Geologia Medica Brasil PDF
Geologia Medica Brasil PDF
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EDITORES
2006
CPRM – Serviço Geológico do Brasil
Rio de Janeiro
Coordenação – DEPAT/DIEDIG
Editoração/Diagramação/Design
CDD 550.289
SUMÁRIO
Apresentação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . vii
1.Geologia Médica . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1
Selinus, O.
13. Exposição Humana ao Arsênio no Médio Vale do Ribeira, São Paulo, Brasil . . . . . . . . . . . . . . . 82
De Capitani, E.M., Sakuma, A.M., Figueiredo, B.R., Paoliello, M.M.B., Okada, I.A., Duran, M.C., Okura, R.I.
– iii –
14. Chumbo e Arsênio nos Sedimentos do rio Ribeira de Iguape, SP/PR . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 88
Lopes Jr., I., Figueiredo, B.R., Enzweiler, J., Vendemiatto, M.A.
16. Estudo da Composição e das Fontes Isotópicas de Pb dos Aerossóis em Brasília (DF) – Brasil Central
Gioia, S.M.C.L., Pimentel, M.M., Kerr, A. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 104
18. Geoquimica do Flúor em Águas e Sedimentos da Região de Cerro Azul, Estado do Paraná:
Definição de Áreas de Risco para Consumo Humano . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 118
Andreazzini, M.J., Figueiredo, B.R., Licht, O.A.B.
– iv –
29. Alumínio Dissovido na Água das Cavas de Extração de Areia – Um Estudo das Possíveis
Implicações de sua Toxidade – Município de Seropédica – RJ . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 200
Eduardo Duarte Marques, E.D., Silva Filho, E.V., Tubbs, D., Santelli, R.E., Sella, S.M.
30. A Influência da Área Superficial das Partículas na Adsorção de Elementos Traço por
Sedimentos de Fundo: Um Estudo de Caso nas Adjacências da Cidade de Macaíba,
Estado do Rio Grande do Norte, Brasil . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 204
Lima, R.F.S., Guedes, J.A., Brandão, P.R.G., Souza, L.C., Petta, R.A.
–v–
APRESENTAÇÃO
E ste livro tem por objetivos divulgar fundamentos, metodologias e resultados de investigações já reali-
zadas dentro do conceito multidisciplinar da “Geologia Médica”. O conteúdo é composto por artigos relati-
vos às apresentações de pesquisadores brasileiros por ocasião da realização, do Workshop Internacional
de Geologia Médica em junho de 2005, no Rio de Janeiro, nas dependências do Serviço Geológico do Bra-
sil – CPRM. Esta iniciativa não tem a pretensão de abarcar todo o universo de pesquisadores atuantes na
interface Geociências e Saúde, mas apresentar um panorama que reflita, de forma significativa, a situação
atual no Brasil dessa integração de disciplinas no enfrentamento de problemas ambientais de saúde.
São apresentadas no primeiro artigo, escrito pelo Dr. Olle Selinus (IMGA), as noções básicas e a evo-
lução histórica da Geologia Médica no âmbito mundial. Segue uma breve descrição do estado da arte da
Geologia Médica no Brasil, ressaltando-se em capítulo específico a importância da Epidemiologia como
base da avaliação dos agravos à saúde no contexto da Geologia Médica. Também é apresentado o pro-
grama brasileiro de vigilância em saúde relacionadas a substâncias químicas.
Os demais artigos apresentam os resultados de pesquisas realizadas por várias instituições e regiões
do Brasil, abordando temas relacionados ao conceito de Geologia Médica. Nesses trabalhos, dados produ-
zidos pelas disciplinas ligadas à Geologia são correlacionados com os dados de saúde das populações, no
sentido de busca e definição de nexos causais, ou de levantamento de hipóteses de trabalho a serem desen-
volvidas. Finalizando, gostariamos de agradecer a todos os autores pela valiosa contribuição, em especial à
Fundação de Amparo a Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro – FAPERJ, pelo apoio financeiro, ao Serviço
Geológico do Brasil – CPRM, a Sociedade Brasileira de Geoquimica – SBGq, e a International Medical Geo-
logy Association – IMGA pelo incentivo e apoio logístico, certos de que juntos estamos contribuindo para a
divulgação e desenvolvimento da Geologia Médica no Brasil, consequentemente, melhorar a qualidade de
vida de nossa população.
Os Editores
– vii –
Olle Selinus
GEOLOGIA MÉDICA
Olle Selinus
Serviço Geológico da Suécia
Tradução: Fernanda Gonçalves da Cunha
(Serviço Geológico do Brasil-CPRM/RJ)
–1–
Geologia Médica
teor de matéria orgânica. Xistos pretos, uma rocha de A deficiência de elementos-traço nas culturas agrícolas e
granulação fina, por exemplo, tende - a se enriquecer nos animais são comuns em grandes áreas em várias re-
nesses elementos. giões do mundo e, por essa razão, programas de suple-
O conhecimento dos processos geológicos também mentação mineral são práticas aplicadas na agricultura.
é fundamental para o entendimento de qual metal foi li- Deficiência de elementos-traço pode empobrecer o pas-
berado como resultado da atividade humana. to, dificultar o crescimento animal e causar desordens re-
Vulcanismo e atividades relacionadas à formação produtivas. Esses problemas freqüentemente geram
das rochas ígneas são os principais processos que tra- grande impacto em populações pobres que não podem
zem os elementos para a superfície terrestre. Por exem- gastar com intervenções nutricionais para seus animais.
plo, o vulcão Pinatubo ejetou em dois dias, em junho de
1991, cerca de 10 bilhões de toneladas de magma e 20 Interações, especiação e biodisponibilidade
milhões de toneladas de SO2, o que resultou na influên- Além do entendimento sobre as fontes naturais e an-
cia dos aerossóis no clima global por 3 anos. Somente tropogênicas das substâncias perigosas ao ambiente, é
esse evento introduziu 800.000 toneladas de zinco, também importante considerar a exposição e a biodispo-
600.000 toneladas de cobre e 1.000 toneladas de cád- nibilidade. Exposição é a descrição qualitativa e/ou quan-
mio na superfície terrestre. Além isso, 30.000 toneladas titativa do total da substância química que entra e é assi-
de níquel, 550.000 toneladas de cromo e 800 toneladas milada pelas diversas vias de exposição. Biodisponibili-
de mercúrio foram também adicionadas ao ambiente su- dade é a proporção da substância química disponível
perficial da Terra. Erupções vulcânicas redistribuem al- para entrar no organismo através de uma determinada via
guns elementos tóxicos, como o arsênio, berilo, cádmio, de exposição. A biodisponibilidade influencia diretamen-
mercúrio, chumbo, radônio e urânio, mas a maioria se te na exposição e, portanto, o efeito e risco em relação à
torna elemento remanescente, muitos têm ainda efeitos saúde. Grandes quantidades de substâncias, potencial-
biológicos não determinados. É também importante es- mente prejudiciais à saúde podem estar presentes no
tar consciente que se há uma média de 60 vulcões su- meio ambiente, mas se não estiverem em forma química
baéreos em erupção na superfície terrestre num determi- biodisponível, o risco para a saúde pode ser mínimo. A bi-
nado momento, vários elementos são lançados no ambi- odisponibilidade depende não somente das formas física
ente. Vulcanismo submarino é até mais significante do e química do elemento, mas também de outros fatores
que os das margens continentais e tem sido estimado ambientais, tais como pH, temperatura e condições de
cautelosamente que são no mínimo 3.000 chaminés nas umidade. A biodisponibilidade e a mobilidade de metais
cadeias mesoceânicas. Um fato interessante é que cer- como o zinco, chumbo e cádmio são maiores em condi-
ca de 50% de SO2 é de origem natural, principalmente ções ácidas e tornam-se menos biodisponíveis com o au-
proveniente de vulcões, e somente 50% tem origem nas mento do pH. Também o tipo de solo, o seu conteúdo de
atividades humanas. argila e areia e suas propriedades físicas afetam a migra-
Os elementos que ocorrem naturalmente não são ção dos metais através deles. Os organismos presentes
distribuídos igualmente na superfície terrestre e os pro- nos solos também afetam a solubilidade, o transporte e a
blemas podem surgir quando as concentrações dos ele- biodisponibilidade do metal.
mentos são muito baixas (deficiência) ou muito elevadas Além disso, foi demonstrado no caso de estudo com
(toxicidade). A incapacidade do ambiente prover o ba- o arsênio em Bangladesh, o perigo potencial somente se
lanço químico dos elementos pode levar a sérios proble- torna um problema se existe uma rota de exposição. O
mas de saúde. As interações entre o ambiente e a saúde potencial de dano à saúde, relacionado aos elevados
são particularmente importantes para a sobrevivência teores de arsênio nas águas subterrâneas, existe há mil
das populações que são altamente dependentes do anos, mas somente nos anos recentes, com a necessi-
ambiente local para suprir sua alimentação. Aproxima- dade de perfurar poços de água para consumo da popu-
damente 25 dos elementos que ocorrem naturalmente lação, foi que a via de exposição ficou estabelecida e os
são conhecidos por serem essenciais à vida das plantas efeitos na saúde se manifestaram. Na ausência de expo-
e dos animais, incluindo Ca, Mg, Fe, Co, Cu, Zn, P, N, S, sição, não haveria efeitos adversos.
Se, I e Mo. Por outro lado, o excesso desses elementos As vias de exposição incluem ingestão (alimentos,
pode causar intoxicação. Alguns elementos como o As, água, ingestão acidental ou não de solo), absorção der-
Cd, Pb, Hg e o Al não possuem função biológica ou a mal e inalação. Em termos de ingestão, se dá muita ênfa-
possuem de forma limitada e são geralmente tóxicos se à água pela facilidade de coleta e análise. Contudo,
para o homem. os solos e os alimentos são de grande importância na di-
Muitos desses elementos são conhecidos como ele- eta porque as concentrações das substâncias potencial-
mentos-traço porque eles geralmente ocorrem em pe- mente perigosas nos solos são mais elevadas (ppm) do
quenas concentrações (mg/kg ou ppm) em muitos solos. que na água (ppb). Se a ingestão de solo é
–2–
Olle Selinus
não-intencional ou se é caracterizada pela ingestão deli- potáveis de 50mg/l para 10mg/l. Entre os países com ca-
berada de solo, conhecida como geofagia, essa via de sos estudados e documentados de intoxicação por arsê-
exposição não deve ser subestimada. Por exemplo, es- nio estão Bangladesh, Índia (West Bengal), Taiwan, Chi-
tudos no Kênia têm mostrado que 60-90% de crianças na, México, Chile e Argentina. Os sintomas mais comuns
entre 5 a 14 anos de idade praticam geofagia e cada cri- da toxicidade crônica do arsênio são conjuntivites, mela-
ança consome em média 28g de solos por dia. nomas, despigmentação, queratose e hiperqueratose.
Na discussão da geologia médica é também neces- Como nos casos da Índia e Bangladesh, a relação entre
sário conhecer quais elementos são essenciais para os a exposição excessiva ao arsênio e casos de câncer in-
homens e animais. Os principais elementos são: cálcio, terno e de pele também ocorrem em Taiwan. A fonte do
cloro, magnésio, fósforo, potássio, sódio e enxofre. Os arsênio é natural, o elemento está presente nos minerais
elementos-traço essenciais são: cromo, cobalto, cobre, formadores das rochas, incluindo os óxidos de ferro e as
flúor, ferro, manganês, molibdênio, zinco e selênio. Os argilas, mas principalmente em sulfetos, especialmente
elementos que provavelmente não participam dos pro- em pirita e arsenopirita.
cessos biológicos são chamados elementos O radônio é um gás radioativo que ocorre natural-
não-essenciais e, freqüentemente, apresentam proprie- mente, é incolor, inodoro, e sem paladar, e somente
dades perigosas, por exemplo: arsênio, cádmio, mercú- pode ser detectado com equipamento especial. Ele é
rio e chumbo. Exposição a metais pesados pode resultar produzido por decaimento radioativo do rádio, o qual,
em efeitos negativos. por sua vez, é derivado por decaimento radioativo do
A maior parte dos metais pesados é essencial em urânio. O urânio é encontrado em baixas concentrações
diferentes funções biológicas nos organismos (por em solos e nas rochas, variando de lugar para lugar. O
exemplo, o cobalto, cobre, manganês, molibdênio, zin- radônio, sob forma de partículas radioativas pode entrar
co, níquel e vanádio). Eles são denominados micronutri- no corpo através da inalação, levando ao risco de cân-
entes. Em altas concentrações, no entanto, todos esses cer no trato respiratório, especialmente nos pulmões. O
metais produzem efeitos adversos nos organismos. A in- radônio inalado no ar do interior das casa é responsável
trodução de metais pesados, em larga escala, na socie- por cerca de 20.000 casos de morte ao ano, por câncer
dade – a tecnosfera – e eventualmente na biosfera tem de pulmão, nos Estados Unidos, e 2.000 a 3.000 no Rei-
trazido à tona os efeitos tóxicos nos animais e plantas e no Unido. Somente o cigarro causa mais mortes por cân-
caminhos não-sustentáveis. Cádmio, mercúrio, chumbo, cer de pulmão.
cobre e outros metais têm relação com vários efeitos na A geologia é o fator mais importante para controlar a
vida dos organismos. Destes, o mercúrio e o chumbo fonte e a distribuição do radônio. Os níveis relativamente
não participam de nenhuma função biológica nos orga- altos de emissão de radônio estão associados com um
nismos vivos. determinado tipo de rocha e depósitos inconsolidados,
por exemplo, granitos, rochas fosfáticas e xistos enrique-
Exemplos de geologia médica cidos em matéria orgânica. A liberação do radônio das
O arsênio inorgânico é um dos elementos tóxicos rochas e solos é controlada largamente pelos tipos de
mais conhecidos. Exposição crônica ao arsênio afeta minerais nos quais o urânio e o radônio ocorrem. Somen-
particularmente a pele, membranas mucosas, sistema te o gás radônio é liberado desses minerais, sua migra-
nervoso, medula óssea, fígado e coração. A toxicidade ção para a superfície é controlada pela permeabilidade
do arsênio é altamente dependente de sua forma quími- do leito rochoso e do solo; é carreado através de fluidos,
ca. A essencialidade do arsênio tem sido mostrada em incluindo o gás dióxido de carbono e a água subterrâ-
estudos com animais, mas não com humanos. As emis- nea; e por fatores meteorológicos tais como pressão ba-
sões naturais de arsênio no mundo para a atmosfera na rométrica e chuvas.
década de 80 foram 1,1 a 23,5 toneladas por ano, devi- O radônio dissolvido nas águas subterrâneas pode
das principalmente aos vulcões, partículas de solo leva- migrar por longas distâncias através de fraturas e caver-
das pelo vento, spray marinho e processos biogênicos. nas dependendo da velocidade do fluxo do fluido. O ra-
Apenas a combustão de carvão contribui com 20% das dônio é solúvel em água e pode ser transportado por dis-
emissões atmosféricas, e o arsênio das cinzas do carvão tâncias maiores do que 5km em drenagens subterrâ-
pode ser lixiviado para os solos e para as águas. neas, em calcários. Se emitido diretamente na fase ga-
Está havendo um aumento do conhecimento sobre sosa, pode ocorrer em água potável de mesa (águas
a toxicidade do arsênio devido à exposição a elevadas minerais). A presença de gás como meio de transporte,
concentrações no ambiente geoquímico. Os efeitos na tal como o dióxido de carbono favorece a migração do
saúde humana devidos ao arsênio são reconhecidos radônio. Esse parece ser o caso em certas formações
pela Organização Mundial da Saúde (OMS), que tem re- carbonáticas, onde as cavernas e fissuras subterrâneas
baixado o nível de segurança para o arsênio em águas possibilitam a rápida transferência da fase gasosa. O ra-
–3–
Geologia Médica
dônio em água para consumo pode resultar em exposi- senciais para os quais a alimentação é a principal fonte, a
ção humana por dois caminhos: por ingestão e por libe- principal fonte do flúor é a água. O flúor em águas superfi-
ração do radônio para o ar durante o banho ou pela chu- ciais e subterrâneas é proveniente de fontes naturais: (a)
va, permitindo que o radônio e seus produtos de decai- lixiviação de rochas enriquecidas em flúor; (b) dissolu-
mento sejam inalados. A presença de radônio nos solos ção de fluoretos dos gases vulcânicos por percolação
sob as casas é a maior fonte de radônio no ar dentro das da água subterrânea através de falhas e juntas em gran-
casas, e apresenta o maior risco para câncer de pulmão de profundidades e em nascentes; (c) água de chuva,
do que o radônio em água potável. Entretanto o radônio onde pode agregar pequena quantidade de fluoretos
em água potável pode ser um problema para as crianças provenientes de aerossóis marinhos e poeira continental
pequenas. contaminada; (d) emissões e efluentes industriais; (e) li-
A ligação entre o bócio e a deficiência de iodo é um xiviação de fertilizantes fosfatados, utilizados ostensiva-
exemplo clássico de geologia médica. A correlação en- mente em plantações em áreas agrícolas.
tre geologia-água-alimentação-doenças pode ser clara- Por exemplo, após a erupção do vulcão Hekla em
mente mostrada para o iodo. O bócio era comum nos po- Iceland em 1693, 1766 e 1845, severos incidentes de flu-
vos antigos da China, Grécia, Egito e entre os Incas, orose foram constatados e descritos. Desde a Segunda
onde os solos e/ou a água são usualmente deficientes Guerra Mundial, o Helka entrou em erupção em 1947,
em iodo, mas foi sucessivamente tratado com alga que 1970 e 1980, e análises para flúor foram executadas. O
contém altos teores de iodo. O iodo é um componente da vulcão liberou grande quantidade de flúor e concentra-
tireóide no hormônio tiroxina, e muito bem conhecido ções de 4.300ppm em gramíneas foram encontradas.
como elemento essencial para os homens e animais ma- No início do século XX ficou conhecido que altos
míferos. A deficiência de iodo resulta numa série de de- teores de flúor podem causar fluorose. A concentração
sordens na saúde, “Iodine Deficiency Disorders (IDD)”, natural de flúor em água potável é normalmente 0,1 a
sendo a mais comum o bócio endêmico. As áreas com 1ppm. Em muitos países, entretanto, a concentração
IDD tendem a ser geograficamente definidas. A mais se- pode ser tão alta quanto 40ppm, o que pode causar fluo-
vera ocorrência do bócio endêmico e o cretinismo ocor- rose severa. A situação é um pouco menos complicada
rem em áreas localizadas no alto de montanhas e re- porque existe o efeito antagônico. O molibdênio e o selê-
giões centrais dos continentes. nio podem reduzir os efeitos das altas concentrações de
O bócio ocorre devido ao crescimento da glândula flúor. Um dos maiores benefícios do flúor é seu antago-
tireóide como tentativa para compensar a insuficiência nismo com o alumínio. Em Ontário, no Canadá, existe um
do iodo. Como exemplo, numa estimativa acerca da po- número menor de casos de doença de Alzheimer onde a
pulação de 17 milhões no Sri Lanka, aproximadamente água potável contém mais flúor.
10 milhões apresentam risco para desenvolver o bócio. Um aspecto totalmente diferente na geologia médi-
A deficiência de iodo em mulheres grávidas pode tam- ca é a geofagia, é o hábito compulsivo de ingerir solo.
bém levar ao cretinismo e prejuízo da função cerebral da Em muitas sociedades rurais antigas a exposição aos
criança. A OMS estima que 1,6 bilhão de pessoas apre- elementos químicos ocorria principalmente através do
sentam risco relacionado à deficiência de iodo e que, hábito compulsivo de ingerir solo, ou de preparações
hoje, é a maior causa de retardamento mental no mundo. medicamentosas derivadas de solo. Tal comportamento
Só a China tem 425 milhões de pessoas com risco de de- é na medicina conhecido como pica ou mais especifica-
senvolver algum tipo de IDD. mente como geofagia. Geofagia é comum entre socieda-
Outro elemento importante é o flúor. A geoquímica des tradicionais e é reconhecida desde o tempo de Aris-
do flúor em água subterrânea e a saúde dental em comu- tóteles como meio de cura para problemas de saúde.
nidades, particularmente aquelas que dependem da Hoje a geofagia é conhecida como uma resposta do
água subterrânea para suprir as necessidades de água subconsciente para dietas tóxicas ou estresse onde se tor-
potável, é um dos maiores exemplos de relação entre a na necessidade a ingestão de solo, podendo se desenvol-
geoquímica e a saúde. Em muitos dos sistemas de supri- ver ao extremo de tornar-se obsessiva ou compulsiva. Essa
mento de água, particularmente em países em desenvol- ânsia ocorre geralmente imediatamente após a chuva. No
vimento, onde a escavação de poços profundos é a mai- Kênia, a quantidade de solo ingerido pelas pessoas pode
or fonte de água, a água contém excesso de flúor e como ser calculada em 20 gramas por dia. Isto representa 400
tal é prejudicial à saúde dental. vezes mais do que a quantidade de solo ingerida através
O flúor é um elemento essencial com recomenda- da atitude de levar as mãos à boca (isto é, 50 miligramas
ção de ingestão diária de 1,5 a 4,0 mg/dia. Problemas de por dia). A ingestão de grande quantidade de solo aumen-
saúde tais como cáries ou dentes manchados ou fluo- ta a exposição aos elementos-traço nutrientes, e promove
rose esquelética podem ocorrer devidos ao excesso ou também um significativo aumento da exposição às patolo-
deficiência de flúor. Ao contrário de outros elementos es- gias biológicas e à potencialidade tóxica dos elemen-
–4–
Olle Selinus
tos-traço, especialmente em áreas associadas com extra- res geológicos para a saúde, a comissão
ção mineral ou ambientes urbanos poluídos. COGEOENVIRONMENT (Comissão das Ciências Geoló-
Poeiras ocorrem naturalmente. A exposição às po- gicas para o Planejamento Ambiental) do IUGS, criou em
eiras minerais pode causar vários problemas respiratóri- 1996 o International Working Group on Medical Geology
os. Os efeitos na saúde à exposição das poeiras minerais coordenado pelo Geological Survey of Sweden, SGU,
foram descritos décadas atrás, sendo os asbestos um com o principal objetivo de aumentar a consciência des-
exemplo clássico. A exposição à poeira pode também sa questão entre os cientistas, especialistas médicos e o
afetar vastas regiões, tais como as poeiras levantadas por público em geral. Em 2000 um novo projeto IGCP foi es-
terremotos nas regiões áridas do sudoeste dos Estados tabelecido pela UNESCO: IGCP#454 Medical Geology.
Unidos e nordeste do México. A exposição às poeiras O International Council of Scientific Unions (ICSU) tam-
pode ter dimensões globais. As cinzas ejetadas pelas bém patrocinou em 2002-2003 mini cursos internaciona-
erupções vulcânicas podem viajar ao redor do mundo e, is com esse objetivo, em cooperação com o SGU, United
imagens de satélite recentes mostraram ventos levando States Geological Survey e o US Armed Forces of Patho-
poeira dos desertos do Saara e de Gobi a distâncias que logy em Washington. Esses cursos têm tido continuidade
cobrem mais da metade do caminho ao redor do mundo. em todo mundo e, mais recentemente, um no Brasil, em
O maior efeito para a saúde humana é a inalação das par- junho de 2005. Em março de 2002, o IUGS anunciou que
tículas finas da poeira. Sob este ponto de vista, trabalho o International Working Group on Medical Geology foi in-
considerável está sendo conduzido para identificar as dicado para operar com o status de Projeto Especial,
partículas das poeiras derivadas de solos, sedimentos e operando diretamente com a IUGS. Olle Selinius é o dire-
de superfícies das rochas intemperizadas. tor em atividade. José Centeno e Bob Finkelman são
co-diretores. A nova associação internacional, Internati-
O futuro da Geologia Médica onal Medical Geology Association – IMGA (www.medi-
Naturalmente ocorrem materiais como rochas, mi- calgeology.org), é agora também estabelecida com um
nerais, poeiras, águas que podem causar efeitos profun- conselheiro no Brasil. No Ano do Planeta Terra, um dos
dos na saúde humana, das plantas e dos animais. O en- principais tópicos é a geologia médica.
tendimento do complexo relacionamento entre o ambi- Os serviços geológicos, universidades e socieda-
ente natural e a saúde dos animais e do homem requer des geológicas deverão dar continuidade e fornecer as
colaboração entre médicos, veterinários, geocientistas e informações geológicas necessárias, relacionadas à
toxicologistas. O campo emergente da geologia médica geologia médica e apoiar o desenvolvimento de grupos
é o elo entre esses campos interdisciplinares. Isto requer de trabalho locais multidisciplinares, de geologia médi-
coordenação entre os países desenvolvidos e os em de- ca. Se necessário, desenvolver estudos de metodologi-
senvolvimento. as para estudar os fatores geológicos na medicina ambi-
A geologia médica é uma ciência interdisciplinar ental e formular recomendações para mitigação dos
com rápido crescimento. Devido a importância dos fato- efeitos danosos naturais e induzidos pelo homem.
–5–
Geologia Médica no Brasil
GEOLOGIA MÉDICA NO
BRASIL
¹Cassio Roberto da Silva, cassio@rj.cprm.gov.br
²Bernardino Ribeiro Figueiredo, berna@ige.unicamp.br
²Eduardo Mello De Capitani, capitani@hc.unicamp.br
¹Serviço Geológico do Brasil – CPRM/RJ
²Universidade Estadual de Campinas - UNICAMP
–6–
Cassio Roberto da Silva
de crianças e adultos, residentes na proximidade da buco, Ceará, Rio Grande do Norte, Pará, Amazonas e
metalurgia da Plumbum S.A. em Adrianópolis, Paraná Rondônia).
(Paoliello, 2002; Cunha, 2003; Figueiredo, 2005). Na Graças à qualidade e quantidade dos trabalhos
mesma região, em Iporanga, Estado de São Paulo, em- apresentados pelos pesquisadores brasileiros no Work-
bora tenham sido identificadas concentrações anômalas shop Internacional de Geologia Médica no Rio de Janei-
de arsênio em solo e sedimentos, os níveis de exposição ro foi possível editar o presente livro, abordando temas
humana revelaram-se baixos, não representando risco à relativos a As, Hg, F, Pb, amianto, substâncias orgânicas
saúde da população (Sakuma, 2004). e qualidade de águas para abastecimento público.
Diversos trabalhos de avaliação de risco humano à
assimilação de mercúrio em garimpos, principalmente GEOLOGIA MÉDICA
da região amazônica, têm sido realizados por pesquisa-
dores do CETEM, FIOCRUZ, Instituto Evandro Chagas, No Brasil, pesquisadores da área de Geologia Mé-
UFPA, INPA, UFAM e UFRO. Nos sites dessas institui- dica têm recorrido principalmente aos livros e artigos de
ções pode-se encontrar inúmeros trabalhos sobre o refe- Selinus et al., (2005), Skinner & Berger (2003), Cortecci
rido assunto. (2002), Singh (2000), Licht (2001) e Figueiredo (2005b).
A partir de 2002, após o Congresso Brasileiro de Assim, com base nesses autores, a Geologia Médica
Geologia, ocorrido em João Pessoa, Paraíba, um grupo pode ser definida como “o estudo das relações entre os
de pesquisadores de mais de uma dezena de universida- fatores geológicos naturais e a saúde, visando o
des e instituições, decidiram criar um grupo de discus- bem-estar dos seres humanos e outros organismos vi-
são, denominado Rede de Pesquisa em Geoquimica vos”. Outro entendimento mais conciso é de ser “o estudo
Ambiental e Geologia Médica – REGAGEM (rega- do impacto dos materiais e processos geológicos na saú-
gem@ige.unicamp.br), atualmente com 345 membros. O de pública”. De acordo com esta visão, a geologia médi-
objetivo desse grupo foi o de conceber e propor o Pro- ca inclui “a identificação e caracterização das fontes na-
grama Nacional de Pesquisa em Geoquímica Ambiental e turais e antrópicas de materiais nocivos no ambiente, bus-
Geologia Médica – PGAGEM e disponibilizar informações cando prever o movimento e alteração dos agentes quími-
deste programa, links e demais dados relacionados à cos, infecciosos e outros causadores de doenças ao
geologia médica no site www.cprm.gov.br/pgagem. longo do tempo e espaço, bem como compreender como
O primeiro evento de geologia médica ocorrido no as pessoas estão expostas a tais materiais e o que pode
Brasil, o International Workshop on Medical Geology, foi ser feito para minimizar ou evitar tal exposição”.
realizado na UNICAMP, em outubro de 2003, com o mi- A união proporcionada pela Geologia Médica entre
nicurso ministrado pelos pesquisadores Olle Selinus, geólogos e outros cientistas como médicos, odontólo-
Robert Finkelman e José Centeno do IGCP 454 da gos, veterinários e biólogos, num esforço para resolver
IUGS-UNESCO, contando com a participação de 110 local e globalmente as questões de saúde, objetiva forta-
brasileiros, principalmente das áreas de geociências, lecer e integrar pesquisas que possam reduzir as amea-
saúde e química. Um resultado interessante dessa ativi- ças ambientais para a saúde e bem-estar dos humanos
dade na comunidade foi que já no Simpósio de Geologia e animais.
Médica do 32º Congresso Internacional de Geologia, As questões associadas à saúde geralmente se re-
ocorrido em Florença-Itália, em setembro de 2004, do to- ferem a seres humanos e outras criaturas vivas, ao passo
tal de 33 apresentações 4 foram de pesquisadores bra- que o foco da geologia é sobre o inanimado e o passado
sileiros. distante. Assim, embora possam estar em áreas distintas
O segundo workshop ocorreu em junho de 2005 no do conhecimento ou requeiram diferentes abordagens
Rio de Janeiro, nas dependências do Serviço Geológico de investigação, as relações diretas entre estas duas
do Brasil, tendo o minicurso, atualizado, com os mesmos disciplinas não podem ser ignoradas. “A vida desenvol-
pesquisadores internacionais mencionados acima. Nes- ve-se numa matriz de materiais da terra – rochas, mine-
se evento foram feitas apresentações de pesquisas bra- rais, solos, água, ar – cuja disponibilidade exerce um
sileiras que alcançaram a marca surpreendente de 56 profundo controle sobre o que todas as criaturas vivas
trabalhos (12 palestras e 44 painéis). Contou com a parti- ingerem e como elas se desenvolvem biológica e cultu-
cipação de 210 profissionais das áreas das geociências ralmente”, assim, “somos o que comemos e bebemos” .
(48%), saúde (16%), química (4%), outras profissões O ar que respiramos, a água que bebemos e os nu-
(11%) incluindo estudantes de graduação e trientes que consumimos dependem do ambiente geoló-
pós-graduação em geologia (21%). Os participantes gico, que podemos controlar somente de forma parcial.
eram oriundos de vários estados brasileiros (Rio Grande Como lutamos para nos adequar a um mundo de 10 bi-
do Sul, Santa Catarina, Paraná, São Paulo, Rio de Janei- lhões de pessoas, um melhor entendimento acerca dos
ro, Minas gerais, Goiás, Distrito Federal, Bahia, Pernam- processos pelos quais o ambiente natural influencia a
–7–
Geologia Médica no Brasil
nossa saúde deverá permitir decisões mais apropriadas elementos essenciais costumam ser divididos em macro-
no futuro. É consenso geral que as mudanças globais nutrientes (que necessitam ser absorvidos através da die-
estão relacionadas aos poderosos impactos produzidos ta em grande quantidade) participando da massa corpo-
pelo homem na sua vizinhança. É justamente os efeitos ral em concentrações maiores que 0,1% (Ca, Cl, P, K, Na,
nocivos ou benéficos que por vezes os materiais e pro- S) e micronutrientes, com concentrações corpóreas abai-
cessos geológicos provocam sobre os seres humanos xo de 0,1% (Mg, Si, Fe, F, Zn, Cu, Mn, Sn, I, Se, Ni, Mo, V,
constituem o tema central da Geologia Médica. Cr, Co). Tabela 1.
A combinação dos conhecimentos oriundos das Apesar de não essenciais, muitos elementos são re-
ciências da terra com aqueles provenientes da medicina gularmente absorvidos através da dieta (alimentos e
e das ciências da vida oferece a oportunidade de inúme- água) e inalados junto com o ar respirado. Dessa forma,
ras aplicações e possibilidades para a solução de ques- podem ocorrer quantidades variáveis desses elementos
tões concernentes à saúde. Essa integração de esfor- que se depositam no corpo humano de acordo com suas
ços pode melhorar a definição do problema, auxiliar nas afinidades químicas por determinados tecidos, como
estratégias de abordagem, definir e localizar fontes de por exemplo: alumínio (Al), bário (Ba), cádmio (Cd),
água potável, e desenvolver soluções econômicas base- chumbo (Pb), arsênio (As), mercúrio (Hg), estrôncio (Sr),
adas em princípios geológicos que podem ajudar a mi- urânio (U), prata (Ag) e ouro (Au) (Emsley, 2001).
norar, mas principalmente prevenir sofrimento e doença. Os elementos constituintes das rochas ao serem li-
Há a expectativa de que os geocientistas, juntamen- berados pelo intemperismo podem ser disponibilizados
te com os profissionais da saúde, contribuam significati- no solo para em seguida serem levados para as águas
vamente para a melhoria da qualidade da saúde públi- dos rios e subterrâneas. No solo, podem ser assimilados
ca. Segundo geocientistas europeus, os estudos efetua- pelas raízes de plantas, entrando na cadeia alimentar.
dos nos últimos 15 anos são apenas a ponta de um ice- Também entram na cadeia alimentar quando carreados
berg, uma pequena mostra do espectro da pesquisa que em solução pela drenagem e assimilados por seres
agora se inicia e que transitará no extenso espaço entre aquáticos. Mas, além da dieta, as substâncias químicas
a geologia e a medicina. podem ainda ser também assimiladas pelos seres vivos
A Geologia Médica é uma “ciência” de equipe, exi- por inalação ou pela pele.
gindo bom entrosamento e entendimento com outras De modo geral, o solo, as águas correntes e as plan-
ciências. Em detalhe, estuda variações regionais ou lo- tas refletem a composição das rochas do substrato, essa
cais na distribuição dos elementos, principalmente os relação é muito usada em exploração mineral para a
metálicos e metalóides, seu comportamento geológi- descoberta de depósitos minerais. Ao alimentar-se da
co-geoquímico, as contaminações naturais e artificiais e vegetação, os animais silvestres também refletem o qui-
os danos à saúde humana, animal e vegetal, por exces- mismo da região onde vivem. Essa relação é observada
sos ou deficiências. também com huma-
A vida na terra se desenvolveu na presença de todos nos, havendo casos
os 97 elementos que ocorrem naturalmente, incluindo os clássicos de doen-
que chamamos de essenciais, não essenciais, tóxicos e ças acompanhando
os possivelmente tóxicos (Garret, 2005). O corpo humano faixas geológicas
necessita de 25 elementos reconhecidos até o momento que exibem anomali-
como essenciais ao seu funcionamento adequado. Den- as litológicas ou geo-
tre os elementos que são considerados essenciais o prin- químicas (Figuras 1 e
cipal deles é o carbono (C), sem o qual não haveria qual- 2). Anomalias são re-
quer forma de vida como é conhecida hoje. Cadeias mo- lacionadas a efeitos
leculares de carbono são a base estrutural de milhares de de poluição, porém
diferentes compostos constituintes das células, como as não podem ser igno-
proteínas e o DNA. Como mais de 60% da massa corporal radas contaminações
é constituída de água (H2O), o oxigênio e o hidrogênio naturais como, por
têm uma participação significativa como elementos es- exemplo, as provo-
senciais. O oxigênio supera qualquer outro elemento em cadas pela deposi-
quantidade no corpo humano (61% da massa corpórea) ção de cinzas ejeta-
por sua participação também na estrutura óssea na forma das em erupções
de fosfato de cálcio. Da mesma forma, o nitrogênio (N) faz vulcânicas e pelas Figura 1 – Doença de Kaschin-Beck,
China distúrbio de formação óssea
parte desse grupo seleto dos 4 mais importantes elemen- nuvens de pó gera-
afetando o crescimento e produzindo
tos essenciais (junto com o O, H, e C), pois participa prati- das em áreas desér- deformidades, causados por deficiência
camente de todas as proteínas e do DNA. Os outros 21 ticas. de selênio na água e solos.
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Cassio Roberto da Silva
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Geologia Médica no Brasil
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Cassio Roberto da Silva
de contaminação da população por elementos São previstas também a coleta de amostras de água
químicos; de consumo doméstico nos municípios onde não haja
· planejamento de atividades, na área de estudos estação de tratamento de água ou este seja deficiente, e
ambientais, do Ministério da Saúde, do Ministério do de solos superficiais (0-25 cm), na quantidade de três
Meio Ambiente e de outros órgãos ambientais, esta- amostras por município, em áreas cultivadas.
duais e municipais, da Agência Nacional de Águas A figura 3 apresenta a programação de amostra-
– ANA, e dos comitês de bacias hidrográficas; gens por regiões, com cerca de 29.700 estações, com a
· identificação de focos superficiais de contamina- coleta de sedimento e água (onde houver), que soma-
ção natural ou antropogênica em áreas urbanas das apontam cerca de 59.400 amostras. Estima-se ainda
ou rurais; a coleta de mais 5.000 amostras de águas para abaste-
· caracterização geoquímico-ambiental das zonas cimento e 10.000 amostras de solos, que totalizariam
de recargas de aqüíferos; 74.400 amostras para todo o programa.
· determinação da extensão da pluma de contami- Mais detalhes sobre os procedimentos metodológi-
nação nas águas superficiais e subterrâneas, no- cos adotados pelo PGAGEM podem ser obtidos na pági-
tadamente aquelas próximas a lixões e aterros; na www.cprm.gov.br/pgagem, Lins (2002).
· elaboração de mapas de vulnerabilidade de solos
e de águas subterrâneas e mapas de riscos;
· geração de informações de geoquímica de solo Norte Nordeste
2
3.800.000 km 1.600.000 km
2
(200 estações em 44.000 km²), nas bacias dos rios Mogi Total 4.600 estações
Guaçu e Pardo (99 estações em 21.000 km²), e Vale do 8.514.000 km2
29.700 estações
Rio Ribeira (187 estações em 28.000 km²).
O PGAGEM abrange todo o território brasileiro, fo-
calizando inicialmente regiões e bacias hidrográficas Figura 3 – Distribuição regional das estações de amostragens de
sedimento de corrente (fundo e água de drenagem.
onde existem problemas de saúde que podem estar re-
lacionados com o meio ambiente. Serão também estuda-
das, prioritariamente, as áreas com indícios de altera-
ções na qualidade dos corpos d’água e do solo que po- Resultados Parciais
dem causar efeitos adversos à saúde dos seres vivos. No âmbito do PGAGEM já foram executados vários
A amostragem geoquímica compreende a coleta trabalhos no período de apenas dois anos de 2003 a
de amostras de água superficial (onde houver) e de se- 2005.
dimentos ativos de corrente nas drenagens das bacias Sob a responsabilidade da CPRM e instituições con-
hidrográficas da região estudada com adensamento di- veniadas foram coletadas cerca de 4.041 amostras de
ferenciado. Na região amazônica, devido ao problema água, sedimento de corrente e solos e, destas, cerca de
de acesso, serão amostradas bacias com áreas de 2.960 amostras foram analisadas e os resultados de al-
captação em torno de 2.000 km² (1.000 – 3.000 km2). gumas áreas como, Parintins no Amazonas, NE (parte
Nas demais regiões as bacias selecionadas têm entre oriental) do Estado do Pará, Lagoa Real na Bahia, Vale
100 e 200 km2. do Ribeira-SP/PR, Estado do Ceará e Lavras no Rio
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Geologia Médica no Brasil
Grande do Sul, encontram-se neste livro. Os demais re- que acusaram concentrações de urânio no intervalo de
sultados das outras regiões (Rondônia,Estado de Goiás, 0,041 a 0,566 mg/L excedendo o teor máximo admitido
Teresina e Itinga-MG) deverão ser divulgados no ano de de 0,02 mg/L de U em 8 poços tubulares. Destaca ainda,
2006. o excesso de captação de água subterrânea, prevendo
A ilha de Parintins, localizada na margem direita do em curto prazo escassez desse bem mineral.
Rio Amazonas, cerca de 350 km a jusante de Manaus, O Projeto Paisagens Geoquímicas e Ambientais do
hoje um destacado pólo turístico da região, pela tradicio- Vale do Ribeira – Avaliação e Prevenção de Risco para o
nal festa do Boi-Bumbá, vinha apresentando problemas Meio Físico e Saúde Humana Relacionados à Exposição
com a saúde da população, provavelmente associados ao Arsênio e Metais Pesados, executado em parceria
à má qualidade das águas de abastecimento público, por geólogos, químicos, médicos e toxicologistas da
em vista do grande aumento populacional, principal- UNICAMP, Universidade Estadual de Londrina, Instituto
mente na época de festas. As atividades desenvolvidas Adolfo Lutz e Serviço Geológico do Brasil – CPRM, se-
na ilha, por Marmos & Aguiar (2006), incluíram a análise gundo Figueiredo (2005b), contemplou a elaboração do
de 6 amostras de água corrente e 33 de poços tubulares. Atlas Geoambiental (Alto e Médio Vale do Ribeira), do
As primeiras mostraram-se normais, enquanto entre as Atlas Geoquímico de Sedimento do Vale do Ribeira e ge-
amostras de água subterrânea, cerca de 63% apresen- ração de dados inéditos sobre a exposição de Pb e As
taram elevados teores de NO3 (11-49 mg/L), Al (0,3 – 2,0 em ecossistemas e agrupamentos humanos no Alto e
mg/L) e amônia (2,9 mg/L) que foram atribuídos à conta- Médio Vale do Ribeira- SP/PR. Grande parte dos resulta-
minação antrópica, pois somente os poços com profun- dos obtidos nesse projeto consta de outros artigos deste
didades menores que 65 metros apresentaram esses te- livro e no site www.ige.unicamp.br/geomed.
ores elevados. No sul do Brasil, Grazia & Pestana (2006) estudaram
No nordeste do Pará, segundo Macambira & Viglio o distrito aurífero de Lavras do Sul – RS, em vista do pas-
(2006), os resultados da análise de 77 amostras de água sivo ambiental deixado pelas minerações e garimpos
de abastecimento público, abrangendo cerca de 80% desde o final do século XIX. Foram analisadas 43 amos-
da área estudada, revelaram-se excessivos para Al e Pb, tras de sedimento de corrente e 11 de solos. Os solos
respectivamente, 18 e 145 vezes o valor máximo permiti- apresentaram contaminação, principalmente nas áreas
do pelo CONAMA e OMS, seguidos pelos teores de B, próximas às instalações de beneficiamento das minera-
Cd, Fe, Cu, K, Mn, Zn e P. Estes dados de qualidade de doras, em níveis superiores aos de intervenção da
água estão sendo analisados sob o ponto de vista da CETESB (2005) de 5 ppm para Hg. As concentrações
sua correlação ou não com alta prevalência na região de mais elevadas foram encontradas para Hg (10,3 a 18,5
doenças endêmicas como verminoses, doenças no apa- ppm), para As (24,5 – 163 ppm), Cu (124 – 1.469 ppm) e
relho digestivo (câncer), cáries dentárias, anemia e he- Pb (719 – 1.465 ppm). Os autores recomendam a reme-
patite. diação do solo no entorno das instalações de beneficia-
Frizzo (2006) apresenta resultados analíticos obti- mento da CRM, Chiapetta e Cerro Rico, as quais podem
dos em 234 amostras de água de abastecimento público constituir fator de risco à saúde humana.
provenientes de poços tubulares e amazonas, açudes e Os exemplos dados acima revelam que as ativida-
lagos, fontes e rios, no estado do Ceará, numa área de des que vêm se desenvolvendo no âmbito do PGAGEM
146.000 km². Concentrações acima do permitido pelo tendem a atingir um nível significativo embora ainda res-
CONAMA foram detectadas em 43% das amostras, para te muito a ser feito. Normalmente, após a identificação e
os elementos considerados tóxicos: Al (0,11 – 0,80 constatação de valores anômalos de elementos tóxicos
mg/L), As (0,02 mg/L), B (0,63 mg/L), Cd (0,001 – 0,02 que possam causar efeitos adversos à saúde das popu-
mg/L) e Pb (0,01 – 0,46 mg/L) e, para aqueles considera- lações, espera-se que profissionais/instituições da saú-
dos tóxicos e essenciais: Ba (0,71 – 5,59 mg/L), Fe (0,31 de possam viabilizar a aplicação de técnicas de análise
– 12,1 mg/L), Mn (0,11 – 1,21 mg/L), Ni (0,26 mg/L) e Zn dos riscos aos quais as populações estão sujeitas.Os re-
(0,18 – 0,76 mg/L). Estas informações foram repassadas sultados tanto relativos à geoquímica quanto da parte
para o órgão responsável pelo saneamento do estado, o médica devam impreterivelmente ser dados ao conheci-
qual vem procedendo reamostragem da água para ter mento dos órgãos responsáveis pela saúde pública, vi-
uma melhor definição das medidas mitigadoras a serem sando ações coordenadas para que não ocorram alar-
tomadas. des desnecessários.
Em Lagoa Real na Bahia, Oliveira (2006) efetuou É também aconselhável que, de acordo com a área
amostragem em água subterrânea (n=32), solos (n=32) estudada e o tipo de contaminação, sejam desenvolvi-
e sedimento de corrente (n=42), numa área de 1.126 dos em parceria com os órgãos de saúde, programas de
km², onde recomenda especial atenção para o consumo comunicação de risco e de educação ambiental com a
de água na região, em vista dos resultados analíticos população afetada.
– 12 –
Cassio Roberto da Silva
O PGAGEM pode servir de incentivo aos pesquisa- contínuo fortalecimento dessa área, continuarão a ser
dores que compõem a REGAGEM para, através de suas importantes os encontros científicos periódicos e a reali-
instituições, estabelecerem parcerias com o SGB-CPRM zação de minicursos que doravante deverão contar com
ou com outras entidades, com a finalidade de pleitear re- o apoio da Associação Internacional de Geologia Médi-
cursos ante órgãos financiadores de pesquisas (CNPq, ca – IMGA.
FINEP, Fundos de Pesquisa e Setoriais) visando a exe-
cução de novos projetos. Muitos outros projetos em áre- REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
as específicas e que exigem maior detalhamento podem
ser propostos para regiões metropolitanas, bacias hidro- CARVALHO F.M.; BARRETO, M.L.; SILVANY NETO,
gráficas, em distritos mineiros e em zonas agrícolas es- A.M.; WALDRON, H.A.; TAVARES, T.M. Multiple cau-
peciais. Estes projetos podem ter a participação ativa de ses of anaemia amongst children living near a lead
entidades de pesquisas federais, estaduais e municipais smelter in Brazil. Sci Total Environ, Amsterdam, v. 35,
e universidades. n. 1, p. 71-84, Apr. 1984.
Convém destacar neste programa de geoquímica a CARVALHO, F.M.; SILVANY-NETO, A.M.; TAVARES,
importância da homogeneização nos procedimentos de T.M.; LIMA, M.E.; WALDRON, H.A. Lead poisoning
coleta e análise das amostras, pelas instituições e pes- among children from Santo Amaro, Brazil. Bull Pan
quisadores, de forma a alimentar o banco de dados de Am Health Organ. Washington, v. 19, n. 2, p.
todo o Brasil, disponível e acessível na internet para toda 165-175, 1985.
a comunidade científica e público em geral. COMPANHIA DE TECNOLOGIA DE SANEAMNETO
AMBIENTAL. Decisão de Diretoria No 195/2005. Dis-
CONSIDERAÇÕES FINAIS ponível em:<http://www.cetesb.sp.gov.br>. Acesso
em 01 jun. 2006.
Em paralelo à execução do PGAGEM e consideran- CORTECCI, G. Geologia e Salute. Disponível em:
do que a Geologia Médica ainda é uma atividade inova- <http://www.dst.unipi.it/fist/salute/salute.htm>.
dora e desconhecida no Brasil, os participantes da Acesso em 31 jul. 2006.
REGAGEM têm realizado inúmeras atividades de divul- CUNHA, F.G. Contaminação humana e ambiental por
gação, incluindo a distribuição de impressos, em portu- chumbo no Vale do Ribeira, nos Estados de São Pau-
guês e inglês, realização de palestras, cursos e partici- lo e Paraná, Brasil. 2003.111p. Tese (Doutorado em
pação em mesas-redondas em congressos e simpósios, Ciências)- Instituto de Geociências, Universidade
relacionados a geologia, recursos hídricos, meio ambi- Estadual de Campinas, Campinas, 2003.
ente e da área médica, assim como em semanas de geo- EMSLEY, J. Nature’s Building Blocks : an A-Z guide to
logia promovidas por graduandos do curso de geologia the elements. Oxford: Oxford University Press,
em diversas universidades do país. 2001.
A Universidade Estadual de Campinas – UNICAMP FIGUEIREDO, B.R. A contaminação ambiental e humana
e a Pontifícia Universidade Católica de Goiás – PUC/GO, por chumbo no Vale do Ribeira (SP-PR). Com ciên-
já incluíram em seus programas de pós-graduação al- cia, Campinas, n. 71, nov. 2005. Disponível em:
guns conteúdos de Geologia Médica. Vislumbra-se para <http://www.comciencia.br>. Acesso em: 31 jul.
o futuro uma inserção crescente da nova disciplina nos 2006.
cursos de graduação e pós-graduação de geologia e de FIGUEIREDO, B. R. Estudo geoquímicos e ecotoxicoló-
medicina, contando-se para isso com a difusão do livro giocos do Vale do Ribeira. [S.l]: FAPESP; UNICAMP;
texto “Essentials of Medical Geology” recém-publicado. IAL; UEL; CPRM, 2005. 1 CDROM. Projeto Paisagens
Recentemente, foram adquiridos exemplares desse livro Geoquímicas e Ambientais do Vale do Ribeira.
e distribuídos entre os profissionais do Serviço Geológi- FRIZZO, S. J. Elementos químicos em águas de abaste-
co do Brasil –CPRM e pesquisadores de diversas institui- cimento público no Estado do Ceará. In:
ções e regiões do país. INTERNATIONAL WORKSHOP ON MEDICAL
Os dados e fatos relatados acima denotam que a GEOLOGY, 2005, Rio de Janeiro. [Trabalhos apre-
Geologia Médica no Brasil vem tendo um acentuado sentados]. Rio de Janeiro: CPRM, 2006.
crescimento a partir de 2003, devido principalmente à GARRET, R.G. Natural distribution and abundance of
criação da rede de discussão REGAGEM, à execução elements. In: SELENIUS, O. (Ed). Essentials of Medi-
do programa nacional de pesquisa PGAGEM e manuten- cal Geology: impact of the natural environment on
ção de website próprio. Partindo de menos de uma de- public health. Amsterdam: Elsevier, 2005. p. 17-41.
zena de pesquisadores em 2000, estima-se que, atual- GRAZIA, C. A.; PESTANA, M.H. D. Contaminação por
mente, devam estar atuando na área de Geologia Médi- Mercurio Antrópico em Solos e Sedimentos de Cor-
ca aproximadamente 80 pesquisadores no Brasil. Para o rente de Lavras do Sul – RS – Brasil.
– 13 –
Geologia Médica no Brasil
– 14 –
Eduardo Mello De Capitani
EPIDEMIOLOGIA E
GEOLOGIA MÉDICA
Eduardo Mello De Capitani
Departamento de Clínica Médica
Centro de Controle de Intoxicações
Faculdade de Ciências Médicas
Universidade Estadual de Campinas
– 15 –
Epidemiologia e Geologia Médica
cia e prevalência disponíveis, ou coletados especial- Qualquer inferência sobre relação causal entre determi-
mente. nado fator (ambiental, ocupacional, genético, relacio-
Incidência de uma doença ou evento de saúde é de- nado a hábitos alimentares, etc.), que for feita ao final
finida como o número de casos novos sobre o número de de um estudo epidemiológico deverá estar referencia-
pessoas expostas ao risco naquela comunidade (bairro, da à qualidade do dado de morbidade e mortalidade
cidade, estado, país, continente, etc.) por período de inicial.
tempo (em geral por ano, ou durante epidemias, por mês Com relação à definição da etiologia de determina-
ou semana). do agravo à saúde, o investigador deve proceder se-
Prevalência diz respeito ao número de casos acu- guindo duas etapas essenciais ao raciocínio epidemio-
mulados durante certo período de tempo, incluindo os lógico: 1º) determinar se existe uma ASSOCIAÇÃO en-
incidentes, e os que cronificaram ou ainda não se cura- tre um fator (por exemplo, determinada exposição am-
ram. Estes seriam os dados referentes à morbidade. biental) e um agravo à saúde e, 2º) no caso de haver
Morbidade é “um termo genérico usado para desig- uma associação, derivar inferências apropriadas sobre
nar o conjunto de casos de uma dada afecção ou a soma a existência de RELAÇÃO CAUSAL na associação, se-
de agravos à saúde que atingem um grupo de indivídu- guindo critérios de julgamento já bem definidos (ver
os” (Pereira, 2000). As estimativas de morbidade de uma adiante).
dada população são baseadas em diversas fontes de re-
gistro, como dados de prontuários de serviços de saúde; Tipos de estudos (desenhos) epidemiológicos
notificação compulsória de determinadas doenças (em
geral as infecto-contagiosas); registros especiais de do- Os estudos epidemiológicos podem ser divididos
enças como câncer, tuberculose, AIDS, lepra; arquivos didaticamente em observacionais e experimentais (Qua-
de laboratórios de anatomia-patológica; dados de inter- dro 1). Os estudos observacionais são divididos em des-
nações do SUS (Sistema Único de Saúde), e outras fon- critivos, de um lado, e analíticos, de outro.
tes. A qualidade desses dados está sempre relacionada Os estudos experimentais em epidemiologia limi-
ao grau de cobertura desses registros e à qualidade da tam-se basicamente aos chamados ensaios clínicos te-
assistência médica fornecida. rapêuticos controlados, usados para avaliar a eficácia
Dados sobre mortalidade são também extremamen- de novos medicamentos ou tratamentos, nos quais se
te importantes e, dependendo da situação, podem ter tenta controlar todas as variáveis interferentes no pro-
mais relevância epidemiológica que os dados de morbi- cesso de tratamento, selecionando adequadamente os
dade. doentes, definindo critérios de diagnóstico da doença,
Os dados de mortalidade estão baseados em regis- determinando doses de exposição, e estabelecendo o
tros feitos a partir dos atestados ou declarações de óbi- tipo de resultado que se espera de um novo medicamen-
to, padronizadas internacionalmente, nos quais devem to ou tratamento em comparação com o tradicional, ou
constar informações sobre: a) a causa básica da morte mesmo com o tratamento placebo (medicamento sem
(ou seja, a doença ou lesão que desencadeou a série de princípio ativo, por exemplo).
acontecimentos patológicos, e que redundou diretamen-
te na morte); b) complicações eventuais ocorridas; e c)
Quadro 1 – Tipos de estudos epidemiológicos.
outros estados patológicos significativos que não te-
nham tido relação direta com a morte.
