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Texto 08 - Aspectos Materiais Da Corrupcao
Texto 08 - Aspectos Materiais Da Corrupcao
Texto 08 - Aspectos Materiais Da Corrupcao
P r o g r a m a N a c i o n a l d e C a p a c i t a ç ã o e T r e i n a m e n t o n o
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A) Aspectos legais
1
NAPOLEONI, Loretta. Economia bandida, p. 15.
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Já o art. 333 do Código Penal define o crime de corrupção ativa, que pode ser
praticado por qualquer pessoa que “oferecer ou prometer vantagem indevida a
funcionário público, para determiná-lo a praticar, omitir ou retardar ato de ofício”. A
pena é equivalente à prevista para a modalidade passiva.
Importa salientar que, além do ato de corrupção propriamente dita, o Código Penal
tipifica outros crimes assemelhados que podem ser cometidos por funcionários
públicos. É o caso dos delitos de tráfico de influência (art. 332), de concussão (art.
316 – equivale, na esfera pública, à extorsão), de facilitação de contrabando (art.
318), de prevaricação (art. 319), de condescendência criminosa (art. 320), de
advocacia administrativa (art. 321) e de violação de sigilos funcionais (artigos 325 e
326), além da conduta do servidor que se apropria de bem ou valor, público ou não,
que esteja em sua posse em razão do cargo, ou seja, o crime de peculato (artigos
312 e 313). Embora distintos da corrupção, tais crimes têm em comum com ela a
conduta do servidor pautada pelo interesse privado, dele ou de terceira pessoa, em
detrimento do interesse público e da probidade. Naturalmente, são previstas penas
diferentes para cada tipo penal.
Na esfera federal, são de especial relevância as leis especiais que tratam das
licitações (Lei n. 8.666/93) e dos crimes de responsabilidade cometidos por
prefeitos municipais (Decreto-Lei n. 201/67). Grande parte das investigações
conduzidas pela Polícia Federal, tanto em operações de grande porte como em
inquéritos policiais específicos, referem-se a crimes previstos nesses dois diplomas
legais.
A Lei n. 8.666/93 inovou ao reservar toda uma seção, com um total de dez
tipificações, para a tutela penal específica dos processos licitatórios e da
contratação administrativa. Antes da edição da lei, eventuais condutas criminosas
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relacionadas com o tema eram enquadradas no Código Penal, que contava com
alguns tipos específicos (arts. 326 e 335), porém sem tratamento sistemático. Com
a publicação da Lei n. 8.666/93, houve também o agravamento das penas
cominadas a certas condutas.
2
STJ, APN n. 226, Corte Especial, rel. Min. Luiz Fux, jul. 01/08/2007, pub. DJ 08/10/2007, p. 187.
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Especial atenção merece o inciso XI, que tipifica a conduta de “adquirir bens, ou
realizar serviços e obras, sem concorrência ou coleta de preços, nos casos exigidos
em lei”. O dispositivo coexiste com a Lei n. 8.666/93, especialmente no que se
refere ao rito processual6, sendo importante atentar para as hipóteses de
contratação pelo poder público sem licitação (dispensa e inexigibilidade), previstas
nos arts. 24 a 26 da mesma. A redação do inciso XI é de certo modo anacrônica,
uma vez que prevê apenas a ausência de concorrência e a coleta de preços, não
abrangendo portanto as modalidades licitatórias do convite e do pregão. Essa
restrição da redação original do texto legal já levou o Superior Tribunal de Justiça a
decidir pela absolvição de prefeito, fundada em atipicidade da conduta.
B) Aspectos criminológicos
8
Ibidem, p. 367.
9
MELO, Carlos Ranulfo. Corrupção eleitoral. In: AVRITZER, Leonardo et alli (org). Op. cit., p. 374.
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10
CONTROLADORIA GERAL DA UNIÃO. Gestão de Recursos Federais/Controladoria Geral da
União, p. 23.
11
Ibidem, pg. 24.
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MAIEROVITCH, Wálter F. Na linha de frente pela cidadania, p. 227.
