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Modulo IV Livro de Teoria Literatura para Professores
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SUMÁRIO
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ROMANTISMO
CONTEXTO HISTÓRICO
EUROPA: O Romantismo foi a arte da burguesia vitoriosa após a I Revolução Industrial. Era o auge
do Liberalismo, que se tornava uma filosofia de vida individual. Muitos países europeus viviam um
surto de alfabetização, democratizando a arte literária. Nascia um enorme, variado e ávido público
leitor, os escritores profissionalizavam-se e o livro passava a ser visto como um produto.
A arte romântica parece ter surgido na Alemanha dos 1770 com o movimento Sturn und
drang (Tempestade e ímpeto), que preconizava uma arte nacionalista e folclórica (popular), que se
opunha à erudição e ao universalismo do Arcadismo.
BRASIL: O acontecimento histórico mais relevante para o nosso Romantismo foi a independência
política do país (1822).
CARACTERÍSTICAS
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O marasmo do cotidiano levava os românticos a um inevitável e profundo tédio, daí odiarem
tanto a realidade e cultuarem variadas formas de escapismo, buscado:
Enfim, não raro os românticos criaram atmosferas oníricas e delirantes como um universo paralelo
à realidade.
Todavia, seguiam algumas diretrizes estilísticas: grande variedade métrica e rítmica, maior
uso de versos brancos e estilo verbal excessivo (cheio de adjetivos e interjeições) e retórico. Outra
marca formal do Romantismo foi a sua disposição ao hibridismo dos gêneros, por exemplo, a prosa
poética. Além do fortalecimento do romance como principal forma narrativo-descritiva da realidade,
e não a poesia épica; cite-se o teatro romântico, que teve no drama sua melhor forma, deixando em
segundo plano a tragédia clássica.
POESIA ROMÂNTICA
A poesia romântica brasileira divide-se em três gerações. As obras dos integrantes de cada
uma das gerações possuem similaridades que tornam viável abordá-las em conjunto.
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GONÇALVES DE MAGALHÃES (1811-1882)
CARACTERÍSTICAS GERAIS
Batalhou muito para radicar o Romantismo no Brasil e teve o mérito de fundar a revista
Niterói: Revista brasiliense em Paris. Suspiros poéticos e saudades (1836) foi a primeira obra do
nosso Romantismo. Seus versos denotam um sentimentalismo burocrático e pouco de autêntica
emoção. Assim, o prefácio do livro foi mais lido do que as poesias, cujos temas são a pátria, as
paixões do homem, o nada da vida e a religiosidade. Magalhães aliou-se ao indianismo em A
confederação dos tamoios, uma tentativa de épico-indianista fracassada.
Obras: poesia: Primeiros cantos (1843), Segundos cantos (1848), Sextilhas de Frei Antão (1848) e
Últimos cantos (1850); teatro: Beatriz Cenci (1843) e Leonor de Mendonça (1846)
CONSIDERAÇÕES INICIAIS
Veremos a lira de Gonçalves Dias em três temas: o índio, a natureza (saudade da pátria) e o
amor.
1. POESIA INDIANISTA
O poeta eleva o índio a símbolo da nação brasileira e genuíno ser brasileiro, postura que
beira a xenofobia quanto ao europeu e o ressentimento com o colonialismo. A total idealização do
índio gerou constante inverossimilhança. Na linha do bom selvagem, de Rousseau, o indígena era
descrito como um ser puro e inocente em sua rusticidade. O índio gonçalvino não é branqueado,
por exemplo, no poema narrativo I-Juca Pirama.
I-JUCA PIRAMA
O jovem guerreiro tupi é preso pelos inimigos timbiras, tem início o ritual antropofágico.
Porém, ele pede para ser poupado do sacrifício por conta de seu pai, velho e cego. Julgado covarde
e indigno de ser pasto dos fortes timbiras, ele é humilhado e solto.
O cheiro das tintas usadas no rito antropofágico e a cabeça raspada do filho levam o ancião a
adivinhar sua fraqueza. Levado até a aldeia rival, ele exige que seu filho seja morto, conforme a
tradição. O chefe timbira diz que, por ter chorado, o jovem era indigno de tal honra. Quando presas
de tribos rivais, coragem e altivez em face da morte eram imprescindíveis para os indígenas.
Envergonhado por seu filho, o velho amaldiçoa-o e, dramaticamente, deseja-lhe todo tipo de
infelicidades:
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Possas tu, isolado na terra,
Sem arrimo e sem pátria vagando,
Rejeitado da morte na guerra,
Rejeitado dos homens na paz,
Ser das gentes o espectro execrado;
Não encontres amor nas mulheres,
Teus amigos, se amigos tiveres,
Tenham alma inconstante e falaz! (...)”
O velho ouve o grito de guerra do filho, que luta contra os inimigos... O chefe timbira ordena
o fim do combate: o jovem retomara o respeito dos inimigos e o orgulho do pai, era digno da
imolação, o que corre em seguida. Aliás, I-Juca Pirama significa “o que é digno de ser morto”, em
tupi. No presente, o último canto informa que os fatos narrados ocorreram há muito tempo e que
foram evocados pela memória de um velho timbira que os testemunhara.
Comentários: composto de dez cantos, o poema épico-dramático possui um forte lirismo. Traz
variada métrica e sua linguagem é rítmica e melódica, bem como verossimilhança no trato dos
costumes indígenas.
Canção do exílio
“Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o Sabiá;
As aves, que aqui gorjeiam,
Não gorjeiam como lá.
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3. POESIA AMOROSA
Amar e sofrer são praticamente o mesmo sentimento p ara Gonçalves Dias. Raramente
realizado, o amor não passa de uma mera ilusão ou limita-se à indiferença do ser amado. Solidão e
angústia tomam conta do eu-lírico. Temendo o fracasso, o poeta costuma optar pelo platonismo,
mantendo seu sentimento no campo da idealização e da irrealização, como se vê abaixo:
Obras: poesia: Lira dos vinte anos (1853) e O Conde Lopo (1886); contos: Noite na taverna (1855);
poema dramático: Macário (1855)
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Maldigo o meu amor!... (...)
A mulher, às vezes, também aparece como uma devassa que nutre os instintos sexuais e
orgiásticos do adolescente e, por isso, torna-se repugnante aos olhos do eu-lírico.
PARTE II: Além do par amor-morte, há, em Lira dos vinte anos, um Romantismo fortemente
byroniano (irônico, sarcástico), com temas mais próximos ao cotidiano, resultando em um tédio
doentio no eu-lírico. O próprio Álvares aponta a mudança de foco: “Aqui dissipa-se o mundo
visionário e platônico. Vamos entrar num mundo novo. (...) A razão é simples. É que a unidade
deste livro funda-se numa binômia”. Vejamos um soneto:
Comentários: o tema central do poema é o tédio mórbido e a juventude a tentar, cada qual a seu
modo, uma forma diferente de escapismo: jogos, bebidas, festas, passeios a cavalo, namoros,
rapé, charutos etc. Note que o sujeito poético encontra no fumo – além do prazer, é claro – o
estado anímico perfeito para um singular mergulho em seu íntimo (“Numa fumaça o canto d’alma
escuto...”), em uma completa negação à realidade exterior.
IMPORTANTE:
O amor e a figura da amada são ironizados em alguns dos inusitados poemas dessa
segunda parte de Lira dos vinte anos. Um tombo do eu poético que andava a cavalo,
o dinheiro (ou a falta dele) e o dia a dia flagrado com senso de humor e com
ironia são as demais tônicas desta “outra face da medalha”.
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NOITE NA TAVERNA
Primeiro livro de contos em nossa literatura, traz estrutura de narrativa de moldura: contos
enquadrados, uma trama geral emoldura (liga) as demais. Os contos de Noite na taverna são
narrados por cinco jovens que decidem contar histórias sanguinolentas e fantásticas enquanto
bebem e fumam em uma tasca. Cada um deles relata uma aventura fantasiosa do passado vivida
em diferentes países da Europa, cuja atmosfera geral parece um pesadelo satânico, fantasmagórico
e macabro, ligando de modo pessimista as relações amorosas ao par ultrarromântico amor e morte.
Aliás, Álvares foi chamado de “Byron brasileiro”.
O lado bestial da alma humana habita este submundo, dominado pela absoluta falta de
moral e perversidade, bem como pela tortura íntima, que irrompe nos mais proibidos instintos.
Canibalismo, assassinatos, necrofilia, incesto, suicídio e loucura são os temas das narrativas, cuja
atmosfera de pesadelo levou a crítica a apontar influência gótica em sua composição.
A obra possui lirismo ingênuo e comovente singeleza. Divide-se nos seguintes núcleos
temáticos: o amor, o saudosismo da pátria e da infância e o tédio existencial.
1. O AMOR
Sem ferir o bom gosto e o decoro, seus maliciosos versos veiculam diversas ambiguidades
sexuais. O eu poético sente-se vacilante ao lidar com seus desejos, já que anseia por realização
amorosa, mas teme o universo erótico desconhecido. Disso decorre um inusitado negaceio
amoroso, uma espécie de jogo sensual cuja arte está justamente na dubiedade de mostrar e
esconder, em um erotismo sadio e um tanto inocente. Já visto em Álvares de Azevedo, o tema do
poema a seguir é definido por seu próprio título: Amor e medo:
Veja, entretanto, que a sofreguidão dos ardores juvenis do eu-lírico de Casimiro não é tão
dilacerante como em Álvares de Azevedo, mas soa um pouco protocolar.
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2. O SAUDOSISMO DA PÁTRIA E DA INFÂNCIA
Casimiro foi o único poeta egótico (2ª geração) que estudou em Portugal, os demais
gozavam de nossas recentes universidades, sobretudo a USP. Surtiu disso o sentimento de exílio e
saudosismo da pátria em seus versos, algo muito parecido com Gonçalves Dias. Em Primaveras, a
nostalgia além-mar pelo solo natal excede o meio natural para evocar suas antigas vivências: o lar,
a mãe e a irmã, tudo traz à tona as lembranças da infância. Para ele, a meninice é a única época
em que se pode ser feliz, quando tudo é alegria pura e sincera de viver, os mínimos eventos são
mágicas aventuras, o mundo é aliado do ser. Observe:
3. O TÉDIO EXISTENCIAL
Primaveras traz ainda poemas em que o poeta aprofunda suas tristezas cotidianas, oriundas
do fatalismo da passagem do tempo quando da doença (tuberculose) e da morte iminente.
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POETAS MENORES DA 2ª GERAÇÃO
– FAGUNDES VARELA (1841-1875). Obras: Noturnas (1861), Vozes d’América (1864), Cantos
e fantasias (1865), Cantos meridionais (1869) e Anchieta ou evangelho nas selvas (1875)
Na década de 1870, nossos intelectuais mostravam senso crítico quanto à realidade política,
econômica e humana do país, criando uma arte engajada em prol de causas liberais e
humanitárias. Sob influência do poeta francês Victor Hugo, a poesia pediu o fim da Monarquia e
da escravidão. O republicanismo e a defesa da abolição da escravatura tornaram a geração
conhecida como condoreira. O condoreirismo aludia ao condor dos Andes, ave que simboliza a
liberdade da América e serve de metáfora à liberdade desejada para os escravos.
Obras: poesia: Espumas flutuantes (1870) e Os escravos (1883); teatro: Gonzaga ou A revolução de
Minas (1875)
CONSIDERAÇÕES INICIAIS
Por sua consciência social, política e humanitária, o poeta representou uma evolução em
relação a seus antecessores.
