à trajetória curvilínea da rua se torna mais acentuada. A fachada situada
paralelamente à uma linha reta intermediaria e fictícia fez com que o eixo do terreno
não coincidisse com o eixo do imóvel, o qual ocupa menos da metade do comprimento
do lote de 66,00m, segundo informação obtida no Registro Geral de Imóveis. Os
principais pavimentos da casa foram erguidos sobre uma superfície plana abaixo do
nível da rua e próxima a via de acesso.

Fig. 116: Vista aérea do imóvel


Fonte: http://maps.google.com.br

Fig. 117: A imagem mostra a curvatura da Rua Joaquim Murtinho e a implantação oblíqua da casa.
Fonte: Arquivo da autora, 2011

144
N

Linha fictícia
usada Como
referência
para
implantação
da casa

acréscimo

Eixo da casa

Fig. 118: Implantação da casa e o primeiro acréscimo Fig. 119: Corte longitudinal que mostra a declividade
posterior. do terreno e o patamar que sofreu aterros e desaterros
Fonte: Planta cadastral de 1950. Secretaria Municipal de e sobre o qual foi edificada a casa..
Urbanismo Fonte: Projeto original de 1914, AGCRJ.

A casa, afastada dos limites do terreno, recebeu um pequeno jardim na frente.


Atualmente, no lugar do alpendre (o torreão não chegou a ser edificado) há uma
construção que acabou com o afastamento lateral direito e com a escada de acesso
aos fundos do lote.

Fig. 120: Na foto, observa-se ainda o alpendre no lugar do torreão, os limites laterais e o pequeno
jardim frontal.
Fonte: Coleção Augusto Malta, Museu da Imagem e do Som.

145
Fig. 121: A fachada principal segundo o projeto.
Fonte: Projeto original, 1914, AGCRJ

Fig. 122: Fachada atual e as modificações sofridas pela casa ao longo do


tempo.
Fonte: Arquivo da autora, 2011.

O acesso pela fachada lateral fez com que o projetista situasse o portão próximo
à extremidade direita do muro que faz divisa com a rua, alinhando-o com o alpendre
que serviu de referência visual para a entrada principal da casa. No projeto, esta
referência seria o torreão, o qual deveria ser contornado pelo visitante para que
146
pudesse ter acesso ao vestíbulo. Apesar de ser lateral, talvez o projetista não tenha
tido a intenção de dar privacidade a esta entrada, pois, segundo a foto de 1916, pelo
que parece o muro da divisa era baixo e permitia uma certa visibilidade da porta do
vestíbulo para quem subia a rua. Aliás, vale ressaltar que três fatores podem ter
motivado a solução de se deslocar o vestíbulo para esta fachada: a localização do
gabinete voltado para a rua, não permitindo espaço para abertura de uma porta, a vista
panorâmica vislumbrada pelo visitante ao chegar no alpendre, e a própria visibilidade
do acesso da casa já na subida da Rua Joaquim Murtinho, por conta da implantação
oblíqua da casa.

vestíbulo

O torreão que não foi


construído

Portão de entrada

Fig. 123: Detalhe da planta baixa do pavimento de acesso


Fonte: Planta original de 1914. AGCRJ

147
Fig. 124: A visão que se tem da fachada lateral atual na subida da
Rua Joaquim Murtinho
Fonte: Arquivo da autora, 2011.

Quanto à entrada de serviço, há uma longa escada lateral, do lado direito, que
conduz ao pavimento inferior, ao porão e ao quintal. Neste pavimento inferior, foi
construída uma outra escada de dois lances, na parte posterior da casa, que dava
acesso à copa. No quintal, observam-se, ainda, os degraus entre um patamar e outro.

Fig. 125 e 126: Escada dos fundos que


dava acesso à área de serviços.
Fonte: Arquivo da autora, 2011.

148
Fig. 127: Trecho da escada lateral em pedra, Fig. 128: Foto do amplo quintal nos fundos
que conduz ao pavimento inferior Fonte: Arquivo da autora, 2011
Fonte: Arquivo da autora, 2011

Composição das Fachadas e Volumetria

Não se pode afirmar que o tamanho e a forma do lote tenham limitado a largura
da fachada, pois, conforme observado na simulação abaixo, a expansão no sentido
transversal criaria um equilíbrio entre os eixos que definem a composição. O que houve
foi a opção em se projetar uma fachada longitudinal, retangular, com altura definida
pelo pé-direito mínimo exigido na época. Apesar de modificada, notam-se ainda alguns
vestígios da fachada original assimétrica composta de duas porções de dimensões e
tratamentos distintos, sobretudo em relação às janelas. A bay window do pavimento
superior e o frontão triangular do telhado com estrutura curvilínea em madeira
hierarquizaram e dinamizaram a porção esquerda mais avançada, através da
combinação de elementos retos e curvos, planos e volumétricos. Além disso, as janelas
desta porção estavam vinculadas aos espaços nobres da casa, ou seja, à sala de
visitas no pavimento de acesso e ao quarto, provavelmente do casal, no superior.

149
Apesar da diferença de tamanhos, o projetista não descartou o princípio clássico de
alinhar as janelas, que apresentam verga reta e em arco abatido, como também
procurou não enfatizar a divisão entre os pavimentos, criando, praticamente, uma
continuidade visual entre os mesmos.

Fig. 129 e 130: Na simulação à direita, o aumento na largura da fachada criaria


um equilíbrio entre os eixos. À esquerda, a fachada longitudinal construída.

Fig. 131: A estrutura em madeira ainda intacta do frontão do telhado


Fonte: Arquivo da autora, 2011.

150
A casa foi concebida com três pavimentos, no entanto, a topografia em declive
do terreno definiu a presença apenas de dois deles na composição da fachada
principal, solução comum nas casas do lado par da Rua Joaquim Murtinho, sendo o
acesso realizado, como foi visto, por um intermediário onde ficava o vestíbulo. Abaixo
deste pavimento, ficava outro de pé direito alto que não fazia parte desta composição,
mas continha outras salas e quartos da casa.

Pavimento
superior

Nível da rua

Fig. 132 e 133: Os pavimentos que compõem a fachada principal.

A tipologia foi inspirada nas revivescências dos estilos da arquitetura inglesa, ou


seja, nos cottages e bungalows em estilo vitoriano que se difundiram pela Europa e
pelas Américas no final do século XIX e início do XX. O principal representante desse
movimento, que segundo Nikolaus Pevsner, ficou conhecido como English Domestic
Revival44, foi o inglês Richard Norman Shaw, que se inspirou em estilos antigos da
arquitetura inglesa como o Tudor, Elisabetano e o Queen Anne, para desenvolver
projetos residenciais, sobretudo de campo, para a classe média. Acrescenta Pevsner

44
PEVSNER, Nikolaus. Origens da arquitetura moderna e do design. São Paulo: Editora Martins Fontes, 1996,
p.28.

151
que Shaw foi “quem mais prontamente captou as possibilidades de criar o pitoresco
pela mistura de motivos dos mais variados estilos...”45

Fig. 134: Royal Geographical Society. Projeto de Richard Norman


Shaw. Londres. 1872-1875.
Fonte: http://en.wikipedia.org/wiki/Lowther_Lodge

Neste caso, acredita-se que o principal meio de divulgação tenham sido as


publicações estrangeiras que circularam na cidade ou que foram trazidas pelos
proprietários em viagens realizadas pela Europa. A revista mensal americana
“Architectural Record” de 1913, por exemplo, apresentou algumas matérias sobre
projetos vinculados a essa tipologia, assinalando seu caráter predominantemente
pitoresco e rural, ilustrando com fotos residências que salientavam os aspectos que
podem ter servido de referência. A título de ilustração, a matéria de junho falava sobre a
arquitetura urbana na Filadélfia e trazia, em detalhe, a foto de uma casa que expressa o
pitoresco, qualidade característica das casas de campo. Em Setembro, a revista
apresentou um portifólio da arquitetura atual, e em dezembro lançou, dentre outras,
uma matéria sobre as casas de campo na Califórnia.

45
Id., 2002, p.406.

152
Fig. 135: Foto ilustrando o artigo “Protifolio of current Fig. 136: Artigo sobre as casas de
architectural” campo na Califórnia
Fonte: The Architectural House, dezembro de
Fonte: The Architectural Record, setembro de 1913.
1913.

As construções em área nobre da cidade também podem ter contribuído e


estimulado a concepção desses projetos como, por exemplo, a residência de 1910
realizada por Heitor de Mello em Botafogo, atualmente sede da Gurilândia Clube
Infantil, e o próprio Castelo Valentim construído em Santa Teresa.

Fig. 137: Projeto de Heitor de Mello, Fig. 138: Castelo Valentim, Santa Teresa, 1879.
1910. Fonte: Arquivo da autora, 2010.
Fonte: CZAJKOWSKI, 2000, p.113.

A volumetria do telhado é uma característica dessa tipologia e foi arranjada a


partir da combinação de superfícies de acentuada inclinação. Outro dado a ser
assinalado é que, apesar de não ter sido construído, a presença do vidro como
elemento de vedação em praticamente toda a extensão do torreão representou uma

153
solução mais avançada para a época, revelando também a familiaridade do projetista
com os novos materiais que estavam se difundindo neste período.

Fig. 139: Fotos da complexa estrutura do telhado com a altura elevada dos pontaletes
Fonte: Arquivo da autora, 2011

Assim como na Villa Alice, verifica-se a introdução de um embasamento em


pedra de aparência rústica, cujo objetivo era evitar o contato direto da casa com o nível
do solo, uma questão cultural associada à concepção deselegante de se ter uma casa
no “rés -do-chão”. Nota-se, ainda, nesta faixa horizontal, o guarda-corpo da varanda em
balaustre, um elemento do vocabulário clássico presente nesta fachada vitoriana.

