Revista Brasileira de História & Ciências Sociais – RBHCS
Vol. 11 Nº 22, Julho - Dezembro de 2019
Sistema de aluguel de escravos em obras públicas viárias do
Brasil Império: uma análise das listas nominais de
trabalhadores livres e escravos em Minas Gerais (1867-1873)
System of rental of slaves in road public works of Brazil Empire: an
analysis of the nominal lists of free and slave workers in Minas Gerais
(1867-1873)
Télio Cravo*
Resumo: Este estudo explora o sistema de aluguel de escravos e a participação de
dezenas de proprietários escravistas em obras públicas viárias a fim de contribuir
para o debate sobre a escravidão e a liberdade no Brasil. Para tanto, analisa as listas
nominais de trabalhadores livres e cativos em obras viárias da província de Minas
Gerais. Valendo-se dessas listas, fonte primária pouco explorada pela historiografia,
esta pesquisa analisa a ocupação e a condição social dos trabalhadores, bem como as
taxas de retorno brutas anuais obtidas pelos donos de escravos alugados nas décadas
de 1860 e 1870.
Palavras-chave: Trabalhadores; Sistema de Aluguel de Escravos; Infraestrutura
viária.
Abstract: This study explores the slave rental system and the participation of dozens
of slave owners in order to contribute to the debate on slavery and freedom in Brazil.
For this purpose, it analyzes the nominal lists of free and slave workers in public road
works in the Minas Gerais Province. Using these lists, this research analyzes the
occupation and social condition of the workers, as well as the annual gross return
rates obtained by the owners of slaves rented in the 1860s and 1870s.
Keywords: Workers; Slave Rental System; Road Infrastructure.
INTRODUÇÃO
Este artigo aborda a história de trabalhadores livres e escravizados
empregados em obras públicas viárias da província de Minas Gerais nas décadas de
1860 e 1870. A documentação que sustenta este estudo corresponde a vinte e três
Pós-Doutorando em História (Unifesp), Doutor em História (Unicamp), Mestre em História (Usp) e
Graduado em História (UFMG)
*
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listas nominais de trabalhadores, que permitiram explorar o sistema de aluguel de
escravos, ocupação e a divisão social do trabalho. Essas listas indicam o nome,
número de escravos e o nome do senhor de cada escravo, o que possibilitou reagrupar
os escravizados nos seus respectivos plantéis. Para tanto, este estudo analisa as listas
nominais de duas obras viárias: ponte sobre o rio Santa Bárbara (1867-1869)1 e
Estrada da Corte (1872-1873).2
Há uma longa tradição no debate historiográfico sobre o significado do sistema
de aluguel de escravos na dinâmica econômica e demográfica de cidades dos Estados
Unidos (WADE, 1964; GOLDIN, 1976) e do Brasil no século XIX (KARASCH, 2000;
REIS, 1993; SOARES, 1988; ANDRADE, 1988; CHALHOUB, 1990). Em que pese
controvérsias teóricas e diferenças de abordagens desses estudos, chama atenção a
busca pelo entendimento do escravo urbano a partir do mundo do trabalho e as
questões sobre a autonomia escrava, a liberdade e os mecanismos de controle e
coerção nos espaços públicos das cidades escravistas nas Américas, além de
destacarem a mobilidade social desses escravos (FRANK, 2004; MAC CORD, 2012).
Contudo, apesar dessas expressivas contribuições, há poucas menções sobre a
existência e o papel desempenhado pelo sistema de aluguel de escravos em obras
públicas viárias, sobretudo aquelas edificadas no interior do Brasil, afastadas dos
grandes centros urbanos litorâneos como Salvador, Recife e Rio de Janeiro, durante a
segunda metade do século XIX (CRAVO, 2016; CRAVO; GODOY, 2019).
É importante considerar que os estudos historiográficos têm sublinhado que a
defesa do tráfico negreiro e da escravidão foram políticas do Estado nacional
brasileiro no século XIX (ALENCASTRO, 1979; MAMIGONIAN, 2011; PARRON,
2011). Essas pesquisas apontam que as alianças políticas e sociais em prol da
estabilidade institucional da escravidão e a participação de órgãos do Estado nacional
em benefício dos proprietários escravistas criaram condições institucionais e políticas
necessárias à realização do tráfico ilegal de escravos (1831-1850) e a manutenção do
cativeiro até 1888 (CHALHOUB, 2015; MAMIGONIAN, 2017; PARRON, 2011).
Valendo-se desses debates historiográficos, este artigo indica que a estrutura
social e econômica assentada no trabalho escravo, embora ameaçada pela
possibilidade do término da escravidão, o impacto político da abolição americana
(1865) e pela pressão inglesa (MARQUESE, 2015; YOUSSEF, 2019), conseguiu
1
2
Integrava a estrada de Ouro Preto a Santa Bárbara.
