DISSERTAÇÃO EstudoFiltroAplicado PDF
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CDU: 624.13
Catalogação: www.sisbin.ufop.br
DEDICATÓRIA
À minha família, em especial aos meus pais, Silvio e Ivani, que são responsáveis
pela minha formação.
iv
AGRADECIMENTOS
Agradeço em primeiro lugar a Deus, que permitiu que mais essa etapa importante da
minha vida fosse concluída.
Aos meus pais, Silvio e Ivani, e irmãs, Tamires e Luciene, que acreditaram no meu
potencial e me apoiaram durante toda minha caminhada.
A toda minha família, em especial, a Tia Ana pela assistência durante a etapa de
consolidação inicial do meu sonho.
v
RESUMO
vi
ABSTRACT
Several factors may put a risk in dam. The progressive loss of stability caused by some
kind of anomaly can lead to the collapse this structure. In the design, construction and
operation of a dam, the fundamental requirement should be safety, considering that
accidents involving this type of structure can have catastrophic and immeasurable
consequences. The internal erosion process is a main cause rupture of dams around the
world. One of the most efficient devices to prevent and / or contain such a process is the
internal drainage system. To assess the susceptibility or vulnerability soil eroded is
necessary to study the erodibility and internal processes soil instability, which occur
through criteria defined in the literature and more for laboratory testing. The criteria are
related primarily to particle size distribution curves of the materials and the combination
of the hydraulic gradient and effective stress. Within this context and in order to
elucidate the application of the filter design criteria, laboratory test was conducted in
soil sample and filter base. Through the test, it was possible to evaluate the filter
efficiency as the underlying soil protection, when subjected to high hydraulic gradients
values imposed by downflow of water. From the test result can have greater certainty as
to the design of the filter. Another resource available to evaluate the hydraulic gradients,
and consequently, the internal erosion is using computer programs applied on numerical
studies of flow control. There is the need to use numerical models to interpret and
quantify the quantities associated with the percolation phenomenon of a fluid in porous
media because of the difficulty that exists in framing the use of exact analytical
solutions for complex problems such as these. In this work, the Seep / W program was
used to quantify the hydraulic gradients in different sections typical dam, besides the
study of three real cases.
vii
Lista de Figuras
viii
Figura 3.11 − Critério hidráulico para fluxo horizontal (adaptado Adel et al., 1988 apud
Li, 2008).
Figura 3.12 − (a) Fotografia do aparelho de teste NEF; (b) Representação esquemática
das camadas de solos durante o ensaio (Adaptado de Soroush et al., 2011).
Figura 3.13 − Ilustração esquemática do detalhe do bocal no teste NEF (Adaptado de
Soroush e Shourijeh, 2009 apud Soroush et al., 2011).
Figura 3.14 − Detalhe mostrando vazamento concentrado através do núcleo da
barragem com descarga para o filtro à jusante (Sherard et al., 1984b apud Fell et al.,
2015).
Figura 3.15 − Equipamento hidráulico, filtro-caixa, com condições de fluxo paralelo
(Adaptado de Bakker et al., 1990 apud ICOLD, 1994).
Figura 3.16 − Limites de erosão do filtro (Adaptado de Foster, 1999; Foster e Fell,
1999a e c, 2001 Foster apud Fell et al., 2015).
Figura 3.17 − Graduações de filtros que apresentaram desempenho pobre (Adaptado de
Fell et al., 2015)
Figura 4.1 − Condições de fluxo nas interfaces de filtragem (adaptado de Fell et al.
2015).
Figura 4.2 − Filtragem e conceito de auto filtragem (adaptado de Fell et al., 2015).
Figura 4.3 − Ilustração do esquema analisado por Taylor, 1948 (Neves et al., 1985 apud
Souza, 2013).
Figura 4.4 – Ilustração esquemática do teste criado para o castelo de areia (Soroush et
al., 2012 apud Fell et al., 2015).
Figura 4.5 − Ensaio do castelo de areia, em campo (Soroush et al., 2011).
Figura 4.6 − Esquema dos passos a serem seguidos para projeto de filtro com base no
critério do USSCS, 1994 (Acosta et al., 2014).
Figura 4.7 − Esquema dos passos a serem seguidos para projeto de filtro com base no
critério do USACE, 2004 (adaptado de Acosta et al., 2014).
Figura 4.8 − Esquema dos passos a serem seguidos para projeto de filtro com base no
critério do USBR, 2011 (adaptado de Acosta et al., 2014).
Figura 5.1 − Critérios de dimensionamento de filtro.
Figura 5.2 − Curva de distribuição granulométrica da amostra do solo base.
Figura 5.3 − Curva de distribuição granulométrica da amostra do filtro.
Figura 5.4 − Série de peneiras utilizadas no ensaio.
Figura 5.5 − Pesagem do material seco, conforme quantidades definidas pela curva
ix
granulométrica proposta para o filtro.
Figura 5.6 − Aparato experimental utilizado para realização do ensaio.
Figura 5.7 − Sequência construtiva da camada de solo base.
Figura 5.8 − Sequência construtiva da camada do filtro.
Figura 5.9 − Corpo de prova finalizado.
Figura 5.10 − Corpo de prova em processo de saturação.
Figura 5.11 − Curva de forma do material do filtro.
Figura 5.12 − Visualização da amostra durante o ensaio.
Figura 5.13 − Evolução da vazão e coeficiente de permeabilidade vertical com o
gradiente hidráulico ensaiado.
Figura 5.14 − Retirada do material do filtro em quatro subcamadas.
Figura 5.15 − Quantificação dos finos na camada do filtro após o ensaio de percolação.
Figura 5.16 − Quantificação da contaminação da camada do filtro após o ensaio de
percolação.
Figura 6.1 − Curva característica (Geo-Slope, 2012).
Figura 6.2 – Diminuição da área útil para o fluxo de água (Morales, 2008 apud
Reichardt e Timm, 2004).
Figura 6.3 − Valores de k versus o Potencial mátrico para três solos hipotéticos (Freeze,
1978 apud Campos, 1998).
Figura 6.4 − Esquema do ensaio da barragem de aterro na altura em que imobilizou o
nível da água (Ferreira, 2008).
Figura 6.5 − Fotografia da barragem de aterro em enchimento com fenda na crista
(Ferreira, 2008).
Figura 6.6 − Ruptura provocada pela erosão interna na barragem (Ferreira, 2008).
Figura 6.7 − Evolução das trajetórias de corante no corpo da barragem (Ferreira, 2008).
Figura 6.8 − Linhas de fluxo e nível freático obtidos via simulação numérica (Ferreira,
2008).
Figura 6.9 − Modelos reduzidos estudados (Marques e Unas, 2010).
Figura 6.10 − Comparação dos resultados dos modelos propostas para os métodos
físico, numérico e gráfico (Marques e Unas, 2010).
Figura 6.11 − Seção 1: Barragem de terra com tapete drenante.
Figura 6.12 − Seção 2: Barragem de terra com filtro vertical e tapete drenante.
Figura 6.13 − Seção 3: Barragem de terra com filtro vertical inclinado e tapete drenante.
Figura 6.14 − Seção 4: Barragem de terra com dreno de pé.
x
Figura 6.15 − Seção 5: Barragem de enrocamento com núcleo argiloso (impermeável).
Figura 6.16 − Seção 6: Barragem zoneada de terra e enrocamento.
Figura 6.17 − Curva de retenção do aterro compactado.
Figura 6.18 − Função permeabilidade do aterro compactado.
Figura 6.19 − Ponto de singularidade formado por segmentos retos (Geo-Slope, 2016).
Figura 6.20 − Critério para quantificar o gradiente máximo – Seção 5.
Figura 6.21 − Exemplo de delimitação das interfaces onde foram obtidos os resultados.
Figura 6.22 − Delimitação região onde foram obtidos os resultados.
Figura 6.23 − Seção 1: Diagrama Gradiente X.
Figura 6.24 − Seção 2: Diagrama Gradiente X.
Figura 6.25 − Seção 3: Diagrama Gradiente X.
Figura 6.26 − Seção 4: Diagrama Gradiente X.
Figura 6.27 − Seção 5: Diagrama Gradiente X.
Figura 6.28 − Seção 6: Diagrama Gradiente X.
Figura 6.29 − Seção transversal típica da Barragem de Emborcação (Divino, 2010).
Figura 6.30 − Diagrama de distribuição de carga hidráulica (equipotenciais) na
Barragem Emborcação.
Figura 6.31 − Quantificação do gradiente hidráulico máximo para Barragem de
Emborcação.
Figura 6.32 − Diagrama Gradiente X, Barragem de Emborcação.
Figura 6.33 − Seção de maior altura da barragem de Irapé (CCI, 2003b apud Aires,
2006).
Figura 6.34 − Diagrama de distribuição de carga hidráulica (equipotenciais) na
Barragem Irapé.
Figura 6.35 − Quantificação do gradiente hidráulico máximo para Barragem de Irapé.
Figura 6.36 − Diagrama Gradiente X, Barragem de Emborcação.
Figura 6.37 − Seção transversal típica da Barragem Bico da Pedra (Montes, 2003).
Figura 6.38 – Seção do modelo numérico calibrado Barragem Bico da Pedra (Montes,
2003).
Figura 6.39 – Diagrama de distribuição de carga hidráulica (equipotenciais) na
Barragem Bico da Pedra.
Figura 6.40 – Diagrama Gradiente X, Barragem de Bico da Pedra.
xi
Lista de Tabelas
xii
Tabela 4.1 − Influência da porcentagem de finos passantes na peneira nº 100 na
permeabilidade do filtro de agregado lavado (Cedergren, 1967).
Tabela 4.2 − Probabilidade do filtro em conter fissuras, com base no teste de castelo de
areia (Soroush et al., 2012 apud Fell et al, 2015).
Tabela 4.3 − Resumo de alguns critérios de filtros estabelecidos desde os estudos de
Terzaghi.
Tabela 4.4 − Critérios de filtro de acordo com Sherard e Dunnigan (1985, 1989)
(adaptado de Fell et al., 2015).
Tabela 4.5 – Proposta para o critério de filtro baseado nas análises estatística dos
resultados dos ensaios NEF (Foster, 1999; Foster e Fell, 1999a, 2001).
Tabela 5.1 – Quantitativo definido para cada peneira.
Tabela 5.2 – Gradientes hidráulicos definidos em cada ciclo do ensaio.
Tabela 6.1 – Parâmetros de fluxo dos materiais dos modelos de estudo.
Tabela 6.2 – Resumo dos resultados do gradiente hidráulico na interface entre aterro/
fundação e filtro/tapete drenate.
Tabela 6.3 – Resumo dos resultados do gradiente hidráulico de saída, vazão e
velocidade de fluxo.
Tabela 6.4 – Parâmetros de fluxo dos materiais (Divino, 2010).
Tabela 6.5 – Parâmetros de fluxo dos materiais (Aires, 2006).
Tabela 6.6 – Parâmetros de fluxo dos materiais (Montes, 2003).
Tabela 6.7 – Quantificação do gradiente hidráulico, Barragem Bico da Pedra.
xiii
Lista de Símbolos, Nomenclatura e Abreviações
d Diâmetro da amostra
e Índice de vazios
g Grama
h Altura da amostra
h’ e h” fatores de uniformidade
i Gradiente hidráulico
ic Gradiente hidráulico crítico
ix Gradiente hidráulico horizontal
iy Gradiente hidráulico vertical
k Coeficiente de permeabilidade
kv Coeficiente de permeabilidade vertical
l Litro
m Metro
n Porosidade
pp%0,075mm Percentual de finos menores que as partículas de diâmetro igual a
0,075mm
v Vazão
wot Teor de umidade ótimo
A Área da seção transversal
ABNT Associação Brasileira de Normas Técnicas
ANCOLD Australian Committee on Large Dams
ASCE American Society of Civil Engeneers
ASTM American Society for Testing and Materials
CBDB Comitê Brasileiro de Barragens
CEF Continuing Erosion Filter
CR Compacidade Relativa
Cu Coeficiente de uniformida
D Diâmetro dos grãos do solo
D100FMÁX. Diâmetro máximo através do qual 100% do material do filtro passará
xiv
D10FMÍN. Diâmetro mínimo através do qual 10% do material do filtro passará
D15B Diâmetro através do qual 15% do material do solo base passará
D15F Diâmetro através do qual 15% do material do filtro passará
D15FMÍN. Diâmetro mínimo através do qual 15% do material do filtro passará
D15g Diâmetro com 15% passante na fração grosseira
D50FMÍN. Diâmetro mínimo através do qual 50% do material do filtro passará
D5FMÍN. Diâmetro mínimo através do qual 5% do material do filtro passará
D85B Diâmetro através do qual 85% do material do solo base passará
D85f Diâmetro com 85% passante na fração fina
D90FMÁX. Diâmetro máximo através do qual 90% do material do filtro passará
D95B Diâmetro através do qual 95% do material do solo base passará
F Porcentagem de massa de grãos com diâmetros inferiores a um
determinado diâmetro D
FEMA US Federal Emergency Management Agency
Gs Peso específico relative dos sólidos do solo
H Porcentagem de massa de grãos com diâmetros entre D e 4D
HCT Hidraulic Consolidation Test
HET Hole Erosion Tests
ICOLD International Commission on Large Dams
JET Jet Erosion Tests
L Comprimento
N1 Fluxo normal de interface, condições de altos gradients hidráulicos
N2 Fluxo normal de interface, condições de baixos gradients hidráulicos
NBR Norma Brasileira
NEF No Erosion Filter
P Fluxo paralelo à interface
PAE Plano de Ação Emergencial
PNSB Política Nacional de Segurança de Barragens
Vazão de saída
RCT Rotating Cylinder Tests
SET Slot Erosion Tests
UNSW Universidade de Nova Gales do Sul
USACE United States Army Corps of Engineers
USBR United States Bureau of Reclamation
xv
USDA-SCS United States Department of Agriculture, Soil Conservation Service
USSCS United States Soil Conservation Service
Perda de carga
Potencial de pressão
Potencial gravitacional
Potencial matricial
Potencial total
µ Viscosidade dinâmica
γ’ Peso específico submerso do solo
γw Peso específico da água
θ Teor de umidade volumétrico
θr Teor de umidade volumétrico residual
θs Teor de umidade volumétrico saturado
ρ Densidade específica
ρdmáx Densidade específica seca máxima
ρdmín Densidade específica seca mínima
σ’v Tensão efetiva vertical
xvi
SUMÁRIO
CAPÍTULO 1 − INTRODUÇÃO
1.1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS ................................................................................. 1
3.2.1 Iniciação.......................................................................................................... 31
3.2.1 Continuação .................................................................................................... 34
3.2.1 Progressão ....................................................................................................... 37
3.2.1 Mecanismo Final de Falha .............................................................................. 38
3.3 FATORES QUE INFLUENCIAM A EROSÃO INTERNA .................................. 38
xvii
3.4.1 Critérios para Avaliação da Instabilidade Interna .......................................... 42
3.4.2 Critério Geométrico de Kenney and Lau (1985, 1986) .................................. 46
3.4.3 Critério Hidráulico de Adel et al. (1988) ........................................................ 49
3.5 ERODIBILIDADE DO SOLO ................................................................................ 50
xviii
5.7 APRESENTAÇÃO DOS RESULTADOS .............................................................. 93
xix
CAPÍTULO 1
INTRODUÇÃO
Estudos mostram que o processo de erosão interna é uma das principais causas de
ruptura em barragens em todo o mundo. Segundo publicação do U.S. Department of the
Interior Bureau of Reclamation (2007), o total de falhas em barragens relacionado à
erosão interna é de 49,60%. É comum que onde haja fluxo de água do material mais
fino para o mais grosso, o transporte de partículas finas possa acontecer. O carreamento
excessivo de partículas é caracterizado como uma patologia. Caso ocorra na fase inicial
de operação um carreamento de finos do solo base (material argiloso) para o filtro,
espera-se que o processo seja estabilizado, de modo que o filtro continue atendendo às
premissas de projeto adotadas a priori.