Fig.: 140: Embasamento em pedra da casa


Fonte: Projeto original de 1914. AGCRJ.

Quanto às fachadas laterais, conforme já foi dito, a posição do terreno em


relação à via e, conseqüentemente, a localização da casa fizeram com que a fachada
leste fosse visualizada por quem subia pela Rua Joaquim Murtinho. Esta situação
levou o projetista a introduzir um torreão justaposto à parede, a fim de que fosse
154
facilmente percebido antes mesmo de se chegar ao portão de entrada, transformando-
se em referência para todo o conjunto. No entanto, este elemento não foi construído, e
em seu lugar foi erguido um alpendre, que também serviu de referência para a entrada
da casa, nada impactante se comparado ao torreão. Na fachada oposta, a porção
corresponde à escada curva se projeta para fora, criando uma saliência composta por
três faces. É provável que esta solução tenha sido resultado de um ajuste vinculado à
organização interna, e não propriamente uma atitude com vistas a destacar tal
elemento, já que a visibilidade desta fachada é restrita, e possível apenas para quem
desce pela rua. Esse ajuste refere-se à entrada do gabinete situado no pavimento de
acesso, pois se não fosse o recuo da escada, o acesso àquele ambiente seria feito pela
sala de visitas, e não diretamente pelo vestíbulo.

Fig. 141: Detalhe da planta mostrando o acesso direto do gabinete


pelo vestíbulo e o recuo da escada.
Fonte: Projeto original de 1914, AGCRJ.

A fachada dos fundos foi bastante alterada, permanecendo apenas as duas


janelas dos quartos do pavimento inferior. As construções laterais e o bloco acima são
acréscimos posteriores.

155
Fig. 142: O destaque em azul revela o trecho remanescente
da fachada dos fundos da casa.
Fonte:Arquivo da autora, 2011.

As fachadas assinaladas até então compõem um volume prismático único


correspondente ao corpo principal da casa e aos espaços mais importantes do
programa de necessidades da família, conforme será falado mais adiante. Este volume
recebeu a adição de outro bloco prismático puro, de função secundária e mais baixo,
situado na parte dos fundos.

Dimensões aproximadas da casa:


Largura: 7,50m
Comprimento: 18,30m
Prisma
anexado

Fig. 143: Configuração volumétrica da casa.

156
Fig. 145 e 145: A planta do telhado e o corte longitudinal mostram o agrupamento entre o
bloco principal e o bloco prismático anexado na parte posterior da casa.
Fonte: Projeto original de 1914. AGCRJ.

157
Distribuição Espacial

Fig. 146 e 147: Planta baixa do pavimento de acesso e do pavimento superior


Fonte: Projeto original de 1914, AGCRJ

O porão ficava na fachada


dos fundos da casa e
correspondia aos quartos
do pavimento inferior.

Fig. 148 e 149: Planta baixa do pavimento inferior e do porão.


Fonte: Projeto original de 1914, AGCRJ

158
Fig. 150 e 151: Corte longitudinal e corte transversal da casa.
Fonte: Projeto original de 1914, AGCRJ

Os espaços internos, atualmente com as áreas e usos modificados para abrigar


uma escola de acunputura, foram distribuídos ao longo de três pavimentos, dois acima
do nível da rua e um abaixo. No pavimento de acesso, a área social ocupava mais da
metade da casa e era composta pela sala de visitas, por um gabinete, ambos voltados
para a rua, por um amplo vestíbulo contíguo à escada e que permitia o acesso pela
lateral da casa, e por uma espaçosa e reservada sala de jantar. Nos fundos, ficava a
área de serviços constituída pela copa com escada para o exterior, um pequeno
banheiro, a cozinha e uma despensa. Não havia corredores de circulação entre os
cômodos, cujo acesso se dava de forma direta. Conforme o projeto original, as salas
deveriam ser abertas para uma estreita e comprida varanda ladrilhada projetada na
fachada leste, a partir da qual se avistava a cidade do Rio. Parece que, ao analisar a
foto de 1916, esta varanda não foi construída.

159
Fig. 152: No pavimento de acesso, o antigo vestíbulo com a escada
ao fundo. Atualmente, entra-se pela fachada principal da casa.
Fonte: Arquivo da autora, 2011.

Fig. 153 e 154: Á esquerda, a porta em madeira trabalhada, que dava


acesso, no vestíbulo, à antiga sala de jantar . Ao lado, detalhe em
metal da escada.
Fonte: Arquivo da autora, 2011.

160
Fig. 155: A curvatura da escada vista do pavimento superior.
Fonte: Arquivo da Autora, 2011.

Fig. 156 e 157: Este espaço, um dos poucos ainda com as dimensões
originais, corresponde à copa, por onde se tinha acesso à casa pelos
fundos. À esquerda, ficava a cozinha, atualmente escritório da escola.

No pavimento superior, a área íntima foi distribuída ao longo de um corredor e


era composta por dois quartos de frente e dois de fundos, sendo que o maior
correspondia à bay window da fachada principal. Havia ainda um banheiro nos fundos,
um toalete comum a dois dormitórios e um amplo terraço no final do corredor.

161
No pavimento inferior, o projetista, provavelmente apoiado no programa familiar,
resolveu mesclar espaços com funções atrbuídas aos demais pavimentos, com a
introdução de uma sala correspondente à largura da casa, um gabinete de trabalho em
frente à escada, quatro quartos, uma sala de espera e um banheiro.

7 6

8 5

4 3

Fig. 158 e 159: A foto mostra a antiga sala de espera do pavimento inferior, com
as duas portas à direita que davam acesso aos quartos e, ao fundo, a marca da
parede do WC.
Fonte: Arquivo da autora, 2011.

Os espaços retangulares e justapostos organizados pelo projetista nos


pavimentos superior e inferior foram concebidos de maneira muito simplificada, a partir
de pequenas modificações promovidas na planta de composição reticulada do
pavimento de acesso, que serviu de matriz para os demais. Essas modificações
consistiram no acréscimo ou exclusão de algumas paredes, resultando na ampliação ou
redução de espaços. Por exemplo, os dois dormitórios de fundos localizados na área
íntima correspondiam à área reservada à sala de jantar do pavimento de acesso, já a
sala de frente do pavimento inferior foi resolvida a partir do espaço destinada ao
gabinete e à sala de visitas no pavimento de acesso. Essa correspondência entre os
pavimentos é um aspecto comum observado na distribuição espacial das residências
ecléticas analisadas até o momento.

162
Parece que a intenção do projetista foi criar um núcleo central na composição do
pavimento de acesso, que se repetiu nos demais pavimentos, a fim de abrigar as áreas
mais importantes da casa: a área de acesso, a social e a íntima. Foi adicionado um
espaço secundário, fora do núcleo, reservado à área de serviço, às varandas, aos
terraços e aos cômodos de arrumação.
Apesar da casa se expandir no sentido longitudinal do terreno, as linhas
transversais da composição foram responsáveis pela definição dos espaços internos no
pavimento de acesso, haja vista a ausência de um corredor de distribuição. Nos
demais pavimentos, os eixos longitudinais aparecem marcando presença no arranjo
espacial.

Eixos
longitudinais
Linhas
transversais

Fig. 160 e 161: O retângulo em azul revela o núcleo central do pavimento de acesso que
se repetiu no pavimento superior.
Fonte: Projeto original de 1914, AGCRJ

Na setorização espacial, apesar da área íntima apresentar um número


considerável de cômodos, observa-se uma correspondência de dimensionamento entre
este e o setor social. Além disso, nota-se a centralização do acesso e da circulação no
núcleo da casa, a partir dos quais foram distribuídos os espaços. Quanto à orientação
solar, o projetista não levou em consideração este aspecto na distribuição dos espaços,
tendo em vista a configuração do terreno. Apesar disso, no pavimento de acesso, o

163
setor social acabou sendo preservado da incidência do sol da tarde.
Consequentemente, a área de serviços ficou concentrada na fachada noroeste, tendo
em vista a localização padrão deste espaço nos fundos da casa, próximo ao quintal. Em
relação ao pavimento superior, o setor íntimo ficou resguardado do sol forte, ao
contrário do banheiro e do terraço voltados para fachada noroeste.

Área de serviço

Área social

Acesso
(vestíbulo )

Banheiros

Área íntima

Circulação

Fig. 162: Setorização espacial da casa


Fonte: Projeto original de 1914, AGCRJ

164
3.4 - Casa de José Ferreira Macedo Terra
Villa Aurora

Nome do proprietário: José Ferreira Macedo Terra


Engenheiro ou arquiteto: desconhecido
Construtor: Manoel Rudriguez Esteves
Localização: Rua Joaquim Murtinho, 531, antigo 205, Rio de Janeiro/RJ
Data do Projeto: 1916
Data da construção: desconhecida
APAC de Santa Teresa: imóvel preservado
Estado atual de conservação:
Área útil:151,60 m²
Largura da testada:13,00 m
Gabarito: dois pavimentos e um porão

Fig. 163: Foto da fachada principal.


Fonte: Coleção Augusto Malta, Museu da Imagem e do Som

165
Implantação e Acesso

Direção ascendente

Eixo da casa

Fig. 164: Implantação da casa no sentido Fig. 165: Corte longitudinal da casa, onde a
longitudinal do terreno. fundação revela a declividade do terreno.
Fonte: Planta Cadastral de 1953. Secretaria Fonte: Projeto original de1916, AGCRJ.
Municipal de Urbanismo.

