Xavier Candido F Luz No Lar
Xavier Candido F Luz No Lar
Xavier Candido F Luz No Lar
NO LAR
FRANCISCO CÂNDIDO XAVIER
Ditados por
Espíritos Diversos
1
INDICE
LUZ NO LAR
2
ANTE-CÂMARA
Emmanuel
Emmanuel
(Uberaba, 18 de abril de 1968)
3
A INFÂNCIA
4
A LENDA DA CRIANÇA
Irmão X
5
Dito isso, o Senhor Supremo entrou nos Tabernáculos Eternos e voltou de lá
trazendo um ser pequenino nos braços paternais...
Nesse augusto momento, os atormentados filhos da Terra receberam de
Deus a primeira criança.
6
A MULHER ANTE O CRISTO
Emmanuel
Toda vez que nos dispomos a considerar a mulher em plano inferior, lembremo-
nos dela, ao tempo de Jesus.
Há vinte séculos, com exceção das patrícias do Império, quase todas as
companheiras do povo, na maioria das circunstâncias, sofriam extrema abjeção,
convertidas em alimárias de carga, quando não fossem vendidas em hasta pública.
Tocadas, porém, pelo verbo renovador do Divino Mestre, ninguém respondeu
com tanta lealdade e veemência aos apelos celestiais.
Entre as que haviam descido aos vales da perturbação e da sombra,
encontramos em Madalena o mais alto testemunho de soerguimento moral, das trevas
para a luz; e entre as que se mantinham no monte do equilíbrio doméstico,
surpreendemos em Joana de Cusa o mais nobre expoente de concurso e fidelidade.
Atraídas pelo amor puro, conduziam à presença do Senhor os aflitos e os
mutilados, os doentes e as crianças. E embora não lhe entregassem o círculo apostólico,
foram elas – as representadas nas filhas anônimas de Jerusalém - as únicas
demonstrações de solidariedade espontânea que o visitaram, desassombradamente, sob
a cruz do martírio, quando os próprios discípulos debandavam.
Mais tarde, junto aos continuadores, da Boa Nova, sustentavam-se no mesmo
nível de elevação e entendimento.
Dorcas, a costureira Jopense, depois de amparada por Simão Pedro, fez-se mais
ativa colaboradora da assistência aos infortunados. Febe é a mensageira da epístola de
Paulo de Tarso aos romanos. Lídia, em Filipos, é a primeira mulher com suficiente
coragem para transformar a própria casa em santuário do Evangelho nascituro. Lóide e
Eunice, parentas de Timóteo, eram padrões morais da fé viva.
Entretanto, ainda que semelhantes heroínas não tivessem de fato existido, não
podemos olvidar que, um dia, buscando alguém no mundo para exercer a necessária
tutela sobre a vida preciosa do embaixador divino, o supremo poder do universo não
hesitou em recorrer à abnegada mulher, escondida num lar apagado e simples...
Humilde, ocultava a experiência dos sábios; frágil como o lírio, trazia consigo a
resistência do diamante; pobre entre os pobres, carreava na própria virtude os tesouros
incorruptíveis do coração, e, desvalida entre os homens, era grande e prestigiosa perante
Deus.
Eis o motivo pelo qual, sempre que o raciocínio nos induza a ponderar quanto à
glória do Cristo - recordando, na terra, a grandeza de nossas próprias mães - nós nos
inclinaremos, reconhecidos e reverentes, ante a luz imarcescível da Estrela de Nazaré.
7
ABORTO DELITUOSO
Emmanuel
8
ÁLBUM MATERNO
Irmão X
... E nós respigamos alguns tópicos do álbum repleto de fotos, que descansava
na penteadeira de Dona Silvéria Lima, ao lermos enternecidamente a história do filho,
que ela própria escrevera.
1941 – Outubro, 16 – Meu filho nasceu, no dia 12. Sinto-me outra. Que alegria!
Como explicar o mistério da maternidade? Meu Deus, meu Deus!... Estou transformada,
jubilosa!...
Outubro, 18 – Meu filho recebeu o nome de Maurício. Aos seis dias de nascido,
parece um tesouro do Céu em meus braços!...
Outubro, 20 – Recomendei o Jorge trazer hoje um berço de vime, delicado e
maior. O menino é belo demais para dormir no leito de madeira que lhe arranjamos.
Coisa estranha!... Jorge, desde que se casou comigo, nada reclamou... Agora, admite
que exagero. Considerou que devemos pensar nas crianças menos felizes. Apontou casos
de meninos que dormem no esgoto, mas, que temos nós com meninos de esgoto?
Caridade!... Caridade é cada um assumir o desempenho das próprias obrigações. Meu
marido está ficando sovina. Isso é o que é...
1942 – Novembro, ll – Mauricinho adoeceu. Sinto-me enlouquecer... Já recorri a
seis médicos.
1943 – Dezembro, 15 – O pediatra aconselhou-me deixar a amamentação e
mandou que Mauricinho largue a chupeta. Repetiu instruções, anunciou, solene, que a
educação da criança deve começar tão cedo quanto possível. Essa é boa! Eu sou mãe de
Mauricinho e Mauricinho é meu filho. Que tem o médico de se intrometer? amamento
meu filho e dou-lhe a chupeta, enquanto ele a quiser.
1944 – Março, 13 – Mauricinho, intranqüilo, arranhou, de leve, o rosto da ama
com as unhas. Brincadeira de criança, bobagem. Jorge, porém, agastou-se comigo por
não repreendê-la. Tentou explicar-me a reencarnação. Assegurou que a criança é um
Espírito que já viveu em outras existências, quase sempre tomando novo corpo para se
redimir de culpas anteriores, e repisou que os pais são responsáveis pela orientação dos
filhos, diante de Deus, porque os filhos (palavras do coitado do Jorge) são companheiros
de vidas passadas que regressam até nós, aguardando corrigenda e renovação... Deu-me
vontade de rir na cara dele. Antes do casamento, Jorge já andava enrolado com
espíritas... Reencarnação!... Quem acredita nisso? Balela... Chega um momento de
nervosismo, a criança chora, e será justo espancá-la, simplesmente por essa razão?
1946 – Março, 15 – Jorge admoestou-me com austeridade. Parecia meu avô,
querendo puxar-me as orelhas. Declarou que não estou agindo bem. Acusou-me. Tratou-
me como se eu fosse irresponsável. Tem-se a impressão de que é inimigo do próprio
filho. Queixou-se de mim, alegou que estou deixando Maurício crescer como um pequeno
monstro (que palavra horrível!), tão só porque o menino, ontem, despejou querosene no
cão do vizinho e ateou fogo... Era um cachorro intratável e imundo. Certamente que não
estou satisfeita por haver Maurício procedido assim, mas sou mãe... Meu filho é um anjo
e não fez isso conscientemente. Talvez julgasse que o fogo conseguisse acabar com a
sujeira do cão.
1948 – Abril,9 – Crises de Maurício. Quebrou vidraças e pratos, esperneou na
birra e atirou um copo de vidro nos olhos da cozinheira, que ficou levemente machucada,
seguindo para o hospital... Jorge queria castigar o menino. Não deixei. Discutimos.
Chorei muito. Estou muito infeliz.
1950 – Setembro, 5 – A professora de Maurício veio lastimar-se. Moça
neurastênica. Inventou faltas e mais faltas para incriminar o pobre garoto. Informou que
não pode mantê-lo, por mais tempo, junto dos alunos. Mulher atrevida! Pintou meu filho
como se fosse o diabo. Ensinei a ela que a porta da rua é serventia da casa. Deixa estar!
Ela também será mãe... Que bata nos filhos dela!...
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1952 – Maio, 16 – Maurício já foi expulso de três colégios. Perseguido pela má
sorte o meu inocentinho!... Jorge afirma-se cansado, desiludido... Já falou até mesmo
num internato de correrão. Meu Deus, será que meu filho sòmente encontre amor e
refúgio comigo? Tão meigo, tão bom!... Prefiro desquitar-me a permitir que Jorge
execute qualquer idéia de punição que, aliás, não consigo compreender... Meu filho será
um homem sem complexos, independente, sem restrições... Quero Maurício feliz, feliz!...
1%6 – Meu marido quer empregar nosso filho numa casa de móveis. Loucura!...