1
Os filtros devem ser dimensionados para atender aos critérios básicos de retenção e
permeabilidade, que a princípio parecem ser critérios antagônicos. No entanto, estas
condições supõem que as dimensões dos vazios no material do filtro devem ser
suficientemente pequenas para reter as partículas maiores do material protegido e, ao
mesmo tempo, o material deve ter permeabilidade suficiente para impedir a indução de
forças elevadas de percolação e pressões hidrostáticas aplicadas aos filtros.
1.3. METODOLOGIA
3
4. Emprego da modelagem numérica de fluxo como uma ferramenta útil para
estudos ainda na fase de projeto, oferecendo informações quanto à vazão,
poropressão, gradiente hidráulico e outras variáveis relacionadas à erosão
interna. Os estudos foram realizados para seções típicas de barragens,
comumente adotadas em projeto, e elaboração de três estudos de casos reais de
barragens.
Essa dissertação foi estruturada em sete capítulos e um anexo, de acordo com a seguinte
abordagem:
4
No Capítulo 4 são apresentadas algumas características intrínsecas do material de filtro,
como permeabilidade, filtragem, auto filtragem e cicatrização. Em seguida, são
abordados os métodos propostos para dimensionamento de filtros, desde o publicado
por Terzaghi, baseados na distribuição granulométrica dos materiais envolvidos no
processo de filtragem, até os mais recentes, apresentados na literatura.
5
CAPÍTULO 2
A construção de barragens é uma arte antiga praticada por várias civilizações, com
destaque para os antigos egípcios que foram pioneiros na construção dessas estruturas
entre 2.950 a.C. e 2.750 a.C, devido especialmente aos extensos períodos de seca a que
estavam sujeitos (Jesus, 2011). Inicialmente, as civilizações visavam apenas o
armazenamento de água para abastecimento e irrigação, e mais recentemente à
possibilidade de produção de energia elétrica, entre outros fins.
Estas estruturas geotécnicas podem ter usos múltiplos, servindo duas ou mais
finalidades, das quais para armazenamento e abastecimento de água, fornecimento de
água à indústria, irrigação, combate a incêndios, regularização e controle de cheias,
recreio e navegação, geração de energia hidroelétrica, dessedentação, piscicultura e
contenção de rejeitos.
Massad (2010) comenta que, no Brasil, as barragens de terra são mais utilizadas devido
às condições topográficas, com vales muito abertos, e à disponibilidade de material
terroso. Além disso, este tipo de barragem tolera fundações mais deformáveis, podendo
ser construir sobre solos moles, como no caso da barragem do rio Verde, próximo à
Curitiba, com 15,0 m de altura máxima.
Em relação às outras barragens, uma barragem de aterro implica, desde logo, uma
preocupação acrescida com os estudos de percolação, uma vez que a passagem de água
através do corpo da barragem é uma realidade. Estes estudos, bem como os de
estabilidade, deverão ser acompanhados por um eficaz sistema de monitoramento em
7
fase de construção e em serviço, para averiguar a funcionalidade e segurança de todo o
sistema (Souza, 2013).
8
2.2.2. Barragem de Terra – Enrocamento
Os fatores que concorrerão para a escolha de uma barragem de seção mista terra e
enrocamento serão (Eletrobrás, 2013):
9
(transversais), podendo criar um caminho preferencial de fluxo através do núcleo e até
levar à ruptura da barragem por erosão interna (Divino, 2010).
10
As ações mais frequentes tomadas após a falha são abandono do projeto (36%),
construção de uma barragem com novo projeto (17%) e reconstrução total com o
mesmo projeto (16%).
Segundo o USBR (2007 apud Souza, 2013), a Universidade de Nova Gales do Sul
(UNSW) faz uma relação e resumo dos modos de falhas/rupturas em barragens e seus
respectivos percentuais de ocorrência, como apresentado na Tabela 2.1, com destaque
para o piping como umas das principais causas de ruptura.
11
Figura 2.2 – Tipos de rupturas em barragens de aterro, estatística feita até 1986, inclui
apenas grandes barragens (Foster et al., 2000 apud Sousa, 2013).
A Tabela 2.2 apresenta a probabilidade anual de ruptura por erosão interna, em
barragens, segundo ANCOLD (Australian Committee on Large Dams).
Tabela 2.2 – Probabilidade anuais de ruptura por erosão interna (ANCOLD apud
Silveira e Machado, 2005).
Muitos casos de rupturas em barragens foram registrados ao longo dos anos. A Tabela
2.3 apresenta uma síntese de alguns acidentes registrados no mundo, nos quais o modo
de falha mais provável teria sido a erosão interna.
12
A Tabela 2.4 apresenta a análise das causas que desencadearam o piping, com as
respectivas incidências, associadas aos casos de piping em barragens construídas entre
1978 e 1980 e levantados por Hsu (1981 apud Cruz, 2004).
Tabela 2.3 – Registro de alguns casos de ruptura de barragem por piping (adaptado
Silva, 2012 e Kaplan, 2010).
Barragem Ano/Local Causa provável
Gradiente hidráulico excessivo na
fundação junto da trincheira drenante.
Teton 1979, Estados Unidos
Emprego de solo altamente susceptível
ao processo de piping.
Piping no material do talude ao longo do
CSC Orchards 1995, Estados Unidos
conduto vertedouro de soleira.
Construção da ombreira esquerda da
Barragem de Camará 2004, Alagoa Grande (PB) barragem em fundação de rocha alterada,
por onde o processo erosivo teve início.
Apertadinho 2008, Rondônia Piping na região do vertedouro.
Piping no contato do maciço de terra
Espora 2008, Rondônia
com a estrutura de concreto do vertedor.
Cabixi II 2008, Rondônia Piping.
Piping no contato do vertedouro e
Mineração Casa da Pedra 2008, Congonhas (MG)
maciço.
Tabela 2.4 – Piping em barragens – causas principais (Hsu, 1981 apud Cruz, 2004).
13
Tabela 2.5 – Acidentes com barragens no mundo com mais de 300 fatalidades (Silva,
2012).
Geração Mortes Mortes
Local Descrição
elétrica (min) (max)
Japão Forte chuva destrói barragem do lago Iruka não 941 1.200
EUA Colapso da barragem de South alaga a cidade de Johnstown não 2.200 2.209
Índia Colapso da barragem de Tigra alaga a cidade de Gwalior não 1.000 1.000
Itália Colapso da barragem de Gleno sim 356 600
EUA Ruptura da barragem de Saint Francis, na Califórnia sim 426 500
Paises
Tempestade do Mar do Norte causa ruptura de vários diques não 1.835 1.835
Baixos
China Falha da barragem de Lomngtun não 707 707
Colapso da barragem de Malpasset alaga as cidades de
França sim 361 500
Malpasset, Bozon e Fréjus
China Falha da barragem de Tiefosi não 1.092 1.092
Colapso das barragens de Panshet e Khadakwasla provocam
Índia não 1.000 1.250
inundação da cidade de Pune
Alemanha Tempestade do Mar do Norte causa ruptura de vários diques não 315 315
China Falha da barragem de Liujiatai e outras na bacia do Rio Hai não 948 5.616
Deslizamento de encosta causa transbordamento da barragem de
Itália sim 1.900 2.500
Vaiont, destruindo Longarone e outras vilas
Falha de barragem de rejeitos de mineração destrói a vila de
Bulgária não 488 488
Sgorigrad
China Falha da barragem de Hengjiang sim 779 779
China Falha da barragem de Lijiazui não 580 580
Rompimento das barragens de Banqiao, Shimantan e outras 60
China sim 26.000 230.000
atingidas pelo Tufão Nina na bacia do Rio Amarelo
Índia Colapso de barragem de Machhu II inunda a cidade de Morvi sim 1.500 2.500
Falha da barragem de Hirakud, no Rio Mahanadi, provoca
Índia sim 200 1.000
inundação
Rompimento da barragem de Gouhou, próximo à cidade de
China não 290 1.200
Gonghe
Ruptura de diques na cidade de Nova Orleans pelo Furacão
EUA não 1.464 1.464
Katrina
Apesar das fatalidades vinculadas aos acidentes, Silva (2012) ressalta que estes servem
de catalisadores do processo tecnológico e provocam reações da sociedade que
estimulam o debate em torno do assunto. O debate é de suma importância uma vez que
gera pressão para regulamentações e estabelecimento de obrigações cada vez mais
severas a fim de se reduzir os riscos.
14
2.4. SEGURANÇA DE BARRAGENS
Biedermann (1997 apud Fusaro, 2012) considera que a segurança de barragens pode ser
obtida apoiando-se em três pilares básicos: segurança estrutural (projeto, construção e
15
manutenção adequados), monitoramento e gestão de emergências, como apresentado na
Figura 2.3.
A Lei nº12.334/2010 tem como maior mérito exigir e uniformizar as ações de controle
da Segurança de Barragens para todos os tipos de empreendimento, sejam barragens de
água ou de resíduos, bem como para as diversas finalidades como mineração, irrigação,
geração de energia, entre outros.
16
citados o Critério de Projeto Civil de Usinas Hidrelétricas, da Eletrobrás (2003), o Guia
Básico de Segurança de Barragens de 2001, publicado pelo Comitê Brasileiro de
Barragens, e o Manual de Segurança e Inspeção de Barragens de 2002, publicado pelo
Ministério da Integração Nacional.
Entretanto, mesmo sendo a erosão interna a segunda causa de ruptura mais recorrente
em barragens, poucas informações se obtêm nesses documentos, a esse respeito. Em
contrapartida, esses documentos apresentam uma ampla abordagem sobre estabilidade
de taludes, Plano de Ação Emergencial (PAE), inspeções e instrumentações, entre
outros assuntos.
Resumidamente, Silveira (2013) comenta que acidentes com barragens poderiam ser
evitados ou reduzidos ao mínimo se houvesse um projeto bem realizado e detalhado, se
a construção fosse realizada por uma empresa experiente e idônea, se fosse operada por
uma equipe treinada para atuar em situações de emergência, e se a instrumentação fosse
adequadamente lida e analisada. Com todas essas etapas adequadamente realizadas, ter-
se-ia uma barragem segura durante toda sua vida útil, geralmente de 50 anos.
17
2.5. IMPORTÂNCIA DA AUSCULTAÇÃO DE BARRAGENS
Uma vez que o projeto e construção adequados são fundamentais, mas não suficientes
para garantir a continuidade da operação segura das barragens, deve ser estabelecido um
processo de acompanhamento e avaliação permanentes do desempenho destas
estruturas. Este processo é usualmente denominado de auscultação de barragens, e
engloba as atividades de observação, detecção e caracterização de eventuais
deteriorações que possam aumentar o potencial de risco de uma estrutura (Fonseca,
2003).
Este autor esclarece que um plano de auscultação bem programado se dá por meio da
instalação de instrumentação suficiente, lida e interpretada adequadamente, com
frequência apropriada e acompanhado de inspeção visual in situ.
19
Tabela 2.6 – Principais causas de comportamento insatisfatório de barragens e sistemas
usuais de observação (Cruz, 2004).
Comportamento Causa Sistema de observação
Chuva intensa
Galgamento de ondas de Inspeção visual
montante
Transbordamento
Taludes e éreas de jusante
Erosão interna Batimento de ondas de
Inspeção visual
jusante
Velocidade tangencial da
Batimetria
água de jusante
Talude de montante Batimento de ondas
Trincas/canalíticos
Inspeção visual
Erosão interna Deficiência de
Instrumentação
compactação/interfaces
Deterioração da fundação ou
do maciço Inspeção visual
Cisalhamento Sismos Topografia
Poropressões Instrumentação
Recalques diferenciais
Ressecamento Inspeção visual
Trincas Inspeção visual
Ruptura hidráulica
Instrumentação
Este autor ressalta que os sistemas de drenagem constituem a principal defesa contra
fluxos concentrados e preferenciais. Nas barragens homogêneas, além do controle do
fluxo, eles são importantes para a estabilidade do espaldar de jusante, já que abatendo a
linha freática, anulam-se os efeitos das poropressões de percolação em praticamente
toda a região a jusante do eixo da barragem. Além deste benefício, a drenagem
regulariza a saída do fluxo, tanto da própria barragem como da fundação, atenuando as
pressões e disciplinando seu escoamento para jusante da barragem. Nas fundações
20
muito permeáveis ou com feições preferenciais de fluxo, a drenagem é o elemento que
proporciona o controle efetivo das pressões de saída d’água.
Como recomendação de ordem prática, Cruz (2004) diz que é de todo aconselhável
levar os sistemas internos de drenagem (sejam verticais ou inclinados) até o N.A.
máximo normal do reservatório, e lançar dreno horizontal no contato com a fundação.
21
Dreno de saída ou de pé (coletor dos drenos vertical ou inclinado e horizontal)
na barragem;
Trincheira drenante na fundação das ombreiras;
Furos de drenagem e poços de alívio na fundação.
Para selecionar o material adequado do filtro, é preciso que o material seja permeável o
suficiente para permitir o livre escoamento da água, sem alteração da estrutura
granulométrica do filtro, e ser fino o suficiente para evitar a migração de partículas do
solo, a ser protegido, através dos seus poros.
Figura 2.4 – Barragem de terra sem sistema interno de drenagem (Lambe e Whitman,
1969).
Deste modo, é necessário inserir drenos que proporcionem o abatimento da posição do
nível d’água dentro do aterro da barragem. As Figuras 2.5 a 2.7 ilustram exemplos de
sistemas de drenagem interno em barragens de terra, destacando-se que em barragem
zoneada de terra e enrocamento, o espaldar de jusante construído com enrocamento já
desempenha a função de drenagem da água que passa através do aterro menos
permeável.
Figura 2.5 – Barragem de terra com sistema interno de drenagem tipo dreno horizontal
(Lambe e Whitman, 1969).
22
Figura 2.6 – Barragem de terra com sistema interno de drenagem tipo dreno vertical
inclinado (Lambe e Whitman, 1969).
O dreno vertical (ou inclinado) deve se estender por toda a extensão longitudinal
da barragem e até a elevação do nível d’água máximo normal de operação do
reservatório. O dreno vertical só é recomendável para barragens até 20,0m
(máximo de 30,0m), por questões de concentração de tensões no mesmo. Para
barragens maiores, deve-se adotar o dreno inclinado;
A espessura do dreno vertical (ou inclinado) é função do método construtivo e
dos equipamentos de construção. De qualquer forma, não deve ser inferior que
0,6 a 0,8m, para prevenir qualquer falha devido à contaminação do solo
adjacente;
O dreno horizontal não deve ter espessura superior a 2,0m, por motivos
econômicos. Em casos de maiores vazões, deve-se recorrer ao dreno-sanduíche.
23
Por razões construtivas, o valor mínimo da espessura desse dispositivo é de
0,25m;
O dreno de saída ou pé deve ter altura, no mínimo, igual a duas vezes a
espessura do dreno horizontal, e largura de crista mínima de 4,0m;
Trincheiras drenantes, na fundação de ombreiras, devem ter largura mínima de
0,6 a 0,8m e profundidade máxima de 3,5m;
Furos de drenagem devem ser executados em uma só linha e com espaçamento
médio de 3,0m até a profundidade ditada pelas condições de fundação.
Na maioria das vezes, o fluxo pela fundação das barragens pode ser dominante, sendo
superior ao fluxo pelo maciço. O dreno horizontal, neste caso, tem a função principal de
controlar o fluxo pela fundação e não de direcionar o fluxo do maciço ou dreno vertical,
para jusante da barragem. Para seu melhor desempenho, o dreno horizontal deve ser
contínuo e revestir toda a área da fundação e ombreiras.
Como o fluxo pela fundação pode e na maioria das barragens é dominante, ou seja, é
bastante superior ao fluxo pelo maciço compactado, o projeto de vedação de fundação
conta com os seguintes sistemas (Cruz, 2004):
24
Cut-off para tratamento em fundações em areias, aluviões, areno argilosos com
granulometria descontínua, colúvios com permeabilidade mais elevada que o
elemento vedante da barragem, e em descontinuidades permeáveis em solos
residuais e saprolíticos e saprólitos;
Diafragmas rígidos, plásticos, colunas injetadas, colunas secantes de concreto,
para controle de fluxo em formações arenosas e em cascalho;
Tapetes vedantes.