CARACTERÍSTICAS TEMÁTICAS
O traço mais emblemático da poesia de Castro Alves é sua apaixonada luta contra a
escravidão negra no Brasil. O poeta defendeu ardorosamente a República, já que a Monarquia era
então tida como um regime de governo retrógrado e desumano, resumidos na própria escravidão.
Outros temas recorrentes em sua lira são o lirismo amoroso e existencial e a própria natureza.
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ESPUMAS FLUTUANTES
1. POESIA ÉPICO-SOCIAL
Traz a figura do artista engajado em ideias políticas e sociais, que buscava mudar seu país e a
própria América. Em O livro e a América, o saber é elevado a arma para iluminar os homens e
trazer justiça. Castro Alves foi um artista revolucionário, já que uniu ação à consciência do papel
messiânico que cabia à minoria de letrados naquela sociedade.
2. POESIA AMOROSA
O poeta cantou o amor sob diversos enfoques: a ânsia de um sentimento que não excede a
mera aspiração, o desejo febril sem concretização e a exaltação da concretização carnal, sua
indiscutível contribuição para o tema. Foi o pioneiro em nossas letras da descrição realista do
amor como uma comunhão de corpos, não de almas, superando o platonismo da 1ª geração e a
medrosa angústia sexual do ultrarromantismo. A linguagem de seus versos amorosos também
amadureceu, passando da retórica condoreira a uma variante mais simples e coloquial.
Enquanto os românticos da 2ª geração viam na morte uma dádiva, devido a ela ser o fim de
sua angústia amorosa e de seu tédio existencial, o sujeito poético castroalvino, ao sentir a vida
ameaçada, reflete sobre a beleza de estar-se vivo, afirmando seu imenso amor à vida, como em
Quando eu morrer:
Comentários: o poema foi uma espécie de resposta de Castro Alves aos versos de Lembrança de
morrer, de Álvares de Azevedo, onde se lê: “Descansem o meu leito solitário/ Na floresta dos
homens esquecida,/ À sombra de uma cruz, e escrevam nela:/ Foi poeta – sonhou – e amou na
vida.” Além da execração da morte, destaque para as metáforas “hotel funéreo” e “messalina”
(prostituta) alusivas à sepultura.
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4. NATUREZA E PLASTICIDADE
OS ESCRAVOS
III Parte: horrorizado, o eu-lírico flagra a “cena infame e vil”: a selvageria do tráfico negreiro,
descrevendo-a em toda sua desumanidade (IV Parte). O quadro é revoltante: banhados em
sangue, negros são açoitados e obrigados a dançar , sob as risadas sádicas de seus algozes . O
poema torna-se um libelo antiescravista.
V Parte: há a crítica indireta à omissão de Deus e o pedido ao mar, tempestades e tufões para
que acabem com o sórdido espetáculo. O poeta opõe passado (os negros livres na África) e
presente (macabra prisão: jogados, como animais, em um porão de navio, sem dignidade sequer
para morrer). VI Parte: expressa uma áspera crítica ao país (Brasil), que compactua com a
vergonhosa escravidão:
SOUSÂNDRADE (1833-1902)
A obra narra uma lenda indígena quíchua do Peru e da Bolívia. Guesa é uma criança roubada
de seus pais por Bochica, deus do sol. Após peregrinar pelo mundo, ele é sacrificado aos 15 anos. A
obra execra ora o desastroso colonialismo europeu para com os ameríndios, ora o capitalismo
como sistema econômico moderno (Inferno de Wall Street). Também o Brasil colonial é ironizado
ao ser batizado, satiricamente, de Tatuturema (Inferno de Tatuturema).
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PROSA ROMÂNTICA
A vinda da família real lusitana para o Brasil (1808) trouxe enorme efervescência cultural ao
país. As fundações do Museu Nacional, do Banco do Brasil e da Biblioteca Pública e o surgimento
de universidades e de uma imprensa escrita convergiram para a formação de um efetivo público
leitor e para a popularização dos “romances de folhetim”, narrativas publicadas capítulo a capítulo
diariamente nas páginas dos principais jornais locais. Os romances de folhetim tinham enredos
bastante dinâmicos (cheio de peripécias e barreiras à realização afetiva dos protagonistas) e
personagens planas, que se limitavam a cumprir papéis engessados a serviço de uma visão
maniqueísta e idealizada da realidade. Nossos romances românticos dividiram-se em núcleos
temáticos: históricos, indianistas, urbanos ou regionalistas (sertanistas).
ROMANCISTAS E OBRAS
A MORENINHA
Fabrício, Leopoldo, Augusto e Filipe cursam Medicina. Este convida os amigos para um final
de semana na casa de sua avó, D. Ana, em uma ilha (Paquetá). Na ocasião, Augusto afirma sua
inconstância e diz que não se prende a uma única mulher. Filipe aposta que ele se apaixonaria por
uma de suas primas na ilha e, então, teria que escrever um romance narrando seus amores.
Na ilha Augusto conhece Carolina, a Moreninha, 14 anos. Em segredo, ele se explica à D. Ana,
a avó da menina: fizera uma promessa de amor mal resolvida. Aos 13 anos, ele brincava na praia
com uma garota linda e desconhecida. Um menino pediu-lhes ajuda e levou-os até a casa de seu pai,
que estava doente. Eles lhe deram o dinheiro que tinham e o homem profetizou a união futura de
ambos. As crianças trocaram objetos (prendas) e nunca se encontraram. Augusto fizera-se um
namorador incorrigível.
Domina Carolina e Augusto um misto de interesse e implicância. Desde então eles se sentem
inquietos. As visitas de Augusto à casa de D. Ana são dominicais e ele se aproxima da Moreninha.
Por seu desleixo nos estudos, é proibido pelo pai de voltar à ilha e adoece seriamente. Seu pai vê-
se obrigado a concordar com o casamento e o rapaz então se recupera de pronto.
Ao tornar à ilha de Paquetá, Carolina revela-lhe ser sua companheira daquele dia na praia.
As prendas trocadas outrora atestam o que diz a menina: podiam ser felizes como profetizara o
doente. Quando Filipe cobra do amigo a escrita do romance de seu amor com Carolina, Augusto
diz já haver escrito a obra, cujo título era A Moreninha.
Comentários: foi o primeiro romance da nossa literatura (1844). Seu teor documental seduziu o
público carioca ao retratar tipos, cenários e valores locais. A obra traz os moralistas valores
patriarcais da época (cândidos namoros e filhos submissos aos pais), mesmo Augusto passa de
grande namorador a par romântico perfeito. Note a idealização dos tipos: Augusto tem sólidos
princípios morais, é belo, alegre, jovial, inteligente; a sagaz Carolina é fascinante em sua inocente
travessura. Vencido o conflito, há o final feliz, que cumpre o propósito de entreter o singelo
público leitor da época, no que sua linguagem, bastante ágil e viva, contribui.
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JOSÉ DE ALENCAR (1829-1877)
Romances: indianistas: O guarani (1857), Iracema (1865) e Ubirajara (1874); urbanos: Cinco
minutos (1856), A viuvinha (1857), Lucíola (1862), Diva (1864), A pata da gazela (1870), Sonhos
d’ouro (1872), Senhora (1875) e Encarnação (1877); históricos: As minas de prata (1862),
Alfarrábios (1873) e A guerra dos mascates (1873), e regionalistas: O gaúcho (1870), O tronco do ipê
(1871), Til (1872) e O sertanejo (1875).
Foi o maior romancista romântico brasileiro, já que possuía um projeto estético para nossa
literatura, o qual passava pela:
1. ROMANCES INDIANISTAS
O GUARANI
1604: às margens do Paquequer, em uma fortificação, moram o fidalgo luso Dom Antônio de
Mariz e sua família: Lauriana, esposa; Cecília e D. Diogo, filhos; Isabel, sobrinha. Junto ao solar,
habitam aventureiros a serviço de D. Antônio e Peri, um índio belo e forte, o qual salvara a vida de
Cecília há tempos, deixando sua tribo por adorá-la (Ceci), que ele acredita ser Nossa Senhora.
Álvaro de Sá, um jovem nobre de excelente caráter, ama Cecília e é amado por Isabel. Já Frei
Angelo di Luca, Loredano, deixara a batina e pensava raptar Cecília, por quem nutria um desejo
sexual doentio. Por acidente, D. Diogo mata uma índia aimoré e centenas de ferozes guerreiros da
tribo cercam o casarão, exigindo a vida de Cecília em desforra. Só Peri poderia livrá-la dos aimorés
e de Loredano. Seu plano era ser preso pelos inimigos e, tendo ingerido veneno, matá-los quando
do ritual antropofágico. Porém, com alguns aventureiros, Álvaro salva Peri, que parte para a selva
em busca de um antídoto.
D. Diogo vai para a corte buscar reforços; Loredano é desmascarado pelos aventureiros e
queimado em uma fogueira. Álvaro é morto pelos aimorés, Peri recupera o corpo de seu amigo.
Desesperada, Isabel pede ao bugre que ponha o corpo do amado em seu quarto e se suicida, em
uma cena dramática e romântica.
Sitiado, D. Antônio batiza Peri a fim de ele levar sua filha ao Rio de Janeiro. O solar arde por
flechas incendiárias. O guarani desce o Paquequer numa canoa com Cecília, que chora muito a
morte dos seus, mas logo se convence de que não mais poderia viver longe de Peri. Ela então pede
que seu protetor vá morar com ela na Corte, mas ele nega-se a viver na civilização. Eis a bela moça
solta a corda que amarrava a canoa... Estavam sozinhos na selva e amavam-se... Ocorre uma
enchente e, para salvar sua Senhora, Peri arranca uma palmeira, presos à qual, são levados pelas
águas. Somem no horizonte, deixando em aberto o final da narrativa.
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Comentários: os romances indianistas possuem fundo histórico e estilo folhetinesco. Note a forma
maniqueísta de divisão dos protagonistas: o BEM, representado pelo par Peri-Cecília e o próprio
Álvaro; e o MAL, Loredano e os aimorés. Por fim, seguindo a usual lógica das obras indianistas de
Alencar, O guarani segue o projeto de forjar uma identidade própria para nosso país , daí a intensa
idealização da cor local humana (índio) e geográfica (natureza), além de sua linguagem adjetivosa.
Traz a linda índia tabajara Iracema e Martim, primeiro colonizador português no Ceará, e o
ódio entre os tabajaras (aliados dos franceses) e os pitiguaras (ligados aos lusitanos). Filha do pajé
Araquém, Iracema deve manter-se virgem, pois é a guardiã do segredo da fabricação do licor
sagrado de Tupã.
Martim perde-se na mata e encontra Iracema, que o alveja com uma flecha, ferindo-o no
braço. Ela quebra a seta em sinal de paz e leva o europeu até sua tribo para que seu irmão, Caubi,
leve-o aos campos pitiguaras em segurança. Martim é bem tratado e espera a volta de Caubi de
uma caçada. Neste ínterim, se apaixonam. Certa noite, Martim pede à Iracema o licor de Tupã para
dormir e, assim, resistir aos encantos da virgem. Ela dá-lhe o vinho, mas se entrega ao branco, que
acredita estar sonhando.
Irapuã, líder dos guerreiros tabajaras, ama Iracema e ameaça a vida de Martim. Enquanto os
tabajaras deliram sob o efeito do vinho sagrado, Iracema foge com Martim e Poti, amigo deste, até
os campos pitiguaras, onde revela já ser esposa do homem branco (gravidez). Irados, os guerreiros
tabajaras seguem os fugitivos e ocorre uma sangrenta batalha entre as tribos. Iracema luta ao lado
de Martim contra seus irmãos, que são derrotados. Ela sente-se triste... Poti, Martim e Iracema
habitam o litoral; ela gesta. Felicidade. Contudo, o europeu está saudoso de sua terra e de uma
suposta noiva que lá ficara. Iracema sofre.