Acredita que Mauricinho precisa trabalhar sob disciplina. Que plano!... Meu filho com
patrão... Era o que faltava!... Temos o suficiente para garantir-lhe sossego e liberdade.
1957 – Janeiro, 14 – Jorge está doente. O médico pediu para que lhe evitemos
dissabores ou choques. Participou-me, discreto, que meu marido tem o coração fatigado,
hipertensão. Desde o ano passado, Jorge tem estado triste, acabrunhado com as calúnias
que começam a aparecer contra o nosso filhinho. Amigos-ursos fantasiaram que
Maurício, em vez de freqüentar o colégio, vive nas ruas, com vagabundos. Chegaram ao
desplante de asseverar que meu filho foi visto furtando e, ainda mais... Falaram que ele
usa maconha em casas suspeitas. Pobre filho meu!... Sendo filho único, Maurício
necessita de ambiente para estudar, e se vem, alta madrugada, para dormir, é porque
precisa do auxilio dos colegas, nas várias residências em que se reúnem com os livros.
1958 – Outubro, 6 – Jorge ficou irado, porque exigi dele a compra de um carro
para Maurício, como presente de aniversário. Brigou, xingou, mas cedeu...
1959 – Junho, 15 – Estou desesperada. Jorge foi sepultado ontem. Morreu
apaixonado, diante da violência da delegado policial que intimou Mauricinho a provar que
não estava vendendo maconha. Amanhã, enviarei um advogado ao Distrito. Se preciso,
processarei o chefe truculento... Ninguém arruinará o nome de meu filho, que é um
santo... Oh! meu Deus, como sofrem as mães!...
1960 – Agosto, 2 – Duas mulheres me procuraram, com a intenção de arrancar-
me dinheiro. Disseram que meu filho lhes arrepiou jóias. Velhacas e mandrionas.
Maurício jamais desceria a semelhante baixeza. Dou-lhe mesada farta. Expulsei as
chantagistas e, se voltarem, conhecerão as necessárias providências.
1961 – Fevereiro, 22 – Nunca pensei que o nosso velho amigo Noel chegasse a
isso!... Culpar meu filho! Sempre a mesma arenga... Maurício na maconha. Maurício no
furto! Agora é um dos mais antigos companheiros de meu esposo que vem denunciar
meu filho como incurso num suposto crime de estelionato, comunicando-me, numa farsa
bem tramada, que Maurício lhe falsificou a letra num cheque, roubando-lhe trezentos
contos... Tudo perseguição e mentira. Já ouvi dizer que Noel anda caduco. Usurário
caminhando para o hospício. Essa é que é a verdade... Sou mãe!... Não permitirei que
meu filho sofra; nunca admiti que alguém levantasse a voz contra ele... Maurício nasceu
livre, é livre, faz o que entende e não é escravo de ninguém. Estou revoltada,
revoltada!...
Nesse ponto, terminavam as confidências de Dona Silvéria, cujo corpo estava
ali, inerte e ensangüentado, diante de nós, os amigos desencarnados, que fôramos
chamados a prestar-lhe assistência. Acabara de ser assassinada pelo próprio filho,
obsidiado e sequioso de herança.
Enquanto selecionávamos as últimas notas do álbum singular, Maurício, em
saleta contígua, telefonava para a Polícia, depois de haver armada hàbilmente a tese do
suicídio.
10
ANGUSTIA MATERNA
Sebastiana Pires
11
Quando nosso rapaz completou dezesseis anos, o pai amoroso e correto
providenciou-lhe tarefa digna, mas, findo o terceiro dia de trabalho, Pedro chegou em
casa choramingando, a queixar-se do chefe, e eu, em minha imprudência, lhe aceitei as
lamentações e exigi que Claudino lhe dobrasse a mesada, retirando-o do emprego em
que , a meu ver, apenas encontraria pesares e humilhações.
O esposo me fez ver a impropriedade de semelhante procedimento; no entanto,
amava-me demais para contrariar-me os caprichos e, a breve tempo, nosso filho
entregou-se a deploráveis dissipações.
Aquele para quem idealizara um futuro de rei, chegava ao lar em horas
avançadas da noite, cambaleando de embriaguez..
O olhar piedoso de Claudino para as minhas lágrimas dava-me a entender que
as minhas preocupações surgiam demasiado tarde.
Todos os meus cuidados foram então inúteis.
Gastador e viciado, Pedro confiou-se a bebida, à jogatina, comprometendo-se
num estelionato de graves proporções, em que o nome paterno se envolveu numa divida
muito superior as possibilidades de nossa casa.
Claudino, desditoso e envergonhado, adoeceu, sem que os médicos lhe
identificassem a enfermidade, falecendo após longos meses de martírio silencioso.
Morto aquele que me fora companheiro devotadíssimo, vendi nossa residência
para solver grandes débitos.
Recolhi-me com Pedro num domicilio modesto; entretanto, embora me
empregasse, aos cinqüenta anos, para atender-lhe as necessidades, comecei a sofrer,
das mãos de meu filho ébrio, dilacerações e espancamentos.
Certa noite, não pude conter-lhe os criminosos impulsos e caí golfando sangue...
Internada num hospital de emergência, senti medo de partilhar o mesmo teto
com o homem que meu ventre gerara com desvelado carinho e que se me transformara
em desapiedado verdugo.
Fugi-lhe, assim, ao convívio.
Procurei velha companheira da mocidade, passando a morar com ela num bairro
pobre.
E, juntas, organizamos pequeno bazar de quinquilharias.
Pensava em meu filho, agora, entre a saudade e a oração, entregando-o a
proteção da Virgem Santíssima.
Finda a tarefa diária, recolhia-me à sos em singelo aposento, trazendo em
minhas mãos o retrato de Pedro e rogando ao anjo dos Desvalidos amparasse aquele
cuja posição moral eu apenas soubera agravar com desleixo delituoso.
Amealhei algum dinheiro...
Dez anos correram apressados sobre a minha nova situação.
E porque as nossas migalhas viviam entesouradas em meu quarto de velha
indefesa, cada noite me armava de um revolver sob o travesseiro, ao mesmo tempo que
desbotada fotografia era acariciada por minhas mãos.
Numa noite chuvosa e escura, observei que um homem me rondava o leito
humilde.
Alteava-se a madrugada.
O desconhecido vasculhava gavetas procurando algo que lhe pudesse,
naturalmente, atender a viciação.
Não hesitei um momento.
Saquei da arma e buscava a mira correta para que o tiro fosse desfechado com
segurança, quando a luz de um relâmpago penetrou a vidraça...
Apavorada, reconheci, no semblante do homem que me invadia a casa, meu
filho Pedro, convertido em ladrão.
Esmoreceram-se-me os braços.
Quis gritar, mas não pude.
12
A comoção insofreável como que me estrangulava a garganta.
Contudo, através do mesmo clarão, Pedro me vira armada e bradou, sem
reconhecer-me de pronto:
- Não me mates, megera! Não me mates!
Avançou sobre mim como fera sobre a presa vencida e, despojando-me do
revolver a pender-me das mãos desfalecentes, sufocou-me com os dedos que eu tantas
vezes tinha acariciado, e que me asfixiavam, agora, como garras assassinas...
Não consegui, realmente, pronunciar uma só palavra.
No entanto, ligada ainda ao meu corpo, meus olhos e meus ouvidos
funcionavam eficientes.
Registrei-lhe o salto rápido sobre o acendedor de luz...
Naturalmente, ele agora contava simplesmente com um cadáver.
Contemplei-o com a ternura de mulher que ainda ama, apesar de sentir-se em
derrocada suprema, e notei que Pedro se inclinou, instintivamente, para minha mão
esquerda, crispada, a guardar-lhe a fotografia.
Horrorizado, exclamou:
- Mãe, minha mãe! Pois és tu?
Para falar com franqueza, daria tudo para volver ao equilíbrio orgânico,
acariciar-lhe de novo os cabelos e dizer-lhe: - "Filho querido, não se preocupe!
Regenere-se e sejamos felizes voltando a viver juntos! Estou velha e cansada... Fique
comigo! Fique comigo!..."
Entretanto, minha língua jazia inanimada e minhas mãos estavam hirtas.