A padronização no preenchimento das declara- OBSERVACIONAIS
ções de óbito trouxe grandes benefícios quanto à pos-
1. Descritivos (descrevem a situação e geram hipóteses de
sibilidade de comparação de dados em nível internaci- relação causal)
onal. Ocorre que a qualidade do preenchimento ainda
· Prevalência / incidência
é um grande problema em todo o mundo, sendo de-
pendente do nível de assistência médica local, do trei- · Estudos Transversais (cross sectional)
namento específico dado aos médicos, do interesse · Estudos Ecológicos
pessoal do médico, da padronização dos termos mé-
2. Analíticos (investigam a causa)
dicos, etc.
Assim, frente a dados de morbidade ou mortalida- · Estudos caso-controle (retrospectivos)
de, existe a necessidade de se perguntar, primeiramen- · Estudos de coorte (seguimento prospectivo)
te, se os dados são reais, ou seja, se são representati-
EXPERIMENTAIS
vos da situação de saúde daquela população, e se são
comparáveis com outras regiões (qualidade da coleta, 1. Ensaios clínicos terapêuticos controlados
grau de cobertura de saúde daquela população, etc.). 2. Intervenção na comunidade
– 16 –
Eduardo Mello De Capitani
Dentro da epidemiologia ambiental, os estudos ex- rios epidemiológicos de causação estabelecidos por Hill
perimentais têm apenas um representante, que é o estu- (1965), e discutidos mais adiante.
do de intervenção na comunidade. Tal estudo tem utili- Num estudo analítico de tipo coorte, parte-se da ex-
dade quando se propõe, por exemplo, adicionar deter- posição comum de determinado grupo populacional e
minado suplemento vitamínico, ou elemento químico na busca-se a ocorrência do agravo à saúde ao longo do
dieta ou na água potável de certas populações, baseado tempo, comparando a incidência deste agravo nesse
em estudos preliminares mostrando efeito benéfico des- grupo com um grupo populacional não exposto. Trata-se
sa suplementação (exemplo do iodo no sal, flúor na água de um desenho prospectivo ao longo do tempo. São es-
potável, etc.). Os estudos experimentais, sejam eles clí- tudos trabalhosos e caros, pois envolvem problemas
nicos com novos medicamentos, sejam eles de interven- operacionais de toda ordem relacionados ao seguimen-
ção comunitária, devem levar em conta e respeitar diver- to de grande número de pessoas por prolongados perío-
sos aspectos éticos envolvidos em seu planejamento e dos de tempo (o período de tempo depende do tipo de
execução. agravo, se é de ocorrência aguda, subaguda ou crôni-
Dentro dos estudos observacionais, ou seja, sem ca). Tome-se, por exemplo, o estudo de determinado
intervenção experimental, temos dois tipos básicos, os tipo de câncer e exposição ambiental a um determinado
descritivos e os analíticos. Os estudos descritivos, elemento químico. Como o câncer é doença de ocorrên-
como o nome diz, descrevem as situações e geram hi- cia tardia, com tempos de latência longos, de 20 a 30
pótese de eventuais associações estatísticas ou epide- anos, pode-se ter uma idéia da dificuldade de se manter
miológicas entre determinados fatores e os agravos à populações inteiras sendo acompanhadas ao longo de
saúde em estudo. Investigam a incidência e a prevalên- 30 ou 40 anos. Esse tipo de estudo é bastante poderoso
cia dos problemas em questão e têm, em geral, um ca- no sentido de estabelecimento de relação de nexo cau-
ráter de corte transversal no tempo, ou seja, estudam a sal entre exposição e agravo à saúde.
situação dentro de um limite estreito de tempo, realizan- Ainda dentro dos estudos observacionais temos os
do um retrato estático da situação naquele momento. estudos ecológicos, que comparam dados populacionais,
Investigando os fatores que podem estar relacionados como peso, altura, peso ao nascer, dados nutricionais,
com os agravos de saúde, esses estudos geram hipóte- prevalência de doenças, parâmetros laboratoriais espe-
se de relação causal a partir de associações existentes cíficos, entre duas populações em áreas geográficas di-
entre variáveis. Não têm, no entanto, poder de estabele- ferentes, ou mesmo comparando esses dados na mes-
cer correlações causais na grande maioria das situa- ma população, mas em épocas diferentes. Esse tipo de
ções epidemiológicas. estudo tem muito de descritivo, gerando hipóteses de re-
Inferências de tipo causal são mais fáceis de serem lação causal que deverão ser testadas usando-se outros
feitas utilizando desenho de tipo analítico. Num estudo desenhos mais apropriados. A diferença com os estudos
de tipo analítico, testa-se a hipótese de associação cau- descritivos básicos é que não coleta dados individuais.
sal gerada pelo estudo descritivo. Para isso, dispõe-se São bastante úteis na avaliação de impacto de medidas
de três subtipos básicos de estudos, que serão utiliza- de intervenções populacionais, como programas de sa-
dos dependendo das características do agravo à saúde úde, por exemplo (Kleinbaum et al, 1982).
que se está estudando, e do tipo e características da ex-
posição em questão. CRITÉRIOS DE ASSOCIAÇÃO CAUSAL
Num estudo observacional analítico de tipo ca-
so-controle, o pesquisador parte do agravo diagnostica- Frente a uma associação estatisticamente signifi-
do (uma doença específica, um sintoma, um resultado cante entre uma variável (fator estudado) e a doença ou
de exame complementar, etc.) e tenta definir que tipo de agravo à saúde (questão), a decisão se ela é causal ou
fator está associado causalmente com ele de forma re- não, passa por uma série de considerações lógicas, que
trospectiva. O desenho básico desse tipo de estudo en- devem ser estudadas com cuidado. Para facilitar, e até
volve o agrupamento de vários indivíduos com o mesmo mesmo padronizar esse raciocínio, Hill estabeleceu uma
problema (“casos”) que será comparado com outro lista de critérios de causação (pouco modificados ao
agrupamento de indivíduos com um tipo de problema di- longo dos anos) que devem ser preenchidos para se
ferente (“controles”). Nos dois grupos serão pesquisa- considerar uma associação entre variáveis como de
dos os mesmos fatores (variáveis relacionadas à alimen- nexo causal (Hill, 1965; Gordis, 1996). O Quadro 2 expõe
tação, ocupações passadas, hobbies, uso de medica- esses critérios e seus significados de forma didática.
mentos, hábitos, procedência geográfica, etnia, etc.). O Para detalhamento e exemplificação de cada um deles,
fator ou variável que predominar de forma significante no remeto o leitor à bibliografia citada no final deste texto.
grupo de estudo (“casos”) poderá ser imputado como Esses critérios permanecem basicamente os mesmos
provável fator causal, caso preencha a maioria dos crité- até hoje, apesar de modificados por outros autores no
– 17 –
Epidemiologia e Geologia Médica
– 18 –
Guilherme Franco Netto
VIGILÂNCIA EM SAÚDE
RELACIONADA A
QUÍMICOS NO ÂMBITO DO
SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE
Guilherme Franco Netto, Médico, Ph.D.
Coordenador Geral de Vigilância em Saúde Ambiental
Secretaria de Vigilância em Saúde
Ministério da Saúde
A Constituição Federal do Brasil, promulgada em temente, a Estratégia Global de Segurança Química, vi-
1988, estabelece um conjunto de deveres e direitos fun- sam reduzir os riscos à saúde e ao ambiente, por meio
damentais à melhoria da qualidade de vida da popula- de mecanismos de controle das substâncias químicas
ção brasileira. ao longo de seus ciclos de vida.
O Capítulo da Saúde, posteriormente estabelecido e No Brasil, a Comissão Nacional de Segurança Quí-
ampliado na Lei nº 8080, conhecida como a Lei do Siste- mica, CONASQ, presidida pelo Ministério do Meio Ambi-
ma Único de Saúde – SUS, determina que a saúde é um ente, da qual o Ministério da Saúde é integrante, expres-
direito da cidadania e um dever do Estado, baseado em sa as preocupações e iniciativas do governo e da socie-
princípios que assegurem o universal acesso da popula- dade brasileira nesse tema.
ção a serviços de promoção, prevenção, atenção e re- O Ministério da Saúde vem se estruturando e organi-
cuperação da saúde. zando serviços na direção de colaborar com a estratégia
A complexidade da vida contemporânea, em que da segurança química. Dentre estes, destaca-se o Pro-
coexistem o desenvolvimento e a aplicação de ciência e grama Nacional de Vigilância em Saúde Relacionada a
tecnologia em larga escala e profunda iniqüidade eco- Substâncias Químicas – VIGIQUIM, que está em fase de
nômica e social, traduz-se em múltiplos novos riscos à estruturação.
saúde, seja nos ambientes formais e informais de traba- O VIGIQUIM consiste na detecção, conhecimento,
lho, seja nos ambientes domésticos, bem como nos am- mapeamento e no monitoramento de populações expos-
bientes públicos e comunitários. tas a substâncias químicas de reconhecido interesse à
Nesse contexto, a exposição humana a substâncias saúde em razão de seus efeitos prejudiciais. Na presen-
químicas é cada vez maior, e decorre de diversas ativi- te fase, foram eleitos cinco (5) contaminantes prioritári-
dades e fontes: produtos e serviços que os contém; ativi- os: amianto; agrotóxicos; benzeno; chumbo e mercúrio.
dades laborais que os produzem e manipulam (extração Outra iniciativa é o Programa Nacional de Vigilân-
mineral, processamento e transformação industrial); dis- cia em Saúde de Populações Expostas a Áreas com So-
posição inadequada de resíduos; contaminação ambi- los Contaminados – VIGISOLO, o qual consiste na de-
ental de corpos d’água, atmosfera e solos, entre outros. tecção, conhecimento, mapeamento e monitoramento
Iniciativas internacionais, no âmbito das Nações de populações expostas a áreas com solos contami-
Unidas, têm demonstrado a importância de que o tema nados. A análise dos dados obtidos pelo Ministério da
da segurança química seja adequadamente tratado. Saúde, informa que existem pelo menos 689 áreas que
Assim, protocolos e compromissos tais como o Fórum exigem a aplicação de metodologia de avaliação de ris-
Internacional de Segurança Química, o banimento de co à saúde.
Produtos Orgânicos Persistentes, o Informe Prévio de Os padrões de controle do risco à saúde relaciona-
Comercialização de Químicos, a Regulação Internacio- do à contaminação da água por químicos são regulados
nal do Transporte de Resíduos Perigosos, e mais recen- pela Portaria MS nº 518. A sua aplicação e monitoramen-
– 19 –
Vigilância em Saúde Relacionada a Químicos no Âmbito do Sistema Único de Saúde
to é exercida pelo Programa Nacional de Vigilância em nistérios, está efetivamente contribuindo com a constru-
Saúde Relacionado à Qualidade da Água Para Consumo ção de uma forte agenda de segurança química no Bra-
Humano – VIGIÁGUA. sil, voltada a assegurar com que a defesa da saúde e do
Com essas iniciativas, dentre outras já existentes, o meio ambiente sejam consideradas no desenvolvimento
Ministério da Saúde, em cooperação com diversos mi- econômico.
– 20 –
Otávio Augusto B. Licht
GEOQUÍMICA
MULTIELEMENTAR DE
SUPERFÍCIE NA
DELIMITAÇÃO DE RISCOS
E IMPACTOS AMBIENTAIS,
ESTADO DO PARANÁ,
BRASIL
Otávio.A.B Licht, otavio@pr.gov.br
Minerais do Paraná S.A. - MINEROPAR
– 21 –
Geoquímica Multielementar de Superfície na Delimitação de Riscos e Impactos Ambientais, Estado do Paraná, Brasil
estabelecer o real significado sanitário de algumas áreas Branco do Sul, Almirante Tamandaré, Colombo, Piraqua-
de risco indicadas pelo bário, potássio, cálcio, alumínio ra, Pinhais e São José dos Pinhais (Figura 2).
em águas, chumbo, lantânio, cádmio e mercúrio em se-
dimentos ativos de drenagem e nos solos. OS LEVANTAMENTOS GEOQUÍMICOS
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Otávio Augusto B. Licht
– 23 –
Geoquímica Multielementar de Superfície na Delimitação de Riscos e Impactos Ambientais, Estado do Paraná, Brasil
nação de Ag, Al2O3, As, Au, B, Ba, Be, Bi, Br, CaO, Cd,
Ce, Cl, Co, Cr, Cs, Cu, Dy, Er, Eu, F, Fe2O3, Ga, Gd, Ge,
Hg, Ho, I, K2O, La, Li, Lu, MgO, Mn, Mo, Na2O, Nb, Nd,
Ni, P, Pb, Pd, Pr, Pt, Rb, S, Sb, Sc, Se, SiO2, Sm, Sn, Sr,
Tb, Te, Th, Ti, Tl, Tm, U, V, W, Y, Yb, Zn, Zr, com limites de
detecção analíticos mais baixos que o Clarke respectivo
(Licht, 2001a).
Horizonte B – solos do Estado do Paraná - As
amostras GGRN foram analisadas no IGGE, sendo de-
terminados Ag, Al2O3, As, Au, B, Ba, Be, Bi, Br, CaO,
Cd, Ce, Cl, Co, Corgânico, Cr, Cs, Ctotal, Cu, Dy, Er, Eu, F,
Fe2O3, Ga, Gd, Ge, Hf, Hg, Ho, I, In, K2O, La, Li, Lu,
MgO, Mn, Mo, N, Na2O, Nb, Nd, Ni, P, Pb, Pd, Pr, Pt, Rb,
S, Sb, Sc, Se, SiO2, Sm, Sn, Sr, Ta, Tb, Th, Ti, Tl, Tm, U,
V, W, Y, Yb, Zn e Zr com limites de detecção analíticos
mais baixos que o Clarke respectivo. Além disso, foram Figura 8 – Superfície geoquímica do F em 39 amostras GGRN
(compostas de 698 amostras de sedimentos ativos de drenagem).
determinados U, K, Th e contagem total por gamaes-
pectrometria e susceptibilidade magnética, pelo Labo-
ratório de Pesquisas Geofísicas Aplicadas - LPGA da
Universidade Federal do Paraná - UFPR. Finalmente, no
Laboratório de Solos e Tecidos Vegetais do Instituto
Agronômico do Paraná – IAPAR, foram determinados os
parâmetros de química agrícola: pH, Altrocável, Caassimilá-
+ 3+
vel, Mgassimilável, Passimilável, Kassimilável, C, H +Al , Cuextraí -
vel, Znextraível, Feextraível, Mnextraível, Sextraível, Bextraível, Al%,
V% (Saturação de bases), T (Soma das cargas positivas
trocáveis) e S (Somas das bases trocáveis) (Licht & Pla-
wiak, 2005).
Sedimentos de fundo de bacias hidrográficas
da Folha Curitiba – As 392 amostras foram analisadas
no LAMIN/CPRM e em laboratório comercial, com de-
terminação de Hg, Nb, F, Zr com extrações fortes e P,
Cr, Li, W, As, V, Sc, Ni, K, Sr, La, Mg, Mn, Na, Y, Co, Pb,
Cu, Ca, Zn, Al, Ba e Fe com extrações fracas (Licht, 2+
Figura 9 – Superfície geoquímica do Ba em 696 amostras de águas
2001c). de bacias hidrográficas.
-
Figura 7 – Superfície geoquímica do F em 696 amostras de águas de Figura 10 – Superfície geoquímica do Ba em 39 amostras GGRN
bacias hidrográficas. (compostas de 698 amostras de sedimentos ativos de drenagem).
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Otávio Augusto B. Licht
Tabela 1 – Prevalência e severidade de fluorose dentária em crianças em idade escolar na vila de São Joaquim do Pontal, mu-
nicípio de Itambaracá, Paraná.
N = 135 pacientes (Morita et al, 1998) N = 1129 pacientes (Cardoso et al, 2001)
Muito Muito
Normal Duvidosa Suave Moderada Normal Duvidosa Suave Moderada Severa
suave suave
52 5 31 38 9 410 30 478 165 41 5
38,52% 3,7% 22,96% 28,15% 6,67% 36,3% 2,7% 42,3% 14,6% 3,6% 0,4%
Figura 11 – Mapa geoquímico do F- (mg/L) nas águas de bacias hidrográficas. A área flúor-anômala localizada no norte do estado é a origem
da elevada incidência de fluorose dentária em crianças.
– 25 –
Geoquímica Multielementar de Superfície na Delimitação de Riscos e Impactos Ambientais, Estado do Paraná, Brasil
água para consumo humano é freqüentemente feita por Brometos, cloretos e neoplasias hepáticas - A re-
meio de poços tubulares profundos com teores elevados gião norte do Paraná, é produtora tradicional de café e
em fluoretos, atingindo 2,2 mg/L F-, causando sérios pro- de algodão (Figuras 13 e 14). Por muito tempo, até sua
blemas sanitários com características endêmicas (Figu- proibição legal, pesticidas clorados e bromados foram li-
ra 12). A água das bacias hidrográficas também contém vremente aplicados no controle de pragas dessas cultu-
teores elevados, como foi identificado pelo Levantamen- ras, formando um estoque / passivo ambiental de dimen-
to Geoquímico alcançando 0,9 mg/L F-. sões desconhecidas. Marzochi et al. (1976) já haviam
identificado não só a prevalência mas também as eleva-
das taxas de óbito por neoplasias hepáticas (câncer de
fígado) na região. Relacionaram esse problema de saú-
de com a aplicação de agrotóxicos, especialmente os
clorados e os bromados.
O Levantamento Geoquímico identificou a existência
de uma elevação do teor de fundo em cloretos e brometos
nas águas de bacias hidrográficas (Figuras 15 e 16).
Com base nesses resultados e no Banco de Dados
de Mortalidade do Ministério da Saúde - DATASUS, Licht
(2001a) estabeleceu o relacionamento espacial entre as
taxas de mortalidade, culturas e anomalias geoquími-
cas, considerando cloretos e brometos nas águas de su-
perfície como indicadores geoquímicos para esse pro-
blema sanitário de características endêmicas.
A prevalência das neoplasias hepáticas bem como
Figura 12 – Os dentes da arcada superior estão corroídos pela da elevação das taxas de mortalidade está realmente
ingestão continuada de água com doses elevadas de fluoretos. associada com a aplicação de agrotóxicos clorados e
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Otávio Augusto B. Licht
Figura 15 – Mapa da distribuição do Cl- (mg/L) nas águas de 696 bacias hidrográficas.
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Geoquímica Multielementar de Superfície na Delimitação de Riscos e Impactos Ambientais, Estado do Paraná, Brasil
Norte
2,14
Nordeste
2,49
Centro-Oeste
2,64
Sudeste
3,23
Sul
3,64
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Otávio Augusto B. Licht
Figura 21 – Os dez municípios do Paraná com as mais altas taxas de óbito por câncer (em vermelho) e os com as
menores (em azul). Média dos óbitos/100.000, no período 1980-1997.
Figura 22 – Mapa geoquímico do Ba (mg/L) nas águas de 696 bacias hidrográficas do Paraná. A grande anomalia positiva a noroeste coincide
com os arenitos dos grupos Bauru e Caiuá.
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Geoquímica Multielementar de Superfície na Delimitação de Riscos e Impactos Ambientais, Estado do Paraná, Brasil
coincidente com a área de exposição das rochas sedi- acontece com o mercúrio, os compostos inorgânicos de
mentares cretácicas dos grupos Bauru e Caiuá. Estes As são mais tóxicos que os orgânicos. Muitos estudos têm
siltitos, arenitos e arenitos conglomeráticos foram depo- mostrado que o As na forma inorgânica pode aumentar os
sitados em ambiente desértico, com sedimentos quími- riscos de câncer de pele, pulmões, bexiga, fígado, rins e
cos associados, o que justificaria a existência da ano- próstata (ATSDR, 1999 apud Licht & Plawiak, 2005).
malia hidrogeoquímica com teores de até 0,3 mg/L Ba2+. O mapa geoquímico do As na Folha Curitiba (Figura
Nessa região o abastecimento público é feito principal- 23), caracteriza uma anomalia regional de orientação
mente por meio de poços tubulares com entradas SW – NE coincidente com o sistema transcorrente da Fa-
d’água localizadas nessa seqüência sedimentar. O Valor lha da Lancinha, bem como com os flancos do antiforme
Máximo Permitido - VMP estabelecido na Portaria nº 518 Setuva. Os teores nas águas obtidas no aqüífero karst
do Ministério da Saúde é de 0,7 mg/L Ba2+ mas em al- por meio de poços tubulares profundos pela Companhia
guns desses poços, os teores de Ba2+ atingiram 1,3 de Saneamento do Paraná, estão abaixo dos VMP de
mg/L, com entradas d’água localizadas a cerca de 30 0,01 mg/L As (SANEPAR, com. pessoal, 2005).
metros de profundidade. A Companhia de Saneamento Mercúrio - A toxidez do mercúrio é reconhecida, es-
do Paraná - SANEPAR, solucionou o problema com selo pecialmente na forma de vapor e por seus compostos or-
de cimento em locais específicos e entradas d’água gânicos. O metil-mercúrio é produzido pela ação bacte-
mais rasas (SANEPAR, com. pessoal, 2005). riana sobre mercúrio metálico, especialmente em condi-
Arsênio - Concentrações maiores que 10 µg/L As na ções redutoras.
água potável são consideradas como fator de risco para a Os mapas de distribuição do mercúrio tanto em se-
saúde humana e animal. Diversas moléstias endêmicas dimentos ativos de drenagem (Figura 24) quanto nos so-
têm sido relatadas em regiões com teores elevados de ar- los (Figura 25), mostram grandes anomalias regionais. A
sênio, especialmente lesões de pele e mucosas, hiper- anomalia localizada no vale do rio Ribeira (Figura 25) na
pigmentação, queratose, câncer de pele e de pulmão, região nordeste do Paraná, está relacionada com as mi-
desordens vasculares periféricas, danos nos sistemas neralizações de Pb-Zn-Ba com teores que atingem
nervoso central, respiratório e circulatório (Varsányi et al., 14.000 ppb Hg (Daitx, E.C. com. pessoal, 2005). Já as
1991 apud Licht & Plawiak, 2005). Ao contrário do que anomalias localizadas na porção central do estado, esta-
Figura 23 – Mapa geoquímico do As (ppm) na Folha Curitiba. A grande anomalia positiva com orientação SW-NE, está relacionada
com a Zona de Falha da Lancinha e antiforme Setuva.
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Otávio Augusto B. Licht
Figura 24 – Mapa geoquímico do Hg (mg/Kg) nas células GGRN (compostas de 696 amostras de sedimentos ativos de drenagem).
Figura 25 – Mapa geoquímico do Hg (mg/Kg) nas células GGRN (compostas de 307 amostras de solo – horizonte B).
– 31 –
Geoquímica Multielementar de Superfície na Delimitação de Riscos e Impactos Ambientais, Estado do Paraná, Brasil
riam relacionadas com concentrações de Hg em rochas seja nos sedimentos de fundo das baías de Antonina e
sedimentares ricas em matéria carbonosa e carvão, que Paranaguá. Já a anomalia localizada e coincidente com
teria sido mobilizado pela ação de águas termais. Sua a região urbana de Curitiba, está apontando para o so-
migração ocorreria ao longo de falhas profundas até a matório dos impactos de diversas atividades desde ga-
superfície onde seria depositado pela queda brusca de binetes odontológicos até lâmpadas de vapor de mercú-
temperatura (Plawiak et al., 2005). Mesmo que essa mi- rio para iluminação pública (Figura 26).
gração ocorra em baixos teores, expressos na faixa de Chumbo – As fontes industriais de chumbo estão
40 a 80 ppb, haverá transporte do metal pelas águas su- principalmente relacionadas com baterias e acumulado-
perficiais e deposição em corpos d’água como barra- res de energia (50 - 70% do consumo total), revestimento
gens para geração de energia. Assim, essas anomalias de cabos elétricos (3-4%), tubos e barras, ligas, pigmen-
estão delimitando áreas de risco à saúde, constituindo to de tinta (vermelho e branco) e como escudo an-
alvos evidentes para investigações epidemiológicas e ti-radiação. Seu uso como aditivos antidetonantes (5%)
toxicológicas. na gasolina está caindo rapidamente devido aos impac-
A região litorânea, no extremo-leste do Paraná, tam- tos ambientais (Koljonen et al., 1992 apud Licht & Plawi-
bém merece investigações da mesma natureza, pois a ak, 2005). Apesar de sua virtual eliminação como agente
ocupação do território paranaense pelo colonizador eu- antidetonante nos combustíveis (gasolina e óleo diesel),
ropeu iniciou-se pelo litoral já no século XVI, a partir da os impactos do uso dessa forma de chumbo são eviden-
vila de Cananéia, em São Paulo, com expedição enviada tes no mapa construído com os dados de Pbtrocável nos
por Martim Afonso de Souza em busca de ouro aluvionar sedimentos de fundo de bacias hidrográficas da Folha
(Carneiro, 1962; Martins, 1969 apud Licht & Plawiak, Curitiba (Figura 27). Uma elevação geral dos teores de
2005). Nessa região, de grande fragilidade ambiental, fundo com fortes anomalias positivas, coincide com as
ocorreram os primeiros garimpos do país, com uso fre- concentrações urbanas bem como com os traços das
qüente de mercúrio para recuperação do ouro e conse- principais rodovias, que abrigam um maior volume e trá-
qüente geração de passivo ambiental seja em terra firme fego de veículos.
Figura 26 – Mapa geoquímico do Hg (ppb) na Folha Curitiba. A anomalia situada na porção centro -sul, coincide
com a área densamente urbanizada.
– 32 –
Otávio Augusto B. Licht
Figura 27 – Mapa geoquímico do Pbtrocável (ppm) na Folha Curitiba. A anomalia situada na porção centro-sul,
coincide com a área densamente urbanizada.
Cálcio - A região situada a noroeste de Curitiba, tuba, na Bacia de Curitiba, são conhecidas as ocorrênci-
englobando os municípios de Almirante Tamandaré, as do carbonato duplo de La e Nd (Nd-lantanita) que sob
Rio Branco do Sul e Colombo, é uma tradicional área de condições supergênicas deposita-se na forma de ci-
lavra de calcário calcítico e dolomítico usados no fabri- mento e venulações e filonetes em horizontes e lentes de
co de cimento, cal e corretivos agrícolas. A atividade de arenitos arcosianos (Licht, 2001a). Até o momento, não
um grande número de empresas mineradoras e de são conhecidas investigações de cunho epidemiológico
transformação dessas matérias-primas, geram um im- sobre o tema, apesar de a área anômala (Figura 29) se
pacto ambiental na forma de poeira em suspensão que, localizar próxima da área urbana de Curitiba e com ocu-
por ação dos ventos dominantes, se dissemina e depo- pação humana relativamente densa.
sita-se sobre uma grande área. O mapa geoquímico do
Catrocável na Folha Curitiba (Figura 28) delimita com CONCLUSÕES
grande precisão o traço da rodovia PR-092, conhecida
como Rodovia dos minérios, às margens da qual se A cartografia geoquímica tem provado sua grande
concentra a atividade mineradora e de beneficiamento utilidade como instrumento de diagnóstico e caracteriza-
de rochas calcárias. Os agravos à saúde humana, po- ção territorial. Levantamentos geoquímicos com baixa
rém, estão mais relacionados com a inalação dos parti- densidade de amostragem têm a capacidade de delinear
culados sólidos em suspensão, especialmente nas pro- as grandes estruturas que serão o objeto de investiga-
ximidades de estações de britagem e moagem, do que ções posteriores visando detalhar e aprofundar o conhe-
com impactos geoquímicos. cimento de suas características bem como sua origem e
Lantânio - O lantânio não desempenha papel conhe- eventuais reflexos na cadeia trófica. As técnicas tradicio-
cido na fisiologia animal ou vegetal. Todos os compostos nais de exploração geoquímica, acompanhadas por aná-
de La devem ser tratados como altamente tóxicos já que lises multielementares com baixos limites de detecção
os sais de lantânio podem agredir e prejudicar o funciona- analíticos são imperativas para o sucesso desse tipo de
mento do fígado (Winter, 1998 apud Licht & Plawiak, pesquisa. Os resultados obtidos com levantamentos geo-
2005). Nos sedimentos terciários da Formação Guabiro- químicos de superfície são ferramentas fundamentais na
– 33 –
Geoquímica Multielementar de Superfície na Delimitação de Riscos e Impactos Ambientais, Estado do Paraná, Brasil
Figura 28 – Mapa geoquímico do Catrocável na Folha Curitiba. A grande anomalia na porção noroeste coincide com a região de lavra
de calcário e produção de cal e cimento.
Figura 29 – Mapa geoquímico do La na Folha Curitiba. A mancha a cinzentada na porção centro -sul,
representa a região densamente urbanizada.
– 34 –
Otávio Augusto B. Licht
– 35 –
Geoquímica dos Solos Brasileiros: Situação Atual
– 36 –
Daniel Vidal Pérez
só a partir da década de 70 é que ocorreu uma melhoria No Brasil, a exemplo do que ocorreu nos EUA, a
substancial dos limites de detecção dos elemen- maioria dos estudos geoquímicos de solos, inicialmente,
tos-traço em função de uma série de novos desenvolvi- seguiu a tendência internacional de dar suporte à pros-
mentos na área de instrumentação dos espectrofotôme- pecção mineral e de entender a gênese de solo (Melfi &
tros de absorção e emissão atômica (Cienfuegos & Va- Pedro, 1977; Melfi & Pedro, 1978). Com a melhoria das
itsman, 2000). São dessa época, os primeiros trabalhos técnicas analíticas, novos estudos foram dirigidos no
que tentam relacionar problemas de saúde humana com sentido de correlacionar quantidades de elemen-
a distribuição geográfica de metais em solos (Shacklette tos-traço com a formação de solos e sua classificação
& Boerngen,1984). Com o desenvolvimento de novos es- (Araujo, 1994; Horbe, 1995; Ker, 1995; Oliveira, 1996;
tudos, verificou-se, então, que o material de origem Castro, 1998; Lacerda, 1999). Em função desses estu-
constituia-se na fonte primária dos elementos-traço no dos, Ker (1995) e Lacerda (1998), por exemplo, citam vá-
solo (Alloway, 1995; Kabata-Pendias & Pendias, 2001). rios autores que destacam que certos óxidos de ferro no
Nessa ótica, esperar-se-ia que solos originados de ro- solo seriam importantes fontes de reserva de elementos-
chas básicas apresentassem maiores teores de Zn, Cu, traço, particularmente, Zn, Cu, Co e Ni. Estudos com o
Ni, Mn, entre outros, do que aqueles provenientes de objetivo específico de caracterizar os solos brasileiros
granitos, gnaisses, calcários e arenitos. Entretanto, vári- com respeito às concentrações dos vários metais (mi-
os trabalhos, dos quais destaca-se o de Chen et al. cronutrientes, tóxicos ou traço) foram pouco desenvolvi-
(1993), indicaram que, além do material de origem, ou- dos, sendo que a maioria, no princípio, se concentrou no
tros fatores pedogenéticos também exerciam papel fun- Estado de São Paulo (Valadares, 1975; Valadares & Cata-
damental na distribuição de elementos-traço no solo. ni, 1975; Furlani et al., 1977; Valadares & Camargo, 1983).
Nos últimos 20 anos, o enfoque da análise geoquímica Com base na mesma preocupação internacional, alguns
de solos tem sido o estabelecimento de valores de refe- grupos brasileiros começaram a buscar valores de “back-
rência para metais tóxicos com vistas ao estabelecimen- ground” de solos nacionais para vários elementos. Pérez
to de uma legislação que regule o uso do solo como via et al. (1997) analisaram 30 amostras (horizonte A e B diag-
alternativa para aplicação de resíduos domésticos/in- nóstico) de 15 perfis de solos brasileiros e para vários ele-
dustriais na agricultura (USEPA 40 CFR Part 503 and mentos (Co, Cr, Cu, Mo, Pb, Zn, Mn, Fe, Cd, Sr, Zr, Ba, Rb,
Council Directive 86/278/EEC). É interessante observar U, Th, La, Ce, Pr, Nd, Sm, Eu, Gd, Tb, Dy, Ho, Er, Tm, Yb,
que a maioria dos países europeus se decidiu pelo esta- Lu). Marques (2000), apesar de desenvolver uma tese de
belecimento de limites máximos permissíveis em solos cunho pedogenético, também produziu dados inéditos
(Tabela 1) dos principais elementos tóxicos, ou seja, Cd, sobre uma série de elementos-traço em solos, no caso,
Zn, Cu, Cr, Hg, Ni e Pb. Alguns países, como a Espanha, de Minas Gerais. Contudo, foi a Cetesb (2001), com base
Portugal e o Reino Unido, ainda estabeleceram esses em metodologia holandesa, quem definiu valores de refe-
valores variáveis com o pH do solo. Outros poucos, a rência de qualidade de solo com base em amostragens
exemplo dos EUA, contudo, têm mantido, ao longo dos específicas. A partir de 13 tipos diferentes e representati-
anos, uma rotina de análise de solos de forma a montar vos de solos de São Paulo, foram coletadas 84 amostras
um banco de dados que possa indicar, com um pouco compostas, representando as profundidades de 0-20 e
mais de precisão, os valores médios de metais-traço em 80-100 cm, e realizadas análises de alumínio, antimônio,
solos “naturais” e solos alterados pelo homem (Shacklet- arsênio, bário, cádmio, chumbo, cobalto, cobre, cromo,
te & Boerngen,1984; Holmgren et al., 1993; Burt et al., ferro, manganês, mercúrio, molibdênio, níquel, prata, se-
2000; Burt et al., 2003). Apesar disso, o estabelecimento lênio, vanádio, zinco. Por fim, Fadigas et al. (2002), anali-
de valores limites ainda é arbitrário, com base, normal- sando um conjunto de 256 amostras de solos brasileiros,
mente, no 95% percentil. separadas em 7 grupamentos com base em similaridade
Tabela1. Valor limite de concentração de metais pesados (mg/kg) em solos de países europeus.
Cd Cr Cu Hg Ni Pb Zn
EU Directive 86/2781 1-3 ——- 50-140 1-1.5 30-75 50-300 150-300
2
França 2 150 100 1 50 100 300
2
Alemanha 1,5 100 60 1 50 100 200
2
Itália 1,5 ——- 100 1 75 100 300
2
Holanda 0,8 100 36 0,3 35 85 140
2
Suécia 0,4 60 40 0,3 30 40 100-150
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Geoquímica dos Solos Brasileiros: Situação Atual
de outras propriedades dos solos, determinaram valores em alguns tipos de solos brasileiros e com base em da-
de referência para Cd, Co, Cr, Cu, Ni, Pb e Zn. dos internacionais. A grande diferença encontrada é fru-
to de processos físico-químicos que ocorrem, tipicamen-
OBTENÇÃO DE VALORES DE REFERÊNCIA OU DE te, em solos tropicais e que pouca influência têm em
“BACKGROUND” solos do hemisfério Norte. No Brasil, os métodos mais usa-
dos, tanto para extração de micronutrientes “disponíveis”,
Se não há o conhecimento de qual é o nível conside- como para extração de metais tóxicos “disponíveis”, são
rado “natural” de um determinado elemento no solo, as soluções de DTPA e de Mehlich 1 (Cantarella et al.,
como saber se ele foi, antropicamente, contaminado ou 2001; Mattiazo et al., 2001). Estão em andamento alguns
se ele possui um deficit considerável que pode afetar a estudos que visam utilizar esse tipo de resultado na de-
nutrição dos seres vivos? terminação de valores de referência para certos elemen-
A base de dados nacional, como se viu, é pequena tos tóxicos em solos. Por fim, existem, ainda, alguns es-
e concentrada, para certos elementos no Estado de São tudos que, baseados na complexidade das possíveis re-
Paulo. Além disso, as metodologias de coleta, preparo e ações do solo, utilizam extrações seqüenciais para ten-
extração de solos são, normalmente, diferentes e não tar identificar o compartimento em que se localiza dado
correlacionáveis. No entanto, há formas de planejar o elemento químico (Ure, 1991; Das et al., 1995; Hayes &
trabalho de coleta de amostras de forma a se obter fun- Traina, 1998). A maioria dos estudos ambientais que en-
ções matemáticas que, por meio de correlação com ou- volve essa técnica contempla, em geral, as seguintes fa-
tras propriedades do solo (“Pedotransfer”), permitam ses (McLean & Bledsoe, 1992; Das et al., 1995; Morrow
predizer os dados em regiões não amostradas. Fadigas et al., 1996):
et al. (2002), por exemplo, propuseram um modelo para • Solúvel em água
obtenção dos teores “naturais” de Cd, Co, Cr, Cu, Ni, Pb • Trocável
e Zn em solos a partir dos teores de silte, argila, Mn, Fe e • Ligado a carbonatos
CTC. Assim mesmo, a espacialização dos dados, que já • Ligado a oxi-hidróxidos de Fe/Mn
entraria no campo do mapeamento digital (McBratney et • Ligado à matéria orgânica
al., 2003), seria muito importante, fato que, usualmente, • Residual
não é observado na maioria dos trabalhos citados. Isso
seria de grande valia para facilitar a validação dos “pe- Vários são os problemas relativos às técnicas de ex-
dotransfers” e reorientar novas amostragens. tração propriamente ditas (Ross, 1994; Hayes & Traina,
Com respeito aos métodos analíticos, extrações e 1998; Kot & Namiesnik, 2000): i) falta de seletividade dos
análises consideradas “Totais” produzem poucas infor- extratores; ii) readsorção e redistribuição do elemento
mações úteis, já que os efeitos ecotoxicológicos de um durante o processo de extração; iii) influência da relação
elemento químico, assim como o seu comportamento solo:solução extratora na distribuição do elemento de in-
ambiental (transporte, reatividade, mobilidade, etc.), de- teresse; iv) mudança da solubilidade dos compostos mi-
pendem totalmente da sua forma química (Allen, 1993; nerais e orgânicos durante o curso das extrações. Mes-
Tack & Verloo, 1995; Hani, 1996; Quevauviller, 1998; Kot mo assim, pelo fato de permitir a comparação de frações
& Namiesnik, 2000; Abreu et al. 2001). Métodos conside- quimicamente similares, a extração seqüencial tem sido
rados “Pseudo-Totais” permitem determinar a influência preferida nos estudos de especiação da fase sólida do
antropogênica e, por isso, podem ser usados no monito- solo, por permitir determinar o potencial de mobilidade e
ramento ambiental (Alloway, 1995; Walter & Cuevas, biodisponibilidade ambiental de vários metais e radionu-
1999; Scancar et al., 2000). Contudo, se não for eleita clídeos (Candelaria & Chang, 1997; Dean et al., 1998;
uma só metodologia analítica, voltar-se-a à questão da Quevauviller, 1998; Wasserman et al., 2002). A Figura 2,
consolidação do banco de dados, já que a maioria das extraída de Mavropoulos et al. (2005), serve para ilustrar
metodologias não possui capacidade de extração simi- isso. Nota-se que, apesar do teor total de Pb permanecer
lar (Mattiazo et al., 2001). Outrossim, existem métodos inalterado nos dois solos (7,0g/kg), houve uma migração
que avaliam o potencial de transferência de determinado diferencial do elemento para fases distintas, represen-
elemento para a planta (“disponível”). Neste caso, entre- tando um potencial de risco de mobilidade e biodisponi-
tanto, deve-se tomar a precaução de não usar métodos bilidade bem diferentes.
que, apesar de serem internacionalmente reconhecidos,
não foram desenvolvidos para nossas condições e, por EXCESSO X DEFICIÊNCIA
isso, não permitem interpretações adequadas. Exemplo
disso encontra-se na Figura 1, extraído de Wasserman O objetivo principal no estabelecimento de valores
(1997), que apresenta fatores de transferência do solo de referência em solos sempre esteve ligado à preocu-
para a planta do Cs (absorção pela planta similar ao K) pação com a sua poluição. Contudo, é fato que, em fun-
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Daniel Vidal Pérez
3.5 Radish
Carrot
3 Soybeans
Transfer Factor for Cs-137
Beans
2.5 Cassava
1.5
0.5
0
Ferralsol Tropical soil Nitisol Goiânia soil Goiânia IUR
artificially artificially recommended
contaminated contaminated values
Figura 1– Fatores de transferência de Cs137 para as culturas de rabanete, cenoura, soja, feijão e mandioca em alguns solos brasileiros
confrontados com dados internacionais gerados em clima temperado (IUR).
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Geoquímica dos Solos Brasileiros: Situação Atual
Vale, ainda, ressaltar que, em casos de poluição do ABREU, C.A. de; FERREIRA, M.E.; BORKERT, C.M.
solo por metais, existem mecanismos de “defesa” da 2001. Disponibilidade e avaliação de elementos
planta que garantem a baixa transferência desses ele- catiônicos: zinco e cobre. In: FERREIRA, M.E.;
mentos para os diversos orgãos vegetais, notadamente CRUZ, M.C.P. da; van RAIJ, B.; ABREU, C.A. De.
os que se localizam nas partes aéreas (Shaw, 1989). Micronutrientes e elementos tóxicos na agricultura.
Entretanto, se há deficit no solo de um dado micronutri- Jaboticabal: CNPq; FAPESP; POTAFOS, 2001.
ente, a planta dificilmente conseguirá absorvê-lo em p.125-150.
quantidades suficientes para sua nutrição, embora, em ALLEN, H.E. The significance of trace metal speciation
muitos casos, não seja percebido nenhum sintoma visual for water, sediment and soil quality criteria and stan-
de deficiência (“fome oculta”). Neste sentido, essa ca- dards. The Science of the Total Environment, Amster-
rência afetará a nutrição dos animais e dos seres huma- dam, Supplement Part 1, p.23-45, 1993.
nos que dependerem dessa planta em sua alimentação ALLOWAY, B.J. Heavy metals in soils. 2nd ed. Glasgow,
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de referência para os metais-traço, sejam eles micronu- BURT, R.; WILSON, M.A.; MAYS, M.D.; KECK, T.J.;
trientes ou potencialmente tóxicos, é fundamental unifor- FILLMORE, M.; RODMAN, A.W.; ALEXANDER, E.B.;
mizar as metodologias de coleta, preparo de amostra e HERNANDEZ, L. Trace and major elemental analysis
análise de solo, que devem ser estabelecidos com base applications in the U.S. cooperative soil survey pro-
em um grupo de trabalho nacional. Todavia, em razão da gram. New York, Commun. soil sci. plant anal., v.31,
extensa área a ser coberta, torna-se evidente que deve p.1757-1771, 2000.
ser realizado um trabalho em nível regional, porém, com BURT, R.; WILSON, M.A.; MAYS, M.D.; LEE, C.W. Major
vistas a compor um banco de dados nacional espaciali- and trace elements of selected pedons in the USA.
zado. Existem alguns esforços estaduais para buscar os Journal of Environmental Quality, Madison, Wis., v.
valores de referência regionais, porém, a maioria deles 32, n. 6, p.2109-2121, nov. 2003.
esbarra na falta de verbas. Com isso, é imprescindível CANDELARIA, L.M.; CHANG, A.C. Cadmium activity
sensibilizar as autoridades competentes para que os or- solution speciation and solid phase distribution of
gãos de fomento de Ciência & Tecnologia estaduais e fe- Cd in cadmium nitrate and sewage sludge treated
derais possam criar linhas de pesquisa específicas para soil systems. Soil Sci., v.162, n.10, p.722-732,
subsidiar esse trabalho. 1997.
Por fim, para aqueles que tencionam se aprofundar CANTARELLA, H.; WIETHOLTHER, S.; BERNARDI,
sobre o tema das implicações do solo na saúde humana, A.C.C.; VITTI, G.C.; CANTARUTTI, R.B.; MUNIZ,
existem algumas revisões internacionais que merecem A.S.; OLIVEIRA, M.H. Programas de avaliação de
ser consultadas, a saber: Oliver (1997); Dissanayake & qualidade das análises de solo e de planta no Brasil.
Chandrajith (1999); Abrahams (2002); Deckers & Stein- Boletim Informativo Sociedade Brasileira Ciência do
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Dras. Neli do Amaral Meneguelli e Maria de Lourdes Men- S.Q.; HE, Q. Geographical tendencies of trace ele-
donça pela revisão técnica do texto. À bibliotecária Maria ment contents in soil derived from granite, basalt and
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COMBATE A DEFICIÊNCIAS
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José Luiz V. Carvalho; jlvc@ctaa.embrapa.br
Edson Watanabe; edswat@ctaa.embrapa.br
Embrapa Agroindústria de Alimentos
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A Biofortificação como Ferramenta para Combate a Deficiências em Micronutrientes
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Marília Nutti
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A Biofortificação como Ferramenta para Combate a Deficiências em Micronutrientes
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Marília Nutti
Um problema comum em muitos países em desen- sementes desempenharão um papel crucial na tarefa de
volvimento é a falta de um sistema de entrega e distribui- fazer chegar às mãos dos agricultores as variedades ri-
ção de produtos – sejam eles insumos para a saúde ou cas em micronutrientes.
produtos agrícolas – às populações mais carentes. O
HarvestPlus está superando esta limitação mediante o RESULTADOS JÁ ALCANÇADOS E
uso de tecnologias que têm como base a semente, pró- CONSIDERAÇÕES FINAIS
prias ao enfoque da biofortificação. Quando alimentos ri-
cos em micronutrientes são cultivados em propriedades No primeiro ano do projeto, foram selecionados e
familiares, o sistema de distribuição de micronutrientes é multiplicados cerca de 3.000 variedades de mandioca,
incorporado ao processo existente de produção e mer- feijão e milho, aproximadamente 1.000 de cada cultivo,
cado. Uma vez que os agricultores tenham adotado a que serão avaliados quanto aos teores de ferro, zinco, ca-
nova semente, pouca intervenção ou investimento é ne- rotenóides totais e beta-caroteno. As variedades promis-
cessário. Além do mais, sementes ricas em micronutrien- soras serão trabalhadas pelos melhoristas, em atividades
tes podem ser facilmente guardadas ou compartilhadas de melhoramento participativo, para o desenvolvimento
até mesmo pelas famílias mais pobres. de variedades biofortificadas. Espera-se ainda durante o
Os centros da EMBRAPA possuem experiência vali- ano de 2005 realizar os estudos de retenção de be-
osa na criação e promoção de sistemas locais de distri- ta-caroteno em mandioca e ferro e zinco em feijão, em va-
buição de sementes, graças ao trabalho que atualmente riedades convencionais, para estimativas das perdas
desenvolvem com os sistemas de produção de semen- destes nutrientes no processamento e na estocagem.
tes e à sua contribuição aos programas que prestam au- Este projeto prevê ainda interessante integração en-
xílio durante os desastres naturais. Esses sistemas, já es- tre os paises da América Latina e Caribe, África e Sudes-
tabelecidos, oferecem uma via natural para a dissemina- te Asiático, com a expectativa que o Brasil irá desenvol-
ção de sementes biofortificadas. Em particular, os comi- ver e transferir não só os cultivos biofortificados, mas
tês agrícolas locais e as pequenas empresas de também tecnologia pós-colheita para estes cultivos.
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Evaluación de Riesgo Una Herramienta Para El Proceso de Gerenciamiento Socioambiental: Estudio de caso en La Región Norte de Mato Grosso
EVALUACIÓN DE RIESGO
UNA HERRAMIENTA PARA
EL PROCESO DE
GERENCIAMIENTO
SOCIOAMBIENTAL:
ESTUDIO DE CASO EN LA
REGIÓN NORTE DE MATO
GROSSO
1
Sandra Hacon, shacon@ensp.fiocruz.br
2
Renato Farias
3
Reinaldo Calixto de Campos
4
Julio C. Wasserman
1
Fundação Oswaldo Cruz, ENSP
2
Universidade Estadual de São Paulo - UNESP
3
Pontíficie Universidade Católica – PUC/RJ
4
Universidade Federal Fluminense– UFF
– 48 –
Sandra Hacon
mercializa en la propia región, el resto es destinado a oro. Paranaíta y Matupá fueron importantes áreas de ex-
otros centros de comercialización del país (Hacon et al. plotación minera, teniendo como base la cuenca del río
2003). Las principales especies de pescado cultivadas Teles Pires, la que, por su parte, fue marcada por la
en las pisciculturas son: Tambaqui (Colossoma macro- contaminación extensiva e intensiva con mercurio en la
pomum); el híbrido de Tambacú (Colossoma macropo- década de 80, lo que transformó este sistema ambiental
mum) con Pacú (Piaractus mesopotamicus), todos el- en un camino potencial de exposición al metilmercurio,
los, no piscívoros El Pintado (Pseudoplastystoma corr- debido a los procesos bióticos que interactúan con el
ruscans) y el Jundiá (Leiarius marmoratus), ambos piscí- ciclo biogeoquímico del mercurio en la región (Hacon et
voros, ya comenzaron a ser cultivados en algunas al 1995).
pisciculturas de la región. Actualmente, Paranaíta tiene una población de
10.250, Matupá 11.300, Nova Monte Verde 6.500 e Nova
2 REGIÓN DE ESTUDIO Y METODOLOGÍA Bandeirante 9.535 de habitantes (IBGE 2000). Durante
el período de la “fiebre del oro”, al final de la década de
La región estudiada se ubica entre la latitud 7º 37’ a 70 hasta mediados de 90, el crecimiento demográfico en
11º 00` Sur y longitud 52º 31’ a 58º 13’ Oeste. Abarca 5 la región llegó a ser de 12% anual. La figura 2 ilustra la
municipios que fueron seleccionados considerando las relación entre la producción de oro y el contingente de-
áreas degradadas por la minería, la producción y co- mográfico durante el período de la “fiebre del oro” en la
mercialización de oro en la región, la localización de los región norte del Mato Grosso (Farias 2002). Para el pre-
proyectos de piscicultura y las especies de los pesca- sente estudio fueron seleccionadas dos áreas de refe-
dos cultivados y consumidos en la región. En la figura 1 rencia en la región: Nova Monte Verde y Nova Bandei-
se presenta la región estudiada. El área urbana de Alta rantes, como localidades para comparación de la conta-
Floresta, con una población de 46.982 habitantes (IBGE minación mercurial. Estas áreas nunca tuvieron activi-
2000) fue el principal centro de comercialización de dad minera.
South America
Venezuela
Paranaita Matupa
Colombia
Nova Bandeirantes
Amazonia Legal
Para
Peru Amazonas
Maranhao
Nova Monte Verde
Alta Floresta
Paranaíta
Tocantins
Rondonia
Mato
Grosso
Boliv ia
Mato Grosso
Rio
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LEGEND
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Fish Farming
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Rio
Rivers
S.
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Study Area
mé
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Guaranta
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Novo do Norte
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Peixoto
Rio Apia
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Bandeirantes #
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Matupa de Azevedo
## #
Alta Carlinda #
#
íta
##
Nova Floresta
#
Monte #
Nova # #
N
100 0 100 200 Kilometers
– 49 –
Evaluación de Riesgo Una Herramienta Para El Proceso de Gerenciamiento Socioambiental: Estudio de caso en La Región Norte de Mato Grosso
160 30
140
25
120
100
80 15
60
10
40
5
20
0 0
1976 1978 1980 1982 1984 1986 1988 1990 1992 1994 1996 1998
Año
Problación x 1.000 habitantes Producción de oro (kg. X mil)
Figura 2 – Relación entre la producción de oro y el contingente demográfico durante el período de la “fiebre del oro” en la región
norte del Mato Grosso (Farias 2002).
