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Psiquiatria - 2020

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Como a Psicologia contribui

para o estudo da relação


médico-paciente?

1.1 INTRODUÇÃO
A Psicologia médica é o ramo da Medicina que tem a Psicologia como
campo interdisciplinar específico. Pode também ser definida como o
estudo das relações médico-paciente e das ações psicológicas na
prática médica em geral, que se constitui como uma ciência única e
independente da Psiquiatria e da Psicologia.
Grandes contribuições à Psicopatologia vieram da Psicologia médica,
em especial das relacionadas a Ernst Kretschmer (1888-1964) e
Sigmund Freud (1856-1939), que recomendavam a especialização
em psicanálise das distintas especialidades médicas, aperfeiçoando
os profissionais na lida com os processos transferenciais da relação
médico-paciente. Os conceitos de psicanálise a seguir foram
retirados das obras de Sigmund Freud, resumidas no livro Noções
básicas de Psicanálise, de Charles Brenner.
1.2 CONTRIBUIÇÕES DE FREUD
A transferência e a contratransferência são uma forma de projeção
típica da relação terapêutica entre paciente e médico e podem
caracterizar-se de forma positiva, com sentimentos de afeto e
admiração, ou negativa, com sentimentos de agressividade e
resistência, dependendo dos laços inconscientes e emocionais que
emergem dessa relação.
Denominamos “transferência” as projeções relacionadas a reações
emocionais do paciente, dirigidas ao médico, com base nos conflitos
infantis dos pacientes com relação às figuras paterna e materna. A
“contratransferência” envolve sensações, sentimentos e percepções
que brotam no médico, emergentes do relacionamento terapêutico
com o paciente, também com base em seus conflitos inconscientes.
Espera-se que o médico esteja preparado emocionalmente para
saber lidar com tais conflitos.
Transferências são as projeções do paciente
dirigidas ao médico, enquanto as
contratransferências são projeções do médico
em relação ao paciente.

1.3 INCONSCIENTE
Freud iniciou seus estudos pela utilização da técnica da hipnose
como forma de acesso aos conteúdos mentais no tratamento da
histeria. Ao observar melhora, elaborou a hipótese de que a causa da
doença era psicológica, não orgânica. Essa hipótese serviu de base
para seus outros conceitos, como o do inconsciente. Assim,
abandonou o uso de hipnose em pacientes com histeria, em favor da
interpretação de sonhos e da livre associação como vias de acesso ao
inconsciente.
Freud procurou uma explicação à forma de operar do inconsciente,
propondo uma estrutura particular. No primeiro tópico, recorreu à
imagem do iceberg, em que o consciente corresponde à parte visível,
e o inconsciente corresponde à parte não visível, ou seja, à parte
submersa do iceberg. Em sua teoria, Freud estava preocupado em
estudar o que levava à formação dos sintomas psicossomáticos.
1.4 ID, EGO E SUPEREGO
Quando sua preocupação se voltou para a forma como se dava o
processo da repressão, Freud passou a adotar os conceitos de id, ego
e superego.
O id representa os processos primitivos do pensamento e constitui,
segundo Freud, o reservatório das pulsões, e, dessa forma, toda a
energia envolvida na atividade humana seria advinda do id.
Inicialmente, considerou que todas essas pulsões seriam de origem
sexual. Posteriormente, introduziu o conceito das pulsões de morte,
que atuariam no sentido contrário ao das pulsões de agregação e
preservação da vida. O id é responsável pelas demandas mais
primitivas e perversas.
O superego, a parte que contra-age ao id, representa os
pensamentos morais e éticos internalizados.
O ego permanece entre ambos, alternando nossas necessidades
primitivas e crenças éticas e morais. É a instância na qual se inclui a
consciência. Um eu saudável é aquele que tem a habilidade para
adaptar-se à realidade e interagir com o mundo exterior de uma
maneira que seja cômoda para o id e o superego.
1.5 EROS E TÂNATOS
Freud estava especialmente interessado na dinâmica dessas três
partes da mente. Argumentou que essa relação é influenciada por
fatores ou energias inatas, que chamou de pulsões. Descreveu duas
pulsões antagônicas: eros, a pulsão sexual com tendência à
preservação da vida, e tânatos, a pulsão da morte, que levaria à
desagregação de tudo o que é vivo, à destruição. Ambas não agem de
forma isolada, estão sempre trabalhando em conjunto.
1.6 CONTRIBUIÇÃO DE KÜBLER-ROSS
A psiquiatra suíça Elisabeth Kübler-Ross, em sua obra Sobre a morte
e o morrer, pesquisou e trabalhou com o tema do luto, descrevendo
cinco fases desse processo. Existem pensamentos e comportamentos
comuns às pessoas que passam por cada uma dessas fases, e a
descrição delas pode facilitar a compreensão e a percepção sobre o
que ocorre com as pessoas que vivenciam o luto.
1.6.1 Fase 1: negação
É uma defesa psíquica, em que o indivíduo acaba negando o
problema, tentando encontrar algum jeito de não entrar em contato
com a realidade e geralmente não quer falar sobre o assunto.
1.6.2 Fase 2: raiva
Nessa fase, o indivíduo revolta-se com o mundo, sente-se
injustiçado e não se conforma que isso está acontecendo com ele.
1.6.3 Fase 3: barganha
Essa é fase na qual o indivíduo começa a negociar; por exemplo,
prometendo que será uma pessoa melhor se sair daquela situação.
1.6.4 Fase 4: depressão
A pessoa retira-se para seu mundo interno, isolando-se e
considerando-se impotente perante o que ocorre.
1.6.5 Fase 5: aceitação
O indivíduo não sente mais desespero e consegue enxergar a
realidade como realmente é, assimilando por completo a perda ou a
morte.
Como a Psicologia contribui
para o estudo da relação
médico-paciente?
A psicologia médica contribui, portanto, para melhor
compreensão dos mecanismos psicológicos que norteiam
tanto a relação médico-paciente quanto a do paciente com
uma patologia ou perda em sua vida.
Você sabe o que investigar
em um exame psíquico
completo?

2.1 PSICOPATOLOGIA
A Psicopatologia propõe-se a conhecer e descrever os fenômenos
psicopatológicos para, dessa forma, oferecer à Psiquiatria as bases
para a compreensão e o estudo do psiquismo humano. Compete a ela
reunir materiais para a elaboração do conhecimento dos fenômenos
com o qual a Psiquiatria possa coordenar a sua ação diagnóstica,
curativa e preventiva. Como dito por Paulo Dalgalarrondo, em seu
livro Psicopatologia e semiologia dos transtornos mentais, que será
utilizado como base para o capítulo: “A semiologia é a base, o pilar
fundamental da atividade médica. Saber observar com cuidado, olhar
e enxergar, ouvir e interpretar o que se diz, saber pensar,
desenvolver um raciocínio clínico crítico e acurado são as
capacidades essenciais do profissional de saúde”
(DALGALARRONDO, 2008, p. 13). O diagnóstico em Psiquiatria é feito
com base no exame psíquico, excluindo outras patologias clínicas
que possam cursar com alterações no psiquismo.
2.2 FUNÇÕES PSÍQUICAS E SUAS
ALTERAÇÕES
2.2.1 Consciência
Consciência é a capacidade do indivíduo de entender o que está
acontecendo dentro e fora de si mesmo. A clareza dessa consciência é
traduzida pela lucidez. Quando o paciente está desperto, recebendo e
devolvendo informações com o meio ambiente, está lúcido. As
alterações da consciência podem ser quantitativas e qualitativas.
Em seu aspecto quantitativo, a consciência pode estar diminuída ou
aumentada. Dentre as diminuições da consciência, a forma mais
suave é denominada obnubilação, que resulta em intensificação dos
estímulos para obter-se acesso eficiente à consciência. Ocorre
diminuição da sensopercepção, lentidão da compreensão e da
elaboração das impressões, lentificação no ritmo e alteração no
curso do pensamento, prejuízo da memória, algum grau de
desorientação e sonolência mais ou menos acentuada. Se na
diminuição da consciência os estímulos para determinar
manifestações primitivas como gemer ou balbuciar são muito
intensos, fala-se em estupor. Um grau mais aprofundado, ou seja, a
abolição total do contato entre o indivíduo e o meio, é denominado
estado de coma.
Qualitativamente, a consciência é avaliada como a aptidão em
apreender todos os fenômenos interiores ou exteriores e integrá-los
a um contexto real das circunstâncias ocorridas no presente, no
passado e que ocorrerão futuramente.
As alterações qualitativas são apresentadas a seguir.
2.2.1.1 Estado crepuscular

É um estreitamento transitório da consciência, com a conservação


de atividade mais ou menos coordenada e mais ou menos
automática. Normalmente, há a falsa aparência de que o paciente
está compreendendo a situação. Em geral, a percepção do mundo
exterior é imperfeita ou de todo inexistente. Os estados
crepusculares costumam desaparecer rapidamente, mas, em alguns
casos, podem durar muitos dias. Apresentam-se e terminam de
modo súbito, acompanhados de amnésia em relação às vivências
acessuais.
2.2.1.2 Dissociação da consciência

Ocorre fragmentação ou divisão do campo da consciência, com perda


da unidade psíquica do ser humano. Observa-se estado semelhante
ao sonho, podendo ocorrer em estados dissociativos e de ansiedade
intensa.
2.2.1.3 Transe

É o fenômeno em que a pessoa se sente transformada em outra,


como uma “despersonalização”. Desaparece a relação entre o corpo
e os objetos do meio exterior, como impossibilidade de estabelecer a
distinção entre o que é próprio e o que pertence ao exterior. Pode
ocorrer em contextos religiosos (não sendo patológico), casos
neurológicos ou início de psicoses.
2.2.1.4 Polarização da consciência ou estado hipnótico

É a orientação forçada da consciência em determinado sentido,


segundo forte tendência afetiva. É uma atitude mais focal e profunda
do que o estado crepuscular e nem sempre sugere estado patológico.
É possível que, tocado por intensa motivação afetiva, o indivíduo
concentre toda a sua consciência em um dado ponto (música ou
imagem), desconsiderando os demais estímulos à sua volta.
2.2.2 Atenção
A atenção é um processo psíquico que concentra a atividade mental
sobre determinado ponto, traduzindo um esforço mental, e resulta
de atividade deliberada e consciente do indivíduo. Existem a atenção
voluntária (ativa e intencional – capacidade de ler um livro, por
exemplo) e a espontânea (por algum interesse incidental e
momentâneo por algum objeto – capacidade de parar de ler o livro
para focar em algum barulho que acontece no momento, por exeplo).
Investigação:
1. Atenção: normal ou euprosexia;
2. Hiperprosexia: estado de atenção exacerbada;
3. Hipoprosexia: diminuição global da atenção;
4. Aprosexia: abolição total da capacidade de atenção;
5. Hipertenacidade: atenção voltada, demasiadamente, a algum
estímulo específico, com diminuição da atenção espontânea;
6. Hipotenacidade: atenção afastada com demasiada rapidez do
estímulo específico, com diminuição da atenção voluntária.

2.2.3 Orientação
Pode-se definir orientação como um complexo de funções psíquicas
pelo qual tomamos consciência da situação real em que nos
encontramos. A orientação pode ser inferida da avaliação do estado
de consciência e está intimamente ligada às noções de tempo e
espaço.
Em geral, o primeiro sentido de orientação perdido é o do tempo;
depois, o do espaço, que envolve deslocamento e localização e, em
um estado mais grave, a “desorientação do próprio eu” (identidade e
corpo).
Orientação:
1. Autopsíquica: o paciente reconhece dados de identificação pessoal
e sabe quem é;
2. Alopsíquica: o paciente reconhece os dados do ambiente:
a) Temporal: dia, mês e ano em que está; em que parte do dia se
localiza (manhã, tarde e noite);
b) Espacial: em que lugar se encontra e para que está lá; a cidade
onde está; como chegou ao consultório.

2.2.4 Sensopercepção
Sensação é o fenômeno elementar gerado por estímulos físicos,
químicos ou biológicos, que produzem estimulação dos órgãos
receptores. Percepção é a tomada de consciência de tal estímulo
sensorial. Podem acontecer alterações quantitativas e qualitativas.
2.2.4.1 Quantitativas

1. Hiperestesia:
a) Intoxicação por alucinógenos, epilepsia;
b) Aumento das formas de sensibilidade.
2. Hipoestesia:
a) Quadros depressivos;
b) Diminuição das formas de sensibilidade.
3. Anestesia: abolição de todas as formas de sensibilidade.

2.2.4.2 Qualitativas

1. Ilusão: é a percepção deformada da realidade, de um objeto real e


presente, uma interpretação errônea do que existe. Pode acontecer em
rebaixamento do nível de consciência ou esgotamento afetivo e fadiga
grave;
2. Alucinação: é a percepção real de um objeto inexistente, ou seja,
sem um estímulo externo. Dizemos que a percepção é real, tendo em
vista a convicção inabalável que a pessoa manifesta em relação ao
objeto alucinado; portanto, será real para ela. As alucinações podem
ser auditivas (dentre elas, podem ocorrer sonorização do pensamento,
quando o paciente ouve os próprios pensamentos, e publicação do
pensamento, quando o paciente sente que as pessoas escutam o que
ele pensa), auditivo-verbais (mais comuns), visuais, olfativas,
gustativas, cenestésicas (corpórea – “cabeça encolhendo”),
cinestésicas (movimento – “corpo voando”) e sinestésicas (envolvem
mais de um sentido). Também existem as alucinações hipnagógicas
(ao adormecer) e hipnopômpicas (ao despertar);
3. Pseudoalucinação: não apresenta os aspectos vivos e corpóreos
da alucinação e é menos nítida. Ocorre em casos de psicoses
orgânicas, intoxicações ou estados afetivos intensos;
4. Alucinose: é um quadro alucinatório sem perda da consciência da
realidade; o paciente percebe a alucinação como estranha à sua
pessoa. Acontece em casos de alcoolismo;
5. Despersonalização: o paciente tem a sensação de que seu corpo
não lhe pertence;
6. Desrealização: o ambiente ao redor parece estranho e irreal.
Ilusão é a percepção deformada da realidade,
uma interpretação errônea do que existe,
enquanto alucinação é percepção real de um
objeto inexistente, ou seja, sem um estímulo
externo.

2.2.5 Memória
Memória é a capacidade de registrar, manter e evocar fatos passados.
Há quatro dimensões principais do seu funcionamento:
1. Percepção: modo como o sujeito percebe os fatos e atitudes em
seu cotidiano e reconhece-os psiquicamente;
2. Fixação: capacidade de gravar imagens na memória;
3. Conservação: tudo o que o sujeito guarda para o resto da vida (a
memória aparece como um todo e é um processo tipicamente afetivo);
4. Evocação: atualização dos dados fixados (nem tudo pode ser
evocado).

A função mnésica pode ser avaliada pela rapidez, precisão e


cronologia das informações oferecidas pelo próprio paciente, assim
como a observação da capacidade de fixação. A memória pode ser
imediata, de curto ou de longo prazo.
Podem existir as alterações quantitativas: hipermnésia (aceleração
psíquica) e hipomnésias ou amnésias. As últimas podem ser
anterógradas (o paciente não consegue fixar memória a partir do
evento que causou o dano cerebral) ou retrógradas (perda da
memória para fatos ocorridos antes do trauma). Podem, também,
ocorrer amnésias lacunares, ou seletivas.
O exame da memória passada (retrógrada) é feito com perguntas
sobre o passado do paciente e data de acontecimentos importantes.
Contradições nas informações podem indicar dificuldades.
Com relação à memória recente (anterógrada), podem ser feitas
perguntas rápidas e objetivas, como “O que você fez hoje?”, ou dizer
um número de quatro ou cinco algarismos ou uma série de objetos e
pedir para que o paciente os repita após alguns minutos. Para o
exame da memória de retenção, pode-se pedir a ele que repita
algarismos na ordem direta e depois inversa.
A amnésia pode ser anterógrada (o paciente
não fixa a memória a partir do evento que
causou o dano), retrógrada (perda para fatos
ocorridos antes do trauma) e lacunar ou
seletiva.

A maior parte das alterações da memória provém de síndromes


orgânicas (amnésia, hipermnésia ou hipomnésia). As alterações
qualitativas, ou paramnésias, são lembranças deformadas, que não
correspondem à sensopercepção original.
Alterações da memória:
1. Ilusões mnêmicas: acréscimos de elementos falsos a um núcleo
verdadeiro;
2. Alucinações mnêmicas: criações imaginativas;
3. Confabulações: fantasias que preenchem vazios de memória
(podem ocorrer na síndrome de Korsakoff).

2.2.6 Afetividade
A afetividade compreende o estado de ânimo ou de humor, os
sentimentos, as emoções e as paixões e reflete sempre a capacidade
de experimentar sentimentos e emoções. É ela que determina a
atitude geral do indivíduo diante de qualquer experiência vivencial,
promove os impulsos motivadores e inibidores, percebe os fatos de
maneira agradável ou sofrível, confere disposição indiferente ou
entusiasmada e determina sentimentos que oscilam entre dois
polos: depressão e euforia.
A afetividade divide-se, basicamente, em:
1. Humor: um estado de ânimo; é a disposição afetiva de fundo, que
penetra em toda a experiência psíquica do indivíduo. Algumas
alterações de humor são:
a) Hipertimia: euforia;
b) Hipotimia: depressão;
c) Disforia: irritabilidade, mau humor.
2. Afeto: o tônus emocional que acompanha uma ideia ou
representação mental.

Alterações afetivas:
1. Labilidade afetiva: estado especial em que se produz a mudança
rápida e imotivada do humor, sempre acompanhada de extraordinária
intensidade afetiva;
2. Ambivalência afetiva: acentuações afetivas opostas e,
basicamente, simultâneas nos indivíduos;
3. Embotamento afetivo: perda de todo tipo de vivência afetiva;
ausência dos nexos afetivos;
4. Anedonia: incapacidade de sentir prazer com determinadas
atividades da vida antes prazerosas; muito comum nas depressões;
5. Hipomodulação: inadequação ou distanciamento afetivo.

2.2.7 Pensamento
Por meio do pensamento ou do raciocínio, o ser humano é capaz de
manifestar suas possibilidades de adaptar-se ao meio. É por ele que
se elaboram conceitos, articulam-se juízos, constrói-se, compara-
se, solucionam-se problemas, elaboram-se conhecimentos
adquiridos e ideias, transforma-se e cria-se.
É importante a investigação do curso, da forma e do conteúdo do
pensamento.
2.2.7.1 Curso

Trata-se da velocidade com que o pensamento é expresso e pode ir


do acelerado ao lentificado.
2.2.7.2 Forma
Formas de pensamentos:
1. Fuga de ideias: pessoas afetadas mudam de assunto a todo
instante, sem concluí-los ou dar continuidade, em uma aceleração do
fluxo do pensamento; é a forma extrema do taquipsiquismo (comum na
mania);
2. Interceptação ou bloqueio: há interrupção brusca do que vinha
falando, e o assunto pode ser retomado como se não o tivesse
interrompido (comum na esquizofrenia);
3. Prolixidade: é um discurso detalhista, cheio de rodeios e
repetições, com certa circunstancialidade; há introdução de temas e
comentários não pertinentes ao que se está falando;
4. Arborização: há perda da direcionalidade, sem conclusão do
raciocínio (comum nos episódios maníacos);
5. Circunstancialidade: o paciente dá voltas em torno do tema sem
conseguir atingi-lo (comum em casos de transtorno obsessivo-
compulsivo);
6. Descarrilamento: há mudança súbita do que se está falando;
7. Perseveração: há repetição dos mesmos conteúdos de
pensamento (comum nas demências).

2.2.7.3 Conteúdo

As perturbações no conteúdo do pensamento estão associadas a


determinadas alterações, como as obsessões, as fobias e,
especialmente, os delírios.
Para classificar uma ideia como delirante, deve-se considerar alguns
aspectos: a incorrigibilidade (não há como modificar a ideia
delirante por meio de correções), a influenciabilidade (a vivência é
muito intensa; chega a ser mais fácil o delirante influenciar a pessoa
dita normal) e a incompreensibilidade (não pode ser explicada
logicamente). O delírio é uma convicção íntima e irremovível, contra
a qual não há argumento.
Uma ideia delirante deve ter aspectos como
incorrigibilidade, influenciabilidade e
incompreensibilidade.

Os delírios podem ser primários (núcleo da doença) ou secundários


(consequentes à situação social, manifestação afetiva ou disfunção
cerebral).
Quadro 2.1 - Perturbações no conteúdo do pensamento

2.2.8 Linguagem
A linguagem é considerada um processo mental predominantemente
consciente, significativo, além de ser orientada para o social. É um
processo dinâmico que se inicia na percepção e termina na palavra
falada ou escrita e, por isso, se modifica constantemente.
As alterações mais comuns são disartrias (má articulação de
palavras), afasias (perturbações por danos cerebrais que implicam
dificuldade ou incapacidade de compreender e utilizar os símbolos
verbais), verbigeração (repetição incessante de palavras ou frases),
parafasia (emprego inapropriado de palavras com sentidos
parecidos), neologismo (criação de palavras novas), jargonofasia
(“salada de palavras”), mussitação (voz murmurada em tom baixo),
logorreia (fluxo incessante e incoercível de palavras) e
pararrespostas (responde a uma indagação com algo sem relação
alguma com o que foi perguntado).
2.2.9 Vontade/volição
A vontade, relacionada aos atos voluntários, é uma disposição
(energia) interior com o princípio de alcançar um objetivo
consciente e determinado.
O indivíduo pode apresentar-se normobúlico (vontade normal), ter a
vontade rebaixada (hipobulia), uma exaltação patológica
(hiperbulia), responder a solicitações repetidas e excessivas
(obediência automática), concordar com tudo o que é dito, mesmo
que sejam juízos contraditórios (sugestionabilidade patológica),
realizar atos contra a sua vontade (compulsão), duvidar
exageradamente do que quer (dúvida patológica), opor-se de forma
passiva ou ativa às solicitações (negativismo), repetir de forma
automática as palavras ou ações do entrevistador (ecolalia e
ecopraxia).
2.2.10 Psicomotricidade
A psicomotricidade pode estar normal, diminuída (hipocinesia),
inibida (acinesia) ou exaltada (hipercinesia). O paciente pode
apresentar maneirismos (movimentos bizarros e repetitivos),
estereotipias posturais (repetições automáticas e uniformes),
automatismos, flexibilidade cérea (tendência a manter-se na
posição colocada pelo examinador), cataplexia (perda abrupta do
tônus muscular), tiques motores e alterações na marcha.
2.2.11 Consciência do eu
Este item refere-se ao fato de o indivíduo ter a consciência dos
próprios atos psíquicos, a percepção do seu eu, como o sujeito
apreende a sua personalidade.
São características formais do eu:
1. Sentimento de unidade: “Eu sou uno no momento”;
2. Sentimento de atividade: consciência da própria ação;
3. Consciência da identidade: “Sempre sou o mesmo ao longo do
tempo”;
4. Cisão sujeito-objeto: consciência do eu em oposição ao exterior e
aos outros.

2.2.12 Inteligência
O que se faz na avaliação da inteligência não é o que chamamos de
“avaliação fina”, realizada por meio de testes; o objetivo é constatar
se o paciente está dentro do considerado padrão de normalidade,
conseguindo resolver os problemas básicos da vida. Devem-se
considerar sempre o contexto sociocultural e a escolaridade do
paciente. As deficiências de inteligência são os retardos mentais, em
todos os seus níveis.
2.3 EXAME DO ESTADO MENTAL –
EXAME PSÍQUICO
O exame psíquico consiste na detalhada avaliação das funções
psíquicas, bem como das impressões e das observações feitas pelo
examinador enquanto está em contato com o paciente. Deve ser
sempre acompanhado de anamnese completa, com identificação,
queixa principal, história da doença atual, história patológica
pregressa, história pessoal e familiar. Todo paciente psiquiátrico
deve ser submetido, ainda, ao exame físico.
O exame psíquico deve ser completo e espelhar
exatamente o estado mental do paciente no
período analisado.

Quanto ao psiquismo do paciente, deve-se seguir um roteiro básico


de observação da impressão geral do paciente.
1. Apresentação: tipo constitucional, condições de higiene pessoal e do
vestuário, cuidados pessoais;
2. Atividade psicomotora e comportamento: mímica – atitudes e
movimentos expressivos da fisionomia (triste, alegre, ansioso,
temeroso, desconfiado, esquivo, dramático, medroso etc.);
gesticulação (ausência ou exagero); motilidade – toda a capacidade
motora (inquieto, imóvel, incapacidade de manter-se em determinado
local); deambulação – modo de caminhar (tenso, elástico, largado,
amaneirado, encurvado etc.);
3. Atitude para com o entrevistador: cooperativo, submisso, arrogante,
desconfiado, apático, superior, irritado, indiferente, hostil, bem-
humorado etc.;
4. Atividade verbal e linguagem: normalmente responsivo ao
entrevistador, não espontâneo (tipo pergunta e resposta), fala muito ou
pouco, exaltado e taciturno;
5. Estado de consciência;
6. Atenção espontânea e voluntária;
7. Orientação auto e alopsíquica;
8. Afetividade: humor, tônus afetivo;
9. Sensopercepção: ilusões, alucinações;
10. Pensamento: alteração de forma, curso e conteúdo;
11. Memória de curto e longo prazos;
12. Vontade e pragmatismo;
13. Inteligência: raciocínio e abstração;
14. Crítica de seu estado, da doença;
15. Planos para o futuro.

2.3.1 Exemplo de exame psíquico


Paciente trajado e asseado adequadamente; vígil, gesticulando
muito, inquieto, por vezes saindo da cadeira para andar pela sala;
coopera com o entrevistador, mas se mostra um tanto irritado com
as perguntas; linguagem um tanto exaltada, por vezes prolixo;
atenção espontânea e voluntária preservadas; orientado auto e
alopsiquicamente; humor exaltado, afeto expandido; pensamento
expansivo, mas sem alteração de curso; pragmatismo preservado;
inteligência sem rebaixamento; crítica parcial do estado mórbido.
2.4 CLASSIFICAÇÕES EM PSIQUIATRIA
São usadas, exclusivamente, para uniformizar a linguagem médica e
como objeto de pesquisa. São elas:
2.4.1 DSM-5
O Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais é uma
publicação da American Psychiatric Association, Washington D.C.,
sendo a sua 5ª edição conhecida pela designação DSM-5. Fornece
critérios de diagnóstico para a generalidade das perturbações
mentais, incluindo componentes descritivos, de diagnóstico e
tratamento, constituindo um instrumento de trabalho de referência
para os profissionais da saúde mental.
No DSM-5, os diagnósticos psiquiátricos são formulados de acordo
com uma avaliação multiaxial, que estabelece cinco eixos:
1. Diagnóstico do transtorno mental;
2. Transtornos de personalidade ou retardo mental;
3. Condições médicas gerais;
4. Psicossociais ou eventos associados;
5. Avaliação global do nível de funcionamento psicossocial.