Lagrimas ardentes borbotavam-me dos olhos parados, enquanto a voz querida
me gritava estridente:
- Mamãe! Mamãe! Minha mãe!...
Um sono profundo, pouco a pouco, se apoderou de mim e somente mais tarde
acordei numa casa de socorro espiritual, onde pude reconstituir minhas forças para
empreender a restauração de minha alma diante da Lei.
No entanto, até agora, busco meu filho para rogarmos juntos a benção da
reencarnação em que eu possa extirpar-lhe do sentimento a hera maldita do orgulho e
do egoísmo, da viciação e da crueldade.
E enquanto sofro as conseqüências de meus erros deliberados, posso clamar
para as minhas companheiras do mundo:
- Mães da Terra, educai vossos filhos!
Afagai-os no carinho e na retidão, na justiça e no bem.
Uma criança no berço é um diamante do Céu para ser burilado.
Lembrai-vos de que o próprio Deus, em conduzindo a terra o seu Filho Divino,
Nosso Senhor Jesus-Cristo, fê-lo nascer numa estrebaria, deu-lhe trabalho numa oficina
singela, induziu-o a viver em serviço dos semelhantes e permitiu que Ele, o Justo, fosse
imerecidamente imolado aos tormentos da cruz.
13
ANTE O DIVÓRCIO
Emmanuel
14
CARTA A MEU FILHO
J.
Meu filho, dito esta carta para que você saiba que estou vivo.
Quando você me estendeu a taça envenenada que me liquidou a existência, não
pensávamos nisso.
Nem você, nem eu.
A idéia da morte vagueava longe de mim, porque esperava de suas mãos
apenas o remédio anestesiante para a minha enxaqueca.
Entendi tudo, porém, quando você, transtornado, cerrou subitamente a porta e
exclamou com frieza:
-Morre, velho!
As convulsões que me tomavam de improviso, traumatizavam-me a cabeça...
Era como se afiada navalha me cortasse as vísceras num braseiro de dor. Pude
ainda, no entanto, reunir minhas forças em suprema ansiedade e contemplar você,
diante de meus olhos.
Suas palavras ressoavam-me aos ouvidos: __ “morre, velho!”
Era tudo o que você, alterado e irreconhecível, tinha agora a dizer.
Entretanto, o amor em minh’alma era o mesmo.
Tornei à noite recuada quando o afaguei pela primeira vez.
Sua mãezinha dormia, extenuada...
Pequenino e tenro de encontro ao meu peito, senti em você meu próprio
coração a vagir nos braços...
E as recordações desfilaram, sucessivas.
Você, qual passarinho contente a abrigar-se em meu colo, o álbum de
fotografias em que sua imagem apresentava desenvolvimento gradativo em todas as
posições, as festas de aniversário e os bolos coloridos enfeitados de velas que seus lábios
miúdos apagavam sempre numa explosão de alegria... Rememorei nossa velha casa, a
princípio humilde e pobre, que o meu suor convertera em larga habitação, rica e farta...
Agoniado, recordei incidentes, desde muito esquecidos, nos quais me observava
expulsando crianças ternas e maltrapilhas do grande jardim de inverno para que nosso
lar fosse apenas seu... Reencontrei-me, trabalhando, qual suarento animal, para que as
facilidades do mundo nos atendessem as ilusões e os caprichos...
Em todos os quadros a se me reavivarem na lembrança, era você o grande
soberano de nosso pequeno mundo...
O passado continuou a desdobrar-se, dentro de mim. Revisei nossa luta para
que os livros lhe modificassem a mente, o baldado esforço para que a mocidade se lhe
erigisse em alicerce nobre ao futuro... De volta às antigas preocupações que me
assaltavam, anotei-lhe, de novo, as extravagâncias contínuas, os aperitivos, os bailes, os
prazeres, as companhias desaconselháveis, a rebeldia constante e o carro de luxo com
que o presenteei num momento infeliz...
Filho do meu coração, tudo isso revi...
Dera-lhe todo o dinheiro que conseguira ajuntar, mas você desejava o resto.
Nas vascas da morte, vi-o, ainda, mãos ansiosas, arrebatando-me o chaveiro
para surripiar as últimas jóias de sua mãe...Vi perfeitamente quando você empalmou o
dinheiro, que se mantinha fora de nossa conta bancária, e, porque não podia odiá-lo, orei
– talvez com fervor e sinceridade pela primeira vez – rogando a Deus nos abençoasse e
compreendendo, tardiamente, que a verdadeira felicidade de nossos filhos reside, antes
de tudo, no trabalho e na educação com que lhes venhamos a honrar a vida.
Não dito esta carta para acusá-lo.
Nem de leve me passou pelo pensamento o propósito de anunciar-lhe o nome.
15
Você continua sangue de meu sangue, coração de meu coração.
Muitas vezes, ouvi dizer que há filhos criminosos, mas entendo hoje que, na
maioria das circunstâncias, há, junto deles, pais delinqüentes por acreditarem muito mais
na força do cofre que na riqueza do espírito, afogando-os, desde cedo, na sombra da
preguiça e no vício da ingratidão.
Não venho falar, assim, unicamente a você, porque seu erro é o meu erro
igualmente. Falo também a outros pais, companheiros meus de esperança, para que se
precatem contra o demônio do ouro desnecessário, porque todo ouro desnecessário,
quando não busca o conselho da caridade, é tentação à loucura.
Há quem diga que somente as mães sabem amar e, realmente, o regaço
materno é uma bênção do paraíso. Entretanto, meu filho, os pais também amam e, por
amar imensamente a você, dirijo-lhe a presente mensagem, afirmando-lhe estar em
prece para que a nossa falta encontre socorro e tolerância nos tribunais da Divina
Justiça, aos quais rogo me concedam, algum dia, a felicidade de tê-lo novamente ao meu
lado, por retrato vivo de meu carinho... Então nós dois juntos, de passo acertado no
trabalho e no bem, aprenderemos, enfim, como servir ao mundo, servindo a Deus.
16
CARTA AOS PAIS
Casimiro Cunha
17
Pode encontrar a miséria
No fim da ociosidade.
Na pobreza ou na fortuna,
Esforça-te meu amigo.
Exemplifica o trabalho
E Deus estará contigo.
18
CARTA PATERNA
Neio Lúcio
19
COLOMBINA
Júlia Cortines Laxe
20
COMPAIXÃO EM FAMÍLIA
Emmanuel
"Mas se alguém não tem cuidado dos seus e, principalmente dos da sua família, negou a
fé...”.
Paulo. {I Timóteo, 5:8.}
21
COMPANHEIROS MUDOS
Emmanuel
22
CONFIDÊNCIA DE MAE
Andradina de Oliveira
23
CONFISSÃO MATERNA
Dulce
24
Nisso, porém, meu filhinho empalideceu e desmaiou... Retirei o sapato e vi que
um escorpião, escondido no fundo, lhe descarregara todo o veneno...
Ó Deus de Infinita Bondade, tu que foste imensamente piedoso para confiar um
anjo a uma leoa, porque não eliminaste a leoa para que o anjo conseguisse viver?!...
O que se passou, alcança o indescritível.
Apesar de toda a medicação, em breve tempo minha ternura, que a dor
desentranhara ao rebentar-me a coração de pedra, apertava simplesmente um cadáver
miudo, de encontro ao peito...
As horas no relógio continuaram as mesmas ; entretanto, de minha parte, não
mais me reconheci.
“Ai! ai, mãezinha!... um espinho, um espinho!...” Aquelas palavras gemidas
cresceram em minha alma. Jamais o equilíbrio, não mais a esperança. Minha cabeça
encaneceu, meu pensamento destrambelhou... Chorei até que meus olhos parassem,
alucinados, na noite da loucura; acusei-me, até que o manicômio me asilasse e até que o
manicômio me escondesse, piedoso, o agoniado transe da morte!...
Desencarnada, encontrei a mim própria, dementada, atormentada, arrependida,
padecente...
Amparada por benditos mensageiros da caridade, tenho recolhido o consolo de
vários círculos consagrados à prece.
Dizem que os supostos mortos devem falar às criaturas em aprendizado na
Terra, para que as criaturas da Terra lhes aproveitem o aprendizado.