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de influência (CP, art. 332), sendo necessários apenas ajustes para adequar a
simetria de redação e de quantificação de pena com o crime de corrupção de
funcionário estrangeiro.
c) Suborno de funcionários estrangeiros (art. 16): Conduta tipificada nos já
mencionados artigos 337-B e 337-C do CP. O conceito de funcionário contido no
art. 337-D tem a mesma limitação em relação à Convenção mencionada no item
(a), acima.
d) Desvio de bens por servidores públicos (art. 17): Previsões abrangidas pelos
crimes de peculato (CP, art. 312), de emprego irregular de verbas ou rendas
públicas (CP, art. 315) e pelos tipos penais do Decreto-Lei n. 201/67 (crimes
funcionais dos prefeitos). São recomendáveis algumas alterações de redação
como, por exemplo, no caso do peculato, que atualmente se aplica apenas a bens
móveis.
e) Tráfico de influência (art. 18): Capitulado no art. 332 do CP.
f) Abuso de funções (art. 19): Abrangido pelo crime de prevaricação (art. 319 do
CP), referente à conduta do servidor que retarda ou deixa de praticar ato de ofício
“para satisfazer interesse ou sentimento pessoal”. No que tange à motivação para a
prática do ilícito, a Convenção adota a expressão “benefício indevido” (para si
mesmo ou para outrem), de conotação mais ampla. Além disto, deve-se destacar
que a pena prevista no Código Penal é bastante leve (3 meses a 1 ano de
detenção, além de multa), sendo recomendável sua majoração, para adequação às
políticas preconizadas pela Convenção.
g) Enriquecimento ilícito (art. 20): Hipótese não contemplada pelo direito penal
brasileiro, consiste na conduta do servidor público que possua injustificadamente
patrimônio incompatível com seus ganhos legítimos. Nesse caso, a Convenção
preconiza a condenação penal, independente da existência de prova de liame entre
a aquisição do patrimônio e alguma atividade ilícita.
h) Suborno no setor privado (art. 21): Hipótese também não contemplada pelo
direito brasileiro, consiste no suborno entre particulares no curso de atividades
econômicas , financeiras ou comercials, figurando no pólo passivo indivíduo com
poder de mando ou decisão em ente privado (empresa, banco, corretora,
conglomerado, etc.).
i) Malversação ou peculato de bens no setor privado (art. 22): Equivale, em linhas
gerais, às hipóteses de gestão fraudulenta tipificadas na Lei de Crimes Financeiros
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a) Controle interno
Como regra geral, o controle interno é feito pela Controladoria Geral da União
(CGU). No caso de transferências voluntárias, em tese o controle é feito de forma
cumulativa pela CGU e pelo órgão repassador (no caso dos convênios, hipótese na
qual o órgão repassador é geralmente um dos Ministérios) ou pela instituição
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financeira (no caso dos contratos de repasse, nos quais via de regra a instituição é
Caixa Econômica Federal).
As fiscalizações pela CGU podem ser iniciadas por demanda interna ou externa. As
iniciativas internas são as mais diversas e incluem, entre outras:
a) Avaliação da execução de programas de governo por amostragem (não sendo
possível, evidentemente, a análise exaustiva de todos eles);
b) Auditorias em Municípios escolhidos por sorteio, metodologia iniciada em 2003.
Participam dos sorteios municípios com até 500 mil habitantes (os 47 municípios
brasileiros com população acima deste número são fiscalizados com base em
outros critérios, independentemente de sorteio). Além dos municípios, são
sorteados também os programas de governo e/ou convênios que serão objeto da
auditoria; contudo, o objeto da fiscalização pode ser ampliado, usualmente a partir
de denúncias. Após o sorteio, a data e o período dos trabalhos de campo (uma
semana, normalmente) são previamente divulgados e publicados;
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Na área da educação, a maior parte das verbas é gerida pelo FNDE - Fundo
Nacional de Desenvolvimento de Educação, autarquia do Ministério da Educação,
criada pela Lei n. 5.537/68 e encarregada da prestação de assistência técnico-
financeira e da execução de programas nesta área, dentro do modelo estabelecido
pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei n. 9.394/96). O
orçamento do FNDE se divide em quatro grandes áreas: custeio, FUNDEB, FIES
(Financiamento ao Estudante do Ensino Superior) e Salário-Educação, sendo que
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b) Controle externo
A atuação do TCU pode ser provocada por quem de direito (Poder Legislativo,
CGU, etc.), por denúncia ou representação, ou pode atuar de ofício diante de
indícios de irregularidade, ou ainda no caso de receber autos relatados de TCE -
Tomada de Contas Especial que tenha sido realizada por alguma unidade gestora
da Administração, em sede de controle interno.