2.4.2 CID-10
A Classificação Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à
Saúde (também conhecida como Classificação Internacional de
Doenças – CID-10) foi publicada pela Organização Mundial da Saúde
(OMS) em 1992 e visa padronizar a codificação de doenças e outros
problemas relacionados à saúde. A CID-10 fornece códigos relativos
à classificação de doenças e de grande variedade de sinais, sintomas,
aspectos anormais, queixas, circunstâncias sociais e causas externas
para ferimentos ou doenças. A cada estado de saúde é atribuída uma
categoria única à qual corresponde um código CID-10. Essa é a
classificação usada para laudos, atestados e pareceres médicos.
A OMS lançou, em junho de 2018, sua nova Classificação Estatística
Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde (CID-
11), que foi apresentada para adoção em maio de 2019 (durante a
Assembleia Mundial da Saúde) e entrará em vigor em 1º de janeiro de
2022.
Documentos médicos com fins judiciais devem
utilizar o CID-10, enquanto o DSM-5 é usado em
prontuários e discussões.
Você sabe o que investigar
em um exame psíquico
completo?
Um exame psíquico completo deve ser iniciado assim que
visualizarmos o paciente, atentando para sua
apresentação, atividade psicomotora e comportamento,
atitude para com o entrevistador, atividade verbal e
linguagem, estado de consciência, atenção espontânea e
voluntária, orientação auto e alopsíquica, afetividade,
sensopercepção, pensamento, memória de curto e longo
prazos, vontade e pragmatismo, inteligência, crítica de seu
estado, além de planos para o futuro.
Você sabe diagnosticar e
diferenciar delirium e
demência?

3.1 INTRODUÇÃO
O agrupamento dos transtornos mentais orgânicos compreende uma
série de transtornos mentais reunidos, tendo em comum uma
etiologia demonstrável, como doença, lesão cerebral ou outro
comprometimento que leva à disfunção cerebral. A disfunção pode
ser primária, em ação direta sobre o sistema nervoso, ou secundária.
O comprometimento que ocorre é o das funções cognitivas
(memória, linguagem, atenção); por vezes, precedido de
deterioração do controle emocional, do comportamento social ou da
motivação. As principais síndromes mentais orgânicas são o delirium
e a demência.
3.2 DELIRIUM
3.2.1 Definição
Delirium, ou estado confusional agudo, é uma síndrome clínica
caracterizada por rebaixamento súbito do nível de consciência,
comprometimento da atenção, distúrbios da percepção (distorções,
ilusões e alucinações), distúrbio da capacidade de compreensão e de
abstração, delírios pouco estruturados e fugazes, déficit de memória
de fixação e relativa preservação da memória remota, desorientação
(mais comumente no tempo), comprometimento da atividade
psicomotora (aumento ou redução), alteração do ciclo sono-vigília,
transtornos emocionais (depressão, ansiedade, medo, irritabilidade,
euforia, apatia, perplexidade), com início abrupto dos sintomas e
flutuação ao longo do dia, tendendo a piorar à noite. Tem duração
limitada, em geral dias ou semanas, e os sintomas desaparecem
quando o fator de causa é identificado e tratado.
3.2.2 Epidemiologia
Trata-se de um transtorno bastante frequente, principalmente entre
pacientes internados. Dados revisados da literatura médica apontam
delirium em cerca de 30% dos pacientes que estão em unidades
cirúrgicas de tratamento intensivo e unidades cardíacas de cuidados
intensivos e 40 a 50% dos que estão se recuperando de cirurgias por
fraturas de quadril. O delirium pode acometer até 80% dos pacientes
criticamente enfermos sob ventilação mecânica, segundo estudos
americanos e canadenses. Porém, é comumente subdiagnosticado;
aproximadamente 70% dos casos não são reconhecidos pelos
médicos, o que leva a aumento nas taxas de mortalidade e
morbidade, declínio da capacidade funcional e prolongamento das
internações hospitalares.
3.2.3 Etiologia
1. Causas extracranianas:
a) Infecções sistêmicas;
b) Transtornos metabólicos;
c) Hipóxia;
d) Hipercapnia;
e) Hipoglicemia;
f) Desequilíbrio eletrolítico;
g) Doença hepática ou renal;
h) Deficiência de tiamina;
i) Estados pós-operatórios;
j) Trauma.
2. Causas intracranianas:
a) Infecções: meningite, encefalite;
b) Encefalopatia hipertensiva;
c) Estados convulsivos pós-ictais;
d) Sequelas de traumatismo craniano;
e) Lesões focais do lobo parietal direito;
f) Lesões da superfície inferomedial do lobo occipital.
3. Abstinência de substâncias:
a) Álcool (delirium tremens);
b) Anfetaminas e relacionadas;
c) Sedativos;
d) Hipnóticos e ansiolíticos;
e) Outras substâncias.
4. Medicamentos:
a) Anestésicos;
b) Cardiovasculares;
c) Analgésicos;
d) Antimicrobianos;
e) Antiasmáticos;
f) Antiparkinsonianos;
g) Anticonvulsivantes;
h) Corticosteroides;
i) Anti-histamínicos;
j) Relaxantes musculares;
k) Anti-hipertensivos;
l) Anticolinérgicos (psicotrópicos).
5. Toxinas:
a) Anticolinesterase;
b) Dióxido de carbono;
c) Organofosforados;
d) Substâncias voláteis;
e) Monóxido de carbono;
f) Combustíveis ou tintas.

3.2.4 Diagnóstico
Quando se suspeita do diagnóstico de delirium, é essencial tentar
encontrar e tratar a causa-base, o que deve ser o foco principal do
manejo. Deve-se fazer exame físico completo, revisão de prontuário
(procurando, principalmente, por mudanças de comportamento,
inclusão de novas drogas ao regime e resultados de exames
complementares) e solicitar exames laboratoriais e de imagem
adequados. É importante a solicitação de todos os exames
laboratoriais, pois sempre haverá causa orgânica no delirium.
3.2.4.1 Exames básicos

1. Hemograma completo com diferencial de leucócitos;


2. Eletrólitos, índices renais e hepáticos, glicemia;
3. Testes de função da tireoide;
4. Testes sorológicos para sífilis;
5. Teste sorológico para HIV;
6. Análise de urina;
7. Eletrocardiograma;
8. Eletroencefalograma;
9. Radiografia torácica;
10. Triagem para drogas no sangue e na urina.

3.2.4.2 Exames adicionais

1. Cultura de sangue, urina e liquor;


2. Concentração de ácido fólico e B12;
3. Tomografia computadorizada ou ressonância magnética do cérebro;
4. Punção lombar e exame do liquor.

3.2.4.3 Diagnósticos diferenciais

1. Demência, em que o curso é mais lento e insidioso e não há


rebaixamento do nível de consciência. Porém, ambas as condições
podem coexistir;
2. Mania ou outro transtorno psicótico, em que o paciente também
apresenta alucinações, delírios, pensamento desorganizado e
agitação, mas não tem alteração da consciência;
3. Depressão, que se confunde, sobretudo, com o subtipo sonolento de
delirium.

3.2.5 Tratamento
O tratamento da condição médica que induz à agitação é primário.
Posteriormente, se necessário, deve-se sedar com neuroléptico de
alta potência e baixa interferência em parâmetros vitais: haloperidol
(Haldol®), 5 mg IM, a cada 30 minutos, até obter sedação, com
possibilidade de dose máxima entre 45 e 100 mg, em 24 horas. Pode-
se utilizar neuroléptico atípico, como risperidona, 1 a 2 mg VO, ou
ziprasidona, 40 mg VO.
Deve-se manter cerca de metade da dose inicialmente eficaz,
intramuscular ou oral, com redução progressiva à medida que os
sintomas remitem. A dose de manutenção em idosos deve ser menor:
1 mg VO, a cada 12 horas.
3.3 DEMÊNCIA
3.3.1 Definição
A demência é uma síndrome progressiva que apresenta múltiplos
comprometimentos da função cognitiva. As três características
principais são:
1. Esquecimento ou problemas com a memória;
2. Problemas de comportamento (agitação, insônia, choro fácil,
comportamentos inadequados);
3. Perda das habilidades adquiridas durante a vida (dirigir, vestir a
roupa, gerenciar a vida financeira, cozinhar etc.).

3.3.2 Etiologia
A demência pode ter várias causas, algumas delas reversíveis (15%
dos casos). A mais comum é a doença de Alzheimer (50% dos casos),
seguida da demência vascular (15% dos casos).
Outros fatores que podem causar demência são:
1. Drogas e toxinas;
2. Tumores cerebrais;
3. Traumatismo cranioencefálico;
4. Hidrocefalia de pressão normal;
5. Transtornos neurodegenerativos: Parkinson, Huntington, Pick;
6. Infecções: sífilis, encefalite, HIV;
7. Transtornos nutricionais e metabólicos.

3.3.3 Diagnóstico
Devem ser solicitados exames laboratoriais tanto para diagnóstico
quanto para tentar estabelecer a etiologia da demência. São os
mesmos exames realizados nos casos de delirium.
3.3.3.1 Doença de Alzheimer

A doença é diagnosticada depois de excluídas as demais causas de


demência, já que seu diagnóstico definitivo é o exame
anatomopatológico do cérebro.
Ocorre quadro de início insidioso, sendo os déficits de memória os
primeiros sintomas. A doença progride em fases:
1. Fase inicial:
a) Distração;
b) Dificuldade para lembrar nomes, palavras e números;
c) Dificuldade para aprender coisas novas;
d) Desorientação em ambiente familiar;
e) Redução das atividades sociais.
2. Fase intermediária:
a) Perda marcante da memória e das funções cognitivas;
b) Deterioração das habilidades verbais;
c) Alterações de comportamento;
d) Delírios e alucinações;
e) Incapacidade de convívio social;
f) Fugas ou perambulação pela casa;
g) Início da perda do controle esfincteriano.
3. Fase avançada:
a) Tendência de a fala desaparecer;
b) Continuam delírios e alucinações;
c) Transtornos de comportamento;
d) Perda do controle da bexiga e dos intestinos;
e) Tendência a ficar acamado;
f) Dificuldade para engolir alimentos, necessitando de sonda para
alimentação.

Vários estudos demonstraram que a doença de Alzheimer é idade-


dependente e que o risco aumenta em familiares, demonstrando que
a genética está fortemente relacionada. A hereditariedade está muito
mais marcada na chamada doença de Alzheimer familiar (15 a 20%),
cujo início é precoce, antes dos 65 anos, do que na doença de
Alzheimer esporádica (80 a 85%), caracterizada pelo aparecimento
em idades mais avançadas. A forma familiar está relacionada à
herança autossômica dominante com penetrância idade-
dependente. Já na forma esporádica, há um padrão de alta frequência
e baixa penetrância, distúrbio relacionado a um único gene ou um
modelo multifatorial com múltiplos genes e/ou fatores não
genéticos. O componente genético parece variar de família para
família: algumas fortemente relacionadas, outras sem grande
relevância.
3.3.3.2 Demência vascular

A demência vascular é causada por várias enfermidades, que têm em


comum origem vascular, derrame ou trombose, além da obstrução
de pequeninas artérias cerebrais (Binswanger), ou por causas
cardiorrespiratórias (parada cardíaca ou outra causa de falta de
oxigênio no cérebro).
Apresenta quadro clínico de demência mais agudo (repentino) após
evento neurológico, como derrame ou trombose. O diagnóstico é
feito pelo exame clínico e por tomografia computadorizada ou
ressonância magnética de crânio.
Suspeita-se de demência vascular na presença
de quadro abrupto, alterações no exame
neurológico e histórico de doença
cardiovascular.
3.3.4 Tratamento das demências
Se for por causa reversível, devem-se tratar as demências o mais
rápido possível. Nas degenerativas, devem-se manejar os
transtornos de comportamento com antipsicóticos em doses baixas
(Haldol®, 1 a 2 mg/d; risperidona, 1 a 2 mg/d). A doença de
Alzheimer pode estabilizar-se com um inibidor de colinesterase
(rivastigmina, donepezila, tacrina). Na demência vascular, deve-se
controlar a doença de base para prevenir novos infartos.
São fundamentais orientação familiar e suporte psicossocial.
3.4 DIAGNÓSTICOS DIFERENCIAIS
A depressão é o estado psiquiátrico mais comum que pode
apresentar-se sob a forma de demência. O termo pseudodemência
indica que portadores de doença depressiva podem apresentar
quadro demencial. Quando convenientemente tratados, respondem
muito bem, chegando frequentemente à remissão completa do
quadro demencial, o que não acontece nas demências de Alzheimer
ou vascular.
Quadro 3.1 - Delirium x demência
Quadro 3.2 - Doença de Alzheimer x demência vascular
Você sabe diagnosticar e
diferenciar delirium e
demência?
Para o diagnóstico e a distinção entre delirium e demência,
devemos observar o quadro clínico, a evolução e a
reversibilidade da patologia. O delirium é agudo e ocorre em
pacientes sem antecedentes de alterações de memória. É
um quadro flutuante, de curta duração, que melhora
quando a causa de base é identificada e tratada (reversível).
Ocorre prejuízo da atenção, déficit de memória recente e
são comuns delírios e alucinações.
A demência é um quadro insidioso e progressivo,
geralmente irreversível. A consciência geralmente se
preserva, e delírios e alucinações são comuns apenas na
progressão da patologia.
Intoxicação e abstinência, o
que fazer?

4.1 CONCEITOS GERAIS


Os conceitos definidos segundo o Compêndio de Psiquiatria: Ciência do
Comportamento e Psiquiatria Clínica e o Consenso de Abuso e
Dependência do Álcool (2002), da Associação Brasileira de
Psiquiatria (ABP), estão apresentados a seguir.
4.1.1 Substâncias psicoativas ou drogas
Substâncias psicoativas, ou drogas, são substâncias que alteram o
comportamento do usuário e o induzem a usá-las novamente. São
classificadas de acordo com o efeito que causam no cérebro, em
depressoras (álcool, inalantes, opioides), estimulantes (cocaína,
nicotina e anfetamina) e alucinógenas (LSD).
4.1.2 Abuso de substâncias
A característica essencial do abuso de substâncias é um padrão mal
adaptativo de uso, manifestado por consequências,
significativamente danosas e recorrentes, relacionadas ao uso
repetido da substância.
Em decorrência do abuso, pode haver fracasso repetido em cumprir
obrigações importantes, uso repetido em situações em que isso
apresenta perigo físico, problemas legais, sociais e interpessoais.
Tais problemas devem ser recorrentes (com recaídas) durante um
período de 12 meses. A diferença entre dependência e abuso de
substâncias diz respeito à tolerância (aumento na quantidade
consumida), à abstinência (crise por falta da substância) ou a um
padrão de uso compulsivo.
Embora um diagnóstico de abuso de substâncias seja mais provável
em indivíduos que começaram recentemente a consumi-las, alguns
indivíduos continuam por longo período sofrendo as consequências
sociais adversas relacionadas a ela, sem desenvolverem evidências
de dependência de substância. A categoria “abuso de substância”
não se aplica à nicotina e à cafeína.
4.1.3 Dependência
Dependência é a presença de um agrupamento de sintomas
psicofisiológicos, indicando que a pessoa continua a usar a
substância apesar dos problemas significativos relacionados a ela.
Há um padrão de uso repetido que, em geral, resulta em tolerância,
abstinência (dependência física) e comportamento compulsivo de
consumo da droga, com impulso irrefreável para consumi-la
(dependência psicológica).
Um diagnóstico de dependência de substância pode ser aplicado a
toda classe de substâncias, exceto à cafeína. Os sintomas de
dependência são similares entre as várias categorias de substâncias,
mas, para certas classes, alguns são menos salientes e, em certos
casos, nem todos os sintomas se manifestam.
São requisitos básicos da dependência:
1. Forte desejo ou compulsão para consumir a substância;
2. Dificuldade no controle de consumir a substância em termos do seu
início, término ou níveis de consumo;
3. Estado de abstinência fisiológica quando foi cessado ou reduzido o
uso (sintomas de abstinência ou uso da substância para aliviá-los);
4. Evidência de tolerância, de tal forma que doses crescentes da
substância psicoativa são requeridas para alcançar efeitos
originalmente produzidos por doses mais baixas;
5. Abandono progressivo de prazeres ou de interesses alternativos em
favor do uso da substância psicoativa, aumento do tempo necessário
para obter ou tomar a substância psicoativa ou para recuperar-se dos
seus efeitos;
6. Persistência no uso da substância a despeito de evidência clara de
consequências manifestamente nocivas, como dano ao fígado por
excesso de álcool, depressão consequente a período de consumo
excessivo da substância ou comprometimento cognitivo relacionado à
droga.

Para haver dependência, deve haver


abstinência, comportamento compulsivo de
consumo com impulso irrefreável e tolerância.
O uso diário de substância não é critério para
dependência.

4.1.4 Tolerância
Tolerância é a necessidade de crescentes quantidades da substância
para atingir o efeito desejado ou um efeito acentuadamente
diminuído com o uso continuado da mesma quantidade da
substância. O grau em que a tolerância se desenvolve varia
imensamente. Indivíduos em uso intenso de opioides e estimulantes
podem desenvolver níveis substanciais (multiplicados por 10) de
tolerância. Em geral, a tolerância ao álcool é muito menos extrema
do que no caso das anfetaminas. Muitos tabagistas consomem mais
de 20 cigarros/dia, quantidade que teria produzido sintomas de
toxicidade quando começaram a fumar. Os indivíduos em uso
intenso de maconha, em geral, não têm consciência de que
desenvolveram tolerância (embora esta tenha sido demonstrada em
estudos com animais e em alguns indivíduos).
4.1.5 Síndrome de abstinência
A síndrome de abstinência é uma alteração comportamental mal
adaptativa, com elementos fisiológicos e cognitivos, que ocorre
quando as concentrações de uma substância no sangue e nos tecidos
declinam em um indivíduo que manteve uso intenso e prolongado
dela. Após o desenvolvimento dos sintomas desagradáveis de
abstinência, a pessoa tende a consumir a substância para aliviá-los
ou evitá-los, tipicamente o dia inteiro, começando logo após o
despertar. Os sintomas de abstinência variam imensamente entre as
classes de substâncias, de modo que são oferecidos conjuntos
separados de critérios de abstinência para a maioria das classes.
Sinais acentuados e, com frequência, facilmente mensuráveis de
abstinência são comuns com álcool, opioides e sedativos, hipnóticos
e ansiolíticos. Os sinais e sintomas de abstinência com frequência
estão presentes, mas podem ser menos visíveis no caso de
estimulantes, como anfetaminas, cocaína e nicotina. Nenhuma
abstinência significativa é vista, mesmo após o uso repetido de
alucinógenos.
Tolerância e abstinência estão presentes na
dependência de substâncias e ausentes no
abuso de substâncias.

4.1.6 Intoxicação
A intoxicação é o desenvolvimento de uma síndrome reversível
específica, ocasionada pela recente ingestão de uma substância (ou
exposição a ela).
Diferentes substâncias podem produzir síndromes similares ou
idênticas. Alterações comportamentais ou psicológicas clinicamente
significativas e mal adaptativas, em razão do efeito da substância
sobre o Sistema Nervoso Central (SNC – beligerância, instabilidade
do humor, prejuízo cognitivo, comprometimento da memória,
prejuízo no funcionamento social ou ocupacional), que se
desenvolvem durante ou logo após o uso da substância. Os sintomas
não são atribuídos a uma condição médica geral nem são mais bem
explicados por outro transtorno mental.
Quadro 4.1 - Alguns agentes tóxicos para os quais existem antídotos

Na intoxicação por ADT, pode-se encontrar agitação ou sedação,


midríase, taquicardia, convulsões generalizadas, perda da
consciência, depressão respiratória, arritmia cardíaca, parada
cardíaca e morte. Tendo em vista a grande afinidade proteica dos
ADTs, sua eliminação por diálise ou diurese é muito difícil. Nos casos
de intoxicação, indica-se o uso de anticolinesterásicos (fisostigmina
ou Prostigmine® intramusculares ou intravenosas) e medidas de
sustentação geral. Na intoxicação por anticolinesterásico, como os
organofosforados, as manifestações tóxicas devem-se à inibição da
acetilcolinesterase no sistema nervoso. Manifestações muscarínicas
incluem miose, lacrimejamento aumentado, broncoespasmo, visão
turva, broncorreia, diaforese, salivação, bradicardia, hipotensão,
incontinência urinária e motilidade gastrintestinal aumentada.
Manifestações nicotínicas incluem fasciculações, fraqueza muscular,
hipotensão, cãibras e paralisia respiratória. Toxicidade do SNC gera
ansiedade, fala pastosa, alterações do estado mental (delirium, coma
e convulsões) e depressão respiratória.
4.2 DADOS EPIDEMIOLÓGICOS
Dados epidemiológicos dos transtornos mentais decorrentes de
substâncias psicoativas:
1. 20% da população utiliza substâncias psicoativas no decorrer da
vida;
2. 15%, no mínimo, podem ser classificados como dependentes
químicos;
3. 10 a 12% usam mais de uma droga concomitantemente;
4. A incidência de dependência química é de duas a seis vezes maior
no homem;
5. A dependência química evolui do álcool para drogas mais pesadas;
6. 150.000 óbitos/ano por alcoolismo nos Estados Unidos;
7. 15% dos dependentes químicos cometem suicídio (incidência 20
vezes maior do que na população em geral).

Fonte: Associação Brasileira de Psiquiatria, 2002.

4.3 ÁLCOOL
4.3.1 Mecanismo de ação
Quando consumido, o álcool passa pelo estômago e começa a ser
absorvido no intestino, caindo na corrente sanguínea. Ao passar pelo
fígado, começa a ser metabolizado. A 1ª substância formada pelo
álcool chama-se acetaldeído, depois convertido em acetato por
outras enzimas. Essas substâncias, como o álcool excedente, são
eliminadas pelos rins. As que, eventualmente, voltam ao fígado, são
transformadas em água e gás carbônico expelido pelos pulmões. A
passagem do intestino para o sangue ocorre conforme a velocidade
com que o álcool é ingerido; já o processo de degradação do álcool
pelo fígado obedece a um ritmo fixo, podendo ser ultrapassado pela
quantidade consumida. Quando isso ocorre, tem-se a intoxicação
pelo álcool (estado de embriaguez). Como a quantidade de enzimas é
regulável, um indivíduo em uso contínuo de álcool acima do
necessário produzirá mais enzimas metabolizadoras do álcool,
tornando-se mais “resistente” a ele. A presença de alimentos no
intestino lentifica a absorção do álcool. Apesar de ser altamente
calórico, o álcool não fornece material estocável, assim a energia
oferecida é utilizada enquanto ele circula ou é perdida. O dano físico
direto do álcool sobre o cérebro é um fato inquestionavelmente
confirmado. A parte mais afetada costuma ser o córtex pré-frontal,
responsável pelas funções intelectuais superiores, como raciocínio,
capacidade de abstração de conceitos e lógica. Os mesmos estudos
que investigam as imagens do cérebro identificam uma
correspondência linear entre a quantidade de álcool consumida ao
longo do tempo e a extensão do dano cortical. Quanto mais álcool,
maior o dano. Depois do córtex, as áreas envolvidas são as
relacionadas com a memória e o cerebelo, que é a parte responsável
pela coordenação motora. O estresse oxidativo, decorrente do
metabolismo do etanol, produz alto nível intracelular de espécies
reativas de oxigênio e nitrogênio, que são os pontos cardiais da
patogênese de uma série de complicações clínicas relacionadas ao
álcool, como hepatopatia alcoólica, pancreatopatia alcoólica,
miocardiopatia alcoólica, alterações hematológicas etc. A
peroxidação de lipídios, formando ácidos graxos, também contribui
com as lesões orgânicas advindas do metabolismo do álcool. A ação
do etanol interfere em macromoléculas celulares, em ácidos
nucleicos e na cascata de sinalização intra e extracelular, altera as
mitocôndrias e produz dano no retículo endoplasmático, no DNA e
nos ribossomos.
4.3.2 Intoxicação
Os estados de intoxicação e embriaguez normalmente são obtidos de
modo voluntário. Neles, a pessoa tem alteração da fala (fala
arrastada), incoordenação motora, ataxia, nistagmo, prejuízos na
memória e atenção, estupor ou coma nos casos mais extremos. Em
geral, junto a essas alterações neurológicas, apresenta-se um
comportamento inadequado ou impróprio da pessoa intoxicada. O
tratamento consiste em medidas gerais de suporte à vida e atenção
para trauma cranioencefálico e broncoaspiração de vômitos,
bastante comuns. O intoxicado deve receber, sempre, tiamina antes
do início do soro glicosado, para prevenir complicações como a
Síndrome de Wernicke-Korsako (SWK). Embriaguez patológica é
uma condição em que, com ingestão de pequenas doses de álcool, há
comportamento violento, crepuscularização da consciência e
amnésia lacunar.
4.3.3 Abuso
O critério de abuso existe para caracterizar as pessoas com eventuais
problemas em razão de consumos excessivos de álcool em curtos
períodos de tempo. Para o diagnóstico, é preciso que o paciente
esteja tendo problemas com álcool durante, pelo menos, 12 meses e
apresente, pelo menos, uma das seguintes situações:
1. Prejuízos significativos no trabalho, na escola ou na família, como
faltas ou negligências nos cuidados com os filhos;
2. Exposição a situações potencialmente perigosas, como dirigir ou
manipular máquinas perigosas embriagado;
3. Problemas legais, como desacato a autoridades ou a superiores;
4. Persistência no uso de álcool, apesar do apelo das pessoas
próximas para que interrompa o uso.

4.3.4 Dependência
Para o diagnóstico de dependência alcoólica, é preciso que o usuário
venha tendo problemas decorrentes do uso de álcool durante 12
meses seguidos e preencher, ao menos, três dos seguintes critérios
(Classificação Internacional de Doenças – CID-10):
1. Tolerância ao álcool: marcante aumento da quantidade ingerida para
produção do mesmo efeito obtido no início ou marcante diminuição dos
sintomas de embriaguez ou, ainda, outros resultantes do consumo de
álcool, apesar da contínua ingestão;
2. Sinais de abstinência: após a interrupção do consumo de álcool, o
indivíduo passa a apresentar sudorese excessiva, aceleração do pulso
(acima de 100), tremores nas mãos, insônia, náuseas e vômitos,
agitação psicomotora, ansiedade, convulsões e alucinações táteis. A
reversão desses sinais com a reintrodução do álcool comprova a
abstinência;
3. O dependente de álcool, geralmente, bebe mais do que planejava;
4. Persistente desejo de voltar a beber ou incapacidade de interromper
o uso;
5. Emprego de muito tempo para obter a bebida ou recuperar-se do
seu efeito;
6. Persistência na bebida, apesar dos problemas e dos prejuízos
gerados, como perda do emprego e das relações familiares.

Outro instrumento cada vez mais utilizado para avaliação de


dependência ao álcool é o questionário CAGE. Ele é composto por
quatro perguntas, de fácil memorização, sendo bastante preciso para
identificar pacientes dependentes de álcool, conforme a definição
dos critérios diagnósticos. Duas respostas afirmativas sugerem
indicação positiva de dependência de álcool. As perguntas são:
1. Cut down (diminuir): você já pensou em largar a bebida?
2. Annoyed (aborrecido): você já ficou aborrecido quando outras
pessoas criticaram o seu hábito de beber?
3. Guilt (culpa): você já se sentiu mal ou culpado pelo fato de beber?
4. Eye-opening (ao despertar): você já bebeu pela manhã para ficar
mais calmo ou se livrar de uma ressaca?