La investigación fue realizada permitiendo que los de minería y áreas degradadas por la actividad minera
representantes de las cooperativas y de las asociacio- en los municipios con el objetivo de caracterizar a las
nes de piscicultores, así como también el poder público pisciculturas de la región. Un total de 254 muestras de
y la Universidad local integrasen el estudio desde los pri- pescados en los principales ríos y pisciculturas de la re-
meros pasos. Aproximadamente 180 pisciculturas en 5 gión fueron recogidas y analizadas en el período com-
municipios fueron analizadas aunque solamente 36 fue- prendido entre septiembre de 2000 y abril de 2002. To-
ron seleccionadas de acuerdo con los criterios estable- dos los pescados fueron pesados y medidos. La identifi-
cidos: producción de pescado para consumo propio y/o cación de las especies fue realizada por investigadores
para comercialización regional y/o nacional; período de de la Universidad Estadual del Mato Grosso (UNEMAT).
desarrollo de las actividades, condiciones de cultivo. El análisis del mercurio total fue realizado por la Pontificia
Con el objetivo de caracterizar la reciente actividad de Universidad Católica de Río de Janeiro (PUC-Rio) utili-
piscicultura en la región norte del Mato Grosso, se reali- zando el método de Espectrofotometría de vapor frío
zaron entrevistas con los trabajadores directos e indirec- descrito por Campos & Curtis (1990). La calidad analíti-
tos de las pisciculturas analizadas a través de la aplica- ca fue determinada a través del control de los blancos
ción de cuestionarios con preguntas cualitativas y cuan- del análisis por duplicado, y comparada con el resultado
titativas. Este cuestionario incluía variables relacionadas anl de referencia. Un banco de datos con todas las infor-
con hábitos sociales e alimenticios dando énfasis al con- maciones recolectadas a través de las entrevistas fue
sumo y la origen de los pescados, la calidad del agua en construido y analizado. Todos los datos fueron georefe-
la represa, pisciculturas localizadas en antiguas áreas renciados, garantizando la localización espacial de los
– 50 –
Sandra Hacon
componentes del estudio. Todos los datos fueron anali- 2003). Sin embargo, la actividad informal de minería de
zados utilizando los programas estadísticos SPSS ver- oro y su asociación con el uso de grandes cantidades de
sión 8.0 y Epinfo versión 6.0. La estadística descriptiva mercurio metálico para amalgamarlo aún es una realidad
fue utilizada para analizar la magnitud del mercurio en en la región amazónica. La actividad minera de oro infor-
los pescados, así como también, las demás variables mal presenta actualmente una escala mucho más baja
que componen el modelo de exposición. Comparacio- que la observada hace veinte años. En la actualidad,
nes de medias utilizando ensayos paramétricos y no ésta representa solamente el 3-5% del oro producido en
paramétricos acompañaron los análisis. Los análisis de la Amazonia Legal, aún así, continua siendo la principal
los escenarios de exposición y las de incertidumbre fue- fuente antrópica de mercurio y aún son encontradas ele-
ron cuantificados utilizando el programa Cristal Ball ver- vadas concentraciones de metilmercurio en pescados
sión 2000. La evaluación de la exposición fue estimada a piscívoros en los ríos de la cuenca amazónica. Estos ni-
partir de la ingestión diaria de pescado por parte de la veles elevados de mercurio encontrados en los pesca-
población adulta de cada municipio a través de la ecua- dos de la cuenca amazónica representan un riesgo para
ción general para calcular la evolución de la exposición la sustentación de la actividad de piscicultura en algu-
crónica. nas áreas de la región norte del Mato Grosso. En este es-
tudio se midieron los niveles de mercurio en 19 especies
Ecuación general para la estimativa de los escenarios de pescados consumidos por las comunidades locales
de exposición: en las 5 áreas estudiadas. La tabla 2 muestra los resulta-
dos de los niveles de mercurio en pescados tanto de ríos
Ingestión de Hg diaria (mg/kg/d) = Concentración de Hg en el pescado como de pisciculturas consumidos en estas comunida-
(mg/kg) x tasa de ingreso de pescado consumido diariamente (kg/d) /
peso corporal del individuo expuesto (8,9) des.
La tabla 2 pone en evidencia que las áreas de Para-
RESULTADOS Y DISCUSIÓN naíta y Alta Floresta en la región norte del Mato Grosso
presentan las concentraciones de mercurio más eleva-
En la región norte del Mato Grosso, la actividad de la das en la ejemplares de la especie Brachyplatystoma
piscicultura surgió como una asociación entre la Prefec- spp (Piraíba) pescados en el río Apiacás, con una con-
tura de Alta Floresta y la Universidad Estadual del Mato centración media de 2.02 mg/kg (DP ± 1.04) y una varia-
Grosso. A partir de esta asociación fue estructurado, en ción media de 1.2 a 3.5 mg/kg y en ejemplares de la es-
1994, el Proyecto “Peixe” (pescado), con la intención de pecie Paulicea lutkeni (Jaú) pescados en el río Paranaí-
fortalecer la actividad económica en la región. El estudio ta, con un valor medio de 1.3 mg/kg (DP ± 0.4) y una vari-
realizado para caracterizar las pisciculturas reveló que la ación de 0.5 a 1.7 mg/kg. Ambos ríos fueron
mayoría del cultivo es de tipo extensivo, es decir, con un intensamente afectados por la actividad minera en las úl-
mínimo control de las condiciones de cultivo y de los pa- timas décadas. El análisis estadístico de estos datos
rámetros fisicoquímicos del agua, resultando en una puso en evidencia, a través del test de Kruskal-Wallis,
baja producción y en niveles alterados de contaminantes una diferencia significativa (p< 0.001) entre las especies
ambientales tal como se observa en la tabla 1. piscívoras y no piscívoras de ríos y pisciculturas. El nivel
En la actualidad, son varias las discusiones y las in- de mercurio encontrado en los pescados piscívoros de
certidumbres asociadas a las fuentes y a la naturaleza los ríos corresponde al doble del medido en el mismo
del mercurio en la Amazonia Legal (Wasserman et al tipo de pescados en las pisciculturas.
Área total do Município IBGE 1998 (km2) 9310 7213 4898,2 9172 4857,3
– 51 –
Evaluación de Riesgo Una Herramienta Para El Proceso de Gerenciamiento Socioambiental: Estudio de caso en La Región Norte de Mato Grosso
Hay varias maneras de explicar las diferencias en en los pescados piscívoros y no piscívoros oriundos de
los niveles medidos en los pescados de la cuenca del los ríos y pisciculturas.
río Teles Pires y en las pisciculturas. Entre ellas, desta- La especie migratoria Tucunaré, también conocida
camos: el tamaño, el peso y la edad de los pescados como especie invasora, presentó un valor medio de 0.33
piscívoros, el nivel trófico, la disponibilidad de alimento, mg/kg (SD ± 0.16) de mercurio y una variación de 0.06 a
tiempo de exposición, la influencia de las característi- 0.66 mg/kg en pescados de piscicultura de Alta Floresta
cas del ecosistema acuático, etc. Las concentraciones y Paranaíta. Esta especie, dependiendo del alimento dis-
medias de mercurio en los pescados piscívoros (n = ponible, puede alcanzar los 5 kilogramos y puede con-
125 muestras) es de 0,6 mg/kg (DP ± 0,54) y en los no vertirse en una amenaza para las pisciculturas de la re-
piscívoros (n=129 muestras) es de 0,03 mg/kg (DP ± gión debido a su rápido crecimiento y a su capacidad de
0,03). Los niveles de mercurio medidos en los pesca- biomagnificación del mercurio. Muchos estudios mues-
dos piscívoros fueron estadísticamente significativos tran una correlación relevante entre los niveles de mer-
(p< 0.001). El municipio de Matupá fue el que presentó curio, el peso y el crecimiento en los pescados piscívo-
los niveles más altos de mercurio en los pescados culti- ros (Farias 2002, Wasserman et al 2003). Un análisis
vados en pisciculturas, el Tambacú y el Tambaqui, am-
bos no piscívoros, llegaron a valores superiores a 0,1
mg/kg. Estos resultados no eran esperados para estas
especies. En las pisciculturas de Matupá, estas especi-
es presentaron una leve tendencia a la bioacumulación
del mercurio. En las áreas de referencia Nova Monte
Verde y Nova Bandeirante (n=70) los niveles de mercu-
rio en los pescados no piscívoros (n=38) presentó una
media de 0,04 mg/kg (DP ± 0,02) y una variación de
0,01 a 0,11 mg/kg. En los piscívoros (n=32), la media
fue de 0,48 mg/kg ( DP ± 0,36) y una variación de 0,73
a 1,10 mg/kg. Estos resultados se mostraron estadísti-
camente significativos con relación a los niveles tróficos
(p= < 0,001). La figura 3 presenta los valores de la me-
diana 5%, 25%, 75% e 95% de los niveles de mercurio
en especies piscívoras y no piscívoras oriundas de ríos
y de pisciculturas consumidas por la población de las
áreas estudiadas. Los valores extremos fueron retira-
dos del cuadro para una mejor representación de la
magnitud actual de la exposición en la región. La figura
Figura 3 – Distribución de los niveles de mercurio en pescados de
resalta la diferencia en las concentraciones de mercurio ríos y de pisciculturas en la región norte del Mato Grosso.
– 52 –
Sandra Hacon
estadístico de correlación de Pearson, entre las varia- 0,09 mg/kg/d, lo que significa que los pescados de la re-
bles: nivel de mercurio, longitud estándar y peso de gión pueden ser consumidos sin que representen un ri-
ejemplares de la especie Tucunaré pescados en el río esgo para la comunidad. Las demás localidades presen-
Teles Pires o en las pisciculturas de la región evidencia- tan poca variación media entre los valores de dosis de
ron resultados significativos (p < 0.01) con los coefici- exposición. Matupá presentó la mayor dosis de exposi-
entes de correlación 0.95 y 0.51, respectivamente. A ción (0,5 mg/kg/d) y Paranaíta la mayor variabilidad de
pesar de que las especies no piscívoras de piscicultura dosis (0,03 – 3,9 mg/kg/d). Los principales factores que
hayan presentado niveles más altos de mercurio que explican esta variabilidad de las dosis son: las tasas de
los del río, estos resultados no fueron estadísticamente consumo; la preferencia de determinadas especies de
significativos. pescado por parte de la población rural y urbana; y el ni-
La tabla 3 presenta una comparación de los nive- vel de mercurio de los pescados consumidos en las dife-
les de mercurio en pescados de pisciculturas en la re- rentes comunidades evaluadas. Se constató que el 70%
gión norte de Mato Grosso consumido por las comuni- de la población rural de la región consume pescado
dades de estas áreas. Comparando los resultados se- como la principal fuente de proteínas de su dieta.
gún el lugar de origen del pescado, se observa que Estos resultados ponen en evidencia que el consu-
37% de los pescados de río están por encima del valor mo de pescado de la región continúa influenciando la di-
máximo para consumo humano recomendado por la eta local y, consecuentemente, representando un riesgo
OMS, mientras que solamente el 6% de los pescados potencial de contaminación mercurial para las comuni-
de piscicultura presentan valores superiores al reco- dades estudiadas. Con excepción de la localidad de
mendado. Estos resultados indican un riesgo potenci- Matupá, todas las demás áreas mostraron que los pes-
al en el consumo de pescado de río de la región, prin- cados no piscívoros Tambaqui y Tambacú pueden ser
cipalmente los provenientes de los ríos Teles Pires, consumidos sin representar riesgos a la salud humana.
Apiacás e Paranaíta. El gerenciamiento de la exposición al consumo de pes-
cados contaminados con niveles de mercurio superiores
Tabla 3 – Comparación del nivel de mercurio en los a 0,5 mg/kg debe ser una prioridad para el poder público
pescados de pisciculturas y ríos de la región norte del Mato de la región. Esta investigación contribuyó a legitimar la
Grosso. importancia del proceso de evaluación de riesgo como
herramienta de planificación y gerenciamiento sociambi-
Origem del <0,3mg/kg 0,3 - 0,5mg/kg >0,5mg/kg ental para el desarrollo de proyectos sustentables. Estos
pescado resultados permiten orientar a los órganos reguladores,
Pisciculturas 67,5% (NP) 12% (P) 6% (P) a las comunidades y a las ONGs con relación al gerenci-
n = 219 14,5% (P) amiento del riesgo que la contaminación mercurial repre-
senta para la región norte de Mato Grosso.
Ríos n = 106 27% (NP) 22,5% (P) 37% (P)
13% (P)
CONCLUSIONES
P= Piscívoros NP= No Piscívoros
Los resultados del presente estudio muestran que el
La tabla 4 presenta la variación de las dosis de ex- pasivo ambiental de la contaminación mercurial en la re-
posición en las cinco localidades estudiadas. La loca- gión norte del Mato Grosso está presente en varios luga-
lidad de Nova Bandeirante presentó la menor dosis res, incluyendo ríos, áreas con y sin historia de minería lo
Tabla 4 – Dosis potencial (mg/kg/d) de exposición al mercurio en la región norte de Mato Grosso.
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Evaluación de Riesgo Una Herramienta Para El Proceso de Gerenciamiento Socioambiental: Estudio de caso en La Región Norte de Mato Grosso
que evidencia un extenso transporte de mercurio en la 1996. 182 p. Tese (Doutorado em Geoquímica
región. El consumo de grandes cantidades de pescado Ambiental)- Universidade Federal Fluminense, Nite-
piscívoro, es decir, 700 gramos de pescado por sema- rói, 1996.
na puede representar un riesgo para las comunidades HACON, S. S.; FARIAS, R. A.; CAMPOS R. C.;
expuestas. Entre los pescados de mayor riesgo para el ARGENTO, R.C.; ROSSI, A. P.; VALENTE, J.;
consumo humano – debido a su bajo precio y, por lo WASSERMAN, J. The new human exposure scenari-
tanto, su mayor accesibilidad para las comunidades os to mercury in the North region of Mato Grosso -
más pobres – aparece el Jaú, muy consumido por este Amazon Basin. Environmental Science, [S.l.], v. 10,
sector de la población. La dosis diaria de mercurio para n. 2, p. 121-134, 2003.
la población adulta no debe exceder los 0,3 µg/kg/d. IBGE. Censo 2000: resultado do universo. Disponivel
Esta dosis se encuentra en un límite de exposición em: <http://www.ibge.gov.br>. Acesso em 03 ago.
aceptable. 2006.
SECRETARIA MUNICIPAL DE AGRICULTURA DE ALTA
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na de Alta Floresta. MT - Bacia Amazônica – Brasil. 144.
– 54 –
Carlos Siqueira Bandeira de Mello
RISCOS À SAÚDE DE
SUBSTÂNCIAS ORGÂNICAS
Carlos Siqueira Bandeira de Mello, carlosbandeira@petrobras.com.br
Dennis James Miller, miller@petrobras.com.br
COPPE/GEOQ/CENPES/PETROBRAS,
– 55 –
Riscos à Saúde de Substâncias Orgânicas
to ambiental, é atualmente atribuição da Geologia Médica, cos, químicos e biológicos (Figura 1). A geosfera é a
nascida no século passado e em pleno desenvolvimento fonte original de toda a matéria existente no planeta, à
no século XXI. A ação da Geologia Médica se dá principal- exceção da massa oriunda do espaço, seja na forma de
mente através do conhecimento das fontes de riscos natu- meteoros ou de poeira cósmica. A partir da geosfera
rais para a saúde e o bem-estar humano, colaborando as- ocorrem trocas com os domínios da hidrosfera, biosfera
sim para que se possam prevenir doenças acarretadas por e atmosfera, bem como as relações entre elas. Interli-
excessos ou carências de determinadas substâncias e gando a geosfera e a atmosfera. A contribuição dos
elementos presentes no meio geológico (Moeller, 1997, compostos orgânicos advém principalmente das ema-
Cunha et al.,1997). Em síntese, pode-se dizer que a Geolo- nações de aerossóis, gases vulcânicos que incluem
gia Médica ocupa-se com a compreensão do interrelacio- aqueles oriundos de vulcões propriamente ditos e vul-
namento de processos geológicos, físicos e biológicos do cões de lamas, além dos hidrocarbonetos gasosos e
sistema Terra, incluindo suas interações geológi- vapores oriundos de bacias sedimentares através de
cas-fisicas e biológicas (Sigh, 2000). seeps naturais, e de tempestades de poeiras interconti-
nentais. Da geosfera para a hidrosfera existem os pro-
O ENFOQUE DAS SUBSTÂNCIAS ORGÂNICAS NA dutos orgânicos oriundos do intemperismo químico de
GEOLOGIA MÉDICA substâncias minerais tais como fenóis de carvões e os
hidrocarbonetos sólidos, líquidos e ainda gasosos.
Embora o enfoque atual da Geologia Médica con- O relacionamento entre a hidrosfera e a biosfera
temple os elementos e substâncias inorgânicas em fun- ocorre a partir do consumo e da excreção de produtos
ção de efeitos danosos provocados nos seres vivos, a orgânicos por animais e vegetais que vivem em meio
exemplo do mercúrio, arsênio, chumbo, flúor, selênio, aquoso. Esses produtos incluem as comunidades quimi-
zinco, alumínio, cádmio, asbestos, sílica e outros (Olivei- ossintéticas encontradas em seeps nas zonas batiais ri-
ra et al., 2002, Pinese et al., 2002), as substâncias orgâ- cas em hidrocarbonetos gasosos, advindos de bacias
nicas naturais têm sido apontadas como responsáveis produtoras de petróleo da geosfera (Mbari, 2005, Duna-
por muitos males que assolam os seres vivos (ATSDR, way, 2005).
2001, WHO, 2000). Muitas dessas substâncias, tais A biosfera e a atmosfera relacionam-se através da
como benzeno, benzo[a]pireno, hidrocarbonetos policí- queima da biomassa, dos aerossóis biogênicos, com hi-
clicos aromáticos em geral (PCA’s) incluindo o ben- drocarbonetos biogênicos. A hidrosfera e a atmosfera in-
zo(b)fluoranteno, juntamente com alguns dos inorgâni- terligam-se através de aerossóis marinhos, chuvas e tam-
cos acima mencionados, fazem parte da lista das vinte bém através de hidrocarbonetos gasosos e vapores que
substâncias mais tóxicas segundo a Agency for Toxic se desprendem de zonas enriquecidas em hidrocarbone-
Substances and Disease Registry – ATSDR. As contami- tos. Na realidade a atmosfera é o caminho de muitos nutri-
nações orgânicas naturais como de águas ricas em entes como nitratos, amônia, compostos orgânicos de ni-
BTEX (benzeno, tolueno, etil-benzeno e xilenos) encon- trogênio e de outros elementos bioativos (Solas, 2004).
tradas em lençóis freáticos em campos de petróleo, ex-
sudações de óleos e gases existentes em abundância EFEITOS DOS PRODUTOS ORGÂNICOS E SUAS
na região do Golfo do México entre outros, águas ricas ORIGENS
em fenóis encontradas em minas de carvão, hidrocarbo-
netos expelidos por vulcões de lama, contaminações or- A lista dos produtos orgânicos antrópicos prejudici-
gânicas carreadas por tempestades de areia interconti- ais aos seres vivos é imensa e a cada dia são fabricados
nentais, são exemplos significativos para estudo no novos produtos. No entanto, neste trabalho enfocou-se
campo da Geologia Médica (Bandeira et al., 2004, Ban- apenas as principais substâncias orgânicas relaciona-
deira & Françolin, 2003). Por fim, convém lembrar que das às fontes geológicas. A ação destas substâncias
muitas substâncias orgânicas são responsáveis por pro- pode ocorrer de forma paulatina como os hidratos de
cessos de asfixia, toxicidade, ataques ao sistema respi- gás, aerossóis, e seeps de hidrocarbonetos, ou então de
ratório, câncer e até morte. maneira catastrófica e muitas vezes letal, como no caso
das tempestades de areia, vulcões e vulcões de lama. A
ENTENDENDO O INTER-RELACIONAMENTO ENTRE tabela 1 mostra os principais efeitos causados nos seres
AS DIFERENTES ESFERAS NO PLANETA TERRA vivos e respectivos produtos orgânicos naturais.
– 56 –
Carlos Siqueira Bandeira de Mello
– 57 –
Riscos à Saúde de Substâncias Orgânicas
cos); sais marinhos (NaCl); biogênicos (sulfatos e orgâ- ra e contaminantes de um continente a outro. Em 2001
nicos); vulcânicos (ácido sulfúrico e gases diversos) e ocorreu outra tempestade semelhante àquela de 1988.
neblinas urbanas industriais (Husar et al., 2001). Cada O rastreamento da nuvem de poeira permitiu observar
componente de aerossol tem fontes e propriedades es- que a tempestade, embora tenha passado pela China e
pecíficas, ocorrendo sobre uma região particular e num Mongólia, na realidade era originária da Sibéria. Através
estrato preferencial. Alguns aerossóis ocorrem de forma de satélites observou-se que nos dias 6 a 9 de abril fo-
natural a partir de tempestades de areia, vulcões, quei- ram carregadas milhões de toneladas de poeira do de-
madas e sprays oceânicos (NASA, 2001). serto de Takla Makan da China e de Gobi na Mongólia.
No dia 7 de abril de 2001 as ruas de Baicheng na provín-
Tempestades de Areia cia de Jilin a norte da China, foram tomadas por uma
A maior parte dos sedimentos carreados por tem- densa nuvem de poeiras (NASA, 2001).
pestades de “areia” estão, na realidade, sob a granulo- Em 2004, cientistas de universidades chinesas e de
metria de silte. Afetam cultivos, povos, vilas, climas e po- Hong Kong estudaram dezoito amostras de três episódios
dem ter caráter intercontinental. Em 1971 o planeta Mar- de tempestades de areia na localidade de Qingdao -
te foi inteiramente coberto por uma tempestade de areia. China ocorridas em 2002. As análises químicas revela-
Esse fenômeno se repetiu em 2001 tendo sido observa- ram que, além de elementos originários da crosta terres-
do e fotografado através do telescópio Hubble (NASA, tre, foram detectados também compostos orgânicos tais
2001). Observou-se que as temperaturas atmosféricas como fenantreno, fluoranteno, pireno, benzo[a]pireno,
são afetadas durante tais tempestades tanto através da benzo[a]fluoranteno, perileno, antraceno e coroneno.
absorção como pela reflexão da radiação solar pelas Através do índice de preferência de carbono (CPI) e ou-
partículas. A influência sobre o clima se dá através dos tras análises, Guo et al., (2004), concluíram tratar-se de
produtos primários marinhos com conseqüências sobre resíduos de petróleo oriundos de contribuições antrópi-
as atividades de convecção das nuvens geradas. Quan- cas que incluíam policíclicos aromáticos, ácidos graxos,
do uma tempestade de areia é originada em uma região bem como hidrocarbonetos advindos de veículos. De-
de lagos secos gera um ambiente de alta salinidade. As tectaram também produtos orgânicos relacionados a
partículas resultantes são prejudiciais aos pulmões. A plantas cerosas provavelmente originados da abrasão
alta incidência de doenças respiratórias na área recente- do particulado presente na tempestade em contato com
mente exposta do mar de Aral pode estar ligada a tem- a folhagem dos vegetais.
pestades de areia deste tipo. No Oriente Médio as tempestades de areia do de-
Para Meskhidze (2005) as tempestades de areia serto ocorrem com maior freqüência entre os meses de
nem sempre são fonte de poluentes podendo também abril e maio. Em 26 de abril de 2005 a base aérea de Al
contribuir para a formação de nutrientes em zonas oceâ- Asad, no Iraque, foi atingida por uma forte tempestade
nicas. O processo ocorre quando uma tempestade de de areia. A frente da nuvem de poeira avançou a uma
areia, contendo poeiras ricas em óxidos de ferro, passa velocidade estimada de 60 milhas por hora. Em maio de
sobre uma área industrializada. Em circunstâncias espe- 2005, as nuvens de poeira provenientes do Saara atin-
ciais pode ocorrer a captura de dióxido de enxofre e giram as Ilhas Canárias e áreas mais distantes situadas
diversos tipos de ácidos. A prosseguir por sobre uma na Europa e na Região Amazônica. Nesta última esti-
área oceânica, o ferro pode sofrer redução a partir de mou-se que, anualmente, o total de poeira oriunda do
reações químicas e ser transformado em ferro solúvel e Saara situava-se entre 20 e 50 kg por hectare (Artaxo
auxiliar na formação de micronutrientes para o fito- et al., 2004).
plancton marinho. Além das possíveis conseqüências para olhos e pul-
Atualmente, se estudam os possíveis tipos de rea- mões acarretadas pelo particulado, as tempestades de
ções que ocorrem na trajetória de tempestades de areia areia propiciam meios para disseminação de microorga-
que, em muitos casos, podem ultrapassar a milhares de nismos. Na África Subsaariana, observou-se que as bac-
quilômetros. Em abril de 1988, uma tempestade de areia térias da meningite meningocócica (inflamação da medu-
retirou sedimentos finos do deserto de Gobi na Mongólia la espinhal ou no cérebro) desenvolvem-se mais em cer-
e da área industrial poluída da China e, após ter atraves- tas épocas do ano em que ocorrem tempestades de areia
sado o oceano Pacífico, cobriu 25% da América do Norte que são coincidentes com a estação de pouca chuva e
- Canadá e Estados Unidos (Guo et al., 2004). O fenôme- baixa umidade (FAPESP, 2005). Em face desta realidade,
no ocorreu de novo em 2001 quando os satélites da médicos vêm pesquisando, através de satélites da Agên-
NASA detectaram uma nuvem de poeira maior que 2.000 cia Espacial Européia (ESA), as grandes nuvens de poei-
km saindo da China, cobrindo o Japão e Coréia do Nor- ra que saindo do deserto do Saara atingem vários países
te, atravessando o oceano Pacífico e atingindo a Améri- africanos. Este monitoramento semanal, busca descobrir
ca do Norte, desde o Alasca até a Flórida, levando poei- eventuais relações entre o pó e as epidemias.
– 58 –
Carlos Siqueira Bandeira de Mello
Até pouco tempo atrás se supunha que os raios ul- Em junho de 1991 o vulcão Pinatubo, situado nas Filipi-
travioleta seriam letais aos microorganismos encontra- nas, ejetou 42 milhões de toneladas de gás carbônico,
dos nas tempestades de areia. Entretanto, as observa- grandes quantidades de rochas, água, sulfatos, bem
ções têm mostrado que tal hipótese não corresponde à como volumes menores, porém significativos, de clore-
realidade. Na Inglaterra foi observado haver uma estreita tos e metais pesados como zinco, cobre, cromo, chum-
ligação entre as tempestades de areia e a doença viral bo, níquel, cádmio e mercúrio (Terrence et al., 1996). Os
foot-and-mouth (pés e boca) que ocorre entre animais aerossóis oriundos desta explosão afetaram o clima glo-
de criação, que algumas vezes foi confundida com a do- bal por três anos (Gerlach, 1996; Selinus, 2004).
ença da vaca louca (Mckie, 2001). Descobriu-se tam- A explosão de um vulcão pode elevar grandes
bém que a doença encontrada nos corais do mar das quantidades de fragmentos, poeiras e gases a grandes
Caraíbas é acarretada por fungos comumente encontra- altitudes. Em 1º de outubro de 1994 os satélites da NASA
dos em solos, a saber: o Aspergillus sydo-wii. Como este detectaram a erupção do vulcão Klyuchevskaya, situado
fungo não se multiplica nas águas do mar, a origem de- a 4.750 metros acima do nível do mar, na Rússia. A plu-
pende de uma fonte fresca em espalhamento contínuo ma de contaminação elevou-se a uma altitude entre 10 e
de solos que ocorre através de tempestades de areia 14 km (NASA, 2005). A erupção do vulcão Tambora, em
como a que vem ocorrendo na região (Pohl, 2003 e Gou- 1815 na ilha de Sumbawa na Indonésia, ejetou para a at-
3
die et al., 2004). mosfera, aproximadamente, 100 km de rochas. A tem-
Nas regiões áridas dos Estados Unidos no Valley peratura média da parte central da Inglaterra decresceu
Fever e também no México ocorre uma doença causada cerca de 4.5° F. No vulcão Etna situado na Itália, a princi-
pelo cocciodioidomicose, um fungo que compromete, pal emissão é de gás carbônico, mas estão presentes
freqüentemente com infecção, o sistema respiratório de também grandes emissões de metano (Veschetti et al,
pessoas, gado, cães, cavalos, lhamas e, em alguns ca- 1999 e Pecoraino & Giammanco, 1998). Há vulcões que
sos, gatos (Finkelman, 2001, Deaner & Einswtein, 1999). emitem gás sulfídrico e provocam graves efeitos na saú-
A doença apresenta uma forma granulomatosa no apa- de humana. Adicionalmente há relatos sobre os perigos
relho respiratório e secundariamente é disseminativa no para a saúde causados por poluição vulcânica no Havaí
organismo em geral, atingindo preferencialmente pele, onde existe uma relação entre as taxas de mortalidade e
ossos, articulações e as meninges (Costa, 2003). A fase as distâncias das erupções e dos gases (Grattan et al.,
vegetativa de vida dos fungos apresenta dois tipos de 2002, 2003).
micélios que ao atingirem os pulmões transformam-se
em esferas espongiais ou coccidiais (Kuhl, et al., 1995). Vulcões de Lama
Muitos endósporos são desenvolvidos, e as esferas são Os vulcões de lama são originados em zonas de pe-
capazes de produzir novas esférulas que constituem a tróleo e gás. Formam estruturas de dezenas de metros
fase saprofítica da doença. A disseminação e os casos de altura e de diâmetro, com expulsão de material sólido
mais graves da doença costumam ocorrer por ocasião e gasoso, ocasionando a deposição de brechas e provo-
de terremotos, quando os solos removidos sob a forma cando a ignição de gases. Em cada erupção são lança-
de poeira são levados pelo vento, atingindo grandes dis- das centenas de toneladas de lama e milhões de metros
tâncias, a exemplo do que aconteceu em Northridge no cúbicos de gases que, geralmente, são lançados ao ar
ano de 1994. Em algumas situações a doença pode ser sob a forma de imensos cogumelos em chamas (Tabela
mortal (Williams et al., 1979). Na América do Sul esta do- 2). Tais explosões vêm sendo registradas desde 1882. A
ença foi detectada na Venezuela, Colômbia, Bolívia e última grande explosão ocorreu em 2001. Após o evento
norte da Argentina. Este tipo de fungo foi também encon- explosivo, o vulcão entra em um estágio de dormência
trado na região de Oeiras no Piauí em solos escavados relativa que pode durar dezenas de anos. Durante esse
por tatus (Costa, 2003 e Kuhl, et al., 1995). estágio continua extravasando lama, gases e petróleo
Assim, as tempestades de areia têm a capacidade em estruturas chamadas de grifons que se localizam
de transportar tanto as contaminações orgânicas versus dentro e /ou próximas da cratera principal. Em alguns
inorgânicas naturalmente encontradas na natureza, bem vulcões ocorrem também estruturas circulares que ex-
como as de origem antrópica. A rota destas tempesta- pelem água salgada e gás, sendo denominadas de sal-
des tem sido alvo de estudos preocupantes por parte de sas. No mundo existem mais de 700 vulcões de lama dis-
órgãos governamentais de diversas nações. tribuídos em 25 países, sendo a maioria no Azerbaijão
(país do fogo na linguagem Azeri) e adjacências que in-
Vulcões clui a região do Mar Cáspio (Françolin, 2002). A queima
Os vulcões em geral ocorrem sob a forma explosiva. dos hidrocarbonetos pode durar vários dias e envolver
O vulcanismo espalha na superfície da Terra produtos volumes colossais de gases, gerando chamas que atin-
químicos e substâncias oriundas do interior do planeta. gem centenas de metros de altura. Em 1947, cerca de
– 59 –
Riscos à Saúde de Substâncias Orgânicas
500 milhões de metros cúbicos de gás foram lançados pende da composição do gás e da pressão em que se
na atmosfera durante a erupção do vulcão de lama Tou- encontra. O metano, por exemplo, em presença de água
rogay. Neste período de quietude o total de gás emitido a 600 psia forma hidratos a 5° C. Nesta mesma pressão,
pelos vulcões de lama Charagan e Dashgil correspon- se a composição possuir 1% de propano, consegue for-
3 3
deu, respectivamente, a 44 mil m /ano e 165,000 m /ano mar hidrato de gás a 10°C. Outros fatores como a salini-
(Akper, 2003). Os maiores acidentes ocorridos com pes- dade também podem influenciar os hidratos (Edmonds
soas e animais devem-se tanto à chama incolor do meta- et al., 1996). De acordo com Kvenvolden (1993), a quan-
no como à combustão espontânea que acontece de ma- tidade de gás contido em um metro cúbico de hidrato, ao
neira repentina. ser dissociado na atmosfera, em condições normais de
3
O mar Cáspio, nas cercanias de Baku, capital do temperatura e pressão, pode formar 164 m de gás natu-
3
Azerbaijão, costuma ter uma película de hidrocarbo- ral, além de 0,8 m de água.
netos na superfície e deve-se tanto aos vulcões de O metano é um dos seis gases listados no protocolo
lama como de tubulações utilizadas para exploração de Kyoto como causadores do efeito estufa. A ação de
de óleo e gás na região, hoje abandonadas (Françolin, um gás para formação do efeito estufa depende de sua
2002). natureza e do respectivo tempo de vida na atmosfera.
Assim, o potencial de aquecimento global para 20 anos
Hidratos de Gás (GWP20) do metano é 62 vezes mais potente que o CO2.
São também conhecidos como clatratos (do latim – Já no potencial de aquecimento global para 100 anos
gaiola) assemelham-se a neve compactada ou gelo e (GWP100) é de apenas 23 vezes (UKERC, 2004). Na rea-
são, na realidade, uma estrutura cristalina composta por lidade o metano tem a capacidade de acumular 21 ve-
46 moléculas de água e 8 moléculas de gás, com predo- zes mais calor por molécula que o CO2, embora propor-
mínio de metano (REDQ, 2002), ou outros gases de bai- cionalmente ocorra em quantidades menores que o gás
xo peso molecular como o etano, propano e também dió- carbônico. Na Inglaterra, no ano de 2002, o metano per-
xido de carbono (Sloan, 1998 e Clennell, 2000). O meta- centualmente bem menor que o gás carbônico foi res-
no pode originar-se tanto termogenicamente como bio- ponsável por 7% do efeito estufa, contra 84 % do CO2
genicamente. No caso biogênico, procede (UKERC, 2004).
principalmente dos estágios iniciais da diagênese da A quantidade de energia proveniente do metano
matéria orgânica, e pode fazer parte dos hidratos encon- existente nos hidratos em todo o mundo, longe de ser
trados em sedimentos da plataforma continental. Há ga- desprezível, equivale ao dobro do total dos combustíveis
ses biogênicos que procedem também da degradação fósseis encontradas até hoje (Clennell, 2000). Somente
bacteriana, oriundos de reservatórios de petróleo. No nos Estados Unidos o United States Geologic Survey -
3
caso termogênico, o metano relaciona-se a campos de USGS estimou existir 600 trilhões de m de metano que
gás situados em bacias sedimentares. Geologicamente daria para abastecer a nação em 2000 anos (REDQ,
os gases de hidratos podem ocorrer em duas situações 2002). A detecção de hidratos costuma ser feita através
distintas, a saber: em sedimentos de plataforma mari- de perfilagem sísmica, de geoquímica e sondagens. Os
nha, de distribuição mundial, ou em regiões polares maiores depósitos de hidratos situam-se no Alasca, no
on-shore, situadas abaixo da camada de gelo polar (per- delta do Mackenzie e no arquipélago do Canadá, na ba-
mafrost). Sob a pressão apropriada, os hidratos podem cia siberiana e bacia Vilyuy na Rússia. No Brasil são re-
existir em temperaturas significativamente acima do portados hidratos nas bacias de Pelotas e Amazônica
ponto de congelamento da água. Por outro lado, a tem- (Clenell, 2000).
peratura máxima para existência de hidrato do gás de-
Seeps de Hidrocarbonetos
Os seeps são escapes naturais de hidrocarbone-
Tabela 2 – Média dos gases oriundos de diversos vulcões tos para a superfície oriundos de campos de gás e óleo
do Azerbaijão (Akper, F., 2003). existentes em bacias sedimentares. Podem ocorrer tan-
to no mar como no continente. Somente na costa da Ca-
lifórnia existem mais de 2.000 seeps naturais, sendo o
Gases
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Carlos Siqueira Bandeira de Mello
d’água de 70 metros de profundidade e é a principal AKPER, F. Geological Conditions and Peculiarities of the
fonte de poluição atmosférica do citado município cali- Mud Volcanoes Formation. In: AAPG ANNUAL
forniano. Os hidrocarbonetos ali encontrados contêm CONVENTION, 2003, Salt Lake City, Utah. [Traba-
gases orgânicos reativos (ROGs), que são os precurso- lhos apresentados]. [Slat Lake City]: AAPG, 2003.
res do ozônio. Os seeps de óleo trazem para a superfí- ARTAXO, P.; PAULIQUEVIS, T.M.; RIZZO, L. V.; LARA,
cie contaminações de benzeno, tolueno, etil-benzeno e L.L. Environmental implications of aerosol particles in
xilenos (BTEX) e podem comprometer a biota marinha. the Amazonian atmosphere: results from the LBA ex-
Por outro lado, os seeps gasosos trazem gases que periment. In: INTERNATIONAL SYMPOSIUM ON
contribuem para o efeito estufa. ENVIRONMENTAL GEOCHEMISTRY IN TROPICAL
COUNTRIES, 4., 2004, Buzios, RJ. Abstract. Rio de
CONCLUSÕES Janeiro: [s.n.], 2004.
BANDEIRA, C.S.; FRANCOLIN, J. B. L. Study of oil spills
Os produtos orgânicos de origem não antrópica po- and seeps using geological profiles in a river from the
dem também afetar a saúde dos organismos vivos, influ- Negro basin, Amazon rain forest, Brazil. In:
enciar no clima, contribuir para o efeito estufa e afetar as INTERNATIONAL SYMPOSIUM ON ENVIRONMENT
concentrações de ozônio no planeta. 2010: situation and perspectives for the European
A quantidade de produtos orgânicos naturais gera- Union, 2003, Porto, Portugal. [Trabalhos apresenta-
dos em atividades geológicas no meio ambiente através dos]. [S.l.: s.n.], 2003.
aerossóis, tempestades de areia, vulcões, vulcões de BANDEIRA, C.S.; GRACIANO, J.; MENEZES, R. M. 4. The
lama, hidratos e seeps precisam ser considerados como importance of the inclusion of natural organic subs-
assuntos importantes a serem estudados, cuidadosa- tances in geomedicine. In: INTERNATIONAL
mente, pela comunidade científica e especialmente atra- SYMPOSIUM ON ENVIRONMENTAL
vés da Geologia Médica. GEOCHEMISTRY IN TROPICAL COUNTRIES, 4.,
2004, Buzios, RJ. [Trabalhos apresentados]. Rio de
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AGRADECIMENTOS CUNHA, F. G.; BANDEIRA, C.S.; MACHADO, G. J. The
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Somos gratos ao Dr. Luiz Antonio F. Trindade, ge- concern in the Minas Gerais State, Brazl.
rente da geoquímica do CENPES / Petrobras, pelo incen- INTERNATIONAL SYMPOSIUM ON
tivo, e à colega Joelma P. Lopes da COPPE / UFRJ, pelas ENVIRONMENTAL GEOCHEMISTRY, 4., 1997, Vail,
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– 63 –
Arsênio no Brasil e Exposição Humana
ARSÊNIO NO BRASIL E
EXPOSIÇÃO HUMANA
1
Bernardino Ribeiro Figueiredo, berna@ige.unicam.br
2
Ricardo Perobelli Borba, borba@iac.sp.gov.br
3
Rômulo Simões Angélica, rsa@ige.unicamp.br
1
Instituto de Geociências/UNICAMP
2
Instituto Agronômico de Campinas
3
Centro de Geociências/UFPA
– 64 –
Bernardino Ribeiro Figueiredo
– 65 –
Arsênio no Brasil e Exposição Humana
Amostras de primeira urina da manhã, coletadas en- que amostras coletadas nas proximidades de minas e de-
tre residentes no Vale do Ribeira, foram analisadas (Sa- pósitos de rejeitos podem apresentar até 350 µg/L As e
3+ 5+
kuma, 2004) para As (As + As + MMA + DMAA) por amostras de águas de minas, até 3.000 µg/L As.
geração de hidreto acoplado a absorção atômica por Em 1998, uma campanha de monitoramento humano
sistema de injeção de fluxo, no Instituto Adolfo Lutz (São foi realizada em populações de crianças em idade esco-
Paulo), segundo procedimento recomendado por Guo et lar (7-12 anos) nos municípios de Santa Bárbara e Nova
al. (1997) e utilizando material de referência certificado Lima, utilizando arsênio em urina como bioindicador
NIST 2670 (0.06 mg/mL As). (Matschullat et al., 2000). A concentração média de As em
As concentrações de As em amostras de urina, co- urina de 126 amostras foi 25,7 µg/L As e 20% das crian-
letadas no Quadrilátero Ferrífero, referem-se a As inorgâ- ças examinadas apresentaram mais de 40 µg de As inor-
nico total, determinado por HG-AAS (Matschullat et al., gânico total por litro de urina, limiar, acima do qual, efeitos
2000). No Instituto Evandro Chagas, amostras de san- adversos à saúde em longo prazo não podem ser excluí-
gue e cabelo, provenientes de Santana, foram analisa- dos. A via de exposição ao arsênio mais provável teria
das em forno de grafite utilizando-se correção de back- sido o contato com solo e poeira, visto que as concentra-
ground Zeemann (Santos et al., 2003). ções de As em água potável revelaram-se bem inferiores
a 10 µg/L (limites estabelecidos pelo Ministério da Saúde
RESULTADOS e Organização Mundial da Saúde para água potável).
Campanhas de monitoramento levadas a efeito nas
Nas três áreas onde foram realizados estudos inte- mesmas escolas nos anos subseqüentes revelaram va-
grados de geoquímica ambiental e exposição humana lores médios inferiores aos de 1998 sendo que a porcen-
ao arsênio podem ser identificados processos induzidos tagem de crianças com concentrações acima de 40 µg/L
por atividades de mineração e metalurgia. Porém, no As em urina não excederam 5% da população amostra-
Vale do Ribeira, além dos impactos provocados pelas da em 2002 (Matschullat, 2004, comunicação oral).
atividades industriais no Alto Vale, também é considera-
da a ocorrência da anomalia geoquímica de As, corres- Arsênio no Vale do Ribeira (PR-SP)
pondente à associação de rochas e solos da Unidade Pi- O Vale do Ribeira estende-se desde o nordeste do
ririca (Grupo Açungui) caracterizada em estudos anteri- Paraná até o litoral sul do estado de São Paulo abrigando
ores da CPRM (1982) e Perrota (1996). grande parte da Mata Atlântica remanescente e um im-
portante reservatório de água doce da Região Sudeste
Arsênio no Quadrilátero Ferrífero (MG) do país.
O Quadrilátero Ferrífero é a província aurífera mais Durante o século 20, a região do Alto Vale abrigou
importante do Brasil, respondendo por uma produção de várias minas de Pb-Zn-Ag em operação, bem como uma
ouro de cerca de 600 t nos últimos 300 anos. O minério de planta de refino de chumbo (Plumbum), instalada no mu-
ouro contém arsênio em minerais como arsenopirita e löl- nicípio de Adrianópolis (PR), em operação no período de
lingita ou como impureza em pirita. As litologias compre- 1945-1995. As mineralizações principais da região conti-
endem metabasaltos, formações ferríferas bandadas me- nham quantidades significativas de arsênio (arsenopirita
tamorfizadas, xistos e granitóides que apresentam altera- e tennantita), em especial nas jazidas filonares de Pane-
ção carbonática importante nas proximidades dos depó- las e Furnas, hospedadas em calcários dolomíticos de
sitos. Esses terrenos de idade arqueana e paleopro- idade mesoproterozóica.
terozoica representam uma importante anomalia geoquí- No Médio Vale, entre as cidades de Iporanga e Ita-
mica de As na porção sul do Cráton São Francisco. A con- peúna, estende-se a Unidade Piririca, de idade meso-
tribuição das atividades de mineração e metalurgia aos proterozóica, constituída de xistos e rochas metabási-
processos de liberação de As para o ambiente vem sen- cas, hospedeiras de filões de quartzo, ouro e sulfetos (in-
do estudada por vários autores como Oliveira et al. cluindo arsenopirita). Concentrações elevadas de As em
(1979), Borba et al. (2000), Deschamps et al. (2002), Bor- sedimentos de corrente e solos delimitam uma faixa de
ba et al., (2003) e Borba & Figueiredo (2004), entre outros. direção NE (CPRM, 1982; Perrota, 1996), que representa
Em toda a região, as concentrações de As nos sedi- uma anomalia natural de arsênio, visto que na área a mi-
mentos de corrente (<63 µm) são elevadas, podendo atin- neração moderna não chegou a ser implantada.
gir até 4.000 mg/kg As nas proximidades das minas, en- Campanhas de monitoramento humano para arsênio
quanto que as águas superficiais raramente apresentam foram realizadas em cinco municípios, distribuídos nas re-
concentrações superiores a 50 µg/L As, na época o limite giões do Alto Vale (1999-2001) e do Médio Vale (2001-
estabelecido pela legislação para águas não tratadas. 2003). Foram determinadas as concentrações de As em
Poucas amostras de águas de fontes naturais também urina, coletada no início da manhã, entre crianças e adul-
apresentam baixas concentrações de arsênio, enquanto tos (Sakuma, 2004). A população da cidade de Cerro Azul
– 66 –
Bernardino Ribeiro Figueiredo
(PR), localizada fora da área sob a influência da minera- caram teores de até 345 mg/kg As em sedimento de cor-
ção e distante da anomalia natural de arsênio, foi escolhi- rente (Toujague, 1999). Solos ricos em arsênio e metais
da como grupo de referência. Entre as comunidades resi- pesados também ocorrem na Faixa Piririca, resultantes
dentes na área de mineração do Alto Vale, aquela que do intenso intemperismo químico que afetou rochas e
apresentou as medianas mais altas de As em urina (8,94 mineralizações arseníferas. Abreu & Figueiredo (2004)
mg/L As em crianças, n=89, e 8,54 mg/L As em adultos, encontraram concentrações de 25 a 754 mg/kg As em
n=86) foi a do Bairro da Serra, município de Iporanga, lo- solo superficial (profundidade 0-30 cm) na área.
calizado nas proximidades da mina Furnas e do Ribeirão
Betari, conhecido pelas altas concentrações de arsênio e Arsênio em Santana (AP)
chumbo em sedimentos à época da mineração. No Amapá, o arsênio ocorre em arsenopirita associa-
No Médio Vale foram monitoradas seis comunidades da a formações manganesíferas, de idade pré-cambria-
residentes e as concentrações médias de As em urina de na, lavradas por mais de 50 anos na famosa mina de Ser-
crianças e adultos variaram entre 2,24 e 11,35 mg/L As ra do Navio. A fonte de arsênio não se localiza na mina,
como indicado na Tabela 1 onde constam também as me- mas no município de Santana, 350 km distante, às mar-
dianas de Cerro Azul e do Bairro da Serra para efeito de gens do Rio Amazonas, onde o minério de manganês era
comparação (Sakuma, 2004 e De Capitani et al., 2005). processado e embarcado. Nessa localidade, minérios e
Embora as concentrações de arsênio em urina não rejeitos expostos ao ar livre podem conter até 0,17% As e
possam ser consideradas elevadas, observa-se que al- água subterrânea coletada em poços de monitoramento
guns teores médios guardam diferença estatisticamente próximos a esses depósitos exibem concentrações altas
significante com os resultados obtidos para o grupo de de arsênio de até 2.000mg/L.
referência de Cerro Azul (3,60 mg/L As em crianças, Estudos geoquímicos, levados a efeito na área
n=73 e 3,87mg/L As em adultos, n=83). No Médio Vale, (Lima, 2003), revelaram concentrações de As em águas
as medianas mais altas foram obtidas para as popula- superficiais entre 5 e 231mg/L As (2001-2002) mas a mai-
ções de Galvão, São Pedro, Ivaporunduva e Castelha- oria dos valores abaixo de 50 e 10mg/L As. Amostras de
nos, coincidentemente, as localizadas mais próximas da sedimento fluvial e material de suspensão apresentaram
anomalia de arsênio do Piririca, enquanto que as media- teores variando de 1.600 a 696 mg/kg As. Por outro lado,
nas mais baixas foram obtidas para as comunidades as concentrações em águas de torneira das residências
mais afastadas da anomalia geoquímica. não ultrapassaram 0,5mg/L As.
A qualidade das águas superficiais do Rio Ribeira e A população local, cerca de 2.000 pessoas, foi ava-
tributários na região do Médio Vale foi monitorada no pe- liada para exposição ao arsênio utilizando-se análises
ríodo de 2001-2003 em cinco campanhas de amostra- de sangue e cabelo (Santos et al., 2003). Arsênio inorgâ-
gem. As concentrações de As variaram de 1 a 9mg/L, nico tem especial afinidade com cabelo e outros tecidos
sendo as concentrações mais altas encontradas no cór- ricos em queratina, podendo o teor de As nesses tecidos
rego Piririca que drena rochas hospedeiras de filões au- ser usado como bioindicador de exposição. Concentra-
ríferos e solos ricos em arsênio(Takamori & Figueiredo, ções de até 1 ppm de arsênio em cabelo e unha podem
2002). Também nesse córrego, estudos anteriores indi- ser consideradas normais, segundo Choucair & Ajax
(1988) e Franzblau & Lilis (1989), limiar também usado
pela ASTDR (2000).
Tabela 1 – Concentração de arsênio em urina de crianças e Para uma população de 512 pessoas analisadas em
adultos no Médio Vale do Ribeira (2002-2003), Santana foi obtida uma mediana de 0,20mg/g As em ca-
Cerro Azul e Bairro da Serra (Iporanga). belo (Tabela 2). De acordo com resultados obtidos em
Mediana Min Max outros países (Granero et al., 1998; Pazirandeh et al.,
Localidade n
mg/L As mg/L As mg/L As 1998; Saad & Hassanien, 2001, entre outros), os níveis
Cerro Azul 156 3,86 1 34,12 de exposição ao arsênio da comunidade de Santana não
Bairro da Serra -
175 8,90 1 62,54
Iporanga
Iporanga 112 8,14 1 33,49 Tabela 2 – Concentração de arsênio (ìg/g As )em cabelo –
Pilões 73 3,97 1 68,92 Santana, Estado do Amapá (2001-2002).
Castelhanos 58 9,48 1 60,32 Mediana Min. Max.
População n
Galvão 35 15,02 2,36 55,69 mg/g As mg/g As mg/g As
São Pedro 51 11,35 1 76,19 Homens 182 0.200 0.074 1.936
Ivaporunduva 30 10,02 1,77 34,57 Mulheres 330 0.200 0.063 1.855
Nhungara 22 5,84 1 25,95 Total 512 0.200 0.063 1.936
Fonte: Sakuma (2004) e De Capitani et al. (2005) Fonte: Santos et al. (2003)
– 67 –
Arsênio no Brasil e Exposição Humana
podem ser considerados elevados, embora dados com- dos em outras localidades do país. Informações mais
plementares de arsênio urinário ainda se façam neces- sistemáticas sobre a ocorrência de arsênio em água
sários na área. subterrânea, em especial naquelas regiões onde a po-
pulação e a atividade econômica são dependentes de
Outras ocorrências de arsênio no Brasil aqüíferos rasos, ainda são escassas. Também não são
Estudos integrados de geoquímica ambiental e ava- encontradas informações sobre a liberação de arsênio
liação de exposição humana foram realizados apenas para o ambiente a proveniente de atividades agrícolas
nas três áreas descritas acima. Os três casos se referem (uso intensivo de pesticidas).
a impactos no ambiente provocados por atividades de
beneficiamento e refino mineral, representados por des- CONCLUSÕES
cartes de minas e pilhas rejeitos expostos e contamina-
ção de drenagens superficiais e de solos. Nas três áreas No Brasil, como nos demais países em desenvolvi-
as fontes de poluição podem ser consideradas pontuais, mento, a exposição a substâncias tóxicas afeta, prefe-
embora na Faixa Piririca, no Médio Vale do Ribeira, os rencialmente, a população de baixa renda e sujeita à de-
solos ricos em arsênio apresentem grande extensão. ficiência alimentar. Nas regiões norte e sudeste, referi-
Outras fontes pontuais de poluição de arsênio po- das neste trabalho, a população tem acesso à abundan-
dem ser identificadas nos distritos auríferos do greensto- te água superficial, em áreas de elevada precipitação
ne belt do Rio Itapicuru (BA), Crixás (GO) e Paracatu pluviométrica, o que configura uma situação diferente
(MG), onde foram ou são lavrados minérios auríferos, ri- daquela vivenciada nas regiões de incidência grave de
cos em arsenopirita, como o descrito no Quadrilátero intoxicação por As, onde as populações são dependen-
Ferrífero, com a diferença de que, nessas localidades, tes de consumo de água subterrânea.
as atividades de mineração não são tão antigas como O clima tropical favorece também a predominância
em Minas Gerais. de processos de intemperismo químico das rochas, do
Na Região Sul também é reconhecida a presença qual resultam perfis profundos de solos, enriquecidos
de arsênio associado aos depósitos de carvão. A mine- em ferro e alumínio, bem como sedimentos finos, que
ração de carvão nos estados de Santa Catarina e Rio funcionam como barreiras geoquímicas prevenindo a li-
Grande do Sul produziram impactos ambientais signifi- beração de As para as águas. Estes processos explicari-
cativos hoje representados pelos gigantes depósitos de am o porquê das baixas concentrações de As em águas
resíduos e lagoas sulfurosas. superficiais e, em alguns casos, em águas de nascen-
Uma revisão mais extensa da literatura e documen- tes, encontradas nas áreas estudadas, em contraste
tação geológica no Brasil ainda está por ser feita com o com as elevadas concentrações de As em solos e sedi-
objetivo de identificar fontes não pontuais de arsênio. mentos.
No banco de dados geoquímicos do Serviço Geológico Nas três áreas descritas neste trabalho observa-se
do Brasil (Lins, 2004, comunicação oral) podem ser en- que, independentemente da atividade industrial, elas
contradas até 18.670 análises de amostras de sedimen- apresentam anomalias naturais de arsênio. Aos proces-
to de corrente e solo para arsênio. Aproximadamente sos derivados da geodisponibilidade de arsênio se super-
20% das amostras apresentaram teores de arsênio su- pôs significativa liberação de As para o ambiente, decor-
periores a 100 ppm. As concentrações mais altas em rente das atividades de beneficiamento e refino mineral.
sedimento e solo foram encontradas no Vale do Ribeira Não obstante, afortunadamente, os baixos níveis de expo-
(Faixa Piririca), nas áreas dos prospectos de ouro em sição humana ao elemento tóxico, nas condições atuais,
terrenos greenstone no Amapá e Quadrilátero Ferrífero, ainda representam uma situação de risco controlável e re-
e em certas localidades na região nordeste do Estado versível. Percebe-se, além disso, que, para uma adequa-
de Rondônia. da avaliação de risco, são necessários estudos comple-
Inferências sobre prováveis fontes não pontuais de mentares de especiação de As em água e da disponibili-
As podem ser feitas a partir do mapeamento geoquímico dade de As em solos e sedimentos, não sendo suficientes
de baixa densidade do estado do Paraná. Licht (2001) apenas as determinações de concentrações totais de As
descreveu uma anomalia positiva de As associada à nos diferentes compartimentos geoquímicos.
ocorrência de folhelhos betuminosos e formações car- Até o momento, formações geológicas arseníferas
boníferas paleozóicas da Bacia do Paraná, bem como a e aqüíferos contaminados, como os indicados em ou-
ocorrência de arsênio associado à formação carbonífera tras regiões do mundo por Smedley & Kinniburgh
e uranífera na região de Figueira, no Estado do Paraná. (2002), não foram descritos no Brasil. Um inventário
No que diz respeito às águas superficiais em re- mais completo das ocorrências de arsênio no Brasil ain-
giões tropicais úmidas, os dados de concentração de As da constitui um desafio para as Geociências a ser en-
apresentados neste trabalho são coerentes com os obti- frentado no futuro.