A casa de número 531, conhecida como Villa Aurora, apresenta implantação


longitudinal e ascendente, resultante da topografia e das dimensões do lote. As casas
edificadas no aclive da montanha eram implantadas em um ponto elevado do terreno,
talvez pela vista privilegiada da cidade, o que significava promover o distanciamento,
neste caso de aproximadamente 30 metros, da edificação em relação à testada. Por
sua vez, esse afastamento criava um amplo espaço para a introdução de jardins
frontais em meio as rampas de acesso à casa, valorizando a imagem dos imóveis e
reforçando a característica pitoresca do bairro. Conforme as casas deste lado da rua, foi
construído um embasamento elevado, sobre o qual foi erguido o porão e a parede
estrutural da frente. Sobre outro plano foram edificados os dois pavimentos da casa.
Apesar da implantação tomar como referência a configuração do terreno, o eixo
deste não coincide com o da casa, cujo posicionamento, levemente inclinado, teve
como guia a linha limítrofe dos fundos do terreno e a provável existência da casa

166
vizinha que pode ter impedido a sua localização em um platô mais elevado. Como
conseqüência, o afastamento do lado esquerdo permitiu a ampliação da varanda frontal
do pavimento de acesso, reservando-se o afastamento do lado oposto para uma
estreita escada que conduz aos fundos da casa, onde fica situada a área de serviço.

Fig. 166: Na imagem, a vista lateral da varanda do pavimento de acesso não


apresenta obstáculo, por conta do recuo da casa vizinha, em primeiro plano.
Fonte: Coleção Augusto Malta, Museu da Imagem e do Som.

O afastamento frontal ocupado pelo jardim fez com que a casa não fosse
imediatamente percebida da mesma forma que as do lado par que ficavam próximas à
via de acesso, no entanto a mesma se destacava no alto do morro, haja vista a
inexistência, ainda, da espessa vegetação que se vislumbra hoje no local, bem como do
tratamento elegante que foi dado à fachada principal.

167
Fig. 167: A fachada principal da casa não é vista da rua. Esta foto
foi tirada da última rampa de acesso.
Fonte: Arquivo da autora, 2011.

A entrada do terreno é centralizada e constituída por uma escada que conduz a


um pequeno terraço em forma de “U”, de onde parte o primeiro lance de rampa, de
suave inclinação, paralela à testada do lote e que dá acesso ao platô sobre o qual foi
erguida a casa.

Fig. 168: Entrada do terreno e o terraço de onde se avista a rua.


Fonte: Arquivo da autora, 2011.

168
Fig. 169, 170 e 171: Acima, detalhe do terraço que compõe a entrada do lote.
Abaixo, as rampas de acesso à casa e o jardim criado entre as mesmas.
Fonte: Arquivo da autora, 2011.

169
Fig. 172: Escada que conduz ao patamar que corresponde ao nível do
porão.
Fonte: Arquivo da autora, 2011.

A simetria também foi reproduzida na entrada principal da casa, visualmente


clara e induzida pela escadaria e pelo pórtico de acentuada verticalidade. Vale
acrescentar que esta escadaria que se projeta a partir da superfície do porão teve o
aspecto ótico como determinante, sendo um elemento de referência visual, cuja função
é indicar, com nitidez, o seu acesso principal. Vários são os exemplos deste tipo de
solução na arquitetura oficial e residencial da época.

170
Fig. 173: Palácio dos Estados da Exposição Nacional Fig. 174:Teatro Municipal do Rio de Janeiro.
de 1908 realizada no Rio de Janeiro e sua escada Projeto de Francisco Pereira Passos, 1909.
projetada. Fonte: http://www.metalpan.com.br
Fonte: LEVY, 2008, p.93

Fig. 175 e 176: Planta baixa do pavimento de acesso e a fachada principal. Observa-
se o destaque que o projetista procurou dar à entrada da casa através da escada, da
composição decorativa e da volumetria.
Fonte: Projeto origjnal de 1916, AGCRJ.

171
Fig. 177: Escada que conduz à varanda da casa
Fonte: Arquivo da autora, 2011.

Composição das Fachadas e Volumetria

A Villa Aurora revela uma tipologia clássica de fachada caracterizada por uma
modulação tripartida e modular, com hierarquização da parte central constituída pelo
pórtico. Nas referências constituídas pelo padrão arquitetônico divulgado e premiado
pelo poder público, é fácil perceber a fachada composta por módulos distribuídos a
partir de um corpo central hierárquico. O Palácio Monroe, projetado pelo arquiteto
Sousa Aguiar para ser o Pavilhão do Brasil na Exposição de Saint Loius e remontado
na cidade em 1906, é um bom exemplo deste princípio.

172
Fig. 178: Palácio Monroe. Projeto do arquiteto Souza
Aguiar, Rio de Janeiro, 1906
Fonte:http://www.vivercidades.org.br

É o único projeto simétrico dentre os quinze apresentados no segundo capítulo,


caracterizado pela regularidade e equilíbrio na distribuição dos elementos de
arquitetura. O tratado de Sequeira afirma a necessidade de se colocar “no centro
principal um vão de porta, ou de janela e nunca um membro ou intervalo”46. O projeto
da Villa Aurora se coaduna com essa regra, pois introduziu um pórtico composto por
uma janela no segundo andar e uma porta de entrada logo abaixo como eixo a partir do
qual foram rebatidas as aberturas e os elementos decorativos e construtivos do edifício.

46
SIQUEIRA, op. cit., p.07

173
Fig. 179: Pórtico de entrada da casa.
Fonte: Arquivo da autora, 2011.

A configuração total retangular desta fachada, cujos espaços foram concebidos


com base em um traçado regulador de planos geométricos que se repetem, resultou no
predomínio do eixo longitudinal. Essa questão da racionalização e do equilíbrio do
traçado foi exposta por Gustavo Rocha-Peixoto, ao falar da presença dos princípios
clássicos dos tratadistas na arquitetura realizada por Grandjean de Montigny no Rio de
Janeiro, no século XIX.

A eqüidistância das colunas, o respeito ao ritmo binário, a geometria clássica do


traçado regulador rigoroso, baseado em desenvolvimentos da simetria dinâmica e o
equilíbrio entre os diversos eixos hierarquizados garantem uma dispersão da tensão
47
estética através da subordinação de cada parte ao todo da composição”.

47
PEIXOTO, Gustavo Rocha. Reflexos das luzes na terra do sol: sobre a teoria da arquitetura no Brasil da
Independência: 1808-1831. São Paulo: ProEditores, 2000, p.126.

174
Fig. 180: O esquema acima revela o traçado regulador que
determinou a composição da fachada.
Fonte: Projeto original de 1916. AGCRJ.

O aclive criou uma solução comum nos imóveis de numeração ímpar da Rua
Joaquim Murtinho que é a presença de um porão compondo a fachada, nitidamente
caracterizado como um pavimento mais rústico, que servia de base para os demais,
apresentando pequenas aberturas fechadas com gradil de ferro. Na Villa Aurora, esse
elemento aparece como base de sustentação do avarandado do pavimento de acesso,
sendo responsável também pela verticalidade da fachada, conforme demonstra a
simulação abaixo.

175
Fig. 181: A ausência da base rústica representada pelo porão criaria equilíbrio entre
os eixos que compõem o plano da fachada principal, originando uma configuração
aproximadamente quadrangular.
Fonte: Projeto original de 1916. AGCRJ.

Outro dado interessante a ser destacado e que está vinculado não apenas à
topografia, mas, sobretudo, à vista da cidade do Rio de Janeiro, é a presença das
varandas na fachada principal, tendo em vista que, nas casas construídas nos terrenos
em declive, esses elementos eram introduzidos na fachada dos fundos, servindo como
mirantes.

Fig. 182: Varanda do pavimento de acesso.


Fonte: Arquivo da autora, 2011.

176
Cabe, ainda, ressaltar que a fachada principal revela as dimensões exatas da
divisão espacial interna da casa, correspondendo, no pavimento de acesso, às salas de
estar, de jantar e ao vestíbulo, e, no pavimento superior, aos quartos. Quanto à análise
da composição decorativa, o projeto, que não corresponde à fachada atual, apresenta
uma solução neorenascentista, caracterizada pelo equilíbrio e predominância das linhas
retas, e pela ausência de mansardas, torreões e ornamentação excessiva. Para essa
solução, as referências empregadas, assim como na Villa Alice, não foram apenas as
construtivas, mas também as publicações estrangeiras que reuniam ornamentos de
diferentes períodos históricos. A platibanda em balaustrada, por exemplo, que arremata
o pórtico da entrada principal da casa está presente em algumas ilustrações do livro
“Styles of Ornament” de Alexander Speltz , e aparece como uma solução clássica
renascentista difundida em diversos países da Europa. A ilustração abaixo mostra
detalhe da balaustrada do Palácio de Versalhes como ornamento do renascimento
tardio francês.

Fig. 183: Detalhe da balaustrada do Palácio de Versalhes. Projeto


do francês Louis le Vau, Versalhes, Século XVII.
Fonte: SPELTZ, s.d, p. 550

177
Esse coroamento com uma platibanda reta e sem adornos de estuque é uma
característica da racionalidade do conjunto que pode ser observada, também, em vários
projetos residenciais inspirados nas villas italianas, dentre eles o de Antonio Jannuzzi
para o seu cliente Modesto Leal.

Fig. 184: Residência de Modesto Leal. Projeto de Antonio


Jannuzzi. Laranjeiras, Rio de Janeiro, 1895.
Fonte: GRIECO, 2005, p. 94

Fig. 185: Balaustrada do pórtico de entrada.


Fonte: Arquivo da autora, 2011.

Além disso, não só o contato, mas a variedade de elementos decorativos á


disposição do projetista pode ter estimulado o emprego dos diferentes motivos
observados nesta composição, como aqueles de estilo geometrizante presentes nos
guarda-corpos das varandas do pavimento de acesso e superior, na platibanda das

178
porções laterais da fachada, e no arranjo decorativo do friso do entablamento do
pórtico.

