Daniela Giovana Siqueira - Dissertação
Daniela Giovana Siqueira - Dissertação
Daniela Giovana Siqueira - Dissertação
Belo Horizonte
2007
Belo Horizonte
2007
AGRADECIMENTOS
Agradecer se faz preciso!
antroploga Jnia Torres, que naquela tarde de sol dentro de uma Kombi, ouvindo a minha
angstia por definir o tema da minha monografia de graduao, disse: Por que voc no fala
dos cinejornais, eu acho to bacana!
Da monografia dissertao outros encontros foram se dando.
Ao meu orientador, Joo Pinto Furtado, por ter me aceitado por orientanda, mesmo sem me
conhecer.
Aos colegas de mestrado, e ao Davidson uma vez mais, que das conversas no caf entre uma
aula e outra me davam caminhos que foram me ajudando, e muito, a me situar neste universo
novo, a Histria, que eu havia abraado.
Ao Centro de Referncia Audiovisual de Belo Horizonte e aos meus estagirios que me
estimulam com perguntas e me desafiam a ser uma profissional cada vez melhor. Para vocs,
que no me deixam esquecer... Elenice pelo amor!
Fernanda Coelho, Chico Mattos e Cinemateca Brasileira, por me ensinarem o valor da
preservao flmica, e da construo de um trabalho que se quer sempre maior do que ns
mesmos. Pelas inmeras trocas, pelo carinho, pela amizade.
A todos os amigos do caminho e graas Deus so muitos! Aos presentes por entenderem por
vezes a longa ausncia e aos que de c se fazem ausentes, por se fazerem presentes, em todos
os momentos.
quele que chegou a pouco e j ocupa um grande espao e que ter de mim mais tempo livre
agora.
vida! Que bonita, bonita e bonita!!!
EPGRAFE
SUMRIO
1. INTRODUO................................................................................................................. 06
2. CAPTULO 1: Da fonte histrica anlise flmica e as experincias de produo de
cinejornais pelo mundo...........................................................................................................11
3. CAPTULO 2: Textos, contextos e personagens no horizonte de 1963:
poltica, cidade e administrao municipal...........................................................................38
4. CAPTULO 3: Uma crnica sobre uma cidade: os cinejornais das obras pblicas e
da vida social de Belo Horizonte........................................................................................... 69
5. CONCLUSO ................................................................................................................ 106
REFERNCIAS ...................................................................................................................107
ANEXOS ...............................................................................................................................113
1. INTRODUO
Os filmes no foram analisados a partir das pelculas, mas sim por meio da
1
telecinagem dos ttulos encontrados em bitola magntica do tipo VHS. Isso facilitou o acesso
informao. Dados colhidos na anlise direta das pelculas puderam ser levantados no
trabalho do pesquisador Hlio Mrcio Gagliardi Os cinegrafistas, uma pesquisa no acervo de
filmes da Prefeitura Municipal de Belo Horizonte, obra ainda no publicada. Estes dados
puderam cercar dvidas com relao a possveis falhas na telecinagem e mesmo na
delimitao e confirmao dos assuntos nas edies de temas mltiplos. Sabemos tambm
que detalhes de informaes sobre a fotografia do filme, por exemplo, e mesmo quanto
qualidade da imagem podem se perder quando a anlise feita em VHS, mas a possibilidade
do acesso aos documentos nesta bitola, e a no identificao de todos os rolos em pelcula
dentro da atual reorganizao do acervo da instituio, determinaram a deciso por realizar o
trabalho a partir da cpia.
O CRAV no possui nenhum tipo de documentao correlata a estes filmes e a
fragmentao (natureza prpria deste tipo documental) procurou ser contornada no mbito
desta pesquisa com documentos administrativos encontrados em outras instituies de
memria da prefeitura como o Arquivo Pblico da Cidade, Cmara Municipal de Vereadores
e mesmo no arquivo pessoal de Jorge Carone Filho.
O trabalho de levantamento de dados, a busca por identificar os personagens da
poca a fim de cercar informaes que ainda no se encontravam sistematizadas em nenhum
lugar, acessar filmes e tecer sobre eles um trabalho de histria, so alguns pontos que
contribuem para justificar o estudo do tema aqui proposto. certo porm, que as linhas que se
seguem apontam apenas um dentre muitos caminhos possveis de anlise para este conjunto
documental ainda indito.
O desafio por compreender o trabalho de anlise de filmes primando por um
trabalho de histria, talvez tenha sido o maior exerccio de embate na construo desta
pesquisa. Espero contribuir com a atual historiografia do cinema brasileiro somando esforos
junto crescente corrente de pesquisas que procuram trabalhar com a produo documental
em cinejornais; e particularmente colaborar com mais informaes sobre o cinema feito em
Belo Horizonte, importante cidade que muito j ofereceu discusso cinematogrfica
nacional.
Assim, este trabalho tem por objetivo apresentar um estudo de caso sobre a
realizao de cinejornais produzidos pela administrao Jorge Carone Filho frente da
1
Processo tcnico que copia o contedo de um filme feito em pelcula cinematogrfica para outros tipos de
suporte mais acessveis como o VHS ou DVD.
10
Entrevista concedida por Marc Ferro a Bernardo Frey, Jacques DArthuys, Priscila Soares e Vitor Martins, em
Portugal, no final da dcada de 1970. In: Revista Recine, ano 1, n 1, Rio de Janeiro: Arquivo nacional, setembro
2004.
11
FERRO, Marc. O filme: uma contra-anlise da sociedade? In: LEGOFF, Jacques, NORA, Pierre
(orgs.). Histria: novos objetos. Trad. Terezinha Marinho. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1995.p. 200.
12
Idem, p. 213
13
assim uma maior descentralizao da produo de contedos e o surgimento de novos atoresprodutores. Mais produo, mais registros, mais documentao. Naturalmente esse
movimento obrigou a Histria a repensar seus pontos de observao sobre o contedo flmico.
E novas contribuies a partir das idias de Ferro surgiram.
Ao invs de propor uma pesquisa que busque no documento apenas aquilo que no
foi revelado, a evoluo das discusses sobre o cinema como fonte histrica passaram a
perceber a potencialidade inscrita no prprio registro cinematogrfico, ou seja, um filme
registra os fatos que prope mostrar trazendo em si mesmo uma identidade documental que
lhe prpria. Perde-se ento a leitura de que um filme se presta apenas ilustrao de fatos
histricos, tendo sempre que ser subsidiado por fontes escritas. O discurso das imagens deixa
de ser visto como incompleto, possuindo por definio uma natureza lacunar e passa a
assumir um estatuto acabado: princpio, meio e fim.
Noel Burch 5 traz uma nova mirada sobre a percepo histrica de um filme e afirma:
Para mim desde j escrever sobre o cinema
escrever sobre uma atividade social, culturalmente
especfica, mas indissocivel da histria dos homens e
das mulheres, efeitos de prazer, de emoo e de beleza
(...) [] situar os filmes no contexto histrico em que
eles foram concebidos, produzidos e distribudos (...)
fazer ver de que modo o valor cultural de uma obra
flmica seja qual for o prestgio, ou a obscuridade,
de seus autores -, funo das ideologias
contraditrias que a trabalham.
O cinema presentifica o movimento dando aos olhos de quem assiste uma maior
proximidade com o real, um novo estatuto para a confirmao de fatos, diferentemente da
descrio do mesmo pelas pginas do jornal, ou pela narrao do rdio. Nestes dois ltimos
casos o receptor tem que lanar mo de suas prprias imagens mentais que so diferentes na
mente de cada um. Como afirma Jean-Louis Leutrat6, o romance histrico pode, quando
muito, reproduzir uma carta ou o texto de um edital, de um tratado; diferentemente do filme,
ele no pode encen-lo, produzir aquilo mesmo que seria arquivvel, o trao do passado sob a
forma do objeto.
A pesquisa brasileira sobre o assunto tem avanado muito, o que traz uma especial
alegria para as reflexes neste campo.
5
Citado. LEUTRAT, J.L. Uma relao de diversos andares: Cinema & Histria. Imagens. Cinema 100
anos, n. 5, 1995. p. 31
6
LEUTRAT, J.L. Uma relao de diversos andares: Cinema & Histria. Imagens. Cinema 100 anos, n.
5, 1995. p. 29
14
Contestando Marc Ferro o brasileiro Eduardo Morettin7 traz uma leitura crtica
viso do francs:
No acreditamos, no entanto, que a anlise das
relaes entre cinema e histria possa ser elucidada a
partir das dicotomias aparentelatente, visvelno-visvel e histria-contra-histria. (...)
afirmar a possibilidade de recuperar o no-visvel
atravs do visvel contraditrio, j que essa anlise
v a obra cinematogrfica como portadora de dois
nveis de significado independentes, perdendo de vista
o carter polissmico da imagem. Este raciocnio s
tem sentido para aqueles que, ao analisarem um filme,
separam da obra um enredo, um contedo, que
caminha paralelamente s combinaes entre imagem
e som, ou seja, aos procedimentos especificamente
cinematogrficos. Pelo contrrio, afirmamos que um
filme pode abrigar leituras opostas acerca de um
determinado fato, fazendo desta tenso um dado
intrnseco sua prpria estrutura interna. A percepo
desse movimento deriva do conhecimento especfico
do meio, o que nos permite encontrar os pontos de
adeso ou de rejeio existentes entre o projeto
ideolgico-esttico de um determinado grupo social e
a sua formatao em imagem.
MORETTIN, Eduardo. O cinema como fonte histrica no obra de Marc Ferro. Histria: Questes &
Debates, Curitiba, n.38, p. 15, 2003. Editora UFPR
8
Idem, ibid, p. 38
9
Idem, p. 40
15
Falar sobre cinema como fonte histrica pressupe um segundo debate que versa
sobre um campo extremamente desafiador: a anlise flmica.
A definio desta atividade vem por meio de Leutrat 10:
Analisar delimitar um terreno, medi-lo, esquadrinhalo muito precisamente (trata-se de um fragmento de
obra ou de uma obra inteira). Uma vez recortado e
batizado o terreno, devemos nele, e em conformidade
com a sua natureza, efetuar seus prprios movimentos
de pensamento. Para este priplo imperativo dispor
de vrias cartas, ou seja, de instrumentos trazidos de
disciplinas diversas, para que se possa superp-las,
saltar de uma a outra, estabelecer as passagens, as
trocas e as transposies (...). A descoberta de tais
signos depende das questes postas s obras, cada
obra necessitando de questes particulares. Como diz
Gerard Granel, no h migalhas numa obra, nem
triagem possvel entre o que seria importante,
revelador ou insignificante. (...) Afinal de contas,
tudo pode ser levado em conta, dado que disto que o
sentido advm.
16
determinar a escolha de um diretor pelo formato que melhor vai ser capaz de representar a
histria que ele se prope contar. O que no pode ser perdido de vista este contrato de
produo, pois ele ir determinar os pontos de vista e as escolhas narrativas que iro compor o
documento que ali est surgindo.
Os cinejornais estudados esto estruturados sob a forma de reportagens jornalsticas
para o cinema. O jornalismo um tipo de formulao e registro dos acontecimentos que parte
do princpio de estabelecer como contrato de produo a busca pela objetividade dos fatos,
uma vez que na matria jornalstica no interessa a opinio do jornalista, mas sim, a sua
capacidade de reportar ao receptor as informaes tal como foram dadas pelas fontes ou pelos
acontecimentos. Mas levando-se em considerao a forte relao entre objetividade e
subjetividade prprias da ao humana, nenhuma produo est livre dos filtros
proporcionados pelas escolhas daqueles que produzem os contedos.
Assim ratifica Napolitano (2005:240):
Enunciao direta e conveno de linguagem so os plos de
tenso no trabalho de anlise das imagens-sons registradas
mecanicamente, como no cinema e na televiso. (...) Na
perspectiva da moderna prtica historiogrfica, nenhum
documento fala por si mesmo, ainda que as fontes primrias
continuem sendo a alma do ofcio do historiador. Assim, as
fontes audiovisuais e musicais so, como qualquer outro tipo
de documento histrico, portadoras de uma tenso entre
evidncia e representao. (...) a fonte uma evidncia de
um processo ou de um evento ocorrido, cujo estabelecimento
do dado bruto apenas o comeo de um processo de
interpretao com muitas variveis. (Grifo do autor)
17
Citado. SOUZA, J.I.M. Trabalhando com cinejornais: relato de uma experincia. In: Histria:
Questes & Debates, Curitiba, n.38,p. 46, 2003. Editora UFPR
14
SOUZA, J.I.M. Trabalhando com cinejornais: relato de uma experincia. In: Histria: Questes &
Debates, Curitiba, n.38,p. 43-62, 2003. Editora UFPR
18
Brasileiro, cinejornal oficial do Estado Novo, que foi uma das formas de propaganda do
regime ditatorial institudo em 1937. Souza (2003:46) salienta a diversidade e aponta a
dificuldade de se trabalhar esta documentao. A fragmentao dos temas e assuntos dos
cinejornais outro obstculo para a leitura histrica do documento flmico. Os vrios tpicos
cobertos por um nmero de cinejornal levado semanalmente s telas pedem uma complexa
abordagem de enunciados descontnuos e separados no tempo e no espao.
No Brasil este formato foi produzido em larga escala entre a segunda dcada do sculo
XX e incio do ano de 1980 quando o formato j no produzia o mesmo efeito de antes,
devido em grande parte, popularizao da televiso.
Empreender pesquisas junto a esta documentao no uma tarefa inicialmente fcil.
Muito do que se sabe hoje sobre essa produo se deve ao trabalho de organizao de
arquivos de imagens, cinematecas e museus de imagem e som e no caso belo-horizontino ao
Centro de Referncia Audiovisual (CRAV). O desafio da pesquisa comea na busca pala
existncia ou no das pelculas dentro do acervo, identificao de seu grau tcnico (que indica
o comprometimento fsico do material), visualizao em mesa de montagem (moviola),
telecinagem (migrao da informao do suporte em pelcula para outros formatos de
exibio em bitolas mais acessveis, como por exemplo, o VHS) indexao e posteriormente a
catalogao de todo o conjunto documental com o qual se quer trabalhar.
Todo este processo muito caro por que envolve, em todas as suas etapas, materiais e
equipamentos muito especficos e de difcil acesso no mercado. Depois da organizao o
pesquisador da imagem empreende o processo de analisar os contedos de cada documento
flmico a fim de tecer o conhecimento histrico sobre eles.
Conceitualmente existem trs formas estabelecidas de associao para a relao
Histria e Cinema: O cinema na Histria (e na sociedade), que entende o cinema como fonte
primria para a investigao historiogrfica. A histria (e a sociedade) no cinema, que
percebe o cinema como produtor de discurso histrico e interprete do passado e a Histria
do cinema, que se dedica ao estudo da linguagem cinematogrfica com seus avanos
tecnolgicos e condies dos modos de recepo dos contedos.15
Mas estas formas de diviso no so estanques em si mesmas. Pelo contrrio, elas
pressupem interfaces que conferem movimento aos estudos dedicados ao cinema e a histria.
Jean-Louis Leutrat demonstra os pontos de interseo possveis na anlise16:
15
16
19
17
20
Ibid, p. 356-357
KUSCHNIR, Karina e CARNEIRO, Leonardo Piquet. As dimenses subjetivas da poltica: cultura
poltica e antropologia poltica. In: Estudos Histricos. Rio de Janeiro, vol 13, n24, 1999 p. 227.
21
21
22
22
O homem, na sua qualidade de ser sensvel, muito menos guiado por princpios
generosos do que por objetos imponentes, imagens chamativas, grandes espetculos,
emoes fortes. Sendo esta nova considerao rigorosamente aplicvel aos indivduos, -o
ainda mais s naes encaradas no seu conjunto. Assim, o poder deve apoderar-se do
controle dos meios que formam e guiam a imaginao coletiva. A fim de impregnar as
24
Ibid, p.21-22
Citado. Enciclopdia Einaudi. Volume 5: Antropos-Homem. 1984 p. 309-310.
26
Ibid, p. 298-299.
25
23
mentalidades com novos valores e fortalecer a sua legitimidade, o poder tem designadamente
de institucionalizar um simbolismo e um ritual novos. (MIRABEU:1791) 27
Como afirma Rodrigo Patto S Motta:
o argumento ento que o imaginrio poltico pode
ser considerado como um dos elementos
constituidores da cultura poltica. O largo espao
utilizado para trabalhar com a conceituao ligada ao
imaginrio se deve complexidade e polmica de
que se reveste e no a uma desconsiderao aos outros
elementos integrantes do universo cultural. (MOTTA,
1996: 88-9)
24
A gnese desta experincia fundadora pode ser atribuda a trs pases: Inglaterra,32
Estados Unidos33 e Alemanha,34 que durante a primeira guerra mundial, cada um a sua
maneira, se articulou para fazer da propaganda uma importante arma para o convencimento
das massas. O cinema de propaganda est neste contexto como um dos mais profcuos meios
de disseminao de contedos.
O formato que estudamos o de cinejornais. A histria de produo deste tipo de
filme est diretamente atrelada a governos, tanto de direita quanto de esquerda, democrticos
ou ditatoriais que se utilizaram do cinema para fazer difundir mensagens a fim de garantir,
31
Ibid, p. 36
Devido neutralidade americana at 1917, os beligerantes estavam livres para convencer os
cidados daquela grande potncia de suas causas e valores. A propaganda britnica, por exemplo, existia nos
Estados Unidos desde o fim de 1914. Ela era paga pelo governo britnico, era supervisionada por seus agentes e
controlada por seu departamento de propaganda. Muitos acreditavam que a interveno dos Estados Unidos em
1917 tinha sido causada por este lobby britnico. Tal situao tornou claro que entre 1914 e 1918 o governo
britnico tinha aberto uma caixa de Pandora que lanou a propaganda moderna na arena internacional.
WAINBERG. Jacques A. A voz de Deus: um estudo da narrao de cinejornais em tempos de guerra a
persuaso audiovisual de um povo. IN: INTERCOM Revista Brasileira de Comunicao. So Paulo, vol XV,
n.2, p. 147, jul/dez 1992.
33
Com o inimigo tentando persuadir soldados e civis americanos de que seus esforos e sacrifcios no
faziam sentido o Presidente Wilson desistiu de sua oposio administrao da opinio ao estabelecer o Comit
de Informao Pblica Committee on Public Information - em 14 de abril de 1917. (...) a nova Diviso de
Filmes recebia cinejornais de combatentes censurados e editados Ibid. p 147.
34
Na Alemanha o interesse do governo pela utilizao do cinema para fins propagandsticos surgiu na
Primeira Guerra Mundial (1914-1918). A Universum Film Aktien Gesellschaft, mais conhecida como UFA, foi
um projeto estimulado e financiado pelo alto comando militar alemo para tentar reequilibrar a guerra de
informao/propaganda sustentada pelos inimigos, principalmente os Estados Unidos. O ano de sua criao,
1917, curiosamente se confunde com o ano em que os EUA entraram definitivamente em combate.
