BORDIN, João. Nação e Nacionalismo No Pensamento Político de Max Weber
BORDIN, João. Nação e Nacionalismo No Pensamento Político de Max Weber
BORDIN, João. Nação e Nacionalismo No Pensamento Político de Max Weber
Artigo realizado para a disciplina Teoria Social Clssica, nvel mestrado, ministrada
pelo Prof. Ernesto Seidl, como requisito para a obteno de conceito.
Este artigo um esboo. No citar.
1 Semestre de 2014
Como um nacionalista convicto, nos primeiros meses de confronto Weber esteve arrebatado pelo
esprito patritico e pelo entusiasmo marcial (DIGGINS, 1999, p.221). Veja-se tambm a definio de
democracia que deu ao general Ludendorff, reduzindo-a ao sufrgio peridico de um lder ao qual o povo
se submete incondicionalmente aps eleito (SCHAPIRO, 1971, p.228)
2
A poltica de potncia ou poltica de poder a Machtpolitik dos autores alemes era deduzida da
teoria das relaes internacionais, enquanto doutrina da ao diplomtica. Como essas relaes escapam
ao mbito das leis, cada ator era responsvel pelo seu destino, mantendo a liberdade de usar a espada em
defesa dos prprios interesses. A Machtpolitik no implicava o imperialismo, a vontade de ampliar o
espao da soberania ou de sujeitar povos estrangeiros, mas o conceito soava nacionalista e se inspirava
numa filosofia pessimista: empenhados numa competio permanente, ora pacfica, ora violenta, os
Estados s conseguem sobreviver pela vontade de potncia, s prosperam com a afirmao orgulhosa da
sua independncia (ARON, 1985, pp.218-219).
Alm de ser uma personalidade antinmica e complexa, na sua eterna busca por
uma classe capaz de assumir politicamente o que ele via como as tarefas da nao num
perodo de grande tenso externa e dificuldades internas, Weber fez muitos adversrios
na arena poltica, embora fosse muito bem considerado e cortejado no meio acadmico.
Era um intelectual solitrio, cuja independncia de pensamento rendeu-lhe crticos de
todos os lados, para no dizer inimigos:
As opinies de Weber sobre a Alemanha no conseguiram larga audincia
por oporem-se ao reacionarismo junker, ao marxismo que cultivava a doena
infantil do esquerdismo (condenada por Lnin) de Kurt Eisner e ao marxismo
3
Weber um intelectual que tem conscincia de sua existncia como burgus (TRAGTENBERG,
1985, p.165), educado que fora nos seus ideais e sentimentos (idem, p.119). Mas no apenas por isso:
sabe-se que Weber adotava o ponto de vista da burguesia e do liberalismo no como uma fatalidade de
nascimento, mas conscientemente como uma opo poltica, ainda que sua prpria formulao desse
ponto de vista fosse sem dvida sui generis. Weber was not only a liberal, but an explicitly classconscious one (BEETHAM, 1985, p.8).
4
Objetivamente, a obra de Weber representa o ltimo combate da burguesia progressista na Alemanha, a
auto-conscincia de sua crise (TRAGTENBERG, 1985, p.152). Desta maneira, sua obra se articula na
realidade alem, da qual constitui o retrato sem retoque e sem concesso (idem, p.158). Assim se coloca
a posio de Weber, um burgus da Aufklaerung numa poca de crise da razo (ibdem, p.164).
Alm de introduo ao debate, todo este excurso serve para alertar o leitor ou
leitora quanto aos perigos de desconsiderar ingenuamente as complexas antinomias do
pensamento weberiano, ou de, ainda pior, buscar solues simples a fim de equacionlas. No que tange aos aspectos polticos de seu pensamento, a compreenso de tais
antinomias se que essa uma tarefa de consecuo plenamente possvel exige de
ns levarmos a srio o pressuposto metodolgico weberiano da distino entre cincia e
poltica como esferas distintas da ao humana (BEETHAM, 1985, p.30) o que no
significa, por suposto, isolar teoria e prtica, sociologia e poltica em Weber. Na
essncia do mundo weberiano h uma tenso irreconcilivel entre os valores e a
cincia (MAYER, 1985, p.85): enquanto a cincia s pode se pronunciar a respeito dos
meios, a poltica a busca dos fins, cuja escolha s pode ser feita com base em valores e
cuja validade no pode ser demonstrada racionalmente.5 Esse mesmo conflito de base
determina os fundamentos de sua sociologia poltica, ou seja, a ideia de que as formas
de Estado so puras tcnicas (idem).