Diante de um caso de dependência, ainda podemos categorizar cada


indivíduo de acordo com a classificação de Cloninger, que toma por
base a epidemiologia e a genética do dependente, servindo para
identificar comportamentos e estabelecer melhor abordagem
terapêutica para o alcoolismo. Cloninger classificou o alcoolismo em
dois tipos:
Alcoolismo tipo I ou alcoolismo decorrente do meio, que é a forma
mais frequente, com igual equivalência em ambos os sexos, de
progressão lenta e de início após os 20 anos de idade, associada à
personalidade passivo-dependente.
Alcoolismo tipo II, que foi definido como o alcoolismo
exclusivamente masculino, com início antes dos 20 anos de idade, de
rápida progressão para a dependência em sujeitos muito impulsivos,
e com tendência à personalidade antissocial.
4.3.5 Abstinência
A síndrome de abstinência constitui-se no conjunto de sinais e
sintomas observados nas pessoas que interrompem o consumo de
álcool após longo e intenso uso. As formas mais leves de abstinência
apresentam-se com tremores, aumento da sudorese, aceleração do
pulso, insônia, náuseas e vômitos e ansiedade depois de 6 a 8 horas
desde a última bebida. A síndrome de abstinência leve limita-se a
tremores, insônia e irritabilidade. A síndrome de abstinência torna-
se mais perigosa com o surgimento do delirium tremens.
Graus de abstinência dos transtornos mentais orgânicos:
I - Ansiedade, irritabilidade.
II - Grau I e alucinações.
III - Grau II e convulsões.
IV - Delirium tremens.
4.3.5.1 Delirium tremens

O delirium tremens é uma forma mais intensa e complicada da


abstinência, que se inicia, geralmente, após 72 horas da última
ingesta. Delirium é um diagnóstico inespecífico em Psiquiatria, que
designa estado de confusão mental (a pessoa não sabe onde está, em
que dia está, não consegue prestar atenção em nada, tem
comportamento desorganizado, além de fala desorganizada ou
ininteligível, e à noite pode ficar mais agitada do que durante o dia).
A abstinência e várias outras condições médicas não relacionadas ao
alcoolismo podem causar esse problema. Um traço comum no
delirium tremens, mas nem sempre presente, são as alucinações
táteis e visuais, em que o paciente vê insetos ou animais asquerosos
próximos ou pelo seu corpo, podendo levá-lo a um estado de
agitação violenta. Trata-se de uma condição potencialmente fatal,
principalmente nos dias quentes e nos pacientes debilitados. A
fatalidade, quando ocorre, é atribuída ao distúrbio hidroeletrolítico.
4.3.6 Tratamento
Segundo o projeto Diretrizes da Associação Médica Brasileira, de
2012, e o Consenso de Abuso e Dependência do Álcool, da ABP, de
2002:
1. Reposição vitamínica: tiamina intramuscular, nos primeiros 7 a 15
dias; após esse período, por via oral. Doses de 300 mg/d de tiamina
são recomendadas com o objetivo de evitar a SWK, que cursa com
ataxia, confusão mental e anormalidades de movimentação ocular
extrínseca (esta última, nem sempre presente);
2. Benzodiazepínicos: a prescrição deve basear-se em sintomas.
Dessa forma, as doses recomendadas são as que, em média, o
paciente pode receber em determinado dia. O diazepam é usado na
dose de 20 mg/d VO, com retirada gradual ao longo de 1 semana. O
clordiazepóxido pode ser usado até 100 mg/d VO, com retirada gradual
ao longo de 1 semana. Nos casos de hepatopatias graves: lorazepam
4 mg/d VO, com retirada gradual em 1 semana.

Deve-se sempre administrar tiamina antes da


glicose no tratamento da abstinência, para
evitar a síndrome de Wernicke-Korsakoff.

4.3.6.1 Tratamento das complicações

1. Convulsões: a maioria das crises é do tipo tônico-clônica


generalizada. As crises convulsivas correspondem à manifestação
relativamente precoce da abstinência; mais de 90% ocorrem até 48
horas após a interrupção do uso de álcool (pico entre 13 e 24 horas) e
estão associadas à evolução para formas graves de abstinência. Cerca
de 1/3 dos que apresentam crises evolui para delirium tremens, se não
tratado. Em 40% dos casos, as crises ocorrem isoladamente. Nos
pacientes que apresentam mais de uma crise, ocorrem, em geral, em
número limitado. O diazepam (ou um benzodiazepínico de ação longa)
é a medicação de escolha, na dose de 10 ou 20 mg VO. O uso
intravenoso é especialmente indicado durante os episódios
convulsivos;
2. Delirium tremens: forma grave de abstinência, geralmente se inicia
entre 1 e 4 dias após a interrupção do uso de álcool, até 3 ou 4 dias.
Caracteriza-se por rebaixamento do nível de consciência, com
desorientação, alterações sensoperceptivas, tremores e sintomas
autonômicos (taquicardia, elevação da pressão arterial e da
temperatura corporal). Doses elevadas de benzodiazepínico são
necessárias, mas o uso associado de neurolépticos é, em maior parte,
indicado. O tratamento farmacológico inclui diazepam, 60 mg/d (ou
lorazepam, até 12 mg/d, em casos de hepatopatia grave) e haloperidol,
5 mg/d.

4.3.7 Efeitos crônicos


Os alcoólatras crônicos podem desenvolver algum problema grave de
memória. Há dois desses tipos: a chamada SWK e a demência
alcoólica.
4.3.7.1 Wernicke-Korsakoff (síndrome amnésica)

A SWK caracteriza-se por incoordenação motora, movimentos


oculares rítmicos, como durante uma leitura (nistagmo), e paralisia
de certos músculos oculares, provocando algo parecido ao
estrabismo para quem antes não o possuía. Além desses sinais
neurológicos, o paciente pode estar em confusão mental, ou, se com
a consciência clara, apresentar prejuízos evidentes na memória
recente (não consegue gravar o que o examinador falou 5 minutos
antes). Muitas vezes, para preencher as lacunas da memória, o
indivíduo inventa histórias (a isso se chama fabulação).
Tal quadro deve ser considerado emergência, pois requer imediata
reposição da vitamina B1 (tiamina) para evitar o agravamento da
situação. Os sintomas neurológicos, já citados, são rapidamente
revertidos com a reposição da tiamina, mas o déficit da memória
pode tornar-se permanente.
4.3.7.2 Síndrome demencial alcoólica
A síndrome demencial alcoólica é semelhante à demência
propriamente dita, como a de Alzheimer. No uso intenso e
prolongado, mesmo sem a SWK, o álcool pode provocar lesões
difusas no cérebro, prejudicando, além da memória, a capacidade de
julgamento, de abstração de conceitos; a personalidade pode
alterar-se; todo o comportamento fica prejudicado. A pessoa torna-
se incapaz de se sustentar.
4.3.8 Tratamento
Segundo o projeto Diretrizes da Associação Médica Brasileira, de
2012, o tratamento é complexo, pois depende, principalmente, da
motivação do indivíduo para parar de beber. Podem-se usar
medicações (naltrexona, acamprosato) para diminuir o desejo pelo
álcool, e devem-se prevenir recaídas, especialmente, com consultas
próximas, psicoterapia ou grupos de ajuda.
A internação deve ocorrer se o paciente não consegue parar de beber
e apresenta danos físicos que o coloquem em risco, se tem outro
transtorno psiquiátrico associado em estado grave ou se as recaídas
são muito constantes.
4.4 COCAÍNA
4.4.1 Mecanismo de ação
Ocorre bloqueio da recaptação de dopamina, aumentando tal
substância na fenda sináptica. Há, então, aumento da transmissão de
estímulos da sensibilidade e do número de receptores. A dopamina
aumenta a atividade psicomotora, provoca comportamentos
estereotipados e reduz o consumo de alimentos, além de estar
relacionada aos centros límbicos, responsáveis pelo prazer.
4.4.2 Intoxicação aguda
Os sintomas mais comuns são:
1. Taquicardia ou, menos frequentemente, bradicardia;
2. Midríase, tornando mais difícil estar em ambientes claros;
3. Elevação da pressão sanguínea ou, menos constantemente,
diminuição da pressão;
4. Calafrios, náuseas e vômitos;
5. Perda de peso consequente à anorexia;
6. Agitação psicomotora ou, menos frequentemente, retardo
psicomotor;
7. Dores musculares, diminuição da capacidade respiratória e arritmias
cardíacas;
8. A relação entre o consumo de cocaína e infarto do miocárdio vem
sendo estudada.

Tanto o crack como a merla também são derivados da coca, com


efeitos semelhantes. Porém, a via de uso dessas duas formas confere
diferenças importantes; assim que fumados (crack e merla),
alcançam o pulmão, que é intensivamente vascularizado e apresenta
grande superfície, levando à absorção instantânea. Caem quase
imediatamente na circulação, chegando rapidamente ao cérebro,
aparecendo os efeitos da cocaína muito mais rapidamente que por
outras vias. Pela via pulmonar, os primeiros efeitos já ocorrem em 10
a 15 segundos; pela via inalatória, após 10 a 15 minutos e, pela via
intravenosa, em 3 a 5 minutos. A duração dos efeitos, contudo, é
muito rápida: em torno de 5 minutos, ao passo que, após injetar ou
cheirar, é de cerca de 20 a 45 minutos, respectivamente. Essa
duração efêmera dos efeitos faz que o usuário volte a utilizar a droga
com mais frequência (praticamente a cada 5 minutos) por essa via do
que pelas outras, gerando compulsão, popularmente denominada
“fissura”, uma vontade incontrolável de sentir os efeitos de prazer
provocados pela droga.
Uma dose alta da droga pode desencadear um quadro de overdose,
ou seja, falência de um ou mais órgãos, com alto risco de morte. A
overdose pode acometer tanto usuários crônicos quanto eventuais. A
dose letal é incerta, dependendo de fatores como tolerância e pureza
da droga consumida. Ocorre aumento do tônus simpático por
bloqueio da recaptação das monoaminas no SNC.
Os sintomas mais comuns na overdose são:
1. Agitação psicomotora;
2. Arritmia cardíaca;
3. Angina ou infarto agudo do miocárdio;
4. Acidente vascular cerebral;
5. Convulsões.

4.4.3 Abstinência
A interrupção do uso contínuo de cocaína é, em geral, seguida de
uma crise que pode ser vista como síndrome de abstinência, na qual
a exaltação dá lugar a apreensão, depressão profunda, sonolência e
inércia. A abstinência pode durar até 10 semanas, e são frequentes as
recaídas.
A cocaína possui ação parecida com a dos
antidepressivos, portanto, a abstinência dela
leva a sintomas depressivos.

4.4.4 Efeitos crônicos


Síndrome psicótica com delírios paranoides, alucinações visuais e
auditivas e ideias de autorreferência. Nas grávidas que usam cocaína,
foram descritos efeitos teratogênicos, incluindo anormalidades do
trato urinário e deformidade dos membros.
4.4.5 Tratamento
Tratam-se, basicamente, sintomas depressivos, ansiosos ou
psicóticos produzidos pela droga ou pela abstinência. O tratamento é
sintomático e de manutenção; na psicose cocaínica, aplica-se
haloperidol (5 mg IM ou VO, a cada 6 horas) ou tioridazina (25 a 50
mg, a cada 8 horas).
4.5 CANNABIS (MACONHA)
4.5.1 Intoxicação
Durante a fase de intoxicação, o usuário apresenta hiperemia ocular,
aumento do apetite, xerostomia e taquicardia. Acontece, ainda,
aumento da sensibilidade aos estímulos externos, revelando cores e
detalhes antes não percebidos. A percepção do tempo também é
afetada, passando a ser sentido como se estivesse mais lento.
Sensações de que o mundo está diferente, distante ou de que houve
uma mudança em si mesmo, como se não fosse a mesma pessoa ou
se estivesse sonhando, também podem ocorrer. Como efeito
imediato, há prejuízo na memória de curto prazo, na atenção e na
capacidade de recordação e de retenção do conhecimento. Há
dificuldade para a realização de tarefas que apresentem múltiplas
etapas. A capacidade de traduzir em palavras o que se pensa também
fica lesada. Além disso, as capacidades motoras ficam prejudicadas,
como a de exercer a força muscular original. Inibição dos reflexos,
incoordenação e desequilíbrio podem acontecer em doses mais altas.
4.5.2 Efeitos em longo prazo
Têm sido muito estudados os prejuízos permanentes que a maconha
pode causar após o uso intenso durante tempo prolongado (mais de
10 anos). Os achados não são conclusivos; não se pode, por
enquanto, confirmar nem descartar efeitos como a síndrome
amotivacional (indivíduo apático, sem persistência em seus
objetivos), embora ela se manifeste em muitos usuários. Os testes
neuropsicológicos não puderam detectar prejuízos, assim como os
testes de imagens. A ausência de alterações nos exames não pode ser
considerada ausência de prejuízo; é possível que este só aconteça a
uma parte dos usuários, ou que os instrumentos e as técnicas de
pesquisa ainda não sejam capazes de localizar o problema.
4.5.3 Dependência e abstinência
A maioria não se torna dependente, e a minoria desenvolve síndrome
de uso compulsivo da droga. Na abstinência, os sintomas são
irritabilidade, insônia, tremores, visão turva e incoordenação dos
movimentos.
4.5.4 Tratamento
O tratamento baseia-se nos mesmos princípios de outras drogas.
Deve-se incentivar a abstinência e tratar seus efeitos
sintomaticamente. Grupos de apoio e psicoterapia são de grande
ajuda.
4.6 OPIOIDES
4.6.1 Definição
Opioide é um termo designado para qualquer substância (endógena
ou sintética) similar à morfina. São elas: heroína, ópio, codeína,
metadona, fentanila e meperidina.
4.6.2 Intoxicação aguda
Pode haver sonolência e até inconsciência, miose, depressão
respiratória, resposta reduzida à dor, bradicardia, convulsões e
coma. Tríade clássica: coma, pupilas “em ponta de alfinete” e
depressão respiratória. Trata-se de uma emergência, devendo-se
garantir suporte à vida e medicar o paciente com naloxona
(antagonista opioide).
4.6.3 Dependência e abstinência
A tolerância desenvolve-se rapidamente. Todavia, os sintomas de
abstinência sucedem unicamente com uso crônico e parada abrupta.
Na abstinência ocorrem sudorese, midríase, ansiedade e fissura,
lacrimejamento, rinorreia, tremores, diarreia, náuseas e vômitos,
dor muscular e nas articulações, taquicardia, aumento da pressão
arterial, calafrios e insônia.
4.6.4 Tratamento e complicações
A metadona pode evitar sintomas de abstinência. As complicações
são atribuídas ao uso intravenoso (tromboflebites, úlceras,
meningite bacteriana, hepatites e HIV) e podem ser evitadas, por
exemplo, com agulhas descartáveis.
4.7 INALANTES
4.7.1 Intoxicação aguda
Incidem euforia, desinibição, zumbidos, ataxia, risos imotivados e
fala pastosa. Com doses mais altas, podem ocorrer arritmia cardíaca,
depressão do SNC com convulsões, coma e morte.
4.7.2 Efeitos em longo prazo
Não há evidências de tolerância ou abstinência. As principais
complicações crônicas são atrofia cortical e cerebelar, insuficiência
renal crônica e hepatite tóxica.
4.8 SEDATIVOS E HIPNÓTICOS
(BENZODIAZEPÍNICOS)
4.8.1 Abstinência
A abstinência tem início de 2 a 10 dias após a parada do uso. Podem
advir irritabilidade, insônia, tremores, sudorese, palpitação,
cefaleia, dores musculares e déficits de memória.
Os benzodiazepínicos não são indicados por períodos prolongados,
devendo-se diminuir gradualmente a sua dosagem, até a retirada do
medicamento.
4.8.2 Efeitos em longo prazo
O risco de dependência é muito grande, e podem ocorrer piora da
memória e da coordenação motora, sonolência, tontura, quedas e
fraturas.
Benzodiazepínicos devem ser sempre
introduzidos por curto espaço de tempo, para
evitar dependência.

4.9 ALUCINÓGENOS
4.9.1 Definição
Os alucinógenos são substâncias naturais (cogumelos) e sintéticas
(LSD) que causam alucinações e perda de contato com a realidade. Os
principais efeitos ocorrem no sistema serotoninérgico. A tolerância
desenvolve-se rapidamente, mas não existe dependência ou
abstinência.
4.9.2 Intoxicação aguda
Podem ocorrer ansiedade, ideação paranoide, medo de perder o
juízo, despersonalização, desrealização, comprometimento da
crítica, ilusões, alucinações, midríase, taquicardia, sudorese, visão
turva, tremores e incoordenação motora.
4.9.3 Efeitos em longo prazo
Mesmo com pouco ou único uso, pode haver fenômeno de flashback
(alucinações dias após a ingestão), transtorno psicótico prolongado
e bad trip (pânico, depressão e comportamento suicida).
4.10 ANFETAMINAS
4.10.1 Definição
A mais conhecida é a metanfetamina, ou ecstasy, de uso recreativo.
Porém, as anfetaminas também podem ser utilizadas para o
tratamento de doenças psiquiátricas, como o transtorno de déficit de
atenção e hiperatividade.
4.10.2 Intoxicação
O indivíduo sob sua ação tem insônia, inapetência, sente-se cheio de
energia e fala mais rápido. Quem toma anfetaminas é capaz de
executar uma atividade qualquer por mais tempo, sentindo menos
cansaço, o qual só aparece horas mais tarde, quando a droga já não
está mais presente no organismo; com uma nova dose, as energias
voltam, embora com menos intensidade. De qualquer modo, as
anfetaminas fazem que o organismo reaja além de suas capacidades,
exercendo esforços excessivos, o que, logicamente, é prejudicial à
saúde. Causam midríase, taquicardia e aumento da pressão
sanguínea (crise hipertensiva). Se uma pessoa exagera na dose fica
mais agressiva, irritadiça, começa a suspeitar de que outros estão
tramando contra ela (delírio persecutório). Os sinais físicos ficam
também muito evidentes: midríase acentuada, pele pálida devido à
contração dos vasos sanguíneos e taquicardia. Tais intoxicações são
graves, e a pessoa, geralmente, precisa ser internada até a
desintoxicação completa. Algumas vezes, durante a intoxicação, a
temperatura aumenta muito, o que é bastante perigoso, pois pode
levar a convulsões.
4.10.3 Abstinência
Chega a atingir quase 90% dos usuários. A pessoa sente grande falta
de energia (astenia), tornando-se bastante deprimida, ansiosa e
agitada.
4.11 NICOTINA
4.11.1 Mecanismo de ação e intoxicação
A nicotina age como agonista nicotínico de receptores de
acetilcolina. Na intoxicação, podem ocorrer cefaleia, náuseas e
tontura.
4.11.2 Abstinência
Ocorrem humor disfórico ou deprimido, insônia, irritabilidade,
ansiedade, inquietação e dificuldade de concentração. Dentre as
perturbações físicas, estão bradicardia e aumento do apetite e do
peso.
4.11.3 Tratamento
De acordo com uma publicação de 2018, do Instituto Nacional de
Câncer (INCA), 428 pessoas morrem por dia no Brasil em
decorrência do tabagismo, contabilizando 12,6% de todas as mortes
registradas no país. Ao todo, 156.216 mortes poderiam ser evitadas
todos os anos, caso o uso de tabaco fosse eliminado. O INCA ainda
aponta que R$56,9 bilhões são perdidos a cada ano em função de
despesas médicas e perda de produtividade decorrentes do tabaco.
A avaliação global do paciente e do grau de dependência a nicotina é
fundamental para estabelecer um planejamento terapêutico na
cessação do tabagismo. A avaliação é feita pelo questionário de
tolerância de Fagerström, que também ajuda na tomada de decisão
sobre a conduta individualizada. Recomenda-se o tratamento
farmacológico a todo fumante acima de 18 anos, com consumo
maior do que 10 cigarros/dia, sendo essa uma medida efetiva para a
cessação do tabagismo.
Verifica-se o grau de interesse do paciente em parar de fumar, de
acordo com o modelo que o classifica em fases motivacionais
comportamentais: pré-contemplativa (não quer parar de fumar),
contemplativa (pensa em parar de fumar), ativa (preparado para
iniciar tratamento), manutenção e recaída (voltou a fumar).
Deve-se avaliar o grau de dependência à nicotina, saber sobre
experiência pregressa com fármacos para tabagismo e considerar a
presença de comorbidades. A prescrição deve considerar todos esses
aspectos acrescidos das contraindicações, efeitos colaterais e
precauções para o uso.
Para tratamento, segundo o Protocolo Clínico e Diretrizes
Terapêuticas de Dependência de Nicotina, podem ser usados:
1. Adesivos de nicotina: 21 mg, 14 mg e 7 mg, em 24 horas, e 15
mg, 10 mg e 5 mg, em 16 horas. A dose deve ser prescrita
considerando-se o consumo médio de cigarros/dia, variando de 14 a
21 mg/d, com o objetivo de controlar os sintomas de abstinência,
podendo aumentar a dose a critério médico;
2. Goma de nicotina ou pastilhas: 4 e 2 mg. Fumantes de 25
cigarros ou mais devem utilizar gomas ou pastilhas de 4 mg e
fumantes de menos de 25 cigarros/dia devem utilizar gomas de 2 mg.
As gomas devem ser consumidas a cada 1 ou 2 horas ao longo de 6
semanas, com redução progressiva do consumo até a 14ª semana;
3. Bupropiona: comprimidos de 150 mg de cloridrato de bupropiona
de liberação prolongada. Iniciar com 150 mg, 1x/d, no quarto dia
prescrever 150 mg, 2x/d, usualmente por 12 semanas;
4. Vareniclina: comprimidos de 0,5 e 1 mg de tartarato de vareniclina.
Iniciar com 0,5 mg, 1x/d. No quarto dia, prescrever 0,5 mg, 2x/d, no
sétimo dia prescrever 1 mg, 2x/d, por 12 ou 24 semanas.

A terapia com bupropiona e vareniclina não requer cessação


imediata do tabagismo. Recomenda-se a interrupção deste a partir
do oitavo dia após o início desses medicamentos.
Embora não tenham aprovação do Food and Drug Administration
(FDA) para tratamento do tabagismo e provoquem muitos efeitos
colaterais, existe evidência científica de que a nortriptilina e a
clonidina sejam superiores ao placebo no tratamento do tabagismo,
podendo contribuir em situações em que não se podem utilizar os
medicamentos considerados de primeira linha mencionados.
Figura 4.1 - Diretrizes clínicas na saúde suplementar, segundo a Associação Médica
Brasileira e a Agência Nacional de Saúde Suplementar

Fonte: Diretrizes clínicas na saúde suplementar - Tabagismo, 2011.


Intoxicação e abstinência, o
que fazer?
Em todos os pacientes psiquiátricos, devemos investigar a
existência ou não de intoxicação e de abstinência de
substâncias psicoativas. A sintomatologia auxilia no
diagnóstico, que orienta o tratamento específico para cada
substância, como resumido no mapa mental.
O que é psicose e quais as
principais características da
esquizofrenia?

5.1 PSICOSE
O termo “psicótico” tem recebido, historicamente, diversas
definições diferentes, nenhuma com aceitação universal. A definição
mais estreita está restrita a delírios ou alucinações proeminentes,
sem crítica por parte do paciente. Ainda mais ampla é a definição que
igualmente inclui outros sintomas positivos da esquizofrenia, como
discurso desorganizado, comportamento amplamente
desorganizado ou catatônico.
De acordo com o glossário da American Psychiatric Association, o
termo “psicótico” refere-se a um amplo comprometimento do teste
da realidade.
Na psicose, é possível encontrar delírios,
alucinações e comportamento desorganizado,
podendo estar presentes em várias condições
ou patologias: esquizofrenia, transtornos de
humor (mania ou depressão), intoxicação e
abstinência de substâncias químicas, uso de
medicamentos e delirium.
Os transtornos incluídos nesta seção são especificados pelo Manual
Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-5) e pela
Classificação Internacional de Doenças (CID-10).
5.1.1 Esquizofrenia
Trata-se de uma perturbação que dura, pelo menos, 6 meses e inclui,
no mínimo, 1 mês de sintomas da fase ativa (isto é, dois ou mais
sinais, como delírios, alucinações, discurso desorganizado,
comportamento amplamente desorganizado ou catatônico e
sintomas negativos).
5.1.2 Transtorno esquizofreniforme
Caracteriza-se por quadro sintomático equivalente ao da
esquizofrenia, exceto por sua duração (isto é, a perturbação dura de 1
a 6 meses) e ausência da exigência de declínio no funcionamento.
5.1.3 Transtorno esquizoafetivo
Trata-se de uma perturbação em que episódio de humor e sintomas
da fase ativa da esquizofrenia ocorrem juntos e foram precedidos ou
seguidos por, pelo menos, 2 semanas de delírios ou alucinações sem
sintomas proeminentes de humor.
5.1.4 Transtorno delirante
Caracteriza-se por, pelo menos, 1 mês de delírios não bizarros sem
outros sintomas da fase ativa da esquizofrenia.
5.1.5 Transtorno psicótico breve
Trata-se de uma perturbação psicótica com duração maior que 1 dia
e remissão em 1 mês.
5.1.6 Transtorno psicótico compartilhado
Trata-se de uma perturbação que se desenvolve em indivíduo
influenciado por outra pessoa com delírio estabelecido de conteúdo
similar.
5.1.7 Transtorno psicótico devido a uma condição
médica geral
Os sintomas psicóticos são considerados consequência fisiológica
direta de uma condição médica geral.
5.1.8 Transtorno psicótico induzido por substância
Nesse caso, os sintomas psicóticos são considerados consequência
fisiológica direta de droga de abuso, medicamento ou exposição à
toxina.
5.1.9 Transtorno psicótico sem outra especificação
Está incluído na classificação de quadros psicóticos que não
satisfazem os critérios para quaisquer dos transtornos psicóticos
específicos definidos nesta seção, ou de sintomatologia psicótica
acerca da qual existem informações inadequadas ou contraditórias.
5.2 ESQUIZOFRENIA
5.2.1 Características gerais
Os transtornos esquizofrênicos caracterizam-se, em geral, por
distorções fundamentais de características do pensamento e da
percepção e por afetos inapropriados ou embotados. Usualmente,
mantêm-se claras a consciência e a capacidade intelectual, embora
certos déficits cognitivos possam evoluir no curso do tempo.
A evolução dos transtornos esquizofrênicos pode ser contínua,
episódica com déficit progressivo ou estável, ou comportar um ou
vários episódios seguidos de remissão completa ou incompleta.
Não se deve fazer diagnóstico de esquizofrenia quando o quadro
clínico comporta sintomas depressivos ou maníacos no primeiro
plano, a menos que se possa estabelecer, sem equívoco, que a
ocorrência dos sintomas esquizofrênicos tenha sido anterior à dos
transtornos afetivos. Além disso, não se deve fazer o mesmo
diagnóstico quando se manifestam doença cerebral, abstinência de
droga ou intoxicação por ela. A esquizofrenia é uma doença
caracterizada por desorganização de diversos processos mentais.
Culturalmente, o esquizofrênico representa o estereótipo do
“louco”, um indivíduo que produz grande estranheza social em
razão do seu desprezo para com a realidade reconhecida.
Os transtornos esquizofrênicos não podem ser
diagnosticados durante doença cerebral,
abstinência, intoxicações ou outros transtornos
que possam alterar o paciente.

5.2.2 Histórico
Em 1896, Emil Kraepelin cunhou o termo “dementia praecox” para
uma doença que tendia a começar relativamente cedo e produzir
prejuízo claro e persistente em aspectos das funções cognitivas e
comportamentais. No início, ele considerava a doença com curso
crônico e prognóstico ruim, porém, no decorrer de sua vida
profissional, acompanhou grande amostra de pacientes e observou
que 12,5% se recuperaram.
Em 1908, Eugen Bleuler modificou o termo para esquizofrenia (do
grego schizo = cindido/dividido, phrén = mente); para ele, o sintoma
mais importante era a fragmentação na formulação e na expressão
do pensamento (“afrouxamento de associações”). Identificou os
“As” bleulerianos: associações (dissociações) no processo do
pensamento; ambivalência; autismo; afeto embotado; avolição e
atenção prejudicadas. Kurt Schneider, interessado em identificar
sintomas patognomônicos, como Bleuler, estabeleceu uma
hierarquia de sintomas, de acordo com sua importância, para o
diagnóstico da esquizofrenia – sintomas de primeira e segunda
ordens. Os de primeira ordem não são obrigatórios para o
diagnóstico de esquizofrenia.
Sintomas de primeira e segunda ordens:
1. 1ª ordem: percepção delirante, alucinações auditivas (vozes que
fazem comentários e/ou que dialogam entre si), sonorização do
pensamento, roubo do pensamento, vivências de influência sobre o
pensamento, difusão do pensamento, eco do pensamento;
2. 2ª ordem: intuição delirante, perplexidade, humor depressivo ou
exaltado, vivência de empobrecimento afetivo.

