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Moda e Masculinidade No 20 e 21

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ModaPalavra e-periódico

E-ISSN: 1982-615X
modapalavra@gmail.com
Universidade do Estado de Santa
Catarina
Brasil

Vieira-Sena, Taísa; Castilho, Kathia


MODA E MASCULINIDADE: BREVES APONTAMENTOS SOBRE O HOMEM DOS
SÉCULOS XX E XXI
ModaPalavra e-periódico, núm. 7, enero-junio, 2011, pp. 46-56
Universidade do Estado de Santa Catarina
Florianópolis, Brasil

Disponível em: http://www.redalyc.org/articulo.oa?id=514051718005

Como citar este artigo


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Modapalavra E-periódico

MODA E MASCULINIDADE: BREVES APONTAMENTOS SOBRE O HOMEM


DOS SÉCULOS XX E XXI

Taísa Vieira-Sena

Kathia Castilho

RESUMO: A sociedade moderna é terreno fértil à condição de indivíduo-consumidor.


Portanto, vivemos em um novo mundo organizado em torno de imagens, que
transformam radicalmente nossas experiências de vida, cria novas identidades e
múltiplas formas de ação do indivíduo, permitindo-lhe agir como ator social. Este artigo
levanta algumas possibilidades de diálogos entre Moda e masculinidades, suas
interferências nos movimentos sociais e históricos. Trata também de suas modificações
mediadas pelo consumo, que transforma os valores estéticos e simbólicos dentro de um
sistema de hierarquização social e construção do eu.

PALAVRA-CHAVES: moda, masculinidade, consumo.

ABSTRACT: Modern society is a fertile land to the condition of individual-consumer.


Therefore, we live in a new world organized around images, which radically transform
our life experiences, create new identities and multiple possibilities for individual
action, allowing it to act as social actor. This article raises some dialogue between
fashion and masculinity, their interference in social movements and historical. In
addition to treating your modifications mediated by consumption, transforming the
aesthetic and symbolic values within a system of social hierarchy and self-construction.

A Moda1 é um dispositivo social, portanto o comportamento orientado por ela é


fenômeno do comportamento humano generalizado e está presente na sua interação com
o mundo. Dialogando com Lipovetsky (1989) observa-se que vinculada à cultura
específica de cada sociedade, a indumentária usada numa determinada época reflete os
hábitos e os costumes da sociedade em questão, atuando como uma espécie de reflexo
da cultura.
Entendemos a moda como um sistema que constitui subjetividades a partir das
relações de aparência. Porém, essas construções subjetivas da Moda na
contemporaneidade, se dão de forma coletiva, precisam da interação e do olhar do outro
para se constituírem e fazem parte do contexto cultural a que estão inseridas.
A Moda se apresenta como um agente, as modificações do vestuário se tornam
um processo de constituição da subjetividade dos sujeitos e, por conseguinte, estas
modificações se encontram atreladas às representações de masculinidades, ou seja, as
imagens que os homens fazem tanto perante seus pares como para si mesmos.

1
No decorrer do trabalho o termo moda será utilizado de duas formas: Quando construído com “M”
maiúsculo, o termo moda, é entendido como fenômeno social; moda com “m” minúsculo, expressa a
renovação cíclica de tendências de vestuário.

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De acordo com Joan Scott (1990), o gênero, bem como a masculinidade são
representações culturais construídas pelos discursos sociais, que determinam os papéis
que devem ser seguidos por homens e mulheres. Desta forma também podem ser
modificados dentro de um contexto social vigente.
Assim, a Moda como agente, é mediadora das transformações de tais
representações. Apresenta-se tanto como meio de expressão, como intercessora de
relações de aparência entre os sujeitos. Relações estas que se dão sobre o corpo e pelo
corpo, que se torna lugar de significações através das diversas formas de configuração
do vestuário e da Moda nos espaços sociais.