Fig. 186: Motivo decorativo do guarda-corpo da varanda do pavimento de acesso.


Esta composição corresponde ao projeto.
Fonte: Arquivo da autora, 2011.

179
Fig. 187, 188, 189, 190: Detalhes da composição decorativa da fachada.
Fonte:Projeto original de 1916, AGCRJ

180
No pórtico centralizado, a composição resultante do arco pleno e das ordens
sobrepostas emoldurando as portas de ambos os andares reforça o destaque conferido
à entrada da casa. Esse princípio da sobreposição das ordens característico do
vocabulário clássico, presente na arquitetura romana e depois consolidada pela
renascença, deveria apresentar, segundo o manual de Moisy, eixos coincidentes e
proporções pré-estabelecidas48. Para Sequeira, o profissional deveria ter um cuidado
rigoroso ao dispor as mesmas, onde “a mais simples, e mais forte, deve sempre
colocar-se pela parte inferior da mais delicada”49. No projeto em estudo, verifica-se
esse rigor quanto aos eixos e quanto às ordens, onde a pilastra robusta e mais
resistente, que no caso é representada pela jônica, sustenta a ordem compósita, mais
delicada. No entanto, pelo que se observa na fachada atual, esse princípio não foi
colocado em prática, tendo em vista o mesmo tratamento dado às pilastras de ambos
os pavimentos.

Fig. 191: As pilastras que sustentam as varandas do pavimento


superior e que compõem o pórtico de entrada.
Fonte: Arquivo da autora, 2011.

48
MOISY, op. cit., p. 49.
49
SEQUEIRA, op. cit., p. 24.

181
Quanto à volumetria, a composição era bem simples, e correspondeu,
basicamente, a justaposição de dois blocos prismáticos puros de dimensões e usos
diferentes. O principal consistiu no arranjo de praticamente todo o espaço interno,
enquanto que o bloco anexado envolveu apenas o banheiro e a despensa dispostos na
parte dos fundos do pavimento de acesso.

Dimensões aproximadas da casa:


Largura: 10,00 m
Comprimento: 10,80 m

Bloco anexado

Fig. 192: Configuração volumétrica da casa.

182
Distribuição Espacial

Fig.: 193, 194, 195 e 196: Acima, planta baixa do pavimento de acesso e
superior. Abaixo, corte longitudinal e transversal da casa.
Fonte: Projeto original de 1916, AGCRJ.

183
A simetria da fachada foi reproduzida na planta que traduz o programa de
necessidades da família do primeiro proprietário, José Ferreira Macedo Terra. O
pavimento de acesso era constituído pela sala de visitas, sala de jantar, sala de bilhar,
pelo setor de serviços, e por um vestíbulo, o qual apresentava uma particularidade que
o diferenciava dos projetos da época e dos manuais utilizados pelos construtores, que
era a distância em relação à escada que conduz ao segundo pavimento, já que a
solução mais comum era o acesso direto do vestíbulo à área íntima. A sala de jantar
seguia a localização padrão, próxima à cozinha e à copa. A varanda em “L” se deve,
possivelmente, ao recuo do lado esquerdo na implantação da casa edificada, ampliando
a visão da paisagem circundante.
Outra consideração a ser feita, observada também em alguns projetos
consultados, refere-se à presença, do lado de fora, do único banheiro do pavimento de
acesso. Não foi projetado um banheiro interno, cuja localização habitual deveria ser
próxima à área de serviço, tendo em vista a economia que esta solução proporcionava
com uma instalação de água e esgoto mais racional. É provável que o externo fosse
usado apenas pelos empregados.
A área íntima, localizada no pavimento superior, correspondia ao arranjo espacial
do pavimento de acesso, com alinhamento da maioria das paredes. Era composta de
quatro quartos, dois de dimensões significativas voltados para a Rua Joaquim Murtinho,
e dois menores voltados para os fundos do lote.
A novidade da concepção formal interna desta casa está vinculada ao vestíbulo,
cuja forma corresponde à metade de um hexágono, fruto da subtração de um dos
vértices das salas de visitas e de jantar. É interessante observar a necessidade de se
transformar este espaço em um diferencial no contexto geral interno, por conta de ser
este o primeiro contato do visitante com o interior da casa e com estilo de vida da
família. Este destaque era conseguido ou através de uma solução formal como esta,
ou através da presença de elementos decorativos como o alpendre da Casa da Família
Fraga.
Esta distribuição espacial, composta por quadriláteros de tamanhos
diferenciados, foi concebida, basicamente, por um eixo longitudinal dominante e três
linhas transversais. A diferença entre os pavimentos envolvia apenas uma solução de

184
caráter estrutural, referente à localização do vão da escada, já que a área ocupada pelo
amplo setor social e pelo setor íntimo era praticamente a mesma, conforme visto,
também, nas análises anteriores, talvez por conta da falta de flexibilidade oriunda do
sistema construtivo. Infelizmente, a documentação fotográfica do interior não foi
permitida pelo proprietário, tendo em vista estar a casa em processo de compra e
venda.

N
Eixo
longitudinal
Linhas escada
transversais

Área de serviço

Área social

Acesso

banheiro

circulação

Área íntima

Fig. 197: Setorização espacial da casa.


Fonte: Projeto original de 1916. AGCRJ.

185
Sem muita alternativa no tocante à orientação solar, as salas e os quartos
principais foram dispostos na fachada norte, no entanto as varandas do pavimento
superior funcionaram como elementos atenuantes da insolação no interior das salas.
Quanto à área de serviço, foi situada nos fundos, nas fachadas sul e sudeste. No
pavimento íntimo, os quartos maiores foram projetados na fachada principal e os
menores nos fundos, ficando apenas estes resguardados do sol.

186
3.5 - Casa de Mário Aurélio da Silveira

Nome do proprietário: Marco Aurélio da Silveira


Construtor: Ferro A. Luiz
Arquiteto/engenheiro: desconhecido
Localização: Rua Joaquim Murtinho, 273, antigo 109, Rio de Janeiro/RJ
Data do projeto: 1912
Data da construção: desconhecida
APAC de Santa Teresa: imóvel preservado
Estado atual de conservação: conservado
Área útil: 165,79 m²
Largura da testada: 25,00 m
Gabarito: dois pavimentos e um porão

Fig. 197: Fachada principal concebida conforme o projeto original, salvo


algumas modificações no tratamento decorativo das janelas.
Fonte: Coleção Augusto Malta – Museu da Imagem e do Som

187
Implantação e Acesso

Ao contrário das casas até então analisadas, onde o lote longitudinal não dava
margem a outras possibilidades de implantação, a configuração irregular deste lote em
aclive e de esquina e o programa reduzido do proprietário Mário Aurélio da Silveira
ofereciam outras opções de projeto. No entanto, a solução escolhida, que adotou um
eixo diagonal em direção oposta ao eixo também diagonal do terreno, mais uma vez
teve como referência a configuração do lote, sobretudo, a considerável largura da
testada de 25,00 metros, voltada para o norte. A pequena profundidade do lote também
interferiu nesta implantação, impedindo a localização da casa mais alto. Observa-se
também uma solução comum nas casas deste lado da rua que é a implantação da casa
em um patamar acima do patamar do porão, que corresponde à base aterrada
revestida de pedra rústica.

Eixo do terreno
N

Eixo da casa

Fig. 199, 200, 201, 202:Exemplos de implantação no lote irregular com outras volumetrias.
Em azul, a figura que corresponde à implantação da casa.

188
Eixo da casa

acréscimo

Fig. 203: Implantação da casa em lote de Fig. 204: Corte transversal da casa.
esquina, já com acréscimo que não consta Fonte: Projeto original de 1912, AGCRJ
no projeto original de 1912.
Fonte: Planta cadastral de 1953. Secretaria
Municipal de Urbanismo.

Fig. 205: Lote situado entre a Rua Joaquim Murtinho e a Travessa das
Escadinhas de Santa Teresa, a qual revela a inclinação do aclive.
Fonte: Arquivo da autora, 2011.

189
Quanto ao acesso, localizado no muro frontal, do lado esquerdo da casa, o
visitante é conduzido do portão da rua ao patamar do terraço, que fica no mesmo nível
do porão, mediante uma escada curvilínea encaixada entre as paredes do platô. Por
sua vez, este patamar dá acesso à escada com guarda-corpo em ferro da entrada
principal projetada na saliência da fachada e que conduz ao pequeno vestíbulo. Foi
uma concepção que dispensou arranjos formais ou decorativos, já que, neste caso, o
projetista lançou mão de uma característica do lugar: o terreno em aclive e de esquina
que possibilitou a visualização desta entrada da própria rua, antes mesmo de se chegar
na casa. Quanto ao setor de serviço, os empregados tinham acesso aos fundos por
uma escada que partia do terraço em direção ao patamar situado no mesmo nível do
pavimento de acesso, onde ficava a entrada da cozinha.

Fig. 206 e 207: No esquema à esquerda, a localização do portão de acesso ao lote e


das entradas principal e de serviço. Na foto de Augusto Malta, o destaque para a
concentração dos acessos pelo lado esquerdo da casa, de quem sobe a rua.

190
Fig. 208: Na planta do pavimento de acesso, a escada seguida pelo vestíbulo
(saleta)
Fonte: Projeto original de 1912, AGCRJ

Fig. 209: A entrada do lote. Fig. 210:Entrada principal da casa


Fonte: Arquivo da autora, 2011 Fonte: Arquivo da autora, 2011.