Tais concepções descritas influenciaram as classificações e os


critérios atuais, como o DSM-5 e a CID-10.
5.2.3 Prevalência
Cerca de 1% da população é acometida pela doença, geralmente
iniciada antes dos 25 anos, sem predileção por qualquer camada
sociocultural. O diagnóstico baseia-se, exclusivamente, na história
psiquiátrica e no exame do estado mental. É extremamente raro o
aparecimento de esquizofrenia antes dos 10 ou após os 50 anos, e
parece não haver nenhuma diferença na prevalência entre homens e
mulheres.
5.2.4 Curso
A idade média de início do primeiro episódio psicótico de
esquizofrenia situa-se na segunda metade da casa dos 20 anos para
homens e no final da casa dos 20 para as mulheres. O início pode ser
abrupto ou insidioso, mas a maioria apresenta algum tipo de fase
prodrômica, manifestada pelo desenvolvimento lento e gradual de
uma variedade de sinais e sintomas (retraimento social, perda do
interesse pela escola ou pelo trabalho, deterioração da higiene e dos
cuidados pessoais, comportamento incomum e ataques de raiva). Os
membros da família podem encontrar dificuldades para interpretar
tal comportamento, presumindo que a pessoa está “passando por
uma fase”. Por fim, o aparecimento de alguns sintomas da fase ativa
marca a perturbação como esquizofrenia.
A idade de início pode ter importância tanto fisiopatológica quanto
prognóstica. Os indivíduos com início precoce são, mais
frequentemente, do sexo masculino e têm ajustamento pré-mórbido
mais fraco, aquisição educacional inferior, mais evidências de
anormalidades estruturais do cérebro, sinais e sintomas negativos
mais proeminentes, mais evidências de prejuízo cognitivo, avaliado
com testes neuropsicológicos, e pior prognóstico. Inversamente, os
indivíduos com início mais tardio são, com frequência, do sexo
feminino, têm menos evidências de anormalidades estruturais do
cérebro ou prejuízo cognitivo e apresentam melhor prognóstico.
A maioria dos estudos sobre curso e resultado da esquizofrenia
sugere que o curso seja variável. Alguns indivíduos apresentam
exacerbações e remissões, enquanto outros permanecem
cronicamente doentes. A variabilidade na definição e na
determinação impossibilita a previsão acurada do resultado da
esquizofrenia em longo prazo. A remissão completa (isto é, retorno
ao pleno funcionamento pré-mórbido), provavelmente, não é
comum. Daqueles que continuam enfermos, alguns parecem ter
curso razoavelmente estável, ao passo que outros apresentam piora
progressiva associada à incapacitação severa. Logo no início da
doença, os sintomas negativos podem ser proeminentes,
aparecendo, primariamente, como aspectos prodrômicos.
Posteriormente, surgem os sintomas positivos. Uma vez que são
particularmente suscetíveis ao tratamento, na maioria diminuem,
mas, em muitos indivíduos, os sintomas negativos persistem entre
os episódios de sintomas positivos. Estudos indicam um grupo de
fatores associados ao melhor prognóstico: bom ajustamento pré-
mórbido, início agudo, idade mais tardia de aparecimento, eventos
estressores, perturbação do humor associada, breve duração dos
sintomas da fase ativa, bom funcionamento entre os episódios,
mínimos sintomas residuais, ausência de anormalidades na
estrutura cerebral, funcionamento neurológico normal, história
familiar de transtorno do humor e ausência de história familiar de
esquizofrenia.
5.2.5 Padrão genético
O DSM-5 aponta que existe forte contribuição dos fatores genéticos
na determinação do risco para esquizofrenia, embora a maioria dos
indivíduos com diagnóstico do transtorno não tenha história
familiar de psicose. Essa tendência é atribuída a um espectro de
alelos de risco, que são associados a outros transtornos mentais,
incluindo transtorno bipolar, depressão e transtorno do espectro
autista. Os parentes biológicos em primeiro grau de indivíduos com
esquizofrenia estão em risco 10 vezes maior para a doença do que a
população geral. As taxas de concordância para esquizofrenia são
maiores em gêmeos monozigóticos do que em gêmeos dizigóticos.
Estudos de adoções têm mostrado que os parentes biológicos de
indivíduos com esquizofrenia têm risco substancialmente
aumentado para a doença, enquanto os parentes adotivos não
apresentam aumento no risco. Embora muitas evidências sugiram a
importância de fatores genéticos na etiologia da esquizofrenia, a
existência de uma taxa substancial de discordância em gêmeos
monozigóticos também indica a importância de fatores ambientais.
5.2.6 Diagnóstico
Os sintomas característicos da esquizofrenia podem ser agrupados,
genericamente, em dois tipos: positivos e negativos. Os positivos são
os mais floridos e exuberantes. Os negativos são, em maior parte, os
déficits.
1. Positivos:
a) Alucinações (mais comuns auditivas e visuais e, menos
comuns, táteis e olfativas);
b) Delírios (persecutórios, de grandeza, de ciúmes, somáticos,
místicos, fantásticos);
c) Perturbações da forma e do curso do pensamento (incoerência,
prolixidade, desagregação);
d) Comportamento desorganizado, bizarro;
e) Agitação psicomotora;
f) Negligência dos cuidados pessoais.
2. Negativos:
a) Pobreza do conteúdo do pensamento e da fala;
b) Embotamento ou rigidez afetiva;
c) Prejuízo do pragmatismo;
d) Incapacidade de sentir emoções e sentir prazer;
e) Isolamento social;
f) Diminuição de iniciativa e da vontade.

Alguns sintomas, embora não sejam específicos da esquizofrenia,


são de grande valor para o diagnóstico, como os seguintes:
1. Audição dos próprios pensamentos (sob a forma de vozes);
2. Alucinações auditivas que comentam o comportamento do paciente;
4. Alucinações somáticas;
5. Sensação de ter os próprios pensamentos controlados;
6. Irradiação desses pensamentos;
7. Sensação de ter as ações controladas e influenciadas por algo
exterior.

Os sintomas positivos da esquizofrenia são mais


facilmente revertidos com medicação,
enquanto os negativos tendem a ser mais
refratários à medicação.

Habitualmente, o surgimento da esquizofrenia é notado quando a


família e os amigos observam que a pessoa mudou de
comportamento. Ela passa a ter mau rendimento em áreas
significativas da vida cotidiana, como na escola, no trabalho ou nas
relações sociais e familiares. Comumente, há notável falta de
interesse por cuidados pessoais.
São sentimentos experimentados pelos próprios pacientes:
1. Perplexidade: no começo da doença, relatam sentimento de
estranheza sobre a experiência, alguma confusão sobre de onde vêm
os sintomas (normalmente, alucinações) e se perguntam por que sua
experiência diária tem mudado tanto.
2. Isolamento: o esquizofrênico experimenta sensação intensa de ser
diferente dos demais e de estar separado de outras pessoas. O
isolamento social e a evitação de contatos tornam-se evidentes.
3. Ansiedade e medo: na maior parte, a experiência cotidiana é
invadida por sensação geral de mal-estar e ansiedade. Evidenciam-se
os períodos de terror intenso, causados por um mundo dentro do qual
tudo parece perigoso e incontrolável, normalmente atribuído às origens
externas e mágicas.

5.2.7 Critérios diagnósticos – DSM-5


5.2.7.1 Sintomas característicos

1. Dois (ou mais) dos seguintes, cada qual presente por uma porção
significativa de tempo durante o período de 1 mês (ou menos, se
tratados com sucesso):
a) Delírios;
b) Alucinações;
c) Discurso desorganizado (frequente descarrilamento ou
incoerência);
d) Comportamento amplamente desorganizado ou catatônico;
e) Sintomas negativos, isto é, embotamento afetivo, alogia ou
avolição.

Apenas um dos sintomas descritos é necessário para o diagnóstico de


esquizofrenia, caso os delírios sejam bizarros ou as alucinações
consistam em vozes que comentam o comportamento ou os
pensamentos da pessoa, ou duas ou mais vozes conversando entre
elas.
5.2.7.2 Disfunção social/ocupacional

Por uma porção significativa do tempo, desde o início da


perturbação, uma ou mais áreas importantes do funcionamento,
como trabalho, relações interpessoais ou cuidados pessoais, estão
acentuadamente abaixo do nível alcançado antes do início (ou,
quando o início se dá na infância ou na adolescência, fracasso em
atingir o nível esperado de aquisição interpessoal, acadêmica ou
ocupacional).
5.2.7.3 Duração

Sinais contínuos da perturbação persistem por, pelo menos, 6


meses, período que deve incluir, no mínimo, 1 mês de sintomas (ou
menos, se tratados com sucesso) que satisfazem aqueles descritos
no item 5.2.7.1 (isto é, sintomas da fase ativa) e pode incluir períodos
de sintomas prodrômicos ou residuais. Durante esses períodos, os
sinais da perturbação podem ser manifestados apenas por sintomas
negativos ou por dois ou mais sintomas relacionados no item 5.2.7.1,
presentes de forma atenuada (crenças estranhas, experiências
perceptuais incomuns).
5.2.7.4 Exclusão de transtorno esquizoafetivo e transtorno do humor

O transtorno esquizoafetivo e o transtorno do humor, com aspectos


psicóticos, foram descartados porque nenhum episódio depressivo
maior, maníaco ou misto ocorreu concomitantemente aos sintomas
da fase ativa, ou se os episódios de humor ocorreram durante os
sintomas da fase ativa, sua duração total foi breve em relação à dos
períodos ativo e residual.
5.2.7.5 Exclusão de substância/condição médica geral

A perturbação não se deve aos efeitos fisiológicos diretos de uma


substância (droga de abuso, medicamento) ou à condição médica
geral.
5.2.7.6 Relação com transtorno invasivo do desenvolvimento

Se há história de transtorno autista ou outro transtorno invasivo do


desenvolvimento, o diagnóstico adicional de esquizofrenia é feito
apenas se delírios ou alucinações proeminentes também estão
presentes por, pelo menos, 1 mês (ou menos, se tratados com
sucesso).
5.2.8 Achados laboratoriais
Não foram identificados achados laboratoriais diagnósticos de
esquizofrenia. Entretanto, uma variedade de achados laboratoriais
anormais foi encontrada em grupos de indivíduos com
esquizofrenia, em comparação com os controles.
Anormalidades estruturais do cérebro mais comuns incluem
aumento do sistema ventricular e sulcos proeminentes no córtex.
Diversas outras anormalidades também foram notadas com o uso de
técnicas de imagens mais apuradas (tamanhos temporal e
hipocampal diminuídos, aumento no tamanho dos gânglios basais,
diminuição do tamanho do cérebro). Técnicas de imagens funcionais
indicam que alguns indivíduos podem ter fluxo sanguíneo cerebral
ou utilização de glicose anormais em regiões cerebrais específicas
(córtex pré-frontal).
Avaliações neuropsicológicas podem mostrar ampla faixa de
disfunções (dificuldade para mudar o conjunto de respostas,
focalizar a atenção, formular conceitos abstratos). Achados
neurofisiológicos incluem lentidão nos tempos de reação,
anormalidades no acompanhamento visual ou prejuízos nas
comportas sensoriais.
Achados laboratoriais anormais podem, também, ser notados como
complicação da esquizofrenia ou do seu tratamento. Alguns
indivíduos bebem quantidades excessivas de líquidos (“intoxicação
hídrica”) e desenvolvem anormalidades na densidade específica da
urina ou desequilíbrios eletrolíticos. Elevação da
creatinofosfoquinase pode resultar da síndrome neuroléptica
maligna.
5.2.9 Subtipos (CID-10)
5.2.9.1 Esquizofrenia paranoide
A esquizofrenia paranoide caracteriza-se, sobretudo, por ideias
delirantes relativamente estáveis, com frequência, de perseguição,
na maioria das vezes acompanhadas de alucinações, em especial,
auditivas, e de perturbações das percepções. As perturbações do
afeto, da vontade e da linguagem e os sintomas catatônicos estão
ausentes, ou são um pouco discretos.
5.2.9.2 Esquizofrenia hebefrênica

A esquizofrenia hebefrênica caracteriza-se pela perturbação dos


afetos. As ideias delirantes e as alucinações são fugazes e
fragmentárias, o comportamento é irresponsável e imprevisível; e
há, com frequência, maneirismos. O afeto é superficial e
inapropriado, o pensamento é desorganizado, o discurso,
incoerente, e há tendência ao isolamento social. Em geral, o
prognóstico é desfavorável, devido ao rápido desenvolvimento de
sintomas negativos, em particular, embotamento do afeto e perda da
volição. A hebefrenia deveria, normalmente, ser só diagnosticada em
adolescentes e adultos jovens.
5.2.9.3 Esquizofrenia catatônica

A esquizofrenia catatônica é dominada por distúrbios psicomotores


proeminentes que podem alternar entre extremos, como
hipercinesia e estupor, ou entre a obediência automática e o
negativismo. Atitudes e posturas que os pacientes foram compelidos
a tomar podem ser mantidas por longos períodos. Um padrão
marcante da afecção pode ser constituído por episódios de excitação
violenta. O fenômeno catatônico pode estar combinado com estado
oniroide, com alucinações cênicas vívidas.
5.2.9.4 Esquizofrenia indiferenciada

Afecções psicóticas que preenchem os critérios diagnósticos gerais


para a esquizofrenia, mas que não correspondem a nenhum dos
subtipos incluídos em outros diagnósticos, ou que exibem padrões
de mais de um deles; sem clara predominância de um conjunto
particular de características diagnósticas. É chamada, também,
esquizofrenia atípica.
5.2.9.5 Esquizofrenia residual

Estádio crônico da evolução de doença esquizofrênica, com


progressão nítida de um estádio precoce para um tardio, o qual se
caracteriza por sintomas negativos persistentes, embora não
forçosamente irreversíveis, como lentidão psicomotora,
hipoatividade, embotamento afetivo, passividade e falta de
iniciativa, pobreza da quantidade e do conteúdo do discurso, pouca
comunicação não verbal (expressão facial, contato ocular,
modulação da voz e gestos), falta de cuidados pessoais e
desempenho social medíocre.
São subtipos da esquizofrenia: paranoide
(perseguição), hebefrênica (afeto), catatônica
(psicomotor), indiferenciada, residual (sintomas
negativos) e simples.

5.3 TRANSTORNO DELIRANTE


A característica essencial do transtorno delirante é a presença de um
ou mais delírios não bizarros que persistem por, pelo menos, 1 mês.
Exceto pelo impacto direto dos delírios, o funcionamento
psicossocial não está acentuadamente prejudicado, e o
comportamento não é de modo evidente estranho ou bizarro. Se
episódios de humor ocorrem concomitantemente com os delírios,
sua duração total é breve, comparada com a duração total dos
períodos delirantes. Os delírios não se devem aos efeitos fisiológicos
diretos de uma substância (cocaína) ou condição médica geral
(doença de Alzheimer, lúpus eritematoso sistêmico).
Embora seja importante determinar se os delírios são bizarros para a
distinção entre transtorno delirante e esquizofrenia, esse caráter
pode ser difícil de ser julgado, especialmente entre diferentes
culturas. Os delírios são considerados bizarros quando claramente
implausíveis, incompreensíveis e não extraídos de experiências
comuns da vida (a crença de um indivíduo de que um estranho
retirou seus órgãos internos e os substituiu pelos de outra pessoa
sem deixar quaisquer cicatrizes ou ferimentos). Em comparação, os
delírios não bizarros envolvem situações que poderiam
concebivelmente ocorrer (ser seguido, envenenado, infectado, traído
pelo cônjuge).
O funcionamento psicossocial é variável. Alguns indivíduos podem
parecer relativamente reservados em seus papéis interpessoais e
ocupacionais. Em outros, o prejuízo pode ser substancial e incluir
baixo ou nenhum funcionamento ocupacional e isolamento social.
Quando presente no transtorno delirante, um fraco funcionamento
psicossocial decorre diretamente das próprias crenças delirantes.
Por exemplo, um indivíduo convencido de que será assassinado por
criminosos pode abandonar seu emprego e recusar-se a sair de casa.
Esse comportamento é uma tentativa compreensível de evitar ser
identificado e morto por seus supostos assassinos. Em comparação,
o fraco funcionamento na esquizofrenia pode ser atribuído aos
sintomas tanto positivos quanto negativos (particularmente,
avolição). De modo similar, uma característica comum a indivíduos
com transtorno delirante é a aparente normalidade de seu
comportamento e aparência quando suas ideias delirantes não estão
sendo questionadas ou postas em prática. Em geral, os
funcionamentos social e conjugal estão mais propensos a sofrer
prejuízos do que os funcionamentos intelectual e ocupacional.
5.3.1 Critérios diagnósticos – DSM-5
1. Delírios não bizarros (isto é, envolvendo situações que ocorrem na
realidade, como ser seguido, envenenado, infectado, amado a
distância, traído por cônjuge ou parceiro romântico ou ter uma
doença), com duração mínima de 1 mês;
2. Os critérios para esquizofrenia jamais foram satisfeitos;
3. Exceto pelo impacto do(s) delírio(s) ou de suas ramificações, o
funcionamento não está bastante prejudicado, e o comportamento não
é visivelmente esquisito ou bizarro;
4. Se episódios de humor aconteceram durante os delírios, sua
duração total foi breve com relação à dos períodos delirantes;
5. A perturbação não se deve aos efeitos fisiológicos diretos de uma
substância (droga de abuso, medicamento) ou de condição médica
geral.

Alucinações táteis e olfativas podem estar


presentes no transtorno delirante, se
relacionadas ao tema dos delírios.

5.3.2 Tipos
Os tipos seguintes são atribuídos com base no tema predominante
do(s) delírio(s):
1. Erotomaníaco: delírios de que outra pessoa, geralmente de
situação mais elevada, está apaixonada pelo indivíduo;
2. Grandioso: delírios de grande valor, poder, conhecimento,
identidade ou de relação especial com uma divindade ou pessoa
famosa;
3. Ciumento: delírios de que o parceiro sexual é infiel;
4. Persecutório: delírios de que o indivíduo (ou alguém próximo a ele)
está sendo, de algum modo, maldosamente tratado;
5. Somático: delírios de que tem algum defeito físico ou condição
médica geral;
6. Misto: delírios característicos de mais de um dos tipos anteriores,
sem predomínio de nenhum deles;
7. Não especificado.

5.4 TRANSTORNO PSICÓTICO BREVE


A característica essencial do transtorno psicótico breve é uma
perturbação que envolve o início súbito de, pelo menos, um dos
seguintes sintomas psicóticos positivos:
1. Delírios;
2. Alucinações;
3. Discurso desorganizado (descarrilamento ou incoerência
frequentes);
4. Comportamento amplamente desorganizado ou catatônico.

Um episódio de perturbação dura, no mínimo, 1 dia e, no máximo, 1


mês, e o doente tem pleno retorno ao nível pré-mórbido de
funcionamento.
A perturbação não é mais bem explicada pela definição de transtorno
do humor com aspectos psicóticos ou transtorno esquizoafetivo ou
esquizofrenia, nem é atribuída aos efeitos fisiológicos diretos de
uma substância (alucinógeno) ou condição médica geral (hematoma
subdural).
Classificação quanto ao desencadeante do transtorno psicótico leve:
1. Pós-evento: estressor se os sintomas ocorrem logo após e
aparentemente em resposta a eventos que, em particular ou em
conjunto, seriam estressantes demais para qualquer pessoa em
circunstâncias similares em seu contexto cultural;
2. Pós-ausência: evento estressor se os sintomas psicóticos não
ocorrem logo após ou aparentemente não consistem em respostas a
eventos que, em particular ou em conjunto, seriam estressantes
demais para qualquer pessoa em circunstâncias similares;
3. Pós-parto: se o início ocorre em 4 semanas após o parto.

5.4.1 Critérios diagnósticos – DSM-5


Presença de um ou mais dos seguintes sintomas:
1. Delírios;
2. Alucinações;
3. Discurso desorganizado (descarrilamento ou incoerência
frequentes);
4. Comportamento amplamente desorganizado ou catatônico.
Não incluir sintoma que seja padrão de resposta
culturalmente sancionado no diagnóstico de
transtorno psicótico breve.

5.4.2 Especificação
1. Com estressor(es) acentuado(s) – psicose reativa breve: se os
sintomas ocorrem logo após e aparentemente em resposta a eventos
que, em particular ou em conjunto, seriam estressantes demais para
qualquer pessoa em circunstâncias similares na cultura do indivíduo;
2. Sem estressor(es) acentuado(s): se os sintomas psicóticos não
ocorrem logo após ou aparentemente não consistem em respostas a
eventos que, em particular ou em conjunto, seriam estressantes
demais para qualquer pessoa em circunstâncias similares na cultura
do indivíduo;
3. Com início no pós-parto: se o início ocorre em 4 semanas pós-
parto.

5.5 TRATAMENTO DOS TRANSTORNOS


PSICÓTICOS
O tratamento consiste no uso de antipsicóticos em monoterapia ou
associação, psicoterapia e internação, se necessário.
O que é psicose e quais as
principais características da
esquizofrenia?
Psicose é a quebra de contato com a realidade,
apresentando sintomas como delírios (alteração do
pensamento), alucinações (alteração de um dos cinco
sentidos) e comportamento desorganizado. A psicose pode
estar presente em várias condições ou patologias:
esquizofrenia, transtornos de humor (mania ou
depressão), intoxicação e abstinência de substâncias
químicas, uso de medicamentos e delirium. Esquizofrenia é
uma patologia diagnosticada quando dois ou mais dos
seguintes sintomas ocorrem durante o período de 1 mês:
delírios, alucinações, desorganização do discurso,
comportamento desorganizado ou catatônico e sintomas
negativos (embotamento afetivo, alogia, avolição).
Você sabe como
diagnosticar um transtorno
de humor?

6.1 TRANSTORNO DEPRESSIVO


A depressão é uma doença “do organismo inteiro”, que compromete
o físico, o humor e, em consequência, o pensamento. Ela altera a
maneira como o indivíduo vê o mundo e sente a realidade, entende
as coisas, manifesta emoções, sente a disposição e o prazer com a
vida, além de afetar a forma como se alimenta e dorme, como se
sente em relação a si mesmo e como pensa sobre as coisas.
A depressão, de modo geral, resulta em uma inibição global da
pessoa, afeta a parte psíquica e as funções mais nobres da mente
humana, como a memória, o raciocínio, a criatividade, a vontade, o
amor, o sexo e a parte física. Tudo parece difícil, problemático e
cansativo para o deprimido.
A pessoa deprimida não tem ânimo para os prazeres nem para quase
nada na vida; pouco adiantam os conselhos para que passeie,
encontre pessoas diferentes, frequente grupos religiosos ou pratique
atividades. Ela sabe e tem consciência das coisas boas da vida, sabe
que tudo poderia ser bem pior, pode até saber que os motivos do seu
estado sentimental não são tão importantes; entretanto, apesar de
não desejar estar muito deprimida, continua dessa forma.
Segundo relatório da OMS (Organização Mundial da Saúde) de 2017,
a prevalência da depressão no Brasil já é a segunda maior carga de
incapacidade, sendo o maior índice na América Latina. São mais de 11
milhões de brasileiros diagnosticados com a doença, de acordo com
dados da Pesquisa Nacional de Saúde (PNS). A prevalência registrada
é maior entre as mulheres (10,9%) do que nos homens (3,9%).
A doença é, essencialmente, um transtorno episódico e recorrente.
Cada episódio depressivo dura, em geral, alguns meses, seguido de
um período normal. Em cerca de 20% dos casos, porém, a depressão
segue um curso crônico e sem remissão, ou seja, é contínua,
especialmente quando não há tratamento adequado disponível.
A taxa de recorrência para aqueles que se recuperam do primeiro
episódio fica em torno de 35% dentro de 2 anos, e cerca de 60%
dentro de 12 anos. A taxa de recaídas é mais alta nas pessoas com
mais de 45 anos.
Um dos resultados particularmente trágicos desse distúrbio é o
suicídio, que continua a ser um dos resultados frequentes (cerca de
15 a 20% dos pacientes depressivos o cometem) e evitáveis da
depressão.
Os sintomas da depressão são muito variados, desde as sensações de
tristeza, passando pelos pensamentos negativos, até as alterações da
sensação corpórea, como dores e enjoos.
6.2 CRITÉRIOS DIAGNÓSTICOS
6.2.1 Depressão maior
Segundo o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais
(DSM-5), é um quadro de sintomas intensos, em que,
necessariamente, devem estar presentes anedonia e/ou humor
polarizado para depressão e cinco ou mais dos seguintes critérios,
por, no mínimo, 2 semanas:
1. Hiperfagia ou perda de apetite;
2. Insônia ou hipersônia;
3. Agitação ou lentificação psicomotora;
4. Fadiga ou perda de energia;
5. Sentimento de inutilidade ou culpa excessiva ou inadequada;
6. Capacidade diminuída de pensar ou concentrar-se;
7. Pensamentos de morte recorrentes/ideação suicida/tentativa de
suicídio.

O número e a gravidade dos sintomas permitem determinar três


graus de um episódio depressivo, segundo a Classificação
Internacional de Doenças (CID-10): leve, moderado e grave, como
descrito a seguir:
1. Leve: em geral, estão presentes ao menos dois ou três dos
sintomas citados. O paciente sofre com a presença deles, mas,
provavelmente, será capaz de desempenhar a maior parte das suas
atividades sociais e ocupacionais;
2. Moderado: em geral, estão presentes quatro ou mais dos sintomas
citados, e o paciente, aparentemente, tem muita dificuldade para
continuar a desempenhar as atividades de rotina;
3. Grave sem sintomas psicóticos: vários dos sintomas estão
presentes, tipicamente a perda da autoestima e ideias de desvalia ou
culpa. As ideias e os atos suicidas são comuns, e observa-se, de modo
habitual, uma série de sintomas físicos;
4. Grave com sintomas psicóticos: acompanhada de alucinações,
ideias delirantes, lentidão psicomotora ou estupor de gravidade, tal que
todas as atividades sociais e ocupacionais se tornam impossíveis de
serem realizadas. Pode existir o risco de morrer por suicídio,
desidratação ou desnutrição.

6.2.2 Depressão atípica


Ocorrem sintomas menos comuns, como ansiedade, hiperfagia,
hipersônia e irritabilidade.
Figura 6.1 - Grupos da depressão atípica
Fonte: elaborado pelo autor.