Enquanto o guerreiro branco combatia os tabajaras, nasce seu filho, batizado pela mãe de
Moacir: “nascido de meu sofrimento, da minha dor”. Solitária e triste, a índia prenuncia a própria
morte. Oito meses depois, Martim retorna e encontra Iracema à beira da morte. Ela entrega-lhe o
filho e morre. O local onde fora enterrada a índia tabajara seria um dia chamado de Ceará.
2. ROMANCES URBANOS
LUCÍOLA
Oriundo de Pernambuco, o jovem advogado Paulo Silva se apaixonara pela bela Lúcia
(Lucíola) na corte. Tempos depois veio a saber que sua amada era uma requisitada prostituta da
elite. Mulher excêntrica, ela vendia as joias que ganhava de seus clientes e negava-se a ser
exclusiva de qualquer deles. Paulo passou a frequentar a casa da cortesã. Amavam-se, a relação
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parecia estável. Ela deixara a prostituição, sendo sustentada modicamente pelo Bacharel. Um mês
feliz, mas Paulo ouvira boatos de que explorava a amante. Furioso, ele pediu-lhe que voltasse a ter
outros amantes. A fase, agora, era péssima tanto pelo preconceito da sociedade, como porque
Lúcia não se julgava digna de ser amada.
Ela narrara ao amado seu passado: quando tinha 14 anos, sua família adoecera de febre
amarela e vivia terrível penúria financeira. Ela fora prostituída por um senhor e expulsa de casa
pelo pai, acabando por adotar o nome de Lúcia (chamava-se Maria da Glória) e ir passar um ano
para a Europa. Ao voltar ao Rio de Janeiro, seus pais haviam falecido; ela pusera Ana, sua irmã, em
um internato e fizera-se cortesã.
Lúcia abandonara o meretrício e fora morar, com Ana, em uma casa humilde. Mesmo
amando muito o Bacharel, não retomara a relação. Achava que a autopunição iria purificá-la;
abnegada, pedira a Paulo que desposasse Ana, contudo ele se negara. Lúcia estava grávida de
Paulo. Um médico diagnosticou um provável aborto, mas defendeu que o feto estava vivo; ela não
acreditou. À noite, Lúcia ardia de febre, que piorou nos dias seguintes. O médico insistiu em
medicá-la para que expelisse o feto, Lúcia negara-se. Antes de falecer, ainda pediu que Paulo
cuidasse de Ana como se fosse seu pai; ele obedeceu. Após seis anos, sabemos que Ana casara e
vivia feliz.
Comentários: a trama parte de algumas cartas que Paulo envia a uma senhora chamada G. M., nas
quais narra seu amor com Maria da Glória. O tema da obra é muito recorrente na literatura
ocidental: as injunções sociais que inviabilizam o amor de um jovem de família conservadora e
uma cortesã. Destaque negativo para o moralismo da sociedade, que se torna o vilão do enredo ao
opor-se ao amor do par romântico. Maria da Glória perdera-se a fim de salvar a família da miséria,
mas apenas seu corpo fora pervertido, sua alma permanecera virgem para, somente em Paulo,
conhecer o legítimo amor. Cite-se ainda o tom melodramático do romance.
SENHORA
Aurélia Camargo, 18 anos, encanta os salões cariocas com sua beleza, desprezando aqueles
lhe cortejam. Através de Lemos, seu tio e tutor, ela oferece ao pai de Adelaide Amaral, atual noiva
de Fernando Seixas, enorme quantia para que aquele case a filha com outro rapaz. Fernando
aceitara se casar com Adelaide por conta do dote da moça, rompendo, à época, seu noivado com
Aurélia, que, tempos depois, enriquecera ao receber uma herança. Lemos oferta a Fernando uma
enorme soma para se casar com uma moça desconhecida: a própria Aurélia. O jovem relutara em
pôr fim a outro noivado por causa de dinheiro, mas estava em sérios apuros financeiros. Rapaz
pobre, porém fútil e vaidoso, ele gostava de levar uma vida luxuosa, endividando-se.
Humilhado, Fernando faz-se frio e esquivo, embora ame a esposa, cujo caráter ele admirava.
Embora o casamento fosse uma farsa e não houvesse qualquer contato físico, havia ciúmes
recíproco entre os cônjuges, que ainda se amavam. Ele arranja um emprego e guarda tudo aquilo
que ganhava. Onze meses após a união, o rapaz recebe uma boa quantia em uma especulação,
alcançando a soma para restituir o valor do dote à sua senhora e comprar a sua liberdade.
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Fernando redime-se aos olhos de Aurélia, que se comove com a altivez de seu amado. Chegam a
acertar o divórcio, mas, quando o jovem ia retirar-se do quarto, Aurélia o detém, ajoelha-se a seus
pés e suplica que aceite seu amor. O casal enfim se une em um final redentor.
Comentários: a obra critica o casamento por interesse. A narrativa divide-se em partes alusivas a
uma transação comercial: O preço, Quitação, Posse e Resgate, pondo a nu a doentia ambição e
busca de ascensão social da burguesia. Assim, o romance possui claras nuances realistas, ao final,
contudo, cai no mais deslavado Romantismo, dada a redenção de Seixas e a felicidade dos leitores.
No molde folhetinesco, vemos a vitória do amor sobre o poder nefasto do dinheiro. É óbvia a
idealização dos protagonistas. Exemplo: Seixas tem sua má conduta inicial indiretamente justificada
pelo narrador, que atribui à sociedade a falta de caráter do jovem.
O SEMINARISTA
Capitão Antunes, rico fazendeiro mineiro, envia o filho, Eugênio, para o seminário em
Congonhas do Campo. Tendo crescido junto a Margarida, filha de uma agregada da fazenda, o
menino mantinha com ela um pueril e inocente namoro. Tempos depois, em férias na fazenda do
pai, Eugênio apaixona-se de fato por Margarida e é correspondido. De volta ao seminário, ele
suporta a vida monacal valendo-se da lembrança de sua amada.
Todavia, após algum tempo, desilude-se: sabedores de sua paixão juvenil, seus pais mentem-
lhe ao dizer que Margarida se casara com um moço das redondezas. A jovem e sua mãe acabam
expulsas da fazenda. Já ordenado padre, Eugênio volta à fazenda e é chamado a um vilarejo
próximo para auxiliar um moribundo que estava à beira da morte; tratava-se de Margarida. Ela
revela-lhe que não havia casado e a antiga paixão irrompe irrefreável entre ambos, que se entregam
ao amor. Em casa, Eugênio culpa-se por ter rompido o celibato.
No dia seguinte, o jovem padre vai rezar sua primeira missa quando recebe o pedido para
que abençoe um corpo que estava na igreja. Nova surpresa: era Margarida que havia morrido.
Após ver sua amada morta, Eugênio entra na igreja lotada, caminha até o altar e, em um surto de
desesperado e fúria, despe-se das vestes sacerdotais enquanto corre para a rua. Havia
enlouquecido.
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A ESCRAVA ISAURA
Início do reinado de D. Pedro II, em uma fazenda em Campos dos Goitacazes, interior
fluminense, Isaura (escrava branca e de educação refinada) sofre constante assédio sexual de
Leôncio, seu senhor, não obstante este fosse recém-casado com Malvina. As tentativas de Leôncio
são frustradas, pois Isaura não se entrega, resignando-se com as constantes humilhações e
ameaças de violência física.
Na companhia de Miguel, seu pai, ela foge para o Recife, onde vivem de forma modesta.
Então Isaura, que dizia chamar-se Elvira, conhece Álvaro, jovem, rico, republicano e liberal, a quem
passa a amar e é correspondida. Em um baile, ela é descoberta por caçadores de escravos fugidos,
contudo Álvaro impede que a levem de volta à corte. O jovem tenta comprar sua amada; porém,
Leôncio não aceita, obrigando Isaura a voltar a Campos dos Goitacazes. Para castigar a escrava
subversiva, seu senhor decide casá-la com Belchior, jardineiro da fazenda e homem de aparência
disforme e grotesca.
Álvaro viaja furtivamente para o Rio de Janeiro e descobre a falência financeira de Leôncio,
saldando as dívidas do fazendeiro e tornando-se dono de todos os seus bens. Minutos antes do
malfadado casamento de Isaura, Álvaro aparece e cobra seus direitos junto a Leôncio, que,
derrotado e na miséria, suicida-se. A união do casal é possível agora. Tudo acaba em completa
harmonia: os justos triunfam e os maus são punidos.
INOCÊNCIA
Cirino, um prático em Medicina, viaja pelo sertão do Mato Grosso e dá consultas baseadas
em seu empirismo. Ele encontra o pequeno proprietário Pereira, que lhe pede que socorra a filha,
Inocência, doente de maleita. Cirino cura a jovem e ambos se apaixonam. Entretanto, ela estava
prometida ao rude vaqueano Manecão, de forma que o amor deles já nascera condenado.
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Cirino quer fugir, Inocência recusa-se e pede que ele busque apoio em seu padrinho:
Antônio Cesário, que poderia intervir em prol do amor de ambos. Meyer parte. Cirino vai procurar
Cesário, que se nega a ajudar o jovem casal para não se indispor com Pereira. Ao descobrir o
intuito de Inocência de não se casar com Manecão, Pereira espanca-a e afirma seu desejo de antes
a ver morta do que ter desonrada sua palavra. Chegado de uma vaquejada pelo sertão, Manecão,
enfurecido pela desobediência da noiva, vai atrás de Cirino e assassina-o.
Na viagem ao Brasil, tem início o namoro de Leonardo Pataca e Maria da Hortaliça. Sete
meses mais tarde, nascia o filho casal: Leonardinho Pataca, batizado pela parteira (comadre) e
pelo barbeiro (compadre), vizinho dos portugueses. Já na infância o menino praticava legítimas
diabruras. Leonardo, agora um meirinho, flagra a infidelidade da esposa. Irritado, expulsa o filho
de casa com um grande chute no traseiro e ainda dá uma surra em Maria, que foge para Portugal
com o amante.
Em seguida Leonardo apaixona-se por uma cigana, com quem passa a morar e que mais
tarde também o abandonará. Já Leonardinho fora morar com o barbeiro, criatura bastante
compassiva. O menino se faz ainda mais abusado e vadio. Em vão, o compadre tenta encaminhá-lo
à carreira religiosa e ele chega a se tornar sacristão. Entretanto, aproveita a ocasião apenas para
praticar novas travessuras; inclusive desmascarando e tornando público o caso entre o padre e a
cigana que outrora morara com Leonardo. Vingativo, o clérigo expulsa Leonardinho da Sé.
Apesar de seu carisma, o jovem torna-se cada vez mais vadio. Ele, então, conhece Luisinha,
sobrinha de D. Maria, uma vizinha. Embora a moça não possuísse grandes encantos pessoais,
Leonardinho apaixona-se. Todavia, Luisinha se casa com um homem mais velho: o interesseiro
José Manuel. Apesar de a obra ter sido escrita no Romantismo, a infelicidade não acaba em
choradeira, pois Leonardinho passa a ter um caso com Vidinha, mulata muito sensual e livre de
moralismos. Morre o barbeiro. Leonardinho vive em contínuas patuscadas com Vidinha e seus
amigos, e é perseguido pelo major Vidigal, temido chefe de polícia.