– 68 –
Bernardino Ribeiro Figueiredo
– 69 –
Arsênio no Brasil e Exposição Humana
SAKUMA, A.M.A. Avaliação da exposição humana ao tural waters. Applied Geochemistry, Oxford, v. 17,
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SMEDLEY, P.L.; KINNIBURGH, D.G. A review of the as)-Instituto de Geociências, Universidade Estadual
source, behaviour and distribution of arsenic in na- de Campinas, Campinas, 1999
– 70 –
José Augusto Costa Gonçalves
– 71 –
O Arsênio nas Águas Subterrâneas de Ouro Preto (MG)
Minas Gerais
CG CANGA
N GT GRUPO ITACOLOMI
GI FS
FORMAÇÃO SABARÁ
GI GC
SÃO SEBASTIÃO FT
FORMAÇÃO TABÕES
GC
GN A` FF FORMAÇÃO FECHO DO FUNIL
VELOSO FC FORMAÇÃO CERCADINHO
FC
GI GI GRUPO ITABIRA
GN GN GC
LAJES GC
GRUPO CARAÇA
SANTANA GI
GC GG GN GRUPO NOVA LIMA
FC GC GG GG GN
FC
GI
PIEDADE A A’ PERFIL GEOLÓGICO
As As FALHA
FT CENTRO
FS GI GI FALHA DE EMPURRÃO
FC
FT A
RUAS
FS PADRE FARIA
As FC E.F. (ESTRADA DE FERRO)
As FC
As ARSÊNIO
FS
FS
L
NI
GG FT
FU
E.F. MORRO DO
CRUZEIRO
DO
FF
FT FF
IRÃO
RIBE SARAMENHA FT
NOSSA SENHORA
DO CARMO
GT
FS FS
HIDROGEOLOGIA - OS SISTEMAS AQÜÍFEROS: (C.A.), nos meses de janeiro, março, maio, julho, setem-
DESCRIÇÕES E CARACTERIZAÇÕES bro e novembro. Em cada ponto de coleta foram medi-
dos in situ o pH, Eh, temperatura, sólidos totais dissolvi-
Foram identificados três categorias de sistemas dos e condutividade elétrica.
aqüíferos: um meio granular, caracterizado por mantos O método de análise de especiação de As utilizado,
de alteração e coberturas detríticas indiferenciadas, um foi por voltametria de onda quadrada (Gonçalves et al.,
meio granular-fissurado, constituído pelas rochas itabirí- 2004). Os experimentos voltamétricos foram realizados
ticas, e um meio fissural, representado pelas rochas xis- em um polarógrafo Metrohm, modelo 757 VA Computra-
tosas e quartzíticas (Quadro1). ce, dotado de um eletrodo de trabalho de gota pendente
de mercúrio, um eletrodo de referência Ag/AgCl/KCl
-1
MATERIAIS DE MÉTODOS 3mol.L e um eletrodo auxiliar de platina.
– 72 –
José Augusto Costa Gonçalves
água analisadas, os valores das concentrações de As 1 – o declínio dos níveis de água após as estações
de 75% das amostras estavam acima dos valores com- chuvosas propiciam o início dos processos de oxidação
-1
patíveis ao consumo humano, que é de 10 µg.L de As nos sistemas aqüíferos;
(FUNASA, 2001). Em todas as amostras de água estuda- 2 – nos períodos chuvosos, os sais formados nas zo-
das, não foi detectada a presença do As(III), espécie nas de oxidação, durante o período seco, são solubiliza-
mais tóxica de As. dos e transportados.
As amostras de água que apresentaram concentra- Somados às condições climáticas, e atuando de
ções de As impróprias para o consumo humano foram forma concomitante, os caminhos das precipitações at-
encontradas nos pontos de amostragem P.A. 14 (Mina mosféricas, tanto pelo escoamento superficial, como pe-
do Chiquinho), PA 15 (Chafariz – Rua do Barão), PA 16 las águas infiltradas, encontram na geomorfologia e no
(Piedade-Tassara) e P.A. 17 (Biquinha da Rua Santa Rita relevo abrupto da área, condições propícias para fluxos
– Mina Velha). rápidos, facilitando as interações água-rocha, a solubili-
A direta e estreita relação entre a sazonalidade do cli- zação e o transporte de quantidades maiores de subs-
ma e os valores das concentrações de As, encontrada tâncias e elementos.
nas águas de alguns pontos estudados (P.A. 14, P.A. 15, Os sistemas aqüíferos existentes, também contri-
P.A. 16, P.A. 17), é evidenciada na Figura 2. Em todos es- buem de forma relevante na solubilização e liberação
ses pontos as curvas representativas dos índices de chu- do As para o ambiente. Tanto os filitos e quatzitos fer-
va e dos valores das concentrações de As, mostram a ruginosos, rochas da Formação Cercadinho (aqüífero
mesma tendência, ou seja, os períodos de maior incidên- fissural), como principalmente os itabiritos e itabiritos
cia de chuva são também os que apresentam os maiores dolomíticos, Formação Cauê, filitos dolomíticos e for-
valores nos teores de As nas águas analisadas. Períodos mações ferríferas dolomíticas da Formação Gandare-
estes compreendidos entre os meses de dezembro e la, rochas xistosas (aqüífero granular-fissural), apre-
março. sentam boas condições de porosidade e permeabili-
Por outro lado, na estação mais seca, entre os me- dade, densa malha de fraturas, microfraturas e planos
ses de junho e setembro, os valores das concentrações de foliação. Nessas formações, onde se localizam os
de As nas águas apresentaram os menores valores, sen- pontos em que ocorrem As em águas subterrâneas,
do que para os pontos (P.A 14 e P.A 16), nesses meses, são observadas, as presenças de minerais sulfetados
o As não foi detectado. Para todos os pontos com pre- oxidados e minerais secundários, expostos superfici-
sença de As nas águas, os valores máximo e mínimo, almente.
dos teores de As, coincidem com os valores máximo e A oxidação dos corpos minerais sulfetados, tem iní-
mínimo dos índices pluviométricos. cio com a redução do aporte de águas no fim do período
Duas condições hidrogeoquímicas podem levar chuvoso, estendendo-se por todo o período seco, poden-
às variações da qualidade das águas (Rose et al., do produzir considerável quantidade de sais solúveis.
1991): Essas condições ocorrem inicialmente e principalmente
Quadro 1 – Os sistemas aqüíferos, litologias predominantes e unidades geológicas associadas (Modificado de IGA, 1995)
Meio Granular
Aqüíferos em Manto de alteração e Coberturas detríticas Saprólitos, colúvios, areias finas, capas lateríticas e formações de
indiferenciadas canga
Meio Fissurado
– 73 –
O Arsênio nas Águas Subterrâneas de Ouro Preto (MG)
Tabela 1 – Localização dos Pontos de Amostragem (P.A.) e composição química das amostras de água subterrânea
PA01 Rua Tomé Vasconcelos – 438 / Bairro São Cristóvão—————Tipo de Captação: Antiga mina de ouro—————Não foi detectado As ao longo do ano
PA02 Travessa Sargento Francisco Lopes-1—————Tipo de Captação: Nascente—————Não foi detectado As ao longo do ano
PA03 Travessa Sargento Francisco Lopes-2—————Tipo de Captação: Antiga Mina de Ouro—————Não foi detectado As ao longo do ano
PA05 Água Limpa – Caixa 4 (Quadra de Futebol)————Tipo de Captação: Nascente————Não foi detectado As ao longo do ano
PA06 Água Limpa – Caixa 5 (Banheira)—————Tipo de Captação: Nascente—————Não foi detectado As ao longo do ano
PA07 Nossa Senhora do Carmo—————Tipo de Captação: Superficial—————Não foi detectado As ao longo do ano
PA09 Morro São Sebastião—————Tipo de Captação: Poço Tubular—————Não foi detectado As ao longo do ano
PA010 Estação de Tratamento do Itacolomi—————Tipo de Captação: Superficial—————Não foi detectado As ao longo do ano
PA011 Biquinha – Rua 13 de Maio (Frente ao número 160)—————Tipo de Captação: Antiga Mina de Ouro—————Não foi detectado As ao longo do ano
PA012 Mina do Bem Querer—————Tipo de Captação: Antiga Mina de Ouro—————Não foi detectado As ao longo do ano
PA013 Morro São João—————Tipo de Captação: Poço Tubular—————Não foi detectado As ao longo do ano
CA1 7,43 19,7 14,12 21,38 0,397 <5 27,0 1,06 0,26 < LQ 0,94 1,35 58,80 < LQ 7,87
CA 2 6,62 19,0 16,38 25,15 0,433 <5 14,8 1,80 0,40 < LQ 1,03 1,35 127,90 < LQ 6,27
CA 3 6,57 17,5 17,39 25,99 0,488 <5 <5 1,78 0,50 < LQ 1,03 1,23 124,40 < LQ 5,96
CA 4 6,37 18,3 16,63 25,90 0,398 <5 <5 1,58 0,49 < LQ 1,00 1,20 53,10 < LQ 26,87
CA 5 6,30 20,0 16,50 25,35 0,383 <5 <5 1,61 0,48 < LQ 1,04 1,22 7,58 < LQ 14,13
CA 6 6,59 20,6 15,13 22,63 0,387 <5 <5 1,68 0,44 < LQ 0,88 1,23 18,05 < LQ 4,75
CA 1 7,16 19,6 54,21 80,85 0,399 <5 71,0 7,15 1,12 < LQ 2,80 4,28 10,34 < LQ 9,03
CA 2 6,24 19,4 48,24 73,33 0,497 <5 62,9 7,32 1,02 < LQ 2,62 2,97 15,51 < L.Q. 7,42
CA 3 6,28 18,6 48,23 71,49 0,469 <5 48,0 7,00 1,10 1,76 2,53 2,45 14,95 4,33 7,59
CA 4 6,67 18,2 49,03 75,45 0,335 <5 25,0 6,90 1,08 < LQ 2,60 2,43 15,04 < L.Q. 39,61
CA 5 7,82 19,5 49,25 74,65 0,412 <5 25,0 7,14 1,02 3,13 2,64 2,46 15,38 5,05 28,50
CA 6 7,31 20,7 49,95 73,90 0,365 <5 26,5 1,26 0,44 38,20 0,35 1,22 9,49 12,30 4,72
CA 1 7,21 18,7 46,70 69,50 0,420 <5 29,0 5,65 0,93 3,35 2,30 3,63 29,60 < L.Q. 13,61
CA 2 6,65 18,6 48,43 73,55 0,488 <5 22,8 6,70 1,00 7,97 3,17 3,38 31,54 < L.Q. 12,95
CA 3 6,61 18,4 47,15 69,83 0,517 <5 <5 6,23 1,07 5,83 2,92 2,75 32,38 < L.Q. 12,13
CA 4 6,55 18,1 49,22 75,75 0,414 <5 <5 5,65 1,04 < LQ 2,78 2,73 27,19 < L.Q. 25,25
CA 5 6,53 19,0 42,87 64,88 0,400 <5 15,2 5,46 0,99 3,83 2,72 2,73 31,63 < L.Q. 22,16
CA 6 6,73 20,4 41,47 61,13 0,408 <5 9,0 6,60 1,12 4,49 2,93 3,58 30,26 < L.Q. 13,20
PA 17 Biquinha da rua Santa Rita (Mina Velha) Tipo de Captação: Antiga Mina de Ouro
CA 1 7,00 19,2 90,74 135,70 0,420 <5 224,0 8,36 2,02 30,40 3,86 11,96 20,53 < L.Q. 12,73
CA 2 6,92 19,2 82,05 125,00 0,495 <5 125,9 8,97 1,74 27,76 3,60 9,53 38,60 < L.Q. 11,51
CA 3 6,42 18,6 82,88 123,01 0,532 <5 68,0 9,39 1,84 7,41 3,75 6,79 57,30 < L.Q. 14,61
CA 4 5,93 18,4 82,00 126,50 0,408 <5 17,0 9,47 1,85 < LQ 3,90 6,30 68,00 < L.Q. 33,64
CA 5 6,56 18,6 80,90 122,70 0,388 <5 <5 9,93 1,74 11,53 3,97 6,09 71,10 < L.Q. 25,86
CA 6 6,87 19,1 85,94 127,10 0,397 <5 27,0 9,44 2,03 25,33 3,37 10,73 30,18 < L.Q. 11,30
-1 -1 1 1 -1 1 1 -1 -1 -1
Limite do Quadrilátero (LQ) (5µgL ) (5µgL ) (0,15mgL- ) (0,01mgL- ) (4µgL ) (0,05mgL- ) (0,01mgL- ) (4µgL ) (9µgL ) (0,2µgL )
– 74 –
José Augusto Costa Gonçalves
550 30 550 75
70
500 500
65
450 25 450
60
400 Ponto 14 400 Ponto 15 55
Mina do Chiquinho Chafariz do Barão
Precipitação (mm)
Precipitação (mm)
350 350 50
20
As V (µg/L)
As V (µg/L)
45
300 300
40
250 250
35
15
200 200 30
150 15 0 25
10 20
100 10 0
15
50 50
10
0 5 0 5
4
04
04
03
4
04
04
4
4
04
04
4
4
03
4
04
04
4
4
4
l/0
/0
/0
r/0
t/0
t/0
l/0
/0
/0
/0
r/0
t/0
t/0
/0
v/
n/
n/
v/
z/
o/
v/
o
n/
v/
ai
z/
ar
n
ju
ai
ou
ar
ab
ju
no
se
de
fe
ag
ju
ou
ja
ab
no
se
de
fe
ag
ju
m
ja
m
m
m
Período considerado Período considerado
350 350
15 5
As V (µg/L)
As V (µg/L)
300 300
20 13 0
250 250
10 5
200 200
15
80
15 0 15 0
10 0 55
10 10 0
50 50 30
0 5 0 5
4
04
04
4
03
4
04
04
04
04
4
04
03
4
4
04
04
4
4
4
4
l/0
/0
/0
l/0
r/0
t/0
t/0
/0
/0
r/0
t/0
t/0
/0
o/
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n/
v/
o/
v/
n/
z/
n/
v/
n
z/
ai
ar
ai
ju
ar
ou
ju
ab
no
se
ou
de
fe
ag
ju
ab
no
ja
se
de
fe
ag
ju
ja
m
m
m
Figura 2 – Representação gráfica da relação entre as precipitações atmosféricas e as concentrações de As V, no período de dezembro de 2003
a novembro de 2004 em pontos de captação de água para uso doméstico.
nas áreas de recarga da águas subterrâneas e encos- Armienta et al. (2001), relatam a contaminação de águas
tas, onde os processos intempéricos na zona não satura- subterrânea por As, proveniente de processos de oxida-
da, rica em O2 livre, provocam a oxidação dos minerais ção da arsenopirita e da dissolução da escorodita, origi-
sulfetados, como principalmente a arsenopirita. A rea- nárias de mineralizações sulfetadas encaixadas em ro-
ção de oxidação da arsenopirita, segundo Plumlee chas carbonáticas.
2+ +
(1999) é: FeAsS + 3.25O2 + 1.5H2O = Fe + 2H +
2- 2-
HAsO4 + SO4 . ESTUDO DA PRESENÇA DO AS NAS RESIDÊNCIAS
Sob essas condições ácidas, o As possui alta mobi- DO BAIRRO PADRE FARIA
lidade, Mok et al. (1988), se liberando das rochas mine-
ralizadas através de processos inorgânicos ou bióticos, O Bairro Padre Faria é abastecido por águas de vári-
Nordstron & Southam (1997). as captações. Amostras de água foram coletadas em 42
Borba (2002), credita principalmente a esse mineral residências de algumas ruas desse bairro (Tabela 2),
e à sua dissolução incongruente, em decorrência da ele- previamente sorteadas para garantir a aleatoriedade
vação do pH do meio, a presença de As em águas sub- dos pontos de amostragem. As residências foram seleci-
terrâneas de algumas minas de Ouro Preto e na mina de onadas por amostragem sistemática, sendo selecionada
Passagem em Mariana. No Vale de Zimapám, no México, uma a cada dez existentes na rua.
– 75 –
O Arsênio nas Águas Subterrâneas de Ouro Preto (MG)
Tabela 2 – Concentrações de As Total em algumas de água nos aqüíferos, favorece a oxidação dos minerais
residências do Bairro Padre Faria sulfetados. Na estação chuvosa, ocorrerá a dissolução
desses minerais, mobilizando e lixiviando o As (Banks et
AMOSTRA As mg/L AMOSTRA As mg/L al., 1997; Freeze & Cherry, 1994) para o ambiente, au-
PF 01 < L.Q. PF 22 189,00 mentando as concentrações desse elemento nas águas
PF 02 < L.Q. PF 23 9,88 subterrâneas, ao mesmo tempo em que podem diluir as
PF 03 8,66 PF 24 10,76 concentrações originais. Os valores das concentrações
PF 04 8,57 PF 25 7,47 de As determinadas nas amostras de água, são repre-
PF 05 8,82 PF 26 55,52 sentativas do momento da amostragem e da estação do
PF 06 8,54 PF 27 16,11 ano, podendo sofrer variações em seus valores, para
PF 07 < L.Q. PF 28 9,74 mais ou para menos, ao longo do tempo.
PF 08 9,23 PF 29 10,91 Em decorrência da existência de As nas águas
PF 09 9,62 PF 30 < L.Q. subterrâneas utilizadas pela população de alguns bair-
PF10 11,51 PF 31 < L.Q. ros da cidade de Ouro Preto, providências dos órgãos
PF 11 9,90 PF 32 < L.Q. municipais responsáveis pela distribuição de água se fa-
PF 12 10,14 PF 33 < L.Q. zem necessárias. A constituição de um eficaz e eficiente
PF 13 < L.Q. PF 34 < L.Q. sistema de abastecimento de água que contemple a
PF 14 < L.Q. PF 35 7,47 identificação e caracterização das áreas contaminadas,
PF 15 8,90 PF 36 < L.Q. um inventário de todas as captações de água, elabora-
PF 16 8,42 PF 37 < L.Q. ção de um plano de controle e monitoramento constante
PF 17 8,04 PF 38 < L.Q. dessas águas.
PF 18 8,17 PF 39 < L.Q.
PF 19 < L.Q. PF 40 < L.Q.
PF 20 127,00 PF 41 < L.Q. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
PF 21 13,46 PF 42 < L.Q.
PF – Padre Faria ARMIENTA, M.A.; VILLASENÕR, G.; RODRIGUES, R.;
L.Q. – Limite de Quantificação ONGLEY, L.K.; MANGO, H. The role of arse-
nic-bering rocks in groundwater pollution at Zimapan
CONCLUSÕES Valley, Mexico. Environmental Geology, Berlin, v. 40,
n. 4-5, p. 571 – 581, Feb. 2001.
Na metodologia utilizada, as espécies inorgânicas BANKS, D.; YOUNGER, P.; ARSENEN, R.; IVERSEN, E.;
As(III) e As(V) podem ser quantificadas em águas natu- BANKS, S. Mine-water chemistry: the good, the bad
rais, com custo relativamente baixo, resposta rápida e and the ugly. Environmental Geology, Berlin, v. 32, n.
-1
sensibilidade elevada. Teores acima de 5 µgL podem 3, p. 157 – 174, Oct. 1997.
ser facilmente determinados, cobrindo-se uma faixa ex- BARBOSA, A . L. M. Geologic map of the Ouro Preto, Ma-
tensa de concentrações. As respostas para as análises riana, Antonio Pereira e São Bartolomeu quadran-
das amostras reais são perfeitamente similares às dos gles, Minas Gerais, Brazil. Washington,
padrões, não havendo, portanto, interferências prejudi- DNPM/USGS, 1969. U.S. Geological Survey Professi-
ciais das matrizes. onal Paper, 641; plates 7,8,9,10.
Uma característica de áreas em que as águas sub- BORBA, R.P. Arsênio em ambiente superficial: proces-
terrâneas apresentam elevados teores de As, com rela- sos geoquímicos naturais e antropogênicos em uma
ção aos valores permissíveis para o consumo humano, é área de mineração aurífera. 2002. 202 p. Tese (Dou-
o grau de variabilidade espacial em concentrações de torado em eociências)-Instituto de Geociências, Uni-
As, (Smedley et al., 2002). Assim, pode ser difícil ou im- versidade Estadual de Campinas, Campinas, 2002.
possível predizer a concentração de As, em uma nascen- BRASIL.Fundação Nacional de Saúde. Portaria nº
0
te, poço ou mina, tendo por base os resultados de nas- 1469/2000, de 29 de dezembro de 2000 : aprova o
centes ou poços vizinhos. Aqüíferos afetados por As, po- controle e vigilância da qualidade da água para con-
dem ser restritos a certos ambientes, apresentando um sumo humano e seu padrão de potabilidade. Brasí-
comportamento espacial errático, e parecerem ser exce- lia: FUNASA, 2001. 32 p.
ção à regra. CHEN, C.; LIN, L. Human carcinogenity and atherogeni-
As variações das concentrações de As nas águas city induced by chronic exposure to inorganic arse-
subterrâneas da área pesquisada, ao longo do período nic. In: Nriagu, J. O. (Ed.). Arsenic in environmental:
de um ano estão relacionadas à sazonalidade climática. part II: human health and ecosystem effects. New
Na estação de déficit pluviométrico, a redução do nível York: John Wiley & Sons, 1994. P. 109 – 132.
– 76 –
José Augusto Costa Gonçalves
FREEZE, A. R.; CHERRY, J.A. Groundwater. Englewood NATIONAL primary drinking water regulations: arsenic
Cliffs, NY: Prentice Hall, 1994. and clarifications to compliance and new source
GONÇALVES, J.A .C.; PAIVA, J. F.; TEÓFILO, R. F.; contaminants monitoring: proposed rule. Federal Re-
LENA, J.C.; NALINI JR, H.A. 2004. Determinação das gister, Washington, DC, v. 65, n 121, p. 38888 –
0
– 77 –
Arsênio em Sedimentos Estuarinos do Canal de Acesso à Baía de Antonina, Paraná
ARSÊNIO EM SEDIMENTOS
ESTUARINOS DO CANAL DE
ACESSO À BAÍA DE
ANTONINA, PARANÁ.
1
Fabian Sá, fabianbgm@ufpr.br
1
E. C. Machado,
2
J. R. Ângulo,
1
Centro de Estudos do Mar – UFPR
2
Departamento de Geologia – UFPR
INTRODUÇÃO
– 78 –
Fabian Sá
(a) (c)
(b)
Figura 2 - Atividades urbanas/industriais e portuárias que ocorrem concomitantemente na região: (a) depósito de resíduos sem planejamento;
(b) atividades de dragagens; (c) emissários de esgoto doméstico/industrial.
Canal de acesso
25° 25' S
Pontos de coleta
25° 26'
Baí a de An tonina
25° 27'
7
8
9 25° 28'
Baí a de Paranagu á
4
5 25° 29'
6 1
2
3 25° 30'
25° 32'
1 0 5 km
48° 42' 48° 39' 48° 36' W 48° 33' 48° 30'
Figura 3 – Mapa dos pontos de coleta e delimitação do canal de acesso ao Terminal Portuário Ponta do Félix
e o porto Barão de Teffé, Antonina.
– 79 –
Arsênio em Sedimentos Estuarinos do Canal de Acesso à Baía de Antonina, Paraná
– 80 –
Fa bi an Sá
25° 27
'
Antonin a
7
Ar sê nio p
( pm)
8 2
14
9 26 25° 28
'
38
4
50 (a)
5 25° 29
'
6 1
2
3
25° 30
'
Paranagu á
25° 2 9' 45"
25° 31
'
1 0 4 km
48° 40
' 48
° 39' 48° 38' 4 8° 37' 48° 36' 4 8°35' 48° 34
' 48° 33'
Ar sê ni o (ppm ) 9
10
(b) 25° 3 0' 00"
2 7
8
14
26
38 6 5
50 25° 3 0' 15"
2 3
25° 3 0' 30"
1
C anal do An haia
25° 3 0' 45"
100 0 500
m
48°33' 30" 48°3 3' 1 5" 48 °33' 00" 4 8°32' 45" 48° 32' 30" 48°32' 15" 48°3 2' 00" 48° 31' 45" 48° 31' 30"
Fi gu ra 5 – Mapa de pro por ci o na li da de das con cen tra ções de ar sê nio no se di men to super fi ci al, em des ta que o Ter mi nal Por tuá rio da Pon ta do
Fé lix e as ilhas Ge re rês pró xi mo ao mu ni cí pio de Pa ra na guá.
De vi do à gama de in for ma ções ge o quí mi cas ain da physi cal and che mi cal cha rac te ris tics. Nerítica, Cu ri-
inexistentes para a região do complexo estuarino da ti ba, v. 2, n. 1, p. 1-36, 1987.
Baía de Pa ra na guá os es tu dos atu a is es tão sen do en fo- KOLM, H.E. Et al. Avaliação dos im pac tos de cor ren tes
ca dos na ge ra ção de co nhe ci men to so bre a es pe ci a ção da cons tru ção de um píer pela FOSPAR – Fer ti li zan-
de diferentes elementos nos sedimentos superficiais, tes Fos fa ta dos do Pa ra ná S.A.: re la tó rio téc ni co. Pon-
determinação dos níveis de referência ( background) e tal do Pa ra ná: UFPR-CEM-FOSPAR, 2002. 184 p.
as con cen tra ções pre sen tes na co lu na d’água. Estes es- MARONE, E.; JAMIYANAA, D. Ti dal cha rac te ris tics and a
tu dos ser vi rão, não só para fu tu ros tra ba lhos de ca rá ter variable boun dary nu me ri cal mo del for the M2 tide for
ci en tí fi co, como para o ge ren ci a men to das ati vi da des de the Estu a ri ne Com plex of the Bay of Pa ra na guá, PR,
dragagem, dando suporte para tomadas de decisões. Bra zil.Nerítica, Cu ri ti ba, v. 11, n. 1-2, p. 95-107, 1997.
Como por exem plo, qual o me lhor des ti no para o ma te ri al NOERNBERG, M. A. Processos morfodinâmicos no
dra ga do e as prin ci pa is en tra das des tes ele men tos para Complexo Estuarino de Paranaguá: um es tu do uti li-
o sis te ma. zando dados Land sat-TM e me di ções in situ . 2001.
118 f. Dis ser ta ção (Dou to ra do em Ge o lo gia Ambi en-
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS tal)-Departamento de Ge o lo gia, Univer si da de Fe de-
ral do Pa ra ná, Cu ri ti ba, 2001.
HANSEN, D. V.; RATTARAY JÚNIOR, M. Gra vi ta ti o nal cir- SÁ, F. Distribuição e fracionamento de contaminantes
culation in straits and es tu a ri es. J. Mar. Res., New nos sedimentos su per fi ci a is e atividades de dra ga-
Ha ven, v. 23, p. 104-122, 1965. gem no Com ple xo Estu a ri no da Baía de Pa ra na guá,
KNOPPERS, B. A.; BRANDINI, F. P.; THAMM, C. A.). Eco- PR. 2003. 92 p. Dissertação (Mestrado em Ge o lo-
logical studies in the Bay of Paranaguá: II: some gia)-Uni ver si da de Fe de ral do Pa ra ná, Cu ri ti ba, 2003.
– 81–
Expo si ção Hu ma na ao Arsê nio no Mé dio Vale do Ri be i ra, São Pa u lo, Bra sil
EXPOSIÇÃO HUMANA AO
ARSÊNIO NO MÉDIO VALE
DO RIBEIRA, SÃO PAULO,
BRASIL
1
Edu ar do Mel lo De Ca pi ta ni,ca pi ta ni@fcm.uni camp.br
2
Sa ku ma, Ali ce M., ali ce@ial.sp.gov.br
3
Bernardino Ri be i ro Fi gue i re do, ber na@ige.uni camp.br
4
Mo ni ca M. Bas tos Pa o li el lo, mo ni bas@ser con tel.com.br
2
Isa u ra A.Oka da
2
Ma ria Cris ti na Du ran
2
Ro ber ta I. Oku ra
1
Faculdade de Ciên ci as Mé di cas, UNICAMP
2
Insti tu to Adol fo Lutz
3
Insti tu to de Ge o ciên ci as, UNICAMP
4
Uni ver si da de Esta du al de Lon dri na
– 82 –
Edu ar do Mel lo De Ca pi ta ni
de ar sê nio uri ná rio. O estudo bus cou tam bém iden ti fi- Os re sul ta dos re fe ren tes ao gru po con tro le (Cer ro
car os fa to res so ci o de mo grá fi cos que in flu en ci a ram no Azul) fo ram ob ti dos em 156 pes so as an te ri or men te es tu-
grau de ex po si ção. da das por Sa ku ma (2004).
Um ques ti o ná rio foi apli ca do aos par ti ci pan tes, para
POPULAÇÃO DE ESTUDO reunir informações sobre condições socioeconômicas,
há bi tos ali men ta res, ati vi da des ocu pa ci o na is, hob bi es e
A po pu la ção de es tu do do Mé dio Vale foi cons ti tu í da lazer.
por 378 cri an ças e adul tos mo ra do res de oito lo ca is dis- O ter mo de con sen ti men to li vre e es cla re ci do, apro-
tin tos, agru pa dos se gun do as ca rac te rís ti cas ge o ló gi cas vado pelo Comitê de Ética da Faculdade de Ciências
dos lo ca is de mo ra dia (den tro da Fa i xa Pi ri ri ca ou fora Mé di cas da UNICAMP, foi lido e as si na do pe los par ti ci-
dela (Fi gu ra 1). pan tes, pais ou res pon sá ve is.
O gru po po pu la ci o nal 1 es tu da do na pre sen te pes -
quisa foi formado por 112 participantes re sidentes na MATERIAL E MÉTODO
área ur ba na do mu ni cí pio de Ipo ran ga (SP), fora da Fa i-
xa Piririca, mas com pro vá vel in fluên cia das ati vi da des Entre abril de 2003 e mar ço de 2004, fo ram co le ta-
mineradoras de Fur nas. O gru po 2, por 192 re si den tes das amos tras da pri me i ra uri na da ma nhã, em fras cos de
nos Ba ir ros de Nhun gua ra e de Cas te lha nos, e nos Qu i- polietilenopreviamente des con ta mi na dos com áci do ní-
lom bos de São Pe dro, Gal vão e Iva po run du va, re giões tri co, sem adi ção de con ser van tes, e man ti das re fri ge ra-
ru ra is lo ca li za das dentro da extensão da Faixa Piririca. das até o re ce bi men to do la bo ra tó rio.
Os re si den tes nos Qu i lom bos de Pi lões e Ma ria Rosa, lo- Os com postos arseniais fo ram de terminados por
calizados em uma re gião mais dis tan te, fora da Fa i xa Pi- HG-AAS. Foi utilizado um espectrômetro de absorção
ri ri ca, for ma ram o gru po 3 des te es tu do com, 74 par ti ci- atô mi ca, Per kin-Elmer, mo de lo Analyst 100, com ge ra-
pantes. dor de hidretos e sistema de injeção de fluxo Per -
kin-Elmer, mo de lo FIAS 400. Foi
usado o método analítico des -
cri to por Guo et al. (1997), ba se-
ado na complexação dos com-
postos arseniais toxicologica-
mente importantes (As(III) +
As(V) + áci do mo no me ti lar sô nio
(MMA) + ácido di metilarsínico
(DMA ) com cis te í na. O mé to do
analítico foi validado previ a -
men te, usan do ma te ri al de re fe-
rência certi fi ca do (NIST 2670),
com valor certificado de 60 µg
L-1. O limite de quantificação
do mé to do foi de 0,4 µgL-1 nas
amostras di luídas cinco vezes,
cor res pon den do a 2,0 µg L-1 de
ar sê nio na amostra.
As aná li ses es ta tís ti cas fo-
ram fei tas com o programa
FAIXA PIRIRICA SPSS 10.0 for win dows (Sta tis ti-
cal Package for Soci al Scien -
ce). Para os re sul ta dos de ar sê-
nio na uri na (As-u) aba i xo do li-
mi te de detecção (LD) foi atri-
bu í do o va lor de 1,0 µg L-1, que
cor res pon de à me ta de do li mi te
de de tec ção do mé to do ana lí ti-
co. Não foi fe i to ne nhum ajus te
em re la ção à creatinina uriná -
Fi gu ra 1 – Lo ca li za ção do Vale do Ri be i ra e da Fa i xa Pi ri ri ca ria.
– 83 –
Expo si ção Hu ma na ao Arsê nio no Mé dio Vale do Ri be i ra, São Pa u lo, Bra sil
60
40
20
0
N= 156 11 2 192 74
Cont role 1 2 3
Gru po
Fi gu ra 2 – Box plots da con cen tra ção de As-u (µg.L-1) da po pu la ção con tro le (Cer ro Azul) e po pu la ção dos gru pos 1, 2 e 3.
Ta be la 1 – Con cen tra ção de ar sê nio uri ná rio nos gru pos po pu la ci o na is es tu da dos
As urinário ( µg.L-1 ) N(%) N(%)
Grupo Área / local Idade N
mediana mínimo máximo > 40 µg.L < LD
Controle nascente do Rio Ribeira de Iguape criança* 73 3,60 1,00 34,12 0 (0%)
Cerro Azul – PR (pop. controle) adulto 83 3,87 1,00 16,00 0 (0%)
total 156 3,86 1,00 34,12 0 (0%) 51 (32,9%)
1 Iporanga ( área urbana) criança 82 8,35 1,00 33,49 0 (0%)
fora da Faixa Piririca adulto 29 7,42 1,00 27,55 0 (0%)
total 111 8,07 1,00 33,49 0 (0%) 13 (11,6%)
2 Faixa Piririca criança 67 9,85 1,00 55,69 3 (4,5%)
Nhunguara, Castelhanos, Galvão, adulto 123 11,68 1,00 76,19 7 (5,7%)
São Pedro, Ivaporunduva total 190 11,04 1,00 76,19 10 (5,3%) 20 (10,4%)
3 Fora da Faixa Piririca criança 28 3,64 1,00 31,28 0 (0%)
Pilões, Maria Rosa adulto 46 3,11 1,00 68,92 2 (4,3%)
total 74 3,62 1,00 68,92 2 (2,7%) 29 (39,2%)
Total Médio Vale criança 177 7,99 1,00 55,69 3 (0,8%)
adulto 198 9,09 1,00 76,19 9 (2,4%)
*
total 375 8,21 1,00 76,19 11 (2,9%) 62 (16,4%)
-1
* 7 a 14 anos ** Li mi te de de tec ção ( 2,00 µg.L )
– 84 –
Edu ar do Mel lo De Ca pi ta ni
posição ao As é ma i or na po pu la ção re si den te na área verduras cultivadas nos quintais das moradias. Para
da Fa i xa Pi ri ri ca, onde ocor re a pre sen ça na tu ral do As. fins de avaliação es ta tís ti ca com re lação ao consumo
Comparando-se as medianas de As-u en tre cri an- de car ne bo vi na e fran go, a po pu la ção foi di vi di da em:
ças e adul tos nos três gru pos, ob ser vou-se au sên cia de “con so me uma vez ou me nos” e “mais que uma vez por
diferenças significativas apresentando (r = 0,707; r = semana”. Com relação aos outros alimentos, foi feita
0,544 e r = 0,811, para os grupos 1, 2 e 3, respectiva - uma avaliação qualitativa do tipo “consome” ou “não
mente). con so me”.
Do to tal das amos tras ana li sa das, 11,6%, 10,4% e Con si de ran do ape nas a po pu la ção de cri an ças, ob-
39,2% dos in di ví du os, res pec ti va men te nos gru pos 1, 2 ser vou-se que as que têm o há bi to de brin car em con ta to
e 3, apresentaram con cen tra ções de ar sê nio in fe ri o res com o solo não apre sen ta ram me di a na de As-u, es ta tís ti-
ao li mi te de de tec ção do mé to do (2,00 µg.L-1). Por sua ca men te di fe ren te da que las que não pos su em esse há-
vez, o gru po con tro le (Cer ro Azul) apre sen tou 32,9% de bi to.
ca sos aba i xo do li mi te de de tec ção. A ta be la 2 mos tra que não exis te di fe ren ça sig ni fi-
Não houve di ferença estatisticamente significante can te en tre as me di a nas de As-u de quem con so me e de
en tre as me di a nas com re la ção ao sexo, tan to en tre as quem não con so me pe i xe, car ne bo vi na ou fran go, pelo
cri an ças quan to en tre os adul tos. me nos uma vez por se ma na. No en tan to, as pes so as dos
Nes te es tu do, fo ram ava li a das ou tras va riá ve is que grupos 1 e 3 que não con so mem le i te e de ri va dos têm
poderiam in flu en ci ar os ní ve is de ar sê nio uri ná rio, tais ma i or con cen tra ção me di a na de As-u.
como: con su mo de le i te, car ne, fran go, pe i xe, ver du ras Utilizando modelo de regressão logística múltipla
e frutas localmente produzidas, além do consumo de observou-se que as variáveis que juntas melhor ex pli-
água (Whi te & Sab bi o ni, 1998), pois o es ta do nu tri ci o nal cam as con cen tra ções de As-u fo ram: lo cal de mo ra dia
influencia diretamente a ab sor ção do ar sê nio (Man dal (variável “grupo populacional”), número de vezes que
et al., 1998). Foi per gun ta do aos mo ra do res qual o con- consome carne por semana, e número de vezes que
sumo semanal de car ne, frango, peixe, le ite, frutas e con so me fru tas e ve ge ta is (r < 0,10) (Ta be la 3).
Ta be la 2 – Con cen tra ção de As-u me di a na se gun do o con su mo de ali men tos na po pu la ç ão de cri an ças e de adul tos dos três
gru pos po pu la ci o na is do Mé dio Vale
Valores de ρ
Consumo de carne bovina Consumo de frango Consumo de leite e derivados
Grupo (uma ou mais vezes por semana) (uma ou mais vezes por semana)
Adultos Crianças Total Adultos Crianças Total Adultos Crianças Total
1 1,000 0,117 0,141 – 0,964 1,000 0,054 0,223 0,027
2 0,914 1,000 0,953 1,000 0,240 0,612 0,838 0,723 0,856
3 0,549 0,678 1,000 0,749 0,678 0,445 0,412 0,041 0,027
Ta be la 3 – Aná li se de re gres são lo gís ti ca múl ti pla das va riá ve is ex pli ca ti vas re fe ren tes à po pu la ção do Mé dio Vale
pré-selecionadas (Mo de lo fi nal: As > 3,86 µg.L-1 [me di a na de As-u do gru po con tro le])
– 85 –
Expo si ção Hu ma na ao Arsê nio no Mé dio Vale do Ri be i ra, São Pa u lo, Bra sil
– 86 –
Edu ar do Mel lo De Ca pi ta ni
mento da toxicidade, São Paulo : Atheneu, 2003. ociências, Universidade Estadual de Campinas,
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DE GEOLOGIA, 41., 2002, João Pessoa, PB. Anais. WHITE, M.A.; SABBIONI, E. Tra ce ele ment re fe ren ce va-
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– 87 –
Chumbo e Arsênio nos Sedimentos do Rio Ribeira de Iguape, SP/PR
– 88 –
Chumbo e Arsênio nos Sedimentos do Rio Ribeira de Iguape, Sp/Pr
Figura 1 – Localização da bacia hidrográfica do Rio Ribeira de Iguape com as divisões municipais, o contorno da bacia
e os remanescentes da Mata Atlântica.
e compará-las com as atuais. As coletas foram realiza- Pb, Rb, S, Sb, Sn, Sr, Th, U, V, Y, Zn, Zr). Como no Brasil
das durante os períodos das estações secas, para que o e em outros países, os mapeamentos geoquímicos de
material amostrado fosse o mais representativo possível sedimentos de corrente contemplam a análise da fra-
da bacia a montante da estação de coleta, evitando-se ção menor do que 180mm, e considerando que em mui-
dessa forma contribuições laterais que sempre ocorrem tos estudos de Geologia Médica/Geoquímica Ambien-
durante o período de chuvas torrenciais. Antes de cada tal é muito comum que seja analisada a fração menor
coleta, com equipamentos apropriados, foram obtidos do que 63mm, no presente estudo foi tomada a decisão
parâmetros físico-químicos das águas fluviais tais como: de analisar as duas frações granulométricas. Verifi-
pH, Eh, OD (oxigênio dissolvido), condutividade, turbi- cou-se posteriormente que as respostas das duas fra-
dez e temperatura. As amostras de “overbank” foram co- ções, do ponto de vista da identificação das anomalias
letadas nos primeiros 30 cm de “top soil” de paleoalu- geoquímicas, são muito semelhantes. Todos os resulta-
viões. dos obtidos foram reunidos no Atlas Geoquímico do
Nos laboratórios do IG-UNICAMP essas amostras Vale do Ribeira (2005).
de sedimentos foram secadas, peneiradas e analisa-
das por fluorescência de raios X, nas frações menores ARSÊNIO
do que 180mm (80#) e 63mm (230#), para 10 óxidos
(SiO2, TiO2, Al2O3, Fe2O3, MgO, CaO, Na2O0, K2O, P2O5) e O arsênio (As) pode ocorrer em quatro estados de
21 elementos-traço (As, Ba, Co, Cr, Cu, Ga, Mo, Nb, Ni, oxidação: arsenato (+5), arsenito (+3), arsina (-3) e o me-
– 89 –
Chumbo e Arsênio nos Sedimentos do Rio Ribeira de Iguape, SP/PR
– 90 –
Chumbo e Arsênio nos Sedimentos do Rio Ribeira de Iguape, Sp/Pr
Figura 2 – Paisagem geoquímica do arsênio na fração < 180 ìm. As amostras das sub-bacias de cor azul possuem valores menores do que 2,3 ppm; cor verde entre 2,3 e 11,9 ppm possuem
os valores de “background” regional; cor laranja entre 12 e 34 ppm e na cor vermelha com valores acima de 34 ppm.
– 91 –
Idio Lopes Jr.
Figura 3 – Paisagem geoquímica do arsênio na fração < 63 ìm. As amostras das sub-bacias de cor azul possuem valores menores do que 3 ppm; cor verde entre 3 e 12,3 ppm possuem os
valores de “background” regional; cor laranja entre 12,4 e 29,6 ppm e na cor vermelha com valores acima de 29,7 ppm.
– 92 –
Chumbo e Arsênio nos Sedimentos do Rio Ribeira de Iguape, Sp/Pr
Figura 4 – Paisagem geoquímica do chumbo na fração < 180 ìm. As amostras das sub-bacias de cor azul possuem valores menores do que 14 ppm; cor verde entre 14 e 36,9 ppm possuem
os valores de “background” regional; cor laranja entre 37 e 124 ppm e na cor vermelha com valores acima de 124 ppm.
– 93 –
Idio Lopes Jr.
Figura 5 – Paisagem geoquímica do chumbo na fração < 63 ìm. As amostras das sub-bacias de cor azul possuem valores menores do que 18 ppm; cor verde entre 18 e 49,9 ppm possuem
os valores de “background” regional; cor laranja entre 50 e 123 ppm e na cor vermelha com valores acima de 123 ppm.
– 94 –
Idio Lopes Jr.
chegando-se a registrar até 37,8mg/dl em algumas de- nor relação comprimento/peso, baixa capacidade de
las, em Vila Mota e Capelinha. reprodução e conseqüentemente um número menor
O chumbo é um elemento que possui baixa mobili- de peixes (75% menos) por área em comparação com
dade em qualquer ambiente (oxidante, redutor, ácido e outros riachos de porte similar não contaminados da
alcalino) e co-precipita facilmente com óxidos de região.
Fe-Mn; assim os sedimentos de corrente perdem con-
teúdo de Pb rapidamente a partir de uma ocorrência REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ou um depósito mineral. O SGB/CPRM desenvolveu
durante muitos anos pesquisa de ouro na faixa Piriri- AZEVEDO, F. A.; CHASIN, A. A. M. Metais: gerenciamen-
ca-São Pedro e acabou por descobrir um depósito de to da toxidade. São Paulo: Atheneu, 2003. 554 p.
ouro associado a sulfetos de arsênio, chumbo, zinco e COMPANHIA DE TECNOLOGIA DE SANEAMENTO
cobre. Este depósito fica localizado no divisor de AMBIENTAL – CETESB. Decisão de Diretoria Nº 195-
águas do Rio São Pedro (nas figuras 4 e 5 é uma drena- 2005-E: de 23 de novembro de 2005. São Paulo:
gem da margem esquerda do rio Pilões, um pouco a [s.n.], 2005. 4 p.
montante do ponto de coleta 133, próximo à barra do CONSELHO NACIONAL DO MEIO AMBIENTE –
rio Pilões com o Ribeira) e do rio Ivaporunduva CONAMA. Resolução nº357: de 17 de março de
(sub-bacia do ponto 132). Nesse local, as anomalias 2005. 23 p.
de chumbo no solo alcançaram valores acima de 500 CUNHA, F. G. Contaminação humana e ambiental por
ppm e, no entanto, nos pontos de coleta dos sedimen- chumbo no Vale do Ribeira nos Estados de São Pa-
tos de corrente, não tão distantes, não se apresenta- ulo e Paraná. 2003. 111p. Tese (Doutorado) - Uni-
ram anômalos (ponto 133) ou não passaram de 124 versidade Estadual de Campinas, Instituto de Geo-
ppm (ponto 132). ciências, Campinas, 2003.
Destaca-se desta forma a diferença da dispersão FIGUEIREDO, B. R. Minérios e ambiente. Campinas:
iônica do chumbo, na Faixa Piririca-São Pedro, da dis- Editora da Unicamp, 2000. 401 p.
persão predominantemente clástica (particulado de GREENWOOD, N. N.; EARNSHAW, A. Chemistry of the
minério e escória) no leito do Rio Ribeira, única possi- elements. 2.ed. [S.l.]: Elsevier Science, 1997. 1305 p.
bilidade de seus sedimentos ainda mostrarem valores HOWARTH, R. J.; THORNTON, I. Regional geochemical
anômalos a centenas de quilômetros a jusante da últi- mapping and its applications to environmental
ma fonte de chumbo, mesmo com a retirada diária de studies. In: APPLIED environmental geochemistry.
dezenas de toneladas de areia para a construção civil London: Academic Press, 1983. p. 41-78.
da calha do Ribeira nas proximidades da cidade de LEVINSON, A. A. Introduction to exploration geoche-
Registro. mistry. Ottawa: Applied Publishing Academic Press,
Embora ausente das águas do rio Ribeira e de 1974. 612 p.
seus principais afluentes entre as cidades de Iporanga LICHT, O. A. B. et al. Levantamento geoquímico multiele-
e Eldorado, como foi constatado pelo monitoramento mentar de baixa densidade no Estado do Paraná: hi-
realizado durante a execução do projeto, e dessa for- drogeoquímica - resultados preliminares. A Terra em
ma sem causar nenhum dano às populações e ao meio Revista, Belo Horizonte, v. 3, n.3, p. 34-46, 1997.
ambiente, o mesmo não se pode dizer dos sedimentos LOPES JR., I. Atlas geoquímico do Vale do Ribeira. [S.l.] :
da calha do Ribeira e dos afluentes que possuem mi- FAPESP; CPRM-SGB, 2005. 77 p.
nas de chumbo nas suas bacias de captação. Em um LOPES JR., I. et al. A prospecção geoquímica desco-
trabalho que consistiu no estudo de peixes do Ribeirão brindo novas mineralizações auríferas no Vale do Ri-
Furnas, coletados entre 1998 e 2000, por uma equipe beira. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE
da Universidade de Tecnologia Chalmers de Gotem- GEOLOGIA, 38.,1994, Balneário de Camboriú. Ana-
burgo, Suécia, foi demonstrado duas espécies de ba- is. Balneário de Camboriú : SBG, 1994. 3v. v. 3., p.
gres e cascudos que apresentaram atividade 50% me- 170-171.
nor da enzima ALAD (enzima relacionada à síntese de LOPES JR., I.; VASCONCELOS, C. S. de; WILDNER, W.
glóbulos vermelhos no sangue e, normalmente, utiliza- ; SILVA, L. A. C. Geoquímica das Folhas Jacupi-
da como indicador da presença de chumbo no ambi- ranga e Rio Guaraú (1:50.000). In: SIMPÓSIO DE
ente), em relação aos da mesma espécie, de rios não GEOLOGIA DO SUDESTE, 6., 1999, São Pedro, SP.
contaminados. Essas espécies de peixes de fundo são Boletim de Resumos. São Paulo : SBG, Núcleos
afetadas pela poluição porque procuram seus alimen- São Paulo/Rio de Janeiro/ Espirito Santo, 1999. p.
tos nos sedimentos argilosos nos quais o chumbo está 38.
fortemente concentrado. Foram observadas altas con- LOPES JR., I. 2001. Projeto Mogi-Guaçu / Pardo. Levan-
centrações de Pb nos tecidos desses peixes, uma me- tamento Geoquímico das Bacias dos Rios Mo-
– 95 –
Chumbo e Arsênio nos Sedimentos do Rio Ribeira de Iguape, SP/PR
gi-Guaçu e Pardo, SP. São Paulo: CPRM - Serviço man and Ecological Risk Assessment, v. 9, n. 1, p.
Geológico do Brasil ; Secretaria de Estado do Meio 149-169, 2003.
Ambiente de São Paulo, 2001. 77 p. ROSE, A. W.; HAWKES, H. E.; WEBB, J. S. Geochemistry
MINERAIS DO PARANÁ S. A. – MINEROPAR . Atlas in Mineral Exploration. 2.ed. New York : Academic
Geoquímico do Estado do Paraná. Curitiba, 2001. Press, 1979. 657 p.
80 p. THORNTON, I. Applied Environmental Geochemistry.
MORAES, R.; GERHARD, P.; ANDERSSON, L.; STURWE, London : Academic Press, 1983. 501 p.
J.; RAUGH, S.; SVERKER M. Establishing causality WRIGHT, J. Environmental Chemistry. London: Routled-
between exposure to metals and effects on fish. Hu- ge, 2003. 409 p.
– 96 –
Fernanda Gonçalves da Cunha
DIAGNÓSTICO AMBIENTAL
E DE SAÚDE HUMANA:
CONTAMINAÇÃO POR
CHUMBO EM
ADRIANÓPOLIS, NO
ESTADO DO PARANÁ,
BRASIL
1
Fernanda Gonçalves da Cunha , fcunha@rj.cprm.gov.br
2
Bernardino Ribeiro de Figueiredo, berna@ige.unicamp.br
3
Mônica Maria Bastos Paoliello, monibas@sercomtel.com.br
4
Eduardo Mello De Capitani, capitani@hc.unicamp.br
1
Serviço Geológico do Brasil/CPRM/RJ;
2
Instituto de Geociências/UNICAMP;
3
Universidade Estadual de Londrina;
4
Faculdade de Ciências Médicas/UNICAMP;
– 97 –
Diagnóstico Ambiental e de Saúde Humana: Contaminação por Chumbo em Adrianópolis, no Estado do Paraná, Brasil
pais tributários, englobando uma superfície de aproxi- são preservadas sob forma de florestas primitivas. Essas
madamente 25.000 km2, sendo 61% no Estado de São áreas constituem reservas e parques estaduais. As flo-
Paulo. O rio Ribeira atravessa 120 km do seu percurso restas secundárias já ocupam área bem maior que as
inicial em terras paranaenses, atua como limite entre os primárias e tendem a crescer ainda mais, em conse-
dois Estados num trecho de cerca de 90 km, e após re- qüência da insuficiência de demarcação e fiscalização
ceber a contribuição do rio Pardo, estende-se por mais dos parques. Completando o quadro da cobertura vege-
260 km em terras paulistas, até alcançar a sua foz, no im- tal, cerca de 30% são áreas com cultura de banana e de
portante complexo lagunar-estuarino de Igua- chá, de capoeiras e de pastagens.
pe-Cananéia, no litoral sul do Estado de São Paulo.
O clima da região é subtropical úmido. As temperatu- ASPECTOS SOCIOECONÔMICOS
ras médias anuais oscilam em torno de 20oC. Na faixa lito-
rânea, os meses de dezembro, janeiro e fevereiro são os O Vale do Ribeira de Iguape foi, no passado, uma
mais quentes, com médias de 25oC, e os meses de maio a das maiores Províncias Metalogenéticas de chumbo no
agosto, os mais frios, com médias de 18oC. Nos meses de Brasil e teve como atividade paralela à mineração uma
junho e julho são comuns temperaturas mínimas diárias usina de refino, a Plumbum, instalada na embocadura da
de 0oC, muitas vezes ocorrendo geada. As médias de mina Panelas de Brejaúva, em Vila Mota, no município de
precipitação pluviométrica anual da região ficam em torno Adrianópolis, para processar os minérios produzidos na
de 1.500 a 2.500 mm. A faixa litorânea e as partes serra- região. Atualmente a produção de bens minerais no Vale
nas recebem mais chuvas. Os dias com chuvas fortes do Ribeira se resume na exploração de não-metálicos,
acontecem nos meses de outubro a março. Segundo o como o calcário, argila, rocha ornamental e fluorita.