Quando os sintomas são de natureza física, aparecem em qualquer


órgão ou sistema. Quando psíquicos, manifestam-se por meio de
determinadas emoções que equivalem aos sentimentos depressivos,
embora tenham outro aspecto.
Diz-se “predominantemente” porque haverá predomínio de
sintomas físicos ou psíquicos em cada caso, mas a mesma pessoa
pode apresentar tanto sintomas físicos como psíquicos ao mesmo
tempo. É o que acontece com mais frequência, ou seja, a pessoa,
além da ansiedade, da fobia ou do pânico (sintomas psíquicos),
apresenta, ainda, palpitação, sudorese, formigamentos, tontura,
hipertensão e taquicardia (sintomas físicos) etc.
Há também a depressão reativa a alguma situação vivencial
traumática e a depressão secundária a uma condição orgânica
(tumores, hipotireoidismo).
6.2.3 Distimia
O traço essencial da distimia é o estado depressivo leve e prolongado.
Pelos critérios diagnósticos do DSM-5, são necessários 2 anos de
período contínuo predominantemente depressivo para os adultos e 1
ano para as crianças; para elas, o humor pode ser irritável em vez de
depressivo. Outros sintomas que acompanham são:
1. Insônia ou hipersônia;
2. Alta de energia ou fadiga;
3. Baixa da autoestima;
4. Dificuldade de concentrar-se ou tomar decisões;
5. Sentimento de falta de esperança;
6. Descontrole do apetite.

Na presença de quadros depressivos


prolongados (> 2 anos), sem comprometimento
no trabalho e na vida social, deve-se suspeitar
de distimia.

6.2.4 Depressão pós-parto


Há três formas de depressão no pós-parto, uma mais leve e mais
comum, chamada pelos americanos de “blues post partum”
(disforia), outra chamada depressão pós-parto, e a psicose
puerperal.
O blues é uma condição benigna que se inicia nos primeiros dias após
o parto (2 a 5 dias), dura de alguns dias a poucas semanas, é de
intensidade leve, autolimitada e cede espontaneamente.
Caracteriza-se, basicamente, pelo sentimento de tristeza e o choro
fácil, que não impedem a realização das tarefas de mãe.
Aproximadamente metade das mulheres é acometida pelo blues no
pós-parto.
Os sintomas dessa síndrome iniciam-se logo nos primeiros dias do
pós-parto, diminuindo por volta do 15º dia, e se resolvem pouco
depois. Uma das características do diagnóstico é que seus sintomas
característicos não são considerados suficientes para causar sérios
danos ao desempenho da mulher, o que é diferente da depressão
pós-parto.
Em algumas mulheres, no entanto, o transtorno inicialmente tido
como blues persiste, e evolui para um quadro mais grave de
depressão pós-parto.
A depressão pós-parto é uma depressão propriamente dita, que
recebe tal classificação sempre que iniciada nas 6 primeiras semanas
após o parto, segundo a CID-10. Sua manifestação clínica é igual à
das depressões, ou seja, é prolongada e incapacitante, e requer o uso
de antidepressivos. Seu principal problema reside no uso das
medicações. Recomenda-se o uso de fluoxetina ou citalopram, que
não prejudicam a criança na amamentação.
A psicose puerperal acomete menos de 1% dos casos, com início de
até 2 a 3 semanas após o parto. Inicia-se com sintomas depressivos,
que rapidamente progridem para delírios, alucinações e agitação
psicomotora.
O quadro dura de 6 a 12 semanas, e o tratamento consiste em separar
a mãe da criança, e em usar neurolépticos. Ocorrem infanticídios em
2% dos casos e suicídio em 1%.
6.2.5 Disforia
A disforia caracteriza-se pela mudança repentina e transitória do
estado de ânimo, com sentimentos de tristeza, pena e angústia. É um
mal-estar psíquico, acompanhado por sentimentos depressivos,
tristeza, melancolia e pessimismo.
6.2.6 Depressão secundária a patologias clínicas
ou medicamentos
Um quadro depressivo pode ser secundário a uma patologia
orgânica, que pode ser sistêmica ou, principalmente, cerebral.
Hipotireoidismo, lúpus eritematoso sistêmico, doença de Parkinson,
acidentes vasculares cerebrais próximos ao lobo frontal e
dependência de álcool são exemplos de patologias que cursam com
frequência com quadro depressivo.
Algumas medicações também podem causar sintomas depressivos,
as mais comuns estão no Quadro 6.1.
Quadro 6.1 - Medicações que podem causar depressão

O tratamento da depressão secundária a patologia clínica e ao uso de


medicamentos é semelhante ao tratamento da depressão comum,
somando-se ao antidepressivo o tratamento da doença clínica ou a
substituição da medicação que causa os sintomas (quando possível).
6.2.7 Tratamento dos estados depressivos
O tratamento é realizado com antidepressivos e psicoterapia. Deve-
se avaliar a necessidade de internação, caso seja identificado o risco
de suicídio.
6.3 TRANSTORNO AFETIVO BIPOLAR
A alternância de estados depressivos com maníacos caracteriza tal
distúrbio. Muitas vezes, o diagnóstico correto só é feito depois de
muitos anos. Uma pessoa com depressão e que, 10 anos depois, tenha
um episódio maníaco, apresenta, na verdade, o transtorno bipolar;
no entanto, seu diagnóstico só poderia ser possível com o
surgimento da fase maníaca.
A depressão do transtorno bipolar é igual à depressão comum, mas
uma pessoa deprimida do transtorno bipolar não recebe o mesmo
tratamento do paciente unipolar.
Tal transtorno geralmente se inicia em torno dos 20 a 30 anos, mas
pode começar mesmo após os 70 anos. O início pode ser tanto pela
fase depressiva como pela fase maníaca, gradualmente ao longo de
semanas, meses ou abruptamente em poucos dias, já com sintomas
psicóticos, o que, muitas vezes, faz confundir com síndromes
psicóticas puras. Além dos quadros depressivos e maníacos, há
também os quadros mistos (sintomas depressivos simultâneos aos
maníacos), muitas vezes confundindo os médicos e retardando o
diagnóstico da fase em atividade.
Figura 6.2 - Tipos de transtorno afetivo bipolar
Fonte: elaborado pelo autor.

6.3.1 Fase maníaca


O estado de humor está elevado, há alegria contagiante ou irritação
agressiva. É acompanhada de elevação da autoestima e de
sentimentos de grandiosidade, podendo chegar à manifestação
delirante de grandeza, considerando-se uma pessoa dotada de
poderes especiais. Há aumento da atividade motora com grande
vigor físico e, apesar disso, com diminuição da necessidade de sono e
dificuldade de ficar parado e de concentrar-se nas tarefas. Nessa
fase, o paciente literalmente “ri da própria desgraça”.
Inicialmente, quando os sintomas ainda não se aprofundaram, o
paciente sente-se como se fosse ou pudesse ser uma grande
personalidade; com o aprofundamento do quadro, tal ideia torna-se
uma convicção delirante.
O senso de perigo fica comprometido, e o indivíduo envolve-se em
atividades que apresentam risco tanto para integridade física como
patrimonial. O comportamento sexual torna-se excessivamente
desinibido, mesmo promíscuo, com numerosos parceiros em um
curto espaço de tempo.
Os pensamentos são incontroláveis para o próprio paciente; para as
outras pessoas, a grande confusão de ideias, na verdade, diz respeito
à interrupção de temas para que se iniciem outros, os quais, por sua
vez, também não são concluídos, e assim por diante. Essa aceleração
do pensamento, com consequente perda da lógica, denomina-se
fuga de ideias.
Pelo DSM-5, um episódio de mania é caracterizado por período
distinto de humor anormal e persistentemente elevado, expansivo
ou irritável e aumento anormal e persistente da atividade dirigida a
objetivos ou da energia, com duração mínima de 1 semana e presente
na maior parte do dia, quase todos os dias (ou qualquer duração, se a
hospitalização se fizer necessária). Durante o período de perturbação
do humor e aumento da energia ou atividade, três (ou mais) dos
sintomas que serão descritos a seguir (quatro se o humor é apenas
irritável) estão presentes em grau significativo e representam
mudança notável do comportamento habitual.
Principais características da fase maníaca e hipomaníaca (DSM-5):
1. Diminuição do sono;
2. Hiperatividade;
3. Aceleração do pensamento;
4. Ideias de grandiosidade;
5. Sintomas psicóticos;
6. Pressão de discurso;
7. Aumento da autoestima.

6.3.2 Fase hipomaníaca


Pelo DSM-5, é caracterizada por um período distinto de humor
anormal e persistentemente elevado, expansivo ou irritável e
aumento anormal e persistente da atividade ou energia, com duração
mínima de 4 dias consecutivos e presente na maior parte do dia,
quase todos os dias. Também são necessários três ou mais dos
sintomas listados na fase maníaca, porém o episódio não é
suficientemente grave a ponto de causar prejuízo acentuado no
funcionamento social ou profissional ou para necessitar de
hospitalização.
Existindo características psicóticas, por definição, o episódio é
maníaco.
6.3.3 Ciclotimia
Flutuação crônica (2 ou mais anos) do humor, com vários períodos
com sintomas hipomaníacos que não satisfazem os critérios para
episódio hipomaníaco e diversos outros períodos com sintomas
depressivos que não satisfazem os critérios para episódio depressivo
maior. Os sintomas não são suficientes e duradouros para que se
considere transtorno afetivo bipolar, e a pessoa permanece dessa
maneira a maior parte do tempo.
6.3.4 Tratamento
O tratamento é realizado com estabilizadores de humor. Na presença
de agitação e psicose, deve-se associar um antipsicótico. Podem ser
necessárias internação e contenção física para preservar o paciente.
Você sabe como
diagnosticar um transtorno
de humor?
O diagnóstico de um transtorno de humor é clínico,
baseado na psicopatologia observada no exame psíquico e
no histórico da patologia do paciente. Não esquecer que
alterações de humor podem ser secundárias a patologias
clínicas ou uso de medicamentos ou substâncias
psicoativas.
Você sabe diagnosticar e
diferenciar os transtornos
de ansiedade?

7.1 INTRODUÇÃO
A ansiedade é o grande sintoma de características psicológicas que
mostra a intersecção entre o físico e o psíquico, uma vez que tem
claros sintomas físicos, como taquicardia, sudorese, tremores,
tensão muscular, aumento das secreções, aumento da motilidade
intestinal e cefaleia. Trata-se de um sinal de alerta, que adverte
sobre perigos iminentes e capacita o indivíduo a tomar medidas para
enfrentar ameaças. O medo é a resposta a uma ameaça conhecida,
definida; a ansiedade é uma resposta a uma ameaça desconhecida,
vaga.
A ansiedade prepara o indivíduo para lidar com situações
potencialmente danosas ou qualquer ameaça à unidade ou
integridade pessoal, tanto física como moral. Dessa forma, ela
prepara o organismo para tomar as medidas necessárias para
impedir a concretização desses possíveis prejuízos. Portanto, é uma
reação natural e necessária para a autopreservação. Não se trata de
um estado normal, mas de uma reação. As reações de ansiedade
normais não precisam ser tratadas porque são naturais e
autolimitadas. Os estados de ansiedade anormais, que constituem
síndromes de ansiedade, são patológicos e requerem tratamento
específico.
Figura 7.1 - Níveis de ansiedade

Fonte: elaborado pelo autor.

7.2 TRANSTORNO DE PÂNICO


O transtorno de pânico caracteriza-se por crises súbitas e
imprevisíveis de elevada ansiedade e medo, com taquicardia,
sudorese, tontura, dor no peito, falta de ar e sensação de morte ou de
perda de controle (ataques de pânico). Para definir o transtorno,
devem ocorrer vários ataques de pânico em um período de, pelo
menos, 1 mês, sem que haja circunstâncias com perigo objetivo.
As crises de ansiedade no pânico duram aproximadamente 10
minutos e costumam ser inesperadas, ou seja, não seguem situações
especiais (como na fobia simples ou na fobia social), podendo
surpreender o paciente em ocasiões variadas. Todavia, alguns
desenvolvem o episódio de pânico diante de determinadas situações
pré-conhecidas, como ao dirigir automóveis, diante de grande
multidão ou dentro de transportes públicos. Nesse caso, dizemos que
o transtorno de pânico é acompanhado de agorafobia. Na presença
desta, o transtorno é duas vezes mais prevalente entre mulheres.
São sintomas mais frequentes do transtorno de pânico, segundo o
Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-5):
1. Palpitações ou ritmo cardíaco acelerado;
2. Sudorese;
3. Tremores;
4. Sensações de falta de ar ou sufocamento;
5. Dor ou desconforto no peito;
6. Náusea ou desconforto abdominal;
7. Sensação de tontura, instabilidade ou desmaio;
8. Desrealização (sensações de irrealidade) ou despersonalização
(estar distanciado de si mesmo);
9. Medo de perder o controle ou enlouquecer;
10. Medo de morrer;
11. Parestesias (anestesia ou sensações de formigamento,
especialmente nos membros inferiores ou nos superiores);
12. Calafrios ou ondas de calor.

Segundo o DSM-5, a estimativa de prevalência de 12 meses para o


transtorno de pânico nos Estados Unidos e em vários países
europeus é de 2 a 3% em adultos e adolescentes, o que significa uma
prevalência alta, sendo ainda mais alta quando os critérios para
diagnóstico não são inteiramente preenchidos, ou melhor, se forem
consideradas as crises parciais e os quadros de ataques de ansiedade
atípicos.
O transtorno de pânico, em geral, inicia-se depois dos 20 anos,
sendo igualmente prevalente entre homens e mulheres. Portanto,
em sua maioria, as pessoas acometidas de pânico são jovens ou
adultos jovens e estão na plenitude da vida profissional.
O tratamento deve ser realizado com antidepressivos,
preferencialmente inibidores seletivos da recaptação da serotonina,
em dose mais baixa do que a utilizada em casos de depressão. No
início do tratamento, pode ser associado um benzodiazepínico de
ação rápida ou intermediária, como lorazepam ou alprazolam, para
melhora mais rápida das crises. Paralelamente à medicação, deve-se
indicar psicoterapia, em especial da linha cognitivo-
comportamental, que focaliza a redução dos sintomas e a parada das
crises.
7.3 TRANSTORNO DE ANSIEDADE
GENERALIZADA
Segundo critérios do DSM-5, o transtorno de ansiedade generalizada
é caracterizado por preocupação ou ansiedade excessivas, com
motivos injustificáveis ou desproporcionais ao nível de ansiedade
observado. Para o seu diagnóstico, é preciso que outros transtornos
de ansiedade, como pânico e fobia social, tenham sido descartados. É
necessário também que essa ansiedade excessiva dure mais de 6
meses continuamente e que seja diferenciada da ansiedade normal
ou da causada por alguma doença física ou substância.
São sintomas presentes no transtorno de ansiedade generalizada,
segundo o DSM-5:
1. Dificuldade para relaxar ou sensação de que está a ponto de
“estourar”, no limite do nervosismo;
2. Cansaço com facilidade;
3. Dificuldade de concentração e frequentes esquecimentos;
4. Irritabilidade;
5. Tensão muscular;
6. Dificuldade para dormir ou sono insatisfatório.

Por fim, um critério presente em todos os transtornos mentais é o


prejuízo no funcionamento pessoal ou marcante sofrimento.
Ainda segundo o DSM-5, as mulheres são duas vezes mais
acometidas pela ansiedade generalizada do que os homens. A
prevalência desse transtorno na população é relativamente alta, em
torno de 3% da população geral, sendo também o tipo mais
frequente do grupo dos transtornos de ansiedade. Nos períodos
naturais de estresse, os sintomas tendem a piorar. As mulheres
abaixo de 20 anos são as mais acometidas, podendo, contudo, ter
início na infância ou em idades mais avançadas (apesar de a idade
avançada diminuir as chances do surgimento de transtornos de
ansiedade).
O tratamento é realizado com antidepressivos e/ou
benzodiazepínicos de ação prolongada (diazepam), acompanhado de
psicoterapia.
7.4 TRANSTORNO OBSESSIVO-
COMPULSIVO
O transtorno obsessivo-compulsivo consiste na combinação de
obsessões e compulsões. Segundo o DSM-5, obsessões são
pensamentos recorrentes insistentes caracterizados por serem
desagradáveis, repulsivos, contrários à índole do paciente e
incontroláveis. Como este perde o controle sobre os pensamentos,
muitas vezes passa a praticar atos que, por serem repetitivos,
tornam-se rituais. Esses atos objetivam prevenir ou aliviar a tensão
causada pelos pensamentos. Assim, as compulsões podem ser
secundárias às obsessões. As compulsões são gestos, rituais ou ações
sempre repetitivas e incontroláveis. Um paciente que tenta evitá-las
acaba submetido a uma tensão muito grande, por isso sempre cede.
Não ocorre perda do juízo, e o indivíduo sempre percebe o absurdo
ou o exagero do que se está passando; no entanto, como não sabe o
que acontece, teme estar enlouquecendo e, pelo menos no começo,
tenta esconder seus pensamentos e rituais. No transtorno
obsessivo-compulsivo, os dois tipos de sintomas quase sempre estão
juntos, mas pode haver a predominância de um em relação ao outro.
Tal transtorno apresenta dois picos de incidência. O primeiro, na
infância, e o segundo, em torno dos 30 anos. A incidência é
aproximadamente a mesma entre homens e mulheres, com
pequenas diferenças de um estudo para outro. Entre as crianças,
observa-se o aparecimento um pouco mais comum nos meninos.
O tratamento é realizado com antidepressivos. No início, podem-se
utilizar benzodiazepínicos para o alívio rápido dos sintomas.
Destaca-se a importância da psicoterapia, em especial da linha
cognitivo-comportamental.
7.4.1 Sintomas obsessivos mais comuns
1. Sentir medo de contaminar-se por germes;
2. Imaginar que tenha ferido ou ofendido outras pessoas;
3. Imaginar-se perdendo o controle, realizando violentas agressões;
4. Ter pensamentos sexuais urgentes e intrusivos;
5. Ter dúvidas morais e religiosas;
6. Ter pensamentos proibidos.

7.4.2 Sintomas compulsivos mais comuns


1. Lavar-se para descontaminar-se;
2. Repetir determinados gestos;
3. Verificar se as coisas estão como deveriam: porta trancada, gás
desligado;
4. Conferir objetos;
5. Contar objetos;
6. Ordenar ou arrumar objetos;
7. Rezar.

7.5 FOBIA SOCIAL


Segundo critérios do DSM-5, a fobia social é a intensa ansiedade
gerada quando o desempenho do paciente é submetido à avaliação de
outras pessoas. Tal ansiedade, ainda que generalizada, concentra-se
sobre tarefas ou circunstâncias bem definidas. É comum sentir-se
acanhado quando se é observado, o que é, até certo ponto, normal e
aceitável. Passa-se a considerar tal vergonha ou timidez como
patológicas quando a pessoa começa a sofrer algum prejuízo pessoal
por causa dela, como deixar de concluir um curso ou uma faculdade
devido a uma apresentação pública ou por não conseguir se
expressar diante de um avaliador.
Observam-se, dentre os fóbicos, tremores, sudorese, sensação de
“bolo na garganta”, dificuldade para falar, mal-estar abdominal,
diarreia, tonturas, falta de ar e vontade de sair o quanto antes do
local onde está. A preocupação por antecipação desperta a ansiedade
antecipatória, fazendo que o paciente, vários dias antes de uma
apresentação, sofra ao imaginar-se na situação.
As situações que geram maior desconforto aos pacientes,
geralmente, são:
1. Escrever ou assinar em público;
2. Falar em público;
3. Dirigir ou estacionar um carro enquanto é observado;
4. Cantar ou tocar um instrumento musical;
5. Comer ou beber em público;
6. Ser fotografado ou filmado;
7. Usar sanitários públicos (mais para homens).

As pessoas mais afetadas pela fobia social são os homens, ao


contrário da maioria dos transtornos de ansiedade, que predomina
entre as mulheres. A idade média de início do transtorno de
ansiedade social nos Estados Unidos, segundo o DSM-5, é 13 anos, e
75% dos indivíduos têm idade de início entre 8 e 15 anos. O
transtorno inicia-se com história infantil de inibição social ou
timidez. O início na idade adulta é relativamente raro e é mais
provável ocorrer após um evento estressante ou humilhante ou após
mudanças na vida que exigem novos papéis sociais (por exemplo,
casar-se com alguém de uma classe social diferente, receber uma
promoção no trabalho). Entre as pessoas que buscam atendimento
clínico, o transtorno tende a ser particularmente persistente. O
tratamento medicamentoso é feito com os benzodiazepínicos ou os
antidepressivos inibidores da recaptação da serotonina, que
permitem recuperação entre 70 e 90%. É pouco provável melhora de
100%, embora algumas pessoas atinjam percentuais bem próximos a
esse.
Todos os transtornos têm em comum o prejuízo
social gerado por eles.
7.6 TRANSTORNO DE ESTRESSE PÓS-
TRAUMÁTICO
O transtorno de estresse pós-traumático, segundo o DSM-5, pode
ser entendido como a perturbação psíquica decorrente e relacionada
a um evento ameaçador ao paciente, ou sendo este apenas
testemunha de uma tragédia. Consiste em um tipo de recordação de
revivescência, em que, além de recordar as imagens, o paciente sente
como se vivesse novamente a tragédia com todo o sofrimento que ela
causou. Para o diagnóstico, é essencial que a pessoa tenha
experimentado ou testemunhado um evento traumatizante ou
gravemente ameaçador; separação conjugal, repetência e demissão
do emprego não são considerados eventos ameaçadores. É
necessário também que ela tenha apresentado uma resposta
marcante de medo, desesperança ou horror imediatamente após o
evento. Após isso, pode passar a ter recordações vivas, intrusivas
(involuntárias e abruptas), incluindo a lembrança do que pensou,
sentiu ou percebeu enquanto vivia o trauma. Podem ocorrer
pesadelos baseados no tema, e as situações que lembram o evento
causam intenso sofrimento e são evitadas. O tratamento mais efetivo
é a psicoterapia, embora antidepressivos também possam beneficiar
o paciente.
7.7 TRATAMENTO DOS TRANSTORNOS
DE ANSIEDADE
O tratamento de todos os transtornos ansiosos é realizado com
antidepressivos e benzodiazepínicos, por curto período, para alívio
imediato das crises. A terapia da linha cognitivo-comportamental
auxilia bastante no tratamento.
Você sabe diagnosticar e
diferenciar os transtornos
de ansiedade?
Os estados de ansiedade anormais, que constituem
síndromes de ansiedade, são patológicos e requerem
tratamento específico. O diagnóstico dos diferentes tipos
de transtornos é baseado no quadro clínico. É importante
saber diferenciar os diferentes transtornos: síndrome do
pânico (crises imprevisíveis com sintomas físicos intensos
e de curta duração), transtorno de ansiedade generalizada
(ansiedade elevada, na maior parte do tempo, com
sintomas físicos, por pelo menos 6 meses), transtorno
obsessivo-compulsivo (misto de sintomas obsessivos e
compulsivos neutralizadores dos primeiros), fobia social
(ansiedade elevada quando em avaliação de outras
pessoas) e transtorno de estresse pós-traumático
(decorrente de situação ameaçadora de forte intensidade).
Você sabe diferenciar
corretamente os
transtornos alimentares?

8.1 ANOREXIA NERVOSA


A anorexia nervosa é um distúrbio alimentar no qual o indivíduo se
furta à manutenção do peso corpóreo em um nível mínimo normal
adequado à idade e à altura, restringindo a ingesta calórica em
relação às necessidades. Peso significativamente baixo é definido
como um peso inferior ao peso mínimo normal ou, no caso de
crianças e adolescentes, menor do que o minimamente esperado.
Há medo intenso de ganhar peso ou tornar-se “gordo”, mesmo com
o peso abaixo do normal. Além disso, há perturbação no modo de
vivenciar o peso ou a forma do corpo, influência indevida do peso ou
da forma do corpo sobre a autoavaliação, ou negação do baixo peso
corpóreo atual.
Nas mulheres pós-menarca, ocorre amenorreia, isto é, a ausência
de, pelo menos, três ciclos menstruais consecutivos (considera-se
que uma mulher tem amenorreia caso sua menstruação ocorra
apenas depois da administração de hormônio estrogênico).
8.1.1 Tipos
Figura 8.1 - Tipos de anorexia nervosa
Fonte: elaborado pelo autor.

A anorexia nervosa raramente se inicia antes da puberdade, mas há


indícios de que a gravidade das perturbações mentais associadas
pode ser maior entre os pacientes mais jovens que desenvolvem a
doença. Entretanto, também há dados que sugerem que, quando a
doença se inicia durante os primeiros anos da adolescência (entre 13
e 18 anos), pode estar associada a melhor prognóstico. Mais de 90%
dos casos de anorexia nervosa ocorrem em mulheres.
Nos distúrbios de anorexia nervosa, é marcante
a perda de peso (ou a manutenção de um peso
abaixo do normal), ao contrário da bulimia, em
que os pacientes costumam ganhar peso (ou
apresentar sobrepeso).
Outro hábito comum entre os anoréticos consiste na obsessão por
guardar/estocar comida.
8.1.2 Gravidade
A gravidade do transtorno é baseada no Índice de Massa Corpórea
(IMC). Os intervalos a seguir são derivados das categorias da
Organização Mundial da Saúde para baixo peso em adultos; para
crianças e adolescentes, deve-se utilizar os percentis do IMC
correspondentes à faixa etária.
O nível de gravidade pode ser aumentado de maneira a refletir
sintomas clínicos, o grau de incapacidade funcional e a necessidade
de supervisão.
1. Leve: IMC ≥ 17 kg/m2;
2. Moderada: IMC 16 a 16,99 kg/m2;
3. Grave: IMC 15 a 15,99 kg/m2;
4. Extrema: IMC < 15 kg/m2.

8.1.3 Tratamento
Dependendo das condições clínicas, muitas vezes é necessário
proceder à internação para o restabelecimento da sua saúde em
ambiente hospitalar (IMC abaixo de 15 ou ideação suicida são
exemplos). Em caso de regime de hospitalização, procede-se à
correção hidroeletrolítica, à dieta hipercalórica, mesmo contra a
vontade do paciente, à correção de possíveis alterações metabólicas e
ao início do tratamento psiquiátrico.
A psicofarmacoterapia é indispensável, normalmente feita com
antidepressivos tricíclicos que tenham como efeito colateral o
estímulo do apetite e o ganho de peso – caso da maprotilina,
amitriptilina ou clomipramina. Na necessidade de sedação, o que
quase sempre acontece, recomenda-se que seja feita com
neurolépticos e, preferencialmente, com aqueles que também
aumentam o apetite – caso da levomepromazina.
Devem estar associados psicoterapia e acompanhamento
nutricional. Mesmo após a melhora, é importante saber que as
recaídas são frequentes. No caso da internação, a taxa de recidiva
imediata é superior a 25%. Portanto, o acompanhamento desses
pacientes deve ser feito durante anos.
8.2 BULIMIA NERVOSA
A bulimia nervosa é um transtorno alimentar caracterizado por:
1. Episódios recorrentes de compulsão periódica, que possuem os
seguintes aspectos:
a) Ingestão, em um período limitado de tempo (2 horas), de uma
quantidade de alimentos definitivamente maior do que a maioria
das pessoas consumiria durante um período similar e sob
circunstâncias similares (binges);
b) Sentimento de falta de controle sobre o comportamento
alimentar durante o episódio (sentimento de incapacidade de
parar de comer ou de controlar o que ou quanto está comendo);
c) Comportamento compensatório inadequado e recorrente, com
o fim de prevenir aumento de peso, como autoindução de vômito,
uso indevido de laxantes, diuréticos, enemas ou outros
medicamentos, jejuns ou exercícios excessivos (vigorexia):
• A compulsão alimentar e os comportamentos
compensatórios inapropriados ocorrem, em média, no
mínimo uma vez por semana durante 3 meses. A
autoavaliação é indevidamente influenciada pela forma e
pelo peso do corpo;
• O distúrbio não ocorre exclusivamente durante episódios de
anorexia nervosa.