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Certa feita o malandro é preso e, em vez de ser castigado, torna-se soldado nas tropas do
major. Ele prega uma peça no chefe ao deixar fugir um vigarista, inimigo mortal de Vidigal, que
prende Leonardinho e quer açoitá-lo. Quem protege o jovem é a comadre, que, ajudada por uma
conhecida, Maria Regalada, obtém a liberdade de Leonardinho e sua ascensão a sargento. Vidigal
protegera o mau soldado na esperança de que Maria Regalada cumprisse sua promessa de
retomar o caso amoroso que tivera com ele no passado. Até então um símbolo de justiça e ordem,
o major revela-se corrupto.
José Manuel morre de apoplexia, Leonardinho e Luisinha, enfim, podem se unir. Vence o
costumeiro final feliz romântico. Mesmo sem merecimento moral, Leonardinho realizava-se
profissional e afetivamente.
Comentários: embora o seu título, o romance traz um narrador onisciente (3ª pessoa) , que,
contudo, não é imparcial, tomando o partido de algumas personagens, em especial Leonardinho .
Ora humorística ora irônica, a linguagem da narrativa é bastante coloquial, aproximando-se do
português falado à época e deixando de lado o artificial excesso de adjetivos dos demais escritores
românticos.
O enredo transcorre no Rio de Janeiro no “ tempo do rei” (reinado de D. João VI, 1808-1821)
e foca as classes baixas. Prevalecem os homens livres (nem escravos tampouco senhores), os
quais, sem empregos específicos e seguros, viviam de ocupações ocasionais, pequenos afazeres ou
serviços burocráticos subalternos (parteiras, milicianos, sacristãos, vendeiros ou barbeiros). A obra
tem ares de crônica de costumes por sua linguagem e por descrever o dia a dia de uma camada
social esquecida no Romantismo.
Os tipos vivem de forma irreverente e tanto amoral, fundando o dito “ jeitinho brasileiro”
como essência de nosso povo. O anti-herói Leonardinho introduz nas letras brasileiras o tema da
malandragem, muito explorado a posteriori em textos canônicos, como Macunaíma (Mário de
Andrade) e Auto da compadecida (Ariano Suassuna), entre outras. Aliás, as três obras são
influenciadas por uma tradição literária espanhola do séc. XV: a picaresca, romances
protagonizados por pícaros: anti-heróis, que, marginalizados, são obrigados a lançar mão da astúcia
(picardia), da malandragem e de expedientes ilícitos para sobreviverem.
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TEATRO ROMÂNTICO
Obras: O juiz de paz na roça (1842), O Judas em sábado de aleluia (1846), Quem casa quer casa
(1847), O noviço (1853) e Os dois ou o inglês maquinista (1871)
CONSIDERAÇÕES INICIAIS
Foi o fundador do teatro propriamente brasileiro. Escreveu dramas históricos, mas tornou-se
célebre por suas comédias de costumes, cujas personagens tratam-se de meros tipos sociais, sem
maior complexidade psicológica.
Suas peças trazem recursos cênicos bastante simples, haja vista o baixo nível cultural do
público a que eram destinadas. A linguagem de suas comédias é marcada por um grande
coloquialismo.
A dramaturgia de Martins Pena tematizam tanto o meio urbano carioca quanto o rural,
sendo que ambas as vertentes abordam o tema do amor contrariado. A frustração amorosa das
personagens decorre do fato de os filhos verem no matrimônio a busca da felicidade junto a quem
amam; enquanto, para seus pais, a união significa a possibilidade de ascensão social, pelo que
escolhem pretendentes mais velhos e ricos. Note que, na sociedade patriarcal brasileira de
meados do séc. XIX, imperava, é claro, a vontade dos pais, instaurando o conflito.
Suas comédias urbanas são um tanto irônicas, levando ao palco os problemas de sua época:
o extremo patriarcalismo, o casamento por interesse, a carestia da vida, a exploração do
sentimento religioso pela igreja, a corrupção das autoridades, a exploração do país por
estrangeiros etc. Ao fazer de sua literatura um bem-humorado veículo de denúncia de nossas
mazelas sociais, o comediógrafo antecipa a essência crítica do Realismo.
Seus textos pecam um pouco pela extrema tipificação das personagens e pela repetição
temática. Porém, ressalte-se o fato do autor imprimir ares totalmente nacionais a suas peças, que
funcionam como uma espécie de crônica de costumes do mundo urbano e rural carioca do séc.
XIX.
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REALISMO
CONTEXTO HISTÓRICO
O final do séc. XIX foi um período de enorme efervescência artística em nosso país. O intenso
sincretismo sobrepôs a prosa do Realismo, do Naturalismo e do Impressionismo, que conviveram –
nem sempre de modo harmônico – com a poesia do Parnasianismo e do Simbolismo, opostas
entre si. O contexto histórico europeu foi marcado, à época, por grandes transformações. Vivia-se
o capitalismo comercial e o acentuado avanço tecnológico trazido pela II Revolução Industrial,
gerando novas facetas do Imperialismo e do Liberalismo. Cada vez mais a estratificação da
sociedade opunha burguesia e proletariado.
CARACTERÍSTICAS
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(forma) que traduzisse tal postura estética e filosófica. Disso decorre a obcecada busca pela
perfeição formal da escola realista.
TEMPO – ÊNFASE NO PRESENTE: Os românticos tendiam à volta ao passado, por sua vez os
realistas centravam suas narrativas no presente ou no passado imediato, preferindo a linearidade
temporal e, sempre que possível, evitando flashbacks, isto é, o retorno da trama ficcional ao
passado a fim de que o narrador elucide fatos que tornem viável a compreensão do presente e do
futuro do enredo. Em suma, os realistas fogem à subjetividade da memória, pois ela compromete a
verossimilhança.
OBRAS PRINCIPAIS
CONTOS: Contos fluminenses (1870), Histórias da Meia-noite (1873), Papéis avulsos (1882),
Histórias sem data (1884), Várias histórias (1896), Páginas recolhidas (1899) e Relíquias de casa
velha (1906)
ROMANCES:
– Primeira fase (tendência romântica): Ressurreição (1872), A mão e a luva (1874), Helena
(1876) e Iaiá Garcia (1878);
– Segunda fase (realista): Memórias póstumas de Brás Cubas (1881), Quincas Borba (1891),
Dom Casmurro (1899), Esaú e Jacó (1904) e Memorial de Aires (1908).
POESIAS: Crisálidas (1864), Falenas (1870), Americanas (1875) e Poesias completas – incluindo
Ocidentais (1901)
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1. O CONTISTA
Machado de Assis escreveu mais de duzentos contos, os quais impressionam pela qualidade
e variedade temática, abordando de maneira profunda seus temas preferidos. Duas marcas
linguísticas relevantes da narrativa curta machadiana são a concisão e a espantosa capacidade de
sugestão verbal.
Proponhamos uma tipologia de seus textos curtos, apesar de ser possível, em alguns casos,
que eles sejam enquadrados em mais de uma categoria.
– Conto alegórico-satírico: veiculam uma censura simbólica aos valores sociais, daí sua
ligação com a sátira. Podem burlar a verossimilhança. Exemplo: O alienista etc.
– Conto moral: relatam o aprendizado de protagonistas que adquirem novos valores éticos e
morais, ficando, nas entrelinhas, o convite para que também nós leitores façamos uma reflexão
pessoal. Exemplo: Conto de escola, O apólogo etc.
2. O ROMANCISTA
– Características da 1ª fase
Escritos ainda sob influência romântica, os quatro primeiros romances de Machado de Assis
apresentam: conformismo acerca da venalidade e da hipocrisia da sociedade burguesa ,
personagens-tipo e um certo gosto pelo uso de frases-feitas.
– Características da 2ª fase
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Memórias póstumas de Brás Cubas tornou Machado um escritor totalmente realista.
Vejamos, a seguir, as peculiaridades de sua genial produção sob o viés do Realismo.
ASPECTOS TEMÁTICOS
Hipocrisia, egoísmo, vaidade e interesse: o autor retrata um mundo onde o altruísmo foi
substituído pelo individualismo e pela velhacaria. Na competitiva sociedade burguesa, a
hipocrisia tornara-se a norma para seres incapazes de quaisquer atitudes grandiosas. Em uma
sociedade reificada a inexistência de merecimento fazia com que a subida social premiasse os
corruptos e aqueles que se valiam das aparências.
Adultério: os triângulos amorosos são uma obsessão de Machado, que praticamente veda a
autenticidade nas relações e instaura a falência do casamento nos moldes românticos.
Relativização da loucura: a glória da elevação moral acima do senso comum opõe-se à solidão
e ao banimento social dos desequilibrados. A fronteira entre loucura e razão é relativizada, já
que o conceito de sanidade está limitado aos valores de cada época. Exemplo: O alienista,
novela ferozmente irônica contra os conceitos prontos de loucura.
Poder absoluto e corrupção: além de sua usual vaidade, os poderosos surgem como despóticos
em seu propósito de manutenção do poder. Agem em prol do interesse individual e não do
bem público, como Simão Bacamarte, protagonista de O alienista.
Intenso ceticismo (niilismo), que se deve ao caráter temerário das tentativas de apreensão da
absoluta complexidade da realidade, marcada por hipocrisia, egoísmo, vaidade etc.
Universalismo: ao abordar os grandes temas humanos, Machado foi um dos mais geniais
investigadores da essência humana da história da literatura universal.
ASPECTOS FORMAIS
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Fina ironia: a aguçada veia irônica do autor desemboca em um humor sarcástico e demolidor
que propõe uma reflexão sobre a própria condição humana.
TRÊS OBRAS-PRIMAS
1869: falecido aos 64 anos, o defunto-autor Brás Cubas conta sua autobiografia. Menino
traquinas e mimado pelo pai, levou vida afora o modo malicioso de julgar a realidade. Aos 17 anos,
apaixonou-se por Marcela, uma espanhola que o iniciara no amor e, de certo modo, na corrupção.
Presenteava-a francamente e não demorou a se endividar. Furioso, Bento Cubas, seu pai, mandou-
o estudar na Europa. O julgamento de além-túmulo de Brás Cubas à amante não poderia ser mais
sarcástico: “Marcela amou-me durante quinze meses e onze contos de réis”.
Bacharelou-se em Direito, em Coimbra, sem nunca ter estudado com afinco, acabando por
aprender apenas a dissimular o que não sabia. Retornou ao Brasil e logo sua mãe faleceu.
Entristecido, foi para a chácara da família, em Tijuca, e lá conheceu a encantadora Eugênia, filha
de uma amiga de sua mãe. A moça era linda e espirituosa, porém coxa. Mesmo desapontado, Brás
manteve um rápido flerte com Eugênia; ele era muito apegado às aparências para desposar uma
coxa.
Fora influenciado pelo pai ao casamento e à política. Conheceu, então, sua nova paixão:
Virgília. Bento sonhava acordado com a carreira política do filho, já que a moça era filha de um
figurão da política. Mas seus planos fracassaram: surgira Damião Lobo Neves, e, mais talentoso e
ambicioso do que Brás, caíra nas graças do Conselheiro, que lhe deu a mão da filha. Bento Cubas
morreu de decepção após alguns meses.
Casada com Lobo Neves por interesse, Virgília viu o marido tornar-se deputado. Todavia, ela
amava Brás Cubas e eles tornaram-se amantes. Absorvido pela carreira política, Lobo Neves de
nada desconfiava. Os amantes viam-se em uma casinha em lugar ermo. Quem tomava conta da
casa era D. Plácida, uma antiga empregada de Virgília. Eis que Lobo Neves fora nomeado para uma
província distante, era a separação iminente de ambos, mas, por superstição, o político desistira
do cargo. Nova nomeação, desta vez o político fora para o interior com a esposa.