Estrada da Corte, especificamente, o trecho de Juiz de Fora a Barbacena.
163
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sobreviver com o reconhecimento da legitimidade por parte do Estado da prática do
sistema do aluguel de escravos em obras públicas viárias em Minas Gerais. Mesmo
diante das tensões antiescravistas do século XIX (ELTIS, 1987; ENGERMAN, 2000) e
da proibição do tráfico transatlântico (1850), o Governo da Província de Minas Gerais
orientou a política de construção do sistema viário com o uso de trabalhadores
escravizados alugados.
Como bem lembra Dolhnikoff, no âmbito provincial, aperfeiçoar a
infraestrutura viária significava investimento com garantia de retorno, ao propiciar o
aumento do comércio e, por conseguinte, incremento das rendas públicas
(DOLHNIKOFF, 2005, p. 174-178). O arranjo político-institucional, promulgado pelo
Ato Adicional de 1834, garantia às províncias, através da criação de Assembleias
Provinciais, autonomia de decisões concernentes à tributação, orçamento (receita e
despesa), empregos e obras públicas (DOLHNIKOFF, 2003, p.117-118). Isso resultou
no direito das províncias de tratarem de suas estradas, pontes e da navegação, desde
que não pertencessem à administração geral do Estado (MORAES, 2010).
É reconhecido que a produção historiográfica sobre os transportes no Brasil do
século XIX volta-se principalmente para a construção das ferrovias (SAES, 1981;
SUMMERHILL, 2005) e dos seus respectivos trabalhadores (COSTA, 1976;
LAMOUNIER, 2012; SOUZA, 2015). Em relação dos trabalhadores, os estudos sobre
obras públicas e a construção férrea brasileira apontam a pouca frequência de
informações sobre os custos da mão de obra (SOUZA, 2015; MAC CORD, 2012, p.
302-303) e a dificuldade em rastrear a condição social dos trabalhadores e as
ocupações (LAMOUNIER, 2012, p. 152-153).
Levando em conta essas contribuições, esta pesquisa explora os registros
nominais
de
trabalhadores,
fonte
primária
praticamente
inexplorada
pela
historiografia, e dedica especial atenção ao sistema de aluguel de escravos em obras
públicas viárias, sem perder de vista os rendimentos apropriados pelos proprietários
escravistas (MELLO, 1992; MELLO; SLENES, 1980), bem como as perspectivas de
rentabilidade bruta obtida com o aluguel entre 1867 e 1873.
Em relação ao sistema de aluguel de escravos em Minas Gerais, a historiografia
indica que a prática de aluguel de escravos expandiu após a cessação do tráfico
negreiro por conta da alta dos preços dos cativos (LIBBY, 1988, p. 95). O brasilianista
Bergad aponta que há ausência de dados seriados sobre o aluguel de escravos em
Minas Gerais, assim como há carência de informações sobre os juros pagos pelos
164
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compradores de cativos, os custos de manutenção e os índices de mortalidade
(BERGAD, 2004, p. 288-292). Tais aspectos inviabilizam estimativas sobre o retorno
líquido com o aluguel de escravos (MELLO, 1992).
A análise sobre o sistema de aluguel de escravos ganha maior relevância
quando se constata que Minas Gerais, segundo o recenseamento de 1872, detinha, em
termos absolutos, a maior população escrava do Brasil com 378.126 escravos. Era
seguida pela província do Rio de Janeiro com 306.425 cativos, que somados com os
48.939 escravos da Corte, alcançava 355.364 e São Paulo com 156.612 escravos
(RODARTE, 2012, p. 89; PAIVA; GODOY; RODARTE, 2012, p. 77).
Além disso, é possível levantar a hipótese de que as listas nominais quando
identificam os trabalhadores como livres, certamente, se referem a muitos que eram
ex-escravizados. Assim, quanto à população livre de cor é necessário ressaltar que, em
termos comparativos com outras sociedades escravistas (Cuba e os Estados Unidos),
o Brasil abrigou a maior população livre de cor das Américas no século XIX (KLEIN;
LUNA, 2009, p. 489). Em 1872, o censo brasileiro, indicava que os indivíduos livres
de cor (todos de origem escrava) somavam 4,2 milhões de pessoas, diante de apenas
1,5 milhão de escravos (KLEIN; LUNA, 2009, p. 462). Segundo o recenseamento de
1872, Minas Gerais possuía 20,6% da população do Brasil. A população mineira
alcançava 2.083.545 indivíduos (1.705.419 livres e 378.126 escravos). Destes ditos
“livres” do Censo de 1872, 407.364 eram homens pardos e pretos e 397.911 mulheres
pardas e pretas. Portanto, 47,2% da população dita “livre” eram de pessoas livres de
cor, incluindo libertos como também gerações que já tinham se libertado
anteriormente. Pode-se supor, tendo Minas Gerais, em 1872, apresentado o maior
contingente populacional de pessoas livres de cor do Brasil, que a designação “livre”
nas listas nominais dos trabalhadores nas obras viárias “esconda” diversos homens
livres de cor.