Instituto Nacional de Meteorologia, os ventos predomi- As atividades de mineração foram responsáveis por
nantes na área do Alto Vale são oeste-sudoeste (WSW). um período transitório de prosperidade nos municípios
A elevada precipitação pluviométrica regional con- do Alto Vale do Ribeira e o seu declínio representou tam-
tribui para a exuberância da Floresta Subcaducifólia Tro- bém a queda do nível de renda e emprego para a popu-
pical que ainda cobre extensas faixas na região e que lação local. Os índices de desenvolvimento humano
Rio Juquiá
BRASIL SETE BARRAS JUQUIÁ
APIAÍ
í
tar
Be
ELDORADO
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REGISTRO
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Rio R
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Rio Ribeira
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ITAPEÚNAS
a de
RIBEIRA ITAÓCA
ADRIANÓPOLIS a
ng Iguape
ra
pi
Vila Mota cu
Capelinha Ja IGUAPE
Porto Novo o
Panelas e Ri
24°45’ refinaria Plumbum
a
eir Rocha
Rib
Rio
Canoas N
CERRO AZUL
Perau
o OCEANO
Pa
rd SÃO PAULO
CANANÉIA
PARANÁ Ri
o ATLANTICO
0 15 30Km
o
25 00´
49°00 48°00
Cidade
Mina
Divisa interestadual
– 98 –
Fernanda Gonçalves da Cunha
(IDH-M) desses municípios, de acordo com o PNUD, são As crianças são consideradas grupo de alto risco,
os mais baixos do Vale do Ribeira e bem inferiores às porque absorvem e retêm maior quantidade do chumbo
médias dos estados de São Paulo e Paraná. Os diferen- ingerido do que os adultos.
tes indicadores sociais, como nível de renda, emprego, O CDC (1991) recomendou para limite de ação,
investimentos industriais, educação, mortalidade infantil configurando risco de exposição a altas doses de chum-
e saúde pública convergem para a caracterização do bo e conseqüente ocorrência de efeitos adversos em
Vale do Ribeira como relativamente pobre, embora apre- longo prazo, o valor 10mg de chumbo/dL de sangue em
sente maior dinamismo econômico em algumas áreas crianças. Exposições crônicas em níveis acima deste va-
mais vocacionadas para agricultura de banana, comér- lor podem levar à ocorrência de efeitos adversos à saú-
cio e turismo. de comprometendo o sistema nervoso central, com efei-
tos irreversíveis, também causando anemia, alterações
GEOLOGIA renais e alteração do metabolismo da vitamina D.
Adultos com teores de 40 a 60 mg/dL de chumbo no
A região do Vale do Ribeira, sob o ponto de vista sangue podem apresentar sintomas neurocomporta-
geotectônico, insere-se na Faixa de Dobramento Ribe- mentais como distúrbios de humor e neuropatias periféri-
ira, caracterizada por grande número de falhas longi- cas, além de sintomas gerais como cansaço, sonolên-
tudinais subverticais que representam zonas de cisa- cia, irritabilidade, tonturas, dores nos músculos e proble-
lhamento. Essas falhas afetam tanto o embasamento mas gastrointestinais. Níveis acima de 60 mg/dL podem
quanto as seqüências metassedimentares que defi- produzir sintomas de alterações mentais e neurológicas
nem um corredor com aproximadamente 100 km de importantes, além de cólicas abdominais típicas.
largura e 1.000 km de comprimento, denominado Fai-
xa de Dobramento Apiaí-São Roque, com estruturação POPULAÇÃO E MÉTODOS
geral NE-SW, alternando conjuntos de metamorfitos de
baixo e/ou médio grau, complexos graníticos e com- Para a realização do monitoramento humano, foi ne-
plexos gnáissico-graníticos e/ou gnáissi- cessário submeter o projeto ao Comitê de Ética da Facul-
co-migmatítico/granulítico (Daitx, 1996; Dardenne & dade de Ciências Médicas da UNICAMP, realizar reu-
Schobbenhaus, 2001). niões com os prefeitos e secretários de saúde dos muni-
Regionalmente predominam gnaisses e migmatitos cípios abrangidos pelo estudo e, em seguida, reuniões
de idade arqueana, que têm sido descritos como emba- com os diretores, professores, pais e responsáveis pelas
samento (Complexo Cristalino), sobre os quais dis- crianças, nas escolas públicas de cada município, para
põem-se seqüências supracrustais do Grupo Açungui, esclarecimento dos objetivos e autorização na participa-
depositadas no Proterozóico Médio-Superior. O Grupo ção voluntária no estudo.
Açungui está subdividido em formações: Setuva (basal), Foram coletadas amostras de sangue de 335 crian-
Capiru, Itaiacoca, Votuverava e Água Clara, Subgrupo ças na faixa etária entre 7 e 14 anos e de 350 adultos
Lageado, Complexo Perau e a Seqüência Turvo-Cajati. com idade entre 15 e 70 anos, nos municípios de Ribeira
As unidades litoestratigráficas (rochas de composição e Iporanga (Serra) no Estado de São Paulo e Adrianópo-
carbonáticas) que se apresentam mineralizadas (Pb-Zn) lis (Capelinha, Vila Mota e Porto Novo) e Cerro Azul, no
estão no Complexo Perau e no Subgrupo Lageado. Estado do Paraná.
No momento da coleta de sangue foram aplicados
CHUMBO: CONTAMINAÇÃO HUMANA questionários sobre informações dos hábitos alimenta-
res, saúde, ocupação dos pais, tempo de residência, en-
Tanto as crianças quanto os adultos são suscetíveis tre outras questões, necessárias à interpretação final
aos efeitos na saúde por exposição ao chumbo, entre- dos dados.
tanto as vias de exposição e os efeitos podem ser bas- O chumbo nas amostras de sangue foi analisado
tante diferentes. As crianças estão mais expostas em re- por espectrofotometria de absorção atômica acoplado a
giões apresentando contaminação ambiental, devido ao forno de grafite, no Instituto Adolfo Lutz, em São Paulo.
seu comportamento e fisiologia, enquanto os adultos es- Para a verificação da contaminação ambiental, fo-
tão mais expostos nas atividades de trabalho, como in- ram coletadas 13 amostras de água utilizada para con-
dústrias e refinarias. sumo doméstico, de torneiras, de algumas residências
O chumbo absorvido pelo trato gastrointestinal nas nas áreas estudadas, e 21 amostras de solos superficia-
crianças mais velhas e nos adultos é proveniente princi- is (0-20cm de profundidade), numa distância de até
palmente da ingestão de alimentos e água, enquanto 9,5km da Plumbum, incluindo 4 amostras de solos de
nas crianças mais novas, é da inalação de poeiras e da hortas domésticas. Foram coletadas ainda amostras das
ingestão de pequenas partículas de solo (Who, 1995). pilhas de rejeito e da escória.
– 99 –
Diagnóstico Ambiental e de Saúde Humana: Contaminação por Chumbo em Adrianópolis, no Estado do Paraná, Brasil
PbS (ug/dL)
5,40 5 ,3 6
6,00
Ribeira e em Iporanga é fornecida pela 4,17
RESULTADOS
11,8 9
Contaminação humana 12 ,0 0
10 ,0 0
Crianças
A média aritmética dos teores de chum- 8 ,0 0
6 ,0 6
PbS (ug/dL)
– 100 –
Fernanda Gonçalves da Cunha
PbS (ug/dL)
8
nos organismos infantis (Figura 4).
Os resultados mostraram que todas as po- 6
66
55
teores de chumbo acima de 100mg/g podem
2,8
2,8
44 indicar alteração na qualidade em relação ao
PbS
1,8
1,8
33 risco potencial à saúde humana, e com teores
22 acima de 350mg/g já necessitam de estudos
11 ambientais de remediação. Seguindo, então,
00 essa proposição, os solos mais próximos da
Plumbum podem ser considerados contami-
Figura 5 – Médias aritméticas das concentrações de chumbo no sangue das nados por chumbo, apresentando risco à saú-
populações de adultos.
de das populações que ali habitam. Esses re-
– 101 –
Diagnóstico Ambiental e de Saúde Humana: Contaminação por Chumbo em Adrianópolis, no Estado do Paraná, Brasil
Tabela 1 – Concentrações de chumbo nas amostras de solo como a ocupação paterna na refinaria, mas a moradia
superficial próxima à refinaria foi o mais importante, onde os solos
Número da Teor de chumbo pH Distância da apresentaram elevadas concentrações de chumbo. Os
amostra (ug g-1) Plumbum hábitos das crianças de levarem suas mãos e brinque-
dos sujos à boca possibilitam a ingestão de partículas de
1 175 6,6 5km
solo, caracterizando uma via de entrada do metal no or-
2 432 6,6 2,5km ganismo infantil.
3 343 7,9 1,2km Os resultados das análises das amostras de sangue
das populações adultas mostraram que aquelas resi-
4 63 6,2 1km
dentes no entorno da refinaria Plumbum apresentaram
5 672 6,7 1km os níveis de chumbo mais elevados do que das outras
6* 904 6,5 300m populações, semelhante aos dados analíticos encontra-
dos para as crianças. Os adultos que apresentaram os
7 397 6,5 500m
maiores teores de chumbo no sangue (48mg/dL) foram
8 916 6,3 900m do sexo masculino e trabalharam na usina de refino de
9* 802 5,5 900m chumbo. Segundo a WHO (1995) esses teores de chum-
bo em adultos não apresentam risco à saúde, porém es-
10 76 5,0 1km
tudos mais recentes já apontam risco à saúde até em
11 117 6,7 1,4km concentrações mais baixas.
12 245 5,9 1,5km A dispersão do chumbo contido no material particu-
lado emitido pela chaminé da refinaria e sua deposição
13* 217 7,2 1,7km
na superfície dos solos adjacentes (contaminação resi-
14* 293 6,3 1,8km dual) possibilitou que ainda hoje as crianças moradoras
15 37 5,9 2km de Vila Mota e Capelinha continuem expostas ao chum-
bo, e conseqüentemente apresentem os teores de
16 52 5,6 3,5km
chumbo no sangue mais elevados.
17 76 5,9 3,6km Esses resultados mostram a necessidade de estu-
18 58 5,8 4,5km dos ambientais para reabilitação da área e atendimento
médico, com monitoramento humano, principalmente
19 21 5,6 6,5km
nas populações infantis que residem próximo à refinaria
20 37 5,8 6,0km Plumbum.
21 26 5,5 9,5km
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
* solos de horta
– 102 –
Fernanda Gonçalves da Cunha
DARDENNE, M.A.; SCHOBBENHAUS, C. Metalogênese in an adult population from a mining area in Brazil.
do Brasil. Brasília: Ed. UNB, 2001. Cap. 3, p. Journal de Physique IV, [S.l.], v. 107. P. 127, may
232-238. 2003.
PAOLIELLO,M.M.B.; CAPITANI,E.M.; CUNHA,F.G.; WORLD HEALTH ORGANIZATION (WHO). International
CARVALHO,M.F.; MATSUO,T.; SAKUMA,A.; Programme on Chemical Safety. Environmental He-
FIGUEIREDO, B.R. Determinants of blood lead levels alth Criteria 165. Inorganic lead. Geneva, 1995. 300 p.
– 103 –
Estudo da Composição e das Fontes Isotópicas de Pb dos Aerossóis em Brasília (DF) – Brasil Central
ESTUDO DA COMPOSIÇÃO
E DAS FONTES ISOTÓPICAS
DE Pb DOS AEROSSÓIS EM
BRASÍLIA (DF) – BRASIL
CENTRAL
1
Simone M.C.L.Gioia, sgioia@unb.br
2
Márcio.M.,Pimentel,
3
Américo Kerr,
1
Instituto de Geociências,Universidade de São Paulo
2
LInstituto de Geociências,Universidade de Brasília,
3
Instituto de Física, Universidade de São Paulo,
– 104 –
Simone M.C.L. Gioia
As partículas atmosféricas foram coletadas em duas razões isotópicas de Pb foram medidas por espectrome-
estações (uma urbana e outra remota), em duas frações tria de massa com fonte sólida termoiônica (TIMS), usan-
de diâmetro aerodinâmico médio de PM10-2.5 e PM2.5, du- do-se Finnigan MAT 262 multi-coletor, no laboratório de
rante períodos de 12h (dia e noite), no verão e no inver- Geocronologia da Universidade de Brasília. O branco
no. Foram investigados nos aerossóis a concentração e analítico de Pb para o procedimento total foi =120 pg.
composição isotópica de Pb, elementos químicos e mas-
sa total, associando com a variabilidade sazonal e a lo- Procedimento Analítico PIXE
calização das fontes. Dois métodos foram utilizados na As análises foram realizadas segundo o procedi-
análise dos aerossóis: 1) Particle Induced X-ray Emission mento analítico montado no LAMFI (Laboratório de análi-
(PIXE), para determinar os elementos químicos com nú- ses de matéria por feixe de íons), do Instituto de Física da
mero atômico maior do que 12; 2) Isotopic Diluti- Universidade de São Paulo. A redução dos dados foi fei-
on-Thermal Ionization Mass Spectrometry (ID-TIMS) para ta usando-se o programa Axil (Espen et al., 1991), tendo
determinar a concentração e as composições isotópicas o ajuste do espectro apresentado c2 menor que 2,0.
de Pb (204Pb, 206Pb, 207Pb e 208Pb).
RESULTADOS E DISCUSSÃO
EXPERIMENTAL
Isótopos de Pb
Geologia Local Os aerossóis urbanos (UNB) mostraram razões
206
A geologia local (Figura 1) é caracterizada pelas ro- Pb/207Pb e 208Pb/206Pb variando de 1,1219 a 1,2062 e
chas metamórficas de baixo grau do Meso- ao Neoprote- 2,0094 a 2,1337, respectivamente, formando um trend li-
rozóico, representadas por pelitos, metassedimentos near (Figura 2).
psamíticos e carbonáticos, pertencentes aos Grupos A maioria das amostras compreende razões
206
Canastra, Paranoá, Araxá e Bambuí. Pb/207Pb no intervalo entre 1,150 e 1,200, aproximada-
mente, e concentrações entre 10,7 a 0,07 ng/m3, durante
Amostragem o verão, assim como 25,4 a 0,04 ng/m3, durante o inverno
A Tabela 1 fornece informações sobre a coleta das (Figura 3a). Na área remota (CIAB) o intervalo das razões
206
amostras nas estações urbana e remota em Brasília (Fi- Pb/207Pb são muito similares ao obtido na estação da
gura1). A área remota está a, aproximadamente, 40 km a UnB, embora com concentrações baixas de Pb (Figura
sudoeste da estação de coleta da UNB. Amostras de 3b). Em geral, as composições do particulado são muito
combustível, filtros contendo material particulado de homogêneas, sendo, entretanto, mais radiogênica e ten-
emissões industriais e solos de lixão foram analisadas e dem a apresentar baixas concentrações durante o inver-
apresentam-se como as principais fontes antropogêni- no e verão à noite; elevadas concentrações de Pb ocor-
cas de poluição. As amostras de rochas e solos foram rem durante o inverno, de dia. Isto indica uma importante
analisadas a fim de caracterizar a composição isotópica contribuição antrópica durante o dia, quando a atividade
de Pb geogênico na região. humana é elevada, sendo, principalmente, o tráfego de
veículos mais intenso. Composições menos radiogêni-
Procedimento Analítico TIMS cas foram observadas principalmente na fração PM2.5
As amostras de solo, rochas e material particulado durante o dia.
foram tratados com uma mistura de ácidos de HF, HNO3 Comparando-se os dados de aerossol em Brasília
e HCl para a decomposição total. O procedimento com- com as composições isotópicas de Pb nos combustíveis
pleto para as análises de material particulado, combustí- (206Pb/207Pb = 1,1298-1,192) e filtros industriais coleta-
veis, rochas e solo estão detalhados em Gioia (2004). As dos na estação central de ônibus de Brasília (206Pb/207Pb
– 105 –
Estudo da Composição e das Fontes Isotópicas de Pb dos Aerossóis em Brasília (DF) – Brasil Central
Figure 1 – Mapa geológico esquemático do Distrito Federal (modificado de Freitas-Silva & Campos 1998)
e localização das amostras (rochas e solos).
Figure 2 – Relação entre as razões Pb/ Pb and Pb/ Pb dos Figura 3a – Relação entre a razão Pb/ Pb e a concentração de Pb
208 206 206 207 206 207
resultados obtidos neste trabalho. para o inverno e verão nas estação UnB.
– 106 –
Simone M.C.L. Gioia
– 107 –
Estudo da Composição e das Fontes Isotópicas de Pb dos Aerossóis em Brasília (DF) – Brasil Central
Figure 4 – Resultado das análises de PIXE de elementos maiores, no inverno e verão nas estações UnB e CIAB.
Figure 5 – Resultado das análises de PIXE de elementos-traço, no inverno e verão nas estações UnB e CIAB.
– 108 –
Simone M.C.L. Gioia
Estudos adicionais serão necessários para avaliar a CHOW, T.J.; SNYDER, C.; EARL, J. Isotope ratios of lead
influência do tráfego, assim como de outras fontes antro- as pollutant source indicators. Proceedings of the
pogências, as quais, provavelmente, aumentarão com a IAEA-SM-191/14, Vienna, 1975. p. 95-108.
expansão populacional. ESPEN, P.V.; JASSENS, SWENTER, S, 1AXIL X-Ray
Analysis software: users manual. Bebelux : Packard,
AGRADECIMENTOS 1991. 72 p.
GIOIA, S.M.C.L. Caracterização da assinatura isotópica
Os autores agradecem ao engenheiro da Shell Adair de Pb atual na atmosfera e no sistema lacustre do
Narazeth Santos Júnior, que forneceu algumas das Distrito Federal e pré-antropogênica em Lagoa Feia
amostras de combustíveis, à técnica Ana e ao Dr. Man- – GO. 2004. Tese (Doutorado) - Instituto de Geociên-
fredo, do Instituto de Física da Universidade de São Pau- cias, Universidade de Brasília, Brasília, 2004.
lo, e à Dra. Maria de Fátima Andrade, do Instituto Astro- ROSMAN, K.J.R.; LY, C.; VAN DE VELDE, K.; BOUR-
nômico e Geofísico da Universidade de São Paulo, e à TRON, C.F. A two century record of lead isotopes in
meteorologista Maria Cristina G. Costa, do INMET. high altitude Alpine snow and ice. Earth and Plane-
tary Science Letters, v. 176, p. 413-424, 2000.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS VERGARA, M.C. Caracterizações isotópicas e percen-
tuais de material particulado respirável e de matéri-
AILY, C. Caracterização Isotópica de Pb na atmosfera: um as fontes afins da cidade de Santiago do Chile
exemplo da cidade de São Paulo. 2001. Dissertação usando Pb Sr e Nd como traçadores naturais.
(Mestrado) - Universidade de São Paulo, São Paulo, 2001.Tese (Doutorado) - Universidade de São Pau-
2001. lo, São Paulo. 2001.
– 109 –
Fluorose Dentária e Anomalias de Flúor na Água Subterrânea no Município de São Francisco, Minas Gerais, Brasil
FLUOROSE DENTÁRIA E
ANOMALIAS DE FLÚOR NA
ÁGUA SUBTERRÂNEA NO
MUNICÍPIO DE SÃO
FRANCISCO, MINAS
GERAIS, BRASIL
1
Leila Nunes Menegasse Velásquez; menegase@netuno.lcc.ufmg.br
1
Lúcia Maria Fantinel; fantinel@ufmg.br
2
Efigênia Ferreira e Ferreira; efigenia@uai.com.br
2
Lia Silva de Castillo; liacastilho@ig.com.br
1
Alexandre Uhlein, uhlein@dedalus.lcc.ufmg.br
2
Andréia Maria Duarte Vargas; vargasnt@task.com.br
1
Paulo R. Antunes Aranha; aranha@igc.ufmg.br
1
Departamento de Geologia, Universidade Federal de Minas Gerais
2
Faculdade de Odontologia, Universidade Federal de Minas Gerais
– 110 –
Leila Nunes Menegasse Velásquez;
constituem, por conseguinte, as principais fontes de ausência de planejamento integrado dos recursos hídri-
água para o abastecimento humano e animal e para as cos do município que, aliada ao quadro socioeconômico
atividades agrícolas e industriais. com expressivos índices de pobreza, contribui para a
Nesses domínios, diversas substâncias químicas ocorrência de doenças de veiculação hídrica.
inorgânicas, presentes como fases minerais nos calcári- A limitada disponibilidade de mananciais superficia-
os e rochas associadas, são naturalmente incorporadas is de água resulta da conjugação de dois fatores princi-
às águas subterrâneas pela dissolução/alteração das ro- pais: a precipitação pluviométrica de 1.132,9 mm/ano
chas. Muitas dessas substâncias minerais são funda- concentrada em quatro meses seguidos de um longo
mentais para a saúde humana, mas o tipo de efeito pro- período de estiagem e a elevada infiltração da água no
vocado no organismo depende, entre outros fatores, dos domínio cárstico das rochas calcárias fraturadas do Gru-
teores ingeridos pelo indivíduo. Um exemplo paradigmá- po Bambuí. Todavia, contrastando com esse cenário, há
tico dessa relação diz respeito ao flúor e à fluorose. importantes mananciais de água subterrânea que, no
A assimilação de flúor em doses adequadas é bené- meio rural, representam a única disponibilidade hídrica
fica à saúde, pois promove o aumento da resistência da durante todo o ano.
matriz mineral dos dentes e dos ossos. Todavia, a assi- O abastecimento de água para a população resi-
milação contínua de teores acima do máximo recomen- dente na sede do município, localizada às margens do
dado pode provocar deformações no esmalte dentário rio São Francisco, é realizado pela Companhia de Sane-
(a fluorose dentária), e até mesmo nos ossos (a fluorose amento de Minas Gerais (COPASA MG) por meio, princi-
esqueletal ou osteofluorose). palmente, da captação e tratamento de água desse rio.
A fluorose dentária é uma anomalia do desenvolvi- Diferentemente da sede, na zona rural, o abastecimento
mento dos dentes ligada a deformações do esmalte em de água é de responsabilidade da Prefeitura Municipal
conseqüência da ingestão prolongada de flúor em quan- sendo realizado, principalmente, por meio da captação
tidades excessivas na faixa etária em que o esmalte está de água subterrânea por poços tubulares. Esses poços
em formação, ou seja, até os cinco anos de idade. A do- são os principais responsáveis pelo abastecimento de
ença caracteriza-se pelo aumento da porosidade do es- comunidades rurais geograficamente dispersas e locali-
malte, que adquire aspecto opaco e manchado de bran- zadas, muitas vezes, em áreas onde os recursos hídri-
co e até de marrom ou preto. O teor máximo de fluoreto cos superficiais perenes são escassos ou inexistentes e
na água para consumo humano depende das condições os mananciais hídricos subterrâneos são os únicos dis-
climáticas locais, sendo estabelecido pela Organização poníveis durante todo o ano. A partir do final da década
Mundial da Saúde-OMS (1999) de acordo com os valo- de 1970 foram executados vários poços tubulares na
res de temperaturas médias máximas do ar da região, zona rural na tentativa de minimizar o grave problema de
pois esses valores têm relação com o volume de água abastecimento de água. De maneira geral, os primeiros
consumida pela respectiva população. Em São Francis- poços começaram a funcionar na década de 1980.
co, em função da média de temperatura máxima do ar de O poço de abastecimento público de Mocambo,
32,3oC, o limite máximo recomendado para a concentra- distrito a cerca de 14 km a sul de São Francisco, foi aber-
ção de fluoreto na água para consumo humano é de 0,8 to em 1979. Quinze anos depois, a comunidade e os ci-
mg/L, de acordo com a Portaria 1469/00 do Ministério da rurgiões-dentistas da região diagnosticaram a natureza
Saúde (Brasil, 2000). das manchas nos dentes permanentes das crianças. Em
No município de São Francisco, a fluorose dentária 1995, por solicitação da Prefeitura de São Francisco, a
atinge principalmente crianças e jovens residentes na FUNASA analisou a água do poço tubular de Mocambo,
zona rural. A doença, que é de caráter permanente, de- encontrando 3,2 mg/L de fluoreto, quatro vezes o limite
manda tratamento corretivo e de restauração dos den- máximo recomendado para a região. Entre 1995 e 1997,
tes, geralmente inacessível às populações afetadas. dois outros poços foram construídos em Mocambo, mas
Esse tratamento consiste em lixar o esmalte poroso ex- não entraram em produção devido aos elevados teores
terno até que seja removida a mancha provocada pela de flúor de suas águas.
impregnação do esmalte poroso por pigmentos da ali- Em 2002 e 2003, cinco dos autores deste trabalho
mentação. Em casos graves, torna-se necessário im- desenvolveram pesquisa com o objetivo de caracterizar
plantar coroas ou facetas dentárias. a endemia nas localidades já notificadas, determinar a
O município de São Francisco está localizado na ma- origem dos elevados teores de flúor na água subterrâ-
crorregião Norte de Minas Gerais, na bacia hidrográfica nea do município e caracterizar os sistemas aqüíferos lo-
do médio rio São Francisco, distante cerca de 578 km de cais quanto à geometria, modo de circulação e proprie-
Belo Horizonte. Sua população soma 52.639 habitantes dades hidrogeoquímicas. A equipe pautou-se pelo de-
(IBGE, 2003), sendo 46% residente da zona rural. Muitas senvolvimento de metodologias interdisciplinares e pela
das dificuldades enfrentadas pela população derivam da busca das inter-relações dos dados epidemiológicos
– 111 –
Fluorose Dentária e Anomalias de Flúor na Água Subterrânea no Município de São Francisco, Minas Gerais, Brasil
com os dados derivados da investigação geológi- (1998). Os parâmetros mais importantes analisados fo-
co-hidrogeológica (http://www.odonto.ufmg.br/odon- ram: pH, CE, T, STD, alcalinidade (total, bicarbonato,
to/geologia_saude.html). carbonatos e hidróxidos), Dureza total, íons maiores e F-.
Os estudos identificaram, como causa da fluorose As análises estatísticas foram realizadas no programa
dentária, o consumo de água subterrânea naturalmente computacional SSPS - Statistical Package for the Social
contaminada por flúor e constataram a associação das Science – SPSS e os mapas de isovalores foram elabora-
concentrações de fluoreto com as estruturas rúpteis, com dos no programa computacional Surfer32.
a estratigrafia e com os parâmetros hidráulicos dos po-
ços. Os resultados da pesquisa possibilitam a indicação Métodos no Campo da Saúde
das áreas de maior vulnerabilidade de contaminação das Para os estudos epidemiológicos e clínicos foram
águas subterrâneas por flúor e o estabelecimento de cri- selecionados quatro distritos da zona rural de São Fran-
térios técnicos para a locação de novos poços tubulares cisco, para os quais a Prefeitura tinha conhecimento pré-
em terrenos de menor vulnerabilidade. No presente, a vio da manifestação da doença (Mocambo, Vaqueta,
pesquisa se expande metodológica e geograficamente, Alto São João, Novo Horizonte) e um distrito como área
dirigindo-se para 24 municípios situados a Norte de São controle (Retiro), cujo abastecimento de água é de res-
Francisco que apresentam similar contexto geológico e ponsabilidade da COPASA MG.
registros isolados de casos de fluorose dentária. Para o inquérito epidemiológico, foram examinados
288 indivíduos, entre 6 e 22 anos de idade, em função da
A PESQUISA INTERDISCIPLINAR DA FLUOROSE presença de dentes permanentes e tempo de consumo
DENTÁRIA EM SÃO FRANCISCO da água. Os exames clínicos foram realizados por um
único examinador, paramentado, sob luz natural, após
Métodos do Campo das Geociências escovação e utilizando gaze estéril para secagem dos
A pesquisa geológica compreendeu o mapeamento dentes. Incluiu-se um inquérito sobre dados de escova-
geológico, a definição da seqüência estratigráfica, a ca- ção com dentifrício e outros métodos de aplicação de
racterização petrográfica macro e microscópica e a ca- flúor, informações sobre a residência no local desde o
racterização das estruturas deformacionais e das fei- nascimento e procedência da água consumida. No estu-
ções de dissolução cársticas associadas. do, foram empregados os índices CPO-d (dentes caria-
O mapeamento geológico regional foi realizado na dos perdidos e obturados) segundo critérios da OMS
escala 1:250.000 em toda a porção meridional do muni- (WHO, 1997) e índice TF-Thylstrup e Fejerskov (Fejers-
cípio de São Francisco. Em função da representativida- kov et al., 1994). O banco de dados foi desenvolvido no
de das unidades regionais, da ocorrência de fluorita e da programa EPI INFO da OMS. A coleta de dados foi reali-
elevada prevalência de fluorose dentária no distrito de zada após autorização da Prefeitura do município, depo-
Mocambo, foi executado mapeamento na escala is de enviadas informações por escrito aos pais ou res-
1:60.000 da sub-bacia do riacho Mocambo e 1:25.000 ponsáveis dos alunos a serem examinados, juntamente
de duas áreas-chaves, visando ao detalhamento das as- com o consentimento pós-informado.
sociações faciológicas e à elucidação do controle litoló- Com o objetivo de conhecer a percepção dos mora-
gico/estratigráfico das ocorrências de fluorita. dores do local com relação à fluorose, foram realizadas
O estudo hidrogeológico compreendeu a caracteri- entrevistas com indivíduos afetados e com professores
zação física dos aqüíferos, a elaboração do modelo hi- nas quatro comunidades que apresentavam consumo
drodinâmico de funcionamento dos mesmos, a determi- excessivo de flúor. A metodologia empregada no estudo
nação das características da recarga e da circulação da qualitativo foi a de entrevistas abertas e se-
água subterrânea e, por fim, o estudo hidroquímico. A mi-estruturadas com roteiros e com a produção de resul-
partir de um cadastramento dos poços profundos proce- tados pela análise de conteúdo baseada em Bardin
deu-se à amostragem e realização de análises hidroquí- (1977). No caso dos adolescentes, os roteiros foram divi-
micas, visando a caracterização hidrogeoquímica pro- didos nas seguintes unidades de contexto: saúde bucal,
priamente dita, sobretudo com relação ao flúor, a verifi- percepção da fluorose e expectativas. A amostra foi
cação das associações entre o flúor e os demais parâ- constituída por 17 jovens de 12 a 22 anos de idade que
metros hidroquímicos e a definição do background do apresentavam manchamento por fluorose de graus entre
fluoreto. Considerou-se contaminada a amostra cuja 1 e 9 pelo Índice TF.
concentração se encontrasse acima de 0,8 mg/L, valor
máximo recomendado para a região. CONTEXTO GEOLÓGICO
Os procedimentos de coleta, preservação e análi-
ses da água foram realizados segundo o Standard Met- O município de São Francisco está inserto no com-
hods for the Examination of water and wastewater, 20th partimento central da Bacia do São Francisco, na área
– 112 –
Leila Nunes Menegasse Velásquez;
– 113 –
Marília Nutti
Simbolos Estruturais
Vaqueta
+ Acamamento horizontal
x 560
Direção e mergulho de acamamento +
Fotolineamentos x
640
Simbolos Diversos
520 Mocambo
x
Retiro
760
x
+ 640 x
66
Escala
x 600
0 2 4 6 Km
– 114 –
Leila Nunes Menegasse Velásquez;
As vazões extremamente variáveis, desde poucos João, 61,5% em Mocambo, 72,3% em Vaqueta e 82,2%
m3/h alcançando 260 m3/h, refletem o elevado grau de em Novo Horizonte (Tabela 2). Tal número é indiscutivel-
anisotropia desse sistema aqüífero e a necessidade de mente alarmante e mostra um típico problema de saúde
conhecimento geológico para obter sucesso na produção pública, relacionado ao meio ambiente. Nas quatro loca-
dos poços. Esse sistema aqüífero é a mais importante fon- lidades em que ocorre fluorose dentária, a água consu-
te de abastecimento de água para a população rural. mida provém do aqüífero carbonático, com concentra-
O sistema aqüífero granular é constituído pelas se- ções de flúor superiores a 1,18 mg/L. Na localidade de
guintes unidades: sedimentos do Grupo Areado sobre- Retiro, área controle, não ocorre a fluorose, o que é expli-
postos ao sistema aqüífero cárstico-fissural, coberturas cado pela baixa concentração de flúor nessa localidade
tércio-quaternárias e aluviões/colúvios recentes. A re- (0,2 mg/L).
carga do sistema granular ocorre pela precipitação dire-
ta. Além de serem explorados por meio de poços profun- Tabela 1. Prevalência de indivíduos com fluorose (TF), por
dos (Grupo Areado) e por poços escavados (cobertu- distrito, 2002 (em percentual)
ras), esses aqüíferos possuem a importante função de
restituírem os recursos às drenagens que nascem no sis- Novo Alto São
Idade Mocambo Vaqueta Retiro
tema granular. Horizonte João
O fluxo subterrâneo regional ocorre no sentido da 7a9 57,8 95,5 100 88,0 0
calha do rio São Francisco situada a oeste da área, que 10 a 12 87,0 100 100 75,0 0
corresponde ao nível de base regional. Contudo, fluxos 13 a 15 92,8 100 100 91,6 7,7
locais certamente ocorrem nas demais direções consta- 16 a 22 100 60,0 83,3 100 0
tadas, como é típico de terrenos cársticos. Total 81,5 93,6 97,7 87,7 0,3
– 115 –
Fluorose Dentária e Anomalias de Flúor na Água Subterrânea no Município de São Francisco, Minas Gerais, Brasil
Hidroquímica do flúor nas águas subterrâneas dos aqüíferos. Ocorrem poços secos até poços com va-
Anomalias de fluoreto em águas subterrâneas nas zões de 264 m3/h; a maioria (56%), contudo, possui va-
localidades endêmicas epidemiologicamente estuda- zões de até 20 m3/h.
das apontam ser esta a principal fonte de ingestão de Com base nas observações de campo, constata-
flúor e a causa da endemia de fluorose dentária. ram-se, duas direções de carstificação mais desenvolvi-
Estudo hidrogeoquímico de 78 poços tubulares indi- da: N70°-90°W (sistema distensivo) e N0°-30°E (sistema
cou uma variação de fluoreto de zero a 3,9 mg/L e back- de alívio ou de descompressão). Outros dois sistemas
ground de 0,45 mg/L. Em 16,7% as concentrações supe- identificados são os de cisalhamento N50°-70°E (dex-
raram o limite de potabilidade local (0,8 mg/L). Essas tral) e o N30°-50°W (sinistral). As vazões muito elevadas
amostras correspondem a poços mais novos. (em torno de 100 m3/h) a excepcionais (260 m3/h) indi-
O pH mostrou variação de 7,0 a 8,8, com mediana cam condições de alto grau de carstificação e de artesi-
de 7,5. Os Sólidos Totais Dissolvidos variou de (STD) de anismo. Relacionando-se as vazões dos poços aos sis-
43,3 mg/L a 517 mg/L com mediana de 407,5 e média de temas de fraturamentos, constatam-se produções muito
370,2 mg/L. A alcalinidade de bicarbonatos variou de 94 elevadas nos sistemas N70°-90°W, N30°-50°W e
mg/L CaCO3 a 481,3 mg/L CaCO3 com mediana de 39,3 N0°-30°E, o que permite inferir que a carstificação ocorre
mg/L CaCO3. em todos os sistemas. As vazões mais elevadas (acima
As fácies hidroquímicas constatadas no diagrama de 100 m3/h) associam-se principalmente ao sistema
de Piper (Figura 3) revelaram três tipos hidroquímicos distensivo N70°-90°W.
principais: bicarbonatada cálcica (32,3%); bicarbonata- As concentrações de F- são maiores nos sistemas de
da sódica, sódica-cálcica a cálcica-sódica (21,5%) e bi- menor produtividade, ou seja, no de cisalhamento des-
carbonatada cálcica-magnesiana (15,4%). É nítida a as- compressivo e sinistral. A concentração média de fluoreto
sociação direta do flúor com o sódio, dada a elevada so- nos poços não associados a lineamentos é próxima do
lubilidade deste. background - 0,40 mg/L, ao passo que, no sistema disten-
sivo, a concentração média é de 0,54 mg/L, no sistema de
cisalhamento (sinistral) é de 0,73 mg/L e no sistema des-
compressivo, 0,8 mg/L. Assim, dentre os cinco poços lo-
diâmetro proporcional ao teor de F
cados no sistema distensivo (de maior produção) e que
possuem concentrações acima de 0,8 mg/L de F-, quatro
possuem baixas vazões, entre 2,5 e 10,56 m3/h.
A correlação das concentrações de fluoreto com a al-
timetria das entradas d’água dos poços na área estudada
corrobora a associação do flúor com o pacote de calcare-
nitos das porções inferiores a médias do Grupo Bambuí
na área, onde cerca de 45,8% dos poços com fluoreto
acima de 0,8mg/L estão em altitudes entre 480 e 600 m.
Foram observadas nove outras localidades cujas
águas de abastecimento por meio de poços mais novos
encontram-se contaminadas com relação ao fluoreto,
entretanto, nenhuma medida vem sendo tomada para
prevenir a população atualmente exposta.
Figura 3 – Diagrama de Piper (dimensão dos pontos proporcional à
concentração de Flúor).
CONCLUSÕES
– 116 –
Leila Nunes Menegasse Velásquez;
nem a correção dos teores de fluoretos dos poços tubu- dação de Amparo à Pesquisa de Minas Gerais –
lares e ações odontológicas que possibilitem a saúde FAPEMIG, órgão financiador do projeto (Processo CRA
bucal, incluindo ações informativas sobre a origem das 294/99), Instituto de Geociências da UFMG, Fundação
lesões, necessitam ser empreendidas para a completa Nacional de Saúde Coordenação Minas Gerais –
promoção de saúde dos moradores afetados. FUNASA, Prefeitura Municipal de São Francisco, Com-
Anomalias de fluoreto na água de poços tubulares panhia de Saneamento de Minas Gerais – COPASA MG,
nas localidades estudadas indicam ser a água subterrâ- Companhia de Desenvolvimento do Vale do São Francis-
nea a principal fonte de ingestão de flúor e causa princi- co – CODEVASF, Centro de Desenvolvimento da Tecno-
pal da fluorose. A fluorita em cristais disseminados em logia Nuclear - CDTN/CNEN, e à população de São Fran-
veios calcíticos dos calcarenitos do Grupo Bambuí, cisco que autorizou a realização dos exames clínicos
constitui mineral-fonte da contaminação natural das odontológicos.
águas subterrâneas, mas outros minerais com flúor po-
dem estar presentes nas fácies carbonáticas e nas fáci- REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
es pelíticas do Grupo Bambuí, contribuindo para a con-
taminação das águas subterrâneas. BARDIN, L. 1977. Análise de conteúdo. Lisboa: Edições
As concentrações de fluoreto nas águas subterrâne- 70, 1977. 228 p.
as atingem um máximo de 3,9 mg/L. A associação das BRASIL. Ministério da Saúde. Portaria nº 1469 de 29 de
concentrações de F- com as estruturas rúpteis, com a es- dezembro de 2000. Controle e vigilância da qualida-
tratigrafia e com os parâmetros hidráulicos dos poços de da água para consumo humano e seu padrão de
permite a adoção de critérios técnicos para a locação de qualidade.
novos poços tubulares em terrenos de menor vulnerabili- FANTINEL, L.M. et al. Fluorose dentária e anomalias de
dade à contaminação por flúor, citando-se como mais flúor nos aquíferos do Grupo Bambuí em São Francis-
importantes: evitar as direções N0°-30°E e N30°-50°W; co, MG. Disponível em: <http://www.odonto.ufmg.br/
priorizar a direção N70°-90°W, que é também a mais pro- odonto/site%2004/geologia_saude.html>. Acesso
missora em produção; priorizar profundidades de entra- em: 18 maio 2005.
da d’água em cotas acima de 600 m. FEJERSKOV, O. et. al. Fluorose dentária: um manual
Foram constatadas nove outras localidades no mu- para profissionais de saúde. São Paulo: Ed. Santos,
nicípio cujas águas de abastecimento por meio de po- 1994.
ços mais novos encontram-se contaminadas com rela- FUNDAÇÃO INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA
ção ao fluoreto. Esse é um dado preocupante, pois ne- E ESTATÍSTICA – IBGE. Disponível em: <http://www.
nhuma medida vem sendo adotada para prevenir a po- ibge.gov.br.> Acesso em 2003.
pulação atualmente exposta. ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DE SAÚDE. Manual de le-
vantamento epidemiológico em saúde bucal. São
AGRADECIMENTOS Paulo: Ed. Santos, 1999.
WORLD HEALTH ORGANIZATION. Oral health survey:
Os autores expressam seus agradecimentos às ins- basic methods. 4th ed. Geneva: WHO, 1997. p.
tituições que apoiaram a pesquisa, especialmente: Fun- 35-36, 41-46.
– 117 –
Geoquímica do Flúor em Águas e Sedimentos Fluviais da Região de Cerro Azul, Estado do Paraná: Definição de Áreas de Risco para Consumo Humano
GEOQUÍMICA DO FLÚOR
EM ÁGUAS E SEDIMENTOS
FLUVIAIS DA REGIÃO DE
CERRO AZUL, ESTADO DO
PARANÁ: DEFINIÇÃO DE
ÁREAS DE RISCO PARA
CONSUMO HUMANO
¹Maria Jimena Andreazzini, jimena@ige.unicamp.br
¹Bernardino R. Figueiredo, berna@ige.unicamp.br
²Otávio A. B. Licht, otavio@pr.gov.br
¹Universidade de Campinas-UNICAMP
²Minerais do Paraná-MINEROPAR
– 118 –
Maria Jimena Andreazzini
ca iônica dos materiais do aqüífero (OH- por F-), tamanho de bases (Ca2+ e Mg2+ por Na+), promovendo a progressi-
e tipo de formações geológicas percoladas pelas águas, va elevação do pH a valores alcalinos (pH 9-10,5) (Apam-
e tempo que as águas estão em contacto com uma forma- bire et al., 1997). Deste modo, a diminuição de Ca2+ nas
ção particular (Ampabire et al., 1997). águas favorece concentrações de fluoreto mais elevadas.
O flúor é encontrado nos constituintes de rochas sili-
cáticas, onde a apatita, Ca10(PO4)6F2, é um dos minerais FLÚOR E SAÚDE HUMANA
mais ricos em flúor. O flúor é componente essencial só na
fluorita (CaF2) e no topázio (Al2SiO4(OH,F)2). Também A população pode estar exposta ao fluoreto através
pode ser fixado em hidroxi-silicatos e hidroxi-alumino-sili- do ar, dos alimentos, de solos contaminados e pelo consu-
catos complexos, nos quais os íons hidroxilas (OH)- po- mo de água, sendo esta última a principal via de intoxica-
dem ser substituídos extensivamente por F-, como é o ção. O teor máximo de F- em água potável, recomendado
caso dos anfibólios e minerais do grupo das micas (biotita pela Organização Mundial da Saúde (Who, 1996) é de 1,5
e muscovita) (Goldschmidt, 1970). Allmann & Koritning mg/L, com variações admitidas principalmente em função
(1972) comentam pesquisas feitas sobre troca-adsorção da temperatura média anual da região (18°C = 1,2 mg/L;
do F-/OH- em minerais de argila, onde as concentrações e 19-26°C = 0,9 mg/L; 27°C ou mais = 0,7 mg/L F-). No Brasil,
o pH das soluções circulantes têm uma grande influência a Resolução CONAMA 020/86 estabelece um teor máximo
sobre a lixiviação e adsorção do F. aceitável de 1,4 mg/L F-, e a Portaria N° 518 da Agência
Na maioria dos ambientes, a fluorita é o principal mi- Nacional de Vigilância Sanitária de 1,5 mg/L F- (ANVISA,
neral que controla a geoquímica do fluoreto nas águas. A 2004). Para o estado de São Paulo, a Resolução SS-293/96
concentração de F- na água está limitada pela solubilida- estabelece critérios de classificação da água distribuída
de da fluorita. Seu baixo produto de solubilidade (a 20°C, pelos Sistemas de Abastecimento Público, e considera um
é 3.9x10-11), implica que águas com baixo conteúdo em conteúdo adequado de F- entre 0,6 e 0,8 mg/L.
cálcio poderiam ter altas concentrações de flúor (Bell, A afinidade dos tecidos calcificados pelo flúor deter-
1998). A quantidade de F liberado pela dissolução de mina sua retenção persistente e acumulativa nos ossos,
fluorita em águas com baixa força iônica está na ordem sendo maior nos organismos em crescimento (Ortiz Ruiz,
de 8-10 ppm, mas a concentração de Ca2+, Na+, OH-, e 1997). Águas potáveis que contêm cerca de 1 mg/L F-
certos íons complexantes, tais como Fe, Al, B, Si, Mg e H, promovem uma redução significativa das cáries em crian-
podem alterar este intervalo de concentração de F- ças (ATSDR 2001). O flúor desempenha uma função remi-
(Apambire et al., 1997). neralizadora, através de reações químicas na região su-
A troca iônica (OH- por F-) envolvendo vários tipos perficial do esmalte. Se um nível razoável de F- está pre-
de argilas é um processo que pode explicar concentra- sente na dieta durante a fase de crescimento dos dentes,
ções muito altas de F- nas águas (valores acima de 30 uma quantidade significativa de fluorapatita (Ca10
mg/L). Este processo de troca iônica inclui também a troca (PO4)6F2) é incorporada ao esmalte no lugar da hidroxia-
patita (Ca10(PO4)6(OH)2). A fluorapatita é menos solúvel
nos ácidos do ambiente bucal, fazendo os dentes menos
N susceptíveis às cáries. O flúor também desempenha uma
função bacteriostática, já que quando presente no ambi-
ente bucal inibe o sistema enzimático das bactérias, im-
MATO
DENTRO
pedindo o desdobramento dos açúcares e a conseqüen-
te formação de ácidos que atuam sobre o esmalte.
gudo
RIBEIRA
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No entanto, quando o flúor é ingerido em excesso,
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oI Rio Ribeir ADRIANOPOLIS
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durante o período de formação dos dentes, pode ocorrer
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uma intoxicação crônica e originar a fluorose dentária,
uma patologia que se manifesta por meio de manchas
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esbranquiçadas a amarronzadas na superfície do es-
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ci malte dentário ou, até mesmo, por perdas em sua estru-
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La
Rio
AZUL
Fa
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tura (Cardoso et al. 2001, UNICEF 2003). Já a fluorose
esqueletal desenvolve endurecimento ou aumento anor-
49 24’
0 10 Km
24 52’
LEGENDA mal da densidade óssea em pessoas que ingerem, de
Rochas intrusivas cretáceas Grupos Setuva e Açungui indiferenciados
Granitóide pós-tectônico
(Proterozóico) forma continuada, teores maiores que 3 ou 4 mg/L F-. Os
Depósitos de fluorita
Granitóide sintectônico Cidades máximos efeitos adversos são detectados nas articula-
ções do pescoço, costas, joelho, pélvis e ombros, e tam-
Figura 1 – Localização da área de estudo e contexto geológico bém são afetadas articulações das mãos e dos pés
regional (Ronchi et al. 1995). (Gupta & Deshpande 1998).
– 119 –
Geoquímica do Flúor em Águas e Sedimentos Fluviais da Região de Cerro Azul, Estado do Paraná: Definição de Áreas de Risco para Consumo Humano
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Maria Jimena Andreazzini
nascente que abastece o povoado de Mato Preto. Os separação dos minerais densos utilizando bromofórmio,
parâmetros físico-químicos (pH, Eh, condutividade, oxi- e foi feita novamente a análise difratométrica da fração
gênio dissolvido, temperatura, turbidez, SDT) foram me- de minerais densos, e em outras também foi analisada a
didos in situ. No mesmo dia da coleta foram realizadas fração argila (amostra orientada, glicolada e aquecida).
as análises de alcalinidade em amostras não filtradas, Observações complementares foram feitas utilizando
pelo método de titulação, utilizando 4 gotas de corante microscópio eletrônico de varredura (MEV).
azul de bromocresol e H2SO4 0,16 N. As amostras para
análises de cátions foram acidificadas com 4 gotas de RESULTADOS E DISCUSSÃO
HNO3 concentrado em 50 ml de amostra. As amostras de
água filtrada (Millipore <0,45µm) foram analisadas no Qualidade das Águas
Laboratório de Analises Minerais (LAMIN), os ânions Cl-, O diagrama de Piper permite observar que as águas
NO2-, Br-, NO3-, PO4-3 e SO4-2 por cromatografia iônica e exibem composições do tipo bicarbonatadas cálcicas.
os cátions Al, As, B, Ba, Be, Ca, Cd, Co, Cr, Cu, Fe, Li, Só a amostra 24 (água subterrânea) caiu no limite entre
Mg, Mn, Mo, Ni, Pb, Sc, Se, Si, Sn, Sr, Ti, V, W e Zn, por os campos de águas bicarbonatadas cálcicas e bicar-
ICP-OES. Na e K foram analisados por espectrofotome- bonatadas sódicas (Figura 2).
tria de absorção atômica. Os parâmetros físico-químicos e os diferentes íons
Os conteúdos de F- foram determinados no Instituto analisados para as águas, entre eles, elementos que re-
de Geociências da Unicamp em um eletrodo de íon seleti- presentam risco para a saúde, foram comparados com
vo (EIS) marca Orion, modelo 96-09. A
curva para a calibração do eletrodo foi
100
realizada a partir de três soluções de re-
ferência, cada uma delas preparada
com 5 ml de solução TISAB III, e 50 ml -
de soluções padrão de 0,1, 1 e 10 mg/L l
Ca
+C
Águas
2+
de F-, respectivamente. Para determinar
2-
sulfatadas
+M
ou cloretadas
4
SO
g
2+
magnesianas
de água filtrada e 5 ml de solução
TISAB III, sempre utilizando copos bé- Águas Águas
quer de plástico. bicarbonatadas
cálcicas ou
sulfatadas
0 ou cloretadas 0
Nas mesmas campanhas de magnesianas sódicas
campo foram coletadas 14 amostras
2+ 2-
de sedimentos de corrente (12 em ju- Mg SO4
lho e 2 em março), as quais foram ana- 100 0
Águas
100 0
lisadas para 30 elementos nas frações bicarbonatadas
sódicas
granulométricas <177 mm e <63 mm,
por FRX no IG da Unicamp, usando Águas Águas
magnesianas sulfetadas
pastilhas de pó prensado. O teor de F
foi determinado seguindo o procedi- Águas
mento proposto por Hopkins (1977), mistas 100 Águas
mistas
que consiste na fusão da amostra com Águas
Águas
sódicas Águas
uma mistura de Na2CO3 e K2CO3, se- Águas bicarbonatadas cloretadas
cálcicas
guida de adição de ácido cítrico e de 0 100 0 100
CATIONS ANIONS
uma solução tampão de citrato de só- 100 0 100 0
dio, e, finalmente, medição do F- atra- Ca
2+ +
Na + K
+ 2-
CO3 + HCO3
-
Cl
-
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Geoquímica do Flúor em Águas e Sedimentos Fluviais da Região de Cerro Azul, Estado do Paraná: Definição de Áreas de Risco para Consumo Humano
os valores máximos permitidos pela Portaria N° 518 da tras de água subterrânea (ambas localizadas dentro do
Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA, ambiente granítico) foram determinados teores de 1,13 e
2004). A maior parte das águas analisadas encon- 0,33 mg/L F-.
tram-se dentro dos padrões de potabilidade após trata- A captação de água realizada pela empresa
mento convencional. SANEPAR para posterior tratamento e distribuição à po-
Os valores de pH estiveram entre 7,3 e 8 na coleta pulação de Cerro Azul, está localizada no arroio Três
de julho/03, e entre 7,7 e 8,3 na de março/04. Os demais Barras, onde foi coletada a amostra 12 que apresentou
parâmetros de qualidade de água apresentaram varia- 0,12 e 0,14 mg/L F- nas coletas de julho e março, respec-
ções, respectivamente nas duas ocasiões de coleta, tivamente. Os teores de F- obtidos nas amostras de água
como segue: Eh nos intervalos 452-532 mV e 444-502 já tratada para consumo foram de 0,84 e 1,02 mg/L F-
mV; condutividade elétrica 0,06-0,21 mS/m e 0,10-0,34 para a cidade de Cerro Azul, em julho e março, respecti-
mS/m; OD 8,1-10,3 mg/L e 7,8-10,1 mg/L; temperatura vamente, e de 0,23 mg/L F- para o povoado de Mato Pre-
14,7-18,5 °C e 21,1-27,8 °C. Durante a coleta de março, to em março.
as concentrações totais de sólidos dissolvidos (TSD) va-
riaram de 0,06 a 0,22 g/L, e os valores de turbidez entre 2 Análise dos Sedimentos de Drenagem
e 45 UTN. As amostras de sedimentos apresentaram teores de
As concentrações de Be, Cd, Co, Cr, Cu, Ni, Pb, Sc, F entre 330 e 1.300 mg/g. Em geral, as concentrações de
Se, Sn, Ti, W e V estiveram abaixo dos respectivos limites F na fração <63 mm foram mais altas que na fração <177
de detecção em todas as amostras. mm, à exceção das amostras próximas da mina Mato
Teores de flúor superiores aos limites permitidos fo- Preto (15a e 15b), dada sua proximidade da fonte e a
ram detectados nas drenagens próximas à mina de MP. menor distância de transporte a que foram submetidas
As concentrações de F- em água superficial variaram (Figuras 4 e 5). Destaca-se também que para algumas
de 0,07 até 2,54 mg/L F-, correspondendo os valores amostras a diferença entre os teores determinados para
mais elevados às amostras localizadas em cursos influ- as duas frações encontra-se dentro do erro analítico do
enciados pelas duas mineralizações (Figura 3). Cabe método.
destacar aqui que na
amostragem de julho/03,
planejada para represen-
tar o período seco, ocorre-
ram intensas chuvas no
dia anterior à coleta, o que
gerou a diluição das
amostras de água. Portan-
to, não foi possível deter-
minar os máximos teores
de F- nas águas da região,
ficando a possibilidade de
que algum outro curso de
água exceda o limite per-
mitido, por exemplo o rio
Pinheirinho, onde a con-
centração de F- esteve
próxima desse limite.
Para ambas coletas,
aquelas amostras com ma-
iores teores de F- apresen-
taram também concentra-
ções mais elevadas de
Ca2+, Sr2+ e Ba2+, elemen-
tos com afinidade geoquí-
mica, enquanto os teores
mais altos de F- nem sem-
pre coincidiram com os
maiores de Si+4. Nas amos- Figura 3 – Mapa de teores de fluoreto em água superficial.