Será talvez por isso que, hoje, algo reanimada para abraçar o trabalho
reeducativo que me espera, estou sustentada por benfeitores, entre os vossos ouvidos,
não sòmente para rogar-vos um pensamento de auxilio, mas também para repetir às
irmãs, a quem Deus confiou as alegrias do lar:
– Mães que pisais no mundo, compadecei-vos de vossos filhos!... Corrigi,
amando! Ensinai, servindo! À frente de qualquer dificuldade, conservai a paciência e
cultivai a oração!...
25
CONSELHO MATERNO
João de Deus
Ouve, filhinho,
Pelo caminho
Encontrarás
Muita criança
Sem esperança,
Sem luz, sem paz...
Aves pequenas,
Guardam apenas
O pranto e a dor,
Rolando ao vento
Do sofrimento
Esmagador
Passam a sós,
Erguendo a voz,
Pedindo pão...
Passam em bando,
Dilacerando
O coração.
Ante a tristeza
Dessa aspereza,
Desse amargor,
Filhinho amigo,
Dá-lhes abrigo,
Dá-lhes amor...
És irmãozinho
Do pobrezinho
Que aflito vai...
Nos mesmos trilhos
Nós somos filhos
Do mesmo Pai.
26
CONVERSA EM CASA
Casimiro Cunha
O suor da paciência
Encontra a luz por remate,
Não há provocação difícil,
O medo é que nos abate.
27
CORAÇÃO MATERNAL
Meimei
Mãe, que te recolhes no lar, atendendo à Divina Vontade, não fujas a renuncia
que o mundo te reclama ao coração.
Recebeste no templo familiar o sublime mandato da vida.
Muitas vezes, ergueste cada manhã, com o suor do trabalho, e confiaste à noite,
lendo a página branca das lagrimas que te emanam da lama ferida.
Quase sempre, a tua voz passa desprezada, com vazio rumor o alarido das
discussões domestica, e as tuas mãos diligentes servem com sacrifício, sem que ninguém
lhes assinale o cansaço...
Lá fora, os homens guerreiam, entre si, disputando a posse efêmera do ouro ou
da fama, da evidencia ou da autoridade...Além, a mocidade , em muitas ocasiões,grita
festivamente, buscando o mentiroso prazer do momento rápido...
Enquanto isso, medita e esperas, na solidão da prece,com que te elevas ao Alto,
rogando a felicidade daqueles de quem te fizeste o gênio guardião.
Quando o santo sobe às eminências do altar, ninguém te vê nas amarguras da
base, e quando o herói passa, na rua, coroado de louros, ninguém se lembra de ti, na
retaguarda de aflição.
Deste tudo e tudo ofereceste, entretanto, raros se recordam de que teus olhos
jazem nevoados de pranto e de que padeces angustiosa fome de compreensão e carinho.
No entanto, continuas amando e ajudando, perdoando e servindo...
Se a ingratidão te relega à sombra na Terra, o Criador de tua milagrosa
abnegação vela por ti dos Céus, através do olhar cintilante de milhões de estrelas.
Lembra-te de que Deus a fonte de todo o amor e de toda a sabedoria, é
também o Grande Anônimo e o Grande Esquecido entre as criaturas.
Tudo passa no mundo...
Ajuda e espera sempre.
Dia virá em que o Senhor, convertendo os braços da cruz de teus padecimentos
em grandes asas de luz, transformará tua alma em astro divino e iluminar para sempre a
rota daqueles que te propuseste socorrer.
28
CREDORES NO LAR
Emmanuel
No devotamento dos pais, todos os filhos são jóias de luz; entretanto, para que
compreendas certos antagonismos que te afligem no lar, é preciso saibas que, entre os
filhos-companheiros que te apóiam a alma, surgem os filhos-credores, alcançando-te a
vida, por instrutores de feição diferente.
Subtraindo-te aos choques de caráter negativo, no reencontro, preceitua a
eterna bondade da Justiça Divina que a reencarnação funcione, reconduzindo-os à tua
presença, através do berço. É por isso que, a princípio, não ombreiam contigo, em casa,
como de igual para igual, porquanto reaparecem humildes e pequeninos.
Chegam frágeis e emudecidos, para que lhes ensines a palavra de
apaziguamento e brandura.
Não te rogam a liquidação de débitos, na intimidade do gabinete, e, sim,
procuram-te o colo para nova fase de entendimento.
Respiram-te o hálito e escoram-se em tuas mãos, instalando-se em teus passos,
para a transfiguração do próprio destino.
Embora desarmados, controlam-te os sentimentos.
Não obstante dependerem de ti, alteram-te as decisões com simples olhar.
De doces numes do carinho, passam, com o tempo, à condição de examinadores
constantes de tua estrada.
Governam-te os impulsos, fiscalizam-te os gestos, observam-te as companhias
e exigem-te as horas.
Reaprendem na escola do mundo com o teu amparo; todavia, à medida que se
desenvolvem no conhecimento superior, transformam-se em inspetores intransigentes do
teu grau de instrução.
Muitas vezes choras e sofres, tentando adivinhar-lhes os pensamentos para que
te percebam os testemunhos de amor.
Calas os próprios sonhos, para que os sonhos deles se realizem.
Apagas-te, a pouco e pouco, para que julguem em teu lugar.
Recebes todas as dores que te impõem à alma, com sorrisos nos lábios,
conquanto te amarfanhem o coração.
E nunca possuis o bastante para abrilhantar-lhes a existência, de vez que tudo
lhes dás de ti mesmo, sem faturas de serviço e sem notas de pagamento.
*
Quando te vejas, diante de filhos crescidos e lúcidos, erguidos à condição de
dolorosos problemas do espírito, recorda que são eles credores do passado a te pedirem
o resgate de velhas contas.
Busca auxiliá-los e sustentá-los com abnegação e ternura, ainda que isso te
custe todos os sacrifícios, porque, no junto instante em que a consciência te afirme tudo
haveres efetuado para enriquecê-los de educação e trabalho, dignidade e alegria, terás
conquistado, em silêncio, o luminoso certificado de tua própria libertação.
29
CRIANÇAS DOENTES
Meimei
Acalentas nos braços o filhinho robusto que o lar te trouxe e, com razão, te
orgulhas dessa pérola viva. Os dedos lembram flores desabrochando, os olhos trazem
fulgurações dos astros,os cabelos
Recordam estrigas de luz e a boca assemelha-se a concha nacarada em que os
teus beijos de ternura desfalecem de amor.
Guarda-o, de encontro ao peito, por tesouro celeste, mas estende compassivas
mãos aos pequeninos enfermos que chegam à Terra, como lírios contundidos pelo
granizo do sofrimento.
Para muitos deles, o dia claro ainda vem muito longe...
São aves cegas que não conhecem o próprio ninho, pássaros mutilados,
esmolando socorro em recantos sombrios da floresta do mundo... Às vezes, parecem
anjos pregados na cruz de um corpo paralítico ou mostram no olhar a profunda tristeza
da mente anuviada de densas trevas.
Há quem diga que devem ser exterminados para que os homens não se
inquietem; contudo, Deus, que é a Bondade Perfeita, no-los confia hoje, para que a vida,
amanhã, se levante mais bela.
Diante, pois, do teu filhinho aquinhoado de reconforto, pensa neles!... São
nossos outros filhos do coração, que volvem das existências passadas, mendigando
entendimento e carinho, a fim de que se desfaçam dos débitos contraídos consigo
mesmos...
Entretanto, não lhes aguardes rogativas de compaixão, de vez que, por agora,
sabem tão-somente padecer e chorar.
Enternece-te e auxilia-os, quanto possas!...
E, cada vez que lhes ofertes a hora de assistência ou a migalha de serviço, o
leito agasalhante ou a lata de leite, a peça de roupa ou a carícia do talco, perceberás que
o júbilo do Bem Eterno te envolve a alma no perfume da gratidão e na melodia da
bênção.
30
CRISTO EM CASA
Casimiro Cunha
Se desejas extinguir
A sombra que aflige e atrasa,
Não olvides acender
A luz do Evangelho em casa.
Verás a tranqüilidade,
Vestida em suave brilho,
Irradiando esperança
Em todo o teu domicílio.
Mentiras da vaidade,
Velhos crimes da avidez,
Calúnia e maledicência
Desaparecem de vez...
