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Por Viver Com Você 1.5 - Por Você - Mariana Vaz

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Por Viver com Você @2021.

Todos os direitos reservados


Obra protegida pela Lei 9.610 de 1998
(Lei de Direitos Autorais)
É proibida a reprodução integral ou parcial desta obra, seja de forma gratuita ou comercial, sem a autorização da autora e os devidos
créditos. Por Viver com Você é uma obra de ficção. Qualquer semelhança com pessoas ou fatos reais é mera coincidência.

Capa: L.A. Designer Editorial


Sumário
Nota da Autora
Capítulo 1
Capítulo 2
Capítulo 3
Capítulo 4
Capítulo 5
AGRADECIMENTOS
SOBRE A AUTORA
Nota da Autora

Intitulei Por Viver com Você como o volume 1.5 da série por uma compreensão de que aqui
neste pequeno spin-off vocês não vão encontrar uma história isolada. É uma continuação de Benício e
Laila e, ao mesmo tempo, uma pequena introdução ao que ainda virá. Por isso, volto a sugerir: se
você não leu Por Odiar Você, não leia este conto agora.
Foi uma forma de mostrar como está o casal depois do “fim” sem que interferisse nas próximas
histórias. Quero que cada livro principal foque nos seus protagonistas. Suas angústias, seus encontros
e suas paixões.
Só que as histórias que já aconteceram têm sua continuidade, e esse foi o jeito que encontrei
para contá-las. Essa é uma série sobre amores e amizades, e em como estes sentimentos se constroem
com o tempo.
De bônus, vou lançando pequenas pitadas do que virá no futuro. Uma ou outra pista solta, um
acontecimento que vai reverberar em outros livros... Está tudo aí para quem conseguir pegar os
easter eggs.
Foi um prazer imenso escrever esse pequeno conto, e espero que vocês se divirtam com esse
bônus.
Uma deliciosa e excelente leitura,

Mariana Vaz
Capítulo 1

Laila revirou-se na cama, deitando-se de costas para mim e levando quase todas as cobertas e
lençóis consigo.
Ela tinha ganchos invisíveis no meio das coxas para conseguir aquela façanha toda noite.
Nós usávamos cobertores separados e ainda assim ela conseguia puxar todos eles para junto de
si todas as noites, me deixando completamente descoberto.
Se eu me irritava com aquilo?
Eu adorava tudo aquilo.
Na mesma hora que ela me deixava completamente refém do vento frio do ar condicionado, do
nada ela se voltava para mim e me puxava com força, me envolvendo com suas pequenas e quentes
pernas sedosas.
Aquilo era melhor do que qualquer cobertor do mundo.
O quarto estava no mais completo breu. As portas de vidro da sacada fechadas com a cortina
black-out, impedindo qualquer claridade de entrar. Olhei de relance para o relógio que estava na
cabeceira da cama e desativei o alarme antes que ele despertasse, dali a dois minutos.
Me voltei novamente para Laila e me permiti apreciá-la por um tempo, enquanto ela dormia.
Seus cabelos se espalhavam no lençol branco como uma onda negra e perfumada, e ela tinha uma
marca avermelhada de mordida em suas costas, bem na altura das costelas.
Hum... Eu quem fiz essa marquinha aqui...
Lembrei da noite anterior e já me senti latejar, enquanto beijava de leve suas costas nuas.
— Bom dia, aniversariante...
Ela resmungou alguma coisa e então se virou, abrindo os olhos. Piscou algumas vezes e me
beijou na altura do pescoço, enquanto me envolvia com as pernas.
— Bom dia só daqui a meia hora — ela falou com a voz rouca e arrastada de sono, mas sem
qualquer sinal de irritação.
— Nada disso. Não quero nem saber de você reclamar de acordar cedo hoje, ou vai ficar sem
seu primeiro presente — falei suavemente, mordendo o lóbulo da sua orelha.
— E posso saber qual é o meu primeiro presente? — ela perguntou manhosa, passando as
unhas sorrateiramente no meu peito e me olhando nos olhos.
Afastei meu rosto do dela e então fiz um sinal apontando para mim mesmo, ao mesmo tempo em
que esfregava minha ereção contra suas coxas ardentes.
Ela soltou uma gargalhada irônica antes de falar, a voz divertida, mas sem conseguir esconder
o tesão:
— Benício De Lucca, isso não é um presente. Em primeiro lugar, está me oferecendo algo que
já é meu; e em segundo, quem ganha nessa troca toda aqui é você — concluiu, apontando para nós
dois.
— É assim que você pensa? — desafiei, erguendo uma sobrancelha e soltando sua cintura. —
Então acho que não vai se importar de pularmos essa parte do dia. — Sentei-me na cama e comecei a
me levantar. — Você até pode dormir um pouco mais. — Deixei o parco lençol que me cobria cair e
atravessei o quarto lenta e completamente nu, ciente de que continuava duro por aquela mulher.
Bem
Visível.
Ela que salive de desejo sozinha.
— Você não vai fazer isso no dia do meu aniversário! — Laila se levantou da cama, apoiando-
se nos cotovelos.
— Já fiz — falei friamente, entrando no banheiro, sem fechar a porta.
— Ei! — ela gritou do quarto, ainda sem sair da cama. — Você não pode me deixar aqui assim,
seu egocêntrico mandão!
Me olhei no espelho do banheiro e não consegui reprimir um sorriso.
Eu adorava aquelas preliminares.
— Você foi muito clara quando disse que quem ganha sou só eu. A garota mimada deve preferir
um sapato ou esmaltes de presente.
Esperei que ela respondesse, mas não ouvi nenhuma ofensa de volta. Laila continuou em
silêncio e escutei o farfalhar dos lençóis na cama. Estiquei meu pescoço para ver o que estava
acontecendo e me deparei com uma cena que fez o sangue arder nas minhas veias.
Laila havia tirado todas as cobertas do corpo e estava inteiramente nua na cama, deitada de
costas e com as pernas levemente dobradas e abertas na direção do banheiro. Com uma das mãos, ela
se esfregava com uma lentidão lasciva, os dedos circundando a minha parte preferida daquele corpo
sem nenhuma pressa.
Engoli em seco.
— Sabe que eu sou muito melhor do que você para fazer isso. — Tentei soar desinteressado,
mas acho que minha voz saiu um pouco falha.
Ela sorriu sedutora e mergulhou um dos dedos com lentidão no interior da sua virilha. Eu era
capaz de sentir o seu calor e a sua umidade só de olhar. Era como se os meus dedos estivessem ali.
— Você já disse que não terei nada — ela ronronou e eu senti um arrepio na espinha. Dei dois
passos na direção da cama, hipnotizado com aquela cena. — Melhor um pássaro na mão do que dois
voando. — Seus dedos começaram a ir e voltar freneticamente e ela jogou a cabeça para trás. —
Nunca um ditado fez tanto sentido como agora. — E riu gostosamente.
— Diga o que você quer, Laila — eu rugi ao subir na cama, ajoelhando-me na sua frente.
— Pare de usar essa voz cretina — ela gemeu e eu sorri satisfeito.
Ela adorava quando eu falava daquela forma.
— Diga e você sabe que vai ter — continuei, agora passando minha mão suavemente por suas
coxas.
Ela se contorceu na cama e me olhou com profundidade.
— Vamos nos atrasar para o trabalho.
— Nada que você já não esteja habituada.
— Você também — ela provocou, ainda se tocando e se excitando.
Esperei. Deixei que Laila se tocasse e observei com atenção o momento em que ela revirou os
olhos, já no limiar do desejo. Seus dedos começaram a se mover rapidamente e ela então me encarou
suplicante.