KRACAUER. Siegfried. De Caligari a Hitler. Uma histria psicolgica do cinema alemo. Rio de Janeiro:
Jorge Zahar Editor, p. 52, 1988.
32
25
Das seis relaes analisadas neste texto, cinco pertencem a experincias autoritrias. Os casos de
Alemanha, Itlia, Portugal e Espanha esto fortemente embasados no estudo do pesquisador Wagner Pinheiro
Pereira, que afirma ser o cinema: um veculo onde esto depositadas as ideologias, mentalidades, aspiraes e
representaes de uma determinada sociedade, meio sobre o qual os governos tentam disseminar suas ideologias
e exercer o seu poder poltico. Por esse motivo, decidimos analisar os filmes fascistas, pois eles conseguiram
realizar, de uma s vez, todas essas possibilidades, constituindo-se em fontes valiosas para o estudo da histria
cultural e poltica da nossa poca. PEREIRA. Wagner Pinheiro. Cinema e propaganda poltica no fascismo,
nazismo, salazarismo e franquismo. In: Histria: Questes & Debates, Curitiba, n 38, p. 101-131, 2003.
Editora UFPR
26
36
37
27
Noventa e cinco nmeros deste cinejornal foram produzidos at 1953 quando o nome
desta produo cinejornalstica foi trocado para Imagens de Portugal sem, contudo, mudar
seu perfil editorial.
Mas na propaganda salazarista o destaque ficou por conta da produo e veiculao de
documentrios que tinham por princpio nico divulgar as realizaes de Salazar e os grandes
acontecimentos da vida cvica, poltica e cultural do Estado Novo.
No trato com a censura ligada ao cinema a Espanha de Franco apresenta-se como o
pas mais rgido entre os at agora citados. Durante o perodo mais fascista do governo
franquista (1936-1942) o cinema ficou nas mos controladoras da Falange transformando-se
em um brao importante de atuao da propaganda do regime. Fora desta produo tudo era
rigorosamente supervisionado.
38
39
28
Esta peculiaridade talvez possa ser explicada pelo menor poder de fogo espanhol para
promover, a exemplo de Itlia e Alemanha, a sua prpria indstria cinematogrfica. Mas um
dado curioso ajuda a exemplificar a cumplicidade presente entre os regimes nazi-fascistas
europeus. Vrios filmes espanhis foram realizados na Alemanha, Itlia e Portugal por meio
de apoios de co-produo ofertados por estes pases.
Uma novidade de 17 de dezembro de 1942 foi a criao dos Noticiarios y
Documentales Cinematogrficos NO-DO, uma iniciativa da Vicesecretara de Educacin
Popular, destinada a difundir a obra do Estado e manter a diretriz adequada das
informaes. Arias Salgado decretou que a partir de 1 de janeiro de 1943, a projeo do
NO-DO seria obrigatria para todos os locais de exibio do pas, possesses e colnias, o
que representava mais de quatro mil salas de projeo. At 1945 uma boa parte das notcias de
atualidades e reportagens de guerra era de reprodues dos cinejornais nazistas, elogiosos dos
feitos militares do exrcito alemo e repletos de crticas ferozes aos comunistas russos. Com a
derrota dos nazistas, o NO-DO mudou de carter, tendo assumido a direo Manuel Garcia
Violas. A partir da penetrao da influncia norte-americana, da entrada do capital
estrangeiros e dos tecnocratas, a temtica abordada pelos cinejornais abandonou a antiga
militncia poltica explcita, convertendo-se num instrumento para elogiar as realizaes
tcnicas do Estado, dar a sensao de progresso, apresentar as atividades polticas e
diplomticas do regime franquista e divulgar os acontecimentos do mundo do espetculo. A
40
29
A exemplo de todos esses pases o Brasil tambm viveu intensos dias de produo
exclusivamente estatal de contedos cinematogrficos.42 O modelo de organizao desta
produo tambm se manteve o mesmo passando a existir a partir de um brao armado do
poder, pensado para ser responsvel pelo setor de propaganda.
A centralizao da preocupao com o setor de propaganda ligada ao governo
brasileiro anterior ao Estado Novo. Em 1934 foi criado o DPDC (Departamento de
Propaganda e Divulgao Cultural), que ganhou novos status poltico transformando-se em
1935 no DNP (Departamento Nacional de Propaganda).
Enfim, em 1939 durante o Estado Novo, regime comandado por Getlio Vargas, foi
criado o DIP (Departamento de Imprensa e Propaganda) a que o pesquisador Jos Incio de
Melo Souza chamou de a ao da razo autoritria. 43
O novo departamento responderia diretamente ao presidente da repblica e ganhou por
atribuies as funes de centralizar, coordenar, orientar e superintender a propaganda
nacional interna e externa. A exemplo de uma Europa que fervilhava entre guerras e disputas
polticas norteadas por um forte contorno simblico e, portanto ideolgico, o governo
41
PEREIRA, p. 126-7
O Varguismo e o peronismo no se definem como fenmenos fascistas, mas preciso levar em conta
a importncia da inspirao das experincias alem e italiana nesses regimes, especialmente no que se refere
propaganda poltica. CAPELATO, op. cit, p. 63
43
SOUZA. Jos Incio de Melo. O estado contra os meios de comunicao (1889 - 1945). So Paulo:
Annablume: Fapesp, 2003. As informaes referentes ao caso brasileiro neste texto esto embasadas no estudo
trazido por este livro.
42
30
brasileiro tambm tratou de dar novo significado ao seu entendimento sobre propaganda,
apertando o controle. O DIP simbolizava esses novos tempos.
Em 1938-39 Lourival Fontes podia reunir todas as
foras de que era capaz para por em marcha o seu
projeto de controle e propaganda poltica. O centro da
questo para Fontes era fazer da presena do Estado
Novo algo visvel e palpvel no cotidiano dos
cidados urbanos. (...) Enfim, o DIP se fez presente
onde e como foi possvel. Na dcada de 40, o Estado,
por intermdio do DIP, das Empresas Incorporadas da
Unio (Rdio Nacional e Mau, jornais A Manh e A
Noite, do Rio de Janeiro e So Paulo) e do Ministrio
da Educao, era o maior produtor e animador cultural
do pas.44
Dentro do departamento existia a DCT (Diviso de Cinema e Teatro) que teve como
maiores atribuies o trabalho com a censura de filmes e a produo do Cine Jornal
Brasileiro. Foram veiculados entre outubro de 1938 e setembro de 1946, 607 nmeros do
cinejornal. Mas o que chama ateno aqui a motivao maior da censura, ao legislada por
oito regras gerais amplas e ricamente baseadas em fatores de ordem moral. Na dvida em
relao clareza dos itens o segundo ponto mais aplicado, como afirma Souza45 em sua
anlise era mesmo o gosto pessoal do censor.
Entre 1942-45 13% da produo eram de filmes nacionais, sendo que 80% do mercado
era ocupado por filmes estrangeiros. Para os ltimos, as questes de Estado deveriam se
sobrepor ao gosto pessoal na anlise da censura.
Como avaliao final, Souza afirma que (2003:217)
No Estado Novo o Estado, servido por um
Executivo forte, o signo que abarca os destinos
polticos, econmicos e sociais, transformando-se no
grande ponto de referncia da vida da populao
urbana. (...) O Estado passa a ser na ditadura
estadonovista, o espao dos conflitos, solucionados
atravs das instituies civis e militares. Ditadura de
instituies, ele no reconhece a organizao social de
nenhuma classe. Burguesia industrial e agrria, classes
mdias ou trabalhadores no conseguem se fazer
representar enquanto tais. (...) No existindo o elogio
da riqueza burguesa, nem o do esforo operrio, resta
ao Estado fazer a nao rica e os homens a ela ligados,
prsperos.
44
45
Ibid, p. 109
Idem, ibid, p. 132-33
31
Esta uma sntese proposta para o caso brasileiro, mas que se enquadra em todos os
demais pases aqui apresentados, pois h fortes coincidncias de estrutura administrativa
interna no trato que estes governos deram propaganda, mas o que subsidia o externo o
fator ideolgico de diluio da nao em pontos de convergncia ditatoriais. Uma tenso
constante presente entre as foras polticas, econmicas e sociais no interior de cada uma
destas sociedades. E como tradutor destes tensionamentos, que visam o poder, pode-se
identificar o cinema traduzindo em formas os desejos, os jogos explcitos e implcitos, os
smbolos, as marchas que se quer registrar e difundir, retirados da superfcie lisa do cotidiano
social do pas. Na orquestrao deste conjunto que se quer sonante, a juno de poltica e
cinema a servio dos governos.
O trunfo destes regimes foi o de terem se apropriado e re-significado o veculo cinema
ao potencializar sua ao de difusor de contedos propagandsticos. 46
Contrapondo esta incurso s experincias autoritrias ser apresentado agora um uso
do mecanismo de propaganda por meio de um regime democrtico. Analisando o maior
exemplo mundial em produo cinematogrfica, os Estados Unidos, que no fim da 1 Guerra
Mundial possua metade das salas de cinema do mundo, possvel perceber que a extenso de
objetivos a mesma, colocando-se de forma velada em alguns momentos verdade, uma vez
que na vivncia de uma democracia no cairia bem por parte do governo aes extremamente
ostensivas de imposio ideolgica. Mas o que no consegue ser escondido a intenso por
traz do gesto.
Em 1917 os Estados Unidos ainda no haviam declarado sua entrada na I Guerra
Mundial, pressionado pela existncia de uma forte corrente prapagandstica inglesa e alem
em seu prprio territrio o pas se mobilizou e para conseguir o apoio da populao lanou
mo da perspectiva da Guerra Total, ou seja, seria preciso mobilizar a retaguarda interna do
pas e ao mesmo tempo garantir o apoio popular intenso de guerra tomada pelo governo.
importante salientar a importncia da propaganda
nas campanhas que visam elevar a moral interna dos
civis entre 1914 e 1945. A guerra moderna incluiu
esta novidade: o envolvimento das populaes. (...)
John Grierson, o criador dos modernos documentrios
cinematogrficos salientou que era necessrio um
46
Em qualquer regime, a propaganda poltica estratgia para o exerccio do poder, mas nos de
tendncia totalitria ela adquire uma fora muito maior porque o Estado, graas ao monoplio dos meios de
comunicao, exerce censura rigorosa sobre o conjunto das informaes e as manipula. O poder poltico, nestes
casos, conjunga o monoplio da fora fsica e simblica. CAPELATO, op. cit., p.66.
32
O cinema foi visto pelas autoridades americanas como um veculo com alto poder de
penetrao junto s massas. Por meio de filmes de fico eles acreditaram poder transmitir
contedos sem usar de uma propaganda direta de convencimento. A estratgia ento seria
mais sutil. O OWI (Office of War Information) decidiu usar a tela como um de seus
principais meios para contar, aos americanos, a histria da guerra, dar-lhes uma boa viso do
conflito mundial de idias e interesses, e desafi-los a bater o inimigo. A deciso no foi
censurar Hollywood, mas alist-la neste esforo.
48
47
Ibid, p. 153
Idem, ibid, p. 150
33
FOUCAULT, Michel. O original e o regular. In: A arqueologia do saber. Trad. Luiz Felipe Baeta
Neves. Rio de Janeiro: Forense Universitria, 2004, p. 161.
34
51
Ibid, p. 163
35
traduz as lutas ou os sistemas de dominao, mas aquilo por que, pelo que se luta, o poder do
qual nos queremos apoderar. 52
Os cinejornais so discursos e ao mesmo tempo caminhos discursivos que sustentam
a briga simblica no interior das tenses polticas que prezam em ltima instncia pela
permanncia no poder.
O discurso poltico aliado formulao cinematogrfica de contedos fortemente
encontrado na produo de ordem totalitria e re-apropriado em novas nuances em regimes
democrticos. Mas existe um traado enunciativo, presente nestas produes, que interliga a
realizao dos cinejornais produzidos pela Prefeitura Municipal de Belo Horizonte, durante a
administrao do prefeito Jorge Carone Filho no ano delimitado de 1963, caso estudado por
estas pginas. O perodo poltico brasileiro democrtico, mas um dos traados, presente
nestas produes, capaz de exprimir a regularidade pela qual percebida a permanncia de
um fio condutor universal.
Estes cinejornais pesquisados dialogam com o universal por meio de um trao de
permanncia, a saber, o ritual do poder. Este conceito alinhava, a partir da premissa da
regularidade de Foucault, o fio condutor da proposta que pensa um caminho historiogrfico
para a produo de cinejornais polticos-propagandistas pelo mundo. Assim, o pressuposto
que universaliza essa documentao estudada a presena marcante do ritual do poder nestas
produes.
O Ritual do Poder um conceito cunhado por Paulo Emlio Sales Gomes ao estudar a
produo do cinema documental brasileiro durante o perodo mudo (1898-1930). Ele
percebeu dois plos argumentativos que se repetiam na maioria dos filmes denominando-os
de Bero Esplndido e Ritual do Poder.
O Bero Esplndido o culto das belezas naturais do
pas, notadamente da paisagem da Capital Federal,
mecanismo psicolgico coletivo que funcionou
durante tanto tempo como irrisria compensao para
o nosso atraso. O cinema recm-aparecido foi posto a
servio do culto (...). O Ritual do Poder se cristaliza
naturalmente em torno do Presidente da
Repblica. (...) so todos filmados presidindo,
visitando,
recebendo,
inaugurando
e,
eventualmente, sendo enterrados. 53
52
36
54
As consideraes deste pargrafo foram sintetizadas a partir de informaes tecidas pela Palestra:
Rituais do poder: documento, memria e histria, ministrada por Eduardo Morettin em 04 de novembro de
2006 durante o curso de Histria do Documentrio Brasileiro na Cinemateca do Museu de Arte Moderna do Rio
de Janeiro.
37
38
39
57
mal e os homens de bem dessa nao devem se unir para evitar um mal maior, a saber, o
comunismo e as reformas de base do governo.
55
GORENDER, Jacob. Combate nas trevas. A esquerda brasileira: das iluses perdidas luta armada. 2 ed.
So Paulo: tica, 1987. 48-49
56
RIBEIRO, Jos Amrico. O cinema em Belo Horizonte: do cineclubismo produo cinematogrfica na
dcada de 60. Belo Horizonte: Editora UFMG, 1997, p. 21
57
Para detalhes sobre o Ips ver o importante trabalho. ASSIS, Denise. Propaganda e cinema a servio do golpe
(1962/1964). Rio de Janeiro: Mauad, FAPERJ, 2001.
40
E assim o tecido poltico brasileiro ia sendo explicitado no ano de 1963 que chegou ao
final apresentando um crescimento econmico de apenas 2,1%. Se por um lado o Partido
Comunista Brasileiro havia se convertido naquele ano em uma organizao com capacidade
decisria58 , a direita tambm se arregimentava costurando organicamente os setores que no
se encontravam satisfeitos com os possveis rumos polticos do pas.
Uma sntese dos nimos polticos que preocupavam tanto as foras conservadoras
brasileiras quanto norte-americanas no que tocava os rumos da situao brasileira foi definida
em matria do dia 8 de abril de 1963 no jornal Binmio, publicao de oposio imprensa
conservadora de Belo Horizonte. Criado no incio da dcada de 1950, nos anos60 j circulava
com bastante adeso pela populao da cidade.
1) A pregao do sr. Leonel Brizola, cunhado do
presidente da Repblica, que estava reclamando do
Congresso, em tom de imposio, as chamadas
reformas de base; 2) Fortalecimento da Frente
Parlamentar Nacionalista, que contava com quase um
tero da Cmara de Deputados, com representantes de
todos os partidos, inclusive 12 da UDN, partido que
liderava a oposio; 3) Movimentao dos sargentos
que, segundo os observadores militares, estavam
perfeitamente integrados ao esprito da pregao
reformista; 4) A esquerdizao de setores havia pouco
tempo estranhos a qualquer esquema poltico, como
era o exemplo do clero. Em So Paulo, sob a direo
de um frei dominicano, acabava de ser lanado um dos
jornais de linha mais radical do pas, denominado
Brasil Urgente; 5) A realizao do Congresso de
Solidariedade a Cuba; 6) A alterao do art. 141 da
Constituio, para fazer a reforma agrria com
pagamento em ttulos da dvida pblica; 7) A
autorizao do ministro do Trabalho para a criao de
uma Central Sindical. 59
O ano de 1963 registraria ainda vrios conflitos rurais por descontentamento das bases
rurais. Em Pernambuco e na Paraba, duzentos mil cortadores de cana entram em greve
acentuando o medo dos latifundirios.
O xodo do campo atingiu o auge no incio dos anos
60, fomentando nos grandes centros da Regio CentroSul a concentrao de trabalhadores com mo-de-obra
58
GORENDER, 1987, p. 46
RABLO, Jos Maria (direo). Binmio. Edio histrica. Belo Horizonte: Armazm de Idias/Barlavento
Grupo Editorial, 1997, p.50
59
41
Belo Horizonte era ento a quarta cidade brasileira, com aproximadamente 700.000
habitantes, a espera de atingir o seu primeiro milho. Era o auge do processo de
metropolizao da cidade que, segundo o PLAMBEL Planejamento da Regio
Metropolitana de Belo Horizonte -, ocorreu entre os anos de 1950 e 1977.
Em 1950, a cidade tinha pouco mais de 350 mil habitantes e viu esse nmero dobrar
durante os dez anos seguintes devido, principalmente, ao xodo rural, que teve na poca um
movimento bastante significativo. Neste perodo, o processo modernizador se instala
definitivamente na capital mineira, ficando conhecido como dcada da indstria,
impulsionado pela criao das Centrais Eltricas de Minas Gerais (Cemig), em 1952, que
consolidou a instalao da indstria siderrgica. Assim, s, de fato, na dcada de 1950 que
o desenvolvimento industrial de Belo Horizonte poder se dar sem os constrangimentos da
carncia de energia eltrica. 61
A arquitetura moderna, aliada aos investimentos feitos na construo civil, conferiu
cidade uma fisionomia que procurava se igualar cada vez mais das grandes metrpoles,
apesar do eterno ar provinciano de cidade do interior. Mas a busca pela modernidade
construiu obras como o edifcio JK, na Praa Raul Soares, e do edifcio Clemente Faria, na
Praa Sete de Setembro, inaugurado em 1951. Em 1957, o governo federal confirma
investimentos milionrios na construo da Cidade Universitria na Pampulha e, em 1958, era
criada a Universidade Catlica de Minas Gerais, alm do Colgio Municipal e do Imaco
Instituto Municipal de Administrao e Cincias Contbeis.
60
61
42
A capital de Minas Gerais havia ento passado por uma dcada de intensas
modificaes, num processo de transformao que pretendia diminuir os aspectos interioranos
da cidade e dar incio a uma modernizao que projetaria o municpio em escala internacional.
