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Obras Pas 2

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Obras

Análises completas e questões


comentadas

Tudo Sobre o PAS UnB

PAS 2

Edição 2022

Anny Vitória - CPF: 079.983.971-01


Apresentação
Carta ao estudante
Futuro (a) estudante da UnB,

Seja bem-vindo (a) ao nosso curso, desejamos que por meio do nosso material didático você consiga
obter êxito no seu objetivo que é ingressar na Universidade de Brasília. Dessa maneira, elaboramos cuidadosamente
Obras PAS 2 com base na Matriz do PAS, este material é resultado de muito trabalho em equipe, o qual foi sistemati-
zado com intuito de facilitar seu aprendizado. Foi coordenado por nós, Juliana Galvão (Música) e Tiago Henrique (Di-
reito), e desenvolvido por uma eficiente equipe de acadêmicos da Universidade de Brasília que conhecem, na prática,
o que é fazer o PAS.

O TSPASUnB foi fundado em 2014. Inicialmente ofertávamos apenas aulas presenciais sobre as obras da 1ª
Etapa. Com o crescimento da demanda, estendemos às 2ª e 3ª etapas, criamos um blog e um site (tspasunb.com), um
canal no Youtube, Fanpage, Instagram, grupos no Whatsapp e no Facebook, começamos a sugerir temas de redações
e consequentemente a corrigi-las, criamos simuladores de nota e aprovações. Com isso, o apoio que era apenas offli-
ne, posteriormente passou a ter suporte online. Hoje somamos quase dois milhões de acessos no Tudo Sobre o PAS
UnB; temos milhares de seguidores e já corrigimos milhares de redações. E agora somado a essas estatísticas, eis a
Apostila de Análise das Obras, que já faz sucesso entre estudantes, professores, escolas e cursinhos pré-PAS.

Esperamos que esta apostila seja um diferencial na sua aprovação ao final do subprograma.

Bons estudos!

Introdução à Apostila
Todas as obras analisadas nesta apostila estão contidas na Matriz de Referência publicada no site do CE-
BRASPE. A Matriz tem o objetivo de articular os conhecimentos escolares orientando-os para uma interdisciplinari-
dade e contextualização dos saberes, e, assim, apresenta os Objetos de Conhecimentos avaliados na prova, que são
trabalhados por meio de Artes cênicas, Artes visuais, Músicas, Leituras e Vídeos. Mediante a Matriz, o PAS visa a
avaliação do estudante capaz de compreender, raciocinar, analisar, criticar e propor questões relevantes para a própria
formação e de elaborar propostas de intervenção na realidade.

Para facilitar o seu estudo, nós dividimos todas as análises da forma a seguir. Mas, antes, cabe destacar que
o estudo das análises das obras contidas nesta apostila por si só não fará com que o aprendizado esteja completo.
Pelo contrário, esta apostila o auxiliará na sistematização das obras que, usualmente, não são compreendidas sem um
apoio especializado. Assim a proposta não é resumir o seu estudo, mas complementar. Portanto, o contato com as
obras se faz extremamente necessário para o melhor aproveitamento do conteúdo aqui preparado.
• Autor;
• Obra e Contexto;
• Gênero e Estrutura;
• Citações da obra na Matriz;
• Questões anteriores e inéditas - DISPONÍVEL NA PLATAFORMA;
• Dicas de estudo - DISPONÍVEL NA PLATAFORMA.

Para mais informações, curta a nossa fanpage e nos siga no Instagram, ambos @tudosobreopasunb. Conte
sempre conosco!

EDIÇÃO 2022 - APOSTILA DIGITAL

Tudo Sobre o PAS UnB

Anny Vitória - CPF: 079.983.971-01


Nossa Equipe
Produção:
Música
Juliana Galvão

Artes Visuais
Emanuelle Feitosa
Juliana Galvão
Gabriella Gomes Rendeiro

Cênicas
Luciana Loureiro
Samla Alves
Tiago Henrique

Audiovisuais
Isabella Félix
Tiago Henrique

Leituras
Amanda Cavalcante
Raquel dos Santos
Ana Luíza
Victória Albuquerque
Bruno Dias
Tiago Henrique

Supervisão de Produção:
Tiago Henrique de Freitas Galvão

Revisão:
Ana Cristina Rodrigues
Eduarda Alicy

Direção Editorial:
Juliana de Freitas Galvão

Assistente Editorial:
Thiago D. Godoy Fonseca

Produção Gráfica:
Juliana de Freitas Galvão

Direção Geral:
Tiago Henrique de Freitas Galvão

Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta edição pode ser utilizada ou
reproduzida - em qualquer meio ou forma, seja mecânico ou eletrônico, fotocópia,
gravação e etc. - nem apropriada ou estocada em sistema de banco de dados, sem a
expressa autorização do editor.

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Controle de Estudos
Música
Li Estudei Respondi Corrigi
Obra Ouvi Analisei as as Revisei
Assisti Resumi questões questões
Crab Canon
Cavalgada das Valquírias
Flor Amorosa
Reisado do Pastoreio
Capoeira
Carimbó
Sal da Terra
Inclassificáveis
Mar de Brasília
Tribunal do Feicebuqui
Eu Estou Apaixonada por Você
Maria da Vila Matilde
Cabaça d’Água
Cota Não é Esmola

Artes Visuais
Li Estudei Respondi Corrigi
Obra Ouvi Analisei as as Revisei
Assisti Resumi questões questões
O Rapto da Proserpina
Anartia Olivacea
Maria Antonieta com Rosa
O Juramento dos Horácios
Série Desastres de Guerra
Igreja São Francisco de Assis de Ouro Preto
Roda de Capoeira
Moema
Impressão Nascer do Sol
Independência ou Morte
Noite Estrelada
Jane Avril
A Redenção de Cam
Atrás da Estação Saint Lazare

3
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Artes Cênicas
Li Estudei Respondi Corrigi
Obra Ouvi Analisei as as Revisei
Assisti Resumi questões questões
Um Inimigo do Povo
Medida por Medida

Audiovisual
Li Estudei Respondi Corrigi
Obra Ouvi Analisei as as Revisei
Assisti Resumi questões questões
A Cidade é Uma Só?
Povos Indígenas do Brasil
Precisamos Romper com os Silêncios
Conservar a Amazônia
Parque Nacional da Serra da Canastra
Plataforma GeoProcessamento

Leituras
Li Estudei Respondi Corrigi
Obra Ouvi Analisei as as Revisei
Assisti Resumi questões questões
Contos Selecionados de Machado de Assis
O Bom Crioulo
A Canção do Exílio
Ideias Íntimas
Meus Oito Anos
Marieta
O Sonho Africano
Mal Secreto
O Assinalado
Ismália
Úrsula
A Desobediência Civil
Resposta à Pergunta: O Que é Esclarecimento?
Museu Nacional
O Rompimento da Barragem de Mariana
Entrevista - Edgar Dutra Zanotto
Onde os Cientistas Não Têm Vez
Lei Maria da Penha
Declaração Universal dos Direitos Humanos
Constituição Federal, Capítulo II

4
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Sumário
• Apresentação..................................... 1 Audiovisuais 107
• Nossa Equipe....................................... 2 • Estatística de questões cobradas.......... 109
• Controle de Estudos............................. 3 • Controle de Desempenho..................... 110
• Qr Code................................................ 6 • A Cidade é Uma Só?.............................. 111
Música 7 • Povos Indígenas do Brasil..................... 114
• Estatística de questões cobradas......... 9 • Precisamos Romper com os Silêncios... 117
• Controle de Desempenho.................... 10 • Conservar a Amazônia.......................... 120
• Crab Canon.......................................... 11 • Parque Nacional da Serra da Canastra... 124
• Cavalgada das Valquírias..................... 14 • Plataforma GeoProcessamento........... 127
• Flor Amorosa....................................... 17 Leituras 131
• Reisado do Pastoreio........................... 19 • Estatística de questões cobradas.......... 133
• Capoeira............................................. 21 • Controle de Desempenho..................... 134
• Carimbó............................................... 24 • Contos Selecionados de Machado de
• Sal da Terra........................................... 26 Assis................................................... 135
• Inclassificáveis..................................... 29 • O Bom Crioulo........................................ 141
• Mar de Brasília..................................... 32 • A Canção do Exílio................................. 145
• Tribunal do Feicebuqui......................... 34 • Ideias Íntimas......................................... 148
• Eu Estou Apaixonada Por Você............. 36 • Meus Oito Anos..................................... 151
• Maria da Vila Matilde........................... 38 • Marieta.................................................. 154
• Cabaça d’Água...................................... 41 • O Sonho Africano................................... 156
• Cota Não É Esmola............................... 43 • Mal Secreto........................................... 159
Artes Visuais 47 • O Assinalado.......................................... 161
• Estatística de questões cobradas.......... 49 • Ismália.................................................... 163
• Controle de Desempenho.................... 50 • Úrsula..................................................... 166
• O Rapto de Proserpina......................... 51 • A Desobediência Civil............................. 169
• Anartia Olivacea................................... 54 • Resposta à Pergunta: O que é Esclare-
• Maria Antonieta com Rosa.................... 56 cimento................................................ 180
• O Juramento dos Horácios................... 59 • Museu Nacional..................................... 185
• Série Desastres de Guerra................... 62 • O Rompimento da Barragem de Maria-
• Igreja São Francisco de Assis................ 66 na......................................................... 189
• Roda de Capoeira................................. 70 • Entrevista - Edgar Dutra Zanotto:
• Moema................................................ 73 Um Olho na Ciência, Outro na Indús-
• Impressão Nascer do Sol...................... 76 tria.................................................. 197
• Independência ou Morte..................... 79 • Onde As Cientistas Não Têm Vez............ 203
• Noite Estrelada..................................... 82 • Lei Maria da Penha................................ 207
• Jane Avril.............................................. 85 • Declaração Universal dos Direitos Hu-
• A Redenção de Cam.............................. 88 manos.................................................. 213
• Atrás da Estação Saint Lazare................ 91 • Constituição Federal, Capítulo II............ 217

93 • Agradecimentos e Dedicatória.......... 221


Artes Cênicas
• Estatística de questões cobradas.......... 95
• Controle de Desempenho.................... 96
• Um Inimigo do Povo.............................. 97
• Medida por Medida.............................. 102

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QR Code
Para você acessar as dicas, questões e justificativas sobre cada uma das obras,
preparamos, na plataforma Sofista Learning, um espaço específico para isso! Lá
você encontrará:

• 1 ou mais minissimulados sobre cada uma das obras;


• Os gabaritos e as justificativas de cada uma das questões dos
minissimulados;
• Link para acessar a obra na íntegra, entre outras coisas.

Para ter acesso a esses recursos adicionais, é necessário que você acesse
a plataforma com o mesmo e-mail cadastrado na compra, pois os recursos
adicionais citados acima são exclusivos de quem comprou a apostila digital ou
de quem é usuário premium da Sofista Learning.

Para ir diretamente à Trilha de Estudos de Análise de Obras do PAS 2, aponte a


câmera do seu smartphone para a imagem abaixo e vá direto.

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reproduzida - em qualquer meio ou forma, seja mecânico ou eletrônico, fotocópia,
gravação e etc. - nem apropriada ou estocada em sistema de banco de dados, sem a
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Música

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“Sucesso é a soma de
pequenos esforços
repetidos dia sim, e no
outro também ”.
(Robert Collier)

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Gráficos e Estatísticas
OBRAS COBRADAS NA PROVA DESDE
2019
Sal da Terra
Capoeira Cavalgada das
Valquírias
Cota Não É
Esmola
Flor Amorosa
Maria da Vila
Matilde
Inclassificáveis

OBRAS COBRADAS NA PROVA DESDE


2019

6
5 5 5
4
3
1

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9
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Controle de Desempenho
Total Porcentagem
Itens Itens Escore
Obra de
certos errados
de itens
bruto
itens certos
Crab Canon
Cavalgada das Valquírias
Flor Amorosa
Reisado do Pastoreio
Capoeira
Carimbó
Sal da Terra
Inclassificáveis
Mar de Brasília
Tribunal do Feicebuqui
Eu Estou Apaixonada por você
Maria da Vila Matilde
Cabaça d’Água
Cota Não É Esmola

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Crab Canon - Johann Sebastian Bach

Autor
Johann Sebastian Bach nasceu no dia 21 de mar- Embora sua obra tenha sido muito negligenciada após
ço de 1685, na pequena cidade de Eisenach, localizada a sua morte, hoje Bach é considerado um dos maiores
na Alemanha. Bach nasceu em uma família de músicos. compositores de todos os tempos.
Seu pai, que era violinista, educou musicalmente seus 8
filhos para que se tornassem bons músicos, seguindo as- Contexto
sim a tradição da família Bach. Sendo assim, J. Sebastian
Bach aprendeu violino, viola e a escrita musical com seu Bach, em toda sua vida foi simples, mas de per-
pai. Seguindo a árvore genealógica da família Bach, dos sonalidade muito forte, e por causa do seu temperamen-
33 Bach, 27 foram músicos, entretanto, J. S. Bach foi o to entrou em conflito com os eclesiásticos muitas vezes.
maior compositor dentre os músicos de sua família. A maior parte das suas composições são religiosas e evi-
denciam o período em que Bach estava inserido: Barro-
Desde pequeno Bach teve contato com a Igreja co. Ocasionadas pelas fortes divergências religiosas, im-
Protestante de Martinho Lutero, da qual toda sua família posições do catolicismo e pelas dificuldades econômicas
fazia parte. Após se tornar órfão de pai e mãe, o jovem decorrentes do declínio do comércio com o Oriente, o
ficou aos cuidados do seu irmão mais velho, o violinista período barroco reflete os conflitos dos dualistas entre
Johann Christoph, que lhe ensinou a tocar órgão. o homem (antropocentrismo) e Deus (teocentrismo), o
terreno e o celestial, o pecado e o perdão.
Apenas aos 15 anos começou a ter um ensino
formal de música, ingressando na escola de São Miguel Na música, o barroco, que vai de aproximada-
de Lünenburg, onde cantaria no coro da igreja. Para mente 1600 até 1750, é caracterizado pelo uso do bai-
aperfeiçoar seu domínio técnico, Bach estudava várias xo contínuo, do contraponto e da harmonia tonal. Foi
horas por dia. Há quem diga que, enquanto criança, Bach durante esse período que a música instrumental passa
transcrevia obras em alemão, latim, francês e italiano. a ter, pela primeira vez, a mesma importância que a mú-
sica vocal.
Teve vários empregos em igrejas e nas cortes
da Alemanha. No ano de 1703, conseguiu seu primei- As formas populares na Renascença como a can-
ro trabalho, ocupando o cargo de organista da igreja de zona, o ricercar, a tocata, a fantasia e as variações soma-
Arnstadt. Em suas viagens de férias familiarizou-se com riam em outras formas e concepções novas como a fuga,
a obra e aprendeu com outros compositores, mudando o prelúdio coral, a suíte, a sonata e o concerto. Durante
então sua forma de tocar órgão. Pouco tempo depois, o período barroco foram desenvolvidas novas técnicas
Bach ocupou o cargo de organista na igreja de São Blásio instrumentais, assim como novos instrumentos. O ano
de Muhlhausen, e foi nesses dois locais que compôs suas de 1750 é marcado por muitos estudiosos como o final
primeiras músicas religiosas. do período barroco em decorrência da morte de Bach.

Entre os anos de 1707 e 1717, trabalhou como Cânone


organista, violinista e compositor na corte de Weimar.
Teve muitos conflitos com o duque que o empregara, O cânone é uma forma de composição cujo
já que ambos tinham personalidades difíceis. Depois de tema é iniciado por uma voz, sendo continuamente imi-
1717, Bach foi para Kothen, e lá trabalhou para o prín- tado pelas outras vozes que a sucedem, normalmente
cipe Leopold d’Anhalt-Kothen, onde teve 5 anos muito com uma pequena distância entre as vozes. Essa imita-
frutíferos. Ganhava um alto salário e pôde dedicar-se à ção pode ser a duas, três ou mais vozes, que podem ser
composição de músicas instrumentais. Algumas de suas executadas em uníssono (repetição exata das mesmas
principais obras, tais como concertos de Brandenburgo notas que foram executadas anteriormente) ou em in-
e o cravo bem temperado, foram escritas nesse período. tervalos diferentes (quando as imitações são realizadas
Bach morreu completamente cego no dia 28 de julho de em outros tons). A polifonia aqui existente é derivada de
1750. Seu corpo foi enterrado na igreja de São Tomas. uma linha seguida de imitação.

A obra de Bach abrange quase todos os gêneros O método mais corrente de escrever cânones consistia em
musicais do período barroco, excetuando os gêneros dra- fazer derivar uma ou mais adicionais de uma única voz inicial.
As vozes adicionais tanto podiam ser escritas pelo composi-
máticos da ópera e oratório. Grande parte de suas obras
tor como cantadas a partir das notas da voz inicial, modifica-
são sacras: mais de duzentas cantatas, vários motetos, das de acordo com certas instruções. A regra segundo a qual
quatro paixões (sendo a mais famosa a “Paixão Segundo se obtinham estas vozes suplementares chamava-se canône,
São Mateus”), três oratórios e cinco missas. Deixou tam- termo que significa precisamente «regra» ou «lei». (Aquilo a
bém inúmeros concertos e peças de música de câmara. que hoje damos o nome de cânone chamava-se então fuga.)

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Por exemplo, as indicações do compositor podiam deter- que estão mais claros são apenas para ajudar a ilustrar
minar que a segunda voz começasse um certo número de a ideia de Bach e mostrar como soa a execução da peça.
tempos ou compassos depois da voz original; a segunda voz
podia ser uma inversão da primeira, ou seja, mover-se sem-
pre com os mesmos intervalos, mas na direcção oposta, ou
então a voz derivada podia ser a voz original lida do fim para
o princípio — dava-se a isto o nome de cânone retrógrado
ou cânone cancrizans («caranguejo») (GROUT & PALISCA,
2011, p. 196).

Obra

Citações da Obra na Matriz de Referências
O ser humano como um ser que pergunta e quer saber

Obras musicais como Crab Canon (Bach), Ca-


valgada das Valquírias (Wagner) e Reisado do pastoreio
O Crab Canon, traduzido como Cânone do Ca- / batuque - dança de negros (Lorenzo Fernandez) exem-
ranguejo, pertence à coleção A Oferenda Musical, que plificam formas expressivas distintas de musicalidades,
reúne dez cânones, duas fugas e uma sonata. Essa cole- contrastadas com as das músicas Cabaça d’água, (Alberto
ção de obras é baseada em um tema musical escrito por Salgado), Flor amorosa (Joaquim Callado), ou Mar de Bra-
Frederico II da Prússia, que ao encontrar Bach em 7 de sília (Engels Espíritos). Esses contrastes entre as formas
maio de 1747, propôs a ele que improvisasse uma fuga musicais apresentam-se também em músicas populares,
sobre o Thema Regium. Bach disse que para isso precisa- como O Sal da Terra (Beto Guedes) e Estou apaixonada
ria se preparar. Ao voltar a Leipzig, Bach criou uma obra por você, 6 na versão de Gina Lobrista, ou nas de tradições
inteira cheia de variações sobre o tema sugerido. Essa populares, como Capoeira e Carimbó. (Página 5, quinto
obra ficou conhecida como A Oferenda Musical. parágrafo)
O Cânone do Caranguejo, o primeiro dos dez câ- Indivíduo, cultura e mudança social
nones da coleção, consiste em um arranjo de uma linha
musical que, ao ser executada como cânone, aparenta Ao ampliar esse contexto, estão postas questões
ter duas linhas musicais complementares de frente para relativas à figura do artista como agente de mudanças so-
trás, assim como um palíndromo. É um cânone a dois ciais e as suas produções culturais. Obras como Cavalga-
caranguejos, ou seja, duas vozes. Palíndromo significa da das Valquírias (Wagner), Crab Canon (Bach), Reisado
algo que corre em sentido inverso. Em outra definição, é do Pastoreio/ Batuque - Dança de Negros (Lorenzo Fer-
uma sequência de unidades que pode ser lida, indiferen- nandez), O Sal da Terra (Beto Guedes), Eu estou apaixona-
temente, da direita para a esquerda e da esquerda para da por você (na versão de Gina Lobrista), Cabaça D’água
a direita. Por exemplo: A palavra “sopapos” pode ser lida (Alberto Salgado), Flor amorosa (Joaquim Callado) e Mar
do início ao fim ou de trás para frente que continuará de Brasília (Engels Espiritos) ampliam o reconhecimento
sendo a mesma palavra. É essa lógica que Bach utiliza no dessas questões. Cabe indagar como o artista participa
Cânone do Caranguejo: Enquanto uma voz executa a li- dessas mudanças sociais e como a sociedade vê a criação
nha melódica de cima do início ao final, a linha melódica artística, pensando ações e reações da sociedade. Tom Zé
debaixo é executada de trás para frente (do final da par- exemplifica na canção Tribunal do Feicebuqui questiona-
titura para o início). Ou seja, é tocada para frente e para mentos como esses. (Página 7, quinto parágrafo)
trás simultaneamente. O nome “Cânone do Caranguejo”
é póstumo e se dá pelo fato do caranguejo andar para A formação do mundo ocidental contemporâneo
trás. São necessários dois músicos para tocarem a peça
partindo de direções opostas. Na Cavalgada das Valquírias (Wagner, 1856) que
é executada na abertura do terceiro ato da ópera A Val-
quíria, pode-se perceber elementos advindos da forma-
ção do mundo ocidental contemporâneo, sendo uma das
obras eruditas mais conhecidas e representativas da mú-
sica ocidental. Na obra Canon Crab (Bach, 1747), pode-
-se observar a presença de tradições musicais europeias,
especialmente a influência contrapontística germânica
de compositores que antecederam o autor e construíram
grande parte da história da música ocidental. (Página 21,
quarto parágrafo)
Reprodução: Youtube.
Número, grandeza e forma
Mesmo sem conseguir ler as notas que são in-
dicadas na partitura, é possível perceber que enquanto Em Tribunal do Feicebuqui, há a distribuição de
uma voz começa do início, a outra começa do final. Ao seções bem distintas umas das outras, cada uma faz alu-
se encontrarem no meio, ambas repetem o que já havia são a diferentes gêneros musicais populares, por sua ins-
sido tocado antes, mas de trás para frente, como se fos- trumentação, organização das vozes e caráter expressivo,
se um espelho. Os pentagramas (cinco linhas) debaixo assim como na composição Canon Crab (Bach) verifica-

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mos a técnica do cânone, que é uma técnica contrapontis-


ta polifônica, e especificamente nesta obra, um palíndro-
mo musical, que permite que a obra seja reproduzida em
duas linhas melódicas, tocando-se desde o início da pauta
e conjuntamente em sentido inverso, caracterizando uma
polifonia. (Página 25, quinto parágrafo)

Materiais

No campo da criação musical, os materiais são


elementos importantes para gerar distintas sonoridades
e efeitos. A diversidade de timbres provém das variadas
fontes sonoras. Ao longo do tempo, materiais e o seu em-
prego nas fontes sonoras têm definido diferentes tipos de
criação e interpretação musical, como podemos observar
nas músicas Canon Crab (J.S.Bach), A Cavalgada das Val-
quírias (Richard Wagner), Flor Amorosa (Joaquim Calla-
do) e Tribunal do Feicebuqui (Tom Zé). Na Suíte Reisado de
Pastoreio / Batuque / Dança dos Negros (Lorenzo Fernan-
dez), verifica-se a escolha de instrumentos não convencio-
nais. (Página 31, quinto parágrafo)

Questões, Justificativas e Dicas


Quer acessar as questões, justificativas e dicas desta obra?

Clique aqui ou use o QR CODE da página 6.

Anotações e Rascunhos

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Cavalgada das Valquírias - Richard
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Wagner

Autor
Wilhelm Richard Wagner nasceu em Leipzig, Ale- primeiro festival, apresentando o ciclo completo de “O
manha, em 22 de maio de 1813. Wagner nasceu em uma Anel dos Nibelungos”.
família de artistas, então sempre mostrou apreço pelas
artes, que o acompanharam por toda a vida. Iniciou Em 1882 viajou para a Itália para se recuperar
como autodidata na música e na literatura. Em 1822, dos ataques cardíacos que havia sofrido. No mesmo
ingressou na Escola Kreuzschuke. Apesar de estudar pia- ano assiste a estreia de sua última criação “Parsifal”. Em
no, Wagner preferia se dedicar ao teatro e à literatura. 1883, de volta a Veneza, teve uma sincope que o para-
Somente aos 15 anos de idade começou a se interessar lisou enquanto tocava piano. Faleceu em Veneza, no dia
mais por música. Estudou também violino, contraponto 13 de fevereiro do mesmo ano.
e harmonia.
Importante compositor do romantismo, as com-
Ingressou no curso de música da Universidade posições de Richard Wagner possuem texturas comple-
de Leipzig, mas largou a faculdade antes de se formar. xas e harmonia e orquestração ricas. Inclusive, Wagner
Começou a compor nessa época. Em 1833 se tornou o expandiu as possibilidades de combinação de instru-
ensaiador de ópera em Würzburg e, logo em seguida, mentação para orquestras sinfônicas. Foi um dos pionei-
diretor musical da companhia teatral de Magdeburg. ros no uso do cromatismo extremo e rápidas mudanças
Em 1834 casou-se com Minna Planer, no entanto o casa- dos centros tonais.
mento não durou muito, já que a situação financeira do
casal não estava muito boa e entre eles haviam muitos Baseou muitas de suas músicas em mitos nacio-
atritos. nalistas, pois tinha a crença que a música nacional era
capaz de formar um novo homem e uma nova socie-
Entre 1839 a 1842, Wagner morou em Paris. Ao dade. O próprio compositor escrevia os textos de suas
retornar para a Alemanha, foi nomeado diretor da ópera obras. Alguns de seus textos eram de caráter antissemi-
de Dresden em 1842. No mesmo ano, apresentou sua ta, o que contribuiu para que a imagem do compositor
primeira produção operística, Rienzi. Assumiu o cargo de fosse comprometida. Wagner denunciava uma pretensa
regente da Ópera Real, permanecendo até 1849. “judaização” da arte moderna.

Em 1848, Wagner começou o processo de com- Possui uma obra extensa. Compôs peças para
posição do ciclo “O Anel dos Nibelungos”, obra que tem piano, coral, orquestra, óperas, música de câmara e can-
18 horas de música e é constituída por 4 óperas: “O ouro ções, entretanto segundo Laterza Filho (2013), grande
do Reno”, “A valquíria”, “Siegfried” e “O crepúsculo dos parte de sua obra se destina quase integralmente ao te-
deuses”. No mesmo ano escreveu alguns artigos defen- atro musical.
dendo a revolução Alemã. Esse seu envolvimento com a
A importância de Wagner é tripla: representou a consuma-
política o deixou em uma situação delicada, obrigando o
ção da ópera romântica alemã, do mesmo modo que Verdi
compositor a fugir do país. Entre 1849 a 1852, escreveu representa a consumação da ópera italiana; criou uma nova
diversos livros de ensaios, esboçando um novo estilo de forma, o drama musical; o vocabulário harmónico das últi-
teatro musical. mas obras levou ao limite mais extremo a tendência para a
dissolução da estrutura tonal clássica, tornando-se o ponto
Em 1855, regeu concertos da Filarmônica de de partida de desenvolvimento que se prolonga até à actua-
Londres. Residiu em Zurique até 1859. Se apaixonou por lidade. (GROUT & PALISCA, 2011, p. 644)
Mathilde Wesendonck, a mulher de um mecena muito
rico. Já que seu amor era impossível, deixou Zurique e Wagner acreditava que a música e o drama eram
compôs a ópera Tristão e Isolda. Voltou para Paris e em igualmente importantes. Grout & Palisca (2011) afirmam
1861 voltou para a Alemanha. que para Wagner, a música tinha função de servir os ob-
jetivos da expressão dramática. Os escritores afirmam
Em 1862, ao retornar para a Alemanha, fugiu ainda que as únicas composições importantes de Wag-
para Stuttgart por motivos financeiros, todavia foi salvo ner foram as que ele escreveu para o teatro.
por Luís II, um grande admirador de Wagner. Casou com
Cosima, filha de Liszt. Mudou-se para Triebschen, Suíça, A obra de Wagner afectou todo o panorama da ópera. Nin-
guém conseguiu imitar com êxito a forma muito pessoal
e depois em Bayreuth, na Baviera. Em 1871 viajou para a
como Wagner utilizou a mitologia e o simbolismo, mas o seu
cidade de Bayreuth para construir um grande teatro e re- ideal da ópera como um drama de conteúdo significativo,
alizar um festival anual dedicado às suas obras. Três anos com o texto, o cenário, a acção visível e a música a colabo-
depois conseguiu concluir o teatro, e em 1876 realizou o rar, na mais estreita harmonia, tendo em vista o propósito

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central — o ideal, em suma, da Gesamtkunswerk —, exerceu cutado isoladamente em salas de concerto, jogos e fil-
uma profunda influência (GROUT & PALISCA, 2011, p. 650). mes, como “Apocalypse Now” e “O Nascimento de uma
Nação”.
Obra
Em “Cavalgada das Valquírias” os elementos
A ópera “A Valquíria”, a segunda ópera da tetra- evocam a imagem de donzelas guerreiras cumprindo
logia “O Anel do Nibelungo”, é constituída também por o seu papel como valquírias. O trecho descreve o voo
“O Ouro do Reino”, “Siegfried” e “O Crepúsculo dos Deu- dos cavalos através das nuvens: O galope é executado
ses”. As quatro óperas foram escritas entre 1848 e 1874 pela trompa e violoncelo; os relinchos são representa-
e são adaptações de personagens mitológicos das sagas dos pelos instrumentos de sopro; a canção da batalha
nórdicas e do poema medieval “A Canção dos Nibelun- das virgens é executada pelas trombetas e trombones; e
gos”. os gritos de guerra ficam por conta dos instrumentos de
cordas. (ADORNO, 1994 apud PEREIRA, 2015).
Na ópera, o drama gira em torno do desenten-
dimento de valquíria Brunhilde com o seu pai e chefe Em suas óperas, Wagner usava grandes orques-
dos deuses, Wotan. As valquírias são virgens guerreiras trações. Em Cavalgada das Valquírias, o compositor usou
cruéis que têm o papel de eleger quem vai morrer no trompetes, trombones, trompas, flautas, oboés, clarine-
campo de batalha e levar as almas dos guerreiros mortos tas, clarones, piccolos, fagotes, inúmeros instrumentos
para o Valhala. Os personagens são: Siegmund, filho de percussão e instrumentos de cordas.
de Wotan; Siglinde, filha de Wotan; Hunding, marido de


Sieglinde; Wotan; Frick; e Brunhilde, filha de Wotan. Há
também as oito Valquírias, que são as irmãs mais novas
de Brunhilde: Gerhilde. Ortlinde, Waltraute, Schwertlei-
te, Helmwige, Siegrune, Grimgerde e Rossweise. Citações da Obra na Matriz de Referências
No primeiro ato acontece o encontro dos irmãos O ser humano como um ser que pergunta e quer saber
gêmeos Siegmund e Sieglinde. Siegmund conta que es-
Obras musicais como Crab Canon (Bach), Caval-
tava fugindo de uma guerra e que sua vida era regada
gada das Valquírias (Wagner) e Reisado do pastoreio /
de miséria e morte, já que sua mãe havia morrido pelas
batuque - dança de negros (Lorenzo Fernandez) exem-
mãos dos neidings e que, no mesmo dia que isso aconte-
plificam formas expressivas distintas de musicalidades,
ceu, seu pai e sua irmã desapareceram. Ou seja, ambos
contrastadas com as das músicas Cabaça d’água, (Alberto
não sabiam que eram irmãos, mas logo descobriram e se Salgado), Flor amorosa (Joaquim Callado), ou Mar de Bra-
apaixonaram perdidamente. No segundo ato, os aman- sília (Engels Espíritos). Esses contrastes entre as formas
tes fogem do marido de Sieglinde, Hunding. Siegmund musicais apresentam-se também em músicas populares,
era o responsável por proteger o anel do perigoso anão, como O Sal da Terra (Beto Guedes) e Estou apaixonada
mas morre pelas mãos do marido traído. No terceiro por você, 6 na versão de Gina Lobrista, ou nas de tradições
ato, entram cavalgando as valquírias. Brunhilde, a guer- populares, como Capoeira e Carimbó. (Página 5, quinto
reira que detém o título de Valquíria, é escolhida para parágrafo)
recolher Siegfried e levá-lo para o salão dos mortos, mas
desobedece a ordem do pai e intercede em favor de Sie- Indivíduo, cultura e mudança social
gfried. Por esse motivo, Brunhilde é castigada, exilada e
privada de sua essência divina (PALMEIRIN, 2009; PEREI- Ao ampliar esse contexto, estão postas questões
RA, 2018). relativas à figura do artista como agente de mudanças so-
ciais e as suas produções culturais. Obras como Cavalga-
A “Cavalgada das Valquírias” é a abertura do da das Valquírias (Wagner), Crab Canon (Bach), Reisado
Ato III da ópera “A Valquíria”, e provavelmente um dos do Pastoreio/ Batuque - Dança de Negros (Lorenzo Fer-
trechos mais famosos de toda a obra de Wagner, sendo nandez), O Sal da Terra (Beto Guedes), Eu estou apaixona-
o primeiro a “Marcha Nupcial”, muito tocada em casa- da por você (na versão de Gina Lobrista), Cabaça D’água
mentos. A ópera “A Valquíria” foi estreada em Munique, (Alberto Salgado), Flor amorosa (Joaquim Callado) e Mar
no dia 26 de junho de 1870. Após sua estreia, Wagner de Brasília (Engels Espiritos) ampliam o reconhecimento
recebeu inúmeros pedidos para executar somente a “Ca- dessas questões. Cabe indagar como o artista participa
valgada”. Para ele, a ideia de separar a música dentro dos dessas mudanças sociais e como a sociedade vê a criação
atos das óperas era inconcebível. Grout & Palisca (2011, artística, pensando ações e reações da sociedade. Tom Zé
p.646) afirmam que para o compositor, a música dentro exemplifica na canção Tribunal do Feicebuqui questiona-
de cada ato “é contínua, rejeitando a divisão formal em mentos como esses. (Página 7, quinto parágrafo)
recitativos, árias e outros tipos de seções”. Inicialmente
o compositor ficou furioso e disse que proibiria tal coi- Tipos e gêneros
sa, mas em 1876 mudou de ideia, sendo ele mesmo o
regente da execução do trecho em 12 de maio de 1877, As óperas são espetáculos cênicos e musicais,
em Londres. Esse pedaço da ópera foi muitas vezes exe- contendo representações sociais de tipos e gêneros da

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sociedade de suas épocas. Como são construídas as rela-


ções entre as características das personagens e a expres-
sividade musical utilizada? No caso da Cavalgada das
Valquírias (Wagner), as representações da mitologia nór-
dica e suas personagens compõem a trama e o conflito da
música. A construção de conceitos, como ópera, sinfonia,
ária, entre outros, faz-se necessário à apreciação musical
de quem se propõe a assistir esse tipo de espetáculo. A
música serve à exposição de temas e ajuda no desenvol-
vimento da trama, como percebe-se na obra de Wagner.
Como pensar essas relações em gêneros musicais e cul-
turais como a Capoeira e o Carimbó? (Página 10, terceiro
parágrafo)

A formação do mundo ocidental contemporâneo

Na Cavalgada das Valquírias (Wagner, 1856)


que é executada na abertura do terceiro ato da ópera A
Valquíria, pode-se perceber elementos advindos da for-
mação do mundo ocidental contemporâneo, sendo uma
das obras eruditas mais conhecidas e representativas da
música ocidental. Na obra Canon Crab (Bach, 1747), pode-
-se observar a presença de tradições musicais europeias,
especialmente a influência contrapontística germânica
de compositores que antecederam o autor e construíram
grande parte da história da música ocidental. (Página 21,
quarto parágrafo)

Materiais

No campo da criação musical, os materiais são


elementos importantes para gerar distintas sonoridades
e efeitos. A diversidade de timbres provém das variadas
fontes sonoras. Ao longo do tempo, materiais e o seu em-
prego nas fontes sonoras têm definido diferentes tipos de
criação e interpretação musical, como podemos observar
nas músicas Canon Crab (J.S.Bach), A Cavalgada das Val-
quírias (Richard Wagner), Flor Amorosa (Joaquim Calla-
do) e Tribunal do Feicebuqui (Tom Zé). Na Suíte Reisado de
Pastoreio / Batuque / Dança dos Negros (Lorenzo Fernan-
dez), verifica-se a escolha de instrumentos não convencio-
nais. (Página 31, quinto parágrafo)

Questões, Justificativas e Dicas


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Anotações e Rascunhos

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Flor Amorosa - Joaquim Callado

Autor
Joaquim Antônio da Silva Callado Júnior nasceu há um consenso sobre a origem da palavra “choro”. A
em 11 de julho de 1848 no Rio de Janeiro. Callado nas- palavra pode derivar da forma de executar a música de
ceu em berço musical, já que seu pai era professor de forma chorada, e que com o passar do tempo se tornou
música, regente da Banda Sociedade União de Artistas, um gênero específico, com características próprias.
tocador de cornetim e trompete. Estudou música e pia-
no com o seu pai e seus amigos músicos que frequenta- No choro, o solista busca demonstrar seu virtuo-
vam sua casa. sismo utilizando variações melódicas, rítmicas, dinâmi-
cas, timbrísticas e harmônicas nos seus improvisos, que
No final da sua adolescência começou a estudar é uma de suas características principais. Esse gênero mu-
flauta transversal com Henrique Alves de Mesquita, co- sical incorporou alguns ritmos da época como a polca,
nhecido como “professor dos chorões”. Casou-se com lundu e dança de salão. Quanto à estrutura do choro tra-
Feliciana Adelaide Callado, com quem teve cinco filhos. dicional, essa é organizada em forma de rondó e possui
Compôs sua primeira melodia conhecida aos 19 anos. três seções (A, B e C), e quase sempre segue o padrão de
Para sustentar sua família, Callado começou a tocar flau- repetições AABACCA.
ta em concertos e bandas. Durante sua vida viveu em
uma casa modesta. Acredita-se que sua primeira apre- As primeiras formações de grupos de choro ado-
sentação como flautista em salas de concertos tenha tavam a flauta (como solista), violão (na “baixaria”, que
acontecido em julho de 1866, quando se apresentou significa a base do conjunto) e o cavaquinho (como cen-
para a família imperial no Teatro Ginásio Dramático. tralizador de ritmo).

Na década de 70, teve muitas de suas composi- Antônio Callado foi o primeiro compositor a uti-
ções publicadas, e em 1879 foi condecorado com a Or- lizar a palavra choro no local da partitura destinado ao
dem da Rosa, no grau de Comendador. Se tornou tam- gênero. A partitura em questão é da polca Flor Amorosa,
bém professor de música no Liceu de Artes e Ofícios do a primeira composição do gênero choro.
Rio de Janeiro. Foi amigo e parceiro de composição da
maestrina Chiquinha Gonzaga. Faleceu em 1880, vítima Obra
da epidemia de meningite que atingiu a população do
Rio de Janeiro no mesmo ano. A canção Flor Amorosa foi a última música de
Joaquim Callado, e só foi publicada após a morte do
Na época da sua morte, Callado já era conhecido compositor. Em sua dissertação de mestrado, Frazão
como um representante do Choro. Hoje é considerado (2014, p. 109) cita Severiano (2013) ao afirmar que essa
“Pai do Choro”. Um mês após sua morte, sua última mú- foi a única peça de Callado que se tornou um clássico
sica, “Flor Amorosa”, foi publicada e se tornou um clás- do choro. Essa canção possui um andamento rápido e,
sico da música popular brasileira, tendo recebido, poste- segundo Frazão (2014, p. 109), “a graciosidade típica da
riormente, letra de Catulo da Paixão Cearense. Apesar do maioria das polcas de Callado”. Essa obra apresentava
pouco tempo de vida, Callado se tornou o instrumentista um caráter mais brasileiro.
mais popular do Rio de Janeiro no final do século XIX.
De todas as suas obras somente sessenta e seis peças Apesar de ter sido publicada pela primeira vez
restaram. O restante se perdeu por não ter sido editado. em 1880, foi somente em 1902 que a canção foi grava-
da. Posteriormente, Catullo da Paixão Cearense incluiu
Segundo Weffort (2002), Callado é considerado uma letra na canção. Segundo Matos (2012, p.62), além
o criador do choro e foi o responsável por incorporar a de Flor Amorosa ter sido a primeira polca composta por
flauta aos violões e cavaquinhos, que era a composição um brasileiro a ser gravada, a canção possui muitos “ele-
instrumental comum dos grupos da época. Seu grupo, “O mentos musicais semelhantes aos das polcas europeias”.
choro de Callado”, era constituído por um instrumento Matos cita Cazes (1999), que afirma que as composições
solista, dois violões e um cavaquinho, formação que se de Callado demonstram sua preocupação com o virtuo-
tornou tradicional para os grupos de choro posteriores. sismo e com a exploração de recursos da flauta, “porém
os acompanhamentos originais demonstram pouco inte-
Choro resse pela harmonia e uma falta quase total de preocu-
pação com o arranjo”.
O choro foi desenvolvido no Rio de Janeiro a par-
tir de 1870. Segundo Adriano Brandão, “[...] um instru- A versão indicada pelo Cebraspe faz parte do
mento dialoga incessantemente com os demais, tecendo álbum Chorada, Chorões, Chorinhos, e foi gravada em
um emaranhado tão completo quanto fascinante”. Não 1976. A execução da peça é feita por Altamiro Carrilho

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na flauta, Voltaire no Violão Sete Cordas e Valmar no Ca- exemplifica na canção Tribunal do Feicebuqui questiona-
vaquinho. mentos como esses. (Página 7, quinto parágrafo)

A estrutura desse choro é a tradicional, que pos- Materiais


sui três seções organizadas em forma de rondó. Na pri-
meira vez que a seção A é executada ,o flautista segue a No campo da criação musical, os materiais são
partitura tal como Callado escreveu. Em seguida temos elementos importantes para gerar distintas sonoridades
a repetição da seção A, mas dessa vez com variações so- e efeitos. A diversidade de timbres provém das variadas
bre o que já havia sido apresentado. Isso acontece com fontes sonoras. Ao longo do tempo, materiais e o seu em-
todas as seções: na primeira vez que é executada não prego nas fontes sonoras têm definido diferentes tipos de
há variações, e o instrumentista segue tal como foi es- criação e interpretação musical, como podemos observar
crito, mas na segunda repetição, há variações para que nas músicas Canon Crab (J.S.Bach), A Cavalgada das Val-
não fique repetitivo. Podemos ver isso também nas se- quírias (Richard Wagner), Flor Amorosa (Joaquim Calla-
ções B e C. A seção A está na tonalidade tônica, que é do) e Tribunal do Feicebuqui (Tom Zé). Na Suíte Reisado de
Dó maior. A parte B está em Lá menor, e a parte C em Pastoreio / Batuque / Dança dos Negros (Lorenzo Fernan-
Fá maior. A sequência em que as seções são executadas dez), verifica-se a escolha de instrumentos não convencio-
é: AA’BB’A’A’CC’A’A’. Para facilitar o entendimento, uti- nais. (Página 31, quinto parágrafo)
lizamos nessa análise a aspa (‘) para informar onde há
variação. Importante ressaltar que as variações, no caso Questões, Justificativas e Dicas
dessa versão, são improvisos que o instrumentista faz,
Quer acessar as questões, justificativas e dicas desta obra?
sempre tendo como base a melodia e harmonia escri-
tas pelo compositor. Uma variação da mesma seção não Clique aqui ou use o QR CODE da página 6.
será igual à outra. Essa estrutura na forma rondó com
três partes era a estrutura formal comum do choro até a Anotações e Rascunhos
década de 1930.


Citações da Obra na Matriz de Referências
O ser humano como um ser que pergunta e quer saber

Obras musicais como Crab Canon (Bach), Ca-


valgada das Valquírias (Wagner) e Reisado do pastoreio
/ batuque - dança de negros (Lorenzo Fernandez) exem-
plificam formas expressivas distintas de musicalidades,
contrastadas com as das músicas Cabaça d’água, (Alberto
Salgado), Flor amorosa (Joaquim Callado), ou Mar de Bra-
sília (Engels Espíritos). Esses contrastes entre as formas
musicais apresentam-se também em músicas populares,
como O Sal da Terra (Beto Guedes) e Estou apaixonada
por você, 6 na versão de Gina Lobrista, ou nas de tradições
populares, como Capoeira e Carimbó. (Página 5, quinto
parágrafo)

Indivíduo, cultura e mudança social

Ao ampliar esse contexto, estão postas questões


relativas à figura do artista como agente de mudanças so-
ciais e as suas produções culturais. Obras como Cavalga-
da das Valquírias (Wagner), Crab Canon (Bach), Reisado
do Pastoreio/ Batuque - Dança de Negros (Lorenzo Fer-
nandez), O Sal da Terra (Beto Guedes), Eu estou apaixona-
da por você (na versão de Gina Lobrista), Cabaça D’água
(Alberto Salgado), Flor amorosa (Joaquim Callado) e Mar
de Brasília (Engels Espiritos) ampliam o reconhecimento
dessas questões. Cabe indagar como o artista participa
dessas mudanças sociais e como a sociedade vê a criação
artística, pensando ações e reações da sociedade. Tom Zé

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Reisado do Pastoreio/Batuque - Dança de
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Negros - Lorenzo Fernandez

Autor
Oscar Lorenzo Fernandez nasceu 4 de novembro era um dos princípios defendidos por Mário de Andrade
de 1897 no Rio de Janeiro. Filho de espanhóis, Loren- para o desenvolvimento da música brasileira. Segundo
zo aprendeu a tocar piano de ouvido quando tinha 15 Igayara (1997, p. 68), “a influência do pensamento de
anos. Pouco tempo depois, teve aulas com a sua irmã. Mário de Andrade pode ser notada na trajetória de Lo-
Começou a estudar medicina, mas acabou deixando de renzo Fernandez”.
lado para estudar música. Em 1917, ingressou no Institu-
to Nacional de Música (INM), onde teve aulas com Hen- Obra
rique Oswald, entre outros professores. Foi orientado
também por Alberto Nepomuceno. A suíte orquestral Reisado do Pastoreio, escrita
em 1930, é dividida em três partes: reisado, toada e ba-
Recebeu em 1922 os três primeiros lugares no tuque. A suíte foi composta na segunda fase das obras
Concurso de Composição da Sociedade de Cultura Mu- de Lorenzo Fernandez, quando o compositor aproveita
sical com as obras “Noturno”, “Arabesque para piano” e mais os elementos folclóricos, negros e caboclos. Segun-
“Cisne”. Seu Trio Brasileiro para piano, violino e violonce- do Igayara (1997, p. 70), a suíte “faz referência às cele-
lo garantiu a ele o primeiro lugar no Concurso Internacio- brações pastoris do Natal”, o objeto da análise é a última
nal de Música de Câmara da Sociedade de Cultura Musi- parte da suíte: Batuque.
cal. Com esse trio já era possível ver o rumo nacionalista
que suas obras tomavam. Segundo Pinto (2004), nessa Batuque era o nome que os brancos davam a
época foi fortemente influenciado pelo nacionalismo de toda reunião de negros que colocava em prática uma
Alberto Nepomuceno, “que consistia, de forma modera- cantoria acompanhada por tambores, atabaques e pal-
da, em adequar elementos musicais a uma forma estru- mas no período colonial. É também o nome de uma
turada europeia” (2004, p. 19). Em 1925 estreou a Suíte dança considerada proveniente de Angola ou Congo. Os
Sinfônica op. 33. Após 1928 novas obras sinfônicas fo- batuques persistiram durante todo o período colonial,
ram criadas por Oscar Lorenzo, como o bailado Imbapára apesar de sofrer alterações culturais durante os deslo-
(1928) e a Suíte Reisado do Pastoreio (1929). camentos de negros das minas para a lavoura cafeeira.
(PINTO, 2004)
No início da década de 30, Lorenzo Fernandez
fundou o periódico Ilustração Musical, onde passou a Muito antes de compor essa obra, Lorenzo Fer-
publicar vários artigos sobre educação musical e canto nandez frequentou alguns terreiros para conhecer a ri-
coral. Trabalhou na Superintendência de Educação Mu- queza rítmica das manifestações afro-brasileiras. Como
sical e Artística do Distrito Federal. Foi um dos fundado- um dos resultados de suas pesquisas nasceu o Batuque
res do Conservatório Brasileiro de Música e da Academia da Suíte Pastoreio, que chama atenção pela orquestra-
Brasileira de Música. Faleceu em 1948, após ter regido ção exuberante e vitalidade rítmica.
um concerto. Apesar de sua obra não ser tão extensa,
compôs diferentes gêneros e formações. Compôs can- O Batuque foi a peça de Lorenzo Fernandez que
ções, suítes sinfônicas, balés, música de câmara, concer- mais obteve reconhecimento internacional, além de di-
tos e sinfonias. vulgar o nome do compositor e a música brasileira no ex-
terior. Sua estreia mundial aconteceu pela Orquestra do
As composições de Lorenzo Fernandez podem Instituto Nacional de Música sob a regência de Francisco
ser divididas em três fases: Na primeira fase, de 1923 a Braga. Seu sucesso é tanto que já foi gravada e interpre-
1938, há influência do impressionismo francês, empre- tada por muitos regentes importantes, como Arturo Tos-
go da bitonalidade, ausência de brasilidade e harmonia canini e a NBC de Nova Iorque, Leonard Bernstein com
complexa. A segunda fase, de 1923 a 1938, é caracteri- a Filarmônica de Nova Iorque, Eleazar de Carvalho com
zada pela busca da brasilidade musical, e há um apro- a Orquestra Sinfônica Brasileira, Claudio Santoro com a
veitamento sistemático do folclore, elementos negros e Orquestra Sinfônica do Teatro Nacional de Brasília, entre
caboclos. Na terceira fase, de 1939 até 1948, há exclusão outros.
de ornamentos e maior utilização da polirritmia e poli-
tonalidade1. Foi escrita para flautins, flauta transversal, cor-
ne-inglês, oboés, clarinetas, clarone, fagotes, contra-fa-
É considerado, ao lado de Francisco Mignone, o gote, trompas, trompetes, tuba, tímpanos, pratos, caixa
principal representante da segunda geração nacionalista clara, triângulo, bombo, tamtam, piano, violinos, violas,
da música brasileira. A utilização do material folclórico violoncelos e contrabaixos. De compasso binário, a obra
1 IGAYARA, Susana Cecília. Oscar Lorenzo Fernandez. Rev. possui andamento allegro pesante, que significa que o
Int. Est. Bras., SP, 42: 59-73, 1997 andamento deve ser ligeiro e alegre, mas forte e pesado.