Em razo disso, Weber dividia-se ambivalentemente entre essas duas vocaes
que ele considerava irreconciliveis:
Ao longo de sua vida, Weber foi alvo de dois impulsos conflitantes: para uma
vida passiva e disciplinada de estudioso e para uma vocao prtica e ativa de
poltico. No mbito intelectual, ele conseguiu estabelecer uma clara distino
entre ambas essas aspiraes conflitantes, reconhecendo uma dicotomia
absoluta entre a validao do conhecimento factual ou cientfico, de um
lado, e os juzos de valor ou normativos, de outro. Assim, se a atividade
do poltico poderia ser guiada ou modelada por conhecimento cientfico do
tipo que se estabelece na histria, economia e sociologia, esse conhecimento
no poderia validar, em ltima instncia, os objetivos pelos quais luta o lder
poltico. Essa posio teve como resultado o distanciamento de Weber dos
dois maiores movimentos polticos que competiam com os liberais na
Alemanha: os nacionalistas conservadores da direita e os socialdemocratas da
esquerda. Cada um deles, na viso de Weber, teria aderido a uma concepo
normativa da histria que eles teriam introduzido na poltica, reivindicando
validao histrica para o seu direito de governar. (GIDDENS, 1998,
pp.28-9)
Today it is clear that this splendid undertaking [His search for a value-free description of social
reality] could not fully succeed. Webers major sociological work was in no way free o value judgments.
It is thoroughly imbued with a universal-historical perspective anchored in Max Webers liberal viewpoint (MOMMSEN, 1984, pp.60-1).
de
Weber
em
relao
aos
ajustes
poltico-institucionais
que,
a questo nacional, como os velhos marxistas a chamavam, est situada na interseco da poltica, da
tecnologia e da transformao social. As naes existem no apenas como funes de um tipo particular
de Estado territorial ou da aspirao em assim se estabelecer [...], como tambm no contexto de um
estgio particular de desenvolvimento econmico e tecnolgico. [...] As naes e seus fenmenos
associados devem, portanto, ser analisados em termos das condies econmicas, administrativas,
tcnicas, polticas e outras exigncias (HOBSBAWM, 1990, p.19). Alm da crescente nacionalizao
da economia no sentido de grandes conglomerados de empreendimentos concentrados, mantidos,
protegidos e, at certo ponto, guiados pelos governos (idem, p.160), a democratizao da poltica ou
seja, de um lado a extenso crescente do voto (masculino) e de outro a criao de um Estado moderno
colocava a questo da nao e dos sentimentos do cidado em relao quilo que ele considerava como
sua nao, a sua nacionalidade ou outro centro de lealdade, no topo da agenda poltica (ibidem,
p.105).
Segundo Giddens (1998, p.31) essas transformaes haviam sido feitas no sem problemas: atraso e
autoritarismo constituram certas peculiaridades da posio alem que s poderiam ser resolvidas por um
Estado forte. Esse problema especfico do desenvolvimento poltico alemo era o mesmo do legado
de Bismarck, que teria levado a Alemanha a uma burocracia fortemente centralizada, sem que fosse
complementada por uma ordem institucional capaz de gerar uma liderana poltica independente, como
demandavam as tarefas da nao. (idem, p.48). Foi a existncia de um Estado burocrtico na
Alemanha e a direo especfica para a qual ele foi canalizado sob Bismarck que levara o pas s mos de
polticos sem vocao. (ibidem, p.50).
Especialmente quando ele sugere que essas ideias de Weber so consequncias do impacto de sua
concepo de cincia enquanto fator desencantador do mundo que leva ou ao pluralismo tico ou ao
niilismo sobre seu pensamento poltico (idem, p.115), e quando ele demonstra como a oscilao de
Weber entre o Estado-potncia como destino (junto com a guerra e o imperialismo) e o Estado como
esfera onde a nao escolhe o deus ao qual vai servir, articula-se com os dois polos da perspectiva poltica
weberiana: o nacionalismo e o liberalismo, respectivamente (ibidem, p.119).
considerao, Weber emerge de seu ensaio como um racista belicoso, fantico pela
crena num destino nacional mstico, a guisa de um nazista avant la lettre.10
Those who regard Webers nationalism simply as an extension of the
nationalism of this early period thus overlook two developments in his
thinking. One of these was his critique of Germanys prewar foreign policy,
the politics of national vanity, which made its contribution to the outbreak
of war. The other was his confrontation with the situation of national
minorities in his Russian studies of 1905-6, and with the problem of how to
preserve the cultural identity of smaller nations in face of the aggrandizement
of a larger power. (BEETHAM, 1985, p.142-3).