25
CAPÍTULO 3
O piping pode ser definido como uma fase potencial de progressão da erosão interna,
que tem início a jusante e resulta na formação de um túnel contínuo entre montante e
jusante da barragem ou sua fundação. Erosão interna é comumente descrita como
“erosão interna e piping”, mas o piping é realmente o culminar de um processo de
erosão em que um número de fases deve ocorrer e serem sustentadas, a fim de que um
26
tubo (pipe) desenvolva através da barragem ou a sua fundação e permita a passagem de
quantidades consideráveis de água que podem conduzir a uma ruptura (ICOLD, 2013).
Segundo o ICOLD (2015) e Fell et al. (2015), além disso, o processo de erosão interna
pode ser dividido em quatro fases de desenvolvimento sendo iniciação, continuação,
27
progressão e finalmente o colapso da estrutura geotécnica, como apresentados na Figura
3.1.
(a) Erosão interna através do aterro de uma barragem, iniciada devido à erosão regressiva e
erosão por vazamento concentrado, respectivamente.
(b) Erosão interna através da fundação de uma barragem, iniciada a partir do processo de erosão
regressiva com piping.
(c) Erosão interna do aterro para fundação de uma barragem iniciada a partir do processo de
erosão regressiva com piping.
Figura 3.1 – Modelos conceituais de processo de colapso por erosão interna (ICOLD,
2015; Fell et al., 2015).
28
Para efeitos práticos, Fell et al. (2015) sugerem o refinamento deste processo na
seguinte sequência genérica de eventos mostrada na Figura 3.2.
Figura 3.2 – Árvore de eventos do processo de erosão interna (Fell et al., 2015).
Fell et al. (2015) e ICOLD (2015) destacam que a primeira condição para ocorrência da
erosão interna é a desagregação das partículas do solo. A água escoa através da
barragem ou flui entre trincas com velocidade suficiente para fornecer energia para
separar as partículas da estrutura do solo. A natureza do solo do aterro ou fundação
determina a sua vulnerabilidade à erosão e o seu mecanismo de erosão interna. Assim,
três classes de solo podem ser distinguidas, de acordo com sua natureza:
Solo não plástico: tais como siltes, areias, areias siltosas e areias siltosas com
pedregulhos; estes solos colapsam quando saturados, geralmente não sustentam
rachaduras/fissuras quando saturados e são erodidos com relativa facilidade;
como solos pouco coesivos se tornam mais grossos do silte para a pedregulho e
progressivamente requerem maior energia para iniciar a erosão; a resistência à
erosão está relacionada com o peso da partícula e, em alguns casos, estado de
tensões e desprendimento de partículas; estes solos estão sujeitos à erosão
regressiva, a erosão de contato ou sufusão dependendo da sua distribuição
granulométrica;
29
Solo plástico: tais como argila, areia argilosa e areia argilosa com pedregulho;
são geralmente mais resistente à erosão do que os solos pouco coesivos; estes
solos estão sujeitos à erosão por vazamento concentrado e erosão de contato;
erosão regressiva e sufusão não ocorrem sob gradientes hidráulicos normalmente
experimentados em barragens e suas fundações, mas pode ocorrer em locais
cujo gradiente hidráulico é muito elevado; solos argilosos sustentam
rachaduras/fissuras mesmo quando saturados; emprego de maior energia para
separar as partículas a partir de trincas ou vazamento concentrado, mas em
sendo removidas as partículas são pequenas e facilmente transportadas através
da rachaduras/fissuras; a resistência à erosão está relacionada a força de contato
entre a água, que percola através das trincas ou vazamento concentrado, e a
tensão de cisalhamento crítica do solo;
Solo plástico dispersivo: solo em que, por causa da sua mineralogia e da química
da água, a erosão vai iniciar em trincas ou vazamento concentrado sob baixa
tensão e gradiente hidráulicos.
3.2.1. Iniciação
31
Existem duas formas de erosão regressiva, “erosão regressiva com piping” e “erosão
regressiva global”. No primeiro caso, em solos arenosos o tubo de erosão é
essencialmente horizontal e o teto do tubo é formado por uma camada de solo coesivo.
Para a “erosão regressiva global” são formados tubos de erosão regressiva curtos, mas
estes colapsam sucessivamente resultando em erosão generalizada. Duas formas de
“erosão regressiva global” são reconhecidas. Na primeira, cavidades subverticais são
formadas em núcleos de maciços compostos por areias siltosas de granulometria aberta
(mal graduada) e cascalhos (não plásticos), já na segunda, ocorre o desembricamento
dos taludes de jusante de maciços areno-siltosos e de cascalhos.
Kovacs (1981 apud Barrera, 2010) descreveu o piping como um “efeito de fervura”,
quando um movimento significativo de partículas, ao longo da linha de fluxo, cria um
canal de alta permeabilidade dentro da camada e as partículas sólidas parecem “ferver”
na saída deste canal.
De acordo com Fell et al. (2005), Von Thun (1996) descreve quatro condições que
devem existir para ocorrência da erosão regressiva com piping, sendo elas:
32
C. Iniciação por Erosão de Contato
É uma forma de erosão interna que envolve a erosão seletiva das partículas finas no
contato com uma camada mais grossa, causada por um fluxo que passa pela camada
mais grossa. Refere-se apenas a condições em que o fluxo na camada mais grosseira é
paralelo à interface entre a camada grossa e a fina. A erosão seletiva de partículas finas,
a partir do contato com uma camada mais grossa, causada pelo escoamento através da
camada fina com fluxo normal à superfície de contato é considerada em outra fase do
processo de erosão: continuação.
Segundo ICOLD (2015), para a sufusão ocorrer os seguintes critérios devem ser
satisfeitos, sendo:
33
Critério 1: O tamanho das partículas finas do solo deve ser menor do que o
tamanho dos espaços formados pelas partículas grossas, que constituem o
esqueleto básico do solo;
Critério 2: A quantidade de partículas finas do solo deve ser apenas suficiente
para preencher os vazios do esqueleto do solo base, formado pelas partículas
grossas. Se existir mais partículas finas do que o necessário para preencher os
vazios, as partículas grossas irão "flutuar" na matriz de finos, em vez de formar
o esqueleto do solo;
Critério 3: A velocidade de fluxo, através da matriz do solo, deve impor uma
tensão suficientemente elevada para superar as tensões efetivas do solo e mover
as partículas finas através dos vazios.
3.2.2. Continuação
A fase de continuação da erosão está atrelada ao fato de a barragem contar ou não com
um sistema de drenagem interna. No caso de contar com um sistema de drenagem
interna, outro ponto importante a avaliar é se este sistema é eficiente, ao passo de
interromper o processo de erosão. No item 3.7 são discutidos os critérios de
classificação dos limites de erosão.
34
Figura 3.3 – Alguns tipos de maciço praticados na engenharia de barragens (Foster et
al., 1998 apud Filho, 2013).
1. Barragem
homogênea sem Não há potencial
filtro para filtragem. A
interceptando erosão contínua é
totalmente o certa.
aterro.
Fissura/alta
permeabilidade
2. Maciço de
através do núcleo
jusante com
pode se estender
material coesivo,
para o maciço de
capaz de manter
jusante ou não, e
uma fissura/
encontrar uma
tubulação.
saída desprotegida
(sem filtro).
Avaliar a
3. Zona de filtro/
probabilidade da
transição à
zona de filtro ou
jusante do núcleo
transição ser eficaz
ou zona do
usando os critérios
maciço de
de projeto de filtro
jusante incapaz
de Foster (1999),
de manter uma
Foster e Fell
fissura/tubulação.
(1999a, 2001).
Para a continuação
da erosão através
de um fissura/junta
4. Piping em uma aberta, esta deve
junta ou fissura ser suficientemente
aberta. aberta para
permitir que o solo
em volta passe
através dela.
Cenário aplicável
se o caminho de
infiltração que vai
para o dreno de pé
pode conduzir à
5. Erosão em erosão contínua os
direção ao dreno materiais do aterro
de pé. ou fundação.
Avaliação
considerando
detalhes de projeto
e construção do
dreno.
36
3.2.3. Progressão
Uma vez iniciada e não interrompida pela ação do filtro na barragem, a erosão interna
vai progredir caso existam condições hidráulica e/ou mecânica adequadas (ICOLD,
2015), das quais:
Condição hidráulica adequada: a água que escoa através da barragem, deve gerar
uma velocidade de percolação de modo a fornecer energia, ou força de arraste,
suficiente para continuar a transportar as partículas do solo, ao longo de
aberturas e superfícies externas da barragem, em um processo contínuo;
Condição mecânica adequada: a água só escoa através de caminhos preferenciais
na barragem porque esses caminhos são criados por fratura hidráulica e/ou o
“tubo” ou cavidade, através da qual as partículas erodidas estão sendo
transportadas, não colapsa. Solos plásticos (coesivos), quando saturados e
parcialmente saturados, podem sustentar aberturas pelo solo criando “teto” e
“parede”. Solos como siltes não plásticos, areias e cascalhos, em geral, não
conseguem sustentar o “teto” da abertura, entrando em colapso quando são
saturados. No entanto, solos não plásticos parcialmente saturados e com elevado
percentual de finos podem conter uma abertura ao longo da superfície freática,
pelo efeito da sucção, podendo entrar em colapso com a saturação.
37
interrompendo a progressão da erosão. Para que isto ocorra, deve existir um filtro de
transição a jusante do núcleo para interceptar as partículas erodidas (ICOLD, 2015).
Caso as fases da erosão interna tenham sido concluídas sem ocorrência de processos de
estabilização, combinadas com o insucesso das ações de detecção e intervenção do
processo é praticamente inevitável o colapso da barragem. A ruptura ocorrerá por um
dos mecanismos mais comuns listados por Fell e Fry (2007 apud Filho, 2013), como
apresentados na Figura 3.4, por ordem de frequência observada de ocorrência.
Figura 3.4 – Mecanismos finais de falha devidos a eventos de erosão interna (Fell e Fry,
2007 apud Filho, 2013).
Foster e Fell (2000 apud Fell et al., 2005) apresentam, na Tabela 3.3, uma classificação
resumida sobre os fatores que influenciam a probabilidade de iniciação, continuação e
progressão da erosão, finalizando com o colapso da barragem. O que se segue é um
resumo das informações apresentadas, principalmente para auxiliar na avaliação de
38
barragens existentes. Um ponto discutido também é fornecer um guia útil que fomente a
execução de obras aplicando-se as boas práticas de engenharia, para reduzir a
probabilidade de problemas de erosão interna nas novas barragens.
Tabela 3.3 - Probabilidade de erosão interna e piping no aterro sobre efeitos de projeto e
construção (Foster e Fell, 2000 apud Fell et al., 2005).
Importância Relativa
Fator
Início Continuação Progressão Colapso
Geometria
Zoneamento geral B - M A
Largura do núcleo M/A - B B
Largura/altura do núcleo B/M - M B
Largura da crista - - - B/M
Borda livre - - - M/A
Propriedades da zona à jusante - - M/A A
Filtro - A A M
Compatibilidade do núcleo da barragem
Classificação M - A B
Erodibilidade/dispersividade B - A B
Densidade de compactação M - M B
Teor de umidade de
A - A B
compactação
Permeabilidade M - M B
Grau de saturação M - A B
Fundação
Irregularidades em grande escala A - B -
Irregularidades em pequena
M - B -
escala
Compressibilidade dos solos M - B B
Conduto
Se presente A - A B
Detalhes tipo/conjunto B - B -
Assentamento B - B -
Detalhes das trincheiras A - A B
Parede adjacente ao núcleo
Se presente A - A B
Inclinação M - B -
Acabamento B - B -
Volume de armazenamento - - - M
Seção de fechamento do rio/ensecadeira
M - M B
Notas: (1) Os pesos dados à importância relativa são julgados e variam de barragem para
barragem;
(2) - = não aplicado, B = baixo, M = médio, A = alto.
39
A erosão interna através do aterro, como mostrado na Tabela 3.3, pode estar associada a
estruturas inseridas no seu interior, tais como condutos, parede de vertedouro ou
estruturas de concreto, de apoio, adjacentes ao aterro compactado. Durante o processo
construtivo, pode ser observada a dificuldade de compactação do material do aterro
junto às estruturas adjacentes ou internas a ele, o que pode criar caminhos preferenciais
de percolação e, consequente, erosão interna.
De acordo com Fell et al. (2015), sendo o solo base mal graduado há uma deficiência de
partículas de tamanho médio ou apenas partículas de tamanho uniforme, possibilitando
que as partículas finas desloquem-se através dos espaços formados pelas partículas
grossas. Neste caso, maior será a susceptibilidade deste material à instabilidade interna,
representado pela curva de distribuição granulométrica, descontínua, mostrada na
40
Figura 3.6. Em tal situação, deve-se projetar um filtro capaz de controlar a erosão das
partículas mais finas do solo base.
Para Kezdi (1979), Kenney e Lau (1985) e Moffat (2005) citado em (Li, 2008), o início
da instabilidade interna é regida pela:
A primeira condição representa um critério geométrico que pode ser utilizado para
determinar a susceptibilidade à instabilidade interna. Enquanto que a segunda condição
estabelece uma relação hidromecânica, que pode ser utilizada para determinar o
gradiente crítico em que a instabilidade interna se inicia a uma determinada tensão
efetiva (Li, 2008).
41
(2014), posteriormente, Kezdi (1979) introduziu o conceito de sufusão como um
mecanismo de erosão. No entanto, sob a ótica do USACE (1953) com experiências de
filtro, Kenney e Lau (1984, 1986) promoveram, significativamente, o conceito de
estabilidade interna, propondo um método para a análise das curvas granulométricas.
Barrera (2010) cita que, ao longo do tempo, vários critérios foram desenvolvidos por
diferentes autores para avaliar a susceptibilidade do solo à instabilidade interna.
Existem dois tipos de critérios básicos: os geométricos e hidráulicos, como citado
anteriormente. O critério geométrico caracteriza a potencialidade da erosão interna por
meio da análise das curvas granulométricas. O critério hidráulico preconiza que se um
solo é classificado como potencialmente instável, ele não é por si só instável, mas
precisa de uma força “externa”, decorrente do fluxo de água, e gradientes hidráulicos
suficientemente altos para ocasionar a sufusão ou piping.
Tabela 3.4 – Algumas pesquisas de instabilidade interna, com breve descrição das
amostras e condições de teste (Adaptado de Li, 2008).
42
Li (2008) ressalta que na revisão da literatura é possível encontrar vários critérios
geométricos desenvolvidos para avaliar o potencial de instabilidade interna de solos
pouco coesivos. Entre eles, os critérios de Kezdi (1979), Kenney e Lau (1985, 1986) e
Burenkova (1993) são os mais comumente preconizados para uso na prática de
engenharia. Estes critérios avaliam a instabilidade interna de solos granulares,
baseando-se em diferentes hipóteses e ensaios.
Levando em consideração que o critério geométrico proposto por Kenney e Lau (1985,
1986) seja um dos mais utilizados, este será abordado com mais detalhes no item 3.7.2.
O critério hidráulico proposto por Adel et al. (1988) se diferencia dos demais, pelo fato
de ter sido realizado ensaio com imposição de fluxo horizontal através do corpo de
prova, sendo também abordado com mais detalhes no item 3.7.3.
43
Tabela 3.5 - Resumo de alguns critérios geométricos para a avaliação da
susceptibilidade do solo à instabilidade interna (Compilado de Barrera, 2010).
Avaliação da susceptibilidade à instabilidade interna com base no critério geométrico
Autor Observação Critério
44
Tabela 3.6 - Resumo de alguns critérios hidráulicos para a avaliação da susceptibilidade
do solo à instabilidade interna (Compilado de Barrera, 2010).
Avaliação da susceptibilidade à instabilidade interna com base no critério hidromecânico
Autor Critério Conclusão
Terzaghi Gradiente hidráulico crítico, do fluxo vertical ascendente, que reduz a
(1939) tensão efetiva do solo a zero.
