O presente artigo aborda algumas influências da mídia sobre a disseminação da cultura do medo e da violência na sociedade de risco em que vivemos. A abordagem focaliza-se na situação brasileira, expondo em que setores essa intervenção se dá mais frequentemente, o que acaba nos exigindo o resgate de uma postura mais crítica, dadas as consequências nefastas e irreversíveis que a exposição midiática pode acarretar.
O presente artigo aborda algumas influências da mídia sobre a disseminação da cultura do medo e da violência na sociedade de risco em que vivemos. A abordagem focaliza-se na situação brasileira, expondo em que setores essa intervenção se dá mais frequentemente, o que acaba nos exigindo o resgate de uma postura mais crítica, dadas as consequências nefastas e irreversíveis que a exposição midiática pode acarretar.
O presente artigo aborda algumas influências da mídia sobre a disseminação da cultura do medo e da violência na sociedade de risco em que vivemos. A abordagem focaliza-se na situação brasileira, expondo em que setores essa intervenção se dá mais frequentemente, o que acaba nos exigindo o resgate de uma postura mais crítica, dadas as consequências nefastas e irreversíveis que a exposição midiática pode acarretar.
O presente artigo aborda algumas influências da mídia sobre a disseminação da cultura do medo e da violência na sociedade de risco em que vivemos. A abordagem focaliza-se na situação brasileira, expondo em que setores essa intervenção se dá mais frequentemente, o que acaba nos exigindo o resgate de uma postura mais crítica, dadas as consequências nefastas e irreversíveis que a exposição midiática pode acarretar.
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Crnica da Violncia e da Criminalidade
OPapel da Mdia na Disseminao do Medo
Carlo Velho Masi Mestre em Cincias Criminais pela PUCRS; Especialista em Direito Penal ePoltica Criminal pela UFRGS; Advogado Criminalisla em Porto Alegre/RS. RESUMO: O presente artigo aborda algumas influncias da mdia sobre a disseminao da cultura do medo e da violncia na sociedade de risco emque vivemos. Aabordagem focaliza-se na situao brasileira, expondo emquesetores essa interveno se d mais freqentemente, oque acaba nos exigindo o resgate de umapostura mais crtica, dadas as conseqncias nefastas e irreversveis que a exposio miditica pode acarretar. PALAVRAS-CHAVE: Mdia. Sociedade de Risco. Cultura do Medo. Insegu rana. Aliberdade de informar e de ser informado constitui um dos pilares das sociedades democrticas. Luhmann afirma que "aquilo quesabemos sobre nossa sociedade, ou mesmo sobre o mundo onde vivemos, o sabemos pelos meios de comunicao"1. Por essa razo, a instituio da mdia legitimou-se historicamente como a principal difusora de informaes sobre o ambiente que cerca seus leitores e ouvintes. Na contemporaneidade, a mdia goza de enorme credibilidade e con fiana aos olhos da populao, de modoque possvel afirmar que asociedade se tornou dependente dela para se atualizar e ter cincia dos acontecimentos do mundo. Acomplexidade das sociedades imps a massificao dos mecanis mos comunicacionais. Uma massificao de meios (jornais, rdio, televiso, internet, etc), mas tambm de mensagens, de emissores e de destinatrios2. O problema surge precisamentequando se constata que a expansoda mdia causou um grande embate entre avelocidade do mundo3, impulsionada pelo fetiche do imediatismo, e o conhecimento cientfico, erudito, tcnico e 1 LUHMANN, Niklas.Arealidade dos meios de comunicao. SoPaulo: Paulus, 2005. p. 15. 2 GOMES, Marcus Alan de Melo. Mdia, poder c delinqncia. Boletim IBCCRIM, n. 238, So Paulo, ano 20, sct. 2012, p.4-5. 3 V1RILIO, Paul. A inrcia polar. Lisboa: Dom Quixotc, 1993. p. 128. 