Figura 8.2 - Tipos de bulimia


Fonte: elaborado pelo autor.

Segundo o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais


(DSM-5), a prevalência de 12 meses de bulimia nervosa entre jovens
do sexo feminino é de 1 a 1,5%. A maioria dos pacientes com bulimia
nervosa é do sexo feminino, na proporção de 9:1. O início dos
sintomas vai dos últimos anos da adolescência até os 40 anos, com
média de início por volta dos 20 anos.
Algumas profissões, em particular, parecem apresentar maior risco,
como as de jóqueis, atletas, manequins e pessoas ligadas à moda em
geral. Aspectos socioculturais são importantes, na medida em que a
doença parece também mais comum em classes econômicas mais
elevadas.
8.2.1 Tratamento
Quando necessária, a internação acontece por complicações
associadas, como depressão com risco de suicídio, perda de peso
acentuada com comprometimento do estado geral, hipopotassemia
seguida de arritmia cardíaca e casos de comportamento impulsivo
(abuso de álcool, drogas, automutilação, cleptomania,
promiscuidade sexual).
Os antidepressivos têm demonstrado maior eficácia na diminuição
dos episódios bulímicos e incluem antidepressivos tricíclicos ou
Inibidores Seletivos da Recaptação da Serotonina (ISRSs), como a
fluoxetina e a fluvoxamina, mesmo na ausência de depressão
coexistente. Devem estar associados psicoterapia e
acompanhamento nutricional.
Na bulimia, geralmente há sobrepeso, uma vez
que vômitos e diarreia não contribuem para a
perda de peso.

8.3 TRANSTORNO ALIMENTAR


RESTRITIVO/EVITATIVO
A principal característica diagnóstica do transtorno alimentar
restritivo/evitativo é a esquiva ou a restrição da ingestão alimentar
(Critério A), manifestada por fracasso clinicamente significativo em
satisfazer as demandas de nutrição ou pela ingestão energética
insuficiente por meio da ingestão oral de alimentos. Um ou mais dos
seguintes aspectos-chave devem estar presentes: perda de peso e
deficiência nutricional significativas (ou impacto relacionado à
saúde), dependência de alimentação enteral ou de suplementos
nutricionais orais ou interferência marcante no funcionamento
psicossocial. A determinação da perda de peso e deficiência
nutricional é um julgamento clínico.
O transtorno é mais comum na fase de lactente ou na primeira
infância e pode persistir na idade adulta. Da mesma maneira, a
evitação baseada em características sensoriais dos alimentos tende a
surgir na primeira década de vida, mas pode persistir na idade
adulta. Em vez de perder peso, crianças e adolescentes que não
concluíram o crescimento não atingem os aumentos de peso e altura
esperados em sua trajetória do desenvolvimento.
8.4 TRANSTORNO DE COMPULSÃO
ALIMENTAR
Segundo o DSM-5, o transtorno é caracterizado por episódios
recorrentes de compulsão alimentar, associados a três (ou mais) dos
critérios apresentados a seguir:
1. Comer muito e mais rapidamente do que o normal;
2. Comer até sentir-se incomodamente repleto;
3. Comer grandes quantidades de alimento, quando não está
fisicamente faminto;
4. Comer sozinho por embaraço, devido à quantidade de alimentos
que consome;
5. Sentir repulsa pelo ato, apresentar depressão ou demasiada culpa
após comer excessivamente.

Ocorre, ainda, acentuada angústia relativa à compulsão alimentar, e


há inexistência de comportamentos compensatórios inadequados
(por exemplo, purgação, jejuns e exercícios excessivos). Os episódios
de compulsão alimentar ocorrem, em média, ao menos uma vez por
semana durante 3 meses. A compulsão não acontece durante o curso
de anorexia nervosa ou bulimia nervosa.
O tratamento é multiprofissional, com nutricionista, psicólogo e
psiquiatra. Podem ser utilizados antidepressivos (como a fluoxetina)
para melhora da impulsividade (compulsão) alimentar.
Você sabe diferenciar
corretamente os
transtornos alimentares?
Os transtornos alimentares devem ser diagnosticados e
diferenciados pelas suas características clínicas e
alterações físicas e comportamentais dos pacientes. Na
anorexia nervosa, há IMC baixo, restrição alimentar,
distorção da imagem corporal e alterações como
amenorreia. Na bulimia nervosa, o IMC tende a ser mais
alto, ocorrem os binges e comportamentos purgativos
compensatórios. O transtorno restritivo /evitativo
caracteriza-se por baixo peso e restrição alimentar, sem
distorção da imagem corporal, sendo comum em crianças.
A compulsão alimentar diferencia-se da bulimia nervosa
pela ausência de mecanismos compensatórios para perda
de peso.
O que são transtornos de
personalidade e como
diferenciá-los?

9.1 INTRODUÇÃO
Indivíduos com distúrbios de personalidade estão entre os usuários
mais assíduos dos serviços de emergência, representando, para o
médico, casos bastante complexos, confusos e que consomem muito
tempo e energia. O correto diagnóstico e a abordagem desse tipo de
paciente são fundamentais para que o seu comportamento não
influencie a avaliação e a conduta objetiva do caso.
Definição e sintomas do transtorno de personalidade:
1. Definição: de acordo com a Classificação Internacional de Doenças
(CID-10), esse agrupamento compreende diversos estados e tipos de
comportamento clinicamente significativos que tendem a persistir e são
a expressão característica da maneira de viver do indivíduo e de seu
modo de estabelecer relações consigo próprio e com os outros. Alguns
desses estados e tipos de comportamento aparecem precocemente
durante o desenvolvimento individual, enquanto outros são adquiridos
mais tardiamente durante a vida. Eles representam desvios extremos
ou significativos das percepções, dos pensamentos, das sensações e
sobretudo das relações com os outros em comparação àquelas de um
indivíduo médio de dada cultura. Tais tipos de comportamento são, em
geral, estáveis e englobam múltiplos domínios da conduta e do
funcionamento psicológico. Com frequência, estão associados a
sofrimento subjetivo e a comprometimento de intensidade variável do
desempenho social;
2. Sintomas: iniciam-se na adolescência e continuam por toda a vida
adulta, podendo ser atenuados na velhice. Em graus variados, o
distúrbio influencia todas as facetas da personalidade, incluindo
cognição, humor, comportamento e relacionamento interpessoal.

No Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-


5), diferentemente da CID-10, os transtornos da personalidade estão
reunidos em três grupos, com base em semelhanças descritivas. O
grupo A inclui os transtornos da personalidade paranoide,
esquizoide e esquizotípica. Indivíduos com esses transtornos
frequentemente parecem esquisitos ou excêntricos. O grupo B inclui
os transtornos da personalidade antissocial, borderline, histriônica e
narcisista. Indivíduos com esses transtornos costumam parecer
dramáticos, emotivos ou erráticos. O grupo C inclui os transtornos
da personalidade evitativa, dependente e obsessivo-compulsiva.
Indivíduos com esses transtornos com frequência parecem ansiosos
ou medrosos.
Deve-se observar que esse sistema de agrupamento, embora seja útil
em algumas pesquisas, apresenta sérias limitações e não foi
consistentemente validado. É também bastante frequente que
pessoas apresentem diagnóstico ou características de mais de um
transtorno de personalidade.
Estimativas de prevalência para os diferentes grupos no DSM-5
sugerem 5,7% para os transtornos do grupo A, 1,5% para os do grupo
B e 6% para os do grupo C, com 9,1% para qualquer transtorno da
personalidade, indicando concomitância frequente de transtornos de
grupos diferentes.
Dados do National Epidemiologic Survey on Alcohol and Related
Conditions, de 2001-2002, sugerem que cerca de 15% dos adultos
dos Estados Unidos apresentam pelo menos um transtorno da
personalidade.
9.2 DEFINIÇÃO
O distúrbio de personalidade resulta de interações complexas entre
constituição pessoal, temperamento, experiências pessoais,
relacionamento familiar e oportunidades de aquisição de modelos
comportamentais (fatores constitucionais e ambientais).
Figura 9.1 - Características dos distúrbios de personalidade primário e secundário

Fonte: elaborado pelo autor.

São condições médicas mais comuns que podem causar alteração na


personalidade:
1. Epilepsia;
2. Doenças endócrinas;
3. Doenças cerebrovasculares;
4. AIDS;
5. Traumatismos cranianos;
6. Tumores cerebrais;
7. Esclerose múltipla;
8. Doença de Huntington;
9. Envenenamento por metais pesados (manganês, mercúrio);
10. Neurossífilis.
9.3 TIPOS DE TRANSTORNOS
Segundo a CID-10, os transtornos de personalidade são agrupados
em:
9.3.1 Paranoide
1. Excessiva sensibilidade em ser desprezado;
2. Tendência a guardar rancores, recusando-se a perdoar insultos,
injúrias ou injustiças cometidas;
3. Interpretações errôneas de atitudes neutras ou amistosas de outras
pessoas, tendo respostas hostis ou desdenhosas;
4. Tendência a distorcer os atos dos outros;
5. Combativo e obstinado senso de direitos pessoais em desproporção
à situação real;
6. Repetidas suspeitas injustificadas relativas à fidelidade do parceiro
conjugal;
7. Tendência a valorizar-se em excesso;
8. Preocupações com fofocas, intrigas e conspirações infundadas, com
base nos acontecimentos circundantes.

As palavras-chave do transtorno paranoide são


desconfiança, rancor e ciúme.

9.3.2 Esquizoide
1. Pouca ou nenhuma atividade produz prazer;
2. Frieza emocional, afetividade distante;
3. Capacidade limitada de expressar sentimentos calorosos, ternos ou
de raiva para com os outros;
4. Indiferença a elogios ou críticas;
5. Pouco interesse em relações afetivas ou sexuais;
6. Preferência quase invariável por atividades solitárias;
7. Tendência à vida introspectiva e fantasias pessoais;
8. Falta de amigos íntimos e de interesse em fazer amizades;
9. Insensibilidade a normas sociais predominantes, como atitude
respeitosa para com idosos ou com aqueles que perderam uma
pessoa querida recentemente.

As palavras-chave do transtorno esquizoide são


distância emocional, solidão e indiferença.

9.3.3 Antissocial
1. Atitude de desrespeito por normas, regras e obrigações sociais de
forma persistente;
2. Estabelecimento de relacionamentos com facilidade, principalmente
quando é do seu interesse, mas com dificuldade em mantê-los;
3. Baixa tolerância à frustração e fácil “explosão” em atitudes
agressivas e violentas;
4. Incapacidade de assumir a culpa pelo que fez de errado ou de
aprender com as punições;
5. Tendência a culpar os outros ou defender-se com raciocínios
lógicos, porém improváveis.

As palavras-chave do transtorno antissocial são


violação de regras, mentira e ausência de
aprendizado com punição.

9.3.4 Histriônico
1. Busca frequente por elogios, aprovações e reafirmações dos outros
em relação ao que faz ou pensa;
2. Comportamento e aparência sedutores e inadequados na esfera
sexual;
3. Preocupação com aparência e atratividade físicas;
4. Expressão de emoções com exagero inadequado, como ardor
excessivo no trato com desconhecidos, acessos de raiva incontrolável,
choro emotivo em situações de pouca importância;
5. Desconforto nas situações em que não é o centro das atenções;
6. Emoções, apesar de intensamente expressadas, superficiais e que
mudam facilmente;
7. Imediatismo, pouca tolerância a adiamentos e atrasos;
8. Estilo de conversa superficial e vago, com dificuldades para detalhar
o que pensa.

As palavras-chave do transtorno histriônico são


teatralidade, emotividade e busca por atenção.

9.3.5 Borderline ou emocionalmente instável


1. Padrão de relacionamento instável, que varia rapidamente entre
grande apreço por certa pessoa para logo depois desprezá-la;
2. Comportamento impulsivo, principalmente quanto a gastos
financeiros, sexual, abuso de substâncias psicoativas, pequenos
furtos, irresponsabilidade ao volante;
3. Rápida variação das emoções, passando de um estado de irritação
para angústia e, depois, para depressão (não necessariamente nessa
ordem);
4. Sentimento de raiva frequente e falta de controle desse sentimento,
chegando a lutas corpóreas;
5. Comportamento suicida ou automutilante;
6. Sentimentos persistentes de vazio e tédio;
7. Dúvidas a respeito de si mesmo, de sua identidade como pessoa, de
seu comportamento sexual, de sua carreira profissional.

As palavras-chave do transtorno borderline são


sensação de vazio, instabilidade, suicídio e
automutilação.

9.3.6 Obsessivo (anancástico)


1. Perfeccionismo que pode atrapalhar o cumprimento das tarefas,
porque, muitas vezes, o indivíduo se detém nos detalhes enquanto
atrasa o essencial;
2. Insistência em que as pessoas façam as coisas a seu modo ou
preferência por fazer tudo por achar que os outros o farão errado;
3. Excessiva devoção ao trabalho em detrimento das atividades de
lazer e da família;
4. Expressividade afetiva fria;
5. Comportamento rígido (não se acomoda ao comportamento dos
outros) e insistência irracional (teimosia);
6. Excessivo apego a normas sociais em ocasiões de formalidade;
7. Relutância em desfazer-se de objetos por achar que serão úteis
algum dia (mesmo sem valor sentimental);
8. Indecisão constante, prejudicando seu próprio trabalho ou estudo;
9. Consciência e escrúpulo excessivos com relação às normas sociais.

As palavras-chave do transtorno anancástico


são perfeccionismo, indecisão e rigidez.

9.3.7 Ansioso (evitação/esquiva)


1. Fácil ofensa por críticas e desaprovações;
2. Ausência de costume de ter amigos íntimos, além dos parentes mais
próximos;
3. Aceitação de relacionamento apenas quando tem certeza de que é
querido;
4. Fuga de atividades sociais ou profissionais em que o contato com
outras pessoas seja intenso, mesmo que venha a ter benefícios com
isso;
5. Sentimentos de tensão e apreensão enquanto está exposto
socialmente;
6. Exagero nas dificuldades, nos perigos envolvidos em atividades
comuns, porém fora da rotina. Por exemplo, cancelamento de
encontros sociais por achar que estará muito cansado, antes de
chegar.

As palavras-chave do transtorno de evitação são


insegurança, fácil ofensa e tensão social.

9.3.8 Dependente
1. Incapacidade de tomar decisões do dia a dia sem uma excessiva
quantidade de conselhos ou reafirmações de outras pessoas;
2. Permissão para que outras pessoas decidam aspectos importantes
de sua vida, como onde morar, que profissão exercer;
3. Submissão de suas próprias necessidades às dos outros;
4. Preferência por não fazer exigências, ainda que em seu direito;
5. Sentimento de desamparo quando sozinho, por medos infundados;
6. Medo de ser abandonado por quem possui relacionamento íntimo;
7. Fácil ofensa por crítica ou desaprovação.

As palavras-chave do transtorno dependente


são sensação de desamparo, submissão e medo
do abandono.
O transtorno de personalidade é diagnosticado
quando o funcionamento do paciente é de tal
maneira danoso, prejudicando a si mesmo ou às
pessoas ao seu redor.

9.4 TRATAMENTO
9.4.1 Psicoterápico
O tratamento psicoterápico deve sempre ser indicado e incentivado.
Independentemente do tipo de psicoterapia (psicodinâmica, de
suporte ou cognitivo-comportamental), é o tratamento que mais
beneficia o paciente, melhorando seu comportamento em médio e
longo prazos.
9.4.2 Medicamentoso
O tratamento medicamentoso é reservado para emergências e
comorbidades com doenças psiquiátricas (ansiedade, transtornos de
humor e psicoses).
O que são transtornos de
personalidade e como
diferenciá-los?
Transtornos de personalidade são diagnosticados pela
curva de vida do paciente. São evidenciados por
comportamentos disfuncionais, que tendem a persistir e
são a expressão característica da maneira de viver do
indivíduo e de seu modo de estabelecer relações consigo
próprio e com os outros. A diferença entre os diversos
transtornos está em suas características clínicas, e o
paciente pode inclusive ter traços de 2 ou mais transtornos.
Você sabe diferenciar os
transtornos somatoforme,
dissociativo e factício?

10.1 TRANSTORNOS SOMATOFORMES


A característica principal dos transtornos somatoformes, segundo a
Classificação Internacional de Doenças (CID-10), é a presença de
sintomas físicos, que sugerem alguma doença orgânica ou física e
não são produzidos intencionalmente. Ocorrem associados à busca
persistente de assistência médica. Apesar de os médicos nada
encontrarem de anormal, as queixas persistem e, quando há alguma
alteração orgânica, esta normalmente não justifica a queixa.
Porém, para que haja diagnóstico de transtorno somatoforme, deve
haver, junto às queixas, algum sofrimento ou prejuízo no
funcionamento social ou ocupacional. A diferença entre os
transtornos somatoformes e as doenças psicossomáticas está no fato
de estas últimas apresentarem, além da queixa, de fato, alguma
alteração orgânica constatável clinicamente.
A importância clínica dos transtornos somatoformes é totalmente
determinada pela sua enorme prevalência, portanto, pela
assiduidade com que os pacientes se utilizam dos sistemas de saúde.
10.1.1 Transtorno de somatização
O transtorno de somatização é o mais comum, cuja característica
principal é a elaboração de múltiplas queixas somáticas, que são
recorrentes e clinicamente significativas, resultando em algum
tratamento médico. No transtorno de somatização, normalmente,
há história de dor incaracterística e de difícil explicação médica que
acomete, sobretudo, a cabeça, as costas, as articulações, as
extremidades e o tórax, ou história de comprometimento nas
funções de órgãos, como em relação às menstruações, ao intercurso
sexual, à digestão ou ao funcionamento intestinal.
As queixas levam a frequentes exames médicos, radiográficos,
tomográficos e mesmo a cirurgias exploratórias desnecessárias.
Como os portadores do transtorno de somatização são previamente
histeriformes, em geral, descrevem suas queixas em termos
dramáticos, eloquentes e excessivos ou, curiosamente, ao contrário,
ou seja, completamente indiferentes à sugerida gravidade do
problema.
Frequentemente, ocorre longo histórico de hospitalizações e extensa
trajetória médica, muitas vezes em busca de tratamento com vários
médicos ao mesmo tempo. Para o diagnóstico, deve haver, pelo
menos, 2 anos de sintomas múltiplos, sem explicação clínica, recusa
pelo paciente de que não há explicação física para os sintomas e
prejuízo em seu funcionamento social e familiar. O transtorno é mais
comum entre mulheres e inicia-se na idade adulta, após os 30 anos.
Dependência e abuso de sedativos e analgésicos são bastante
frequentes.
10.2 TRANSTORNOS DISSOCIATIVOS
(CONVERSIVOS)
Segundo a CID-10, os transtornos dissociativos, ou de conversão,
caracterizam-se por perda parcial ou completa das funções normais
de integração da memória, da consciência, da identidade e das
sensações imediatas, e do controle dos movimentos corpóreos. Os
diferentes tipos de transtornos dissociativos tendem a desaparecer
após algumas semanas ou meses, em particular quando a ocorrência
se associa a acontecimento traumático. A evolução pode igualmente
acontecer para transtornos mais crônicos, particularmente
paralisias e anestesias, quando o transtorno está ligado a problemas
ou dificuldades interpessoais insolúveis.
No passado, esses transtornos eram classificados, entre diversos
tipos, como “histeria de conversão”. Admite-se que sejam
psicogênicos, uma vez que ocorrem em relação temporal estreita
com eventos traumáticos, problemas insolúveis e insuportáveis, ou
relações interpessoais difíceis. Os sintomas revelam frequentemente
a ideia que o sujeito faz de uma doença física. O exame médico e os
exames complementares não permitem colocar em evidência um
transtorno físico (em particular neurológico) conhecido. Os
sintomas podem ocorrer em relação temporal estreita com estresse
psicológico, aparecendo e desaparecendo frequente e bruscamente.
Convém atentar-se à produção dos sintomas, se é consciente ou
inconsciente e se há ganho secundário, para fazer o correto
diagnóstico dos transtornos.
10.2.1 Amnésia psicogênica ou dissociativa
Define-se amnésia psicogênica ou dissociativa uma súbita
incapacidade para lembrar informações pessoais importantes e
anteriormente armazenadas na memória. Trata-se de algo muito
mais profundo que um esquecimento simples e, para que se possa
dar esse diagnóstico, ele deve ocorrer na ausência de outro
transtorno cerebral concomitante, como traumatismos cranianos e
estados pós-convulsivos. A amnésia psicogênica pode seguir-se a
acidentes catastróficos, como guerra, acidentes aéreos ou fatos
vivenciais traumáticos ou moralmente muito condenáveis, como
assaltos e estupros. Há incapacidade de recordar informações
pessoais importantes, em geral de natureza traumática ou
estressante, demasiadamente extensa e delimitada para ser
explicada pelo esquecimento normal.
10.2.2 Fuga psicogênica
Nesse tipo de alteração, o distúrbio predominante consiste em
afastamento súbito e inesperado de casa ou do local de trabalho e a
incapacidade de recordar seu passado, portanto é um sintoma
superposto à amnésia psicogênica. Há desejo incontido de afastar-se
de experiências emocionalmente dolorosas, mas, durante o período
em que o paciente está foragido, pode comportar-se de modo
aparentemente normal ao julgamento dos outros. O principal
diagnóstico diferencial é o comportamento do estado crepuscular,
que pode acontecer na epilepsia do lobo temporal.
10.2.3 Estupor dissociativo
O estupor dissociativo compreende a diminuição importante ou a
ausência dos movimentos voluntários e da reatividade normal a
estímulos ópticos, auditivos e táteis externos, sem que os exames
clínicos e os exames complementares mostrem evidências de causa
física. Além disso, dispõe-se de argumentos em favor de origem
psicogênica do transtorno, na medida em que é possível evidenciar
eventos ou problemas estressantes recentes.
10.2.4 Convulsões dissociativas
Os movimentos observados no curso das convulsões dissociativas
podem assemelhar-se, de perto, aos observados no curso das crises
epilépticas; todavia, a mordedura de língua, os ferimentos por queda
e a incontinência urinária são raros. Além disso, a consciência está
preservada ou substituída por estado de estupor ou transe.
10.2.5 Anestesias dissociativas
Os limites das áreas cutâneas anestesiadas correspondem,
frequentemente, às concepções pessoais do paciente, mais do que às
descrições científicas. Pode haver, igualmente, perda de um tipo de
sensibilidade com conservação de outras sensibilidades, não
correspondendo a nenhuma lesão neurológica conhecida. A perda de
sensibilidade pode ser acompanhada de parestesias. As perdas da
visão e da audição raramente são totais nos transtornos
dissociativos.
10.2.6 Síndrome de personalidade múltipla
O transtorno de personalidade múltipla ou transtorno dissociativo
de identidade é outro sintoma que pode estar presente no transtorno
dissociativo. Esse quadro caracteriza-se pela existência de duas ou
mais personalidades distintas e separadas em uma só pessoa, cada
uma determinando comportamentos, atitudes e sentimentos
próprios. Quando o paciente manifesta determinada personalidade,
há amnésia em relação à outra. A transição de uma personalidade
para outra é, frequentemente, súbita e dramática. As personalidades
assumidas podem representar identidades criadas subjetivamente e
que atendem a anseios subterrâneos do indivíduo, bem como
entidades sobrenaturais e possessivas.
10.2.7 Transtorno de despersonalização e
desrealização
Muito semelhante à personalidade múltipla, é a forma de histeria
denominada despersonalização, caracterizada por alteração
persistente ou recorrente na percepção de si mesmo, como a
experiência de sentir-se separado do próprio corpo, de agir
mecanicamente ou de estar em um sonho. Em vez de sentir-se
“possuído” por outra personalidade, há sensação de irrealidade para
com o próprio corpo. Dentre as causas orgânicas que mais
apresentam o sintoma da despersonalização, está a epilepsia, que
deve ser prontamente distinguida do transtorno dissociativo.
Normalmente, a despersonalização é acompanhada de grande
sensação de ansiedade.
A desrealização também pode estar presente, vivenciada como um
sentimento de que o mundo externo é estranho ou irreal. A pessoa
com desrealização pode perceber, também, alteração insólita no
tamanho ou na forma dos objetos, percebendo-os maiores do que
são (macropsia) ou menores (micropsia), assim como podem
parecer estranhas ou mecânicas as pessoas à sua volta.
10.2.8 Síndrome de Ganser
A síndrome de Ganser caracteriza-se por “respostas
aproximativas”: quando se pergunta quanto são 2 + 2, por exemplo,
a resposta é 5. É acompanhada de vários outros sintomas
dissociativos.
10.3 TRANSTORNO FACTÍCIO
Também chamado de síndrome de Munchausen, o transtorno
factício é definido pela CID-10 por presença de sintomas físicos ou
psicológicos, intencionalmente produzidos ou simulados com o fim
de assumir o papel de doente. O julgamento de que determinado
sintoma é intencionalmente produzido é feito por evidências diretas
e pela exclusão de outras causas. Por exemplo, um indivíduo que se
apresenta com hematúria é descoberto com anticoagulantes em seu
poder, nega tê-los consumido, mas os exames de sangue condizem
com a ingestão de anticoagulantes. Cabe notar que a presença de
sintomas factícios não exclui a coexistência de sintomas somáticos
ou psicológicos verdadeiros.
No caso de crianças, quando a mãe intencionalmente produz algum
sintoma no filho pequeno, visando mantê-lo no papel de paciente, o
transtorno é chamado transtorno factício por procuração (ou
Munchausen por procuração).
Os transtornos factícios são diferenciados de atos de simulação.
Nesses últimos casos, o indivíduo também produz os sintomas de
modo intencional, porém com um objetivo obviamente perceptível
quando as circunstâncias ambientais se tornam conhecidas; por
exemplo, a produção intencional de sintomas para livrar-se de uma
prova ou de uma viagem. Da mesma forma, seria um ato de
simulação se um indivíduo hospitalizado para tratamento de
transtorno mental simulasse piora da doença para evitar a
transferência para outro hospital menos desejável. Em
contrapartida, no transtorno factício, a motivação é uma
necessidade psicológica de assumir o papel de enfermo, evidenciada
por ausência de incentivos externos para o comportamento. A
simulação pode ser considerada adaptativa sob certas
circunstâncias, mas, por definição, o diagnóstico de transtorno
factício sempre indica psicopatologia.
Você sabe diferenciar os
transtornos somatoforme,
dissociativo e factício?
Para diferenciar os transtornos somatoformes,
dissociativos e factícios, deve-se observar se a produção de
sintomas pelo paciente é voluntária ou não, e se ocorre
ganho secundário com a posição de doente.
Quais as principais
patologias psiquiátricas da
infância?