AS LISTAS NOMINAIS DOS TRABALHADORES NAS OBRAS PÚBLICAS VIÁRIAS DE
MINAS GERAIS (1867-1873)
As listas nominais apresentam significativas informações qualitativas e
quantitativas sobre o mundo do trabalho: a) nome do trabalhador; b) ocupação; c)
remuneração diária; d) número de dias de trabalho; e) condição social dos
trabalhadores; f) nome do proprietário escravista; g) vencimento mensal. Elas foram
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redigidas com o objetivo de atestar o andamento das obras e os gastos com mão de
obra a cada mês.
Com base nas listas nominais, os resultados revelaram 1.075 registros de
trabalhadores, dos quais 317 na condição de escravizado, 758 como homens livres,
assim como a participação de trinta e cinco proprietários no sistema de aluguel de
escravos para as obras públicas viárias.
Ao todo foram analisadas vinte e três listas nominais: dezoito listas referentes
à Ponte de Santa Bárbara e cinco listas sobre as atividades construtivas da Estrada da
Corte.
A Estrada da Corte apresenta maior representatividade numérica: total de 803
registros (556 livres e 247 escravizados). Com menor número de registros, situa-se a
Ponte de Santa Bárbara: 202 trabalhadores livres e 70 escravos.
A participação de escravos alcançou 25,8% e 30,7%, respectivamente, na
construção da Ponte de Santa Bárbara e na Estrada da Corte. Somados os registros
das duas obras, os escravizados representam 29,5% do total de trabalhadores, o que
corresponde a 317 registros e os homens livres 758 registros, equivalente a 70,5% de
todos os trabalhadores.
Tabela 1 – Trabalhadores, segundo a condição social (1867-1873)
Condição Social
Obra
Ano
Livre
Total
Escravo
N
%
N
%
N
%
Ponte sobre o rio
Santa Bárbara
1867-1869
202
74,20
70
25,8
272
100
Estrada da Corte
1872-1873
556
69,24
247
30,76
803
100
758
70,5
317
29,50
1075
100
Total
Fonte: Arquivo Público Mineiro, APM, OP 3-6, Caixa 4, doc. 02; Caixa 49, doc. 18.
A Ponte de Santa Bárbara (1867-1869) apresentou uma média mensal de 11,2
homens livres e 3,8 escravos. A participação relativa de homens livres foi
predominante em todos os meses e nunca abaixo de 50% dos trabalhadores. Quanto
aos cativos, apenas em junho de 1869, o percentual ultrapassou 40% da força de
trabalho. Já a presença de trabalhadores escravos, nas demais listas mensais, oscilou
entre o mínimo de 13,6% e o máximo de 33,3% da força de trabalho.
166
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Gráfico 1
Fonte: Arquivo Público Mineiro, APM, OP 3-6, Caixa 49, doc. 18.
No caso da Estrada da Corte, que era considerada uma das mais importantes
da província, pois constituía o eixo central de ligação entre Ouro Preto e o Rio de
Janeiro (APM, OP 3/1, Caixa 1, doc. 14), entre novembro de 1872 e março de 1873, o
número médio de operários empregados, sem distinção de condição social, foi de
160,6 homens, sendo o mínimo de 110 trabalhadores em dezembro de 1872 e o
máximo de 188 operários em fevereiro de 1873.
Gráfico 2
Fonte: Arquivo Público Mineiro, APM, OP 3-6, Caixa 4, doc. 02.
As listas nominais da Estrada da Corte revelam que o número de trabalhadores
livres superou o de cativos em todos os meses. A composição relativa dos
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trabalhadores livres variou entre 59% e 72% da força de trabalho. A média mensal foi
de 111,2 homens livres e 49,4 para cativos.
Quanto ao número de escravizados, os dados apontam que há uma baixa
oscilação quantitativa ao longo dos meses: o mínimo de 45 e o máximo de 53
trabalhadores escravizados. A participação relativa dos cativos, em cada mês,
alternou de 29,2% a 40,9% da força de trabalho. Portanto, pode-se concluir que a
maior parte da força de trabalho foi constituída por homens livres durante a
construção da Estrada da Corte (1872-73).