A Moda e O Masculino

A Moda tem historicamente criado uma associação forte entre feminilidade e a


busca do “estar na moda”, onde se realça a importância da aparência na construção
social da feminilidade. Dialogando com Liliane Carvalho2 (2007) acredita-se que ao
contrário do que muitos crêem, Moda não é coisa de mulher. Efêmera por natureza, a
Moda é uma das expressões, individuais e coletivas, dos valores e idéias que permeiam
determinadas sociedades e épocas. Inicialmente representativa do poder masculino,
somente no século XIX a Moda será dita como "característica" do Universo feminino.
Norteados pelos valores do tempo e dinheiro, os burgueses associaram a Moda com a
futilidade e desperdício aristocráticos, relegando-a, em discurso, ao espaço feminino.
Para compreendermos as formas que estes discursos se articulam, é necessário
que se faça uma breve retrospectiva do vestuário masculino, e já que estamos
vivenciando mudanças nas identidades homem versus mulher, precisamos entender o
papel do homem no seu tempo histórico.
Com Luis XIV o vestuário masculino atinge o seu ápice em luxuosidade. A
moda masculina de Versailles era copiada por toda a Europa e, conseqüentemente, por
todas as colônias, já que o Rei Sol, como era conhecido o monarca francês, estava
empenhado, segundo James Laver, “em tornar a França o árbitro da Europa, não só
politicamente, como também em questões de gosto” (LAVER, 1989, p. 116). Ainda
segundo o autor, as roupas masculinas francesas modificaram-se pouco durante o século

2
Liliane Carvalho é historiadora e professora de História da Moda.

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XVIII, sofrendo uma grande alteração por volta de 1760, quando houve uma ênfase
maior na corte francesa em adotar as roupas inglesas de campo.
No mesmo século, a Revolução Francesa proporcionou a ascendência da classe
burguesa, e consequentemente, a erradicação das roupas faustosas do Antigo Regime.
Nestes tempos revolucionários ser confundido com a aristocracia, com suas roupas
bordadas a ouro e prata, poderia resultar em guilhotina. Desta forma a austeridade,
traduzida pela simplicidade e praticidade do estilo das roupas aristocráticas inglesas
virou referência para o vestuário masculino. E o valor e a moral do homem passaram a
ser o trabalho.
No início século XIX, o dândi Beau Brummell, foi o responsável por um estilo
“less is more” [menos é mais], que reforçou a discrição na moda masculina
direcionando-a para alfaiataria. Os dândis, que com sua anti-estética, em contraposição
à nobreza da época com a idéia de eliminar por completo o elemento de mudança da
moda, elegeram o preto como cor oficial das vestimentas. Criava-se então o estilo chic
urbano para os homens.
Wilson (1989) diz que o dândi inaugurou a antimoda e criou o estilo de
oposição, podia ser caracterizado como uma versão do herói romântico, na sua posição
de revolta. A sua dedicação a um ideal de vestuário que idealizava a sutileza, iniciou
uma época que punha em destaque o tecido, o corte e o caimento do traje. Este estilo de
vestir, com corte retilíneo clássico e cores sóbrias fazia oposição direta a e ostentação
do rebuscado traje barroco e rococó. A autora afirma ainda que o dândi, narcisista por
natureza, trouxe uma nova masculinidade, sem perucas ou maquiagem, mas com calças
muito apertadas e altamente eróticas.
O dândi, em sua grande maioria, não tinha profissão ou nome de família,
aparentemente sem nenhum meio de sustento econômico, criou o arquétipo do novo
homem urbano, que praticava o flaneur, ou flanar, a arte de circular pela sociedade se
impondo pelo bom gosto e elegância. Os primeiros representantes do dandismo foram,
na Inglaterra Beau Brummell, seu criador e na França o escritor Charles Baudelaire.
A moda se torna mais austera no período vitoriano. A Revolução Industrial, no
século XIX, editou um burguês rico e cordato, a sua mulher, ou amantes, vestidas com
roupas ricas, criadas por estilistas, usando muitas jóias, que davam o seu aval de
poderoso, mas discretíssimo em sues trajes pessoais. Nesta época o contraste visual
entre a moda feminina e masculina ficou muito evidente. Ele se dava nos volumes (traje
masculino reto e junto ao corpo versus feminino volumoso), cor (masculino cores