O já cinquentão Brás Cubas tentava esquecer a amante quando Sabina, sua irmã, arranjou-
lhe o casamento com Eulália Damasceno de Brito, a Nhá-Loló, moça de 19 anos. Embora sem
muita vontade, ele aceitou. Porém, Eulália morreu pouco antes do casamento, vitimada por uma
epidemia de febre amarela. Brás fez-se, então, deputado e o casal Lobo Neves e Virgília
retornaram à corte, todavia os ex-amantes não retomaram a antiga relação, estavam velhos...
Agora, a distração de Brás Cubas era ouvir seu amigo de infância, Quincas Borba, explicar-lhe seu
sistema filosófico: o Humanitismo.
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Morreram Quincas Borba e Lobo Neves, o que gerou sofrimento sincero em Virgília.
Obcecado pela invenção do Emplasto Brás Cubas, o narrador-personagem contraiu uma
pneumonia e também faleceu pouco depois. A narrativa se encerra com um balanço cético de sua
vida: “Ao chegar a este outro lado do mistério, achei-me com um pequeno saldo, que é a derradeira
negativa deste capítulo de negativas: – Não tive filhos, não transmiti a nenhuma criatura o legado
da nossa miséria.”
Comentários: Memórias póstumas de Brás Cubas inaugurou o Realismo brasileiro (1881) e foi nosso
primeiro romance psicológico. A presença de um “defunto-autor” e o modo ímpar com que este
conta suas memórias eram novidades: Brás escreve uma inverossímil autobiografia de além-túmulo,
relembra eventos e reflete, em flashbacks, sobre eles, em uma narrativa digressiva, cheia de
divagações e diálogos muitas vezes irônicos para com o leitor; note, portanto, a presença de
metalinguagem.
Citem-se o tema machadiano do adultério e o total pessimismo da obra, da qual não nos fica
na memória uma única atitude das personagens que não se baseie na corrupção e no
individualismo. Exemplo: o objetivo final do sonhado Emplasto Brás Cubas é a obcecada tentativa
de Brás de obter a imortalidade da fama absoluta, não a ajuda abnegada à sofrida humanidade.
Ao narrar, em 1ª pessoa, suas memórias após a morte, Brás Cubas desmascara os falsos
valores da sociedade. Ele próprio é um anti-herói, um tipo superficial, hipócrita, individualista e
tomado por um tédio existencial que tranca sua vida: não casou, não fez carreira no Direito, não
teve filhos; Brás é um homem “falhado”. Mencione-se ainda D. Plácida, cuja pobreza a faz tornar-
se alcoviteira dos amantes. Inicialmente, ela fica insatisfeita com a situação, mas muda de opinião
quando é presenteada por Brás com cinco contos de reis, passando a rezar por seu benfeitor. Sua
inconstância ética simboliza a corrupção das virtudes e o poder do dinheiro na dominação dos
ricos sobre os pobres.
QUINCAS BORBA
À janela de sua casa em Botafogo (RJ), Pedro Rubião de Alvarenga, o Rubião, compara o seu
presente (capitalista) ao passado recente (professor primário em Barbacena (MG)). Sua rápida
ascensão social dera-se por causa da amizade com Joaquim Borba dos Santos, o filósofo Quincas
Borba, que, ao chegar a Barbacena, se apaixonara por Maria da Piedade, a irmã de Rubião.
Malgrado viúva, Piedade negara-se à corte do rico Quincas Borba, vindo a falecer pouco depois.
Entretanto, o triste fato não separou Rubião e o filósofo, e, quando este começou dar sinais de
demência, aquele fechara sua escola para cuidar do amigo, o qual lhe ensinava sua filosofia, o
Humanitismo.
O filósofo, um pouco melhor, fora visitar Brás Cubas no Rio de Janeiro, de onde enviara uma
carta a seu discípulo, dizendo-se Santo Agostinho. Estava louco. Esperançoso de ser lembrado no
testamento de Quincas, Rubião temeu que todos descobrissem o real estado de saúde do filósofo,
que, assim, seria julgado incapaz de gerir sua fortuna, levando à anulação do testamento. Por isso
ele rasgou a carta comprometedora. Rubião soube da morte de Quincas pelo jornal. Após alguns
dias, ele recebeu uma carta de Brás Cubas com uma novidade bombástica: era o herdeiro universal
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do filósofo, sob uma única condição: cuidar do cachorro de Quincas Borba, homônimo de seu
falecido dono.
Na viagem a corte, onde iria morar, Rubião conhece Cristiano de Almeida Palha, um
capitalista, e sua esposa, Sofia, que o impressiona por sua beleza e simpatia. Ingenuamente, o
provinciano diz a eles ter recebido vultosa herança, despertando-lhes súbito interesse. O mineiro
passa a frequentar a casa de Cristiano e torna-se seu sócio em uma casa de importação. Apaixona-
se por Sofia, de quem recebe delicadezas e olhares insinuantes.
Depois de pagar dívidas de Palha e fazer-lhe muitos favores, Rubião declara-se a Sofia, que
se faz de desentendida. Mostrando-se ofendida, ela sugere ao marido que rompam relações com
Rubião. A investida do sócio incomoda Palha, contudo ele contemporiza, pois não podia saldar
suas dívidas com o mineiro, além de não estar disposto a abrir mão das conveniências econômicas
desta amizade. Calculista, Sofia volta a bajular Rubião, mantendo-o enamorado. Cego de amor, ele
se torna vítima de uma corja de bajuladores, que, afetando autêntica amizade, aos poucos,
dissipam seus bens.
O belo e jovem conquistador Carlos Maria corteja Sofia, que se mostra atraída, acentuando
a angústia e o ciúmes de Rubião. Cristiano planeja casar seu sócio com Maria Benedita, a prima
da Sofia, mas ela se casa com Carlos Maria, para alegria de Rubião. Tendo se valido, a bel-prazer,
do capital do mineiro, Cristiano põe fim à sociedade . Já enriquecido, o casal Palha dispensa o
dinheiro do ex-sócio, de quem se afasta gradualmente. Por sua vez, Rubião continua investindo
em projetos disparatados, apesar de sua herança estar muito combalida.
Empobrecido e desprezado por todos, Rubião tem delírios de grandeza e poder; estava
louco. Em um surto, fala com Sofia, tratando seu amor como algo consumado e recíproco. Crendo-
se a causa da doença de Rubião, ela se penaliza. O mineiro é internado em uma casa de saúde,
mas foge em companhia do cão. De volta a Barbacena, dormem na rua e apanham chuva. Rubião
pega pneumonia, morre coroando-se Napoleão III e proferindo a frase de Quincas Borba: “Ao
vencedor, as batatas!” Saudoso de seu dono, o cachorro também adoece. Desesperado, foge em
busca de Rubião e é encontrado morto na rua após três dias.
Comentários: dissimulada, Sofia é a típica mulher machadiana. Malgrado sua grande complexidade
psicológica, mas não está a salvo das leis que regem o coração: passa de dominadora de Rubião a
dominada por Carlos Maria, por quem se apaixona. Quincas Borba é o homem fortalecido pela
verdade que criou para si: o Humanitismo. Em nome de sua filosofia, humaniza seu cão e o batiza
com seu nome, deixando-lhe sua fortuna, da qual Rubião era apenas o depositário. Certo de que o
Humanitismo encerra uma verdade superior, Quincas não se desespera sequer perante a morte ou
a falta de seguidores, já que Rubião não entendia sua doutrina. Tudo isso estava previsto!
A demência de Rubião está mais para o grotesco e o risível do que propriamente para o
trágico. Uma vez louco, ele adquire nobreza e elevação moral, tornando-se uma espécie de
seguidor de Quincas Borba, de quem herdou o Humanitismo, a fortuna e a própria loucura.
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De novo a obra traz um profundo pessimismo. Suas personagens mostram extremos egoísmo
e interesse material, exceto o cão Quincas Borba, ironicamente, a única ligação de fato autêntica
de Rubião. Aliás, note-se sua dupla reificação: faz-se amigo do filósofo só por estar de olho em sua
herança, tornando-se, a seguir, vítima de uma tropa de parasitas. É a típica ironia do destino, algo
recorrente em Machado.
DOM CASMURRO
Bentinho (o narrador) era órfão de pai; sua mãe, D. Maria da Glória Santiago, tinha uma vida
confortável. Aos 15 anos, ele ouviu uma inusitada conversa: José Dias, o agregado da família,
advertia D. Glória de que o cumprimento de sua promessa (fazer do filho um padre) podia estar
em risco se o rapaz “pegasse de namoro” com a sua vizinha: Capitolina Pádua (Capitu), 14 anos.
Ainda que discordasse de José Dias, D. Glória decidiu apressar a execução de sua promessa. Bento
só então soube que suas inocentes relações com Capitu tinham o caráter de um namoro. Os
jovens descobriram o amor mútuo. Muito esperta, Capitu planejou fazer de José Dias um aliado
para libertar Bentinho do sacerdócio, contudo não lograram sucesso. Em vão o menino confessou
à mãe sua falta de vocação religiosa.
Cosme, o irmão de D. Glória, e a Prima Justina, beata também viúva e que habitava a casa há
anos, lavaram as mãos e a mãe de Bentinho mandara-o para o seminário. Antes da partida, os
jovens juraram apenas se casarem um com o outro. No seminário Bentinho travou forte amizade
com Ezequiel de Sousa Escobar. Já Capitu fez-se muito amiga de D. Glória, que dela se afeiçoou
tanto que passara a crer que o desenlace mais adequado para o filho seria apaixonar-se pela filha
do vizinho e com ela se casar. Seria Bentinho quem quebraria a promessa e não ela...
Escobar teve uma ardilosa ideia para livrar o amigo da batina: D. Glória deveria adotar um
órfão e pagar-lhe os estudos no seminário. Para Escobar, ela prometera dar a Deus um padre, no
entanto não afirmara que este seria necessariamente seu filho. Consultadas as autoridades, o
engodo é aceito.
Bentinho formou-se em Direito aos 22 anos. Escobar, também egresso do seminário, tornou-
se um abastado comerciante, casando-se com Sancha, amiga de Capitu. Bentinho e Capitu casam-
se. Ele progride na advocacia. Tivessem um filho e a felicidade do casal seria completa. Chegam
mesmo a invejar Escobar e Sancha, pais recentes da menina Capitolina. Passados alguns anos,
enfim nasceu Ezequiel. A felicidade parecia absoluta.
Os casais estavam ainda mais unidos, planejando até um futuro casamento entre
Capituzinha e Ezequiel, que era uma criança irrequieta e curiosa. Os desgostos de Bento se
iniciaram em 1871. Certa feita Escobar desafiou o mar em um dia de intensa ressaca e morreu
afogado. Ao fim do velório, enquanto amparava Sancha, Capitu olhara de maneira tão enigmática
para o corpo de Escobar que Bentinho ficara perturbado. Posteriormente, isso serviria como
argumento para que ele justificasse sua absoluta certeza de que fora traído pela esposa.
Capitu chamara a atenção do marido: Ezequiel tornava-se muito parecido com Escobar. O
tempo acentuou ainda mais tal semelhança, dando a Bento a certeza da traição. A crise no
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matrimônio principiara. Bento já não suportava o filho. Perturbado, decidiu suicidar-se bebendo
veneno. Surpreendido pela chegada de Ezequiel, resolveu dar ao garoto o café com veneno, mas
desistiu no último instante. O evento acarretou séria discussão do casal. Bento, então, deliberou
pela separação, só restando a Capitu ir morar na Europa com o filho. A fim de simular harmonia
entre ambos e salvar as aparências, Bento viajara algumas vezes ao Velho Mundo, todavia jamais
os reencontrara.