ESTRUTURA OCUPACIONAL
Por meio dos registros nominais foi possível distinguir os oficiais mecânicos e
os trabalhadores braçais não-qualificados e relacioná-los com a condição social.
Constatou-se uma concentração dos escravizados alugados nas funções de
trabalhadores braçais não-qualificados (98,42%). O restante se dividiu entre artífices
em madeira (1,26%) e de pedra e cal (0,32%).3
Quanto aos trabalhadores livres, 84,9% dos registros estiveram circunscritos à
ocupação de trabalhadores braçais não-qualificados. Em seguida, prevaleceram os
artífices em madeira com 5,68% e os artífices de pedra e cal com 3,7% dos dados.
Para analisar as ocupações, elas foram agrupadas segundo a matéria-prima das atividades manuais e
mecânicas. Artífices em madeira: carpinteiro, contramestre carpinteiro, mestre carpinteiro, carapina,
serrador, ajudante de carpinteiro, aprendiz de carpinteiro, carvoeiro. Artífices em metais: mestre
ferreiro e ferreiro. Artífices em pedra e cal: pedreiro, mestre pedreiro, aprendiz de pedreiro, ajudante
de pedreiro. Artífices em metais e madeira: ferreiro e carpinteiro, exercício de dupla função em mesma
obra.
3
168
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Tabela 2 - Atividades manuais e mecânicas, segundo a condição social
Condição Social
Atividades Manuais e Mecânicas
Livre
Escravo
N
%
28
3,70
43
5,68
8
1,06
28
3,70
2
0,26
644
84,9
Função de Controle e Artífice em Metais e/ou Madeira
2
0,26
2
Outros (Cozinheiro e Arrieiro)
3
0,40
3
758
100
Funções de Coordenação ou Administrativas e de
Controle
Artífices em Madeira
Artífices em Metais
Artífices em Pedra e Cal
Artífices em Metais e Madeira
Trabalhadores Não-Qualificados (Braçais)
Total
N
Total
%
28
4
1,26
47
8
1
0,32
29
2
312
317
98,42
956
100
1075
Fonte: Arquivo Público Mineiro, APM, OP 3-6, Caixa 4, doc. 02; Caixa 49, doc. 18.
Os resultados apontaram para o percentual expressivo de livres e escravizados
na ocupação de trabalhadores braçais. Esse aspecto ajuda a explicar o motivo pelo
qual a mediana dos jornais pagos aos trabalhadores livres e escravos apresentou um
valor idêntico: 1$060 réis por dia, o que revela que havia uma associação entre o
valor do dia de trabalho e a ocupação desempenhada.
Tabela 3 – Média e mediana dos jornais, segundo a condição social (1867-1873)
Obra viária
Ano
Livre
Escravo
Jornal (réis)
Jornal (réis)
Média
Mediana
Média
Ponte sobre o
Rio Santa
1867-1869
1244
1060
1074
Bárbara
Estrada de Juiz
de Fora a
1872-1873
2328
2300
2254
Barbacena
Fonte: Arquivo Público Mineiro, APM, OP 3-6, Caixa 4, doc. 02; Caixa 49, doc. 18.
Mediana
1060
2300
Essas listas também quantificaram, individualmente, o número de dias
trabalhados, o valor da diária e o vencimento mensal.
No que tange ao número de dias trabalhados, os escravizados apresentaram
maior média do que os livres, sendo semelhante nas duas obras: 15,2 dias. Quanto
aos homens livres, a média foi de 12 dias de trabalho por mês.
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Tabela 4 - Média de dias trabalhados, segundo a condição social (1867-1873)
Livre
Obra viária
Ano
Nº Dias
Desvio
Média
Padrão
Escravo
Nº Dias
Média
Desvio Padrão
Ponte sobre o rio Santa
Bárbara
1867-1869
12,1
7,9
15,2
8,0
Estrada da Corte: Juiz de
12,9
6,6
15,2
8,75
1872-1873
Fora a Barbacena
Fonte: Arquivo Público Mineiro, APM, OP 3-6, Caixa 4, doc. 02; Caixa 49, doc. 18.
Os critérios adotados nesta pesquisa para fundamentar a interpretação dos
1.075 registros dos trabalhadores livres e escravizados evidenciaram cinco aspectos
específicos: 1) jornada de trabalho de 10 horas por dia; 2) concentração de jornaleiros
livres e escravizados nas tarefas braçais; 3) mediana dos jornais pagos aos livres e
escravizados semelhante; 4) a média do número de dias trabalhados por escravizados
foi igual nas duas obras; 5) a média de dias trabalhados por cativos foi superior a dos
homens livres.