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escuras, consideradas sóbrias versus feminino com profusão de cores), tecidos


(masculinos simples versus femininos armados e brilhosos), principalmente, em
ornamentos, (o homem procurava omitir os enfeites enquanto a mulher abusava dessas
possibilidades). À exceção no caso masculino, fica por conta da gravata, da cartola, da
barba e, normalmente, da corrente do relógio de bolso, que lhe ficava aparente sobre o
colete. A barba bem cortada e definida, e o uso destes acessórios tornaram-se
fundamentais em todo o século XIX marcando a diferença para aqueles que tinham
poder econômico e uma posição social elevada. O destaque para o masculino não estava
apenas na forma de vestir, mas também uma forma de ser e de agir.
Desde então, o homem traz uma austeridade no vestir, cores escuras e
acinzentadas, sobriedade nas formas e matérias, tudo para ratificar seu local e papel
social. É o que Dario Caldas (1997) chama de o modelo de Homem herdado da
sociedade patriarcal, também conhecida como burguesa clássica, isto é, o homem forte,
que não fraqueja, que não chora, provedor da família, mas distante dos filhos, habitando
o mundo do poder, do dinheiro e da política, etc.
Nos anos de 1950 e nas transformações do pós-guerra, o consumo se acentuou e
novas possibilidades começaram a se abrir ao vestuário masculino. Apresentam-se duas
vertentes: os jovens com o visual contestador; e o tradicional, que não explora a beleza,
mas começa a se relacionar de forma diferente com a moda e o seu corpo, em prol de
uma “boa aparência”.
Na década de 1960 podemos identificar o início das renovações na moda
masculina. Barros (1997, p. 137) destaca: “No começo dos anos 60, a visão
conservadora que regia a moda masculina começa afinal a passar por transformações.
Como uma verdadeira revolução, com prós e contras, os homens começaram a se
rebelar diante das tradições[...]”.
Connel (1995) lembra que a masculinidade hegemônica não corresponde a um
caráter fixo, situado sempre da mesma forma em um mesmo lugar. Essa posição
hegemônica é um constante objeto de disputa em qualquer tempo, onde se sobressai
uma forma de masculinidade em detrimento de outras. De qualquer forma, é sempre
uma prática discursiva que legitima uma posição dominante dos homens e uma
subordinação das mulheres e daqueles a estas identificados.
A partir dos anos 1970, o segmento gay começou a buscar espaço social, e
também a mostrar o seu poder de consumo, de voto etc. e ganhar a simpatia da platéia
em peças e depois filmes, como Gaiola das Loucas e Priscila, a Rainha do Deserto. Na

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entrada dos anos 2000, a disponibilidade de informações e a intensificação do consumo