Eu sei o que ela estava pedindo. Conheço cada mais obscuro desejo dessa mulher, mas não
daria enquanto ela não dissesse.
E o por que disso?
Porque isso éramos nós!
As provocações, os embates, as pequenas implicâncias... tudo faz parte do que nós somos e
partilhamos.
Um ano e meio juntos e parece que todos os dias nos desejamos com a intensidade da primeira
vez, somado a uma intimidade que parecemos compartilhar de outras vidas.
Eu amo essa mulher mais do que tudo nesse Universo!
— Benício... — ela gemeu e eu abri meu sorriso.
— Peça, meu amor. — Resolvi dar um desconto, já que era seu aniversário. Subi minha mão
até sua virilha, mas sem excitá-la. Encobri sua mão com a minha e simplesmente guiei seus
movimentos, estabelecendo o ritmo exato que eu sei que ela gosta, no ponto exato que eu sei que a
excita.
Era o que bastava para Laila explodir, gemendo sobre os lençóis, sua pele brilhosa e ofegante
se destacando na penumbra do quarto.
— Benício... — ela ainda gemia e sua voz falhava. — Quero você.
Era tudo o que eu estava esperando.
Em um átimo de segundo meu corpo envolvia todo o corpo dela, e eu apanhava sua boca na
minha.
— Eu estava a fim de te dar tudo que você queria desde o momento em que acordou — falei
entre os beijos. — Mas você gosta desses joguinhos...
— Porque eu sempre ganho... — ela murmurou, enquanto cravava as unhas nas minhas costas.
Passei a língua pelo seu pescoço, subindo até a extremidade do seu queixo. Ela deu um gritinho
alto quando eu mordi sua orelha e apertei um dos seus seios com as mãos, segundos antes de penetrá-
la.
— É aqui que você ganha? — perguntei, enquanto me movia lentamente sobre ela, cada parte
do seu corpo me provocando por inteiro.
— Com toda certeza — ela sussurrou, me encarando com intensidade.
Comecei a me mover mais e mais rápido, sentindo seu corpo se abrir e relaxar para mim.
Éramos naturalmente nós mesmos. Benício e Laila. Colegas de profissão. Amores. Amantes.
Amar Laila era como respirar. Automático e essencial. Fechei meus olhos para senti-la, indo
cada vez mais rápido e profundo. Os minutos se fundiam quando eu estava dentro dela e tudo parecia
girar à nossa órbita.
Ela soltou um som gutural e abafado em meu pescoço, e seus músculos se contraíram
fortemente antes de relaxarem em espasmos involuntários, na sua segunda onda de orgasmo.
— Eu amo você — declarei, beijando seus olhos cerrados e sentindo suas contrações de prazer
me apertando.
— Também amo você — ela respondeu num gemido rouco, ainda de olhos fechados.
— Feliz aniversário, meu amor — falei docemente, e ela abriu os olhos para me fitar com o
olhar raso de paixão. Aquilo me cegou de prazer e eu me entreguei ao desejo que estava acumulado
desde o momento que acordei naquela manhã.
Me deixei cair ao seu lado, o lençol gelado eriçando meu corpo febril depois de toda aquela
dança frenética.
— Que tal um banho agora? — chamei, beijando sua testa e enrolando a minha mecha preferida
dos seus cachos nos meus dedos.
Ela riu baixinho no meu peito antes de responder:
— Hoje é meu aniversário, mas temos uma reunião cedo com os diretores. Aquele contrato da
nova rede de supermercados do Sul precisa sair essa semana.
— Estou pensando em criar uma norma na LBK que dá folga ao funcionário no dia do seu
aniversário, começando por hoje. O que você acha?
— Acho que seria interessante eu de folga e você indo trabalhar sozinho.
— Meu amor... Eu sou um dos donos daquele lugar. Não assino folha de ponto.
— Convencido... — Ela deu um tapa no meu ombro e então me olhou nos olhos. — Ano
passado você quis me dividir com todo mundo — referia-se ao aniversário do ano anterior, o
primeiro depois que havia se mudado para Goiânia. — Esse ano você me quer só com você?
— Exatamente — confirmei, segurando-a pelo queixo e beijando seus lábios demoradamente.
Quando a soltei, levantei-me e a puxei comigo, levando nós dois para o banheiro e fazendo assim a
minha vontade de minutos atrás. — Até posso dividir você com a fábrica hoje, durante o expediente.
Mas à noite você é só minha! — disse, entrando no chuveiro.
Laila me olhou de esguia e começou a rir, enquanto se levantava na ponta dos pés para beijar
meu ombro.
— Então nada de surpresas esse ano?
— Não — respondi com uma meia verdade. — Hoje somos só nós dois.
Sei que ela se referia à uma festa surpresa, o que de fato eu não faria esse ano.
Mas isso não quer dizer que eu não estava preparando uma surpresa para ela...
Me lembrei do seu aniversário do ano anterior, quando praticamente metade da fábrica se
juntou para cantar parabéns para Laila, numa festa preparada às pressas e por baixo dos panos.
Haviam se passado cerca de cinco meses desde o acidente que ela tinha sofrido e, com a
proximidade do seu aniversário, percebi que Laila começou a ficar triste e distante.
Ela tinha motivos para isso. Seu último aniversário havia sido arruinado por um assédio sexual
no trabalho, e tudo o que eu desejava era que todos os anos seguintes fossem diferentes, em especial
aquele, que seria nosso primeiro ano juntos.
Convoquei suas amigas, que na época já sabiam da violência que Laila havia sofrido e
frequentavam nosso apartamento rotineiramente.
Formou-se uma operação de guerra para despistar Laila e montar uma pequena festa no salão
de eventos do novo prédio administrativo, que já havia sido inaugurado.
Mobilizamos algumas cozinheiras do refeitório que fizeram questão de ajudar nos
preparativos, além de alguns funcionários do Financeiro e uma ou outra pessoa dos demais setores.
Só que as coisas saíram do controle. Depois de tudo o que aconteceu com Laila, das ameaças,
o sequestro e o acidente, a verdade é que minha namorada se tornou a “namoradinha” de toda a
fábrica.
Não sei como consigo dizer isso sem sentir uma pontada de ciúmes...
Se eu era o chefe carrasco, ela era a Bela que domava a Fera e salvava toda a vila.
Aquilo tudo era ridículo, mas no fundo eu adorava.
E, por tudo isso, o que era para ser uma simples festinha entre os colegas do Financeiro e um
ou outro amigo mais íntimo de Laila se tornou um grande evento. Todos queriam participar.
E por pouco, muito pouco, Laila não acabou descobrindo tudo, dada a proporção da coisa. Lis
teve que trancá-la no banheiro nos últimos minutos e eu tive que fingir uma discussão qualquer sobre
trabalho para despistá-la.
No final das contas, Laila estava furiosa com todos nós, principalmente comigo, quando
finalmente consegui arrastá-la para o salão onde todos a esperavam. Quando ela viu todas aquelas
pessoas reunidas ali e batendo palmas para ela, me encarou com uma expressão chocada no rosto e
eu, por um momento, pensei que pudesse ter exagerado um pouco na dose.
Mas então ela se aproximou de mim, levantou o rosto para me fitar e falou suavemente nos
meus ouvidos:
— Você não faz ideia do que acabou de me dar. Eu nunca vou me esquecer desse dia. — Seus
olhos se encheram de lágrimas e ela me abraçou com força, para delírio de toda a fábrica. — Eu te
amo mais do que tudo nessa vida.
Foi um dos dias mais felizes da minha vida.
Esse ano seria um pouco diferente. Eu só desejava que fosse tão inesquecível quanto o ano
anterior.
Capítulo 2

