89 - Um Conto Celta - As Mulheres de Chifres
89 - Um Conto Celta - As Mulheres de Chifres
89 - Um Conto Celta - As Mulheres de Chifres
As Mulheres de Chifres
Uma rica mulher estava sentada, tarde da noite, cardando e
preparando a l, enquanto toda a famlia e os criados
dormiam. Subitamente ouviu uma batida na porta, e voz
chamou:
Abra! Abra! Quem est a?, disse a dona da casa.
Eu sou a Feiticeira de um Chifre, foi a resposta.
A mulher, supondo tratar-se de alguma vizinha pedindo
ajuda, abriu a porta e uma mulher entrou, levando nas mos
um par de cardadores, e tendo na testa um chifre, como que
nascido ali. Sentou-se em silncio junto ao fogo e comeou
a cardar a l com violenta pressa. Subitamente ela parou, e
disse em voz alta: Onde esto as mulheres? Esto
demorando muito.
Ento se ouviu uma segunda batida na porta, e uma voz
chamou, como antes: Abra! Abra!
A dona da casa sentiu-se obrigada a se levantar e abrir a
porta. Imediatamente outra feiticeira entrou, com dois chifres
na testa e uma roca de fiar l nas mos.
D-me um lugar para sentar, disse ela, eu sou a feiticeira
dos dois chifres, e comeou a fiar veloz como um raio. E
assim as batidas na porta prosseguiram, as chamadas eram
ouvidas, e as feiticeiras iam entrando, at que finalmente
havia doze mulheres sentadas ao redor do fogo, a primeira
com um chifre e a ltima com doze.
E elas cardaram o fio, e giraram suas rocas de fiar, e
tricotaram e teceram, todas cantando juntas uma antiga
cano, mas no dirigiram uma nica palavra a dona da
casa. Era estranho de se ouvir e assustador de se ver essas
doze mulheres, com seus chifres e suas rocas; e a dona da
casa quase desmaiou; tentou levantar-se para chamar
ajuda, mas no conseguiu mover-se nem pronunciar uma
palavra, nem mesmo gritar, pois as feiticeiras haviam-na
enfeitiado.
Ento uma delas a chamou em irlands e disse: Levante-se
mulher, e faa um bolo para ns.
A dona da casa foi pegar uma vasilha para trazer agua do
poo e mistura-la a farinha, para fazer o bolo, mas no
conseguiu encontrar nenhuma.
Ento elas disseram a ela: Pegue uma peneira e traga a
gua dentro dela.
Ela pegou a peneira e foi at o poo, mas a agua passava
pelos furos da peneira e assim a mulher no conseguiu
pegar nem um pouco para fazer o bolo ento sentou-se junto
ao poo e chorou. Subitamente ouviu uma voz perto dela
que disse: Pegue argila ocre e musgo, misture-os e forre a
peneira com a pasta, assim ela vai segurar a agua dentro
dela.
Foi o que a mulher fez, e a peneira segurou a agua para o
bolo, e a voz disse novamente:
Volta para casa, e quando chegar ao canto norte, grite alto
trs vezes dizendo: A Montanha das Mulheres Fenianas e o
cu sobre elas esto Pegando fogo!
Foi o que ela fez. Quando as feiticeiras l dentro ouviram o
chamado, um grito enorme e terrvel irrompeu de seus lbios
e elas correram para fora soltando gritos estridentes e
lamentos, e fugiram para Slievenamon, sua morada
primordial. Mas o Esprito do Poo pediu a dona da casa que
entrasse e preparasse a casa contra os feitios das bruxas,
caso elas voltassem.
Primeiro, para romper os encantamentos, ela borrifou a agua
na qual lavara os ps de seu filho, a gua do lava-ps, do
lado de fora da porta, na soleira; depois, pegou o bolo que
as feiticeiras haviam feito em sua ausncia, de farinha
misturada ao sangue sugado da famlia adormecida, cortou-
o em pedaos, colocou um pedao na boca de cada um dos
adormecidos, e eles recuperaram a sade. Ento pegou o
pano que haviam tecido e colocou metade fora e metade
dentro do ba fechado com cadeado, e finalmente travou a
porta com uma grande tramela presa aos batentes, para que
as bruxas no pudessem entrar, e, ao terminar de fazer
essas coisas todas, ficou aguardando.
No demorou muito para que as feiticeiras voltassem, com
muita raiva e clamando por vingana.
Abra! Abra! , gritaram, abra, gua do lava-ps! No
posso, disse a agua de lava-ps, "estou toda esparramada
pelo cho, e minha trajetria vai at o lago.
Abram, abram, madeira, rvores e tramela, gritaram elas
para a porta.
No posso, disse a porta, a tramela esta pregada nos
batentes e no tenho fora para mov-la
Abra, abra, bolo que fizemos e que misturamos com
sangue, gritaram elas de novo.
No posso, disse o bolo, estou quebrado e macerado e
meu sangue est nos lbios das crianas adormecidas.
Ento as feiticeiras voaram pelos ares dando gritos
estridentes, e fugiram para Slievenamon, lanando
estranhas maldies ao Esprito do Poo que desejara a sua
destruio. A mulher e a casa foram deixadas em paz, e um
xale perdido por uma das feiticeiras em sua fuga foi
guardado pela dona da casa como lembrana daquela noite;
esse xale permaneceu na mesma famlia, passando de
gerao em gerao, durante mais de quinhentos anos.
Referncias Bibliogrficas
JACOBS, Joseph. Contos de fadas celtas. So Paulo: Landy, 2003.
SAMUELS, Andrew, Jung e os Ps-junguianos, Rio de Janeiro: Imago Ed.,
1989.