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Maria Jimena Andreazzini
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Geoquímica do Flúor em Águas e Sedimentos Fluviais da Região de Cerro Azul, Estado do Paraná: Definição de Áreas de Risco para Consumo Humano
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– 125 –
Estudo Hidrogeoquímico do Flúor nas Águas Subterrâneas das Bacias dos Rios Casseribú, Macacú e São João, Estado do Rio de Janeiro
ESTUDO
HIDROGEOQUÍMICO DO
FLÚOR NAS ÁGUAS
SUBTERRÂNEAS DAS
BACIAS DOS RIOS
CASSERIBÚ, MACACÚ E
SÃO JOÃO, ESTADO DO
RIO DE JANEIRO
1
Theodoros I. Panagoulias, geotheo@uol.com.br
1
Emmanoel V. da Silva Filho, geoemma@vm.uff.br
1
Universidade Federal Fluminense - UFF
– 126 –
Theodoros I. Panagoulias
blemas para o uso do recurso hídrico para outros fins Numerosos são os possíveis fatores contaminantes
(como irrigação e dessedentação de animais). A relação de águas subterrâneas (Geraghty & Miller, 1972). Na re-
entre a ocorrência do flúor com problemas de saúde pú- gião em questão, possíveis fontes de contaminação seri-
blica é bem documentada em áreas de litologia vulcâni- am ocorrências de veios de mineral rico em Flúor (Fluori-
ca alcalina, como em partes da Índia, Sri Lanka, China e ta), ganga e emissão atmosférica de olarias e de minera-
África Oriental (Dissanayake, 1996), pouco se conhece doras e o esgoto doméstico e/ou industrial.
em áreas onde o flúor é de ocorrência hidrotermal (Ferra- Em estudos recentes (Maddock & Dias, 1988 e Mad-
ri et al., 1982; Maddock e Dias, 1989). dock & Dias, 1989) na região, detectaram anomalias na
Portanto essa região, por suas características geo- concentração de fluoreto em água superficial da ordem
lógicas, por seus aspectos de ocupação do solo, e pela de 12,5 mg/L de fluoreto.
ocorrência de fluorose humana e em animais exige um O flúor, quando ingerido em baixas concentrações
estudo da ocorrência, distribuição espacial e comporta- (1 a 3 mg/dia) é recomendado como profilático dentário
mento geoquímico desse elemento com vistas a melhor e para o desenvolvimento apropriado dos ossos. Para ter
gestão para utilização da água subterrânea. uma ação eficaz, quase todo o flúor (>90%) deve estar
dissolvido em água sob a forma mais abundante: fluore-
BASE TEÓRICA to. A ingestão de elevadas doses (>40 mg/dia) pode
acarretar perda de brilho dos dentes, podendo chegar,
Água subterrânea é a água que infiltra nas rochas e em alguns casos, na deficiência esquelética, resultando
solos, caminhando até o nível hidrostático. Como a cap- em dores reumáticas e/ou artrites nos indivíduos
tação em mananciais superficiais (com nível de qualida- (OMS/WHO, 1970).
de aceitável) encontra-se cada vez mais distante (ex.: a As concentrações do flúor na natureza variam des-
central CEDAE de Imunana, em Magé, para o abasteci- de as concentrações-traço, podendo chegar a concen-
mento da ETA de Laranjal para a população de São Gon- trações elevadas de até 2.800 mg/L, como na África Ori-
çalo e Niterói), assim como o tratamento de águas de ental (Gaciri & Davies, 1993). A concentração do flúor
qualidade excessivamente degradada, ou o reuso des- nas águas naturais vai depender de um conjunto de fato-
tas, apresentam crescentes limitações técnicas e econô- res, tais como: temperatura, pH, presença ou não de
micas, a utilização das águas subterrâneas constitui a al- complexos minerais, íons precipitados e colóides, solu-
ternativa técnico-econômica mais promissora (Da Silva, bilidade de minerais, capacidade de troca iônica de mi-
1984). nerais, a granulometria e o tipo da litologia e o tempo de
A água subterrânea é um recurso natural renovável, residência das águas (Apambire et al., 1997).
logo a sua exploração em longo prazo deve ser equili- Minerais que influenciam na variação da concentra-
brada e baseada na recarga natural disponível. ção hidrogeoquímica do fluoreto são: fluorita, apatita,
Águas subterrâneas poluídas são definidas como mica , anfibólio, certos tipos de argilas e a vermiculita. A
águas subterrâneas em que o total de dissolvidos e sus- fluorita é o principal mineral controlador da concentra-
pensos, causados diretamente ou indiretamente pelo ção do fluoreto em águas. O total de fluoreto liberado em
homem, é maior que as concentrações máximas permiti- águas de baixa força iônica pela dissolução de fluorita é
das relativo aos limites dos padrões nacionais (como as da ordem de 8 a 10 mg/L (Boyle, 1976). Contudo, as con-
Resoluções do CONAMA) e internacionais (OMS) para centrações de Ca, Na, hidroxilas e certos complexos iô-
água potável ou para uso em determinadas atividades nicos podem alterar essa taxa de dissolução. Estudos
econômicas. têm indicado uma alta correlação negativa entre as con-
Como a água subterrânea natural, não afetada pelo centrações de Ca e de F em águas com concentrações
homem, pode ter concentrações de alguns elementos de Ca acima do necessário para a solubilidade do F
que excedam tais limites, a contaminação neste caso (Boyle 1976, 1992). Voroshelov (1966) demonstrou que
pode ser definida por valores que excedam as médias águas com teores altos de Ca condicionam a dissolução
naturais globais dos constituintes envolvidos em deter- de flúor.
minado manancial (Matthes, 1982). O sódio é o elemento que normalmente apresenta
Partindo desta premissa, deduz-se ser indispen- uma correlação positiva com o fluoreto em vários tipos
sável conhecer a qualidade dos aqüíferos dessa re- de águas subterrâneas, especialmente as com baixas
gião, para que se possa definir a extensão da variação concentrações de Ca. Altas concentrações de Na au-
dos constituintes de origem natural, os mecanismos mentam a solubilidade do fluoreto nas águas (Apambire,
geoquímicos de mobilização desses elementos nas 1997). Tal processo resultará em altas concentrações de
águas, custo/beneficio para utilização pela população fluoreto nas águas (>30mg/L), porém é pouco compre-
e sua viabilidade de uso para atividades econômicas endido quando ocorrem argilas pois o processo envolve
específicas. uma troca de bases (Ca e Mg por Na) fazendo com que o
– 127 –
Estudo Hidrogeoquímico do Flúor nas Águas Subterrâneas das Bacias dos Rios Casseribú, Macacú e São João, Estado do Rio de Janeiro
pH seja progressivamente deslocado para o campo das acima do necessário para a solubilidade do F (Boyle
águas alcalinas, ocorrendo em bacias sedimentares 1976, 1992). Voroshelov (1966) demonstrou que águas
(Boyle, 1992). com teores altos de Ca condicionam a dissolução de
Estudos recentes têm demonstrado que o flúor for- flúor. Analisando as correlações entre F e Na, elemento
ma mono e difluor complexos com ETR e que esse me- que normalmente apresenta uma correlação positiva com
canismo liberador de flúor em águas não está totalmente o fluoreto em vários tipos de águas subterrâneas, especi-
compreendido (Sallet et al., 2000 e Schijf & Birne, 1999). almente as com baixas concentrações de Ca, observa-se
A fluorita é um mineral que comumente apresenta con- que as concentrações de Na aumentam a solubilidade do
centrações de ETR e Y. Certas ocorrências com concen- fluoreto nas águas (Apambire, 1997). Tal processo é pou-
trações elevadas (acima de 13% do peso total de Y e co compreendido quando envolve diversas litologias pois
14,1% do peso total de Ce) já foram citadas na literatura. o processo envolve uma troca de bases (Ca e Mg por Na)
Os ETR tendem a substituir o Ca na estrutura do mineral, fazendo com que o pH seja progressivamente deslocado
indicando que um enriquecimento das concentrações para o campo das águas alcalinas. Baseando-se nos re-
tanto os ETR pesados como leves, pode ocorrer. Rochas sultados da distribuição espacial das concentrações, po-
em depósitos hidrotermais demonstram concentrações de-se observar que as águas de poços da região encon-
de toda a série de ETR e estudos têm demonstrado que tram-se impróprias para o consumo devido às altas con-
razões de ETR, como Tb/Ca vs Tb/La, podem demons- centrações de flúor presente.
trar se o depósito de fluorita é de origem hidrotermal ou
de processos de sedimentação, em virtude do fraciona-
mento de ETR em fluorita (Henderson, 1984). Já em apa-
titas, minerais secundários na litologia da região, alguns
membros do grupo possuem relativa concentração de
ETR, mas as fluorapatitas, em geral, possuem baixas con-
centrações, porém significativas, que variam de 0,01% a
12%(rochas alcalinas). Os ETR substituem o Ca na estru-
tura das apatitas, formando complexos de Ce e Y (Hen-
derson, 1984). Além disso, o comportamento e comple-
xação dos ETR em águas relacionado com a acidez ou
basicidade das águas, principalmente para minerais
como a apatita (Johannesson et al., 1996 e Fleet & Pan,
1997) e/ou minerais fosfatados com conteúdo de flúor
não está significativamente explicado.
Figura 2 – Distribuição das concentrações de flúor em água
Em virtude disso, a necessidade da realização de subterrânea na região estudada.
análises hidrogeoquímicas de ETR na região se faz im-
portante para que se consiga definir os mecanismos hi-
drogeoquímicos que disponibilizam o flúor no meio.
As concentrações obtidas foram plotadas num AMPABIRE, W.B. et al. Geochemistry, genesis, and he-
mapa de isolinhas para análise da distribuição espacial alth implications of fluoriferous groundwaters in the
das concentrações do elemento (Figura 2). Observa-se upper regions of Ghana. Environmental Geology,
no mapa que as maiores concentrações (>6mg.L-1) fo- Berlin, v. 33, n. 1, p. 13-24, 1997.
ram obtidas entre os municípios de Tanguá e Rio Bonito, BOWELL, R.J. et al. Improving water quality assesment
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mente para poços profundos. Poços rasos apresenta- Sanitation for All”, 23., 1997, Durban. [Proceedings].
ram baixas concentrações do elemento, sugerindo dilui- Durban: [s.n.], 1997. p. 146-149.
ção dessas águas por infiltração de águas de chuva e/ou BOYLE, D.R. Effects of base exchange softening on fluo-
superficial nesses poços. Observa-se que as maiores ride uptake in groundwaters of the Moncton
concentrações obtidas estão dentro dos padrões máxi- Sub-Basin, New Brunkswick, Canada. In: KHARAKA,
mos estabelecidos de potabilidade pela OMS e MS e, Y.K.; MAEST, A.S. (Ed.). INTERNATIONAL
analisando as correlações entre elementos, observa-se SYMPOSIUM ON WATER ROCK INTERACTION, 7.,
uma correlação próxima à negativa entre as concentra- 1992, Rotterdam. Proceedings...Rotterdam: [s.n.],
ções de Ca e de F em águas com concentrações de Ca 1992. p. 771-774.
– 128 –
Theodoros I. Panagoulias
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– 129 –
Mercúrio – Ocorrências Naturais no Estado do Paraná, Brasil
MERCÚRIO – OCORRÊNCIAS
NATURAIS NO ESTADO DO
PARANÁ, BRASIL
INTRODUÇÃO OBJETIVOS
Os levantamentos geoquímicos regionais realizados Os objetivos principais da fase atual da pesquisa fo-
no Estado do Paraná, Brasil setentrional, indicaram algu- ram compilar os dados disponíveis sobre a presença de
mas extensas anomalias positivas de mercúrio. Uma de- mercúrio no Estado do Paraná (Figura 1), relacionado
las, identificada no levantamento geoquímico de sedi- com condicionamentos geológicos diversos, que pos-
mentos ativos de drenagem (SAD), mostrou uma boa sam justificar e dar o suporte necessário às hipóteses
concordância geográfica com algumas estruturas tectô- genéticas das anomalias geoquímicas na superfície e
nicas profundas que cortam as rochas ígneas da Bacia em escala regional (levantamento geoquímico por sedi-
do Paraná (Grupo São Bento - Mesozóico) que ainda mentos ativos de drenagem – SAD, e levantamento geo-
apresentam muitas fontes e surgências de águas terma- químico de solos – horizonte B – SOLO) e também em es-
is. Por outro lado, o levantamento geoquímico de solos – cala de detalhe (região do Salto do Itararé – SOLO (Figu-
horizonte B (SOLO) mostrou uma anomalia regional bem ra 2) e região de Palmeira – SAD (Figuras 3).
ajustada com horizontes ricos em carbono e carvão da
seqüência de rochas sedimentares da Bacia do Paraná
(Grupos Paraná, Itararé e Passa Dois - Paleozóico). Em
outro contexto geológico relacionado com o Proterozói-
co, ambos os levantamentos, mas principalmente SOLO,
mostraram que os conhecidos depósitos e mineraliza-
ções de Pb-Zn do vale do rio Ribeira podem ser respon-
sáveis por essa anomalia geoquímica.
Essas concordâncias geológico–geoquímicas per-
mitiram aos autores construir as seguintes hipóteses de
trabalhos: (a) mobilização do metal contido em horizon- Paraná
tes favoráveis da seqüência sedimentar da Bacia do Pa-
raná por meio de águas termais migrando através de fa-
lhas profundas, seguido pela deposição do metal na su-
perfície e (b) associação aos processos mineralizadores
de Pb-Zn-Ba do vale do rio Ribeira. Figura 1 – Localização do Estado do Paraná.
– 130 –
Plawiak, R.A.B
HISTÓRICO
– 131 –
Mercúrio – Ocorrências Naturais no Estado do Paraná, Brasil
– 132 –
Plawiak, R.A.B
Figura 6 – As células GGRN, as 696 amostras de sedimentos ativos de drenagem e respectivas bacias hidrográficas (modif. Licht, 2001).
Figura 7 – As células GGRN e as 307 amostras de solo – horizonte B (Licht and & Plawiak, 2005).
– 133 –
Mercúrio – Ocorrências Naturais no Estado do Paraná, Brasil
Figura 9 – Os principais lineamentos tectônicos do Estado do Paraná (modif. Zalán et al., 1987).
– 134 –
Plawiak, R.A.B
– 135 –
Mercúrio – Ocorrências Naturais no Estado do Paraná, Brasil
Figura 11 – Mapa geoquímico do Hg na fração < 150 # de amostras de sedimentos ativos de drenagem da região de Palmeira.
Figura 12 – Mapa geoquímico do Hg na fração < 230 # em amostras de sedimentos ativos de drenagem da região de Palmeira.
– 136 –
Plawiak, R.A.B
Figura 13 – Mapa geoquímico do Hg na fração < 150 # de amostras de solo da região de Salto do Itararé.
– 137 –
Mercúrio – Ocorrências Naturais no Estado do Paraná, Brasil
Figura 15 – Mapa geoquímico do Hg (mg/Kg) nas células GGRN - SOLO (horizonte B).
de falha de Caçador, falhas de Guaxupé e Jacutinga e a À Sra. Kátia Borges e ao Sr. Antonio Carlos G. Valé-
intersecção da zona de falha de Cândido de rio, do Arquivo Nacional, pela pesquisa e localização de
Abreu/Campo Mourão com a zona de falha da Lancinha documentos do século XIX.
/Cubatão. Ao Dr. Paulo Roberto Amorim dos Santos Lima pela
Finalmente, as relações de causa-efeito, entre as gentileza em enviar cópia do Diccionario Geographico
grandes áreas anômalas da região do vale do rio Ribeira das Minas do Brazil (Ferreira, 1885) de sua biblioteca
e os processos mineralizadores a Pb-Zn-Ba devem me- particular.
recer atenção especial, particularmente considerando o
risco à saúde da população nas vizinhanças da área da REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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Ao Presidente Dr. Eduardo Salamuni e Diretor Técni- 1995.
co Rogério da Silva Felipe, pela autorização na divulga- BIZZI, L.A.; SCHOBBENHAUS, C.; GONÇALVES, J.H.;
ção de dados do acervo da MINEROPAR. BAARS F.J.; DELGADO, I.M.; ABRAM, M.B.; LEÃO
Ao Dr. Edilson da Silva Brabo, Instituto Evandro Cha- NETO, R.; MATOS, G.M.M.; SANTOS, J.O.S. Geolo-
gas, pelas determinações de mercúrio realizadas nas gia, tectônica e recursos minerais do Brasil: sistema
amostras de sedimentos ativos de drenagem da região de informações geográficas - SIG e mapas na escala
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– 139 –
Contaminação por Mercúrio Antrópico em Solos e Sedimentos de Corrente de Lavras do Sul, RS, Brasil
CONTAMINAÇÃO POR
MERCÚRIO ANTRÓPICO EM
SOLOS E SEDIMENTOS DE
CORRENTE DE LAVRAS DO
SUL, RS, BRASIL
¹Carlos Antonio Grazia : grazia@pa.cprm.gov.br
²Maria Heloisa Degrazia Pestana, mariahdp@fepam.rs.gov.br
¹Serviço Geológico do Brasil-CPRM/SUREG-PA
²Fundação Estadual de Proteção Ambiental-FEPAM
– 140 –
Carlos Antonio Grazia
da CRM e do Moinho Chiapetta, e por Pestana et al. As amostras de solos são do horizonte A. Foram pe-
(2000) em uma amostra de sedimento coletada na lagoa neiradas por via úmida para obtenção da fração < 230
de tratamento do moinho Cerro Rico. mesh, com peneiras de PVC e malha de nailon e, posteri-
ormente secas à temperatura ambiente. As amostras de
OBJETIVOS DESTE TRABALHO sedimentos de corrente também foram secas à tempera-
tura ambiente, desagregadas em almofariz de ágata e
- Confirmar a existência de contaminação por Hg nos separadas as frações < 120 mesh, com peneiras de PVC
solos próximos às unidades de beneficiamento e verifi- e malha de nailon. As frações granulométricas < 230
cá-la em locais afastados dessas; mesh e < 120 mesh das amostras de solos e sedimentos
- Verificar o grau de dispersão do Hg dos solos contami- de corrente, respectivamente, foram abertas com
nados nas drenagens, através de análises de sedi- água-régia (6 ml para 1 g de amostra), a 95°C durante 1
mentos de corrente; hora para determinações de 51 elementos por ICP-MS,
- Estabelecer os limiares (ou thresholds) e valores médi- nos ACME Laboratórios (Canadá). As concentrações de
os de backgrounds para Au, Fe, Mn e para elementos As, Au, Cd, Cu, Fe, Hg, Mn, Pb e Zn são avaliadas neste
de interesse ambiental, como As, Cd, Cu, Hg, Pb e Zn, trabalho. No lote enviado para análise, foi incluída uma
em sedimentos de corrente sobre granitos e andesitos, amostra de material de referência certificado para Hg
e estabelecer os valores médios desses mesmos ele- (NIST-8407), cujo resultado mostrou erro de exatidão <
mentos para solos; 7% para o método analítico utilizado.
- Comparar os limiares obtidos com os atuais guidelines
brasileiros (CONAMA e CETESB). RESULTADOS E DISCUSSÃO
METODOLOGIA Solos
Os valores de concentração dos elementos anali-
Foram coletadas 8 amostras de solos sobre andesi- sados em amostras de solos distantes das áreas de be-
tos, sendo uma junto à área de beneficiamento da CRM, neficiamento de ouro foram extraídos de Grazia & Pes-
outra junto à área de beneficiamento do Cerro Rico e as tana (2005a) e estão mostrados na tabela 1. Os valores
restantes seis amostras em locais afastados de áreas de médios (VM) de concentração para as 5 amostras de
beneficiamento. Sobre os granitos, foram coletadas: solos sobre andesitos e os valores referentes a uma
uma amostra no interior da área de beneficiamento do amostra coletada sobre granito foram usados como re-
moinho Chiapetta; outra coletada na parte externa da ferência para calcular as taxas de contaminação das
mesma área e uma terceira amostra, utilizada como refe- amostras coletadas nas áreas de beneficiamento.
rência de solo não contaminado, longe de área de bene- A comparação dos VM de solos sobre andesitos,
ficiamento. Sobre a área granítica, se situam 24 amos- com valores orientadores para solos, conforme CETESB
tras de sedimentos de corrente, e sobre a área andesíti- (2001), descritos no rodapé da tabela 1, mostrou back-
ca, 19 amostras. grounds naturalmente elevados para As, Cu e Pb nessa
– 141 –
Contaminação por Mercúrio Antrópico em Solos e Sedimentos de Corrente de Lavras do Sul, RS, Brasil
Tabela 2 - Teores em solos junto às instalações de beneficiamento de ouro e respectivas taxas de contaminação
Fração < 230 mesh Abertura: Água-régia Leitura: ICP-MS
As Au Cd Cu Fe Hg Mn Pb Zn
Amostra Substrato
µg/g ng/g µg/g µg/g % ng/g µg/g µg/g µg/g
7 Andesito CRM 24,5 688 0,20 270 3,03 18508 626 79 113
(2) (35) (6,8) (4,9) (1,1) (511) (1,3) (3,8) (2,0)
9 Granito Chiapetta 127 13173 1,34 270 4,86 43497 418 1465 661
Interior (15) (2195) (44) (26) (2,7) (805) (3,2) (77) (17)
10 Granito Chiapetta 59,3 2870 1,63 124 2,84 11021 566 1100 500
Exterior (7,23) (478) (54) (12) (1,5) (219) (4,3) (58) (13)
12 Andesito Cerro Rico 163 1533 0,29 1469 5,68 10379 1029 719 250
Exterior (13,2) (78) (7,2) (27) (2) (287) (2,1) (13) (4,5)
1
Valor de Referência 3,5 nr <0,5 35 nr 50 nr 17 60
1
Valor de Alerta 15 nr 3 60 nr 500 nr 100 300
1
Valor Intervenção Agrícola 25 nr 10 100 nr 2500 nr 200 500
1
Valor Intervenção Residencial 50 nr 15 500 nr 5000 nr 350 1000
> ou = ao valor de referência > ou = ao valor de alerta > ou = ao valor de intervenção agrícola
1
Valores orientadores em solo em amostra total da CETESB (2001) - Taxas de contaminação ( ) nr = não referenciado pela CETESB
litologia vulcânica. Os valores de referência também fo- Cu superaram os respectivos valores de intervenção
ram ultrapassados para As, Hg e Pb na amostra 08 cole- para solos de uso agrícola em 100% das amostras, e as
tada sobre granito. de As e Pb, em 75% delas, indicando risco potencial à
As concentrações doos elementos obtidas nas saúde humana. O Zn superou o valor de intervenção
amostras de solos em áreas de beneficiamento, bem agrícola em 50% das amostras coletadas em áreas de
como as respectivas taxas de contaminação, encon- beneficiamento do minério, mais especificamente em
tram-se na tabela 2. Estas taxas foram calculadas como ambas as amostras coletadas no moinho Chiapetta. De-
o quociente entre a concentração na amostra e o respec- ve-se ressaltar, entretanto, que as concentrações dos
tivo valor médio (VM) retirado da tabela 1, que, para gra- elementos analisados nos solos de Lavras do Sul foram
nitos, refere-se ao valor da amostra 08. Na tabela 2 tam- determinadas na fração silto-argilosa, enquanto o relató-
bém foram incluídos os valores orientadores, conforme rio da CETESB (2001) não especifica a fração granulo-
CETESB (2001), exceto os de intervenção industrial. métrica, o que leva a crer que se trate de amostra total.
Considerando a manutenção da multifuncionalida- Recentemente a CETESB disponibilizou na Internet a
de do solo na gestão ambiental, utilizamos preferencial- sua Decisão de Diretoria No 195-2005, datada de
mente os valores de intervenção para uso agrícola como 23/11/2005, que revê os valores orientadores de 2001.
referência na avaliação dos dados apresentados, por Conforme os novos valores, os solos contaminados do mo-
serem mais restritivos do que os de uso residencial. Ou- inho Chiapetta estariam superando também o valor de pre-
tro motivo para a preferência por esses valores é o fato venção para Cd (1,3 mg/g), que é mais restritivo do que o
dos locais amostrados estarem situados em área predo- valor de alerta anterior (3,0 mg/g). Entretanto, com relação
minantemente rural. ao Hg, a nova decisão é muito mais permissiva, tendo os
O Hg mostrou as maiores taxas de contaminação, valores de intervenção residencial passado de 5.000 mg/g
seguido por Pb, Cu e As. Os solos mais contaminados em 2001 para 36.000 mg/g em 2005; e os de intervenção
por Hg e Au foram coletados no interior do moinho Chia- agrícola, de 2.500 mg/g em 2001, para 12.000 mg/g em
petta e na área da CRM, mostrando clara associação 2005. Com isso, somente as amostras coletadas no interior
com perdas no processo de amalgamação. As amostras do moinho Chiapetta e na área da CRM permaneceriam na
mais contaminadas por As, Cd, Pb e Zn foram as locali- mesma categoria. As demais seriam classificadas, quanto
zadas no moinho Chiapetta (interior e exterior), e por Cu, às concentrações de Hg, como superiores ao valor de pre-
no moinho Cerro Rico. Os elementos Fe e Mn, com fraca venção, que nesse caso, coincide com o antigo valor de
ou nenhuma associação com a mineralização sulfetada, alerta. Para os demais elementos analisados, não haveria
apresentaram as menores taxas de contaminação. alterações quanto à avaliação apresentada nas tabelas 1 e
A comparação dos dados obtidos em solos conta- 2. Neste trabalho continuaremos a adotar os valores orien-
minados com valores de orientação adotados pela tadores de 2001, pois não temos conhecimento do emba-
CETESB (2001) mostrou que as concentrações de Hg e samento técnico que levou às alterações de 2005.
– 142 –
Carlos Antonio Grazia
– 143 –
Contaminação por Mercúrio Antrópico em Solos e Sedimentos de Corrente de Lavras do Sul, RS, Brasil
1
Limiar 31 25 0,12 66 4,60 88 1397 40,70 99
2 1
CONAMA Nível 5,90 nr 0,60 35,70 nr 170 nr 35 123
2 2
CONAMA Nível 17 nr 3,50 197,0 nr 486 nr 91,30 315
1 2
Este trabalho Resolução Nº 344/04 - A resolução CONAMA Nº 344/04 restringe-se aos elementos As, Cd, Cu, Hg, Ni (não avaliado neste
trabalho), Pb e Zn nr = elemento não referenciado pelo CONAMA.
Nesta última, o limiar de 31mg/g de As para sedimentos pectivos valores do nível 2. Nessa amostra, a concentra-
de corrente ultrapassou até mesmo o nível 2 da RC. ção de Hg (958 mg/g) é de origem antrópica, devida à
Em amostras isoladas, o nível 2 da RC é ultrapassa- proximidade com o moinho Cerro Rico, situado a mon-
do para Cu na amostra 27 da área andesítica e para As e tante, fato que explica o seu elevado valor, o único maior
Cu na amostra 10 da área granítica. Na primeira, as con- que o nível 2 da RC para o Hg. Entretanto, uma contribui-
centrações de As, Hg e Pb também superaram os res- ção natural de Hg também é possível, pois, a análise de
Figura 2 – Detalhe de grão de cinábrio no MEV – Análise qualitativa no MEV - EDS do Microscópio Eletrônico de Varredura.
cinábrio em concentrados de bateia.
– 144 –
Carlos Antonio Grazia
– 145 –
Contaminação por Mercúrio Antrópico em Solos e Sedimentos de Corrente de Lavras do Sul, RS, Brasil
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Carlos Antonio Grazia
– 147 –
Implicações de Radioelementos no Meio Ambiente, Agricultura e Saúde Pública em Lagoa Real, Bahia, Brasil
IMPLICAÇÕES DE
RADIOELEMENTOS NO
MEIO AMBIENTE,
AGRICULTURA E SAÚDE
PÚBLICA EM LAGOA REAL,
BAHIA, BRASIL
José Erasmo de Oliveira; erasmo@sa.cprm.gov.br
Serviço Geológico do Brasil – CPRM/SA
INTRODUÇÃO
o
50 45
o
40
o o
O presente trabalho integra o Progra-
35
o
ma Nacional de Pesquisa em Geoquímica 5 o
5
Ambiental e Geologia Médica – PGAGEM,
desenvolvido pela CPRM em parceria com
universidades e outras instituições gover-
namentais. A área estudada está localizada PIAUÍ PERNAMBUCO
na região centro-sul do Estado da Bahia, o
entre os paralelos de 13°45’30” e 10 ALAGOAS
TOCANTINS 10
o
14°07’30”S e os meridianos de 42°07’30” e BAHIA SERGIPE
42°22’30”W.Gr, no município de Lagoa
Real, no Estado da Bahia, e abrange uma
área de 1.126 km2 (Figura 1).
O
SALVADOR
C
o
Uranífera Lagoa Real. A exploração minei- 15
N
LA
o
ra, realizada pela INB (Indústrias Nucleares 15
AT
o
100 mil toneladas de U3O8. 20 ESPIRÍTO SANTO
O processo de beneficiamento do mi- o
o 20
nério de urânio é o de lixiviação em pilhas 50 45
o o
(estática), onde o mineral é britado. Depois
40 o
35
de britado, o minério é disposto em pilhas e
irrigado com solução de ácido sulfúrico
para a retirada do urânio nele contido. A Figura 1 – Localização da área do Projeto Lagoa Real.
– 148 –
José Erasmo de Oliveira
concentração do urânio é realizada pelo processo de ex- A maior abundância de urânio em zonas mineraliza-
tração por solventes orgânicos, seguida da separação das e a dispersão aumentada desse elemento no ambi-
por precipitação, secagem e acondicionamento do con- ente, através de atividades como a mineração, podem
centrado (yellow cake) em tambores especiais, que obe- levar a problemas de toxicidade. Nesses casos, um en-
decem normas determinadas pela Comissão Nacional de tendimento dos processos geoquímicos é importante
Energia Nuclear – CNEN (www.inb.gov.br). O yellow cake para compreender as trajetórias de migração e rotas de
(diuranato de amônia) é transportado para Salvador (BA) exposição do urânio em relação às plantas, animais e às
por via terrestre. Esse material precisa ser transformado populações humanas.
em gás hexafluoreto de urânio e enriquecido na Alema- Mesmo fora da área de mineração, os teores natu-
nha, Holanda ou Inglaterra, para ser utilizado no Brasil rais de urânio nas águas e nos solos podem ser tóxicos
como combustível nas usinas nucleares Angra I e II. e causar efeitos adversos à saúde humana. Nos últimos
A INB tem procurado assegurar a realização de cinco anos a INB construiu poços para satisfazer as de-
operações de controle e remediação dos impactos am- mandas geradas pelas atividades de mineração e pela
bientais. Com relação ao trabalhador, cada um recebe população local e evitar o consumo das águas super-
um crachá com um dosímetro que mede a dose de radia- ficiais. Infelizmente as características geoquímicas da
ção que está recebendo. No caso do meio ambiente é água desses aqüíferos não foram consideradas e, em-
feito um monitoramento do ar, do solo, das águas de bora os solos e os sedimentos do aqüífero não estejam
chuva e subterrânea, dos animais e das plantas. A INB mineralizados, as concentrações desse elemento são
mantém contato freqüente com a Comissão Nacional de elevadas e suficientes para causar sérios problemas de
Energia Nuclear (CNEN), com o IBAMA e com o Centro saúde, a exemplo dos elevados teores de urânio na fa-
de Recursos Ambientais (CRA) do Governo do Estado zenda Juazeiro.
da Bahia. O radônio 222 é gás natural formado durante a
Este estudo visa contribuir para a identificação de transformação radioativa de urânio em chumbo. Embora
problemas ambientais que podem estar correlacionados tenha vida média muito curta, de apenas 3,8 dias, por
com a saúde pública, principalmente os relacionados ser gás é muito móvel, sendo facilmente inalado em am-
com a exposição ao urânio, assim como para o gerencia- bientes fechados, podendo provocar câncer no pulmão.
mento de microbacias e com dados e parâmetros geo- Determinações de Ra222 fazem parte das operações de
químicos para os programas de monitoramento da Pro- controle e remediação dos impactos ambientais pela
víncia Uranífera Lagoa Real. INB.
A região de Lagoa Real está situada na porção cen- O uso da água na região inclui principalmente o
tro-sul do Cráton São Francisco. A província uranífera si- consumo por animais domésticos e a utilização para irri-
tua-se no contexto dos ortognaisses Lagoa Real, perten- gação. Uma classificação das águas para agricultura
centes à suíte intrusiva homônima, que ocorre no Corre- em função do RAS e da condutividade elétrica é propos-
dor de Deformação do Paramirim. Esses ortognaisses ta pelo United States Salinity Laboratory – U.S.S.L (1954)
graníticos mesoproterozóicos apresentam faixas cata- na qual são estabelecidas 16 classes. Na região foram
clásticas, metassomatizadas a albita-oligoclásio (albiti- distinguidas 5 classes (Figura 2 e Tabela 1).
tos), por vezes mineralizados em urânio. O controle das A produção agrícola na região está restrita ao plan-
mineralizações é litotectônico, havendo distribuição pre- tio de abacaxi, cana-de-açúcar, feijão, mamona, mandi-
ferencial segundo a lineação. A uraninita é o principal mi- oca e sorgo. Como culturas permanentes, cultiva-se ba-
neral-minério, seguido de pechblenda finamente disper- nana, caqui, laranja e manga.
sa nas bandas máficas. Nos solos podzólicos da região, comumente, as raí-
As extensões mineralizadas variam, desde alguns zes têm certa dificuldade em atravessar o horizonte A.
metros até centenas de metros, enquanto a espessura é Naturalmente este fenômeno torna as culturas muito sen-
variável de centímetros até dezenas de metros; a conti- síveis à seca, e a água de profundidade se torna inapro-
nuidade em profundidade foi constatada por sondagens veitável. Isto poderia explicar, em parte, o enriquecimen-
até a ordem de 700 metros. to relativo dos elementos químicos no horizonte. A (Figu-
Os minerais secundários de urânio (uranofano e au- ra 2). No que concerne ao urânio existe a possibilidade
tunita) estão restritos às zonas de alteração intempérica, de toxicidade, mas os efeitos relacionados à fitotoxidade
condicionadas principalmente pelo sistema de fraturas. ainda não foram estudados.
Predominam na região os processos morfogenéticos as- A escassez de água na região restringe a aplicação
sociados ao intemperismo químico e ao entalhe fluvial. sistemática da geoquímica de águas superficiais.
– 149 –
Implicações de Radioelementos no Meio Ambiente, Agricultura e Saúde Pública em Lagoa Real, Bahia, Brasil
28
C1 S4 C2 S4 28
2
++
DRENAGEM
PARA
26 26
FORTE
S3
RAS =
24 C3 S4 24
SOMENTE
22 22
C1 C4
SÓDIO
S3 S4
COM EXELENTE
20 20
DE SÓDIO
18 18
C2 C5 S4
UTILIZÁVEIS
S3
MÉDIO
DO
S2
16 16
ADSORÇÃO
14 14
C3
PERIGO
S3
C1 S2
PALMEIRAS
12 12
C2
ÁGUAS
S2 C4
10 S3 10
EF-73
DE
8 C3 S2 8
EF-72
C5 S3
BAIXO
S1
RAZÃO
6 6
C2 S1 C4 S2
4
C1 S1 EF-65 4
EF-58 C3 S1 C5 S2
2 2
EF-62
EF-48 EF-43 AN C4 S1 C5 S1
EF-67 EF-34
C 100 250 750 2250 5000 10000
L
A
S CONDUTIVIDADE ELÉTRICA EM MICROMHOS / CM A 250C
S
E
C1 C2 C3 C4 C5
B A I XO MÉDIO ALTO MUITO ALTO EXCEPCIONALMENTE ALTO
PERIGO DE
RISCO DE SALINIDADE
SALINIDADE
o
Fonte: Figura 25 adaptada, do manual n 60, do Departamento de Agricultura do United States,1954.
Tabela 1 – Classificação das águas para irrigação na área do PGAGEM Lagoa Real
– 150 –
José Erasmo de Oliveira
– 151 –
Implicações de Radioelementos no Meio Ambiente, Agricultura e Saúde Pública em Lagoa Real, Bahia, Brasil
Nível Estático
Figura 3 - Representação esquemática de um perfil de solo podzólico , mostrando os principais horizontes e os sítios de amostragem.
pelos valores de Clarke, parâmetro importante na defini- (xi/c>1) nos sedimentos de corrente, solo e rocha. Nesta
ção de assinaturas geoquímicas da litologia e do meio perspectiva foram destacados: Se (13,78x), Bi (5,50x),
secundário. Ce (4,61x), La (4,48x), Th (2,84x), Y (2,42x), Mo (1,82x),
Para as análises químicas de água foram utilizados U (1,43x), Pb (1,28x) e Sn (1,14x). Os outros 41 elemen-
os valores publicados por Levinson (1980) para águas tos analisados, restantes, foram considerados empobre-
naturais (ppb). Para os níveis considerados perigosos cidos (xi/c<1) ou depletados (Figura 4).
para a saúde dos seres vivos, foram usados os limites Na amostragem de rocha evitou-se a zona minerali-
para rios de classe II, da Resolução nº 357/2005, do zada portadora de teores aberrantes (outliers). O enri-
Conselho Nacional do Meio Ambiente-CONAMA. quecimento dos litotipos é localizado, com uma média
igual a 1,920ppm U, ligeiramente depletados (0,83x).
RESULTADOS A predominância, na região, dos processos morfo-
genéticos associados ao intemperismo químico e ao en-
Embasado nas concentrações e dispersões dos 51 talhe fluvial, favorece aos elevados teores médios de
elementos químicos analisados na interface ro- 4,480ppm U e 3,480ppm U, equivalendo a enriqueci-
cha-solo-água e sedimento de corrente na área de estu- mentos de 1,94x e 1,51x em solo e sedimento de corren-
do, estimou-se, hipoteticamente, que cerca de 10% dos te, respectivamente.
elementos, em média, permanecem no ambiente primá- Para o urânio registrou-se um padrão de distribuição
rio (rocha). Dos 90% dos elementos que migram do am- associável ao Th e ETRL (La e Ce), com comportamento
biente primário para o secundário, aproximadamente geoquímico caracterizado pela abundância dos HFS (High
54% ficam retidos no solo e 36% dispersam-se pela rede Field Strenght), em conformidade com Oliveira (2004).
de drenagem (sedimento de corrente). Menos de 0,1% Destacaram-se oito poços de água subterrânea
dos elementos químicos são solubilizados. Este cenário considerados como poluídos por elemento radioativo
deverá sofrer modificações após a inclusão, no sistema, (urânio). Todos os outros 71 elementos analisados não
do ciclo vegetal-animal-homem. apresentam, a priori, importância significativa à poluição
O urânio surgiu como um dos dez elementos enri- radioativa dos aqüíferos. O risco de contaminação de
quecidos em relação ao teor médio na crosta terrestre água por radiação foi definido pela probabilidade de a
– 152 –
José Erasmo de Oliveira
SELÊNIO BISMUTO CÉRIO LANTÂNIO TÓRIO ÍTRIO MOLIBDÊNIO URÂNIO CHUMBO ESTANHO
Se Bi Ce La Th Y Mo U Pb Sn
14 21x
13
12
11
Xi/C (TEOR MÉDIO/CLARKE)
10
ELEMENTOS
contaminação dos poços alcançar teores acima dos pa- encerra a mina Cachoeira, em atividade desde 2000,
drões de qualidade do CONAMA (2005) para águas de com reservas superiores a 20.400 t de U3O8, e uma pro-
abastecimento para consumo humano após tratamento dução anual estimada em 300t de yellow cake.
convencional (0,02 mg/L U). Para as outras duas áreas selecionadas nesta pes-
A conversão do risco numa ameaça de contamina- quisa, recomenda-se o monitoramento ambiental e, se
ção do solo e rocha (pó) foi de 3,0 ppmU. necessário, programas relacionados à saúde pública. A
Com base nos resultados obtidos, foram seleciona- área nº2 foi demarcada na região da fazenda Juazeiro
das áreas-alvo para estudos posteriores, em escala de com elevados teores de urânio em água subterrânea
detalhe. (85ppb U e 93ppb U) e que inclui a jazida Engenho, pon-
to de coleta de amostra de solo com 8,3 ppm U e, com
Áreas - alvo selecionadas reserva total estimada de 27.600 t de U3O8,. A área nº 3
Foram selecionadas três áreas-alvo para propostas foi delimitada a partir de baselines geoquímicas (≥5,0
de estudos detalhados com monitoramento ambiental e ppm U), alcançados em amostras de sedimento de cor-
humano, em parceria com profissionais da área da saú- rente, na região da jazida Monsenhor Bastos, com reser-
de (Figura 5). va total estimada em 2.200t de U3O8.
Na a área nº1 (12 km2), onde o complexo mine- Os poços de água subterrânea situados em São Ti-
ro-industrial da INB de Lagoa Real está situado, reco- móteo, fazenda Muquila e Lagoa Grande são também re-
menda-se o controle/monitoramento permanente do comendados para estudos complementares em geoquí-
meio ambiente e dos trabalhadores da mineradora que mica ambiental e geologia médica (Figura 5 e Tabela 2).
– 153 –
Implicações de Radioelementos no Meio Ambiente, Agricultura e Saúde Pública em Lagoa Real, Bahia, Brasil
Figura 5 – Amostras e áreas selecionadas para estudos complementares do PGAGEM Lagoa Real.
– 154 –
José Erasmo de Oliveira
Tabela 2 – Áreas-alvo e amostras selecionadas para estudos complementares do PGAGEM Lagoa Real
ÁREA ALVO (Nº) MATERIAL
ESTAÇÃO DE
AMOSTRA AMOSTRADO LONGITUDE UTMmE LATITUDE UTMmE
AMOSTRAGEM
INDIVIDUAL (*) (TEOR DE URÂNIO)
EF-S-035 (1) S (5,2ppm) 796.109 8.469.380
EF-S-041 (1) S (14,9ppm) 793.170 8.470.054
EF-S-042 (1) S (6,3ppm) 791.503 8.468.748
EST-043 (1) A (29,89ppb) 92.554 8.469.283
R (9,9ppm), S (8,7ppm)
R (9,9ppm), S (8,7ppm)
EST-045 (1) L (13,1ppm) 792.554 8.469.283
EST-047 (1) A (158,79ppb) 796.258 8.468.982
EST-048 (1) A (41,39ppb) 796.349 8.468.982
EST-058 (1) A (42,11ppb) 795.749 8.469.438
EF-S-030 (2) S (5,0ppm) 797.341 8.465.425
EST-072 (2) A (566,85ppb) 799.705 8.465.694
EST-073 (2) A (105,93ppb) 799.993 8.465.635
EST-074 (2) L (8,2ppm) 793.075 8.463.199
EF-S-001 (3) S (5,2ppm) 807.105 8.439.738
EF-S-002 (3) S (5,2ppm) 805.444 8.438.631
EF-S-005 (3) S (5,8ppm) 799.481 8.439.462
EF-S-009 (3) S (5,0ppm) 794.461 8.439.563
EF-S-015 (3) S (6,3ppm) 791.835 8.440.462
EST-062 (*) L (10,7ppm) 788.513 8.457.279
EST-065 (*) A (21,03ppb) 809.690 8.451.388
EST-067 (*) A (98,48ppb) 806.517 8.467.984
(1) Área-alvo do Complexo Minero Industrial da INB (2) Área-alvo fazenda Juazeiro (3) Área-alvo Monsenhor Bastos
(*) Poços tubulares recomendados para serviços complementares de geoquímica ambiental e geologia médica
– 155 –
Implicações de Radioelementos no Meio Ambiente, Agricultura e Saúde Pública em Lagoa Real, Bahia, Brasil
– 156 –
Wilson Scarpelli
AMIANTO: O QUE É
IMPORTANTE CONSIDERAR
Wilson Scarpelli, wiscar@attglobal.6net
– 157 –
Ami an to: O que é Impor tan te Con si de rar
ser agen te ace le ra dor das re a ções quí mi cas que le vam dos. O mi né rio con tém pe que nas quan ti da des de tre-
à oxi da ção das fi bras com fer ro. molita as bes ti for me e sua lavra e moagem le va ram ao
Também aqui há si mi la ri da de com o que ocor re na aparecimento de gran de nú me ro de ca sos de cân cer
in tem pe ri za ção das ro chas, onde o ca lor é im por tan te fa- por as bes to se em Libby e, tam bém, em ou tras lo ca li da-
tor na in ten si da de das re a ções quí mi cas que al te ram as des para onde a ver mi cu li ta con ten do tre mo li ta foi en vi-
rochas. a da, para usos em cons tru ções e adi ções ao solo.
Gru po Mi ne ral das Ser pen ti nas Gru po Mi ne ral dos Anfi bó li os
Mi ne ra is mi cá ce os ou fi bro sos, pro du tos de al- Mi ne ra is fi bro sos, cons ti tu in tes pri má ri os de ro chas íg ne as me ta mór fi cas.
te ra ção de oli vi nas e pi ro xê ni os.
Em ser pen ti ni tos e ul tramáficas ser pen ti ni sa- Em ro chas íg ne as áci das, in ter me diá ri as, bá si cas e al ca li nas e em ro chas me ta mór f i cas (gna is-
das. ses, an fi bo li tos e xis tos).
Cri so ti la - Mg 3S i2O5(OH)4
– 158 –
WilsonScarpelli
ASTDR (2005)
(Agius, 2005)
fumo.”
(Agius, 2005)
– 159 –
Amianto: O que é Importante Considerar
– 160 –
Aderson Marques Martins
CRENOTERAPIA DAS
ÁGUAS MINERAIS DO
ESTADO DO RIO DE
JANEIRO
INTRODUÇÃO des pagãs dos lugares tutelares das fontes pelos santos
e santas da Igreja Católica.
As águas minerais constituem um dos meios mais A documentação científica sobre o assunto come-
antigos de que os homens dispuseram para finalidades çou a aparecer em 1604, quando é promulgada a primei-
de tratamento da saúde. Através de provas clínicas mile- ra legislação de águas minerais na França, por Henrique
nares, elas se consagraram ao longo da História pelo IV. No século XVIII, a Hidrologia se consolidou com os re-
uso generalizado e eficaz nos mais variados tipos de en- sultados de um trabalho de mais de duas mil observa-
fermidades em diferentes épocas e em todas as partes ções realizadas em Baréges, por Teófilo de Bordeu, e
do mundo. com várias publicações da Sociedade Real de Medicina
Na mais remota antigüidade as virtudes das fontes da França (Duhot & Fontain, 1963). No período entre as
hidrominerais foram consideradas como manifestações duas guerras mundiais, se dá o nascimento da moderna
sobrenaturais e fenômenos religiosos. Deuses, ninfas e indústria de águas engarrafadas.
outros simbolismos, foram os primeiros protetores das No Brasil, o Imperador D. Pedro II criou em 1848, a
fontes, enquanto sacerdotes e curandeiros, os primeiros estação hidromineral de Caldas da Imperatriz, em Santa
hidroterapeutas. Na Grécia Antiga, Aristóteles procla- Catarina, dando início à utilização de águas minerais em
mou a virtude dos vapores emanados das fontes termais, balneários no país. Nas primeiras décadas do século XX
enquanto Platão discutiu a origem das águas minerais. começam a aparecer estudos sobre as nossas águas
Heródoto, um dos maiores pensadores romanos, esbo- minerais, principalmente após 1930, com a criação do
çou os princípios da Crenoterapia (do grego Crenos = Departamento Nacional da Produção Mineral - DNPM.
Fonte). Daí em diante, a indústria de águas minerais, tanto de
Fatos relacionados à utilização de águas minerais balneários como de envasamento se consolida no país,
são freqüentes nos documentos históricos. Consta na Bí- notadamente com as descobertas das fontes do Sul do
blia, que no tanque de Bethsaida, em Jerusalém, reuni- país e de Minas Gerais (São Lourenço, Caxambu, Lam-
am-se multidões de enfermos em busca da cura. Na Eu- bari, Araxá, Poços de Caldas, Cambuquira, etc.) e de
ropa, antes da ocupação Romana, os gauleses já utiliza- São Paulo (Lindóia, etc.). Em 1945, entra em vigor o Có-
vam algumas das suas numerosas fontes termais. Con- digo de Águas Minerais (Decreto-Lei nº 7.841, publicado
tudo, a organização das estâncias foi iniciada com Júlio no DOU de 20 de agosto de 1945) que define e classifica
César, época em que tiveram um período de apogeu. nossas águas minerais, regulamentando sua pesquisa,
Durante a Idade Média, foram substituídas as divinda- exploração, industrialização e comercialização.
– 161 –
Crenoterapia das Águas Minerais do Estado do Rio de Janeiro
O Estado do Rio de Janeiro teve sua primeira fonte hi- priedades físicas, químicas ou físico-químicas distintas
dromineral descoberta em 1887, no município de Paraíba das demais águas, fenômeno muita vezes observado e
do Sul. A água dessa fonte, hoje paralisada, foi classifica- confirmado por provas clínicas. Tal evidência é atribuída
da como Bicarbonatada-Sódica Alcalina, era conhecida a concentrações infinitesimais (ppb) de elementos ou
como salutar, vindo daí sua marca “Salutaris”, sob a qual substâncias químicas, denominadas genericamente de
era envasada desde 1898. Em 1941, foi construído um ho- oligoelementos, responsáveis por suas propriedades me-
tel e uma área de lazer, que lá estão até os dias de hoje, dicinais. Essas águas são denominadas oligominerais ou
quando passou a denominar-se “Parque de Águas Salu- oligometálicas. No Brasil, essas águas são classificadas
táris”, constituindo-se na primeira Estância Hidromineral pelo Código de Águas Minerais como oligominerais.
do Estado do Rio de Janeiro. Em 1972, em Viena, a FAO - Organização para a Ali-
Um ano após o descobrimento da Água Salutáris, foi mentação e a Agricultura, e a OMS - Organização Mundi-
descoberta a Água Mineral Santa Cruz, pelo escravo re- al de Saúde, ambos organismos das Nações Unidas,
cém-alforriado Domingo Camões, conhecido pela alcu- promoveram um encontro de vários países visando um
nha de “Beiçola”. A partir de 1909, esse ex-escravo inici- Código Mundial de Águas Minerais, onde o ponto de ma-
ou o engarrafamento artesanal dessa água, então deno- ior controvérsia foi exatamente o conceito de “proprieda-
minada de Água Santa, em embalagens de vinho de 5 li- des favoráveis à saúde”, não se havendo chegado a um
tros, entregues de porta em porta, transportadas em acordo nessa questão.
lombo de burros. Só em 1914, surgiu a empresa de Segundo o Código de Águas Minerais brasileiro,
Águas Santa Cruz Ltda., que se mantém até os dias atua- uma água pode ser considerada mineral (Caetano &
is, no bairro Água Santa, que perpetua o nome da fonte, Yoshinaga, 2003; Caetano, 2005) de acordo com:
no subúrbio carioca.
Atualmente existem 34 empresas envasadoras de a Sua composição química (Tabela 1) - quando for
água mineral operando comercialmente no Estado do predominante a presença de um determinado ele-
Rio de Janeiro, distribuídas por todo o seu território. mento ou substância;
b Quando possuírem comprovada ação medicamen-
CONCEITUAÇÃO tosa constatada e aprovada pela Comissão Perma-
nente de Crenologia, vinculada ao DNPM (oligomi-
Denominam-se águas minerais as “águas provenien- nerais); e
tes de fontes naturais ou artificialmente captadas, que c Suas características físico-químicas na fonte:
possuam composição química ou propriedades físicas ou • quando houver uma vazão gasosa de radônio en-
físico-químicas distintas das águas comuns, com carac- tre 5 e 50 unidades Mache (radioativas);
terísticas que lhes confiram uma ação medicamentosa” • quando houver uma vazão gasosa de tório igual a
(DNPM, 1966). Esta conceituação, do Código de Águas 2 unidades Mache (toriativas);
Minerais do Brasil, é a mais aceita, embora existam outras • quando possuírem desprendimento definido de
definições baseadas em tipos de águas minerais que não gás sulfídrico (sulfurosas) e;
se enquadrem completamente no critério acima. • frias, hipotermais, mesotermais, isotermais e hi-
Para a escola francesa, por exemplo, água mineral é pertermais: quando a temperatura for respectiva-
qualquer água natural de fonte dotada de propriedades mente inferior a 25°C, entre 25 a 33°C, entre 33 e
terapêuticas, mesmo que não possua as citadas pro- 36°C, entre 36 e 38°C e acima de 38°C.
Tabela 1 – Características das Águas Minerais (modificado de Caetano & Yoshinaga, 2003; Caetano, 2005)
Classificação Características
Radíferas Substâncias que lhe dêem radioatividade permanente
Alcalina Bicarbonatada Bicarbonato de sódio = ou > 200mg/L
Alcalino Terrosas Carbonato de cálcio = ou > 120mg/L
Alcalino Terrosas Cálcicas Cálcio = ou > 48mg/L como bicarbonato de cálcio
Alcalino Terrosas Magnesianas Mg = ou > 30mg/L como bicarbonato de magnésio
Sulfatadas Sulfatos de Na, K, e ou Mg = ou > 100 mg/L
Nitratadas Nitratos de origem mineral = ou > 100 mg/L
Cloretadas Cloreto de sódio = ou > 500mg/L
Ferruginosas Ferro = ou > 5mg/L (Ex.: Salutaris - RJ)
Carbogasosas Gás carbônico livre dissolvido = ou > 200 mg/L
Elemento Predominante (> 0,01mg/l) Iodetada; Litinada; Fluoretada; Brometada; Vanádica, etc.
– 162 –
Aderson Marques Martins
Atualmente, a OMS, através do Codex Alimentarius Além das águas minerais propriamente ditas, o Có-
define as águas minerais naturais tão somente como digo de Águas Minerais define as águas potáveis de
aquelas que se caracterizam pela concentração de cer- mesa como “águas de composição normal, provenien-
tos sais minerais, pela presença de oligoelementos ou ou- tes de fontes naturais ou artificialmente captadas, que
tros constituintes. Nos Estados Unidos da América o ór- preencham tão somente as condições de potabilidade
gão responsável pelo setor, a Food and Drug Administra- para a região“. Estas águas são denominadas águas na-
tion (FDA), exige um mínimo de 250 mg/L de sólidos totais turais pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária –
dissolvidos para classificação da água como mineral. ANVISA, vinculada ao Ministério da Saúde.
De acordo com a Comunidade Econômica Européia A ANVISA também permite o envasamento das
- CEE (Directiva 80/777/CEE/1980), as águas minerais se águas purificadas, adicionadas de sais como águas de
distinguem das demais águas por sua natureza e é ca- diversas origens, mineralizadas artificialmente ou ozoni-
racterizada pela concentração de minerais, oligoele- zadas.
mentos ou outros constituintes e, caso contrário, por cer-
tos efeitos e por sua pureza original, com uma e outra ca- A ATUALIDADE DO CONSUMO DAS ÁGUAS
racterística conservada intacta, em razão da sua origem MINERAIS
subterrânea, protegidas de qualquer risco de poluição.