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A peça tem início com os instrumentos de per- a ideologias e teorias científicas referentes ao embran-
cussão em tom misterioso, incluindo o piano, que tam- quecimento da população brasileira vigentes no período.
bém é um instrumento percussivo. Em seguida entram A obra sinfônica Suíte Reisado do Pastoreio / Batuque /
os contrabaixos, logo sendo acompanhados pelos vio- Dança dos Negros (Lorenzo Fernandez), apesar de tam-
loncelos, que tocam a mesma coisa que os contrabaixos bém ser uma obra contemporânea do século XX, remete
em uma oitava acima. Depois entra a trompa, que come- às contribuições da matriz africana para a formação do
ça a tocar bem forte, logo sendo seguida pelo trombone povo brasileiro, em uma perspectiva moderna, com ele-
e os demais instrumentos. mentos da música erudita e africana. (Página 22, segundo
parágrafo)
Segundo Pinto (2004, p.26), a obra é estruturada
pela forma A-B-A’: A seção A é dividida em exposição, Materiais
desenvolvimento e reexposição com variação; a seção B
apresenta a exposição de dois temas diferentes; de volta No campo da criação musical, os materiais são
à seção A’ é apresentada a reexposição e desenvolvi- elementos importantes para gerar distintas sonoridades
mento, finalizando com a volta a um dos temas apresen- e efeitos. A diversidade de timbres provém das variadas
tados na seção B. Pinto resumiu da seguinte forma: A (a fontes sonoras. Ao longo do tempo, materiais e o seu em-
- b - a’) – B (c - d) - A1(a’’- b’- d’). prego nas fontes sonoras têm definido diferentes tipos de
criação e interpretação musical, como podemos observar
nas músicas Canon Crab (J.S.Bach), A Cavalgada das Val-


Citações da Obra na Matriz de Referências
O ser humano como um ser que pergunta e quer saber

Obras musicais como Crab Canon (Bach), Caval-


gada das Valquírias (Wagner) e Reisado do pastoreio /
quírias (Richard Wagner), Flor Amorosa (Joaquim Callado)
e Tribunal do Feicebuqui (Tom Zé). Na Suíte Reisado de
Pastoreio / Batuque / Dança dos Negros (Lorenzo Fer-
nandez), verifica-se a escolha de instrumentos não con-
vencionais. (Página 31, quinto parágrafo)

Questões, Justificativas e Dicas


batuque - dança de negros (Lorenzo Fernandez) exem- Quer acessar as questões, justificativas e dicas desta obra?
plificam formas expressivas distintas de musicalidades,
contrastadas com as das músicas Cabaça d’água, (Alberto Clique aqui ou use o QR CODE da página 6.
Salgado), Flor amorosa (Joaquim Callado), ou Mar de Bra-
sília (Engels Espíritos). Esses contrastes entre as formas Anotações e Rascunhos
musicais apresentam-se também em músicas populares,
como O Sal da Terra (Beto Guedes) e Estou apaixonada
por você, 6 na versão de Gina Lobrista, ou nas de tradições
populares, como Capoeira e Carimbó. (Página 5, quinto
parágrafo)

Indivíduo, cultura e mudança social

Ao ampliar esse contexto, estão postas questões


relativas à figura do artista como agente de mudanças so-
ciais e as suas produções culturais. Obras como Cavalga-
da das Valquírias (Wagner), Crab Canon (Bach), Reisado
do Pastoreio/ Batuque - Dança de Negros (Lorenzo Fer-
nandez), O Sal da Terra (Beto Guedes), Eu estou apaixona-
da por você (na versão de Gina Lobrista), Cabaça D’água
(Alberto Salgado), Flor amorosa (Joaquim Callado) e Mar
de Brasília (Engels Espiritos) ampliam o reconhecimento
dessas questões. Cabe indagar como o artista participa
dessas mudanças sociais e como a sociedade vê a criação
artística, pensando ações e reações da sociedade. Tom Zé
exemplifica na canção Tribunal do Feicebuqui questiona-
mentos como esses. (Página 7, quinto parágrafo)

A formação do mundo ocidental contemporâneo

As transformações ocorridas no Brasil e no mun-


do a partir do século XIX refletem-se também na produção
das artes, que abordam criticamente a sociedade. A pin-
tura A Redenção de Cam (Modesto Brocos) faz referência

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Capoeira

Histórico
A capoeira é uma manifestação cultural que pode poeira é extinguida do rol de crimes do Código Penal
ser considerada um esporte, luta e/ou dança. Essa ex- Brasileiro. A capoeira é rica de elementos, como a musi-
pressão cultural foi desenvolvida no Brasil no século XVI calidade, religiosidade e movimentos acrobáticos, o que
por descendentes de escravos africanos, e surgiu como a torna única.
forma de resistência. Nesse período, muitos africanos
foram trazidos ao Brasil como escravos para trabalharem Estilos da Capoeira
nos engenhos de cana-de-açúcar, nas fazendas e na casa
dos senhores. Aos poucos perceberam a necessidade de A capoeira é caracterizada por movimentos
criar uma forma de se defenderem da violência dos co- ágeis que utilizam mais os pés e a cabeça, como chutes,
lonizadores, já que eram constantemente maltratados e rasteiras, cabeçadas, joelhadas e outros. Existem vários
violentados. Viu-se a necessidade de criar uma técnica estilos, sendo os principais a Capoeira Angola e a Capoei-
de defesa e ataque para que os negros pudessem utilizar ra Regional:
seu próprio corpo para confrontar seus adversários.
• Capoeira Angola - é o estilo mais próximo da capoeira
Para que ninguém suspeitasse, tendo em vista que os escravos jogavam. É mais lenta, quase sempre
que os escravos eram proibidos de praticar qualquer está acompanhada por uma bateria completa de ins-
tipo de luta, decidiram adaptar o ritmo e movimentos trumentos e os movimentos são furtivos e executados
das danças africanas para um novo tipo de luta. Surgiu perto do solo. Leva esse nome por terem sido os es-
então a capoeira, que é, na realidade, uma arte marcial cravos angolanos que mais se destacaram nessa práti-
disfarçada de dança. Os confrontos costumavam aconte- ca. Apesar de ser baseada na calma e na velocidade, a
cer nas fugas, geralmente em matas grandes e capoeiras, Capoeira Angola é uma luta.
e é desse último que se originou o nome da luta. • Capoeira Regional – foi criada em 1930 pelo Mestre
Bimba. Inicialmente foi chamada de ‘luta regional
Fontoura e Guimarães (2002) citam Santos baiana”. Como um habilidoso lutador e exímio prati-
(1990, p. 19) que comenta que, “para assegurar a so- cante da capoeira Angola, Mestre Bimba buscou pro-
brevivência da capoeira naquela época, os capoeiristas, mover a capoeira com intuito de ter mais força como
quando na presença dos senhores de engenho, pratica- luta, e por isso incorporou novos golpes, inclusive do
vam-na em forma de brincadeira, quando, na verdade, Batuque, uma luta já extinta muito rica em golpes
estavam treinando”. As autoras acrescentam ainda que o traumáticos. Foi ele também o responsável por criar o
berimbau, instrumento característico da capoeira, servia primeiro método de ensino da capoeira. Um dos fun-
para dar ritmo e também para anunciar a chegada dos damentos da capoeira regional é manter no mínimo
senhores, a fim de transformar a luta em dança. Impor- uma base (pé ou mão) no solo. Na capoeira regional
tante ressaltar que apesar de ser uma luta, a capoeira são utilizadas muitas cabeçadas, rasteiras e quedas,
não foi criada apenas com esse propósito, já que é tam- e ao contrário da capoeira Angola, que é mais lenta e
bém um movimento de resistência cultural. calma, a capoeira regional é mais rápida.
Com o passar do tempo, os senhores de enge-
nhos perceberam o poder fatal que a capoeira possuía e Instrumentos da Capoeira
a proibiram, rotulando-a de “arte negra”. Em 1888, com Segundo Fontoura e Guimarães (2002), até onde
a abolição da escravidão, não houveram políticas públi- se sabe, a capoeira é a única luta brasileira que utiliza
cas para a inclusão de ex-escravizados no mercado de instrumentos musicais. Além dos instrumentos, as pal-
trabalho, com isso a capoeira se tornou um dos princi- mas dos capoeiristas também ajudam a ritmar a luta. Os
pais meios utilizados para a sobrevivência. instrumentos utilizados são:
Mesmo após a abolição, os praticantes da ca- • Berimbau: Instrumento de corda percutida constituí-
poeira continuaram sofrendo perseguições, pois a luta do por uma única corda esticada em haste de ma-
era vista como uma prática extremamente violenta. Em deira. Sua caixa de ressonância é feita de cabaça; O
1890, a capoeira foi considerada “fora da lei” pelo antigo berimbau deve ser segurado na mão esquerda junto
Código Penal, que estabelecia a pena de dois a seis me- com uma moeda, que quando utilizada, permite a
ses de reclusão a quem praticasse a capoeira nas ruas ou obtenção de uma segunda nota musical. Importante
em praça pública. ressaltar que o toque do berimbau é parte importan-
Em 1937, um grupo de capoeira fez uma apre- te na condução da capoeira. Existem três tipos de be-
sentação ao então presidente Getúlio Vargas, que trans- rimbaus, sendo o principal o berimbau gunga, que é
formou a luta em esporte nacional. No mesmo ano ca- o que possui som mais grave e cabaça maior, por isso

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comanda a capoeira. O berimbau médio possui um


som médio (entre o grave e o agudo) e uma cabaça
média, enquanto o berimbau viola (ou violinha) pos-
sui uma cabaça ainda menor e um som mais agudo. O
berimbau gunga marca o ritmo, o médio ajuda o gun-
ga a manter o ritmo, e o berimbau viola faz o repique
da roda de capoeira.

Citações da Obra na Matriz de Referências
O ser humano como um ser que pergunta e quer saber

Obras musicais como Crab Canon (Bach), Ca-


valgada das Valquírias (Wagner) e Reisado do pastoreio
• Pandeiro: Instrumento de percussão composto por
um aro de madeira com uma pele esticada sobre ele / batuque - dança de negros (Lorenzo Fernandez) exem-
e algumas soalhas (rodelas de metal) no aro. Do pan- plificam formas expressivas distintas de musicalidades,
deiro são extraídos apenas dois sons, sendo um grave contrastadas com as das músicas Cabaça d’água, (Alberto
Salgado), Flor amorosa (Joaquim Callado), ou Mar de Bra-
e um agudo;
sília (Engels Espíritos). Esses contrastes entre as formas
musicais apresentam-se também em músicas populares,
• Caxixi: Instrumento de percussão de origem africana,
como O Sal da Terra (Beto Guedes) e Estou apaixonada
o caxixi é um chocalho de cestinha fechado com se-
por você, 6 na versão de Gina Lobrista, ou nas de tradições
mentes secas dentro. É usado principalmente como
populares, como Capoeira e Carimbó. (Página 5, quinto
complemento do berimbau. A mesma mão que se-
parágrafo)
gura a vareta do berimbau segura também o caxixi.
Dessa forma, toda vez que a vareta toca a corda do Indivíduo, cultura e mudança social
berimbau, o som seco do caxixi também aparece;
Compreender as origens da manifestação artísti-
• Atabaque: Instrumento de percussão também de ca Capoeira faz pensar sobre a construção da identidade
origem afro-brasileira. Existem três tipos de ataba- de um grupo e suas relações com o ambiente. O surgimen-
ques: o mais baixo (Le) produz um som alto; o mé- to dessa manifestação exige a análise da condição social
dio alto (Rum Pi-e) produz um som médio; e o mais do povo negro no Brasil durante a escravidão e depois
alto (Rum) produz um som baixo. Os tambores são dela. Por sua vez, a pintura Roda de Capoeira (Rugendas)
fabricados com madeira de jacaranda e por cima da e a manifestação cultural Carimbó permitem, também,
tampa do tambor é colocada uma pele. Podem ser reflexões acerca dessa temática. (Página 7, quarto pará-
tocadas com a mão ou com baquetas; grafo)
Tipos e gêneros
• Agogô: Instrumento de percussão de origem africa-
na. O agogô brasileiro, que é utilizado na capoeira, é As óperas são espetáculos cênicos e musicais,
um pouco diferente do instrumento africano. O ins- contendo representações sociais de tipos e gêneros da so-
trumento de ferro possui um formato de U e liga dois ciedade de suas épocas. Como são construídas as relações
sinos. Na capoeira, o agogô tem a função de fazer a entre as características das personagens e a expressivida-
marcação. de musical utilizada? No caso da Cavalgada das Valquírias
(Wagner), as representações da mitologia nórdica e suas
• Reco-reco: Instrumento de percussão feito de bam- personagens compõem a trama e o conflito da música. A
bu com gomos. Quando a tala ou varinha é passada construção de conceitos, como ópera, sinfonia, ária, entre
sobre a superfície do instrumento, este produz um outros, faz-se necessário à apreciação musical de quem
ruído rascante. se propõe a assistir esse tipo de espetáculo. A música ser-
ve à exposição de temas e ajuda no desenvolvimento da
Na capoeira regional, também conhecida como trama, como percebe-se na obra de Wagner. Como pen-
capoeira do mestre Bimba, são utilizados 1 berimbau e 2 sar essas relações em gêneros musicais e culturais como a
pandeiros. Na capoeira angola, entretanto, são utilizados Capoeira e o Carimbó? (Página 10, terceiro parágrafo)
3 berimbaus, 2 pandeiros, agogô, atabaque e reco-reco.
Vale ressaltar que o caxixi é utilizado como complemen- A formação do mundo ocidental contemporâneo
to do berimbau, então está presente nos dois estilos da
capoeira. Esses elementos de resistência da população
afro-brasileira estão presentes na pintura Roda de Ca-
No ano de 2008, a roda de capoeira foi reconhe- poeira (Johann Moritz Rugendas, 1835) e na própria Ca-
cida e registrada como um bem cultural pelo Instituto do poeira enquanto manifestação social, política e cultural,
Patrimônio Histórico e Artístico (IPHAN). Em novembro contrariando as representações históricas tradicionais re-
de 2014, recebeu o status de Patrimônio Cultural Imate- lacionadas à ideia de passividade dos negros brasileiros
rial da Humanidade pela Organização das Nações Unidas diante de contextos e situações de opressões e violências.
para a Educação, Ciência e Cultura (UNESCO). Pode-se observar essa resistência também no Carimbó.
(Página 22, terceiro parágrafo)
Espaços

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Na formação do espaço geográfico brasileiro,


observa-se a constituição de focos de resistência e afirma-
ção de escravos, ex-escravos e indígenas. Exemplos dessa
formação estão na pintura Roda de capoeira (Rugendas),
na Plataforma GeoProcessamento da Funai e nas mani-
festações de cultura popular tais como Capoeira e Carim-
bó que carregam influências africanas e indígenas que
estão evidenciadas nas coreografias e na dramaticidade
e gestualidade dos brincantes, além de representar a di-
versidade, no que se refere às suas fronteiras geográficas,
culturais e econômicas. (Página 28, terceiro parágrafo)
Materiais
Manifestações de tradições populares como o
Carimbó e a Capoeira trazem, nos materiais sonoros, re-
flexos das diferentes formas de relação do homem com
o ambiente, gerando identidades culturais e de pertenci-
mento. Essas reflexões podem ser notadas na obra Roda
de capoeira (Rugendas). (Página 31, primeiro parágrafo)

Questões, Justificativas e Dicas


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Anotações e Rascunhos

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Carimbó

Histórico
O carimbó é uma manifestação cultural tradicio- as moças, com suas saias, executam movimentos na ten-
nal do estado do Pará que reúne elementos da cultura tativa de cobrir a cabeça de seus pares. As moças usam
indígena, africana e portuguesa. Objetiva expressar, por muitos acessórios coloridos e flores na cabeça.
meio dos instrumentos, letras e dança, o cotidiano das
populações ribeirinhas, dos agricultores e pescadores A letra e dança costumam conversar ao expres-
da região, bem como a relação que eles mantêm com o sar o trabalho dos pescadores, agricultores e ribeirinhos.
meio ambiente. Por exemplo: quando a pesca e o mar são constante-
mente citados, as dançarinas fazem movimentos com a
O carimbó está presente na Ilha de Marajó, na saia que remetem ao balançar da rede.
região do Baixo Amazonas e principalmente na faixa lito-
rânea do Pará, região conhecida como Zona do Salgado, É importante ressaltar que o termo “carimbó”
onde o oceano atlântico e a floresta amazônica se en- era inicialmente utilizado apenas para designar o ins-
contram (FUSCADO, 2014). trumento utilizado, mas com o passar do tempo se es-
tendeu também para a dança, poesia e cantos oriundos
Os elementos dessa manifestação (canto, mú- dessa manifestação cultural.
sica, dança, e a formação instrumental) foram tradicio-
nalmente transmitidos pela oralidade. Não se sabe ao O carimbó foi também responsável por influen-
certo onde e quando o carimbó surgiu, embora alguns ciar gêneros como o tecnobrega e a lambada. Ganhou le-
municípios se auto intitularem como “berço” dessa ma- gitimidade nas rádios e mídias da capital do Pará através
nifestação. de compositores como Mestre Verequete, Mestre Lucin-
do e Pinduca. Os compositores do carimbó costumam
O nome carimbó é derivado do instrumento de ser pescadores e agricultores que moram no interior do
percussão indígena chamado curimbó, que significa “pau Pará.
oco”. Esse instrumento é feito de um tronco de árvore
escavada e em uma das suas extremidades é coberto por Carimbó Tradicional X Urbano
couro de animal. O tocador senta-se sobre o curimbó e
bate o tambor com as mãos fazendo a marcação rítmica Segundo Fuscado (2014), é necessária a utiliza-
tradicional do carimbó. ção da expressão carimbó tradicional para se referir ao
carimbó de raiz, tendo em vista que existe também no
Dança e Música Pará um outro estilo de carimbó chamado de “moder-
no” ou “urbano”. Enquanto o primeiro, o carimbó tra-
A instrumentação varia de acordo com cada dicional, é produzido pelas populações das cidades do
região, mas junto ao curimbó podem ser utilizados ins- interior, bem distante da lógica comercial, o segundo, o
trumentos como pandeiros, maracas, matracas, caxixis, carimbó urbano, segundo Fuscado (2014, p.85) “resul-
violão, cavaquinhos, flauta, clarinete, rabeca e saxofone. tou do processo de popularização do carimbó na capital
Entretanto, apesar dessa riqueza de combinações sono- paraense [...], dentro de um contexto de modernização
ras, também é possível fazer um carimbó apenas com o estética e difusão de seu ritmo através dos meios de
curimbó e maracas. comunicação de massa regionais”. A principal diferença
musical entre eles é a incorporação de guitarras, baixos
À medida em que o ritmo é marcado, o cantador elétricos e baterias no carimbó urbano.
de carimbó, que puxa os versos e refrãos, canta os ver-
sos principais, que logo depois serão repetidos por todos Foi o carimbó urbano que popularizou o estilo
que estão presentes. entre os moradores do Pará e, consequentemente, do
Brasil, contribuindo para que se tornasse um dos maiores
A dança do carimbó é feita em pares ou em roda. representantes da identidade paraense, sendo inclusive
Essa dança, cheia de rodopios, quando apresentada por reconhecido como patrimônio cultural imaterial pelo
grupos de dança, possui coreografias e vestimentas es- Iphan em 2014. Existem alguns festivais tradicionais que
pecíficas. Nas rodas improvisadas, quando quem dança reúnem grupos de carimbó de todo o estado do Pará.
é o público, não há coreografias ou roupas específicas.
As saias das mulheres costumam ser coloridas e volumo-
sas, garantindo um efeito visual ao movimento. Os dan-
çarinos se vestem como trabalhadores, com calças cur-
tas ou dobradas. Homens e mulheres dançam descalços.
O rapaz convida a moça para a dança batendo palmas, e

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ção de escravos, ex-escravos e indígenas. Exemplos dessa


Citações da Obra na Matriz de Referências
O ser humano como um ser que pergunta e quer saber

Obras musicais como Crab Canon (Bach), Ca-


valgada das Valquírias (Wagner) e Reisado do pastoreio
formação estão na pintura Roda de capoeira (Rugendas),
na Plataforma GeoProcessamento da Funai e nas mani-
festações de cultura popular tais como Capoeira e Carim-
bó que carregam influências africanas e indígenas que
estão evidenciadas nas coreografias e na dramaticidade
e gestualidade dos brincantes, além de representar a di-
versidade, no que se refere às suas fronteiras geográficas,
culturais e econômicas. (Página 28, terceiro parágrafo)
/ batuque - dança de negros (Lorenzo Fernandez) exem-
plificam formas expressivas distintas de musicalidades, Materiais
contrastadas com as das músicas Cabaça d’água, (Alberto
Salgado), Flor amorosa (Joaquim Callado), ou Mar de Bra- Manifestações de tradições populares como o
sília (Engels Espíritos). Esses contrastes entre as formas Carimbó e a Capoeira trazem, nos materiais sonoros, re-
musicais apresentam-se também em músicas populares, flexos das diferentes formas de relação do homem com
como O Sal da Terra (Beto Guedes) e Estou apaixonada o ambiente, gerando identidades culturais e de pertenci-
por você, 6 na versão de Gina Lobrista, ou nas de tradições mento. Essas reflexões podem ser notadas na obra Roda
populares, como Capoeira e Carimbó. (Página 5, quinto de capoeira (Rugendas). (Página 31, primeiro parágrafo)
parágrafo)

Indivíduo, cultura e mudança social


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Compreender as origens da manifestação artísti-
ca Capoeira faz pensar sobre a construção da identidade Clique aqui ou use o QR CODE da página 6.
de um grupo e suas relações com o ambiente. O surgimen-
to dessa manifestação exige a análise da condição social
do povo negro no Brasil durante a escravidão e depois
Anotações e Rascunhos
dela. Por sua vez, a pintura Roda de Capoeira (Rugendas)
e a manifestação cultural Carimbó permitem, também,
reflexões acerca dessa temática. (Página 7, quarto pará-
grafo)
Tipos e gêneros
As óperas são espetáculos cênicos e musicais,
contendo representações sociais de tipos e gêneros da so-
ciedade de suas épocas. Como são construídas as relações
entre as características das personagens e a expressivida-
de musical utilizada? No caso da Cavalgada das Valquírias
(Wagner), as representações da mitologia nórdica e suas
personagens compõem a trama e o conflito da música. A
construção de conceitos, como ópera, sinfonia, ária, entre
outros, faz-se necessário à apreciação musical de quem
se propõe a assistir esse tipo de espetáculo. A música ser-
ve à exposição de temas e ajuda no desenvolvimento da
trama, como percebe-se na obra de Wagner. Como pen-
sar essas relações em gêneros musicais e culturais como a
Capoeira e o Carimbó? (Página 10, terceiro parágrafo)
A formação do mundo ocidental contemporâneo
Esses elementos de resistência da população
afro-brasileira estão presentes na pintura Roda de Ca-
poeira (Johann Moritz Rugendas, 1835) e na própria Ca-
poeira enquanto manifestação social, política e cultural,
contrariando as representações históricas tradicionais re-
lacionadas à ideia de passividade dos negros brasileiros
diante de contextos e situações de opressões e violências.
Pode-se observar essa resistência também no Carimbó.
(Página 22, terceiro parágrafo)
Espaços
Na formação do espaço geográfico brasileiro,
observa-se a constituição de focos de resistência e afirma-

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O Sal da Terra - Beto Guedes

Autor
O cantor e compositor Alberto de Castro Guedes Obra
nasceu no dia 13 de agosto de 1951, em Montes Claros,
Minas Gerais. Seu pai, Godofredo Guedes, era um músi- O Sal da Terra
co respeitado na cidade.
Anda!
Aos 9 anos, Beto mudou-se com sua família Quero te dizer nenhum segredo
Falo desse chão, da nossa casa
para Belo Horizonte, onde se tornou vizinho de Lô Bor- Vem que tá na hora de arrumar
ges, com quem criou um grupo de violão e quatro vozes
que tinha um repertório exclusivamente dedicado aos Tempo!
Beatles. A amizade com Lô Borges influenciou Beto a de- Quero viver mais duzentos anos
cidir seguir de vez a carreira musical. Quero não ferir meu semelhante
Nem por isso quero me ferir
Em 1970, Beto participou do V Festival Interna-
cional da Canção (FIC) com a música “Feira Moderna”, Vamos precisar de todo mundo
Pra banir do mundo a opressão
que no mesmo ano seria gravada pelo grupo Som Ima-
Para construir a vida nova
ginário. Vamos precisar de muito amor
A felicidade mora ao lado
Participou de forma ativa do Clube da Esquina, E quem não é tolo pode ver
cantando, tocando baixo, bateria e percussão. O grupo
Clube da Esquina objetivava dar visibilidade para a mú- A paz na Terra, amor
sica mineira, contribuindo para que compositores mi- O pé na terra
neiros fossem conhecidos. Fica clara a influência que a A paz na Terra, amor
música mineira exerceu em sua carreira. O sal da

Terra!
De volta para Minas, Beto reorganiza o “Bloco
És o mais bonito dos planetas
B”, uma espécie de Clube de Esquina. Desse bloco é for- Tão te maltratando por dinheiro
mado o grupo Fio da Navalha em 1972, e no ano seguin- Tu que és a nave nossa irmã
te surge o primeiro disco de Beto. Em 1975 gravou uma
música com Milton Nascimento, e a parceria deu tão Canta!
certo que no mesmo ano gravaram um compacto juntos. Leva tua vida em harmonia
E nos alimenta com seus frutos
Em 1976, assinou contrato com a Odeon, lan- Tu que és do homem, a maçã
çando seu primeiro disco individual no ano seguinte. O
Vamos precisar de todo mundo
álbum “Amor de índio” foi lançado em 1978. Em 1979,
Um mais um é sempre mais que dois
volta a gravar com Milton Nascimento. Na sequência lan- Pra melhor juntar as nossas forças
çou os discos “Sol de Primavera”, “Contos de Lua Vaga”, É só repartir melhor o pão
“Viagem das mãos” e a coletânea “Lumiar”. Recriar o paraíso agora
Para merecer quem vem depois
O seu primeiro disco de ouro foi conquistado
com o LP “Alma de Borracha”, o qual rapidamente ul- Deixa nascer, o amor
trapassou a marca de 200 mil cópias vendidas. Na déca- Deixa fluir, o amor
da de 90 lança os discos “Andaluz” e “Dias de paz”. Em Deixa crescer, o amor
Deixa viver, o amor
2004, Beto participou da gravação do CD “Hino do Fome
O sal da terra
Zero”. Beto é considerado um grande representante da
música popular brasileira. A canção Sal da Terra faz parte do álbum “Con-
tos da lua vaga”, lançado em 1981. Composição de Beto
Continua fazendo vários shows pelo Brasil. Sua
Guedes em parceria com o jornalista Ronaldo Bastos, a
música mais conhecida é “Sol de Primavera”, música
canção mostra que o sal da terra somos nós. Ou seja,
de abertura da novela da rede globo “Marina”. Outras
somos os responsáveis por cuidar do planeta.
de suas canções também se tornaram trilha sonora de
novelas. Suas composições foram gravadas por artistas A canção convida o ouvinte a se unir em prol das
importantes da MPB como Elis Regina e Milton Nasci- necessidades do planeta, buscando desenvolver ações
mento. coletivas que protejam e preservem a vida. Fala também

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sobre respeito e cuidado para com o próximo a fim de tradições populares, como Capoeira e Carimbó. (Página
que seja banida a opressão e haja o resgate do amor. 5, quinto parágrafo)

Trechos como “Vamos precisar de todo mundo/ Indivíduo, cultura e mudança social
Um mais um é sempre mais que dois” reforçam a neces-
sidade de conscientizarmos as pessoas sobre a preserva- Ao ampliar esse contexto, estão postas questões
ção do meio ambiente. relativas à figura do artista como agente de mudanças
sociais e as suas produções culturais. Obras como Caval-
“Tão te maltratando por dinheiro” fala sobre a gada das Valquírias (Wagner), Crab Canon (Bach), Rei-
ganância do homem e seu amor ao lucro que tem des- sado do Pastoreio/ Batuque - Dança de Negros (Loren-
truído o planeta. Vemos constantemente acontecimen- zo Fernandez), O Sal da Terra (Beto Guedes), Eu estou
tos que exemplificam o trecho da canção, como o rompi- apaixonada por você (na versão de Gina Lobrista), Ca-
mento da barragem em Mariana (MG) em 2015, tragédia baça D’água (Alberto Salgado), Flor amorosa (Joaquim
abordada também na canção Cabaça d’água, e da barra- Callado) e Mar de Brasília (Engels Espiritos) ampliam o
gem em Brumadinho, em 2019. reconhecimento dessas questões. Cabe indagar como o
artista participa dessas mudanças sociais e como a socie-
Poluição dos rios, devastação de áreas que de- dade vê a criação artística, pensando ações e reações da
veriam ser preservadas e derrubadas de florestas são só sociedade. Tom Zé exemplifica na canção Tribunal do Fei-
alguns exemplos que mostram como a ação insensata do cebuqui questionamentos como esses. (Página 7, quinto
homem tem devastado o planeta, que sofre em agonia. parágrafo)
Muitas atitudes tomadas em nome da ganância e do de-
senvolvimento econômico têm interferido no equilíbrio Ambiente e vida
ambiental. As consequências desse desequilíbrio vão
desde enchentes e secas e inundação de áreas ribeiri- Ao longo da história da humanidade temos ob-
nhas até o aquecimento global e o aumento do nível da servado que a biodiversidade é constantemente negli-
água do mar. genciada em benefício do capital, como exposto por Beto
Guedes em O Sal da Terra. O texto O rompimento da
Quando respeitamos e cuidamos do meio am- barragem de Mariana e seus impactos socioambientais
biente, colhemos os benefícios que um planeta saudável (Luciano M. N. Lopes) e o vídeo Conservar a Amazônia,
pode oferecer, afinal, a natureza nos oferece os recursos uma questão ambiental, social e econômica mostram
necessários para a nossa sobrevivência. Os compositores como as ações humanas impactam o meio ambiente e
fizeram questão de ressaltar a importância da terra para podem causar a destruição de espaços e prejudicar es-
a nossa subsistência: “Leva tua vida em harmonia/E nos pécies, evidenciando a necessidade de repensar o uso
alimenta com seus frutos”. desses ambientes. Kant, no texto Resposta à pergunta:
o que é o esclarecimento? sugere que ao fazer uso da
O mundo pede socorro, e para que haja futuro razão o homem exerce sua autonomia, condição que o
para as gerações que virão, precisamos cuidar do meio torna responsável pela manutenção das demais formas
ambiente agora. Como canta Beto Guedes: “Recriar o de vidas assegurando o equilíbrio ambiental. (Página 17,
paraíso agora/Para merecer quem vem depois”. É preci- quarto parágrafo)
so remediar para que o mundo não seja destruído.
A formação do mundo ocidental contemporâneo
Os instrumentos utilizados são teclados, voz,
guitarra, baixo elétrico, bateria e percussão. África, Ásia e América Latina foram submeti-
das e expostas a situações dramáticas, relacionadas à


expansão dos modelos capitalistas industriais europeus
e norte americano em sua fase imperialista. Reflexões
acerca dessa temática estão presentes em: O Sal da Ter-
Citações da Obra na Matriz de Referências ra (Beto Guedes), Cabaça d’água (Alberto Salgado), O
O ser humano como um ser que pergunta e quer saber rompimento da barragem de Mariana e seus impactos
socioambientais (Luciano M. N. Lope), Um Inimigo do
Obras musicais como Crab Canon (Bach), Caval- Povo (Henrik Ibsen) e Conservar a Amazônia, uma ques-
gada das Valquírias (Wagner) e Reisado do pastoreio / tão ambiental, social e econômica (Agência FAPESP), ao
batuque - dança de negros (Lorenzo Fernandez) exem- criticarem os impactos sociais e ambientais relacionados
plificam formas expressivas distintas de musicalidades, ao Imperialismo. (Página 23, primeiro parágrafo)
contrastadas com as das músicas Cabaça d’água, (Al-
berto Salgado), Flor amorosa (Joaquim Callado), ou Mar Espaços
de Brasília (Engels Espíritos). Esses contrastes entre as
Pensar em espaços naturais implica em com-
formas musicais apresentam-se também em músicas po-
preender a sustentabilidade como condição necessária
pulares, como O Sal da Terra (Beto Guedes) e Estou apai-
para orientar as atividades humanas, a fim de evitar a
xonada por você, 6 na versão de Gina Lobrista, ou nas de

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devastação desses espaços. Essa reflexão pode ser sus-


citada na peça Um inimigo do povo (Henrik Ibsen), na
música O Sal da Terra (Beto Guedes), no texto O rom-
pimento da barragem de Mariana e seus impactos so-
cioambientais (Luciano M. N. Lopes) e no documentário
Conservar a Amazônia, uma questão ambiental, social e
econômica (Agência Fapesp). Nesse documentário pode-
-se, também, perceber como a influência climática inter-
fere nos espaços agrários produtivos e de manutenção
do meio ambiente. (Página 27, quinto parágrafo)

Materiais

A discussão sobre matéria e suas transforma-


ções, como a sua destruição e modificação no meio am-
biente, pode ser enriquecida a partir de músicas como O
Sal da Terra (Beto Guedes) e Cabaça D’água (Alberto Sal-
gado), nas quais 32 possível verificar distintos usos dos
materiais (Página 31, sétimo parágrafo)

Questões, Justificativas e Dicas


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Inclassificáveis - Ney Matogrosso

Autor
Ney de Souza Pereira, conhecido como Ney Ma- Participou de renomados festivais internacio-
togrosso, nasceu no dia 1º de agosto de 1941 em Bela nais. Nos anos 90 e 2000 se envolveu em diversos pro-
Vista, Minas Gerais. O cantor, ator, diretor e iluminador jetos sociais e se redescobriu como escritor. Atuou no
demonstrou vocação artística desde cedo. Durante sua filme “Gosto de Fel” e apresentou o documentário “Olho
infância passou boa parte do tempo sozinho. Filho de Nu”. Ao longo de sua carreira, apresentou-se diversas
militar, sua família tinha o costume de mudar de cidade vezes em solo internacional, realizando turnês na Euro-
várias vezes, e por isso, até os 17 anos de idade, Ney já pa, Israel, Uruguai, Estados Unidos e Argentina.
tinha morado em Bela Vista, Salvador, Recife, Rio de Ja-
neiro e Campo Grande. Obra
Antes de decidir qual carreira seguir, Ney pas- Inclassificáveis
sou pela Aeronáutica, pelo laboratório de anatomia pa-
tológica do Hospital de Base de Brasília, trabalhou com Que preto, que branco, que índio o quê?
recreação de crianças, foi convidado para participar de Que branco, que índio, que preto o quê?
Que índio, que preto, que branco o quê?
um festival universitário e integrou um quarteto. Decidiu
Que preto branco índio o quê?
então ser ator, o que o levou para o Rio de Janeiro, onde Branco índio preto o quê?
passou a viver da confecção e venda de peças de artesa- Índio preto branco o quê?
nato em couro e, em raras ocasiões, se apresentava. Co-
nheceu João Ricardo, um produtor musical que buscava Aqui somos mestiços mulatos
uma voz aguda para integrar o grupo Secos & Molhados. Cafuzos pardos mamelucos sararás
Crilouros guaranisseis e judárabes
O sucesso com o grupo foi estrondoso e o pri-
Orientupis orientupis
meiro disco que Ney participou como vocalista vendeu Ameriquítalos luso nipo caboclos
mais de 1 milhão de cópias. Ney se destacou dentro do Orientupis orientupis
grupo com sua maquiagem marcante, performances Iberibárbaros indo ciganagôs
sensuais e roupas chamativas. Logo após o lançamento
do segundo LP, o grupo Secos & Molhados se desfez e Somos o que somos
Ney deu início à sua carreira solo. Inclassificáveis

Não tem um, tem dois


Seu primeiro disco, intitulado “Água do Céu – Não tem dois, tem três
Pássaro”, lançado em 1975, não foi o sucesso de ven- Não tem lei, tem leis
das que era esperado, mas lhe rendeu convites para se Não tem vez, tem vezes
apresentar em vários palcos. No mesmo ano estreou, no Não tem Deus, tem Deuses
Hotel Nacional no Rio de Janeiro, a superprodução “Ho- Não há sol a sós
mem de Neanderthal”, espetáculo em que atuava, can-
Aqui somos mestiços mulatos
tava e dançava, transformando-se em meio bicho, meio Cafuzos pardos tapuias tupinamboclos
homem, coberto de pelos, penas e chifres. Americarataís yorubárbaros
Seu segundo disco foi lançado logo em seguida, Somos o que somos
em 1976. Foi com esse disco que Ney Matogrosso alcan- Inclassificáveis
çou o seu primeiro grande sucesso nacional como artista
solo com a música “Bandido Corazón”. Que preto, que branco, que índio o quê?
Que branco, que índio, que preto o quê?
À medida que o tempo passava, sua performan- Que índio, que preto, que branco o quê?
ce foi se tornando cada vez mais ousada, e o artista co- Não tem um, tem dois
Não tem dois, tem três
meçou a ser reconhecido como um dos maiores intér- Não tem lei, tem leis
pretes do Brasil, já que incluiu em seu repertório grandes Não tem vez, tem vezes
releituras de clássico de compositores importantes. Não tem deus, tem deuses
Não tem cor, tem cores
Dez anos após a estreia da sua carreira artística Não há sol a sós
de sucesso, já contando com 8 LP’s solo, 2 discos de plati-
na e 2 discos de ouro, Ney Matogrosso fez a sua primeira Egipciganos tupinamboclos
turnê pela Europa, onde se apresentou ao lado de artis- Yorubárbaros carataís
tas renomados como Alceu Valença, Milton Nascimento Caribocarijós orientapuias
Mamemulatos tropicaburés
e Wagner Tiso.

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Chibarrosados mesticigenados Em diversos momentos, Ney faz um jogo de per-


Oxigenados debaixo do sol gunta e resposta com os vocais, que cantam a primeira
parte da frase e são respondidos pelo cantor. Esse jogo
De autoria de Arnaldo Antunes, a canção Inclas-
se inverte e Ney passa a cantar primeiro e os vocais res-
sificáveis foi composta e gravada em 1996. Doze anos
pondem. A dinâmica musical ajuda a reforçar o discurso
depois, a canção foi regravada por Ney Matogrosso. O
político da canção. Quanto mais próximo do fim da músi-
sucesso da canção na voz de Ney foi tão grande que aca-
ca, mais volume e agressividade as vozes ganham.
bou gerando um show que recebeu o nome da canção e
finalizou uma turnê do artista por diversas cidades bra- Ao analisar o vídeo é possível perceber que Ney
sileiras. permanece no centro do palco durante toda a perfor-
Seria a primeira vez (segundo declaração do cantor no mate- mance. Com isso, o artista objetiva transferir a atenção
rial extra do DVD) que ele se colocava política e criticamente do espectador para a letra e o recado a ser passado. Ao
diante do sistema, que montaria um roteiro com repertório cantar “somos o que somos/somos o que somos/inclas-
preparado para mostrar sua visão sobre o país (VARGAS & sificáveis/inclassificáveis”, Ney encara a plateia.
SILVA, 2012, p. 152).

Logo no início da música o compositor ques-


tiona a matriz clássica da formação do povo brasileiro:
“Que preto, que branco, que índio o quê?/ Que branco,
que índio, que preto o quê?/ Que índio, que preto, que
branco o quê?/ Que preto branco índio o quê?/ Branco
índio preto o quê?/ Índio preto branco o quê?”
Surgem então “novas raças” a partir de três po-

Citações da Obra na Matriz de Referências
O ser humano como um ser que pergunta e quer saber

Esse exercício da crítica pode ser enriquecido a


partir do contato com obras como a canção Cota não é
vos principais: o mulato (mistura de branco com negro); esmola (Bia Ferreira) ou Inclassificáveis (Arnaldo Antu-
o mameluco (mistura de índio com branco); e o cafuzo nes, interpretada por Ney Matogrosso), e Maria da Vila
(mistura de negro com índio). A letra apresenta trocadi- Matilde (Elza Soares) ao trazerem, em suas letras, proble-
lhos com raças, cores, religiões e etnias. matizações acerca de determinadas maneiras contempo-
râneas de viver e conviver, modos que não se orientam
Arnaldo Antunes apresenta neologismos ao jun- para o 4 reconhecimento da riqueza étnica do Brasil, nem
tar palavras como uma estratégia poética para a misci- dos direitos de populações marginalizadas historicamen-
genação de raças e etnias do povo brasileiro (Vargas & te. (Página 3, sexto parágrafo)
Silva, 2012). Podemos encontrar exemplos disso com as
Indivíduo, cultura e mudança social
palavras crilouros (crioulos e loiros), guaranisseis (gua-
ranis e nisseis) e jurárabes (judeus e árabes). Com isso, O discurso musical também pode ser uma forma
o compositor objetivou ressaltar a diversidade humana de crítica aos valores sociais e de classe. Isso pode ser ob-
e mostrar que somos uma pluralidade de etnias, frutos servado na canção Inclassificáveis (interpretada por Ney
da miscigenação de milhares de anos e portanto, inclas- Matogrosso) cuja temática central é a formação do povo
sificáveis. brasileiro e todo o significado de uma identidade marca-
da pela miscigenação. As reflexões sobre esse processo e,
Segundo Marques (2010), a miscigenação das também, de embranquecimento da população são apre-
três raças formadoras do país aporta um sistema redu- sentadas na pintura A redenção de Cam (Modesto Bro-
cionista que não dá conta da complexidade das rela- cos). (Página 7, quinto parágrafo)
ções sócio-político-culturais dos dias atuais. Por isso, a
palavra “misticigenados” surge da mistura das palavras Estruturas
“miscigenação” e “mestiçagem” como uma tentativa de
ampliar o conceito. Nesse sentido, o intérprete Ney Matogrosso, na
canção Inclassificáveis, demonstra que os paradigmas
Sobre a análise musical, o acompanhamento presentes na sociedade não são suficientes para sua har-
musical é feito quase que inteiramente sob um acorde, monia. Nossa sociedade historicamente jovem, formada
que sustenta a melodia com poucas variações de notas. pela imigração de diversas etnias. Na música, a influência
As variações que enriquecem a música ficam por conta da guitarra elétrica, marcante no rock´n roll, é justaposta
da guitarra, com seu timbre distorcido, a percussão e o a uma percussão de influência africana, causando, audi-
acompanhamento vocal. tivamente, a mistura étnica que se concretizou no Brasil.
(Página 12, terceiro parágrafo)
No início da música Ney começa cantando em
uma região grave, mas à medida que a música é cantada, Ambiente e vida
a voz caminha para o agudo até chegar ao grito entoa-
A música Inclassificáveis (Ney Matogrosso) abor-
do na palavra “inclassificáveis”. A mesma coisa acontece
da a temática da diversidade e formação do povo brasilei-
com os instrumentos, que aumentam o volume ao passo
ro não se atendo a critérios tradicionais que são baseados
que a letra é construída. nas matrizes brasileiras: indígenas, europeias e africanas.