Sob o ponto de vista histrico, a perspectiva de um impulso modernizador ditou a face
belorizontina no perodo, que j sinaliza por sua vez, os contornos poltico-administrativos da
dcada seguinte.
A cidade no incio dos anos de 1960 o reflexo de obras construdas sob a vertente
modernista cavada nas duas dcadas anteriores. O prdio do Departamento Estadual de
Trnsito (Detran-MG), localizado na Avenida Joo Pinheiro, representa um exemplar tpico
das construes que ocorreram na capital mineira nesta poca. Inaugurado em janeiro de
1960, causou forte impresso aos belorizontinos, no s pela qualidade de sua construo,
mas, sobretudo, pela sua concepo esttica. O painel artstico do pintor modernista Mrio
Silsio deu personalidade ao edifcio de quatro andares. O edifcio Mesbla, na Avenida
Afonso Pena, tambm foi um marco do perodo. Mas, em nome do progresso, algumas
construes do incio da cidade j cediam espao aos modernos arranha-cus, de dez
andares. O Grande Hotel de Belo Horizonte foi demolido para construo do modernssimo
Conjunto Arcanjo Maletta. Localizado bem no centro da cidade, na Rua da Bahia, o edifcio
Maletta assume ento o posto de referncia cultural de Belo Horizonte. O prdio reunia na
poca, a nata intelectual envolvida com o universo da poltica e estudantes que fomentavam a
ao cultural para ser empregada de forma crtica no cotidiano da cidade. A dcada de 1960
inaugura novas tendncias. O clima calmo se rende agora em definitivo aos imperativos da
metropolizao, rompendo com os comportamentos que referendavam o incio do sculo. O
asfalto nas ruas passa a dominar o cenrio urbano, anunciando o fim dos bondes e a chegada
dos nibus, alm do significativo aumento no nmero de carros particulares.
Para Le Corbusier apud Jlio Csar Bure (1997), a arquitetura preside os destinos da
cidade. Ela ordena a estrutura da habitao, e representa uma clula bsica do tecido urbano
que submete s suas decises a alegria e a harmonia do espao. Ela estabelece a rede de
circulao que pe em contato as diversas zonas urbanas, sendo a chave da apropriao social
do espao urbano.
Com um crescimento mdio de 7% ao ano devido ao intenso processo de urbanizao
migratria, a cidade chega aos anos de 1962 e 1963 com uma grave situao populacional,
vendo o surgimento de novas favelas como a Padre Lage, Frei Carlos Josefa e Joo XXIII. O
problema era to grave que em 1964 aprovada a lei n 1072 que cria a Superintendncia das
43
Terras Urbanas e Rurais para fins de aproveitamento social. Mesmo assim, Belo Horizonte
continuou a viver merc das leis do mercado imobilirio, que faziam nascer novos bairros
numa velocidade impressionante. O cinema no ficou de fora deste processo de extenso na
ocupao do solo, e marcou sua presena mesmo em reas mais afastadas do centro, onde
foram construdas salas de exibio nos bairros. Este movimento se configurou como um dos
principais destaques na relao da cidade com a grande tela durante a dcada de 60.
As altas taxas de crescimento demogrfico, associadas concentrao do capital e da
renda contribuem para a formao de um espao de segregao, tanto no que diz respeito
especializao das atividades econmicas, quanto das desigualdades sociais. Intensifica-se a
pobreza da metrpole, proliferam as favelas.
Inserida em um projeto desenvolvimentista racional, traado inicialmente em sua
fundao, o crescimento fsico-espacial da cidade torna-se intenso; a concentrao cumulativa
de servios e capital delineia rapidamente as marcas de macrocefalia. Belo Horizonte, j
muito grande, rene nos seus espaos, as contradies do processo intenso de urbanizao. 62
Dito de outra forma e sinteticamente o planejamento na cidade, mesmo em suas pocas de
maior prestgio e atuao (...) foi, sobretudo, instrumento auxiliar dos interesses do
mercado, interesses estes que jamais foram afrontados pelos planos, mesmo quando assim o
exigia o interesse coletivo. 63
Com uma campanha eleitoral que trazia por slogan a frase: Carone realiza mesmo! E
com uma proposta de renovao poltica pautada na idia de que Belo Horizonte precisava de
um homem dinmico e realizador, capaz de enfrentar e solucionar os problemas de Belo
Horizonte64 ex-prefeito no interior, e, portanto, sem compromissos com a elite burguesa da
capital, mas com uma slida carreira poltica, as eleies de 7 de outubro de 1962 sagrou
vencedor em primeiro turno o ento Deputado Estadual Jorge Carone Filho, candidato do PRPartido Republicano tendo como vice-prefeito Jair Negro de Lima do PSD-Partido Social
Democrata.
Poltico, tabelio e desportista nasceu em Rio Branco (hoje Visconde do Rio Branco),
Minas Gerais, a 29 de junho de 1919. Filho do poltico Jorge Carone e de Ducila Carone, se
casou com Nysia Coimbra Flores Carone. Os estudos secundrios foram cursados nas cidades
mineiras de Ub, Viosa, Mariana e Ouro Preto. Como desportista, atuou como reserva do
62
Os dois ltimos pargrafos esto baseados no trabalho: ARAJO, Maria Luiza Grossi. Percepo e
planejamento em ambiente urbano: o projeto de renovao do centro de Belo Horizonte. Belo Horizonte:
Instituto de Geocincias da UFMG. (Dissertao, Mestrado em Geografia), 1995.
63
PAULA e MONTE-MR, 2001, p. 40
64
Frases retiradas de material de campanha prefeitura em 1962. Documentos do Arquivo Pessoal de Jorge
Carone Filho.
44
Eu era do PR, mas tinha sido chefe da campanha queremos Getlio na minha regio.
Eu era trabalhista. Minha poltica sempre foi trabalhista, quer dizer, eu reconheo que Getlio
foi um ditador, foi um perodo em que vamos dizer assim, em que as liberdades foram
ameaadas, mas com relao parte social, as leis do Getlio: justia do trabalho, indenizao
proporcional por tempo de servio, salrio mnimo, estabilidade, maior remunerao no
trabalho noturno, direito s frias, iguais salrios pelos mesmos servios, quer dizer ento que
eu sou f da legislao dele, certo. Por ela eu sempre pautei a minha vida pblica, na
legislao social do Getlio. 67
A origem no Partido Republicano e a vocao trabalhista permitem a formao da
coligao PTB-PR com a qual vence as eleies para prefeito de Visconde do Rio Branco,
permanecendo no cargo de 1954 a 1958. Em seguida elegeu-se Deputado Estadual pelo PR
para a 4 e 5 Legislaturas (1959-1967). Na Assemblia, foi 3 Secretrio da Comisso de
Finanas, Oramento e Tomada de Contas (1959; 1961), do Servio Pblico Civil (1960) e
Especial para Construo do Prdio da Assemblia (1959).
O percurso parlamentar registra projetos de aladas muito diversas Lei 1947 de
13/08/59 recurso para construo do estdio do Mineiro; Lei 2395 de 10/07/61 recurso
para construo do Pronto Socorro Joo XXIII; Lei 2474 (Lei da Paridade), que deu
65
MONTEIRO, Norma de Ges. (coord,) Dicionrio biogrfico de Minas Gerais. Belo Horizonte:
UFMG/ALMG, 1994, p. 153
66
DELGADO, Lucilia de Almeida Neves. PTB do Getulismo ao reformismo (1945-1964). So Paulo: editora
Marco Zero, 1989, p.48
67
Entrevista de Jorge Carone Filho concedida autora em 25 de janeiro de 2007. A partir de agora esse
depoimento ser assinado apenas como Entrevista Carone.
45
70
diz: telefnica incapaz, neste artigo contra a compra das concessionrias de telefones e
eletricidade, eu dava esta informao impressionante sobre a atuao da Cia. Telefnica de
68
Entrevista Carone
Jornal Estado de Minas do dia 4 de outubro de 1962.
70
Edio de 22/04/1963
69
46
Democrtica
Nacional. (...) desejo ressaltar perante Vossa Excelncia e seus dignos pares que constitui
grande honra em minha vida pblica ter recebido da Egrgia Cmara o apio e a compreenso
que me animaram, nste primeiro ano de minha gesto frente do Executivo, a luta pelo bem
comum
73
71
RABLO, 1997, p. 51
Prefeitura Municipal de Belo Horizonte - Relatrio de Gesto 1963. A partir de agora as citaes deste
documento sero identificadas por RG63.
73
RG63
72
47
Dois focos se mostraram bem claros na atuao da prefeitura naquele ano: resolver o
grave problema de gua enfrentado pelo municpio e a realizao de obras de infra-estrutura
como habitao e vias pblicas.
No resumo das concorrncias pblicas realizadas no exerccio de 1963 constam trs
editais em destaque sendo um destinado abertura e instalao de 150 poos artesianos na
Capital
74
(substituio de paraleleppedos por asfalto), cobriu entre ruas, praas e avenidas 96.788,00m
a um custo de Cr$ 165.352.125,30. J a relao de logradouros beneficiados com
recapeamento (nova capa de asfalto sobre o antigo) em ruas e avenidas totalizara uma rea de
180.206,00m a um custo de Cr$ 207.089.158,60.
O grande problema da falta de gua na cidade bem como o problema das enchentes
resultou em obras de canalizao como as realizadas na rua Professor Morais com o
alargamento, aprofundamento e lajeamento do canal. Canalizao do crrego da Avenida
Uruguai no Carmo para disciplinar os cursos dgua evitando os transbordamentos que
74
48
77
A insatisfao popular
canalizada pela imprensa fez surgir jingles que circularam amplamente pela cidade, como
este:
Voc gosta de loira
Eu gosto de morena
Cad, cad, Carone
Os arvoredos da
Avenida Afonso Pena?
77
Entrevista Carone: At hoje ainda tem pessoas que acham que eu estou errado, mas voc imagina o seguinte.
Se a Afonso Pena fosse igual a Bernardo Monteiro, como que ela ia comportar o trnsito dela? Quer dizer, no
tinha jeito. Outro dia conversei com uma senhora at, ela falou pra mim. No, mas no precisava ter tirado que
ia passar do lado. Mas a Afonso Pena a nica avenida que divide a cidade no meio, mas quando eu tirei, eu
tinha um plano maior.
78
RABLO, 1997, p. 53
49
79
80
50
51
84
52
Documento micro filmado. Rolo n. 005. Acervo Cmara Municipal depositado no Arquivo Pblico da Cidade
de Belo Horizonte
53
Joo Goulart, e o Jango ao meu pedido ele asfaltou praticamente o anel rodovirio e me deu
recursos para construir a canalizao da Professor Moraes, rua Outono, Andaluzia, Uruguai,
Pium-, Palmira, quer dizer, iniciar a construo da Prudente de Morais, iniciar a construo
da Catalo, quer dizer o Jango me ajudou demais. Bom eu fiquei ento comprometido com
ele. Quando a cmara municipal em fevereiro negou o ttulo a ele, em fevereiro de 64 eu dei o
ttulo de cidado a ele por decreto, eu prefeito dei por decreto, quer dizer, assumi nas vsperas
da eleio entendeu?86. O golpe militar iria instituir no pas um novo comando de governo
em abril daquele ano.87
Meses depois, no mesmo ano de 1964 seria instaurado contra o prefeito um Inqurito
Policial-Militar (IPM) que foi presidido pelo Coronel Silvio de Souza em uma comisso
composta por militares da 4 Regio Militar (Juiz de Fora), mesmo destacamento que no dia
31 de maro, comandados pelo General Olimpio Mouro, deu inicio ao levante mineiro em
direo ao Rio de Janeiro. Foram 13 horas de depoimentos sendo apresentados mais de
cinqenta documentos para rebater as acusaes apresentadas contra a prefeitura.
88
Este
89
Entrevista Carone
87
Entrevista Carone: O que aconteceu foi que eu bati o telefone para o Jango e falei: - Olha presidente o
negcio o seguinte. O Magalhes e o Mouro saram daqui pro Rio de Janeiro pra depor, mas acontece o
seguinte. A informao que eu tenho que eles no tm nem bala, nem arma, eles tm uns fuzis velhos. A o
Jango me falou assim: - Carone. Eu no vou reagir porque eu tenho medo de cair em mos piores. - Eu no sei
quais so essas mos piores. Ele me falou assim: - eu no vou reagir porque eu tenho medo de cair em mos
piores. Quer dizer, ele conseguia acabar com a Revoluo, mas no agenta as conseqncias, nas mos piores,
s pode ser..., tem hora que eu penso, nem vou falar quem no, mas at hoje eu quero saber quem so as mos
piores. Pois , eu desconfio. Mas ele me falou assim na hora do almoo, liguei pra ele e falei pra ele: Presidente. O Mouro e o Magalhes saram daqui com as tropas militar e o pessoal da 4a regio, mas eles no
tm armamento nenhum, no tem arma. Se mandar a Vila Militar subir (do Rio subir pra Minas) eles vo parar
em Gois. Ele falou: - eu no vou fazer isso porque pode cair em mos piores.
88
Entrevista Carone
Projeto de Resoluo n. 143/65 de 31 de janeiro de 1965.
90
Documento recebido pela Cmara Municipal de Belo Horizonte, sob o protocolo n 113/65 de 9 de fevereiro
de 1965.
89
54
de Jos de Figueiredo Silva, advogado de Jorge Carone Filho para obter cpias de vrios
documentos, entre eles a ata da sesso da cmara de 31/01/1965, recebe como resposta uma
certido que justifica a deciso da comisso instaurada na cmara, que foi presidida pelo
prprio presidente da casa, afirmando ter sido tomada a deciso a partir de nota oficial do
ento governador Jos de Magalhes Pinto encaminhada Presidncia da Cmara Municipal
de Belo Horizonte na madrugada do mesmo dia 31 de janeiro alegando que o municpio
passava por um grave problema de incapacidade administrativa:
O governador do Estado de Minas Gerais,
Considerando o notrio estado de calamidade na
administrao da Prefeitura de Belo Horizonte,
notadamente no que se refere situao financeira do
municpio;
Considerando que essa grave irregularidade afeta a
ordem pblica e social, com o funcionalismo sem
condies at de subsistncia, por isso que h vrios
meses no recebe seus vencimentos;
Considerando que dever do Governador do Estado
prevenir reaes programadas que intranqilizam a
populao da cidade, com inevitveis e ruinosas
repercusses;
Considerando a impossibilidade moral e material de
colaborao financeira do Estado com a Prefeitura, na
situao insustentvel que se criou;
Considerando, finalmente, os imperativos de
preservao das instituies e do estilo moral do
governo que inspiram a Revoluo de maro, resolve
determinar:
1- Ao Secretrio de Segurana Pblica, que ocupe a
sede da Prefeitura, preservando-a dos excessos
anunciados;
2- O Secretrio do Interior e Justia, que sugira as
demais medidas que se tornem necessrias.
Belo Horizonte 31 de janeiro de 1965.
Ass: Jos de Magalhes Pinto. 91
Documento micro filmado. Rolo n. 005. Acervo Cmara Municipal depositado no Arquivo Pblico da Cidade
de Belo Horizonte.
55
Eu fui ao Magalhes e falei com ele, olha governador: eu tenho tido problemas a, greve essas
coisas, mas agora graas a Deus eu vou com o reajustamento que eu fiz de gua, esgoto e lixo
eu vou consegui pagar em dia. Foi o erro que eu cometi. Eu falando com ele que tinha
equilibrado as finanas, a ele disse. Est na hora de tirar esse homem. Pois a eu digo: estava
na hora de ele me tirar porque eu ia passar por cima. Ento, foi quando eles me tiraram.92
As querelas polticas entre Magalhes Pinto e Carone eram antigas. As disputas
envolviam questes como, por exemplo, a construo do estdio do Mineiro. O projeto
do ento deputado estadual Jorge Carone, aprovado pelo governador poca Bias Fortes, mas
que foi encampado por Magalhes Pinto que mais tarde acabou inaugurando o estdio e
conferindo construo o seu prprio nome. O lanamento do movimento de maro-abril de
1964 trazia a possibilidade eminente de uma candidatura de Magalhes Pinto presidncia da
repblica interesse que era contrariado com a presena de Jorge Carone Filho frente da
prefeitura de Belo Horizonte. Carone aliou a sua poltica ao presidente Joo Goulart, alm de
j trazer em seu histrico poltico relaes com o iderio petebista. Agravando a antipatia
poltica entre prefeito e governador, tem o fato de Carone ter se lanado candidato ao governo
do Estado, para as eleies de 1964, construindo uma campanha com o slogan JJ. Juscelino
Kubitschek presidente 65 e Jorge Carone governador 65. Um prefeito que era candidato a
governador e que no apoiava a candidatura presidncia de Magalhes, um empecilho
poltico difcil de ser administrado.
Cumprindo a determinao do governador a sede da prefeitura invadida pela Polcia
Militar.93 Aps a sada de Carone assume o seu lugar Oswaldo Pieruccetti eleito pela prpria
cmara de vereadores. 94 Para vice reconduzido ao cargo Jair Negro de Lima do PSD. 95
O impedimento de 1965 conferiu a Carone um outro caminho. Com os direitos
polticos cassados bacharelou-se em Direito pela Universidade de Itana. Voltando
militncia poltica aps a anistia de 1979, em 1982 elegeu-se Deputado Federal para o perodo
1983-1987.
92
Entrevista Carone
Em 22 de janeiro de 2003 atendendo ao pedido do ex-prefeito Jorge Carone Filho a Diretoria do Legislativo
Municipal expede certido onde constata que Carone foi eleito para o cargo de Prefeito, tomando posse em
31/01/1963 e exercendo o cargo at 31/01/1965, sendo impedido de cumprir o seu mandato, por um ato do
Governo do Estado, conforme Resoluo 143/65, publicada em 04/02/1965.
94
Entrevista Carone: Porque o que acontece o seguinte. O Magalhes me chamou no palcio para que eu
renunciasse. - Eu vou renunciar o qu Magalhes. Eu nunca renunciei nem a presidente de clube de futebol. Eu
no vou renunciar ao mandato no. No adianta voc me tirar, porque voc me tirando o Jair Negro de Lima
do PSD vai continuar l.
95
O Projeto de Resoluo n 14/65 de 18 de fevereiro de 1965 revoga a resoluo n 143/65 no que se refere ao
impedimento do vice-prefeito reconduzindo-o ao cargo.
93
56
O que chama a ateno no nome escolhido para ser o novo chefe do executivo mineiro
a intimidade da relao poltica de Pieruccetti com Magalhes Pinto que pode ser percebida
em um fragmento do texto de Roberto Drummond em uma biografia sobre o governador:
Belo Horizonte assumiu naquele pr-64 contornos que vieram a reboque dos
encaminhamentos polticos estaduais e nacionais. Era ponto estratgico e por isso recebeu um
largo apoio do governo Joo Goulart. Era tambm alvo de interesse poltico do governo do
estado, que por sua vez no poderia permitir brotar em seu quintal, uma clula contrria aos
seus prprios interesses, que j se firmavam junto s foras de oposio ao governo federal.