Quando Benício parou o carro na cancela de entrada da LBK, senhor Valdemar, um dos vigias,
rapidamente saiu de dentro da sua guarita para nos recepcionar, cumprindo só o primeiro de nossos
rituais diários.
— Bom dia, dona Laila. — Por mais que eu o pedisse para retirar aquele “dona”, ele insistia
em me chamar assim. Talvez porque do meu lado Benício sempre o encarasse com olhos de “atreva-
se a estabelecer esse tipo de intimidade...”. — Bom dia, sr. De Lucca — ele completou, e Benício
respondeu ao cumprimento com um sorriso sutil no rosto.
— Bom dia, sr. Valdemar — falei animada. — Qual é o placar de hoje?
Ele olhou com animação para o relógio que levava no pulso e se voltou para mim:
— Oito e meia, dona Laila. Hoje a senhora ganhou com folga!
— Parece que estou na frente essa semana. — Virei meu rosto para Benício e ele me olhou com
uma falsa irritação no rosto.
— A senhora sempre ganha. — O sorriso de sr. Valdemar se abriu e ele piscou para mim.
Benício resmungou alguma coisa qualquer ao meu lado e o vigia se recompôs, fazendo um aceno de
cabeça para meu namorado — e seu chefe — e se afastando do carro, liberando a passagem para
nós.
Aquela era só umas de nossas brincadeiras internas. Desde que me mudei “forçadamente” para
o apartamento de Benício, logo após o sequestro, íamos todos os dias trabalhar juntos. Isso seria
ótimo, se não fosse por um pequeno porém.
Acontece que Benício era um verdadeiro relógio britânico de tão pontual, enquanto eu... bem...
eu não era um exemplo quando o assunto era pontualidade.
Como resolver esse impasse?
Criando uma pequena competição, é claro!
Todos os dias o sr. Valdemar anotava com imenso prazer a hora que nós chegávamos. Quanto
mais atrasados, mais pontos eu tinha. Quanto mais pontuais, Benício é quem somava.
E digamos que eu ganhava quase todas as semanas...
— Se todas as manhãs forem como a de hoje, eu não me importo em perder... — Benício
murmurou assim que entrou com o carro no pátio interno da fábrica, levando uma mão para as minhas
coxas. Depois de nosso pequeno joguinho na cama, nos atrasamos um pouco mais no chuveiro.
Enlacei seus dedos nos meus e sorri em silêncio. Ele deu a volta por todo o pátio e parou o
carro ao lado da entrada do refeitório, partindo assim para a segunda parte da nossa rotina diária.
Me deu um beijo rápido nos lábios antes de destrancar as portas do carro e ordenar:
— A reunião é nove e meia. Tente chegar antes das nove.
— Hoje? — O encarei duvidosa. — Impossível! Tenho medo de entrar no refeitório e me
deparar com metade da fábrica como no ano passado.
— Se isso acontecer, dessa vez não será por minha culpa — ele falou sorrindo e eu desci do
carro.
Depois de me deixar no refeitório, Benício sempre seguia para o estacionamento
administrativo, que agora ficava atrás do novo prédio, ao lado da mata. Enquanto isso, eu pegava
café para nós dois e um pedaço de bolo ou outra guloseima qualquer. Só que nessa ida ao refeitório
eu sempre acabava conversando com alguém aqui ou ali. E aí, às vezes se passavam mais uns quinze
a vinte minutos até que eu finalmente conseguisse chegar na minha sala.
Acho que Benício só concordava com aquilo para continuar brigando comigo por conta de
atraso, mesmo nós dois chegando juntos.
Sim, ele continuava implicando com meus horários.
Algumas coisas nunca mudam...
Como eu previa, assim que entrei no imenso galpão do refeitório fui recebida por um grupo de
quinze a vinte pessoas cantando “Parabéns” e segurando um pedaço gigante dos bolos da Dona Ieda,
com dois palitinhos de velas em cima. Lis, Bia, Ana e Lu tomavam a frente da rodinha.
— Parabéns, minha baixinha preferida! — Lis falou rindo e me dando um abraço acalorado,
seguida das outras meninas.
Quando todos me cumprimentaram e finalmente consegui me sentar para comer um pedaço do
bolo, já eram quase nove da manhã.
— Gente — comecei a dizer, me levantando —, eu agradeço demais a surpresa, mas preciso ir.
Temos uma reunião nove e meia e ainda tenho que repassar uns e-mails antes de tudo.
— Você não está ficando tempo demais com o Benício? — Ana brincou.
— E vocês estão bem folgadas achando que podemos ficar aqui de conversa fiada em pleno
expediente. Não é porque todo mundo virou amiga do Quarteto que podem se dar esse luxo.
— Está até falando igual a ele — Lis gracejou.
Nós ainda chamávamos os sócios de Quarteto Fantástico, mas intimamente. Só entre nós cinco.
Acontece que com o meu namoro com Benício, acabamos juntando todo mundo em um grupo
particularmente singular de amigos. Cinco malucas e quatro sócios atraentes.
Era perfeito.
Tirando a noiva chata do Ricardo e o namorado/amigo da Lis.
— Amiga, você está se livrando da gente agora, mas de noite não vai escapar! — Lu falou
enquanto andávamos em direção ao prédio administrativo.
— Do que estão falando? — perguntei sem entender.
— Vamos todos para o apartamento de vocês! — Lis explicou eufórica. — Hoje tem festinha
na sacada de Benício e Laila!
— Todos? — Se eu entendi o que ela quis dizer...
— Sim. Todos!
— Gustavo quem me avisou hoje cedo — Ana comentou, enquanto comia um pedaço de bolo
debaixo do Sol ameno do mês de abril. — Disse que já está combinado com o Eduardo e o Ricardo.
— É seu aniversário, garota! — Bia falava divertida. — O que mais você queria?
— Acho que o Benício não está sabendo disso...
— Hum... — Bia agora me olhava com o cenho franzido. — Por acaso vocês tinham outros
planos?
— Eu não tinha plano nenhum — comecei a dizer receosa. — Mas pela conversa que tivemos
hoje cedo, imagino que ele tenha. E os planos dele me parecem bem claros: Só nós dois.
— Xiiii... — Ana murmurou quando enfim entramos no prédio. — Acho que vamos ser um
bando de empata-fodas.
— Vão sim! — Eu nem ousei negar aquele fato.
— Amiga, vocês já fazem isso todos os dias... — Bia falava num muxoxo. Ela estava radiante
de felicidade nas últimas semanas por conta do novo namorado. — Devem fazer várias vezes ao dia.
Inclusive aqui na fábrica.
— Nós paramos com isso — cortei-a rapidamente.
— Que seja — ela continuou. — Sexta-feira é feriado e vocês vão viajar para Cuiabá, para a
casa da sua mãe.
— Vamos na quinta.
— Amanhã eu tenho meu tão esperado jantar de três meses. — Os olhos dela brilharam e eu
senti uma pontada de culpa por querer ficar sozinha com Benício. Estava doida para saber todos os
detalhes do novo enrosco da Bia. — Se não nos encontrarmos hoje, não vou poder nenhum outro dia.
Parei na frente do pequeno elevador e encarei as quatro, que aguardavam por uma resposta
ansiosas.
— Ok. — Acabei por vencida. — Vou convencer o Benício. Espero que os presentes
compensem a cara feia que ele vai fazer.
Elas gritaram eufóricas e nós cinco entramos no pequeno cubículo de aço.
Quando eu e Lis chegamos no nosso andar, ele já me esperava na porta da minha sala, os
braços cruzados no peito e os olhos apertados. Ainda tive que passar por três ou quatro de nossos
colegas que vieram me felicitar antes de chegar no meu carrasco.
— Eu disse “antes das nove” — ele sibilou, batendo os dedos no relógio de pulso.
— E eu disse “impossível” — rebati, passando por ele e o puxando pela gola da camisa. —
Vem. Tenho que falar com você antes da reunião.
— Bom dia, Benício — Lis o cumprimentou rapidamente e seguiu para sua sala.
— Bom dia, Lis — ele respondeu e me seguiu em silêncio.
Aquela era outra batalha que eu havia ganho.
O chefe europeu e inacessível que é chamado pelo sobrenome “sr. De Lucca” foi, aos poucos,
dando lugar ao comum e brasileiro “Benício”.
Pelo menos entre nosso grupo de amigos e alguns colegas mais íntimos.
E Benício parecia aceitar muito bem esse novo papel.
Entrei na minha sala e dei de cara com um imenso arranjo de girassóis em cima da mesa, com
um pequeno cartão vermelho.
Minhas flores preferidas.
— Oh! — exclamei impressionada, já virando o corpo e fitando Benício, que me olhava com
um meio sorriso no rosto.
— Presente número dois do dia — ele estendeu o braço e me enlaçou pela cintura, beijando
meus lábios.
— Meu namorado rabugento e cretino foi sequestrado e substituído por um homem romântico e
meloso? — ironizei, passando a mão por seus cabelos e me contendo para não morder seu pescoço.
— Você que é uma insuportável mimada e que reclama de tudo que eu faço — ele revirou os
olhos, mas no final acabou sorrindo e me beijando novamente. — Vamos. Desembucha. O que
precisa falar comigo?
Ah, é! Tinha até me esquecido...
— É que... — comecei a dizer ao mesmo tempo em que pegava o arranjo de flores e abria o
pequeno cartão que vinha junto, e então parei. — Benício! Por que você mandou alguém escrever?!
Ele abriu um sorriso imenso no rosto.
— Achei que detestasse minha letra.
— Eu detesto! — Tentei não soar decepcionada. — Mas é a sua letra!
Ele ergueu uma sobrancelha satisfeito e se aproximou de mim. Com uma das mãos, segurou
meu queixo e me forçou a olhar nos seus olhos.
— Eu adoro você, sabia? — Tornou a me beijar e eu me perguntei se nós dois sairíamos dali
antes das dez da manhã. — Encomendei essas flores por telefone e acabei pedindo o cartão junto. —
Pegou o cartão das minhas mãos e leu em voz alta, bem próximo dos meus ouvidos. — “Para minha
eterna assistente petulante e debochada. Ainda te odeio de vez em quando”. Isso soaria melhor com a
minha letra?
— Isso soa maravilhoso com a sua voz cretina — sussurrei nos seus ouvidos e o senti se
enrijecer contra meu corpo.
— Hoje você não me escapa, diaba. — Ele se esfregou em mim rapidamente antes de me
beijar, mas aquela insinuação me fez lembrar que eu iria decepcioná-lo em minutos.
— Então... — comecei a dizer e ele imediatamente afastou o rosto do meu, já prevendo algo
pelo meu tom de voz. — Sobre isso... Parece que nossos amigos querem comemorar meu aniversário
lá em casa hoje à noite...
— O que?! — Seus olhos se apertaram e ele exclamou um pouco alto demais.
— As meninas me falaram agora a pouco. “Festinha na sacada de Benício e Laila”. Palavras da
Lis.
— Não! — Ele foi incisivo.
— Benício... — Fiz um beicinho e o puxei pelo queixo para me encarar. — Hoje é o único dia
que todos podem ir. É meu aniversário...
— De quem foi a ideia?
— Adivinha.
Ele precisou de dois segundos para acertar:
— Eu vou esmurrar o idiota do Gustavo!
— Você deveria se sentir agradecido por ter amigos que querem comemorar o aniversário da
sua namorada. — Dei um beijo em sua bochecha e ele me olhou com ceticismo, mas eu senti que o
estava amolecendo. — Depois podemos fazer nossa festinha particular...
— Eu tinha planos para hoje!
— Posso saber quais eram seus planos? Ia me levar a algum lugar?
— Não. — Ele virou os olhos para as imensas janelas que davam para a mata dos fundos da
fábrica, evitando assim me fitar. Estava me escondendo alguma coisa. — Pedi a Zezé para preparar
uma carne para nós. O plano era ficar em casa mesmo. Mas com menos pessoas. — completou
irônico e voltando a me encarar.
— Podemos comer essa carne com nossos amigos. E depois que eles forem embora, prometo te
recompensar.
— Vou cobrar — bufou chateado.
— Pode cobrar, meu amor. E obrigada pelas flores.
Seu rosto se quebrou em um sorriso satisfeito e eu concluí que tinha conseguido.
Gustavo me devia uma.
Capítulo 3