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O compositor cria palavras que representam a fusão de


raças diversas para representar a mistura étnica que
diante de tantas variações se torna inclassificável, como
ressaltado na letra da canção. (Página 18, terceiro pará-
grafo)

A formação do mundo ocidental contemporâneo

Observa-se também no século XIX a construção


das lutas emancipatórias femininas na Europa, nos Esta-
dos Unidos e na América Latina. Essas temáticas estão
presentes nas músicas Cota Não é Esmola (Bia Ferreira),
Maria da Vila Matilde (Elza Soares), Inclassificáveis (Ney
Matogrosso) e Eu estou apaixonada por você (Gina Lo-
brista), obras contemporâneas que estimulam reflexões
acerca das rupturas ou permanências relativas à socieda-
de brasileira e aos movimentos sociais surgidos no século
XIX. Essas reflexões são evidenciadas nas obras audiovi-
suais Precisamos romper com os silêncios (Djamila Ribei-
ro - TEDxSaoPauloSalon 2016) e Povos indígenas do Brasil
(Cristian Wariu, 2018). (Página 21, sexto parágrafo)

Questões, Justificativas e Dicas


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Anotações e Rascunhos

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Mar de Brasília - Engels Spiritus

Autor
Engels Espíritos nasceu na Asa Norte, em Brasí- O nosso mar é o céu, mergulhe nas nuvens,
lia, e começou sua trajetória musical na Escola de Música Se perca nas cores, viaje nas luzes
de Brasília (EMB), onde estudou canto lírico. Herdou o
Mulher, menina dos meus olhos
nome do teórico Friedrich Engels. Autodidata, Engels é Suas formas voluptuosas, arte-textura de um Oscar
pioneiro no trabalho com gaitas harmônicas, tendo co- Passeando por suas belas curvas, pistas que aceleram o meu
meçado a estudar o instrumento em 1980. coração
Menina, mulher do meu país, faz o meu povo decolar
Em entrevista ao Correio Brasiliense, Engels Você é um avião!
conta que teve muita dificuldade para estudar o instru- Cai a noite, um oceano de estrelas
A lua cheia no lago é a nossa sereia
mento, pois em Brasília não havia professores e nem o
Vivemos como poucos, místicos, poetas e loucos
instrumento, que foi encomendado em São Paulo1. Sua Buscando nas festas, a diversão de suas noites perfeitas
experiência na Escola de Música de Brasília facilitou o E o céu na tormenta das luzes é o astro que nasce
aprendizado da gaita, já que aprendeu muito sobre teo-
ria musical. Abrindo os braços e com as asas da cidade
Faço um mergulho profundo no mar de Brasília
Engels criou uma escola onde lecionou técnicas Em um crepúsculo de um céu artista
Em um oceano que inspira, o nosso mar é o céu,
da gaita, se tornando o responsável pela formação da
Mergulhe nas nuvens, se perca nas cores, viaje nas luzes
primeira geração de gaitistas de Brasília. Criou também
um festival de gaitistas. Estudou luthieria (arte ou ofício A canção “Mar de Brasília” faz parte do segun-
que consiste na manutenção e construção de instrumen- do CD de Engels Espíritos, intitulado “Faces of the Harp”,
tos musicais) e técnicas de manutenção em gaitas. Re- lançado em 2006.O Cd possui 12 músicas, nas quais o
presentou o Brasil em vários festivais e circuitos impor- compositor demonstra sua habilidade com a gaita ex-
tantes na Alemanha, Canadá e Estados Unidos. traindo sons e timbre de outros instrumentos. Mar de
Brasília é uma homenagem à cidade planejada que se
Sua discografia conta com dois álbuns e um DVD.
tornou a capital do Brasil.
Por meio da mistura de ritmos, Engels mostrou que a
gaita não é instrumento exclusivo do jazz, blues e rock, Com Engels Espíritos na gaita e vocal, Marcelo
podendo ser inserida em diversos ritmos regionais. Em Ribeiro no Baixo, Rafa Dornelles na Guitarra e Cezar na
suas músicas, o compositor mistura influências e ritmos, bateria, a canção exalta a forma e as belezas da cidade,
sempre experimentando as possibilidades de combina- mas o maior elogio é feito ao mar de Brasília, que é o
ções. céu. Assim, as ondas brancas a que se refere o cantor
são as nuvens.
Obra
A música faz uma comparação entre a cidade de
Mar de Brasília
Brasília e uma figura feminina, como no trecho “Menina,
Olhe para o céu e veja o mar azul mulher do meu país, faz o meu povo decolar/Você é um
Olhe para o céu e sinta a imensidão azul avião!” e o trecho “Passeando por suas belas curvas, pis-
Veja a explosão de ondas brancas tas que aceleram o meu coração”.
Meus olhos se perdem em tamanha beleza
Além disso, também é possível ver as referên-
Dos quatros cantos da cidade, você vê o horizonte... cias que são feitas ao cerrado e a formação geográfica
A terra que piso é da cor do meu sangue da cidade “Dos quatros cantos da cidade, você vê o ho-
Na mistura de um povo, idéias e tribos
rizonte… / A terra que piso é da cor do meu sangue / Na
Aqui tudo é plano, mas as arvores são tortas
E Deus escreveu certo no vislumbre do profeta (Dom Bosco) mistura de um povo, idéias e tribos / Aqui tudo é plano,
mas as arvores são tortas”
Abrindo os braços e com as asas da cidade
Faço um mergulho profundo no mar de Brasília O trecho “E Deus escreveu certo no vislumbre
Em um crepúsculo de um céu artista, em um oceano que ins- do profeta” faz referência a Dom Bosco que, em 1883,
pira. sonhou que fazia uma viagem à América do Sul e passava
por várias terras até chegar na região entre os paralelos
1 Gaitista Engels Espíritos fala da carreira e da relação com 15° e 20°. Segundo o anjo que acompanhava Dom Bosco
a música. Disponível em: <https://www.correiobraziliense.com.br/app/
noticia/diversao-e-arte/2014/05/18/interna_diversao_arte,428045/
em sua visão, nesse local apareceria a “terra prometida”,
gaitista-engels-espiritos-fala-da-carreira-e-da-relacao-com-a-musica. que seria um lugar de muitas riquezas.
shtml>

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“Entre os graus 15 e 20 havia uma enseada bastante longa e presentes na sociedade não são suficientes para sua har-
bastante larga, que partia de um ponto onde se formava um monia. Nossa sociedade historicamente jovem, formada
lago. Disse então uma voz repetidamente: -Quando se vie- pela imigração de diversas etnias. Na música, a influência
rem a escavar as minas escondidas no meio destes montes, da guitarra elétrica, marcante no rock´n roll, é justaposta
aparecerá aqui a terra prometida, de onde jorrará leite e mel.
a uma percussão de influência africana, causando, audi-
Será uma riqueza inconcebível.2”
tivamente, a mistura étnica que se concretizou no Brasil.
O sonho de São João Bosco foi relatado no livro O músico Engels Espíritos, em Mar de Brasília, destaca as
“Memórias biográficas de São João Bosco”, escrito por características geográficas naturais da capital brasileira,
seu assistente. Muitas pessoas acreditam que o sonho propondo que as condições naturais que foram encon-
era na verdade uma profecia, já que o local que Dom tradas aqui pela Missão Cruls auxiliaram na formação da
Bosco avistou corresponde às coordenadas geográficas identidade social dos brasilienses. (Página 12, terceiro pa-
da cidade de Brasília, que foi inaugurada setenta e sete rágrafo)
anos depois. Energia e oscilações
Em homenagem ao santo, a primeira obra de A relação da interferência visual da luz sobre o
alvenaria erguida em Brasília foi a Ermida Dom Bosco, pigmento é tratado nas pinturas impressionistas, como se
projetada por Oscar Niemeyer e localizada nas margens percebe na obra Impressão, nascer do sol (Monet). Na li-
do Lago Paranoá. teratura, o Simbolismo também aborda a relação cromá-
tica, como pode ser observado na obra O assinalado (Cruz


Citações da Obra na Matriz de Referências
O ser humano como um ser que pergunta e quer saber

Obras musicais como Crab Canon (Bach), Ca-


valgada das Valquírias (Wagner) e Reisado do pastoreio
e Souza). Na música Mar de Brasília (Engels Espíritos) é
possível perceber o fenômeno da dispersão da luz. (Pági-
na 15, quarto parágrafo)

A formação do mundo ocidental contemporâneo

A Cidade é uma só? (Adirley Queirós, 2011),


Conservar a Amazônia, uma questão ambiental, social e
/ batuque - dança de negros (Lorenzo Fernandez) exem- econômica (Agência Fapesp, 2018) e O Mar de Brasília
plificam formas expressivas distintas de musicalidades, (Engels Espíritos) problematizam os deslocamentos e as
contrastadas com as das músicas Cabaça d’água, (Alberto migrações de grupos sociais e étnicos, relacionados aos
Salgado), Flor amorosa (Joaquim Callado), ou Mar de Bra- interesses e orientações vinculados ao Capitalismo Indus-
sília (Engels Espíritos). Esses contrastes entre as formas trial desenvolvido a partir do século XIX. (Página 22, pri-
musicais apresentam-se também em músicas populares, meiro parágrafo)
como O Sal da Terra (Beto Guedes) e Estou apaixonada
por você, 6 na versão de Gina Lobrista, ou nas de tradições
populares, como Capoeira e Carimbó. (Página 5, quinto Questões, Justificativas e Dicas
parágrafo) Quer acessar as questões, justificativas e dicas desta obra?
Indivíduo, cultura e mudança social Clique aqui ou use o QR CODE da página 6.
Ao ampliar esse contexto, estão postas questões
relativas à figura do artista como agente de mudanças so- Anotações e Rascunhos
ciais e as suas produções culturais. Obras como Cavalga-
da das Valquírias (Wagner), Crab Canon (Bach), Reisado
do Pastoreio/ Batuque - Dança de Negros (Lorenzo Fer-
nandez), O Sal da Terra (Beto Guedes), Eu estou apaixona-
da por você (na versão de Gina Lobrista), Cabaça D’água
(Alberto Salgado), Flor amorosa (Joaquim Callado) e Mar
de Brasília (Engels Espiritos) ampliam o reconhecimento
dessas questões. Cabe indagar como o artista participa
dessas mudanças sociais e como a sociedade vê a criação
artística, pensando ações e reações da sociedade. Tom Zé
exemplifica na canção Tribunal do Feicebuqui questiona-
mentos como esses. (Página 7, quinto parágrafo)

Estruturas

Nesse sentido, o intérprete Ney Matogrosso, na


canção Inclassificáveis, demonstra que os paradigmas
2 Muitos acreditam que santo italiano profetizou a construção
de Brasília no século 19. In: Notícias - Senado.

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Tribunal do Feicebuqui - Tom Zé

Autor
Antônio José Santana Martins nasceu na Bahia, Tribunal do Feicebuqui
em 1936. Sua infância foi boa, tendo em vista que seu
pai havia sido premiado na loteria federal. Durante a Tom Zé Mané
Baixou o tom
adolescência se interessou por música e começou a es-
Baba, baby, bebe, baba
tudar violão. Estudou na Escola de Música da Universi- Velho babão
dade Federal da Bahia, onde estudou com Koellreutter Tom Zé bundão
(musicólogo alemão que veio para o Brasil em 1937, fu- Baixou o tom
gindo no nazismo, trazendo a técnica “dodecafônica”), Baba, baby, bebe, baba
e foi nessa fase que começou a compor canções de teor Mané babão
satírico e político.
Seu americanizado
Através do espetáculo “Nós, Por Exemplo nº 2”, quer bancar Carmem Miranda
rebentou botando a calça
Tom Zé se aliou a figuras importantes como Gilberto Gil,
Tio Sam baixou em Sampa
Maria Bethânia, Caetano Veloso e Djalma Corrêa. É com
esse mesmo grupo que grava o álbum definidor do mo- Vendido, vendido, vendido
vimento Tropicalista. Sua canção “São, São Paulo, meu à preço de banana
amor” lhe rendeu o primeiro lugar no IV Festival de Mú- já não olha mais pro Samba
sica Popular Brasileira, da TV Record em 1968. Entretan- tá estudando propaganda
to, nas décadas de 70 e 80 seus trabalhos não desperta-
Que decepção (Ah, eu não acredito nisso. Olha só)
ram muita atenção do público.
traidor, mudou de lado (Ele fez isso mesmo? Ta errado!)
corrompido, mentiroso (Não é o Tom Zé que eu conheço não.)
No final dos anos 80 é que Tom Zé voltou a fi-
seu sorriso engarrafado (Se fosse um Dolly pelo menos…)
car em evidência quando o músico David Byrne lançou a
obra do compositor nos Estados Unidos. A partir daí Tom Não ouço mais
Zé começa a atrair plateias da Europa, Estados Unidos e não gostei do papo
Brasil, especialmente com o lançamento do álbum “Com pra mim é o príncipe que virou
defeito de fabricação”. Em 2006 Décio Matos Jr lança o onde já se viu, refrigerante
documentário “Fabricando Tom Zé”, que retrata a vida e agora é a Madalena arrependida com conservante
obra do músico. Bruxo, descobrimos seu truque
Defenda-se já no Tribunal do Feicebuqui
a nossa súplica, que que custava morrer de fome só pra fazer
Obra música?
Em 2013, Tom Zé participou de uma propaganda Tio Sam baixou em Sampa - Este trecho se refe-
da Coca Cola, o que ocasionou manifestações por uma re às críticas recebidas por Tom Zé por estar participan-
pequena parte do público que, segundo a entrevista de do e promovendo um produto americano, daí a referên-
Tom Zé ao programa Roda Viva, em 06/05/2013, afirma- cia ao Tio Sam. Isso fica claro logo no início da estrofe
va que a Coca-Cola era símbolo do capitalismo e dos Es- onde o chamam de “seu americanizado” e dizem que
tados Unidos, e que intervia na política. Rebatendo as ele “quer bancar Carmem Miranda”. Carmen Miranda foi
críticas com muito bom humor, ironia e deboche, Tom uma grande artista e cantora brasileira que fez um notá-
Zé se manifestou gravando um novo disco chamado “Tri- vel sucesso nos EUA durante as décadas de 30 e 50. Em
bunal do Feicebuqui”, lançado em 22 de abril, também 1940 a cantora gravou uma música intitulada “Disseram
conhecido como segunda edição do Imprensa Cantada. que eu voltei americanizada” para rebater as críticas que
sofria sobre ter perdido a sua “brasilidade”.
Para a realização desse disco o compositor convi-
dou um grupo de músicos paulistas (Emicida, Filarmôni- Vendido, vendido, vendido à preço de banana/
ca de Pasárgada, Tatá Aeroplano, O Terno e Trupe Chá Já não olha mais pro Samba/ Tá estudando propaganda
de Boldo). Uma das músicas gravadas com esse grupo - a referência às críticas da propaganda da Coca-Cola fica
é a que dá o nome ao CD. Tom Zé agradeceu a opinião mais que evidente. Que decepção, o traidor, mudou de
de todos os “feicebuqueiros”, e acrescentou que ouviu lado/ Corrompido, mentiroso, seu sorriso engarrafado/
igualmente tanto quem o criticou como quem o defen- “Sorriso engarrafado” faz uma clara alusão às garrafas
deu. As 5 primeiras faixas do CD diziam respeito apenas de refrigerante. Enquanto esses versos citados são can-
ao grupo dos críticos, os quais diziam que Tom Zé havia tados podemos escutar alguém cantando as seguintes
se vendido. A música “Tribunal do Feicebuqui” ironiza as palavras: Ah, eu não acredito nisso. Olha só! Não é o
críticas que Tom Zé recebeu de forma divertida e leve. Tom Zé que eu conheço não/ Se fosse um Dolly pelo

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menos… A crítica à promoção de um produto estran- da das Valquírias (Wagner), Crab Canon (Bach), Reisado
geiro em vez de um brasileiro ficou claro quando citam do Pastoreio/ Batuque - Dança de Negros (Lorenzo Fer-
Dolly, a empresa brasileira que lançou o primeiro refrige- nandez), O Sal da Terra (Beto Guedes), Eu estou apaixona-
rante diet do Brasil. da por você (na versão de Gina Lobrista), Cabaça D’água
(Alberto Salgado), Flor amorosa (Joaquim Callado) e Mar
Bruxo, descobrimos seu truque/ Defenda-se já de Brasília (Engels Espiritos) ampliam o reconhecimento
no Tribunal do Feicebuqui/ Que que custava morrer de dessas questões. Cabe indagar como o artista participa
fome só pra fazer música? - Sobre esse trecho Tom Zé dessas mudanças sociais e como a sociedade vê a criação
postou o seguinte texto em sua página do Facebook: artística, pensando ações e reações da sociedade. Tom Zé
exemplifica na canção Tribunal do Feicebuqui questiona-
“Nos dias atuais vivemos a era da internet e a venda de disco mentos como esses. (Página 7, quinto parágrafo)
passou a ter um peso insignificante. Já o papel desses lan-
çamentos, em termos de divulgação, é muito eficiente (...) Número, grandeza e forma
com a eficiente colaboração do engenheiro Marcelo Blanck,
começamos a desenvolver alguma tecnologia, mas com re- Em Tribunal do Feicebuqui, há a distribuição de
cursos parcos, insuficientes. (...) Aí entrou o anúncio da Co- seções bem distintas umas das outras, cada uma faz alu-
ca-Cola que, mesmo sem ela saber, patrocinaria boa parte da são a diferentes gêneros musicais populares, por sua ins-
pesquisa. Será que o uso dos recursos obtidos com o anúncio trumentação, organização das vozes e caráter expressivo,
muda a avaliação de vocês? assim como na composição Canon Crab (Bach) verifica-
mos a técnica do cânone, que é uma técnica contrapontis-
Vale lembrar que o cachê recebido por ele (80 ta polifônica, e especificamente nesta obra, um palíndro-
mil reais) seria utilizado para investir em uma pesquisa mo musical, que permite que a obra seja reproduzida em
e gravação de cd com instrumentos experimentais, mas duas linhas melódicas, tocando-se desde o início da pauta
foi destinado à Sociedade Lítero-Musical 25 de dezem- e conjuntamente em sentido inverso, caracterizando uma
bro, banda comunitária de Irará, onde estudava sax e de polifonia. (Página 25, quinto parágrafo)
onde foi expulso por ser “filho de rico”.
Materiais
Tom Zé estende a crítica, de forma irônica é cla-
ro, a outras músicas do seu álbum: “Meu coração funda- No campo da criação musical, os materiais são
mentalista pede socorro aos intelectuais pois a diferença elementos importantes para gerar distintas sonoridades
entre esquerda e direita já foi muito clara, hoje não é e efeitos. A diversidade de timbres provém das variadas
mais. [...] Papa Francisco vem perdoar o tipo de pecado fontes sonoras. Ao longo do tempo, materiais e o seu em-
que acabaram de inventar. [...] Mas se tomo coca-cola prego nas fontes sonoras têm definido diferentes tipos de
acho que estou me vendendo”. criação e interpretação musical, como podemos observar
nas músicas Canon Crab (J.S.Bach), A Cavalgada das Val-
Estrutura quírias (Richard Wagner), Flor Amorosa (Joaquim Callado)
e Tribunal do Feicebuqui (Tom Zé). Na Suíte Reisado de
A música Tribunal do Feicebuqui reúne vários Pastoreio / Batuque / Dança dos Negros (Lorenzo Fernan-
elementos de diferentes ritmos musicais. O som de ini- dez), verifica-se a escolha de instrumentos não convencio-
cialização do Windows abre a música e é seguido por um nais. (Página 31, quinto parágrafo)
rap, coco e rock. Dentre os instrumentos podemos en-
contrar guitarra, baixo, bateria, pandeiro, gaita, alguns Questões, Justificativas e Dicas
instrumentos de metais, entre outros. Quer acessar as questões, justificativas e dicas desta obra?


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Citações da Obra na Matriz de Referências


Anotações e Rascunhos

O ser humano como um ser que pergunta e quer saber

Recentemente, o compositor Tom Zé sentiu-se


censurado pelos fãs, que expressaram, no Facebook, críti-
cas ao artista e, a partir disso, uma obra foi criada com a
ajuda de outros músicos, Tribunal do feicebuqui. (Página
6, segundo parágrafo)

Indivíduo, cultura e mudança social

Ao ampliar esse contexto, estão postas questões


relativas à figura do artista como agente de mudanças so-
ciais e as suas produções culturais. Obras como Cavalga-

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Eu Estou Apaixonada por Você - Gina
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Lobrista

Intérprete
Gina Severina da Silva, conhecida como Gina Eu estou apaixonada por você
Lobrista, nasceu em Recife, Pernambuco. Aos 4 anos de E não posso mais ficar
idade foi morar no Pará com sua família e desde então Distante assim do seu carinho
E sei porque tudo que eu faço penso em você
nunca mais retornou à sua cidade natal. Participou, com
É que eu estou apaixonada
a sua irmã, da banda Geração Eletrizante. Em 2013 deci-
diu seguir carreira solo. Fico esperando um minutinho
Mesmo que seja só pra ganhar um beijinho
Tentando o sucesso, Gina saía às ruas da cidade Rapidamente e depressa dizer
de Belém, no Pará, com um microfone e uma caixa de Que eu estou apaixonada
som para divulgar suas músicas e vender seu cd, que cus- Eu estou apaixonada por você
tava apenas cinco reais. Se tornou muito conhecida nas
redondezas do mercado de ferro Ver-o-Peso e na Praça Para gravar seu primeiro videoclipe, Gina Lobris-
da República. ta escolheu a música “Eu estou apaixonada por você”. O
vídeo da composição de Erasmo Carlos e Roberto Carlos
A artista chamou a atenção de um grupo de uni- foi produzido em 2014 no mercado de ferro Ver-o-peso,
versitários que estavam começando uma produtora local local onde Gina se apresentava e vendia seu cd diaria-
(Platô Produções). O grupo a abordou e propôs gravar mente.
um videoclipe. Gina topou, e em pouco tempo o clipe
“Eu estou apaixonada por você” viralizou na internet, No videoclipe a “índia da Amazônia” ou “índia
permitindo que a cantora se apresentasse em diversos apaixonada”, como gosta de ser chamada, aparece an-
programas de TV, como Legendários e Hora do Faro. dando pelo mercadão, vendendo ervas, cortando man-
Desse último programa citado, recebeu a oportunidade dioca, servindo refeições e cantando na rua. Em entre-
de ter um cd produzido e lançado pelo produtor musical vista ao site UOL, Gina comenta que tudo que fez no
Rick Bonadio. clipe, ela já viveu. O videoclipe já teve mais de 467 mil
visualizações no Youtube.
A inspiração da artista, que se tornou uma gran-
de referência no meio musical paraense, vem de can- A partir desse contexto, o início do clipe mostra
tores bregas, como Reginaldo Rossi, mas seu ídolo é o Gina chegando ao mercado Ver-o-peso e se instalando
cantor Roberto Carlos. Gina se considera uma artista de no local onde sempre canta. A música começa com a
rua: “Eu tenho certeza de que serei muito famosa, mas guitarra e voz. O teclado só entra no refrão e segue até
quero fazer diferente de certos artistas que dizem que o final da música. As viradas da bateria e o solo no meio
são do Pará, mas não pisam mais aqui. Quero continuar da música são todos feitos no teclado. Enquanto isso, a
cantando no mercado. Sou artista de rua”. guitarra passa a fazer pequenas participações, sempre
executando a mesma sequência de cinco notas.
Ficou conhecida como a cantora que levou o rit-
mo acoxadinho para fora do Pará. Para ela a diferença A canção tem três seções: A seção “A” começa
entre o acoxadinho e o arrocha está nos instrumentos, já com “Nessa minha vida agitada”; “B” começa com “Eu
que o acoxadinho tem mais gingada da guitarra paraen- estou apaixonada”; “C” começa com “Fico esperando
se, enquanto no arrocha o teclado aparece mais. um minutinho “. A seção B, apesar de ter duas letras di-
ferentes, é uma só, pois a melodia, ritmo e harmonia da
Obra seção não mudam. Sendo assim, a música tem a seguin-
te sequência de seções: ABBC – instrumental - BC.
Eu estou apaixonada por você

Nessa minha vida agitada


Já não tenho mais tempo pra nada
Já nem posso mais pensar no amor
Mas veja só que mesmo assim

Eu estou apaixonada por você.


E nem mesmo tenho jeito de falar do meu amor
Que é grande sim

Citações da Obra na Matriz de Referências
O ser humano como um ser que pergunta e quer saber

Obras musicais como Crab Canon (Bach), Ca-


valgada das Valquírias (Wagner) e Reisado do pastoreio
Que é tudo enfim / batuque - dança de negros (Lorenzo Fernandez) exem-
Que existe em mim plificam formas expressivas distintas de musicalidades,
Eu estou apaixonada contrastadas com as das músicas Cabaça d’água, (Alberto

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Salgado), Flor amorosa (Joaquim Callado), ou Mar de Bra- A formação do mundo ocidental contemporâneo
sília (Engels Espíritos). Esses contrastes entre as formas
musicais apresentam-se também em músicas populares, Observa-se também no século XIX a construção
como O Sal da Terra (Beto Guedes) e Estou apaixonada das lutas emancipatórias femininas na Europa, nos Esta-
por você, 6 na versão de Gina Lobrista, ou nas de tradi- dos Unidos e na América Latina. Essas temáticas estão
ções populares, como Capoeira e Carimbó. (Página 5, presentes nas músicas Cota Não é Esmola (Bia Ferreira),
quinto parágrafo) Maria da Vila Matilde (Elza Soares), Inclassificáveis (Ney
Matogrosso) e Eu estou apaixonada por você (Gina Lo-
Indivíduo, cultura e mudança social brista), obras contemporâneas que estimulam reflexões
acerca das rupturas ou permanências relativas à socieda-
Ao ampliar esse contexto, estão postas questões de brasileira e aos movimentos sociais surgidos no século
relativas à figura do artista como agente de mudanças so- XIX. Essas reflexões são evidenciadas nas obras audiovi-
ciais e as suas produções culturais. Obras como Cavalgada suais Precisamos romper com os silêncios (Djamila Ribei-
das Valquírias (Wagner), Crab Canon (Bach), Reisado do ro - TEDxSaoPauloSalon 2016) e Povos indígenas do Brasil
Pastoreio/ Batuque - Dança de Negros (Lorenzo Fernan- (Cristian Wariu, 2018). (Página 21, sexto parágrafo)
dez), O Sal da Terra (Beto Guedes), Eu estou apaixona-
da por você (na versão de Gina Lobrista), Cabaça D’água
(Alberto Salgado), Flor amorosa (Joaquim Callado) e Mar Questões, Justificativas e Dicas
de Brasília (Engels Espiritos) ampliam o reconhecimento Quer acessar as questões, justificativas e dicas desta obra?
dessas questões. Cabe indagar como o artista participa
dessas mudanças sociais e como a sociedade vê a criação Clique aqui ou use o QR CODE da página 6.
artística, pensando ações e reações da sociedade. Tom Zé
exemplifica na canção Tribunal do Feicebuqui questiona- Anotações e Rascunhos
mentos como esses. (Página 7, quinto parágrafo)

Tipos e gêneros

As músicas Cota Não é esmola (Bia Ferreira),


Estou apaixonada por você, na versão de Gina Lobrista
e Maria da Vila Matilde (Elza Soares) permitem discutir
questões de sexualidade, amor, racismo e protagonismo
feminino utilizando-se de gêneros musicais diferenciados
e historicamente adaptados, como o RAP e a música bra-
sileira. Bia Ferreira utiliza-se do violão para cantar sua
música que tem características do RAP americano, Gina
Lobrista interpreta na rua sua música e Elza Soares faz uso
de instrumentos elétricos e de sopro em sua canção. (Pá-
gina 10, segundo parágrafo)

Energia e oscilações

Com o desenvolvimento da luz elétrica, ocorreu


uma mudança na iluminação, enquanto técnica de supor-
te cênico. A luz passa a ser não um mero artifício para que
a plateia veja o espetáculo, mas passa a ter um significa-
do artístico. Havia, então, a possibilidade de controlar a
fonte da luz, sua intensidade, cor, ângulo de incidência e
até mesmo o recurso do blecaute. Nesse contexto, a obra
de Henrik Ibsen, Um inimigo do povo, encontra a possibi-
lidade de reprodução fiel da realidade, por meio não só
da iluminação, mas também das demais técnicas de su-
porte cênico, como cenografia, figurino e maquiagem. O
videoclipe da canção Eu estou apaixonada por você (Gina
Lobrista) utiliza os mesmos suportes cênicos que Ibsen,
porém enquanto o dramaturgo trabalha de uma maneira
realista, a artista utiliza os elementos em um caráter este-
reotipado. (Página 15, sexto parágrafo)

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Maria da Vila Matilde - Elza Soares

Intérprete
Elza Soares nasceu no Rio de Janeiro em 1937. E quando o samango chegar
Gostava de cantar desde criança. Aos 12 anos foi obriga- Eu mostro o roxo no meu braço
da pelo pai a se casar com Lourdes Antônio Soares. Teve Entrego teu baralho
Teu bloco de pule
seu primeiro filho aos 13 anos de idade. A artista sonha-
Teu dado chumbado
va em um dia se tornar cantora e, escondida do marido, Ponho água no bule
fez seu primeiro teste em 1953, no programa “Calouros Passo e ainda ofereço um cafezim
em Desfile” da Rádio Tupi, conquistando o primeiro lu- Cê vai se arrepender de levantar a mão pra mim
gar.
E quando tua mãe ligar
Aos 21 anos de idade já tinha velado dois filhos, Eu capricho no esculacho
que morreram em decorrência da fome, e o seu primeiro Digo que é mimado
marido. Viúva com 5 filhos para cuidar, Elza trabalhou Que é cheio de dengo
como faxineira, empacotadora e conferente em uma fá- Mal acostumado
Tem nada no quengo
brica de sabão. Apesar das dificuldades, nunca abando- Deita, vira e dorme rapidinho
nou o sonho de ser tornar artista. Você vai se arrepender de levantar a mão pra mim
Em 1958 viajou para a Argentina com a Com- Cê vai se arrepender de levantar a mão pra mim
panhia de Dança de Mercedes Baptista. Ao retornar ao Cê vai se arrepender de levantar a mão pra mim
Brasil, foi contratada para trabalhar na Rádio Vera Cruz. Cê vai se arrepender de levantar a mão pra mim
Começou a cantar no Texas Bar, em Copacabana, e logo Cê vai se arrepender de levantar a mão pra mim
teve a oportunidade de gravar na rádio Odeon.
Mão, cheia de dedo
Nos anos 60, Elza fez sucesso ao lançar as mú- Dedo, cheio de unha suja
E pra cima de mim? Pra cima de moi? Jamé, mané!
sicas “Se acaso você chegasse”, “Boato” e “Edmundo”.
Casou-se com Garrincha, famoso jogador de futebol, em Cê vai se arrepender de levantar a mão pra mim
1962. Seu primeiro livro “Minha vida com Mané” foi pu-
blicado em 1969. A canção “Maria da Vila Matilde (Porque se a da
Penha é brava, imagine a da Vila Matilde)” foi lançada
Em 1997 teve sua biografia publicada pelo escri- em 3 de outubro de 2015 e faz parte do álbum “A mulher
tor José Louzeiro, e em 2000, a emissora BBC lhe deu o do fim do mundo”, que é inteiramente voltado à temá-
título de “A melhor cantora do milênio”. Gravou mais de tica da violência contra a mulher. Além disso, esse foi o
34 álbuns e recebeu inúmeros títulos por seu trabalho. primeiro álbum da cantora somente com músicas inédi-
Em 2018, sua biografia “oficial e definitiva” foi publicada tas. Conta a história de uma mulher que toma consciên-
pelo jornalista Zeca Camargo. cia da violência que sofria e decide denunciar o agressor.
Em 2016 recebeu o Prêmio Multishow de Música Brasi-
Obra leira na categoria Canção do Ano. A canção rapidamente
se tornou um hino do movimento feminista e carrega um
Maria da Vila Matilde
pouco do que Elza viveu em seu segundo casamento.
Cadê meu celular?
Eu vou ligar pro 180 No início dos anos 60, Elza teve um relaciona-
Vou entregar teu nome mento com o famoso jogador de futebol Mané Garrin-
E explicar meu endereço cha, que ainda estava casado. Na época a cantora chegou
Aqui você não entra mais a ser ameaçada de morte e foi hostilizada por amigos do
Eu digo que não te conheço parceiro. Elza e Garrincha se casaram em 1962, e a união
E jogo água fervendo durou 15 anos.
Se você se aventurar
Durante muito tempo a cantora foi rotulada
Eu solto o cachorro
E, apontando pra você
como “a amante” e bastante criticada. Ao se afastar dos
Eu grito: péguix guix guix guix gramados, Garrincha se tornou alcoólatra e violento com
Eu quero ver Elza, que apanhou por diversas vezes e até teve os den-
Você pular, você correr tes quebrados em uma dessas ocasiões. Essa foi uma das
Na frente dos vizim razões do término do relacionamento. Apesar de tudo,
Cê vai se arrepender de levantar a mão pra mim a artista sofreu calada, já que seu parceiro era muito co-
nhecido no mundo esportivo.

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Mediante essa música, Elza expõe a realidade sistema judiciário. Esses agressores são, na maioria dos
sobre a violência masculina contra a mulher e convoca casos, parentes, ex-parceiros ou parceiros das vítimas.
as vítimas para denunciarem seus agressores. Maria da
Vila Matilde apresenta uma mulher destemida, como é Estrutura
possível observar nos trechos: “Cadê meu celular?/ Eu
vou ligar pro 180/ Vou entregar teu nome/ E explicar Com letra de Douglas Germano, a música é, se-
meu endereço/ Aqui você não entra mais/ Eu digo que gundo Kastrup, na sua essência “um samba-de-breque
não te conheço/ E jogo água fervendo/ Se você se aven- à la Kid Morengueira, com arranjo distorcido da banda,
turar/ Cê vai se arrepender de levantar a mão pra mim”. que dialoga com a tradição do samba e do rock”. Esse
Nesses trechos a personagem da canção deixa claro que samba com mistura de música eletrônica e de tom for-
tomará as devidas providências para que o agressor seja temente irônico e contestador, contou na sua gravação
punido e ressalta que, se for necessário, vai se defender com Kiko Dinucci na guitarra, Rodrigo Campos na gui-
de todas as formas que puder. tarra, Marcelo Cabral no baixo, Guilherme Kastrup na
bateria, Felipe Roseno nas percussões e Edy Trombone
Lyra (2017) aponta outro fato que chama a aten- no trombone. Chama atenção o solo que Elza faz com
ção na letra da música, que é a ênfase que o composi- o trombone, como quem imita o instrumento de sopro.
tor deu ao número à Central de Atendimento à Mulher
(180), conscientizando o ouvinte de como recorrer em
casos de violência doméstica.

O compositor da música, Douglas Germanos,


disse, em entrevista à Revista Rolling Stone Brasil: “Sou
filho de uma Maria. Eu vi essa Maria, minha mãe, apa-
nhar em casa. Era garoto e podia fazer muito pouco além
de sentir medo de meu pai e dó de minha mãe. No dia

Citações da Obra na Matriz de Referências
O ser humano como um ser que pergunta e quer saber

Esse exercício da crítica pode ser enriquecido a


partir do contato com obras como a canção Cota não é
seguinte, não se falava nada. Minha mãe soluçava pela
casa com hematomas e meu pai saía para trabalhar. esmola (Bia Ferreira) ou Inclassificáveis (Arnaldo Antunes,
interpretada por Ney Matogrosso), e Maria da Vila Ma-
Aquilo era como se fosse um segredo nosso. Segredo de
tilde (Elza Soares) ao trazerem, em suas letras, problema-
família. Achava ruim”. tizações acerca de determinadas maneiras contemporâ-
neas de viver e conviver, modos que não se orientam para
Lei Maria da Penha o 4 reconhecimento da riqueza étnica do Brasil, nem dos
direitos de populações marginalizadas historicamente.
Com o objetivo de coibir qualquer tipo de vio- (Página 3, sexto parágrafo)
lência doméstica contra a mulher, foi criada a Lei Maria
da Penha. A lei nº 11.340, que entrou em vigor no dia 22 Indivíduo, cultura e mudança social
de setembro de 2006, alterou o código penal brasileiro,
permitindo que, caso tenham cometido qualquer ato de A participação da mulher na política ou na vida
violência doméstica estabelecido em lei, os agressores social de forma pública, pode ser percebida em obras
sejam presos em flagrante ou tenham a prisão preven- como O rapto de Prosérpina (Bernini), Maria Antonieta
tiva decretada. Essa medida possibilitou que os agres- com rosa (Le Brun), Jane Avril (Lautrec), Moema (Victor
sores não fossem mais punidos com penas alternativas, Meirelles), Úrsula (Maria Firmina dos Reis), Precisamos
como pagamento de cestas básicas, além de aumentar romper com os silêncios - TEDxSaoPauloSalon (Djamila
Ribeiro), Cota não é Esmola (Bia Ferreira) e Maria da Vila
o tempo máximo de detenção de um para três anos, es-
Matilde (Elza Soares) que trata da necessidade da desna-
tabelecendo ainda que o agressor saia do domicílio da turalização da violência, permitindo um diálogo sobre a
vítima e a proibição de sua proximidade com a mulher Lei Maria da Penha. (Página 8, quinto parágrafo)
agredida e os filhos.
Tipos e gêneros
O nome da lei é uma homenagem a Maria da
Penha Maia, que durante seis anos foi agredida pelo ma- As músicas Cota Não é esmola (Bia Ferreira),
rido até que em 1983 foi atingida por ele com uma arma Estou apaixonada por você, na versão de Gina Lobrista
de fogo e ficou paraplégica. Após o ocorrido, o marido de e Maria da Vila Matilde (Elza Soares) permitem discutir
Maria ainda tentou matá-la afogada e eletrocutada, sen- questões de sexualidade, amor, racismo e protagonismo
do punido somente após 19 anos de julgamento, ficando feminino utilizando-se de gêneros musicais diferenciados
apenas dois anos em regime fechado. e historicamente adaptados, como o RAP e a música bra-
sileira. Bia Ferreira utiliza-se do violão para cantar sua
Muitas mulheres ainda sofrem violência domés- música que tem características do RAP americano, Gina
tica, e apesar de poderem denunciar, muitas preferem Lobrista interpreta na rua sua música e Elza Soares faz uso
não o fazer, seja por acreditar que o agressor um dia de instrumentos elétricos e de sopro em sua canção. (Pá-
poderá mudar, por medo de retaliações e repressões gina 10, segundo parágrafo)
sociais ou ainda por não acreditarem na efetividade do

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A formação do mundo ocidental contemporâneo

Observa-se também no século XIX a construção


das lutas emancipatórias femininas na Europa, nos Esta-
dos Unidos e na América Latina. Essas temáticas estão
presentes nas músicas Cota Não é Esmola (Bia Ferreira),
Maria da Vila Matilde (Elza Soares), Inclassificáveis (Ney
Matogrosso) e Eu estou apaixonada por você (Gina Lo-
brista), obras contemporâneas que estimulam reflexões
acerca das rupturas ou permanências relativas à socieda-
de brasileira e aos movimentos sociais surgidos no século
XIX. Essas reflexões são evidenciadas nas obras audiovi-
suais Precisamos romper com os silêncios (Djamila Ribei-
ro - TEDxSaoPauloSalon 2016) e Povos indígenas do Brasil
(Cristian Wariu, 2018). (Página 21, sexto parágrafo)

Espaços

Os espaços de convivência e coletividade se for-


mam por questões sociais e econômicas, além das ques-
tões geográficas. A escultura O rapto de Prosérpina (Ber-
nini) ilustra tais aspectos e remete aos mitos gregos como
referência de organização dessas relações. As músicas
Maria da Vila Matilde (Elza Soares) e Cota não é esmola
(Bia Ferreira) permitem problematizar os espaços defini-
dos para cada grupo social, além de definir um espaço
que pode ser confrontado pelo protagonismo feminino.
Essas percepções estão presentes, também nas pinturas
Maria Antonieta com rosa (Le Brun) e Moema (Victor Mei-
relles), na litogravura Jane Avril (Toulouse-Lautrec) e na
análise da Lei Maria da Penha, artigos 1º a 12-B – Lei nº
11.340/2006. (Pàgina 27, quarto parágrafo)

Questões, Justificativas e Dicas


Quer acessar as questões, justificativas e dicas desta obra?

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Anotações e Rascunhos

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Cabaça d’Água - Alberto Salgado

Autor
O compositor, cantor, arranjador, professor e Recebeu o 28º Prêmio de Música Brasileira
multi-instrumentista Alberto Salgado nasceu em Brasília. como melhor álbum na categoria Música Regional. A
Seu primeiro contato com a música veio da capoeira, que canção que dá nome ao disco foi composta em parceria
acabou se tornando uma de suas influências. Tem for- com Werner Scheller, e chama atenção para a conser-
mação em violão clássico, instrumento que utilizou para vação e uso consciente da água, que se torna cada vez
compor suas primeiras músicas. Autodidata, começou a mais escassa.
estudar violão sozinho. Tempos depois, estudou violão
erudito com o professor Maurízio Martins. O título da canção faz referência ao fruto de cas-
ca dura denominado “Cabaça” ou ainda “Porango”, que
Participou de festivais estudantis e obteve boas pode ser utilizado para servir de recipiente para armaze-
colocações. Em entrevista ao Entrecultura, Alberto Sal- nar água ou para fazer instrumentos musicais.
gado disse que os resultados positivos nesses festivais
reforçaram a crença dele no seu dom de compor. Passou A música começa ao som do berimbau e em se-
a participar de festivais profissionais e em 1999 começou guida é acompanhada pela bateria. O baixo elétrico e a
a carreira artística. Suas músicas têm influências da sua voz entram juntos. Salgado canta as seções A e B, até que
formação erudita, sua vivência em rodas de capoeira, entra o cavaco de 5 cordas e ao fundo surge o áudio do
bossa-nova, músicas tradicionais africanas, samba, afro- que parece ser o trecho de uma reportagem. A mulher
-samba, entre outros. declama: “Um relatório feito pelo Ibama calcula que vão
ser necessários pelo menos 10 anos para reparar a bacia
Seu primeiro álbum, “Além do Quintal”, foi gra- do rio doce que sofreu fortes danos causados pelo rom-
vado em 2014 e em seis meses todas as unidades já ha- pimento de uma barragem em Mariana, Minas Gerais. A
viam sido vendidas. Em 2017, com o patrocínio do Fundo tragédia foi a quase um mês, e nesse período a lama com
de Apoio à Cultura da Secretaria de Cultura do Governo rejeitos de minério percorreu mais de 660 quilômetros
de Brasília, lança o segundo álbum, chamado “Cabaça pelo rio1”.
d’Água”. Esse disco recebeu elogios da crítica e de artis-
tas importantes da MPB, como Chico Buarque. Salgado volta a cantar a seção A, seguindo a se-
quência B, A’ e B’. Para exemplificar a variação na letra da
Obra canção foi utilizado o símbolo (‘). O cavaco de 5 cordas
faz outro solo, e Salgado novamente retoma à sequência
Cabaça d’água A, B, A’, B’. Após isso, Salgado canta “Água de março do
Rio de Janeiro/ Verão em fevereiro”. Em “Se não restas-
Se agora no mundo acabasse água de beber
E no fundo de um copo restasse sede de viver se nenhuma cabaça d’água/ Se não restasse nenhuma
cabaça”, o vocal canta simultaneamente a seção B, con-
Que que cê ia fazer, camarada? trapondo ao que Salgado está cantando.
Que que cê ia fazer?
Além de reafirmar a necessidade do uso cons-
A vaidade do homem consome ciente da água, a canção chama a atenção também para
Sede de viver
Tanto pingo que pinga que some a tragédia de Mariana, que ocorreu em novembro de
Água de beber 2015, quando uma das barragens da mineradora Sa-
marco se rompeu, provocando uma enxurrada de lama.
Água de março do Rio de Janeiro Muitas pessoas morreram, outras tiveram suas casas
Verão em fevereiro destruídas. A lama avançou pelo Rio Doce, atingindo os
Se não restasse nenhuma cabaça d’água ambientes aquáticos e destruindo os organismos que
Se não restasse nenhuma cabaça estavam ali, como peixes e algas, além de afetar os mo-
(Que que cê ia fazer camarada?) radores que se beneficiavam da pesca. A lama atingiu o
(Que que cê ia fazer?) mar na região do Espírito Santo e em 2019 um estudo
realizado por pesquisadores da UERJ detectou que o de-
A canção Cabaça d’água pertence ao álbum que sastre também atingiu corais de abrolhos na Bahia.
leva o mesmo nome. O álbum gravado em 2017 conta
com dez canções, sendo algumas de autoria somente do
cantor, e outras realizadas em parcerias. Entre as can-
ções do disco, Salgado apresenta diversos ritmos brasi-
leiros. 1 Transcrição da fala da canção Cabaça d’água: 00:01:25 a
00:01:48 .