Skempton e
Para pedregulho arenoso, internamente instável, erosão inicia com
Brogan Curva ic versus (*H/F)mín.
gradiente hidráulico crítico de 1/3 a 1/5.
(1994)
Ressalta a importância do controle: da razão entre os tamanhos das
Tomlinson e
- partículas, espessura do filtro e magnitude da taxa de crescimento do
Vaid (2000)
gradiente hidráulico, das quais podem influenciar o início do piping.
Ensaios para avaliar: (1) se o aumento do gradiente hidráulico por si só,
é suficiente para iniciar o processo de erosão; (2) introdução de água
Garner et al.
- gasosa nas amostras, a fim de desencadear o processo de sufusão. Os
(2002)
resultados dos testes mostraram que o processo sufusão pode ser
iniciado por introdução no solo de água com gases dissolvidos.
45
A partir dos critérios abordados nas Tabelas 3.5 e 3.6 é percebido que os critérios
hidráulicos ou hidromecâmicos apresentam maior complexidade, comparados aos
critérios geométricos. Os critérios geométricos apresentam-se melhor definidos dentro
de uma expectativa de avaliação da susceptibilidade do solo à instabilidade interna, e a
obtenção da curva granulométrica do solo é um processo relativamente simples e rápido
de se conseguir em laboratório. Já as relações dos critérios hidráulicos ou
hidromecâmicos apresentam-se diferentes para cada graduação, e os autores se a têm
mais a avaliação de comportamento e tendência dos resultados dos ensaios.
Em resumo, pode-se concluir que o critério admite que o solo cuja curva de forma se
localiza acima da linha H = F, para os intervalos 0% < F < 20% ou 0% < F < 30%, é
considerado internamente estável, entretanto, se parte dessa curva se apresentava abaixo
da linha H = F, o solo será considerado instável.
O método foi desenvolvido para filtros de zonas de transição com menos do que 5% de
finos passando na peneira de 0,075 mm (ICOLD, 2013).
46
As Figuras 3.7 e 3.8 apresentam graficamente os métodos para obtenção da curva de
forma (Kenney e Lau, 1985) e para avaliação da estabilidade interna de solos – Kenney
e Lau (1985, 1986), respectivamente.
Figura 3.9 – Evolução dos limites entre graduações estáveis e instáveis de Kenney e Lau
(Kenney e Lau, 1984 e 1986 apud Rönnqvist e Viklander, 2014).
De acordo com Filho (2013), faz-se importante destacar as ressalvas feitas por Kenney e
Lau (1985, 1986) na conclusão do trabalho desenvolvido por eles, sendo:
48
se justificam pela pequena duração dos ensaios em comparação à vida útil das
estruturas construídas em campo.
Adel et al. (1988, apud Li, 2008) testaram três solos comumente utilizados em obras de
proteção de encosta e diques na Holanda. A amostra ensaiada possuía 105,0cm de
comprimento com uma malha confinando a maior parte do material (Figura 3.10).
Nenhuma sobrecarga foi aplicada à amostra, e o fluxo unidirecional foi aplicado
segundo uma direção horizontal. Qualquer carreamento de partículas finas foi coletado
em uma caixa de areia. A taxa de perda de partículas finas, definida como aquela para o
transporte de 1g/m2.s, foi utilizada para determinar o valor do gradiente hidráulico
crítico. Esta taxa foi medida durante 30 minutos ou mais. Uma relação linear foi
proposta entre gradiente hidráulico crítico (icr) e (H/F)min, como apresentado na Figura
3.11.
Figura 3.10 – Ensaio com fluxo horizontal (adaptado Adel et al., 1988 apud Li, 2008).
Figura 3.11 – Critério hidráulico para fluxo horizontal (adaptado Adel et al., 1988 apud
Li, 2008).
49
Nesses ensaios Adel et al. (1988) obtiveram gradientes hidráulicos, característicos do
início da erosão, da ordem de 0,70 para material estável e 0,16 a 0,17 para material
instável, conforme apresentado na Tabela 3.7. Estes valores apresentam-se menores do
que os valores obtidos, por exemplo, por Skempton e Brogan (1994). Neste caso, esta
diferença pode ser atribuída à direção do fluxo ensaiado, ou seja, as partículas
submetidas ao fluxo vertical, que se opõem à gravidade, apresentam maior dificuldade
de movimentação, com gradientes maiores do que no fluxo horizontal.
51
os testes NEF, salvo algumas particularidades, para fundamentar filtros adequados e
avaliar a credibilidade dos critérios propostos para dimensionamento de filtro.
Os testes de NEF realizados por Sherard et al. (1984a e b, apud Fell et al., 2015) foram
dirigidos no sentido de buscar a distribuição granulométrica das partículas do filtro que
oferecessem condições para impedir a erosão interna ou minimizar sua ocorrência.
No ensaio NEF, água sob alta pressão é passada através de um pequeno buraco, de
1,0mm, feito na camada compactada do material do solo base sobrejacente ao material
do filtro, como mostrado na Figura 3.12.
Segundo Soroush et al. (2011), durante os testes de NEF, em solos de baixa plasticidade
de granulação fina, existe uma chance que as regiões superiores do buraco amoleçam
levando ao seu fechamento. Em tais casos, nenhum fluxo emerge através do orifício
(isto é, para fora do aparelho), consequentemente, a funcionalidade do filtro não pode
ser testada. Para contornar este problema, Soroush e Shourijeh (2009, apud Soroush et
al., 2011) recomendam a utilização de um cone truncado (bocal) que se introduz na
amostra de solo base para dar suporte ao furo durante o teste, semelhante ao detalhe
ilustrado na Figura 3.13.
Figura 3.12 – (a) Fotografia do aparelho de teste NEF; (b) Representação esquemática
das camadas de solos durante o ensaio (Adaptado de Soroush et al., 2011).
52
Figura 3.13 – Ilustração esquemática do detalhe do bocal no teste NEF (Adaptado de
Soroush e Shourijeh, 2009 apud Soroush et al., 2011).
Vazão inicial;
Clareza da água efluente e no caso de turbidez, o tempo que ela demora a
clarear;
Evidência de erosão da amostra de solo base;
Evidência de erosão da base para o material do filtro.
Se água turva emergir é sinal que alguma erosão tenha ocorrido e que as partículas
erodidas não foram retidas no filtro, então conclui-se que filtro não desempenhou com
sucesso seu papel de proteção. Além disso, pelo ensaio de Pinhole test é possível obter a
classificação do solo base quanto ao grau de dispersão, como apresentado na Tabela 3.8.
Tabela 3.8 – Resumo dos critérios interpretativos do ensaio Pinhole Test (Furo de
Agulha) ASTM D4647M-13 adaptado a NBR 14114-98 (Ramidan, 2003).
53
Este ensaio visa simular a condição em que ocorre a formação de um vazamento
concentrado através do núcleo ou aterro de uma barragem, de modo que na interface
entre o solo base e o filtro ocorram altos valores de cargas e gradientes hidráulicos (Fell
et al., 2015). Caso as partículas erodidas do solo base concentrem-se na interface de
filtragem e o fluxo pela abertura seja interrompido, como esquematizado na Figura 3.14,
o desempenho do filtro é considerado satisfatório.
54
Este ensaio avalia o fluxo entre materiais adjacentes, tais como, entre o aterro e rip rap
de enrocamento, entre materiais de transição, casos específicos de fluxo na face de um
dique ou revestimento sujeito à ação de ondas, e fluxo paralelo à margem de canal. De
acordo com ICOLD (1991, apud ICOLD, 1994), para filtro sob enrocamento verifica-se
que filtros razoavelmente bem graduados, com diâmetro máximo dos grãos entre 8 e
10cm (3 ou 4 polegadas), são satisfatórios para a grande maioria das barragens. Entanto,
estes filtros podem estar sujeitos à segregação e não proteger de forma eficiente contra a
influência frequente da ação das ondas.
Fell et al. (2015) consideram que para as camadas finas de rip rap sobre barragens
importantes (associada a dano potencial de ruptura), com ação significativa de ondas
advindas do reservatório, devem ser projetados filtros criteriosos.
Segundo Moreira (1981, apud Matheus, 2006) ocorre com frequência interpretações
erradas associando segurança à erosão interna somente à redução dos gradientes.
Segundo o autor, a análise de segurança contra o piping, deve contemplar a comparação
entre forças de percolação e forças de gravidade. Logo, para o autor, o estudo mais
adequado de piping envolve o estabelecimento do estado de tensões no maciço durante
55
todas as fases de operação da barragem, uma vez que, tanto a força de percolação
atuante quanto a resistente, de gravidade, são função do estado de tensões.
O ICOLD (2013) cita algumas intervenções que podem ser aplicadas isoladamente ou
em conjunto, para prevenir a progressão da erosão interna, sendo:
A curto e médio prazo, o aumento do controle e/ou monitorização da barragem pode ser
usado como intervenção. Para barragens antigas, onde pouco se sabe sobre a geometria
interna e solos utilizados na construção, considerando que os riscos para a sociedade
sejam médios a baixos, o controle e/ou monitorização pode ser a forma mais eficaz de
gestão de risco (ICOLD, 2013).
56
3.7. CRITÉRIOS DE EROSÃO
Segundo Sherard e Dunning (1989) e Peck (1990), citado em Foster e Fell (1999c), uma
das principais funções do filtro localizado à jusante do núcleo é prevenir o
desenvolvimento do piping através da barragem na eventualidade de um vazamento
concentrado através do núcleo. O bom desempenho de barragens com filtros projetados
de acordo com os critérios modernos têm provado que esses filtros são capazes de
proporcionar a vedação de vazamentos concentrados, de forma confiável.
Foster (1999), Foster e Fell (1999a, 2001), citado em Foster e Fell (1999c), utilizaram
os dados dos ensaios de Sherard (1984a, b) e ensaios adicionais utilizando equipamento
de teste similar ao do ensaio NEF, para o desenvolvimento do conceito dos limites de
nenhuma, alguma, excessiva e contínua erosão, ilustrado na Figura 3.16.
Fell et al. (2015) comentam que Foster (1999), Foster e Fell (1999a, 2001) fizeram
análises estatísticas dos resultados dos ensaios de laboratório em materiais de filtro
realizados por Sherard e Dunningan (1989), pela University of New South Wales e
ensaios adicionais utilizando equipamento de teste similar ao do ensaio NEF. Estas
análises proporcionaram o desenvolvimento do conceito dos limites de comportamento
e evolução dos ensaios. Esses limites foram comparados ao comportamento das
barragens que experimentaram filtros com desempenhos bons e ruins, para permitir a
aplicação prática dos critérios e avaliação da segurança de outras barragens.
Os ensaios adicionais utilizados por Foster (1999), Foster e Fell (1999a, 2001) trata-se
do ensaio CEF (Continuing Erosion Filter), que é um ensaio modificado a partir do
NEF para avaliar, também, a erodibilidade do solo.
Figura 3.16 – Limites de erosão do filtro (Adaptado de Foster, 1999; Foster e Fell,
1999a e c, 2001 Foster apud Fell et al., 2015).
Segundo Foster e Fell (1999), testes adicionais de filtro foram realizados utilizando uma
versão modificada do teste NEF, chamados de testes de Filtro com Erosão Contínua
(CEF - Continuing Erosion Filter), para determinar o limite da erosão contínua em
solos com D85B > 0,1mm. Os procedimentos de ensaio dos CEF foram essencialmente
os mesmos que os do ensaio NEF, tal como descrito por Sherard e Dunnigan (1989),
mas com as seguintes modificações:
58
A água que passa através do filtro durante o ensaio é recolhida e os materiais
erodidos são secados e pesados para determinação da perda de material, do solo
base, requerida na vedação do filtro;
Progressivamente, filtros com graduação mais grossa foram usados até que o
mesmo não fosse selado;
Amostras com a camada do solo base mais espessa foram usadas para permitir
maiores perdas por erosão.
Ainda segundo estes autores, os testes foram realizados durante um tempo suficiente até
que ficasse evidente a selagem do filtro ou se julgasse que este não iria selar, sem
importar o quanto de erosão tivesse ocorrido no solo base. Os filtros foram julgados
como selados quando todas as seguintes condições fossem alcançadas:
Foster e Fell (2001, apud Hill, 2008) avaliaram o que acontece quando os filtros não
satisfazem os critérios de filtro aceitos, a partir dos dados coletados de outros
pesquisadores e de suas próprias investigações de laboratório usando os testes NEF e
CEF. A classificação de “nenhuma erosão” indica menos de 10 gramas de material
erodido do solo base, para solos pouco coesivos, e nenhuma erosão visível para solos
coesivos. O grupo de “alguma erosão” indica entre 10 e 100 gramas de material erodido
para solos pouco coesivos, seguida da vedação do filtro. A “erosão excessiva” indica a
59
vedação do filtro, mas depois de mais de 100 gramas de material erodido. Finalmente, a
classificação de “erosão contínua” que indica uma graduação demasiadamente grossa do
filtro para permitir que os materiais erodidos do solo base selem o filtro, resultando na
erosão irrestrita do solo base.
De acordo com Fell et al. (2015), existem inúmeros casos de incidentes descritos na
literatura envolvendo erosão interna e piping de materiais do núcleo para filtros de
jusante, em aterros zoneados ou núcleo central de barragens terra e enrocamento.
60
Foster e Fell (1999) e Fell et al. (2015) comentam que na literatura internacional,
apenas duas barragens, Rowallan e Whiteman, experimentaram um desempenho fraco
do filtro envolvendo erosão interna e piping de materiais do núcleo de granulometria
fina com D95B < 2 mm. Em ambos os casos, a combinação do material mais fino do
núcleo com o mais grosso do filtro, leva à categoria de erosão contínua, tal como
definido pelos testes de laboratório, isto é, D15F/9 > D95B.
Estes autores acrescentam que barragens com bom desempenho do filtro, geralmente,
têm filtros com uma média de D15F ≤ 0,5 mm, relação que apresenta material mais fino
do que o critério de dimensionamento proposto por Sherard e Dunnigan (1989) para
solo base do Grupo 2 (D15F ≤ 0,7mm). As graduações mais grossas são apenas
ligeiramente mais grossa do que isto (D15F até 1,5mm). Barragens com pobre
desempenho do filtro têm filtros com uma média de D15F > 1,0mm e, geralmente, a
perda por erosão maior ou igual a 0,25g/cm2.
Uma notável exceção é a barragem de Songa, com um intervalo de D15F de 0,4 a 1,5mm.
Estes valores são consideravelmente menores do que os de outras barragens com
desempenho ruim de filtro. No entanto, a graduação do filtro da barragem de Songa,
mostrada na Figura 3.16, é ampla e com baixa percentagem de areia, como discutido
anteriormente, sendo provável que as reais graduações locais do filtro sejam
provavelmente mais grossa do que o mostrado (Foster e Fell,1999; Fell et al., 2015).
Tabela 3.9 – Critérios para os limites de erosão excessiva e contínua (Foster, 1999;
Foster e Fell, 1999a, 2001 apud Fell et al., 2015).
Critério proposto para o limite de Critério proposto para o
Solo Base
erosão excessiva limite de erosão contínua
Solo com D95B < 0,3mm D15F > 9D95B
Solos com 0,3 < D95B < 2,0mm D15F > 9D90B
Em média D15F > D15F que
proporciona uma perda, por erosão,
de 0,25 g/cm2 no ensaio CEF.
Solos com D95B > 2,0mm e teor
Limite graduação grossa com D15F
de finos > 35%
> D15F que proporciona uma perda, Para todos os solos:
por erosão, de 1,0 g/cm2 no ensaio D15F > 9D95B
CEF.
Solos com D95B > 2,0mm e teor
D15F > 9D85B
de finos < 15%
D15F > 2,5D15F de projeto, onde:
Solos com D95B > 2,0mm e teor
D15F de projeto = (35 - pp%
de finos entre 15 a 35%
0,075mm)x(4D85B - 0,7)/20+0,7
Nota: Os critérios são aplicáveis diretamente aos solos com D95B de até 4,75 mm. Para solos com partículas
mais grosseiras determinar D85B e D95B usar curvas de granulometria ajustadas para se obter a dimensão máxima
de 4,75mm.