Certo dia, Bento é visitado por Ezequiel, já um belo rapaz, cada vez mais parecido com
Escobar. Capitu morre e é enterrada na Europa. Após alguns meses no Brasil, Ezequiel parte para o
Oriente Médio com o intuito de aprimorar seus estudos em Arqueologia. Meses depois, morre de
febre tifoide em Jerusalém.
Com a morte de todos aqueles a quem Bento Santiago afeiçoara-se ao longo da vida, ele
torna-se o austero Dom Casmurro de raros amigos e amigas, estas o consolam, em parte, da
intensa solidão. Lamuria-se ao assegurar que nenhuma de suas recentes amigas consegue fazê-lo
esquecer Capitu, sua primeira paixão e, ironia do destino, aquela que o enganara com seu melhor
amigo.
Comentários: Bento divide-se ora no menino e jovem, segundo ele mesmo, ingênuo; ora no
cinquentão cético. Para ele, a Capitu adulta já demonstrava sua personalidade dissimulada e
velhaca desde criança. Porém, a certeza da traição afirmada por Bento é a opinião de um narrador
de 1ª pessoa, imparcial e nada confiável. Capitu traiu ou não Bento? Isso não passa de uma mera
ilação, nada no texto ratifica ou refuta de fato o adultério . A trama foi urdida de forma que
argumentos pró e contra sua pretensa traição se sucedem. Capitu é uma das mais complexas e
instigantes personagens da literatura universal, seus “olhos de cigana oblíqua e dissimulada”
ilustram a dubiedade de um ser invulgar. Faz de sua inteligência e sensualidade armas com que, de
certa forma, alcançou a ascensão social pelo matrimônio.
José Dias personifica o homem branco livre sem posses e cuja sobrevivência depende de
uma família de brancos com posses. Ele é hábil em mascarar sua completa obtusidade por meio de
um discurso grandioso e cheio de superlativos, no entanto vazio. Bajulador e com raríssimas
convicções, José Dias não se importa de que elas oscilem continuamente, pois que busca adequá-
las aos interesses da família de que é agregado.
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NATURALISMO
CONSIDERAÇÕES INICIAIS
CARACTERÍSTICAS
Outra figura exponencial para o romance naturalista, o intelectual francês Hippolyte Taine
criou a teoria do Determinismo. Segundo essa tese, três fontes diversas contribuem objetivamente
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para produzir o estado moral e o comportamento elementares do homem: o meio, a raça
(hereditariedade) e o momento histórico, conforme especificado a seguir.
DETERMINISMO DO MEIO: Aponta que o indivíduo é uma extensão do meio onde vive. Assim,
tipos que habitam ambientes abjetos e promíscuos têm uma conduta coerente com sua realidade,
tornando-se criaturas aviltadas, luxuriosas, obtusas. Em seu pessimismo, as obras naturalistas
narram condutas humanas degradadas e bestiais como extensão de ambientes imundos e sórdidos.
Na segunda metade do séc. XIX, ressurgia a velha tentativa de interpretar a conduta humana a
partir das diferentes raças e etnias. Logo, o europeu era sempre elevado a símbolo de pureza e
vigor, enquanto os povos miscigenados (entre outros, os americanos) eram tidos como fracos
racialmente. Nossos romancistas não raro reduziram o tipo brasileiro como um temperamento
extrovertido, festivo, expansivo, além de sensual e luxurioso.
DETERMINISMO DO MOMENTO HISTÓRICO: Destituídas de personalidade própria, as personagens
naturalistas não podem fugir às injunções de seu momento específico, tendo em suas ações meros
reflexos da filosofia de vida da classe social a que pertencem. Subordinando a ficção à Sociologia, as
obras naturalistas europeias muitas vezes denunciavam as mazelas sociais decorrentes do
capitalismo, bem como a óbvia luta de classes entre burguesia e proletariado; exemplo: o célebre
Germinal, de Émile Zola, romance que denuncia as subumanas condições de sobrevivência dos
trabalhadores franceses das minas de carvão.
AUTOR E OBRAS
Obras:
O CORTIÇO
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O português João Romão herdara uma taverna em Botafogo e algum dinheiro de seu ex-
patrão por tê-lo ajudado a enriquecer. Ascendia de empregado a patrão, passando a ter a ajuda na
venda de Bertoleza, uma escrava não forra e que aluga sua liberdade. Desde então o galego
desenvolvera a obsessão por enriquecer, passando a mourejar dia e noite junto à Bertoleza.
Tanto pelo trabalho, como pela tapeação dos clientes no troco, nas medidas e nos pesos dos
produtos da tasca, João Romão não demora a conseguir o dinheiro para comprar um terreno
baldio de tamanho razoável entre sua venda e o sobrado de Miranda, português que é atacadista
de tecidos. Nesse terreno, o vendeiro constrói casinhas e começa o cortiço. A gentalha que mora
nos casebres enfurece Miranda por ser um populacho roto e por sempre falar, aos berros, os
maiores disparates.
João Romão segue sua obstinada escalada rumo à ascensão social. Batizado de Carapicu, o
cortiço logo fica lotado de casinhas, todas ocupadas. Além do aluguel dos cubículos e do lucro da
bodega, ele instala, em uma faixa de terreno à frente da estalagem, tinas para que as mulheres
lavem roupa para fora e, assim, ajudem seus maridos no sustento das famílias. O aluguel das tinas é
cobrado diariamente. Os homens tampouco escapam à exploração do filho do reino, que comprara
parte de uma pedreira nos fundos da venda, empregando-os por salários baixíssimos... João Romão
transformava em lucro tudo o que tocava.
Embora rico e respeitado, Miranda vive um conflito familiar: odeia Estela, sua esposa
adúltera. Eles têm uma filha, chamada Zulmira, a quem execram. Ainda que o casal nutra aversão
mútua e sequer se fale, ambos passam a manter um acordo velado de felicidade sexual, isto é,
eventualmente se entregam ao sexo desabrido.
Já então excedendo Miranda em riqueza, João Romão passa a invejá-lo por seu status social.
O vendeiro vê a possibilidade de entrar nas altas rodas da sociedade carioca casando-se com
Zulmira. Devidamente pago por João Romão, um velho agregado da família de Miranda chamado
Botelho fica encarregado de mediar o arranjo. De olho na riqueza de seu até então inimigo,
Miranda aceita a tramoia.
João Romão passa a namorar Zulmira e a frequentar o sobrado de Miranda. Contudo, surge
um entrave para a união: Bertoleza, que vivera maritalmente com o taverneiro e tanto contribuíra
para sua ascensão, não se mostra disposta a deixar-lhe o caminho livre. João Romão, irado, cogita
matar a negra, mas não tem coragem. Tendo falsificado uma carta de alforria e embolsado o
dinheiro que a escrava pagava mensalmente pela liberdade, ele decide entregá-la a seu ex-dono,
que a tinha por fugida. Os policiais chegam à venda e cercam Bertoleza, que logo entende que o
companheiro a descartava com o ardil de restitui-la ao ex-dono e que seria presa e castigada
exemplarmente. Em uma cena de enorme realismo descritivo, a negra suicida-se ao rasgar o
próprio ventre com a faca com que escamava peixes.
Abre-se o caminho para que João Romão se una a Zulmira e ascenda socialmente,
angariando, agora, o reconhecimento da elite. No exato momento em que Bertoleza, explorada e
humilhada, suicida-se, chega à casa do vendeiro uma comissão de abolicionistas para fazê-lo sócio
da instituição. Ele entrava de vez para a nata social carioca e obtinha o título de Visconde – superior
a Miranda, que era Barão –, sobrepujando totalmente o futuro sogro.
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O CORTIÇO: DETERMINISMO EM DUAS FACES
Típica narrativa de coletividade, a obra põe em evidencia o aglomerado humano que habita
a estalagem. Com incrível vigor descritivo, o autor pinta a podridão, a promiscuidade e a sujeira
geral do ambiente e mostra sua influência na vida dos moradores, de maneira a ditar seu
comportamento e a aviltá-los:
Aos poucos o cortiço vai tornando-se uma espécie de organismo com vida própria, e, à
medida que cresce, respeita leis evolutivas autônomas ao universo que o cerca. A luta cotidiana
pela sobrevivência traz a este mundo à parte um tumulto que animaliza seus moradores.
Complementares, os dados a serem analisados neste triste quadro são a pobreza, a sordidez do
meio e a animalização (zoomorfismo) dos tipos.
Lavadeiras, prostitutas, soldados rasos, caixeiros e operários, além de capoeiras, bêbados e
vagabundos habitam o cortiço. Pela primeira vez em nossa literatura víamos descrito o dia a dia de
tal classe. A seguir salientaremos algumas figuras neste amontoado humano.
A bela Pombinha era ainda impúbere aos 18 anos. Criatura afável e uma das poucas pessoas
alfabetizadas da estalagem, ela ajuda a todos. É abusada sexualmente por sua madrinha, Léonie,
uma prostituta da elite. No calor das carícias, a menina se excita e sente prazer. Embora se sinta
humilhada, esta relação faz com que Pombinha tenha sua menarca e desabroche para uma
sexualidade doentia. Casa-se, mas é infeliz. Torna-se adúltera e deixa o marido para ir morar com
Léonie, de quem se torna amante e emérita discípula na prostituição. Ao tornar-se vítima de seus
próprios instintos, Pombinha tipifica o Determinismo da raça.
Rita Baiana desperta os instintos do europeu para um frenesi sexual desconhecido até então.
Dando vazão ao Determinismo da raça, também a mulata era impelida por seus bestiais impulsos
sexuais aos braços do europeu, visto, inconscientemente, como o macho superior.
Enfeitiçado por Rita, Jerônimo, aos poucos, se cansa da culinária de sua terra, preferindo o
tempero da comida de sua nova amiga, o café, a cachaça e o fumo; em suma, abrasileirava-se ao
ser vencido pelo Determinismo do meio. Após brigar com Firmo, capoeirista e namorado da
mulata, o galego o assassina em uma emboscada e une-se a ela, perdendo-se de vez. Deixa a
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família e o Carapicu e vai viver com Rita em outra estalagem; torna-se luxurioso, brigão,
preguiçoso e bêbado. A crítica literária assinala o abrasileiramento dos sentidos que vitima o
europeu ainda por conta de seu contato com a natureza (clima) tropical, em especial o sol, cujo
calor relaxa o equilíbrio e a severidade, incitando à preguiça e às transgressões morais e sexuais.
Tendo perdido seu esposo, Piedade também se corrompe; vive embriagada e é abusada
sexualmente na estalagem. Mesmo Senhorinha tem seu futuro comprometido, já que Jerônimo
deixara de pagar a escola particular onde ela estudava, anunciando outro destino aviltado. Toda a
família fora destruída pela influência do abjeto meio do cortiço.
O cortiço apresenta linguagem direta e objetiva, a qual não raro beira a escatologia no
intuito de caracterizar a enorme podridão do cenário físico e humano. O narrador, em 3ª pessoa,
não apela ao paternalismo ou ao sentimentalismo ao descrever as durezas da vida cotidiana desta
pobre gente, deixando as devidas conclusões para o leitor.
38
PARNASIANISMO
CONSIDERAÇÕES INICIAIS
A escola surgiu nos anos 1860 na revista francesa Parnasse contemporain, que tinha como
colaboradores os poetas Théophile Gautier, Lecomte de Lisle e Charles Baudelaire. Este, um
legítimo gênio, rompeu posteriormente com a estética parnasiana, influenciando vivamente o
Simbolismo.