passaram a interferir no visual do hetero, abrindo espaço para novas formas de
masculinidades como o metrossexual. Fernando de Barros (1997), diz que hoje,
vivemos a era do homem mais bem informado e alguns estudos apontam que
começamos um novo ciclo masculino, no qual eles se sentem libertos de restrições em
seu vestuário e procuram na roupa e na aparência construir uma nova imagem.
A Moda como linguagem, aos poucos se torna mais consistente no universos
masculino. A análise do vestuário do homem se apresenta um terreno fértil de pesquisa,
compondo um conjunto de significados que traduz simbolicamente informações sobre
os indivíduos. A que classe social pertence que atitude pode-se esperar dele, que poder
ele exerce sobre os demais, entre outras relações. Construindo discursos capazes de
viabilizar identidades diferentes da imagem do homem da sociedade patriarcal.
Ainda, segundo Connell (1995) a história passou da conquista direta ao
colonialismo econômico indireto, com a criação de mercados globais que constituem
uma característica tão importante do mundo contemporâneo. Na medida em que a
difusão da cultura metropolitana, assim como a difusão das instituições metropolitanas,
tem um impacto sobre as ordens de gênero locais. É possível que estejamos
testemunhando agora, como resultado dessa interação global, a criação de novas formas
de masculinidade. As condições para a hegemonia estão mudando, com o crescimento
do feminismo mundial, a estabilização de novas formas de sexualidade e a criação de
uma economia global.
À medida que o efêmero invade o cotidiano, as novidades são cada vez mais
rapidamente e melhor aceitas; em seu apogeu, a economia-moda engendrou um agente
social a sua imagem. Constituindo um contexto pós-moderno o sistema de moda
incorpora os movimentos de contra-cultura, esvaziando sua ideologia, transformando-o
numa energia a seu favor. Após estas revoluções o indivíduo moderno estava abalado e
uma nova subjetividade o investia de novos desafios diante deste “adorável mundo
novo”.
De acordo com Sant‟ Anna (2007) uma nova lógica, a da identificação é
evidenciada (que supera a lógica da identidade), onde o narcisismo é coletivo, pois
individualidade é construída na relação com o outro, na visão que os outros fazem do
próprio sujeito, e no desejo que o move nesta identificação de si próprio.
As sociedades modernas são essencialmente sociedades de mudança constante e
rápida, a revolução tecnológica e a globalização causaram um impacto sobre a

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identidade cultural. Hall (2001, p.7) afirma que a crise de identidade “é vista como parte
de um processo mais amplo de mudança, que esta deslocando as estruturas e processos
centrais das sociedades modernas e abalando os quadros de referência que davam aos
indivíduos uma ancoragem estável do mundo social.” Observamos também uma
fragmentação dos sujeitos em diversas identidades criadas a partir de objetos e
elementos simbólicos.
O consumo passa a se configurar como ponte de integração com o sistema de
interpretação do mundo, onde os sujeitos se utilizam de fichas simbólicas3 para a
construção de um ser apto à modernidade. O princípio é o de tentar modelares as
relações a partir da aparência.
Lembrando Foucault (2003), que diz que o discurso só existe por que se torna
prática. Faz-se necessário deixar claro que o que entendemos por tipicamente feminino
e tipicamente masculino não são imagens que correspondem a qualquer valor essencial,
universal e atemporal, mas a imagens construídas historicamente e que, desde a
modernidade, vêm sendo profundamente alteradas graças à simulação de confusão entre
fronteiras simbólicas do masculino e do feminino.
No contexto das sociedades pós-modernas onde as relações são mediadas pela
aparência e as identidades tornam-se fragmentadas, proporcionando diversas
identificações, Davi (2005) descreve até há bem pouco tempo, o conceito de
masculinidade era considerado óbvio. Salienta, que na cultura brasileira, vemos
freqüentemente o uso da virilidade: na violência conjugal, na homofobia, nas brigas de
torcida. Contudo, devemos perceber também, que não só os (as) homossexuais e as
mulheres são vítimas do machismo, mas os próprios homens se tornam prisioneiros
dessas representações e valores.
Lisboa (1998) analisa o Primeiro Simpósio do Homem (outubro de 1985)
organizado por homens para homens, para discutir a condição do homem. No qual
concluíram que os homens estavam em crise por conta das mudanças do
comportamento feminino e pelo que eles chamaram de “peso da coroa” – “A Coroa
Pesa”.

3
Em seu livro Teoria de Moda: sociedade, imagem e consumo, Mara Rubia Sant‟Anna, fala sobre como o
correto uso ou manipulação das fichas simbólicas (elementos simbólicos) torna o sujeito apto a
modernidade, muito mais do que a simples aquisição de objetos. Ver SANT‟ANNA, Mara Rúbia. Teoria
da Moda: sociedade, imagem e consumo. São Paulo: Estação das Letras, 2007. p. 51.