Serpentes envenenadas
Do orgulho torvo e escarninho,
Sob o clarão da verdade,
Esquecem-nos o caminho.
Dificuldades e provas,
Na dor amargosa e lenta,
São recursos salvadores
Com que o Céu nos apascenta.
31
E o trabalho por mais rude,
No campo de cada dia,
É dádiva edificante
Do bem que nos alivia.
32
CULTO CRISTÃO NO LAR I
Emmanuel
33
CULTO CRISTÃO NO LAR II
Neio Lúcio
34
EM CASA
Emmanuel
Ninguém foge à lei da reencarnação.
*
Ontem, atraiçoamos a confiança de um companheiro, induzindo-o à derrocada
moral.
Hoje, guardamo-lo na condição do parente difícil, que nos pede sacrifício
incessante.
*
Ontem, abandonamos a jovem nos amava, inclinando-a ao mergulho na lagoa
do vício.
Hoje, temo-la de volta por filha incompreensiva, necessitada do ano amor.
*
Ontem, colocamos o orgulho e a vaidade no peito de um irmão que nos seguia
os exemplos menos felizes.
Hoje, partilhamos com ele, à feição de esposo despótico ou de filho-problema, o
cálice amargo da redenção.
*
Ontem, esquecemos compromissos veneráveis, arrastando alguém ao suicídio.
Hoje, reencontramos esse mesmo alguém na pessoa de um filhinho, portador de
moléstia irreversível, tutelando-lhe, à custa de lágrimas, o trabalho de reajuste.
*
Ontem, abandonamos a companheira inexperiente, à míngua de todo auxílio,
situando-a nas garras da delinqüência.
Hoje, achamo-la ao nosso lado, na presença da esposa conturbada e doente, a
exigir-nos a permanência no curso infatigável da tolerância.
*
Ontem, dilaceramos a alma sensível de pais afetuosos e devotados, sangrando-
lhes o espírito, a punhaladas de ingratidão.
Hoje, moramos no espinheiro em forma de lar, carregando fardos de angústia, a
fim de aprender a plantar carinho e fidelidade.
À frente de toda dificuldade e de toda prova, abençoa sempre e faze o melhor
que possas.
Ajuda aos que te partilham a experiência, ora pelos que te perseguem, sorri
para os que te ferem e desculpa todos aqueles que te injuriam...
A humildade é chave de nossa libertação.
E, sejam quais forem os teus obstáculos na família, é preciso reconhecer que
toda construção moral do Reino de Deus, perante o mundo, começa nos alicerces
invisíveis da luta em casa.
35
ESSAS OUTRAS CRIANÇAS
Emmanuel
Quando abraças teu filho, no conforto doméstico, fica essas outras crianças que
jornadeiam sem lar.
Escolhes a roupa nobre e limpa de que teu filho se vestirá, conforme a estação.
Todavia, essas outras crianças tremem de frio, recobertas de andrajos.
E essas outras crianças suspiram debalde pela luz do alfabeto, acabando, muita
vez, encerradas no cubículo das prisões, à face da ignorância que lhes cega a existência.
Conduzes teu filho a exame de pediatras distintos sempre que entremostre leve
dor de cabeça.
Entretanto, essas outras crianças mimadas por moléstias atrozes, agonizam em
leitos de pedra, sem que mão amiga as socorra.
Ofereces aos sentidos de teu filho, a festa permanente das sugestões felizes,
através da educação incessante.
No entanto, essas outras crianças guardam olhos e ouvidos quase sintonizados
no lodo abismal das trevas.
Afaga, assim, teu filho no trono familiar, mas desce ao pátio da provação, onde
essas outras crianças se agitam em sombra ou desespero e ajuda-as quanto possas!
Quem serve no amor de Cristo, sabe que a boa palavra e o gesto de carinho, o
pedaço de pão e a peça de vestuário, o frasco de remédio e a xícara de leite operam
maravilhas.
36
FILHO QUE NÃO NASCEU
José Guedes
37
HISTÓRIA DE UM PÃO
Irmão X
38
Decorrido um ano, Jonakim, a carpinteiro, ostentava, sorridente, nos braços,
mais um filhinho, cujos louros cabelos emolduravam belos olhos azuis.
Com a benção de um pão dado a um menino triste, por espírito de amor puro,
conquistara Barsabás, nas Leis Eternas, o prêmio de renascer para redimir-se.
39
JESUS EM CASA
Irene S. Pinto
Anula-se a malquerença,
a frase é contente e boa.
Quem guarda ofensas, perdoa
Quem sofre, agradece à cruz.
A maldade escuta e pensa
E o vício da rebeldia
Perde a máscara sombria...
Toda névoa faz-se luz!
Na casa fortalecida
Por semelhante alimento,
Tudo vibra entendimento
Sublime e renovador.
O dever governa a vida
Vozes brandas falam calmas....
É Jesus chamando as almas.
A o reino do Eterno Amor!
40
LAMENTO PATERNO
José Guedes
41
LEI DO AMOR
Narcisa Amália
42
LUZ NO LAR
Scheilla
43
MÃE I
Meimei
44
MÃE II
Irmão X
45
infinito mundo de seu co-ração. Seu olhar contemplava-o, através de todas as estrelas
do Céu e encontrava-lhe o hálito perfumado em todas as flores da Terra. A voz d’Ele
vibrava em sua alma e para compreender-lhe a sobrevivência bastava penetrar o
iluminado santuário de ai mesma. Seu Filho – seu amor e sua vida – poderia, acaso,
morrer? E embora a saudade angustiosa, consagrou-se à fé no reencontro espiritual, no
plano divino, sem lágrimas, sem sombras e sem morte!...
........................................................................................................
46
MÃE, DEUS TE ABENÇOE
Maria Dolores
Com júbilos divinos, Mãe querida, que a celeste bondade te coroe ! ... Por tudo
o que nos dá nos caminhos da vida, Deus te exalte e abençoe ! ...
47
MENSAGEM DA CRIANÇA AO HOMEM
Meimei
Proclamas o bem por base da evolução; todavia, se não tens paciência para
comigo, porque eu te aborreça, provavelmente ainda hoje cairei na armadilha do mal,
como ave desprevenida no laço do caçador.
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MEU FILHO
Epiphanio Leite
49
MEU LAR
João de Deus
50
NA INTIMIDADE DOMÉSTICA
Emmanuel
51
NO LAR
Emmanuel
Não olvides que teu filho, sendo a materialização de teu sonho, é também tua
obra na Terra.
Às vezes é um lírio que plantaste no tempo; contudo, na maioria das ocasiões, é
um fragmento de mármore que deixaste à distância.
Flor que te pode encorajar ou pedra que te pode ferir.
Recebe-o, pois, como quem encontra a oportunidade mais santa de trabalho no
mundo.
Não lhe abandones o espírito à liberdade absoluta, para que se não perca ao
longo da estrada, e nem cometas a loucura de encarcerá-lo em teus pontos de vista,
para que o teu exclusivismo não lhe desfigure as qualidades inatas para o infinito bem.
Ajuda-o, acima de tudo, a crescer para o ideal superior, assim como auxilias a
árvore nascente, em ímpeto ascensional para a luz.
Livra-o das deformidades mentais, tanto quanto proteges o vegetal proveitoso
contra a invasão da erva sufocante.
Ser pai é ser colaborador efetivo de Deus, na Criação.
Receber um filho é deter entre os homens o mais sagrado depósito.
Não desertes, assim, da abnegação em que deves empenhar todas as forças
peculiares à própria vida, a fim de que o rebento de tuas aspirações humanas se faça
legítimo sucessor dos teus mais íntimos anseios de elevação.
O lar, na Terra, ainda é o ponto de convergência do passado. Dentro dele, entre
as quatro paredes que lhe constituem a expressão no espaço, recebemos todos os
serviços que o tempo nos impõe, habilitando-nos ao título de cidadãos do mundo.
Exercitemos, desse modo, o amor e o serviço, a humildade e o devotamento, no
templo familiar, à frente de nossos amigos ou adversários do pretérito transformados
hoje em nossos parentes ou em nossos filhos, e estaremos alcançando nos problemas da
eternidade a mais alta e a mais sublime equação.