CARACTERÍSTICAS
IDEAL LATINO DA “ARTE PELA ARTE”: Os parnasianos mostraram total alienação social, validando
o enriquecimento da burguesia, deslumbrada com o capitalismo industrial. Produto da dita belle
époque, o movimento fez da poesia a expressão de um mundo festivo e elegante, típico dos
refinados cafés e cabarés parisienses. Os poemas mostravam total indiferença acerca dos dramas
sociais ou individuais das massas, postura que ficou conhecida como torre de marfim.
O Parnasianismo retomou o ideal latino da “arte pela arte”, segundo o qual a poesia deve
bastar-se enquanto beleza estética, nunca recaindo em qualquer utilitarismo, como a crítica social.
O poeta devia tratar tão-somente de conteúdos de bom gosto, abordando apenas fatores estéticos.
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OBSESSIVO CULTO À FORMA: Para os parnasianos, a arte devia buscar só a beleza estética,
concretizada na absoluta perfeição da forma. O poeta partia dos índices FORMA, BELEZA ESTÉTICA
e VERDADE, seguindo uma relação na qual a beleza seria o critério de verdade superior, obtida pela
beleza estética, concretizada na perfeição formal.
O esteticismo poético parnasiano gerou um obcecado culto à forma, que não raro relegou a
segundo plano o conteúdo. Essa verdadeira obsessão pela perfeição formal baseava-se nas regras
abaixo:
Preferência pelo soneto: se possível com chave de ouro: mantendo a tradição clássica;
A TEMÁTICA DA ANTIGUIDADE CLÁSSICA: Era preciso um temário mais abrangente para a estética
do que a mera descrição de objetos, daí a abordagem reiterada da Antiguidade clássica: a
mitologia greco-latina, símbolo de racionalismo e erudição, a História da Grécia e de Roma
Antigas. Aliás, o nome da estética ilustra a exaltação da Antiguidade Clássica: o termo
Parnasianismo faz referência ao Parnaso grego, que, de acordo com a lenda, era um monte
consagrado a Apolo e às musas, localizado na região da Fócida, na Grécia Central.
POETAS E OBRAS
CARACTERÍSTICAS GERAIS
Execrado por alguns devido ao artificialismo de sua obra; louvado por outros por seu talento
técnico, ele foi o poeta mais popular do nosso Parnasianismo, chegando a ser premiado com o
pomposo título de Príncipe dos poetas brasileiros. Bilac escreveu uma vasta e tematicamente
variada obra, cuja forma é invariavelmente parnasiana. Vejamos os detalhes de seus livros.
40
Transcrevemos, a seguir, trechos de Profissão de fé:
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Direis agora: ‘Tresloucado amigo!
Que conversas com elas? Que sentido
Tem o que dizem, quando estão contigo?’
Pertence à veia patriótica ufanista do poeta, à qual se juntam sonetos que louvam a natureza
brasileira e a própria língua portuguesa. O civismo exótico marcou a própria biografia de Bilac, que
escreveu livros didáticos para estimular as crianças ao amor pátrio, defendeu o serviço militar
obrigatório e o republicanismo, além de compor o Hino à bandeira.
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O herói deste poema épico-cívico é o bandeirante Fernão Dias Paes Leme, ícone da luta pela
civilização da pátria. Note que, ao retomar o passado histórico e forjar heróis nacionais corajosos e
um futuro grandioso para a nação, Bilac acaba fugindo de tratar do subdesenvolvimento brasileiro
de fins do séc. XIX. Merecem alusão as belas descrições da nossa natureza.
3. TARDE (1919)
Obras principais: Meridionais (1884), Versos e rimas (1895) e O livro de Ema (1900)
CARACTERÍSTICAS GERAIS
Foi o nosso mais pragmático parnasiano, seguindo à risca os preceitos da escola, como o ideal
da “arte pela arte”. Sua poesia é fria e intelectualizada, marcada pela temática greco-romana e pelo
descritivismo obsessivo (objetos de bom gosto: vasos chineses e gregos, estátuas, um muro etc.).
Seus poemas denotam quase absoluta impessoalidade e repetição do preciosismo formal e
linguístico, como é o caso de Vaso chinês:
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RAIMUNDO CORREIA (1859-1911)
Obras: Primeiros sonhos (1879), Sinfonias (1883), Versos e versões (1887) e Aleluias (1891)
CARACTERÍSTICAS GERAIS
Primeiros sonhos é um livro de tardia influência romântica, sobretudo por sua simplicidade
técnica. Raimundo Correia fez-se parnasiano nas obras seguintes, que expressam os traços
essenciais de sua lira, em especial o enorme talento na descrição da natureza brasileira , obtendo
notável plasticidade.
A crítica refere nuances simbolistas na lírica de Raimundo Correia nos poemas Banzo e
Plenilúrio, que possuem uma certa aura metafísica. Deixando por vezes de lado a frieza e a
sobriedade parnasiana, seus versos costumam conter emoção genuína, fina melancolia e niilismo
quanto à vida humana, vista como um constante desenrolar de tristezas e desenganos. Porém,
tampouco ele escapou aos clichês pseudofilosóficos parnasianos, tal qual se vê Mal secreto, que
registra a necessidade imposta pela sociedade de que dissimulemos os nossos mais autênticos
sentimentos:
– VICENTE DE CARVALHO (1866-1924). Obras: Ardentias (1885); Relicário (1888); Rosa, rosa
de amor (1902) e Poemas e canções (1908)
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– FRANCISCA JÚLIA (1874-1920). Obras: Mármores (1895) e Esfinges (1903)
SIMBOLISMO
CONSIDERAÇÕES INICIAIS
Surgiu na França de fins do séc. XIX com os poetas Charles Baudelaire, Paul Verlaine e
Stéphane Mallarmé. As publicações do Manifesto decadente e do Manifesto simbolista (1886)
definiram as bases ideológicas da poesia simbolista como uma oposição ao Realismo-Naturalismo e
ao Parnasianismo, bem como a prerrogativa de que a civilização burguesa vivia uma total
decadência moral e espiritual, tornando a vida um grande mal-estar, suportável apenas pelo gozo
dos prazeres mais radicais.
CARACTERÍSTICAS
ROMPIMENTO ENTRE ARTISTA E SOCIEDADE: Há quem considere o Simbolismo uma extensão (ou
potencialização) dos preceitos do Romantismo, como o rompimento entre a visão de mundo
sensível e subjetiva do artista e o mecanicismo da sociedade. O eu-lírico simbolista vive um extremo
mal-estar quanto à filosofia de vida materialista da burguesia e o Cientificismo racionalista da
segunda metade do séc. XIX, fugindo da realidade imediata e assumindo a típica postura da “torre
de marfim”.
45
inconsciente e do subconsciente. Assim, a lírica simbolista negou a objetividade realista e a
impassibilidade parnasiana, preferindo, ao contrário da pormenorizada descrição de objetos, a
sugestão de estados de alma inefáveis e etéreos.
SINESTESIAS E MUSICALIDADE: Hermética ou de difícil interpretação, essa poesia apela antes aos
sentidos do que ao intelecto. Os poetas simbolistas empreenderam sugerir sensações tão sutis e
estados de alma tão subjetivos que tiveram que propor uma reinvenção da linguagem, que valorizou
os neologismos e pela tradução verbal de sensações fugidias ao associarem cores, cheiros, sons etc.
(sinestesias). Enfim, a linguagem simbolista extrapolou o teor metafórico e tornou-se cifrada,
simbólica, incidindo no uso de maiúsculas alegóricas; além de demonstrar enorme musicalidade, em
um profusão de aliterações e assonâncias.
ANGÚSTIA CÓSMICA E CULTO À BRANCURA: O mal-estar simbolista para com a realidade levou os
poetas à angústia cósmica, gerando a busca de transcendência e de espiritualização. Trata-se de
uma poesia bastante mística e religiosa, o que é sugerido pela ampla presença de índices que
evocam a cor branca: espumas, neblinas, brumas, neve, lua, marfim etc. (culto à brancura).
Portanto, a cor branca é elevada a símbolo da pureza e da transcendência tão desejadas.
PRINCIPAIS POETAS
Obras: Broqueis e Missal (1893), Evocações (1899), Faróis (1900) e Últimos sonetos (1905)
CONSIDERAÇÕES INICIAIS
Dividimos, com fins didáticos, sua poética em alguns núcleos temáticos, conforme se segue.
Os versos de Cruz e Sousa possuem uma musicalidade incomum, como ele mesmo aconselha
aos demais poetas em Arte, metapoema do qual transcrevemos uma das últimas quadras:
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Como se o coração, nessas supremas
Estrofes, puro e diluído fosse.”
Servindo para sugerir sutis estados de alma, as sinestesias são outra constante na obra do
poeta catarinense, que praticamente elimina de sua lírica o mundo concreto, substituído por
alegorias cromáticas, atmosferas vagas e abstratas.
A maior das obsessões de Cruz e Sousa é o culto à brancura, desenvolvido no que a crítica
chamou de um “lirismo estelar”, ou seja, inúmeras vezes os versos d o poeta trazem efeitos de
meia-luz e penumbra cortadas por fúlgidos clarões de astros, estrelas, da lua, do sol e mesmo de
cristais e círios. Ainda que de maneira contestável, especialistas atribuíram a obsessiva brancura
de sua poesia à tentativa do poeta de negar (disfarçar) sua origem (negro e filho de escravos
alforriados) e como tradução simbólica de seu desejo inconsciente de arianismo.
A brancura na poesia cruzesouseana tem ainda o intuito de sublimar o erotismo. Cruz e Sousa
não descreve a figura feminina com realismo e concretude (como Olavo Bilac), mas de forma
indefinida e nuançada. Embora a leveza feminina, a mulher (o erotismo) é sempre abordada como
uma ameaça, um perigo a atordoar o eu-lírico. Oprimido pela presença feminina, o eu poético só
deseja sublimar e transcender seus instintos sexuais. Note o modo demoníaco com que é abordada
a figura feminina em Braços:
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A sublimação dos instintos sexuais desemboca na absoluta negação a tudo o que é material e
mundano, gerando um invariável desejo de pureza e um profundo platonismo na poesia de Cruz e
Sousa. A discordância entre a realidade imediata (vida terrena em seus mais diversos aspectos) e o
platonismo (vida ideal supra terrena) é o tema central do soneto Cárcere das almas:
Observe ainda que não raro os versos de Cruz e Sousa trazem o desejo de morte como
libertação suprema e fim óbvio do sofrimento terreno que vivencia o sujeito lírico.
Toda a obra do poeta catarinense traz uma forte tendência à inquirição filosófica sobre o
sentido da vida humana, reduzida a um infindável sofrimento. Inerente à própria condição do
homem, a dor existencial por vezes gera um maior contato com a realidade terrena na obra de
Cruz e Sousa, conforme os versos do ilustre Litânia dos pobres:
Bandeiras estraçalhadas
Das sangrentas barricadas.”
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Comentários: dor existencial e solidão humana são os temas do poema, que denota alguma crítica
social, já que é ambíguo o sentido dado aos termos “ miserável”, “rotos”, “esgotos” e “fome”. É
ainda possível uma leitura autobiográfica do texto ao lembrarmos da vida miserável que o poeta
enfrentou, chegando mesmo a passar fome com sua família no Rio de Janeiro, haja vista não ter
conseguido emprego por ser negro.