A partir de Boatca (2013), segundo a qual Weber sustentou ao longo de toda a vida uma perspectiva
nacionalista que o levou a defender polticas germanistas com base no em diferenas raciais e sim
culturais, pode-se avanar a hiptese que Weber no era um racista de tipo biologista/social-darwinista,
lugar-comum em sua poca, mas aproxima-se do racismo cultural-diferencialista contemporneo do tipo
observado por Taguieff (1997, pp.60-65): While Weber was an explicit and outspoken opponent of
biological racism, his concern with the power-political interests of the nation consistently led him to
check for economic and cultural threats to these national interests, such as immigrant workers and
religious Others, and to treat them as culturally separate, unassimilable (and as such undesirable) social
groups, thus using culturally racist arguments throughout. In the context of defining world power as the
power to determine the character of culture in the future during World War I, what Weber had described
in his Freiburg lecture as the standpoint of Germanism would be restated as the standpoint of those
cultural values that have been entrusted to a people and which is the duty of a Machtstaat to protect.
Insofar as Weber considered other countries to be Machtstaaten, great military states with a cultural
responsibility before history, this standpoint equally applied to them. Seeing, as he did, the problem of
the color line as paramount everywhere, was in this context an acknowledgment of the parallel threats that
Weber saw both Germany and the United States as facing not a plea for the social emancipation of
Blacks in the U.S., as formulated by W.E.B. Du Bois. Thus, it is precisely because the threat Weber
perceived in both cases did not come from a biologically distinct race, but from a lowering of cultural
standards, that he could dismiss as unfounded the one-drop rule for determining race membership and
condemn the anti-Black racism of the poor whites in the U.S. South, yet refer to black plantation workers
as lesser humans in the same breath (BOATCA, 2013, p.73-4).
10
Segundo ainda Mommsen (ibidem, p.43), a questo, para Weber, que, porquanto
a poltica implica tanto uma tica de convico quanto de responsabilidade, o poder s
se justifica enquanto meio de fazer valer determinados valores, os quais jamais
poderiam ser universais seno resultantes do conflito inerente vida social. na
interseco da "dichotomy between an ethic of responsibility and an ethic of
conscience donde emerge a distino entre Weber e Maquiavel (ibidem). Noutras
palavras, isso significa que o poder no pode ser um valor em si mesmo, mas um meio
para a consecuo de determinados valores cujo uso deve ser feito responsavelmente,
atentando-se para as consequncias. Essa dicotomia tica, que mais parece um dilema,
significa que se, por um lado, The seeking and holding of power were only justified in
defense of ultimate values (idem, p.45), por outro, no suficient to satisfy
momentary ethical ideals without attention to concrete results and consequences
(ibidem, p.43).
There is no trace in Webers work of the aesthetic glorification of great
power politics that we find repeatedly in Machiavellis writings. It was only
because politics was also a matter of belief, for Weber, because the choice
of goals that all political action should serve could only arise out of the belief
in ultimate values, that he was forced to face the conflict between the
political and ethical spheres of values. It was the conscientiously ethical
component of his theory of political power that led him to take such an
extreme stand on power politics. It is therefore no accident that in great
moments of political decision the politician of conviction always won out
over the sober Realpolitiker. The seeking and holding of power were only
justified in defense of ultimate values. The duty to use power if necessary to
implement these values was then inescapable. (ibidem, pp.45-6)
Argumenta ele (ibidem) que Weber realiza uma espcie de revisionismo na tradio
liberal qual pertence conscientemente a fim de equacionar essas questes. Ou seja, sua
preocupao era encontrar os meios de preservar os valores liberais neste novo mundo
cada vez mais preso a uma jaula de ferro. Enquanto liberal, todavia, Weber
coerentemente recusa o programa internacionalista dos socialdemocratas. Seu quadro de
referncia permanece sendo sempre a nao. Nesse sentido, o Parlamento, por exemplo,
s se justificaria, para Weber, luz das tarefas histricas a confrontar a nao alem
(ibidem, p.119).