191
Fig. 211: Escada curvilínea que conduz ao terraço.
Fonte: Arquivo da autora, 2011.

Fig. 212: Terraço frontal situado sobre o embasamento revestido com pedra
rústica.
Fonte: Arquivo da autora, 2011.

192
Fig. 213: A Rua Joaquim Murtinho vista do terraço.
Fonte: Arquivo da autora, 2011.

Fig. 214: Em destaque, a escada que dá acesso aos fundos da casa e,


consequentemente, à área de serviço.
Fonte: Arquivo da autora, 2011.

193
Composição das Fachadas e Volumetria

Fig. 215: Fachada Principal da casa.


Fonte: Arquivo da autora, 2011.

A largura do lote permitiu que as áreas social e íntima fossem distribuídas ao


longo da imponente fachada principal assimétrica e dinâmica, composta de três porções
com recuos entre si e alturas escalonadas. A presença da última porção,
correspondente ao terraço do pavimento superior, hierarquizou o eixo horizontal,
obrigando o observador a percorrer a fachada neste sentido. Nota-se que esse
dinamismo é resultado da distribuição dos espaços internos que foram dispostos a partir
de um eixo diagonal, conforme será visto mais adiante.

194
Fig. 216: Em primeiro plano, a terceira porção da casa, mais
avançada que as demais, correspondente ao terraço.
Fonte: Arquivo da autora, 2011.

Por outro lado, a ausência desta última porção, atribuiria à fachada um sentido
ascendente, tendo em vista a configuração das superfícies retangulares verticalizadas.
Além disso, o porão habitável, que corresponde ao embasamento que eleva a casa do
“res-do chão”, bem como a cobertura, que foi retirada, reforçariam tal característica,
conforme figuras a seguir.

195
Fig. 217 e 218: Acima, a fachada e o seu eixo horizontal. Abaixo,
a simulação que a tornaria ascendente.
Fonte: Projeto original de 1912. AGCRJ.

196
O afastamento obrigatório dos limites do terreno e o fato de ser de esquina
possibilitaram a visibilidade da fachada leste, o que fez com que recebesse o mesmo
tratamento decorativo da fachada principal, apesar da largura reduzida. Neste caso, o
fachadismo estava presente nas superfícies que estavam expostas à observação
daquele que subia à Rua Joaquim Murtinho.

Fig. 219: Fachada leste voltada para a esquina da casa.


Fonte: Projeto original de 1912, AGCRJ

Ao contrário das aplicações em estuque típico do repertório de formas que


atribuíam volume às fachadas ecléticas, o cuidadoso tratamento art nouveau presente
no desenho do projeto da fachada, que não corresponde à composição que se vê
atualmente, revela a importância dada ao decorativismo nos projetos de arquitetura
eclética, fato observado também nas análises anteriores. Neste caso específico, a
composição caracteriza-se pela presença de variados ornamentos planos, de traçado
curvilíneo aplicados, sobretudo, no entorno das janelas e nos parapeitos. Esta
diversidade de formas estava vinculada não somente às referências construtivas, mas
também aos manuais que possibilitaram o contato dos projetistas com inúmeros
exemplos de arranjos ornamentais, conforme assinalado em análises anteriores. Além
disso, o art nouveau está presente também no elemento em ferro que realça a
cumeeira da cobertura no projeto original, e no desenho sinuoso do portão também em
197
ferro da entrada do lote. As janelas, que apresentam diversidade no tamanho e na
forma das vergas, solução comum nas fachadas dos imóveis da Rua Joaquim Murtinho,
alternam-se no tamanho e seguem o princípio clássico do alinhamento. Clássico
também é o entablamento, ainda intacto, do pavimento superior, onde o conjunto
formado pela cúpula era, sem dúvida, um dos destaques da fachada.

Fig. 220, 221, 222 e 223: Detalhes da fachada principal.


Fonte: Arquivo da autora, 2011.

198
Fig. 224 e 225: Acima, o telhado retirado e o entablamento da primeira porção
da fachada. Abaixo, o portão em ferro da entrada do lote.
Fonte: Arquivo da autora, 2011.

199
A volumetria da casa é composta pela justaposição de três prismas distintos em
altura e largura, articulados entre si de forma, criando avanços e recuos na sua
configuração total.

Dimensões aproximadas da casa


Largura: 14,00 m
Comprimento: 6,50 m

Fig. 226: Configuração volumétrica

200
Distribuição espacial

Fig. 227, 228 e 228: Planta baixa do pavimento de acesso, do pavimento


superior e do porão.
Fonte: Projeto original de 1912, AGCRJ.

201
Fig. 230 e 231: Corte longitudinal e transversal. A escada interna
foi retirada para
que a casa fosse transformada em dois apartamentos.
Fonte: Projeto original de 1912, 2011.

Assim como na fachada principal, a testada mais larga do lote também foi
responsável por uma concepção diferenciada dos espaços, pois permitiu a distribuição
dos mesmos ao longo de um eixo diagonal. No pavimento de acesso, o projetista
resolveu criar um espaço retangular envolvendo a escada e a saleta, e junto a este
introduziu dois quadrados, um para sala de estar e outro para a sala de jantar,
alinhando cada um deles nos lados superior e inferior do retângulo inicial. A este núcleo
social foi adicionado um retângulo transversal, correspondendo a área de serviços nos
fundos e à sala de costura na frente. Nota-se também a presença de um banheiro
externo, ao lado do tanque, usado, provavelmente, pelos empregados da casa. Está
claro que a visualização da casa ao se subir a rua fez com que o projetista situasse o
setor de serviços do lado oposto ao da esquina do terreno, deixando para esta as
partes importantes da casa, ou seja, o social e a área íntima.

202
Eixo diagonal da casa

Fig. 232: A distribuição em diagonal dos espaços


internos, devido à configuração do lote.
Fonte: Arquivo da autora, 2011.

Fig. 233: Foto da sala de jantar, cujas portas estão voltadas para uma pequena
sacada em ferro, de onde se avista a rua e a cidade do Rio de Janeiro.
Fonte: Arquivo da autora, 2011.

203
O projeto mantém, ainda, uma solução característica da época que consiste no
hall de entrada com acesso direto à escada, que foi retirada, e às principais salas de
convívio social. Este pavimento serviu de matriz para o andar superior, ficando os
quartos alinhados às salas, o banheiro ao hall, e o terraço lateral à área de serviço e à
sala de costura. Quanto ao porão, seu espaço foi dividido em dois salões, que
correspondem, aproximadamente, à metade da casa.
Ao contrário da fachada, na decoração interna, houve uma certa simplicidade na
solução adotada, talvez devido à condição sócio-econômica do proprietário, se
comparada com a decoração mais suntuosa da pintura da Casa de João Pedro de
Fraga Lourenço e com o entalhe em madeira cuidadosamente trabalhado da Casa de
Tobias Correa do Amaral. Como exemplo, destaco o revestimento de influência art
nouveau de, aproximadamente, um metro de altura, executado nas paredes da sala de
jantar, composto por azulejos brancos, azulejos decorados com motivos florais
dispostos de forma espaçada, e pelo barramento também floral utilizado como
arremate.

Fig. 234: O revestimento em azulejo da sala de jantar.


Fonte: Arquivo da autora, 2011.

204
Fig. 235 e 236: Detalhes do revestimento da sala de jantar.
Fonte: Arquivo da autora, 2011.

205
N

Área de serviço

Área social

Acesso

Banheiro

Circulação

Área íntima

Fig. 237: Setorização espacial da casa.


Fonte: Projeto original de 1912, AGCRJ.

O setor íntimo no pavimento superior, com apenas dois quartos, reproduz,


exatamente, o mesmo espaço do setor social no pavimento de acesso, da mesma
forma que o terraço corresponde ao setor de serviços, uma prática comum de projeto,
oriunda da rigidez e racionalidade do sistema construtivo de paredes portantes adotado
na época. Quanto à orientação solar, como havia dito nas análises anteriores, este
aspecto não teve influência na solução adotada para a distribuição espacial, já que
quartos e salas, geralmente, ficavam dispostos na fachada principal, que, neste caso
206
estava direcionada para o norte. Consequentemente, o setor de serviços foi situado na
fachada oposta.
Conforme foi visto, o ecletismo arquitetônico foi muito bem empregado pelos
projetistas das edificações residenciais construídas na Rua Joaquim Murtinho, onde
utilizaram um repertório variado para compor as suas fachadas, tanto no que diz
respeito à forma quanto aos ornamentos, envolvendo elementos pertencentes ao
vocabulário clássico, gótico, art nouveau e vitoriano. Os projetistas enfrentaram,
também, desafios resultantes das especificidades do lugar, bem como continuaram
empregando práticas construtivas e projetuais tradicionais. Na conclusão, a
interpretação destas e de outras informações permitirá compreender melhor a presença
do ecletismo na produção local.