Diante dos embates polticos, de banqueiros e de grandes proprietrios de terra da
cidade devido s posies administrativas que havia tomado frente do executivo municipal
(vide entrevista). Tendo a frente uma Belo Horizonte recm chegada de uma dcada que viu
sua populao dobrar em nmero de habitantes, cidade que se apresentava carente de obras
que garantissem infra-estrutura bsica em vrios campos, para resolver problemas como o do
dficit habitacional, abastecimento de gua e constantes enchentes; diante desse cenrio, seria
necessrio traar uma estratgia que garantisse um apoio mnimo para que a gesto se fizesse
de forma efetiva.
Analisando o teor das aes administrativas municipais na cidade, lendo as leis
aprovadas durante o ano, percebendo o contorno empreendido nos filmes realizados pela
municipalidade (alvo de discusso do prximo captulo) possvel afirmar que a prefeitura de
Belo Horizonte na gesto de Jorge Carone Filho desenvolveu um trabalho que assumiu um
tom populista bastante forte.
96
MELO, Jos Geraldo Bandeira. Magalhes Pinto. Navegando contra o vento. DRUMMOND, Roberto. O
romance de uma vida. Belo Horizonte: Companhia Energtica de Minas Gerais, 1994, p. 94.
57
Este carter populista percebido por esta pesquisa como o dado possvel para se
articular o contexto poltico-institucional atuante na cidade no ano de 1963, porque reflete a
diretriz do executivo municipal tornando-se assim, por conseqncia, a prpria ao
institucional da prefeitura no perodo. A procura por perceber o caminho traado por uma
administrao municipal no que ela traz de objetivos em primeiro e segundo planos. No
primeiro plano esto as realizaes administrativas do executivo municipal. Em segundo
plano esto os agentes a quem estas realizaes querem convencer. A percepo do poder,
assim, fenmeno dos mais importantes para o entendimento de atitudes e representaes
mentais de uma dada poca. E tal processo realiza-se em duas vias: a forma pela qual o
poder pretende aparecer e a maneira pela qual percebido. 97 (grifos da autora)
Em questo, o grande bloco a ser convencido a fim de ser transformado em aliado
poltico a populao de Belo Horizonte. A dinmica da administrao que previa na
campanha eleitoral, por exemplo, governar com as portas do gabinete abertas, ou mesmo
depois de eleito estabelecer com as comunidades de vilas e favelas um contato corpo a corpo,
sintetizando na figura do prefeito o prprio poder municipal em sim, configuram-se, todas
elas, em estratgias de convencimento. A administrao popular do poltico revela uma pulso
de representao sobre uma cidade que tem por desejo prosperar. O futuro mais promissor
estava sendo sinalizado pelo volume de obras, pela aproximao do chefe municipal com o
povo, quebrando com padres conservadores elitistas e se pondo em consonncia com a
popularidade meditica de polticos da esfera federal, em uma tradio que dialoga com
Getlio Vargas, Juscelino Kubitschek e Jnio Quadros.
Isso por que o futuro poltico tambm estava estabelecido. Executar nos dois primeiros
anos de mandato uma administrao efetiva em resultados para lanar-se candidato ao
governo estadual com forte apoio popular na Capital. A estratgia poltica tambm por sua
vez um discurso, sendo seus enunciados as realizaes polticas, a construo de
representaes, a mobilizao do imaginrio social que cerca a coletividade, a conseqente
construo de novos smbolos e as articulaes institucionais que necessitam ser formadas
com outros partidos, entidades de classe, setores da sociedade civil e etc. Assim, esses
enunciados so os canais pelos quais o discurso se difunde, atentando-se para a ordem
97
FICO, Carlos. Reinventando o otimismo: ditadura, propaganda e imaginrio social no Brasil. Rio de Janeiro:
Editora Fundao Getlio Vargas, 1997, p. 54
58
foucaultiana que entende o discurso como sendo o prprio poder, aquilo pelo que se luta,
aquilo de que se quer apoderar. 98
O trip: poltico, histrico e institucional de Belo Horizonte no ano de 1963 confere
um contorno especial a cidade neste perodo. Um espao urbano expressando contradies
visveis entre um anseio modernizador e a existncia de grandes dificuldades na infraestrutura de servios bsicos como telefonia, habitao e abastecimento de gua. Uma
prefeitura que possua uma estrutura administrativa99 herdada de meados da dcada de 1950 e
que na dcada de 60 precisaria dar conta de novos problemas administrativos obrigando a
criao de superintendncias100 e servios101 para atender as crescentes demandas do
municpio. E uma conjuntura poltica em que atuavam foras contrrias entre si (governo
federal e governo estadual) influenciando a cidade na sua prpria conduo polticoadministrativa. Pela multiplicidade destes aspectos, se justifica a escolha do ano de 1963, para
anlise da produo especfica de filmes polticos realizados pelo executivo municipal na
cidade de Belo Horizonte no primeiro ano de administrao do prefeito Jorge Carone Filho.
Este trip por mais complexo que se apresente constitui apenas aspectos das muitas
cidades que existem co-habitando o mesmo espao geogrfico. Na esfera cultural abrem-se
outros horizontes e dentro deles o cinema se projeta.
Enquanto a comisso de construtores comandada por Aaro Reis planejava com uma
racionalidade matemtica os contornos geomtricos da futura capital de Minas Gerais, a
Europa conhecia em 1895 a inveno do cinema feita pelos irmos Lumire. Assim, Belo
Horizonte nasceria em 1897 j sob o signo audiovisual exibindo sua primeira sesso de
cinema seis meses depois, em 10 de julho de 1898, quando a cidade ainda buscava se entender
enquanto nova capital.102 Neste trabalho no temos espao para elucidar a relao da cidade
com o cinema pelo fio da permanncia no tempo, desde a sua fundao at dcada de 1960
como gostaramos de fazer.103 Na impossibilidade de fazer um panorama mais extenso e
98
59
efetivo da relao da cidade com a grande tela antes do nosso perodo de estudo fica esta
sntese confiada ao sentimento expresso nas palavras do poeta:
Para se ter uma idia, nos primeiros oitenta anos da capital quase uma centena e meia
de salas de exibio se movimentaram no tempo e no espao.105 Mas o nosso foco mesmo o
104
105
60
incio da dcada de 1960, porm, no podemos entend-la sem antes conhecer um pouco do
que se passou na cidade na dcada anterior.
Nos anos de 1950, a cidade j apresentava um pblico cativo, bastante aplicado. Ir ao
cinema configurava-se em um hbito quase religioso, que revelava por sua vez, a importncia
social que possua. Em um depoimento do cineclubista Raimundo Fernandes possvel sentir
o tom deste clima:
RIBEIRO, 1997, p. 45
FERRARA, Lucrecia DAlessio. Os significados urbanos. So Paulo: tica, 2002.
61
urbana, discriminar caractersticas que revelem como outra face, a cidade como objeto de
conhecimento. A imagem urbana um dado perceptivo, permite desenvolver a informao
que a vivncia urbana estimula. Uma cena em que se vem duas mil pessoas em p, reunidas
nas ruas e em praas pblicas frente de uma tela que recebia a projeo de uma luz e com
isso imagens em movimento de seres humanos falantes podiam ser vistas no mnimo muito
curiosa. Mas para, alm disso, o nmero de expectadores, a itinerncia e as caractersticas do
projeto Cine-Grtis demonstram intrnsecas relaes de interesse da populao belorizontina
com o cinema.
A paixo facilmente se transformava em militncia promovendo reaes explosivas.
Fato que em 1955, Belo Horizonte se inquietou com a ameaa de desaparecimento de um
importante espao do circuito comercial. O Path, uma das mais charmosas e procuradas salas
da capital, corria o risco de ser transformada em uma casa de jogo de bingo. A reao popular
desencadeou uma ao de rgos de preservao do patrimnio pblico. A mobilizao
pblica conseguiu converter o fechamento em investimento, garantindo o tombamento da
sala.108
O poder pblico municipal no se punha parte deste fluxo popular do cinema e da
cidade e tambm propunha sua atuao na rea. Por meio de lei municipal, cria em 1955 a
Seo de Cinema Educativo da Prefeitura que se destina a promover exibies
cinematogrficas de carter educativo e cultural nos estabelecimentos de ensino mantidos pela
Municipalidade, bem como a colaborar na campanha de educao popular nos bairros e vilas
da Capital.
109
62
pudesse ser mais bem destrinchado. Mas o indcio da atuao da prefeitura na rea do cinema
fica registrada e o foco da ao bem delimitado, as exibies cinematogrficas,
preferencialmente de pelculas educativas sero feitas nos estabelecimentos de ensino
mantidos pela Municipalidade, em logradouros pblicos e em outros recintos, a critrio do
Prefeito.111 A administrao municipal j estava atenta s possibilidades do cinema e de sua
eficaz absoro pela populao da cidade. Ter s mos um arcabouo montado que pudesse
colocar a municipalidade prxima das pessoas, e, ao mesmo tempo, poder se fazer presente
neste fluxo cinematogrfico de grande repercusso na cidade, sria em verdade uma atuao
bastante positiva.112 Um outro indicativo para esta afirmao apia-se no fato de em 1961 a
Seo de Cinema ter subido na hierarquia da administrao municipal passando a integrar a
estrutura do Servio de Relaes Pblicas, subordinado diretamente ao Gabinete do Prefeito.
113
Uma portaria de 1958 expressa em seu texto a conscincia do poder pblico municipal
com a relao que a cidade travava com o cinema. Considerando que o cinema uma das
diverses mais difundidas na Capital mineira (...) fica criada a Comisso Especial de
Fiscalizao de Cinemas, diretamente ligada ao Departamento de Fiscalizao (...) Esta
Comisso promover diligncias, vistorias e, se necessrio, percias para o rigoroso exame
tcnico das instalaes de cada cinema, especialmente para o fim de lhe ser concedida licena
especial, para que funcionem como exibidores de filmes da categoria cinemascope.
114
comisso era mista e contou inclusive com a participao do cineclubista e jornalista Ciro
Siqueira, poca, um dos nomes mais influentes na crtica e do fomento discusso
cinematogrfica na cidade de Belo Horizonte.
Apesar de fomentar um importante circuito audiovisual, Belo Horizonte era carente
de um plo produtor capaz de dar movimento cinematogrfico s idias dos homens que j
discutiam a stima arte na cidade. A principal limitao era de ordem econmica, afinal, fazer
cinema implicava e ainda implica em gastos bastante significativos. Mas se no foi pela
produo o fervor mineiro se materializou de outra forma. Belo Horizonte ficaria conhecida e
se tornaria respeitada por sua vocao crtica e pensadora do cinema, produtora sim de
conhecimentos sempre bem trabalhados em torno do cinema como arte e cultura. O cone
111
63
deste movimento foi a Revista de Cinema, publicao fundada em abril de 1954 que
transformou a cidade em um plo difusor do pensamento filmogrfico nacional.
Esta publicao fez com que nomes consagrados da cena cinematogrfica brasileira, se
rendessem aos pensamentos ditados por Belo Horizonte:
ZUBA JR, Jos. Cinema em palavras. Belo Horizonte: Prefeitura Municipal de Belo Horizonte/Secretaria
Municipal de Cultura/ Centro de Referncia Audiovisual, 1995, p. 11
116
Apud RIBEIRO, 1997, p. 41
64
118
pblica a prefeitura sanciona em 1962 Lei que permite no mximo o licenciamento de trs
vendedores de balas nas portas dos cinemas da Capital. Quando requeridas licenas em
nmero superior ao permitido, ser concedida preferncia aos vendedores de balas com mais
tempo no exerccio dessa atividade.
119
A reforma do teatro da Imprensa Oficial que o transformou em um cine-teatro foi realizada no ano de 1964.
Ver: ALVES, Jos Guimares. Recuperao, reforma, reequipamento, construes no governo Magalhes
Pinto. Belo Horizonte: Imprensa Oficial do Estado de Minas Gerais, 1964.
118
BRAGA et alli, 1995, p. 58
119
Lei 0968 de 18 de dezembro de 1962.
65
120
OLIVEIRA. Revista de Cultura Cinematogrfica, v.2, n 8, p. 21-25 apud RIBEIRO, 1997, p. 101
121
98
66
A movimentao cultural e poltica vivida pelo pas naquele incio dos anos de 1960 se
refletia tambm na cidade de Belo Horizonte, alimentando estas produes e discusses,
tornando o cinema cenrio ou mesmo transformando-o em possibilidade de expresso. Os
primeiros anos da dcada de sessenta correspondem ao que talvez tenha sido a mais intensa
fermentao ideolgica e poltica da histria de um pas que ento se politizava ou se
conscientizava, para usarmos a palavra mgica da poca. Existia uma vontade ativa de
participao entre os diversos setores da sociedade e um sopro generoso de mudanas agitava
o pas. 123
Em 1961, a igreja catlica possua um brao estendido para o cineclubismo e o outro
se ocupava da publicao da Revista de Cultura Cinematogrfica. Como fruto de mini-cursos
sobre cultura cinematogrfica, ministrados a partir do cineclube CCBH e entidades como a
Unio Estudantil Catlica (UEC), Juventude Estudantil Catlica (JEC) e a Liga Independente
Catlica (LIC) criado em 1962, aps entendimentos com a Universidade Catlica de Minas
Gerais, a Escola de Cinema com durao de um ano. Com o sucesso da primeira turma
formatou-se ento a Escola Superior de Cinema.
122
RIBEIRO, 1997, p. 22
STARLING, Heloisa Maria Murgel. Os senhores das Gerais: os novos inconfidentes e o golpe militar de
1964. Petropolis, RJ: Vozes, 1986, p. 19
124
RIBEIRO, 1997, p. 287
123
67
A direo ficou a cargo do padre Edeimar Massote que, em texto Revista do Centro
de Cincias Humanas, define a proposta da escola recm criada:
O professor Jos Amrico Ribeiro destaca, porm que o fato da ESC estar inserida
numa universidade catlica isso no concretizou o que a igreja vinha perseguindo desde a
dcada de 50 formar o cineasta para fazer o filme catlico.126 O foco principal como
destacado na fala de padre Massote, diretor do curso, de se preocupar com a formao, alm
da atuao que a escola desempenhou, trabalhando com produtores independentes e at
mesmo como cineclubes ateus (CEC) mostra bem um certo distanciamento poltico com as
orientaes estritamente religiosas.
O Centro Mineiro de Cinema Experimental CEMIC, formado a partir da unio de
nomes ligados Escola Superior de Cinema e tambm ao CEC que participaram, tomando
contato pela primeira vez com uma realizao profissional de filme, nos longas-metragens: O
Padre e a Moa, do cineasta Joaquim Pedro de Andrade, e A Hora e a vez de Augusto
Matraga, de Roberto Santos, ambos rodados na regio de Diamantina, Minas Gerais um dos
exemplos de algumas das parcerias da escola. O centro produziu um nico filme, o curtametragem de fico O Milagre de Lourdes, de Carlos Alberto Prates. Mas o CEMICE foi em
verdade uma tentativa frustrada de se montar em Belo Horizonte um centro produtor de
filmes. 127
Ampla relao da populao belorizontina com o cinema. O incessante abrir e fechar
de salas e a criao de uma forma alternativa de exibio que usava como espao de
socializao as prprias ruas. Forte movimento de discusso cineclubista nascente desde a
125
CUADRADO. Revista do Centro de Cincias Humanas, na V, n 6, p. 237-271 apud RIBEIRO, 1997, p. 163
RIBEIRO, 1997, p. 289
127
RIBEIRO, 1997, p. 197-198
126
68
69
4. CAPTULO 3: Uma crnica sobre uma cidade: os cinejornais das obras pblicas e da
vida social de Belo Horizonte
Ah! Depois eles no sabem nada mais, porque preciso meter as mos na massa,
como se diz, por um bom tempo, a fim de conhecer a fundo as numerosas dificuldades que
devem ser superadas em um ofcio que consiste em realizar tudo, mesmo aquilo que parece
impossvel, e dar aparncia de realidade aos sonhos mais quimricos, s invenes mais inverossmeis
da imaginao. Enfim, no necessrio diz-lo, absolutamente preciso realizar o impossvel,
visto que ser fotografado e que ser exibido.
Georges Mlis Cineasta francs precursor do cinema
Paris, outubro de 1929.
70
DIP, durante o governo Getulio Vargas mas, terceirizados, sendo delegado a vrias
produtoras as edies de cinejornais veiculadas nos cinemas.
Um fato chama a ateno dentro dos filmes analisados. Alguns temas foram
registrados por mais de uma produtora em um mesmo ano. A Semana Santa e a abertura do
terceiro brao do crrego dos Tabues, uma obra de grande vulto so os dois exemplos
temticos ocorridos dentro do recorte documental da pesquisa.
Uma possvel explicao para o fato veio com a entrevista realizada com o
senhor Helio Mrcio Gagliardi,129 poca, cinegrafista de cinejornais.
Tem um outro dado (...) ele [Jorge Carone] dava oportunidade para
todos os produtores que fossem l na prefeitura reivindicar filmagem. Por
exemplo, a Semana Santa de 1963 foi filmada pela PV filmes, do produtor
Paulo Vasconcellos. Teve um lado pelo Alcyr Costa da Panta filmes e tem
filmagens pela Argus filmes que era do Celso Arajo. Ento a gente percebe
que a mesmssima coisa filmada com ngulos diferentes, mas a gente
percebe, a gente l que era para agradar a gregos e troianos para no ter
brigas, no ter disputa. muito apertada essa questo de coisa publica, de
licitao. Hoje o servio pblico tem que ser licitado. Para evitar licitao
ele dava para todo mundo porque assim, ningum reclamava e ficava por
isso mesmo, ento eu tenho tudo levantado, tenho com os dados todos.
71
tambm explica o fato de no ser possvel perceber nestes filmes um padro de filmagem
sobre o prefeito, com exceo apenas de uma regra que se faz presente em todos os filmes:
Jorge Carone Filho sempre aparecer cercado por pessoas, onde quer que ele seja filmado.
A essas produtoras cabia a escolha do tema e o modo de filmar cada assunto. O
Servio de Imprensa da prefeitura somente encomendava o registro, ficando as empresas
responsveis por entregar o filme pronto. A falta de direcionamento especfico por parte da
imprensa da municipalidade foi relatada por Celso Arajo, proprietrio da produtora Argus
Filmes130 e tambm por Helio Gagliardi em sua entrevista quando explica como eram obtidas
as pautas e como era formatada a linguagem:
Alm das escolhas dos temas outro ponto que interfere diretamente no
potencial informativo do documento a linguagem. Nestes filmes em vrios momentos se
percebe uma dissociao entre imagem e som. O exemplo clssico fica por conta das
autoridades polticas. No udio o locutor informa o nome de vrias delas, enquanto que na
imagem vemos uma cmera derivando no ambiente, mostrando ao mesmo tempo muitas
pessoas ou mesmo o anncio de um nome sendo feito vrios quadros antes da imagem que ir
mostrar a pessoa citada.