Entretanto, Beetham (ibidem, p.14) se afasta de Mommsen (1984) ao afirmar que
o nacionalismo weberiano muito mais sutil do que acredita este estudioso. Essa
12
sutiliza, segundo Beetham (ibidem, p.128), est no fato de que ele estava comprometido
com a nao enquanto princpio em si, e no como um meio que justificaria a poltica
imperialista de um Estado-potncia, nem mesmo o Alemo: therefore his specifically
German nationalism found its limits at the point where it threatened the needs of other
nations and their cultures (ibidem). Em outras palavras, Beetham evita ancorar o
nacionalismo weberiano numa poltica necessariamente imperialista, como faz
Mommsen (1984). Para Weber, a questo seria menos a expanso do espao vital, o
fortalecimento da posio da Alemanha face s demais potncias ou a competio nos
mercados internacionais do que a promoo e preservao da Kultur, isto , a cultura ou
identidade nacional alem (BEETHAM, 1985, pp.130-1), o valor ao qual Weber estava
primariamente comprometido. Na base desse argumento reside a ideia de que nao e
Estado pertencem a esferas diferentes a primeira da cultura, e o segunda do poder
, e a relao entre elas d-se de forma mediada pelas caractersticas prprias de cada
uma (idem, pp.128-9). Beetham (ibidem, pp.132-3) defende que, ao menos em teoria,
Weber estava comprometido antes de tudo com a nao enquanto Kultur e no com o
Estado enquanto Macht (potncia).
Mais recentemente, Bellamy (1994) opem-se ainda mais frontalmente tese de
Mommsen (1984) ao afirmar que a defesa da nao e a poltica nacionalista em Weber
esto completamente subordinadas sua perspectiva liberal e a necessidade de preservla diante de um futuro nada promissor para o liberalismo. Bellamy (idem, p.499-500)
divide os escritos polticos weberianos em duas fases e aponta para rupturas e
continuidades entre elas. A ruptura dar-se-ia pelo progressivo abandono por parte do
socilogo alemo do imperialismo, e a continuidade pela persistncia na preocupao
com as tendncias do desenvolvimento capitalista e pela reiterao do liberalismo
enquanto valor:
The first phase relates primarily to the period 1892-7, during which
Weber advocated a policy of liberal imperialism. The second phase,
starting roughly in 1905, follows on from the dashing of his hopes for
the formation of a new party of bourgeois freedom on the basis of his
imperialist proposals. A reappraisal of the economic, social and
political consequences of national expansion, coupled with an
appreciation of the need for national diversity and competition for the
maintenance of liberal values, produced a more sophisticated and
pluralist theory. As a result, Weber came to be much more critical of
Germanys official aims during the First World War than the traditional
picture of him as a Machiavellian advocate of power politics would
lead one to expect. [..] despite the changing emphasis of Webers
theorization of nationalism between the 1890s and the First World War,
a fundamental continuity ran through his writings. This unity followed
from what Mommsen has termed his universal-historical standpoint.
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Diante desse quadro, Weber avana a questo do que deve ser feito para preservar
a nacionalidade alem no leste do pas (ibidem, p.66). Ou seja, a formulao da pergunta
j pressupe que a soluo deve ser tratada da "perspectiva do germanismo" (ibidem).
Weber prope duas diligncias polticas: fechamento da fronteira leste e compra
sistemtica de terras pelo Estado a fim de fomentar a colonizao alem nessas terras.
Acontece que a implementao dessas diligncias tem encontrado resistncia por ir
contra os interesses de classe da aristocracia fundiria, a base social do Segundo Reich
(ibidem). Da que Weber critique a poltica baseada em interesses de classe: em ltima
instncia, a poltica deve estra sempre baseada nos interesses da nao e no de uma de
suas classes. por isso tambm que ele v com maus olhos a continuidade do domnio
poltico dos Junkers: uma vez que se trata de uma classe em decadncia ela certamente
se valer do poder poltico para preservar seus prprios interesses a expensas dos
interesses nacionais, como de fato Weber observa no caso da questo polonesa. Weber
pressupe, portanto, que a poltica econmica nacional pode e deve ser distinguida da
poltica econmica de classe.