Gustavo e aquele bando de malucas tinham arruinado meus planos com Laila, mas tenho que
admitir que, no final das contas, seria uma ótima noite. Minha namorada estava super animada no dia
do seu aniversário — talvez até mais do que no ano anterior — e era só isso que me importava.
Pedi a Zezé que mudasse o cardápio e comprasse algumas coisas que pudessem ser servidas de
petiscos, além de encomendar salgados.
Também pedi que aumentasse o estoque de bebidas da casa.
Conheço aquele bando o suficiente para saber que essa noite será longa. E bêbada.
A aproximação do nosso grupo aconteceu de forma lenta e natural. A trupe de Laila começou a
frequentar nossa casa, assim como meus amigos também costumavam ir lá, ainda que com menos
frequência. Foi só questão de tempo até que um dia os dois grupos se topassem, começassem a
conversar e a se entender.
A sinceridade e autenticidade das amigas de Laila impressionaram Eduardo, divertiram
Ricardo e, claro, casaram perfeitamente com as características de Gustavo. A relação patrão-
empregado sumia completamente quando estavam todos reunidos.
Já eram quase oito da noite. Laila se arrumava no quarto enquanto eu terminava de colocar
algumas bebidas para gelar quando a campainha tocou. Abri a porta e era Ricardo.
— Achei que você não viria — falei baixinho, depois de o cumprimentar.
Mais cedo, logo depois da reunião das nove e meia, Ricardo me chamou em particular para
uma conversa. Veio me segredar que seu noivado de cinco anos havia terminado no dia anterior.
Camila havia simplesmente saído de casa. Sem explicação. Sem motivo. Ela não queria mais e fim.
— Jamais deixaria de comemorar o aniversário da Laila — ele falou também baixo, talvez
adivinhando que eu ainda não tivesse contado sobre o término do noivado para ela. — E talvez faça
bem para mim.
— Já falou com a Camila?
— Tentei falar várias vezes, mas ela se recusa. — Ele suspirou, parecendo cansado. — Acho
que vou dar um tempo.
— Faça isso. Mas não deixe de pensar em você. Lembre-se que foi uma decisão dela, e
totalmente infundada. Você não tem que se culpar ou se arrepender de nada.
Aquilo era o máximo que eu poderia dizer para meu amigo em um momento como aquele sem
magoá-lo. A verdade é que nunca gostei de Camila. Ela sempre me pareceu soberba demais. Distante
demais. E talvez o fim daquele noivado fosse uma bênção para ele. Ricardo só precisava de um
tempo para perceber isso.
Curioso pensar que não só eu como os demais sócios nos sentíamos muito mais à vontade com
as meninas do que com a noiva de Ricardo, que conhecíamos há muito mais tempo.
— Ricardo! Sempre o primeiro! — Laila exclamou assim que entrou na sala.
Ela usava um vestido vermelho que eu havia lhe dado de Natal, com sandálias douradas,
cabelos sempre soltos e as unhas pintadas de rosa.
Era nessas horas que eu me sentia o fodão em saber que aquela mulher era minha.
E logo eu pretendia tornar aquilo oficial.
— Já te dei os parabéns hoje na fábrica, Laila, mas repito aqui os votos de muita saúde. Amor,
vocês dois já tem até demais. — Ricardo a abraçou e lhe entregou um embrulho pequeno.
— Muito obrigada. — Ela abriu a embalagem e deu uns gritinhos eufóricos ao se deparar com
uma pequena gargantilha e um pingente de pérolas, de fato muito bonito. — Que lindo, Ricardo! A
Camila tem muita sorte de ter um homem que sabe escolher joias. — Ela piscou para mim e eu
revirei os olhos, percebendo a indireta. — Onde ela está, por falar nisso?
— Ela tinha um compromisso e não pôde vir.
Laila fez um muxoxo, fingindo decepção, mas sei que no fundo nem se importou com a ausência
de Camila.
— Adorei o presente! — falou, mudando rapidamente de assunto. — Inclusive, vou colocar
agora! — E virou as costas, voltando para o quarto.
— Cara, até hoje eu me pergunto o que a Laila viu em você — Ricardo falou assim que ela
sumiu no corredor.
— Eu me faço essa pergunta quase todo dia — comecei a rir, me encaminhando para uma das
poltronas, enquanto meu amigo se servia de uma caneca de chopp.
— Fico muito feliz por você, Benício. É muito bom ver meu amigo rabugento babar feito um
idiota apaixonado por uma mulher. Isso mesmo depois de tanto tempo juntos.
— Cale a boca, seu imbecil. — Me levantei e me servi de uma caneca também, sentando-me
novamente.
— Gustavo comentou que você não ficou muito satisfeito com essa festinha de hoje. Parecia ter
outros planos. — Ricardo se sentou na poltrona ao lado da minha e se debruçou ao meu lado, falando
agora em tom mais baixo. — Por acaso é o que eu estou pensando?
— O que você está pensando?
— Nada demais. — Ele se esticou na poltrona relaxado e levantou sua mão direita, revelando
a aliança que ainda levava nos dedos. — Talvez você pretenda colocar algo que eu estou prestes a
tirar — insinuou, erguendo uma sobrancelha.
Aquele ali me conhecia de verdade...
— Talvez eu pretenda — murmurei, escondendo um sorriso.
— Só posso te desejar boa sorte, amigo — Ricardo concluiu, erguendo seu copo e me
oferecendo em brinde. Bati minha caneca na dele enquanto dizia:
— Confesso para você que essa noite eu preciso de um pouco de coragem também.
Ele abriu um sorriso largo e não disse nada.
Pouco tempo depois a campainha tocou novamente.
Pelo barulho do corredor, a trupe estava chegando em peso.
— Eu atendo! — Laila gritou já saindo do quarto.
Espremidos no hall de entrada estavam Lu, Ana, Eduardo e Gustavo.
— Lailaaa! — Ana com seus gritos eufóricos e levando um imenso bolo decorado rompeu
porta adentro, enquanto Laila se perdia numa confusão de abraços e presentes. — Meu Deus! Nunca
mais eu pego carona com o Gustavo! — ela esbravejou, enquanto cumprimentava a mim e ao Ricardo
e deixava o bolo em cima da mesa.
— Você pegou carona com o Gustavo? — Ricardo bateu a mão no braço da poltrona, rindo, já
absolutamente relaxado. Aquela noite iria fazer bem a ele. — Eu já avisei a vocês que ele não sabe
dirigir.
— Lógico que sei! Você que dirige feito uma mulher! — Ele avançou na nossa direção, mas
acabou sendo interrompido por Laila, que o puxou pelo braço.
— Como assim: “feito uma mulher”? — Ela apertou os olhos e deu um tapa em seu braço.
— Ok! — ele levantou os braços em sinal de rendição e recomeçou. — O Ricardo dirige feito
uma pessoa recém habilitada que nunca passa de quarenta por hora e ainda vive na faixa da esquerda
atrapalhando os outros.
— Ei! — Ana gritou divertida. — Eu sou essa pessoa!
— Então o Ricardo dirige igual a Ana — Gustavo concluiu revirando os olhos e voltando-se
para ela. — E você ainda reclama do jeito que eu dirijo?
— A gente quase morreu naquele cruzamento! — ela exclamou exagerada.
— O sinal estava amarelo. Amarelo significa “corre que dá tempo”. Foi o que eu fiz — ele
explicou calmamente.
— Amarelo significa “atenção”, trouxa — Eduardo corrigiu. — Depois é multado e fica aí
falando de “indústria da multa”.
— Não sendo multado com um dos carros da fábrica... — falei dando de ombros e sendo
seguido por Ricardo que acenou em concordância com a cabeça.
— É o aniversário da Laila ou a minha prova do Detran? — Gustavo resmungou, já se servindo
de uma caneca também. — A gente estava atrasado para pegar a encomenda na doceria — ele
explicou rapidamente e se voltou para mim. — Deixei meu carro na portaria e amanhã um de vocês
dois vai dirigindo com ele até a fábrica, ok?
Enquanto nós tomávamos chopp, as garotas preferiram se servir de vinho e dos drinks que Lu
preparava. Pouco tempo depois, foi a vez de Lis chegar com seu namorado, John.
Ele quase nunca ia aos nossos encontros, mas parece que o aniversário de Laila era uma
daquelas ocasiões especiais que valessem a sua presença.
Não que eu tivesse algo contra o rapaz. Ele era simpático e educado. No fundo, eu até gostava
do jeito meio reservado dele, mas tenho que admitir que Laila tinha razão em dizer que eles mais
pareciam amigos do que namorados. Não havia muita vontade da parte de John em acompanhar Lis, e
aquilo tudo nos parecia muito frio.
Mas... como Laila sempre dizia: Se Lis não reclamava, quem éramos nós para dizer alguma
coisa?
Bia foi a última a dar o ar da graça, quase uma hora depois.
— Achei que hoje eu iria conhecer seu príncipe encantado — Laila falou enquanto abraçava
Bia. — Por que demorou tanto?
— Ele tentou vir, mas não conseguiu. Fiquei esse tempo todo esperando.
— O que o seu namorado faz, mesmo? — Eduardo perguntava. O rapaz tímido que conheci na
faculdade até que lidava bem com aquelas malucas.
— Médico. Está no plantão agora — Bia respondeu, sem disfarçar o orgulho e o brilho
apaixonado nos olhos.
— Ainda acho muito estranho o seu dedo podre acertar alguém mais perfeito que o Ricardo —
Gustavo ironizou, fazendo graça com os dois ao mesmo tempo.
— Não seja estraga prazeres, Gustavo. — Bia fez uma careta, mas continuou rindo. — Você diz
isso porque seu coração é incapaz de se apaixonar. Acha que todos os homens são iguais a você.
— E são! Tirando o Benício, que foi abduzido e hoje vive no planeta Laila, e o Ricardo que
nasceu com o gene da perfeição, todos são exatamente iguais. Até o Eduardo é igual a mim. —
Apontou para nosso amigo e então se voltou para o namorado da Lis. — Somos um bando de idiotas
que vivem fazendo cagada porque pensam demais com a cabeça de baixo. Concorda comigo, John?
Esse era o jeito Gustavo de puxar conversa...
John pareceu sem graça para responder e Lis saiu em seu socorro:
— Concordo que todo homem é meio idiota, sim. — Ela fez uma pausa e abraçou o namorado
pela cintura. — Mas alguns valem a pena nossa insistência.
Gustavo simplesmente se estirou na cadeira que estava sentado, mudo, e cruzou os braços.
— Adoro quando alguém cala a boca do Gustavo — falei sorrindo ironicamente, enquanto
Gustavo me mostrava o dedo do meio.
Pouco depois das dez da noite, logo após cantarmos “Parabéns” para Laila e com todos já
levemente alterados, John levantou-se ameaçando ir embora.
— Não vai, John — Laila pedia com sinceridade. — Você quase nunca vem na nossa casa, e
ainda é cedo.
— Eu realmente preciso ir... — Foi a fala nada convincente dele. — Você pode ficar, Lis. Sei
que vocês são acostumados a ficar acordados até altas horas.
— Tem certeza? — Ela parecia dividida entre ir com ele e ficar.
— Sim. Pode se divertir. Eu vou para minha casa — ele falou, dando um selinho rápido nos
lábios dela e indo embora.
Era exatamente nesses momentos que todos nós tínhamos a sensação de que aquilo era bem
menos que um namoro.
Capítulo 4