207
Conclusão

A investigação realizada no capítulo precedente permitiu identificar e


contextualizar, com base nos grupos de análise definidos pela implantação e acesso,
composição das fachadas, volumetria e distribuição espacial, os fatores envolvidos nas
fases de concepção dos projetos então analisados.
Na abordagem sobre a implantação, verificou-se que os afastamentos,
presentes já no final do século XIX mesmo timidamente em relação a uma das divisas,
já se encontravam consolidados no período abordado por este estudo, inclusive como
solução obrigatória imposta pelo poder público, representando uma mudança na prática
projetual. Essa imposição deve e muito aos estudos e à atuação dos médicos
sanitaristas iniciada em meados do século XIX, quando foi estabelecido o vínculo entre
as epidemias e o tipo de construção realizada na época.
Nestas implantações, a topografia, que juntamente com o formato do lote
determinou a direção longitudinal dos imóveis, interferiu também no dimensionamento
do afastamento frontal, mais próximo da testada nos declives e mais afastado nos
aclives. Além disso, o procedimento tradicional adotado até então de tomar a
configuração do lote como referência foi legitimada pelos projetistas, tendo em vista a
completa ausência de alternativa diante de loteamentos compostos por terrenos
compridos e estreitos, resultantes da especulação imobiliária promovida no bairro.
Sendo assim, tais lotes, aliados à própria trajetória curvilínea da rua, não davam
margem a outras possibilidades de posicionamento da casa. A casa de Tobias Correa
do Amaral, por exemplo, é bem peculiar quanto a esse aspecto, pois, como foi
apresentado na análise, a obliqüidade do lote em relação à via determinou para ela
uma posição inclinada e bem inusitada da casa, onde a fachada lateral é percebida
antes mesmo da principal. No entanto, mesmo no caso da residência de Mário Aurélio
da Silveira em que havia alternativa de implantação, devido a uma configuração distinta
das demais, o projetista também adotou o lote como referência. O estudo mostra, ainda,
que a falta de paralelismo entre o eixo do terreno e o eixo da casa está vinculado à
adoção de uma referência para direcionar a fachada principal. É como se tivesse

208
surgido a necessidade de se criar um critério de correção a ser adotado no
posicionamento destas fachadas diante da irregularidade das testadas.
Quanto ao acesso ao lote, nos terrenos em declive, esta solução era definida
conforme a localização da entrada principal dos imóveis edificados, tendo em vista o
pequeno afastamento frontal que possibilitava essa correspondência. Na Villa Alice, o
projetista optou em criar uma visualização oblíqua do pórtico, a fim de destacá-lo. Já
nos lotes em aclive, a distância entre a rua e a casa e a própria inclinação da montanha
originou, em sua grande maioria, um caminho constituído por lances de rampas em
meio ao jardim frontal, como no caso da Villa Aurora, não interferindo, diretamente, na
localização do portão da rua. Nota-se também que o predomínio da assimetria na
fachada principal, fruto de uma prática projetual mais liberal, influenciou a localização
da entrada da casa, deslocando-a do centro para uma das porções laterais, ou mesmo
para uma das fachadas laterais, como na casa de Tobias Correa do Amaral. Situação
inversa é constatada na Villa Aurora, o único projeto simétrico dentre os quinze
encontrados e apresentados no segundo capítulo. Nesta casa, a entrada principal
destacada pelo pórtico foi adotada como eixo de rebatimento dos elementos de
composição da fachada.
Essas fachadas assobradadas revelam alguns dados interessantes e
subjacentes a sua composição. Sem dúvida, a altivez de uma fachada verticalizada
ressaltava o status e a afinidade do proprietário com o padrão de sofisticação e
civilidade do período, no entanto não deve ter sido apenas esse aspecto de cunho
simbólico que orientou o projetista na sua tomada de decisão quanto ao número de
pavimentos aparentes. A estreita largura dos lotes, como foi assinalado anteriormente,
pode ter sido um fator determinante também, pois a acomodação espacial do programa
de necessidades dos proprietários, muito mais complexo que nos períodos
precedentes, exigia a projeção de dois ou mais pavimentos. Além disso, as imposições
legais também contribuíram na configuração dessas fachadas. O Decreto de 1903,
publicado durante o governo de Pereira Passos, determinava valores elevados e
diferenciados para o pé-direito dos pavimentos (4,0m para o primeiro, 3,80 para o
segundo e 3,60 para os demais), que, aliados à característica dimensional do lote,
acabaram reforçando a verticalidade das mesmas. Vale ressaltar que esse assunto foi

209
ponto de questionamento do arquiteto Gastão Bahiano em outubro de 1921, no artigo
intitulado “Os pés-direitos na legislação municipal”, publicado na primeira edição da
“Revista de Architectura no Brasil”, a primeira revista especializada no país.

A minha experiência pessoal leva-me a considerar como mínimo desejável a


altura livre de 3,50 em qualquer pavimento, suprimindo de vez o porão
50
habitável.

A presença do embasamento da casa representado ou não por um porão, que


também contribuía para verticalizar o plano da fachada era, nos casos analisados,
resultado não da necessidade higiênica e salubre de se afastar o imóvel da umidade do
solo, tendo em vista o material em que se faziam as lajes, mas estava relacionado,
sobretudo, a uma concepção de valor estético, ou seja, à adaptação de uma antiga
tradição clássica de se introduzir no primeiro plano da fachada uma solução mais
rústica, que evitava um contato direto do corpo principal do imóvel com o nível do chão.
Sobre esse embasamento erguia-se à fachada que, na verdade, não correspondia ao
número total de pavimentos edificados nos terrenos em declive, por conta da topografia
que obrigava os projetistas a promoverem uma distribuição espacial ao longo da
inclinação do terreno, ficando os demais pavimentos abaixo do nível da rua, como pode
ser verificado na Villa Alice.
Além disso, o fato da fachada dos fundos dos terrenos em declive ter vista para
a cidade do Rio de Janeiro, sem dúvida nenhuma uma das forças do lugar, determinou
a presença de varandas e terraços na sua composição. Nas casas edificadas nos
terrenos em aclive, no entanto, esse elemento não constituiu uma regra, dado que os
terraços e varandas nos patamares de acesso faziam as vezes de mirantes nestas
casas.
A questão sanitária foi um fator de grande relevância no contexto construtivo da
época. Os afastamentos obrigatórios permitiram a introdução de janelas com
dimensões mínimas exigidas pela legislação vigente, e posicionadas conforme o
princípio tradicional clássico do alinhamento entre os pavimentos.

50
BAHIANO, Gastão. Os pés direito da legislação municipal. Revista de Architectura no Brasil, outubro 1921.

210
Quanto ao sistema construtivo, as paredes portantes eram responsáveis pelo
aspecto estrutural na arquitetura brasileira, e no caso da Rua Joaquim Murtinho, não
apenas o tijolo, mas também a pedra fizeram parte da execução desses elementos
construtivos. Essa função de sustentabilidade exigia a formação de maciças paredes
que acabaram interferindo, também, na configuração total do edifício, gerando volumes
prismáticos simples, com anexos em alguns casos, também prismáticos justapostos ao
principal. Neste estudo, especificamente, deve-se levar em consideração que não
apenas o sistema construtivo, mas também a estreita largura dos lotes influenciou a
decisão quanto à forma volumétrica da casa, sem a opção de criar novas
configurações. Este fato é constatado pela Casa de Marco Aurélio da Silveira, que
apresenta uma configuração ainda constituída pela junção de prismas, mas
diferenciada das demais pelos seus recuos e avanços, já que é um terreno de esquina
e com testada mais larga.
Na organização dos espaços internos, a arquitetura eclética promoveu mudanças
de relevância, como a introdução do hall ou vestíbulo de entrada, a presença de
espaços com funções diversificadas, os corredores de distribuição e o banheiro
incorporado à casa. Esses espaços, no entanto, eram definidos conforme a disposição
das paredes internas e em função da rigidez das paredes externas definidas pela
estrutura da casa, consistindo em quadriláteros justapostos e fechados em si mesmos,
cuja configuração praticamente se repetia de um andar para o outro, correspondendo,
em regra, o setor íntimo no pavimento superior ao setor social do pavimento de acesso.
Quanto à composição decorativa, a Rua Joaquim Murtinho apresentou uma
variedade de elementos ornamentais oriundos de vocabulários estilísticos distintos. Ao
lado da influência dominante dos estilos classicizantes, houve a difusão do art nouveau
na Casa de João Pedro de Fraga Lourenço e na Casa de Mário Aurélio da Silveira, e do
estilo vitoriano na casa de Tobias Correa do Amaral.
Diante do que foi exposto, apesar da liberdade ensejada pelo caráter pitoresco
do lugar, das novidades introduzidas no campo construtivo e arquitetônico que
introduziram mudanças nos projetos residenciais, como os afastamentos das divisas
por exemplo, pôde-se notar que as soluções propostas pelos projetistas das casas da
Rua Joaquim Murtinho, aqui representadas pelos cinco projetos analisados, tiveram um

211
elevado grau de influência das forças do lugar, aqui representadas por especificidades
da rua como a topografia, a configuração do lote e a vista para a cidade do Rio de
Janeiro, que, aliadas à influência das práticas tradicionais de projeto e construção, em
menor grau, revelaram, de um modo geral, uma certa inflexibilidade e rigidez,
sobretudo, em relação à forma e à implantação.

212
Lista de Figuras:

Fig.1: Rua Joaquim Murtinho, Santa Teresa, p. 2.


Fig. 2: Imagem de Jacinta Rodrigues Aires, p.10.
Fig. 3: Arcos e Convento de Santa Teresa, Richard Bate, 1º metade do século XIX, p.
12.
Fig. 4: Caminho do Aqueduto na região de passeio conhecida como Silvestre, p.13.
Fig. 5: Foto do traçado tortuoso da rua e os trilhos do bonde elétrico, p. 15.
Fig. 6: Projeto de Loteamento de terras pertencentes ao Convento, datado de 1898,
realizado na Rua Ferro Carril, p. 17.
Fig. 7: Trecho correspondente ao projeto de loteamento de 1898, entre os números 273
e 491, p. 18.
Fig. 8: Engenheiro e matemático Manoel Amoroso Costa, p. 20.
Fig. 9: Engenheiro Juan Gatell Solá, p. 21.
Fig.10: Escritora Júlia Lopes de Almeida, p.23.
Fig.11:Fotos do Bairro de Santa Teresa. Ao fundo, o casario da Rua Joaquim Murtinho,
p. 26.
Fig.12: Fotos do Bairro de Santa Teresa. Ao fundo, o casario da Rua Joaquim
Murtinho, p.27.
Fig. 13: A arquitetura eclética da Rua Joaquim Murtinho, p.27.
Fig. 14: Casa situada no nº 15 da Rua Joaquim Murtinho, p. 29
Fig. 15: Villa Lúcia do Dr. Gustavo Armsbrust, p.29.
Fig. 16: Segunda residência de Juan Gatell Solá na Rua Joaquim Murtinho, p. 29.
Fig. 17: Casa de João Pedro de F. Lourenço, p. 30.
Fig. 18: Documento preenchido por Gatell para informar ao proprietário o custo
referente ao aterro da casa, p. 31.
Fig. 19: Lote e implantação da casa de Tobias Correa do Amaral, p. 32.