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Materiais


Citações da Obra na Matriz de Referências
O ser humano como um ser que pergunta e quer saber

Obras musicais como Crab Canon (Bach), Caval-


gada das Valquírias (Wagner) e Reisado do pastoreio /
A discussão sobre matéria e suas transformações,
como a sua destruição e modificação no meio ambiente,
pode ser enriquecida a partir de músicas como O Sal da
Terra (Beto Guedes) e Cabaça D’água (Alberto Salgado),
nas quais 32 possível verificar distintos usos dos materiais
naturais disponíveis, tais como o berimbau, acompanha-
do por instrumento eletrônico. (Página 31, sétimo pará-
batuque - dança de negros (Lorenzo Fernandez) exempli- grafo)
ficam formas expressivas distintas de musicalidades, con-
trastadas com as das músicas Cabaça d’água, (Alberto Questões, Justificativas e Dicas
Salgado), Flor amorosa (Joaquim Callado), ou Mar de Bra-
sília (Engels Espíritos). Esses contrastes entre as formas Quer acessar as questões, justificativas e dicas desta obra?
musicais apresentam-se também em músicas populares,
como O Sal da Terra (Beto Guedes) e Estou apaixonada Clique aqui ou use o QR CODE da página 6.
por você, 6 na versão de Gina Lobrista, ou nas de tradições
populares, como Capoeira e Carimbó. (Página 5, quinto Anotações e Rascunhos
parágrafo)

Indivíduo, cultura e mudança social

Ao ampliar esse contexto, estão postas questões


relativas à figura do artista como agente de mudanças so-
ciais e as suas produções culturais. Obras como Cavalga-
da das Valquírias (Wagner), Crab Canon (Bach), Reisado
do Pastoreio/ Batuque - Dança de Negros (Lorenzo Fer-
nandez), O Sal da Terra (Beto Guedes), Eu estou apaixona-
da por você (na versão de Gina Lobrista), Cabaça D’água
(Alberto Salgado), Flor amorosa (Joaquim Callado) e Mar
de Brasília (Engels Espiritos) ampliam o reconhecimento
dessas questões. Cabe indagar como o artista participa
dessas mudanças sociais e como a sociedade vê a criação
artística, pensando ações e reações da sociedade. Tom Zé
exemplifica na canção Tribunal do Feicebuqui questiona-
mentos como esses. (Página 7, quinto parágrafo)

Ambiente e vida

Preservar o meio ambiente significa garantir a


continuidade também da espécie humana e sua diversi-
dade étnica e cultural. A música Cabaça d’água - faixa 5
do disco homônimo (Alberto Salgado) faz referência a de-
vastação da natureza e seus impactos no acesso a água. A
poluição dos cursos d’água afeta comunidades indígenas
que muitas vezes dependem diretamente de recursos pes-
queiros. Essa poluição e mudança nas margens dos rios
também são responsáveis pelo assoreamento e pode pro-
vocar a falta de água. (Página 17, terceiro parágrafo)

A formação do mundo ocidental contemporâneo

África, Ásia e América Latina foram submetidas


e expostas a situações dramáticas, relacionadas à expan-
são dos modelos capitalistas industriais europeus e norte
americano em sua fase imperialista. Reflexões acerca des-
sa temática estão presentes em: O Sal da Terra (Beto Gue-
des), Cabaça d’água (Alberto Salgado), O rompimento da
barragem de Mariana e seus impactos socioambientais
(Luciano M. N. Lope), Um Inimigo do Povo (Henrik Ibsen)
e Conservar a Amazônia, uma questão ambiental, social
e econômica (Agência FAPESP), ao criticarem os impactos
sociais e ambientais relacionados ao Imperialismo. (Pági-
na 23, primeiro parágrafo)

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Cota Não é Esmola - Bia Ferreira

Autora
Bia Ferreira nasceu no interior de Minas Gerais. A performance de “Cota não é esmola” que vi-
De família evangélica, Bia sempre conviveu com a músi- ralizou aconteceu no projeto Sofar Curitiba, em 19 de
ca, já que sua mãe era cantora, regente de coral e pia- novembro de 2017. Em pouco tempo, o vídeo já tinha
nista. Mudou-se com sua família para Aracaju, Sergipe. atingido mais de 5 milhões de visualizações. A narrati-
va da história contada por Bia impressiona, e o uso das
Aos 3 anos começou a estudar piano, e aos 15 anos de dinâmicas e expressões mostram o tamanho da entrega
idade percebeu que a música poderia virar sua profissão. da artista.
Entrou no Conservatório Brasileiro de Música.
Sobre a viralização de seu single em pouco tem-
Multi-instrumentista, Bia toca, além do piano, po, Bia disse ter sido assustador. Segundo ela: “De re-
mais de 25 instrumentos, como violão, baixo, guitar- pente, todo mundo ouvia uma música que eu fiz e pos-
ra, cavaquinho, instrumentos de sopro e de percussão. tei, assim sem muito alarde”. A artista acrescentou ainda
Além disso, é cantora de jazz, blues e soul. que foi muito gratificante ver pessoas se identificando
com sua música, mas que a velocidade com que as coisas
Bia começou a compor aos 10 anos, mas se apro- aconteceram a assustou.
ximou ainda mais do universo da composição ao entrar Cota não é esmola
na faculdade, em 2009. Em 2011 compôs as músicas
“Cota não é esmola” e “Não precisa ser Amélia”. Em Existe muita coisa que não te disseram na escola
suas letras, Bia abordava temas como o corpo negro na Cota não é esmola!
Experimenta nascer preto na favela pra você ver!
sociedade, questões de gênero e raça. O que rola com preto e pobre não aparece na TV
Começou a tocar em festas da faculdade e na Opressão, humilhação, preconceito
A gente sabe como termina, quando começa desse jeito
rua. Viajou pelo Brasil fazendo um projeto de música e Desde pequena fazendo o corre pra ajudar os pais
mais tarde trabalhou em bares e casas de shows can- Cuida de criança, limpa casa, outras coisas mais
tando cover. Bia afirma, em entrevista ao site Epílogo, Deu meio dia, toma banho vai pra escola a pé
que até então não tinha coragem de cantar as próprias Não tem dinheiro pro busão
músicas. Foi em Aracaju que a cantora decidiu mostrar Sua mãe usou mais cedo pra poder comprar o pão
suas composições, e o resultado foi positivo, pois segun- E já que tá cansada quer carona no busão
do ela: “foi uma descoberta massa de saber que a galera Mas como é preta e pobre, o motorista grita: não!
E essa é só a primeira porta que se fecha
gostava do meu som”1. Não tem busão, já tá cansada, mas se apressa
Chega na escola, outro portão se fecha
Bia Ferreira define sua música como MMP: Mú-
Você demorou, não vai entrar na aula de história
sica da Mulher Preta. Por intermédio das suas músicas, Espera, senta aí, já já dá 1 hora
a cantora e compositora busca conscientizar os ouvintes Espera mais um pouco e entra na segunda aula
sobre as demandas de luta do movimento antirracista no E vê se não atrasa de novo! A diretora fala
Brasil. Atualmente, Bia já fez várias parcerias com gran-
des influências do rap feminino nacional e chegou a divi- Chega na sala, agora o sono vai batendo
E ela não vai dormir, devagarinho vai aprendendo que
dir palco com o Rapper Criolo. Lançou vários singles des- Se a passagem é 3,80 e você tem 3 na mão
de a música “Cota não é esmola”. Foi indicada ao prêmio Ela interrompe a professora e diz, ‘então não vai ter pão’
de revelação no Women Music Award 2018. E os amigos que riem dela todo dia
Riem mais e a humilham mais, o que você faria?
Obra Ela cansou da humilhação e não quer mais escola
E no natal ela chorou, porque não ganhou uma bola
Segundo o Estadão, no dia em que Bia compôs O tempo foi passando e ela foi crescendo
Agora la na rua ela é a preta do suvaco fedorento
a obra “Cota não é esmola”, estava em um almoço com
Que alisa o cabelo pra se sentir aceita
os seus pais na casa de uma família de alemães. Naquele Mas não adianta nada, todo mundo a rejeita
dia, Bia escutou o seguinte comentário: “Eu só não en-
trei em uma faculdade no Brasil quando cheguei da Ale- Agora ela cresceu, quer muito estudar
manha porque algum negro cotista pegou a minha vaga”. Termina a escola, a apostila, ainda tem vestibular
Segundo a reportagem, Bia se levantou indignada, saiu E a boca seca, seca, nem um cuspe
Vai pagar a faculdade, porque preto e pobre não vai pra USP
da mesa e se trancou no quarto até a hora de ir embo- Foi o que disse a professora que ensinava lá na escola
ra. Foi naquele momento que começou a escrever vários Que todos são iguais e que cota é esmola
versos raivosos que mais tarde se tornariam a letra da Cansada de esmolas e sem o dim da faculdade
canção. Ela ainda acorda cedo e limpa três apê no centro da cidade
Experimenta nascer preto, pobre na comunidade
Cê vai ver como são diferentes as oportunidades

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E nem venha me dizer que isso é vitimismo As cotas são uma medida de ação contra a de-
Não bota a culpa em mim pra encobrir o seu racismo! sigualdade. O sistema de cotas foi criado inicialmente
E nem venha me dizer que isso é vitimismo nos Estados Unidos, no ano de 1960, com o objetivo de
São nações escravizadas amenizar as desigualdades sociais e econômicas entre
E culturas assassinadas negros e brancos.
É a voz que ecoa do tambor
Chega junto, venha cá Em 2000 o sistema se tornou conhecido no Bra-
Você também pode lutar, ei! sil, sendo inicialmente adotado pela Universidade do
E aprender a respeitar Estado do Rio de Janeiro (UERJ) que, por meio de uma
Porque o povo preto veio para revolucionar lei estadual, estabeleceu que 50% das vagas do processo
Não deixe calar a nossa voz não! seletivo deveriam ser destinadas para a escola pública.
Não deixe calar a nossa voz não! Em 2004 a Universidade de Brasília implantou o sistema
Não deixe calar a nossa voz não! de cotas raciais. Desde então as demais universidades
Revolução aderiram às cotas, destinando vagas não somente para
negros, mas para indígenas, pardos, quilombolas, estu-
Nascem milhares dos nossos cada vez que um nosso cai
Nascem milhares dos nossos cada vez que um nosso cai, ei dantes de baixa renda oriundos de escolas públicas e
Nascem milhares dos nossos cada vez que um nosso cai alunos com deficiência.
Nascem milhares dos nossos cada vez que um nosso cai
E é peito aberto, espadachim do gueto, nigga samurai! Em agosto de 2012 foi aprovada a lei nº 12.711,
também conhecida como “Lei de cotas”. Essa lei propôs
É peito aberto, espadachim do gueto, nigga que as instituições de ensino superior federais teriam
É peito aberto, espadachim do gueto, nigga até agosto de 2016 para destinar metade das vagas dos
É peito aberto, espadachim do gueto, nigga processos seletivos para estudantes das escolas públi-
É peito aberto, espadachim do gueto, nigga samurai!
cas, levando também em consideração critérios raciais
Vamo pro canto onde o relógio para e sociais.
E no silêncio o coração dispara
Vamos reinar igual Zumbi, Dandara Há quem explica as cotas raciais com o conceito
Odara, Odara da equidade aristotélica. Segundo Aristóteles, é neces-
sário tratar desigualmente os desiguais para promover
Vamo pro canto onde o relógio para
No silêncio o coração dispara
a efetiva igualdade. Ou seja, se duas pessoas que vivem
Odara, Odara, ei! em condições desiguais concorrerem nas mesmas condi-
ções, certamente haverá desigualdade. Seguindo a ideia,
Experimenta nascer preto e pobre na comunidade o correto a se fazer seria igualar as oportunidades para
Você vai ver como são diferentes as oportunidades ambos.
E nem venha me dizer que isso é vitimismo
Não bota a culpa em mim pra encobrir o seu ra-cis-mo!
Existe muita coisa que não te disseram na escola!
Cota não é esmola! (3x)
Eu disse:Cota não é esmola!
Cota não é esmola! (3x)
São nações escravizadas
E culturas assassinadas
É a voz que ecoa do tambor!

Citações da Obra na Matriz de Referências
O ser humano como um ser que pergunta e quer saber

Esse exercício da crítica pode ser enriquecido a


partir do contato com obras como a canção Cota não é
Chega junto, venha cá esmola (Bia Ferreira) ou Inclassificáveis (Arnaldo Antunes,
Você também pode lutar interpretada por Ney Matogrosso), e Maria da Vila Matil-
E aprender a respeitar de (Elza Soares) ao trazerem, em suas letras, problema-
Porque o povo preto veio revolucionar tizações acerca de determinadas maneiras contemporâ-
Cota não é esmola! neas de viver e conviver, modos que não se orientam para
o 4 reconhecimento da riqueza étnica do Brasil, nem dos
A execução da obra se dá por voz e violão, e direitos de populações marginalizadas historicamente.
grande parte da letra é declamada. Em uma conversa (Página 3, sexto parágrafo)
com o jornal PÚBLICO, Bia fala que a música “Cota não é
esmola” é uma explicação didática para as pessoas bran- Indivíduo, cultura e mudança social
cas que são contra as cotas, e é uma música em que as A participação da mulher na política ou na vida
pessoas pobres, pretas e indígenas podem ver sua his- social de forma pública, pode ser percebida em obras
tória sendo contada. A artista conta que ao final da sua como O rapto de Prosérpina (Bernini), Maria Antonieta
apresentação via muitos ouvintes chorando. Ela então com rosa (Le Brun), Jane Avril (Lautrec), Moema (Victor
dizia: “[...] pessoal, obrigado pelas lágrimas, mas mudem Meirelles), Úrsula (Maria Firmina dos Reis), Precisamos
seus pensamentos para que eu não precise mais cantar romper com os silêncios - TEDxSaoPauloSalon (Djamila
essas coisas, por favor”. Ribeiro), Cota não é Esmola (Bia Ferreira) e Maria da Vila
Matilde (Elza Soares) que trata da necessidade da desna-

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turalização da violência, permitindo um diálogo sobre a Anotações e Rascunhos


Lei Maria da Penha. (Página 8, quinto parágrafo)

Tipos e gêneros

As músicas Cota Não é esmola (Bia Ferreira),


Estou apaixonada por você, na versão de Gina Lobrista
e Maria da Vila Matilde (Elza Soares) permitem discutir
questões de sexualidade, amor, racismo e protagonismo
feminino utilizando-se de gêneros musicais diferenciados
e historicamente adaptados, como o RAP e a música bra-
sileira. Bia Ferreira utiliza-se do violão para cantar sua
música que tem características do RAP americano, Gina
Lobrista interpreta na rua sua música e Elza Soares faz uso
de instrumentos elétricos e de sopro em sua canção. (Pá-
gina 10, segundo parágrafo)

A formação do mundo ocidental contemporâneo

Observa-se também no século XIX a construção


das lutas emancipatórias femininas na Europa, nos Esta-
dos Unidos e na América Latina. Essas temáticas estão
presentes nas músicas Cota Não é Esmola (Bia Ferreira),
Maria da Vila Matilde (Elza Soares), Inclassificáveis (Ney
Matogrosso) e Eu estou apaixonada por você (Gina Lo-
brista), obras contemporâneas que estimulam reflexões
acerca das rupturas ou permanências relativas à socieda-
de brasileira e aos movimentos sociais surgidos no século
XIX. Essas reflexões são evidenciadas nas obras audiovi-
suais Precisamos romper com os silêncios (Djamila Ribei-
ro - TEDxSaoPauloSalon 2016) e Povos indígenas do Brasil
(Cristian Wariu, 2018). (Página 21, sexto parágrafo)

Espaços

Os espaços de convivência e coletividade se for-


mam por questões sociais e econômicas, além das ques-
tões geográficas. A escultura O rapto de Prosérpina (Ber-
nini) ilustra tais aspectos e remete aos mitos gregos como
referência de organização dessas relações. As músicas
Maria da Vila Matilde (Elza Soares) e Cota não é esmola
(Bia Ferreira) permitem problematizar os espaços defini-
dos para cada grupo social, além de definir um espaço
que pode ser confrontado pelo protagonismo feminino.
Essas percepções estão presentes, também nas pinturas
Maria Antonieta com rosa (Le Brun) e Moema (Victor Mei-
relles), na litogravura Jane Avril (Toulouse-Lautrec) e na
análise da Lei Maria da Penha, artigos 1º a 12-B – Lei nº
11.340/2006. (Página 27, quarto parágrafo)

Questões, Justificativas e Dicas


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Artes
Visuais
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“A sorte favorece a mente
preparada ”.
(Louis Pasteur)

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Gráficos e Estatísticas
OBRAS COBRADAS NA PROVA DESDE
2019
O Rapto de
A Redenção de Proserpina
Cam
Série Desastres
de Guerra

Noite Estrelada

Igreja São
Impressão Francisco de
Nascer do Sol Assis

OBRAS COBRADAS NA PROVA DESDE


2019

9
6 7
3 4
1

Tudo Sobre o PAS UnB

49
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Controle de Desempenho
Total Porcentagem
Itens Itens Escore
Obra de de itens
itens certos errados
certos
bruto
O Rapto de Proserpina
Anartia Olivacea
Maria Antonieta com Rosa
O Juramento dos Horácios
Série Desastres de Guerra
Igreja São Francisco de Assis
Roda de Capoeira
Moema
Impressão Nascer do Sol
Independência ou Morte
Noite Estrelada
Jane Avril
A Redenção de Cam
Atrás da Estação de Saint Lazare

Tudo Sobre o PAS UnB

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O Rapto de Proserpina - Gian
Lorenzo

Autor
Gian Lorenzo Bernini nasceu em 1598, em Ná- do do rei Luís XIV, e foi solicitado a ele que desenhasse a
poles, Itália. É considerado o nome mais expressivo do fachada leste do Louvre. Seu projeto acabou sendo rejei-
barroco italiano. Seu pai, Pietro Bernini, um talentoso tado. Bernini morreu em 1680, tendo servido oito papas.
escultor de Florença, foi quem iniciou Bernini na vida
artística. Mudou-se com sua família para Roma quando Os contemporâneos reconheceram e celebraram em Berni-
ainda era criança. ni um gênio: não só intérprete, mas também realizador da
“restauração católica” que, depois do fechado rigorismo
contra-reformista, revaloriza toda a cultura como história da
Gian Lorenzo Bernini foi artista barroco italiano,
redenção da humanidade. Nessa nova mentalidade, o que a
escultor, arquiteto, pintor e desenhista, esculpiu nume- imaginação concebe deve tornar-se realidade. Essa é a tarefa
rosas obras em Roma e no Vaticano. Foi um dos artistas da técnica. Mais do que na novidade e vastidão das inven-
mais completos e importantes do barroco. Seus primei- ções formais, a grandeza histórica de Bernini reside na sua
ros trabalhos foram inspirados por esculturas helenistas capacidade técnica capaz de realizar tudo o que pensa e de-
e romanas, as quais procurou estudar em detalhes. seja (ARGAN, 1968 apud SILVA, 2015).

Os primeiros trabalhos de Bernini atraíram a


atenção do cardeal Scipione Borghese. Sob seu patrocí-
nio, Bernini esculpiu seus primeiros importantes grupos
esculturais em tamanho natural, inclusive o Rapto de
Proserpina (1621-22; Galeria Borghese). Estes trabalhos
de mármore mostram um virtuosismo incomparável em
esculpir esse material resistente para alcançar os efeitos
delicados, normalmente encontrados apenas em escul-
turas de bronze.

A consciência sensual de Bernini das texturas su-


perficiais da pele, do cabelo e seu novo sentido de som-
breamento romperam com a tradição de Michelangelo,
além de marcarem o surgimento de um novo período
na história da escultura ocidental. O rompimento com
a tradição de Michelangelo é fortemente evidenciada
se analisarmos a sua escultura “David” (1623-1624) que
incorpora o movimento, algo típico do Barroco, e se dife-
rencia do estático “David” de Michelangelo (1501-1504).
Trabalhou para o Vaticano, sendo contratado pelo Papa
Paulo V. Foi nomeado, em 1624, arquiteto da Basílica de
São Pedro. Estudou profundamente a obra de Michelân-
gelo. Seu virtuosismo atraiu grandes mecenas.

Teve contato com a escultura e arquitetura ro-


manas, gregas e renascentistas, que o influenciaram O Rapto de Proserpina. Internet: <www.julirossi.blogspot.com>
muito. Seu trabalho estava de acordo com o que foi pro-
posto pelo Concílio de Trento, que afirmou que a fun- Ficha Técnica
ção da arte religiosa era inspirar e ensinar os fiéis, assim
como servir de propaganda da doutrina católica. Acredi- Autor: Gian Lorenzo Bernini
ta-se que suas melhores obras tenham sido criadas entre Data de produção: 1621 – 1622
os anos 40 e 60 do século XVII. Entre 1647 e 1652 escul- Técnica: Escultura em mármore
piu a grande obra “O Êxtase de Santa Teresa” e em 1656 Localização: Galeria Borghese (Roma)
deu início àquela que é considerada a sua maior obra: as Período ou movimento artístico que pertence: Barroco
colunas que rodeiam a praça na entrada da Basílica de Italiano
São Pedro. Principal tema abordado: Mitologia Romana

Em 1657 começou a esculpir o Trono de São Pe-


dro que só foi terminado em 1666. Viajou para Paris em
1665. O artista foi convidado para visitar a França a pedi-

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Contexto no outono, épocas frias e sem colheitas, Perséfone esta-


va com o marido.
O Barroco se desenvolveu no século XVII e foi
inspirado no fervor religioso e na passionalidade da Con- A obra nasce do momento exato em que Proser-
tra-Reforma. O berço do Barroco é a Itália do século XVII, pina é raptada. Proserpina empurra a cabeça de Plutão
porém espalhou-se por outros países europeus como, como quem luta para fugir do abraço, enquanto este
por exemplo, a Holanda, a Bélgica, a França, a Espanha aperta a pele de Proserpina para tentar imobilizá-la. Pro-
e Portugal, permanecendo vivo no mundo das artes até serpina parece ser levantada por Plutão, como quem se-
o século XVIII. Entretanto, o aparecimento das formas gura um troféu. Os lábios um pouco abertos de Proserpi-
barrocas ocorreu em diferentes épocas em cada país. na fazem parecer que ela clama por ajuda, e as lágrimas
que rolam no rosto reforçam o seu sofrimento.
A palavra barroco significa “ pérola irregular”
ou “pérola deformada” e representa a ideia de irregu- Um terceiro elemento compõe a escultura: o
laridade. Desta forma, a arte renascentista, baseada no cão de três cabeças responsável por guardar a entrada
equilíbrio, dá lugar a uma arte mais intensa, emocional do submundo.
e envolvente, a qual expressa as emoções de forma pas-
sional. Essa obra apresenta um contraposto retorcido
e em tamanho natural. Na escultura há predomínio das
As obras barrocas romperam o equilíbrio en- linhas curvas e dos drapeados das vestes; os gestos e
tre razão e sentimento, ciência e arte, predominando a os rostos das personagens revelam emoções violentas.
emoção, e não o racionalismo. Outras importantes ca- Bernini parece registrar o momento, fazendo o mármore
racterísticas do barroco são o entrelaçamento entre ar- duro realmente parecer pele. Detalhes extremamente
quitetura e escultura, bem como contrastes de sombra realistas contribuem para que a escultura pareça uma
e luz. fotografia.

Na pintura, é clara a influência do conflito en-


tre razão e fé. Essa dualidade é demonstrada através do
uso de contrastes, como sombra e luz, e escuro e claro.
São exploradas ideias de profundidade e de intensidade
dramática. Há também o uso de tonalidades quentes.
Na escultura se destaca o movimento, linhas curvas, dra-
peados das roupas e a expressão de sentimentos. Para
se obter isso, os artistas abusam do intenso dramatismo,

Citações da Obra na Matriz de Referências
O ser humano como um ser que pergunta e quer saber

Reflexões sobre a existência, o pensamento e o


sublime podem ser reconhecidas na escultura O rapto de
do exagero de formas, grandes volumes e expressões fa-
ciais. Prosérpina (Bernini, 1621), assim como nas pinturas O ju-
ramento dos Horácios (Jacques-Louis David, 1784) obras
Obra e suas análises possibilitam identificar linguagens e tradu-
zir sua plurissignificação Impressão, nascer do sol (Monet,
A escultura é extraída do mito romano do rap- 1872) e A noite estrelada (Van Gogh, 1889). (Página 4, pri-
to de Proserpina por Plutão: uma lenda de origem gre- meiro parágrafo)
ga utilizada para explicar as estações do ano (na cultura
grega, Plutão se chama Hades e Proserpina é Perséfone). Indivíduo, cultura e mudança social

Filha da deusa das colheitas Deméter, Proserpi- A participação da mulher na política ou na vida
na é raptada por Plutão, encantado pela sua beleza. O social de forma pública, pode ser percebida em obras
rapto fez com que Deméter castigasse o mundo, arrasan- como O rapto de Prosérpina (Bernini), Maria Antonieta
do com as plantações, entregando o mundo ao caos e à com rosa (Le Brun), Jane Avril (Lautrec), Moema (Victor
Meirelles), Úrsula (Maria Firmina dos Reis), Precisamos
fome.
romper com os silêncios - TEDxSaoPauloSalon (Djamila
Enquanto sua mãe a procurava, Proserpina não Ribeiro), Cota não é Esmola (Bia Ferreira) e Maria da Vila
podia comer nada que lhe fosse oferecido, ou então Matilde (Elza Soares) que trata da necessidade da desna-
turalização da violência, permitindo um diálogo sobre a
nunca mais voltaria para casa. Porém, Proserpina comeu
Lei Maria da Penha. (Página 8, quinto parágrafo)
algumas sementes de romã, por isso foi obrigada a se
casar com Plutão. Júpiter (nome romano de Zeus) tenta Tipos e Gêneros
intervir e propõe que Proserpina passe metade do ano
com o marido, embaixo da terra no submundo e a outra Sob a perspectiva das artes visuais, “Tipos e gê-
metade com a mãe, na superfície. O período que passa neros” podem ser compreendidos ao se analisar fatores
com o marido corresponde ao inverno, e a outra meta- como sexualidade, moral, conceitos de beleza, religiosi-
de, com a mãe, corresponde ao verão. Quando era verão dade, fé e sociedade, nos gêneros histórico, paisagem e
e primavera, sua filha estava ao seu lado. No inverno e retrato. Os elementos da linguagem visual estabelecem
uma relação direta com o contexto e o tema das obras,

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como expressam a escultura O rapto de Prosérpina (de


Bernini), representando um amor não correspondido; a
pintura O juramento dos Horácios (de Jacques Louis-Da-
vid), representando a moral cívica; a pintura Moema (de
Victor Meirelles), representando a desilusão amorosa en-
tre diferentes raças;a aquarela Roda de capoeira (de Ru-
gendas), representando a influência da cultura africana
no Brasil; e a participação da mulher na vida social pode
ser conferida no quadro Maria Antonieta com rosa (Le
Brun) e na própria vida da pintora. (Página 11, terceiro
parágrafo)

Espaços

Os espaços de convivência e coletividade se for-


mam por questões sociais e econômicas, além das ques-
tões geográficas. A escultura O rapto de Prosérpina (Ber-
nini) ilustra tais aspectos e remete aos mitos gregos como
referência de organização dessas relações. As músicas
Maria da Vila Matilde (Elza Soares) e Cota não é esmola
(Bia Ferreira) permitem problematizar os espaços defini-
dos para cada grupo social, além de definir um espaço
que pode ser confrontado pelo protagonismo feminino.
Essas percepções estão presentes, também nas pinturas
Maria Antonieta com rosa (Le Brun) e Moema (Victor Mei-
relles), na litogravura Jane Avril (Toulouse-Lautrec) e na
análise da Lei Maria da Penha, artigos 1º a 12-B – Lei nº
11.340/2006. (Página 27, quarto parágrafo)

Materiais

O estudo dos materiais e dos metais pode adqui-


rir relevância em diversos contextos, por exemplo, nas ar-
tes. A escultura O rapto de Prosérpina (Bernini), o comple-
xo arquitetônico da Igreja São Francisco de Assis de Ouro
Preto (Aleijadinho e Ataíde), as gravuras da Série Desas-
tres de guerra: Enterrar e calar; E não há remédio; Estra-
gos da guerra; O mesmo (Goya), a litogravura Jane Avril
(Toulouse-Lautrec), a pintura Noite estrelada (Van Gogh),
diferentes possibilidades de usos de materiais como már-
more, bronze, madeira, pedrasabão, pigmentos, entre ou-
tros, com propriedades distintas. Tanto obras de mármore
como de pedra são danificadas pela ação da chuva ácida,
causada pela emissão de óxidos de nitrogênio e enxofre
na atmosfera. (Página 31, terceiro parágrafo)

Questões, Justificativas e Dicas


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Anotações e Rascunhos

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Anartia Olivacea - José Joaquim Freire

Autor
José Joaquim Freire nasceu em Belas, Portugal, Ficha Técnica
no ano de 1760. O pintor aquarelista, desenhista, risca-
dor e cartógrafo foi aprendiz de João de Figueiredo na Técnica: Aquarela
Fundição do Real Arsenal do Exército, uma das mais im- Tema: Ilustração científica - Botânica
portantes escolas de desenho da época em Portugal. Período de Produção: Século XVIII - Período Colonial,
entre 1783 a 1792
Freire, que foi treinado no Arsenal nas técnicas Dimensão: 26,5 x 17cm
do desenho militar, foi contratado pelo Real Museu e Jar- Acervo: Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro
dim Botânico da Ajuda para reunir informações científi-
cas sobre a fauna e flora das colônias portuguesas.
Contexto
Durante os anos de 1783 a 1792, Freire parti- As “Viagens Filosóficas” aconteceram no final do
cipou das “viagens filosóficas”, que foram expedições século XVIII como uma tentativa financiada pela coroa
científicas para a América, África e Ásia patrocinadas portuguesa de obter informações acerca da fauna, flora
pelo governo português. Durante esta expedição, o ar- e vida nativa das colônias Portuguesas.
tista foi enviado ao Pará, Amazonas e Mato Grosso, rea-
lizou croquis e desenhos aquarelados que documentam No Brasil, a expedição teve início em 1783 em
as atividades artesanais dos nativos, vistas das cidades, Belém do Pará. Durante a viagem, o grupo navegou pelos
construções, povos indígenas e espécimes da fauna e rios Amazonas, Negro, Madeira, Guaporé, Cuiabá, São
da flora. Com toda essa pesquisa, o governo português Lourenço e Paraguai. Atravessaram o território de quatro
tinha o objetivo de investigar as potencialidades econô- capitanias até alcançar as bordas das terras espanholas.
micas da flora amazônica e a demarcação de territórios. A expedição teve fim em 1792, após nove anos e três
meses de trabalho de campo.
Após o fim da expedição, em 1792, Freire voltou
a Portugal. Atuou na redução dos mapas criados no Bra- Durante todo esse período, foram produzidos
sil, que resultou na Carta Geográfica de Projeção Esféri- inúmeros relatos e desenhos. Além dos documentos,
ca Ortogonal da Nova Lusitânia ou América Portuguesa. inúmeras amostras de sementes, plantas, minerais, ar-
Essa Carta foi de extrema importância para a defesa ter- tefatos indígenas e animais embalsamados foram envia-
ritorial da colônia Portuguesa. dos para Portugal e passaram a compor o acervo do Real
Gabinete de História Natural. A técnica de pinturas em
Ingressou na carreira militar em 1798. Participou estampas permitiu que as pinturas feitas em aquarela ou
da Guerra Peninsular e anos depois propôs ao governo nanquim durante a exposição fossem reproduzidas pos-
português a criação de um banco nacional. Colocou suas teriormente em chapas de metal.
habilidades de desenho a serviço do governo português.

Obra
Anartia Olivacea foi pintada por Freire em sua
expedição à Amazônia. Atualmente pode ser encontra-
da em uma coletânea da Biblioteca Nacional do Rio de
Janeiro, intitulada Prospectos de Cidades, Vilas, Povoa-
ções, Fortalezas e Edifícios, Rios e Cachoeiras da Expedi-
ção Filosófica do Pará, Rio Negro, Mato Grosso e Cuiabá.

Anartia Olivacea. Internet: <www.brasilianaiconografica.art.com.br>



Citações da Obra na Matriz de Referências
O ser humano como um ser que pergunta e quer saber

O conhecimento se apresenta sob formas diver-


sas, como é possível perceber na Igreja São Francisco de
Assis de Ouro Preto: estrutura arquitetônica, pintura do
teto e esculturas encravadas na estrutura, (Aleijadinho e

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Ataíde, século XVII), na aquarela Anartia Olivacea (José Para se estudar a sistemática, faz-se necessário conhecer
Joaquim Freire, século XVIII), na litografia Jane Avril (Tou- os principais critérios de classificação desses seres. Esses
louse-Lautrec, 1899) e na fotografia Atrás da estação são organizados em categorias taxonômicas hierárquicas,
Saint Lazare (Cartier-Bresson, 1932), expressando aspec- de reino a espécie. A categoria domínio, apesar de não
tos de complexidade nas representações da realidade. pertencer a classificação de Lineu, é necessária para a
(Página 6, terceiro parágrafo) classificação das arqueobactérias e deve ser considerada.
Vírus, por sua vez, são organismos acelulares e por isso
Tipos e gêneros não podem ser classificados segundo os critérios tradicio-
Tendo em vista que tipos e gêneros são classi- nais. (Página 18, segundo parágrafo)
ficações que a inteligência humana realiza consciente e Materiais
inconscientemente, estabelecendo critérios, convenções,
medidas para agrupar objetos pelas semelhanças e afini- Com relação ao conhecimento e ao domínio dos
dades, a caracterização é importante como fator determi- materiais, é importante destacar que eles proporciona-
nante de pertencimento à ordem classificatória dada. O ram a produção de ligas, vidros e criações de técnicas, de-
Museu Nacional do Rio de Janeiro constitui um lugar para senvolvimento de suportes e outras formas de representa-
reunir objetos classificados como obras de arte e acadê- ção da imagem, adequadas às novas tendências das artes
micas. É importante compreender que podem existir di- visuais, à fotografia e à rapidez da execução. A análise
ferentes arranjos no agrupamento de objetos, conforme da fotografia Atrás da estação Saint Lazare (Cartier-Bres-
as motivações, julgamentos e pensamentos de quem clas- son), da aquarela Anartia Olivacea (José Joaquim Freire),
sifica. No campo da biologia, a taxonomia moderna em- do óleo sobre tela Impressão nascer do sol (Monet) são
preendeu a caracterização dos seres vivos como forma de exemplos de resultados desse desenvolvimento. (Página
organização da biodiversidade. Um exemplo dessa biodi- 31, quarto parágrafo)
versidade é a aquarela Anartia Olivacea (de José Joaquim
Freire), que faz um dos primeiros registros de uma planta Questões, Justificativas e Dicas
no território brasileiro.(Página 11, segundo parágrafo)
Quer acessar as questões, justificativas e dicas desta obra?
Energia e oscilações
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A fotografia, como aplicação de conceitos de luz
e cores, é analisada a partir da óptica geométrica, por
meio do modelo da câmara escura e da formação de ima-
Anotações e Rascunhos
gens em anteparos e espelhos, sejam planos ou curvos,
bem como da utilização de lentes convergentes ou diver-
gentes e a aplicação de conceitos como distância focal,
refração, reflexão e interferência luminosas, que afetam
aspectos como nitidez ou tamanho da imagem. Os exem-
plos de fotografias e pinturas revelam a importância do
saber científico frente ao espectro da luz visível, traduzi-
dos na matéria como as cores utilizadas pelo artista, como
é possível perceber nas obras Noite estrelada (Van Gogh),
Jane-Avril (Toulouse-Lautrec), Anartia Olivacea (José Joa-
quim Freire) e A redenção de Cam (Modesto Brocos). No
teatro, a luz solar foi, por bastante tempo, a única forma
de iluminação. No Renascimento, era comum que os pré-
dios teatrais, como o Globe Theatre, utilizado por William
Shakespeare, tivessem abertura para a luz solar. Mesmo
cenas noturnas eram representadas sob a luz solar, evi-
denciando assim o princípio da propagação retilínea da
luz e a independência dos feixes. Essa encenação pode ser
percebida na representação cênica de Medida por medida
(Shakespeare). (Página 15, quinto parágrafo)
Ambiente e vida
A sistemática é a ciência dedicada a inventariar
e descrever a biodiversidade e compreender as relações
entre os organismos. Nesta área, ilustrações científicas,
como a aquarela Anartia Olivacea (José Joaquim Frei-
re), tiveram um importante papel na descrição da flora
brasileira. Esse tipo de trabalho permite a identificação
de estruturas utilizadas na classificação dos seres vivos.

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Maria Antonieta com Rosa - Marie-Louise
Vigée-Lebrun

Autor
Marie-Louise-Élisabeth Vigée-Lebrun (1755 –
1842) foi uma pintora francesa que se tornou uma das
mais bem-sucedidas artistas mulheres de todos os tem-
pos, particularmente reconhecida pelos seus retratos de
mulheres.

Seu pai, Louis Vigée, era retratista e foi seu pri-


meiro professor. Desde a adolescência já se sustentava
com a venda dos seus quadros. Mesmo nesse período
já ganhava prestígio popular e atraía clientes ricos que
almejavam ter um retrato pintado pela artista.

Mais tarde, ela estudou com pintores famosos,


entre eles Jean-Baptiste Greuze e Joseph Vernet. Em
1776 ela casou-se com um negociante de arte, J.-B.-O.
Lebrun.

Uma grande oportunidade em sua carreira veio


em 1779, quando ela foi convidada à Versailles para pin-
tar um retrato da rainha Maria Antonieta. As duas mu-
lheres tornaram-se amigas, e nos anos subsequentes
Vigée-Lebrun pintou pelo menos 25 retratos de Maria
Antonieta em uma grande variedade de poses e fanta- Maria Antonieta com Rosa Internet: <pt.wikipedia.org>
sias; muitos deles pode ser visto no museu de Versailles.
Ficha Técnica
Vigée-Lebrun se tornou membro da Academia
Real de Pintura em 1783. Com a eclosão da Revolução Título: Maria Antonieta com Rosa
em 1789, ela deixou a França e por 12 anos viajou para Gênero: Retrato
fora, à Roma, Nápoles, Viena, Berlim, São Petesburgo e Data: 1783
Moscou, pintando retratos com um importante status Técnica: Óleo sobre tela
social. Dimensões: 130 x 87 cm
Coleção: Palácio de Versalhes
Em 1801, retornou à Paris, mas, por não gostar
da vida na França sob o domínio de Napoleão, foi embo- Contexto
ra para Londres, onde pintou retratos da corte e de Lor-
de Byron. Em 1810, novamente em Paris, a artista deixou O neoclassicismo ocorreu na Europa entre o fim do
de pintar, vindo a falecer em 30 de março de 1842. A século XVIII até o século XIX. Assim como o nome do movi-
causa provável da sua morte foi a arteriosclerose. mento sugere, houve um retorno aos valores clássicos nas
obras do período. Esse retorno se dá devido a influência de
Élisabth Vigée-Lebrun morreu em 30 de março filósofos e pensadores da época, que defendiam o Iluminis-
de 1842, na cidade de Paris. Arteriosclerose foi a causa mo. Jacques-Louis David é considerado o artista que deu
provável da sua morte. início ao Neoclassicismo, com sua pintura “O Juramento
dos Horácios” (1784).
Vigée-Lebrun foi uma das retratistas tecnica-
mente mais influentes de sua época, suas pinturas são As representações do período utilizavam temas
notáveis pelo frescor, charme e sensibilidade de sua e recursos da Antiguidade Clássica, especialmente os que
apresentação. Durante sua carreira, pintou 877 quadros, estavam sendo descobertos no período. As representações
incluindo 622 retratos e cerca de 200 paisagens. humanas seguiam os modelos das esculturas, com sutil de-
monstração de movimento e valorização da definição cor-
Seu estilo estava mais orientado pelo neoclassi- pórea. As cores são vivas, sem variações de tons e as pince-
cismo, porém também teve influência do rococó. A artis- ladas não são visíveis.
ta ganhou fama representando suas pinturas de modo
elegante, se tornando a retratista mais requisitada na Proença (2006, p. 122) comenta que de acordo
França de sua época. com a tendência neoclássica, “uma obra de arte só seria
perfeitamente bela na medida em que imitasse não as

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formas da natureza, mas as que os artistas clássicos gre- Essa pintura, pertencente ao neoclássicismo,
gos e os renascentistas italianos haviam criado”. A autora trata de uma das temáticas mais importantes desse es-
acrescenta ainda que isso só era possível “através de um tilo: a representação de figuras importantes. Apresenta
cuidadoso aprendizado das técnicas e convenções da arte elementos representativos e simbólicos da aristocracia
clássica”. A perspectiva e simetria são valorizadas nas com- francesa.
posições, assim como as proporções das figuras huma-
nas e dos espaços arquitetônicos. A temática inclui fatos Vigée usava pinceladas soltas e cores vigorosas e
históricos, cenas mitológicas e figuras importantes, tais brilhantes. A artista desenvolveu uma técnica de 3 poses
como Napoleão Bonaparte e, como na obra apresenta- ideais para a rainha. Estas, além de captarem a essência
da, Maria Antonieta. da soberana, disfarçava suas imperfeições. De retrato
em retrato, Élisabeth Vigée renovou a imagem da rainha,
Maria Antonieta representando-a não unicamente como soberana, mas
como mãe e mulher.
Maria Antonieta foi arquiduquesa da Áustria, es-
posa do rei francês Luís XVI e a última rainha da França.
Se casou por procuração aos 14 anos de idade com Luís
Augusto de Bourbon, herdeiro do trono francês. Após a
morte de Luís XV e a coroação de seu marido, tornou-se
rainha consorte da França.
Maria Antonieta se encantou com a corte fran-
cesa e seus hábitos extravagantes se tornaram alvo da
revolta da população. Gastava fortunas em joias, promo-

Citações da Obra na Matriz de Referências
O ser humano como um ser que pergunta e quer saber

Questões relativas às diferentes concepções de


mundo, de ser humano e de conhecimento estão presen-
via corridas de cavalo, frequentava bailes de máscaras, tes em expressões artísticas de diferentes culturas e perío-
entre outras coisas. Nesse período o país passava por um dos históricos, como nas pinturas Maria Antonieta com
período de crise revolucionária e financeira. A nobreza, rosa (Le Brun, 1783), Roda de capoeira (Rugendas,1835),
que estava presa ao luxo, não era capaz de perceber as Moema (Victor Meirelles, 1866), Independência ou mor-
necessidades das outras classes. te (Pedro Américo, 1888), A redenção de Cam (Modesto
Brocos, 1895), assim como nas gravuras Enterrar e calar,
A fim de tentar resolver a situação política e fi- E não há remédio e Estragos da guerra, da série Os de-
nanceira do país, o rei se viu obrigado a convocar os Esta- sastres da guerra (Goya, 1810-1820). (Página 4, quarto
dos Gerais, que eram formados por representantes (de- parágrafo)
putados) dos três estados (aqui entendidos como ordens
ou classes). O primeiro estado era composto pelo clero, Indivíduo, cultura e mudança social
o segundo pela nobreza e o terceiro pela burguesia, que
o encabeçou, mas, principalmente pelo povo francês A participação da mulher na política ou na vida
(camponeses, proletários, ou seja, “os comuns”), que social de forma pública, pode ser percebida em obras
exigia parar de sustentar o clero e os nobres. Após dias como O rapto de Prosérpina (Bernini), Maria Antonieta
de discussão, o Terceiro Estado se separa dos demais, com rosa (Le Brun), Jane Avril (Lautrec), Moema (Victor
o que leva a convocação de uma Assembleia Nacional Meirelles), Úrsula (Maria Firmina dos Reis), Precisamos
Constituinte. romper com os silêncios - TEDxSaoPauloSalon (Djamila
Ribeiro), Cota não é Esmola (Bia Ferreira) e Maria da Vila
A Revolução Francesa atinge um de seus marcos Matilde (Elza Soares) que trata da necessidade da desna-
com a queda da Bastilha em 14 de julho de 1789, o mo- turalização da violência, permitindo um diálogo sobre a
vimento revolucionário ganha ainda mais força. As ten- Lei Maria da Penha. (Página 8, quinto parágrafo)
tativas de repressão do rei não surtem efeito e em 1791
a família real resolve fugir para a Áustria. Tal episódio Tipos e gêneros
ficou conhecido como Fuga de Varennes, o rei acabou
sendo reconhecido e preso, passando então a ser consi- Sob a perspectiva das artes visuais, “Tipos e gê-
derado um traidor. Em 21 de janeiro de 1793, Luís XVI foi neros” podem ser compreendidos ao se analisar fatores
decapitado e Maria Antonieta foi guilhotinada em 16 de como sexualidade, moral, conceitos de beleza, religiosi-
outubro do mesmo ano. dade, fé e sociedade, nos gêneros histórico, paisagem e
retrato. Os elementos da linguagem visual estabelecem
Obra uma relação direta com o contexto e o tema das obras,
como expressam a escultura O rapto de Prosérpina (de
A rainha foi retratada com um vestido branco e Bernini), representando um amor não correspondido; a
um chapéu, segurando uma rosa nas mãos. Ao fundo pintura O juramento dos Horácios (de Jacques Louis-Da-
observa-se o que parece um jardim, já que atrás da rai- vid), representando a moral cívica; a pintura Moema (de
nha há outras flores como a que segura. Victor Meirelles), representando a desilusão amorosa en-
tre diferentes raças;a aquarela Roda de capoeira (de Ru-
gendas), representando a influência da cultura africana

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no Brasil; e a participação da mulher na vida social pode


ser conferida no quadro Maria Antonieta com rosa (Le
Brun) e na própria vida da pintora. (Página 11, terceiro
parágrafo)

A formação do mundo ocidental contemporâneo

Na obra Maria Antonieta com rosa (Le Brun,


1783) encontram-se elementos representativos e sim-
bólicos do Antigo Regime, em especial da aristocracia
francesa. Por outro lado, também, existiram obras que
buscavam criticar os privilégios sociais da aristocracia,
assim como os costumes e padrões sociais hegemônicos
da época. Outras obras também criticaram as contradi-
ções do emergente Capitalismo Industrial ou até mesmo
apontavam caminhos para perspectivas sociais alternati-
vas, como pode ser observado no conto realista A Igreja
do Diabo (Machado de Assis,1884), na obra naturalista O
Bom-Crioulo (Adolfo Caminha, 1895), assim como na peça
realista Um Inimigo do Povo (Henrik Ibsen, 1882). (Página
21, segundo parágrafo)

Espaços

Os espaços de convivência e coletividade se for-


mam por questões sociais e econômicas, além das ques-
tões geográficas. A escultura O rapto de Prosérpina (Ber-
nini) ilustra tais aspectos e remete aos mitos gregos como
referência de organização dessas relações. As músicas
Maria da Vila Matilde (Elza Soares) e Cota não é esmola
(Bia Ferreira) permitem problematizar os espaços defini-
dos para cada grupo social, além de definir um espaço
que pode ser confrontado pelo protagonismo feminino.
Essas percepções estão presentes, também nas pinturas
Maria Antonieta com rosa (Le Brun) e Moema (Victor
Meirelles), na litogravura Jane Avril (Toulouse-Lautrec) e
na análise da Lei Maria da Penha, artigos 1º a 12-B – Lei
nº 11.340/2006. (Página 27, quarto parágrafo)

Questões, Justificativas e Dicas


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Anotações e Rascunhos

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Juramento dos Horácios - Jacques-Louis
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David

Autor
O pintor francês Jacques-Louis David nasceu em
30 de agosto de 1748, em Paris. Aos nove anos de idade,
após a morte de seu pai, ficou sob a custódia de dois tios
que eram arquitetos. Sua mãe insistia que Jacques deve-
ria estudar para seguir a mesma carreira que os tios, mas
seu único objetivo era a pintura.

Suas primeiras obras possuíam grande influência


do Rococó, entretanto, o artista teve como professor Jo-
seph Marie Vien, um pintor precursor do neoclassicismo
que o influenciou a ter contato com o estilo e temas re-
lacionados à Antiguidade Clássica. Em 1774 conquistou o
Prêmio de Roma, o que lhe permitiria passar um ano es-
tudando em Roma, sendo subsidiado pela Coroa France-
sa. Após seus estudos na Itália, retornou para Paris para Juramento dos Horácios. Internet: <www.wikipedia.org>
produzir. Em 1787, exibiu sua obra A Morte de Sócrates
no Salão de Paris. A obra retrata a morte do ilustre filó- Ficha Técnica
sofo grego.
Ano de Produção: 1784
Durante a década de 1780, suas pinturas desen- Técnica: Óleo sobre tela
volvem as características do Neoclassicismo. Em 1784 fi- Dimensões: 329,8 cm x 424,8 cm
naliza “O Juramento dos Horácios”, pintura considerada Período ou movimento artístico que pertence: Neoclas-
a primeira obra neoclássica. Entre 1796-1799, o artista sicismo
pintou “A intervenção das Sabinas”, retratando um epi- Localização: Museu do Louvre, Paris, França
sódio do mito fundador romano. Durante a revolução
francesa, sua produção ganha um maior teor político,
como na pintura “A Morte de Marat” (1793) que retrata
Contexto
a morte do revolucionário francês Jean-Paul Marat. Da- O Neoclassicismo foi um movimento artístico
vid, grande entusiasta da revolução, entrou para a polí- que teve início no século XVIII e perdurou até meados do
tica, se tornando deputado para a Convenção Nacional. século XIX. Assim como o nome do movimento sugere,
houve um retorno aos valores clássicos nas obras do pe-
Em 1794, quando Robespierre, líder dos jaco- ríodo. Esse retorno se dá devido a influência de filósofos
binos, foi condenado à guilhotina, David foi acusado de e pensadores da época, que defendiam o Iluminismo. Ja-
traição e passou alguns meses preso. Depois de um pe- cques-Louis David é considerado o artista que deu início
ríodo de reclusão, foi novamente alçado às glórias com ao Neoclassicismo, com sua pintura “O Juramento dos
o governo de Napoleão Bonaparte, o qual retratou em Horácios” (1784).
“ Napoleão cruzando os Alpes” (1801-1805). Em 1816,
com a queda de Bonaparte, exilou-se em Bruxelas, onde As representações do período utilizavam temas
morreu em 1825. e recursos da Antiguidade Clássica, especialmente os
que estavam sendo descobertos no período. As repre-
Suas obras eram voltadas para o retrato e re- sentações humanas seguiam os modelos das esculturas,
presentações de temas históricos e mitológicos. É con- com sutil demonstração de movimento e valorização da
siderado o maior representante da pintura neoclássica. definição corpórea. As cores são vivas, sem variações de
Segundo Proença (2006, p.124), Jacques-Louis “foi con- tons e as pinceladas não são visíveis.
siderado o pintor da Revolução Francesa” e mais tarde
“tornou-se o pintor oficial do Império de Napoleão”, re- Proença (2006, p. 122) comenta que de acordo
gistrando importantes fatos ligados à vida do imperador. com a tendência neoclássica, “uma obra de arte só se-
ria perfeitamente bela na medida em que imitasse não
as formas da natureza, mas as que os artistas clássicos
gregos e os renascentistas italianos haviam criado”. A
autora acrescenta ainda que isso só era possível “através
de um cuidadoso aprendizado das técnicas e convenções
da arte clássica”. A perspectiva e simetria são valorizadas
nas composições, assim como as proporções das figuras

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humanas e dos espaços arquitetônicos. A temática inclui Os rostos dos personagens são sem expressão,
fatos históricos, cenas mitológicas e figuras importantes, porém, os olhos de um dos meninos no canto inferior
tais como Napoleão Bonaparte. direito estão destacados, olhando diretamente para o
acontecimento. Os traços em toda a composição, como
Obra os contornos das figuras e os detalhes do rosto e das rou-
pas, são marcados e fiéis às representações clássicas. O
Na pintura analisada, vemos um homem no cen- vermelho, presente em todo o quadro, é vivo e na mes-
tro da tela segurando três espadas ao alto, três homens ma tonalidade.
no canto inferior esquerdo com um dos braços levan-
tados, duas mulheres sentadas juntas na parte inferior
direita e, no segundo plano da tela, uma mulher abra-
çando duas crianças.