Foster e Fell (1999) ressaltam que uma barragem, em particular, pode ter filtros com
graduação mais grossa do que a do limite de “erosão contínua”, isto não significa
necessariamente inferir que a barragem romperá no caso de um vazamento concentrado.
A avaliação da probabilidade de ocorrência do evento de piping, que conduz a ruptura
da barragem, precisa levar em conta a probabilidade de progressão do piping que
conduza a algum mecanismo de rompimento.
62
CAPÍTULO 4
Região crítica: fluxo normal à interface de filtragem (solo base e filtro), com
geração de altos valores de gradientes hidráulicos (N1);
Região parcialmente crítica: fluxo normal à interface de filtragem, com geração
de baixos valores de gradientes hidráulicos (N2);
Região não crítica: fluxo paralelo à interface de filtragem (P).
Os filtros localizados nas regiões críticas de fluxo são destacados como sendo essenciais
para o controle de fluxo, sendo então denominados de “filtro crítico”.
63
Figura 4.1 – Condições de fluxo nas interfaces de filtragem (adaptado de Fell et al.
2015).
4.2. PERMEABILIDADE
Cruz (2004) faz uma ponderada avaliação dos termos permeabilidade e condutividade
hidráulicas. Este autor interpreta a permeabilidade, como a facilidade (ou dificuldade)
que um meio poroso oferece à passagem de um fluido pelos seus vazios. Já a
condutividade é o termo adotado para descrever a facilidade que um meio confinado
oferece ao fluxo, como é o caso de fissuras ou fraturas rochosas, “tubulações” e
“caminhos confinados” em descontinuidades rochosas.
64
Frequentemente, a água ocupa uma porção considerável dos vazios do solo e, quando
submetida a diferenças de potenciais, ela se desloca. Esse deslocamento é condicionado
pela dimensão e forma dos vazios existentes, o que define a permeabilidade deste meio.
O filtro deve ser suficientemente permeável para impedir a geração de grandes forças de
percolação e poropressões. Isso é levado em consideração no critério de D15F / D15B > 4
ou 5, que garante que a permeabilidade do filtro seja de 15 a 20 vezes maior que a do
solo base. No entanto, é igualmente importante manter-se um percentual mínimo de
finos. Para filtros críticos, especifica-se o percentual de 2% ou 3% de finos não
plásticos, para os outros filtros até 5% de finos pode ser aceito, mas prefere-se que esse
percentual seja menor (Fell et al., 2015).
Em obras de grande vulto como barragens, muitas das vezes é difícil encontrar áreas de
empréstimo suficientes. Caso se tenha quantidades restritas de material para o filtro, e
que não atenda à premissa do teor desejável de finos, recomenda-se a lavagem do
material para que seja possível reduzir o percentual de finos. Muitos autores comentam
que o custo para lavagem e alcance de não mais do que 2% de finos, é viável
economicamente, devido aos benefícios de proteção do filtro.
65
Tabela 4.1 - Influência da porcentagem de finos passantes na peneira nº 100 na
permeabilidade do filtro de agregado lavado (Cedergren, 1967).
Porcentagem passante
Permeabilidade (m/s)
na peneira nº100
0 2,7x10-4 a 10-3
2 3,5x10-5 a 3,5x10-4
4 6,9x10-6 a 1,7x10-4
6 1,7x10-6 a 6,9x10-5
7 6,9x10-7 a 10-5
Cedergren (1967) ressalta que a permeabilidade deve ser determinada por meio de
ensaios de campo e/ou laboratório, e não a partir de correlações que envolvam
propriedades tais como tamanho dos grãos. Mesmo que informações do tipo e tamanho
dos grãos do solo, em geral, sejam úteis, estas características apenas podem indicar,
aproximadamente, o intervalo de permeabilidade esperada e não um valor singular.
66
4.3. FILTRAGEM E AUTO FILTRAGEM
Em qualquer interface de dois materiais porosos granulares, onde haja fluxo de água do
material mais fino para o mais grosseiro, Cruz (2004) afirma ser inevitável que algum
transporte de partículas venha ocorrer.
Os vazios do filtro são controlados pelas partículas finas e, para fins de concepção, o
D15F é geralmente usado para definir a dimensão destes vazios. Sherard et al. (1984a,
apud Fell et al., 2015) mostrou que para solos granulares o tamanho dos vazios entre as
partículas do solo, conhecido como o tamanho da abertura, é dado por D15F/9. Testes
feitos por Foster (1999, apud Fell et al., 2015) confirmam este aspecto.
Outro conceito básico que deve ser considerado é o da auto filtragem, que pode ser
desenvolvida pelo solo base. Se o solo for bem graduado, as partículas maiores fecham
os vazios do material do filtro impedindo a passagem das partículas médias para dentro
do filtro, que por sua vez impedem as partículas finas. Neste caso, o processo depende
da distribuição granulométrica do material, como ilustrado na Figura 4.2. Sendo o solo
base mal graduado, a auto filtragem fica comprometida, pois há uma deficiência de
partículas de tamanho médio e, consequentemente, a passagem dos finos através do
filtro é facilitada, viabilizando o processo de erosão interna.
(a) solo base bem graduado (b) solo base mal graduado, com deficiência de
partículas médias.
Figura 4.2 - Filtragem e conceito de auto filtragem (adaptado de Fell et al., 2015).
67
Cruz (2004) cita que o trabalho pioneiro de Silveira (1964) e um grande número de
trabalhos que se seguiram, dentre os quais o trabalho de Wittmann, 1979, e os trabalhos
de Humes, 1985 e 1995, propõem metodologias para cálculo das curvas de vazios do
filtro e as distâncias percorridas pelas partículas ou grumos de solo, visando a definir a
extensão da zona de auto filtragem e a efetividade do filtro propriamente dito.
Segundo Neves et al. (1985, apud Souza, 2013), Bertram (1940), orientado por
Casagrande, procedeu a ensaios laboratoriais para validar o critério de retenção dos
filtros, utilizando filtros de areia fina bastante uniformes, simulando assim as condições
mais propícias à ocorrência de erosão interna. Este autor realizou também estudos tendo
por base o que foi proposto por Terzaghi e concluiu que, se os poros dos filtros forem
suficientemente pequenos para impedir o movimento das partículas do solo base,
correspondentes ao diâmetro máximo de 85% (D85B), as partículas mais finas também
seriam impedidas de penetrarem no filtro. Seguindo este raciocínio, Taylor (1948), por
sua vez, realizou uma análise com base em esferas de igual diâmetro, numa
aproximação grosseira, para estabelecer a dimensão máxima das partículas que podem
ser usadas como material de filtro sem o perigo da penetração de finos através de seus
poros, como esquematizado na Figura 4.3.
Figura 4.3 - Ilustração do esquema analisado por Taylor, 1948 (Neves et al., 1985 apud
Souza, 2013).
68
4.4. CICATRIZAÇÃO
Vaughan e Soares (1982, apud ICOLD, 1994) sugeriram que um filtro “perfeito” deva
ser concebido para reter a menor partícula que possa surgir durante a erosão, não
dependendo da auto filtragem dos detritos erodidos e operar independentemente da
quantidade de segregação. A ideia seria que o material do filtro fosse não coesivo e
capaz de colapsar, assim a auto filtragem deveria ocorrer na fissura mesmo que uma
zona adjacente ao núcleo tenha sido danificada. Para avaliação desses processos, estes
autores descrevem um teste simples, atribuído a Vaughan, para avaliar a cicatrização, ou
a capacidade do filtro em conter fissuras. Este teste é adequado para ser realizado em
campo e foi elaborado para examinar a coesão (coesão aparente) do material do filtro.
Fell et al. (2015) relatam que refinamentos deste teste foram propostos por Soroush et
al. (2012), como ilustrado na Figura 4.4. A amostra do filtro é compactada dentro de um
molde com diâmetro de 155mm e altura de 200mm, com teor de umidade e densidade
relativa características dos filtros que serão utilizados em campo. A amostra é removida
do molde e colocada sobre uma placa perfurada; em seguida, coloca-se a placa
69
perfurada em um tabuleiro preenchido com água permitindo a ascensão capilar da água.
Se a água subir, reduzir a sucção capilar e a amostra colapsar, o material do filtro é não
coesivo.
Figura 4.4 - Ilustração esquemática do teste criado para o castelo de areia (Soroush et
al., 2012 apud Fell et al., 2015).
Soroush et al., (2012, apud Fell et al., 2015) ensaiaram materiais não plásticos, com
percentual de finos na faixa de 5% a 15%, e um único material plástico. A partir desses
dados e dos estudos desenvolvidos por Foster e Fell (1999b) e Fell et al., (2008), eles
propuseram as classificações quanto à probabilidade dos materiais em conter fissuras de
acordo com o tempo de ensaio, como discriminado na Tabela 4.2.
Tabela 4.2 - Probabilidade do filtro em conter fissuras, com base no teste de castelo de
areia (Soroush et al., 2012 apud Fell et al, 2015).
Probabilidade do filtro em
Tempo de colapso da amostra (min)a,b
conter uma fissura
≤2 Muito improvável
2≤5 Improvável
5 ≤ 15 Improvável a provável
15 ≤ 60 Provável
> 60 Quase certo
Notas:
(a) Dado que a amostra colapsa em um tipo de ruptura de falha, que é rápida
quando colocada em movimento e a amostra se divide.
(b) Devem ser realizados pelo menos três ensaios.
(c) Dependendo do índice de plasticidade.
Segundo Soroush et al. (2011), em geral, os resultados do teste de castelo de areia são
qualitativos, e o acompanhamento do julgamento proficiente de engenharia é necessário
para verificar sua autenticidade e confiabilidade. Os testes do castelo de areia devem ser
realizados para avaliar a colapsibilidade e cicatrização do filtro, e são particularmente
70
aplicáveis aos filtros sobre processo de compactação pelo tráfego de equipamentos,
filtros segregados, etc. A Figura 4.5 apresenta um teste em seus estágios iniciais.
O “Critério clássico de Terzaghi”, como é conhecido, foi proposto por Terzaghi (1926,
apud Filho, 2013) consistindo o primeiro critério largamente adotado em projetos de
filtros, tendo sido utilizado como base para inúmeros estudos posteriores.
São duas, as condições necessárias para a seleção do material adequado para o filtro,
sendo:
71
2) Permeabilidade, ou seja, o material do filtro deve ser permeável o
suficiente para permitir o livre escoamento da água, sem alteração da
sua estrutura granulométrica e capacidade de descarga impedindo a
geração de grandes forças de percolação e poropressão.
O critério de Terzaghi é válido para solos não coesivos e uniformes. Terzaghi propôs o
critério de retenção de D15F/D85B ≤ 4 para controlar a erosão e, para garantir que o filtro
seja suficientemente permeável, o critério de permeabilidade de D15F/D15B ≥ 4 (Filho,
2013).
Em geral, os filtros devem ser confeccionados com materiais de boa qualidade para
garantir durabilidade e resistência ao longo da vida útil da barragem. É destacado pelo
ICOLD (1994) que filtros susceptíveis aos efeitos descritos abaixo devem ser evitados,
sendo:
72
Tabela 4.3 – Resumo de alguns critérios de filtros estabelecidos desde os estudos de
Terzaghi.
Sherard et al. (1963)
United States Bureau of Reclamation – USBR (1977)
Critérios clássicos baseados na
Sherard e Dunnigan (1985)
distribuição granulométrica
Foster e Fell (1999a)
Vaughan e Soares (1982)
United States Soil Conservation Service – USSCS (1994)
Critérios atuais baseados na
US Army Corp of Engineers – USACE (2004)
distribuição granulométrica
United States Bureau of Reclamation – USBR (2011)
Brauns e Witt (1987)
Schuler e Brauns (1993, 1997)
Lafleur et al. (1993)
Critérios baseados no tamanho Giroud (1996)
da abertura dos vazios do
material de filtro Indraratna e Raut (2006)
Indraratna et al. (2007)
Raut e Indraratna (2008)
Kenny et al. (1985)
Vaughan e Soares (1982)
Critérios baseados na
Vaughan e Bridle (2004)
permeabilidade do filtro
Delgado et al. (2006)
Nos itens seguintes são abordados com maior detalhe alguns critérios de projeto de
filtro baseados na distribuição granulométrica dos materiais, para filtros que apresentam
fluxo normal a sua interface e que são considerados, portanto, essenciais para o controle
da erosão interna.
O critério de Sherard et al. (1963, apud Acosta et al., 2014), consiste nas seguintes
definições:
a) D15F ≤ 5D85F;
b) D15F ≥ 5D15B;
c) A curva de distribuição granulométrica do filtro deve ter a mesma forma da
curva do material base, a ser protegido;
d) Se o solo base apresentar uma elevada percentagem de pedregulhos, o filtro deve
ser concebido considerando a porção mais fina passante na peneira de 1” (25,4
mm);
73
e) Os filtros não devem conter mais de 5% de finos passantes na peneira nº 200, e
estes não devem ser coesos.
As regras de Sherard et al., (1963, apud Acosta et al., 2014) são muito conservadoras
para alguns tipos de solos, como argilas e solos grossos com finos argilosos, os quais
apresentam uma inerente resistência ao piping devido a sua coesão. Da mesma forma,
este critério é também conservador para solos grossos, bem graduados com finos
siltosos, pois estes materiais são considerados filtros naturais.
Os critérios (a) I e (a) II foram propostos para assegurar que o filtro seja mais permeável
do que o solo base. Já os critérios (b) e (c) foram concebidos para assegurar que o filtro
consiga controlar alguma erosão do solo base (Fell et al., 2015).
De acordo com Sherard et al. (1984a, 1984b) e Sherard e Dunnigan (1985), citados em
Fell et al. (2015), o United States Soil Conservation Service (USSCS) realizou
extensivos ensaios de laboratório para verificar os critérios de filtro, utilizando
diferentes aparelhos de ensaio para simular fluxo concentrado em uma barragem.
74
O método proposto por Sherard e Dunnigan leva em consideração diferentes testes de
erodibilidade para solos base arenosos, siltosos e argilosos.
Segundo Sherard e Dunnigan (1985, apud Fell et al., 2015), os resultados dos testes
confirmaram que os filtros a jusante do núcleo da barragem, com propriedades não
muito diferentes das que são utilizadas comumente na prática, são capazes de impedir
de forma confiável a erosão causada por vazamentos concentrados, mesmo quando os
gradientes e as velocidades de fluxo são muito maiores do que os valores que poderiam
existir em uma barragem.
Tabela 4.4 – Critérios de filtro de acordo com Sherard e Dunnigan (1985, 1989)
(adaptado de Fell et al., 2015).
% de finos passantes
Grupo Critérios (5) Observações
na peneira nº 200 (1)
1(2)(6) ≥ 85% D15F ≤ 9D85B(3) D15F ≥ 0,2mm
75
4.5.4. Método de Foster e Fell (1999)
Foster (1999) e Foster e Fell (1999a), citados em Fell et al. (2015), realizaram extensos
ensaios para avaliar a erodilidade do solo com configuração semelhante à de Sherard et
al. (1984a, 1984b), e analisaram os resultados dos ensaios feitos pelo USSCS. A Tabela
4.5 resume os resultados, sendo o critério para o limite de “nenhuma erosão” (colunas 4
e 5 destinado à avaliação do desempenho de filtros de barragens existentes.
Segundo Fell et al., 2015, este trabalho mostrou que a divisão entre os Grupos 2 e 4 é
melhor definida com percentual de finos igual a 35% do que com 40%, como utilizado
por Sherard e Dunnigan (1989).
Tabela 4.5 – Proposta para o critério de filtro baseado nas análises estatística dos
resultados dos ensaios NEF (Foster, 1999; Foster e Fell, 1999a, 2001 apud Fell et al.,
2015).