52
NO REINO DOMÉSTICO
Irmão X
53
programa sublime de melhoria individual, em favor da tranqüilidade coletiva e da
ascensão de todos.
Desvelando os horizontes largos da vida, a Nova Revelação dilatará a
esperança, o estímulo à virtude e a educação em todas as inteligências amadurecidas na
boa vontade, que passarão a entender nas piores situações familiares pequenos cursos
regenerativos, dando-se pressa em aceitá-los com serenidade e paciência, de vez que a
dor e a morte são invariavelmente os oficiais da Divina Justiça, funcionando com
absoluto equilíbrio, em todas as direções, unindo ou separando almas, com vistas à
prosperidade do Infinito Bem.
Assim, pois, meu caro, dispense-me da obrigação de maiores comentários, que
se fariam tediosos em nossa época de esclarecimento rápido, através da condensação
dos assuntos que dizem respeito ao soerguimento da Terra.
Observe e medite.
E, quando perceber a imensa força iluminativa do Espiritismo Cristão, você
identificará Jesus como sendo o Sociólogo Divino do Mundo, e verá no Evangelho o
Código de Ouro e Luz, em cuja aplicação pura e simples reside a verdadeira redenção da
Humanidade.
54
NO TEMPLO DO LAR
Pio Ventania
55
O BERÇO
BEZERRA DE MENEZES
CAIRBAR SCHUTEL
CARMEN CINIRA
RODRIGUES DE ABREU
*
CRUZ E SOUZA
56
O GRITO DE CÓLERA
Néio Lúcio:
57
O IRMÃOZINHO
João de Deus
Em seguida, vovozinha
Beijou-lhe a face branquinha,
58
ORAÇÃO DA CRIANÇA
Emmanuel
59
ORAÇÃO A MULHER
Meimei
Missionária da vida:
Ampara o homem para que o homem te ampare.
Não te conspurques no prazer, nem te mergulhes no vício.
A felicidade da Terra depende de ti, como o fruto depende da árvore.
Mãe, sê o anjo do lar.
Esposa, auxilia sempre.
Companheira, acende o lume da esperança.
Irmã, sacrifica-te e ajuda.
Mestra, orienta o caminho.
Enfermeira, compadece-te.
Fonte sublime, se as feras do mal te poluíram as águas, imita a corrente
cristalina que, no serviço infatigável a todos, expulsa do próprio seio a lama que lhe
atiram.
Por mais que te aflija a dificuldade, não te confies à tristeza ou ao desânimo.
Lembra os órfãos, os doentes, os velhos e os desvalidos da estrada que
esperam por teus braços e sorri com serenidade para a luta.
Deixa que o trabalho tanja as cordas celestes do teu sentimento, para que não
falte a música da harmonia aos pedregosos trilhos da existência terrestre.
Teu coração é uma estrela encarcerada.
Não lhe apagues a luz, para que o amor resplandeça sobre as trevas.
Eleva-te, elevando-nos.
Não te esqueças de que trazes nas mãos a chave da vida, e a chave da vida é a
glória de Deus.
60
PAIS E FILHOS
João
61
Duas semanas decorreram, normais, quando sobreveio o momento em que
lobriguei o vulto de um homem que saía de nossa casa...
Seria o rival...
Guardei segredo e prossegui na tocaia.
Mais quatro dias e o mesmo homem chegou de carro, despediu-se do motorista
e entrou...
Puxei o relógio. Onze horas e quinze minutos. Noite quente.
Prevenido, acerquei-me da moradia, que se localizava em subúrbio remoto.
Encontraram-se os dois com mostras de intimidade e, a distância, notei que se
acomodavam num banco de pedra do pátio lateral, que a sombra envolvia. Conversavam
sugerindo carinho mútuo. Enxergava-lhes o perfil, mergulhado em penumbra, conquanto
não lhes ouvisse as palavras, e estudei, friamente, a posição que ocupavam na peça
estreita.
Desvairado, consultei o portão de entrada, verificando-o semiaberto. Acesso
fácil.
Com a sagacidade de um felino, avancei, descarregando a arma nos dois.
Ouvi gritos, mas ocultei-me na vizinhança, para fugir em seguida, a sentir-me
vingado.
Não vacilaria arrostar a polícia, se necessário.
Tentando refrigerar a cabeça, procurei descansar algumas horas em praia
deserta. Entreguei o revólver à lama de esgoto esquecido e voltei a casa para saber,
aterrado, que eu não apenas assassinara minha esposa, mas também meu abnegado pai
que a socorria...
Não acreditei.
Corri ao necrotério e, ao reconhecê-los, tornei ao lar, atormentado pelo
remorso, e enforquei-me, sem dar outra impressão que não fosse a de um homem que a
dor fizera delirar, atirando-o ao suicídio...
Exilado por minha própria crueldade, em vales tenebrosos, nunca mais vi os que
amo...
Entendereis o que sofro?
Quantos anos passaram sobre os meus crimes? Não sei... Os que choram sem o
controle do tempo não sabem contar as horas...
Misericórdia, meu Deus!...
Dai-me a reencarnação, os empenhos da Terra, a luta, a provação e o
esquecimento, mas ainda que eu padeça humilhação e surdez, durante séculos, permiti,
Senhor, que eu aprenda a escutar!...
62
PAPAI RICO
Conheci Cantídio Pereira em pleno fastígio econômico. Duas fazendas na gleba
fluminense e grande conjunto residencial em formosa praia do Rio. Gostava de carros e
viagens, diversões e aperitivos. Era, em suma, cavalheiro elegante e bem posto,
relacionando anedotas finas em cada conversacão.
Não abraçava o grande amigo, desde muito tempo, quando fui reencontrá-lo,
justamente ali, em velha casa consagrada a problemas e assuntos de reencarnação.
Recolhi-o, de encontro ao peito, com a felicidade de quem surpreende um irmão
em país diferente, e passamos a falar no mesmo idioma de carinho e recordação.
Ignorando-lhe a mudança, da Terra para a Vida Espiritual, era natural me
espantasse, não apenas por revê-lo em pessoa, mas também ao verificar-lhe a aflitiva
apresentação.
O antigo “gentleman”, que envergava costumes de puro linho inglês nos
repastos do Leme, parecia desempenhar agora o papel de mendigo. Veste rota,
desajeitada. Amargura, desencanto, tristeza...
Foi por isso, talvez, que as minhas primeiras indagações veladas respondeu sem
rebuços:
– Não se admire, meu caro... Não é a morte que opera tamanha transformação.
É a própria vida que continua...
– Mas você...
– Não faca perguntas – falou bem humorado –, explicarei...
E prosseguiu :
– Você provàvelmente ainda não sabe que voltei da Terra, há dois anos. Tempo
bastante para renovar-me em todas as dimensões, apesar de ter vivido por lá mais de
setenta. Imagine que meus quatro filhos eram meus quatro amores. Viúvo desde a
mocidade, concentrei neles a própria vida.
João e Eduardo, Linda e Eunice resumiam meus sonhos. Casados, continuaram a
ser minha doce alegria. Além disso, povoaram-me a velhice com quatro netos, que eram
para mim claros jorros de sol. Julguei que a morte não nos distanciasse uns dos outros ;
entretanto, meu amigo, tão logo cerrei os olhos, a paixão do dinheiro endoideceu minha
gente. Tudo começou, ao pé das orações que fizeram de boca, por intenção de minha
felicidade, no sétimo dia depois da grande separação. Conduzido por mãos amigas ao
templo religioso em que se ajuntavam, observei, assombrado, que filhos e filhas, noras e
genros se entreolhavam com inesperada desconfiança. Em seguida às preces, Linda e
Eunice começaram a rixar em nossa casa, pela posse de alguns pratos de porcelana
chinesa, não pelo valor afetivo que assinalavam, mas pelo preço a serem vendidos na
feira de antiguidades. Chamados à cena, Eduardo e João, com as respectivas esposas,
desceram a outras minúcias e, ali mesmo, no santuário doméstico, vi lembranças
quebradas, vasos atirados pelas janelas, livros queimados e retratos destruídos, com a
troca abundante de murros e palavrões. O lar, dantes respeitado, fêz-se palco de luta
livre. Chorei e implorei concórdia, mas ninguém me sentiu a, presença. Na noite desse
mesmo dia, meus genros procuraram meus filhos, com pesadas reclamações. Afirmando-
se injuriados, exigiam adiantamento sobre a herança. Surpreendidos por ameaças, na
solidão do extenso gabinete que me fora refúgio, meus rapazes assinaram cheques
vultosos, tomados de ódio silencioso. No dia imediato, um dos genros comprou carro de
luxo, iniciando-se em bebedeiras, enquanto o outro dava curso à recalcada predileção
pelas corridas, adquirindo cavalos de grande fama. Linda e Eunice reclamaram em vão.