Neste ponto entra a sua crtica cincia econmica da poca, cuja concepo, para
Weber, era um dos fatores a entravar a soluo da questo polonesa. Dado o quadro
pessimista pintado por ele, cujo corolrio o acirramento da luta entre classes e naes,
Weber condena a postura eudemonista dos economistas (ibidem, p.67), irrealista em sua
opinio. Alm disso, metodologicamente, as doutrinas econmicas incorriam num
equvoco ao misturar juzos de valor tais como justia social anlise dos problemas
tcnico-econmicos da produo e distribuio de bens (ibidem, p.68). Por outro lado,
Weber no recusa todo juzo de valor no campo da cincia ao menos da cincia
econmica , mas deixa claro que existe somente um nico juzo possvel: a nao.
Assim, a poltica econmica de um Estado alemo, assim como o critrio de valor do
terico econmico alemo, somente podem ser alemes (ibidem).
Nesta fase inicial de seu desenvolvimento intelectual, Weber j entrev o
problema epistemolgico da distino entre fato e valor, e da relao com os valores no
campo da cincia. Mas se encontra longe ainda da soluo neokantiana encontrada em
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Perceba-se que o eixo em torno do qual gira toda a argumentao de Weber a nao: o
Estado incarna os interesses de poder nacional, enquanto a poltica a atividade que
defende e preserva esses interesses, e a economia poltica a cincia que auxilia a
poltica na consecuo dessa tarefa.
Weber passa ento a criticar outros pressupostos presentes na cincia econmica
da poca, sobretudo aquele que identifica na ascenso de determina classe, vitoriosa na
arena econmica, o sinal de superioridade evolutiva (ibidem, p.72). Em vista disso,
Weber afirma que nem sempre o poder econmico e a vocao para a direo poltica
da nao coincidem (ibidem). E como s a nao pode, para ele, oferecer um critrio
ltimo de valor poltico, a determinao do papel histrico de uma classe no leva em
considerao somente a dominncia econmica mas, sobretudo, a maturidade poltica,
entendida como a capacidade de antepor os interesses nacionais aos seus prprios
interesses de classe:
Em todas as pocas, atingir o poder econmico foi o que permitiu a uma
classe conceber-se como candidata ao poder poltico. perigoso e
incompatvel a longo prazo com o interesse nacional que uma classe
economicamente decadente mantenha em mos a dominao poltica. Mais
perigoso ainda, contudo, quando classes para as quais se movimenta o
poder econmico, e com isso a candidatura para a dominao poltica, ainda
no estejam politicamente maduras para a conduo do Estado. Ambos esses
perigosos ameaam atualmente a Alemanha [...]. (ibidem, p.73)
O perigo particular na Alemanha que nela a situao tal que tanto encontra-se
ao leme do Estado uma classe decadente, quanto inexiste uma classe com maturidade
poltica capaz de assumir o seu lugar. Aqui entra outro problema que ir constituir-se na
problemtica weberiana ao longo de sua vida: a questo da herana legada por
Bismarck. Sob a sua liderana, a aristocracia junker cumprira a sua funo histrica, isto
, unificar a nao. Mas com o desenvolvimento da indstria, o centro de gravidade
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poltica deslocou-se dos latifndios do leste para as cidades do oeste. Como nada pode
reverter esse processo (o que, de resto, tampouco seria desejvel), a pergunta que Weber
se coloca se estaria a burguesia em condies de assumir a tarefa que lhe foi outorgada
pela histria (ibidem, p.74). Weber responde negativamente, justamente por causa do
modo como se deu a unificao do pas, cujo Estado no foi criado pela fora da prpria
burguesia. A herana poltica deixada por Bismarck foi acostumar a burguesia a viver
sombra de um majestoso Csar e esperar passivamente pela sua graa (ibidem, p.75).
Restou burguesia, acredita Weber (ibidem), o papel de epgonos polticos, sem
mencionar aquela parcela que submergiu nas preocupaes mesquinhas do filisteu. Por
fim, quanto classe trabalhadora, Weber (ibidem, p.76) entende que ela se encontra
numa situao parecida da burguesia: embora economicamente madura, politicamente
lhe falta a energia catilinria da ao, tendo sua frente uma direo que no passa de
uma claque de jornalistas e lamentveis artesos polticos (ibidem).