Critério de
Grupo Faixa de D15F para o
Percentual dimensionamento de Critério para o limite
do solo limite de “nenhuma
de finos (a) Sherard e Dunnigan de “nenhuma erosão”
base erosão”
(1989)
1 ≥85% D15F ≤ 9D85B 6,4 – 13,5D85B D15F ≤ 9D85B (b)
2A 35 – 85% D15F ≤ 0,7mm 0,7 – 1,7mm D15F ≤ 0,7mm (b)
3 <15% D15F ≤ 4D85B 6,8 – 10D85B D15F ≤ 7D85B
D15F ≤ 1,6D15Fd, onde
1,6D15F –2,5D15F do
D15F ≤ (40 – pp% D15Fd = (35 – pp%
critério de
4A 15 – 35% 0,075mm)× (4D85B – 0,075mm)
dimensionamento de
0,7)/25 + 0,7mm (4D85B – 0,7)/20 +
Sherard e Dunnigan
0,7mm
Nota: (a) A subdivisão dos Grupos 2 e 4 foi modificada a partir de 40% passante na peneira nº 200, tal
como recomendado por Sherard e Dunnigan (1989), para 35% com base na análise de dados do teste do
filtro. Os Grupos de solos modificados são denominados Grupos 2A e 4A. O teor de finos é o percentual
menor que 0,075mm, após o solo base ser ajustado para partículas com tamanho máximo de 4,75mm.
(b) Para solos altamente dispersivos (Ensaio Pinhole classificação D1 ou D2 ou Emerson (classifica o
comportamento de agregados do solo, quanto à sua coerência, quando imerso em água.) classificação 1 e 2)
é recomendado usar-se D15F menor, sendo: Para o Grupo 1utilizar-se D15F ≤ 6,4D85B e para o Grupo 2A
D15F ≤ 0,5mm.
Vaughan e Soares (1982, apud Fell et al., 2015) propuseram o conceito de “filtro
perfeito”. Nesta abordagem, a distribuição do tamanho das partículas do núcleo argiloso
é obtida a partir do ensaio de sedimentação apenas pela dispersão mecânica, sem adição
de dispersantes. A água utilizada para o ensaio deve ter a mesma composição química
76
da água que escoa através da barragem, uma vez que o tamanho dos flocos depende da
composição química da água.
Ensaios de laboratório foram realizados para relacionar o tamanho dos flocos de argila
com a gradação do “filtro perfeito”. Os ensaios constaram basicamente da passagem de
suspensão aquosa, contendo argila floculada, através de amostras de filtros. Estes
autores verificaram que existia uma relação aparente entre o tamanho das partículas
retidas pelo filtro e a permeabilidade do mesmo, fornecendo um conceito alternativo
para o projeto de filtros para solos não coesivos (ICOLD, 1994).
É observado por Fell et al. (2015) que o processo sugerido por Vaughan e Soares é
enfraquecido tanto pela graduação grossa de alguns filtros, como por não se adequarem
aos critérios do USBR (1977) ou Sherard e Dunnigan (1985).
O critério USSCS (1994, apud Acosta et al., 2014) é um dos mais utilizados atualmente
nos Estados Unidos e em outros países, na qual considera como princípios fundamentais
os requisitos do critério proposto por Terzaghi.
77
Figura 4.6 – Esquema dos passos a serem seguidos para projeto de filtro com base no
critério do USSCS (1994, apud Acosta et al., 2014).
78
4.5.7. Método do USACE (2004)
Os passos que devem ser seguidos para cumprir-se a proposição feita pelo USACE,
tanto para materiais coesivos como não coesivos, estão esquematicamente apresentados
na Figura 4.7.
79
Figura 4.7 – Esquema dos passos a serem seguidos para projeto de filtro com base no
critério do USACE (2004 apud Acosta et al., 2014).
80
4.5.8. Método do USBR (2011)
O USBR, assim como outros departamentos nos Estados Unidos, desenvolveu os seus
próprios critérios de projeto para filtros de barragens sob sua jurisdição. Este critério
apresenta similaridade aos critérios estabelecidos pelos USSCS e USACE. Entretanto,
em seus mais recentes manuais, certas diferenças se destacam, sobretudo, no curso final
da faixa do filtro (USBR, 2011 apud Acosta et al., 2014).
Comparado aos outros métodos atuais, Acosta et al. (2014) relatam que o método
proposto pelo USBR apresenta adicionalmente ênfase em solos dispersivos, que são
solos susceptíveis à segregação de suas partículas e posterior erosão em fissuras sob a
infiltração de água. As etapas deste método estão sintetizadas na Figura 4.8. Para solo
base com mais de 15% de finos, os autores recomendam realizar ensaios especiais,
como Crumb Test (ASTM D6572) e Double Hydrometer Test (ASTM D4221), para
estabelecer se as argilas são dispersivas, o que não se consegue obter por meio de ensaio
padrão de granulometria.
81
Figura 4.8 – Esquema dos passos a serem seguidos para projeto de filtro com base no
critério do USBR (2011 apud Acosta et al., 2014).
82
CAPÍTULO 5
Visto que recorrentes acidentes com barragens têm como causa principal o processo de
erosão interna, é de extrema importância o controle eficaz do fluxo de água pela
estrutura. Em projetos de barragens que contam com um sistema de drenagem interno
bem projetado, é pouco provável o desenvolvimento da erosão interna pelo maciço.
Os materiais empregados como filtro e dreno de uma barragem devem ser intensamente
estudados, para que desempenhem com excelência suas funções de filtragem, drenagem
e proteção. Para isso, é recomendado que os estudos baseiem-se não somente nas
referências literárias, mas também, na realização de ensaios de laboratório.
83
granulométrica para o filtro, que atendesse às premissas básicas de retenção e
permeabilidade, como ilustrado na Figura 5.1, e então confeccionada a amostra do filtro
em laboratório.
Devido à falta de recursos, não foi possível realizar ensaios para avaliar o grau de
dispersão do material do solo base. Assim, foi estudado e aplicado o critério do USBR
(2011) considerando o solo base dispersivo e não dispersivo.
84
5.2. CARACTERÍSTICAS GEOTÉCNICAS - SOLO BASE
Para determinação das frações granulométricas da amostra utilizada para o solo base foi
realizado ensaio de granulometria (ABNT NBR 7181). A curva granulométrica do
material está apresentada na Figura 5.2. De acordo com a curva, o material é
classificado como silte areno argiloso, apresenta coeficiente de uniformidade (Cu) igual
a 33 sendo considerado como bem graduado.
Este material apresenta plasticidade média a alta, com índice de plasticidade de 24%.
Realizou-se, também, ensaio de permeabilidade a carga variável (ABNT NBR 14545),
com fluxo vertical, resultando em coeficiente de permeabilidade vertical de 1,08x10-
5
cm/s.
85
5.3. CARACTERÍSTICAS GEOTÉCNICAS - MATERIAL DO FILTRO
A amostra utilizada para o filtro foi obtida após definição da sua curva de distribuição
granulométrica, com base nos critérios de dimensionamento de filtro citados no item
5.1. A curva de distribuição granulométrica do filtro está apresentada na Figura 5.3. O
coeficiente de uniformidade (Cu) deste material é igual a 18 sendo considerado,
também, como bem graduado.
86
Após peneiramento, o material retido em cada peneira foi lavado para eliminação de
qualquer material fino contido naquela porção. Em seguida, o material das peneiras foi
levado para secar na estufa à temperatura de 105 a 110ºC.
Figura 5.5 – Pesagem do material seco, conforme quantidades definidas pela curva
granulométrica proposta para o filtro.
87
Finalmente as porções peneiradas, lavadas, secadas e pesadas em cada peneira foram
misturas para a composição da amostra do filtro. Em seguida, realizou-se ensaio para
determinação da densidade específica seca máxima (ρdmáx.) e mínima (ρdmín.) seguindo
os procedimentos do ensaio de compacidade relativa (CR), considerando-se CR igual a
65%, encontrando os valores de 1,735g/cm³ e 1,397g/cm³, respectivamente.
Para a aplicação da pressão no topo foi utilizada uma linha de pressão de um painel de
saturação de ensaio triaxial, oportunamente localizada próximo ao equipamento HCT,
tornando possível controlar a pressão de topo (painel triaxial) e base (transdutor
diferencial de pressão – HCT).
88
Figura 5.6 – Aparato experimental utilizado para realização do ensaio.
A câmara é fixada entre duas peças metálicas no topo e base. A peça de base possui
quatro dispositivos de saída de fluxo, e a de topo um dispositivo de saída. Na base duas
saídas são responsáveis pelo enchimento da câmara triaxial. As outras duas são
conectadas à base do corpo de prova, sendo uma ligada diretamente no transdutor
diferencial de pressão negativa (não utilizado neste ensaio), e a outra ligada em paralelo
com o transdutor diferencial de pressão positiva e a bomba de fluxo, para medida da
pressão de base estabilizada durante cada estágio de gradiente. A entrada do topo
comunica diretamente com o tubo externo, a fim de aplicar a pressão de topo no corpo
de prova e também para a sua saturação.
A central de pressão e volume é composta por uma bomba de fluxo e por um painel de
controle, onde é possível controlar o fluxo ou a pressão de base requerida para um
gradiente pré-estabelecido e ainda realizar as leituras do volume percolado e das
deformações verticais (não utilizado neste ensaio).
89
5.5. PREPARO DO CORPO DE PROVA E SUA MONTAGEM NA CÉLULA
Após estudo das características geotécnicas dos materiais do solo base e filtro, foi
possível estabelecer algumas premissas para montagem do corpo de prova,
considerando condições reais de projeto e construção do aterro e filtro de uma
barragem.
Para a camada de solo base, com altura de 40,0mm, dimensionou-se compactação por
pisoteamento de quatro subcamadas de 10,0mm de espessura e grau de compactação
maior ou igual a 98%. A partir do peso específico úmido, calculou-se a quantidade de
solo de 64,61g, necessária para cada subcamada.
90
A camada do filtro também seguiu a sequência de compactação por pisoteamento de
quatro subcamadas, agora de 12,0mm de espessura cada. A partir do ensaio de
densidade específica seca máxima e mínima e definição do CR igual 65%, foi possível
calcular o peso específico seco do material e, consequentemente, o peso de cada
subcamada. A sequência construtiva para montagem da camada do filtro está
apresentada na Figura 5.8.
91
Figura 5.10 – Corpo de prova em processo de saturação.
No ensaio HCT com bomba de fluxo, a vazão de fluxo através da amostra é controlada
pela bomba de fluxo e a diferença de pressão resultante é medida por um transdutor
diferencial de pressão. Porém no ensaio realizado neste trabalho, não foi utilizado esse
procedimento, pois as pressões atuantes no topo e base da amostra foram controladas e
pré-estabelecidas. O corpo de prova levou 30 dias para saturar totalmente e assim
possibilitar o início do ensaio.
92
5.7. APRESENTAÇÃO DOS RESULTADOS
De acordo com alguns autores, o início da erosão interna devido à instabilidade interna
dos solos tem relação direta com a forma da curva de distribuição granulométrica do
material e à combinação da tensão efetiva e gradiente hidráulico.
93
Para o critério Kenney e Lau (1985), foi plotada a curva de forma do material do filtro,
como ilustrado na Figura 5.11. Sendo este material bem graduado, para o índice de
estabilidade mínimo H/F ≥ 1 considera-se F ≤ 20%. Nestas condições, a curva de forma
apresenta-se acima da linha H = 1,3F (limite ajustado) classificando, novamente o
material do filtro como internamente estável.
94
Como mostrado na Tabela 5.2, foram considerados no ensaio altos valores de gradientes
hidráulicos, dentro da máxima capacidade do equipamento de pressão do laboratório.
Esperava-se que o fluxo de água imposto através da amostra produzisse uma força de
arraste crítica, ou seja, a máxima conseguida nas condições do ensaio, para que fosse
possível avaliar o comportamento da amostra frente a esta imposição.
A partir das leituras de tempo, volume de água percolada através da amostra e com os
dados geométricos, foi possível calcular-se a permeabilidade e velocidade de percolação
para cada estágio do ensaio, como apresentado na Figura 5.13. Como esperado pela Lei
de Darcy, a vazão observada no ensaio é diretamente proporcional ao gradiente
hidráulico. Observa-se que a curva característica da condutividade hidráulica se
manteve basicamente constante ao longo dos 10 ciclos, indicando que a estrutura física
do solo base manteve-se praticamente inalterada quanto à perda de material. Esta
observação pôde ser confirmada a partir da retirada da amostra e quantificação dos finos
presentes na camada do filtro.
95
Ao final do ensaio, a amostra foi retida do equipamento de HCT. Primeiro, retirou-se a
camada de solo base e coletou-se três cápsulas do material para ensaio de teor de
umidade. Verificou-se que o material do solo teve um aumento de umidade de 36,0%
em relação à condição inicial do ensaio de percolação.
Figura 5.15 – Quantificação dos finos na camada do filtro após o ensaio de percolação.
97
base na interface entre os materiais, apresentado ao final do ensaio um percentual total
de 5,03% de finos.
Skempton e Brogan (1994, apud Jantzer, I. e Knutsson, S., 2010) trabalhando com solos
arenosos e pedregulhos verificaram que enquanto o gradiente crítico é,
aproximadamente, igual 1 em materiais internamente estáveis, materiais internamente
instáveis experimentaram valores mais baixos cerca de 1/3 a 1/5 dos gradientes de
99
material estável. O valor depende também da orientação do fluxo, caso se trate de fluxo
vertical ascendente, o gradiente crítico admissível é superior, em comparação a quando
se trata de fluxo horizontal.
Segundo estes estudos, o início da erosão interna em solos grosseiros acontece com
gradientes hidráulicos críticos menores comparados com solos finos.
100
CAPÍTULO 6
Em solos não saturados, há a presença de água e ar nos poros, o que dificulta o fluxo de
água através do mesmo. Nesta condição o potencial total da água no solo é representado
pelo somatório dos potenciais gravitacional e matricial. A condutividade hidráulica não
saturada é considerada variável sendo função do teor de umidade volumétrico,
, e da sucção mátrica, , do solo não saturado.
Segundo Biassusi (2001), o primeiro trabalho que se tem notícia apresentando uma
equação que quantificava o movimento da água no solo em condições de não saturação
é o de Buckingham (1907), originando a “equação de Darcy- Buckingham”. Richards
101
(1931), baseado no princípio da conservação da matéria, associou a equação da
continuidade com a equação de Darcy- Buckingham, obtendo assim uma equação
diferencial geral que governa o fluxo de água no solo, levando em conta as variações no
tempo e espaço.
Uma das características mais importantes de um meio poroso não saturado é a relação
entre o seu conteúdo de água e o potencial matricial, denominado curva de retenção de
água no solo, que pode ser determinada a partir de ensaios de laboratório ou aplicação
de relações empíricas. Esta relação é uma característica do solo, e caso a geometria do
sistema não sofra variações, é possível sua utilização para estimar o teor de água do solo
a partir do seu potencial matricial e vice-versa (Biassusi, 2001).
O potencial mátrico do solo pode ser medido por tensiômetros, que costumam
apresentar bons resultados. Os blocos de gesso também são muito utilizados,
principalmente devido a seu baixo custo, mas apresentam medidas imprecisas,
principalmente em condições úmidas. Normalmente se utilizam o tensiômetro para
condições úmidas e os blocos de gesso para condições secas. Podem também ser
utilizados, para a medida, o psicrômetro (método direto) e os métodos indiretos, tais
como: outros blocos de resistência elétrica (nylon ou fibra de vidro), sensores para
medir a dissipação do calor, método do papel filtro, método eletro-óptico e filtros de
discos porosos de nylon (Campos, 1998 apud Stephens, 1996).
A Figura 6.1 apresenta uma curva de retenção típica, onde alguns valores merecem
destaque como o teor de umidade volumétrico saturado (θs), o teor de umidade
volumétrico residual (θr) e o valor de pressão de entrada de ar, que é o valor da carga de
pressão no qual ocorre a entrada de ar nos poros do solo em um processo de secagem.
102
Figura 6.1 – Curva característica (Geo-Slope, 2012).