Totalmente alterados pelo dinheiro fácil, ambos desgarraram para o vício. Minhas filhas
passaram a conhecer dificuldades que nunca viram. Linda, mais sensível, adoeceu, e,
porque mostrasse profundo desequilíbrio nervoso, foi recolhida a uma casa de alienados
mentais. Eunice enlouqueceu de outro modo... Acompanhando o marido para fiscalizar-
lhe as noitadas alegres, aderiu aos prazeres noturnos, caiando em conflitos sentimentais
de que sòmente se livrará Deus sabe quando... João e Eduardo, a princípio unidos pelo
63
interesse, acabaram desavindos... Disputaram a posse das vacas, praguejando entre si...
Depois, divergiram quanto à escolha das terras, em seguida venderam--me as casas,
desvastando-me os bens, assumindo a posição de inimigos ferozes... De bolsos
recheados, esqueceram as obrigações de família e puseram-se, desorientados, no tropel
da aventura... As noras igualmente, acreditando mais no dinheiro que no trabalho,
descambaram para mentiras douradas, apodrecendo em preguiça, e os meus pobres
netos são hoje meninos infelizes... Os dois menores estão viciados em gotas
entorpecentes e os dois maiores em flagelo de lambreta...
De expressão desenxabida, Pereira ajuntou:
– Nunca recebi dos meus o favor de uma prece realmente sincera, nem o
socorro de um só pensamento de gratidão... No fundo, colhi o que semeei... Acima da
riqueza amoedada, deveria colocar o trabalho e a educação, a fraternidade e a
beneficência... Agora, é preciso voltar à Terra, começar tudo de novo e olvidar a minha
tragédia de papai rico...
Nesse ínterim, o dirigente da instituição chamou por ele e pude ouvir o instrutor
dizer-lhe, grave :
– Seu pedido de reencarnação, por enquanto, não tem fundamento... Você tem
créditos para repousar e preparar-se, por mais quarenta a cinqüenta anos, junto de
nós...
– Entretanto – falou Cantídio –, tenho pressa... Aspiro a novo corpo de carne, a
agir e a esquecer...
– Bem – aduziu o diretor –, para o momento, só dispomos de recurso difícil. Só
existe uma oportunidade, já, já... O irmão poderá reencarnar na região do Rio de
Janeiro, mas... não na beleza e na glória da grande cidade que tanto amamos, mas, sim,
entre os filhos de um casal de idiotas, no antigo Morro dos Cabritos...
Cantídio, no entanto, longe de aborrecer-se, pôs as mãos postas em sinal de
agradecimento e gritou, feliz:
– Obrigado! Obrigado!... Renascer no Morro doa Cabritos, com pouca memória,
é muita felicidade!...
E concluiu, transtornado de júbilo: – Bendito seja Deus!
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PAZ EM CASA
Emmanuel
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PEQUENINOS
Emmanuel
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PROFESSORES DIFERENTES
Emmanuel
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PROVAÇÃO MATERNA
Valentim Magalhães
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RENUNCIA
Emmanuel
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RESPOSTA DO ALÉM
Irmão X
Minha irmã: valho-me do "correio do outro mundo" para responder à sua carta,
cheia da sensibilidade do seu coração de mulher.
Pede-me a senhora o concurso de Espírito desencarnado para a solução de
problemas domésticos no setor de educação aos filhinhos que Deus lhe confiou.
Conforma-me, sobremaneira, a sua generosidade; entretanto, minha amiga, a opinião
dos mortos, esclarecidos na realidade que lhes constitui o novo ambiente, será sempre
muito diversa do conceito geral.
A verdade que o túmulo nos fornece renova quase todos os preceitos que nos
pautavam as atitudes.
Aí no mundo, entrajados no velho manto das fantasias, raros pais conseguem
fugir à cegueira do sangue. De orientadores positivos, que deveríamos ser, passamos à
condição de servidores menos dignos dos filhos que a providência nos entrega, por
algum tempo, ao carinho e ao cuidado.
Na Europa, trabalhada pelo sofrimento, existem coletividades que já se
acautelam contra os perigos da inconsciência na educação infantil entre mimos e
caprichos satisfeitos. Conhecemos, por exemplo, um rifão inglês que recomenda: -
"poupa a vara e entrega a criança". Mas, na América, geralmente, poupamos os defeitos
da criança para que o jovem nos deite a vara logo que possa vestir-se sem nós.
Naturalmente que os britânicos não são pais desnaturados, nem monstros que
atormentem os meninos na calada da noite, mas compreenderam, antes de nós, que o
amor, para educar, não prescinde da energia e que a ternura, por mais valiosa, não pode
dispensar o esclarecimento.
Dentro do Novo Mundo, e principalmente em nos País, as crianças são
pequeninos e detestáveis senhores do lar que, aos poucos, se transformam em perigosos
verdugos. Enchemo-las de brinquedos inúteis e de carinhos prejudiciais, sem a vigilância
necessária, diante do futuro incerto. Lembro-me, admirado, do tempo em que se
considerava herói o genitor que roubasse um guizo para satisfazer a impertinência de
algum pequerrucho traquinas e, muitas vezes, recordo, envergonhado, a veneração
sincera com que via certas mães insensatas a se debulharem em pranto pela
impossibilidade de adquirir uma grande boneca para a filhinha exigente. A morte,
todavia, ensinou-me que tudo isso não passa de loucura do coração.
É necessário despertar a alegria e acender a luz da felicidade em torno das
almas que recomeçam a luta humana, em corpos tenros e, muita vez, enfermiços. Fora
tirania doméstica subtraí-las ao sol, ao jardim, à Natureza. Seria crime cerrar-lhes o
sorriso gracioso, com os ralhos inoportunos, quando os seus olhos ingênuos e confiantes
nos pedem compreensão. Entretanto, minha amiga, não cogitamos de proporcionar-lhes
a alegria construtiva, nem nos preocupamos com a sua felicidade real. Viciamo-lhas
simplesmente.
Começamos a tarefa ingrata, habituando-lhes a boca às piores palavras da gíria
e incentivando-lhes as mãos pequenas à agressividade risonha. Horrorizamo-nos quando
alguém nos fala em corrigenda e trabalho. A palmatória e a oficina destinam-se aos filhos
alheios. Convertemos o lar, santuário edificante que a Majestade Divina nos confia na
Terra, em fortaleza odiosa, dentro da qual ensinamos o menosprezo aos vizinhos e a
guerra sistemática aos semelhantes. Satisfazendo-lhes os caprichos, dispomo-nos a
esmagar afeições sublimes, ferindo nossos melhores amigos e descendo aos fundos
abismos do ridículo e da estupidez. Fiéis às suas descabidas exigências, falhamos em
setenta por cento de nossas oportunidades de realização espiritual na existência
terrestre. Envelhecemo-nos prematuramente, contraímos dolorosas enfermidades da
alma e, quase sempre, só reconhecem alguma coisa de nossa renúncia vazia, ;quando o
matrimônio e a família direta os defrontam, no extenso caminho da vida, dilatando-lhes
70
obrigações e trabalhos. Ainda aí, se a piedade não comparece no quadro de suas
concepções renovadas, convertem-nos em avós escravos e submissos.
A morte, porém, colhe nossa alma em sua rede infalível para que nos
aconselhemos, de novo, com a verdade. Cai-nos a venda dos olhos e observamos que os
nossos supostos sacrifícios não representavam senão amargoso engano da personalidade
egoística. Nossas longas vigílias e atritos angustiosos eram, apenas, a defesa improfícua
de mentiroso sistema de proteção familiar. E humilhados, vencidos tentamos debalde o
exercício tardio da correção. Absolutamente desamparados de nossa lealdade e de nossa
indesejável ternura, os filhos do nosso amor rolam, vida afora, aprendendo na aspereza
do caminho comum. É que, antes de serem os rebentos temporários de nosso sangue,
eram companheiros espirituais do campo a vida infinita, e, se voltaram ao internato da
reencarnação, é que necessitavam atender ao resgate, junto de nós outros, adquirindo
mais luz no entendimento. Não devíamos cercá-los de mimos inúteis, mas de lições
proveitosas, preparando-os, em face das exigências da evolução e do aprimoramento
para a vida eterna.