Assim que o John foi embora as coisas começaram a desandar.


Ou...
No caso da nossa turma de malucos, foi o momento exato em que as coisas começaram a ficar
exatamente como elas sempre costumam ficar.
Lu, finalmente liberta da sua timidez do John pelos efeitos do álcool, subiu em cima de uma das
nossas cadeiras e anunciou com pompa:
— Que os jogos comecem!
— Alguém tira a bebida da Lu! — Bia gritou da sua cadeira.
— Amiga, nada de joguinhos que envolvam tirar a roupa — Lis falou, erguendo uma mão para
Lu e a chamando para descer da cadeira.
— Não é desse tipo de jogo que estou falando. — Ela levantou um dos braços, segurando uma
garrada vazia de vinho. — Vamos brincar de “verdade ou consequência”.
Ricardo começou a gargalhar e Benício, que estava sentado ao meu lado e me enlaçava pela
cintura, revirou os olhos.
— Que brincadeira de adolescente, Luciana — ele falou, negando algumas vezes com a
cabeça.
— Você está enganado, Benício — Lu continuou convicta. — Essa é uma brincadeira que
adultos também fazem, principalmente quando estão bêbados.
— Um bando de idiotas — ele insistiu.
— Então somos as pessoas certas — Gustavo começou a rir, já se aproximando de Luciana e
deixando claro que estava do lado dela.
— Não — Benício voltou a falar, negando várias vezes com a cabeça.
— Tem medo de perguntas comprometedoras, por acaso? — Gustavo provocou. — Tem algo
que Laila não possa saber?
— Não! — ele negou rápido demais e eu me voltei para ele com a expressão duvidosa.
Benício estreitou os olhos para mim e continuou. — Não me olhe com essa cara, srta. Laila!
— Pois agora sou eu quem quero jogar isso, sr. De Lucca! — Cruzei os braços e o desafiei,
ouvindo ao fundo os gritinhos animados de Lu e as palmas calorosas de Gustavo.
— Não se pode contrariar a aniversariante. — Ana entrou na brincadeira.
Benício continuava com os olhos cravados em mim quando agarrou meu queixo e aproximou
seus lábios do meu rosto, sussurrando em meus ouvidos:
— Pare de beber um pouco. Quero você lúcida quando tudo isso acabar.
— Isso não vai acabar tão cedo. Vamos ter que enxotá-los daqui — eu também sussurrava.
— Eu pego a vassoura e você o rodo.
— Por que precisa de mim lúcida? — Eu senti sua língua passando pela minha orelha
lentamente e estremeci. — Para isso? Já fizemos isso muitas vezes bêbados.
— Quero que se lembre de cada detalhe dessa noite — murmurou lentamente, enquanto levava
a outra mão aos meus cabelos antes de me beijar na boca.
— Ei! — Ana gritou apontando para nós. — Nós ainda estamos aqui.
— Infelizmente... — Benício resmungou, soltando meus lábios.
— Vamos jogar ou não? — Lu voltou a chamar e eu me levantei para retirar um punhado de
pratos e copos que estavam na mesinha de centro da sala para que ela pudesse começar seus
joguinhos.
Todos nos sentamos em volta da mesa de vidro e Lu foi a primeira a rodar a garrafa, com uma
empolgação contagiante. A garrafa girou algumas vezes e parou com os fundos virados para Bia e a
boca voltada para Gustavo.
Bia ergueu as sobrancelhas satisfeita, enquanto esfregava as mãos.
— Vamos lá, Gustavo! Verdade ou consequência?
— Verdade, lógico. Você é perigosa.
— Hum... — Ela levou dois segundos para fazer a pergunta. Parecia ter ela na ponta da língua.
— Você já quis beijar uma de nós?
— Deus do céu, Bia! — Gustavo tossiu com a bebida. — Eu sabia que você era perigosa!
— A verdade — Ela pediu suavemente.
Gustavo endireitou os ombros e se recostou na cadeira antes de dizer, olhando para o teto e
evitando assim entregar qualquer informação com os olhos:
— Já.
Benício, que estava ao meu lado com o corpo todo relaxado no sofá e me agarrando pela
cintura enquanto eu me apoiava em seu peito, endireitou-se na mesma hora e arregalou os olhos.
Ricardo estava de queixo caído e todos os outros pareciam sem palavras. Eduardo foi quem fez a
pergunta que todo mundo parecia querer gritar:
— Quem?
— A garrafa rodou de novo e eu não vi? — Gustavo se virou para ele. — Era a vez da Bia
perguntar, e eu já respondi a sua pergunta.
Gustavo já quis beijar uma das meninas?
Aquela era a informação do ano!
Logo que começamos a sair todos juntos, em nossa primeira noite de bebedeira mais pesada,
tivemos a bela surpresa de constatar que Gustavo se encaixaria bem mais no papel de amigo
confiável do que no de cafajeste pegador.
Ao menos no que dizia respeito às meninas do grupo, pois ele continuava um pegador de
sucesso com o resto do planeta.
Camila, a insuportável e soberba noiva de Ricardo, insinuou que Lu formaria um ótimo par
com Gustavo, fazendo brincadeiras de mal gosto e constrangendo Luciana abertamente.
Eu e as meninas, que ainda tínhamos a imagem do Gustavo pegador e com a “porra-de-mel”,
ficamos com medo de que ele usasse aquilo para se vangloriar, mas fomos surpreendidas quando
nosso diretor de Marketing se levantou indignado e acabou com a brincadeira, deixando Camila com
um bico imenso no rosto e Ricardo enormemente constrangido.
A noiva chata quis ir embora da festa cinco minutos depois, e desde então eu não faço questão
alguma da sua presença.
— Você já sabe qual vai ser a pergunta que vão fazer caso essa garrafa te escolha de novo —
avisei Gustavo, e fui seguida de um acenar de cabeça em concordância de praticamente todos os
outros.
— Eu não vou mais escolher verdade. Simples. — Ele foi direto. — Próximo! — e gritou,
pegando a garrafa e a girando novamente.
Dessa vez, Eduardo perguntaria para Lis.
— Verdade ou consequência?
— Verdade.
— Bem... — Eduardo parecia mais ansioso que a própria Lis. — Você... errr... gente, não sei o
que perguntar!
— Ah, pelo amor de Deus! — Gustavo esfregou as mãos no rosto. — Eu posso ajudá-lo?
Tenho várias perguntas.
— Nem pensar! — Lis gritou sorridente. — A garrafa é inquestionável. Ela escolheu o
Eduardo, então ele pergunta.
— Faça uma pergunta sobre a rotina de sexo dela com o John — Ana disparou.
Eduardo ficou com as faces vermelhas e Lis gritou indignada:
— Cala a boca, Ana! É a vez do Eduardo! Parem de querer me foder.
— Vocês transam todo dia? — um Eduardo receoso perguntou.
Lu explodiu em gargalhadas e Gustavo bateu as mãos nas costas do amigo.
— Meu orgulho, cara. — elogiou de forma teatral.
— Não vou responder! — Lis tentou fugir da pergunta. — Foi uma pergunta influenciada.
— A garrafa é inquestionável — repeti com ironia e ela me fuzilou com os olhos. — O
Eduardo perguntou, você responde.
— Não — enfim respondeu, cruzando os braços. — Que casal transa todo dia?
— Benício e Laila — Benício falou do meu lado com uma naturalidade absurda.
— Cale a boca, Benício! — Dei um tapa nele e ele riu, me dando um beijo e mordendo de leve
meus lábios.
— Sem preliminares aqui, por favor! — Lis gritou, pegando a garrafa e a girando novamente.
— Você deveria ter sido mais específico na pergunta, Eduardo — Ana opinou, enquanto a
garrafa ainda rodava. — Realmente, a maioria dos casais não transa todo dia. Só esses
ninfomaníacos daí. — Apontou para mim e Benício. — A resposta da Lis não disse nada do que eu
queria saber.
— Vou amaldiçoar essa garrafa para ela não te escolher para me fazer outra pergunta — Lis
falou para Ana.
Só que, contrariando as preces de Lis, a garrafa escolheu justamente Ana para fazer a próxima
pergunta.
Para Benício.
— Merda! — Benício gemeu ao meu lado e eu ri. Um pouco.
Qualquer pergunta para ele poderia me afetar.
Ana soltou uma risadinha inocentemente diabólica e perguntou:
— Verdade ou consequência?
— Escolhe consequência, Benício — Ricardo avisou.
— Verdade — Benício decidiu e se preparou para a bomba.
— Onde foi que vocês transaram pela primeira vez? A Laila nunca contou, mas eu aposto que
foi na fábrica.
— A Laila nunca contou? — Benício parecia mais surpreso com isso, o que me intrigou.
— Por que a surpresa? — questionei. — Por acaso você contou para alguém?
Ele me fitou mudo e eu escutei uma risadinha baixa de Gustavo.
O que?!