A análise das listas nominais revelou a coexistência de livres e escravizados nas
atividades construtivas viárias. As narrativas sobre o fenômeno histórico de
constituição do mercado de trabalho no Brasil tendem a postular, como aspecto da
estrutura social, a existência de um universo do trabalho segmentado entre
escravizados e livres. Os resultados apresentados divergem dessa imagem. Havia um
constante “ombrear” de trabalhadores livres e escravizados.
PROPRIETÁRIOS DE ESCRAVOS E A DISTRIBUIÇÃO POR FAIXA DE CATIVOS
ALUGADOS
Com base nas listas nominais e o nome dos donos de escravos, foi possível
identificar o total de trinta e cinco proprietários escravistas: dez proprietários na
construção da Ponte de Santa Bárbara e vinte e cinco proprietários na Estrada da
Corte.
A análise nominal permitiu encontrar proprietários de cativos do sexo
feminino e masculino. Na construção da Ponte de Santa Bárbara as proprietárias do
sexo feminino perfizeram 20,0% dos donos de escravos, e na edificação da Estrada da
Corte alcançaram 12,0% do total.
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Um dado relevante na análise é que ao todo apenas cinco mulheres
participaram como locatárias de escravos, o que corresponde a 14,3%. Os dados
indicam, portanto, a proeminência de escravistas do sexo masculino nas obras
viárias.
Tabela 5 – Número e sexo dos proprietários de escravos alugados, segundo a obra viária (18671873)
Localidade
Ano
Sexo e o número de
proprietários
escravistas
Masculin
o
Total de
proprietários
Feminin
o
N
%
N
%
N
%
Nº de
Trabalhadore
s Escravos
Ponte sobre o rio
Santa Bárbara
1867-1869
8
80,0
2
20,0
10
100
70
Estrada da Corte
1872-1873
22
88,0
3
12,0
25
100
247
85,
5
14,3
35
100
7
Fonte: Arquivo Público Mineiro, APM, OP 3-6, Caixa 4, doc. 02; Caixa 49, doc. 18.
Total
30
317
Houve ainda uma preponderância de senhores com 1 ou 2 a 3 escravizados
alugados. A participação superou a 80,0% na construção da Estrada da Corte e
atingiu a marca de 100,0% na obra da Ponte de Santa Bárbara.
O peso dos proprietários de cativos alugados de mediano porte – indivíduos
com uma quantidade entre 11 e 20 cativos locados – variou, no que se refere aos
senhores, entre 13,3% em 1872-73 e a completa ausência em 1867-69.
Tais proprietários que alugaram na faixa de 21 a 49 cativos compareceram em
reduzido número. A participação desses senhores na massa escrava alugada não se
revelou de grande monta. Dessa forma, o seu peso entre os proprietários alcançou
4,4% da construção da Estrada da Corte.
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Tabela 6 - Distribuição relativa dos proprietários de escravos alugados (1867-1873)
Obra viária
Percentual médio mensal da distribuição dos
proprietários de escravos, segundo a faixa de escravos
alugados
7a
1
2a3
4a6
10
11 a 20 21 a 49
50+
Ponte sobre o Rio Santa Bárbara
(1867-1869)
50,0%
50,0%
Estrada da Corte (1872-1873)
55,6%
24,4%
2,2%
13,3%
4,4%
Fonte: Arquivo Público Mineiro, APM, OP 3-6, Caixa 4, doc. 02; Caixa 49, doc. 18.
A centralidade do mercado de aluguel de escravizados ganha relevância
quando se constata, segundo as listas nominativas da década de 1830, a ampla
difusão da posse de escravizados no território mineiro (PAIVA, 1996; RODARTE,
2012; MARTINS, 2015). Exatos 33,7% da população era constituída por escravizados.
Do total de 64.562 fogos arrolados nesta documentação, 21.355, isto é, 33,1%
possuíam escravizados. O percentual de domicílios com cativos coloca Minas Gerais
entre as maiores sociedades escravistas da América. Segundo Martins, nos Estados
Unidos, em 1860, somente 26% dos domicílios dos estados escravistas possuíam
cativos (Martins, 2015, p. 94-95). Além disso, as listas nominativas de 1830
demonstram que as grandes escravarias, mais de 100 escravizados, eram raras. Dos
21.355 domicílios com escravizados, apenas 31 (0,11%) detinham mais de 100 cativos;
0,7% possuíam de 51 a 100; 4,9% de 21 a 50 escravizados; 10,5% de 11 a 20 cativos;
17,8% de 6 a 10; 42% detinham de 2 a 5 escravizados e 23,9% dos fogos tinham
apenas 1 escravo. No território mineiro havia uma pulverização da propriedade
escrava (MARTINS, 2015, p. 94-95).