A explicao pode ser encontrada no processo de revelao e edio dos
filmes. Na dcada de 1960, Belo Horizonte no possua laboratrios cinematogrficos. As
pelculas aqui gravadas tinham que ser enviadas ao Rio de Janeiro a fim de serem reveladas e
130
Ver entrevista de Celso Arajo, proprietrio da produtora Argus Filmes em SIQUEIRA, Daniela Giovana.
Cinejornais e jornalismo: um olhar sobre a construo da imagem de BH nos anos 60. Monografia de concluso
de graduao do Centro Universitrio de Belo Horizonte. Belo Horizonte: 2002.
72
editadas. Neste processo de finalizao do filme estava includa tambm a narrao por parte
de um locutor. O texto era feito em Belo Horizonte e enviado ao Rio de Janeiro junto com os
rolos dos negativos. Muitas vezes as autoridades retratadas no eram conhecidas dos tcnicos
cariocas e a falha na sincronizao tornava-se inevitvel.
O som em off d o tom em todos os filmes e junto a ele como opo sonora
juntava-se a trilha sonora composta por marchinhas ora alegres ora sbrias, enfim, mas
sempre associadas locuo para cobrir os descansos do texto ou para funcionarem como
Sobe Som131 dando mais ritmo ao filme. Tecnicamente no era possvel a captao de som
direto em Belo Horizonte na dcada de 1960, porque filmava-se com cmeras de corda132
produzidas antes de 1930, ainda no perodo mudo. Depois o Alcyr, o prprio Synzio e Seu
Silva compraram uma Arriflex, ento eles comearam a filmar com ela. Era uma cmera que
tinha chassi, motor eltrico, j tinha trs objetivas, maior possibilidade tcnica, era ainda uma
cmera leve, mas fazia barulho porque no era blipada, ento ela no podia captar o som do
ambiente.133
O depoimento a seguir relata uma experincia capaz de exemplificar o modo de
realizao destes filmes no perodo:
131
Efeito sonoro que marca o aumento do volume da trilha sonora em momentos determinados durante o filme.
As tomadas tinham em mdia 30 segundos, tempo de durao de cada corda.
133
Entrevista Helio Mrcio Gagliardi.
132
73
Rio, onde foi gravado (por Cid Moreira) e mixado por um tcnico do
laboratrio.134
134
Texto de Helio Gagliardi sobre o cinejornal de tema nico Rio So Francisco feito por ele em 1963 para o
DEPARTAMENTO ESTADUAL DE INFORMAES, do governo do Estado de Minas Gerais. Fonte:
http://paginas.terra.com.br/arte/cineacao/sfrancisco.html#
135
Entrevista Helio Mrcio Gagliardi.
74
75
o ento governador do estado Magalhes Pinto, seu inimigo poltico, figura que dois anos
aps a data deste filme, exerceria papel fundamental no impeachment de Carone.
Na seqncia, a missa celebrada na Igreja So Jos.
Da cidade para o ambiente religioso e de l para a Cmara de Vereadores.
hora de registrar a posse dos vereadores, a votao para a composio da nova mesa diretora
da cmara e do prprio prefeito. A votao transcorreu em clima de franca cordialidade. O
povo de Belo Horizonte deposita nos seus novos representantes os melhores votos de
confiana para que realizem uma prspera administrao, inteiramente voltados para os
magnos problemas que afligem a capital mineira. O recm empossado presidente da cmara
discursa.
A cerimnia de posse j estava em pleno andamento, mas o novo prefeito
ainda no estava presente. Quando chega exaltado pela multido. Entre aplausos gerais d
entrada no ambiente o senhor Jorge Carone Filho acompanhado de sua mulher Nsia Carone
Filho. A cmera curiosamente no focaliza um plano geral capaz de corroborar em imagem
com a fala do narrador, que anuncia aplausos gerais, mas casa a esta fala um primeiro
plano de trs homens que batem palma.
O termo de posse assinado. Na seqncia, em vibrante discurso o prefeito
Carone sintetizou seu projeto de governo baseado em iniciativas que visam o bem coletivo.
Trs rpidos planos sucessivos do conta de um homem que expressa em imagem um
discurso veemente, segurando em uma mo o texto e gesticulando fortemente com a outra.
Do espao poltico privado, o filme ganha o espao das ruas. A cmera alta e
mostra a Avenida Afonso Pena cheia de populares. Enorme multido conduziu
entusiasticamente o novo prefeito at a sede do executivo municipal. Milhares de pessoas
acompanharam pelas ruas da capital o senhor Jorge Carone. As manifestaes de regozijo
multiplicavam-se a cada instante. A cmera continua alta, mas traz no plano seguinte um
ngulo mais fechado. Na cena se v o poltico sendo conduzido para dentro do prdio da
prefeitura completamente cercado de pessoas, um verdadeiro mar humano. J no interior do
recinto, o prefeito continua sendo conduzido cercado de pessoas. Amintas de Barros, o antigo
prefeito, transmite o cargo e nenhuma barreira fsica os separa das pessoas no ambiente.
Aplausos abriram a fala do prefeito Carone que reafirmou o seu desejo de cumprir com todas
as promessas do seu tempo de candidato e a dar a Belo Horizonte um governo de justia, de
trabalho, de progresso e de verdadeiras realizaes. A cmera se dedica a mostrar o homem
que porta tantas boas novas para o destino da cidade mudando o seu olhar uma nica vez para
focalizar os ouvintes daquele discurso: uma multido de pessoas que rodeava o novo prefeito.
76
Mais uma vez conduzido pelo agrupamento humano o prefeito volta para a rua.
Novamente, o novo prefeito foi obrigado a falar a milhares de pessoas que se acotovelavam
em frente prefeitura municipal e que nele depositavam todas as suas esperanas de um
futuro melhor para a sua cidade. Os plano-conjunto mostram um grande nmero de pessoas
aglomeradas, ocupando toda a pista centro-bairro da principal avenida da cidade. Vrias
faixas tambm foram afixadas no prdio da prefeitura ou seguiram carregadas por populares.
Aquele trinta e um de janeiro de 1963 culminaria com uma festa em praa
pblica. Artistas como ngela Maria, Elza Soares e Black-out conduziram o show que
animou os presentes. A multido recebeu com jbilo o novo prefeito que mais uma vez entre
estrondosas manifestaes de confiana expressou a sua vontade firme de realizar uma
administrao das mais eficientes correspondendo assim esperana do povo belohorizontino.
Optamos por descrever mais detalhadamente este primeiro cinejornal do
conjunto analisado por entender que ele traz a gnese de vrias opes de linguagem que
veremos a seguir e deixa clara a opo escolhida para se retratar o prefeito: ele sempre estar
rodeado pela multido e vai eleger como espao primeiro de representao as ruas. Um
homem que est entre o povo, cercado por ele, aplaudido por ele, trabalhando com
exclusividade para ele.
Sem dvidas o problema de abastecimento de gua em Belo Horizonte naquele
ano de 1963 era uma dos mais graves a ser enfrentado pela administrao. Sendo assim, este
assunto aparece retratado em cinco filmes, do conjunto analisado. Mas o que prometiam estes
cinejornais?
Uma caracterstica presente em todos eles o fato de citar o prefeito como um
homem extremamente preocupado com o problema da falta de gua. Sua busca para
solucionar a questo incessante e ele faz questo de tornar isso pblico, como foi o caso da
inaugurao do servio de captao do terceiro brao do crrego dos Tabues.
Alm de ter sido assunto de uma edio de tema nico138, o incio do filme
relata uma entrevista coletiva dada para prestar contas do trabalho da municipalidade
realizado para solucionar as necessidades da populao. Com esta cena, o cinejornal, veculo
de imprensa oficial da municipalidade, mostra a ao da impressa em torno do prefeito. Uma
cena metalingstica que tem por funo reforar o intuito de divulgao do trabalho da
prefeitura junto ao grave problema da falta de gua na Capital. O prefeito Jorge Carone deu
138
77
uma entrevista coletiva imprensa de Minas ocasio em que deixou transparecer a sua
preocupao em resolver os problemas da capital montanhesa. As perguntas levantadas
tiveram respostas sinceras. Finalizando enumerou suas realizaes. A grande mesa repleta de
jornalistas com seus gravadores, blocos e canetas na mo afirma em imagens a repercusso da
entrevista coletiva chamada pela assessoria da prefeitura.
Alm deste, outros dois cinejornais139, todos produzidos por empresas
diferentes, tambm se dedicaram a registrar o feito conseguido pela abertura do terceiro brao
do Crrego dos Tabues. A obra garantiria mais sete milhes e 500 mil litros de gua por dia
para o abastecimento de Belo Horizonte. Um dos filmes chega a registrar o nmero de oito
milhes de litros de gua. O servio estava sendo planejado h 33 anos. O prefeito Carone
conseguiu realiz-lo em apenas 40 dias. (...) O vereador Gerardo Renault falou na ocasio
tendo em seguida o prefeito Carone revelado estar disposto a realizar contra todos os
obstculos a obra que propusera quando candidato.140 ...tendo o prefeito de Belo Horizonte
reafirmado sua inabalvel deciso de abastecer a capital de gua na proporo direta da
necessidade de seus habitantes.141
A promessa de cumprir com um anseio da cidade vm nestas edies, muito
mais reforada pelo texto do que propriamente pelas imagens. A fita inaugural desatada pela
filha do prefeito. Jornalistas, autoridades do legislativo, funcionrios da prefeitura e
convidados comparecem ao crrego no dia da inaugurao da obra, mas as imagens, centradas
na figura do lder municipal tiram at mesmo os holofotes da gua precioso lquido de que
tanto carece a cidade. O locutor d o tom do que o espectador deve buscar no filme. Se no
se v to efetivamente o volume de gua e o represamento para captao da mesma, v-se em
abundncia o prefeito. O que precisa ficar claro na mente de quem assisti ao filme em
verdade a efetiva operncia da administrao Carone.
Os cinejornais analisados no possuem um grande trabalho de linguagem
cinematogrfica. Os planos tm enquadramentos bsicos e so articulados pela montagem de
uma maneira bastante simples. Mas um fato assume o primeiro plano nas observaes. O
principal mecanismo utilizado pelos filmes para fazer falar a administrao municipal a
centralizao da narrativa na imagem do prefeito. Aqui como em outras edies analisadas
abaixo o que se percebe uma intensa centralizao na pessoa de Jorge Carone Filho, muitas
vezes em detrimento ao fato narrado em si. Para alm daquilo que pretende ser noticiado, h
139
78
um prefeito que torna tudo aquilo possvel. Esta observao foi construda a partir da anlise
dos filmes que procurou traar a trajetria temporal dessas imagens, a partir do cinejornal que
registra a chegada ao poder no dia da posse at o filme que vai registrar o natal na capital
naquele ano de 1963. Essa inteno clara de uma extrema centralidade se torna visvel na
observao do conjunto dos filmes, segundo sua cronologia de produo. Assim, de uma
aparente simplicidade lingstica extrai-se um complexo arranjo imagtico que vai procurar
cercar o prefeito, e por conseqncia a imagem de sua prpria administrao e seu projeto
poltico de uma urea de lder inconteste da cidade, monumentalizando para o futuro o
registro de uma gesto que muito trabalhou em prol da cidade. Uma Belo Horizonte
cinematogrfica representada por meio destes filmes como um espao social e geogrfico que
se transforma dia a dia por meio da ao operante de um projeto poltico que chega para sanar
todos os males da populao, inserindo-se definitivamente na histria da cidade.
A matria cinejornalsta que compe uma edio de temas mltiplos recebeu o
ttulo de O dep. de bairros e habitaes populares ameniza a falta de gua. Ela destaca um
nico local trazendo um nico tema central: a inaugurao de um poo artesiano que serviria a
uma regio pobre da capital mineira: bairro Cachoeirinha, vilas Parque Riachuelo e Ermelinda
e a favela Santa Cruz. Central tambm a abordagem dada pela cmera s autoridades
presentes. Os planos so construdos, com exceo do primeiro que mostra os moradores, de
forma a dar imagem do prefeito uma grande exposio. Mais uma vez nada o separa do
povo: nenhum palanque ou estrutura que retire de seu lado as pessoas presentes que
acompanharam os atos do chefe do executivo municipal naquela inaugurao. A centralidade
das aes tambm conseguida por meio do texto da locuo: O diretor do DBP, senhor
Raimundo Amaral Tinti e o prefeito Jorge Carone Filho entregaram o importante
melhoramento j em pleno funcionamento para os moradores.... O objetivo do filme
retratar a inaugurao de mais um poo artesiano na cidade. Mas o que vemos na verdade
um conjunto harmnico de pequenas seqncias orquestradas a partir da presena do prefeito.
Ele aparece dando autgrafo, sendo homenageado em uma passeata com muitos cartazes de
vivas ao prefeito, cercado por pessoas, ouvindo o discurso do diretor do Departamento de
Bairros Populares da prefeitura, que aparece todo o tempo ao seu lado, discursando com a
veemncia caracterizada pelo movimento frentico para cima e para baixo de seu brao
direito. O poo artesiano uma lembrana vaga no meio de toda a inaugurao. Em imagem,
j quase no final do filme vemos um cano jorrando gua em um nico plano curto. O curioso
que a matria trazia como propsito falar de gua.
tratamento aqui dado informao ressalta a olhos vistos muito mais a realizao do
79
executivo municipal, do que as imagens da obra em si. O espectador fica sem saber as
verdadeiras dimenses do poo artesiano que, segundo o ttulo do cinejornal, serviria para
amenizar a falta de gua.
O povo aparece cercando o prefeito, aplaudindo o prefeito, fazendo passeata e
empunhando cartazes de apoio ao prefeito, acompanhando os passos do prefeito. Esse povo
mais um objeto do filme do que propriamente uma personagem. A cmera tece sobre os seres
um enquadramento de conjunto, buscando dar volume ao nmero de pessoas retratadas. A
seqncia final do filme articula elementos muito interessantes. O primeiro plano dela
composto pelo trecho final do discurso do prefeito, depois, em contra-plong uma senhora
negra de leno amarrado na cabea aparece aplaudindo, em seguida vemos um cano jorrando
gua (nica referncia em imagem feita sobre o lquido). Depois, aparece novamente o
prefeito descendo a escadaria externa de um prdio completamente cercado por populares que
o aplaudem. No ltimo plano da seqncia temos uma aglomerao de pessoas embaixo de
uma faixa de agradecimento ao prefeito, colocada na rua entre dois postes.
Essa representao da populao mais carente recorrente nos filmes. Uma
massa objeto, assistida e beneficiada pelos esforos municipais.
Obras sendo executas. Platia sempre enquadrada para servir de testemunha in
loco dos acontecimentos. Existe nestes cinejornais a preocupao de fazer uma construo
imagtica do prefeito e de sua administrao sempre sendo referendada pelos olhos pblicos.
Ir s ruas e se dar a conhecer so fatores simblicos fortes lanados em busca de justificar a
ao municipal.
O letreiro se abre e nele possvel ler: Atividades do Departamento Municipal de
Habitao e Bairros Populares no som, uma msica instrumental orquestrada sob a forma de
uma marcha que lembra fora, organizao, grandiosidade e progresso. Nas imagens homens
da prefeitura adentram um terreno com grandes rvores plantadas, trazendo nas mos foices e
enxadas. A narrao explica que os terrenos eram de particulares que ocupavam a extensa
rea somente com a plantao de eucaliptos. Os homens passaram a trabalhar no
desmatamento e no plano seguinte um grande trator remove a terra. J no se v mais
nenhuma rvore enquanto o narrador, que funciona em todos estes registros cinejornalsticos
como porta voz da municipalidade afirma, aps a urbanizao do espao, os lotes sero
doados a trabalhadores e chefes de famlia que no possuem casa prpria. Uma efetiva
realizao da poltica municipal preconizada pelo prefeito Jorge Carone Filho durante sua
campanha eleitoral.
80
Mas o trecho de um depoimento dado por Vicente Gonalves colhido neste mesmo
livro d conta do cenrio poltico e do compromisso assumido pelo prefeito.
Ns nos organizamos e induzimos o Carone a desapropriar, caso ele
fosse eleito para o cargo de Prefeito ao qual ele estava concorrendo. Ele
estava fazendo um discurso para os favelados em frente Secretaria de
Sade, onde hoje o Minascentro, a ns compramos um machado,
colocamos cabo e entregamos para ele, dizendo: Ao futuro Prefeito de Belo
Horizonte, Dr. Jorge Carone, ns entregamos este machado simblico para
que o senhor comece a derrubar os eucaliptos desta cidade. Ele foi eleito e,
passados alguns meses, ele teve um problema de utilidade pblica com
terreno do Luciano, a foi a deixa, e ajuntou com ao Catlica, com um
pessoal que estava sem casa, aquela confuso toda. Da noite para o dia, ns
invadimos uma rea do Luciano rea da BR-31. (CORREA, 2004:32).
81
tambm se representa como sendo o homem que faz. Como no cinejornal O prefeito vai ao
povo.
Plano conjunto: uma fila de pessoas est sendo formada no lado externo de um
prdio. No plano seguinte, tambm de conjunto, porm mostrando um ngulo de cmera um
pouco mais fechado, as pessoas so melhor identificadas, mas o plano bem mais rpido que
o anterior.
A cmera ento se muda para o interior do prdio o ngulo plong e a
curiosidade fica reservada ao pblico: so em grande maioria de mulheres, vrias carregando
crianas no colo. Todas esto em p, aglomeradas no espao.
Os moradores de bairros e vilas de Belo Horizonte j no tm mais
necessidade de enfrentar o ambiente austero e difcil dos gabinetes da prefeitura para levarem
ao prefeito suas reivindicaes. A cmera em grande plano mostra uma fila de populares que
se forma do lado externo de um prdio. Em seu interior, um grande nmero de pessoas
encontra-se em p, mulheres com crianas no colo. A cmera agora est colocada em plong
aumentando a sensao de pequenez desse povo aglomerado. No plano seguinte a figura de
Carone entra no ambiente. O prefeito Jorge Carone Filho logo aps assumir a chefia do
executivo municipal inaugurou um novo e louvvel estilo de se por em contato com o povo,
atendendo-os nas proximidades de seus prprios lares, em audincias pblicas que vem se
revestindo de um alto sentido democrtico. Nessas audincias o governador da cidade ouve
atentamente as reivindicaes de todos que o procuram tomando imediatas providncias para
o atendimento dos casos possveis de solues atravs dos diretores de departamento da
municipalidade.