Weber, portanto, no v necessariamente nocividade na participao poltica das
massas embora d a entender que somente uma elite surgida delas poderia
efetivamente governar. O ponto, para ele, sempre a necessidade imperiosa de unificar
a nao e realizar a contento as tarefas histricas colocadas a ela (ibidem, p.77). Nesse
sentido, qualquer classe poderia faz-lo, desde que cumpra com os requisitos definidos
por Weber embora, verdade, Weber, enquanto intelectual de origem burguesa, veja
nela a classe portadora dos interesses de poder nacionais (ibidem). Na base desse
raciocnio encontra-se a ideia de que no h um antagonismo absoluto de interesses
entre a burguesia e o proletariado, e de que, como j fizemos notar, as razes de Estado
e os interesses nacionais encontram-se acima dos conflitos de classe. Weber conclui sua
aula inaugural apelando para a tarefa mais imediata a ser cumprida: a educao poltica
das classes.
Resultada claro da nossa anlise que a argumentao weberiana gira sempre em
torno da ideia de nao enquanto portadora da germanidade, isto , das caractersticas
prprias que constituem o povo e a cultura alem (seu modo de ser) em uma raa
especfica, a qual Weber tem em alta conta. O Estado, a poltica, as classes, a cincia
econmica constituem, em relao a essa premissa central, as variveis dependentes. Os
problemas que as relaes entre elas apresentam so, por sua vez, vistos dentro de um
enquadramento terico e histrico pessimista, onde a luta de todos contra todos,
especialmente entre os Estado-naes, tornar-se- cada vez mais implacvel. Da que
Weber, comprometido com a preservao da germanidade, defenda polticas
19
Vale notar que Weber se refere nao, como uma unidade, e no a determinadas classes ou partidos
polticos, embora ele no deixe de considerar os interesses e as aes dos atores polticos em jogo.
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4. Consideraes finais
A anlise emprico-exegtica de O Estado nacional e a poltica econmica e de
Parlamento e governo numa Alemanha reconstruda sustenta a concluso de que o
valor supremo perfilhado por Weber a nao, em relao ao qual todos os demais
valores se orientam, bem como os tipos poltico-institucionais, entendidos como meras
tcnicas cujo critrio ltimo de utilidade decorre da nao. Embora um liberal
consciente e honesto, at mesmo seu liberalismo est subordinado ao que ele acreditava
constituir os interesses nacionais da Alemanha. De mais a mais, se por um lado do
interesse da nao que os valores liberais sejam preservados e consolidados, por outro,
tais valores s poderiam existir sobre bases nacionais. Antes de liberal, portanto, e
muito antes de imperialista, Weber era um nacionalista convicto. No entanto, deve-se
sempre ter em mente que nacionalismo e liberalismo no so perspectivas antagnicas
que se possa separar em seu pensamento. Weber concebia-as como duas faces de uma
mesma moeda, ou seja, ambas se determinam mutuamente, uma s fazendo sentido em
relao outra.
A anlise sugere tambm que, para Weber, uma poltica imperialista no tem
valor intrnseco, seja ele positivo ou negativo, mas subordinado aos interesses nacionais
e s circunstncias histricas e internacionais. Em Parlamento e governo no se
encontra o desbragado e intransigente imperialismo da aula inaugural, menos em razo
de escrpulos ou princpios do que de uma apreciao sbria das circunstncias
nacionais e internacionais colocadas a uma Alemanha derrotada pela guerra, ainda que
ele continue a crer que a luta entre Estados-naes um trao ineliminvel do mundo
moderno. Portanto, se descontinuidades podem ser apreendidas em relao aos dois
textos em questo notadamente a redefinio das prioridades de poltica externa e
24
Alm disso, essa centralidade da nao is further indicated by his instrumental way of
looking at imperialism as a means to national unity and harmony between the great
powers in Europe (ibidem).
De resto, alm do limitadssimo corpus bibliogrfico trabalhado aqui, cumpre
ressalvar que, embora os escritos polticos analisados possam ser assumidos como
representativos das duas fases do pensamento poltico weberiano, as concluses
deduzidas deles s podem ser provisoriamente avanadas e, portanto, devem ser
tomadas cum grano salis, j que a anlise de outros textos polticos, menos
conhecimentos porm nem por isso menos significativos, podem apontar em outras
direes ou matizar a direo apontada aqui. Deve-se acautelar tambm diante do fato
de que a anlise concentrou-se exclusivamente no pensamento poltico de Weber,
fazendo abstrao de seu pensamento terico, o que pode ter gerado uma distoro, ou
seja, deve-se considerar a possibilidade de que a anlise de textos tericos indique
concluses diferentes. Estudos futuros devero, portanto, incorporar, alm de mais
estudos acerco do pensamento poltico weberiano, outros escritos polticos de Max
Weber, bem como estabelecer as relaes entre eles e seu pensamento terico.
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