Me levantei de um salto da poltrona e encarei Benício de cima.
— Você contou para eles?
— É a vez da Ana perguntar. — Ele cruzou os braços e tentou me ignorar. — Não você.
Olhei para Ricardo e ele me olhava com cara de culpado. Eduardo parecia querer me evitar,
enquanto Gustavo... nem preciso comentar.
— Você contou para os três! Seu cretino!
— Eu falei para você escolher consequência — Ricardo lembrou.
— Quero ouvir de vocês! — gritei exagerada, apontando para os três sócios do meu namorado.
— Onde foi nossa primeira vez? Quero ver o que ele contou.
— Eu posso contar. — Gustavo parecia estar divertindo-se demais com tudo aquilo.
— E depois vai se ver comigo se fizer isso — Benício sibilou atrás de mim.
— Quero ouvir do Eduardo. — Acabei me decidindo e cruzei a sala com um pulo. Eduardo
encolheu-se quando parei na sua frente. — Onde foi a nossa primeira vez?
— A Ana perguntou para mim, Laila. — Benício tentou reestabelecer o controle, mas eu não
daria o braço a torcer.
— Eduardo! — insisti, cruzando os braços. — Você tem cinco segundos!
Eduardo moveu os olhos de mim para Benício por duas vezes antes de se decidir:
— Na sala de conferência do antigo prédio. Dois dias depois da festa de lançamento de linha
Eco — ele despejou de olhos fechados e erguendo os braços, como se temesse uma agressão minha
ou do Benício.
— Benício! — gritei indignada e me voltei para ele, que já estava em pé ao meu lado e me
encarava sem qualquer expressão.
— Naquela mesa oval? — Ana perguntou e Benício concordou com a cabeça, ainda me
fitando.
— Eu já comi pizza naquela mesa depois daquela festa — Lu falava. — Mas que nojo, Laila!
— Vocês são dois pervertidos. — Bia estava rindo.
— E vocês um bando de santos imaculados — Benício ironizou e me envolveu pela cintura, me
puxando para sentar novamente.
Sentamos e Benício rodou a garrafa com um movimento brusco.
— Essa garrafa é do cão! — Ricardo murmurou quando ela parou de modo que Lu fizesse uma
pergunta a Eduardo.
— Verdade ou consequência? — Lu perguntou.
— Consequência — Eduardo falou rapidamente.
Lu gritou animada e todo mundo pareceu um pouco chocado.
— Você fumou alguma coisa, Eduardo? — Gustavo era o mais surpreso. — A Lu vai foder
contigo!
— Vocês só ficam fazendo perguntas sobre sexo. Tenho até medo do que a Lu poderia perguntar
— ele tentou justificar sua escolha.
— E você acha que a consequência que ela vai escolher é sobre o que, cabeção? — Benício
constatou calmamente, e Eduardo se deu conta da enrascada em que se meteu.
— Eu posso trocar? — ele pediu com voz sumida.
— Nem pensar! — Lu gritou apontando o dedo para ele. — Sua consequência vai ser... — Ela
olhou para todos na rodinha, como se pensasse no que pretendia fazer e acabou decidindo-se. — Vai
beijar uma de nós.
— Mas que obsessão que vocês estão com beijo hoje! — Eduardo rebateu inconformado.
Ela ignorou a fala dele e continuou:
— Como Bia, Lis e Laila são comprometidas, só sobra eu e a Ana. Então, por óbvio, eu vou
escolher a Ana.
Ricardo explodiu numa gargalhada sonora e vi Benício colocar as mãos no rosto para esconder
um sorriso debochado que surgiu nos seus lábios.
Eduardo ficou pálido feito uma folha de papel e Ana, incrivelmente vermelha, embora
continuasse com o mesmo olhar divertido e despretensioso.
— Eu vou beijar um dos sócios gatos? — ela brincou, já se levantando, enquanto colocava sua
taça de vinho em cima da mesa. — Alguém tira uma foto?
— Na hora! — Gustavo falou, já tirando o celular do bolso, sendo seguido por Bia, Lis e Lu.
Até Benício tirou o celular do bolso!
— Essa eu tenho que registrar... — o vi murmurar ao meu lado, rindo.
Eduardo continuava paralisado na sua cadeira enquanto Ana, tímida ao seu jeito, ajoelhou-se
na sua frente, apoiando as mãos em seus joelhos.
— Eu sou desbocada, mas também sou tímida. — Ana riu baixinho e pareceu ficar indecisa
enquanto olhava para cima e esperava por Eduardo.
— A consequência é sua, Eduardo! — Ricardo bradou depois de um tempo. — Beija ela logo.
A cena foi rápida. Eduardo, com os olhos arregalados, debruçou-se para frente e colou os
lábios nos de Ana por poucos segundos. Quando endireitou o corpo, tinha as faces queimando.
Ana pareceu não se afetar. Continuou com aquele riso frouxo e o olhar alegre.
— Deu tempo de fotografar? — ela perguntou, levantando-se.
— É mais fácil tirar foto de um raio — Lis murmurou, enquanto olhava para as fotos que tirou
na tela do seu celular.
— Eu peguei uma foto ótima — Gustavo falou com uma risadinha silenciosa na direção de
Eduardo. — Quer que eu te mande, amigo?
— Vai para o inferno, Gustavo! — Eduardo xingou irritado, levantando-se e rodando a garrafa
novamente.
Continuamos com aquela brincadeira perigosa e adolescente por mais uma meia hora até que
Benício e Gustavo começaram a discutir sobre quem tinha bebido a última lata de cerveja do
frigobar da casa de praia de um Carnaval de seis anos atrás, e achamos por bem que era o momento
de encerrar com aquele joguinho.
Eu fui até um dos quartos e voltei com um baralho nas mãos, mas antes que pudesse chegar na
sala fui interrompida por Benício, que me agarrou pelos cotovelos e me levou até a cozinha.
— Está maluca?! — ele inquiriu baixinho. — Eu quero enxotar todos eles daqui e você pega o
baralho? Se vocês começarem a jogar, eles vão acampar aqui pelos próximos dois dias!
— Benício — comecei a dizer com calma. — Não importa quais tenham sido seus planos para
hoje, eles já foram arruinados. Está todo mundo se divertindo.
— Eu ainda não desisti de fazer o que eu queria, Laila.
— Meu amor, por que essa insistência? A gente pode fazer nossa comemoração amanhã. Que
diferença faz?
— Porque eu quero hoje! — Bem cabeça dura.
— Você diz isso por conta do meu aniversário? — ele concordou com a cabeça e eu continuei,
apontando para o relógio do display da geladeira. — De qualquer maneira já era, amor. Já passou da
meia noite. Meu aniversário foi ontem.
Ele olhou para o relógio com uma imensa dose de decepção e então voltou-se para mim. Pegou
o baralho que eu levava nas mãos e jogou em cima da bancada, me puxando para fora.
— Vem comigo! Cansei de esperar! — E nos levou para o quarto.
Benício trancou a porta e fez um sinal para que eu me sentasse na cama.
— Somos os donos da casa. Não podemos simplesmente nos trancar aqui. Temos convidados
— rebati, mas acabei me sentando.
— Eu não convidei ninguém — ele respondeu e virou as costas, indo até a mesinha de
cabeceira ao lado da cama e abrindo a gaveta de baixo. Remexeu rapidamente e tirou do fundo uma
caixinha vermelha de veludo.
Em silêncio, ele se sentou ao meu lado na cama e pegou minha mão esquerda, enquanto abria a
caixinha e me observava com aqueles intensos olhos cor de mel.
Ai
Meu
Deus
Um anel com um solitário imenso brilhou no meio do veludo vermelho e me fez prender a
respiração.
O que esse maluco pretende fazer?
O encarei muda, esperando que dissesse alguma coisa. Benício acariciou lentamente meus
dedos, ainda me fitando. Parecia escolher as palavras, e eu sabia que, quaisquer que fossem as
palavras que ele escolhesse, minha resposta seria uma só.
Para aquele homem que eu amava de uma forma que jamais imaginei que pudesse amar alguém;
Para aquele que me ensinava todos os dias sobre companheirismo e parceria. No trabalho e na
cama. Que me via como aliada e igual, mesmo em momentos como aquele, sentando-se ao meu lado,
e não se ajoelhando abaixo de mim ou mesmo ficando de pé, me olhando de cima;
Para aquele que demonstrava seu amor em pequenos gestos todo santo dia, sempre atento a
cada necessidade minha, desde o momento que eu acordava;
Para aquele que tinha uma letra odiosa e um mau humor por vezes implacável, mas era o único
que conseguia lidar com minhas crises de TPM;
Para aquele que me pediu uma única noite e me deu em troca sua vida inteira;
Para Benício, só haveria uma resposta possível...
Capítulo 5