Os senhores que participaram das obras da Ponte de Santa Bárbara se
concentraram nas pequenas faixas de cativos alugados (1 ou 2 a 3 escravizados);
enquanto que os donos de escravos da Estrada da Corte se dividiram em cinco faixas
de escravos alugados. Entretanto, na construção da Estrada da Corte também se
verificou a concentração de proprietários que alugaram na faixa de 1 ou de 2 a 3
cativos (80%).
A análise da distribuição média mensal dos cativos, segundo a divisão por faixa
de escravizados alugados, revelou que 22,05% dos escravizados, durante a construção
da referida obra, se situavam entre 21 a 49 escravizados alugados e na faixa de 11 a 20
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escravizados alugados a distribuição mensal atingiu o percentual médio de 49,74%.
Isto é, 71,77% da distribuição média mensal dos escravizados se localizavam nas
faixas de aluguel de 11 a 49 de escravizados.
Tabela 7 - Distribuição relativa dos escravos alugados (1867-1873)
Obra viária
Percentual médio da distribuição mensal de
trabalhadores cativos, segundo a faixa de escravos
alugados
7a
10
1
2a3
4a6
11 a 20 21 a 49
50+
Ponte sobre o Rio Santa Bárbara
32,86% 67,14%
(1867-1869)
Estrada de Juiz de Fora a Barbacena
49,74% 22,05%
12,33% 13,33% 2,05%
(1872-1873)
Fonte: Arquivo Público Mineiro, APM, OP 3-6, Caixa 4, doc. 02; Caixa 49, doc. 18.
Os resultados obtidos com os indicadores quantitativos também permitem
estimar a taxa anual de retorno bruto e compará-la com as taxas obtidas em outros
setores da economia de Minas Gerais, que será analisada na próxima seção.
ESTIMATIVA E COMPARAÇÃO DO RENDIMENTO BRUTO ANUAL: O SISTEMA DE
ALUGUEL DE ESCRAVOS EM MINAS GERAIS (1867-1873)
Os dados de arquivos mais antigos sobre as taxas de aluguel de escravizados
em Minas Gerais foram encontrados nos livros de contabilidade da Real Extração
(1772-1832) (BERGAD, 2004). Como detentora do monopólio da exploração dos
diamantes, a Real Extração alugava escravos de proprietários locais. Segundo Bergad,
em 1772, ela pagava 200 réis por dia de trabalho por escravo e, em 1774, 150 réis.
Entre 1783 e 1809, a diária se manteve em 112,5 réis/dia. Os livros de contabilidade
da Real Extração apontam que cada escravizado trabalhava em média 249 dias por
ano.
Mediante essas informações, Bergad estima o retorno bruto dos aluguéis
anuais de escravos entre 1772 e 1809, tendo em vista o preço médio dos escravos do
sexo masculino na idade de 15 a 40 anos. Entre 1800 e 1809, a oscilação da taxa bruta
anual apresenta, em 1804, o mais alto retorno: 23,1%. E, em 1808, a menor taxa, o
retorno de 18,5% (Bergad, 2004, p. 288). Aplicando as mesmas premissas, Bergad
também se debruça sobre o sistema de aluguel de escravos braçais do setor
siderúrgico de Minas Gerais na década de 1840 e identifica que recebiam 0$400 réis
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por dia de aluguel. Ao projetar a jornada de 250 dias por ano, a taxa bruta de retorno
com aluguel alcança 19% ao ano (BERGAD, 2004, p. 292).
É reconhecido pela historiografia que, em Minas Gerais, as empresas de
mineração utilizaram o sistema de aluguel de escravos (CAMPBELL, 2015; LIBBY,
1984; 1988). Cabe destacar que em Minas Gerais, entre 1867 e 1873, seis companhias
mineradoras estavam em funcionamento: Saint John del Rey Mining Company, East
D’el Rey Mining Company, Don Pedro North del Rey Mining Company, Santa
Barbara Gold Mining Company, Anglo-Brazilian Gold Mining Company e a Roça
Grande Brazilian Gold Mining Company (Libby, 1988, p. 267). Dentre essas, a Saint
John Del Rey Mining, fundada em Londres, em 1830, com capital nominal de
135.000 libras, que alcançou, em 1872, o capital nominal de 253.000 libras, um dos
maiores investimentos dos britânicos nas Américas no século XIX (LIBBY, 1984),
teve maior destaque, pois a empresa operou por cinquenta anos com uma taxa média
de lucratividade de 18% ao ano (LIBBY, 1988, p. 309-310).
Os registros sobre a locação de escravos possibilitaram estimar o retorno bruto
anual com o aluguel de cativos pagos por três empresas: Saint John d’El Rey Mining,
Companhias D. Pedro North d’el Rey e Anglo Brasileira.