De acordo com o nome da obra, “O Juramento


dos Horácios”, supomos que os três homens do canto in-
ferior esquerdo são os Horácios, e as mulheres e crianças
do canto inferior direito, do primeiro e segundo plano

Citações da Obra na Matriz de Referências
O ser humano como um ser que pergunta e quer saber

Reflexões sobre a existência, o pensamento e o


da tela, são sua família. O homem que segura as três es- sublime podem ser reconhecidas na escultura O rapto de
padas é Horácio o velho, pai dos três homens no canto Prosérpina (Bernini, 1621), assim como nas pinturas O ju-
inferior esquerdo. ramento dos Horácios (Jacques-Louis David, 1784) obras
e suas análises possibilitam identificar linguagens e tradu-
Todos estão representados em um ambiente zir sua plurissignificação Impressão, nascer do sol (Monet,
fechado, com arcos jônicos, que apesar de estarem em 1872) e A noite estrelada (Van Gogh, 1889). (Página 4, pri-
terceiro plano, dividem a tela em três partes. meiro parágrafo)

A história representada no quadro se passa em Indivíduo, cultura e mudança social


Roma no século VII a.c, na guerra entre Roma e Alba
Os avanços tecnológicos e científicos bem como o
Longa. Os três homens com braços levantados, dois com desenvolvimento de novas formas de pensamento e de or-
o braço esquerdo e um com o braço direito, fazem este ganização política são importantes fatores para alterar o
sinal em forma de juramento ao seu pai, ao se compro- comportamento do indivíduo e sua relação na sociedade,
meterem em defender sua família. O pai, que segura as além de refletir no fazer artístico. Esses e outros debates
três espadas, é o centro da obra, assim como o ponto de podem ser apreciados na tela neoclassicista O juramento
fuga, o qual é desenvolvido para a composição da pin- dos Horácios (Jacques-Louis David), nas gravuras român-
tura. A composição dos corpos é feita em comparação ticas Série: desastres de guerra - chapas selecionadas: En-
com as representações humanas nos modelos gregos. terrar e calar; E não há remédio; Estragos da guerra; O
Já as caracterizações dos personagens, essas são feitas mesmo; (Goya), na tela impressionista Impressão sol nas-
no modelo romano, tais como os capacetes dos homens cente (Monet), na tela pós-impressionista Noite estrelada
que vão para a guerra e os trajes masculinos e femininos. (Van Gogh) e na fotografia de Saint-Lazare (Cartier-Bres-
son). (Página 8, primeiro parágrafo)
Os homens unidos, em posição de juramento,
representam a fraternidade, em que os mesmos irão lu- Tipos e gêneros
tar juntos, por sua pátria e sua família. Seus corpos estão
alinhados com a figura central que toma seus juramen- Sob a perspectiva das artes visuais, “Tipos e gê-
tos e os corpos das mulheres no canto inferior direito, neros” podem ser compreendidos ao se analisar fatores
estão curvados e desalinhados. como sexualidade, moral, conceitos de beleza, religiosi-
dade, fé e sociedade, nos gêneros histórico, paisagem e
As mulheres fazem parte da história narrada na retrato. Os elementos da linguagem visual estabelecem
pintura. A mulher que abraça as duas crianças é a mãe uma relação direta com o contexto e o tema das obras,
dos três Horácios. A mulher de branco representa a mãe como expressam a escultura O rapto de Prosérpina (de
das crianças, Sabina. A mulher que se reclina sobre a Bernini), representando um amor não correspondido; a
pintura O juramento dos Horácios (de Jacques Louis-Da-
mãe das crianças representa Camila, personagem que
vid), representando a moral cívica; a pintura Moema (de
será morta por um dos Horácios quando retornar da ba-
Victor Meirelles), representando a desilusão amorosa en-
talha. tre diferentes raças;a aquarela Roda de capoeira (de Ru-
gendas), representando a influência da cultura africana
A origem da luz focada nas mãos da figura cen-
no Brasil; e a participação da mulher na vida social pode
tral do quadro é natural, surge do canto médio esquer-
ser conferida no quadro Maria Antonieta com rosa (Le
do, de uma provável janela, oculta na composição. As Brun) e na própria vida da pintora. (Página 11, terceiro
sombras, resultado da luz no quadro, seguem a lógica da parágrafo)
mesma origem.

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A formação do mundo ocidental contemporâneo Anotações e Rascunhos


São notórias as influências do Iluminismo nos
movimentos de emancipação política na América Latina,
particularmente no Brasil, assim como o advento de no-
vos referenciais ideológicos presentes nos movimentos
sociais europeus do século XIX e suas influências para as
demais regiões do mundo. Obras como O Juramentos do
Horácios (Jacques-Louis David,1784) e Desobediência ci-
vil (Henry David Thoreau, 1849) exemplificam aspectos
desses novos pensamentos e mentalidades difundidos no
período. (Página 21, primeiro parágrafo)

Número, grandeza e forma

É possível aplicar a trigonometria de triângulos


quaisquer, como pode ser apreciado na obra O juramento
dos Horácios (Jacques-Louis David). Por meio das funções
trigonométricas é possível identificar a localização exata
em que o pintor Monet executou Impressão nascer do sol.
(Página 25, segundo parágrafo)

Espaços

No mundo tecnológico-informacional, temos o


desenvolvimento do espaço virtual. Neste novo espaço
da virtualidade, estão reproduzidas as relações sociais
do mundo presencial, estabelecendo reflexões acerca de
desigualdades, como pode ser observado no Precisamos
romper com os silêncios - TEDxSaoPauloSalon,2016 (Dja-
mila Ribeiro), na fotografia Atrás da estação Saint Lazare
(Cartier-Bresson) e no documentário Parque Nacional da
Serra da Canastra. Também, essas novas tecnologias da
informação afetam percepções do sujeito a respeito de
aspectos do espaço, tais como: próximo - distante, gran-
de - pequeno, rural - urbano, centro - periferia, local - re-
gional, nacional - internacional. Essas noções de espaço
antes da tecnologia virtual podem ser apreciadas nas pin-
turas em óleo sobre tela como Impressão nascer do sol
(Monet), Noite estrelada (Van Gogh, 1889) e O juramen-
to dos Horácios (Jacques-Louis David, 1784). (Página 26,
quinto parágrafo)

Os eventos históricos, isto é, as guerras, avanços


territoriais e novos pensamentos, mudam as concepções
de espaço, território e destinação da obra artística que
acabam por registrar essas mudanças, como pode ser
apreciado nas telas Independência ou morte (Pedro Amé-
rico, 1888) e O juramento dos Horácios (Jacques-Louis
David, 1784), nas gravuras da Série Desastres de guerra,
chapas selecionadas: Enterrar e calar; E não há remédio;
Estragos da guerra O mesmo (Goya, 1810-20) e no com-
plexo arquitetônico da Igreja São Francisco de Assis de
Ouro Preto (Aleijadinho e Ataíde, século XVII). (Página 29,
primeiro parágrafo)

Questões, Justificativas e Dicas


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Série Desastres de Guerra - Goya

Autor
Francisco José Goya y Lucientes nasceu em Ara-
gão, Espanha, no dia 30 de março de 1746. Aos 13 anos,
começou a ter aulas com o pintor José Luzán y Martínez,
professor na Academia de Desenho de Saragoça. Mudou
para Madri em 1762, onde mais tarde se tornou pupilo
do pintor da corte espanhola Francisco Bayeu. No perío-
do em que esteve em Madri, Goya tentou, sem sucesso,
se tornar aluno da Academia de Belas Artes.
Em 1770, foi para a Itália a fim de continuar os
seus estudos e em 1771 ganhou uma menção honrosa
em um concurso de pintura organizado pela Academia Lo Mismo. Internet: <www.en.wikipedia.org>
de Belas-Artes de Parma.
Voltou para a Espanha e em 1774 se casou com
Josefa Bayeu. Trabalhou também na Manufatura Real de
Santa Bárbara, em que fazia canvas (cartões pintados a
óleo) que eram utilizados na confecção de tapeçarias.
Em 1780 foi eleito membro da Academia de Be-
las-Artes de Madri. Seu primeiro retrato foi pintado cin-
co anos depois. Se tornou um dos pintores da câmara do
rei após a coroação de Carlos IV, em 1789. Após concluir
o seu trabalho na Manufatura Real, Goya se dedicou às
suas pinturas. São desse período os primeiros retratos
de figuras da corte espanhola. Enterrar y callar. Internet: <www.commons.wikimedia.org>

Em 1792, ao contrair uma doença misteriosa


devido a envenenamento por chumbo utilizado na tinta
branca, Goya teve paralisia temporária, cegueira parcial
e surdez permanente. Sua saúde só se reestabeleceu em
abril de 1793, quando voltou a pintar como artista da
Corte Espanhola.
Em 1799 foi nomeado Primeiro Pintor da Câ-
mara. Suas obras mais famosas foram pintadas entre os
anos de 1810 e 1814. Jurou fidelidade ao rei francês, que
em 1811 o condecorou com a Ordem Real de Espanha.
Esse juramento o colocou em uma situação extrema-
mente delicada, já que mais tarde Fernando VII recupe-
rou o trono. Em 1821 foi processado pela Inquisição, que Estragos de la guerra. Internet: <www.auctionzip.com>
considerou a obra “Majas” imoral.
A partir de 1815 começou a trabalhar exclusiva-
mente para si e um grupo restrito de amigos. Em 1826,
após retornar do exílio para Madri, Goya demitiu-se ofi-
cialmente do cargo de pintor da corte. Em 16 de abril de
1828, o artista morreu após sofrer uma parada cardíaca.
Goya foi um importante pintor espanhol da fase
do romantismo, e suas obras de maior destaque foram
pinturas a óleo. Gostava de utilizar cores fortes e vivas, e
transmitiu em suas obras vários sentimentos humanos.
Y no hai remedio. Internet: <www.commons.wikimedia.org>

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Ficha Técnica que ergue um machado com as duas mãos e abre a boca
para gritar, enquanto o soldado francês prestes a ser
Artista: Francisco Goya decapitado está deitado no chão tentando se proteger
Título: Desastres de Guerra inutilmente com a mão. Atrás desse espanhol há um ho-
Ano de produção: Entre 1810 e 1815 mem com espada que se afasta do ataque do espanhol.
Técnica: Calcografia - Água-forte e Água-tinta
Tema: Guerra Em segundo plano percebe-se um emaranha-
do de corpos jogados ao chão e um espanhol que subiu
Contexto nas costas de um francês e está prestes a esfaqueá-lo.
Os olhos selvagens, a boca aberta e as maçãs do rosto
A Guerra Peninsular teve início em 1807/1808, proeminentes retratam selvageria e primitivismo. Com
quando Napoleão Bonaparte invadiu Portugal, ocasio- isso, Goya quis apresentar a irracionalidade desses atos.
nando a fuga da família real para o Brasil. A Espanha, que O nome “O Mesmo” traz uma analogia que demonstra
era aliada dos franceses, foi traída e teve suas principais dois lados da mesma moeda: a violência. Para Goya,
fortificações conquistadas. Napoleão Bonaparte forçou o que retratou o horror da feracidade dos espanhóis e dos
Rei Carlos IV a abdicar e indicou um de seus irmãos para franceses em muitas de suas gravuras, esses atos são in-
governar a Espanha. justificáveis.
Nesse momento, Goya declarou fidelidade ao
rei francês José Bonaparte. Entretanto, o povo espanhol
Nº 15 – E não há remédio
não aceitou e permitiu que a Grã-Bretanha desembar- Tamanho: 142 X 168 mm
casse suas tropas na Espanha. Napoleão, que comandou
pessoalmente o seu exército em território espanhol, ex- Em primeiro plano o espectador vê o homem
pulsou os ingleses da Espanha. A Áustria formou a Quin- que está amarrado a um tronco e vendado, prestes a ser
ta Coalizão, e com isso Bonaparte partiu da Espanha para executado. No fundo há um pelotão de soldados que,
combater os austríacos. pelo uniforme, é possível constatar que são franceses.
Os soldados apontam seus rifles e disparam contra outro
Em 1812, Napoleão decidiu retirar 30 mil solda- condenado.
dos franceses da Espanha e levá-los para a Rússia. Foi aí
que os franceses foram derrotados e a guerra acabou. O título “Y no hay remedio” faz alusão ao fato de
que agora não existe mais solução para o homem que
Obra está em primeiro plano. Aos seus pés, há um homem
morto caído no chão. Seus colegas já foram executados,
A obra “Os desastres da Guerra” é uma série de e ele será o próximo. Os soldados franceses não pos-
82 estampas, ou gravuras, criadas entre os anos de 1810 suem expressão.
e 1815. Retratam, sobretudo, a guerra da Independência
entre espanhóis e franceses, que aconteceu entre 1808 Nº 18 – Enterrar e Calar
e 1814.
Tamanho: 16 X 23 cm
Goya, apesar de ser patriota, não concordava
que a guerra fosse uma forma de resolver questões po- A obra sugere que uma das consequências da
líticas, e, consequentemente, não via de maneira posi- guerra é obviamente a morte. Na série “Os desastres da
tiva as gloriosas representações da guerra. Acreditava Guerra”, Goya se propõe a representar em suas estam-
também que os verdadeiros heróis eram os cidadãos pas as vítimas dos massacres coletivos da guerra. Na gra-
espanhóis, e não o exército. Por isso, decidiu eternizar vura vemos duas pessoas em pé que parecem lamentar
os acontecimentos da guerra de 1808 com um olhar vol- sobre os corpos amontoados no chão.
tado aos trabalhadores e camponeses que lutaram por Os cadáveres estão despidos, e por estarem de-
seu país. sordenados, reforçam a ideia de que foram largados de
Tais cenas já não correspondem a nenhum repertório de sig- maneira aleatória como se não tivessem nenhum valor.
nos convencionais. Goya as representa sem nos indicar qual A expressão de terror nos rostos mostra que seus mo-
é o seu objetivo. Sentiu que elas revelavam algo de essencial mentos finais foram dolorosos e assustadores. Outro de-
à condição humana; isso lhe bastou para que ele julgasse útil talhe importante que Goya fez questão de ressaltar é o
colocá-las sob os nossos olhos. (TODOROV, 2014, p.50) cheiro dos corpos, já que as duas pessoas que estão em
pé levam as mãos ao nariz.
As obras selecionadas pelo CEBRASPE são:
Nº 30 – Estragos da Guerra
Nº 3 – O mesmo
Tamanho: 141 X 170 mm
Tamanho: 162 X 223 mm
Essa obra é considerada por muitos como um
A gravura mostra patriotas atacando soldados precedente da obra Guernica. Remete a um bombardeio
franceses. A figura em primeiro plano é de um espanhol

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e apresenta um caos intenso, corpos mutilados, des- além de refletir no fazer artístico. Esses e outros debates
membração dos corpos e um menino morto com a cabe- podem ser apreciados na tela neoclassicista O juramento
ça invertida sendo segurado por sua mãe. No centro da dos Horácios (Jacques-Louis David), nas gravuras român-
imagem há uma mulher caindo. O cenário é uma casa, ticas Série: desastres de guerra - chapas selecionadas:
como é possível ver pela cadeira jogada. Enterrar e calar; E não há remédio; Estragos da guerra; O
mesmo; (Goya), na tela impressionista Impressão sol nas-
A cadeira, que é elegante, faz alusão ao status so- cente (Monet), na tela pós-impressionista Noite estrelada
cial dos proprietários da casa. Com isso, Goya quis mos- (Van Gogh) e na fotografia de Saint-Lazare (Cartier-Bres-
trar que a guerra não escolhe classe social. Novamente son). (Página 8, primeiro parágrafo)
os corpos apresentam nudez e expressão de medo.
Estruturas
Técnica Utilizada Expandindo um pouco o conceito de estruturas,
Na calcografia, a gravura é precedida por um de- o mestre espanhol Goya utiliza-se da arte para expor ao
senho prévio, que depois é transcrito para a matriz, uma mundo algumas consequências da guerra como exemplifi-
chapa de metal. Entretanto, na técnica da água-forte o cado nas gravuras românticas Série: desastres de guerra
desenho é realizado diretamente com um estilete sobre - chapas selecionadas: Enterrar e calar; E não há remédio;
a placa de cobre envernizado, que, depois de ser mergu- Estragos da guerra; O mesmo. A utilização de mídias para
lhado em ácido, ganha relevo para impressão. questionar o mundo tem sido fortemente ressignificada
na contemporaneidade, por força da grande velocidade
Para criar a série “Os desastres da Guerra”, Goya de 13 informações que permeia a sociedade. Nesse senti-
utilizou uma derivação da técnica da água-forte, que ele do, aponta-se a Plataforma de Geoprocessamento da Fu-
havia conhecido anos antes: a técnica da água-tinta. Ta- nai, que não só facilita a velocidade da informação, como
vares (2004) explica a grande vantagem dessa técnica: permite pesquisa refinada de dados. Também é exemplo
[...] “através da aplicação de camadas de pós granulosos, se disso o canal do jovem Cristian Wariu, sobretudo em seu
conseguiam obter superfícies homogéneas de cinzentos com primeiro vídeo Povos indígenas do Brasil no qual se iden-
uma textura rugosa, ou «manchas zonais» que separavam a tifica como descendente de uma das etnias pré-cabralinas
cena em várias amplitudes de luz. Nos Desastres da Guerra, e discute a importância de que essas etnias sejam enten-
contudo, Goya abandona estas potencialidades que tanto o didas pelo resto da sociedade. A obra audiovisual Preci-
haviam fascinado e opta por um desenho ainda mais directo samos romper com os silêncios (Djamila Ribeiro - TEDx-
e livre sobre a própria chapa, que recobre de marcas e riscos SaoPauloSalon 2016) também traz importantes reflexões
até enegrecer quase toda a composição, como se o seu es-
críticas acerca da estrutura social brasileira, ocidental-
tado de alma já não pudesse mais poupar ninguém – nem a
razão, nem os monstros” (TAVARES, 2004, p. 164 e 165). -cristã hegemônica e a marginalização de determinados
grupos sociais e étnicos. (Página 12, sexto parágrafo)


A formação ocidental do mundo contemporâneo

A pintura Independência ou morte (Pedro Améri-


Citações da Obra na Matriz de Referências co, 1888) é uma romantização de um fato, na medida em
que retrata uma realidade bem diferente do que ocorreu
O ser humano como um ser que pergunta e quer saber no processo de Independência do Brasil em 1822. Por ou-
tro lado, as gravuras Série Desastres de guerra: chapas
Questões relativas às diferentes concepções de
selecionadas Enterrar e calar; E não há remédio; Estragos
mundo, de ser humano e de conhecimento estão presen- da guerra; O mesmo (Goya) expõe de forma realista uma
tes em expressões artísticas de diferentes culturas e pe- crítica aos horrores da guerra ao presenciar as crueldades
ríodos históricos, como nas pinturas Maria Antonieta com ocorridas durante a invasão napoleônica à Espanha no
rosa (Le Brun, 1783), Roda de capoeira (Rugendas,1835), início do século XIX, conhecida como Guerra Peninsular.
Moema (Victor Meirelles, 1866), Independência ou mor- (Página 22, quinto parágrafo)
te (Pedro Américo, 1888), A redenção de Cam (Modesto
Brocos, 1895), assim como nas gravuras Enterrar e calar, Espaços
E não há remédio e Estragos da guerra, da série Os de-
sastres da guerra (Goya, 1810-1820). (Página 4, quarto Os eventos históricos, isto é, as guerras, avanços
parágrafo) territoriais e novos pensamentos, mudam as concepções
de espaço, território e destinação da obra artística que
Indivíduo, cultura e mudança social acabam por registrar essas mudanças, como pode ser
apreciado nas telas Independência ou morte (Pedro Amé-
Os avanços tecnológicos e científicos bem como o rico, 1888) e O juramento dos Horácios (Jacques-Louis
desenvolvimento de novas formas de pensamento e de or- David, 1784), nas gravuras da Série Desastres de guerra,
ganização política são importantes fatores para alterar o chapas selecionadas: Enterrar e calar; E não há remédio;
comportamento do indivíduo e sua relação na sociedade, Estragos da guerra O mesmo (Goya, 1810-20) e no com-
plexo arquitetônico da Igreja São Francisco de Assis de

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Ouro Preto (Aleijadinho e Ataíde, século XVII). (Página 29,


primeiro parágrafo)

Materiais

O estudo dos materiais e dos metais pode adqui-


rir relevância em diversos contextos, por exemplo, nas ar-
tes. A escultura O rapto de Prosérpina (Bernini), o comple-
xo arquitetônico da Igreja São Francisco de Assis de Ouro
Preto (Aleijadinho e Ataíde), as gravuras da Série Desas-
tres de guerra: Enterrar e calar; E não há remédio; Estra-
gos da guerra; O mesmo (Goya), a litogravura Jane Avril
(Toulouse-Lautrec), a pintura Noite estrelada (Van Gogh),
diferentes possibilidades de usos de materiais como már-
more, bronze, madeira, pedrasabão, pigmentos, entre ou-
tros, com propriedades distintas. Tanto obras de mármore
como de pedra são danificadas pela ação da chuva ácida,
causada pela emissão de óxidos de nitrogênio e enxofre
na atmosfera. (Página 30, terceiro parágrafo)

Questões, Justificativas e Dicas


Quer acessar as questões, justificativas e dicas desta obra?

Clique aqui ou use o QR CODE da página 6.

Anotações e Rascunhos

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Igreja São Francisco de Assis de Ouro
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Preto - Aleijadinho e Ataíde

Autores
Aleijadinho Por não ter o costume de assinar suas obras,
existe uma grande dificuldade para identificar o que de
Antônio Francisco Lisboa, conhecido como Alei- fato é obra de Aleijadinho, pois foram encontrados pou-
jadinho, nasceu em 29 de agosto de 1738 na antiga Vila cos documentos de seus trabalhos.
Rica, hoje Ouro Preto, Minas Gerais. Filho de um portu-
guês e de uma escravizada, seu interesse pela arte surgiu Em suas esculturas são encontradas característi-
quando ainda era criança, já que gostava de observar o cas do rococó. Apesar disso, é considerado barroco. Al-
trabalho de seu pai como entalhador e escultor. Teve au- gumas das características de suas esculturas são: grande
las de artes com os portugueses João Gomes Batista e expressividade, nariz proeminente, boca entreabertas,
Francisco Xavier de Brito. braços curtos e queixo dividido. As fachadas das igrejas
onde trabalhou são retilíneas e a decoração é marcada
Frequentou o internato do Seminário dos Fran- por dourados e detalhes como querubins.
ciscanos Donatos do Hospício da Terra Santa entre os
anos de 1750 e 1759, estudando latim, matemática, gra- Ataíde
mática, música e religião.
O pintor Manuel da Costa Ataíde nasceu no dia
Seu primeiro projeto individual foi um chafa- 18 de outubro de 1762 em Mariana, Minas Gerais. Não
riz para o Palácio dos Governadores de Ouro Preto, em se sabe muito sobre sua infância, formação artística e
1752. Quatro anos depois, viajou para o Rio de Janeiro, realizações pessoais, mas sabe-se que Ataíde seguiu os
conhecendo diversas obras arquitetônicas que influen- cânones da igreja católica com base nas gravuras dos li-
ciariam seu trabalho no futuro. Por ser filho bastardo de vros sagrados.
pai português, o artista encontrou muitas dificuldades
para ser valorizado nos seus primeiros anos de ofício. Não se restringiu somente à pintura. Entre seus
trabalhos podemos encontrar atividades de douramento
Esculpiu, em 1758, um chafariz para o Hospí- e encarnação (técnica que objetiva imitar aspectos do
cio da Terra Santa, que foi considerado posteriormente corpo humano) de imagens, pinturas de painéis, pintu-
a primeira obra do estilo barroco tardio. Em 1766 ter- ras decorativas em forros de igrejas e trabalhos em ta-
minou parte da Igreja São Francisco de Assis, em Ouro lhas. Suas primeiras obras conhecidas datam de 1781,
Preto, esta foi considerada uma de suas maiores obras. quando dourou diversas estátuas de Aleijadinho.
Em 1768 alistou-se no Regime da Infantaria dos Homens
Pardos de Ouro Preto, prestando serviço militar pelos Ataíde era militar, e em 1797 assumiu o posto
três anos seguintes. Entre 1770 e 1790 fez alguns repa- de sargento da Companhia de Ordenança do Distrito do
ros na igreja. Arraial do Bacalhau. Dois anos depois atingiu o posto de
alferes na Companhia do Distrito de Mombaça.
Por volta de 1778, começou a desenvolver uma
doença degenerativa nas articulações, e aos poucos co- Iniciou os trabalhos na Igreja da Ordem Tercei-
meçou a perder os movimentos dos pés e das mãos. A ra de São Francisco de Assis, Ouro Preto, em 1801. Lá
essa altura, já tinha uma equipe de artesãos que traba- realizou a pintura de seis painéis que imitam azulejos.
lhavam com ele. Sendo assim, continuou o seu trabalho O tema desses painéis era a vida de Abraão. Em 1806
com ajuda dos auxiliares. Recebeu o apelido de Aleijadi- pintou o forro da capela-mor da Igreja Matriz de Santo
nho no início dos anos 1790. Antônio, em Santa Bárbara.

Continuou trabalhando na construção de igrejas Trabalhou na decoração de igrejas e painéis. Sua


e altares das cidades de Minas Gerais. Em 1796 concluiu obra mais famosa é a pintura do teto da igreja de São
64 esculturas de madeira que representam cenas da Pai- Francisco de Assis em Ouro Preto, que também foi em
xão de Cristo. Anos mais tarde, finalizou 12 esculturas parceria com Aleijadinho.
dos profetas. Em 1818 recebeu da Câmara Municipal um ates-
Aleijadinho morreu pobre e abandonado no ano tado de professor das artes da arquitetura e da pintura,
de 1814. O artista que hoje é considerado o mais impor- posteriormente no mesmo ano requereu a criação de
tante do Barroco Mineiro utilizou como material de suas uma escola de belas-artes em Mariana, sua cidade. O ar-
obras principalmente a pedra-sabão. A madeira também tista faleceu em 2 de fevereiro de 1830, aos 67 anos de
foi muito utilizada pelo artista. Sua primeira biografia foi idade. Foi um dos principais artistas do barroco-rococó
escrita em 1858 por Rodrigo José Ferreira Bretas. Sua mineiro.
vida e obra atraiu artistas modernistas brasileiros e his-
toriadores estrangeiros.

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Fachada da Igreja de São Francisco de Assis. Internet: <www.tourouropreto.


com.br> Escultura da fachada da Igreja de São Francisco de Assis. Internet: <pt.
wikipedia.org>

Igreja São Francisco de Assis Ouro Preto. Internet: <www.tourouropreto.


com.br>

Frontão da Igreja de São Francisco de Assis. Internet: <pt.wikipedia.org>

Contexto
Durante a primeira metade do século XVIII, em
Minas Gerais as construções religiosas eram, sobretudo,
de igrejas paroquiais. Com o intuito de evitar o contra-
bando de ouro, o governo impôs que somente os padres
que prestavam assistência aos paroquianos poderiam
permanecer na capitania. Alguns padres se juntaram e
criaram confrarias e irmandades, aumentando o número
de construções religiosas. Na segunda metade do século,
graças ao ouro, surgiram ricas construções religiosas em
pedra e alvenaria.
O barroco no Brasil surgiu um século depois do
surgimento do barroco na Europa. O barroco brasileiro
é claramente associado à religião católica. Nesse perío-
do foram construídas inúmeras igrejas. Uma das carac-
terísticas do barroco é o excesso de ornamentos, e nas
regiões de mineração foram realizados trabalhos em re-
levos na madeira cobertos por finas camadas de ouro.
Os maiores representantes do barroco brasileiro foram
Teto da Igreja de São Francisco de Assis. Internet: <www.viagemdeaaz.
com> Aleijadinho (na escultura) e Mestre Ataíde (na pintura).
É comum encontrar as expressões “barroco tar-
dio” e “barroco mineiro” em descrições do trabalho de
Aleijadinho.

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Obra Esculturas encravadas na estrutura


A Igreja São Francisco de Assis de Ouro Preto é Logo na fachada da igreja, é possível ver me-
considerada uma das raras construções em que o proje- dalhões com anjos e fitas esculpidos em pedra-sabão.
to, talha e esculturas são de responsabilidade do mesmo Nas pilastras de capitel compósito se assentam anjos,
artista: Aleijadinho1. Foi erguida pela Ordem Terceira de ladeando dois medalhões com armas franciscanas e do
São Francisco de Assis. Considerada um marco da tercei- Reino de Portugal. Mais acima está um medalhão orna-
ra fase do barroco mineiro, a construção apresenta ca- do com faixas e guirlandas que ostenta a imagem da Vir-
racterísticas próximas ao rococó. A arquitetura da igreja gem Maria. Há também um grande relevo, instalado no
se destaca por seu trabalho artístico singular. local do tradicional óculo, que representa São Francisco
recebendo os estigmas do Cristo.
A capela-mor (capela principal de uma igreja) foi
o primeiro ponto da construção, seguido pelo altar-mor, Na abóboda há medalhões com figuras em rele-
que foi erguido entre 1790 e 1794. Na sequência foi vo de Santo Antônio de Pádua, Santo Ivo, São Boaventu-
construída a fachada e o frontispício, cuja portada apre- ra e São Conrado. O retábulo, estrutura de madeira com
senta um medalhão (moldura circular) com anjos e fitas lavores, é formado com várias figuras, incluindo anjos. É
esculpidos em pedra-sabão, obra de Aleijadinho. A pin- importante ressaltar que os púlpitos, portadas e lavató-
tura do teto da nave (ala central da igreja), dos painéis rios são apontados como as maiores obras de escultura
da capela-mor, nave, o douramento e pintura da talha da em pedra sabão.
capela-mor tiveram início em 1801, só sendo concluídos
em 1812 pelo Mestre Ataíde.

Arquitetura
A planta baixa rompe com os padrões baseados
nas fachadas planas. Traz elementos do rococó, além do
barroco italiano e português. Nave e coros (área reser-
vada ao clero) são retangulares e as passagens laterais

Citações da Obra na Matriz de Referências
O ser humano como um ser que pergunta e quer saber

O conhecimento se apresenta sob formas diver-


sas, como é possível perceber na Igreja São Francisco de
levam à sacristia.A fachada e as duas torres laterais re-
presentam uma tendência à dualidade. Os arranjos do Assis de Ouro Preto: estrutura arquitetônica, pintura do
vão ligam uma torre à outra e, consequentemente, as teto e esculturas encravadas na estrutura, (Aleijadinho e
duas torres até a fachada. Dentro da igreja há quatro ja- Ataíde, século XVII), na aquarela Anartia Olivacea (José
nelas do coro, que ajudam a projetar a luz em direção ao Joaquim Freire, século XVIII), na litografia Jane Avril (Tou-
teto da nave central. louse-Lautrec, 1899) e na fotografia Atrás da estação
Saint Lazare (Cartier-Bresson, 1932), expressando aspec-
Pintura do teto tos de complexidade nas representações da realidade.
(Página 6, terceiro parágrafo)
O teto da Igreja de São Francisco foi pintado en-
tre 1801 e 1812. Mestre Ataíde utilizou uma técnica de- Estruturas
nominada “trompe l’oeil’, que foi criada pelo padre An-
Seguindo o caminho inverso, os artistas mineiros
dre Pozzo. Essa técnica estabelece um jogo com colunas
Aleijadinho e Mestre Ataíde fazem da Igreja São Francis-
e parapeitos ao redor da igreja. Isso cria a ilusão de que o co de Assis de Ouro Preto a possibilidade de elevação dos
teto se projeta para o infinito, assim como o céu. pensamentos à divindade, por meio da apreciação de uma
O forro, de altura aproximada de 12 m do chão obra humana, que representa o divino. As artes visuais
foi pintado com material importado de Portugal. Entre são as que mais concretamente deixam perceber que o
as cores utilizadas estão o branco de chumbo, azul da domínio da estrutura transparece a maestria do trabalha-
dor. Nesse sentido, a obra pode ter caráter realista, como
Prússia, vermelhão, amarelo ouro, preto de carvão vege-
a representação da Independência do Brasil, na pintura
tal e verde-gris. A principal técnica utilizada é a têmpera
histórica Independência ou Morte (Pedro Américo), ou em
em fundo branco, com aplicação de camada de verniz Moema (Victor Meirelles). Na representação realista, a in-
oleoso. tenção é que o fruidor da arte sinta-se genuinamente na
Ataíde apresenta uma glorificação de Nossa Se- situação retratada, como se fosse testemunha ocular da
nhora da Porciúncula cercada de anjos músicos. A vir- cena. (Página 11, quarto parágrafo)
gem é retratada com traços de mulata, contribuindo Energia e oscilações
para uma estética voltada à realidade nacional. À época,
isso foi inovador, já que Jesus e Maria sempre foram re- Assim, a entrevista do cientista Edgar Dutra
tratados como brancos. Zanotto: um olho na ciência, outro na indústria (Revis-
ta Fapesp, edição 269 - julho de 2018), especialista em
1 Igreja São Francisco de Assis. Disponível em: <http://mon- vidros, cita a revolução causada por esses instrumentos
dego.com.br/igreja-sao-francisco-de-assis/> capazes de desvendar fenômenos, até então impossíveis

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de serem vistos a olho nu, possibilitando novas interpreta- Questões, Justificativas e Dicas
ções dos fenômenos físicos. É comum caracterizar o vidro
como um corpo sólido, porém isso pode ser desmistificado Quer acessar as questões, justificativas e dicas desta obra?
ao analisar os vidros de igrejas seculares, como a Igreja
São Francisco de Assis de Ouro Preto: estrutura arquite- Clique aqui ou use o QR CODE da página 6.
tônica, pintura do teto e esculturas encravadas na estru-
tura (Aleijadinho e Ataíde, século XVII), na qual fica evi- Anotações e Rascunhos
dente que os vidros são mais espessos na base, pois, como
um líquido, escorreram, fluindo lentamente para a base
com o passar dos séculos. (Página 16, segundo parágrafo)

Número, grandeza e forma

Conceitos matemáticos, tais como: geometria


dos corpos curvos (cilindros, cones e esferas); figuras pla-
nas criadas a partir de interseções de um plano com cor-
pos curvos (principalmente, os conceitos das cônicas); e o
princípio de Cavalieri na comparação de volumes podem
ser observados no artigo O rompimento da barragem de
Mariana e seus impactos socioambientais, de Luciano M.
N. Lopes e na Igreja São Francisco de Assis de Ouro Pre-
to: estrutura arquitetônica, pintura do teto e esculturas
encravadas na estrutura, de Aleijadinho e Ataíde, século
XVII. Nesta Igreja, pode-se observar a relação entre as
partes e o conjunto, o modo como elas estão articuladas
e a estrutura interna das imagens. Destacam-se marcas
como contrastes e semelhanças, variações formais, inter-
valos, pausas e interrupções, agrupamentos. (Página 24,
terceiro parágrafo)

Espaços

Os eventos históricos, isto é, as guerras, avanços


territoriais e novos pensamentos, mudam as concepções
de espaço, território e destinação da obra artística que
acabam por registrar essas mudanças, como pode ser
apreciado nas telas Independência ou morte (Pedro Amé-
rico, 1888) e O juramento dos Horácios (Jacques-Louis
David, 1784), nas gravuras da Série Desastres de guerra,
chapas selecionadas: Enterrar e calar; E não há remédio;
Estragos da guerra O mesmo (Goya, 1810-20) e no com-
plexo arquitetônico da Igreja São Francisco de Assis de
Ouro Preto (Aleijadinho e Ataíde, século XVII). (Página 29,
primeiro parágrafo)

Materiais

O estudo dos materiais e dos metais pode adqui-


rir relevância em diversos contextos, por exemplo, nas ar-
tes. A escultura O rapto de Prosérpina (Bernini), o comple-
xo arquitetônico da Igreja São Francisco de Assis de Ouro
Preto (Aleijadinho e Ataíde), as gravuras da Série Desas-
tres de guerra: Enterrar e calar; E não há remédio; Estra-
gos da guerra; O mesmo (Goya), a litogravura Jane Avril
(Toulouse-Lautrec), a pintura Noite estrelada (Van Gogh),
diferentes possibilidades de usos de materiais como már-
more, bronze, madeira, pedrasabão, pigmentos, entre ou-
tros, com propriedades distintas. Tanto obras de mármore
como de pedra são danificadas pela ação da chuva ácida,
causada pela emissão de óxidos de nitrogênio e enxofre
na atmosfera. (Página 31, terceiro parágrafo)

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Roda de Capoeira - Rugendas

Autor
Johann Moritz Rugendas nasceu em 29 de mar- Ficha Técnica
ço de 1802, na cidade de Augsburgo, Alemanha. Seu pri-
meiro contato com a arte veio de seu pai, que era pintor, Título: Roda de Capoeira/Danse de la guerre/Jogar ca-
gravador e professor na escola de desenho de Augsbur- poeira
go. O artista frequentou a Academia de Belas Artes de Autor: Johann Moritz Rugendas
Munique, onde ingressou em 1817 e teve aulas com Al- Ano de produção: 1835
brecht Adam. Técnica: Litografia aquarelada
Tema: Usos e costumes dos negros no período imperial
Foi convidado pelo Barão Georg Heinrich Von
Langsdorff a integrar uma missão científica para o Brasil.
No ano de 1821, chegou em território brasileiro. Rapi-
Capoeira
damente se desligou da expedição e viajou pelo interior A capoeira é uma manifestação cultural que
do Brasil coletando materiais para suas pinturas e dese- pode ser considerada um esporte, luta e/ou dança. Essa
nhos. Com esse material, produziu desenhos e aquarelas expressão cultural foi desenvolvida no Brasil no século
que retratam paisagens, costumes e a diversidade da po- XVI por descendentes de escravos africanos, e surgiu
pulação brasileira. como forma de resistência. Nesse período, muitos afri-
canos foram trazidos ao Brasil como escravos para traba-
Dos anos de 1831 a 1834, o artista viajou pelo lharem nos engenhos de cana-de-açúcar, nas fazendas,
México, e nesse período começou a utilizar a pintura a e na casa dos senhores. Diante dessa situação, aos pou-
óleo. Em 1835 publicou na França um livro sobre o Brasil cos perceberam a necessidade de criar uma forma de se
do início do século XIX com o título de “Viagem pitoresca defenderem da violência dos colonizadores, já que eram
através do Brasil”. Esse livro contém mais de cem dese- constantemente maltratados e violentados. Logo, viu-se
nhos. a necessidade de criar uma técnica de defesa e ataque, a
Mais tarde voltou para América Latina, passan- fim de que os negros pudessem utilizar seu próprio cor-
do pelo México, Chile, Argentina, Bolívia, Peru e Uruguai. po para confrontar seus adversários.
Em 1847 voltou ao Brasil, onde permaneceu por mais Para que ninguém suspeitasse, tendo em vista
dois anos. Nesse período, participou das Exposições Ge- que os escravizados eram proibidos de praticar qualquer
rais da Academia Imperial de Belas Artes, no Rio de Ja- tipo de luta, estes decidiram adaptar o ritmo e movimen-
neiro e retratou membros da família imperial. Mais tar- tos das danças africanas para criar uma nova luta. Surgiu
de, Rugendas publicou novas memórias de suas viagens então a capoeira, que é, na realidade, uma arte marcial
e transformou os desenhos e aquarelas em litografias. O disfarçada de dança. Os confrontos costumavam aconte-
artista faleceu em 29 de maio de 1858. cer nas fugas, geralmente em matas grandes e capoeiras,
Em 1969 o Museu da Imagem e do Som realizou e é desses locais que se originou o nome da luta.
uma exposição sobre a obra de Rugendas. O artista acre- Mesmo após a abolição, os praticantes da ca-
ditava que a pintura deveria registrar ao mesmo tempo poeira continuaram sofrendo perseguições, pois a luta
todos os aspectos de uma paisagem, como a topografia, era vista como uma prática extremamente violenta. Em
população, fauna e flora. 1890, a capoeira foi considerada “fora da lei” pelo anti-
go Código Penal, que estabelecia a pena de dois a seis
meses de reclusão a quem a praticasse nas ruas ou em
praça pública.
Em 1937, um grupo de capoeira fez uma apre-
sentação ao então presidente Getúlio Vargas, que este
transformou a luta em esporte nacional. No mesmo ano
a capoeira foi extinguida do rol de crimes do Código Pe-
nal Brasileiro.

Obra
A obra “Roda de Capoeira”, também conhecida
Roda de Capoeira. Internet: <naçõesunidas.org>
como “Jogar Capoeira” ou “Dança da guerra” (danse
de la Guerre), é um dos primeiros registros que se tem
sobre a capoeira. As obras de Rugendas sempre foram

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grandes fontes de pesquisa para a história da escravidão, te (Pedro Américo, 1888), A redenção de Cam (Modesto
do negro e do Brasil durante o período do Império. Brocos, 1895), assim como nas gravuras Enterrar e calar,
E não há remédio e Estragos da guerra, da série Os de-
Nessa tela de 1835, que é fruto da sua segunda sastres da guerra (Goya, 1810-1820). (Página 4, quarto
vinda ao Brasil, são apresentadas doze pessoas negras, parágrafo)
sendo nove homens e três mulheres. Todos estão des-
calços, subentendendo então que são escravos. No cen- Indivíduo, cultura e mudança social
tro da tela, dois homens jogam capoeira ao som de um
tambor. Compreender as origens da manifestação artísti-
ca Capoeira faz pensar sobre a construção da identidade
O cenário é um pátio colonial, ao fundo de uma de um grupo e suas relações com o ambiente. O surgimen-
grande casa (que também pode ser interpretado como to dessa manifestação exige a análise da condição social
três casas). Atrás dessas casas é possível ver morros. O do povo negro no Brasil durante a escravidão e depois
terreno está descampado, o que, segundo Lussac (2013), dela. Por sua vez, a pintura Roda de Capoeira (Rugendas)
“demonstra a possibilidade de se tratar de área urbana e a manifestação cultural Carimbó permitem, também,
devido ao desmatamento da vegetação original”. Pela reflexões acerca dessa temática. O discurso musical tam-
bém pode ser uma forma de crítica aos valores sociais e de
prática da capoeira e o período da obra, supõe-se que
classe. Isso pode ser observado na canção Inclassificáveis
a cena foi retratada no Rio de Janeiro. Os capoeiristas
(interpretada por Ney Matogrosso) cuja temática central
jogam em chão de terra batida. é a formação do povo brasileiro e todo o significado de
A mulher da extrema direita parece ser uma uma identidade marcada pela miscigenação. As reflexões
vendedora de fruta da terra. No centro da imagem estão sobre esse processo e, também, de embranquecimento
da população são apresentadas na pintura A redenção de
duas mulheres, sendo que uma mexe uma panela, a par-
Cam (Modesto Brocos). (Página 7, quarto parágrafo)
tir desta descrição, o espectador é conduzido a acreditar
que ela é uma cozinheira. Uma quarta mulher aparece Tipos e gêneros
na tela como quem está assistindo ao jogo.
Sob a perspectiva das artes visuais, “Tipos e gê-
Ao lado da cozinheira, é possível ver um homem neros” podem ser compreendidos ao se analisar fatores
em pé que segura um chapéu, sugerindo, segundo Lus- como sexualidade, moral, conceitos de beleza, religiosi-
sac (2013), um gesto de saudação ou agradecimento à dade, fé e sociedade, nos gêneros histórico, paisagem e
mulher, que lhe entrega uma cumbuca. retrato. Os elementos da linguagem visual estabelecem
uma relação direta com o contexto e o tema das obras,
Do lado esquerdo de quem vê o quadro, há um como expressam a escultura O rapto de Prosérpina (de
homem de cartola e braços levantados como quem está Bernini), representando um amor não correspondido; a
torcendo e aproveitando o jogo/dança. Próximo ao co- pintura O juramento dos Horácios (de Jacques Louis-Da-
queiro estão três homens: um que toca o tambor, outro vid), representando a moral cívica; a pintura Moema (de
que parece estar torcendo, e o último, que parece estar Victor Meirelles), representando a desilusão amorosa en-
tenso com o desenrolar do jogo. Os dois jogadores apa- tre diferentes raças; a aquarela Roda de capoeira (de Ru-
recem em posição de luta com os punhos cerrados. gendas), representando a influência da cultura africana
no Brasil; e a participação da mulher na vida social pode
ser conferida no quadro Maria Antonieta com rosa (Le
Litografia Brun) e na própria vida da pintora. (Página 11, terceiro
Litogravura é um tipo de gravura feita sobre a parágrafo)
matriz, geralmente de pedra calcária ou placa de metal, A formação do mundo ocidental contemporâneo
com um lápis gorduroso. Essa técnica utiliza o princípio
de repulsão entre a água e o óleo. Com isso, o desenho é Esses elementos de resistência da população
feito por meio do acúmulo de gordura sobre a superfície afro-brasileira estão presentes na pintura Roda de Ca-
da matriz. poeira (Johann Moritz Rugendas, 1835) e na própria Ca-
poeira enquanto manifestação social, política e cultural,


contrariando as representações históricas tradicionais re-
lacionadas à ideia de passividade dos negros brasileiros
diante de contextos e situações de opressões e violências.
Citações da Obra na Matriz de Referências Pode-se observar essa resistência também no Carimbó.
(Página 22, terceiro parágrafo)
O ser humano como um ser que pergunta e quer saber
Número, grandeza e forma
Questões relativas às diferentes concepções de
mundo, de ser humano e de conhecimento estão presen- Na matemática, aplicam-se modelos para a reso-
tes em expressões artísticas de diferentes culturas e pe- lução de problemas. Um dos modelos tratados refere-se
ríodos históricos, como nas pinturas Maria Antonieta com a problemas cujas variáveis estão relacionadas por um
rosa (Le Brun, 1783), Roda de capoeira (Rugendas,1835), sistema de equações lineares. Em relação a esses mode-
Moema (Victor Meirelles, 1866), Independência ou mor- los, destaca-se a classificação dos sistemas lineares, sua

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resolução e os conceitos de dependência e independên-


cia linear de equações. É importante enfatizar também
a representação gráfica no plano cartesiano, tanto das
equações, quanto das soluções, no caso de sistemas bidi-
mensionais, bem como a representação matricial. Alguns
desses modelos podem ser abstraídos das pinturas Roda
de Capoeira (Rugendas) e Independência ou morte (Pedro
Américo) que representam de forma tridimensional, isto
é, com perspectiva, em meio bidimensional. (Página 24,
sétimo parágrafo)

Espaços

Na formação do espaço geográfico brasileiro, ob-


serva-se a constituição de focos de resistência e afirmação
de escravos, ex-escravos e indígenas. Exemplos dessa for-
mação estão na pintura Roda de capoeira (Rugendas), na
Plataforma GeoProcessamento da Funai e nas manifesta-
ções de cultura popular tais como Capoeira e Carimbó que
carregam influências africanas e indígenas que estão evi-
denciadas nas coreografias e na dramaticidade e gestua-
lidade dos brincantes, além de representar a diversidade,
no que se refere às suas fronteiras geográficas, culturais e
econômicas. (Página 28, terceiro parágrafo)

Estabelecendo uma comparação entre Brasil e


Europa, percebe-se que, enquanto aquele continente já
se encontrava na Segunda Revolução Industrial, entran-
do no capitalismo monopolista e desenvolvendo novas
tecnologias de produção e de fontes energéticas, o Brasil
permanecia tecnicamente atrasado, com uma economia
agroexportadora e sob o poder de uma aristocracia rural
e escravagista. Reflexões acerca dessas temáticas podem
ser elucidadas na pintura Roda de capoeira (Rugendas) e
no texto Úrsula (Maria Firmina dos Reis) que, por meio de
descrições detalhadas das senzalas e da problematização
dos espaços de convivência entre negros e brancos, con-
tribui para refletir sobre a tensão social existente nessa
época. (Página 28, quinto parágrafo)

Materiais

Manifestações de tradições populares como o


Carimbó e a Capoeira trazem, nos materiais sonoros, re-
flexos das diferentes formas de relação do homem com
o ambiente, gerando identidades culturais e de pertenci-
mento. Essas reflexões podem ser notadas na obra Roda
de capoeira (Rugendas). (Página 31, primeiro parágrafo)

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Moema - Victor Meirelles

Autor
Victor Meirelles de Lima nasceu em Nossa Se- Ficha Técnica
nhora do Desterro, atual Florianópolis, em 18 de agosto
de 1832. Filho do imigrante português Antônio Meirelles Título: Moema
de Lima e da brasileira Maria da Conceição, Victor foi Ano de produção: 1866
pintor, desenhista e professor. Técnica: óleo sobre tela
Dimensões: 129 x 190
Desde cedo demonstrou seu gosto por desenho, Acervo: Museu de Arte de São Paulo (MASP), Brasil
já que gostava de ficar pintando paisagens. Estudou fran-
cês, filosofia e latim. Aos 13 anos, começou seus estudos
artísticos com Marciano Moreno. Mudou para o Rio em
Contexto
1847 para estudar na Academia Imperial de Belas Artes. Após a independência em 1822, a construção da
Estudou desenho por dois anos, até que em 1849 co- identidade nacional tornou-se uma preocupação do Es-
meçou a estudar “pintura histórica”. Em 1853 vai para a tado, e para isso, a história teve um papel primordial. O
Itália após ganhar uma viagem como prêmio. Em Roma passado, reconstruído de maneira intelectual, torna-se
teve aulas com Tommaso Minardi e Nicola Consoli. uma importante fonte de legitimação do novo regime.