96 Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal N 59 - Abr-Maio/2014 - Criminalidade refletido, que demanda um tempo de maturao menos acelerado. Esse con flito torna cada vez mais atrativos os meios de comunicao em massa como principal fonte de "conhecimento"4. A mdia de massa (rnass media), fortemente pautada pela fragmenta- riedade, efemeridade e ambigidade, produziu uma realidade centrada na instantaneidade do consumo e no impacto sensacionalista, com pouca pro fundidade de anlise. O abandono da distino entre informao e entretenimento causou dois problemas fundamentais. Em primeiro lugar, a ameaa ao debate significativo que o ps-modernismo implica, pois o pblico perde a noo do que verdade e do que no . E, em segundo, a dificuldade de definio do que hoje constitui recreao, porquanto a violncia passou a entreter o pblico, que tornou-se mais emocionalmente desapegado e insensvel ante a vasta gama de imagens que o bombardeia diariamente5. O exemplo mais convincente da performance da mdia ps-moderna ocorreu nos atentados de 11de setembro de 2001, nos EUA, porque congregou uma srie de fatores que propiciaram uma cobertura miditica sem prece dentes. As imagens televisivas daquele dia tornaram-se as mais memorveis j vistas. Foi verdadeiramente um "espetculo ps-moderno" que exaltou a sensao de insegurana, trazendo a idia de ataques terroristas contra civis inocentes. No Brasil, os efeitos miditicos podem ser sentidos cada vez com maior intensidade, especialmente na deflagrao de "megaoperaes" das polcias civil e federal - nas quais ocorre a priso simultnea de dezenas de pessoas por fraudes escandalosas em algum setor determinado e geralmente ocorrem coletivasde imprensa para "esclarecer" os fatos- e nas transmisses aovivo de julgamentos pelo Tribunal doJri - nas quais no raro que diversos "especia listas" sejamchamados a dar sua opinio pessoal sobre os desdobramentos, as condenaes soaplaudidas como sinnimos dejustia e as absolvies como vitrias dos defensores experientes contratados pelos rus para convencer os jurados. Numa categoria parte, pode-se situar osjulgamentos da Suprema Corte, que, por sempre envolverem casos de elevada notoriedade, no raro adquirem ainda um componente poltico. Os atuais discursos da mdia transformam os observadores em sujeitos do perigo fragmentado e aleatrio da criminalidade, proporcionando condi espara infindveis narrativas da criminalidade que perpetuam a sensao de 4 SOUZA, Bernardo de Azevedoc; SOTO, Rafael Eduardo de Andrade. Criminologia cultural, "marketing" c mdia. Boletim IBCCRIM, n. 234, So Paulo, ano 20, maio 2012, p. 14-15. 5 JEWKES, Yvonnc. Media c crime. 2. ed. Londres: Sage, 2011. p. 7-38. )E Criminalidade - Revista Magister de Direito Penal eProcessual Penal N_59-Abr-Main/?m4 97 perigo constante. Essa aexplicao que os ps-modernistas do fascinao da mdia pelo crime: todos os expectadores so potenciais vtimas. Outro aspecto da histeria que envolve os casos criminais noticiados queamdia no faz adistino entre oordinrio e oextraordinrio. Aaudin cia bombardeada com arepresentao de crimes raros, como, por exemplo, assassinatos em srie (serial killings), extermnios coletivos ("chacinas"), trfico de pessoas eseqestras de crianas por estrangeiros, como se fossem comuns. Isso provoca um aumento da ansiedade do pblico edesvia aateno de crimes cuja reiterao freqente e mais preocupante. Rodrigues sustenta que aresponsabilidade pblica dos meios decomu nicao de massa muito grande, pois, se h uma forma de problematizao da violncia urbana capaz de produzir pnico e, consequentemente, desordem, a que se produz quando anfase do noticirio dada sobre odesamparo de todos diante de uma situao totalmente fora de controle6. Silva Snchez descreve o