Libby indica que, de 1835 a 1838, a mineradora Saint John pagava pelo aluguel
de escravo, de sexo masculino, por um ano 90$000 réis, o que se traduzia numa taxa
de retorno bruta anual entre 19,7% e 20,8% (LIBBY, 1984, p. 95). Entre 1839 e 1842,
o valor aumentou para 100$000 réis, o que equivalia à oscilação da taxa bruta de
retorno entre 24,4% e 18,0% (Libby, 1984, p. 95-96). Em 1867, as empresas D. Pedro
North e Anglo Brasileira pagavam pelo aluguel anual de escravo homem 220$000
réis, o que em termos de retorno bruto anual correspondia a 22,0%.
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Tabela 8 - Estimativa da taxa de retorno bruto anual com o aluguel de escravos (1800-1867)
Ano
Rendimento anual
bruto por escravo
Preço Médio de Escravos - 15 a
40 anos – (em 1$000)
Taxa de Retorno Bruto
Anual (%)
1800
28$013
132$000
21,2
1801
28$013
126000
22,2
1802
28$013
131000
21,4
1803
28$013
129000
21,8
1804
28$013
121000
23,1
1805
28$013
140000
20,0
1806
28$013
136000
20,6
1807
28$013
137000
20,5
1808
28$013
152000
18,5
1809
28$013
138000
20,3
1835
90$000
456$000
19,7
1836
90$000
412$000
21,8
1837
90$000
437$000
20,6
1838
90$000
432$000
20,8
1839
100$000
370$000
24,3
1840
100$000
446$000
22,4
1841
100$000
472$000
21,2
1842
100$000
559$000
18,0
1867
220$000
998$000
22,0
Fonte: LIBBY, Douglas Cole. Trabalho Escravo e Capital Estrangeiro no Brasil. O Caso de Morro
Velho. Belo Horizonte: Ed. Itatiaia, 1984, p. 95; BERGAD, Laird W.. Escravidão e História
Econômica: demografia de Minas Gerais, 1720-1880. Bauru: Edusc, 2004, p. 286; 360-363.
Annuncio. Diário de Minas, 9 de fevereiro de 1867, p. 3.
Portanto, pode-se afirmar, levando em conta esses registros, que as
estimativas da taxa de retorno bruto anual com o aluguel de escravos no século XIX
oscilaram entre 18% e 24,3%.
Tomando por base, os procedimentos adotados por Bergad (2004), com o
intuito de comparar as estimativas das taxas brutas anuais do aluguel de escravos em
Minas Gerais, foram extraídos das listas nominais das construções de pontes e
estradas, os seguintes dados: i) mediana da diária paga pelo aluguel de escravos; ii)
média do número de dias trabalhados por mês pelos escravos. Em conjunto a esses,
foram agrupados o preço médio de cativos na idade de 15 a 40 anos. E, desse modo,
realizado o cálculo para a estimativa da taxa de retorno bruto anual.
Como resultado, o sistema de aluguel de escravos nas atividades construtivas
viárias, que, permaneceu em pleno funcionamento nas décadas de 1860 e 1870,
alcançou a maior taxa de retorno bruta em 1873: 38,3%. E, em 1868, a menor: 17,2%.
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Em termos comparativos, o retorno bruto anual do aluguel de cativos para a
construção de obras públicas viárias apresenta taxas em patamares próximos à
expectativa de retorno com o aluguel de escravos nas atividades de extração mineral
em Minas Gerais no século XIX.
Tabela 9 - Estimativa da taxa de retorno bruto anual do aluguel de escravos na construção viária
(1867-1873)
Estimativa do
Preço médio de
Taxa de
Mediana/Alugue
número de dias
escravos de 15 a 40
retorno bruto
Ano
l de Escravos
trabalhados por ano
anos
Anual
(*)
1867
1060
182,4
998$000
19,4
1868
1060
182,4
1:123$000
17,2
1869
1060
182,4
1:103$000
17,5
1872
2300
182,4
1:121$000
37,4
1873
2300
182,4
1:096$000
38,3
(*) Média de dias trabalhados por mês: 15,2 dias
Fonte: Arquivo Público Mineiro, APM, OP 3-6, Caixa 4, doc. 02; Caixa 49, doc. 18. Laird W. Bergad.
Escravidão e História Econômica: demografia de Minas Gerais, 1720-1880. Bauru: Edusc, 2004, p.
360-363.
Contudo, deve-se apontar que o retorno bruto anual obtido com o aluguel de
escravos na construção da Estrada da Corte, entre 1872 e 1873, ultrapassa o patamar
do padrão do sistema de aluguel nas atividades de extração mineral.