O prefeito entra em cena no plano seguinte utilizando-se da mesma cmera
plong. O povo bate palma. No plano seguinte o ngulo da cmera se inverte mostrando agora
em contra-plong uma fila de pessoas formadas em uma escada que d acesso ao saguo onde
o prefeito est. Um trevelling vertical realizado mostrando do alto de uma escada at chegar
no saguo tomado de pessoas. O movimento termina quando a cmera se encontra com o
prefeito que est ao centro do ambiente cercado pelo povo.
Na seqncia o chefe da municipalidade enquadrado rapidamente, junto s
pessoas que o cercam, em um plano conjunto mais aproximado. A montagem articula seis
planos seguidos alternando um prefeito que fala com um povo que ouve. Nas imagens,
Carone se faz ilha cercado por um mar de pessoas.
Depois desta localizao geral de ambiente e personagens, prefeito e povo
passam a se encarar como velhos amigos. Para se certificar do registro dos colquios, Jorge
82
Carone olha para a cmera com um rabo de olho como se quisesse ter certeza de que a cmera
o filmava e em seguida continua sua conversa com um cidado. A seqncia continua
encadeada por quatro cenas em primeiro plano mostrando um administrador que dialoga cara
a cara, em cada um deles, com um nico cidado.
A cmera busca reforar as imagens das pessoas no ambiente, mostrando que muitas
delas permanecem na escadaria por no consegui chegar at o salo lotado. O foco passa a ser
ento a fala do governador da cidade que tem uma expresso firme e braos que gesticulam
para frente e para trs. Ele fala ao povo cercado por ele. No h um palanque, nem mesmo
uma mesa ou microfone. O dirigente municipal est ali, e o povo est ao seu redor. A cmera
focaliza tudo isso em planos mais abertos. Quando fecha o seu foco para mostrar dilogos
travados de forma particular com trs pessoas. Com uma delas, uma senhora de estatura
mediana, o prefeito, que tem mais de 1,80m de altura, se abaixa para escut-la ainda mais de
pertinho, olhando-a nos olhos. Ao mesmo tempo, na locuo o narrador traz o texto o povo
belo-horizontino vem tomando conscincia que realmente elegeu um prefeito que dele no se
afasta.
O cinejornal trabalha basicamente um nico espao que no bem identificado nem
pelas imagens, nem pelo texto. Sabe-se apenas que o prefeito encontra-se em um bairro ou
vila da periferia da cidade. O objetivo espacial do filme mostrar que o prefeito se deslocou
da sede da prefeitura municipal para se encontrar e ouvir o povo em um local bem prximo de
onde vive aquele agrupamento de pessoas que so enquadradas pelas imagens. O espao
fsico retratado remete ento para uma idia de descentralizao do olhar do poder pblico
municipal em relao populao da cidade. Este foco mobiliza a idia de centro/periferia e
atesta o ttulo do cinejornal O prefeito vai ao povo. O texto refora esta idia: O prefeito
Jorge Carone Filho logo aps assumir a chefia do executivo municipal inaugurou um novo e
louvvel estilo de se por em contato com o povo, atendendo-o nas proximidades de seus
prprios lares, em audincias pblicas que vem se revestindo de um alto sentido
democrtico. Nessas audincias o governador da cidade ouve atentamente as reivindicaes
de todos que o procuram tomando imediatas providncias para o atendimento dos casos
possveis de solues atravs dos diretores de departamento da municipalidade. Pela ordem
cronolgica montada para os filmes analisados, esta edio foi ao ar no terceiro ms da
administrao, o que refora o indcio de que era de interesse do executivo sedimentar junto
aos espectadores a idia de que cumpriria efetivamente as promessas de se aproximar da
populao mais carente afirmada durante o perodo eleitoral.
83
O cinejornal motiva a apreenso por parte do pblico de uma verdade que quer
ser transmitida por um desejo de quem enuncia a ao de transformao sobre a prpria
cidade. Uma verdade enviesada tendo por ponto de partida um lugar de enunciao bastante
definido porque pronunciada por um agente social investido por e pelo poder concedido de
forma democrtica pelo voto, pela escolha da maioria. o lder quem fala.
Os filmes do Ritual do Poder mostram imagens a servio de um projeto
poltico. (...) Atravs das imagens que se prope a adeso a um projeto governamental. (...)
A partir do momento em que a imagem capta, ela vai trazer tona a vontade do Estado em
retratar a sua ao junto quela populao.142
A exemplificao desta observao terica esta presente em todos os
documentos flmicos analisados. E a matria: ... E o perigo desapareceu que compe uma
edio de temas mltiplos exibida provavelmente em maro de 1963 foi aqui escolhida como
representante para mostrar a linguagem desenvolvida na composio de imagens a favor de
um projeto governamental.
Ela oferece aos olhos do pesquisador ricos elementos para que possa ser
percebida a vontade da prefeitura em retratar a sua ao junto populao de Belo Horizonte.
A imagem vai dar conta de um empreendimento de transformao no fluxo de transporte da
populao. O tema central gira em torno de obras realizadas em uma importante via da cidade,
a Rua Mau, hoje Avenida Tereza Cristina.
O filme comea com o anncio feito pelo locutor de que o problema da via
pblica em foco j era histrico. Por muitos anos a Rua Mau no cruzamento da Avenida
Pedro II, dada a sua configurao topogrfica se constitua em um dos problemas mais srios
em vista do permanente perigo que representava para o trfico de veculos e mesmo de
pedestres uma vez que por aquele local tambm trafegavam os trens da rede mineira de
aviao. Em plano conjunto um emaranhado de carros em fila andando lentamente um atrs
do outro. No plano seguinte, pessoas andando a p e at mesmo de bicicleta esto misturadas
aos carros da rua. No h separao por caladas ou sinalizao entre elas. Na seqncia uma
rua de terra completamente irregular mostrada, deixando clara a desordem existente no local.
To logo assumiu o governo da cidade o prefeito Jorge Carone Filho tomou
providncias para acabar com o velho perigo determinando o rebaixamento da Rua Mau no
trecho compreendido entre as Ruas Bonfim e Peanha, trabalho realizado em ritmo Braslia.
142
Palestra: Rituais do poder: documento, memria e histria, ministrada por Eduardo Morettin em 04 de
novembro de 2006 durante o curso de Histria do Documentrio Brasileiro na Cinemateca do Museu de Arte
Moderna do Rio de Janeiro.
84
O anncio da administrao vem acompanhado das imagens de mquinas que aparecem pela
primeira vez: so tratores e caminhes trabalhando a terra e abrindo passagem. Um plano
conjunto destaca o trabalho de um trator que remove a terra no canto direito do quadro
enquanto do lado esquerdo da imagem mostrada a largura da via e ao fundo alguns prdios
que contextualizam minimamente a ao dentro do conjunto urbano. A locuo suspendida e
um Sobe Som que traz uma orquestrao de banda de msica recobre imagens de tratores
colocados individualmente em trs planos seguidos sendo enfocados enquanto removem a
terra. Nestes quadros, pessoas acompanham as obras sendo focalizado ao fundo o trabalho das
mquinas.
A sensao que fica para o expectador de que a ao operante da nova
administrao chega para por fim a algo que se arrastava de forma negativa para a populao.
Esta , portanto, uma administrao que realiza.
... o local em foco ser inteiramente transformado e modernizado. As pistas de
rolamento dobraro de largura permitindo o rpido escoamento para vrios bairros
desaparecendo a ameaa de graves desastres. Tratores em primeiro plano desfilam diante da
cmera em dois quadros seguidos. O terceiro mostra em conjunto a remoo de terra que j
revela uma nova configurao do espao. A desordem de pessoas e carros, pouco a pouco
medida que as mquinas entram em operao, vai sendo diluda.
Idias de transformao e de modernizao so fortemente trabalhadas nesta
narrativa. E como esta ao que proporcionava um novo ar Belo Horizonte estava sendo
realizada naquele momento, o que fica em silncio a idia de atraso atribuda ao passado
administrativo da cidade. Se agora chega o progresso, o que existia anteriormente era a
inoperncia das administraes anteriores da prefeitura junto aos anseios da populao.
Um trator em primeiro plano quase sendo mostrado em uma posio de cmera
contra-plong removendo uma pilha de terra a imagem usada para dar destaque a seguinte
fala do narrador. A iniciativa do prefeito Jorge Carone Filho foi acolhida com entusisticos
aplausos pelo povo que acompanhou com curiosidade e vivo interesse o incio das obras que
custaro prefeitura uma aviltada soma, mas que valer a pena. No se v pessoas
corroborando em imagens com o que dito pela locuo, o trabalho do trator recobre a
imagem.
No informado, por exemplo, se a mobilizao do poder pblico veio a cabo
de uma reivindicao popular. O protagonismo da ao todo delegado prefeitura. O filme
chega a citar o povo por duas vezes, mas no o focaliza em nenhuma delas. S fica delegado
apenas um personagem social (no caso a prefeitura) a ao de fazer. A narrativa
85
cinematogrfica construda somente a partir do ponto de vista do poder. Por fim, o que se
registra uma histria das elites polticas. Fica no presente a monumentalizao de uma
imagem poltica que gira em torno do prefeito e que dita uma imagem pblica de um
realizador por excelncia. Dita uma imagem de cidade antes provinciana e pouco atenta s
necessidades do progresso, mas que se v transformada a partir do desejo daquele que a
governa naquele perodo. Assim, o que se percebe que estas duas construes simblicas, j
que neste filme vemos imagens e no fatos, confundem-se entre si. Imbricam-se e perpetuam
para o futuro imagens de uma cidade ora carente e necessitada de mudanas que passam a ser
atendidas pelo marco da administrao Jorge Carone Filho.
Nos trinta segundos finais do cinejornal o ritmo da narrao e de montagem
das imagens muda. Ambos se tornam mais rpidos. A cmera em todos os planos finais est
ainda mais prxima do movimento das mquinas que trabalham incessantemente para garantir
o fim do crnico problema do trfico garantindo a segurana de milhares de pessoas que
transitam pela Rua Mau.
No ltimo trecho da narrao o clima da locuo chega s raias da apoteose,
com um texto no menos ousado. Modernas mquinas estiveram em ao, centenas de
toneladas de terras foram removidas, o asfaltamento da rea atacada ser imediatamente
iniciado e mais alguns dias o trnsito do local estar livre do engarrafamento. Este filme
destaca imagens a servio de um projeto poltico: um desejo de mostrar realizaes grandiosas
e teis, que marcam a atuao da administrao junto vida cotidiana da cidade.
Aps o locutor citar o nome do prefeito, o cinejornal abre espao para as
mquinas que no abandonam mais o filme. Atrela-se narrativamente a imagem de Carone s
aes positivas realizadas pela sua chegada administrao to logo assumiu o governo da
cidade. O relato de problemas histricos deixado para trs dando lugar ao que est sendo
feito no presente. A idia sntese desta construo bem sucedida a de que o prefeito vence
qualquer dificuldade. Logo, ele um vencedor.
E vence tanto as dificuldades fsicas da cidade, quanto as dificuldades polticas.
Banqueiros, polticos, homens da indstria e do comrcio foram reunidos para
atender a um pedido do prefeito.143 O cenrio o salo interno da prefeitura. O espao est
cheio de pessoas em p, mas bem vestidas e arrumadas. Enquanto a cmera varre o espao,
mostrando todo o ambiente, dedicando-se depois a mostrar o prefeito discursando, o narrador
diz: No dia do lanamento oficial dos Ttulos Progressivos de Emprstimos para o
143
86
Desenvolvimento o prefeito Jorge Carone falou ao povo de Belo Horizonte sobre a segurana
do investimento a prova de inflao e tambm sobre as vantagens que o arrojado plano
oferece para o progresso da capital mineira facilitando a execuo de obras de vital
importncia para a vida da cidade. Naquele ano de 1963 a prefeitura precisava equilibrar as
suas contas, somente com o funcionalismo pblico j se somavam quase quatro meses de
atrasos. Diante de uma administrao que se iniciava, o prefeito precisava tomar uma atitude
capaz de reverter este quadro desfavorvel, principalmente para um poltico com planos de
chegar em pouco tempo ao executivo estadual.
frente do governo de Minas Gerais estava Magalhes Pinto, um desafeto
poltico de Carone. Nesta instncia seria difcil conseguir um apoio para sanar problemas
econmicos da capital. Curioso se torna at o fato de ter sido entre outras coisas,
incompetncia administrativa, o motivo declarado por Magalhes Pinto a fim de conseguir
junto cmara o impeachment de Carone quase dois anos depois deste filme. Assim, a
soluo de financiamento para o desenvolvimento dos intentos poltico-administrativos
precisaria vir de outras fontes. O caminho encontrado foi ento o dos chamados Ttulos
Progressivos de Emprstimos para o Desenvolvimento. O filme no explica com detalhes do
que se tratavam especificamente estes ttulos, mas o locutor destaca: os ttulos garantem
renda mensal compensadora e so de liquidez imediata. o dinheiro do povo aplicado em seu
prprio benefcio e no melhoramento da cidade. Neste momento closes dos que assinam em
uma mesa a proposta so colocados em seqncia fechando o filme.
Para alm de explicar com detalhes o intento, o cinejornal cumpre com um
objetivo maior: mostrar populao a grande adeso, de pessoas importantes que assinam
embaixo do projeto poltico de Jorge Carone Filho. O salo estava cheio de pessoas
influentes, ligadas aos setores produtivos da cidade.
Uma outra matria144 vai dar conta de uma aproximao de Jorge Carone com
representantes da elite belo-horizontina, mas esses momentos so em muito menor grau
quando comparados ao tempo dedicado a registrar o prefeito junto s massas populares.
Por iniciativa do Correio da Manh, plenamente apoiado pelas classes
produtivas de Minas e pelo prefeito Jorge Carone Filho realizou-se na principal avenida de
Belo Horizonte a cerimnia de ereo do busto do saudoso industrial Vitrio Marola,
pioneiro da indstria perfumista na capital montanhesa. O prefeito aparece assim alinhado a
dois outros personagens importantes da cidade: um jornal de nome e classe produtiva.
144
87
88
o valha. O que importa que a cmera o retrate cercado e bem prximo do povo, seja nas
vilas e favelas, seja entre os familiares de um rico industrial.
Para que tal iniciativa ocorresse num espao como esse com certeza deve ter
havido um esforo de desvio de trnsito, algo que interferisse na rotina do lugar. Se a rua o
espao da polis por excelncia, naturalmente mais pessoas se tornariam espectadores do
prefeito e de seu intento. Estas so dedues feitas a partir de um silncio do filme, pois
nenhum plano dedicado a mostrar o conjunto do espao onde se d a homenagem. A cmera
conta toda a histria em planos fechados se dedicando exclusivamente ao interior da ao.
O som, sempre em locuo off145 e acompanhado de trilha sonora tambm
retira toda e qualquer possibilidade de anlise do em torno do ambiente. No sabemos assim,
se houve algum protesto, se o trnsito ficou impedido, o nmero correto de pessoas que
assistiram cerimnia. Mas esse registro, todo construdo por planos mais fechados, revela
tambm uma opo de seus realizadores. Lanar perguntas, buscar o que e como o filme diz e
investigar os silncios deixados pelas imagens so tarefas que se fazem presentes na anlise
flmica.
Assim, possvel ver nos filmes prestao de contas como a relatada na notcia
dos tratores municipais que derrubaram os eucaliptos em terreno do bairro So Bernardo146. E
at mesmo a transmisso de recados polticos. Talvez o mais engraado tenha sido o do
episdio relacionado com o ex-prefeito da capital Amintas de Barros.
No ano de 1963 muitos insetos tomaram conta dos enormes Fcus que cobriam
quase toda a extenso do corredor central de trfego da cidade, a Avenida Afonso Pena. O
transtorno era grande porque os insetos caiam nas roupas dos transeuntes e quando iam aos
olhos ardia muito. O incmodo inseto recebeu ento o nome de Amintinhas, uma referncia
clara ao ex-prefeito que havia antecedido Carone. O cinejornal147 abre com a seguinte frase:
A bonita arborizao de Belo Horizonte est seriamente ameaa pela praga dos insetos que o
pblico batizou de Amintinhas. O Prefeito Jorge Carone Filho determinou imediatas
providncias para o combate praga. As imagens de pedestres caminhando sob as rvores e
logo no plano seguinte, funcionrios da prefeitura dependurados nos troncos e galhos
pulverizando as folhas com um novo produto, o Malatow, ltima palavra americana em
inseticidas retrata nesta edio os esforos municipais para solucionar o problema. Soluo
que pode ser lida por uma dupla mensagem. Esfora-se para acabar com os Aminitinhas e
145
89
esfora-se tambm para acabar com todo o atraso que representou para a cidade a
administrao anterior pouco operosa.
Seguindo esta percepo de veiculao de mensagens que revelam facetas do
jogo poltico temos tambm o registro em maro de 1963 da vinda de Carlos Lacerda capital
mineira. O assunto comps uma edio de temas mltiplos148 que trouxe alm desta visita, a
licitao para a perfurao de poos artesianos e a visita de Carone Juiz de Fora como
veremos a seguir.
A abordagem referente Lacerda simples, porm curiosa. A matria registra
a chegada do governador carioca ao prdio da prefeitura e a recepo feita pelo prefeito. No
ambiente tambm identificamos o presidente da cmara, e vrios homens de terno,
provavelmente outras autoridades, alm de jornalistas. Em sua estada em Belo Horizonte o
governador do estado da Guanabara senhor Carlos Lacerda visitou o prefeito Jorge Carone
Filho no palcio da municipalidade. O chefe do executivo municipal dirigiu cordial saudao
ao ilustre visitante que agradeceu. Em seguida os dois prestigiosos polticos mantiveram
demorada palestra sobre os destinos da capital de Minas e do estado da Guanabara. O
espectador no fica informado sobre o motivo da visita nem o seu contexto, sabe-se apenas
que o encontro com a municipalidade fez parte de uma agenda maior cumprida por Lacerda
na viagem cidade. Outro ponto que chama a curiosidade o fato do filme destacar que os
dois polticos conversaram sobre o destino de Belo Horizonte e do Rio de Janeiro. Em face ao
perodo, ano que acabou entrando para a histria como antecessor do golpe militar, e sabendo
que Carlos Lacerda se aliou a esta corrente juntamente com Magalhes Pinto, ento
governador de Minas Gerais, fica no ar o contedo destes destinos conversados, j que Carone
era opositor poltico governando debaixo do nariz de Magalhes Pinto.
E nesse mesmo cinejornal a matria149 que fecha a edio d conta do 113
aniversrio de Juiz de Fora e Carone viaja para comparecer cerimnia e acaba dividindo o
palanque com o prprio Magalhes Pinto que nominalmente citado pelo locutor. Para
completar a pujana de figures polticos, tambm esteve presente o presidente da repblica,
senhor Joo Goulart. Alm claro de outras altas autoridades do estado e da repblica.