11.1 RETARDO MENTAL


Na Classificação Internacional de Doenças e Problemas Relacionados
à Saúde (também conhecida como Classificação Internacional de
Doenças – CID-10), a característica essencial do retardo mental é um
funcionamento intelectual significativamente inferior à média,
acompanhado de limitações significativas no funcionamento
adaptativo em, pelo menos, duas das seguintes áreas de habilidades:
comunicação, autocuidados, vida doméstica, habilidades
sociais/interpessoais, uso de recursos comunitários,
autossuficiência, habilidades acadêmicas, trabalho, lazer, saúde e
segurança. O início deve ocorrer antes dos 18 anos.
O retardo mental apresenta muitas etiologias diferentes e pode ser
visto como uma via final comum de vários processos patológicos que
afetam o funcionamento neurológico do paciente. A taxa de
prevalência do retardo mental é de aproximadamente 1%, conforme
estimativas.
Os fatores etiológicos podem ser primariamente biológicos ou
psicossociais, ou alguma combinação de ambos. Em
aproximadamente 30 a 40% dos indivíduos vistos em contextos
clínicos, não é possível determinar nenhuma etiologia para o retardo
mental. Os principais fatores predisponentes incluem:
1. Hereditariedade (cerca de 5%): esse fator inclui erros inatos do
metabolismo, herdados, em sua maior parte, por meio de mecanismos
autossômicos recessivos (doença de Tay-Sachs), outras
anormalidades em gene único com herança mendeliana e expressão
variável (esclerose tuberosa) e aberrações cromossômicas (síndrome
de Down por translocação, síndrome do X frágil);
2. Congênitas: alterações precoces do desenvolvimento embrionário
(aproximadamente 30%). Esses fatores incluem alterações
cromossômicas (síndrome de Down devido à trissomia do 21) ou dano
pré-natal causado por toxinas (consumo materno de álcool, infecções);
3. Problemas da gravidez e perinatais (aproximadamente 10%):
esses fatores incluem desnutrição fetal, prematuridade, hipóxia,
infecções virais, trauma e outras;
4. Condições médicas gerais adquiridas no início da infância (em
torno de 5%): esses fatores incluem infecções, traumas e
envenenamento (devido ao chumbo ou outros metais);
5. Influências ambientais e outros transtornos mentais (cerca de
15 a 20%): esses fatores incluem privação de afeto e cuidados, bem
como de estimulação social, linguística e outras, e transtornos mentais
severos (transtorno autista).

O funcionamento intelectual geral é definido pelo Quociente de


Inteligência (QI ou equivalente). Um funcionamento intelectual
significativamente abaixo da média é definido como QI de cerca de
70 ou menos.
Prejuízos no funcionamento adaptativo, em vez de baixo QI,
geralmente são os sintomas visíveis. O funcionamento adaptativo
refere-se ao modo como os indivíduos enfrentam as exigências
comuns da vida e o grau em que satisfazem os critérios de
independência pessoal esperados para a idade, bagagem
sociocultural e contexto comunitário específicos. Pode ser
influenciado por vários fatores, como educação, motivação,
personalidade, oportunidades sociais e vocacionais, além de
transtornos mentais e condições médicas gerais que podem coexistir
com o retardo mental.
Quatro níveis de gravidade podem ser especificados, refletindo o
atual nível de prejuízo intelectual, segundo a CID-10.
11.1.1 Leve: nível de QI 50-55 a aproximadamente
70
Esse grupo constitui o maior segmento (cerca de 85%) dos
indivíduos com o transtorno. Em seu conjunto, as pessoas com tal
nível de retardo mental desenvolvem habilidades sociais e de
comunicação durante os anos pré-escolares (de 0 a 5 anos), têm
mínimo prejuízo nas áreas sensório-motoras e, com frequência, não
são facilmente diferenciadas de crianças sem retardo mental até
uma idade mais tardia. São chamadas de “educáveis”. No fim da
adolescência, podem atingir habilidades acadêmicas equivalentes,
aproximadamente, ao sétimo ano escolar.
11.1.2 Moderado: nível de QI 35-40 a 50-55
Esse grupo constitui cerca de 10% dos indivíduos acometidos. A
maioria adquire habilidades de comunicação durante os primeiros
anos da infância. Beneficiam-se de treinamento profissional e, com
moderada supervisão, podem cuidar deles mesmos. Também podem
beneficiar-se do treinamento em habilidades sociais e ocupacionais,
mas, provavelmente, não progredirão além do nível de terceiro ano
em temas acadêmicos. São chamados “treináveis”.
11.1.3 Severo: nível de QI 20-25 a 35-40
O grupo constitui de 3 a 4% dos indivíduos com retardo mental.
Durante os primeiros anos da infância, adquirem pouca ou nenhuma
fala comunicativa. Durante o período da idade escolar, podem
aprender a falar e ser treinados em habilidades elementares de
higiene, mas se beneficiam apenas em grau limitado da instrução em
matérias pré-escolares, como familiaridade com o alfabeto e
contagem simples, embora possam dominar habilidades como
reconhecimento visual de algumas palavras fundamentais.
11.1.4 Profundo: nível de QI abaixo de 20-25
O grupo constitui cerca de 1 a 2% dos indivíduos com retardo mental.
A maioria tem uma condição neurológica identificada como
responsável pela condição. Durante os primeiros anos da infância,
apresentam prejuízos consideráveis no funcionamento sensório-
motor. Um desenvolvimento mais favorável pode acontecer em
ambiente altamente estruturado, com constante auxílio e supervisão
e, no relacionamento individualizado, com alguém responsável por
seus cuidados.
No Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-
5), os vários níveis de gravidade são definidos com base no
funcionamento adaptativo, e não em escores de QI, uma vez que é o
funcionamento adaptativo que determina o nível de apoio
necessário.
11.2 TRANSTORNO DE DÉFICIT DE
ATENÇÃO E HIPERATIVIDADE
São características do transtorno de déficit de atenção e
hiperatividade, de acordo com a DSM-5:
1. Definição: transtorno neurobiológico, de causas genéticas, que
aparece na infância e frequentemente acompanha o indivíduo por toda
a vida; mais comum em crianças e adolescentes encaminhados para
serviços especializados;
2. Sintomas: desatenção, hiperatividade e impulsividade;
3. Incidência:
a) Ocorre em 3 a 5% das crianças em idade escolar. Em mais da
metade dos casos, o transtorno acompanha o indivíduo na vida
adulta, embora os sintomas de inquietude sejam mais brandos;
b) As meninas apresentam maior proporção de desatenção e, por
incomodar menos, são levadas com menor frequência a
tratamento. Por isso, achava-se que o transtorno acontecia mais
entre meninos.
4. Diagnóstico: clínico, sem necessitar de qualquer exame
complementar (os sintomas devem começar a causar prejuízo antes
dos 12 anos, devendo ocorrer seis sintomas de desatenção e/ou seis
sintomas de hiperatividade/impulsividade por mais de 6 meses, na
ausência do curso de outras doenças).

Tipos de transtorno de déficit de atenção e hiperatividade:


1. Predomínio de desatenção (não tem sintomas do outro);
2. Predomínio de hiperatividade/impulsividade;
3. Combinado.

11.2.1 Desatenção
1. Não presta atenção a detalhes e erra por descuido;
2. Tem dificuldade para manter a concentração nas atividades;
3. Não ouve quando lhe falam diretamente;
4. É desorganizado (caderno, quarto);
5. Distrai-se facilmente por estímulos que não têm relação com o que
está fazendo;
6. Não persiste nas tarefas que exigem esforço mental continuado;
7. É “esquecido”;
8. Tem dificuldade para seguir instruções ou terminar tarefas;
9. Perde coisas.

11.2.2 Impulsividade/hiperatividade
1. É irrequieto com mãos e pés quando sentado;
2. Não para sentado quando necessário;
3. É muito agitado;
4. Fala demais;
5. Tem dificuldade para esperar a sua vez;
6. Interrompe as conversas e intromete-se nelas ou nos jogos dos
outros;
7. Tem sensação de inquietude;
8. É barulhento para jogar ou divertir-se;
9. Salta com as respostas antes de terminar as perguntas.

11.2.3 Tratamento
O tratamento é realizado com a família, a criança e a escola. Terapia,
principalmente da linha comportamental, apresenta boa eficácia.
Quanto à farmacologia, o principal medicamento utilizado é o
metilfenidato (Ritalina®). Alternativas são os antidepressivos
(tricíclicos, bupropiona) e os anti-hipertensivos (clonidina). Quanto
à eficácia do tratamento, em 70% dos casos há diminuição de, pelo
menos, 50% dos sintomas com a medicação.
11.3 TRANSTORNOS DO ESPECTRO
AUTISTA
Segundo a CID-10, trata-se de um grupo de transtornos
caracterizados por alterações qualitativas das interações sociais
recíprocas e modalidades de comunicação e por um repertório de
interesses e atividades restrito, estereotipado e repetitivo. O autismo
infantil é caracterizado por:
1. Desenvolvimento anormal ou alterado, manifestado antes da idade
de 3 anos;
2. Presença de perturbação característica do funcionamento em cada
um destes três domínios: interações sociais, comunicação,
comportamento focalizado e repetitivo.

O transtorno geralmente é acompanhado de outras manifestações


inespecíficas, como fobias, alterações do sono ou da alimentação,
crises de hétero ou autoagressividade.
O tratamento medicamentoso, quando necessário, visa à melhora do
comportamento. Podem ser utilizados antipsicóticos, como
risperidona, ou antidepressivos, como fluoxetina, para diminuição
da impulsividade e agressividade.
11.4 DISLEXIA
A característica essencial da dislexia é um comprometimento do
desenvolvimento das habilidades de leitura, não atribuíveis
exclusivamente à idade mental, transtornos de acuidade visual ou
escolarização inadequada. A capacidade de compreensão da leitura, o
reconhecimento das palavras, a leitura oral e o desempenho de
tarefas que necessitam da leitura podem estar comprometidos. Pode
haver associação a transtornos emocionais e do comportamento
durante a escolarização. Pessoas com dislexia não apresentam
retardo mental, e não há tratamento medicamentoso para ela. O
tratamento exige a participação de especialistas em várias áreas
(Pedagogia, Fonoaudiologia, Psicologia etc.).
Quais as principais
patologias psiquiátricas da
infância?
As principais patologias psiquiátricas da infância são
retardo mental, transtorno de déficit de atenção e
hiperatividade, transtornos do espectro autista e dislexia.
Você sabe avaliar e manejar
emergências psiquiátricas?

12.1 AGITAÇÃO PSICOMOTORA


Agitação psicomotora, emergência mais comum em Psiquiatria,
caracteriza-se por atividade motora excessiva, associada a
sentimento de tensão interna. A atividade, geralmente, é
improdutiva e repetitiva, como caminhar a esmo, mexer-se em
excesso, retorcer as mãos, puxar as roupas e não conseguir ficar
sentado e quieto. Muitas vezes, associa-se a comportamento
violento, que conduz ou ameaça conduzir a dano físico em pessoas
ou objetos.
Diante de paciente em quadro de agitação psicomotora, devem-se
avaliar, concomitantemente, alteração no nível de consciência,
etiologia do quadro de agitação e risco de violência.
Como o estado de agitação psicomotora pode ser o sintoma de
apresentação de amplo espectro de distúrbios clínicos ou
psiquiátricos, é importante verificar rapidamente se não se trata de
uma emergência clínica e se o paciente está ameaçando a própria
segurança ou a segurança da equipe. Por isso, a história clínica deve
ser realizada junto ao exame físico e psíquico, bem como com algum
tipo de intervenção física ou medicamentosa, se imperativa.
É importante informar-se sobre:
1. Quando iniciou o quadro de agitação;
2. Características da agitação: ansiedade, inquietação física, agitação
verbal, estado confusional;
3. Se o quadro já ocorreu outras vezes;
4. Doenças e tratamentos clínicos;
5. Doenças e tratamentos psiquiátricos;
6. Uso de medicamentos, álcool ou drogas;
7. História de trauma cranioencefálico;
8. Presença de febre;
9. Eventos recentes estressores (cirurgias, doenças, rompimento de
relacionamentos, falecimento na família).

12.1.1 Etiologia
A agitação psicomotora pode ser sintoma ou sinal de:
12.1.1.1 Transtorno orgânico agudo (delirium)

O delirium deve ser diferenciado entre evidência de doença orgânica


ou evidência de intoxicação ou abstinência de substância química.
12.1.1.2 Psicose ou síndrome maníaca

Nas psicoses, ocorrem delírios, alucinações, discurso desconexo e


incoerente, diminuição da atenção, irritabilidade e aumento da
atividade motora.
O diagnóstico específico será estabelecido após o controle da
agitação. Algumas possibilidades são surto esquizofrênico, psicose
reativa ou psicose por drogas.
A síndrome maníaca é bastante parecida com a psicose. No entanto,
o paciente apresenta, como sintoma predominante, alteração do
humor, tendo-o anormalmente elevado e expansivo, com a
autoestima elevada, grandiosidade, pensamento rápido e aumento
de atividades rotineiras e que causam prazer (sexo, compras).
12.1.1.3 Síndrome ansiosa
O sintoma mais proeminente é a agitação ansiosa. O paciente, em
geral, não apresenta psicose ou discurso bizarro. O diagnóstico
específico será realizado em um momento posterior, por
especialista, quando a agitação estiver controlada.
Alguns possíveis diagnósticos são agorafobia, transtorno de pânico,
transtorno de ansiedade generalizada, transtorno de estresse pós-
traumático, transtornos dissociativos ou conversivos, transtorno de
personalidade.
12.1.2 Conduta
Deve-se tentar, primeiramente, abordagem verbal, dialogando a sós
com o paciente e em ambiente tranquilo; informar a finalidade da
presença do médico e explicar os procedimentos que serão
realizados. Muitas vezes, essa conduta é impraticável e, em caso de
risco para o paciente ou para a equipe, deve ser contido fisicamente,
observando-se alguns cuidados:
1. Durante todo o procedimento, o paciente deve ser sempre
esclarecido sobre o que está sendo feito e o motivo para tal;
2. O ideal é o envolvimento de cinco pessoas, e uma delas coordena e
comunica-se com o paciente;
3. A medicação a ser administrada deve estar pronta e ser realizada
tão logo seja possível, caso o paciente continue agitado após a
contenção;
4. As faixas de contenção devem ser de material resistente. Deve-se
tomar cuidado para que os membros não fiquem torcidos, de forma a
causar tração de nervo ou alguma lesão por compressão;
5. A posição mais indicada é a lateral, com a cabeça levemente
elevada, o que previne aspiração;
6. O paciente deve ser observado em relação à segurança e ao
conforto, aos sinais vitais e ao nível de conciência, aproximadamente a
cada 30 minutos;
7. As contenções devem ser retiradas com equipe adequada e
suficiente para conter novamente o paciente, caso seja necessário.

Mesmo quando se encontra uma causa orgânica para a agitação,


pode ser necessário tratamento sintomático. Nos casos de
identificação de causa orgânica, geralmente a agitação é revertida
após o tratamento da causa-base. Se necessário, deve-se sedar com
haloperidol intramuscular. Somente em casos de abstinência por
álcool, a sedação deve ser feita com benzodiazepínicos, como
diazepam ou lorazepam (antipsicótico diminui limiar convulsivo, e
esses pacientes tendem a convulsionar). Se a agitação decorrer de
psicose ou mania, o tratamento da causa-base ficará para um
segundo momento, sendo realizada na Emergência somente a
sedação do paciente, com haloperidol por via oral ou intramuscular.
Em casos de síndrome ansiosa, a sedação é feita com
benzodiazepínico via oral (lorazepam, clonazepam ou diazepam).
Na Emergência, apesar de já ter formulado um diagnóstico, deve-se
apenas sedar o indivíduo, deixando a conduta de um tratamento
específico para a equipe especializada que cuidará, posteriormente,
do paciente.
Após o controle da agitação, devem-se avaliar riscos e optar por
internação, caso o paciente esteja incapaz de controlar seus
impulsos, apresente ideação suicida, esteja psicótico ou pareça ter
risco elevado de violência recorrente ou contínua. Caso não seja
necessária internação, dá-se sempre alta para o paciente, além de
encaminhá-lo para serviço ambulatorial.
A contenção física sempre antecede a
contenção química na agitação psicomotora.

12.2 TENTATIVA DE SUICÍDIO


O suicídio é compreendido como um ato multidimensional, que
resulta de uma interação complexa entre diversos fatores. Vários
estudos de revisão bibliográfica apontam fatores de risco para o
suicídio que podem ser de natureza clínica ou social.
12.2.1 Fatores de risco para o suicídio
1. Depressão grave (particularmente, no início da doença). Setenta por
cento dos suicídios decorrem de uma fase depressiva;
2. Histórico familiar ou pessoal prévio de depressão ou tentativas de
suicídio, abuso de álcool ou outras substâncias;
3. Psicose;
4. Agitação;
5. Ansiedade grave;
6. Insônia;
7. Sexo masculino (apresentam tentativas brutais e mais bem-
sucedidas);
8. Idade avançada (principalmente em associação a outras doenças
clínicas) e adolescentes(impulsividade);
9. Falta ou perda de apoio social;
10. Encarceramento;
11. Perda recente;
12. Crise pessoal ou causa para vergonha;
13. Falta de tratamento psiquiátrico ativo e mantido;
14. Doença crônica.

12.2.2 Conduta do médico


1. Segundo o Manual de Prevenção do Suicídio, da Organização
Mundial da Saúde (2006), deve-se sempre perguntar sobre a ideação
e o planejamento suicida de um paciente psiquiátrico;
2. Quanto mais planejado, mais perigoso, pois pode haver novas
tentativas, caso a última não tenha dado certo;
3. Qualquer distúrbio psiquiátrico associado ao uso de álcool aumenta
o risco de suicídio;
4. Isolamento social, falta de amigos, não ser casado, não morar com
outra pessoa, não ter filhos, não ser religioso, aumentam o risco de
suicídio, se associados a algum transtorno mental;
5. Nunca desconsiderar os avisos. Noventa por cento de quem tenta o
suicídio avisa antes;
6. Quem já fez uma tentativa tem 30% a mais de chances de repeti-la
do que quem nunca tentou;
7. Nos casos de psicoses agudas com pensamentos suicidas, ou
depressões delirantes com ideias de suicídio, caso não seja possível
hospitalizar o paciente, o acompanhante deve estar alerta todo o
tempo, atentando-se para janelas trancadas, armas, venenos,
comprimidos, facas, garfos, fios etc.
O tratamento do paciente com ideação e planejamento suicida deve
ser sempre realizado com internação psiquiátrica. As medicações
variam de acordo com a doença de base (por exemplo, pacientes
psicóticos são medicados com antipsicóticos; pacientes deprimidos,
com antidepressivos).
Em pacientes psiquiátricos, sempre se deve
indagar diretamente sobre ideação e
planejamento suicida.
Você sabe avaliar e manejar
emergências psiquiátricas?
As principais emergências psiquiátricas são agitação
psicomotora e tentativa de suicídio. Na agitação
psicomotora, deve-se avaliar em conjunto, e o mais rápido
possível, alteração de nível de consciência, etiologia da
agitação e segurança do paciente e da equipe. A agitação
pode ser decorrente de várias patologias psiquiátricas,
como delirium, psicose de qualquer natureza, intoxicação
ou abstinência de substâncias psicoativas ou até ansiedade.
A conduta inicial (caso o paciente não se acalme e esteja em
risco de agredir-se ou agredir alguém da equipe) é
contenção física, seguida de contenção química, de acordo
com a etiologia da agitação. O paciente deve ser
encaminhado a posteriori ao serviço de Psiquiatria.
O suicídio deve ser abordado sempre de forma direta; caso
o paciente apresente ideação com planejamento suicida,
deve-se proceder à internação psiquiátrica para
preservação da sua vida.
Você sabe quais as
principais classes de
medicações psiquiátricas?

13.1 ANTIDEPRESSIVOS
Acredita-se que o efeito antidepressivo se deva ao aumento da
disponibilidade de neurotransmissores no Sistema Nervoso Central
(SNC), notadamente da serotonina (5-HT), da noradrenalina (NE) e
da dopamina (DA). Ao bloquearem receptores 5-HT2 (da 5-HT), os
antidepressivos também funcionam como antienxaquecosos. O
aumento de neurotransmissores na fenda sináptica ocorre por meio
do bloqueio da recaptação da NE e da 5-HT no neurônio pré-
sináptico ou, ainda, da inibição da monoaminoxidase (MAO), enzima
responsável pela inativação desses neurotransmissores.
Podem-se dividir os antidepressivos em quatro grupos:
1. Antidepressivos tricíclicos (ADTs);
2. Inibidores seletivos de recaptação da 5-HT;
3. Inibidores da MAO (IMAOs);
4. Outros antidepressivos.

13.1.1 Antidepressivos tricíclicos


1. Amitriptilina (150 a 300 mg/d);
2. Clomipramina (150 a 300 mg/d);
3. Imipramina (150 a 300 mg/d);
4. Nortriptilina (50 a 150 mg/d).

Os ADTs impedem a recaptação de NE e 5-HT, resultando no


aumento dos neurotransmissores na fenda sináptica. Parece haver,
também, diminuição de receptores pré-sinápticos do tipo alfa-2,
cuja estimulação pela NE da fenda por mecanismo de feedback
negativo inibiria a liberação de NE.
Assim, quanto menor o número desses receptores, menor sua
estimulação e, consequentemente, mais NE seria liberada na fenda.
Portanto, há dois mecanismos relacionados à recaptação: um
inibindo diretamente a recaptação, outro diminuindo o número dos
receptores. É importante, com relação à farmacocinética dos ADTs, o
conhecimento do período de latência para a obtenção dos resultados
terapêuticos. Normalmente, esses resultados são obtidos após um
período de 15 até 30 dias depois do início da utilização. Os ADTs são
potentes anticolinérgicos, e, por essa característica, seus efeitos
colaterais são acentuados e ocorrem logo no início do tratamento,
sem período de latência.
Os principais efeitos colaterais dos antidepressivos tricíclicos são:
1. Oftalmológicos: há dificuldade de acomodação visual;
2. Gastrintestinais: secura na boca ocorre em quase 100% dos
pacientes, resolvida com ingesta aumentada de água. Constipação
intestinal também acontece em quase 100% das vezes e é resolvida
com mudança no hábito alimentar ou uso de laxantes;
3. Cardiocirculatórios: os ADTs podem provocar aumento na
frequência cardíaca, mas as taquicardias importantes são raras. Outro
efeito circulatório que pode molestar o paciente é a hipotensão
postural;
4. Geniturinários: a retenção urinária pode ser observada,
principalmente, em homens e portadores de adenoma de próstata.
Com muita frequência, encontra-se disúria em ambos os sexos. Na
esfera sexual, podem ocorrer diminuição da libido, retardamento do
orgasmo e, mais raramente, anorgasmia (em ambos os sexos);
5. SNC: sedações iniciais e sonolência são encontradas no início do
tratamento, diminuindo sensivelmente após os 6 primeiros dias. Em
doses terapêuticas, insônia, agitação e aumento da ansiedade não são
comuns. Em indivíduos mais idosos, pode-se encontrar a chamada
síndrome anticolinérgica central, com agitação, confusão mental,
delírios e alucinações. Então, considera-se o uso de doses menores
em tais pacientes. Em predispostos, podem ocorrer convulsões do tipo
generalizadas pelo fato de os ADTs diminuírem o limiar convulsígeno;
6. Alterações gerais: tremores finos das mãos são observados com
certa frequência e respondem muito bem aos betabloqueadores
(propranolol). Sudorese excessiva pode também incomodar o paciente,
mas não necessita de cuidado especial. É comum ganho de peso, e,
algumas vezes, os pacientes referem impulso para comer doce.

13.1.1.1 Indicações

Os ADTs estão indicados para o tratamento dos estados depressivos


de etiologia diversa: depressão associada a esquizofrenia e
distúrbios de personalidade, síndromes depressivas senis ou pré-
senis, distimia, depressão de natureza reativa, neurótica ou
psicótica, síndromes obsessivo-compulsivas, fobias e ataques de
pânico, estados dolorosos crônicos, profilaxia de enxaqueca e
enurese noturna (a partir de 5 anos e com prévia exclusão de causas
orgânicas). A amitriptilina está mais indicada, também, aos casos de
ansiedade associados a depressão, depressão com sinais vegetativos,
dor neurogênica, anorexia e casos de dor crônica grave (câncer,
doenças reumáticas, nevralgia pós-herpética, neuropatia pós-
traumática ou diabética). Clomipramina está mais indicada a casos
de transtorno obsessivo-compulsivo e outros transtornos do
espectro ansioso.
É importante lembrar: a nortriptilina é mais indicada para idosos por
ter menor efeito anticolinérgico; os tricíclicos são contraindicados
no primeiro trimestre da gestação; devem-se solicitar sempre
ecocardiograma e hemograma, pelo risco de leucopenia e
plaquetopenia; deve-se introduzir medicação em dose baixa e
aumentar, progressivamente, até a dose terapêutica.
13.1.1.2 Contraindicações

As contraindicações aos ADTs são bloqueio de ramo ventricular,


glaucoma de ângulo fechado, prostatismo e pós-infarto agudo do
miocárdio.
13.1.2 Inibidores seletivos de recaptação da
serotonina
1. Citalopram (20 a 60 mg/d);
2. Fluoxetina (20 a 80 mg/d);
3. Paroxetina (20 a 40 mg/d);
4. Sertralina (50 a 200 mg/d);
5. Escitalopram (10 a 20 mg/d).

O efeito antidepressivo dos Inibidores Seletivos de Recaptação da


Serotonina (ISRSs) parece ser consequência do bloqueio seletivo da
recaptação da 5-HT. A fluoxetina foi o primeiro representante dessa
classe de antidepressivos e tem um metabólito ativo, a
norfluoxetina. Este metabólito é o ISRS que se elimina mais
lentamente do organismo. A incidência de efeitos colaterais
anticolinérgicos, anti-histamínicos e alfabloqueadores, assim como
o risco de superdosagem, é menor nos ISRSs do que nos ADTs.
Entretanto, a fluoxetina tem se associado a alguns casos de acatisia,
especialmente quando a dose é muito alta, e a estimulação do SNC
parece maior com a fluoxetina do que com outros ISRSs. A
paroxetina origina mais sedação, efeitos anticolinérgicos e
extrapiramidais que outros ISRSs. Têm-se relatado sintomas de
abstinência com a supressão brusca do tratamento com a paroxetina.
Os ISRSs estão indicados para o tratamento dos transtornos
depressivos, transtorno obsessivo-compulsivo, transtorno do
pânico, transtornos fóbico-ansiosos, neuropatia diabética, dor de
cabeça tensional crônica e transtornos alimentares. A fluoxetina tem
ação anorexígena, com discreta redução do peso corpóreo durante os
primeiros meses. Há recuperação do peso com a continuidade do seu
uso.
Os ISRSs representam uma boa escolha para pacientes com
comorbidades clínicas, principalmente cardiovasculares, mas estão
contraindicados para insuficiência hepática (metabolismo hepático
– citocromo p450). O uso é recomendado pela manhã (insônia), e os
efeitos colaterais são diarreia, náuseas, dispepsia, insônia, cefaleia,
diminuição da libido e alteração na ejaculação.
13.1.3 Inibidores da monoaminoxidase
1. Tranilcipromina (300 a 600 mg/d);
2. Moclobemida (50 mg/d).

Os chamados IMAOs promovem o aumento da disponibilidade da 5-


HT por intermédio da inibição da monoaminoxidase responsável
pela degradação desse neurotransmissor intracelular. Não são
drogas de primeira escolha para depressão, mas são excelentes nas
depressões atípicas e nas fobias sociais. Os de inibição irreversível
(tranilcipromina) têm o inconveniente de exigirem restrição para
alimentos com tiramina, como queijos, vinhos e feijão. Os principais
efeitos colaterais são hipotensão postural, bradicardia, tremores,
sudorese, insônia e disfunções sexuais. Não se devem utilizá-los
com ISRS, pois podem desencadear síndrome serotonérgica
(hipertermia, mioclonia, hipertensão, hiperatividade, tremor e
sedação).
13.1.4 Antidepressivos atípicos
Os antidepressivos atípicos são os mais modernos, com melhor
perfil de efeitos colaterais. A eficácia, no entanto, é semelhante à dos
anteriores.
1. Venlafaxina (serotoninérgico, noradrenérgico, dopaminérgico):
150 a 225 mg/d;
2. Desvenlafaxina (serotoninérgico, noradrenérgico): 50 a 200
mg/d;
3. Reboxetina (noradrenérgico): 8 a 10 mg/d;
4. Fluvoxamina (serotoninérgico): 100 a 300 mg/d;
5. Mirtazapina (serotoninérgico, noradrenérgico, dopaminérgico):
15 a 45 mg/d;
6. Trazodona (serotoninérgico): 150 a 600 mg/d;
7. Duloxetina (serotoninérgico, noradrenérgico): 60 a 120 mg/d.