Casa de Marcolino Rodrigues (Villa Alice)


Fig. 20: Foto da fachada principal da Villa Alice, p. 90.

213
Fig. 21: Implantação da Villa Alice e o acréscimo nos fundos que não consta no projeto
original de 1916, p.91.
Fig. 22: Corte longitudinal da Villa Alice, p. 92.
Fig. 23: Visão oblíqua do observador em relação ao pórtico da entrada, a partir do
portão, p. 93.
Fig. 24: Portão da rua centralizado no muro curvilíneo da testada e a visão do pórtico
avançado em relação ao plano da fachada, p. 93.
Fig. 25: Nesta planta, observa-se o primeiro lance de escadas que conduz ao patamar
inferior, e o segundo lance que conduz ao porão, p. 94.
Fig. 26 e 27: As laterais que dão acesso ao pavimento inferior, p. 94.
Fig. 28, 29 e 30: A configuração quadrangular, a verticalidade da fachada e as duas
partes que a compõem, p. 95.
Fig. 31: A cúpula do pórtico, p. 97.
Fig. 32: A escada curvilínea que compõe o pórtico da casa, p. 97.
Fig. 33 e 34: Projeto da fachada principal. O desenho à direita corresponde à simulação
sugerida na análise, p.98.
Fig. 35: Mansão Figner. Projeto de Gustavo Adolphsson, 1912, p. 99.
Fig. 36: Palácio do Distrito Federal. Projeto de Oliveira Passos, 1908, p. 99.
Fig. 37: Detalhe do degrau da escada do alpendre lateral, p. 100.
Fig. 38 e 39: Detalhes da estrutura do alpendre, p. 100.
Fig. 40: As linhas sinuosas do portão em ferro, p. 101.
Fig. 41: Detalhe de console com figura humana no interior do Town Hall. Ausgsburg,
Alemanha, século XVII, p. 102.
Fig. 42 e 43: Alguns exemplos de guirlandas em detalhes presentes no livro de Speltz,
p. 102.
Fig. 44, 45 e 46: detalhes da composição decorativa da Villa Alice, p. 103.
Fig. 47: Detalhe de um capitel compósito, p. 104.
Fig. 48: Foto de uma das colunas que compõem o pórtico, p. 104.
Fig. 49: Real Gabinete Português de Leitura. Projeto de Rafael da Silva e Castro,
Século XIX, p. 105.
Fig. 50: Janelas em estilo gótico da fachada principal da Villa Alice, p. 105.

214
Fig. 51 e 52: Uma das aberturas com gradil de ferro do embasamento da fachada, p.
106.
Fig. 53: Visão da casa ao se subir a rua. Ao fundo, a casa de dois pavimentos da
Família Faria, p. 107.
Fig. 54: Corte longitudinal. A fachada vista da rua corresponde apenas ao pavimento de
acesso, p. 107.
Fig. 55 e 56: À esquerda, fachada lateral direita, onde a porta localizada entre duas
janelas correspondia à sala de jantar do pavimento inferior. Ao lado, uma das janelas
desta sala, composta de duas folhas, em madeira, com venezianas e vidro, p. 108.
Fig. 57 e 58: Fachada dos fundos da casa com o acréscimo lateral à direita. Em
destaque, a varanda que foi fechada, restando, apenas , um pequeno corredor e o
gradil. O terraço acima permanece, p.109.
Fig. 59: Vista da fachada dos fundos, p. 109.
Fig.60: Configuração volumétrica da Villa Alice, p. 110.
Fig. 60, 61, 62, 63: Planta do pavimento de acesso, do pavimento inferior, do porão e
corte longitudinal, p. 111.
Fig. 64: O pórtico da entrada principal e o alpendre lateral que davam acesso à sala e
ao corredor transversal, p. 112.
Fig. 65: Detalhe do alpendre, p.113.
Fig. 66 e 67: As fotos mostram o corredor de distribuição do pavimento inferior, p.113.
Fig. 68: Eixo longitudinal e as linhas transversais, p.114.
Fig. 69: Setorização espacial da Villa Alice, p.115.

Casa de João Pedro de Fraga Lourenço


Fig. 70: Foto da Casa de João Pedro de Fraga Lourenço, tirada poucos anos depois da
construção, p. 117.
Fig. 71: Implantação da casa com acréscimo da garagem no lado direito que não consta
no projeto de 1916, p.118.
Fig. 72: Corte longitudinal revelando a declividade do terreno, p.118.
Fig. 73: A largura do terreno permitiu a visualização das fachadas laterais, p. 119.

215
Fig. 74: Na imagem à esquerda, o portão centralizado no projeto original. À direita, a
fachada projetada, p. 120.
Fig. 75 e 76: Detalhe do portão e do alpendre, p. 121.
Fig. 77 e 78: Pintura realizada pelo artista Colon na parede do alpendre à direita, p.
121.
Fig. 79 e 80: A foto à esquerda mostra a escada que percorre todos os patamares do
terreno pelo lado esquerdo do lote. À direita, a porta da cozinha na fachada dos fundos
da casa, de onde saía a escada, p. 122.
Fig. 81: Parte mais recuada à esquerda e a composição hegemônica da fachada à
direita com alternância rítmica, p. 124.
Fig. 82 e 83: O eixo da porção principal da fachada não coincide com o eixo da sala de
visitas e do quarto, apesar de parecer que sim, p. 125.
Fig. 84 e 85: Notam-se as linhas verticais dominando o traçado da composição da
fachada, p. 126.
Fig. 86: Telhado da fachada principal, p. 126.
Fig. 87: Detalhe da cumeeira e do pináculo que arremata o frontão, p. 127.
Fig. 88: beiral decorado da fachada principal, p. 127.
Fig. 89: vitral presente na fachada, p. 128.
Fig. 90: Esquema de entablamento jônico em manual do século XIX, p. 129.
Fig. 91: A solução em dentículo que assinala a separação entre os pavimentos, p. 129.
Fig. 92 e 93: A arcada correspondente à sala de visitas do pavimento de acesso, p.
130.
Fig. 94: A foto mostra a janela situada acima do alpendre, emoldurada por um arco
pleno e colunas em estilo coríntio, p. 131.
Fig. 95: Detalhe do motivo decorativo do beiral das fachadas laterais, p. 132.
Fig. 96: Ao fundo, o beiral da fachada principal. Mais abaixo, o beiral de uma das
laterais, p. 132.
Fig. 97: A varanda ao lado era um espaço privativo das salas, limitado por um gradil de
ferro, p. 133.
Fig. 98: Foto atual da mesma fachada e a garagem que substituiu a varanda, p. 133.
Fig. 99: Desenho da fachada dos fundos com o terraço e a varanda, p. 134.

216
Fig.100: Desenhos que revelam como eram os guarda-corpos em madeira da varanda e
do terraço da fachada dos fundos, p. 134.
Fig. 101: Nesta foto, observa-se que o terraço e a varanda foram fechados, p. 135.
Fig. 102: O espaço aberto de pé-direito duplo e os arcos plenos que compõem a
estrutura, p. 135.
Fig. 103: Configuração volumétrica da casa, p. 136.
Fig. 104, 105, 106, 107: Acima, planta do pavimento de acesso e do pavimento
superior. Abaixo, planta do porão e o corte longitudinal, p. 137.
Fig. 108:Sala de estar e Sala de jantar, p. 138.
Fig. 109: O corte acima revela a continuidade das paredes internas e a
correspondência entre as dimensões espaciais definidas nos pavimentos da casa, p.
139.
Fig. 110 e 111: Composição dos espaços internos do pavimento de acesso e do
superior, p. 140
Fig. 112: Setorização espacial da casa, p. 141.
Fig. 113: Detalhe da faixa decorativa de um dos quartos da casa, p. 142.
Fig. 114:Detalhe da pintura original que reveste a sala de jantar, p. 142.

Casa de Tobias Correa do Amaral


Fig. 115: Na foto de 1916, nota-se a casa construída conforme o projeto original de
1914, mas sem o torreão, p. 143.
Fig. 116: Vista aérea do imóvel, p. 144.
Fig. 117: A imagem mostra a curvatura da Rua Joaquim Murtinho e a implantação
oblíqua da casa, p. 144.
Fig. 118: Implantação da casa e o acréscimo posterior na
lateral direita, p. 145.
Fig. 119: Corte longitudinal que mostra a declividade do terreno e o patamar que sofreu
aterros e desaterros e sobre o qual foi edificada a casa, p. 145.
Fig. 120: Na foto, observa-se ainda o alpendre no lugar do torreão, os limites laterais e
o pequeno jardim frontal, p. 145.
Fig. 121: A fachada principal segundo o projeto, p. 146.