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Lula Rodrigues4 (2008) coloca a Moda como uma forma de introduzir novas
imagens do masculino. Podemos dizer que a moda masculina, também lida com
identidades de tribos e sexual, dentro de um processo de mudança que é, no entanto,
irreversível. Através da moda podemos mostrar ao homem que ele pode ser alegre sem
que isso macule seus temores de identidade sexual.
As razões para a implosão do modelo patriarcal de masculinidade são
numerosos, indo bem além das questões de especificidade de gênero. Passam pelas
mudanças nos papéis e nas condições de vida, e nos modos de produção que afetam os
homens e mulheres de diversas maneiras. Giannino Malossi (2000) afirma que pelo
menos uma razão para o declínio geral representação do “homem de verdade” está
implícita na dinâmica interna da comunicação e consumo de Moda, e na economia do
espetáculo, em que as relações entre as pessoas são moderadas por objetos. Onde a
“metamorfose do macho” pode ser formulada, começando com as considerações do
valor imaterial dos bens e da imagem de masculinidade associada a ele.
Atualmente existem masculinidades plurais, ou seja, não há mais apenas um
modelo a ser seguido. O homem contemporâneo constrói novos significados sobre o seu
corpo e começa a manipular muito mais elementos para sua constituição visual corporal.
Mas, há de se questionar: O que são estas masculinidades?

Fragmentação do Homem: Consumo e Novas Masculinidades

A mudança no comportamento do homem é uma realidade que vem sendo


constatada de forma gradativa. Vemos na Moda um vetor para intensificar as multiplas
versões de masculinidade. A motivação da indústria da moda se torna evidente quando
identificamos nestas diversas identidades um maior número de possibilidades de se criar
desejo por diferentes objetos.
De acordo com Giannino Malossi (2000), a rigidez que antes era característica
da identidade dos homens, representada também na moda masculina, foi ultrapassada,
para dar lugar à possibilidades mais variadas, complexas e diversificada de
comportamentos e de identidades possíveis. Isso, por sua vez, se traduz em um
conjunto muito maior de possíveis formas de consumo, isto é, uma maior circulação de
mercadorias. Em outras palavras, quando uma identidade unificada do sexo masculino é

4
Jornalista e escritor sobre moda masculina.

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substituída por uma identidade múltipla, cria-se a necessidade diferentes e a moda com
sua diversidade pode oferecer diferentes opções para corresponder a cada uma das
novas identidades possíveis.
As práticas de consumo de vestuário no mercado expressam um conjunto de
valores, hábitos, construções visuais corporais e preferências que definem e colocam em
prática as formas específicas de cada cultura vestir os gêneros, ou apresentar seus
corpos sexuados, mostrando como os padrões de masculino e feminino podem ser
reforçados ou modificados.
Neste contexto vemos uma fragmentação do homens em perfis traçados de
acordo com suas escolhas de consumo que vão do resgate do homem „macho‟, que faz
questão de ressaltar a masculinidade hegemônica da sociedade patriarcal ao crescimento
do homem „sensível‟, que usa cosméticos, perfumaria, roupas com estilo e é mais gentil.
Camilo Vannuchi e Lena Castellón (2006) observam que se complexidade e
inconstância comumente foram características ligadas às mulheres, trabalhos
reveladores começam a identificar perfis de homens com facetas tão múltiplas quanto às
delas. E apresentam um estudo feito pelo grupo Leo Burnett que identifica os perfis
atuais do novo homem, em metrossexuais, retrossexuais, übersexuais, neopatriarcas e
power-seekers.
Tantos rótulos mostram que é necessário conhecer cada uma dessas divisões
para entender o universo masculino atual. De um modo geral, todos têm algum grau de
vaidade. Os mais conhecidos são os metrossexuais, termo proposto em 1994 pelo
jornalista inglês Mark Simpson, proveniente da junção das palavras metropolitano e
sexual. Este grupo é constituido pelo homem urbano excessivamente preocupado com a
aparência, que gasta grande parte do seu tempo e dinheiro em cosméticos, acessórios,
roupas e tem suas contudas pautadas pela moda.
Em oposição aos metrossexuais, surgiram os retrosessuais. O termo retossexual
também foi criado por Mark Simpson, porém em 2003, e foi usado para rotular homens
com idéias conservadoras e não permite que duvidem da sua masculinidade5. Este é o
perfil de homens que são formais e conservadores também na forma de consumir.
Como um meio termo, surgiram os überssexuais. Dentre estes perfis, o
übersexual se apresenta como o tipo masculino que conseguiu conciliar moda e beleza
sem perder a virilidade, a autoconfiança e a personalidade assertiva, elementos