A municipalidade da Manchester mineira ofereceu um banquete aos ilustres
visitantes dele participando tambm outras figuras de projeo da vida pblica de Minas e do
Brasil. Durante esta locuo dois planos chamam a ateno. O primeiro enquadra atrs de
148
149
90
uma grande mesa Magalhes Pinto sentado ao lado de Joo Goulart, no plano seguinte o
ngulo da cmera se abre um pouco mais para enquadrar mais a frente, mas tambm sentado
mesa, o prefeito Carone. A opo escolhida deixa clara a busca por contextualizar o prefeito
junto ordem poltica mais elevada da cerimnia. Carone afirma em entrevista a esta pesquisa
que possua uma ligao poltica bastante direta com Joo Goulart, o que o tornava alvo ainda
mais indesejado do governador mineiro. Estar presente a esta cerimnia demarca tambm uma
posio que revela a partir de dados extras ao filme a conformao de uma teia poltica que
revela interesses, possibilidades de ao do prprio poder e a busca de garantias por
permanecer nele.
As comemoraes em forma de festas cvicas e religiosas tambm tiveram
lugar na cidade de Belo Horizonte, sendo retratadas nos filmes daquele ano de 1963. Sempre
retumbantes e repletas de pessoas, estas festas exemplificam o que Balandier analisa quando
estuda este tipo de insero representativa na esfera do poder:
As emoes tendem a se exacerbar nos espetculos festivos organizados pelo
poder. (...) O poder utiliza meios espetaculares para marcar sua entrada na histria
(comemoraes, festas de todo tipo, construo de monumentos). As manifestaes do
poder no se coadunam com a simplicidade; a grandeza, a ostentao, o luxo as
caracterizam. (Balandier apud Capelato, 1998: 37).
91
objeto que recebe e no sujeito que determina a ao. Os cidados so coadjuvantes na maior
festa popular brasileira.
O prefeito Carone no est presente neste filme e seu nome aparece citado uma
nica vez, mas um plano despretensioso chama a ateno. Do meio para o final da narrativa,
o destaque fica para a beleza da festa, o movimento das cabrochas, os belos carros alegricos
em desfile pela Avenida Afonso Pena. Quando o locutor anuncia o vencedor no quesito bloco
caricato a imagem mostra o carro com o famoso grupo Bocas brancas da Floresta e no
plano seguinte mostra um grande estandarte com a foto do rosto do prefeito sendo carregado e
desfilado por dois homens. Corta. A imagem volta novamente para o bloco vencedor. O nome
do prefeito ento, associado aos vencedores e tradio dos blocos caricatos na cidade e o
curioso que sua presena estandartizada. Aparece sendo levada pelo povo em meio festa
popular, ao anncio dos vencedores e junto tambm tradio local dos blocos carnavalescos.
O cinejornal articula dois espaos: o Teatro Municipal Francisco Nunes, onde
realizado um concurso de fantasias e a rua, no caso especfico a mais importante avenida da
cidade. Mas a rua o grande lugar de realizao do carnaval belo-horizontino de 1963 na
tica divulgada em filme pela prefeitura. Todo o cinejornal se passa no eixo da Avenida
Afonso Pena destacando a presena de blocos carnavalescos at da regio metropolitana de
Belo Horizonte, como o caso do Unidos de Pedro Leopoldo. Vrias presenas de escolas de
samba e blocos caricatos de pontos diferentes da cidade so citados marcando presena na
festa. Mas esta uma festa centralizada. Nada do carnaval realizado em outros espaos da
cidade como nos clubes retratado ou se quer citado. um silncio que o filme assume
quando escolhe falar apenas de uma festa, sendo esta festa a comemorao oficial da
municipalidade. A cobertura do carnaval centralizada nos festejos do centro da cidade
realizados pelo trabalho da municipalidade.
Nos filmes do eixo Vida social o que se percebe de maneira global e
ininterrupta esta busca pela exacerbao do grandioso, do belo, do numeroso, do fantstico.
As manifestaes registradas pela prefeitura sobre o carnaval naquele ano de 1963 uma
mostra deste dizer grandioso. A anlise dos cinco trechos que se seguem, extrados da
narrao do cinejornal150, articulados aos planos de imagem correspondentes, procuram
exemplificar a observao deste dado.
De ano para ano o carnaval de Belo Horizonte vem ganhando novas
dimenses graas s medidas tomadas pelo Departamento de Turismo da Prefeitura sob a
150
92
direo do senhor Clementino Dotti. Em quadro a praa sete mostrada de dia, movimentada
por pessoas e tendo ao centro um enorme rosto de Rei Momo. A cena seguinte traz um plano
geral da praa destacando as luzes que iluminam o local s que agora j est noite. Neste
plano a sensao de movimento de pessoas no ambiente ainda maior. A opo por gravar
um mesmo ponto de dia e a noite sugere uma longa extenso temporal da festa, uma animao
que comea com o dia claro e no tem hora para terminar, varando noite adentro.
O carnaval de rua teve xito inigualvel e contou com a participao de
numerosos carros alegricos das cidades vizinhas que deram aos folguedos de Momo uma
caracterstica diferente dos anos anteriores. A participao das cabrochas animadas pelo ritmo
de samba deu vida nova aos desfiles. Muito movimento dos folies alternando planos
conjunto com primeiro plano alm de uma locuo que traz ao fundo um BG com msicas
carnavalescas conferem cena uma animao sem igual. At a platia focalizada em um
plano curto batendo palmas. A gravao se d a noite, mas mesmo assim no se perdem
detalhes do pblico presente que enquadrado pela cmera em primeiro plano, quando
necessrio se faz ressalt-lo.
O povo assistia com entusiasmo aquele cortejo de carros que se prolongou at
a alta madrugada. Dois planos mostram a aglomerao de pessoas beira da rua vendo o
movimento dos carros alegricos. No segundo v-se tambm um cordo de isolamento
montado por policiais separando o povo do centro da pista, mas nada muito agressivo. A
presena sugere uma ateno dos realizadores principalmente porque j se tratava de altas
horas da madrugada como anunciava o locutor.
O conjunto Tupis-guaranis fez sucesso na Afonso Pena. A escola de Samba
Cidade Jardim com mais de trezentos figurantes foi a campe extra do carnaval montanhs.
Soube dar ao povo toda a alegria necessria quando de sua passagem pela avenida Afonso
Pena. Seu ritmo, sua cadncia e a harmonia perfeita foi uma das grandes foras do carnaval
externo da capital de Minas, que vem crescendo de ano para ano. Marchinha de carnaval,
som da ala de bateria e cenas dos desfiles e evolues dos passistas marcaram a seqncia
final do filme que trabalha basicamente com planos mais curtos aumentando a velocidade da
montagem e com isso aumentando tambm o ritmo da narrativa flmica. Os figurinos e o
samba no p so os itens que mais receberam destaque nesta seqncia final de imagens.
A grande argamassa de linguagem neste filme fica por conta da trilha sonora.
Se a canoa no virar, ol, ol, ol, eu chego l e outras marchinhas conhecidas do grande
pblico bem como batidas de bateria e apitos para conduo de passistas so ouvidas de forma
93
ininterrupta por toda a narrativa servindo inclusive de BG151 para a locuo. Por vrios
trechos ela se dissipa da narrao assumindo a conduo sonora do filme, separando assuntos,
sincronizando-se com as imagens dos passistas na avenida ou com as crianas desfilando
fantasias no concurso infantil.
Este filme diz de uma comemorao bastante cara cultura popular brasileira e
revela o posicionamento do poder pblico municipal em Belo Horizonte naquele ano de 1963
com relao a esta festividade. Para contar esta histria o filme articula em narrativa o espao
pblico da rua trazendo por personagens o povo. Povo e rua ganham ento um entrelaamento
amalgamado pela atuao da prefeitura com destaque para o trabalho que desenvolvido pelo
Departamento Municipal de Turismo e Recreao. Neste filme fica claro que no s a
prefeitura por meio de seu prefeito realiza, mas todos os braos administrativos da
municipalidade tambm se articulam transmitindo as mensagens do poder central. E como
uma ao da prefeitura, os feitos tm que envolver grandiosidades. Chama a ateno o
destaque para os nmeros apresentados: Duzentas mil pessoas de um universo populacional
de 700.000 habitantes saram s ruas. Um carnaval de xitos inigualveis que atraiu
inclusive a ateno de cidades vizinhas que vieram desfilar no corao da capital mineira. Um
carnaval que de ano para ano vem ganhando novas dimenses graas s medidas tomadas
pelo Departamento de Turismo da Prefeitura. O povo samba, toca, ocupa as ruas, faz a
alegria da festa, mas no encarado como um realizador. coadjuvante numa posio de
algum que recebe e fica alegre por que recebeu a possibilidade de assim estar, graas
atuao da prefeitura municipal.
Atravs das imagens possvel perceber a dinmica de um interesse da
municipalidade diante de eventos que possuem significado junto populao. uma
dinmica que exerce uma ao de controle, de fonte de realizao dos acontecimentos. O que
se apreende da idia transmitida que a cidade funciona a partir da ao municipal sendo o
poder pblico o nico capaz de proporcionar com aquelas dimenses de alegria uma festa
como a representada no filme.
Um fato recorrente que se relaciona mais diretamente com os cinejornais
agrupados pela temtica vida social a citao do nome de Clementino Dotti, chefe do
Departamento de Recreao e Turismo da Prefeitura, bem como o destaque que dado a este
departamento dentro dos filmes. Na capital mineira os festejos juninos tiveram um cunho de
originalidade e, sobretudo popular. O prefeito Jorge Carone atravs do servio de turismo
151
94
dirigido pelo senhor Clementino Dotti tm se esforado o para oferecer ao povo festas que
representam um divertimento sadio com iniciativas nas datas comemorativas de carter
popular. Tambm aqui no eixo vida social, como com o Departamento de Bairros Populares
no eixo Obras pblicas, a citao do Departamento de Recreao e Turismo feita de forma a
transmitir a mensagem de que toda a prefeitura est unida e operosa. Seja para facultar
populao a construo de uma cidade mais moderna, como tambm para torn-la uma cidade
mais feliz. A prefeitura est ativamente interessa em promover festas que so motivo de
atrao turstica e que so sempre de interesse do povo que aplaudem com entusiasmo essas
promoes.152
Um ponto alto nos cinejornais do fim do ano fica por conta das festividades em
dois momentos: o aniversrio da cidade a 12 de dezembro e as comemoraes do natal.
Em 1963, Belo Horizonte completou 66 anos de existncia e um longo
cinejornal de tema nico153 foi preparado para a ocasio.
O aniversrio da cidade, logo a que se pensar que ela seja a protagonista, mas
todo o cinejornal funciona na verdade como uma grande prestao de contas sinttica dos
feitos administrativos da municipalidade no fim daquele primeiro ano de gesto. O cinejornal
gira em torno de quatro temas/espaos: a missa e a demonstrao de f catlica; uma grande
exposio de arte; destaques de feitos administrativos e o baile de aniversrio em um clube
fechado. Os trs ltimos porm, bem poderiam ser reunidos sob o tema feitos administrativos.
A primeira seqncia do filme capitaneada pela locuo que abre a narrativa
dando o tom. Ao comemorar 66 anos de existncia a capital montanhesa sente em suas
prprias artrias uma transformao completa. o dinamismo de uma administrao que
cresce e vem acompanhando a evoluo da cidade em seus bairros e vilas. Dia a dia novas
realizaes esto sendo executadas por uma administrao que tudo faz pelo progresso da
jovem metrpole. Em imagens vemos montadas sucessivamente: as antigas rvores da
Afonso Pena, um grande plano da avenida agora sem as rvores, a movimentao de pessoas e
carros na praa sete, destaque para o trnsito de carros, uma faixa estendida no meio da rua
entre dois postes com a frase: A floresta agradece Carone, mais carros nas ruas do bairro
Floresta e na avenida do Contorno.
Curioso torna-se perceber que o primeiro plano da seqncia em que so
mostradas as rvores corresponde s mesmas imagens usadas em um cinejornal do ms de
152
153
95
junho154, portanto antes da retirada das mesmas pela administrao Carone. Fato que gerou
muito desconforto na populao. Relendo o texto da locuo citado acima com a observao
feita agora possvel ver como h uma insistncia em ligar o fato polmico de retirada das
grandes rvores do canteiro central, a uma necessidade inerente e inadivel de progresso. O
smbolo das rvores algo que se liga mais a uma imagem interiorana substitudo pelo
automvel. A avenida antes fechada e com pouca circulao, agora est ampla e melhor
movimentada, afinal a capital montanhesa sente em suas prprias artrias uma transformao
completa.
A segunda seqncia, a mais longa do filme com um minuto e cinqenta
segundos, fica reservada ao cunho religioso da festa. Missa solene realizada nas escadarias da
igreja So Jos e cortejo do aeroporto ao centro da cidade acompanhando a chegada da
imagem de Nossa Senhora de Ftima vinda diretamente de Portugal para saudar o povo de
Belo Horizonte.155
A terceira seqncia recebeu como destaque a realizao do 18 Salo de Belas
Artes no Museu de Arte da Pampulha com a presena de artistas renomados da capital, como
por exemplo, o pintor Inim de Paula. Uma clara iniciativa municipal que visa incentivar a
arte entre ns.
Fechando o filme uma seqncia dedicada alta sociedade. O baile da cidade
no Jaragu Country Clube, no bairro da Pampulha, inaugurado oficialmente naquela data em
homenagem ao aniversrio de Belo Horizonte. As dependncias do clube ficaram lotadas. At
mesmo Vera Lcia Maia, Miss Guanabara, esteve presente aceitando a um convite feito pelo
Departamento de Recreao e Turismo. Enquanto isso o locutor nos informa que aquela foi a
mais concorrida festa social realizada durante o ano de 1963. O senhor e a senhora Jorge
Carone danaram naquela festa em que o povo festivamente comemorava mais um ano de
vida da sua cidade, cujo desenvolvimento sempre crescente se deve ao dinamismo operoso da
atual administrao municipal. Carone dana em um clube da Pampulha. A cena traz uma
sensao de dj vu protagonizada anos antes por JK no mesmo bairro.156 Referncia direta ou
no, fato que no final de 1964, quando Carone se lana candidato ao governo de Minas, ele
vai tentar uma aliana poltica com JK cunhando o slogan JJ. Juscelino Kubitscheck
presidente, Jorge Carone governador.
154
96
157
MORETTIN 2005:141
97
incio dos anos de 1960 a igreja catlica em Belo Horizonte passa por uma intensa
organizao. A idia dele era manter um forte imaginrio social catlico na cidade. A partir
dele, a igreja revitaliza sua rede, j muito forte, de presena na sociedade. Surge o Sistema de
Ensino Arquidiocesano, a Pontifcia Universidade Catlica, e uma extensa estrutura de
comunicao capitaneada pela Rdio Amrica e pelo Jornal de Minas. Com o esprito de
reforar o imaginrio catlico, a igreja passa a ter nos anos de 1950 e 60, sob o comando de
Dom Cabral, uma presena muito forte na sociedade, que se aperfeioa com o mandato de seu
sucessor, Dom Joo Resende Costa.
A marca simblica desse imaginrio catlico na cidade e sua presena em um
quarto dos filmes analisados, faz com que pensemos que associar uma imagem junto a esse
imaginrio resulta em ltima instncia em um reforo na prpria imagem poltica do prefeito.
Esses filmes se apropriaram de uma iconosfera conjunto de imagens que, num dado
contexto, est socialmente acessvel (MENESES, 2003: 15), para potencializar uma imagem
de proximidade do poder pblico junto populao. A Igreja Catlica representava para a
maior parte dos belo-horizontinos um conjunto de valores bastante forte, associar uma
imagem poltica a algo que fazia parte da vida social da cidade um movimento positivo e
necessrio a algum que, na condio de chefe poltico, necessitava ser cada vez mais aceito
dentro do conjunto social.
Por meio dos filmes, de um lado a busca por afirmar um prprio poder e por
outro a busca da consolidao deste intento junto populao. Igreja tambm caberia um
hall de interesses: influncia entre a elite governante e acesso aos meios de comunicao.
Qualquer exame da Igreja e da poltica deve levar em considerao o carter institucional da
primeira. (...) O setor hegemnico de uma instituio como a Igreja Catlica no pode ignorar
nem os prprios interesses, nem a necessidade de influir no contexto social (MAINWARING
1989:15-19).
No primeiro plano da seqncia uma multido de pessoas est aglomerada nas
escadarias da Igreja So Jos. No segundo plano, abrindo passagem entre elas aparece Dom
Joo Resende Costa, poca Arcebispo Coadjuntor de Belo Horizonte. Ao seu lado homens
de terno, por certo, membros da municipalidade, deduo feita a partir da locuo descrita a
seguir. Igreja e estado sobem juntos a escadaria, caminhando lado a lado, rumo ao altar
religioso. Trechos da celebrao feita ao ar livre pelo arcebispo se intercalam a planos que
mostram as pessoas assistindo missa e tambm com uma cena dedicada ao coral que cantou
devidamente uniformizado. Pela locuo somos informados que tambm coube prefeitura a
realizao da parte ecumnica do aniversrio da capital. O Departamento de Turismo da
98
158
99
159
160
100
pretexto prefeitura para que ela possa transmitir ao pblico a imagem de uma administrao
que sabe dar valor para uma manifestao to prpria de seu povo.
E por falar em povo, apesar dele ser quantificado pelo narrador em 200 mil e
da cerimnia ser anunciada como sendo muito importante para essa populao
tradicionalmente crist, o pblico presente enquadrado apenas duas vezes em cenas
rpidas e alternadas, mostradas j no final do cinejornal.
Exemplificando a considerao feita por Hlio Gagliardi citada no incio deste
captulo, trs produtoras documentaram a Semana Santa naquele ano, produzindo trs
cinejornais de tema nico sobre um mesmo fato, no mesmo ano.
Muito alm de um gesto cristo, marcando terreno para mostrar que o
Departamento de Recreao e Turismo da prefeitura est atento na organizao de festas que
calam fundo na f do belo-horizontino, a presena do prefeito e de outras autoridades da
municipalidade na cerimnia, trazia um pano de fundo mais ousado: legitimar por meio de um
discurso cristo o exerccio do poder executivo frente da municipalidade.
Mas qual o lugar de Belo Horizonte, em termos de religiosidade, naquele momento?
No perodo ps-golpe militar em 1964 e mesmo antes dele o estado de Minas Gerais
possua um grande destaque na conjuntura nacional com lderes religiosos que marcaram o
perodo. Alm do mais, Belo Horizonte era uma das poucas arquidioceses do Brasil a falar em
um trabalho de pastoral de conjunto, uma idia estrutural bastante avanada para a poca. Isso
significava falar em planejamento de aes a partir de uma atuao mais organizada, algo
novo no imaginrio catlico, o que mostra uma forte vertente progressista da igreja na cidade.