Antes da legislação da CEE, era exigida a apresenta- Algumas razões podem explicar o crescente consu-
ção de um mínimo de sólidos totais dissolvidos (STD) mo de água mineral. O afastamento humano da natureza
igual ou superior a 1.000 mg/L ou 250 mg/L de CO2 livre produzido pelo progresso tecnológico gera uma resistên-
para o enquadramento da água como mineral natural. A cia no inconsciente coletivo da humanidade, que buscan-
classificação atual de água mineral natural na Comunida- do uma alternativa entre o artificialismo da água tratada
de Européia segue os padrões constantes na tabela 2 . das redes públicas e a água contaminada pela poluição
Na França a implantação de uma indústria de enva- crescente dos mananciais, encontrou uma saída na água
se de água mineral depende do Serviço das Minas (Mi- mineral que, além de tudo, é favorável à saúde. Assim,
nistério da Indústria, Direções Gerais da Indústria, da surgiu um mercado de água mineral, usada como bebida
Pesquisa e do Meio Ambiente) e do Ministério da Saúde, ou complemento alimentar, em constante expansão.
após a obtenção por parte do interessado do laudo da Além da disseminação do consumo de água enva-
Academia de Medicina sobre as propriedades terapêuti- sada, as estâncias hidrominerais também continuam em
cas da água. alta. Em certos países da Europa, como na França, se
Observa-se, portanto, uma crescente preocupação mantém a tradição de célebres estações como Vichy e
em torno da definição de critérios para a classificação das Aix-les-Bains, que, pelo seu potencial turístico, são uma
águas como minerais e que a tendência é pela adoção de perene fonte de riqueza. No Brasil, também as famosas
limites mínimos de teores de sais minerais. A reforma do estâncias como as de Caxambu, São Lourenço e Poços
Código de Águas Minerais do Brasil é uma demanda sen- de Caldas, em Minas Gerais, e Águas de Lindóia e Serra
tida no meio da comunidade profissional e científica. Negra, em São Paulo, recebem grande afluxo de turistas
Duas tentativas de alteração do Código de Águas não só do país como de além-fronteiras.
Minerais foram feitas respectivamente pela Presidência Hoje, depois de um relativo declínio da medicina
da República, em 2002,e pelo DNPM, em 2003, que envi- crenológica, observa-se uma retomada do uso da água
ou um texto para consulta pública. O texto propunha que mineral, com o surgimento de novas especializações da
qualquer água subterrânea, desde que potável e captada medicina, a exemplo da medicina ortomolecular. Esta
de forma a não permitir contaminação, fosse considerada nova tendência surge na busca de um modelo de vida
uma água mineral de baixa, média ou alta mineralização. alternativo ao artificialismo, presente principalmente na
Com esses critérios tão abrangentes, a legislação brasi- alimentação industrializada dos dias atuais, coadjuvado
leira se afastaria ainda mais das bases européia e ameri- pela poluição e pela vida sedentária. Segundo a medici-
cana de definição de água mineral. Após receber diver- na ortomolecular, hoje ingerimos uma série de toxinas e
sas contribuições , entretanto, a iniciativa não foi avante produtos nocivos à saúde, incluindo aditivos alimentares
e a reforma ainda não se concretizou. sintéticos, agrotóxicos e metais pesados, alimentos irra-
Tabela 2 – Classificação da Água Mineral pela CEE . (modificada de Caetano & Yoshinaga, 2003; Caetano, 2005)
Classificação Exigência
Mineralização Muito Baixa <ou = 50mg/L de STD
Mineralização Baixa (Oligominerais) entre 50mg/L e 500mg/L de STD
Mineralização Elevada > 1.500mg/L de STD
– 163 –
Crenoterapia das Águas Minerais do Estado do Rio de Janeiro
diados e transgênicos (cujos efeitos ainda não estão por gases e vapores nelas presentes, essas águas emer-
bem esclarecidos) que interferem no nosso metabolis- gem a superfície sob a forma de fontes (Figura 1).
mo, levando ao enfraquecimento biológico e energético A formação da água mineral começa na atmosfera
e, assim, a uma grande quantidade de doenças. Nesse onde, sob a forma de chuva, absorve alguns elemen-
quadro, a água mineral figura entre o arsenal de recur- tos do ar. Ao penetrar o solo recebe a influência da
sos terapêuticos que não se limitam apenas a combater zona não saturada até penetrar nas rochas onde sofre-
sintomas, mas a agir de forma mais global. Assim a água rá a última etapa de sua mineralização. O tempo entre
mineral é tida como fonte de sais minerais e micronutri- a infiltração e a descarga depende da extensão per-
entes de que o organismo se tornou empobrecido (Bon- corrida, podendo variar de dezenas a milhares de
tempo, 2002). anos. A composição química reflete a percolação em
camadas geológicas, isto é, em seu percurso descen-
ASPECTOS GEOLÓGICOS dente, a água fica submetida a temperaturas e
pressões elevadas, solubilizando rochas e minerais
Com os conhecimentos modernos sobre o ciclo hi- (Martins et al., 2002). Esta teoria tem base no gradiente
drológico e a distribuição da água no planeta, sabe-se geotérmico, que prevê um aumento de 1°C para cada
que as águas minerais têm origem, como toda água sub- 30 metros de profundidade.
terrânea, na precipitação pluviométrica e na infiltração a A teoria de origem magmática tem como argumento
grandes profundidades na crosta terrestre. as fontes termais e gasosas e as águas ricas em elemen-
Dessa forma, água mineral é um tipo particular de tos pouco encontrados nas camadas superiores da Ter-
água subterrânea cuja formação resulta da ressurgência ra. Embora esta teoria esteja hoje ultrapassada, é admis-
das águas das chuvas infiltradas a grandes profundida- sível uma origem mista, em que as águas meteóricas, in-
des através de fraturas e falhas, em velocidade muito filtradas a grandes profundidades, receberiam em seu
lenta. Ao defrontar-se com descontinuidades de estrutu- percurso a contribuição de água juvenil proveniente de
ras geológicas (falhas, diques, etc.), impulsionadas pelo um veio hidrotermal ou outro evento magmático, como
peso da coluna de água superposta e, em certos casos, vulcanismo ou plutonismo (Figura 2).
– 164 –
Aderson Marques Martins
As águas minerais no
Estado do Rio de Janeiro
ocorrem em geral sob a forma
de fontes naturais. Na sua
maior parte tiveram sua des-
coberta a partir da observa-
ção popular sobre seus efei-
tos medicinais, o que levou à
realização de análises das
suas águas. Este foi o caso
da Água Iodetada de Pádua e
da Água Mineral Raposo.
O Mapa Geológico Sim-
plificado do Estado do Rio de
Janeiro, apresentado na figu-
ra 3, mostra a distribuição das
águas minerais conhecidas,
agrupadas de acordo com a
composição predominante.
INDICAÇÕES
TERAPÊUTICAS DAS
ÁGUAS MINERAIS DO
ESTADO DO RIO DE
JANEIRO
O tratamento crenoterá-
pico deve ser efetuado no lo-
cal, já que as águas só têm
plena atividade nas fontes, e
Figura 2 – Origem mista das águas minerais dirigido e controlado por um
médico crenologista, que fará
exames periódicos indispen-
sáveis.
Andrade Júnior (1937), um dos primeiros pesquisa- Em geral há dois tipos de tratamento: o interno
dores sobre a origem das águas minerais brasileiras, (água introduzida no organismo como medicamento) e o
partindo da distribuição geográfica das nossas principa- externo. No tratamento interno, além da ingestão pura e
is fontes, verificou que elas se encontram ao longo de fai- simples via oral, há também as injeções subcutâneas in-
xas de direção geral NE/SW cobrindo de Norte a Sul o tramusculares e intravenosas que se praticam com algu-
país, coincidindo essas faixas com as das nossas gran- mas águas isotônicas ou isotonizadas. No externo, as
des cadeias de montanhas. A interpretação geológica técnicas terapêuticas vão desde simples banhos em du-
deste fato levou-o a concluir que as nossas fontes hidro- chas e banheiras, saunas e aerossóis, até aplicações lo-
minerais estão relacionadas com o magma alcalino e a cais como compressas, etc.
um sistema de fraturas geológicas profundas, que cor- Apesar das inúmeras propriedades terapêuticas
tam o país de Norte a Sul, na direção geral NE/SW. Essa apresentadas na tabela 3 (apenas é apresentado o uso
opinião é compartilhada por Frangipani (1995), que, sem hidropínico, ou seja, pela ingestão), o consumo das
entrar no mérito das relações com o magma alcalino, re- águas minerais deve ser orientado por um médico especi-
laciona essas fontes com as faixas de dobramentos e fa- alizado, uma vez que existem contra-indicações de acor-
lhamentos, nas bordas das áreas cratônicas e das baci- do com o tipo de água e das características de cada pes-
as sedimentares e, também, nas áreas onde o embasa- soa. Este é o caso das águas com alto teor em sais que
mento foi afetado por tectonismo. Essas regiões apre- não devem ser ingeridas continuadamente por hiperten-
sentam estruturas que permitem a circulação de águas a sos. Da mesma forma, águas com elevada concentração
grande profundidade e seu retorno à superfície, em for- de cálcio não são indicadas para pessoas com tendência
ma de fontes. a desenvolver cálculos renais ou vesiculares.
– 165 –
Crenoterapia das Águas Minerais do Estado do Rio de Janeiro
Em relação às águas radioativas, há controvérsia so- CAETANO, L.C. A Política de Água Mineral: uma pro-
bre os seus efeitos benéficos ou não para a saúde, de- posta de integração para o Estado do Rio de Janeiro.
pendendo da linha seguida pelos médicos. Os ortomole- 2005. 329 p. Tese (Doutorado em Ciências) - Instituto
culares e crenologistas fazem sua defesa desde que utili- de Geociências, Universidade Estadual de Campi-
zada devidamente supervisionada, enquanto os alopatas nas, Campinas, 2005.
mostram precaução em relação aos efeitos da radiação. DEPARTAMENTO NACIONAL DE PRODUÇÃO
Segundo Mourão (1992), renomado médico crenolo- MINERAL - DNPM. Código de Águas Minerais: De-
gista, em seu livro “Medicina Hidrológica”, o Estado do Rio creto-Lei nº 1.985, de 29-1-1940. 3.ed. Rio de Janei-
de Janeiro apresenta três categorias principais de fontes ro, 1966.
hidrominerais incluídas no Código Brasileiro de Águas Mi- DUHOT, E.; FONTAN, M. Le Thermalisme. Paris : Presses
nerais: (a) radioativas; (b) alcalino-terrosas bicarbonata- Universitaires de France, 1963. 126 p.
das; e (c) carbogasosas. Uma menção especial é feita FALCÃO, H., 1978. Perfil analítico de Águas Minerais. Rio
para a Água Iodetada de Pádua, considerada uma água de Janeiro : DNPM, 1978. v. 2 (Boletim DNPM, 49).
rara por conter Iodo em concentração que permite o seu FRANGIPANI, A. Origem das Águas Minero-Medicinais.
emprego terapêutico em doenças do aparelho circulatório, In: TERMALISMO no Brasil. [S.l.]:Sociedade Brasilei-
especialmente arteriosclerose e hipotireoidismo. ra de Termalismo- Minas Gerais, 1995.
HIDROMINAS. As estâncias hidrominerais do Estado de
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Minas Gerais: divisão e considerações gerais. Belo
Horizonte, 1969.
ANDRADE JUNIOR, J. F. Águas minerais brasileiras. Mi- LOPES, R. S. Águas minerais do Brasil: composição, va-
neração Metalurgia, Rio de Janeiro, v. 2, n. 9, 1937 . lor e indicações terapêuticas. 2.ed. Rio de Janeiro :
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DA INDÚSTRIA DE ÁGUAS Serviço de Informação Agrícola, 1956. 148 p.
MINERAIS - ABINAM. Tipos e características de MARTINS, A. M.; MANSUR, K. L.; ERTHAL, F.;
águas minerais. INFORME ABINAM, v. 2, n 18, 1996. MAURÍCIO, R. C.; PEREIRA FILHO, J. C.; CAETANO,
o
– 166 –
Aderson Marques Martins
Figura 3 – Mapa geológico do Estado do Rio de Janeiro e a localização das principais fontes de águas minerais
– 167 –
Crenoterapia das Águas Minerais do Estado do Rio de Janeiro
Tabela 3 – Propriedades terapêuticas de algumas águas minerais(Lopes, 1956; Untura Filho, 1995; ABINAM, 1996).
– 168 –
José Luiz Marmos
AVALIAÇÃO DO NÍVEL DE
CONTAMINAÇÃO DAS
ÁGUAS SUBTERRÂNEAS DA
CIDADE DE PARINTINS,
AMAZONAS, BRASIL
José Luiz Marmos, joseluiz@ma.cprm.gov.br
Carlos José Bezerra de Aguiar, carlos_aguiar@ma.cprm.gov.br
Serviço Geológico do Brasil – CPRM/MA
– 169 –
Avaliação do Nível de Contaminação das Águas Subterrâneas da Cidade de Parintins, Amazonas, Brasil
por estudos de laboratório, como agentes cancerígenos 0,3 mg/L e cloreto 1,2 mg/L. O que contribui efetivamen-
potenciais (Cortecci, 2003; Freitas et al., 2001). te para essa homogeneidade é o período do ano em que
Por meio do estudo das características físicas de di- se procedeu à coleta, período de cheias na região,
versos poços, públicos e particulares, aliado a análises quando as águas do canal principal do rio Amazonas in-
químicas e medidas instantâneas de parâmetros físi- vadem todas as zonas rebaixadas e se misturam com as
co-químicos (pH e condutividade elétrica) de amostras águas dos lagos, furos e paranás da ilha e seu entorno,
de água superficial e subterrânea, foi avaliada a intensi- diluindo eventuais contaminações superficiais localiza-
dade da contaminação e propostas soluções para a ate- das.
nuação do problema. Com relação às águas subterrâneas, foram amos-
trados 33 poços tubulares, sendo 28 na zona urbana e 5
MATERIAIS E MÉTODOS na zona rural (Figura 1). Os resultados revelam que dos
18 poços do sistema público apenas dois apresentam
Os trabalhos de campo e laboratório, desenvolvidos águas com teores de alumínio (<0,2 mg/L), nitrato (<10
entre abril e maio de 2005, constaram basicamente das mg/L) e amônia (<1,5 mg/L) que obedecem ao estabele-
seguintes atividades: cido pela legislação (BRASIL, 2004). Os demais mos-
· Reconhecimento fluvial ao longo de todo o perí- tram concentrações de nitrato variando de 11 a 49 mg/L,
metro da ilha, objetivando caracterizar as feições alumínio de 0,3 a 2,0 mg/L e amônia até 2,9 mg/L. Tam-
naturais e antrópicas mais marcantes da orla, bém registram teores elevados de nitrato e alumínio três
como: geologia, declividade dos barrancos, tipo poços de órgãos públicos e dois particulares.
de solo, vegetação, intensidade da ocupação an- Foi possível separar os poços amostrados na zona
trópica, etc. urbana em duas categorias, de acordo com suas profun-
· Cadastramento dos principais poços tubulares e didades: maiores e menores que 65 metros; os primeiros
cacimbas existentes nas zonas urbana e rural, re- revelam teores de nitrato e/ou Al sempre de acordo com
gistrando-se os seguintes parâmetros: cota da a legislação, enquanto que nos demais a situação é inver-
boca do poço; profundidade; nível estático das sa. Portanto, essa contaminação está fortemente associa-
águas; nível dinâmico; vazão; posição dos filtros, da com a profundidade dos poços. Também se nota que
perfil litológico, etc. as águas dos poços mais rasos são sempre mais ácidas
· Coleta de amostras de água subterrânea e de su- que as dos mais profundos (Figura 2), o que sugere uma
perfície para envio a laboratórios onde foram de- correlação inversa entre os valores de pH e os teores de
terminados os seguintes elementos/íons: nitrato, que se torna evidente quando se leva em conta so-
- As, Al, Ba, Bi, Ca, Cd, Co, Cr, Cu, Fe, K, Li, Mg, mente os poços contaminados (Figura 3).
Mn, Na, Ni, Pb, Sb, Se, Sn, V, Zn, analisados no A correlação da acidez das águas com o nitrato é
laboratório da Universidade Católica de Brasí- explicada pela própria origem desse íon, que representa
lia, por ICP-MS; o estágio final da oxidação da matéria orgânica. Os resí-
- cloreto, amônio, nitrato, nitrito, sulfato e sílica, duos de produtos provenientes de esgotos são ricos em
analisados no laboratório do Instituto Nacional nitrogênio e se degradam em nitratos na presença de
de Pesquisas da Amazônia – INPA. oxigênio, de acordo com o ciclo nitrogênio orgânico >
· Medição instantânea, por meio de um kit de sen- amônia > nitrito > nitrato:
+ - +
sores digitais, de parâmetros que caracterizam NH4 + 3/2 O2 ? NO2 + H2O + 2H e
- -
preliminarmente a água amostrada: pH, condutivi- NO2 + 1/2 O2 ? NO3 ; ou, simplificadamente:
+ - +
dade elétrica e temperatura. NH4 + 3/2 O2 ? NO3 + 4H (a produção de nitrato
· Perfurações a trado, em terrenos de órgãos públi- gera elevação da acidez)
cos, próximo a poços, para a coleta de amostras A causa dos altos teores de nitrato nos poços mais
de solos em profundidade e determinação do ní- rasos da zona urbana de Parintins está ligada à falta de
vel estático das águas. um sistema de captação e tratamento dos esgotos na ci-
dade, o que leva à infiltração dos resíduos líquidos des-
DISCUSSÃO DOS RESULTADOS ses esgotos, despejados em fossas ou a céu-aberto, até
os níveis superiores do aqüífero, contaminando-o. Um
Distribuídas ao redor e no interior da ilha de Parintins exemplo marcante desse fato pode ser observado na
foram coletadas seis amostras de águas correntes. Os Estação de Bombeamento Paraíba, cujo terreno, onde
resultados obtidos indicam boa homogeneidade nas ca- se situam diversos poços, além de ser rebaixado, é lade-
racterísticas físico-químicas dessas águas: pH entre 6,1 ado por um sistema de palafitas, em que os moradores
e 6,5; condutividade elétrica entre 41 e 50 µS/cm; teores despejam todos seus dejetos diretamente em um canal
de nitrato e Al abaixo de 0,1 mg/L; amônia em torno de superficial que se comunica com o Lago da Francesa
– 170 –
José Luiz Marmos
Figura 1 – Imagem de satélite com localização da ilha de Parintins, dos poços cadastrados e das amostras de água coletadas.
– 171 –
Avaliação do Nível de Contaminação das Águas Subterrâneas da Cidade de Parintins, Amazonas, Brasil
4,4 250 25
4,3
4,1 150 15
pH
4 100 10
3,9
50 5
3,8
3,7 0 0
Menos que 65m Mais que 65m Menos que 65m Mais que 65m Menos que 65m Mais que 65m
Prof. dos poços Prof. dos poços Prof. dos poços
Figura 2 – Comparação entre os valores médios de pH, condutividade, e teores de nitrato para os dois níveis de profundidade definidos para os
poços amostrados na zona urbana.
r = -0.80
4,15
por desencadear a contaminação por alumínio. Sabe-se
4,10 que este metal é um elemento muito pouco móvel na faixa
4,05 de pH de 4,0 a 8,0, típica dos ambientes naturais. Portan-
4,00
to, dificilmente é liberado, como espécie iônica, para o
meio aquoso, ficando retido na fase sólida, sob a forma de
3,95
argilominerais. Porém em águas com pH abaixo de 4,0,
como ocorre em diversos poços amostrados, e com altas
pH
3,90
– 172 –
José Luiz Marmos
2,4
r = 0.87 necessidade atual de Parintins, já consideradas as per-
das do sistema (30%), é de aproximadamente 17.000
2,2 3
m /dia de água. Os 12 poços que restariam no sistema
2,0
público, segundo dados atualizados de vazão, podem
1,8 3
produzir diariamente mais de 18.000 m .
1,6
Como medidas de curto a médio prazo sugere-se a
1,4
desativação gradual dos poços da Estação Paraíba, de-
Al (mg/L)
1,2
vido à sua precária localização (terreno rebaixado, sujei-
1,0 to a alagamentos, e ladeado por canais de esgoto a céu
0,8 aberto), e dos poços mais rasos (PT-10, PT-14 e PT-16)
0,6 da Estação SHAM. Ao mesmo tempo, trabalhando com
0,4 um horizonte futuro de 100.000 habitantes na ilha (ne-
3
0,2 cessidade de produção de 26.000 m diários de água),
0,0 recomenda-se a abertura de cinco novos poços tubula-
0 10 20 30 40 50 60
Nitrato (mg/L)
res, cada um com pelo menos 100 metros de profundi-
dade e cimentação até 50 metros, sendo 2 na Estação
Figura 5 – Forte correlação positiva entre os teores de nitrato e os SHAM e 3 no Itaúna, o que totalizaria 10 poços de abas-
teores de alumínio nas águas subterrâneas de Parintins. tecimento público, que produziriam cerca de 14.000
3
m /dia de água.
Como medida complementar para suprir as neces-
Dos metais pesados analisados nas amostras de sidades desses 100.000 habitantes e, muito importante,
águas subterrâneas, nenhum registrou teores acima dos diminuir a acidez natural das águas subterrâneas, suge-
valores máximos permitidos. Nos poços amostrados na re-se a instalação de uma Estação de Captação e Trata-
zona rural, apesar das baixas profundidades, não há si- mento de Água Superficial (ETA), no rio Amazonas, com
3
nal de contaminação química. capacidade de fornecer pelo menos 15.000 m /dia de
água tratada, com pH em torno de 6,0-6,5, a qual seria
CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES misturada com as águas ácidas dos poços.
Não menos importante, visando evitar futuras conta-
A maior parte dos poços de abastecimento público minações dos recursos hídricos, é fundamental que se
em Parintins produz águas com composição química busquem recursos para implantação de um sistema de
que não obedece à legislação pertinente, destacan- esgotamento sanitário, acoplado a uma Estação de Trata-
do-se contaminação por nitrato, amônia e alumínio. As mento (ETE), que abranja toda a zona urbana de Parintins.
altas concentrações de nitrato devem-se à precariedade
do saneamento básico na cidade, com ausência de um REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
sistema de esgotamento sanitário.
O aqüífero da ilha de Parintins comporta águas que BRASIL. Ministério da Saúde. Portaria n 518, de 25 mar.
o
possuem naturalmente uma destacada acidez (pH 4,0 a 2004. Brasília: 2004.
4,5), o que, por si só, já é um fato muito preocupante em CARVALHO, I. G. Fundamentos da Geoquímica dos Pro-
termos de saúde pública. Essa acidez se acentua ainda cessos Exógenos. Salvador : Bureau Gráfica e Edito-
mais nos poços com altos teores de nitrato, possibilitan- ra , 1995.
do condições para a mobilização do alumínio, contido CORTECCI, G. Geologia e Salute. Disponível em:<
nas partículas do solo, para o meio aquoso, gerando um http://www.dst.unipi.it/fist/salute/salute.htm.>. Aces-
misto de contaminação natural e antrópica. so em: 10 de outubro de 2003.
Como medida imediata foi recomendada a paralisa- FREITAS, M. B.; BRILHANTE, O. M.; ALMEIDA, L. M.
ção do bombeamento dos seis poços públicos com mai- Importância da análise de água para a saúde públi-
ores níveis de contaminação: PT-6, PT-17, PT-22, PT-11, ca em duas regiões do Estado do Rio de Janeiro: en-
PT-20 e PT-19. A entrada em operação de dois poços, foque para coliformes fecais, nitrato e alumínio. Ca-
com 80 metros de profundidade e boas vazões, na Esta- dernos Saúde Pública, Rio de Janeiro, v. 17, n. 3, p.
ção Itaúna, suprirá a ausência dos poços paralisados. A 651-660, 2001.
– 173 –
Caracterização Geoquímica das Águas de Sistema de Abastecimento Público da Amazônia Oriental
CARACTERIZAÇÃO
GEOQUÍMICA DAS ÁGUAS
DE SISTEMA DE
ABASTECIMENTO PÚBLICO
DA AMAZÔNIA ORIENTAL
– 174 –
Edesio M. Buenano Macambira
Figura 1 – Mapa de localização dos trabalhos executados pelo PEGAGEM Belém na coleta de água de abastecimento público.
– 175 –
Caracterização Geoquímica das Águas de Sistema de Abastecimento Público da Amazônia Oriental
d’água e na faixa litorânea Atlântica (Faraco et al., drica e/ou alimentar (verminose, hepatite, diarréia, etc.)
2004). atingem altos índices de incidência (DATASUS).
O rio Amazonas e seus maiores afluentes constitu-
em o principal sistema hidrográfico da região de traba- RESULTADOS OBTIDOS
lho. No Amapá, destacam-se os rios Oiapoque e Ara-
guari e no Maranhão-Piauí o sistema Gurupi/Parnaíba. Para os cálculos estatísticos foi utilizado o programa
Os mais altos níveis de densidades populacionais Statistic e para os mapas o software ArcView 3.2. Nas in-
estão situados na porção oriental da região de trabalho, terpretações dos resultados foram utilizados os padrões
destacando-se ainda a borda sul e determinados tre- (concentrações máximas dos elementos químicos em
chos ao longo dos principais cursos d’água e das rodo- água para consumo humano) determinados pelo Conse-
vias. Nas demais regiões predomina um grande vazio lho Nacional do Meio Ambiente (Resolução CONAMA
demográfico, particularmente na margem esquerda do 357, de 17 de março de 2005) e pelo Ministério da Saúde
rio Amazonas. Conseqüentemente, nas regiões onde (Portaria 518 de 29 de março de 2004), e os valores reco-
há maiores concentrações humanas, estão implanta- mendados pela OMS (Organização Mundial da Saúde -
das as principais atividades econômicas: mineração, World Health Organization - WHO, 2004).
metalurgia, indústria madeireira, agropecuária, pesca e
comércio. Bloco I – Nordeste do Pará
A área de trabalho apresenta um precário sistema Este bloco abrange cerca de 50.000 km2, sendo de
de saneamento básico, até mesmo nas grandes cida- aproximadamente 80% na região nordeste do Pará e o
des. A malária, a hanseníase e a leichimaniose são endê- restante na porção noroeste do Maranhão (Figura 2).
micas na região e numerosas doenças de veiculação hí- Trata-se da região mais densamente povoada do Estado
Figura 2 – Mapa geológico simplificado do Bolco I - Nordeste do Pará (CPRM/Projeto GIS do Brasil, Faraco et al. 2004).
– 176 –
Edesio M. Buenano Macambira
do Pará, servida por uma boa infra-estrutura logística e Os pontos de amostragem podem ser observados
com a economia baseada nas atividades agropecuárias na figura 2. Dos 31 elementos e compostos químicos
e pesqueiras. analisados o As (< 0,01 mg/L), Mo (< 0,005 mg/L), Se
Sob o ponto de vista geológico a maior porção do (<0,02 mg/L), V (< 0,02 mg/L), Be (< 0,001 mg/L) e NO2
Bloco I é ocupada pelo Grupo Barreiras (arenitos, siltitos e (= 0,1 mg/L) apresentaram os resultados abaixo do limite
argilitos). Na região do Gurupi estão presentes o Cráton de detecção do método analítico e, portanto, não foram
de São Luís (granitóides e seqüência metavulca- submetidos a cálculos estatísticos. Os elementos Cd (<
no-sedimentar) e o Cinturão Gurupi (seqüência metavul- 0,001 mg/L), Co (< 0,002 mg/L), Cr (0,02 mg/L), Ni (0,004
cano-sedimentar). Distribuídas na região de trabalho ain- mg/L), Ti (0,05 mg/L) e o PO4 (0,2 mg/L) também tiveram
da ocorrem as unidades sedimentares Arenito Guamá e mais de 90% dos seus resultados abaixo do limite de de-
Formação Itapecuru e granitóides intrusivos (Tracuateua, tecção do método analítico, sendo interpretados apenas
Nei Peixoto, Cantão, Japiim, Oca, etc.). Ao longo dos prin- visualmente. Os demais elementos foram submetidos a
cipais cursos d’água e na costa litorânea desenvolve-se cálculos estatísticos cujos principais parâmetros cons-
uma cobertura de sedimentos quaternários (Figura 2). tam da tabela 1.
– 177 –
Caracterização Geoquímica das Águas de Sistema de Abastecimento Público da Amazônia Oriental
Com base nas informações dos parágrafos acima, · Enquadrando-se os valores anômalos no contexto
são apresentadas as seguintes considerações: geológico observa-se que as anomalias geoquímicas
· As unidades sedimentares representadas pelo Gru- encontram-se nos 4 domínios mapeados. O Domínio
po Barreiras, Formação Itapecuru, Arenito Guamá e Sedimentar é o que abrange o maior número de amos-
Aluviões Quaternários constituem os maiores aqüífe- tras anômalas, possivelmente em decorrência de sua
ros da região, em razão da grande extensão territori- maior abrangência territorial. Salienta-se que, em ter-
al, espessura e índice de permo-porosidade. Nas mos regionais, as curvas do background para Al e Pb
demais unidades (Domínio dos Granitóides, Cintu- apresentam uma tendência segundo NNW, acompa-
rão Gurupi e Cráton de São Luís) o potencial dos nhando a direção do Cinturão Gurupi.
aqüíferos é restrito, estando limitado a zonas de fra-
turas (Figura 2). Bloco II – Pará-Maranhão / Bloco III – Tocantins-Piauí
· Entre os elementos analisados, o As, Ba, Be, Ca, Co, A área de pesquisa ocupa cerca de 9.300 km2, sen-
Cr, Li, Mg, Mo, Na, Ni, Se, Sr, Ti, V, Cl e F, e os compos- do de aproximadamente 2/3 no Estado do Maranhão e o
tos NO2, e SO4 tiveram seus resultados na faixa de valo- restante no Tocantins (Figura 1). Caracteriza-se por ser
res considerados como compatíveis para consumo uma região relativamente povoada (25 a 100 hab/km2),
humano segundo os padrões fornecidos pelo servida por uma boa infra-estrutura logística e com a
CONAMA, MS e OMS mencionados anteriormente. economia baseada nas atividades agropecuárias.
· O Al, B, Cd, Cu, Fe, K, Mn, Pb, Zn e PO4 apresentaram Localiza-se na porção noroeste da Bacia do Parnaí-
resultados mais elevados do que os dos padrões aci- ba (Figura 4). A mais antiga unidade estratigráfica é a
ma referidos, indicando a impropriedade para consu- Formação Mosquito (Jurássico), constituída por derra-
mo humano. mes basálticos. Sobrejacente observa-se a Formação
· Em cerca de 80% da área de trabalho, o Al e o Pb apre- Corda (Jurássico), que é a unidade de maior extensão
sentaram valores impróprios para o consumo humano territorial e representada por arenitos e folhelhos verme-
(Al = 0,1 mg/L; Pb = 0,01 mg/L). O mais elevado teor lhos. Estratigraficamente, acima se verificam as forma-
de Al foi de 1,8 mg/L, o que corresponde a 18 vezes o ções Grajaú e Codó, de idade cretácea (interdigitadas).
limite máximo permitido, e para o Pb, o mais alto valor A Formação Grajaú é constituída por arenitos, enquanto
foi de 1,45 o qual é 145 vezes o limite tolerado. Não se a Codó, por folhelhos, calcários e arenitos. Segue-se a
observa uma perfeita correspondência entre a distri- Formação Itapecuru, de idade cretácea, constituída por
buição geográfica dos dois elementos (Figura 3). arenitos e argilitos. Na porção nordeste da região de tra-
· Os valores de Cu impróprio para o consumo humano balho desenvolve-se uma cobertura detrítica e/ou lateríti-
(> 0,009 mg/L) ocupam cerca de 60% da área de tra- ca, enquanto que ao longo dos principais cursos d’água
balho, particularmente a porção oriental (Figura 3). estão presentes depósitos aluvionares.
· A água de abastecimento público da porção ocidental Foram coletadas 10 amostras de água do sistema
da área (Figura 3) está caracterizada por valores de Fe de abastecimento público (Figura 4).
superiores ao limite permitido para o consumo humano Os trabalhos de campo e os resultados analíticos
(0,3 mg/L). permitem as seguintes considerações:
· O Zn, B, Mn e K apresentaram pequenas áreas com · Cerca de 80% da região de trabalho é constituída por
teores impróprios para o consumo humano. Estas áre- unidades sedimentares, destacando-se como exce-
as apresentam-se dispersas na região de trabalho e lentes aqüíferos as formações Corda, Itapecuru e Gra-
aparentemente não existe correlação entre os citados jaú.
elementos. · Os elementos B, Be, Ca, Co, Cr, Fe, K, Li, Mg, Mn, Mo,
· O Cd e o PO4 apresentaram valores pontuais distribuí- Na, Ni, Pb, Sr, SO , Zn, F e Cl apresentaram os resulta-
4
dos por toda região trabalhada neste Bloco. Para o Cd dos abaixo do valor máximo permitido para consumo
detectou-se 3 amostras com valores de 0,002 mg/L, os humano segundo as legislações ambientais brasileiras
quais são superiores ao permitido para o consumo hu- vigentes.
mano (0,001 mg/L). Também foram observados teores · O Ba foi o elemento que apresentou o maior número
de 0,7 mg/L e 0,9 mg/L de PO4. Estes valores são su- de amostras com teores impróprios para consumo
periores ao limite permitido para consumo humano humano.
(0,1mg/L). · O Al apresentou todos os resultados iguais ao limite in-
· Com relação ao pH, observou-se que 90% dos valores ferior do método analítico (0,1 mg/L), o qual coincide
ficaram entre 4 e 6, caracterizando águas ácidas a le- com o teor máximo permitido para o consumo humano,
vemente ácidas. Apenas em 8 amostras foram verifica- exceto uma amostra coletada em Imperatriz que apre-
dos valores entre 6 e 7,5, dentro da faixa de pH sentou 0,2 mg/L. Coincidência semelhante foi verifica-
aceitável pelo CONAMA (6 a 9). da para o As, Cd, Cu, Se, V, Br e PO .4
– 178 –
Edesio M. Buenano Macambira
Figura 3 – Vaviação do conteúdo de Pb, Al, Fe, Cu, Zn, Mn, B e K nas águas de sistema de abastecimento público no Bloco I
- Nordeste do Pará.
– 179 –
Caracterização Geoquímica das Águas de Sistema de Abastecimento Público da Amazônia Oriental
Figura 4 – Mapa Geológico da região do sul do Tocantins e oeste do Maranhão (CPRM/Projeto GIS do Brasil, Faraco et al . 2004).
· Das amostras coletadas nas sedes municipais, ape- mia baseada nas atividades agropecuárias. Possui bai-
nas a de Ribamar Freire não se verificou concentra- xa densidade populacional (2 a 5 hab/km2).
ções impróprias para o consumo humano. Baseado nos trabalhos realizados pode-se estabe-
· Plotando-se os pontos amostrados com os seus res- lecer as seguintes considerações:
pectivos resultados, cujos valores mostraram-se im- · Os teores dos elementos B, Ba, Ca, Co, Cr, Fe, K, Li,
próprios para consumo humano, na base geológica, Mg, Mn, Mo, Na, Ni, Pb, Sr, V, Zn, Be, F, Cl, e SO4 apre-
não se observa evidente correspondência entre os ele- sentaram resultados abaixo dos limites estabelecidos
mentos com as várias unidades estratigráficas. para o consumo humano.
· Apesar de estar abaixo dos valores máximos permiti- · Em todas as amostras, os resultados do Al, As e Cd
dos pelas legislações ambientais, a água de abasteci- apresentaram teores que coincidem com o limite inferi-
mento do município de Itaguatins ao ser fervida or analítico e com o teor máximo permitido pela Reso-
precipita um pó branco no fundo da panela de alumí- lução CONAMA 357/2005 e da Portaria 518/2004 do
nio. Este material foi analisado na UFPA fornecendo MS.
como resultado principalmente Aragonita (69%), Cal- · Os teores de Cu, Se, Br e PO4 são superiores aos per-
cita magnesiana (9%) e Cesarolita (8%). mitidos para consumo humano.
· De uma maneira geral, os teores observados nas
Bloco V – Altamira amostras de água nas duas sedes municipais são se-
Neste Bloco foram coletadas apenas 2 amostras de melhantes, particularmente para os elementos cujos
água de abastecimento. A área trabalhada localiza-se valores estão acima dos padrões permitidos.
na Bacia do Baixo Amazonas, particularmente no domí-
nio da Formação Altér do Chão (Cretáceo-Terciário). Li- Bloco Ix - Santarém
tologicamente é semelhante ao Grupo Barreiras e está Os trabalhos de amostragem (4 amostras) foram
representada por intercalações de arenitos, siltitos e ar- executados em parceria com o Projeto HIBAM. A região
gilitos. Exibe uma alta permo-porosidade em razão do de trabalho situa-se na zona limítrofe do estado do Pará
que constitui um excelente aqüífero. A região de pesqui- com o Amazonas. As amostras coletadas situam-se na
sa localiza-se na margem direita do rio Tocantins, apre- Bacia do Médio Amazonas, particularmente no domínio
sentando uma boa infra-estrutura logística com a econo- dos Aluviões Quaternários dos rios Amazonas e Tapajós.
– 180 –
Edesio M. Buenano Macambira
Trata-se de sedimentos arenosos e argilosos, com eleva- Com os resultados alcançados pode-se concluir:
da permo-porosidade e constituem excelentes aqüífe-
ros. Entre as sedes municipais amostradas, Santarém 1. Bloco I
destaca-se pelo maior desenvolvimento populacional e Com relação ao Bloco I, os resultados analíticos mos-
econômico. Entretanto, todos os municípios apresentam traram que os elementos As, Ba, Be, Ca, Co, Cr, Li, Mg,
uma boa infra-estrutura logística, a economia baseada Mo, Na, Ni, Se, Sr, Ti, V, Cl e F, e os compostos NO2, e SO4
nas atividades agropecuárias e possuem uma baixa apresentaram concentrações abaixo dos valores permiti-
densidade populacional. dos para consumo humano (Resolução CONAMA
Baseado nos resultados analíticos pode-se emitir as 357/2005, Portaria MS 518/2004 e/ou pela WHO/1993). O
seguintes considerações: Al, B, Cd, Cu, Fe, K, Mn, Pb, Zn e PO4 apresentaram teo-
· Os teores dos elementos B, Ba, Ca, Co, Cr, Fe, K, Li, Mg, res mais elevados do que os dos padrões acima mencio-
Mn, Mo, Na, Ni, Sr, V, Zn, Be, F, Cl, e SO4 estavam abaixo nados, indicando impropriedade para consumo humano.
dos limites estabelecidos para consumo humano. Destes elementos, em relação à toxicidade, desta-
· Para o As e o Cd, os teores encontrados são coinci- cam-se o Al e o Pb, que apresentaram, respectivamente,
dentes com os limites estabelecidos pelas legislações teores de até 18 vezes e 145 vezes o valor máximo per-
ambientais para consumo humano e com o limite inferi- mitido pelas legislações ambientais. Na literatura pes-
or analítico. quisada, não existem citações sobre valores tão eleva-
· Na maioria das amostras, os elementos Al, Cu, Pb, Se, dos de Pb em águas de abastecimento. Estes elementos
Br e PO4 apresentaram teores superiores aos permiti- ocorrem em cerca de 80% da região de trabalho, entre-
dos para consumo humano. tanto não apresentam uma boa correlação geoquímica
· Verificou-se que todas as amostras coletadas apre- entre si. Também os elementos Fe e Cu mostraram con-
sentaram teores impróprios para consumo humano centrações acima do permitido para consumo humano.
para os elementos Se, PO4 e Br, porém a amostra cole- A grande abrangência areal, aliada à ordem de
tada em Santarém apresentou o maior número de ele- grandeza dos resultados de Al, Pb, Fe e Cu, nos permite
mentos nocivos à saúde, pois além dos citados, supor uma origem natural para os teores encontrados.
verificou-se também o Al e o Pb. Em Curuá o teor de Cu Os demais elementos (Zn, B, Mn, K, Cd, e PO4) distribu-
encontrado é superior ao valor máximo permitido para em-se em pequenas áreas ou apresentam valores pon-
o consumo humano. tuais, o que pode sugerir também possível contamina-
ção de origem antrópica.
CONSIDERAÇÕES E CONCLUSÕES As medidas de pH apresentaram valores de 4 a 6,
indicando uma natureza ácida, em cerca de 90% da
As quatro áreas trabalhadas fornecem uma boa re- área de trabalho. Estes valores são considerados como
presentatividade dos sistemas ambientais e hidrogeoló- impróprios para o consumo humano e podem estar rela-
gicos da região Amazônica, visto que foram abordados cionados à intensa decomposição de substâncias orgâ-
os principais aqüíferos: Formações Corda, Grajaú, Codó nicas e aos elevados índices de pluviosidade, evapo-
e Itapecuru, na Bacia do Parnaíba; Formação Altér do transpiração e lixiviação regionais.
Chão na Bacia do Amazonas; e Grupo Barreiras, Forma- A cidade de Augusto Correa foi a que apresentou o
ção Itapecuru, Arenito Guamá e Aluviões Quaternários maior número de elementos nocivos à saúde (Al, Pb, Cu
Marinhos e Fluviais. Fe, Zn B e Cd). Em segundo plano destacam-se as cida-
A economia dessas regiões está baseada principal- des de Cachoeira do Piriá (Pb, Cu, Zn), e Boa Vista do
mente nas atividades agrícolas, na pecuária, na pesca e Gurupi (PO4 e Mn).
na extração de produtos da floresta. A densidade popu-
lacional é inferior a 100hab/km2. Predominam na região 2. Bloco II e III
doenças endêmicas de veiculação hídrica e alimentar, Os resultados analíticos do Bloco II e III demonstra-
como as verminoses, doenças do aparelho digestivo e ram que os teores de B, Be, Ca, Co, Cr, Fe, K, Li, Mg, Mn,
cáries dentárias. Observam-se também freqüentes ca- Mo, Na, Ni, Pb, Sr, SO4, Zn, F e Cl estavam adequados ao
sos de anemia, hepatite, malária e subnutrição. consumo. Os elementos Al, As, Ba, Cd, Cu, Se, V, Br e
Os sistemas de abastecimento geralmente são PO4 apresentaram concentrações impróprias para o
constituídos de poços tubulares rasos (<100m). Em al- consumo humano, sendo que o Ba foi o elemento que
guns casos a água utilizada pela população é canaliza- apresentou o maior número de amostras com teores aci-
da diretamente dos rios. Na maioria dos municípios a ma do permitido pelas legislações ambientais. Entre as
água que é fornecida à população não passa por qual- cidades onde se coletou as amostras de água de abas-
quer tratamento, e em alguns poucos municípios é reali- tecimento, apenas Ribamar Freire não apresentou teores
zada cloração. impróprios para consumo humano.
– 181 –
Caracterização Geoquímica das Águas de Sistema de Abastecimento Público da Amazônia Oriental
mado o valor encontrado por ICP/AES; em conseqüência março de 2004. Diário Oficial [da] República Federa-
disto descarta-se a possibilidade de erros analíticos. Nos tiva do Brasil, Poder Executivo, Brasília, DF, 26 mar.
pontos amostrados não se observou a presença de lixões, 2004. Seção I, p.266.
indústrias, esgotos ou outras fontes de contaminação, o BRASIL. Ministério do Meio Ambiente. CONAMA. Reso-
que reduz a possibilidade de uma contaminação ambien- lução No 357 de 17 mar. 2005. Disponível em:
tal pontual. Em face do exposto acredita-se que os eleva- <http://www.mma.gov.br/port/conama/res/
dos teores de diversos elementos encontrados nos siste- res05/res35705.pdf>. Acesso em: janeiro 2006.
mas de abastecimento público estejam relacionados a as- FARACO M.T.L.; MARINHO P.A.C.; VALE A.G. Folha SC.22
pectos naturais, em particular a fatores hidrogeológicos. – Tocantins. In: SCHOBBENHAUS C., GONÇALVES,
No Bloco I, onde foi realizado o maior volume de tra- J.H.; SANTOS, J.O.S.; ABRAM, M.B.; LEÃO NETO, R.;
balho, o principal aqüífero é o Grupo Barreiras, litologi- MATOS, G.M.M.; VIDOTTI, R.M. (Eds.). Carta Geológi-
camente constituído por arenitos, siltitos e argilitos, com ca do Brasil ao Milionésimo. Programa Levantamentos
intercalações de lentes ricas em matéria orgânica. De Geológicos Básicos do Brasil. Brasília : CPRM-SGB,
acordo com os recentes estudos de Miranda (2004) a 2004. 41 CD-ROM, CD-ROM 22/41.
área-fonte desses sedimentos seriam a Faixa Tocan- MIRANDA, L. da C.P. Proveniência de arenitos da Formação
tins-Araguaia, a Província Borborema com seus comple- Barreiras (Mioceno), região de Ipixuna, com base em
xos gnáissicos e migmatíticos, o Grupo Gurupi com os análise de minerais pesados e datação de grãos de zir-
granitóides paleoproterozóicos e o Terreno Granito-Gre- cão por evaporação de chumbo. 2004. 1 CD-ROM. Tra-
enstone de Rio Maria, e a Província Carajás, com seus balho de Conclusão de Curso - Centro de Geociências,
granitóides e complexos gnáissicos e migmatíticos. To- Universidade Federal do Pará, Belém, 2004.
dos os elementos (Al, B, Cd, Cu, Fe, K, Mn, Pb, Zn e P) WHO-WORLD HEALTH ORGANIZATION. 2004. Guidelines
que apresentaram teores acima do permitido pelas le- for Drinking-Water Quality. 3ed., v.1. Disponível
gislações são passíveis de serem provenientes das em:<http://www.who.int/water_sanitation_health/ dwq/>.
áreas-fontes mencionadas. Assim acredita-se que esses Acesso em: abril 2005.
– 182 –
Sergio João Frizzo
ELEMENTOS QUÍMICOS
EM ÁGUAS DE
ABASTECIMENTO PÚBLICO
NO ESTADO DO CEARÁ
Sergio João Frizzo; frizzo@fo.cprm.gov.br
Serviço Geológico do Brasil – CPRM/FO
– 183 –
Elementos Químicos em Águas de Abastecimento Público no Estado do Ceará
tribuição das águas superficiais do tipo Bicarbonatadas nos de variada composição mineral e, em geral, desfa-
Mistas e Bicarbonatadas Sódicas, ocorrendo ao norte e voráveis à circulação da água subterrânea, que se faz
sul do estado e na região próxima a Fortaleza, respecti- por sistemas de fraturamentos, com elevado conteúdo
vamente; Cloretadas Mistas que ocorrem na porção cen- de sais dissolvidos.
tral do território estadual, estendendo-se em uma faixa Nos cursos de água superficiais é esperado que a
até o litoral norte e outra até quase o litoral nordeste; Clo- composição da água tenha a contribuição de material
retadas Sódicas e Mistas Sódicas com ocorrência na solubilizado de toda a bacia hidrográfica a montante do
porção centro-oeste do estado. A potabilidade (calcula- ponto de coleta, e que tenha uma variação sazonal (por
da em função da concentração dos principais cátions e diferenças no fluxo, pluviosidade variável na área de in-
dureza) é boa, com exceção de uma pequena bacia no fluência etc.) mais importante do que aquela verificada
alto rio Banabuiú e com restrição nas proximidades da na água subterrânea. Das captações amostradas em
foz do rio Jaguaribe, de maior salinidade. Para irrigação, rios, a maior freqüência é verificada nas faixas de areias,
as águas são impróprias na região central do estado, cascalhos e argilas inconsolidados do Quaternário, de-
nos rios Quixeramobim e alto Banabuiú, e próximo da foz pósitos aluvionares dos próprios rios que se encontram
do rio Jaguaribe, devido ao elevado conteúdo em sais perenizados.
dissolvidos (Figura 1a). Açudes e lagos constituem as principais fontes
Quanto às águas subterrâneas, existe a classifica- d’água de abastecimento público no estado; suas águas
ção primária da água entre doce, salobra e salgada, em também devem refletir a composição das bacias dos rios
função da concentração de sólidos totais dissolvidos que lhes dão origem, com variações intermediárias na
(STD), calculados a partir da condutividade elétrica me- composição devidas à sazonalidade climática. Encon-
dida em 7.092 poços, dentre os mais de 13.000 poços tram-se estabelecidos preferencialmente sobre terrenos
cadastrados em todo o estado, pelo Programa Recense- cristalinos constituídos por antigas rochas ígneas e sedi-
amento de Fontes de Abastecimento por Água Subterrâ- mentares afetadas por processos metamórficos: grani-
nea no Estado do Ceará, executado pelo Serviço Geoló- tos, granodioritos, orto e paragnaisses, metabásicas,
gico do Brasil - CPRM em 1999 (CPRM, 1999). Pode-se, quartzitos, micaxistos, metacalcários, filitos etc, que
a partir deles, delinear as conhecidas províncias hidro- compõem várias unidades estratigráficas posicionadas
geológicas do estado: coberturas sedimentares ceno- no Arqueano e Proterozóico.
zóicas, mesozóicas e paleozóicas ao norte (litoral), a sul
(chapada do Araripe) e a oeste (chapada da Ibiapaba - METODOLOGIA DO TRABALHO
fronteira com o Piauí), respectivamente, onde há predo-
mínio de poços com água doce, e o embasamento cris- As 184 sedes municipais e os 46 distritos visitados
talino, na ampla região central cobrindo quase todo o es- (área superior a 1.000 km2) têm em sua maioria o abas-
tado, onde dominam as águas subterrâneas salobras e tecimento de água a partir de açudes (130) e poços tu-
salgadas (Figura 1b). bulares de diversas profundidades e vazões (51), regis-
Não obstante a ampla diversidade geológica do es- trando-se ainda poços tipo amazonas (28) e captação
tado e a irregularidade na distribuição territorial dos pon- direta em rios (20) e fontes (4) (Figura. 2). Em alguns
tos de captação, condicionada por conveniências eco- dos municípios, o sistema de captação é misto, com-
nômicas, sociais ou políticas, observa-se uma lógica re- posto por poços tubulares + amazonas ou poços ama-
lação entre as litologias e os tipos de captação d’água zonas + captação direta da drenagem. A cidade de
que são adotados e que servem de abastecimento pú- Ibaretama, na época da coleta de amostras, estava
blico para as sedes municipais. sendo abastecida por carro-pipa, e em Sucatinga, dis-
Os poços tipo amazonas e tubulares são dominan- trito de Beberibe, os poços são familiares, individuais.
tes em terrenos cobertos por sedimentos inconsolida- Quando a instalação da unidade de captação é única
dos, areias, argilas e cascalhos do Quaternário. Vários ti- para vários municípios e distritos, optou-se por coletar o
pos dos poços tubulares que alimentam as sedes dos correspondente número de amostras em vários locais
municípios também são registrados no domínio de areni- desses corpos d’água, embora fora do ponto de capta-
tos e argilitos do Grupo Barreiras, do Neogeno; em areni- ção comum.
tos, siltitos e folhelhos de diversas formações geológicas As amostras foram coletadas com recipiente plásti-
mesozóicas (formações Rio Batateiras, Exu, Missão Ve- co, nos locais (poços e fontes) ou nas proximidades das
lha, Brejo Santo e Icó); e ainda em seqüências de areni- bombas de sucção (em açudes ou rios), sempre situa-
tos e conglomerados silurianos (Formação Mauriti e Gru- das antes das estações de tratamento, pré-distribuição.
po Serra Grande). A menor proporção de poços, de até Desse recipiente tomavam-se alíquotas de 50 ml em dois
60 metros de profundidade, ocorre no domínio das ro- frascos apropriados, fazendo uso de uma seringa aco-
chas cristalinas do Proterozóico e Arqueano; são terre- plada a um filtro de membrana “Millipore” de 0,45 mm,
– 184 –
Sergio João Frizzo
a) ÁGUA SUPERFICIAL 0
0
CEARÁ
BRASIL
24
0
Bicarbonatada mista
Bicarbonatada sódica
Cloretada sódica
Cloretada mista
Mista sódica
FORTALEZA
Sobral
PO TAB I LI DAD E
Boa
CEARÁ
Passável
Má
Juazeiro do Norte
IRRIGAÇÃO
Águas sem restrições à irrigação, com
pouco risco de salinidade
Águas com salinidade média. Só devem ser
usadas com boa lixiviação e drenagem
Águas com teores elevados de sais e sódio,
não devendo ser usada para irrigação
b) ÁGUA SUBTERRÂNEA
FORTALEZA
POÇOS
Fonte: CPRM - Atlas dos Recursos Hídricos Subterrâneos do Ceará. Programa Recenseamento de
Fontes de Abastecimento por Água Subterrânea no Estado do Ceará. [Cd-rom]. Fev/1999
– 185 –
Elementos Químicos em Águas de Abastecimento Público no Estado do Ceará
descartáveis, sendo uma alíquota acidulada com 10 go- as concentrações dos cátions Al, As, B, Ba, Be, Ca, Cd,
tas de HNO3 superpuro para análise dos cátions. Duran- Co, Cr, Cu, Fe, K, Li, Mg, Mn, Mo, Na, Ni, Pb, Se, Sr, Ti, V
te a etapa de campo as amostras eram mantidas sob re- e Zn e dos ânions Br, Cl, F, NO2, NO3, PO4 e SO4.
frigeração. Foram gerados mapas de distribuição geográfica
As análises dos cátions foram efetuadas por Espec- das concentrações dos elementos que apresentaram
trometria de Emissão Atômica com fonte de plasma suficiente amplitude de resultados. Nas figuras 3 e 4
(ICP-AES) nos laboratórios da CPRM e da EMBRAPA e vê-se os resultados para alguns elementos seleciona-
dos ânions, por Cromatógrafo Iônico do Instituto de Quí- dos, cujos maiores teores têm provável origem na polui-
mica da UFRJ e do Laboratório de Caracterização de ção ou contaminação e em litologias do substrato, res-
Águas da PUC, todos no Rio de Janeiro. Foram avaliadas pectivamente.