Quando o solo está saturado, todos os poros estão preenchidos e são condutores, então a
condutividade hidráulica é máxima. Quando o solo se torna não saturado, alguns poros
estão preenchidos de ar e a porção condutora da área transversal do solo decresce
correspondentemente. O valor da condutividade hidráulica decresce rapidamente com o
decréscimo do teor de umidade volumétrico (θ) ou da carga de pressão, devido à
diminuição da área útil para a condução da água, estabelecendo a relação k(θ), como
ilustrado na Figura 6.2 (Reichardt e Timm, 2004 apud Morales, 2008).
Figura 6.2 – Diminuição da área útil para o fluxo de água (Reichardt e Timm, 2004
apud Morales, 2008).
103
Em condições de saturação, solos arenosos possuem condutividade hidráulica maior que
solos argilosos, mesmo tendo menor porosidade. À medida que a umidade decresce, a
condutividade hidráulica de ambos os solos decresce rapidamente, com um gradiente
mais acentuado para os solos arenosos. Em condições muito secas, a areia apresenta k
menor que a argila, conforme pode ser observado na Figura 6.3 (Campos, 1998).
areia siltosa
argila siltosa
Areia uniforme
Potencial mátrico
Figura 6.3 – Valores de k versus o Potencial mátrico para três solos hipotéticos (Freeze,
1978 apud Campos, 1998).
104
para seleção e dimensionamento dos sistemas de impermeabilização e drenagem da
fundação.
Um dos métodos para obtenção da rede de fluxo é por meio da elaboração de modelos
físicos, que tendem à simplificação do comportamento de problemas reais mediante
uma análise tridimensional.
Na literatura é possível encontrar estudos recentes com esse tipo de abordagem, seja
para definição, comparação e validação da rede de fluxo, como Ferreira (2008), Ferreira
e Marques (2009), Marques e Unas (2010), Unas (2010), Araújo (2013), Pierozan
(2014), entre outros.
Figura 6.6 – Ruptura provocada pela erosão interna na barragem (Ferreira, 2008).
106
Analisando a foto da Figura 6.6, é possível dizer que esse tipo de processo erosivo na
face inferior do talude pode estar associado à falta de confinamento do solo. Trata-se de
um mecanismo de ruptura que pode gerar um processo progressivo de ruptura
ascendente.
A Figura 6.7 apresenta a evolução das trajetórias de fluxo, após injeção de corantes
naturais de cores diferentes.
Figura 6.7 – Evolução das trajetórias de corante no corpo da barragem (Ferreira, 2008).
107
Figura 6.8 – Linhas de fluxo e nível freático obtidos via simulação numérica (Ferreira,
2008).
108
(a) Seção homogênea com dreno horizontal
109
(a) Posição da superfície freática da barragem homogênea com dreno horizontal de acordo com as soluções
experimental, numérica e gráfica; Erro médio entre a solução experimental e numérica de 1,06%.
(b) Posição da superfície freática da barragem homogênea com dreno de pé de acordo com as soluções
experimental, numérica e gráfica; Erro médio entre a solução experimental e numérica de 3,9%.
(c) Posição da superfície freática da barragem homogênea com dreno chaminé de acordo com as soluções
experimental e numérica.
(d) Posição da superfície freática da barragem zoneada de acordo com as soluções experimental e numérica; Erro
médio entre a solução experimental e numérica de 3,51%.
Figura 6.10 – Comparação dos resultados dos modelos propostas para os métodos
físico, numérico e gráfico (Marques e Unas, 2010).
110
6.3. MODELAGEM NUMÉRICA
Para tal, foram modeladas seções típicas, geralmente adotadas em projetos de barragem,
que contemplam diferentes dispositivos de drenagem interna. Para finalizar, foram
realizados estudos de caso contemplando três barragens, objeto de uma das linhas de
pesquisa do NUGEO, a saber: Montes (2003), Aires (2006), Almeida (2010) e Divino
(2010).
111
6.3.1. Programa Computacional Seep/W
Devido a sua não linearidade geométrica, os problemas de superfície livre podem ser
solucionados analiticamente apenas para casos simples, muito particulares. Para que
situações mais complexas possam ser analisadas, é necessário que se adote algum
método numérico baseado na discretização do domínio de percolação. Entre os vários
métodos disponíveis, o Método dos Elementos Finitos (MEF) ainda é, provavelmente, o
mais utilizado (Strufaldi, 2004).
112
6.3.2. Modelos de Estudo
Os modelos das seções típicas empregados neste trabalho estão ilustrados nas Figuras
6.11 a 6.16. Em geral, os perfis são compostos de aterro compactado e/ou enrocamento,
e conta com sistema interno de drenagem singular. Objetivou-se com isso, estimar e
avaliar os gradientes hidráulicos desenvolvidos em cada tipo de seção.
Figura 6.12 – Seção 2: Barragem de terra com filtro vertical e tapete drenante.
113
Figura 6.13 – Seção 3: Barragem de terra com filtro vertical e tapete drenante.
114
Figura 6.16 – Seção 6: Barragem zoneada de terra e enrocamento.
Os parâmetros de fluxo dos materiais estão apresentados na Tabela 6.1. Para o aterro
compactado foram tomados os resultados de ensaios de laboratório, consubstanciados
no Capítulo 5. Os estudos consideram os solos como sendo isotrópicos em relação à
condutividade, exceto o material do aterro que devido à compactação apresenta
condutividade na direção horizontal cerca de três vezes maior que na direção vertical.
115
0,5
0,45
0,35
0,3
Aterro compactado
0,25
0,2
0,15
0,1
0,05
0.01 0.1 1 10 100 1000
1.0e-06
1.0e-07
Permeabilidade hidráulica (m/sec)
1.0e-08
1.0e-09
1.0e-10
Aterro argiloso
compactado
1.0e-11
1.0e-12
1.0e-13
1.0e-14
Em todas as seções típicas foi considerado barragens com altura de 30m e reservatório
de água operando com borda livre de 2m, ou seja, na El. 43m. Na fase de projeto é
muito difícil avaliar e prescrever a condição de contorno a jusante de barragens. Um
procedimento comum é adotar a prescrição da carga igual ao nível do terreno.
Considerando a condição de operação em regime permanente e barragens de
armazenamento de água, adotou-se como condições de contorno para o fluxo a
prescrição de carga total a montante de 43m, igual à elevação do nível do reservatório, e
a jusante a prescrição de carga total de 15m, igual à elevação do terreno de fundação.
116
6.3.4. Discussão do Gradiente Hidráulico no Seep/W
Em softwares com modelagem 2D, como o Seep/W, deve-se tomar cuidado ao obter os
gradientes de sáida em pontos acentuados formados por segmentos retos, como
ilustrado na Figura 6.19, denominados matematicamente de pontos de singularidade.
Isto significa que a solução da equação diferencial parcial, que descreve o fluxo no
interior do sistema, é indefinida no ponto de singularidade. A consequência é que os
117
gradientes (derivativos) das equações de fluxo tende para infinito no ponto de
singularidade. (Geo-Slope, 2016).
Figura 6.19 – Ponto de singularidade formado por segmentos retos (Geo-Slope, 2016).
Com isso, ao examinar gradientes de saída em modelo geométrico com face inclinada,
como apresentado na ilustração, recomenda-se que seja considerado os valores de
gradientes a alguma distância dos pontos de singularidade, em cerca de um a dois
metros de distância. A implicação prática é que os gradientes calculados nestes pontos
não têm nenhum significado físico e muito provavelmente não são representativos das
condições reais de campo.
Foi simulado fluxo permanente para todas as seções de estudo, considerando condição
normal de operação de uma barragem e reservatório de água operando com borda livre
de 2,0m.
118
Com base na discussão do item 6.3.4 sobre o gradiente hidráulico, é sugerido e adotado
neste trabalho um críterio para quantificar o gradiente máximo devido a não
convergência e/ou continuidade desta variável na interface entre duas regiões e em
pontos de singulatidade (Ribeiro, 2016 comunicação pessoal).
5,0
4,5
Região onde a solução
Gradiente hidráulico horizontal
Figura 6.20 – Critério para quantificar o gradiente horizontal máximo na interface entre
o núcleo e o filtro da Seção 5.
119
Neste caso, a distribuição da pressão é independente da condutividade hidráulica, por
consequência, o gradiente de saída é independente da condutividade hidráulica. A
descarga específica ou velocidade Darciana (chamado velocidade do líquido no
Seep/W) é, contudo, diretamente relacionada com a condutividade hidráulica. Para
areias a taxa de fluxo ascendente será muito maior do que para materiais argilosos,
embora o gradiente de saída seja o mesmo. Portanto, quando consideramos a
possibilidade de piping, no ponto de saída da água, é necessário avaliar mais do que
apenas a gradientes de saída, mas também a quantidade e velocidade de fluxo também
(Geo-slope, 2007).
Figura 6.21 – Exemplo de delimitação das interfaces onde foram obtidos os resultados.
120
Tabela 6.2 – Resumo dos resultados do gradiente hidráulico máximo.
121
Tabela 6.3 – Resumo dos resultados do gradiente hidráulico máximo de saída, vazão e
velocidade de fluxo.
A partir da Tabela 6.3 pode-se observar que a seção que apresenta o maior valor de
gradiente de saída não é a mesma que apresenta a maior quantidade e velocidade de
fluxo. Isso reforça o comentário feito anteriormente de que para avaliação da possível
occorência de piping, todas as variáveis envolvidas devem ser analisadas, não apenas o
gradiente hidráulico.
50
40
Elevação (m)
30
0,2
20
1,2
0,6
10
0,4
0,2
0,1
0,3
0,
0,3
1
5
0,
-10
-90 -75 -60 -45 -30 -15 0 15 30 45 60 75 90
Distância (m)
122
50
40
0, 4
Elevação (m)
30
0,5
20
0,7
1
0,3
10
0, 1
0,
0,4
2
0
-10
-90 -75 -60 -45 -30 -15 0 15 30 45 60 75 90
Distância (m)
Figura 6.24 – Seção 2: Diagrama Gradiente X.
50
40
Elevação (m)
30
20
0 ,7
0,
5
10
0 ,4
0,3
0,1
0,2
0,3
0,1
-10
-90 -75 -60 -45 -30 -15 0 15 30 45 60 75 90
Distância (m)
Figura 6.25 – Seção 3: Diagrama Gradiente X.
50
40 0,3
Elevação (m)
30
20
0,8
0,5
0,3
0,2
0,4
0,1
10
0,2
0,4
-10
-90 -75 -60 -45 -30 -15 0 15 30 45 60 75 90
Distância (m)
Figura 6.26 – Seção 4: Diagrama Gradiente X.
50
40
Elevação (m)
1,7
30
2
20
2,1
10 1,2 0,
1
1
0,8
0,
0 ,3
0,7
0 ,3
-10
-90 -75 -60 -45 -30 -15 0 15 30 45 60 75 90
Distância (m)
Figura 6.27 – Seção 5: Diagrama Gradiente X.
123
50
Elevação (m) 40
30
20
0,
6
0,4
10
0,1
0,2
0,3
0,1
0,3
0
-10
-90 -75 -60 -45 -30 -15 0 15 30 45 60 75 90
Distância (m)
Figura 6.28 – Seção 6: Diagrama Gradiente X.
Para os estudos de caso, adotados neste trabalho, foram consideradas três barragens
existentes, já abordadas em trabalhos desenvolvidos no NUGEO – Núcleo de
Geotecnia da UFOP, de Montes (2003), Aires (2006), Almeida (2010) e Divino (2010).
Vale destacar que a seção com núcleo inclinado dificulta a convergência da solução
numérica em termos de percolação, pois a inclinação condiciona um retorno da água
que percola pelo filtro de montante adjacente ao núcleo. Outro destaque é dado ao fato
de que os três estudos de casos contemplam barragens diferentes que abrangem uma
grande escala de obras de barramento.
124
6.4.1. Barragem de Emborcação
125
Zona 6 – Núcleo impermeável compactado
Zona 7 – Random impermeável compactado
Zona 8 – Transição a jusante do núcleo
Zona 8A – Transição fina a montante e jusante do núcleo
Zona 8B – Transição grossa a montante e jusante do núcleo
No escopo deste trabalho, atenção será dada à análise de fluxo através do maciço,
considerando o regime permanente, utilizando os dados constantes do trabalho original,
para análise dos gradientes hidráulicos nas interfaces entre núcleo e filtro. Sendo a
fundação em rocha impermeável, os gradientes de saída, nesse caso, não faz sentido
serem avaliados.
126
Como condições de contorno de montante e jusante, foram prescitas cargas totais iguais
às cargas de elevação de 660,0m e 520,0m, respectivamente. A fundação não foi
representada, mas em sendo esta impermeável, definiu-se uma condição de contorno de
fluxo nulo para a base da barragem.
670
660 4
650
640
630
620
Elevação (m)
610 1,8
600 1 5
590 1,4
2A 2B 2B 1
580
570 6 1 2A 3
560
9
0
66
550
2
0
8
65
540 1
0
550
580
1
62
530 2A
520 7 PH201
520
510
-300 -250 -200 -150 -100 -50 0 50 100 150 200
Distância (m)
127
5,0
4,5
3,5
3,0
2,5
imáx.
2,0
1,5
1,0
0,5
0,0
-140 -125 -110 -95 -80 -65 -50 -35 -20 -5
Distância (m)
670
660 4
650
640
630 0,4
620 0,9
Elevação (m)
610 1,8
600 1 1
590 1,4
2A 2B 2B 1
580
570 1 1 2A 3
560 1,4
9
550
2 1,8
540 1 8
1 1,8
2A
2
530
2,
510
-300 -250 -200 -150 -100 -50 0 50 100 150 200
Distância (m)
De acordo com o trabalho, a Cemig passa a construir o AHE Irapé a partir de abril de
2002, cuja barragem é a maior em altura do Brasil e a segunda da América do Sul, com
128
208 metros de altura, constituída de enrocamento com núcleo de argila com
comprimento total de 551m.
129
Figura 6.33 – Seção de maior altura da barragem de Irapé (CCI, 2003b apud Aires, 2006).
130
Tabela 6.5 – Parâmetros de fluxo dos materiais (Aires, 2006).
k θ θr
Material Condição k’y / k’x
(m/s) (m³/m³) (m³/m³)
Solo argiloso arenoso Parcialmente saturado 1,2 x 10-9 0,1 0,40 0,1
-4
Filtros Saturado 1,0 x 10 1,0 - -
-3
Transições Saturado 1,5 x 10 1,0 - -
-7
“Cascalho” Parcialmente saturado 1,0 x 10 0,1 0,40 0,1
Enrocamento de rocha
pouco a medianamente Parcialmente saturado 1,0 x 10-0 1,0 0,45 0,05
decomposta
Enrocamento de rocha
medianamente a muito Parcialmente saturado 1,0 x 10-0 1,0 0,45 0,05
decomposta
Random Parcialmente saturado 5,0 x 10-7 1,0 0,45 0,05
Enrocamento de rocha
Parcialmente saturado 1,0 x 101 1,0 0,45 0,05
pouco decomposta a sã
Fundação superficial Saturado 1,0 x 10-6 1,0 0,40 -
-8
Fundação profunda Saturado 1,5 x 10 1,0 0,40 -
Como condições de contorno de montante e jusante, foram prescitas cargas totais iguais
às cargas de elevação de 507,86m e 328,0m, respectivamente, propiciando uma
diferenta de carga de 179,86m a ser dissipada ao longo da seção da barragem. É
importante ressaltar aqui também que foi considerado o fluxo em regime permanente, e
a barragem operando em condições normais, ou seja, sem nenhuma intrefenrência de
anomalias conhecidas.
131
520
500
480
460
440
Elevação (m)
420
400
380
360
340
320
300 0
50
280
33
0
34
0
420
4 00
440
3 60
4 60
380
48
0
260
240
220
-400 -300 -200 -100 0 100 200 300 400
Distância (m)
3,5
3,0
Gradiente hidráulico horizontal
2,5
2,0
1,5
imáx.