papel dos meios de comunicao na construo (subjetiva) do medo social: "(...) cn Io que hace ai derecho penal, resulta ineludible Ia puesta en re- lacin de Ia sensacin social de inseguridad con el modo de proceder de los mdios de comunicacin. Estos, por un lado, desde Ia posicin privi legiada que ostentan en el seno de Ia 'sociedad de Ia informacin' yen el marco de una concepcin dei mundo como aldea global, transmiten una imagen de Ia realidad en Ia que Io lejano yIo cercano tienen una presencia casi idntica en Ia representacin dei receptor dei mensaje. Ello da lugar, en unas ocasiones, directamente a percepciones inexactas; y en otras, en general, a una sensacin de impotncia. Amayor abundamiento, porotrb lado, Ia reiteracin yIa propia actitud (dramatizacin, morbo) con Ia que se examinan determinadas noticias actan a modo de multiplicador de los ilcitos y Ias catstrofes, generando una inseguridad subjetiva que no se corresponde con el nivel de riesgo objetivo."7 Asensao de insegurana, alimentada e acentuada permanentemente pelos meios de comunicao, se apresenta desproporcional em relao existncia concreta do risco. Essa percepo se potencializa e se sobreleva em virtude da ao de alguns setores dos meios de comunicao. Dessa forma, tendo-se em conta o papel extremamente significativo que cumprem as agncias de comunicao no processo de dramatizao do universo penal, chega-se concluso de que o sistema penal no se apresenta como o meio 6 RODRIGUES, Jos Augusto deSouza. Aeconomia poltica domedo. Discursos Scdiciosos: crime, direito csociedade, n. 2, RiodeJaneiro, ano 1, 2osem. 1996, p. 269-276, p. 273. 7 SILVA SNCHEZ, Jesus Maria. La expansiu dei derecho penal: aspectos de Ia poltica criminal en Ias sociedades postindustrialcs. 1. cd. Madrid: Civitas, 1999. p. 27-28. I 98 Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal N 59 - Abr-Maio/2014 - CRIMINALIDADE prprio e legtimo para a mitigao desse quadro, o que torna as propostas e reclamos sociais punitivos absolutamente falhos de qualquer racionalidade8. Como se pode concluir, o sentimento de insegurana que brota da sociedade se potencializa e se sobreleva em virtude da aode alguns setores dos meios de comunicao. Nesse quadro, a desproporcional sensao de insegurana em relao existncia concreta dos riscos dissemina um clima generalizado de ansiedade social, ou uma cultura fbica, influenciando de forma marcante a poltica criminal. As novas propostas de enfrentamento da criminalidade tm em comum a bandeira do eficientismo em seu combate e do intervencionismo, sob a etiqueta de uma suposta "guerra urbana". O incremento do sentimento de insegurana, as tenses sociais e o clamor por uma poltica criminal de "combate" efetivo so o corolrio lgico9. Ento, com enfoques descontextualizados, sob um clima punitivista, os meios de comunicao convolam-se numa verdadeira "fbrica de medo" e, com isso, geraminfindveis postulaes por segurana, acriticamente abrigadas pelas instituies estatais10. Acomplexidade de novas questes, naperspectiva de uma sociedade glo balizada, na qual os riscos soconstantemente objeto de exposio miditica, acabapor denunciar, tambm, asfraquezas das estruturas clssicas de proteo. Esse quadro de crise sistmica experimentado pelo sistema punitivo desemboca em um controle em que difcil distinguir, com a necessria clareza, a legtima interveno estatal da crua violncia, fruto da exigncia de, implementao de medidas de conteno (fora). Vendo ruir os pressupostos modernos sobre os quais assentava um projeto emancipatrio rumo a uma sociedade segura, o uso da fora pblica, sob a bandeira da segurana, tem-se mostrado a opodos governos contemporneos11. Obviamente, a violncia nem sempre produto do consumo; todavia, as respostas s imagens de violncia, sejam de medo, desconforto ou indife rena, demonstram comose do as relaes interpessoais e sociais atualmente, produzindo, assim, novos sentimentos, que surgem dessa hiperexposio12. 