Saliente-se o tema da ascese, que parece surgir de uma religiosidade filosófica, reservando
ao sujeito poético uma singular paz de espírito diante dos horrores com que a vida nos esmaga,
como em Sorriso interior:
Obras principais: Dona mística (1899), Câmara ardente (1899) Septenário das dores de Nossa
Senhora (1899) e Kyriale (1902)
CONSIDERAÇÕES INICIAIS
1. A MORTE DA AMADA
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Saliente-se o teor autobiográfico da obra alphonsina. Formado em Direito em São Paulo, o
poeta morou em várias cidades mineiras, onde exerceu a função de juiz. Já maduro, apaixonou-se
por Constança, sua prima, 17 anos. Pouco antes do casamento, contudo, a menina morreu de
tuberculose, o que se tornou o tema mais recorrente na obra de Alphonsus e acarretou o tom
elegíaco, fúnebre e mórbido de seus versos, além dos intensos sofrimento, angústia e pessimismo.
Definem sua lírica a soturnidade, a melancolia, a nostálgica e a autocomiseração por ver-se
abandonado pela amada, bem como o desejo de morrer para reencontrá-la:
Comentários: os versos trazem a imagem simbólica do velório da amada morta, fim das
esperanças de felicidade do eu-lírico, cuja alma tornou-se uma “sublime e dorida grinalda/ de
saudades”. Através de metáforas, o eu poético antevê o sofrimento (“sirtes” e “urzes”) e a solidão
de sua vida terrena após a perda de seu amor. Ressaltem-se a linguagem musical e o uso de
maiúsculas alegóricas no texto, além de sua essência autobiográfica.
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Agoniza o arrebol2.
Comentários: o meio geográfico mineiro, com suas cidades nos vales e o raiar nevoeirento de cada
novo dia, é, aqui, transformado em um evanescente ambiente simbolista. O eu-lírico sonha com
uma catedral (outra alusão à cor local de Minas Gerais) cujos sinos dobram soturnamente, em uma
comunhão com sua dor (refrão).
3. O LIRISMO RELIGIOSO
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3. Messe: colheita.
4. Requiest in pace: descanse em paz, em latim.
Comentários: o poema possui um tom fúnebre por simular uma oração de corpo presente,
característica dos velórios cristãos. O refrão, o título e a estrutura evidenciam a essência religiosa do
texto. Responsorium traz outro traço usual da lira alphonsina: o louvor à absoluta pureza de sua
musa inspiradora, cujo “olhar se apagou sem que nunca pecasse” e lábios que apenas se dedicaram
às preces (rezas) e não aos beijos. Novamente se pode ligar a musa louvada à Constança. Note outro
tema típico da poesia alphonsina: a fusão entre o terreno (símbolo de dor e tristeza) e o divino
(sublimação e espiritualização), revelada no dito platonismo místico, isto é, poemas onde as duas
figuras adoradas pelo eu-lírico (a amada morta e Nossa Senhora) são como que fundidas em um só
ente.
Por vezes há uma veia medievalista na lírica de Alphonsus, onde o sujeito lírico assume o
papel de um trovador e louva sua amada como uma dama ou princesa. Também o inconsciente e
as zonas profundas e desconhecidas da mente interessaram o poeta mineiro, como em Ismália:
E, no desvario seu,
Na torre pôs-se a cantar...
Estava perto do céu,
Estava longe do mar...
Comentários: este poema nos traz uma das imagens mais líricas (tocantes) em relação ao tema do
suicídio. Ismália, em um misto de sonho (ou loucura?) e desespero, coloca-se no alto de uma
torre, de onde busca alcançar as duas luas que vê: a que está no céu e a que está no mar. O
curioso é que, paradoxalmente, a lua no céu, simbolizando o sonho inatingível, é a lua real;
enquanto a lua no mar, reflexo, versão irreal da outra, é a que está próxima da realidade, da
morte, desfecho trágico e apenas sugerido ao final do texto: “As asas que Deus lhe deu/ Ruflaram
de par em par.../ Sua alma subiu ao céu”. Por fim, o texto ratifica ainda duas tônicas da poesia de
Alphonsus: a visada medievalista, presente na métrica dos versos (redondilhas); e a forte
religiosidade, evidenciada no vocabulário selecionado, que alude ao universo cristão (“Deus”,
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“anjo” e “alma”). (FISCHER, Luís Augusto; FISCHER, Sergio Luís. Poesia brasileira: Do Barroco ao Pré-
Modernismo. Porto Alegre: Novo Século, 2001, p. 186. Adaptado.)
IMPRESSIONISMO
A tela em questão marcou a história da arte devido a abrir mão de uma descrição plástica da
aurora com a pretensão de parecer uma fotografia o mais realista possível (a dita arte acadêmica)
para pintar um nascer do sol, marcado pelo olhar pessoal do artista e por uma relativa abstração.
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Tomadas no conjunto das obras e artistas, as características centrais do Impressionismo
foram a já citada quebra dos preceitos do realismo aristotélico e das normas acadêmicas de
pintura; a sugestão de luz e de movimento por meio de pinceladas soltas, elemento central da
estética; e a obsessiva tentativa de capturar melhor as variações de cores da natureza flagrada à
luz solar, daí que as telas geralmente fossem pintadas ao ar livre. Os nomes mais relevantes foram
Monet, Manet, Degas e Renoir.
Última obra do artista, Trigal com corvos (1890) foi descrita pelo próprio como “vastas extensões
de trigo sob céu tormentoso...”, ao que acrescentou ainda que não precisou se esforçar para
expressar tristeza e extrema solidão. “Observe como as pinceladas são bem visíveis e as cores
pouco se misturam. Note, ainda, que os elementos que compõem a paisagem (...) são apenas
sugeridos ao observador.” (PROENÇA, Graça. Descobrindo a História da arte. São Paulo, Ática,
2005, p. 177.)
IMPRESSIONISMO LITERÁRIO
CONSIDERAÇÕES INICIAIS
AUTOR E OBRA
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Obra principal: O Ateneu (1888)
“Faça-se forte aqui, faça-se homem. Os fracos perdem-se (...). Os rapazes tímidos,
ingênuos, sem sangue, são brandamente impelidos para o sexo da fraqueza; são
dominados, festejados, pervertidos como meninas ao desamparo”.
“Aí vão as carinhas sonsas, generosa mocidade... Uns perversos. Têm mais pecados na
consciência que um confessor no ouvido; uma mentira em cada dente, um vício em cada
polegada de pele. Fiem-se neles. São servis, traidores, brutais, adulões. (...) Pensa-se que
são amigos... Sócios de bandalheira! Cheiram à corrupção, empestam de longe”.
A seguir Rebelo conclui seu conselho ao novo colega a não admitir “protetores”. Árdua tarefa para
uma personalidade tão afeita e desejosa de proteção como a de Sérgio, que fracassa ao ser salvo
de afogar-se por Sanches, de quem se torna íntimo. O novo amigo ajuda-o diariamente nos
estudos, mas o narrador sente asco do colega. Quando Sanches pressiona-o em busca de favores
sexuais, Sérgio nega-se e eles rompem.
No final do primeiro ano de internato, Sérgio passa a admirar profundamente Bento Alves,
que se tornara símbolo de virilidade para o narrador ao capturar um funcionário que cometera um
crime no Ateneu. Eles estudam juntos e tornam-se amigos. Bento Alves chega a brigar com
Malheiros porque chamara Sérgio de sua “namoradinha”. O narrador sente-se atraído pelo amigo
e dá vazão à sua personalidade feminil: “Estimei-o femininamente, porque era grande, forte,
bravo, porque me podia valer; porque me respeitava, quase tímido”. Todavia, Sérgio rompe a
amizade sem prestar favores sexuais a Bento, que nada exigia.
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O narrador sente-se atraído como nunca pela beleza e delicadeza de outro colega: Egbert, e
passa a protetor. Outrora, com Bento Alves, Sérgio mostrava “vaidade feminina de dominar pela
fraqueza”. Agora, o narrador vive a satisfação de ser a parte forte da relação, cabendo-lhe
cortejar:
“Achava-me forte para querer bem e mostrar. (...) Egbert merecia-me ternuras de irmão
mais velho... Vizinhos ao dormitório, eu deitado, esperava que ele dormisse para vê-lo
dormir e acordava mais cedo para vê-lo acordar (...). Eu por mim positivamente adorava-o
e o julgava perfeito. Era elegante, destro, trabalhador, generoso”.
Só agora Sérgio envolve-se sexualmente com um colega, porém tais relações são apenas
sugeridas. Aliás, não era com o tema do homossexualismo que o autor visava provocar a reflexão
em seus leitores, mas pela crítica a vícios da sociedade brasileira do final do Império, bem como a
este, considerado um regime de governo obsoleto e corrupto.
Sérgio segue sua índole egoísta e submissa e afasta-se de Egbert, o que ilustra a gratuidade e
a inconstância das relações no internato. A seguir, o narrador conhece D. Ema e apaixona-se
platônica e edipianamente. O encontro dá-se em um jantar comemorativo na casa de Aristarco
(diretor do Ateneu e esposo de D. Ema) para os alunos de bom desempenho. Sérgio adoecera e,
na casa de Aristarco, é cuidado por Ema, que lhe trata com um misto de proteção materna e
carícias de amante apaixonada, aumentando seu drama íntimo. Ao fim do segundo ano de Ateneu,
com a maioria dos alunos em férias, o narrador vê a destruição do colégio em um incêndio
provocado por Américo, um aluno. Ema aproveita a ocasião e abandona Aristarco.
Lobo na pele de cordeiro, Aristarco é a figura mais caricata da obra. Sérgio usa em larga
escala da caricatura para vingar-se de seus desafetos do passado, os quais são personificados no
diretor, símbolo da dissolução de todos os valores. O Ateneu recebia a elite nacional. Com
afetação, Aristarco afirmava: “Estejam tranquilos os pais! No Ateneu a imoralidade não existe.
Velo pela candura das crianças, como se fossem não digo meus filhos, mas minhas próprias
filhas!”. A realidade, porém, era a mais pura corrupção dos alunos, funcionários e professores do
internato.
Sérgio revela a retórica vazia e hipócrita do diretor: “Aristarco era todo um anúncio”. O
diretor era ainda um arrivista, vendo no internato uma casa comercial, sem qualquer preocupação
na formação do caráter dos alunos. Outro traço negativo de sua personalidade é o narcisismo:
Aristarco sonhava com uma estátua que premiasse seu suposto esforço em prol da educação. Seu
egocentrismo acarreta gestos de pura afetação, como se estivesse a pousar em tempo integral
para o artista que lhe imortalizaria:
“Os gestos, calmos, soberanos, eram de um rei, (...) a pausa hierárquica do andar deixava
sentir o esforço, a cada passo, que ele fazia para levar adiante, de empurrão, o progresso
do ensino público. (...) A própria estatura, na imobilidade do gesto, na mudez do vulto, a
simples estatura dizia ele: aqui está um grande homem...”
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A destruição (incêndio) do Ateneu suscita diversas interpretações; por exemplo, o teor
autobiográfico:
O desfecho da obra alegoriza o final do Império desejado por Pompéia, ardoroso defensor da
República. Assim, a hipocrisia da sociedade imperial descrita por Sérgio simboliza a Monarquia,
vista como uma forma de governo obsoleta e corrupta. Veja as palavras de Cláudio, professor do
colégio:
Aristarco pode ser lido como uma alegoria de D. Pedro II, pois encarna o poder arbitrário, o
narcisismo e a ambição doentia, características típicas dos imperadores.
Difícil tarefa filiar O Ateneu a uma escola literária devido a seu sincretismo estético. Atenção
para os elementos formais ou temáticos de cada uma das diversas estéticas presentes na obra.
– NATURALISMO: O Ateneu traz fortes tons deterministas. Seu sórdido meio corrompe os
alunos, que, dominados pela força dos instintos, são levados à promiscuidade e ao sensualismo, em
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um claro diálogo com o Determinismo dos romances naturalistas e seus tipos subjugados por taras
sexuais.
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