O TCU também realiza fiscalizações por iniciativa própria, de forma seletiva, a partir
das prioridades definidas pelo plano anual do Tribunal, no qual são definidos os
temas de maior significância (saúde, educação, infra-estrutura). Definidos os temas
no Plano Anual de Fiscalização (com vigência a partir do mês de março de cada
ano), a área técnica do TCU define os pontos mais relevantes nos temas
selecionados.
Por fim, cabe salientar que as decisões condenatórias proferidas pelo TCU
possuem caráter de título executivo extrajudicial, devendo a Advocacia Geral da
União (AGU) mover as respectivas ações executórias.
B) Regime disciplinar
O regime jurídico único dos servidores públicos federais está disciplinado pela Lei
n. 8.112/90, com diversas alterações ao longo dos anos. Cada unidade da
Federação conta com sua legislação própria, mas é importante ressaltar que
diversas leis estaduais foram inspiradas diretamente no regime federal, muitas
vezes praticamente o reproduzindo. Mesmo na esfera federal, o regime disciplinar
geral pode coexistir com regulamentos específicos, como é o caso da Polícia
Federal (Lei n. 4.878/65).
O regime disciplinar regulado pela Lei n. 8112/90 se estende dos artigos 116 a 182
e relaciona deveres, proibições, responsabilidades e penalidades, além de
disciplinar o rito processual para a condução dos processos disciplinares.
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O art. 121 da referida lei dispõe que “o servidor responde civil, penal e
administrativamente pelo exercício irregular de suas atribuições”. Na realidade, os
comportamentos listados como “proibições” no art. 117 incluem algumas condutas
que constituem crime, como é o caso, por exemplo, da coação de subordinado
(inciso VII) e do recebimento de propina (inciso XII). Cabe destacar a
independência de instâncias: a infração pode subsistir ainda que não haja crime e
vice versa, as regras quanto à prescrição são próprias de cada esfera, o processo
disciplinar segue rito próprio independentemente de eventual ação penal, etc.
13
NAÍM, Moisés. Ilícito, pp. 127-130. Para contextualização histórica dos fatores que levaram ao
crescimento do fenômeno da lavagem de dinheiro, veja-se: WOODIWISS, Michael. Capitalismo
gângester, cap. 16.
14
MAIEROVITCH, Wálter F. Op. cit., p. 151.
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Em seguida ao caput do art. 1º, são listados os crimes cujos produtos econômicos
e/ou financeiro podem ser “lavados”. Esse é um aspecto da legislação brasileira
criticado de forma praticamente unânime por ter criado um rol rígido dos chamados
“crimes antecedentes”. Outras modalidades criminosas, portanto, não dão azo ao
fenômeno da “lavagem”, ainda que seus frutos econômicos sejam efetivamente
reinseridos na cadeia da legalidade por meio das mesmíssimas técnicas.
16
GOMES, Rodrigo Carneiro. Op. cit., p. 16.
17
NAÍM, Moisés. Op. cit., p. 171.
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Bibliografia indicada:
AVRITZER, Leonardo et alli (org). Corrupção: Ensaios e críticas. Belo Horizonte: Ed.
UFMG, 2008.
BALTAZAR JUNIOR, José Paulo. Crimes Federais. 4.ed. Porto Alegre: Livraria do
Advogado, 2009.
DELMANTO, Celso et alli. Código Penal Comentado. 6.ed. Rio de Janeiro: Renovar,
2002.
GLENNY, Misha. MacMáfia: Crime sem fronteiras. Trad. Lucia Boldrini. São Paulo:
Companhia das Letras, 2008.
GRECO FILHO, Vicente. Dos crimes da Lei de Licitações. 2.ed. São Paulo: Saraiva,
2007.
MATTOS, Mauro Roberto Gomes de. Lei n. 8.112/90 interpretada e comentada. Rio de
Janeiro: América Jurídica, 2005.
NUCCI, Guilherme de Souza. Código Penal Comentado. 8.ed. São Paulo: RT, 2008.
PRADO, Luiz Regis. Comentários ao Código Penal. 4ed. São Paulo: RT, 2007.
RAMOS, João Gualberto Garcez. Crimes funcionais de prefeitos. Belo Horizonte: Del
Rey, 2002.
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ZIEGLER, Jean. Senhores do crime: As novas máfias contra a democracia. Trad. Clóvis
Marques. Rio de Janeiro: Record, 2003.