Meu pai sempre foi um homem brincalhão. Daqueles que fazem piadinhas idiotas e mesmo
assim todo mundo ri, já que ele tem o dom de conseguir colocar alegria e graça em tudo o que diz e
faz.
Eu, obviamente, não puxei seu humor.
Por ser todo “engraçadinho”, por muitas vezes tive dúvidas de quando meu pai estava sendo
sério e quando estava sendo apenas irônico.
Uma das primeiras conversas sérias de que me lembro ter com ele, ainda na adolescência, foi
sobre relacionamentos, assim que comecei a namorar pela primeira vez.
E de tudo o que meu pai disse, no alto dos meus dezessete anos, a frase que mais me afetou foi:
“Case-se com uma mulher que te faça querer ser sempre a sua melhor versão para o
mundo”.
Na época eu não entendi muito bem, mas aquilo me tocou.
E hoje, pouco mais de dezesseis anos depois, eu entendo perfeitamente o que ele quis dizer.
Ali, sentado naquela cama que dividíamos há um ano e meio, do lado da mulher que eu amava
com a força de um tsunami, eu me sentia em minha melhor versão.
Por mim e por ela, eu queria ser o melhor.
Nem mais, nem menos do que fui antes dela, mas o meu melhor.
Durante toda a minha juventude, conheci mulheres que quiseram me mudar. Que quiseram me
moldar ao que elas queriam. Laila nunca quis me mudar. Ela viu o melhor em mim e simplesmente
pediu, ainda que em silêncio, que aquele melhor sempre prevalecesse.
E eu faria isso até o fim dos meus dias.
Um milhão de coisas passavam pela minha cabeça enquanto Laila me fitava com aqueles belos
olhos negros, e todo o texto que eu havia decorado o dia inteiro se evaporou da minha mente.
O que saiu dos meus lábios não foi o que eu decorei, mas veio direto do meu coração:
— Laila. Amar você me faz querer ser sempre o meu melhor — respirei fundo e continuei. —
Eu sei que não sou perfeito, mas aqui está minha melhor versão. A que te ama e que odeia seus
atrasos. A que tem uma letra horrorosa, mas que faz seu leite quente toda noite. A que é mal-
humorado na maior parte dos dias, mas suporta sua TPM assassina. Esse sou eu, Laila. E quero que
se case comigo.
Ela continuou muda, me olhando com atenção e profundidade.
Poderia dizer logo que sim, mulher torturadora?! Eu estava ansioso para caralho!
No entanto, ao invés de responder, Laila jogou-se nos meus braços de repente, me agarrando
pelo pescoço e praticamente me jogando de costas no colchão.
Ok... acho que isso é um sim.
Ainda segurando a caixinha com o anel, a beijei, sendo correspondido por uma Laila
esfomeada e exigente. Ela me puxou pelos cabelos e me fez deitar na cama. Se debruçou sobre meu
corpo e subiu em meu abdômen, travando-me com suas pernas. Seu vestido subiu até a altura da
cintura com o movimento e ela terminou de retirá-lo sem nenhuma cerimônia, ficando só de calcinha
e sutiã.
É. Acho que podemos deixar esse pedido de casamento para depois...
Joguei a caixinha com o anel em algum lugar desconhecido e agarrei sua cintura, inebriado com
a visão de Laila radiante acima de mim.
Eu nunca me cansaria daquela mulher!
Laila se debruçou e colou seus lábios nos meus. Enquanto nos beijávamos, ela abria o zíper da
minha calça e a retirava com velocidade. Comecei a desabotoar minha camisa e ela me impediu:
— Se você tirar essa camisa eu não te deixo sair daqui nas próximas quatro horas, e tem um
bando de empata-fodas lá fora.
Eu ri do comentário dela e sugeri:
— Podemos expulsar eles agora.
— Depois. Primeiro vamos resolver uma questão. — E retirou a sua calcinha, enquanto eu
puxava minha cueca. — Eu te amo, sabia? — declarou com doçura, segundos antes de se encaixar em
mim, que já estava completamente duro.
— Deus, Laila! — eu gemi quando ela se abaixou de uma vez. Apertada. Úmida. Me
arranhando sem dó. Naquela posição ela tinha total controle e aquilo me deixava louco.
— Não fale tão alto — falou, sorrindo diabolicamente.
— Eu vou gritar que estou transando fodido com você! Quem sabe assim eles se tocam e vão
embora...
— Você sabe que eles não vão... — ela ronronou baixinho, enquanto começava a se mover
lentamente em cima de mim.
Suas pernas se moviam com lentidão, me provocando e apertando. Eu movi meus quadris para
encaixá-la mais fundo e vi Laila jogar a cabeça para trás, paralisada com meu movimento. Agarrei
sua cintura e assumi o controle dos movimentos, impulsionando meu corpo para cima e movendo
Laila com força.
Ela fechou os olhos e agarrou meus ombros, tentando conter um gritinho baixo que eu sei que
se acumulava em sua garganta. Seus cabelos caíam no seu colo como um manto da luxúria e Laila me
unhou com força, provocando um som áspero da sua pele contra o tecido da camisa.
Seu orgasmo veio rápido, intenso e provocante. Ela jogou a cabeça para frente e seus longos
cachos caíram no meu rosto, tampando minha visão. Sem dar tempo para que ela se recuperasse,
continuei me movendo com rapidez, aproveitando ao máximo a profundidade que aquela posição me
oferecia.
— Sim...
Escutei Laila dizer dentro da névoa de cachos e prazer que nos cercava. Ela então jogou o
corpo para trás, retirando os cabelos que caíam no meu rosto. Debruçou-se novamente e me beijou
nos lábios, antes de repetir:
— Sim. Eu me caso com você em todas as suas versões — falou suavemente, me fazendo parar
com os movimentos para encará-la.
— Eu te amo, Laila. — sussurrei, olhando em seus olhos.
— Eu também te amo, Benício — ela respondeu, e então começou a mover-se com ferocidade,
me cegando de tesão.
Suas pernas moviam-se como pistões e faziam a cama ranger de leve.
Fodam-se nossos amigos que podem escutar! Eu vou me casar com essa mulher! Ela disse
sim!
Laila ia cada vez mais rápido, cada movimento fazendo nossos corpos se chocarem. Seu
interior quente e úmido se apertando e me envolvendo.
Senti uma pressão monumental no meu corpo e gozei com um gemido rouco e incontido. Laila
também explodiu em um segundo orgasmo e se deixou cair sobre meu corpo. Sua pele suave e quente
sendo sentida sobre a minha camisa que agora estava amarrotada.
Ficamos assim, em silêncio, ouvindo um a respiração do outro, como sempre gostávamos de
ficar.
Foi ela quem rompeu com a quietude:
— Eu pego a vassoura e você o rodo?
— Estava pensando em jogar umas bombinhas na sala, o que acha?
— Acho que teríamos problemas com o síndico.
— Tem razão. Eu pego o rodo — decidi, ajudando-a a se levantar. Enquanto Laila ia ao
banheiro e se vestia, procurei pela caixinha vermelha que havia ficado caída no chão do quarto.
Quando ela voltou, eu já estava completamente vestido e a esperava em pé ao lado da cama.
A chamei com um movimento de cabeça e pedi que estendesse a mão. Coloquei o anel e beijei
seus dedos com suavidade, enquanto ela abria um sorriso imenso no rosto.
— Até que você sabe escolher uma joia quando quer... — ironizou, esticando o rosto para que
eu beijasse. Depois do beijo, enlacei seu corpo e nos dirigimos abraçados para a sala.
Lá encontramos um bando de idiotas em uma discussão acalorada sobre os episódios do
seriado Chaves. Bia insistia em defender a Dona Florinda, dizendo que ela era uma pobre mãe viúva
que teve que lidar sozinha com a educação do filho pequeno, por isso era tão superprotetora com
Quico. Do outro lado, Lu argumentava que Quico teria sérios problemas na vida adulta com todo
aquele excesso de proteção, sendo acompanhada de Gustavo e Lis, que defendiam seu ponto de vista.
Um bando de bêbados alucinados discutindo a psicologia de um seriado de humor da
década de 70.
Foi Ricardo quem notou nossa presença:
— Finalmente o casal resolveu aparecer! — falou alto o suficiente para todos encerrarem a
discussão interessantíssima e voltarem suas atenções para nós.
— Eu não acredito que vocês estavam transando com todo mundo aqui! — Ana disparou sem
nenhum filtro.
Mas ao invés de responder, Laila simplesmente ergueu sua mão esquerda, revelando o anel que
levava nos dedos e soltando um riso imenso no rosto iluminado.
É provável que eu realmente tivesse que conversar com o síndico no dia seguinte, já que
passavam de duas da manhã e cinco mulheres histéricas começaram a gritar enlouquecidas no nosso
apartamento.
Laila foi levada por uma onda de euforia e gritinhos, e eu me vi cercado por meus amigos, que
me levaram até o nosso minibar e me fizeram abrir uma garrafa de espumante.
— Vamos comemorar, Benício! — Ricardo parecia super empolgado. — Meu amigo mal
humorado foi fisgado pela baixinha mais petulante da LBK!
— Esse daí foi fisgado no primeiro dia que olhou para ela — Eduardo falou.
— Nisso você tem razão — concordei, lhe entregando uma taça.
Logo todos estavam servidos e brindamos ao nosso noivado.
É... até que a presença deles teve seu grau de importância naquele momento.
Mas assim que todo mundo bebeu a primeira taça, e antes que tivessem a chance de sentar-se
novamente, resolvi acabar com aquela balbúrdia:
— Agora chega! Já banquei o anfitrião educado, mas eu e Laila temos que continuar um assunto
inacabado.
— Ok! — Bia gritou um pouco alto demais. — Vamos deixar os pombinhos aproveitarem o que
restou da noite. Como vai ser a divisão dos carros hoje?
Pronto! Mais quinze minutos numa confusão de quem iria com quem. Era sempre assim. No
final das contas, sempre dividiam as corridas de forma que as meninas nunca fossem deixadas por
último ou sozinhas.
Demorou mais meia hora até que todos finalmente saíssem. Gustavo em um carro com Bia e
Ana, Ricardo com Lis, e Eduardo sempre ia com Luciana, já que moravam bem perto.
Estávamos eu e Laila observando da sacada a última comitiva partir lá embaixo. Ela já estava
descalça e seu corpo pequeno se aconchegava ao meu para se proteger do vento frio da madrugada.
Apertei-a contra o peito e cheirei seus cabelos, enquanto ela ria do barulho que Luciana fazia lá
embaixo, sendo levada com rapidez para o interior do carro por um Eduardo apressado.
— Eu adoro todos eles — Laila murmurou.
— Eu também — concordei depois de um tempo, apoiando meu queixo em seus cabelos. —
Vamos convidar todos para padrinhos?
— Com toda certeza! — ela respondeu sem pestanejar. — O que acha de um casamento na
chácara dos seus pais? Em Brasília?
— Mamãe iria adorar — inclinei meu rosto para beijar seus ombros e continuei depois de um
tempo. — Minha irmã vai querer participar de tudo.
— Sua irmã tem um ótimo bom gosto. Com certeza vamos incluí-la nessa bagunça.
— Vai ser uma loucura, não é?
— Vai sim — ela disse, rindo e se virando de frente para mim. — Mas com você do meu lado,
eu topo qualquer loucura.
— De todas as loucuras que já fiz na vida, você é a maior e melhor de todas elas — falei antes
de beijá-la nos lábios.
Aquele era só mais um passo em nossas vidas. Não era o primeiro, e nem seria o último. Mas
era o passo que daria início ao ano mais insano e intenso da nossa turma de amigos.
Aquilo era só o começo.
AGRADECIMENTOS