1,0
0,5
0,0
-90 -70 -50 -30 -10 10 30 50
Distância (m)
132
520
500
480
0,4
460
0,7
440
0 ,9
Elevação (m)
420
400
380 1,1
360
340
1,2
1
1,4
320
300
280
0,1
1,3
0,3
0,7
0,5
0,8
0,1
0,5
260 1
0,3
240
220
-400 -300 -200 -100 0 100 200 300 400
Distância (m)
De acordo com Montes (2003), a permeabilidade dos solos de fundação foi verificada
por meio de ensaios de permeabilidade in-situ, realizados concomitantemente com as
sondagens a percussão, tendo-se encontrado valores entre 7,5x10-2 e 1,0x10-5cm/s. Para
fins de estudo da percolação pela fundação, consideraram-se os valores de 5,66x10-
3
cm/s para permeabilidade média dos solos da fundação e 1,0x10-2cm/s para
permeabilidade da areia do leito do rio.
133
Figura 6.37 – Seção transversal típica da Barragem Bico da Pedra (Montes, 2003).
134
Em seu trabalho, Montes (2003) objetivou analisar a segurança contra ruptura da
barragem de Bico da Pedra. Para tal, ele desenvolveu uma carta de risco com base na
leitura das pressões existentes nos piezômetros da obra por meio de análises de fluxo
pela barragem e fundação, com base nos dados de campo e laboratório.
Este trabalho considerou as mesmas premissas para modelagem definidas por aquele
autor, com objetivo de quantificar os gradientes hidráulicos da barragem, para um
cenário de operação normal da estrutura. Os parâmetros das análises para fluxo
permanente foram obtidos através da calibragem do modelo numérico adotado e estão
apresentados na Tabela 6.6. A Figura 6.38 representa a seção tipo do modelo calibrado,
onde foi analisada a instrumentação de campo.
570
Elevação (m)
560
FILTRO VERTICAL
550
540 TAPETE IMPERMEÁVEL TAPETE DRENANTE
530 ATERRO COMPACTADO
520
510 FUNDAÇÃO
500
490
-10 40 90 140 190 240 290 340 390 440 490
Distância (m)
Figura 6.38 – Seção do modelo numérico calibrado Barragem Bico da Pedra (Montes,
2003).
135
porção de montante do aterro compactado. Sendo a fundação composta por aluvião,
com alto coeficiente de permeabilidade, é observada uma perda de carga pouco
acentuada nessa camada.
570
Elevação (m)
560
550
540
549
530 541
520 535
9
52
545
541
537
527
523
533
519
510
549
500
490
-10 40 90 140 190 240 290 340 390 440 490
Distância (m)
A Tabela 6.7 mostra os valores de gradiente hidráulico para a seção de maior altura da
barragem Bico da Pedra. Observa-se que os valores quantificados, para as variáveis em
questão, são pouco expressivos, o que pode ser atribuído à influência do tapete
impermeável utilizado no tratamento de fundação. A partir da Figura 6.40 identificamos
que os maiores gradientes ocorrem próximos ao tapete impermeável.
580
Elevação (m)
565
550
0,3
535
0,
0,3
0,2
520 0,5
0,6
505
490
-10 40 90 140 190 240 290 340 390 440 490
Distância (m)
136
6.4.4. Discussão dos Resultados
Para as análises de percolação realizadas para as três barragens dos estudos de caso, foi
considerado um cenário de normalidade dentro do contexto de operação de uma
barragem, ou seja, nenhum efeito de anomalias como por exemplo erosão interna ou
colmatação do sistema de drenagem interno. Neste caso, os baixos valores de gradiente
hidráulico obtidos apresentam-se coerentes com o contexto da simulação numérica.
Ressalta-se, no entanto, que para a Barragem de Bico da Pedra observa-se um forte
afogamento do sistema de drenagem, porém não há evidências que este afogamento
tenha gerado aumento comprometedor dos gradientes hidráulicos, escopo deste estudo.
Para a elaboração de uma conclusão mais refinada acerca do gradiente hidráulico e sua
relação com o processo de erosão interna, seria necessário avaliar os materiais que
compõem os maciços e filtros das barragens, por meio de os ensaios de laboratório e
adoção de critérios da literatura.
Com base nessas informações, pode-se supor que os gradientes obtidos para as
Barragens de Emborcação, Irapé e Bico da Pedra são pouco significativos para induzir
um processo progressivo de erosão interna. Outros fatores relativos às práticas de
construção e tempo de operação da barragem devem ser levados em consideração nesta
análise, tais como controle de compactação, seleção dos materiais e construção dos
filtros, zonas com alta permeabilidade, trincas, entre outros.
137
CAPÍTULO 7
Importante ressaltar também que em um ensaio, muitas das vezes algumas condições
são tomadas que não refletem o comportamento ou características de um maciço, em
campo, sujeito ao piping. No ensaio, atentou-se para a regularidade da superfície de
contato entre material base e filtro, a energia de compactação da amostra, a seleção
minuciosa do material do filtro, entre outros detalhes, o que muitas das vezes não
acontece no campo. As condições críticas que condicionam a ocorrência de anomalias,
como a erosão interna, podem não ser aquelas consideradas nos ensaios.
Para se obter uma boa equivalência dos resultados é recomendado fazer-se ensaios de
laboratório com uma média de 05 corpos de prova e considerando-se mais de uma
condição de moldagem, no que diz respeito a grau de compactação, dimensionamento
do filtro, introdução de furo na amostra para simulação de fluxo concentrado. Em
campo, é necessário planejar e executar um rigoroso controle de campo, ser criterioso
quanto à seleção do material de construção e prezar pelas boas práticas de engenharia
para a construção do filtro e aterro compactado.
Foi observado que a seção típica que apresentou o maior valor de gradiente hidráulico
de saída, não foi a mesma que apresentou a maior quantidade e velocidade de fluxo,
mostrando que para avaliação da possível ocorrência da erosão interna, todas as
variáveis envolvidas no problema devem ser analisadas, não apenas o gradiente
hidráulico.
140
7.3. CONCLUSÕES GERAIS
Os materiais empregados como filtro e dreno de uma barragem devem ser intensamente
estudados, para que desempenhem com excelência suas funções de filtragem, drenagem
e proteção. Para isso, é recomendado que os estudos baseiem-se não somente nas
referências literárias, mas principalmente na realização de ensaios de laboratório. A
partir de análise qualitativa e quantitativa dos resultados do ensaio é possível ter-se um
grau de segurança maior quanto aos métodos e critérios utilizados no dimensionamento
do filtro.
141
do filtro, introdução de furo na amostra para simulação de fluxo concentrado,
entre outros;
Considerar outras metodologias e tipos de ensaios de laboratório apresentados
na literatura. Recentemente, alguns autores têm realizado ensaios para avaliar a
influência do efeito de escala no resultado e considerações sobre o processo de
erosão interna.
142
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153
ANEXO I – RESULTADOS DE ENSAIOS DE LABORATÓRIO
TEOR DE UMIDADE
CAMADA 1 2 3 4
BACIA Nº 6 7 32 10
SOLO ÚMIDO + BACIA (g) 217,07 185,53 269,82 111,49
TARA BACIA (g) 38,88 37,22 81,53 38,47
SOLO SECO + BACIA (g) 186,12 160,82 237,40 98,01
SOLO SECO (g) 147,24 123,60 155,87 59,54
ÁGUA (g) 30,95 24,71 32,42 13,48
UMIDADE (%) 21,0 20,0 20,8 22,6
UMIDADE MÉDIA (%) 21,1
Camada 4
Camada 3
Camada 2
Camada 1
154
ÍNDICE DE VAZIOS MÁXIMO E MÍNIMO
DETERMINAÇÃO Nº 01 02 03 Balança: 11
155
GRANULOMETRIA POR SEDIMENTAÇÃO
P ESO SECO + TA RA (g) 80,21 76,00 84,80 2" 50 0,00 0,00 2117,69 100,00
P ESO DA Á GUA (g) 7,10 6,02 7,44 11/2" 38 0,00 0,00 2117,69 100,00
TA RA (g) 14,91 22,20 16,30 1" 25 0,00 0,00 2117,69 100,00
P ESO SOLO SECO (g) 65,30 53,80 68,50 3/4" 19 0,00 0,00 2117,69 100,00
UM IDA DE (%) 10,87 11,19 10,86 3/8" 9,5 0,00 0,00 2117,69 100,00
UM IDA DE M ÉDIA (%) 10,97 Nº 04 4,8 0,00 0,00 2117,69 100,00
FA TOR DE CORREÇÃ O FC = 100/100+h Nº 10 2,0 0,00 0,00 2117,69 100,00
SEDIMENTAÇÃO
t
LEITURA DIÂ M ETRO
TEM P ER. CORREÇÃ O LEITURA % FINOS
HORA LEITURA L (ºC) CORRIGIDA DOS GRÃ OS CI CORRIGIDA TOTA IS
(min) M ENISCO (mm)
10:20 15" 33,50 33,50 22,0 0 0,093 -2,85 30,65 74,26
10:20 30" 32,30 32,30 22,0 0 0,066 -2,85 29,45 71,36
10:21 1' 31,00 31,00 22,0 0 0,046 -2,85 28,15 68,21
10:22 2' 29,80 29,80 22,0 0 0,033 -2,85 26,95 65,30
10:24 4' 26,80 22,0 0,023 -2,85 23,95 58,03
10:28 8' 25,00 22,0 0,016 -2,85 22,15 53,67
10:35 15' 22,90 22,0 0,012 -2,85 20,05 48,58
10:50 30' 20,20 22,1 0,0085 -2,83 17,37 42,09
11:20 1h 18,00 22,1 0,0060 -2,83 15,17 36,76
12:20 2h 15,50 22,6 0,0043 -2,70 12,80 31,01
14:20 4h 13,50 23,1 0,0030 -2,56 10,94 26,51
18:20 8h 12,10 23,1 0,0022 -2,56 9,54 23,12
10:20 24h 9,20 21,6 0,0013 -2,95 6,25 15,14
156
CURVAS DE DISTRIBUIÇÃO GRANULOMÉTRICA
PENEIRAS Nº 200 100 50 40 16 10 4 3/8" 1 1/2" 2"
30 3/4" 1"
100,00
90,00
80,00
70,00
Porcentagem que Passa
60,00
50,00
40,00
30,00
20,00
10,00
0,00
98 7 6 5 4 3 2 2 3 4 5 6 7 89 2 3 4 5 6 7 89 2 3 4 5 6 78 9 2 3 4 5 6 78 9 98 7 6 5 4 3 2
0,0001 0,001 0,01 0,1 1 10 100
Diâm etro dos Grãos (mm)
157
PROTOCOLO Nº
LIMITES DE ATTERBERG -
LL/LP
(NBR 6459/84 e NBR 7180/84)
CLIENTE OBRA
- - -
LIMITE DE LIQUIDEZ
Determinação Nº 1 2 3 4 5 6
Cápsula Nº 47 96 98 101 114
Mcap+solo+água (g) 10,77 13,63 11,48 13,93 13,40
Mcap+solo (g) 8,68 11,26 9,75 11,11 10,08
Mcap (g) 4,56 6,76 6,86 6,73 5,06
Msolo (g) 4,12 4,50 2,89 4,38 5,02
Mágua (g) 2,09 2,37 1,73 2,82 3,32
w (%) 50,7% 52,7% 59,9% 64,4% 66,1%
Número de Golpes n 45 38 29 22 15
Utilizar valor (sim/não) sim sim sim sim sim não
Equação da Reta:
69,0%
w = a*ln(N) + b
a= -0,1512
64,0%
Teor de Umidade (%)
b= 1,0898
R² = 0,9279
59,0%
LL 60%
54,0%
LP 36%
49,0%
10 Número de Golpes 100 IP 24%
LIMITE DE PLASTICIDADE
Determinação Nº 1 2 3 4 5
Cápsula Nº 4 23 27 35 41
Mcap+solo+água (g) 7,92 9,13 8,11 6,05 8,01
Mcap+solo (g) 7,47 8,73 7,82 5,67 7,76
Mcap (g) 6,27 7,64 6,99 4,68 7,04
Msolo (g) 1,20 1,09 0,83 0,99 0,72
Mágua (g) 0,45 0,40 0,29 0,38 0,25
LP (%) 37,5% 36,7% 34,9% 38,4% 34,7%
Utilizar valor na média (sim/não) sim sim sim não sim
desvio da média (%) dentro dentro dentro - dentro
LP (para compor a média) (%) 37,5% 36,7% 34,9% ñ utilizado 34,7%
LP (%) 35,96%
OBSERVAÇÕES
158
PERMEABILIDADE
CARGA VARIÁVEL
t h0 h1 T K 20
CK
13:14:00 (s) 0,00 (cm) (cm) (º C) (cm/s)
13:23:00 540 1,70 248,00 246,30 21,1 0,974 1,16E-05
13:31:00 480 3,70 246,30 244,30 21,1 0,974 1,55E-05
13:43:00 720 5,60 244,30 242,40 21,1 0,974 9,86E-06
13:53:00 600 7,60 242,40 240,40 21,1 0,974 1,26E-05
14:04:00 660 9,70 240,40 238,30 21,1 0,974 1,21E-05
14:12:00 480 11,20 238,30 236,80 21,1 0,974 1,20E-05
14:20:00 480 12,70 236,80 235,30 21,1 0,974 1,20E-05
14:28:00 480 14,20 235,30 233,80 21,1 0,974 1,21E-05
14:33:00 300 15,00 233,80 233,00 21,1 0,974 1,04E-05
14:43:00 600 16,80 233,00 231,20 21,1 0,974 1,18E-05
OBS: moldado do bloco - direção K T médio (cm/s) = 1,19E-05 2,3x((a x L) / (A x t))x log(h0/h1)
159
PERMEABILIDADE
CARGA VARIÁVEL
t h0 h1 T K 20
CK
13:14:00 (s) 0,00 (cm) (cm) (º C) (cm/s)
13:22:00 480 1,30 248,00 246,70 21,1 0,974 8,42E-06
13:31:00 540 3,00 246,70 245,00 21,1 0,974 9,85E-06
13:43:00 720 5,00 245,00 243,00 21,1 0,974 8,76E-06
13:53:00 600 6,80 243,00 241,20 21,1 0,974 9,53E-06
14:05:00 720 8,70 241,20 239,30 21,1 0,974 8,45E-06
14:13:00 480 10,10 239,30 237,90 21,1 0,974 9,40E-06
14:21:00 480 11,40 237,90 236,60 21,1 0,974 8,78E-06
14:29:00 480 12,70 236,60 235,30 21,1 0,974 8,83E-06
14:33:00 240 13,90 235,30 234,10 21,1 0,974 1,64E-05
OBS: moldado do bloco - direção K T médio (cm/s) = 1,11E-05 2,3x((a x L) / (A x t))x log(h0/h1)
160
COMPACTAÇÃO PROCTOR NORMAL
Compactação
Cápsula (nº) 51 25 78 34 40 3
Mcap+solo+água (g) 94,50 95,60 97,96 83,59 89,24 194,12
Mcap+solo (g) 80,49 79,55 79,52 67,13 69,37 168,92
Mcap (g) 16,04 16,03 15,99 15,94 14,52 53,19
Mágua (g) 14,01 16,05 18,44 16,46 19,87 25,20
Msolo (g) 64,45 63,52 63,53 51,19 54,85 115,73
Umidade - R (%) 21,7% 25,3% 29,0% 32,2% 36,2% 21,8%
Utilizar valor na média (s/n) - - - - - - - - s s n
Umidade para compor a média (%) s s s s s - - - 21,8%
Umidade média (%) - - - - - - - - 21,8%
Água adicionada (%) 0,0% 3,0% 6,0% 9,0% 12,0% Energia de Compactação
Água adicionada (g) 0,00 90,00 180,00 270,00 360,00 Normal (N)/Intermediaria (I)/Modificada (M)
R² = 1 r dmáx (g/cm 3)
CURVA DE COMPACTAÇÃO
1,410
1,430 ## ## ## wótima (%)
## ## ## 30,2%
OBSERVAÇÕES:
1,410
1,350
1,330
21,0% 23,0% 25,0% 27,0% 29,0% 31,0% 33,0% 35,0% 37,0% 39,0%
161
TEOR DE UMIDADE
CÁPSULA Nº 66 62 16
TEOR DE UMIDADE
CÁPSULA Nº 2 72 77
162