Entre 1853 a 1861 viveu na Europa. Em 1857 ma- Desde os anos 1830, começou a ser forjada a
triculou-se na École des Beaux-Arts. Sua primeira grande ideia da inevitabilidade e mesmo da originalidade da
obra “Primeira Missa no Brasil” foi feita enquanto esta- mestiçagem. Inaugurava-se, portanto, uma linha de
va na França. Retornou ao Brasil no ano de 1861, e em interpretação do Brasil, que começou com o romantis-
seguida foi nomeado professor de pintura histórica na mo, atravessou o evolucionismo e o positivismo, cruzou
Academia onde estudou. o modernismo, com Gilberto Freyre, e vem até os dias
atuais: o pensamento de que o Brasil é essencialmente
Moema, uma das obras mais conhecidas de um país mestiço.
Meirelles, foi pintada após o artista voltar ao Brasil. Foi
condecorado por D. Pedro II com o grau de Cavaleiro da A importância dessas ideias no projeto de iden-
Imperial Ordem de Cristo e da Imperial Ordem da Rosa. tidade nacional e a sua repercussão entre os artistas da
Em 1868 recebeu uma encomenda de dois quadros his- época podem explicar as outras formas de representa-
tóricos ligados à Guerra do Paraguai. Por isso, Meirelles ção do índio e do negro, especialmente na litografia e na
se deslocou para a região do conflito e ali passou seis fotografia.
meses. Produziu muitas encomendas da família imperial.

Em 1885 começou a dedicar seu tempo à pin-


Academicismo no Brasil
tura de panoramas. O primeiro deles foi exposto em O termo academicismo nas artes se refere à pin-
Bruxelas. O artista teve um papel muito importante na tura ou escultura criada segundo as normas de uma aca-
formação de vários artistas que passaram pela Acade- demia, que são instituições que conferem caráter oficial
mia Imperial de Belas Artes. Victor Meirelles deixou um aos princípios estilísticos de um determinado período.
extraordinário acervo, minuciosos esboços, estudos em Esse movimento caracterizou a produção artística du-
papel e óleos sobre tela. Faleceu em 22 de fevereiro de rante a segunda metade do século XIX, e foi inspirado no
1903, no Rio de Janeiro. Ao pintar suas obras, Victor ti- neoclassicismo europeu.
nha preferência por retratos, temas históricos e bíblicos.
Em 1816 a Missão Artística chegou ao Brasil para
implementar um modelo institucionalizado de produção
artística. Embora liderasse um movimento que buscasse
a formação de novos artistas, os franceses traziam consi-
go as influências do neoclassicismo europeu. Por conse-
quência, essa influência seria refletida nos trabalhos dos
novos artistas mediante a criação da Academia Imperial
de Belas Artes, no Rio de Janeiro. Entre os principais
artistas desse movimento estão Pedro Américo e Victor
Meirelles.

Moema. Internet: <pt.wikipedia.org>

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Obra Brocos, 1895), assim como nas gravuras Enterrar e calar,


E não há remédio e Estragos da guerra, da série Os de-
“Moema” é extraída do poema épico “Cara- sastres da guerra (Goya, 1810-1820). (Página 4, quarto
muru”, de José de Santa Rita Durão. A índia, que estava parágrafo)
apaixonada por Diogo Álvares Correio, o Camuru, se atira
na água e nada atrás da embarcação ao vê-lo voltar à Indivíduo, cultura e mudança social
Europa. Ao perder suas forças, Moema se afoga. A tela
retrata o momento em que a maré deposita na praia a A participação da mulher na política ou na vida
índia sem vida. social de forma pública, pode ser percebida em obras
como O rapto de Prosérpina (Bernini), Maria Antonieta
Em 1866, Victor Meirelles expôs a sua pintura de Moema. com rosa (Le Brun), Jane Avril (Lautrec), Moema (Victor
Não é uma cena de Caramuru, mas sim o que poderia ter Meirelles), Úrsula (Maria Firmina dos Reis), Precisamos
ocorrido à indígena depois de ela “sorver-se n’água”; o pintor romper com os silêncios - TEDxSaoPauloSalon (Djamila
a retratou na praia: uma imagem “ideal”. Moema écuma das Ribeiro), Cota não é Esmola (Bia Ferreira) e Maria da Vila
obras mais sugestivas de Meirelles. Uma pintura que renova Matilde (Elza Soares) que trata da necessidade da desna-
a tradição dos nus horizontais e, ao mesmo tempo, transgri- turalização da violência, permitindo um diálogo sobre a
de a fábula épica de Caramuru, conferindo à personagem se- Lei Maria da Penha. (Página 7, quinto parágrafo)
cundária um protagonismo inédito e perturbador. (MIYOSHI,
2008)
Tipos e gêneros

Moema ligou-se ao imaginário brasileiro como Sob a perspectiva das artes visuais, “Tipos e gê-
neros” podem ser compreendidos ao se analisar fatores
uma espécie de símbolo, figura mítica que se confunde
como sexualidade, moral, conceitos de beleza, religiosi-
com a história. Por ser uma índia, personagem de um
dade, fé e sociedade, nos gêneros histórico, paisagem e
episódio épico de intenso drama e exaltado como cria-
retrato. Os elementos da linguagem visual estabelecem
ção “nacional”, ela logo foi transformada num importan-
uma relação direta com o contexto e o tema das obras,
te elemento nativista no século 19.
como expressam a escultura O rapto de Prosérpina (de
Nas artes brasileiras do oitocentos, uma quan- Bernini), representando um amor não correspondido; a
tidade expressiva de pinturas e esculturas foi produzida pintura O juramento dos Horácios (de Jacques Louis-Da-
com a temática indígena, numa diversidade igualmente vid), representando a moral cívica; a pintura Moema (de
expressiva. Moema nasceu nesse ambiente, no qual a Victor Meirelles), representando a desilusão amorosa en-
imagem idealizada do índio era também uma imagem da tre diferentes raças;a aquarela Roda de capoeira (de Ru-
nação, ou mais propriamente do Império. gendas), representando a influência da cultura africana
no Brasil; e a participação da mulher na vida social pode
Apesar de Moema ser uma personagem bastan- ser conferida no quadro Maria Antonieta com rosa (Le
te conhecida, ela não passava de uma imagem visual. Ou Brun) e na própria vida da pintora. (Página 11, terceiro
seja, Victor não representou uma cena existente no poe- parágrafo)
ma, mas sim o que poderia ter acontecido com a índia
Estruturas
após se afogar. Ela aparece nua e inerte na praia, virada
para cima, pernas juntas, braço estendido e mão sobre a Seguindo o caminho inverso, os artistas mineiros
barriga. Tudo isso em meio à natureza. Aleijadinho e Mestre Ataíde fazem da Igreja São Francis-
co de Assis de Ouro Preto a possibilidade de elevação dos
Diante disso, Victor cria uma sequência, apre-
pensamentos à divindade, por meio da apreciação de uma
sentando no canto da tela alguns índios que parecem
obra humana, que representa o divino. As artes visuais
querer resgatar o corpo de Moema. O dia parece estar
são as que mais concretamente deixam perceber que o
amanhecendo e o mar parece estar quieto.
domínio da estrutura transparece a maestria do trabalha-
dor. Nesse sentido, a obra pode ter caráter realista, como


a representação da Independência do Brasil, na pintura
histórica Independência ou Morte (Pedro Américo), ou em
Moema (Victor Meirelles). Na representação realista, a
Citações da Obra na Matriz de Referências intenção é que o fruidor da arte sinta-se genuinamente na
situação retratada, como se fosse testemunha ocular da
O ser humano como um ser que pergunta e quer saber cena. (Página 12, quarto parágrafo)
Questões relativas às diferentes concepções de Espaços
mundo, de ser humano e de conhecimento estão presen-
tes em expressões artísticas de diferentes culturas e pe- Os espaços de convivência e coletividade se for-
ríodos históricos, como nas pinturas Maria Antonieta com mam por questões sociais e econômicas, além das ques-
rosa (Le Brun, 1783), Roda de capoeira (Rugendas,1835), tões geográficas. A escultura O rapto de Prosérpina (Ber-
Moema (Victor Meirelles, 1866), Independência ou mor- nini) ilustra tais aspectos e remete aos mitos gregos como
te (Pedro Américo, 1888), A redenção de Cam (Modesto

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referência de organização dessas relações. As músicas


Maria da Vila Matilde (Elza Soares) e Cota não é esmola
(Bia Ferreira) permitem problematizar os espaços defini-
dos para cada grupo social, além de definir um espaço
que pode ser confrontado pelo protagonismo feminino.
Essas percepções estão presentes, também nas pinturas
Maria Antonieta com rosa (Le Brun) e Moema (Victor
Meirelles), na litogravura Jane Avril (Toulouse-Lautrec) e
na análise da Lei Maria da Penha, artigos 1º a 12-B – Lei
nº 11.340/2006. (Página 27, quarto parágrafo)

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Impressão, Nascer do Sol - Claude

Autor
Oscar-Claude Monet é um importante pintor
francês que nasceu em 14 de novembro de 1840, em Pa-
ris. Foi o fundador e líder do movimento impressionista
na França.

É considerado um dos principais pintores de pai-


sagem na história da arte. Após dois anos com o exército
na Argélia, ele foi a Paris estudar pintura. Em Paris, Mo-
net formou amizades duradouras com os artistas que se
tornariam os principais impressionistas, incluindo Pissar-
ro, Renoir, Sisley e Bazille.

Renoir e Monet começaram a pintar ao ar livre


juntos no final da década de 1860, lançando as bases do Impressão, Nascer do Sol. Internet: <warburg.chaa-unicamp.com.br>
impressionismo. Monet logo começou a se preocupar
com seu objetivo ao longo da vida: retratar as variações
de luz e atmosfera provocadas por mudanças de hora e
Ficha Técnica
estação. Em vez de copiar o Louvre, a prática tradicional Ano de produção: 1872
de jovens artistas, Monet aprendeu com seus amigos, Técnica: óleo sobre tela
com a própria paisagem e com as obras de seus contem- Dimensões: 48 x 63 cm
porâneos Manet, Corot e Courbet. Localização: Museu Marmottan, Paris, França
Em 1874, com Pissarro e Edgar Degas, Monet
ajudou a organizar a Société Anonyme des Artistes, Pein-
Contexto
tres, Sculpteurs, Graveurs, etc., nome formal do grupo A segunda metade do século XIX foi uma das
dos impressionistas. épocas mais fervilhantes da história da humanidade.
Em 1848, os movimentos revolucionários da França aba-
Em 1874, Sisley, Morisot e Monet organizaram o laram o mundo, renovando as concepções políticas de
primeiro espetáculo do grupo impressionista, ferozmen- todo o Ocidente. A Europa, na busca por novas matérias
te difamado pelos críticos. Foi um fracasso, financeira- primas para alimentar a segunda revolução industrial,
mente. No entanto, em 1883, Monet havia prosperado e começava o processo que denominamos de neocolo-
se retirou de Paris para sua casa em Giverny. nialismo, ou seja, a dominação colonial dos continentes
africano e asiático.
Em suas obras posteriores, Monet produziu di-
versas séries de estudos do mesmo objeto em diferen- Surgem novos sistemas filosóficos, cria-se uma
tes momentos do dia ou ano, dentre elas a célebre série nova literatura de denúncia (o Naturalismo), voltada
da Catedral de Rouen (1892-94). Na última década de para situações extremas da condição humana: a misé-
sua vida, Monet, quase cego, pintou um grupo de gran- ria, a degradação e o sofrimento. Inventam-se aparelhos
des murais de nenúfares (Nymphéas) para o Museu de que criariam toda uma nova civilização: o telégrafo, o
l’Orangerie em Paris. telefone e o cinematógrafo. Funcionando como centro
de catalisação e inovação da cultura ocidental, Paris é o
O trabalho de Monet está particularmente bem
mais trepidante núcleo intelectual da época.
representado no Museu do Louvre, em Paris, no Mu-
seu Marmottan Monet, também em Paris, na Nacional A nova concepção de mundo dos impressionistas
Gallery, em Londres, e no Instituto de Arte de Chicago. está ligada a dois fortes fatores. Um deles foi a invenção
Também consta em muitas coleções de arte particulares da fotografia, em meados do século XIX. A máquina foto-
famosas. gráfica ajudou a descobrir o encanto das cenas fortuitas
e do ângulo inesperado. Além disso, impeliu ainda mais
Monet conseguiu transformar o curso da arte e
os artistas em seu caminho de inovação e experimenta-
se tornar um dos pintores mais influentes e importantes
ção, uma vez que substitui a função utilitária da arte.
da historia da arte.
Também nessa época, os artistas ocidentais to-
mam contato com a arte japonesa, impressionando-se
com a delicadeza de seus desenhos e gravuras, a simplifi-

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cação das linhas e a transparência e suavidade das som- tura de tintas na paleta. Ou seja, as cores deveriam ser
bras. Acima de tudo, percebem que não é necessário o puras e dissociadas em pequenas pinceladas.
belo estar sempre preso a cânones estéticos rígidos, pois
estes determinam a criação artística. Assim, arte poderia Obra
resultar apenas da expressão livre do artista.
A obra “Impressão, Nascer do Sol” de Monet foi
exposta na primeira mostra coletiva dos impressionistas,
Impressionismo organizada no ateliê do fotógrafo Maurice Nadar, em
O movimento conhecido como Impressionismo 1874. No grupo original estavam Monet, Renoir, Sisley,
marcou a primeira revolução artística total desde a Re- Degas e Pissarro, que figuram alguns dos principais no-
nascença. Surgido na França no início dos anos 1860, na mes do movimento. No dia seguinte à inauguração, es-
sua forma mais pura só durou até 1886; apesar disso, de- creve o crítico Louis Leroy:
terminou o curso da maior parte da arte que se seguiu. “Impressão, Nascer do Sol -eu bem o sabia! Pensava eu, se
estou impressionado é porque lá há uma impressão. E que
O impressionismo se separa radicalmente da tra- liberdade, que suavidade de pincel! Um papel de parede é
dição rejeitando a perspectiva, a composição equilibra- mais elaborado que esta cena marinha Selvagens obstina-
da, as figuras idealizadas e o chiaroscuro (técnica claro- dos, por preguiça ou incapacidade, não querem terminar
-escuro que dá ênfase em certos elementos da pintura) seus quadros. Contentam-se com uns borrões que represen-
da Renascença. Em vez disso, os impressionistas repre- tam suas impressões. Farsantes! Impressionistas!”
sentam sensações visuais imediatas através da cor e da
luz. Ele cunhara a expressão “impressionista” para
definir este grupo, ainda sem nome, a partir do título da
Os impressionistas pintavam ao ar livre, sempre obra de Monet, de 1872 [“Impressão: Nascer do Sol”].
privilegiando a luz natural para registrar as tonalidades Por meio desse discurso, o artista queria expressar que
que os objetos adquiriam com a incidência da luz do sol esses pintores não trabalhavam com base num sólido co-
e as constantes alterações que essa luz produzia na na- nhecimento. Mas a expressão foi adotada pelos artistas,
tureza. Consideravam que todas as coisas eram dignas quase por desafio, nas exposições seguintes. A intenção
de serem pintadas, não somente retratos com figuras zombeteira foi ignorada conforme alcançaram reconhe-
humanas. cimento. Apenas na década de 80 é que os impressionis-
tas começaram a ser compreendidos pela crítica e pelo
Seu objetivo principal é apresentar uma “im- público.
pressão” ou as percepções sensoriais iniciais registradas
por um breve vislumbre. Para cumprir esse desafio, eles “Impressão: Nascer do Sol” é a pintura de um
criam uma pincelada distinta, curta e cortada. De perto, porto visto através das névoas matinais. Monet dá espe-
os borrões de cor pura dos impressionistas, lado a lado, cial preferência ao estudo ao vivo direto, experimental,
têm aparência ininteligível, levando os críticos a acusa- trabalhado de preferência às margens das águas. Dessa
rem-nos de não finalizar seus quadros. À distância, po- maneira, propõe representar da maneira mais imediata,
rém, o olho funde as cores e traços. com uma técnica rápida e sem retoques, a impressão lu-
minosa e a transparência da água e da atmosfera com
Os impressionistas procuraram retratar o mundo notas cromáticas puras, independentemente de qual-
de forma a mostrá-lo como algo vivo e mutável. Busca- quer gradação de chiaroscuro, deixando de utilizar o
vam uma expressão artística que refletisse as impressões preto para escurecer as cores na sombra.
da realidade, e não uma arte inclinada na razão ou emo-
ção.

Esteticamente, os impressionistas deram grande


importância à natureza como fonte de inspiração: seus
quadros fixam um determinado instante, onde se inter-
calam várias e sutis nuanças de luz e cor. As sombras es-
tariam dentro de um processo de múltiplas gradações.

Quanto ao tema, passam a buscar novas fontes



Citações da Obra na Matriz de Referências
O ser humano como um ser que pergunta e quer saber

Reflexões sobre a existência, o pensamento e o


sublime podem ser reconhecidas na escultura O rapto de
de inspiração para suas obras, deixando de lado os tra- Prosérpina (Bernini, 1621), assim como nas pinturas O ju-
dicionais temas mitológicos, imaginários e pitorescos da ramento dos Horácios (Jacques-Louis David, 1784) obras e
arte acadêmica. suas análises possibilitam identificar linguagens e traduzir
sua plurissignificação Impressão, nascer do sol (Monet,
As figuras não deveriam ter contornos nítidos, as 1872) e A noite estrelada (Van Gogh, 1889). (Página 4, pri-
sombras deveriam ser luminosas e coloridas, e as cores e meiro parágrafo)
tonalidades não poderiam ser obtidas por meio da mis-

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Indivíduo, cultura e mudança social ram a produção de ligas, vidros e criações de técnicas, de-
senvolvimento de suportes e outras formas de representa-
Os avanços tecnológicos e científicos bem como o ção da imagem, adequadas às novas tendências das artes
desenvolvimento de novas formas de pensamento e de or- visuais, à fotografia e à rapidez da execução. A análise
ganização política são importantes fatores para alterar o da fotografia Atrás da estação Saint Lazare (Cartier-Bres-
comportamento do indivíduo e sua relação na sociedade, son), da aquarela Anartia Olivacea (José Joaquim Freire),
além de refletir no fazer artístico. Esses e outros debates do óleo sobre tela Impressão nascer do sol (Monet) são
podem ser apreciados na tela neoclassicista O juramento exemplos de resultados desse desenvolvimento. (Página
dos Horácios (Jacques-Louis David), nas gravuras român- 31, quarto parágrafo)
ticas Série: desastres de guerra - chapas selecionadas: En-
terrar e calar; E não há remédio; Estragos da guerra; O Questões, Justificativas e Dicas
mesmo; (Goya), na tela impressionista Impressão sol nas-
cente (Monet), na tela pós-impressionista Noite estrelada Quer acessar as questões, justificativas e dicas desta obra?
(Van Gogh) e na fotografia de Saint-Lazare (Cartier-Bres-
son). (Página 8, primeiro parágrafo) Clique aqui ou use o QR CODE da página 6.

Energia e oscilações Anotações e Rascunhos


A relação da interferência visual da luz sobre o
pigmento é tratado nas pinturas impressionistas, como se
percebe na obra Impressão, nascer do sol (Monet). Na li-
teratura, o Simbolismo também aborda a relação cromá-
tica, como pode ser observado na obra O assinalado (Cruz
e Souza). Na música Mar de Brasília (Engels Espíritos) é
possível perceber o fenômeno da dispersão da luz. (Pági-
na 15, quarto parágrafo)

Número, grandeza e forma

É possível aplicar a trigonometria de triângulos


quaisquer, como pode ser apreciado na obra O juramento
dos Horácios (Jacques-Louis David). Por meio das funções
trigonométricas é possível identificar a localização exata
em que o pintor Monet executou Impressão nascer do sol.
(Página 25, segundo parágrafo)

Espaços

No mundo tecnológico-informacional, temos o


desenvolvimento do espaço virtual. Neste novo espaço
da virtualidade, estão reproduzidas as relações sociais
do mundo presencial, estabelecendo reflexões acerca de
desigualdades, como pode ser observado no Precisamos
romper com os silêncios - TEDxSaoPauloSalon,2016 (Dja-
mila Ribeiro), na fotografia Atrás da estação Saint Lazare
(Cartier-Bresson) e no documentário Parque Nacional da
Serra da Canastra. Também, essas novas tecnologias da
informação afetam percepções do sujeito a respeito de
aspectos do espaço, tais como: próximo - distante, gran-
de - pequeno, rural - urbano, centro - periferia, local - re-
gional, nacional - internacional. Essas noções de espaço
antes da tecnologia virtual podem ser apreciadas nas pin-
turas em óleo sobre tela como Impressão nascer do sol
(Monet), Noite estrelada (Van Gogh, 1889) e O juramen-
to dos Horácios (Jacques-Louis David, 1784). (Página 26,
quinto parágrafo)

Materiais

Com relação ao conhecimento e ao domínio dos


materiais, é importante destacar que eles proporciona-

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Independência ou Morte - Pedro

Autor
Pedro Américo de Figueiredo e Melo nasceu no
dia 29 de abril de 1843 na cidade de Areia, Paraíba. O
pintor, desenhista, professor, caricaturista e escritor teve
contato com a arte desde cedo. Com apenas 9 anos, foi
escolhido como desenhista auxiliar da missão científica
do naturalista francês Louis Jacques Brunet, que tinha
como objetivo estudar a flora e fauna do Nordeste do
Brasil.
Em 1855 mudou-se para o Rio de Janeiro para
estudar no Colégio Pedro II. No ano seguinte, matricu-
Independência ou Morte. Internet: <www.brainly.com.br>
lou-se na Academia Imperial de Belas Artes. Com uma
bolsa concedida pelo imperador Dom Pedro II, estudou
na École des Beaux-Arts, em Paris. Além de artes, estu- Ficha Técnica
dou filosofia, física e literatura. Durante sua estadia na Título: Independência ou Morte/ Proclamação da Inde-
França, Américo recebeu inúmeros prêmios e títulos, in- pendência
clusive dois prêmios da Academia de Belas Artes. Autor: Pedro Américo
Após uma breve viagem à Itália, voltou ao Rio Dimensões: 415 X 760 cm
de Janeiro e assumiu uma cadeira de desenho na Acade- Gênero: Pintura histórica
mia Imperial de Belas Artes, onde havia estudado antes. Tema: Proclamação da Independência
Mais tarde se tornaria professor na mesma instituição. Data da produção: 1888
Vai para Bruxelas, Bélgica, e obtém seu doutorado em Técnica: Óleo sobre tela
ciências físicas, em 1868. Localização: Museu Paulista da USP – antigo Museu do
Ipiranga
Em 1869 vai para Portugal e se casa com a filha
de seu antigo professor. No ano seguinte retorna ao Bra- Academicismo no Brasil
sil e reassume seu posto de professor na Academia Im-
perial. O termo academicismo nas artes se refere à pin-
tura ou escultura criada segundo as normas de uma aca-
Aos 43 anos de idade, recebeu do governo uma demia, que são instituições que conferem caráter oficial
encomenda para pintar a “Proclamação da Independên- aos princípios estilísticos de um determinado período.
cia”. Seu trabalho gerou controvérsia, pois foram encon- Esse movimento caracterizou a produção artística du-
tradas algumas semelhanças de sua tela com a pintura rante a segunda metade do século XIX, e foi inspirado no
1807 – A Batalha de Friedland, de Meissonier. neoclassicismo europeu.
Em 1890 é afastado da antiga Academia Imperial Em 1816 a Missão Artística chegou ao Brasil para
de Belas Artes, que se tornou Escola Nacional de Belas implementar um modelo institucionalizado de produção
Artes. Ainda nesse ano, Américo é eleito deputado da artística. Embora liderasse um movimento que buscas-
Assembleia Nacional Constituinte pela Paraíba. se a formação de novos artistas, os franceses traziam
consigo as influências do neoclassicismo europeu. Além
Por conta de sua saúde bastante abalada, Amé-
disso, essa influência seria refletida nos trabalhos dos
rico mudou-se para Florença na Itália em 1894, onde es-
novos artistas por meio da criação da Academia Impe-
creveu dois romances e permaneceu até a sua morte,
rial de Belas Artes, no Rio de Janeiro. Entre os principais
em 1905.
artistas desse movimento estão Pedro Américo e Victor
Pedro Américo foi um importante pintor no pe- Meirelles.
ríodo imperial brasileiro. Sua obra abrangeu temas histó-
ricos, personificações e temas bíblicos. Foi um dos mais Contexto
importantes pintores do academicismo. Recebeu inúme-
ros prêmios nacionais e internacionais. O quadro foi produzido na segunda metade do
século XIX, encomendado pelo governo imperial. Nes-
se momento, há uma forte tentativa de exaltar o poder
monárquico e criar a ideia de pertencimento à nação,
ou seja, incentivar o nacionalismo. A pintura, concluída
em 1888, um ano antes da proclamação da República,

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retrata uma cena romantizada da Independência do tada em um número maior; os personagens vestiam uni-
Brasil, proclamada em 7 de setembro de 1822. Antes formes galantes, até demais para esse tipo de viagem; D.
desse acontecimento, no início de 1822, D. Pedro I rece- Pedro e seus acompanhantes não montavam cavalos, e
beu uma carta de Lisboa exigindo seu retorno para Por- sim mulas e jumentos; D. Pedro estava com fortes cólicas
tugal, porém ele negou e proclamou: “Se é para o bem no dia, e por essa razão não aparentava estar tão saudá-
de todos e felicidade geral da nação, diga ao povo que vel e disposto; e a casa do grito, o casebre retratado no
eu fico”. Com a sua volta, Portugal tentaria recolonizar quadro, só foi construído por volta de 1884.
o Brasil, e, sabendo disso, D. Pedro I começou a prepa-
rar o caminho para a independência: Convocou uma As- A partir desse contexto, o quadro pode ser divi-
sembleia Constituinte, organizou a marinha de Guerra dido em dois grandes semicírculos: o primeiro ocupa o
e obrigou as tropas portuguesas a recuarem. É interes- centro da tela para a direita, onde estão representados
sante abordar também que a assinatura do decreto que alguns soldados; no segundo, que está ao lado esquerdo
separa efetivamente o Brasil de Portugal foi feita por D. do quadro, estão os cavaleiros.
Leopoldina, esposa de Dom Pedro I, que governava de No canto, um homem guia um carro de boi pelo
forma interina em sua ausência. O grito do Ipiranga se campo e olha com curiosidade a cena. O riacho do Ipi-
constitui, portanto, como uma retificação dessa decisão ranga aparece em primeiro plano, e os respingos mo-
tomada 5 dias antes. lham a pata do cavalo. Tudo isso reforça o cenário rural.
A obra representa Dom Pedro I proclamando a Na tela, o artista chama atenção para D. Pedro
independência do Brasil e, apesar da engenhosidade, que, em trajes de gala, empunha uma espada no alto da
não relata com exatidão o que aconteceu, uma vez que o colina e proclama a Independência. Os soldados e a co-
artista não presenciou a cena e teve que produzi-la com mitiva de D. Pedro repetem o gesto e acenam com cha-
base na sua imaginação. O próprio artista reconheceu péus e lenços. Todo o conjunto da obra contribui para
que seria impossível retratar minuciosamente, uma vez que o olhar do espectador seja direcionado a D. Pedro.
que faltavam relatos.
Sobre a figura do caipira, Schlichta (2009) co-
Obra mentou:
O quadro Grito da Independência, também co- “O caipira, “e com ele nós também”, no comentário perspicaz
nhecido como Independência ou Morte, foi finalizado de Mattos, é o brasileiro. E aqui o artista coloca-o na ponta
da diagonal do quadro, mantendo a hierarquia das posições,
em 1888. A obra foi encomendada a Pedro Américo pelo
protegendo o status do príncipe. O caipira que representa
conselheiro imperial Joaquim Inácio Ramalho em 1886. todos os brasileiros pertence à massa que se movimenta em
No contrato firmado entre eles, o artista teria três anos torno do herói, mas, não pertence nem ao seu séqüito nem a
para pintar um quadro histórico comemorativo da pro- sua guarda. O artista apresenta o caipira como uma figura tos-
clamação da independência do Brasil. Ou seja, a obra ca, rota, pés descalços, cujo corpo robusto, com partes des-
começou a ser pintada cerca de 64 anos após o fato his- cobertas, contrastante com a elegância do Imperador em seu
tórico. uniforme. O artista não lhe reconhece nenhuma dignidade.
E, como mero espectador, é forçado a virar o rosto para ver o
Antes de começar o quadro, Pedro Américo fez nascimento do Brasil, cujo destino foi decidido por D. Pedro,
algumas pesquisas sobre os trajes e costumes da épo- o primeiro imperador do Brasil. (OLIVEIRA e MATTOS,1999,
ca da independência e visitou frequentemente o bairro p.89) Há na representação do caipira de Independência ou
do Ipiranga para conhecer a luz, topografia e outros as- Morte uma evocação do mito de nação: o brasileiro que con-
templa seu nascimento” (SCHLICHTA, 2009, p. 6-7).
pectos do local, além de estudar pinturas históricas de
outros autores. Morando na Itália, Américo finalizou a
obra um ano antes do combinado, e expôs na Academia
de Belas Artes de Florença. Três meses depois, entregou
o quadro para o governo paulista. À época, a obra foi
considerada “colossal”.
A obra representa Dom Pedro I proclamando a
independência do Brasil e, apesar da semelhança, não
relata com exatidão o que aconteceu, uma vez que o ar-

Citações da Obra na Matriz de Referências
O ser humano como um ser que pergunta e quer saber

Questões relativas às diferentes concepções de


mundo, de ser humano e de conhecimento estão presen-
tista não presenciou a cena e teve que produzi-la com tes em expressões artísticas de diferentes culturas e pe-
base na sua imaginação. O próprio artista reconheceu ríodos históricos, como nas pinturas Maria Antonieta com
que seria impossível retratar minunciosamente, uma vez rosa (Le Brun, 1783), Roda de capoeira (Rugendas,1835),
que faltavam relatos. Moema (Victor Meirelles, 1866), Independência ou mor-
te (Pedro Américo, 1888), A redenção de Cam (Modesto
Apesar disso, a intenção do artista era retratar o Brocos, 1895), assim como nas gravuras Enterrar e calar,
momento de forma grandiosa e enaltecer o império e o E não há remédio e Estragos da guerra, da série Os de-
nacionalismo, por isso representou detalhes não condi- sastres da guerra (Goya, 1810-1820). (Página 4, quarto
zentes com a realidade: a comitiva de D. Pedro I foi retra- parágrafo)

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Estruturas Questões, Justificativas e Dicas


Seguindo o caminho inverso, os artistas mineiros Quer acessar as questões, justificativas e dicas desta obra?
Aleijadinho e Mestre Ataíde fazem da Igreja São Francis-
co de Assis de Ouro Preto a possibilidade de elevação dos Clique aqui ou use o QR CODE da página 6.
pensamentos à divindade, por meio da apreciação de uma
obra humana, que representa o divino. As artes visuais Anotações e Rascunhos
são as que mais concretamente deixam perceber que o
domínio da estrutura transparece a maestria do trabalha-
dor. Nesse sentido, a obra pode ter caráter realista, como
a representação da Independência do Brasil, na pintura
histórica Independência ou Morte (Pedro Américo), ou
em Moema (Victor Meirelles). Na representação realista,
a intenção é que o fruidor da arte sinta-se genuinamente
na situação retratada, como se fosse testemunha ocular
da cena. (Página 12, quarto parágrafo)
A formação do mundo ocidental contemporâneo
A pintura Independência ou morte (Pedro Améri-
co, 1888) é uma romantização de um fato, na medida em
que retrata uma realidade bem diferente do que ocorreu
no processo de Independência do Brasil em 1822. Por ou-
tro lado, as gravuras Série Desastres de guerra: chapas
selecionadas Enterrar e calar; E não há remédio; Estragos
da guerra; O mesmo (Goya) expõe de forma realista uma
crítica aos horrores da guerra ao presenciar as crueldades
ocorridas durante a invasão napoleônica à Espanha no
início do século XIX, conhecida como Guerra Peninsular.
(Página 22, quinto parágrafo)
Número, grandeza e forma
Na matemática, aplicam-se modelos para a reso-
lução de problemas. Um dos modelos tratados refere-se
a problemas cujas variáveis estão relacionadas por um
sistema de equações lineares. Em relação a esses mode-
los, destaca-se a classificação dos sistemas lineares, sua
resolução e os conceitos de dependência e independên-
cia linear de equações. É importante enfatizar também
a representação gráfica no plano cartesiano, tanto das
equações, quanto das soluções, no caso de sistemas bidi-
mensionais, bem como a representação matricial. Alguns
desses modelos podem ser abstraídos das pinturas Roda
de Capoeira (Rugendas) e Independência ou morte (Pe-
dro Américo) que representam de forma tridimensional,
isto é, com perspectiva, em meio bidimensional. (Página
24, sétimo parágrafo)
Espaços
Os eventos históricos, isto é, as guerras, avanços
territoriais e novos pensamentos, mudam as concepções
de espaço, território e destinação da obra artística que
acabam por registrar essas mudanças, como pode ser
apreciado nas telas Independência ou morte (Pedro Amé-
rico, 1888) e O juramento dos Horácios (Jacques-Louis
David, 1784), nas gravuras da Série Desastres de guerra,
chapas selecionadas: Enterrar e calar; E não há remédio;
Estragos da guerra O mesmo (Goya, 1810-20) e no com-
plexo arquitetônico da Igreja São Francisco de Assis de
Ouro Preto (Aleijadinho e Ataíde, século XVII). (Página 29,
primeiro parágrafo)

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Noite Estrelada - Van Gogh

Obra
Vincent Willem van Gogh foi um importante pin- a ser um colorista. Se apaixonou pelas cores intensas e
tor holandês e um dos maiores representantes da pintu- puras pois, em sua concepção, elas tinham a função de
ra pós-impressionista. Nasceu em Zundert, uma peque- representar emoções.
na aldeia holandesa, no dia 30 de março de 1853. Filho
de um pastor calvinista, Van Gogh era uma criança intro- Van Gogh passou por várias crises nervosas. Em
vertida. Em 1869 ingressou num internato provinciano. junho de 1890, o artista cometeu suicídio. As obras de
Vincent Van Gogh são obras do movimento e do espírito
Em 1880, Vincent Van Gogh passou a dedicar-se que não cessam de viver. Deixou 879 pinturas, 1.756 de-
inteiramente à pintura e, em 1886, foi para Paris estudar senhos e dez gravuras. Infelizmente não obteve reconhe-
no atelier independente do pintor Cormon. Seu irmão cimento do público enquanto estava vivo.
Theo, que trabalhava no comércio de artes, o apresen-
tou Pissarro e outros impressionistas. Inicia-se então, a
partir deste contato, uma nova forma de pintar, com co-
res fortes e puras com uma técnica de pinceladas mais
descontraídas.

Em 1887, decide ir além do impressionismo, des-


pertando grande interesse pelas estamparias coloridas
japonesas que, posteriormente, o influenciaram. Entre
1886 a 1888, ele adota as técnicas pontilistas e impres-
sionistas devorando os temas impressionistas, discipli-
nando o seu sentido de cor pintando várias naturezas-
-mortas florais, moinhos, perspectivas da cidade.

Entre 1881 e 1886 retratou os humildes, se ins-


Noite Estrelada. Internet: <www.britannica.com>
pirando na vida dura e miserável dos camponeses. Os
retratos pintados por Van Gogh de pessoas vulgares e o
seu amor ao próximo levou-o a dar ênfase à sua tristeza, Ficha Técnica
dignidade e gentileza. Segundo Proença (2006), o artista
Autor: Vincent Van Gogh
se empenhou em recriar a beleza dos seres humanos e
Localização: Museu de Arte Moderna, Nov York, EUA
da natureza.
Ano de produção: 1889
Van Gogh pretendia que seus quadros expres- Técnica: óleo sobre tela
sassem luz à humanidade. Procurava temas que lhe pro- Dimensões: 73,7cm x 92,1cm
porcionassem a combinação mais feliz entre o que se via Movimento: Pós-Impressionismo
e as suas próprias sensações por intermédio das cores
robustas e dos contrastes entre elas. Por meio de suas Pós-Impressionismo
pinceladas soltas, ele revela o invisível que quase sem-
Segundo Proença (2006), Pós-Impressionismo é
pre é mascarado pela ilusão da vida “real”.
a expressão usada para “designar a pintura que se de-
Trabalhava em um enorme quarto que servia senvolveu de 1886 [...] até o surgimento do Cubismo,
como ateliê. Seus quadros exalam vida. Embora houves- com Pablo Picasso. Os principais representantes dessa
se apenas tinta sobre tecido ou madeira, não são obras tendência foram Van Gogh, Seurat, Cézzane e Gauguin.
estáticas e mortas. Ali tudo se move, tudo pulsa; o mo- Esses artistas buscavam novos estilos.
vimento do interior, do sentimento do artista, explode e
O termo Pós-impressionismo foi cunhado pelo
se manifesta surpreendentemente e com tal força que a
crítico de arte Roger Eliot Fry em 1910. O termo foi uti-
matéria vira onda, energia e não cessa jamais. As estre-
lizado para designar as obras expostas na Grafton Galle-
las estão vivas e pulsantes, dos campos se movem com
ries, em Londres.
o vento, as luzes dos bares faíscam, os rostos respiram.
O artista se retratou em várias obras. Era uma pessoa Tendências como o simbolismo e até o expres-
solitária. sionismo já se encontram nas obras de alguns dos pinto-
res pós-impressionistas. Os pós-impressionistas são ar-
Em 1888 foi para Arles, onde passou a pintar ao
tistas que já não representavam fielmente os preceitos
ar livre. Por meio do abuso das cores, Van Gogh passou
originais do Impressionismo, ainda que não tenham se

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afastado muito dele ou estejam agrupados formalmen- Há predomínio das cores azuis e amarelo, espe-
te em novos grupos. Muitos artistas pós-impressionistas cificamente do azul da Prússia e o amarelo limão. A mis-
fizeram parte do impressionismo, e por isso muitos os tura entre essas cores mantém o contraste entre uma
consideram uma extensão da escola impressionista. cor quente e uma cor fria (TONON, 2017).

Entre as principais características dessa tendên-


cia está o humanismo, subjetivismo, técnica pontilhista e
o uso de cores, luz e textura.

Contexto
A partir da segunda metade do século XIX, o
ocidente promove uma série de ofensivas que visam a
abertura política e econômica do continente asiático. Na

Citações da Obra na Matriz de Referências
O ser humano como um ser que pergunta e quer saber

Reflexões sobre a existência, o pensamento e o


sublime podem ser reconhecidas na escultura O rapto de
década de 1880, a maioria dos países ocidentais experi- Prosérpina (Bernini, 1621), assim como nas pinturas O ju-
mentou um grande ciclo econômico, devido à produção ramento dos Horácios (Jacques-Louis David, 1784) obras
em massa de ferrovias e outros métodos de viagem mais e suas análises possibilitam identificar linguagens e tradu-
convenientes. A cidade moderna, bem como o arranha- zir sua plurissignificação Impressão, nascer do sol (Monet,
-céu, tiveram a proeminência aumentada nessa época. 1872) e A noite estrelada (Van Gogh, 1889). (Página 4,
Na década de 1890, verifica-se os primórdios da indús- primeiro parágrafo)
tria automobilística e são feitas grandes descobertas Identidade, cultura e mudança social
científicas, como a radioatividade.
Os avanços tecnológicos e científicos bem como o
Obra desenvolvimento de novas formas de pensamento e de or-
ganização política são importantes fatores para alterar o
O quadro Noite Estrelada foi pintado enquanto comportamento do indivíduo e sua relação na sociedade,
Vincent estava no asilo em Saint-Rémy. Sua internação além de refletir no fazer artístico. Esses e outros debates
aconteceu após um surto psicótico que o artista teve de- podem ser apreciados na tela neoclassicista O juramento
pois de um desentendimento com Paul Gauguin, quan- dos Horácios (Jacques-Louis David), nas gravuras român-
do viveram juntos na Casa Amarela. Após o desenten- ticas Série: desastres de guerra - chapas selecionadas: En-
dimento, Van Gogh decepou uma parte de sua orelha terrar e calar; E não há remédio; Estragos da guerra; O
e entregou a uma prostituta. O artista, que gostava de mesmo; (Goya), na tela impressionista Impressão sol nas-
pintar ao ar livre, teve que pintar a tela a partir da vista cente (Monet), na tela pós-impressionista Noite estrelada
do seu quarto, com o que conseguia ver entre as grades (Van Gogh) e na fotografia de Saint-Lazare (Cartier-Bres-
de ferro da sua cela, em Saint-Rémy-de-Provence, no sul son). (Página 8, primeiro parágrafo)
da França.
Estruturas
A tela é considerada uma das obras mais impor-
tantes de Van Gogh, pois nela aparecem algumas peque- Em outro diapasão, quando a arte ousa buscar
novos olhares, os artistas Van Gogh e Toulouse-Lautrec,
nas abstrações, que no futuro seriam essenciais para o
não sem dominarem igualmente a técnica, buscam dar ao
modernismo.
espectador sensações que lhe despertem sentimentos em
A tela foi pintada com base nos movimentos do Noite Estrelada e Jane Avril, respectivamente. (Página 12,
quinto parágrafo)
vento. Tonon (2017, p. 33) afirma que na tela A Noite
Estrelada “há um duplo jogo de contrastes cujo tema Energia e oscilações
principal é o movimento. De um lado, temos o sentido
do movimento físico, de outro, o contraste colórico que A fotografia, como aplicação de conceitos de luz
gera a sensação de movimento na própria visão do es- e cores, é analisada a partir da óptica geométrica, por
pectador”. meio do modelo da câmara escura e da formação de ima-
gens em anteparos e espelhos, sejam planos ou curvos,
Na parte inferior da tela, os elementos não de- bem como da utilização de lentes convergentes ou diver-
monstram muito movimento, já que são eles a igreja, gentes e a aplicação de conceitos como distância focal,
o terreno e as casas. Na parte superior, há movimento refração, reflexão e interferência luminosas, que afetam
físico com o brilho das estrelas, a luz da lua e o movi- aspectos como nitidez ou tamanho da imagem. Os exem-
mento do vento em espiral. Essas pinceladas em espiral plos de fotografias e pinturas revelam a importância do
provocam a sensação de profundidade e movimento. saber científico frente ao espectro da luz visível, traduzi-
Outro elemento da tela é o cipreste, que aparece preso dos na matéria como as cores utilizadas pelo artista, como
ao chão, mas apresenta fluidez por meio das suas folha- é possível perceber nas obras Noite estrelada (Van Gogh),
gens, que se movimentam com o vento. Jane-Avril (Toulouse-Lautrec), Anartia Olivacea (José Joa-
quim Freire) e A redenção de Cam (Modesto Brocos). No
teatro, a luz solar foi, por bastante tempo, a única forma

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de iluminação. No Renascimento, era comum que os pré-


dios teatrais, como o Globe Theatre, utilizado por William
Shakespeare, tivessem abertura para a luz solar. Mesmo
cenas noturnas eram representadas sob a luz solar, evi-
denciando assim o princípio da propagação retilínea da
luz e a independência dos feixes. Essa encenação pode ser
percebida na representação cênica de Medida por medida
(Shakespeare). (Página 15, quinto parágrafo)

Espaços

No mundo tecnológico-informacional, temos o


desenvolvimento do espaço virtual. Neste novo espaço
da virtualidade, estão reproduzidas as relações sociais
do mundo presencial, estabelecendo reflexões acerca de
desigualdades, como pode ser observado no Precisamos
romper com os silêncios - TEDxSaoPauloSalon,2016 (Dja-
mila Ribeiro), na fotografia Atrás da estação Saint Lazare
(Cartier-Bresson) e no documentário Parque Nacional da
Serra da Canastra. Também, essas novas tecnologias da
informação afetam percepções do sujeito a respeito de
aspectos do espaço, tais como: próximo - distante, gran-
de - pequeno, rural - urbano, centro - periferia, local - re-
gional, nacional - internacional. Essas noções de espaço
antes da tecnologia virtual podem ser apreciadas nas pin-
turas em óleo sobre tela como Impressão nascer do sol
(Monet), Noite estrelada (Van Gogh, 1889) e O juramen-
to dos Horácios (Jacques-Louis David, 1784). (Página 26,
quinto parágrafo)

Materiais

O estudo dos materiais e dos metais pode adqui-


rir relevância em diversos contextos, por exemplo, nas ar-
tes. A escultura O rapto de Prosérpina (Bernini), o comple-
xo arquitetônico da Igreja São Francisco de Assis de Ouro
Preto (Aleijadinho e Ataíde), as gravuras da Série Desas-
tres de guerra: Enterrar e calar; E não há remédio; Estra-
gos da guerra; O mesmo (Goya), a litogravura Jane Avril
(Toulouse-Lautrec), a pintura Noite estrelada (Van Gogh),
diferentes possibilidades de usos de materiais como már-
more, bronze, madeira, pedrasabão, pigmentos, entre ou-
tros, com propriedades distintas. Tanto obras de mármore
como de pedra são danificadas pela ação da chuva ácida,
causada pela emissão de óxidos de nitrogênio e enxofre
na atmosfera. (Página 31, terceiro parágrafo)

Questões, Justificativas e Dicas


Quer acessar as questões, justificativas e dicas desta obra?

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Anotações e Rascunhos

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Jane Avril - Toulouse Lautrec

Autor
Henri Marie Raymond de Toulouse-Lautrec- nica. Sete anos depois teve um colapso nervoso. Faleceu
-Monfa, também conhecido como Henri de Toulouse- em 9 de setembro de 1901.
-Lautrec, nasceu em 24 de novembro de 1864. Foi um
pintor, gravurista, desenhista, caricaturista e ilustrador Segundo Proença (2006, p. 148), a principal ca-
cuja imersão na vida colorida e teatral de Paris no fim do racterística da pintura de Lautrec é “a sua capacidade de
século XIX permitiu que produzisse uma coleção de ima- síntese, o contorno expressivo das figuras e a dinâmica
gens atraentes, elegantes e provocativas de sua época da realidade representada”.
moderna e, por vezes, decadente.

Viveu grande parte da sua infância na casa do


avô. Aos 14 anos teve duas fraturas nas pernas que com-
prometeram o desenvolvimento dos seus membros infe-
riores. Mudou-se para Paris em 1882, onde ingressou no
estúdio de Léon Bonnat. Três anos depois já se dedicava
inteiramente à sua arte.

Toulouse-Lautrec está entre os artistas mais re-


conhecidos do período pós-impressionista, ao lado de
Paul Cézanne, Vicent van Gogh e Paul Gauguin.

Em sua carreira, que durou menos de vinte anos,


criou mais de 5000 desenhos, 363 impressões e pôste-
res, 275 aquarelas e 737 pinturas em tela.

Ele se destacou em retratar as pessoas em seus


ambientes de trabalho, com a cor e o movimento da vida
noturna espalhafatosa presente, mas o glamour se des-
pojou. Gostava de retratar a vida agitada de Paris, espe-
cialmente de artistas de circo, dançarinas, prostitutas e
pessoas anônimas.