Movimentos laicos com forte atuao tambm se faziam presente destacando-se entre eles a
JUC Juventude Universitria Catlica, uma vertente da atuao catlica que mobilizou
naquele ano aes principalmente ligadas moradia com ocupao de reas invadidas como,
por exemplo, a Cabana do Pai Toms. O Instituto de Teologia possua forte vertente
esquerdista, comungando com a posio progressista do Conclio Vaticano II, pregando
inclusive a realizao da missa rezada em lngua portuguesa. A cidade abrigou tambm vrios
padres ps-conciliares vindos da Europa dispostos a se engajarem no trabalho carismtico
junto aos pobres no Brasil que se concentraram espacialmente na regio da Cidade Industrial.
Sabemos que a disputa poltica entre Magalhes Pinto, governador de Minas e
um dos lderes do golpe militar de 1964 e o prefeito Jorge Carone Filho era acirrada. Neste
panorama temos no perodo em Minas Gerais, e por conseqncia com maior fora em Belo
Horizonte, uma igreja catlica que ir atuar de maneira decisiva contra o golpe. Em 1963 os
rumores e o ajustar do quadro poltico que resultaria em maro/abril do ano seguinte j estava
101
no ar. Aproximar-se de uma igreja que possua um forte potencial de luta contra um inimigo
eminente era para Jorge Carone uma estratgia compensadora at mesmo para sua
sobrevivncia poltica.
Fechando o conjunto documental, o ltimo cinejornal da srie analisada
retratou o natal belo-horizontino daquele ano.
Era dezembro de 1963. Nas telas chega o cinejornal O natal na capital de Minas,
realizado pela companhia produtora Argus Filmes. Locuo: A Prefeitura Municipal de Belo
Horizonte decorou festivamente a capital montanhesa para comemorar as festas natalinas.
Nunca antes a metrpole mineira recebera uma ornamentao to significativa na data magna
da cristandade. A administrao do prefeito Jorge Carone atravs do Departamento de
Recreao e Turismo dirigido pelo senhor Clementino Dotti proporcionou um natal mais
festivo para as crianas que se comprimiram nas avenidas centrais da cidade para receber
Papai Noel. O registro recobre a data de um vis claramente assistencialista. H um pobre
povo infeliz, mas em seu socorro existe um poder executivo extremamente zeloso.
A primeira dama entra no plano em imagem, ao mesmo tempo em que anunciada
pelo narrador: A senhora Jorge Carone Filho fez para as pessoas humildes uma concorrida
festa natalina com a presena de milhares de crianas e adultos aplaudindo e recebendo
brindes. Ela anda no meio do povo, abraada por populares e at mesmo pela Lambreta,
uma famosa moradora de rua da capital que aguardava na fila para ganhar o seu presente.
A estratgia histrica recorrente do po e circo romano encontra ressonncia neste
cinejornal de Belo Horizonte. O po mineiro trouxe a distribuio de alimentos e roupas.
Filas e filas aguardaram com alegria e esperana dando bem o ndice de popularidade j
desfrutado pela primeira dama. Festa popular, festa crist servindo mais uma vez de
oportunidade, para mais uma vez o povo receber dos dirigentes municipais demonstrao de
carinho e compreenso. A encenao do circo coube a Papai Noel, que chega em um carro
aberto, abrindo caminho entre a massa humana em plena avenida Afonso Pena. E a locuo
enfatiza. Mais de 10 mil pessoas desceram dos bairros e vilas para receber a mensagem de
vida do tradicional velhinho. Milhares de crianas e de muitos adultos, que com emoo,
relembraram seus tempos de criana.
Nas favelas os caminhes cheios de presentinhos sobem o morro e quando param so
cercados pelos moradores. Na fila espera do saquinho de presentes, crianas negras, mal
vestidas e mal penteadas olhavam para o interior do cmodo onde era feita a distribuio,
alguns desses olhares se cruzam com o da cmera. O que o espectador v um anseio que
espera. Uma espera que se faz exprimida pelo nmero de crianas e mulheres na estreita porta
102
que separa as mos vazias, dos cobiados embrulhos. Mas o locutor relata um anseio muito
mais animado. As crianas receberam com muita alegria, pois muitas delas nunca antes
haviam tido um natal com brinquedos e comestveis como as crianas ricas. A locuo, voz
da prefeitura quer ditar com o texto uma forma de se v as imagens, querendo transmitir ao
espectador a presena de um poder pblico que equaciona as necessidades das pessoas. O
reforo a esta idia vem no plano seguinte. Mostrando agora o interior do cmodo, v-se o
engravatado diretor do Departamento de Bairros Populares, Raimundo Amaral Tinti
distribuindo os saquinhos a um grupo de crianas. Na cena seguinte, a cmera se abaixa
posicionando-se na altura de duas menininhas, uma delas est sem camisa, que saem com as
mos ocupadas com o agraciamento recebido diretamente da prefeitura, um mimo que nunca
antes haviam tido.
Aps a anlise, o que se percebe que nestes filmes, mesmo a vida social da cidade s
existe e se desenvolve por que h uma ao da prefeitura junto a esse fluxo scio-cultural de
Belo Horizonte. O movimento de comunicao que se quer transmitir neste e em todos os
outros filmes com temticas sobre a vida social da cidade produzidos naquele ano de 1963,
trouxeram um s fluxo de interao: a cidade vive e se realiza a partir da municipalidade. O
povo um coadjuvante do processo porque sempre aparece em segundo plano, sempre o
assistido, sempre a parte que recebe. Esse povo nunca fala e nunca registrado sob o ponto
de vista de protagonistas. O prefeito e os departamentos pblicos por ele comandados so
quem em verdade facultam ao belo-horizontino a possibilidade de viver de forma mais cidad
e crist na cidade onde moram. A cidade um organismo carente de ateno e esta prefeitura
se faz presente para sanar essa carncia, dando a ela o carnaval, as festas de congado, festa
junina, lembrana ao dia das mes, natal com ateno voltada aos mais carentes e tambm
alimentando seu povo com grandes manifestaes de f, aja visto as comemoraes da
Semana Santa e o cunho catlico das festividades em homenagem ao aniversrio da capital.
Somando-se a esta anlise temos tambm a observao final sobre o eixo das obras
pblicas. Nestes filmes d-se por completo o movimento do Ritual do poder. Neles o chefe
mximo da prefeitura tece sobre si um discurso de vitria e avanos que capitaneados por ele
levam a cidade para frente. Jorge Carone Filho o homem capaz de vencer qualquer
dificuldade administrativa e ao seu comando o povo vai vendo pouco a pouco surgir no
espao geogrfico belo-horizontino uma nova cidade, mais moderna, mais em sintonia com os
novos tempos. Carone tambm viaja para outras cidades de Minas em cerimnias
comemorativas, fazendo-se conhecer pelos eleitores do interior, mas, sobretudo, ele se retrata
andando pela cidade. Foi figura presente em festa de gala em comemorao ao aniversrio da
103
104
para suas ambigidades, incertezas e tenses, o cinema perde a sua efetiva dimenso de fonte
histrica. 161
Estas imagens do passado que sobreviveram at o presente constituem hoje
acervos de imagens cinematogrficas que colaboram para otimizar o acesso a uma poca
passada, ampliando as formas histricas de se compreender um tempo.
fato que este jornalismo feito entorno do poder para o cinema, que ora esto
preservados, colabora para perpetuar no tempo significados criados por uma elite poltica que
traz por sua vez um ponto de vista determinado sobre um lugar, uma administrao e sobre
um tempo vivido em uma dada sociedade.
O olhar que procura ver estes documentos no presente, aquele que busca
perceber o caminho traado por uma administrao municipal no que ela traz de objetivos em
primeiro e segundo planos. No primeiro plano esto as realizaes administrativas do
executivo municipal. Em segundo plano, est os agentes a quem estas realizaes querem
convencer. A percepo do poder, assim, fenmeno dos mais importantes para o
entendimento de atitudes e representaes mentais de uma dada poca. E tal processo realizase em duas vias: a forma pela qual o poder pretende aparecer e a maneira pela qual
percebido.162
Em questo, o grande bloco a ser convencido a fim de ser transformado em
aliado poltico a populao de Belo Horizonte. A dinmica da administrao que previa na
campanha eleitoral, por exemplo, governar com as portas do gabinete abertas, ou mesmo
depois de eleito estabelecer com as comunidades de vilas e favelas um contato corpo a corpo,
sintetizando na figura do prefeito o prprio poder municipal em sim, configuram-se, todas
elas, em estratgias de convencimento. A administrao popular do prefeito revela uma
pulso de representao sobre uma cidade. O futuro mais promissor estava sendo sinalizado
pelo volume de obras.
Isso por que o futuro poltico de Jorge Carone Filho tambm estava traado.
Executar nos dois primeiros anos de mandato uma administrao efetiva em resultados para
lanar-se candidato ao governo estadual com forte apoio popular na Capital. A estratgia
poltica tambm por sua vez um discurso, sendo seus enunciados as realizaes
administrativas, a construo de representaes, a mobilizao do imaginrio social que cerca
a coletividade, a conseqente construo de novos smbolos e as articulaes institucionais
161
MORETTIN, Eduardo. O cinema como fonte histrica na obra de Marc Ferro. In: Histria: Questes &
Debates, Curitiba, n.38, p. 40, 2003.
162
FICO, Carlos. Reinventando o otimismo: ditadura, propaganda e imaginrio social no Brasil. Rio de Janeiro:
Editora Fundao Getlio Vargas, 1997, p. 54 (grifos da autora)
105
que necessitam ser formadas com outros partidos, entidades de classe, setores da sociedade
civil e etc. Assim, esses enunciados so os canais pelos quais, o discurso se difunde,
atentando-se para a ordem foucaultiana que entende o discurso como sendo o prprio poder,
aquilo pelo que se luta, aquilo de que se quer apoderar.163 Investigar o quadro mais amplo de
fruio destes contedos, percebendo de forma mais acurada como se dava a recepo deste
influxo poltico pela populao desejo que fica por ora entregue ao futuro.
163
106
5. CONCLUSO
107
REFERNCIAS
108
109
110
111
NAPOLITANO, Marcos. A Histria depois do papel. In: PINSKY, Carla Bassanezi (org.).
Fontes histricas. So Paulo: Contexto, 2005, p. 235-289.
PAULA, Joo Antonio de, MONTE-MR, Roberto Lus de Melo. As trs invenes de Belo
Horizonte. In: ANURIO ESTATSTICO DE BELO HORIZONTE. Belo Horizonte:
Prefeitura Municipal de Belo Horizonte/ Secretaria Municipal de Planejamento/
Departamento de Informaes Tcnicas, 2001.
PEREIRA. Wagner Pinheiro. Cinema e propaganda poltica no fascismo, nazismo,
salazarismo e franquismo. Histria: Questes & Debates, Curitiba: Editora UFPR, n. 38, p.
101-131, 2003.
PREFEITURA MUNICIPAL DE BELO HORIZONTE. Relatrio de Gesto. Belo
Horizonte: [s.n.],1963.
RABAA, Carlos Alberto. Dicionrio de comunicao. So Paulo: tica, 1987.
RABLO, Jos Maria (direo). Binmio. Edio histrica. Belo Horizonte: Armazm de
Idias/Barlavento Grupo Editorial, 1997.
RIBEIRO, Jos Amrico. O cinema em Belo Horizonte: do cineclubismo produo
cinematogrfica na dcada de 60. Belo Horizonte: Editora UFMG, 1997.
RIO
So
Francisco.
1963.
Disponvel
em:
http://paginas.terra.com.br/arte/cineacao
112
113
preciso salientar que este trabalho foi feito a partir da anlise das imagens
telecinadas, ou seja, estes documentos no foram assistidos em pelcula, suporte original de
produo, mas sim, visualizados a partir do formato em vdeo VHS.
A indexao aqui apresentada segue o modelo realizado pela Cinemateca
Brasileira no Catlogo Cinejornal Carrio, 2001 em que foram catalogados e indexados os
cinejornais produzidos pela extinta produtora Carrio Filmes da cidade de Juiz de Fora
Minas Gerais.
Os itens abaixo agrupam dados obtidos a partir dos crditos de cada filme
como ttulo, produtor, companhia produtora e dados tcnicos: tempo de durao, cor, bitola de
telecinagem.
A datao de cada edio foi levantada a partir de seu contedo e por
fotografias e documentos administrativos pertencentes ao Arquivo Pblico da Cidade de Belo
Horizonte.
Siglas utilizadas:
atr. - ttulo atribudo
BP
- branco e preto
cp.
- companhia produtora
d.
- direo
dis. - distribuidora
f.
- fotografia
- produo
pesq. - pesquisa
S/D - data no identificada
114
durao (*)
ca.
cmera (*)
bi bitola de telecinagem
Os ttulos por mim atribudos foram grafados entre parnteses.
ADMINISTRAO
DE
BELO
HORIZONTE
INICIA-SE
115
posse em praa pblica com show de Black-out, Elza Soares e ngela Maria
encantaram os fs
A multido recebeu com jbilo o novo prefeito que mais uma vez
2. O Carnaval em Minas
son - Fevereiro de 1963 - BP
Belo Horizonte/ Minas Gerais
116
p. Paulo Vasconcellos
d -3 min
bi VHS
Abertura: BELO HORIZONTE
O CARNAVAL DE MINAS
Prod. Paulo Vasconcellos
Jorge Carone
117
Para cumprir a grande obra que ser levada a cabo pelo DBP foi
Abertura:
Noticirio 1 F 1963
BELO HORIZONTE M.Gerais
KIRK DOUGLAS VISITA A CAPITAL MINEIRA
118
Turismo, senhor Clementino Dotti e pelo senhor Vitor Mximo diretor da empresa de
cinemas e teatro Minas Gerais
O prefeito vai ao povo
son. 1963 - BP
Belo Horizonte/ Minas Gerais
p. Paulo Vasconcelos
d - 1min 05 seg
bi VHS
Abertura:
Noticirio 1 F 1963
BELO HORIZONTE M. Gerais
O PREFEITO VAI AO POVO
Produes Paulo Vasconcellos
119
son. 1963 - BP
Belo Horizonte/ Minas Gerais
p. Paulo Vasconcelos
d - 1min 57 seg
bi VHS
Abertura:
Noticirio 1 F 1963
Por muito anos a rua Maua constituiu um grave problema para veculos
e pedestres.
tomou providncias para acabar com o grave perigo com um trabalho realizado em
ritmo Braslia
de graves desastres
entusisticos aplausos pelo povo que acompanhou o incio das obras que custar
prefeitura um aviltada soma, mas que valer a pena
foram removidas.
120
bi VHS
Abertura:
Noticirio 1-1-1963
BELO HORIZONTE M. Gerais
SEMANA SANTA EM BELO HORIZONTE
P.V. FILMES
121
Produes: PANTAFILMES
Obs: Com exceo do letreiro final esta edio apresenta o mesmo filme que foi
apresentado no cinejornal nmero 2, acima, s mudando a produtora.
122
pessoa de seu prefeito Jorge Carone Filho e do senhor Clementino Dotti, Diretor do
Departamento de Turismo da prefeitura realizaram esta impressionante demonstrao
de f crist
cerimnia)
Brilhante solenidade sacra que sem dvida uma das mais belas
2 trecho
123
8. Notcias Diversas
son. Abril de 1963 - BP
Belo Horizonte/ Minas Gerais
cp. Pantafilmes
d - 1 min
bi VHS
Abertura: Minas Gerais
NOTCIAS DIVERSAS
Produes PANTAFILMES
vital importncia para a cidade. o dinheiro do povo aplicado a seu prprio benefcio
e melhoramento da cidade
9. Notcias diversas
son. Maio de 1963 - BP
Belo Horizonte/ Minas Gerais
cp. P.V Filmes
d - 2 min e 53 seg.
bi VHS
124
Abertura:
Noticirio 1J 1963
BELO HORIZONTE M.Gerais
NOTCIAS DIVERSAS
P.V FILMES
Homenagem a um pioneiro
son. 1963 - BP
Belo Horizonte/ Minas Gerais
cp. P.V Filmes
d - 1min e 4 seg.
bi VHS
Abertura:
Noticirio 1J 1963
BELO HORIZONTE M.Gerais
125
HOMENAGEM A UM PIONEIRO
P.V FILMES
pelo prefeito Jorge Carone Filho realizou-se na Avenida Afonso Pena a ereo do
busto saudoso industrial Vitrio Marola pioneiro da industria perfumista na capital
montanhesa.
Noticirio 1H 1963
BELO HORIZONTE M.Gerais
NOTCIAS DIVERSAS
P.V FILMES
pblica para a perfurao de 150 poos artesianos em diversas regies da cidade a fim
de resolver o problema da gua que tanto aflige os belo-horizontinos
126
funcionamento
Guanabara senhor Carlos Lacerda visitou o prefeito Jorge Carone Filho no palcio da
municipalidade
Noticirio 1J 1963
JUIZ DE FORA M.G.
113 ANIVERSRIO DA MANCHESTER MINEIRA
P.V FILMES
presentes
127
do aniversrio da cidade
os servio de bonde
manifestao do povo
colaborar com o s municpios do interior. Diante desse plano Lavras recebeu as duas
unidades de bondes cedidas pelo Departamento de Bondes e nibus da capital de
Minas
Jorge Carone, Delane Costa e seu pai foram homenageados pela cmara
128
esforo do prefeito Jorge Carone para dar cidade de Belo Horizonte o precioso
lquido de que tanto carece
129
exposio do administrador que falou por duas horas com o mesmo tom de
sinceridade que acompanhou a sua campanha eleitoral. Ele informou imprensa todas
realizaes feitas
Dando a cidade mais de 7 milhes e 500 mil litros de gua por dia a
prefeito Jorge Carone construiu o terceiro brao do crrego dos taboes que ir
reforar o abasteceimento da capiatal mineira]
O prefeito disse ter foras para realizar sob qualquer custo a obra que
Noticirio 1I 1963
BELO HORIZONTE M.Gerais
ATIVIDADES DA ADMINISTRAO MUNICIPAL
P.V FILMES
130
Todos os esforos esto sendo empregados no combate aos insetos que tanto vem
importunando o povo da capital de Minas
131
iniciativas do prefeito
sobretudo popular. O prefeito Jorge Carone e o servio de turismo dirigido pelo senhor
132
figura
133
professor Moraes ter a seu canal totalmente coberto a fim de facilitar o trnsito de
veculos e os graves problemas de enchente
embelezamento da rua
pblicos
134
prprias artrias uma transformao completa fruto de uma administrao que cresce
acompanhando a cidade em seus bairros e vilas
cidade, derrubado pela ltima administrao foi devolvido cidade pelo prefeito Jorge
Carone e colocado na praa Diogo de Vasconcellos
Belo Horizonte
135
popularidade j desfrutado pela primeira dama. Festa popular servindo mais uma vez
136
de oportunidade para mais uma vez o povo receber dos dirigentes municipais
demonstrao de carinho e compreenso
da cidade