8 FAYETJr., Ncy; MARINHOJr., Inczil Pcnna. Complexidade, insegurana cglobalizao: repercusses no sistema penal contemporneo. Sistema Penal &Violncia, n. 1,v. 1, Porto Alegre, jul./dcz. 2009, p. 84-100, p. 88. 9 Idcm, p. 93. 10 DEZ RIPOLLS, Jos Lute. La poltica criminal en Ia enerneijada. Buenos Aires: Bde F, 2007. p. 108. 11 FAYETJr., Ncy; MARINHOJr., Inczil Penna. Complexidade, insegurana eglobalizao: repercusses nosistema penal contemporneo. Sistema Penal &Violncia, n. 1, v. 1, Porto Alegre, jul/dcz. 2009, p. 84-100, p. 93. 12 CARVALHO, Saio de. Criminologia cultural, complexidade c as fronteiras de pesquisa nas cincias criminais. RBCCrim, n. 81, So Paulo, dez. 2009, p. 294-338, p. 321-322. Criminalidade - Revista Magister de Direito Penal eProcessual Penal N 59 - Abr-Maio/2014 99 Einduvidoso que os meios de comunicao transitam hoje por todas as esferas do poder poltico, interferindo nas aes tomadas pelos Poderes Executivo e Legislativo. Adimenso do poder de influncia dos polticos que atuam nesse campo se reflete na busca pela futura reeleio, para aqual se faz necessrio o suporte da mdia. Na outra ponta, est oJudicirio, composto por membros teoricamente independentes e que julgam conforme o seu "livre-convencimento". No entanto, inegvel que atos magistrados podem ser influenciados por motivos externos, como, por exemplo, a exposio dada pela mdia a de terminados casos, dificultando, assim, o trabalho de coleta de provas perante a autoridade policial, ou, emcasos do Tribunal doJri, nos quais osjurados, juizes de fato, esto muito expostos atuao da mdia. No Supremo Tribu nal Federal, tivemos prova recente, e por todos conhecida, dessa influncia. Assim sendo, a capacidade de formar opinies atravs das notcias pro pagadas pelos meios de comunicao em massa e comover a populao com sensacionalismo transformou o fiscal emguia. Quem deveria limitar, segundo balizas legais e orientaes ticas, passou, em muitos casos, averdadeiramente conduzir o exerccio do poder. Leis passam a ser promulgadas em virtude da presso provocada pela cobertura miditica - no raras vezes estereotipada e preconceituosa - que os meios de comunicao reservam a determinados fatos, sobretudo no mbito da delinqncia. Atos de gesto pblica so executados para afastar a aten o da mdia ou para seduzi-la (o que significa seduzir tambm o pblico). Decises judiciais so proferidas para no contrariar as expectativas criadas e alimentadas pelo discurso dos meios de comunicao. Basta vermos as ferrenhas disputas travadas em pblico entre os pr prios julgadores e amplamente divulgadas pela mdia no to propalado caso do Mensalo (AP 470), julgado pelo STF13. Aquele que deveria estar fora do poder, para vigi-lo, passa a exerc-lo, de modo sutil e dissimulado. O ideal iluminista da imprensa guardi da democracia, que servia aos interesses e necessidades da cidadania, foi paulatinamente substitudo pela essncia da indstria cultural, na qual o indivduo nlo precisa de informao, e sim de mercadoria, como consumidor que . 