Era mestre em pintar cenas de multidões, em


que cada figura era altamente individualizada. Na época
em que foram pintadas, as figuras individuais em suas Jane Avril. Internet: <www.metmuseum.org>
pinturas maiores podiam ser identificadas apenas pela
silhueta, e os nomes de muitos desses personagens fo-
ram registrados.
Ficha Técnica
Autor: Toulouse Lautrec
O artista gostava de frequentar o cabaré Moulin
Ano de produção: 1893
Rouge, inclusive muitas de suas obras são pinturas do
Material: litografia
local e seus frequentadores. Com o passar do tempo se
Dimensões: 128’3 x 94 cm
tornou o responsável por criar cartazes publicitários e
Localização: Museu de Arte de São Diego
vender as atrações do cabaré. Seu primeiro cartaz com
essa finalidade foi “La Goulue”.
Art Nouveau
A representação habilidosa de Toulouse-Lautrec Embora Toulouse-Lautrec faça parte do período
de pessoas pode ser explicada pelo seu estilo pictórico, pós-impressionista e tenha produzido pinturas em tela
que é altamente linear e enfatiza o contorno. Ele fre- pós-impressionistas, parte da sua produção, principal-
quentemente aplicava tinta em pinceladas longas e finas mente as artes gráficas como os cartazes, melhor se en-
que deixavam boa parte do quadro por baixo. Muitos de caixam como Art Nouveau.
seus trabalhos podem ser melhor descritos como “dese-
nhos em tinta colorida”. Art Nouveau, ou Arte Nova, surgiu no final do
século XIX, na Bélgica. Corresponde, enquanto estilo
A partir de 1892, o artista começou a se dedicar
à litografia, produzindo mais de 300 obras com essa téc-

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“moderno”, ao que, na história econômica da civilização


industrial, é chamado de “fetichismo da mercadoria”.

É caracterizado por motivos icônicos, estilísticos


e tipológicos derivados da arte japonesa, ritmos basea-
dos na curva, busca de ritmos “musicais” e sinuosos,
sentido de elasticidade, leveza, juventude e otimismo.
Vigorou entre 1880 e 1920.

Citações da Obra na Matriz de Referências
O ser humano como um ser que pergunta e quer saber

O conhecimento se apresenta sob formas diver-


sas, como é possível perceber na Igreja São Francisco de
Esse estilo essencialmente decorativo era vol- Assis de Ouro Preto: estrutura arquitetônica, pintura do
tado ao design e à arquitetura, mas também foi grande teto e esculturas encravadas na estrutura, (Aleijadinho e
influenciador das artes plásticas. Consistia no acréscimo Ataíde, século XVII), na aquarela Anartia Olivacea (José
de um elemento hedonista a um objeto útil. Joaquim Freire, século XVIII), na litografia Jane Avril (Tou-
louse-Lautrec, 1899) e na fotografia Atrás da estação
Saint Lazare (Cartier-Bresson, 1932), expressando aspec-
Obra tos de complexidade nas representações da realidade.
Jane Avril foi uma das mais famosas bailarinas (Página 6, terceiro parágrafo)
de Can-can de Paris. Toulouse-Lautrec conheceu a dan-
Indivíduo, cultura e mudança social
çarina no Moulin Rouge, um cabaré parisiense. Ambos
ficaram amigos e desenvolveram um grande carinho um A participação da mulher na política ou na vida
pelo outro. Ficou evidente que Toulouse-Lautrec estava social de forma pública, pode ser percebida em obras
apaixonado pela dançarina, que teve destaque em várias como O rapto de Prosérpina (Bernini), Maria Antonieta
obras do artista. com rosa (Le Brun), Jane Avril (Lautrec), Moema (Victor
Meirelles), Úrsula (Maria Firmina dos Reis), Precisamos
Jane era uma das modelos preferidas do artista, romper com os silêncios - TEDxSaoPauloSalon (Djamila
pois era muito performática, flexível e gostava muito de Ribeiro), Cota não é Esmola (Bia Ferreira) e Maria da Vila
dançar. Matilde (Elza Soares) que trata da necessidade da desna-
turalização da violência, permitindo um diálogo sobre a
Em 1893, Jane encomendou a Toulouse-Lautrec Lei Maria da Penha. (Página 8, quinto parágrafo)
um cartaz publicitário para que seus fãs pudessem com-
prar. Na primeira edição foram feitas 20 tiragens, todas Estruturas
assinadas por Toulouse-Lautrec. Entretanto, após o artis-
ta estrelar no Jardin de Paris, foram encomendadas mais Em outro diapasão, quando a arte ousa buscar
duas cópias do cartaz. Medeiros cita Frey (1997), que diz novos olhares, os artistas Van Gogh e Toulouse-Lautrec,
que “naquela mesma época, os cartazes de Jane já esta- não sem dominarem igualmente a técnica, buscam dar ao
vam espalhados por toda Paris”. espectador sensações que lhe despertem sentimentos em
Noite Estrelada e Jane Avril, respectivamente. (Página 12,
Jane se tornou muito famosa após a publicação quinto parágrafo)
dos cartazes de Lautrec. No cartaz de 1893, ela aparece
sozinha em pose sensual vestindo um vestido com vá- Espaços
rias camadas esvoaçantes na saia e muitos detalhes de Os espaços de convivência e coletividade se for-
transparência. A dançarina foi retratada com um olhar mam por questões sociais e econômicas, além das ques-
profundo e rosto fino. tões geográficas. A escultura O rapto de Prosérpina (Ber-
nini) ilustra tais aspectos e remete aos mitos gregos como
Claramente a intenção do cartaz era despertar referência de organização dessas relações. As músicas
o desejo das pessoas e persuadi-las a frequentarem ca- Maria da Vila Matilde (Elza Soares) e Cota não é esmola
sas de espetáculos. Isso pode ser visto também na forma (Bia Ferreira) permitem problematizar os espaços defini-
como Lautrec destacou a sensualidade de Jane, que apa- dos para cada grupo social, além de definir um espaço
rece como se estivesse dançando. que pode ser confrontado pelo protagonismo feminino.
Essas percepções estão presentes, também nas pinturas
O artista utilizou cores chamativas, já que car- Maria Antonieta com rosa (Le Brun) e Moema (Victor Mei-
tazes geralmente são vistos rapidamente. O amarelo do relles), na litogravura Jane Avril (Toulouse-Lautrec) e na
vestido contrasta com o preto das luvas, meias e demais análise da Lei Maria da Penha, artigos 1º a 12-B – Lei nº
acessórios. 11.340/2006. (Página 27, quarto parágrafo)
Ao que parece, Jane está no palco e é acompa- Materiais
nhada pelo homem que segura um contrabaixo. O co-
lorido em Jane e as letras sem cor fazem o espectador O estudo dos materiais e dos metais pode adqui-
prestar atenção na dançarina, e abstrair brevemente o rir relevância em diversos contextos, por exemplo, nas ar-
restante do cartaz. tes. A escultura O rapto de Prosérpina (Bernini), o comple-
xo arquitetônico da Igreja São Francisco de Assis de Ouro

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Preto (Aleijadinho e Ataíde), as gravuras da Série Desas-


tres de guerra: Enterrar e calar; E não há remédio; Estra-
gos da guerra; O mesmo (Goya), a litogravura Jane Avril
(Toulouse-Lautrec), a pintura Noite estrelada (Van Gogh),
diferentes possibilidades de usos de materiais como már-
more, bronze, madeira, pedrasabão, pigmentos, entre ou-
tros, com propriedades distintas. Tanto obras de mármore
como de pedra são danificadas pela ação da chuva ácida,
causada pela emissão de óxidos de nitrogênio e enxofre
na atmosfera. (Página 31, terceiro parágrafo)

Questões, Justificativas e Dicas


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Anotações e Rascunhos

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A Redenção de Cam - Modesto

Autor
Modesto Brocos y Gomez nasceu em Santiago
de Compostela, Espanha, em 1852. O pintor, gravador,
ilustrador, desenhista e professor estudou desenho com
o irmão Isidoro, escultor e secretário da Academia de Be-
las Artes de La Coruña, Espanha. Na argentina trabalhou
como ilustrador.

Veio para o Brasil em 1872 e frequentou como


aluno livre os cursos da Academia Imperial de Belas Ar-
tes (Aiba) no Rio de Janeiro, tendo sido aluno de Victor
Meirelles.

Participou de cursos de aperfeiçoamento em Pa-


ris, na École Nationale Superiéure des Beaux-Arts [Escola
Nacional Superior de Belas Artes], como aluno de Henri
Lehmann (1814 - 1882).

Frequentou posteriormente a Real Academia de


Bellas Artes de San Fernando, e o ateliê do pintor Federi-
co Madrazo y Kuntz , ambos em Madri. Em 1882, cursa a
Academia Chigi, em Roma. Faz pinturas de gênero (cenas
da vida cotidiana), retratos e pintura de paisagens. A Redenção do Cam. Internet: <ptwikipedia.org>

Ao retornar ao Brasil, Brocos assume a cadeira Ficha Técnica


de professor de desenho figurado da Escola Nacional de
Belas Artes - Enba, em 1891, a convite do escultor Rodol- Ano de produção: 1895
fo Bernardelli. Exerceu esse cargo até o seu falecimento. Técnica: Óleo sobre tela
Em 1897 vai a Roma, e ao voltar ao Brasil, em 1900, na- Dimensões: 199 x 166 cm
turalizou-se brasileiro. Período ou movimento artístico que pertence: Arte co-
lonial brasileira
Em 1911 foi nomeado professor extraordinário Principal tema abordado: Episódio Bíblico e questões
da segunda cadeira de Desenho da Enba, tornando-se raciais.
professor catedrático 4 anos depois. Localização: Museu Nacional de Belas Artes, Rio de Ja-
neiro - BR
Brocos é autor de livros sobre o ensino artístico:
A Questão do Ensino das Bellas Artes, 1915 e Retórica Contexto
dos Pintores, 1933. Destacou-se também por ser um
grande incentivador do desenvolvimento da gravura no A miscigenação, na segunda metade do século
Brasil. Faleceu no Rio de Janeiro, em 1936. XIX, passa a ser entendida como algo extremamente
prejudicial para o desenvolvimento da nação brasileira.
Dezesseis anos depois de sua morte, o Museu Um exemplo desse tipo de pensamento é o médico eu-
Nacional de Belas Artes realizou uma mostra sobre sua genista Nina Rodrigues, que propunha em um de seus
produção em comemoração ao centenário de seu nas- livros a criação de códigos penais distintos para negros
cimento. e brancos.

A obra de Brocos é composta por gravuras, pin- Ocorre a propagação do que ficou conhecida
turas, ilustrações, esculturas, painéis e projetos arqui- como “tese de branqueamento”, constituindo-se como
tetônicos. Em suas obras retratou cenas de trabalho e políticas que incentivaram a vinda de imigrantes euro-
costumes, assim como paisagens e retratos. peus para o país visando uma “pureza racial”, alinhada à
ideia de superioridade dos brancos. Essa ideia é reprodu-
Se dedicou ao estudo e pintura de personagens zida no quadro “A Redenção de Cam” de Modesto Brocos
negros, e tem, em suas obras, a preocupação de apre- que apresenta uma família em que a tese foi aplicada. A
sentar a multirracialidade existente no país. Por sua te- avó negra é representada em louvação, sua filha mula-
mática, seu estilo é comumente associado ao realismo ta segura nos braços o neto branco, fruto do casamento
e/ou naturalismo. com um homem branco representado à direita da tela.

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A falta de acesso a políticas públicas e o proces- A mãe, vó e criança, por meio das mãos e olha-
so de exclusão política, social e cultural da população res, parecem construir um uma narração de forma circu-
negra passava a ser justificada não pelo passado de es- lar, enquanto o pai, que se posiciona de costas para as
cravização, mas sim por uma falsa ciência que procurava mulheres, sorri timidamente na extremidade direita da
legitimar a desigualdade. É importante lembrar que o tela. Apesar disso, tem os olhos voltados para o centro
conceito de raça é fruto de uma construção social. da tela, onde se encontra a criança.

Em 1911, João Batista Lacerda, diretor do Mu- Percebe-se que a avó está posicionada sobre um
seu Nacional do Rio de Janeiro, participou do I Congres- chão de terra batida, enquanto o pai se posiciona com
so Internacional das Raças em Londres, afirmando que os pés sobre um calçamento de pedras, que simboliza
em um século a população brasileira teria superado a uma melhora significativa na qualidade de vida. Esse po-
mestiçagem e seria composta apenas por brancos. Esse sicionamento indica a possibilidade de ascensão social,
tipo de pensamento vai ser reproduzido amplamente até resultado do embranquecimento, evidencia também a
aproximadamente a década de 30, quando começa a vi- ideia de progresso do século XIX, que tem a cidade como
gorar um novo tipo de concepção, o mito da democracia centro.
racial.
Segundo Lopes (2015), “os brancos brasileiros
Obra “aceitavam” e “toleravam” os negros, índios e mestiços,
“dando-lhes a chance” de um amálgama e, portanto, de
O título da obra faz referência direta à passa- um melhoramento, uma ascensão e, finalmente, uma re-
gem bíblica de Cam, filho de Noé. Cam e seu filho Canaã denção. Esse cenário é exatamente o que sugere a obra
olharam para Noé quando este estava bêbado e nu e o de Brocos.
ridicularizaram, sendo, por isso, castigados. A maldição
foi lançada sobre Canaã, que foi condenado a tornar-se
escravo dos seus primos e tios.

Essa passagem bíblica deu origem à crença de


que os descendentes de Cam seriam os povos de pele
escura de algumas partes da África e do Oriente Médio.
Sendo assim, especula-se que o pecado de Cam teria
causado a escravidão, que é apresentada aqui como um

Citações da Obra na Matriz de Referências
O ser humano como um ser que pergunta e quer saber

Questões relativas às diferentes concepções de


mundo, de ser humano e de conhecimento estão presen-
castigo divino imposto aos descendentes de Cam.
tes em expressões artísticas de diferentes culturas e pe-
A tela, criada em 1895, pode ser interpretada ríodos históricos, como nas pinturas Maria Antonieta com
como um retrato de família. Segundo Lotierzo (2014), a rosa (Le Brun, 1783), Roda de capoeira (Rugendas,1835),
tela A Redenção de Cam defende uma tese sobre bran- Moema (Victor Meirelles, 1866), Independência ou mor-
queamento, constituindo um estudo sobre as diferentes te (Pedro Américo, 1888), A redenção de Cam (Modesto
gradações de tons de pele. Através das gerações, é pos- Brocos, 1895), assim como nas gravuras Enterrar e calar,
sível perceber gradações de cor na pele dos membros da E não há remédio e Estragos da guerra, da série Os de-
família: a avó, matriarca da família, possui pele escura; a sastres da guerra (Goya, 1810-1820). (Página 4, quarto
mãe tem pele um pouco mais clara, sendo considerada parágrafo)
mulata; o pai é um homem branco; e a criança, fruto do Indivíduo, cultura e mudanças sociais
casamento inter-racial, também é branca.
Compreender as origens da manifestação artísti-
Sendo aqui a maldição associada à origem da ca Capoeira faz pensar sobre a construção da identidade
pele negra, o casamento inter-racial é então apresenta- de um grupo e suas relações com o ambiente. O surgimen-
do como uma solução: um novo caminho rumo ao em- to dessa manifestação exige a análise da condição social
branquecimento. A exemplo disso podemos observar a do povo negro no Brasil durante a escravidão e depois
aliança usada pela mãe, detalhe que Brocos buscou re- dela. Por sua vez, a pintura Roda de Capoeira (Rugendas)
forçar, exagerando o tamanho da mão da mulher. e a manifestação cultural Carimbó permitem, também,
reflexões acerca dessa temática. O discurso musical tam-
À esquerda, a avó tem as mãos e o rosto ergui- bém pode ser uma forma de crítica aos valores sociais e de
dos para o céu, como quem agradece por alguma ben- classe. Isso pode ser observado na canção Inclassificáveis
ção. Acredita-se que esteja agradecendo pela redenção. (interpretada por Ney Matogrosso) cuja temática central
A mãe, que está sentada segurando o filho, olha para a é a formação do povo brasileiro e todo o significado de
criança como quem está ensinando alguma coisa e, ao uma identidade marcada pela miscigenação. As reflexões
mesmo tempo, aponta para a avó. A criança, por sua vez, sobre esse processo e, também, de embranquecimento da
tem o corpo e o rosto voltados para a vó, para quem tam- população são apresentadas na pintura A redenção de
bém acena, enquanto na outra mão segura uma laranja. Cam (Modesto Brocos). (Página 7, quarto parágrafo)

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Energia e oscilações Anotações e Rascunhos


A fotografia, como aplicação de conceitos de luz
e cores, é analisada a partir da óptica geométrica, por
meio do modelo da câmara escura e da formação de ima-
gens em anteparos e espelhos, sejam planos ou curvos,
bem como da utilização de lentes convergentes ou diver-
gentes e a aplicação de conceitos como distância focal,
refração, reflexão e interferência luminosas, que afetam
aspectos como nitidez ou tamanho da imagem. Os exem-
plos de fotografias e pinturas revelam a importância do
saber científico frente ao espectro da luz visível, traduzi-
dos na matéria como as cores utilizadas pelo artista, como
é possível perceber nas obras Noite estrelada (Van Gogh),
Jane-Avril (Toulouse-Lautrec), Anartia Olivacea (José Joa-
quim Freire) e A redenção de Cam (Modesto Brocos). No
teatro, a luz solar foi, por bastante tempo, a única forma
de iluminação. No Renascimento, era comum que os pré-
dios teatrais, como o Globe Theatre, utilizado por William
Shakespeare, tivessem abertura para a luz solar. Mesmo
cenas noturnas eram representadas sob a luz solar, evi-
denciando assim o princípio da propagação retilínea da
luz e a independência dos feixes. Essa encenação pode ser
percebida na representação cênica de Medida por medida
(Shakespeare). (Página 15, quinto parágrafo)

A formação do mundo ocidental contemporâneo

As transformações ocorridas no Brasil e no mun-


do a partir do século XIX refletem-se também na produção
das artes, que abordam criticamente a sociedade. A pin-
tura A Redenção de Cam (Modesto Brocos) faz referência
a ideologias e teorias científicas referentes ao embran-
quecimento da população brasileira vigentes no período.
A obra sinfônica Suíte Reisado do Pastoreio / Batuque /
Dança dos Negros (Lorenzo Fernandez), apesar de tam-
bém ser uma obra contemporânea do século XX, remete
às contribuições da matriz africana para a formação do
povo brasileiro, em uma perspectiva moderna, com ele-
mentos da música erudita e africana. (Página 22, segundo
parágrafo)

Espaços

É possível perceber que as determinações sociais


são vinculadas aos espaços nos quais se dão as relações
e as estruturas de poder na sociedade brasileira contem-
porânea. Desse modo, percebe-se nas obras A redenção
de Cam (Modesto Brocos) e A Cidade é uma só? (Adirley
Queirós) uma certa dinâmica das relações desenvolvidas
a partir da construção de espaços, diferenciados por vin-
culações socioespaciais. (Página 26, quarto parágrafo)

Questões, Justificativas e Dicas


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Fotografia Atrás da Estação Saint-
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Lazare - Cartier Bresson

Autor
Henri Cartier-Bresson nasceu em Chantelou-
p-en-Brie, França, em 22 de agosto de 1908. Quando
criança, Henri ganhou de presente uma câmera fotográ-
fica. Foi para Paris, onde estudou pintura a óleo na Aca-
démie Lhote em 1927.
Em 1928 começou a estudar arte e literatura na
Universidade de Cambridge. Pouco tempo depois, Henri
foi recrutado, por um breve período, pelo exército fran-
cês.
Seu interesse pela fotografia surgiu após conhe-
cer Harry Crosby, o editor, poeta e símbolo da Lost Gene-
ration americana. Viajou para a África no início dos anos
1930, e foi lá que tirou as primeiras fotografias feitas sem
compromisso.
Voltou a Paris em 1932, e logo publicou sua pri-
meira reportagem fotográfica. Começou a levar a foto-
grafia mais a sério, desenvolvendo seu próprio estilo.
Expôs algumas de suas fotografias nos Estados
Unidos e na Europa. Em 1937 dirigiu o documentário
“Victoire de la Vie” junto com Jean Renoir.
Durante a 2º Guerra Mundial se juntou nova-
mente ao exército francês. Nesse período foi capturado Atrás da estação Saint Lazare Internet: <www.medium.com>
por alemães e feito prisioneiro por quase 3 anos, até
que conseguiu escapar. Apesar disso, durante a guerra Ficha Técnica
conseguiu imortalizar muitos momentos nos campos de
refugiados. Em 1944 fotografou a libertação de Paris. Título: Atrás da estação Saint Lazare
Ano de produção: 1932
Se tornou co-fundador da Magnum Photos em Fotografia
1947. Publicou suas fotos em várias revistas célebres, Técnica: Impressão em prata coloidal
como Life e Vogue. Viajou para vários lugares a trabalho, Tamanho: Vários tamanhos
passando pela América do Norte, Índia, China, Indoné-
sia, entre outros; Nesse período registrou momentos im- Obra
portantes da história.
Saint-Lazare era a estação terminal para o nor-
Fotografou o cotidiano na União Soviética du- deste da França. Em 1932, Cartier-Bresson estava pas-
rante o regime comunista. A partir de 1974, dedicou-se sando por trás de uma das seis estações ferroviárias de
ao desenho e pintura até a sua morte, em 2 de agosto Paris e tirou a fotografia às escondidas. A obra só foi vei-
de 2004. culada 15 anos mais tarde na Revista Life20.

Embora tenha trabalhado com fotojornalismo, Sobre essa fotografia, Bresson afirmou: “No
suas obras sempre impressionaram mais como arte. momento em que o homem pulou, eu estava por aca-
Uma de suas principais características era extrair, com so olhando com minha câmera através de um buraco na
sutileza, o máximo de informação de uma cena cotidia- grade1”. O reflexo na água cria uma boa simetria para a
na. foto. No fundo é possível ver um anúncio à esquerda e
os anéis de metal lembram o circo. Os anúncios parecem
Bresson deixou o legado de um olhar aprofunda- espelhar a imagem do homem que está saltando pela
do sobre a condição humana, representada muito bem
1 Conheça Atrás da Estação Saint Lazare, de Henri Cartier-
em suas fotos. -Bresson. Disponível em: <http://noticias.universia.com.br/destaque/
noticia/2012/01/21/906410/conheca-atras-da-estaco-saint-lazare-
-henri-cartier-bresson.html>

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água. As ondulações na poça ao redor da escada imitam do mundo presencial, estabelecendo reflexões acerca de
as peças de metal curvadas que estão próximas. desigualdades, como pode ser observado no Precisamos
romper com os silêncios - TEDxSaoPauloSalon,2016 (Dja-
O autor fotografou a cena com uma câmera de mila Ribeiro), na fotografia Atrás da estação Saint Lazare
35 milímetros. Bresson não gostava de fazer cortes em (Cartier-Bresson) e no documentário Parque Nacional da
suas imagens, mas nessa obra foi necessário. Serra da Canastra. Também, essas novas tecnologias da
informação afetam percepções do sujeito a respeito de
A foto representa muito bem o conceito de “ins- aspectos do espaço, tais como: próximo - distante, gran-
tante decisivo”, que foi apresentado por Bresson. Para de - pequeno, rural - urbano, centro - periferia, local - re-
ele, instante decisivo é o momento exato em que ele- gional, nacional - internacional. Essas noções de espaço
mentos visuais e emocionais se unem em perfeita har- antes da tecnologia virtual podem ser apreciadas nas pin-
monia, além de expressarem a essência da situação pre- turas em óleo sobre tela como Impressão nascer do sol
senciada pelo fotógrafo em uma fotografia. Esse conceito (Monet), Noite estrelada (Van Gogh, 1889) e O juramen-
é mencionado por fotógrafos do mundo inteiro. Ainda to dos Horácios (Jacques-Louis David, 1784). (Página 26,
que o conceito tenha sido lançado por Cartier-Bresson, quinto parágrafo)
atualmente é objeto de estudo, e inclusive transformou-
-se em algo mais complexo. Materiais

Entre as principais características de uma foto- Com relação ao conhecimento e ao domínio dos
grafia de instante decisivo considerada perfeita estão: materiais, é importante destacar que eles proporciona-
um plano de fundo que interaja visual e psicologicamen- ram a produção de ligas, vidros e criações de técnicas, de-
te com o sujeito em foco; um clique preciso, irrepetível, senvolvimento de suportes e outras formas de representa-
de uma única chance; a captura de um momento signi- ção da imagem, adequadas às novas tendências das artes
ficativo que envolva movimento e ação; um elemento visuais, à fotografia e à rapidez da execução. A análise da
de ambiguidade, incerteza e contradição que desperte a fotografia Atrás da estação Saint Lazare (Cartier-Bres-
curiosidade do espectador sobre o significado ou resul- son), da aquarela Anartia Olivacea (José Joaquim Freire),
tado da cena representada; entre outros. do óleo sobre tela Impressão nascer do sol (Monet) são
exemplos de resultados desse desenvolvimento. (Página
31, quarto parágrafo)


Citações da Obra na Matriz de Referências
O ser humano como um ser que pergunta e quer saber

O conhecimento se apresenta sob formas diver-


sas, como é possível perceber na Igreja São Francisco de
Questões, Justificativas e Dicas
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Anotações e Rascunhos
Assis de Ouro Preto: estrutura arquitetônica, pintura do
teto e esculturas encravadas na estrutura, (Aleijadinho e
Ataíde, século XVII), na aquarela Anartia Olivacea (José
Joaquim Freire, século XVIII), na litografia Jane Avril (Tou-
louse-Lautrec, 1899) e na fotografia Atrás da estação
Saint Lazare (Cartier-Bresson, 1932), expressando aspec-
tos de complexidade nas representações da realidade.
(Página 6, terceiro parágrafo)

Energia e oscilações

As obras de artes visuais presentes nesta etapa


contribuem para a melhor compreensão dos fenômenos
ópticos, como a fotografia Atrás da estação Saint Lazare
(Cartier-Bresson, 1932) que retrata a reflexão da luz na
água, com destaque para algumas características: propa-
gação retilínea, reversibilidade e independência dos fei-
xes, assim como a sua ausência, a sombra. (Página 15,
segundo parágrafo)

Espaços

No mundo tecnológico-informacional, temos o


desenvolvimento do espaço virtual. Neste novo espaço
da virtualidade, estão reproduzidas as relações sociais

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Artes
Cênicas
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“O segredo do sucesso é
a constância do objetivo ”.
(Benjamin Disraeli)

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Gráficos e Estatísticas
OBRAS COBRADAS NA PROVA DESDE
2019
Medida por
Medida

Um Inimigo do
Povo

OBRAS COBRADAS NA PROVA DESDE


2019

10

UM INIMIGO DO POVO MEDIDA POR MEDIDA

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Controle de Desempenho
Total Porcentagem
Itens Itens Escore
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Um Inimigo do Povo
Medida por Medida

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Um Inimigo do Povo - Henrik Ibsen

Autor
Henrik Ibsen nasceu em 20 de março de 1828 Em 1877 Ibsen escreveu seu primeiro drama rea-
em Skien, uma cidade costeira localizada na Noruega. lista intitulado “Os Pilares da Sociedade” e obteve gran-
Ser filho de um dono de destilaria e de uma pianista pro- de notoriedade internacional. A partir de então produziu
porcionou a Ibsen uma vida confortável e culturalmente “Casa de Bonecas” (1879), “Um Inimigo do Povo” (1882),
estimulante até os 13 anos de idade, quando o pai foi “Heda Gabler”(1890), entre outros. Sua produção desta-
obrigado a fechar o negócio e a família declarou falência. ca-se por denunciar as injustiças e hipocrisias sociais, o
falso moralismo e o sofrimento causado pelas opressões
Ibsen estudou em uma pequena escola particu- de uma sociedade rígida e conservadora.
lar dos 13 aos 15 anos em Skien, e aos 16 anos, em 27 de
dezembro de 1843, foi de navio para Grimstad e come- “Foi como um inovador dramático que Ibsen fez a sua repu-
tação, numa época em que o drama significava romances
çou a trabalhar como aprendiz de farmacêutico da cida- superficiais, farsas grosseiras e intrigas com enredos compli-
de, trabalhando por cinco anos. Para entrar na faculdade cados e ridículos. Foi como um ardente crítico das normas
de medicina, estudou sozinho por um tempo, entretan- sociais e da hipocrisia que ele foi celebrado por seus primei-
to, quando falhou no exame de admissão, abandonou ros admiradores. Mas foi como autor de dramas poderosos
a ideia. Em seu tempo livre lia peças teatrais, pintava e que retratavam as questões humanas universais, como o
escrevia poesias. criador de personagens complexos que sofrem na tentativa
de acharem uma razão para viver, que ele transcende a mera
Algumas trupes ambulantes representavam pe- importância histórica e permanece como um escritor cujas
ças de teatro em toda a cidade de Grimstad. Henrik as- melhores obras conseguem emocionar e provocar hoje tanto
quanto o fizeram há mais de cem anos quando foram ence-
sistiu a algumas peças e desde então ficou fascinado pela
nadas ou lidas pela primeira vez”1
dramaturgia.
Sua obra é mundialmente aclamada tendo in-
Em 1848, com 20 anos, Ibsen deparou-se com as
fluenciado artistas a escreverem e refletirem sobre o
diversas revoluções que ocorria em toda a Europa, mo-
tempo e a instituições sociais.
vimentos esses que intimavam os governos vigentes. Ele
transformou-se num pensador de livres assuntos acerca Seus primeiros admiradores reconheceram seu
de indagações dentro da política e da religião e já se via trabalho como um dos maiores criticadores de preceitos
inserido em diversas produções dramáticas, ao passo sociais da época, mas Ibsen permanece marcado na his-
que se encontrava inteiramente animado com as revo- tória por se sobressair como o autor de enormes dramas
luções populares. Chegou a escrever mais de um poema que representavam a vida humana, em que os perso-
sobre o povo húngaro, na época que o povo lutava por nagens padeceram tentando encontrar algum entendi-
sua própria alforria e incitava os escandinavos a também mento da vida, por menor que fosse, para que pudessem
erguer-se sobre seus dominadores. continuar vivendo.
Viu-se encantado também quando ainda estuda- Em uma era em que o melodrama era feito nas
va química, e escreveu sua primeira tragédia em verso bordas do romance, de maneira inteiramente rasa, Ibsen
escrita em cinco atos, Catilina (1849/50). foi um dramático moderno e inovador, principalmente
por ter tratado de temas ainda não discutidos, e por ter
Em 1850 mudou-se para Christiana (hoje Oslo),
ressaltado um tipo de psicológico defasado, em que seus
capital da Noruega, e ingressou na Universidade, tendo
personagens foram expressos. Em cima disso, construiu
a oportunidade de conhecer intelectuais e escritores.
sua fama.
Ibsen não chegou a concluir seus estudos na Universida-
de e em 1851 aceitou um emprego de violinista clássico Sua vida foi influenciada drasticamente em
e diretor do teatro Ole Bull, onde permaneceu por seis 1900, quando Ibsen começou a passar por uma sucessão
anos. de ataques apopléticos. O primeiro deles foi capaz de
deixar seu lado esquerdo completamente paralisado. O
O emprego no teatro permitiu-lhe viajar e co-
próprio governo da Noruega sustentou o funeral oficial,
nhecer a estruturação que envolvia o mundo do teatro.
quando Henrik Ibsen morreu aos 78 anos de idade em 23
Foi um período particularmente produtivo em que o au-
de maio de 1906.
tor pode conhecer todos os detalhes desse oficio. Em
1858 casou-se com Susannah, com quem teve um filho.
A carreira de Ibsen passou por vários altos e baixos e o 1 Trecho retirado de htts://www.lpmeditores.com.br/site/de-
autor mudou-se com a família para Roma em 1864 e vol- fault.asp?TroncoID=805134&SecaoID=948848&SubsecaoID=0&Templa-
tou para a Noruega em 1891. te=../livros/layout_autor.asp&AutorID=527448

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Ficha Técnica Movimento


Título: Um Inimigo do Povo Henrik Ibsen chegou a experimentar a estética
Autor: Henrik Ibsen romântica no início de sua carreira, mas foi a partir da
Ano: 1882 adesão ao realismo que o autor desenvolveu seu estilo
Gênero: Drama mais fortemente. O teatro realista procurava compreen-
der os personagens em meio a suas relações sociais e
Contextualização políticas, explorando o cotidiano.
No século XIX, as temáticas acerca da ciência, A linguagem é sempre direta e não há idealiza-
tecnologia e filosofia foram enaltecidas. O conhecimen- ção das personagens, como acontecia no romantismo.
to, de formal geral principiou uma fase de emersão, Ibsen aprofundou-se no estilo realista e, ao abraçar con-
consequência da revolução industrial e que chegou a re- cepções cientificistas em sua obra tais como ‘o homem
sultar na existência de tentativas de sistematização para como fruto do meio’, é tido também como um autor na-
diferentes áreas de conhecimento, em diversos lugares turalista. Nos dois movimentos, o palco convertia-se em
no mundo inteiro. À medida que as evoluções tecnoló- cenário de debates.
gicas se entrelaçavam com as evoluções industriais, as
habilidades exatas, principalmente, ganhavam maiores A encenação das peças procurava reproduzir
propulsões num crescimento assustadoramente rápido. fielmente a realidade com cenários, figurinos e maquia-
gem extremamente verossímeis. Era preciso que a pla-
Essa aceleração brusca colaborou para o surgi- teia se visse retratada, por isso uma série de convenções
mento dos movimentos como o romantismo, os quais se cênicas, como a quarta parede, foram adotadas.
opuseram a toda urgência tecnológica e técnica a fim de
desaprovar consequências iminentes do individualismo Pela complexidade da encenação, grande parte
em conjunto com o estressante ritmo descontrolado da das peças se passa em ambientes internos como a casa
população dos grandes centros urbanos. O romantismo das pessoas. Observe a descrição do cenário do 1° ato de
foi pelo caminho de excesso de sentimento e drama, Um Inimigo do Povo:
numa caracterização de adoração ao amor e percepção
da natureza como abrigo e fuga do industrial e tecnoló- “É noite. Sala de estar do Dr. Stockmann, modestamente
gico. mobiliada, mas com bom gosto. Na parede da direita, há
duas portas. Uma conduz ao gabinete de trabalho do Dr. Sto-
Após o romantismo, surgem outras tendências, ckmann e a outra dá para o vestíbulo. Na parede em frente
a esta, à esquerda, há uma porta que dá para os quartos de
como o parnasianismo que acontece durante a época do dormir. Mais ao centro da mesma parede está a estufa. No
realismo e naturalismo. Discorrendo sem grande rigor, o primeiro plano, atrás de uma mesa oval, contra a parede, há
parnasianismo é praticamente o realismo em poesia. Se- um sofá e acima dele está pendurado um espelho. No fundo
guia proporções de busca pela perfeição e formalidade, da peça, por uma porta aberta, se vê a sala de jantar. Na
dessa maneira os artistas do parnasianismo preocupa- mesa, sobre a qual há um lampião com uma pantalha, está
vam-se muito mais com a estética, vocabulário robusto e servido o jantar e Billing está sentado com um guardanapo
traços em que a poesia era feita - do que em como suas ao pescoço. A Sra. Stockmann, em pé junto à mesa, alcança-
emoções estariam dispostas em suas poesias. -lhe um prato de carne. Os outros lugares vazios e os talheres
em desordem deixam claro que o jantar já acabou”.
Apesar de começar a escrever durante o movi-
A estética realista-naturalista teve grande adesão
mento romancista, Ibsen destaca-se apenas na segunda
por parte de artistas da Europa e Estados Unidos, influen-
metade do século XIX, nos próximos movimentos literá- ciando a composição estética dos filmes de Hollywood.
rios como o realismo, o naturalismo e simbolismo. Seus
questionamentos eram relacionados às próprias contra-
dições humanas, envoltos numa submersão de pensa- Personagens
mentos quanto a preocupações e experimentações do Dr. Thomas Stockmann - Médico;
ser humano da época.
Sra. Stockmann - Esposa do médico;
Os personagens de Ibsen sobressaíram-se por
conta de seus conflitos infindos sobre eles mesmos e Petra - Filha de Thomas. Professora em uma escola pú-
suas consciências, assim como sobre o julgo sem pieda- blica;
de da sociedade. O autor dispunha de diversos símbolos Eilif e Morten – Filhos de 13 e 10 anos de Thomas;
em seus trabalhos, tramando além de um enredo, metá-
foras causadoras de profundas visões e impressões com Peter Stockmann - Irmão mais velho do doutor, prefeito,
mais de uma vertente proposta. chefe de polícia, presidente da Estação Balneária, entre
outros;
Morten Kill - Dono de curtume e pai adotivo da Sra.
Stockmann;

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Hovstad - Editor do jornal A Voz do Povo; ‘inimigo do povo’. Todos os que o apoiam são prejudica-
dos.
Billing - Subeditor do jornal;
No último ato da peça, Ibsen aprofunda sua críti-
Horster - Comandante de navio;
ca quando o personagem Morten Kill aparece na casa do
Aslaksen - impressor do jornal; doutor para chantageá-lo. Kill, que é um riquíssimo pro-
prietário de curtume e responsável direto pela poluição
Cidadãos que comparecem à reunião pública. da água, beneficiou-se da situação ao comprar ações da
Estação Balneária, ou seja, Morten Kill é o causador do
Obra mal e beneficiário de toda situação. Personagem amoral,
Kill coloca seus interesses pessoais acima da família.
Um Inimigo do Povo é um drama em cinco atos.
Sua estrutura narrativa caracteriza-se pela apresentação Em Um Inimigo do Povo, Ibsen faz uma crítica
do conflito, progressão do conflito, clímax e desfecho. profunda às classes sociais, denunciando sua hipocrisia
A peça se passa numa cidade da costa da Noruega que e egoísmo. As águas poluídas representam a degradação
tem sua economia baseada na Estação Balneária. A cida- da própria sociedade – contaminada pela falta de ética.
de recebe tanto turistas, quanto doentes que escolhem Desta maneira, Ibsen se aprofunda na estética natura-
a localidade para recuperar sua saúde. Tudo vai bem até lista, apresentando o homem como fruto de seu meio.
que o médico da cidade, Dr. Thomas Stockmann, des- Uma sociedade corrompida produz pessoas moralmente
cobre que as águas estão poluídas. De início o Dr. Sto- deterioradas.
ckmann conta com o apoio de amigos e da imprensa lo-
cal, que afirmam estarem a favor dos direitos do povo e Decepcionado com as instituições, Ibsen propõe
da verdade. um final utópico a seu personagem que se apresenta
como um reformulador da sociedade. O Dr. Stockmann
O primeiro conflito que se apresenta na peça é quer educar as novas gerações para a construção de uma
entre o Dr. Stockmann e seu irmão Peter, o prefeito da sociedade mais digna. Isolado, ele conta apenas com o
cidade. Enquanto o Dr. Stockmann defende que a Esta- apoio da própria família.
ção Balneária deve ser fechada, o Prefeito defende que
haverá grandes prejuízos financeiros, pois a economia da
cidade depende da Estação. Este primeiro conflito fami-
liar é também um conflito social, visto que na estética
realista-naturalista os personagens são seres sociais e
não se desvinculam do meio.

Defensor da ciência, o Dr. Stockmann acredita


num novo mundo, onde antigas ideias e instituições con-

Citações da Obra na Matriz de Referências
O ser humano como um ser que pergunta e quer saber

A tentativa de compreensão do ser pelo ponto de


vista humanista foi a inspiração e, também, a inquietação
servadoras devem ser superadas para que se alcance um
de autores teatrais. Pensamentos conflituosos acerca do
mundo melhor. Já seu irmão Peter, o prefeito, é o porta
sagrado e profano, morte e vida, razão e emoção, entre
voz das elites conservadoras e tenta, ao longo de toda
outras questões, estão presentes em textos que traduzi-
a peça, manter as coisas como estão. O conflito entre
ram para o teatro reflexões do período, como exemplifi-
esses dois personagens permanece e se intensifica ao
cam as peças Medida por medida (Shakespeare, 1604) e
longo de todo o drama.
Um inimigo do povo (Henrik Ibsen, 1882). A peça shakes-
Em Um Inimigo do Povo, o conflito avança à me- peariana apresenta personagens que questionam o valor,
dida que o Dr. Stockmann vai perdendo o apoio da im- o uso e o abuso das leis e do poder de quem as impõe.
prensa (representada por Hovstad e Billing) e da classe Enquanto a peça de Ibsen apresenta um personagem que
média (representada por Aslaksen) – estas desistem de busca a verdade, que pergunta e quer saber sobre ques-
tões que afetam a coletividade e acaba por sofrer conse-
apoiá-lo ao serem convencidos pelo Prefeito de que o
quências devido a esses questionamentos. Cada autor,
fechamento da Estação traria prejuízos a eles. Como foi
em suas respectivas épocas, apresenta suas indagações
dito anteriormente, a postura desses personagens re-
e incômodos pelas falas, pensamentos e atitudes de seus
presenta ações de indivíduos pertencentes a uma classe
personagens. (Página 4, segundo parágrafo)
social. Ibsen faz uma crítica à imprensa (citada como o
quarto poder) e à pequena burguesia que procura sem- Indivíduo, cultura e mudança social
pre defender os próprios interesses e o das elites. A ma-
nipulação está presente em toda a peça. Os questionamentos que inspiram esse objeto
estão presentes nas obras teatrais. Em Medida por me-
A tensão social gerada pela descoberta do Dr.S- dida (Shakespeare) a atualidade ou anacronismo das leis
tockmann é tão grande que ele é levado a uma audiência é abordada a partir das questões dos costumes e das no-
pública, na qual é rechaçado pela população e declarado ções de ética e moral de uma sociedade. Em Um inimigo
do povo (Henrik Ibsen) o público/leitor é levado a teste-

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munhar a luta do cidadão na tentativa de provocar uma Energia e oscilações


mudança social. Nessas obras, é possível refletir sobre
as motivações, intenções, estratégias e recursos que os Com o desenvolvimento da luz elétrica, ocorreu
indivíduos dispõem para buscar uma mudança na socie- uma mudança na iluminação, enquanto técnica de su-
dade. (Página 7, terceiro parágrafo) porte cênico. A luz passa a ser não um mero artifício para
que a plateia veja o espetáculo, mas passa a ter um signi-
Tipos e gêneros ficado artístico. Havia, então, a possibilidade de contro-
lar a fonte da luz, sua intensidade, cor, ângulo de incidên-
No teatro, um dos gêneros mais antigos é a co- cia e até mesmo o recurso do blecaute. Nesse contexto,
média. Desde a Antiguidade Clássica, é usada como for- a obra de Henrik Ibsen, Um inimigo do povo, encontra a
ma de crítica social e política. No Renascimento, Shakes- possibilidade de reprodução fiel da realidade, por meio
peare lançou mão da comédia, em diversas obras, para não só da iluminação, mas também das demais técnicas
questionar a sociedade. Medida por Medida, é uma das de suporte cênico, como cenografia, figurino e maquia-
peças que debate o Direito de sua época, de forma mais gem. O videoclipe da canção Eu estou apaixonada por
contundente. Como é típico da comédia, retrata perso- você (Gina Lobrista) utiliza os mesmos suportes cênicos
nagens de valores morais baixos e o final traz a solução que Ibsen, porém enquanto o dramaturgo trabalha de
para os problemas de forma leve. Já no final do sécu- uma maneira realista, a artista utiliza os elementos em
lo XIX, sob o Realismo, Ibsen utiliza-se de elementos do um caráter estereotipado. (Página 15, sexto parágrafo)
drama, para promover a reflexão sobre sua contempo-
raneidade, em Um Inimigo do Povo. A peça discute não Ambiente e vida
apenas o exercício da política e seus desvirtuamentos,
como o papel da imprensa, a importância da pesquisa Em 1882, Ibsen, um dramaturgo norueguês,
científica e a sustentabilidade. Tudo isso é possível numa escreveu a peça realista Um inimigo do povo que abar-
única peça porque, como se costuma dizer nos meios cê- ca questões de ecologia, embora o conceito ainda não
nicos, o teatro é a realidade condensada. houvesse sido desenvolvido cientificamente. A peça é
protagonizada por um médico sanitarista que descobre
As obras teatrais podem variar no tipo de gênero a contaminação por um micro-organismo proveniente
dramatúrgico, como a peça Medida por medida (Shakes- de resíduos de um curtume. Esse médico é execrado pela
peare), que é uma comédia, ainda que sua comicidade grande parte da população, que não acredita na existên-
se apresente de forma sutil em muitos momentos da cia de micro-organismos. Esse médico não consegue pro-
peça. Já Um inimigo do povo (Ibsen) apresenta-se como var a existência de seres microscópicos, que interferem
um drama que busca uma representação fidedigna da na saúde humana, e acaba sendo desacreditado pela
realidade. Acerca dos gêneros sexuais, as duas obras co- população. (Página 19, quarto parágrafo)
locam homens e mulheres em papéis sociais diferentes,
evidenciando o poder, e a ausência dele, em cada grupo. A formação do mundo ocidental contemporâneo
É possível analisar, criticamente, como o gênero de cada
indivíduo condiciona seus pensamentos e estabelece li- Na obra Maria Antonieta com rosa (Le Brun,
mitações para suas atitudes. Nesse viés, há abordagem 1783) encontram-se elementos representativos e sim-
semelhante na obra O Bom-Crioulo (Adolfo Caminha, pu- bólicos do Antigo Regime, em especial da aristocracia
blicada em 1895), visto que o romance engendra ques- francesa. Por outro lado, também, existiram obras que
tões de 10 gênero, corpo e sexualidade, não só como buscavam criticar os privilégios sociais da aristocracia,
identidades representadas, mas também discursivamen- assim como os costumes e padrões sociais hegemônicos
te construídas. (Página 9, quarto e quinto parágrafos) da época. Outras obras também criticaram as contradi-
ções do emergente Capitalismo Industrial ou até mesmo
Estruturas apontavam caminhos para perspectivas sociais alterna-
tivas, como pode ser observado no conto realista A Igreja
No extremo oposto da utilização cenográfica, do Diabo (Machado de Assis,1884), na obra naturalista
está Um inimigo do povo, de Henrik Ibsen. Por estar inse- O Bom-Crioulo (Adolfo Caminha, 1895), assim como na
rida num contexto positivista e cientificista, a obra prima peça realista Um Inimigo do Povo (Henrik Ibsen, 1882).
pela reconstituição exata e detalhada da realidade, qua- (Página 21, segundo parágrafo)
se como se estivesse num laboratório para observação.
Portanto, durante o realismo, um dos principais objetivos África, Ásia e América Latina foram submeti-
do teatro era observar e compreender o comportamen- das e expostas a situações dramáticas, relacionadas à
to humano e sua complexidade psicológica, através da expansão dos modelos capitalistas industriais europeus
reprodução fiel da realidade, com a utilização da quarta e norte americano em sua fase imperialista. Reflexões
parede no palco italiano. (Página 13, quarto parágrafo) acerca dessa temática estão presentes em: O Sal da Ter-
ra (Beto Guedes), Cabaça d’água (Alberto Salgado), O
rompimento da barragem de Mariana e seus impactos
socioambientais (Luciano M. N. Lope), Um Inimigo do
Povo (Henrik Ibsen) e Conservar a Amazônia, uma ques-

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tão ambiental, social e econômica (Agência FAPESP), ao Anotações e Rascunhos


criticarem os impactos sociais e ambientais relacionados
ao Imperialismo. (Página 23, primeiro parágrafo)

Espaços

Pensar em espaços naturais implica em com-


preender a sustentabilidade como condição necessária
para orientar as atividades humanas, a fim de evitar a
devastação desses espaços. Essa reflexão pode ser susci-
tada na peça Um inimigo do povo (Henrik Ibsen), na mú-
sica O Sal da Terra (Beto Guedes), no texto O rompimento
da barragem de Mariana e seus impactos socioambien-
tais (Luciano M. N. Lopes) e no documentário Conservar
a Amazônia, uma questão ambiental, social e econômica
(Agência Fapesp). Nesse documentário pode-se, tam-
bém, perceber como a influência climática interfere nos
espaços agrários produtivos e de manutenção do meio
ambiente. (Página 27, quinto parágrafo)