Este singelo conto, limitado à pequeneza de 24 horas de acontecimentos, foi escrito logo
depois que terminei Por Odiar Você, com os personagens ainda borbulhando na minha mente e
pedindo por mais e mais. Fiz e deixei guardado.
E quando finalmente o primeiro livro da série foi lançado e vi a receptividade de tanta gente,
eu tive a certeza de que estava no caminho certo. O conto tinha nascido para também ir ao mundo, e é
em agradecimento a cada palavra de incentivo que recebi nos últimos meses que preparei este
pequeno spin-off com todo carinho. Peço que não se esqueçam de deixar sua avaliação na Amazon
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cuidados em cada detalhe.
No mais, volto a ressaltar que o conto, apesar de curto, diz muito mais do que aparenta.
Continuem atentas que em breve teremos mais histórias sobre essa turma de amigos e seus amores.
Obrigada mais uma vez e até breve.
SOBRE A AUTORA

Mariana Vaz é escritora de romances contemporâneos, daqueles de deixar o coração quentinho no


final. Goiana de 32 anos, é casada e mãe de uma Maria, mas em breve mais dois integrarão a família.
Formada em Jornalismo, sempre gostou de contar histórias, fossem estas reais ou fictícias.
Apaixonada pelos livros desde a infância, acredita que com eles as pessoas possam descobrir
mundos diversos e mergulhar neles. Se identificar, reviver sonhos e despertar sentimentos. Para criar
suas histórias, ela encontra inspirações em músicas, filmes e outros livros.

Para acompanhar todas as novidades e lançamentos da autora, além de bater um papo sobre seus
livros, é só segui-la nas redes sociais @marianavazescritora.

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