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Piscitelli - Gênero e Violência
Piscitelli - Gênero e Violência
Piscitelli - Gênero e Violência
ISSN 0104-8333
DOSSIÊ ANTROPOLOGIA, GÊNERO E SEXUALIDADE NO BRASIL: BALANÇO E PERSPECTIVAS
Adriana Piscitelli **
Resumo
*
Recebido para publicação em 12 de fevereiro de 2014, aceito em 25 de abril
de 2014.
**
Pesquisadora do Núcleo de Estudos de Gênero – Pagu, Unicamp.
piscitelliadriana@gmail.com
http://dx.doi.org/10.1590/0104-8333201400420159
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Abstract
Introdução
1
Agradeço a atenta leitura e os comentários de Ana Fonseca e José Miguel Olivar.
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Traços de um contexto
2
A criação de comitês estaduais e municipais de enfrentamento a esse crime e
da realização de inúmeros cursos de capacitação e de campanhas conduziu à
incorporação da problemática por diversos setores da sociedade. Esse processo
tem sido alimentado por instâncias do Estado, movimentos sociais e organizações
não governamentais e, em 2014, tem ampliado consideravelmente o seu alcance
através da participação de setores religiosos, particularmente a Igreja Católica,
mediante a Campanha da Fraternidade 2014, voltada para o combate ao tráfico
humano. Apesar de ter alcances locais diferenciados, essa Campanha está
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5
(L-012.015-2009). Nessas modificações, os artigos voltados para a prostituição
que, no passado estavam agrupados sob o título “Dos Crimes Contra os
Costumes” passaram a ser incluídos no título “Dos Crimes Contra a Dignidade
Sexual”. Os artigos que, na versão de 1940, tratavam “Do Lenocínio e do Tráfico
de Mulheres”, a partir das alterações de 2005 passaram a tratar “Do Lenocínio e
do Tráfico de Pessoas” e, em 2009, “Do Lenocínio e do Tráfico de Pessoa para
Fim de Prostituição ou Outra Forma de Exploração Sexual”. A partir das
modificações de 2009, vários desses artigos (228; 229; 231 e 231a) passaram a
referir-se à exploração sexual.
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6
Postado na página do facebook do CNJ.
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Agradeço a José Miguel Olivar por ter contribuído com esta reflexão, assim
como por ter chamado minha atenção para parte do material de mídia citado
neste texto.
8
Ver: <http://blogdasesquinas.wordpress.com/2013/05/24/pega-fogo-cabare-
convocatoria-para-artistas-puta-dei-2013/>,
<http://correio.rac.com.br/_conteudo/2014/05/capa/campinas_e_rmc/179184-
puta-dei-discute-a-regulamentacao-das-prostitutas.html>;
<http://www.revistabrasileiros.com.br/2012/06/01/prostitutas-do-para-pedem-
regulamentacao-da-profissao-no-puta-dei/#.U4o6HCinta4>, consultados em
maio de 2014.
9
As Marchas das Vadias se multiplicaram pelo Brasil nos últimos três anos, mas
cada marcha realizada em âmbito local é organizada por coletivos que se
constituem de modo autônomo uns em relação aos outras, com diferentes
composições e posicionamentos políticos
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Violências
10
Sob a orientação de Peter Fry.
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Orientada por Gilberto Velho, defendida no Museu Nacional em 1984.
12
Orientada por Mariza Corrêa, defendida na Unicamp em 1986.
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13
Vale observar que essa reticência também está presente em parte da produção
internacional. Alguns trabalhos, que definem a violência como atos que
restringem o desenvolvimento ou a integridade física, psicológica, intelectual ou
emocional dos indivíduos, consideram que ela está presente em todas as relações
que as prostitutas estabelecem no local de trabalho e também fora dele (Ribeiro e
Sacramento, 2005). No entanto, linhas de abordagem contrárias descrevem
situações análogas praticamente evitando o termo violência. Assim, ambientes de
trabalho marcados por roubos e pelo uso de armas de fogo, abusos realizados
por clientes, acosso policial e pela hostilidade de outras trabalhadoras sexuais
aparecem em itens como “condições de trabalho e problemas” (Antonius-Smits
et al., 1999).
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A violência policial contra as prostitutas em Porto Alegre também é
considerada na dissertação de mestrado de Letícia Tedesco (2008).
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15
A importância do feminismo no apoio a políticas punitivas que atingem e
extrapolam a prostituição tem sido considerada na produção internacional
(Bernstein, 2012). A produção brasileira, porém, também mostra as alianças
criativas e positivas de alguns setores dos feminismos jovens, em relação às
prostitutas (Tavares, 2014).
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menor, esses sentimentos são associados a homens que viajam a procura de sexo
(Cohen, 1986).
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Nas modalidades de serviços sexuais analisadas por Bernstein (2007) em
cidades pós-industriais de países do Norte, parte significativa de uma nova
variedade de trabalho sexual consistiria em oferecer e consumir conexão
emocional e física temporária, que evoca a ideia de “afeto autêntico”, mas é
explicitamente delimitada pelo acerto comercial.
19
Na sua análise das economias afetivas do turismo heterossexual em Cuba e a
República Dominicana, Amalia Cabezas (2009) conceitualiza o sexo tático como
a utilização do sexo para aliviar as penúrias econômicas, sem eliminar o prazer, o
companheirismo e a amizade. Ela, porém, distancia esses intercâmbios sexuais e
econômicos do trabalho sexual, uma vez que o sexo tático remete a uma
atividade flexível, contingente e temporária e não se encaixa nas categorias
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Eles também são considerados na produção antropológica recente que trata de
jovens migrantes em Portugal, originários em camadas populares no Brasil
(Togni, 2014) e sobre mulheres brasileiras em prisões catalãs (Padovani, 2013).
23
Vale observar que se o programa evoca um contrato de serviços, não
necessariamente isento de afetos, a ajuda está inserida em uma tradição de
intercâmbios hierárquicos e frequentemente remete a noções de amparo,
cuidado e afeto, que se expressam em termos de contribuição para a
sobrevivência econômica e para o consumo (Piscitelli, 2011).
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Segundo Bernstein (2007), essa expansão inclui a ampliação na produção de
pornografia, a normalização de produtos sexuais comerciais para consumidoras,
como os analisados por Gregori (2010), incluindo lingerie, brinquedos sexuais e
vídeos educativos, e ainda a popularização do gênero literário das memórias das
trabalhadoras sexuais.
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25
Um viés análogo está presente nos estudos sobre África, ver Cole e Thomas, 2009.
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Considerações finais
Referências bibliográficas
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