Desse modo, minha amiga, use os seus recursos educativos compatíveis com o
temperamento de cada bebê, encaminhando-lhes o passo, desde cedo, na estrada do
trabalho e dobem, da verdade e da compreensão, porque as escolas públicas ou
particulares instruem a inteligência, mas não se podem responsabilizar pela edificação do
sentimento. Em cada cidade do mundo pode haver um Pestalozzi que coopere na
formação do caráter infantil, mas ninguém pode substituir os pais na esfera educativa do
coração.
Se a senhora, porém, não acreditar em minhas palavras, por serem filhas da
realidade indisfarçável e dura, exercite exclusivamente o carinho e espere pela lição do
futuro, sem incomodar-se com os meus conselhos, porque eu também, se ainda
estivesse envolvido na carne terrestre e se um amigo do "outro mundo" me viesse trazer
os avisos que lhe dou, provavelmente não os aceitaria.
71
SANTA MATERNIDADE
Epiphanio Leite
72
SAUDADE VAZIA
Jorge Faleiros
73
SEMPRE AMOR
Jorge Matos
74
SOLUÇÃO NATURAL
Hilário Silva
75
SURPRESA
Irmão X
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TERNURA MATERNAL
Carlos Dias Fernandes
77
TROVAS DE MÃE
Delfina Benigna da Cunha
Maternidade na vida,
Que o saiba quem não souber,
É uma luz que Deus acende
No coração a mulher.
78
UM DESASTRE
Irmão X
Duarte Nunes enriquecera. Duas grandes farmácias, muito bem dirigidas, eram
para ele duas galinhas de ovos de ouro. Dono do próprio tempo, não sabia usá-lo da
maneira mais nobre e, por isso, estimava nas grandes emoções suas grandes fugas.
Corridas de cavalos, corridas de automóveis, concursos de lanchas...
Entusiasta de todas os esportes. Gastador renitente.
Apesar disso, era bom esposo e bom pai. De vez em vez, levava os filhinhos,
Marilene e Murilo, às brigas de galos. O belo casal de garotos, porém, não gostava.
Marilene voltava o rosto para não ver, e Murilo, forte petiz de quatro anos, chorava
desapontado.
– Poltrão! – dizia, o pai, com adocicada ironia. E colocava os dois no carro para
longo passeio. A esposa, muitas vezes presente, rogava aflita: “Nunes, mais devagar.”
Ele, porém, sorria, sarcástico, e dava largas ao freio. Sessenta, oitenta quilômetros...
Noutras circunstâncias, era Elmo Bruno, o amigo inseparável, que advertia,
quando o carro de luxo parecia comer o chão :
– Não corra assim. tanto... Olhe os pedestres!
– Que tenho eu lá com isso?
E Bruno explicava :
– Há pessoas distraídas, e crianças inconscientes. Nem sempre conseguem, de
pronto, ver os sinais...
Duarte encerrava o capítulo, acrescentando :
– Rodas foram feitas para rodar. E depressa.
De outras vezes, era o próprio pai dele a aconselhá-lo, enquanto o veículo
parecia voar :
– Meu filho, é preciso prudência... O volante pede calma... Penso que, além dos
quarenta quilômetros, tudo é caminho para desastre...
– Frioleiras, papai – respondia Nunes, bem humorado, agravando o problema.
Sempre que exortado, corria mais.
II
79
– Porque não buscar, primeiro, a cerveja pura e gelada, em Copacabana? –
perguntou Nunes, contente.
O carro devora o asfalto.
– Devagar, devagar... – pede o amigo.
Depois da cerveja, o retorno a casa. Nunes inicia a marcha, como quem decola.
– Devagar, devagar – roga o companheiro.
Ele ri. Desatende. A poucos minutos, ambos vêem um pequeno em maiô. Está
só. Agita-se. E corre de través procurando o outro lado. Nunes tenta frear, mas é tarde.
Atropela o garoto que tomba qual pluma ao vento.
Populares gritando. O menino estendido na rua é um pássaro que agoniza.
Sangue. Muito sangue. Nunes aflige-se.Elmo volta e vê. Ergue a criança,
espantado, e caminha no rumo dele.
– Seja quem for – grita Nunes –, leve à nossa farmácia... Toda a despesa
gratuita...
Todavia, o amigo, boquiaberto, apresenta-lhe a menino morto e exclama :
– Munes, este menino é...
– É quem? Diga logo – falou Mune, impaciente.
Mas não precisou de maiores minúcias, porque Bruno, traumatizado, disse-lhe
apenas :
– É seu filho...
80
VERDUGO E VÍTIMA
Irmão X
O rio transbordava.
Aqui e ali, na crista espumosa da corrente pesada, boiavam animais mortos os
deslizavam toras e ramarias.
Vazantes em torno davam expansão ao crescente lençol de massa barrenta.
Famílias inteiras abandonavam casebres, sob a chuva, carregando aves
espantadiças, quando não estivessem puxando algum cavalo magro.
Quirino, o jovem barqueiro, que vinte e seis anos de sol no sertão haviam
enrijado de todo, ruminava plano sinistro.
Não longe, em casinhola fortificada, vivia Licurgo, conhecido usurário das
redondezas.
Todos o sabiam proprietário de pequena fortuna a que montava guarda,
vigilante.
Ninguém, no entanto, poderia avaliar-lhe a extensão, porque, sozinho,
envelhecera e, sozinho, atendia às próprias necessidades.
- “O velho – dizia Quirino de si para consigo – será atingido na certa. É a
primeira vez que surge uma cheia como esta. Agarrado aos próprios haveres, será levado
de roldão... E se as águas devem acabar com tudo, por que não me beneficiar? O homem
já passou dos setenta... Morrerá a qualquer hora. Se não for hoje, será amanhã, depois
de amanhã... E o dinheiro guardado? Não poderia servir para mim, que estou moço e
com pleno direito ao futuro?...”
O aguaceiro caia sempre, na tarde fria.
O rapaz, hesitante, bateu à porta da choupana molhada.
- “Seu” Licurgo! “Seu” Licurgo!
E, ante o rosto assombrado do velhinho que assomara à janela, informou:
- Se o senhor não quer morrer, não demore. Mais um pouco de tempo e as
águas chegarão. Todos os vizinhos já se foram...
- Não, não... – resmungou o proprietário -, moro aqui há muitos anos. Tenho
confiança em Deus e no rio... Não sairei.
- Venho fazer-lhe um favor...
- Agradeço, mas não sairei.
Tomado de criminoso impulso, o barqueiro empurrou a porta mal fechada e
avançou sobre o velho, que procurou em vão reagir.
- Não me mate, assassino!
A voz rouquenha, contudo, silenciou nos dedos robustos do jovem.
Quirino largou para um lado o corpo amolecido, como traste inútil, arrebatou
pequeno molho de chaves do grande cinto e, em seguida, varejou todos os escaninhos...
Gavetas abertas mostravam cédulas mofadas, moedas antigas e diamantes,
sobretudo diamantes.
Enceguecido de ambição, o moço recolhe quanto acha.
A noite chuvosa descera completa...
Quirino toma os despojos da vítima num cobertor e, em minutos breves, o
cadáver mergulha no rio.
Logo após, volta à casa despovoada, recompõe o ambiente e afasta-se, enfim,
carregando a fortuna.
Passado algum tempo, o homicida não vê que uma sombra se lhe esgueira à
retaguarda.
É o Espírito de Licurgo, que acompanha o tesouro.
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Pressionado pelo remorso, o barqueiro abandona a região e instala-se em
grande cidade, com pequena casa comercial, e casa-se, procurando esquecer o próprio
arrependimento, mas recebe o velho Licurgo, reencarnado, por seu primeiro filho...
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VERSOS A MINA MÃE
Da Costa E Silva.
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