Pode-se também constatar que as taxas de retorno bruto anual da construção
da Estrada da Corte (1872-1873) são mais elevadas do que as taxas evidenciadas na
Ponte de Santa Bárbara (1867-1869). Uma hipótese possível para explicar a maior
taxa de retorno bruto encontrada na Estrada da Corte consiste no fato de que a obra
exigiu elevado investimento do Estado, pois a estrada era o mais importante eixo
viário do comércio interprovincial entre Minas Gerais e o Rio de Janeiro.
É relevante apontar que, entre 1867 e 1871, o silêncio em torno da questão da
escravidão pelo Estado brasileiro foi quebrado. Em 1867, dois episódios marcaram o
governo: a resposta dada a mensagem da Junta Francesa de Emancipação sobre a
abolição no Brasil e a Fala do Trono que indicava que, ante o envolvimento na Guerra
do Paraguai, após o término do conflito, o parlamento deveria dispor a resolver o
problema do elemento servil (CARVALHO, 1988, p. 299-300). O embate jurídico
sobre a legitimidade da propriedade privada e dos interesses do Estado, que primava
pela estabilidade política e econômica, passaram a intensificar o debate sobre a
emancipação (PENA, 2001, p. 253-262). Foram nessas décadas que as reflexões
jurídicas e políticas sobre o cativeiro tornaram a questão privada escravista como
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problema de Estado (PENA, 2001, p. 253-262). De um lado, os opositores da reforma
imediata da escravidão, contrários à interferência do Estado no mundo privado
senhorial (CUNHA, 1983), de outro, as propostas para controlar o universo privado
da escravidão por meio de leis e, ao mesmo tempo, manter a ordem econômica e
social (PENA, 2001, p. 272; MAMIGONIAN, 2011).
Em face dessa conjuntura, os resultados alcançados sugerem que as obras
públicas viárias despertaram interesse de proprietários escravistas, que detinham
distintos números de cativos em suas posses, mas que, possivelmente, em um período
de crescente discussão sobre o término da escravidão, procuraram, certamente,
minimizar eventual prejuízo patrimonial futuro e garantir alguma liquidez por meio
da locação de escravo para o Estado face às ameaças abolicionistas. Além disso,
alugar escravos para obras públicas liberava o senhor da obrigação de alimentá-los, já
que os jornais incluíam as refeições diárias. Tais aspectos, muito provavelmente,
orientaram as ações e estratégias dos proprietários de escravos. Essa análise sobre a
dinâmica do sistema de aluguel de escravos em obras públicas também pode
contribuir para a compreensão do tráfico interno interprovincial e intra-regional de
escravos que, a partir da extinção do tráfico negreiro em 1850, movimentou mais de
400.000 escravos no interior do território brasileiro (SLENES, 2004, p. 344-352;
MOTTA, 2012, p. 64-77).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao longo das últimas três décadas, as narrativas históricas abandonaram a
dedução da lógica do sistema escravista a partir de modelos interpretativos, que
pouco se utilizavam das fontes primárias dos arquivos brasileiros, e das teses da
irracionalidade econômica da escravidão no século XIX (CARDOSO, 1975;
GORENDER, 1978).
Utilizando-se de dados primários que enfatizam a atuação de senhores e
escravos e as regularidades de comportamentos que possuem a sua lógica na
experiência cotidiana dos atores sociais, as estimativas de retorno anual do sistema
de aluguel de escravos em obras públicas viárias revelaram taxas elevadas
considerando-se os padrões da época. Há evidências de que essas obras integraram a
vida de homens livres como também permitiram aos proprietários de escravos de se
apropriarem (total ou parcialmente) de somas de recursos investidos pelos cofres
provinciais nas construções de pontes e estradas através do sistema de aluguel de
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cativos. Esse mercado de aluguel em obras públicas viárias significava o aumento da
capacidade do escravista em reagir diante das mudanças conjunturais da economia e
da política. Além disso, ele também resolvia, em parte, o problema da inatividade do
escravo durante o ano.
É necessário realçar que, apesar da relevância do sistema de aluguel, os
trabalhadores livres foram presença maciça nas atividades construtivas, o que
ilumina a estrutura ocupacional e o valor pago por dia de trabalho. Esses dados, em
conjunto com outras fontes primárias qualitativas, podem contribuir para o debate
sobre a ideia de “transição” da escravidão ao trabalho livre, ultrapassando a noção de
linearidade implícita nessa proposição, para reconstituir as ambiguidades e
precariedades desse processo histórico marcado pelo término da escravidão. Tais
aspectos constituem traços de uma agenda futura de pesquisa.
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Recebido em Junho de 2019
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