13 Este, alis, um dos casos mais emblemticos do poder de manipulao miditicodos ltimos tempos. Por se tratarem de crimes docolarinho-branco, os meios de comunicao comumente valeram-se das expresses escndalo, esquema, crise poltica, c adotaram a palavra mensalo como forma de facilitar a identificao por parte do pblico. O Mensalo foi responsvel por um aumentocxponcncial daaudincia dos telejornais e da venda de revistas que, semanalmente, apresentavam algumcomponente novoainda mais extraordinrio c chocante. A pressopopular por condenaes dos supostos envolvidos ficou explcita na coberturado maior e mais publicizado julgamento da histria do Brasil. r 100 Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal N 59 - Abr-Maio/2014 - Criminalidade Ainformao ofertada nas "prateleiras miditicas" (jornais, televiso, rdio, internet, etc.) em "embalagens" muito parecidas, o que limita as op es. Etodo aquele que nopode eleger est sendo, seguramente, dominado, conduzido. Ento, manipular significa, no contexto da mdia, dominar pela informao mercantilizada. O noticirio sobre a delinqncia se vale de clichs e de esteretipos para criar heris e viles, personagens com os quais o consumidor certamente ir se identificar. Se h uma condenao, pela culpa do acusado. Agora, se h absolvio, pela agilidade dos defensores. Nesse rumo, a violncia das imagens passa para o plano do imaginrio e produz reflexos nos padres de comportamento da vida real. Talvez isso no signifique que as pessoas simplesmente imitem a vio lncia veiculada pelos meios de comunicao, at porque o processo pode ser inverso. Em vez de agirem com violncia, as pessoas simplesmente passam a toler-la. Torna-se banal assistir aos massacres dirios veiculados pelos tele- jornais. Tais notciasj no causammais o impacto de antigamente. Aceitamos que se tratam de fatos do cotidiano e que com eles temos de conviver. Perdemos a capacidade de indignao. Nossa postura passiva, de aceitao. Vamos nos acostumando violncia como se fosse a nica lingua gem eficiente para lidar com a diferena. "Vamos achando normal que, na fico, todos os conflitos terminem com a eliminao ou a violao do corpo do outro"14. Esse, sem dvida, um dos fatores que contribui parao perodo de crise qe Carlos Sandano identifica no jornalismo. Uma crise econmica em que ojornalismo perde leitores para a internet e outras formas de entretenimento. Uma crise de identidade em que atendnciados grandesgrupos de comunicao em transformar tudo em espetculo descaracteriza o contedo jornalstico. E, no menos, uma crise profissional em que se assiste diluio das fronteiras entre a publicidade e o jornalismo, assim como manipulao (consciente ou inconsciente) da informao15. A velocidade do mundo acaba servindo at mesmo de desculpa para a vulgarizao da qualidade das notcias que so apresentadas ao pblico. Nesse nterim, coloca-se a sedutora idia da criminalidade urbana violenta 14 KEHL, Maria Rita.Televisoe violnciado imaginrio. In: BUCCI, Eugnio; KEHL, Maria Rita. Vidcologias: ensaios sobre televiso. So Paulo: Boitempo, 2004. p. 88-89. 15 SANDANO, Carlos et ai. A informao-mcrcadoria do jornalismo c as novas formas de trocas culturais na socie dade globalizada. In: COELHO, Cludio Novaes Pinto; CASTRO, Valdir Jos de(Org.). Comunicao csociedade do espetculo. SoPaulo: Paulus, 2006. p. 61-80. Criminalidade - Revista Magister de Direito Penal eProcessual Penal N 59 - Abr-Maio/2014 101 trazida pela mdia de massa, incutindo ajmencionada sensao falaciosa de insegurana permanente. Hoje, o medo constri muros. Para suportar a ansiedade causada pelo terror, aceitamos depender da idia de viver gradeados em uma fortaleza. O risco de ultrapassar seus domnios nos muitas vezes alto demais. Preferimos no sair mais noite, no estacionar o carro na rua, no freqentar determi nados locais. Eum preo que julgamos aceitvel. Aquele que deixar sua porta destrancada assume o risco de que algum possa invadir suacasa. S no conseguimos viver isolados por muito tempo sem informao. Otelespectador, ouvinte ou leitor reduzido condio de consumidor por ummercado composto por cartis que, comisso, obtmganhos exorbitantes custa da tragdia e do sofrimento alheios16. Eis a a maior vitria da mdia contempornea, que tem a garantia de