5
O modelo de masculidade caracterizado pelo retrossexual é o da masculinidade hegemônica da
sociedade patriarcal.

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constitutivos da identidade masculina e ainda valorizados pelas mulheres. O ponto


focal dessa tendência é o abraçar da masculinidade tradicional, sem todos os aspectos
negativos a ela associados.
Os neopatriarcas são caracterizados por homens que compartilham as atividades
domésticas com a mulher e são participantes na educação dos filhos. A busca pelo
exercício da paternidade é um dos pilares de sustentação do perfil neopatriarca. Sentem-
se realizados ao lado da companheira e dos filhos e seriam capazes de recusar uma
promoção de trabalho se isso os obrigasse a ficar longe de casa. Suas práticas de lazer e
consumo se dão em torno da família.
Já os power-seekers são homens que ambicionam o poder e usam a vaidade para
auxiliá-los a conquistar as posições almejadas. Suas relações, bem como as práticas de
consumo ocorrem em torno do trabalho, se forma que possam viabilizar seu sucesso.
Estes e outros “títulos” são usados para determinar as novas masculinidades,
podem ser interpretados também, como uma estratégia midiática para criar uma visão
compartilhada, um "senso comum" do que é ser homem na contemporaneidade. De
forma que a moda e a cultura de massa transformam o simbólico em economia,
contribuindo para a criação, seleção e manipulação de novos fatos e imagens culturais.
Já Mario Queiroz (2009) situa o discurso da moda na construção das diversas
masculinidades do mundo contemporâneo, através da leitura de imagens de moda,
destacando a figura do herói no universo masculino. Apresenta as mudanças no homem
do final do século XX e início do XXI, discutindo como as revistas de moda masculinas
trabalham com as transformações do comportamento do homem nas fotografias de
moda, construindo imaginários de herói como idealização do masculino.
Não utiliza o que ele chama de “gavetas” para identificar estas masculinidades,
como metro ou übersexual, pois acredita que tais divisões só servem para mostrar as
perdas dos vários nichos de o mercado ao se pensar o masculino como único. Ele
aborda identidades múltiplas, e fala do homem pós-moderno, fragmentado. Que se
constitui em um novo homem a partir do consumo. “a moda será cada vez mais uma
ferramenta para exteriorizar novos sentimentos e ajudará a gerar infinitas formas de
expressão, uma vez que apontamos que cada um deverá assumir um estilo, e mudar,
quando assim desejar.” (QUEIROZ, 2009, p 147)
A Moda entendida, a partir de uma perspectiva cultural, como um sistema de
códigos no qual os bens materiais tem um forte caráter simbólico, um valor imaterial,
que ultrapassa o seu valor de uso. Desta forma a Moda é vista como parte do universo

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cultural, atuando como principal mediadora das relações sociais que se dão pela
aparência.As intervenções entre a Moda, seu tempo e espaço dialogam com os
acontecimentos mais marcantes da época, caracterizando uma visão holística, por uma
mudança nos padrões sociais e no questionamento dos valores pregados pelas gerações
anteriores.
Em uma época em que a Moda se caracteriza por sua diversidade e
permissividade do consumo, não só nas peças de roupas ou acessórios, mas seu
conteúdo imaterial e o próprio corpo são manipulados de tantas maneiras dentro de seu
contexto de imagem. Imagens estas, que produzem a aproximação pela aparência dos
sujeitos, formando uma paisagem humana cujo consumo pode permitir a discussão dos
modelos estabelecidos em nossa sociedade.

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