Quadro 13.1 - Principais indicações para uso dos antidepressivos


13.1.5 Antidepressivos multimodais
Em 2016, começou a ser comercializado o primeiro antidepressivo
multimodal no Brasil, a vortioxetina, com nome comercial de
Brintellix®. Trata-se de um modulador serotoninérgico, ou seja, age
ao mesmo tempo como antagonista e agonista de múltiplos
receptores 5-HT, também inibindo a recaptação da serotonina. Com
dosagem recomendada de 5 a 20 mg/d, os efeitos colaterais descritos
até o momento são os mesmos que os dos ISRSs, porém com menor
impacto na função sexual.
13.2 ANTIPSICÓTICOS
Os antipsicóticos podem ser divididos em três grupos:
1. Antipsicóticos sedativos;
2. Antipsicóticos incisivos;
3. Antipsicóticos atípicos e de última geração.
13.2.1 Antipsicóticos sedativos
1. Clorpromazina (50 a 800 mg/d);
2. Levomepromazina (25 a 50 mg/d);
3. Tioridazina (50 a 300 mg/d);
4. Trifluoperazina (2 a 4 mg/d);
5. Amissulprida;
6. Sulpirida (200 a 800 mg/d);
7. Periciazina (60 mg/d) – muito usada em casos de agitação,
irritabilidade ou agressividade em outros problemas psiquiátricos,
como demência ou retardo mental.

Os antipsicóticos sedativos são aqueles cujo principal efeito é a


sedação, ao contrário dos antipsicóticos incisivos (como o
haloperidol), cujo efeito principal é a remoção dos chamados
sintomas produtivos (delírios e alucinações). Os antipsicóticos
sedativos têm melhor indicação aos casos de agitação psicomotora.
Usados para o tratamento dos distúrbios psicóticos, são eficazes na
esquizofrenia e na fase maníaca da doença maníaco-depressiva, e
para o controle de náuseas e vômitos graves em pacientes
selecionados. É uma terapêutica alternativa aos benzodiazepínicos
no tratamento de curto prazo (não mais de 12 semanas) da ansiedade
não psicótica.
13.2.2 Antipsicóticos incisivos
1. Flufenazina;
2. Penfluridol;
3. Haloperidol (5 a 15 mg/d);
4. Pimozida (4 a 16 mg/d);
5. Pipotiazina (10 a 20 mg/d) – também injetável (a dose varia de 25 a
200 mg de pipotiazina undecanoato e pipotiazina palmitato);
6. Zuclopentixol: 50 a 75 mg/d.

O grupo farmacológico a que pertencem os antipsicóticos incisivos é


o das butirofenonas e substâncias a elas relacionadas. Sua ação
antipsicótica deve-se ao bloqueio dos receptores pós-sinápticos
dopaminérgicos D2 nos neurônios do SNC (sistema límbico e corpo
estriado).
Para produzir a ação antipsicótica, agem com bloqueio seletivo sobre
o SNC, que ocorre por competitividade dos receptores
dopaminérgicos pós-sinápticos, no sistema dopaminérgico
mesolímbico, e aumento do intercâmbio de DAs no nível cerebral.
13.2.2.1 Indicações

Tratamento de distúrbios psicóticos agudos e crônicos, incluindo


esquizofrenia, fase maníaca do transtorno afetivo bipolar, psicose
induzida por substâncias, transtorno delirante persistente,
problemas severos de comportamento em crianças, como
hiperatividade grave, síndrome de Gilles de la Tourette, autismo
infantil, alívio da sintomatologia da demência senil e dor
neurogênica crônica.
13.2.3 Antipsicóticos atípicos e de última geração
1. Amissulprida (600 a 1.200 mg/d);
2. Clozapina (150-900 mg/d) – o uso dessa medicação requer
cuidados básicos com os glóbulos brancos. Antes, no começo e
durante todo o tratamento, o paciente deve fazer exames de sangue. A
dose da medicação deve ser aumentada de forma que não afete o
sistema imunológico;
3. Olanzapina (5 a 20 mg/d);
4. Quetiapina (50 a 800 mg/d);
5. Risperidona (2 a 6 mg/d);
6. Zuclopentixol (50 a 75 mg/d);
7. Aripiprazol (10 a 30 mg/d);
8. Ziprasidona (40 a 160 mg/d);
9. Paliperidona (3 a 12 mg/d).

São os antipsicóticos mais recentemente lançados no mercado e não


se classificam como fenotiazínicos (sedativos) nem como
butirofenonas (incisivos). Esses medicamentos têm se mostrado um
novo e valioso recurso terapêutico nas psicoses refratárias aos
antipsicóticos tradicionais, nos casos de intolerância aos efeitos
colaterais extrapiramidais, bem como nas psicoses com sintomas
negativos predominantes, em que os antipsicóticos tradicionais
podem ser ineficazes.
13.2.3.1 Indicações

Esquizofrenia e outras psicoses em que os sintomas positivos


(delírios, alucinações, pensamento desordenado, hostilidade e
medo) ou os negativos (indiferença afetiva, depressão emocional e
social, pobreza de linguagem) são predominantes.
13.2.4 Ação farmacológica dos antipsicóticos
Apesar de os antipsicóticos tradicionais bloquearem receptores
adrenérgicos, serotoninérgicos, colinérgicos e histaminérgicos,
todos têm em comum a ação farmacológica de bloquear os
receptores dopaminérgicos. É em relação a estes últimos que os
estudos têm demonstrado os efeitos clínicos dos antipsicóticos. O
bloqueio dos outros receptores, além dos dopaminérgicos, estaria
relacionado mais aos efeitos colaterais da droga do que aos
terapêuticos. Os receptores da DA mais conhecidos são o D1 e o D2
(ambos pós-sinápticos), além dos receptores localizados no corpo
do neurônio dopamínico e no terminal pré-sináptico. A atividade
terapêutica dos antipsicóticos parece estar relacionada,
principalmente, com o bloqueio da DA nos receptores pós-sinápticos
do tipo D2.
A DA liberada próxima aos capilares da circulação porta-hipofisária
chega à hipófise anterior e acaba, dentre outros efeitos, por
aumentar a liberação secundária de prolactina. A hipotensão,
sedação e tontura, efeitos colaterais comuns aos antipsicóticos
tradicionais, normalmente ocorrem devido à capacidade de esses
medicamentos bloquearem também os receptores alfa-
adrenérgicos.
Os antipsicóticos tradicionais, como a clorpromazina e o
haloperidol, são eficazes em mais de 80% dos pacientes com
esquizofrenia, atuando, predominantemente, nos sintomas
chamados produtivos ou positivos (alucinações e delírios) e, em grau
muito menor, nos chamados sintomas negativos (apatia,
embotamento e desinteresse).
13.2.5 Efeitos colaterais

Os efeitos extrapiramidais são mais comuns


com o uso de antipsicóticos típicos.

Dentre os efeitos colaterais provocados pelos antipsicóticos, o mais


estudado é a chamada impregnação antipsicótica ou síndrome
extrapiramidal. Essa situação é o resultado da ação do medicamento
na via nigroestriatal, onde parece haver balanço entre as atividades
dopaminérgicas e colinérgicas. Dessa forma, o bloqueio dos
receptores dopaminérgicos provocará supremacia da atividade
colinérgica e, consequentemente, liberação dos sintomas ditos
extrapiramidais. Esses efeitos colaterais, com origem no SNC,
podem ser divididos em cinco tipos, conforme segue.
13.2.5.1 Distonia aguda

É frequente nas primeiras 48 horas de uso de antipsicóticos,


portanto é uma das primeiras manifestações de impregnação pelo
antipsicótico. Clinicamente, observam-se movimentos
espasmódicos da musculatura do pescoço, da boca, da língua e,
algumas vezes, um tipo de crise oculógira. O tratamento desse efeito
colateral é feito à base de anticolinérgicos injetáveis intramusculares
(biperideno), sempre eficazes em poucos minutos.
13.2.5.2 Parkinsonismo medicamentoso

Em geral, acontece após a primeira semana de uso dos


antipsicóticos. Clinicamente, há tremor de extremidades, hipertonia
e rigidez muscular, hipercinesia e fácies inexpressiva. O tratamento
com anticolinérgicos ou antiparkinsonianos (amantadina) é
igualmente eficaz. Para prevenir o aparecimento desses
desagradáveis efeitos colaterais, pode-se optar pelo uso
concomitante de biperideno por via oral.
13.2.5.3 Acatisia

Ocorre, em geral, após o terceiro dia de medicação e é clinicamente


caracterizada por inquietação psicomotora, desejo incontrolável de
movimentar-se e sensação interna de tensão. O paciente assume
postura típica de levantar-se a cada instante, andar de um lado para
outro e, quando compelido a permanecer sentado, não para de mexer
as pernas. A acatisia não responde bem aos anticolinérgicos, e o
clínico é obrigado a decidir-se entre a manutenção do tratamento
antipsicótico com aquele medicamento e com aquelas doses e o
desconforto da sintomatologia. Com frequência, é necessária a
diminuição da dose ou a mudança para outro tipo de antipsicótico.
Quando isso acontece, normalmente se deve recorrer aos
antipsicóticos atípicos ou de última geração.
13.2.5.4 Discinesia tardia

Aparece após uso crônico de antipsicóticos (em geral, após 2 anos).


Clinicamente, é caracterizada por movimentos involuntários,
sobretudo da musculatura orolinguofacial, havendo protrusão da
língua com movimentos de varredura laterolateral, acompanhados
de movimentos sincrônicos da mandíbula. O tronco, os ombros e os
membros também podem apresentar movimentos discinéticos. A
discinesia tardia não responde a nenhum tratamento conhecido,
embora, em alguns casos, possa ser suprimida com a
readministração do antipsicótico ou, paradoxalmente, aumentando
a dose já utilizada. Tem sido menos frequente a discinesia tardia
depois do advento dos antipsicóticos atípicos ou de última geração.
13.2.5.5 Síndrome antipsicótica maligna

Trata-se de uma forma raríssima de toxicidade provocada pelo


antipsicótico. É uma reação adversa que depende mais do agente
agredido do que do agente agressor, como uma espécie de
hipersensibilidade à droga. Clinicamente, observa-se grave distúrbio
extrapiramidal acompanhado por intensa hipertermia (de origem
central), aumento da creatinofosfoquinase, diminuição da pressão
arterial e distúrbios autonômicos. Leva a óbito a uma proporção de
20 a 30% dos casos e independe da dose de antipsicótico utilizada. A
conduta compreende suspensão do antipsicótico, internação em
unidade intensiva, hidratação e utilização de agonista
dopaminérgico (bromocriptina) e miorrelaxantes (dantroleno).
Além dos efeitos adversos dos antipsicóticos tradicionais sobre o
SNC, são observados reflexos de sua utilização em nível sistêmico,
conforme descritos a seguir:
1. Autonômicos: secura da boca e da pele, constipação intestinal,
dificuldade de acomodação visual e, mais raramente, retenção urinária;
2. Cardiovasculares: alterações eletrocardiográficas, como aumento
do intervalo PR, diminuição do segmento ST e achatamento de onda T
(essas alterações são benignas e não costumam ter significado clínico.
Das alterações cardiovasculares, a mais comum é a hipotensão);
3. Endocrinológicos: amenorreia e, menos frequentemente,
galactorreia e ginecomastia;
4. Gastrintestinais: constipação intestinal e boca seca, que também
podem ser observadas durante o tratamento, como consequência dos
efeitos anticolinérgicos.

13.3 ANSIOLÍTICOS E HIPNÓTICOS


13.3.1 Benzodiazepínicos
1. Alprazolam;
2. Bromazepam;
3. Clobazam;
4. Clonazepam;
5. Clordiazepóxido;
6. Cloxazolam;
7. Diazepam;
8. Lorazepam.
Quando se mencionam ansiolíticos, trata-se praticamente dos
benzodiazepínicos, uma das drogas mais usadas no mundo e, talvez
por isso, considerada problema da saúde pública nos países mais
desenvolvidos. Os benzodiazepínicos são capazes de estimular no
cérebro mecanismos que normalmente equilibram estados de tensão
e ansiedade. Aparentemente, o efeito ansiolítico dos
benzodiazepínicos relaciona-se ao sistema de neurotransmissores
gabaérgicos do sistema límbico. O ácido gama-aminobutírico é um
neurotransmissor com função inibitória, capaz de atenuar as reações
serotoninérgicas responsáveis pela ansiedade. Os benzodiazepínicos
seriam, então, agonistas (simuladores) desse sistema, agindo nos
receptores gabaminérgicos. Como consequência dessa ação, os
ansiolíticos produzem depressão da atividade do cérebro que se
caracteriza por:
1. Diminuição de ansiedade;
2. Indução de sono;
3. Relaxamento muscular;
4. Redução do estado de alerta;
5. Aumento limiar de convulsão.

É importante notar que os efeitos dos benzodiazepínicos podem ser


fortemente aumentados pelo álcool, e a mistura pode ser prejudicial.
Naturalmente, pode-se valer dos benzodiazepínicos como
coadjuvantes do tratamento psiquiátrico, quando a causa-base da
ansiedade não é prontamente resolvida. No caso de paciente
deprimido e, consequentemente, ansioso, os benzodiazepínicos
podem ser úteis enquanto o tratamento antidepressivo não exerce o
efeito desejável. Trata-se, nesse caso, de uma associação
medicamentosa provisória e benéfica ao paciente. Entretanto, com a
progressiva melhora do quadro depressivo, não haverá mais razões
clínicas para a continuação dos benzodiazepínicos e/ou ansiolíticos.
13.3.2 Zolpidem
Trata-se de um fármaco hipnótico, do grupo das imidazopiridinas,
não benzodiazepínico, de rápida ação e de curta meia-vida.
É utilizado na dose de 10 mg/dia, para o tratamento em curto prazo
da insônia (de 2 e 6 semanas).
O zolpidem deve ser usado com cautela, pois tem potencial de causar
amnésia anterógrada, descoordenação motora, fadiga, tonturas,
alucinações e sonambulismo.
13.3.3 Efeitos colaterais
Os principais efeitos colaterais são sedação e sonolência, variáveis de
indivíduo para indivíduo, de acordo com a dose do medicamento. Os
casos de dependência aos benzodiazepínicos se restringem, na
maioria das vezes, ao uso muito prolongado e com doses acima das
habituais. Há tendência atual em considerar o fenômeno da
dependência ao benzodiazepínico, até certo ponto, mais ligado aos
traços da personalidade do que de alguma característica da droga.
13.4 ESTABILIZADORES DE HUMOR
1. Carbamazepina;
2. Oxcarbazepina;
3. Carbonato de lítio;
4. Ácido valproico;
5. Divalproato de sódio;
6. Lamotrigina;
7. Gabapentina;
8. Topiramato.

Os estabilizadores do humor são substâncias não essencialmente


antidepressivas nem sedativas. Internacionalmente, reconhecem-se
algumas substâncias capazes de desempenhar tal papel: o lítio, a
carbamazepina, o ácido valproico e, mais recentemente, o
divalproato de sódio. Alguns outros anticonvulsivantes estão sendo
estudados quanto à eficácia como estabilizadores do humor, como a
lamotrigina e a gabapentina.
As indicações exclusivas para os estabilizadores do humor são os
transtornos afetivos bipolares e os episódios de mania (euforia) ou
hipomania.
13.4.1 Carbamazepina
A carbamazepina é metabolizada no fígado, e um metabólito seu tem
atividade anticonvulsivante, antidepressiva e antineurálgica. Tem
ação importante como estabilizador de humor por agir no sistema
gabaérgico, nos canais de sódio, além de bloquear os canais de cálcio.
13.4.1.1 Reações adversas

Em pacientes que apresentam letargia, debilidade, náuseas, vômitos,


confusão ou hostilidade, anomalias neurológicas ou estupor, deve-
se suspeitar de hiponatremia. São de incidência mais frequente visão
turva, cefaleia contínua, aumento da frequência de crises
convulsivas, sonolência e debilidade. Em diabéticos, pode haver
aumento nas concentrações de açúcar na urina.
13.4.2 Carbonato de lítio
O lítio não se une às proteínas plasmáticas nem é metabolizado, e
eliminam-se 95% de forma inalterada pelo rim. A eliminação é
inicialmente rápida e, após tratamento prolongado, torna-se mais
lenta. Na forma ativa, 80% do lítio pode ser reabsorvido no túbulo
proximal. O início de sua ação terapêutica pode demorar de 1 a 3
semanas. É o medicamento de primeira escolha para o começo do
tratamento, principalmente em casos de mania.
13.4.2.1 Reações adversas

Frequência de micção aumentada, aumento da sede, náuseas, tremor


das mãos, desvanecimentos, taquicardia, pulso irregular, dispneia
de esforço, sonolência e confusão.
13.4.2.2 Precauções
O lítio é excretado no leite materno. Em alguns lactentes, foram
descritos sinais de toxicidade, como hipotonia, hipotermia, cianose e
alterações ao eletrocardiograma. Os idosos necessitam, geralmente,
de dose menor, devido ao volume de distribuição e à velocidade do
clearance renal estarem reduzidos. O lítio é potencialmente tóxico
para o SNC, inclusive em concentrações séricas dentro do alcance
terapêutico. Deve ser administrado com precaução na presença de
doença cardiovascular (pode exacerbar-se), de alterações do SNC
(epilepsia e parkinsonismo), de desidratação grave (aumenta o risco
de toxicidade) e de insuficiência renal ou retenção urinária. A
toxicidade por lítio pode aparecer em concentrações séricas
terapêuticas ou próximas a elas. Durante a fase maníaca aguda, o
paciente pode ter grande capacidade para tolerar o lítio, dado que
diminui a reabsorção de sódio pelos túbulos renais. Recomendam-se
consumo de cloreto de sódio e adequada ingestão de líquidos (2,5 a 3
L/d). Sua administração deve ser cuidadosa nos casos de bócio ou
hipotireoidismo, já que pode agravá-los. Antes e durante o
tratamento, recomenda-se efetuar a determinação da função renal,
além da contagem de leucócitos e eletrocardiogramas. É
aconselhável efetuar exames do lítio sérico durante o tratamento.
1. Faixa terapêutica: litemias entre 0,6 e 1,2 mEq/L. Dose aproximada
de 900 a 1.200 mg/d;
2. Litemia > 1,5 – intoxicação: náuseas, vômitos, diarreia, tremores
grosseiros, moleza e disartria;
3. Intoxicação grave (> 2): turvação da consciência, hipertonia
muscular, fasciculação, hiper-reflexia, convulsões, coma;
4. Soro fisiológico +: diuréticos osmóticos para estimular a excreção
renal;
5. Entre 2 e 4: monitorização de eletrólitos, litemia e
eletrocardiograma;
6. Litemia > 4: hemodiálise ou diálise peritoneal.

13.4.2.3 Contraindicações

Gravidez (efeito teratogênico), lactação, disfunção renal ou cardíaca


grave.
13.5 ELETROCONVULSOTERAPIA
A eletroconvulsoterapia (ECT) é um tipo de tratamento biológico
para transtornos mentais altamente eficaz e extremamente seguro.
Desde o seu princípio, na década de 1930, a ECT foi utilizada para
condições psiquiátricas nas quais outros tratamentos tiveram pouco
ou nenhum benefício.
13.5.1 Técnica
O tratamento consiste na aplicação de uma carga elétrica no cérebro,
com o paciente anestesiado (é feita anestesia geral, que dura em
torno de 5 minutos). Essa carga produz uma descarga do cérebro,
originando uma convulsão, a qual é bastante diferente da que ocorre
nas pessoas com epilepsia, pois é administrada ao paciente, junto à
medicação anestésica, uma medicação que promove relaxamento
muscular. Durante a aplicação, faz-se controle do funcionamento
cardíaco (monitorização por meio de eletrocardiograma) e da
oxigenação do sangue (por intermédio de oxímetro), além do
controle da pressão arterial. Os aparelhos utilizados para a ECT
atualmente são muito desenvolvidos, permitindo uma carga de
energia adequada para cada paciente. Pode-se realizar a aplicação
bilateral (os eletrodos são posicionados nas têmporas) ou unilateral
(um eletrodo é posicionado na têmpora, e outro, na região superior
da cabeça). Durante o procedimento, realiza-se eletroencefalograma
para controle da crise.
13.5.2 Indicações
A principal indicação para o uso de ECT é a depressão, especialmente
se grave ou resistente ao tratamento com remédios, ou aos casos
com risco elevado de suicídio. A eficácia nesse transtorno gira em
torno de 90%, comparada com as medicações (em torno de 70%).
Idosos, que são mais sensíveis aos efeitos colaterais das medicações
antidepressivas, podem beneficiar-se bastante com a ECT. Também
pode ser utilizada para casos em que haja catatonia (síndrome
comum na esquizofrenia, na qual a pessoa fica completamente
parada, sem falar e sem alimentar-se). Para pacientes com
transtornos mentais durante a gestação (depressões, psicoses), a
ECT é o tratamento mais seguro, pois os remédios podem fazer mal à
criança, causando malformações, especialmente no primeiro
trimestre da gravidez. Indivíduos com esquizofrenia ou transtorno
bipolar do humor em fase de mania também podem beneficiar-se
com a ECT, sobretudo quando o quadro é grave e/ou as medicações
não obtiveram resultado satisfatório.
A eletroconvulsoterapia é a primeira indicação
em gestantes bipolares, idosos com ideação
suicida e catatônicos.

13.5.3 Riscos
Antes do início das aplicações, por questão de segurança relacionada
ao risco da anestesia, é sempre realizada avaliação pré-ECT, que
consiste em:
1. Exames laboratoriais (hemograma, glicemia, nível sérico de
potássio);
2. Eletrocardiograma e avaliação cardiológica;
3. Avaliação odontológica;
4. Exame de fundo de olho ou tomografia de crânio;
5. Radiografia de tórax.

Apesar de ser um tratamento muito seguro, há algumas condições


nas quais há risco aumentado, por isso há contraindicação relativa
ao uso da ECT. É claro que, caso o risco de ficar sem ECT seja maior,
deve-se fazê-la, tomando os devidos cuidados. As contraindicações
relativas são infarto do miocárdio recente (até 6 meses), condições
que aumentem a pressão intracraniana (tumores ou hematomas) e
aneurisma cerebral ou sangramentos cerebrais. Arritmias do coração
devem ser avaliadas por cardiologista, pois a maioria não
contraindica a ECT.
13.5.4 Efeitos colaterais
São dois os principais efeitos colaterais da ECT: dor de cabeça
(costuma melhorar com analgésicos comuns) e alterações na
memória (recuperada completamente em 6 meses). Com as técnicas
modernas, esses efeitos são leves e pouco frequentes.
13.5.5 Curso do tratamento
A ECT costuma ser realizada três vezes por semana, com uma média
de 6 a 12 aplicações para apresentar o seu efeito (mínimo de uma e
máximo de 20 aplicações). Pode ser feita com o paciente internado
ou em regime ambulatorial (ele vem de casa para a sessão e, ao
acordar da anestesia, retorna). A frequência e o número das
aplicações são decididos pelo consenso entre o médico que indicou a
ECT e a equipe especializada. Se o paciente responde bem ao
tratamento, pode ser realizada a ECT de manutenção, na qual as
aplicações se tornam espaçadas (no começo semanalmente, depois
quinzenalmente e, por fim, mensalmente).
13.6 ESTIMULAÇÃO TRANSMAGNÉTICA
A estimulação magnética transcraniana repetitiva (TMS) de alta
frequência sobre o córtex pré-frontal dorsolateral esquerdo
apresenta resultados satisfatórios e significativos no tratamento de
pacientes com depressão maior. É uma técnica neurofisiológica que
permite a indução de um campo magnético no cérebro de maneira
indolor e não invasiva. A TMS é aplicada colocando-se uma espiral
metálica envolta em plástico (bobina) sobre a cabeça para a emissão
de pulsos magnéticos que atuam sobre o cérebro de maneira
focalizada. Dependendo da frequência, os estímulos podem
aumentar ou diminuir a atividade da área cerebral atingida e, assim,
pode-se aplicar terapeuticamente modulando (equilibrando) o
funcionamento neuronal, de acordo com o problema apresentado.
13.7 PSICOTERAPIA
A psicoterapia é uma possibilidade de tratamento que visa à
abordagem das dificuldades afetivas ou mentais do paciente para a
sua melhora global. É uma excelente aliada ao tratamento
farmacológico na maioria dos pacientes.
Existem vários tipos de psicoterapia, com técnicas variadas para a
sua aplicação. A melhor é a que atende satisfatoriamente às
expectativas tanto do terapeuta quanto do paciente. Algumas são
citadas a seguir.
13.7.1 Psicanálise
A psicanálise é um método de tratamento psíquico e de investigação
do inconsciente, desenvolvido por Sigmund Freud (1856-1939).
Freud desenvolveu os conceitos de transferência e
contratransferência. Em uma perspectiva psicanalítica, a
transferência ocorre quando o indivíduo, durante o processo de
exploração dos conteúdos internos da psique, por meio da
associação livre, começa a projetar, no analista, atitudes e
sentimentos infantis. É por meio dela que o terapeuta pode auxiliar o
paciente. Partindo da transferência, recriam-se situações capazes de
organizar muitos níveis de experiências, vínculos e diferenciações. A
contratransferência é a projeção e a distorção do vínculo que parte
do terapeuta para o paciente.
13.7.2 Psicoterapia cognitiva
Sistema de terapia cujo princípio básico é que as cognições
(pensamentos, crenças, interpretações) de um indivíduo diante das
situações influenciam suas emoções e seus comportamentos. O
terapeuta atua sobre as cognições, a fim de alterar as emoções e os
comportamentos que as acompanham.
13.7.3 Psicoterapia comportamental
Esse é o nome dado à abordagem fundamentada no behaviorismo
radical de Skinner. Caracteriza-se por preocupar-se com a
comprovação científica de seus procedimentos. O terapeuta
comportamental investiga vários aspectos do comportamento
(motores, afetivos, cognitivos) e busca estabelecer relações do tipo
de comportamento com as condições físicas e sociais em que este
ocorre. Estilo de terapia bastante utilizado para alívio de sintomas de
doenças mentais.
13.7.4 Psicologia analítica
A psicologia analítica foi criada por C. G. Jung. Apesar de ter muitos
aspectos em comum com a psicanálise, Jung acentua a importância
do simbolismo cultural e arquetípico na formação da personalidade.
13.7.5 Psicodrama
Muito parecida com o teatro, esta modalidade de psicoterapia foi
desenvolvida por J. L. Moreno. Sua linha de ação é o desempenho dos
vários papéis por parte do paciente em seu cotidiano.
Você sabe quais as
principais classes de
medicações psiquiátricas?
As principais classes de medicações psiquiátricas são:
antidepressivos (quadros de depressão unipolar e
transtornos de ansiedade), antipsicóticos (quadros de
agitação, psicose, transtorno bipolar e como
potencializadores de antidepressivos), ansiolíticos e
hipnóticos (ansiedade de curta duração e insônia,
respectivamente) e estabilizadores de humor (transtorno
afetivo bipolar, controle da impulsividade e como
potencializadores de antidepressivos).

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