audincia em todas as faixas da populao e, consequentemente, lucros fi nanceiros e simblicos incomensurveis. Ao fim e ao cabo, nem tudo o que a mdia quer transparecer. Deve mos entender que a violncia um "produto" que gera muitos lucros para determinados setores. As posies editoriais nem sempre so a resposta final para todas as questes, mas, antes, so posturas institucionais historicamente situadas, que sempre possuemum interesse relacionado17. Precisamos resgatar, portanto, uma atitude crtica e cautelosa, e no meramente reprodutiva, pois a mdia tem o poder de construir e destruir reputaes em reportagens que duram segundos na vida dos espectadores, porm, muitas vezes, uma vida inteira na vida daqueles que tiveram seus nomes expostos. As imagens e sons que vemos e ouvimos so, na realidade, vidas que esto em jogo. TITLE: The role of the media in the disscmination of fear. ABSTRACT: This article discusses some influences of the media on the disscmination of the culturc of fear and violence in the risk society in which we live. The approach focuses on thc Brazilian situation, exposingsectors in which the intcrvention takes placc more often, which ends up requiring the rescue of a more criticai posture, given the disastrous and irreversible consequences that media exposure can cause. KEYWORDS: Media. Risk Society. Culture ofFear. Insecurity. 16 HAYWARD, Kcith; FERRELL,Jcff. Possibilidades insurgentes: as polticas da criminologia cultural. Sistema Penal & Violncia, n. 2, v. 4, Porto Alegre, jul./dcz. 2012, p. 206-218. 17 Recentemente, por exemplo, asOrganizaesGlobo, maior conglomerado de empresas do setor de mdia da America Latina, admitiu publicamente que apoiou a ditadura militar que se estabeleceu no Brasil entre 1964e 1985, deixando dedivulgar crimes militares praticados nesse perodo, bemcomonegandocoberturaaos movimentospr-democracia queexistiam no pas, tudocm funo de interesses econmicos c polticos do grupo. - 102 Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal N 59 - Abr-Maio/2014 - Criminalidade Referncias CARVALHO, Saio de. Criminologia cultural, complexidade c as fronteiras de pesquisa nas cincias cri minais. RBCCrim, n. 81, So Paulo, dez. 2009, p. 294-338. DIEZ RIPOLLES, Jos Luis. Lapoltica criminal en Ia encrucijacla. Buenos Aires: Bde F, 2007. FAYETJr., Ncy; MARINHOJr., Inczil Penna. Complexidade, insegurana e globalizao: repercusses no sistema penal contemporneo. 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ISSN 1807-3395 Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal AnoX Nmero 59 Repositrio Autorizado de Jurisprudncia Supremo Tribunal Federal - n 38/2007 Superior Tribunal de Justia - n 58/2006 Editores Fbio Paixo Veruscka Diab Waltcr Diab Diretores Ana Maria Paixo Fbio Paixo Luiz Antnio Paixo Coordenadores Damsio E. de Jesus - Fernando da Costa Tourinho Filho - Luiz Flvio Borges D'Urso Elias Mattar Assad - Marco Antnio Marques da Silva Conselho Editorial Ada Pellegrini Grinover - Adeildo Nunes - Amadeu de Almeida Weinmann Aury LopesJnior - Carlos Ernani Constantino - Celso de Magalhes Pinto Csar Barros Leal - Cezar Roberto Bitencourt - Elcio Pinheiro de Castro Fernando Capez - Fernando de Almeida Pedroso - Geraldo Batista de Siqueira Haroldo Caetano da Silva -Jos Carlos Teixeira Giorgis - Luiz Flvio Gomes Marcelo Roberto Ribeiro - Maurcio Kuchne - Renato Marco Ren Ariel Dotti - Roberto Victor Pereira Ribeiro - Rmulo de Andrade Moreira Ronaldo Batista Pinto - Srgio Demoro Hamilton - Umberto Luiz Borges D'Urso Colaboradores deste Volume Cario Velho Masi - Cezar Roberto Bitencourt - Damsio Evangelista deJesus Ives Gandra da Silva Martins - Roberto da Silva Freitas Rmulo de Andrade Moreira -Thales Cavalcanti Coelho -Yuri Felix