217
Fig. 122: Fachada atual e as modificações sofridas pela casa ao longo do tempo, p.
146.
Fig. 123: Detalhe da planta baixa do pavimento de acesso, p. 147.
Fig. 124: A visão que se tem da fachada lateral atual na subida da Rua Joaquim
Murtinho, p. 148.
Fig. 125 e 126: Escada dos fundos que dava acesso à área de serviços, p. 148.
Fig. 127: Trecho da escada lateral em pedra, que conduz ao pavimento inferior, p. 149
Fig. 128: Foto do amplo quintal nos fundos, p. 149.
Fig. 129 e 130: Na simulação à direita, o aumento na largura da fachada criaria um
equilíbrio entre os eixos. À esquerda, a fachada longitudinal construída, p. 150.
Fig. 131: A estrutura em madeira ainda intacta do frontão do telhado, p. 150.
Fig. 132 e 133: Os pavimentos que compõem a fachada principal, p. 151.
Fig. 134: Royal Geographical Society. Projeto de Richard Norman Shaw. Londres.
1872-1875, p. 152.
Fig. 135: Foto ilustrando o artigo “Protifolio of current architectural”, p. 153.
Fig. 136: Artigo sobre as casas de campo na Califórnia, p. 153.
Fig. 137: Projeto de Heitor de Mello, 1910, p. 153.
Fig. 138: Castelo Valentim, Santa Teresa, 1879, p. 153
Fig. 139: Fotos da complexa estrutura do telhado com a altura elevada dos pontaletes,
p. 154.
Fig.: 140: Embasamento em pedra da casa, p. 154.
Fig. 141: Detalhe da planta mostrando o acesso direto do gabinete pelo vestíbulo e o
recuo da escada, p. 155.
Fig. 142: O destaque em azul revela o trecho remanescente da fachada dos fundos da
casa, p. 156.
Fig. 143: Configuração volumétrica da casa, p. 156.
Fig. 144 e 145: A planta do telhado e o corte longitudinal mostram o agrupamento entre
o bloco principal e o bloco prismático anexado na parte posterior da casa, p. 157.
Fig. 146 e 147: Planta baixa do pavimento de acesso e do pavimento superior, p. 158.
Fig. 148 e149: planta baixa do pavimento inferior e do porão, p. 158
Fig. 150 e 151: corte longitudinal e corte transversal da casa, p. 159.

218
Fig.152: No pavimento de acesso, o antigo vestíbulo com a escada ao fundo.
Atualmente, entra-se pela fachada principal da casa, p. 160.
Fig. 153 e 154: À esquerda, porta em madeira do vestíbulo. Ao lado, detalhe em metal
da escada, p. 160.
Fig. 155: A curvatura da escada vista do pavimento superior, p. 160.
Fig. 156 e 157: Este espaço, um dos poucos ainda com as dimensões originais,
corresponde à copa, por onde se tinha acesso à casa pelos fundos. À esquerda, ficava
a cozinha, atualmente escritório da escola, p. 161.
Fig. 158 e 159: A foto mostra a antiga sala de espera do pavimento inferior, com as
duas portas à direita que davam acesso aos quartos e, ao fundo, a marca da parede do
WC, p. 162.
Fig. 160 e 161: O retângulo em azul revela o núcleo central do pavimento de acesso
que se repetiu no pavimento superior, p. 163.
Fig. 162: Setorização espacial da casa, p. 164.

Casa de José Ferreira Macedo Terra (Villa Aurora)


Fig. 163: Foto da fachada principal, p. 165.
Fig. 164: Implantação da casa no sentido longitudinal do terreno, p. 166.
Fig. 165: Corte longitudinal da casa, onde a fundação revela a declividade do terreno,
p.166.
Fig. 166: Na imagem, a vista lateral da varanda do pavimento de acesso não apresenta
obstáculo, por conta do recuo da casa vizinha, em primeiro plano, p. 167.
Fig. 167: A fachada principal da casa não é vista da rua. Esta foto foi tirada da última
rampa de acesso, p. 168.
Fig. 168: Entrada do terreno e o terraço de onde se avista a rua, p. 168.
Fig. 169, 170 e 171: Acima, detalhe do terraço que compõe a entrada do lote. Abaixo,
as rampas de acesso à casa e o jardim criado entre as mesmas, p. 169.
Fig. 172: Escada que conduz ao patamar que corresponde ao nível do porão, p. 170.
Fig. 173: Palácio dos Estados da Exposição Nacional de 1908 realizada no Rio de
Janeiro e sua escada projetada, p. 171.

219
Fig. 174:Teatro Municipal do Rio de Janeiro. Projeto de Francisco Pereira Passos,
1909, p. 171.
Fig. 175 e 176: Planta baixa do pavimento de acesso e a fachada principal. Observa-se
o destaque que o projetista procurou dar à entrada da casa através da escada, da
composição decorativa e da volumetria, p. 171.
Fig. 177: Escada que conduz à varanda da casa, p. 172.
Fig. 178: Palácio Monroe. Projeto do arquiteto Souza Aguiar, Rio de Janeiro, 1906, p.
173.
Fig. 179: Pórtico de entrada da casa, p. 174.
Fig. 180: O esquema acima revela o traçado regulador que determinou a composição
da fachada, p. 175.
Fig. 181: A ausência da base rústica representada pelo porão criaria equilíbrio entre os
eixos que compõem o plano da fachada principal, originando uma configuração
aproximadamente quadrangular, p. 176.
Fig. 182: Varanda do pavimento de acesso, p. 176.
Fig. 183: Detalhe da balaustrada do Palácio de Versalhes. Projeto do francês Louis le
Vau, Versalhes, Século XVII, p. 177.
Fig. 184: Residência de Modesto Leal. Projeto de Antonio Jannuzzi. Laranjeiras, Rio de
Janeiro, 1895, p. 178.
Fig. 185: Balaustrada do pórtico de entrada, p. 178.
Fig. 186: Motivo decorativo do guarda-corpo da varanda do pavimento de acesso. Esta
composição corresponde ao projeto, p. 179.
Fig. 187, 188, 189, 190: Detalhes da composição decorativa da fachada, p. 180.
Fig.191:As pilastras que sustentam as varandas do pavimento superior e que compõem
o pórtico de entrada, p. 181.
Fig. 192: Configuração volumétrica da casa, p. 182.
Fig.: 193, 194, 195 e 196: Acima, planta baixa do pavimento de acesso e superior.
Abaixo, corte longitudinal e transversal da casa, p. 183.
Fig. 197: Setorização espacial da casa, p.185.

220
Casa de Mário Aurélio da Silveira
Fig. 198: Fachada principal concebida conforme o projeto original, salvo algumas
modificações no tratamento decorativo das janelas, p. 187.
Fig. 199, 200, 201, 202:Exemplos de implantação no lote irregular com outras
volumetrias. Em azul, a figura que corresponde à implantação da casa, p. 188.
Fig. 203: Implantação da casa em lote de esquina, já com acréscimo nos fundos que
não consta no projeto original de 1912, p. 189.
Fig. 204: Corte transversal da casa, p. 189.
Fig. 205: Lote situado entre a Rua Joaquim Murtinho e a Travessa das Escadinhas de
Santa Teresa, a qual revela a inclinação do aclive, p. 189.
Fig. 206 e 207: No esquema à esquerda, a localização do portão de acesso ao lote e
das entradas principal e de serviço. Na foto de Augusto Malta, o destaque para a
concentração dos acessos pelo lado esquerdo da casa, de quem sobe a rua, p. 190.
Fig. 208: Na planta do pavimento de acesso, a escada seguida pelo vestíbulo (saleta),
p. 191.
Fig. 209: A entrada do lote, p. 191.
Fig. 210:Entrada principal da casa, p. 191.
Fig. 211: Escada curvilínea que conduz ao terraço, p. 192.
Fig. 212: Terraço frontal situado sobre o embasamento revestido com pedra rústica, p.
192.
Fig. 213: A Rua Joaquim Murtinho vista do terraço, p. 193.
Fig.214:Em destaque, a escada que dá acesso aos fundos da casa e,
consequentemente, à área de serviço, p. 193.
Fig. 215: Fachada Principal da casa, p. 194.
Fig. 216: Em primeiro plano, a terceira porção da casa, mais avançada que as demais,
correspondente ao terraço, p. 195.
Fig. 217 e 218: Acima, a fachada e o seu eixo horizontal. Abaixo, a simulação que
tornaria a fachada ascendente, p. 196.
Fig. 219 : Fachada leste voltada para a esquina da casa, p. 197.
Fig. 220, 221, 222 e 223: Detalhes da fachada principal, p. 198.

221
Fig. 224 e 225: Acima, a cúpula e o entablamento da primeira porção da fachada.
Abaixo, o portão em ferro da entrada do lote, Fig. 199.
Fig. 226: Configuração volumétrica, p. 200.

Fig. 227, 228 e 229: Planta baixa do pavimento de acesso, do pavimento superior e do
porão, p. 201.
Fig. 230 e 231: Corte longitudinal e transversal. A escada interna foi retirada para
que a casa fosse transformada em dois apartamentos, p. 202.
Fig. 232: A distribuição em diagonal dos espaços internos, devido à configuração do
lote, p. 203.
Fig. 233: Foto da sala de jantar, cujas portas estão voltadas para uma pequena sacada
em ferro, de onde se avista a rua e a cidade do Rio de Janeiro, p. 203.
Fig. 234: O revestimento em azulejo da sala de jantar, p. 204.
Fig. 235 e 236: Detalhes do revestimento da sala de jantar, p. 205.
Fig. 237: Setorização espacial da casa, p. 206.

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Doutorado. Ecole des Hautes Estudes em Sciences Sociales, Paris.

Depoimentos colhidos:

Junto à Maria Inês de G. Souza em: 27/11/2010


Junto ao Sr. Gilberto Perdeneiras em: 13/11/2010
Junto ao Sr. Paulo, proprietário da Villa Alice em: 11/12/2010
Junto ao Sr. Manuel Magarinos Torres e Denise Maria M. Torres em: 06/11/2010

229

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