0
0
CEARÁ
BRASIL
24
0
AMERICA
DO
SUL
FORTALEZA
Sobral
9550000
Quixadá
N
Crateús 0 100 km
9350000
Poços tubulares
Poços tipo amazonas
Fontes
Iguatu Açudes e lagos
Rios
Limite de município
Juazeiro
9150000
Principais cidades
– 186 –
Sergio João Frizzo
FORTALEZA
0,020 mg/L N Sobral
açude Gavião
0,465 mg/L
açude Gavião Crateús
Quixadá
0,768 mg/L
poço tubular
Iguatu
Cd Zn
Juazeiro
Pb
599 mg/L
poço tubular
NO 3
Cl
4.012 mg/L
açude Buenos Aires
7,670 mg/L
açude Buenos Aires
Br 0 100 km
– 187 –
Elementos Químicos em Águas de Abastecimento Público no Estado do Ceará
5,59 mg/L
poço tubular
FORTALEZA
N Sobral
12,19 mg/L
poço amazonas Quixadá
Crateús
0,80 mg/L
rio Patu
Iguatu
Ba Al
Juazeiro
6,29 mg/L
1,204 mg/L poço tubular
poço tubular
Fe
Mn F
65,5 mg/L
poço tubular
Mg
0 100 km
– 188 –
Sergio João Frizzo
– 189 –
Elementos Químicos em Águas de Abastecimento Público no Estado do Ceará
apresentou a menor detecção, tendo distribuição irregu- mentos que corta a área, é noticiada a ocorrência de flu-
lar pelo território estadual; os resultados que sobressa- orita. Sendo o flúor também um elemento essencial, a
em ocorrem preferencialmente em açudes e rios. O teor Organização Mundial de Saúde recomenda sua adição
mais elevado (0,8 mg/L) foi encontrado no rio Patu, que durante o tratamento de potabilidade, quando os teores
abastece Mineirolândia, distrito de Pedra Branca, asso- são inferiores a 0,4 mg/L nas águas de abastecimento. O
ciado com alto teor em ferro. Essa drenagem corta ro- mapa de distribuição do flúor mostra que este é o caso
chas arqueanas do Complexo Cruzeta, gnaisses e mig- para a quase totalidade (aproximadamente 90%) das
matitos com metamáficas e metaultramáficas e lentes de fontes de abastecimento dos municípios do estado do
micaxistos, quartzitos, metacalcários, formações ferrífe- Ceará.
ras e calcissilicáticas. O intemperismo sobre tais tipos Em síntese e considerando-se todos os elementos
de rochas pode prover esses elevados valores detecta- avaliados, as águas de abastecimento público de 211 lo-
dos, com a liberação de argilas e colóides fluviais. calidades em 230 visitadas (91%) contiveram ao menos
Águas contendo bário em concentrações de 5,588 1 elemento químico em dosagem acima do recomenda-
(maior valor) e de 1,727 mg/L são provenientes de poços do, e em 49 delas (21% do total), são 3 ou mais os ele-
tubulares que abastecem as cidades de Jijoca de Jeri- mentos em mesma situação.
coacoara e Cruz, cerca de 20 km a leste, respectiva-
mente. Os terrenos locais são compostos por arenitos CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES
argilosos com leitos conglomeráticos do Grupo Barrei-
ras, o que sugere um possível relacionamento com fáci- O trabalho realizado, objetivando a constatação da
es locais desta unidade litológica. existência ou não de metais pesados nas águas de con-
O resultado mais elevado para ferro (12,19 mg/L) foi sumo da população cearense, foi efetivo ao retratar
determinado na amostra proveniente do poço amazonas uma situação preocupante, não somente em função
que alimenta a cidade de Pacoti, cerca de 100 km a su- dos teores elevados de alguns elementos sabidamente
doeste da capital, e o de manganês (1,204 mg/L) foi ob- tóxicos, mas também pela quantidade e amplitude da
tido na amostra de um poço tubular de Santana do Aca- distribuição das amostras que os contém, no território
raú, norte do estado. A associação Fe-Mn, que pode ser estadual.
constatada nos mapas de distribuição dos elementos, é Todavia, é prematuro no presente momento afirmar
típica de óxidos-hidróxidos coloidais, que podem conter que as águas de tais fontes de abastecimento sejam im-
outros íons adsorvidos, provenientes da zona de oxida- próprias para consumo humano. Além de fatores como a
ção na faixa de flutuação do lençol freático. concentração, as variações locais no mesmo corpo
O magnésio, assim como K e Ca, com o qual é forte- d´água e a persistência dos altos valores ao longo do
mente relacionado, é essencial para a vida e não possui tempo, deve-se levar em conta ainda a especiação (es-
restrição quanto aos teores máximos em águas. Seu re- tado de oxidação/valência) de alguns desses indivíduos
sultado mais elevado (65,5 mg/L) foi encontrado na químicos, o que afeta as respectivas mobilidades e bio-
amostra coletada em um poço tubular em Cipó dos disponibilidades, e que são determinantes para avalia-
Anjos, distrito de Quixadá; marca o limite leste de uma ção de seu risco (Centeno, comunicação verbal, Work-
faixa enriquecida em magnésio que se estende por 100 shop Internacional de Geologia Médica, 2005).
km em direção noroeste, onde foram determinados Os resultados descritos, embora consistentes, de-
42,14 mg/L em Choró (açude Choró Limão), 45,16 mg/L vem ser considerados como indícios e sinalizam água
em Madalena (poço amazonas) e 51,76 mg/L na amos- inadequada para consumo humano, mas são necessá-
tra de um poço tubular em Itatira. Embora as rochas que rios mais estudos para confirmação e caracterização
ocorrem nos locais mencionados sejam variadas, suge- das águas de abastecimento em todo território do esta-
re-se origem litogênica, uma vez que este elemento é do do Ceará. É importante a execução de trabalhos em
produto do intemperismo de ampla gama de minerais detalhe e de monitoramento sistemático, naqueles lo-
formadores de rochas (anfibólios, piroxênios, biotitas, cais onde foram encontrados resultados propensos a
cloritas, dolomitas etc.). influenciar negativamente a saúde dos habitantes, ob-
Para flúor, o maior teor registrado foi de 6,29 mg/L jetivando identificar a fonte original da contaminação
na amostra de um dos poços tubulares que fazem parte (natural ou antropogênica) e determinar a persistência
do sistema de abastecimento de Santana do Acaraú, desses fatores no meio ambiente local, com vistas à sua
norte do Ceará. A origem provável deste elemento é lito- remediação. Se confirmados os indícios, as autorida-
gênica, seja por enriquecimento em termos alcalinos das des de saúde pública devem ser imediatamente notifi-
rochas vulcânicas Parapuí ou por fluidos hidrotermais cadas para que realizem estudos epidemiológicos e, se
circulantes em falhas e fraturas, pois a cerca de 120 km necessário, exames toxicológicos adequados na popu-
para SW, acompanhando o extenso sistema de falha- lação em risco.
– 190 –
Sergio João Frizzo
Os órgãos governamentais devem ainda controlar rá. Fortaleza: CPRM – Residência de Fortaleza,
a qualidade das águas minerais vendidas em garrafões 2006. 67p.
de 20 litros, que geralmente não sofrem qualquer trata- IBGE. Superintendência de Desenvolvimento do Nor-
mento ou purificação previamente à distribuição em deste. Hidroquímica dos mananciais de superfície:
pontos de venda e que em sua maioria são águas sub- região Nordeste. [S.l.: s.n.], 1996. 1 mapa, color.
terrâneas e propensas a enriquecimentos de elementos Com nota explicativa. Escala 1:2.500.000.
tóxicos. Dados oficiais (DNPM, 2005) apontam uma IBGE. Pesquisa nacional de saneamento básico. [S.l.:
produção de 115.609.000 litros de água mineral no Ce- s.n.], 2000. Disponível em: <http:// www,ibge.gov.br/
ará em 2004, correspondentes a cerca de 5,7 milhões home/estatistica/populacao/condicaodevi-
de garrafões d´água; nas análises obrigatórias para da/pnsb/abastecimento_de_agua/abagua
sua caracterização, não é exigida a determinação de 12.shtm>. Acesso em: 04 out. 2005.
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on, Japan – after a continuous 22 years of observati-
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águas de abastecimento público no estado do Cea- mistry. [S.l.]: Academic Press Inc., 1983.
– 191 –
Avaliação da Contaminação da Água Consumida no Campus da UFRN em Relação à Presença de Nitratos Provenientes de Fossas Sépticas
AVALIAÇÃO DA
CONTAMINAÇÃO DA
ÁGUA CONSUMIDA NO
CAMPUS DA UFRN EM
RELAÇÃO À PRESENÇA DE
NITRATOS PROVENIENTES
DE FOSSAS SÉPTICAS
Reinaldo A. Petta, petta@geologia.ufrn.br
Ludmagna P. de Araújo, ludmagna@rn.gov.br
Raquel F. S. Lima, raquel@geologia.ufrn.br
Cynthia R. Duarte, cynthia@geologia.ufrn.br
Universidade Federal do Rio Grande do Norte
– 192 –
Reinaldo A. Petta
(sessenta) análises, foi reconhecido que os teores de ni- Neste trabalho foram consideradas as aplicabilida-
trato de alguns setores se encontram alterados, como des em um SIG de planos de informações in-
por exemplo, no Laboratório de Geologia, onde foram ter-relacionadas, que integram as informações espaciais
encontrados teores acima do limite superior permitido. O envolvendo banco de dados, a rede de abastecimento
projeto buscou também implementar uma base carto- particular do campus universitário e seus principais ma-
gráfica digital do Campus, com representação em mapa nanciais e reservatórios e os dados da Companhia de
dos pontos de controle permanente, fixados por bloco Águas e Esgotos do Rio Grande do Norte – CAERN, bem
acadêmico e georreferenciados por GPS, com o maior como os padrões da qualidade da água de acordo com
número de informações possíveis, pois somente um mo- o programa de monitoramento integrado pelos órgãos
nitoramento contínuo e sistemático permitirá que se to- de controle ambiental do estado (Instituto de Desenvolvi-
mem precauções e se estabeleçam políticas de controle mento Econômico e Meio Ambiente do Rio Grande do
dos padrões de potabilidade e da qualidade da água Norte – IDEMA/RN e a Secretaria de Recursos Hídricos
nas dependências do Campus da UFRN. do Rio Grande do Norte – SERHID, e do Município como
a Secretaria Especial do Meio Ambiente e Urbanismo –
INTRODUÇÃO E CONTEXTO SEMURB), todos representados em mapas temáticos,
por pontos de controle georreferenciados permanentes.
A poluição das águas pode ser gerada por (i) eflu- O contexto geológico da área estudada (Campus
entes domésticos (poluentes orgânicos biodegradáveis, UFRN) consiste em sedimentos quaternários, típicos de
nutrientes e bactérias), (ii) efluentes industriais (poluen- dunas, e por sedimentos pertencentes ao Grupo Barrei-
tes orgânicos e inorgânicos, dependendo da atividade ras, que por sua vez, são capeados por sedimentos cre-
industrial) e (iii) carga difusa urbana e agrícola (poluen- táceos (Mesozóico Superior) detectados em alguns per-
tes drenados dos fertilizantes, defensivos agrícolas e ex- fis. São sedimentos com forte porosidade, compostos de
crementos de animais). Existem contaminantes que so- grãos bem selecionados que conferem à região uma
mente afetam a aparência da água, enquanto outros não grande permeabilidade. A estrutura do aqüífero Du-
são tão evidentes, mas podem causar graves problemas nas/Barreiras (que abastece a cidade de Natal) é varia-
à saúde. Como exemplo destes últimos, podem ser cita- da, com alta permeabilidade do solo constituído por arei-
dos os defensivos agrícolas tóxicos e bactérias colifor- as eólicas, que apresentam altas taxas de infiltração.
mes, além dos íons nitrato e nitrito. A contaminação devida à ocupação urbana inade-
Na análise espacial dos problemas relacionados à quada e sem planejamento nos solos, rios e ecossiste-
contaminação das águas, as modernas tecnologias de mas lacustres da área da Grande Natal, converteu-se
Geoprocessamento, Global Positioning System (GPS) e em um dos graves problemas ambientais da atualidade.
Sistemas de Informações Geográficas (SIG) têm se so- Verifica-se que a inexistência de rede de esgoto sanitá-
bressaído muito nos últimos anos e se mostrado bastan- rio em grande parte da cidade de Natal permite que os
te efetivas na identificação de riscos potenciais dos re- esgotos domésticos (colocados em fossas sépticas e
cursos hídricos, no monitoramento em seus problemas “sumidouros”), se infiltrem até níveis do aqüífero, poten-
de poluição e no relacionamento da qualidade de vida e cializando a contaminação das águas subterrâneas, e
saúde com a qualidade da água consumida. O SIG tem aumentando substancialmente sua área afetada nestes
sido freqüentemente utilizado como ferramenta de con- últimos anos, atingindo fontes de abastecimento impor-
solidação e análise de grandes bases de dados envol- tantes para a população.
vendo a saúde e o meio ambiente, por aportar novos Atualmente a comunidade acadêmica do Campus
subsídios para o planejamento, auxiliando nas ações ad- Central é formada por 15.338 estudantes, 3.605 funcio-
ministrativas, baseadas na análise e distribuição espaci- nários e 1.523 docentes concentrados numa área de 123
al dos eventos, localizando pontualmente os riscos am- ha, circundada, de um lado, por extensas muralhas de
bientais existentes. dunas litorâneas e, por outro, pelas vias de acesso ao
O geoprocessamento é portanto um instrumento de centro da cidade do Natal (Figura 1).
organização da decisão estratégica muito útil à saúde e O campus universitário fica um pouco afastado do
ao meio ambiente, área em que é preciso, a todo o mo- centro, onde teoricamente a água deveria estar menos
mento, tomar decisões para priorizar ações em cima de poluída, entretanto todos os cinco postos de abasteci-
uma dada realidade (Barcellos, 1998). Juntos, os SIG’s e mento, como será indicado neste estudo, já estão conta-
os modelos criados, gerenciados por uma interface grá- minados — impróprios para o consumo humano. A água
fica e amigável, formam os mais modernos sistemas de desses poços é imprópria para consumo humano e de-
suporte a decisão, que vêm sendo cada vez mais utiliza- verá de agora em diante ser usada apenas para lavar vi-
dos no planejamento e gestão de recursos hídricos e drarias em laboratórios, limpeza do espaço físico, jardins
ambientais. e coisas desse tipo.
– 193 –
Avaliação da Contaminação da Água Consumida no Campus da UFRN em Relação à Presença de Nitratos Provenientes de Fossas Sépticas
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Reinaldo A. Petta
– 195 –
Avaliação da Contaminação da Água Consumida no Campus da UFRN em Relação à Presença de Nitratos Provenientes de Fossas Sépticas
Figura 2 – Visualização e integração de todos os dados gráficos e analíticos da área e o banco de dados geral.
Figura 3 – Visualização e integração dos resultados analíticos obtidos para as concentrações de nitrato das águas dos
bebedouros do Campus da UFRN.
– 196 –
Reinaldo A. Petta
A partir da avaliação de um conjunto de 60 (sessen- alguns setores, como os Setores I e II apresentam valores
ta) análises, em duplicata, de águas coletadas nos 60 compatíveis com o padrão da OMS, registrando valores
(sessenta) bebedouros espalhados pelo Campus Univer- até inferiores (18 mg/L). Pode-se constatar também que
sitário da UFRN, foi reconhecido que as concentrações não se trata de um problema pontual e restrito ao Cam-
de nitrato, na grande maioria dos bebedouros, se encon- pus.
-1 3-
tram acima do limite superior de 45 mg l de NO , valor As concentrações de NO3 superiores a 45 mg/L são
máximo estabelecido pela Organização Mundial de Saú- decorrentes principalmente da falta de saneamento bá-
de (OMS) e Conselho Nacional do Meio Ambiente sico em Natal, em especial nos conjuntos habitacionais
(CONAMA). Como exemplo de locais onde a concentra- que cercam o campus. Os teores de concentração de
3-
ção de NO3 está bem acima da média (Tabela 1), podem NO encontrados nas áreas adjacentes ao campus,
ser citados o Setor de aulas III (56 a 78 mg/L) e IV (63 a 89 como Mirassol e Conjunto dos Professores, apresentam
mg/L), Laboratórios de Engenharia Química (65 a 78 valores mais baixos porque as águas consumidas ali são
mg/L), Anfiteatro – CCET (57 mg/L). Laboratórios de Solos resultantes da mistura de águas de poços do sistema
(76 mg/L), Escola de Música e Restaurante Universitário público da CAERN com águas da Lagoa do Jiqui, porém
(63 a 72 mg/L), Artes – antiga Escola de Engenharia (83 se analisarmos somente as águas dos poços destas áre-
mg/L), Centro de Convivência (81 mg/L), restaurante e re- as, encontraremos valores semelhantes aos detectados
sidência universitária (74 mg/L), e outros setores onde fo- no Campus.
ram encontrados teores muito acima do limite superior A figura 4 ilustra o comportamento das concentra-
permitido, como o Centro de Biociências (114 a 122 ções de NO3 nos bebedouros do campus. Observa-se
mg/L), garagem (72 e 85 mg/L) e ginásio poliesportivo (87 que as maiores elevações estão dispostas no SW da
mg/L). área e os menores índices estão compreendidos no
Outros setores analisados mostram a presença de sentido NE. As concentrações de NO3 intermediárias
NO3 com concentrações abaixo ou muito próximas do li- merecem atenção devido os índices estarem acima
mite permitido, como por exemplo: CCSA – Serviço Social do valor recomendado pela OMS. Portanto, a espacia-
(44 mg/L), ADURN (42 mg/L), Biblioteca Central (47 lização das concentrações destes teores permite a
mg/L), Laboratório de Geologia (42 mg/L), Setor de Aulas adoção de ações positivas para facilitar a tomada de
I – Bloco F (51 mg/L) e CCHLA (43 mg/L). Por outro lado, decisões.
Figura 4 – Distribuição espacial das concentrações de nitrato nas águas dos bebedouros do Campus da UFRN explicitando
as áreas mais e menos atingidas.
– 197 –
Avaliação da Contaminação da Água Consumida no Campus da UFRN em Relação à Presença de Nitratos Provenientes de Fossas Sépticas
CONSIDERAÇÕES CONCLUSÕES
Os valores detectados no Campus estão muito aci- Com vistas às formulações básicas já mencionadas,
ma ou próximos do limite permitido, são preocupantes e concluiu-se que:
demonstram que a iniciativa da UFRN de monitorar as 1 – Os objetivos na realização deste trabalho foram atin-
águas servidas através dos seus bebedouros deve ter gidos e tiveram por base, gerar, utilizar o Sistema
continuidade. A indicação de valores altos de nitratos SIG-Campus/UFRN, para identificar e caracterizar
na área do Campus da UFRN se deve principalmente os resultados analíticos nas concentrações de nitra-
ao fato de que a água ali utilizada é captada diretamen- to, visando o controle do padrão de potabilidade da
te do subsolo e desta forma traz os teores identificados água consumida no Campus, o que permitiu uma
no próprio aqüífero. Estes valores são de distribuição abordagem diferente, possibilitando a realização de
regional e, como comentado, estão ligados à falta de uma análise atual e de um futuro monitoramento e
saneamento da cidade. Ou seja, sua concentração é gestão da qualidade das águas no campus universi-
maior no campus pelo fato de as águas dos poços não tário.
sofrerem diluição, assim como acontece com as águas 2 – As etapas de captura, tratamento e conversão de ma-
captadas nos poços vizinhos ao campus. pas e dados alfanuméricos do formato analógico
A contaminação atinge principalmente as áreas para o digital, quando associados ao sistema, forne-
mais habitadas devido ao processo de edificação (fos- ceram resultados satisfatórios.
sas) e pavimentação (impermeabilização) e, áreas como 3 – Faz-se necessário avaliar os impactos causados ao
a do campus universitário, que concentra áreas favorá- estado atual em que se encontram os bebedouros e
veis à infiltração, encontra-se prejudicada pela dinâmica suas relações com as condições de saúde da popu-
do fluxo subterrâneo. lação do campus, pela ingestão de teores químicos,
Foi constatado que o Centro de Biociências reunia o por exemplo, compostos nitrogenados, que em ele-
maior número de concentrações das amostras e, diante vadas concentrações provocam hipertensão, meta-
disso, foram tomadas providências no sentido de desco- hemoglobinemia, alguns tipos de câncer e linfoma,
brir as fontes do problema. Ficou comprovado que a ori- e conseqüentemente as condições da qualidade da
gem do abastecimento, um poço locado neste Centro, es- água consumida, objetivando um apropriado plane-
tava impróprio para consumo humano. O poço foi fecha- jamento futuro.
do e a rede ligada a outro poço com valores mais baixos. 4 – As metodologias utilizadas no arranjo das entidades
O abastecimento destes bebedouros hoje continua, po- geográficas permitiram representar no ambiente di-
rém oriundo de outra fonte de melhor qualidade. Nos de- gital os fenômenos presentes no mundo real, e cor-
mais bebedouros, foram tomadas medidas no sentido de responderam às expectativas esperadas.
melhorar estes índices de contaminação. 5 – O programa computacional empregado demonstrou
A base de dados para o Campus Universitário, com na coleta e tratamento, conversão e integração de
representação em mapa dos pontos de controle hidroquí- dados, boa capacidade, gerando desta forma diver-
mico nos parâmetros em nitrato, através de um monitora- sificados níveis de informações, cujas respostas,
mento sistemático, que o trabalho implementou, possibili- em forma de mapas e atributos, permitiram uma vi-
tará um monitoramento contínuo e sistemático, permitindo são ampla do espaço geográfico estudado.
que se tomem precauções e se estabeleçam políticas de 6 – Através do uso do SIG elaborado podem-se criar ce-
controle dos padrões de potabilidade e da qualidade da nários que permitam uma melhor focalização dos
água nas dependências do Campus da UFRN. mais diversos grupos de cartas temáticas e planejar
Efetivamente o campus está diante de um impasse ações em saneamento e vigilância à saúde na área.
que exige um redirecionamento de procedimentos e me- O SIG desenvolvido poderá também ser utilizado
didas emergenciais devem ser tomadas o mais rápido como instrumento didático e de debate com os alu-
possível, por parte de uma ação dirigida e eficaz, com a nos, professores e com a população das vizinhanças
participação de toda a comunidade, visando soluções sobre as condições e inserção no espaço urbano.
que possibilitem melhorar a qualidade desses recursos 7 – O valor agregado decorrente de tal trabalho, permiti-
hídricos, do abastecimento do Campus e conseqüente- rá às instituições públicas e particulares municipa-
mente no padrão de vida da população que o utiliza, caso is, em especial as autoridades administrativas refe-
contrário, é eminente a degradação do aqüífero Du- rentes aos recursos hídricos e em saúde pública,
nas/Barreiras pela propagação da contaminação que se um amplo espectro de visão dos problemas relaci-
observa. A preservação desse manancial é importante e onados ao tema, dentro do seu limite geográfico. A
medidas devem ser tomadas no sentido de manter a inte- interatividade dos diferentes assuntos que inte-
gridade físico-química e bacteriológica de suas águas. gram a unidade administrativa permitirá nortear as
– 198 –
Reinaldo A. Petta
políticas públicas de interesse para a área e, o me- do de manter a integridade físico–química e bacteriológi-
lhor planejamento em face das diversas composi- ca de suas águas, minimizando assim, gastos relaciona-
ções temáticas. dos com a saúde das pessoas. Faz–se necessário ainda
8 – Deve-se salientar que algumas informações concer- implementar o mais rápido possível, uma política de pro-
nentes à parte urbana, que foram levantadas para teção de mananciais e um sistema de esgotamento sani-
toda a cidade do Natal, não foram processadas es- tário eficiente, pois ocorrem problemas causados pelas
pecificamente neste trabalho, tendo em vista não ligações clandestinas que contaminam o meio.
possuírem relações diretas com este processamen- Finalmente é oportuno citar que, a ferramenta utiliza-
to. Entretanto os critérios utilizados neste trabalho da para a geração do SIG-Campus/UFRN, não é em es-
são os mesmos aplicados ao município como um sência a única que possa viabilizar tal trabalho; em verda-
todo e podem ser aplicados futuramente de modo a de, no mercado encontram-se variadas opções, com dife-
melhor identificar outras áreas e outros grupos de rentes maneiras de processar os assuntos inerentes ao in-
risco. ventário, uns com mais recursos, outros mais limitados.
9 – Sendo este trabalho uma realização pioneira em nível A escolha do sistema empregado se deu em função
local, municipal e estadual, o impacto da tecnologia de sua facilidade de manuseio, possibilidade de integra-
dos Sistemas de Informações Geográficas trará ção dos diversos planos de informação empregados
uma nova consciência: de que é necessário a qual- (dados químicos, cartográficos, banco de dados) e seu
quer tomador de decisão o bom domínio do conhe- amplo conhecimento na comunidade técni-
cimento geográfico e seus componentes. co-acadêmica, entretanto a evolução tecnológica permi-
te a migração para dados abertos que podem ser lidos
RECOMENDAÇÕES em diferentes aplicativos, possibilitando que um maior
número de interessados tenha acesso à informação.
Após a divulgação dos primeiros resultados deste
estudo, algumas medidas emergenciais foram tomadas, REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
assim como a contratação de uma empresa especializa-
da em poços profundos, que conseguiu ultrapassar o ní- ARAUJO, L. P.; PETTA, R. A.; DUARTE, C. R. Sistema de
vel de calcário que fica logo abaixo do Sistema Aqüífero informações geográficas aplicado à análise das rela-
Dunas/Barreiras, indo buscar águas em maiores profun- ções da qualidade da água e risco em saúde pública
didades e ainda não contaminadas. Originalmente, essa no município de Natal (RN) . Geociências,2004.
água é mais ácida, e a vazão é bem menor, mas, como (Submetido)
ela ainda não está contaminada, foi a melhor saída en- ARAÚJO L. P. Análise das relações de risco em saúde
contrada. pública e qualidade da água na região de Natal (RN)
As outras recomendações neste caso dirigem-se com base em sistema de informação geográfica
primeiramente à necessidade da adoção de medidas e (SIG). 2002. 150 p. Dissertação ( Mestrado em Geo-
procedimentos simples e cabíveis em torno da minimiza- ciências ) - Universidade Federal do Rio Grande do
ção dos problemas de contaminação oriundos do nitra- Norte,Natal, 2002.
to, tais como: limpeza de caixa d’água, troca de bebe- BARCELLOS, C. ; PINA, M. de F. Análise de risco em saú-
douros, instalação de filtros e principalmente captação de utilizando GIS: o caso do abastecimento de água
de águas superficiais ainda não contaminadas (distribuí- no Rio de Janeiro. Revista FatorGis, São Paulo, 1998.
das pela CAERN) para misturar às águas dos poços do CÂMARA, G.; CASANOVA, M.A.; HERMERLY, A.S.;
campus e assim baixar seus níveis de contaminação. MAGALHÃES, G.C.; MEDEIROS, C.M.B. Anatomia
Entretanto, medidas emergenciais de vulto regional de- de sistemas de informação geográfica. Campinas:
vem ser tomadas o mais rápido possível por parte de Instituto de Computação UNICAMP,1996. 197 p. Dis-
uma ação governamental eficaz, com a participação de ponível em: <http://www.dpi.inpe. Br/geopro/li-
toda a comunidade, visando soluções que possam me- vros/anatomia.pdf> Acesso em: 08 ago. 2006.
lhorar a qualidade desses recursos hídricos e conse- PETTA, R.A.; ARAUJO, L. P. de. Avaliação da contami-
qüentemente o padrão de vida da população, caso con- nação do Aquífero em NO3 e incidência de casos
trário é iminente a degradação do aqüífero Dunas/Barrei- mortalidade no município de Natal (RN) com base
ras pela propagação da contaminação que se mostra em um SIG. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE
ainda pontual. GEOLOGIA,42.,2004, Araxá. Anais. Araxá: Socieda-
A preservação do manancial na área da Grande Na- de Brasileira de Geologia. NúcleoMinas Gerais,
tal é importante e medidas devem ser tomadas no senti- 2004. 1 CD-ROM, v. S-20, p. 946-946.
– 199 –
Alumínio Dissolvido na Água das Cavas de Extração de Areia – Um Estudo das Possíveis Implicações de sua Toxicidade – Município de Seropédica – RJ
ALUMÍNIO DISSOLVIDO NA
ÁGUA DAS CAVAS DE
EXTRAÇÃO DE AREIA – UM
ESTUDO DAS POSSÍVEIS
IMPLICAÇÕES DE SUA
TOXICIDADE – MUNICÍPIO
DE SEROPÉDICA – RJ
1
Eduardo Duarte Marques, eduirmaodageo@yahoo.com.br
1
Emmanoel Vieira Silva Filho, geoemma@vm.uff.br
2
Décio Tubbs, tubbs@ufrrj.br
1
Ricardo Erthal Santelli, santelli@geoq.uff.br
1
Sílvia Maria Sella, gqasela@vm.uff.br
1
Universidade Federal Fluminense,
2
Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro,
– 200 –
Eduardo Duarte Marques
– 201 –
Alumínio Dissolvido na Água das Cavas de Extração de Areia – Um Estudo das Possíveis Implicações de sua Toxicidade – Município de Seropédica – RJ
RESULTADOS E DISCUSSÕES
– 202 –
Eduardo Duarte Marques
Lagoa 1 Lagoa 2
CONCLUSÃO
Al pH Al pH
100 6 100 6
Os resultados preliminares aqui
10
5
10
5 apresentados indicam que a alterna-
4
tiva de introdução de piscicultura
Al (ppm)
Al (ppm)
pH
1 3
pH
1 3
2 2 nas lagoas de extração de areia no
0,1 0,1
1 1 distrito areeiro de Itaguaí-Seropédi-
0,01 0 0,01 0
ca deve considerar a biodisponibili-
dade e toxicidade do alumínio para
m 4
04
04
05
no 4
03
ag 4
04
04
m 4
04
04
05
no 4
03
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04
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0
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n/
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v/
ai
ai
ab
de
ab
ja
ja
no
fe
de
ja
ja
no
fe
Amostragens organismos aquáticos.
Lagoa 4
Lagoa 3
Al pH REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Al pH
100 6
100 6 BAIRD, C. Environmental chemistry. 5
5 10
10 2.ed. [S.l.] : University of Western
4
Al (ppm)
4
Al (ppm)
pH
1 3
H
p
1 3
2
0,1
2 0,1
1
BARBOSA ,C. F.; GUEDES, F. S. P. ;
1
0,01 0 TUBBS FILHO, D. Contaminação por
0,01 0
nitrato das águas subterrâneas no
4
05
4
4
04
04
03
04
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n
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fe
no
no
de
ja
ja
ag
m
Amostragens
Amostragens
nicípios de Seropédica e Itaguaí, RJ.
In: JORNADA CIENTÍFICA [da]
Figura 6 – Variação das concentrações de alumínio versus pH nas quatro lagoas UFRRJ, 12., 2002, Rio de Janeiro,
amostradas.
[Anais]. Rio de Janeiro: UFRRJ, 2002.
BERBERT, M. C. .A mineração de
dar subsídios à hipótese da origem dos baixos valores areia no distrito areeiro de Itaguaí-Seropédica/RJ:
de pH nas águas das cavas e confirmaria a presença de geologia dos depósitos e caracterização das ativida-
espécies orgânicas de alumínio. des de lavra e dos impactos ambientais. 2003. Dis-
A toxicidade do alumínio pode ser amenizada pela sílica sertação ( Mestrado em Geologia)- Universidade Fe-
presente na água, fato comprovado experimentalmente, em- deral do Rio de Janeiro, 2003.
bora na prática isso não ocorra, pois o alumínio tende a ser CAMILLERI, C.; MARKICH,S.J.; NOLLER, B.N.; TURLEY,
mais reativo com a matéria orgânica ou com outros agentes C.J.; PARKER, G.; VAN DAM, R.A. Silica reduces the
complexantes em maiores quantidades na água (Camilleri et toxity of aluminium to a tropical freshwater fish (Mo-
al., 2003). No caso dos areais, a concentração de sílica na gurnda mogurnda). Chemosphere magazine, n. 50,
água é relativamente alta (tabela 1) e esta, segundo as faixas p. 355-364, 2003.
de pH encontradas, provavelmente ocorra na fração coloidal TUBBS, D. Ocorrência das águas subterrâneas :“Aquífe-
sob a forma de ácido silício (H4SiO4). Por outro lado, pela mai- ro Piranema” no município de Seropédica, área da
or afinidade e altas concentrações de sulfato nas lagoas, é Universidade Rural e arredores, estado do Rio de Ja-
mais provável que o alumínio forme complexos com este neiro. [S.l.] : Fundação de Amparo a Pesquisa do E.
ânion preferencialmente à sílica. Pequenas concentrações Rio Janeiro, 1999. 123 p. Relatório Final de Pesquisa.
de flúor e baixa dureza das águas das lagoas favorecem à YARIV, S.; CROSS, H. Geochemistry of colloids systems
biodisponibilidade do alumínio (tabela 1). for earth scientists. Berlin : [s.n.], 1979. 450 p.
– 203 –
A Influência da Área Superficial das Partículas na Adsorção de Elementos-Traço por Sedimentos de Fundo
A INFLUÊNCIA DA ÁREA
SUPERFICIAL DAS
PARTÍCULAS NA
ADSORÇÃO DE
ELEMENTOS-TRAÇO POR
SEDIMENTOS DE FUNDO:
UM ESTUDO DE CASO NAS
ADJACÊNCIAS DA CIDADE
DE MACAÍBA, ESTADO DO
RIO GRANDE DO NORTE,
BRASIL
¹Raquel F. S. Lima, raquel@geolgia.ufrn.br
¹Josiel A. Guedes, josielquedes@yahoo.com.br
²Paulo R.G. Brandão, pbrandao@demin.ufmg.br
¹Laécio C. de Souza aecio@geologia.ufrn.br
¹Reinaldo A. Petta, petta@geologia.ufrn.br
¹ Universidade Federal do Rio Grande do Norte
² Universidade Federal de Minas Gerais
RESUMO vapor frio (AAS-CV) para Hg, após digestão ácida forte
com água régia. O teor dos elementos químicos variou
Este trabalho apresenta uma avaliação da influência nas seguintes faixas (unidade mg/kg): Pb (12-91), Zn
das características das partículas, mais especificamente (24-141) and Hg (0,005-0,355). O grau de enriquecimen-
da área superficial específica, na retenção de elemen- to foi obtido por comparação com a concentração média
tos-traço por sedimentos de fundo. A fração fina (< 0,063 estabelecida por amostragem em estações de coleta na
mm) dos sedimentos de fundo do Rio Jundiaí, coletados mesma bacia de drenagem, as quais supõe-se estarem
a montante e a jusante do centro urbano da cidade de livres de influência antrópica, e os resultados mostram
Macaíba, Rio Grande do Norte, foi analisada para ele- altos valores para os elementos analisados no centro ur-
mentos-traço por plasma indutivamente acoplado – es- bano. Dados de difração de raios X e observações ao
pectrometria de emissão atômica (ICP-AES) para Pb e estereomicroscópio indicam que quartzo e feldspato são
Zn, e espectrometria de absorção atômica – geração de os principais constituintes das amostras. O mineral de
– 204 –
Raquel F. S. Lima
argila identificado é a caulinita. A área superficial especí- dos fenômenos que ocorrem nos compartimentos água
fica (unidade m2/g) foi usada para calcular a densidade e material particulado.
de adsorção (unidade µg/m2) de cada elemento na su- Vários pesquisadores preferem as frações finas de
perfície das partículas, a qual inclui igualmente todas as partículas síltico-argilosas (< 0,063 mm) para amostra-
porções das superfícies internas inacessíveis (principal- gem e análises, utilizando estas frações para determinar
mente as superfícies das paredes dos poros). Conside- a presença de contaminantes em águas superficiais (La-
rando que as superfícies internas e externas são ambas cerda et al., 1990; Davidson et al., 1994; Droppo & Jas-
acessíveis à lixiviação ácida forte, as relações entre con- kot, 1995; Truckenbrodt & Einax, 1995; Gatti, 1997; Liu et
centração de elementos-traço, conteúdo total de matéria al., 1999; Soares, 1999). No que se refere ao tratamento
orgânica, e área superficial específica, são discutidas. químico utilizado para quantificar a disponibilidade dos
Sugere-se que, no caso da digestão parcial das frações elementos químicos para o meio aquoso, há autores que
finas de sedimentos de fundo utilizadas para estudos optam pela denominada extração simples, com um tipo
ambientais, seja no caso de extração simples ou se- de ácido forte ou fraco (Novozamsky et al., 1993; Bevi-
qüencial, anomalias ocasionais possam ser ajustadas lacqua, 1996; Gatti, 1997); ou extração seqüencial com
aos resultados corretos pelo cálculo da densidade de diferentes ácidos de variadas concentrações (Davidson
adsorção (a razão entre a concentração de um dado ele- et al., 1994; Daus et al., 1995; Gonzalez et al., 1994; Kra-
mento lixiviado e a área superficial específica da amos- use et al., 1995; Urasa & Macha, 1996).
tra). O uso da densidade de adsorção como medida da A área do presente estudo situa-se no município de
retenção de elementos-traço por sedimentos de fundo Macaíba, distando 22 km da cidade do Natal, Estado do
pode apresentar implicações importantes em análise de Rio Grande do Norte. A cidade de Macaíba é atravessada
risco ambiental. pelo rio Jundiaí e localiza-se na porção fluvial superior do
estuário do rio Potengi, que é caracterizada tanto pelo
INTRODUÇÃO aporte de água doce quanto pela ação diária da maré. Ní-
veis consideravelmente altos de Pb, Zn e Hg em água e
As propriedades acumulativas e de redisposição sedimentos de fundo do rio Jundiaí já foram reportados
das espécies nos sedimentos os qualificam como de ex- anteriormente (Guedes, 2003; Guedes et al., 2003a; Gue-
trema importância em estudos de impacto ambiental, re- des et al., 2003b). O rio Jundiaí, ao longo do percurso em
gistrando em caráter mais permanente os efeitos da con- seu maior comprimento, ou seja, do curso superior ao mé-
taminação (Förstner & Wittmann, 1981; Bevilacqua, dio, caracteriza-se como um rio intermitente. Os proble-
1996). mas ambientais nesses trechos, são tipicamente de ori-
Para uma correta avaliação da quantidade de espé- gem natural, mesmo cruzando áreas urbanizadas. Porém
cies químicas presentes em sedimentos, distinguem-se ao se aproximar da cidade de Macaíba, uma cidade de
os processos de origem natural daqueles que têm como médio porte, os problemas oriundos da ocupação e cres-
origem a ação do homem. Um sedimento é geralmente cimento de forma horizontal passam a se agravar. A ques-
formado por fases sólidas, compostas por elementos tão de saneamento básico é um dos grandes problemas
químicos diversos, os quais podem estar presentes ori- que a cidade enfrenta, pois somente 3% da cidade tem
ginalmente em altas concentrações ou terem sido adi- esgoto sanitário. O lençol freático é superficial, as fossas
cionados ao meio a partir de fontes antropogênicas. Em sépticas das casas são muito rasas e a prefeitura executa
águas naturais, os sedimentos consistem predominante- a limpeza no caso da população mais carente; mas a
mente em detritos orgânicos, material coloidal, células grande maioria do descarte vai clandestinamente para as
vivas (bactérias e algas) e sólidos inorgânicos, tais como valas pluviais, que em função disso, acabam se tornando
óxidos e hidróxidos de Fe e Mn, carbonatos, sulfetos e perenes, conduzindo os esgotos “in natura” para o rio
argilas. Existem muitos fatores que influenciam a adsor- Jundiaí. A disposição do lixo é um outro problema ambi-
ção e a retenção de contaminantes na superfície das ental com o qual a população de Macaíba convive, já que
partículas, dentre os quais destaca-se o seu tamanho. A não dispõe de uma área específica para um aterro sanitá-
tendência observada é que quanto menores as partícu- rio. Em conseqüência, parte do lixo das residências é
las, maiores as concentrações de nutrientes e contami- descartada diretamente no rio, ou próximo deste. Adicio-
nantes químicos adsorvidos. Esta tendência primária é nalmente, nos três pontos de coleta localizados mais a ju-
devida ao fato de as pequenas partículas apresentarem sante da área de estudo, onde a profundidade e a largura
elevadas áreas superficiais específicas, o que favorece do rio são maiores, a influência do ambiente salino é cla-
a adsorção e ocasional fixação do que se encontra dis- ramente sugerida pelos altos valores registrados dos pa-
ponível em meio aquoso. Os sedimentos de fundo do ca- râmetros condutividade elétrica, salinidade, cálcio, potás-
nal de drenagem dos rios desempenham papel impor- sio, magnésio, sódio, sulfato, cloreto, sólidos totais e sóli-
tante na avaliação de sua poluição, pois refletem parte dos dissolvidos (Guedes, 2003).
– 205 –
A Influência da Área Superficial das Partículas na Adsorção de Elementos-Traço por Sedimentos de Fundo
Os estudos anteriores realizados nos sedimentos de estão em área de domínio urbano e de influência da
fundo do rio Jundiaí tomaram como base os resultados maré. As amostras P13 e P14, foram coletadas na mes-
das análises químicas da fração fina dos sedimentos de ma bacia de drenagem, em locais os quais se supõe es-
fundo (< 0,063 mm), sem considerar o parâmetro área tarem livres de influência antrópica, distantes da cidade
superficial específica, que é definida como a razão A/m de Macaíba cerca de 50 e 27 km, respectivamente. A
(unidade m2/g) entre a área superficial absoluta de um montante da cidade, os pontos de coleta estão distribuí-
sólido e sua massa. A área superficial específica inclui dos de forma a abranger o rio Jundiaí em local livre da in-
igualmente as superfícies externas das partículas sóli- fluência das marés e possivelmente da influência urba-
das, bem como todas as porções das superfícies inter- na. As amostras de sedimento de fundo foram coletadas
nas inacessíveis (principalmente as superfícies das pa- de modo a se obter com fidelidade o material correspon-
redes dos poros). A razão entre a área superficial espe- dente ao intervalo superior (0 a 5cm) do canal ativo da
cífica (unidade m2/g) e a concentração de um dado ele- drenagem.
mento químico adsorvido nas amostras (unidade mg/kg) Em laboratório, as amostras foram secas a 60°C por
foi usada para calcular a densidade de adsorção (unida- 24 horas, desagregadas e peneiradas. A fração fina (<
de µg/m2) do elemento em questão na superfície das 0,063 mm) dos sedimentos, coletados a montante e a ju-
partículas. Este trabalho apresenta uma avaliação da in- sante do centro urbano da cidade de Macaíba, foi anali-
fluência da área superficial específica das partículas na sada para elementos-traço por plasma indutivamente
retenção de elementos-traço por sedimentos de fundo. acoplado – espectrometria de emissão atômica
(ICP-AES) para Pb e Zn, e espectrometria de absorção
METODOLOGIA atômica – geração de vapor frio (AAS-CV) para Hg, após
digestão ácida forte com água régia.
As amostragens foram realizadas no período de ja- A análise do teor de matéria orgânica total foi efetua-
neiro e fevereiro do ano de 2001, na época de estiagem, da em duas etapas. Na primeira, procedeu-se à remo-
quando a contribuição de água doce para o rio Jundiaí é ção de umidade do sedimento por 12 horas em estufa à
representada basicamente pelos esgotos “in natura” temperatura de 105°C. Na segunda etapa, cerca de 2
que chegam à drenagem através das valas pluviais que gramas deste material foram mantidas a 600°C por qua-
recebem clandestinamente os descartes oriundos das tro horas em forno tipo mufla. Com base na diferença de
atividades urbanas. Foram coletadas amostras em 10 massa entre a amostra livre de umidade e a massa após
estações (Figura 1). As estações P3 à P9, distanciam-se o aquecimento a 600°C, foi feito o cálculo do teor de ma-
cerca de 01 km entre si; destas, as estações de P4 à P9 téria orgânica.
– 206 –
Raquel F. S. Lima
A determinação da área superficial específica foi de de adsorção dos elementos químicos adsorvidos na
realizada utilizando-se o método de Brunauer, Emmett e fração fina dos sedimentos de fundo coletados no rio
Teller (BET). As amostras a serem analisadas passaram Jundiaí.
por desgaseificação, correspondente a um tratamento Na área urbana e a jusante da cidade de Macaíba,
térmico a 110°C por um período de 4 horas em atmosfera os valores das concentrações dos elementos químicos
de nitrogênio. A medida precisa da área superficial es- Pb, Zn e Hg encontram-se todos acima do limiar, com os
pecífica de sólidos por adsorção de gás, de acordo com teores máximos sempre na área urbana (Pb: máximo em
Brunauer, Emmett e Teller, envolve a determinação da P4. Zn e Hg: máximos em P10). Neste mesmo trecho, a
quantidade de adsorvato (ou gás que adsorve) necessá- densidade de adsorção segue as mesmas tendências
rio para recobrir as superfícies externas e internas aces- de variação observadas para a concentração dos três
síveis dos poros de um sólido, com uma monocamada elementos químicos, inclusive com os pontos máximos
completa de adsorvato. Esta capacidade de monoca- de densidade de adsorção de Pb na estação P4, e de Zn
mada pode ser calculada a partir da isoterma de adsor- e Hg na estação P10.
ção por meio da equação de BET. Os três pontos de amostragem a jusante, porém
Os dados mineralógicos foram obtidos por obser- próximos à cidade de Macaíba (P3, P2 e P1), destaca-
vação das amostras ao estereomicroscópio e difração dos nos três gráficos por meio de elipses, representam o
de raios X. Para as análises de difração de raios X da trecho no qual concentrações e densidade de adsorção
fração argila, foram preparadas seções orientadas, dos elementos químicos apresentam diferenças consi-
montadas a partir de uma suspensão argila-água com deráveis entre si. Vale destacar que este é o trecho estu-
concentração de 60 mg de argila por 1 ml de água des- dado no qual eram esperados resultados de concentra-
tilada, depositada cuidadosamente sobre uma lâmina ção mais baixos em relação à área urbana. Os valores
de vidro, sendo posteriormente secas em estufa a 60°C. de concentração de Pb encontram-se acima do limiar,
A varredura foi feita de 2 a 32º (escala 2), com velocida- com máximo em P3 e mínimo em P2; os valores de densi-
de de 1º/minuto. dade de adsorção de Pb encontram-se abaixo da densi-
dade de adsorção tomada como limiar, com máximo em
RESULTADOS P3 e mínimo em P1. No caso do Zn, dois dos três valores
de concentração encontram-se acima do limiar (P3 e
O teor dos elementos químicos variou nas seguintes P1), com máximo em P3 e mínimo em P2; os valores de
faixas (unidade mg/Kg): Pb (12-91), Zn (24-141) and Hg densidade de adsorção de Zn encontram-se todos abai-
(0,005-0,355). Os resultados mostram altos valores para xo do limiar, com máximo em P2 e mínimo em P3. O ele-
os elementos analisados no centro urbano, conforme mento químico Hg apresenta um dos três valores de con-
pode ser visualizado na figura 2. Os três gráficos desta fi- centração acima do limiar (P1), com máximo em P1 e mí-
gura apresentam no eixo horizontal a distribuição dos nimo em P2; os valores de densidade de adsorção de
pontos de amostragem, e no eixo vertical a concentra- Hg encontram-se todos abaixo do limiar, com máximo
ção dos elementos químicos Pb, Zn e Hg, em mg/kg (re- em P1 e mínimo em P3.
presentada pelos losangos), e a densidade de adsorção Dados de difração de raios X e observações ao es-
em g/m2 (representada pelos quadrados). A escala do tereomicroscópio indicam que quartzo e feldspato são
eixo vertical é logarítmica para facilitar a visualização e os principais constituintes das amostras. O mineral de
comparação das duas diferentes abordagens utilizadas argila identificado é a caulinita.
(concentração e densidade de adsorção) em um mesmo A figura 3 mostra em seu eixo horizontal a distribui-
gráfico. Os sentidos para montante e jusante, bem como ção dos pontos de amostragem de sedimentos de fundo
as estações de amostragem em área urbana encon- no rio Jundiaí, na área urbana e no entorno da cidade de
tram-se assinalados. Os pontos na área urbana e ao re- Macaíba. No eixo vertical são encontrados os dados de
dor da cidade de Macaíba distam um do outro aproxima- área superficial específica em m2/g (losangos) e teor de
damente um quilômetro. Os dois pontos à esquerda nos matéria orgânica em % (quadrados). A área superficial
gráficos (P13 e P14) estão situados a montante na mes- específica (losangos) varia de 4,5 a 42,2 m2/g, com os
ma bacia de drenagem, em local considerado livre de maiores valores nos três pontos amostrados a montante
contribuição antrópica, a 50 e 27 km da cidade de Maca- da cidade de Macaíba. O teor de matéria orgânica varia
íba, respectivamente. As linhas horizontais em cada grá- de cerca de 10% nas estações a montante, tomadas
fico representam a média aritmética dos resultados obti- como limiar, a cerca de 20% nas estações localizadas
dos para os pontos P13 e P14, cujos valores, para efeito mais a jusante, com teor crescente nos sedimentos a par-
do presente trabalho, são denominados de limiar. As tir do trecho urbano e após o mesmo (quadrados). Apa-
elipses destacam trechos nos quais são observados rentemente, não existe correlação significativa entre o
contrastes marcantes entre a concentração e a densida- teor de matéria orgânica e a área superficial específica.
– 207 –
A Influência da Área Superficial das Partículas na Adsorção de Elementos-Traço por Sedimentos de Fundo
Figura 2 – Eixo horizontal: distribuição dos pontos de amostragem de sedimentos de fundo no Rio Jundiaí, na área urbana e no entorno da
2
cidade de Macaíba. Eixo vertical: concentração em mg/kg (losangos) e densidade de adsorção em mg/m (quadrados), dos elementos
químicos Pb, Zn e Hg. Pontos à esquerda nos gráficos: valores considerados como “limiar”. Elipses: trechos nos quais concentração e a
densidade de adsorção dos elementos químicos adsorvidos na fração fina dos sedimentos de fundo apresentam tendências opostas e valores
mais baixos em relação ao que seriam considerados os valores “limiar”.
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Raquel F. S. Lima
Figura 3 – Eixo horizontal: distribuição dos pontos de amostragem de sedimentos de fundo no Rio Jundiaí, na área urbana e no entorno da
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cidade de Macaíba. Eixo vertical: área superficial específica em m /g (losangos) e teor de matéria orgânica em % (quadrados). Pontos à
esquerda nos gráficos: valores considerados como “limiar”.
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A Influência da Área Superficial das Partículas na Adsorção de Elementos-Traço por Sedimentos de Fundo
Macaíba não apresenta valores elevados. Uma segunda FÖRSTNER, U.; WITTMANN, G. T. W. Metal pollution in
alternativa, a qual apresenta uma abordagem de caráter the aquatic environment. 2.ed. Berlin: Sprin-
mais quantitativo, propõe a utilização da densidade de ger-Verlag, 1981.
adsorção do elemento químico, em vez do valor bruto da GATTI, L.V. Distribuição de metais em testemunhos de
concentração do elemento lixiviado da superfície das par- sedimentos de duas lagoas marginais do rio Mo-
tículas para fins de análise de risco ambiental. ji-Guaçu (E.E. de Jataí, Luiz Antônio, SP). 1997. 146
p. Tese (Doutorado) - Departamento de Química,
CONCLUSÕES Universidade Federal de São Carlos, São Carlos,
1997.
Os dados deste estudo, principalmente aqueles ob- GONZALEZ, M.J.; RAMOS, L.; HERNÁNDEZ, L.M. Distri-
tidos nas estações localizadas a montante da área urba- bution of trace metals in sediments and the relations-
na da cidade de Macaíba (destaques nas elipses), suge- hip with their accumulation in Earthworms. Internatio-
rem que, no caso da digestão parcial das frações finas nal Journal of Environmental Analytical Chemistry, v.
de sedimentos de fundo utilizadas para estudos ambien- 57, n. 2, p. 135-150, 1994.
tais, seja extração simples ou seqüencial, anomalias GUEDES, J.A. Diagnóstico geoquímico-ambiental do Rio
ocasionais possam ser ajustadas aos resultados corre- Jundiaí, nas imediações da cidade de Macaíba/RN.
tos pelo cálculo da densidade de adsorção (a razão en- 2003. Dissertação (Mestrado em Geociências) -
tre a concentração de um dado elemento lixiviado e a Centro de Ciências Exatas e da Terra, Universidade
área superficial específica da amostra). O uso da densi- Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2003.
dade de adsorção como medida da retenção/adsorção GUEDES, J.A.; LIMA, R.F.S.; SOUZA, L.C. Distribuição
de elementos-traço por sedimentos de fundo pode apre- de metais pesados em sedimentos de fundo no Rio
sentar implicações importantes em análise de risco am- Jundiaí em área de Mangue-Macaíba /RN. In:
biental. MANGROVE 2003: Connecting Research and Par-
ticipative Management of Estuaries and Mangro-
AGRADECIMENTOS ves, 2003, Salvador. Livro de resumos. Salvador :
UFBA; UFRPE, 2003. 1 v., p.251.
Os autores agradecem ao Instituto de Desenvolvi- GUEDES, J.A.; LIMA, R.F.S.; SOUZA, L.C. Variação sa-
mento Econômico e Meio Ambiente do Rio Grande do zonal da geoquímica de água e sedimentos de fundo
Norte – IDEMA/RN e ao Programa de Pós-Graduação em em um trecho do Rio Jundiaí, cruzando a cidade de
Geociências da UFRN – PPGEO/UFRN pelo financia- Macaíba, RN. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE
mento a pesquisa, a Renato Souza da Silva que realizou GEOQUÍMICA, 9., 2003, Belém. Livro de resumos ex-
as análises de difração de raios X e teor de matéria orgâ- pandidos. Belém: Sociedade Brasileira de Geoquí-
nica durante suas atividades como bolsista CNPq/PIBIC, mica, 2003. 1 v., p. 301-303.
e à CAPES pela concessão de bolsa de mestrado ao se- KRAUSE, P.; ERBSLÖH, R.; NIEDERGESÄß, R.;
gundo autor. PEPELNIK, E.; PRANGE, A. Comparative study of
different digestion procedures using supplementary
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