A peça Medida por medida (Shakespeare) ser-


ve como um exemplo clássico do teatro renascentista,
utilizando-se do espaço teatral elisabetano para levar
discussões por um viés cômico acerca da legitimidade
do poder público. Em contraponto à comédia shakes-
peariana, a peça Um inimigo do povo (Henrik Ibsen) é
escrita no auge do cientificismo e do positivismo o que
influencia, diretamente, em novas pesquisas no âmbito
do espaço teatral. Nesse contexto, surge a “quarta pare-
de imaginária”, que muito se assemelha à capela de um
laboratório de Química, pois é como se fosse possível co-
locar a sociedade num laboratório para análise científi-
ca, ou seja, o palco italiano é utilizado para repetir a vida
cotidiana, enquanto a plateia assiste passivamente, sem
qualquer interação com os atores. (Página 28, segundo
parágrafo)

Materiais

No Teatro Elisabetano, à época de Shakespeare,


a ausência de cenografia exuberante e recursos de ilumi-
nação exigia que a interpretação teatral e a qualidade do
texto preenchessem essa carência de materiais. Na peça
Um inimigo do povo (Henrik Ibsen), os materiais de ce-
nário e figurino levam o espectador a identificar diversos
ambientes, numa composição realista. (Página 31, sexto
parágrafo)

Questões, Justificativas e Dicas


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Medida por Medida - William
Shakespeare

Autor
Medida por Medida é uma peça/comédia escrita Suas principais obras são:
por Shakespeare. Ele é considerado o maior escritor da
língua inglesa, e um dos mais importantes dramaturgos • Comédias: O Mercador de Veneza, Sonho de uma
de todos os tempos. Suas obras são verdadeiras obras de noite de verão, A Comédia dos Erros, Os dois fidalgos
arte e permanecem vivas até os dias de hoje por meio de de Verona, Muito barulho por coisa nenhuma, Noite
livros, teatro, televisão e cinema. de reis, Medida por medida, Conto do Inverno, Cim-
belino, Megera Domada e A Tempestade.
Filho de John Shakespeare e de Mary Arden, • Tragédias: Tito Andrônico, Romeu e Julieta, Julio Cé-
nascido em 23 de abril de 1564, foi na pequena cidade sar, Macbeth, Antônio e Cleópatra, Coriolano, Timon
inglesa Stratford-Avon que ele nasceu e se educou. Ape- de Atenas, O Rei Lear, Otelo e Hamlet.
sar de não haver muitos registros sobre sua infância, sa- • Dramas Históricos: Henrique IV, Ricardo III, Henrique
be-se que desde criança já demonstrava interesse pela V e Henrique VIII.
literatura e escrita. Teve uma educação bem sólida.
Os principais assuntos retratados em suas obras
Quando completou 18 anos, casou-se precoce- eram temas relacionados ao amor, sentimentalismo,
mente e teve 3 filhos, entre eles um casal de gêmeos. questões de relacionamentos humanos e sociais. Os tex-
Envolvido com problemas financeiros e familiares, em tos de Shakespeare fizeram e ainda fazem sucesso, pois
1586 decide se mudar para Londres com o objetivo de tratam de temas próprios dos seres humanos, indepen-
encontrar oportunidades melhores e, se possível, exer- dentemente do tempo histórico.
cer sua paixão. Começou trabalhando como guardador
de cavalos, mas logo já estava copiando peças e repre- Obra
sentando papéis pequenos.
Medida por Medida de William Shakespeare
Foi em Londres, nesse período, que começou a trata-se de uma peça que vai além do lúdico e do mero
escrever sua primeira peça, Comédia dos Erros. Além da entretenimento, pois é uma espécie de crítica genial,
peça, escreveu aproximadamente 150 sonetos de 1590 a por meio de elementos cômicos, do constante abuso do
1594. Muito embora seja extremamente conhecido pe- poder na Administração Pública, traições, problemas de
los sonetos, foi por meio da dramaturgia que Shakespea- moral e aplicações da lei.
re se destacou e se tornou o ícone que é.
Os personagens centrais da peça são
Logo que terminou sua primeira peça, entrou
• Vicêncio, o Duque;
para a Companhia de Teatro de Lord Chamberlain, que
• Escalo, antigo conselheiro do Duque;
possuía um teatro em Londres, onde ele em pouco tem-
• Ângelo, o governador durante a ausência do Duque;
po se tornou o autor que escrevia o maior número de • Cláudio, jovem que foi condenado por fornicação;
peças apresentadas no Teatro Globo. Assim, nesse perío- • Isabela, irmã de Cláudio;
do, favorecido pelo contexto artístico e cultural inglês do • Mariana, esposa prometida de Ângelo;
reinado da rainha Elizabeth I, escreveu tragédias, dramas • Lúcio, amigo de Cláudio; e
históricos e comédias que marcam até os dias de hoje o • Julieta, noiva de Cláudio.
cenário teatral.
Em resumo feito por Henrique Smidt Simon no
Em 1610 retornou para sua cidade natal. Depois artigo O problema da aplicabilidade da lei em desuso na
de escrever sua última peça, A Tempestade, faleceu em peça “Medida por Medida”, o enredo da peça se baseia
23 de abril de 1616 de causa ainda não identificada pelos no fato de que o Duque Vicêncio sai da cidade de Vie-
historiadores. na, dizendo que vai à Polônia, e encarrega Ângelo como
seu substituto e lhe dá plena autoridade. Entretanto, o
Ao todo, escreveu 38 peças, 154 sonetos, dois motivo de sua saída da cidade era outro. Ele queria, na
poemas de narrativa longa, e várias outras poesias. Suas verdade, fugir das suas responsabilidades e colocar Ân-
produções na dramaturgia podem ser divididas em três gelo, um homem tido como reto e corajoso, para tomar
fases: de 1590 a 1602, Shakespeare escreveu peças his- as decisões duras com relação aos cidadãos, que estão
tóricas, tragédias e comédias; de 1602 a 1610, escreveu em decadência.
apenas tragédias e comédias; e de 1610, o escritor dedi-
cou-se às peças de cunho conciliatório. Nesse contexto, o que acontecia na cidade de
Viena estava fora do controle há bastante tempo e a cul-
pa era do Duque, que não tinha coragem de ser duro

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com as pessoas e de aplicar a lei. A luxúria havia se tor- acordo com o professor de Direito da UFRJ Renato José
nado uma prática corriqueira em todas as camadas da de Moraes em seu artigo Shakespeare e a corrupção dos
sociedade. Os bordéis estavam espalhados por todas as poderosos, a peça apresenta uma série de elementos
partes – periferia e centro da cidade. Apesar de existirem importantes.
leis que puniam a fornicação e a luxúria até com a pena
capital, de morte, elas não eram aplicadas há mais de Primeiro, a importância de o governante não pretender apli-
14 anos, passando a ser negligenciadas ou até mesmo car leis demasiado onerosas à população. Isso é contrapro-
ducente, e costuma ser inclusive disfarce de comportamentos
desconhecidas pelos novos cidadãos. viciosos. Vemos que, quando há indignações exageradas con-
tra determinadas condutas, os indignados são exatamente
Assim, diante de tal libertinagem, o Duque sente aqueles que vão contra normas ainda mais importantes.
que é preciso colocar um freio nessa conduta praticada
corriqueiramente pelos indivíduos. No entanto, teme Não é de estranhar que os corruptos são justamente os que
ser taxado como tirano por aplicar leis depois de tanto mais gritam a favor da moralidade e honestidade públicas.
tempo ignoradas por ele mesmo. E aí está o motivo para Shakespeare percebeu o mecanismo psicológico perverso por
ngelo substituí-lo no poder. Sendo homem de conduta trás disso, como uma forma peculiar de hipocrisia. Mesmo
reta e fria, bem como profundo conhecedor das ciências para denunciar o crime e a maldade é preciso ter equilíbrio
e misericórdia.
sobre o Estado, ele não hesitaria em aplicar a lei. Desse
modo, o governante de Viena (que continuaria na cidade Porém, isso não implica em relaxamento na aplicação da lei.
disfarçado de padre) poderia observar a reação da socie- A segunda lição da peça é que deixar de agir conforme deter-
dade à aplicação das leis e, ainda, vigiar Ângelo atuando minam as leis faz com que todo o tecido social se acostume a
como soberano. fazer o mal impunemente. Há então a tentação do uso férreo
e inapelável das normas, com uma severidade que é igual-
Ao assumir o poder, Ângelo logo condena Cláu- mente prejudicial. Com seu rigor, Ângelo pretende corrigir
dio por fornicação ao constatar que ele havia engravida- anos de leniência; contudo, ele mesmo se mostra depravado.
do Julieta. A caminho da cadeia, Cláudio encontra com Frequentemente, o rigorismo é decorrência de anterior exces-
so de brandura. São faltas de medida.
Lúcio e pede que encontre Isabela para convencê-la a ir
falar com Ângelo pedindo o seu perdão. A irmã do con- A terceira lição é o mal que decorre da perversão dos gover-
denado vai, então, tentar convencer o substituto do Du- nantes. Nas palavras do Duque, “O vício espalha-se rápido /
que a perdoar a infração de seu irmão. A primeira reação quando o traz a própria autoridade”. Por mais que queiramos
de Ângelo é negar o pedido, mas acaba maravilhado pela uma sociedade regida por leis e por instituições, é utópico
beleza e virtudes morais e intelectuais de Isabela. Total- considerar que isso será suficiente. Sem dúvida é necessário,
mente obcecado pela mulher que estava prestes a ser mas nada funcionará no longo prazo se os próprios gover-
freira, o preposto propõe que Isabela troque a vida do nantes – e também os governados – não valorizarem o com-
portamento correto, aquilo que é benéfico para os demais,
irmão pela sua virgindade, o que ela nega. para a sociedade como um todo.
O Duque, que está espreitando tudo que aconte- Com remorso, há um momento em que Ângelo reconhece:
ce na cidade, fica sabendo da atitude de Ângelo e, disfar- “Quem uma vez perdeu a Graça, / não torna a se endireitar,
çado de padre, propõe a Isabela que marque o encontro por mais que faça”. Provavelmente ele está sendo pessimis-
e, em seu lugar, mande Mariana, a esposa prometida de ta, com o radicalismo que o caracteriza. No entanto, de fato
Ângelo, que não teve o seu casamento concretizado por é muito melhor impedir a sociedade se corromper do que a
ter perdido o dote prometido. Mariana aceita a armadi- consertar depois. Daí a importância de ter medida para punir
lha e Isabela marca o encontro. Mesmo acreditando ter e medida para tolerar, dando a cada um o que lhe for devido.
tido um encontro carnal com a irmã do condenado, o


substituto não muda a sentença e determina a morte de
Cláudio. Contudo, para evitar que a sentença seja cum-
prida, o Duque (ainda disfarçado), convence o delegado
a mandar para Ângelo a cabeça de outro prisioneiro que Citações da Obra na Matriz de Referências
havia morrido.
O ser humano como um ser que pergunta e quer saber
Assim, o governante de Viena manda uma carta
A tentativa de compreensão do ser pelo ponto de
anunciando a volta e determinando que Ângelo e Escalo vista humanista foi a inspiração e, também, a inquietação
encontrem-no na entrada da cidade para retomar o seu de autores teatrais. Pensamentos conflituosos acerca do
poder em público. Ao se encontrarem, Isabela denuncia sagrado e profano, morte e vida, razão e emoção, entre
Ângelo, que é desmascarado. O Duque, então, determi- outras questões, estão presentes em textos que traduzi-
na que Ângelo case com Mariana, que Lúcio case com ram para o teatro reflexões do período, como exemplifi-
uma alcoviteira a qual ele havia engravidado, liberta cam as peças Medida por medida (Shakespeare, 1604) e
Cláudio e pede a mão de Isabela em casamento. Um inimigo do povo (Henrik Ibsen, 1882). A peça shakes-
peariana apresenta personagens que questionam o valor,
Com este roteiro, é possível perceber que
o uso e o abuso das leis e do poder de quem as impõe.
Shakespeare tem intenções bem claras com a trama. De
Enquanto a peça de Ibsen apresenta um personagem que

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busca a verdade, que pergunta e quer saber sobre ques- Estruturas


tões que afetam a coletividade e acaba por sofrer conse-
quências devido a esses questionamentos. Cada autor, O bardo conseguiu, com maestria, navegar entre
em suas respectivas épocas, apresenta suas indagações as comédias, tragédias e dramas históricos, captando a
e incômodos pelas falas, pensamentos e atitudes de seus essência humana, de forma a conquistar a atemporalida-
personagens. (Página 4, segundo parágrafo) de de sua obra. Em Medida por medida, o poeta britânico
questiona a legitimidade de aplicação de uma lei que, em-
Indivíduo, cultura e mudança social bora ainda vigente, não tem sido aplicada por muito tem-
po, causando na sociedade a sensação de que não é mais
Os questionamentos que inspiram esse objeto aplicável. Também debate a hipocrisia dos aplicadores da
estão presentes nas obras teatrais. Em Medida por me- lei, terminando com medidas impostas pelo governante,
dida (Shakespeare) a atualidade ou anacronismo das leis arbitrariamente, sem ser questionado sobre as formas
é abordada a partir das questões dos costumes e das no- a que recorre para atingir seus propósitos. É importante
ções de ética e moral de uma sociedade. Em Um inimigo ressaltar que o teatro renascentista, na Inglaterra, utili-
do povo (Henrik Ibsen) o público/leitor é levado a teste- zava-se de cenografias minimalistas. Isso significa que,
munhar a luta do cidadão na tentativa de provocar uma estruturalmente, era necessário que muitas informações
mudança social. Nessas obras, é possível refletir sobre as fossem repassadas ao público através do texto, para com-
motivações, intenções, estratégias e recursos que os indi- preensão geral da cena, que era apresentada nos palcos
víduos dispõem para buscar uma mudança na sociedade. elisabetanos. (Página 13, terceiro parágrafo)
(Página 7, terceiro parágrafo)
Energia e oscilações
Tipos e gêneros
A fotografia, como aplicação de conceitos de luz e
No teatro, um dos gêneros mais antigos é a co- cores, é analisada a partir da óptica geométrica, por meio
média. Desde a Antiguidade Clássica, é usada como forma do modelo da câmara escura e da formação de imagens
de crítica social e política. No Renascimento, Shakespeare em anteparos e espelhos, sejam planos ou curvos, bem
lançou mão da comédia, em diversas obras, para questio- como da utilização de lentes convergentes ou divergentes
nar a sociedade. Medida por Medida, é uma das peças e a aplicação de conceitos como distância focal, refração,
que debate o Direito de sua época, de forma mais con- reflexão e interferência luminosas, que afetam aspectos
tundente. Como é típico da comédia, retrata personagens como nitidez ou tamanho da imagem. Os exemplos de
de valores morais baixos e o final traz a solução para os fotografias e pinturas revelam a importância do saber
problemas de forma leve. Já no final do século XIX, sob científico frente ao espectro da luz visível, traduzidos na
o Realismo, Ibsen utiliza-se de elementos do drama, para matéria como as cores utilizadas pelo artista, como é
promover a reflexão sobre sua contemporaneidade, em possível perceber nas obras Noite estrelada (Van Gogh),
Um Inimigo do Povo. A peça discute não apenas o exer- Jane-Avril (Toulouse-Lautrec), Anartia Olivacea (José Joa-
cício da política e seus desvirtuamentos, como o papel da quim Freire) e A redenção de Cam (Modesto Brocos). No
imprensa, a importância da pesquisa científica e a susten- teatro, a luz solar foi, por bastante tempo, a única forma
tabilidade. Tudo isso é possível numa única peça porque, de iluminação. No Renascimento, era comum que os pré-
como se costuma dizer nos meios cênicos, o teatro é a rea- dios teatrais, como o Globe Theatre, utilizado por William
lidade condensada. Shakespeare, tivessem abertura para a luz solar. Mesmo
cenas noturnas eram representadas sob a luz solar, evi-
As obras teatrais podem variar no tipo de gênero denciando assim o princípio da propagação retilínea da
dramatúrgico, como a peça Medida por medida (Shakes- luz e a independência dos feixes. Essa encenação pode ser
peare), que é uma comédia, ainda que sua comicidade se percebida na representação cênica de Medida por medi-
apresente de forma sutil em muitos momentos da peça. da (Shakespeare). (Página 15, quinto parágrafo)
Já Um inimigo do povo (Ibsen) apresenta-se como um dra-
ma que busca uma representação fidedigna da realidade. A formação do mundo ocidental contemporâneo
Acerca dos gêneros sexuais, as duas obras colocam ho-
mens e mulheres em papéis sociais diferentes, evidencian- A obra renascentista Medida por medida
do o poder, e a ausência dele, em cada grupo. É possível (Shakespeare,1604) já apresenta discussões sobre valores
analisar, criticamente, como o gênero de cada indivíduo e leis que fazem refletir sobre tabus ainda presentes nas
condiciona seus pensamentos e estabelece limitações sociedades ocidentais. Nesse período histórico, a formali-
para suas atitudes. Nesse viés, há abordagem semelhan- zação da Lei da Gravidade por Isaac Newton (1643-1727)
te na obra O Bom-Crioulo (Adolfo Caminha, publicada em e a classificação dos seres vivos pela zoologia destacam a
1895), visto que o romance engendra questões de 10 gê- importância da intelectualidade para o progresso científi-
nero, corpo e sexualidade, não só como identidades re- co. (Página 20, segundo parágrafo)
presentadas, mas também discursivamente construídas.
(Página 9, quarto e quinto parágrafos) Espaços

A peça Medida por medida (Shakespeare) serve


como um exemplo clássico do teatro renascentista, utili-

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zando-se do espaço teatral elisabetano para levar discus-


sões por um viés cômico acerca da legitimidade do poder
público. Em contraponto à comédia shakespeariana, a
peça Um inimigo do povo (Henrik Ibsen) é escrita no auge
do cientificismo e do positivismo o que influencia, direta-
mente, em novas pesquisas no âmbito do espaço teatral.
Nesse contexto, surge a “quarta parede imaginária”, que
muito se assemelha à capela de um laboratório de Quí-
mica, pois é como se fosse possível colocar a sociedade
num laboratório para análise científica, ou seja, o palco
italiano é utilizado para repetir a vida cotidiana, enquan-
to a plateia assiste passivamente, sem qualquer interação
com os atores. (Página 28, segundo parágrafo)

Questões, Justificativas e Dicas


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Anotações e Rascunhos

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“Sorte é o que acontece
quando a preparação
encontra a oportunidade”.
(Elmer Letterman)

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Gráficos e Estatísticas
OBRAS COBRADAS NA PROVA DESDE
2019

Precisamos
Romper com os
Silêncios

OBRAS COBRADAS NA PROVA DESDE


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Controle de Desempenho
Total Itens Porcentagem Escore
Itens
Obra de certos errados
de itens bruto
itens certos
A Cidade é uma Só
Povos Indígenas do Brasil
Precisamos Romper com os Silêncios
Conservar a Amazônia
Parque Nacional da Serra da Canastra
Plataforma GeoProcessamento

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A Cidade é Uma Só? Adirley Queirós

Autor
Adirley Queirós é um cineasta brasileiro forma- Contexto
do em comunicação social, com ênfase em cinema, pela
Universidade de Brasília. Adirley nasceu no Goiás, mas Precisamos entender o momento da produção
sua família se estabeleceu na cidade de Ceilândia aos do documentário e a trajetória de Adirley para saber o
três anos de idade. Ceilândia é uma cidade localizada no que o levou a produzi-lo. Depois, entender o momento
Distrito Federal e é o palco da maioria das produções ci- de criação da CEI em 1969, período de Ditadura Militar, e
nematográficas do cineasta. seus impactos na construção de uma capital inaugurada
há pouco tempo.
A filmografia de Adirley conta com produções
desde 2005. Seu primeiro curta-metragem, Rap, o canto É preciso ter a sensibilidade de entender a pes-
da Ceilândia, trabalho de conclusão de curso do cineas- quisa histórica e perceber que se trata de uma releitura
ta, recebeu prêmio no Festival de Brasília 2005 como de um passado, mas também tentar compreender os fa-
Melhor Curta por Júri Oficial e por Júri Popular. Dentre tos apresentados, e relembrados, no momento em que
os longas-metragens, “Branco sai, preto fica” de 2014 ocorreram, na década de 70.
talvez seja o mais famoso de Adirley, sendo premiado
como Melhor Filme pelo Festival Internacional de Cine- A junção dessas percepções permite ao receptor
ma do Uruguai e pelo Festival de La Plata, além de rece- da mensagem compreender os impactos dessa política
ber Menção Honrosa pela FICUNAM e Prêmio Especial de erradicação de invasões na vivência dos sujeitos apre-
do Júri pela FICCI. sentados no longa, e também na construção da cidade
como um todo.
Adirley provavelmente é um dos cineastas mais
famosos do Distrito Federal. A principal preocupação em Obra
suas produções é política, buscando visibilizar as desi-
gualdades existentes entre os espaços e entre os sujeitos “A cidade é uma só? ” é um longa-metragem do-
ocupantes desses espaços distintos. Os conflitos apre- cumental de 2011 com 1 hora e 12 minutos de duração,
sentados em suas produções perpassam desigualdades e, assim como a maioria das obras de Adirley, retrata o
econômicas e raciais, abordando violência policial, aces- contexto social da Ceilândia, se atendo à sua gênese,
sibilidade e direito à cidade. quando a Campanha de Erradicação de Invasões (CEI) se
inicia, dando origem ao que seria o nome e a cidade de
Estrutura Ceilândia.

Por se tratar de um documentário, “A cidade é Sendo um dos longas mais premiados do cineas-
uma só? ” é uma obra não-ficcional, pois retrata a reali- ta, o documentário é uma importante contribuição para
dade. Ainda assim, essa realidade parte de recorte feito a construção histórica de Brasília, demonstrando um tra-
por um sujeito, logo, é uma representação parcial e sub- balho comprometido em retratar o processo de exclusão
jetiva da história. territorial do Distrito Federal como um projeto político.

O documentário busca evidenciar a exclusão so- O filme recebeu Menção Honrosa de Melhor Fil-
cial a partir da visão daqueles que foram excluídos du- me pela Semana dos Realizadores de 2011, Melhor Filme
rante o processo de construção de Brasília. Ao focar na pela 15ª Mostra de cinema de Tiradentes e se apresen-
vivência de personagens que foram afetados pela Cam- tou em festivais em Buenos Aires, Amsterdã e Los Ange-
panha de Erradicação de Invasões, o longa se posiciona les.
politicamente, escolhendo um recorte que ainda é pou-
co vislumbrado pela indústria cinematográfica: o de tra- O documentário se reveza entre propagandas e
zer narrativas desviantes do padrão hegemônico. recortes audiovisuais do período da criação da Campa-
nha de Erradicação de Invasões e a trajetória atual de
Dessa maneira, por se tratar de uma obra que sujeitos que convivem na Ceilândia.
busca a desconstrução, oferecendo uma variedade de
sentidos para um mesmo evento, pode-se enquadrar a A Campanha de Erradicação de Invasões (CEI)
produção de Adirley como pós-estruturalista, uma vez foi criada durante o período do regime militar brasilei-
que entende os acontecimentos históricos retratados ro, mais especificamente no ano de 1969, e passou a ser
em sua obra como uma construção coletiva e subjetiva, implementada durante os dois anos seguintes. O intuito
que pode mudar se o ponto de vista e os sujeitos envol- era retirar os moradores da Vila do IAPI, alegando falta
vidos em cena forem alterados. de estruturas e os realocar nessa nova cidade, Ceilândia.

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Uma das personagens mais importantes do do- desejado, enquanto os que não se enquadram nesse
cumentário é Nancy, atual moradora da Ceilândia, que grupo são marginalizados e afastados do centro, sendo
foi uma das pessoas realocadas da Vila IAPI, tendo sido, obrigados a conviver em um local de difícil acesso e pou-
inclusive, uma das crianças a cantar na propaganda do ca estrutura.
governo a favor da campanha.
Ao se filmar uma Ceilândia atual, também fica
Nancy conta como foi a construída a campanha claro que mesmo passados 40 anos de campanha, o go-
e qual era a argumentação a favor da retirada do grupo verno ainda não voltou seus olhos para a população que
de pessoas da Vila IAPI. A alegação era a de que o local ali reside. As casas construídas em espaços inapropria-
não tinha as estruturas necessárias para acomodar os dos e as ruas não asfaltadas são o cenário do longa, que
cidadãos e que essa cidade que havia sido criada para só recebe atenção do governo durante campanha polí-
eles seria um local ‘’decente’’ e estruturado. Porém, a tica, como bem retratado também durante os minutos
realidade vivenciada pelos que foram realocados para finais do documentário.
Ceilândia era outra: a cidade não contava com a estrutu-
ra prometida pelo governo e se encontrava distante do Desse modo, Adirley consegue, mais uma vez,
centro. com muita sensibilidade trazer à tona os discursos dos
moradores de Ceilândia e denunciar o descaso de um
Além de descrever a situação e criticar a cam- governo com a região desde o começo da Campanha de
panha, Nancy ainda afirma que o real intuito do gover- Erradicação de Invasões até os dias atuais. Reivindicando
no era retirar os trabalhadores pobres, que ajudaram a o direito à cidade e reforçando que Brasília se mantém
construir Brasília, daquele local tão próximo do centro e por meio dos trabalhadores de cidades como Ceilândia,
que, segundo a própria, ‘’enfeiavam’’ a cidade. o cineasta mostra como a exclusão de certos grupos so-
ciais é um projeto político do Distrito Federal.
Devido a rapidez da campanha e seu intuito hi-
gienista, o deslocamento desses moradores foi feito de
forma precária e as condições da cidade nova, que pro-
metia ter a estrutura não presente na Vila IAPI, não eram
as mesmas prometidas.

Outro personagem que também é explorado no


documentário é Dildu, morador da Ceilândia, trabalha-
dor e candidato a deputado distrital. O documentário

Citações da Obra na Matriz de Referências
O ser humano como um ser que pergunta e quer saber

Produções audiovisuais como A cidade é uma só?


(Adirley Queiroz, 2012), Precisamos romper com os silên-
acompanha a construção da campanha de Dildu, suas cios (Djamila Ribeiro, TEDxSãoPauloSalon, 2016) e Povos
propostas e seu dia a dia, passando pelos longos trajetos indígenas do Brasil (youtuber indígena Cristian Wariu,
no transporte público, a gravação do jingle e as situações 2018), assim como a Plataforma Geoprocessamento da
mais corriqueiras do cotidiano do candidato. Funai permitem ampliar a reflexão sobre o conhecimento
de si e do outro, da história e da sociedade, pois tratam
Uma das maiores propostas de Dildu é pedir in- da noção de povo e discutem temas relativos ao território
denização para os moradores que foram retirados da Vila brasileiro, ampliando para categorias de coletividades a
IAPI, perderam suas moradias e foram realocados em problematização decorrente do perguntar e querer saber.
uma cidade de pouca estrutura e distante do centro da (Página 4, sexto parágrafo)
cidade, distância evidenciada nos longos takes nos quais
Dildu dorme no transporte público ao voltar do trabalho. Indivíduo, cultura e mudança social

O longa se dedica a filmar imagens da atual Cei- Elementos relacionados à identidade indígena,
lândia enquanto acompanha os personagens envolvidos. seu reconhecimento e sua condição contemporânea estão
As memórias do cunhado de Dildu, Zé Antônio, também presentes na Plataforma GeoProcessamento da Funai e
são bem exploradas na construção do documentário, já são tratados pelo jovem xavante no vídeo Povos indígenas
que ele comenta sobre as novas construções da cidade e do Brasil (Cristian Wariu, 2018). A percepção da identida-
de e estratificação, também presentes em Brasília, são te-
fala sobre a antiga configuração da Ceilândia.
mas do filme A cidade é um só? (Adirley Queirós). (Página
O objetivo desse documentário é expor a forma 8, segundo parágrafo)
higienista de atuação do governo, retirando as pessoas
Tipos e gêneros
de suas moradias e as afastando cada vez mais do cen-
tro, local dedicado às pessoas de maior prestígio social. Pode-se também refletir a respeito de tipologi-
O nome do longa A cidade é uma só? é uma provocação zação de estereótipos e preconceitos a partir dos vídeos
inspirada no jingle da Campanha de Erradicação de In- Povos indígenas do Brasil (Cristian Wariu, 2018) e A cida-
vasões e uma pergunta que se responde durante os 72 de é um só? (Adirley Queirós), de forma a relacioná-los à
minutos de documentário. A cidade não é uma só, visto Declaração Universal dos Direitos Humanos (ONU, 1948),
que o direito à cidade é restrito a um grupo de pessoas à Constituição Federal, Capítulo II, Direitos Sociais Fun-

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damentais, artigos 6° (Congresso Nacional Constituinte, Questões, Justificativas e Dicas


Brasil, 1988) e aos demais objetos de conhecimento nas
diferentes áreas do saber. (Página 10, quarto parágrafo) Quer acessar as questões, justificativas e dicas desta obra?

A formação do mundo ocidental contemporâneo Clique aqui ou use o QR CODE da página 6.

A Cidade é uma só? (Adirley Queirós, 2011), Anotações e Rascunhos


Conservar a Amazônia, uma questão ambiental, social e
econômica (Agência Fapesp, 2018) e O Mar de Brasília
(Engels Espíritos) problematizam os deslocamentos e as
migrações de grupos sociais e étnicos, relacionados aos
interesses e orientações vinculados ao Capitalismo Indus-
trial desenvolvido a partir do século XIX. (Página 22, pri-
meiro parágrafo)

Número, grandeza e forma

Outro tipo de modelagem refere-se a fenômenos


naturais que apresentam comportamento exponencial
ou logarítmico, nos quais se enfatiza a relação entre as
propriedades operatórias das funções e o comportamento
correspondente dos fenômenos. Os modelos podem ope-
rar com expoentes reais e bases diversas, inclusive com a
base dos logaritmos naturais, destacando-se as relações
entre a função exponencial e as progressões geométricas,
como é observado no crescimento desordenado da popu-
lação e dos problemas a ele vinculados, exemplificados no
vídeo A Cidade é uma só? (Adirley Queirós). (Página 25,
primeiro parágrafo)

Espaços

É possível perceber que as determinações sociais


são vinculadas aos espaços nos quais se dão as relações
e as estruturas de poder na sociedade brasileira contem-
porânea. Desse modo, percebe-se nas obras A redenção
de Cam (Modesto Brocos) e A Cidade é uma só? (Adirley
Queirós) uma certa dinâmica das relações desenvolvidas
a partir da construção de espaços, diferenciados por vin-
culações socioespaciais. (Página 26, quarto parágrafo)

Na análise da construção do espaço brasileiro, é


importante reconhecer o papel do sistema de transportes
na integração nacional com o objetivo de interconectar as
regiões brasileiras, para favorecer a ampliação do merca-
do interno. Sabendo que o Brasil é um país agro-exporta-
dor, é importante observar as contradições entre a dimen-
são do território e as condições de produção. Também, os
sistemas de acesso à terra que são, historicamente, an-
tidemocráticos, evidenciados pela enorme concentração
de terras. Essas questões podem ser observadas no relato
do xavante Cristian Wariu em Povos indígenas do Brasil.
A noção de espaço provoca, ainda, outras indagações
acerca de políticas de planejamento regional e como isso
teve impactos sobre a produção do espaço geográfico do
Distrito Federal e na Região Integrada do Distrito Federal
(RIDE). Embora Brasília/DF seja uma cidade planejada,
sua área metropolitana sofre um processo de segregação
socioespacial e de periferização. Essa e outras questões
estão presentes na obra audiovisual A Cidade é uma só?
(Adirley Queirós). (Página 29, quarto parágrafo)

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Povos Indígenas do Brasil - Cristian
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Wariu

Autor
Cristian Wari’u Tseremey’wa nasceu em Campi- explicar para muito mais pessoas ao mesmo tempo so-
nápolis, no estado de Mato Grosso, em junho de 1998, bre o que é verdade e o que é preconceito sobre ser in-
próximo à Terra Indígena Parabubure. Xavante de pais dígena, tentando, aos poucos, mudar a visão das pessoas
com ascendência Guarani Nhandewa da mãe, ele viveu a sobre a cultura indígena. No Youtube, o jovem indígena
infância e principalmente a adolescência entre a escola, visualizou uma oportunidade de alcançar milhares e tal-
na cidade, e os rituais Xavantes. Inclusive, o nome que vez milhões de pessoas com as suas ideias.
dá nome ao canal WARIU é de seu bisavô, que foi um dos
maiores guerreiros nas histórias do povo A’uwe uptabi, Nos seus vídeos, o jovem esclarece dúvidas ge-
que era temido entre os próprios xavantes e teve uma rais e específicas sobre o povo indígena, explica as etnias
liderança muito forte, inspirando os xavantes de todas e as diferenças entre as tradições. Fala, ainda, sobre as-
as gerações. suntos polêmicos, como: a confusão que se faz com o
conceito de indígena colonial em relação o conceito de
O jovem sempre teve muita aptidão com tec- indígena contemporâneo; como também o fato de que
nologia e informática. Seu pai, servidor público, sem- ser indígena não está na aparência e sim na essência;
pre levava antigos computadores para casa com o fim que indígena usando a tecnologia na verdade é uma fer-
de trabalhar. Muito curioso, Cristian sempre explorava o ramenta a mais para a perpetuação dos seus costumes e
máximo possível dessas oportunidades para aprender a tradições e não a substituição da própria cultura; entre
usar computadores e navegar na internet. Dessa forma, outros.
ainda muito jovem, foi atrás de cursos de informática, e
isso o levou a aprender a utilizar softwares de edição de Hoje, estudante de Comunicação Organizacional
imagem e sistemas básicos, fazendo trabalhos para orga- da Universidade de Brasília, Cristian tem um site e admi-
nizações indígenas, como artes para camisas e banners. nistra várias redes sociais, além de fazer coberturas de
eventos indígenas, escrever artigos, gravar vídeos com
Sua história com audiovisual começou em um uma frequência semanal para o Youtube e participar de
concurso escolar de vídeos para o combate a violência inúmeros projetos e organizações indígenas.
contra a mulher, no qual se sagrou vencedor com uma
animação bem simples no programa de computador Obra
Photoshop e edição de vídeo em um aplicativo nativo do
Windows. A obra trata-se de um vídeo do canal Wariu, que
fala dos povos indígenas no Brasil. Segue a transcrição:
A ideia de criar um canal no YouTube sobre ques-
tões indígenas contemporâneas era antiga, desde que “Olá, meu nome é Cristian Wari’u Tseremey’wa, sou in-
era adolescente, mas o pouco orçamento e a falta de dígena xavante com ascendência Guarani Nhandewa. Ou
equipamentos o fez deixar essa ideia de lado. Em 2017 seja, eu pertenço a dois dos mais de 300 povos nativos
surgiu um edital do Ministério da Cultura denominado que existem (rexistem) aqui no Brasil, somando mais de
“Juventude Vlogueira”, que selecionava jovens vloguei- 270 línguas diferentes, com uma estimativa de quase um
ros para difundirem uma ideia cultural. Cheio de desejos, milhão de indivíduos espalhados em aldeias e cidades em
logo se preparou com os seus poucos recursos e enviou todo o território brasileiro. Se alguém falar que não existe
a inscrição. Para sua felicidade e surpresa, foi o primeiro indígena no Brasil, tá mentindo...
colocado.
[...]
Durante o ano de 2018, desenvolveu muitas coi-
sas para que o canal pudesse se sustentar sozinho, além Falar dos povos indígenas é automaticamente falar da
de participar de várias entrevistas para jornais e televi- luta, existência, da diversidade e riqueza cultural e, in-
são, o que acabou impulsionando a sua popularidade, felizmente, dos vários equívocos que se difundiram na
chegando à marca de mais de 15 mil inscritos. sociedade e que até mesmo são tratados como absoluta
verdade.
A intenção do canal foi de desmistificar muitos
preconceitos sobre o indígena contemporâneo. Desde Diferente do que muitas pessoas pensam, índio não seria
a palavra correta a se referir aos indígenas, ou povos, ou
criança, quando frequentava a escola, tinha que ficar
nativos originários. Índio foi um equívoco dos primeiros
explicando sobre questões indígenas para os seus cole-
navegantes ao pisarem nessas terras por acreditarem ter
gas que, após entenderem sobre o assunto, passavam a
chegado às Índias. O correto é indígena, que é o oposto de
respeitar mais as tradições. Na adolescência, com a po-
alienígena, e que é um perfeito exemplo, pois, como todo
pularização dos youtubers, Cristian percebeu que podia
mundo sabe, alienígena é algo que vem de fora do plane-

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ta ou de fora da terra. Dessa forma, a palavra indígena é das muitas que resistem aqui neste país e que são total-
o oposto disso, que seria algum nativo da terra originária. mente diferentes umas das outras em línguas, pinturas,
Mas é algo corriqueiro, até mesmo dentro dos indígenas rituais, cantos, artesanato e geograficamente espalhados
e não-indígenas, denominarem um índio [dessa forma], em várias regiões brasileiras e não é só no Amazonas e
pois, como já disse, é algo que vem de muito tempo. no Mato Grosso, mas também no litoral do Brasil e em
capitais brasileiras, cada um com suas características bem
Outro equívoco, que até mesmo eu errava, era da manei- distintas, mas todos com o mesmo sentimento de manter
ra correta que deveriam ser nomeados grupos indígenas. a cultura de demarcar suas terras e ter a oportunidade
Tribo, por exemplo, é incorreto, é ultrapassado, é uma de conseguir passar toda essa riqueza para seus filhos e
denominação europeia para hierarquizar os diferentes de seus filhos para seus netos para que assim continue
povos, do selvagem ao bárbaro, e por fim o civilizado. O sendo durante muito e muito tempo os povos indígenas
que é um erro, pois, povos, diferentemente disso, não são do Brasil.
superiores ou inferiores, apenas têm costumes tradições
e organizações sociais e políticas distintas. Outros termos [...]”
que são melhores para se referir a nós, no lugar de tribo, é
povos e nações. E se for se referir ao território que a gen- A iniciativa da criação deste vídeo por um jovem
te mora, [é] comunidade e aldeia. Ou mesmo perguntar youtuber indígena demonstra vários pontos problemá-
da denominação da língua originária do povo que você ticos na visão da sociedade em relação ao indígena. É
está mencionando. Os guaranis, por exemplo, utilizam o possível perceber que a intenção foi identificar a grande
TEKOHA. O mais adequado é nos chamar de povos origi- diferença que há entre o que o índio é e como ele se vê
nários ou povos indígenas, porque abrange mais, toda a e o que pensam que ele é e como ele é visto. Ou seja, é
riqueza e diversidade étnico cultural. Se ainda resta algu- uma tentativa de desfazer a imagem de um índio sem voz
ma dúvida sobre isso, em 2007 foi assegurado pela orga- e sem protagonismo e refazer a imagem real do índio, que
nização das nações unidas ou ONU a denominação povos é um ser que está cada vez mais articulado politicamente
se referindo a indígenas dentro da declaração das nações e mobilizado para garantir o exercício da sua identidade
unidas sobre o direito dos povos indígenas. cultural, e para isso tem aprendido e dominado os códi-
gos da sociedade não indígena, não para se tornar igual,
Outra visão errada que muitas pessoas têm acerca dos mas para saber como afirmar as diferenças sem que mais
povos indígenas é sobre a aparência. Acredite ou não, injustiças aconteçam e que as suas tradições sejam pre-
mas muitas pessoas têm a visão indígena com o cabelo servadas.
liso, pele morena e olhos puxados, mas isso é apenas uma
das várias características hoje existentes no Brasil, ainda Gênero e/ou Estrutura
mais se tratando de um país tão grande como o nosso.
No Sul, por exemplo, logicamente, os indígenas têm uma Esta obra é um vídeo em formato de vlog. Diante
aparência diferente dos povos indígenas do Norte, isso disso, Vlog é a abreviação de videoblog (vídeo + blog), um
tipo de blog em que os conteúdos predominantes são os
tanto por motivos geográficos como [também o] clima.
vídeos.
Ou como no Nordeste, em que os indígenas sofreram bem
mais, pois foram os primeiros povos que tiveram contato A grande diferença entre um vlog e um blog está
com os warazu ou, por vezes, perseguidos e impedidos mesmo no formato da publicação. Ao invés de publicar tex-
de praticar em sua cultura, e hoje sendo discriminados tos e imagens, o vlogger ou vlogueiro, faz um vídeo sobre o
ou às vezes criminalizadas, sendo chamado até de falso assunto que deseja.
índio por não parecer mais com o estereótipo de indíge-
na. Mas esses povos em um processo de luta afirmando
suas identidades e revivendo suas culturas. Um grande
exemplo que vem dando muito certo são os pataxós, que
lutam diariamente para reconquistar suas origens e prá-
ticas culturais que até então foram perdidos no tempo.
Temos indígenas com diversos traços físicos, alto, baixo,
magro, gordo, loiro, moreno, cabelo enrolado, liso, pele
clara ou escura. Nosso país é extremamente diverso, é de

Citações da Obra na Matriz de Referências
O ser humano como um ser que pergunta e quer saber

Produções audiovisuais como A cidade é uma só?


(Adirley Queiroz, 2012), Precisamos romper com os silên-
se esperar que os indígenas também apresentem caracte-
rísticas físicas distintas, tanto levando em conta a localiza- cios (Djamila Ribeiro, TEDxSãoPauloSalon, 2016) e Povos
ção como também a tal da miscigenação, forçada ou não, indígenas do Brasil (youtuber indígena Cristian Wariu,
ou seja, não existe um padrão indígena, o que importa é 2018), assim como a Plataforma Geoprocessamento da
Funai permitem ampliar a reflexão sobre o conhecimento
que não percamos nossas origens culturais. Nós não dei-
de si e do outro, da história e da sociedade, pois tratam
xamos de ser indígenas ou menos indígena por não estar-
da noção de povo e discutem temas relativos ao território
mos dentro desse estereótipo de índio que foi criado por
brasileiro, ampliando para categorias de coletividades a
não indígena. Macuxi, Kayapó, Xacriaba, Bororo, Guarani,
problematização decorrente do perguntar e querer saber.
Guajajara, Maxacali, Pataxo, Potiguara, Terena, Kaigang, (Página 4, sexto parágrafo)
Tapirapé, Tupinambá, e muito outros são apenas algumas

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Indivíduo, cultura e mudança social blemáticas. (Página 14, sexto parágrafo)

Elementos relacionados à identidade indígena, A formação do mundo ocidental contemporâneo


seu reconhecimento e sua condição contemporânea estão
presentes na Plataforma GeoProcessamento da Funai e Observa-se também no século XIX a construção
são tratados pelo jovem xavante no vídeo Povos indíge- das lutas emancipatórias femininas na Europa, nos Esta-
nas do Brasil (Cristian Wariu, 2018). A percepção da iden- dos Unidos e na América Latina. Essas temáticas estão
tidade e estratificação, também presentes em Brasília, presentes nas músicas Cota Não é Esmola (Bia Ferreira),
são temas do filme A cidade é um só? (Adirley Queirós). Maria da Vila Matilde (Elza Soares), Inclassificáveis (Ney
(Página 8, segundo parágrafo) Matogrosso) e Eu estou apaixonada por você (Gina Lo-
brista), obras contemporâneas que estimulam reflexões
Tipos e gêneros acerca das rupturas ou permanências relativas à socieda-
de brasileira e aos movimentos sociais surgidos no século
Pode-se também refletir a respeito de tipologi- XIX. Essas reflexões são evidenciadas nas obras audiovi-
zação de estereótipos e preconceitos a partir dos vídeos suais Precisamos romper com os silêncios (Djamila Ribeiro
Povos indígenas do Brasil (Cristian Wariu, 2018) e A cida- - TEDxSaoPauloSalon 2016) e Povos indígenas do Brasil
de é um só? (Adirley Queirós), de forma a relacioná-los à (Cristian Wariu, 2018). (Página 21, sexto parágrafo)
Declaração Universal dos Direitos Humanos (ONU, 1948),
à Constituição Federal, Capítulo II, Direitos Sociais Fun- Espaços
damentais, artigos 6° (Congresso Nacional Constituinte,
Brasil, 1988) e aos demais objetos de conhecimento nas A Declaração Universal dos Direitos Humanos,
diferentes áreas do saber. (Página 10, quarto parágrafo) adotada pela ONU, nos serve, também, como base para
estabelecer debates acerca do espaço virtual, que é um
Estruturas meio tecnológico de geração de informação, e, também,
sobre o espaço físico brasileiro em que pode-se estabe-
Expandindo um pouco o conceito de estruturas, lecer reflexões sobre a eficácia dos meios de transporte,
o mestre espanhol Goya utiliza-se da arte para expor ao moradia, saúde etc. Ainda nessa óptica, as novas formas
mundo algumas consequências da guerra como exempli- de comunicação via redes-sociais como ilustra a obra
ficado nas gravuras românticas Série: desastres de guerra Povos indígenas do Brasil (Cristian Wariu) servem para
- chapas selecionadas: Enterrar e calar; E não há remédio; ilustrar a interrelação dos espaços físico-midiático, deba-
Estragos da guerra; O mesmo. A utilização de mídias para tendo sobre o espaço social do índio no Brasil. (Página 26,
questionar o mundo tem sido fortemente ressignificada sexto parágrafo)
na contemporaneidade, por força da grande velocidade
de 13 informações que permeia a sociedade. Nesse senti- Na análise da construção do espaço brasileiro, é
do, aponta-se a Plataforma de Geoprocessamento da Fu- importante reconhecer o papel do sistema de transportes
nai, que não só facilita a velocidade da informação, como na integração nacional com o objetivo de interconectar as
permite pesquisa refinada de dados. Também é exemplo regiões brasileiras, para favorecer a ampliação do merca-
disso o canal do jovem Cristian Wariu, sobretudo em seu do interno. Sabendo que o Brasil é um país agro-exporta-
primeiro vídeo Povos indígenas do Brasil no qual se iden- dor, é importante observar as contradições entre a dimen-
tifica como descendente de uma das etnias pré-cabralinas são do território e as condições de produção. Também, os
e discute a importância de que essas etnias sejam enten- sistemas de acesso à terra que são, historicamente, an-
didas pelo resto da sociedade. A obra audiovisual Preci- tidemocráticos, evidenciados pela enorme concentração
samos romper com os silêncios (Djamila Ribeiro - TEDx- de terras. Essas questões podem ser observadas no relato
SaoPauloSalon 2016) também traz importantes reflexões do xavante Cristian Wariu em Povos indígenas do Brasil.
críticas acerca da estrutura social brasileira, ocidental- A noção de espaço provoca, ainda, outras indagações
-cristã hegemônica e a marginalização de determinados acerca de políticas de planejamento regional e como isso
grupos sociais e étnicos. (Página 12, sexto parágrafo) teve impactos sobre a produção do espaço geográfico do
Distrito Federal e na Região Integrada do Distrito Federal
Energia e oscilações (RIDE). Embora Brasília/DF seja uma cidade planejada,
sua área metropolitana sofre um processo de segregação
O audiovisual Conservar a Amazônia, uma ques-
socioespacial e de periferização. Essa e outras questões
tão ambiental, social e econômica (documentário da
estão presentes na obra audiovisual A Cidade é uma só?
Agência Fapesp) motiva discussões e reflexões sobre
(Adirley Queirós). (Página 29, quarto parágrafo)
como utilizar a tecnologia a favor da sustentabilidade e da
busca por novas fontes de energias renováveis. É relevan-
te que o estudante consiga estabelecer conexões entre o Questões, Justificativas e Dicas
desenvolvimento tecnológico e suas consequências, como
Quer acessar as questões, justificativas e dicas desta obra?
por exemplo: a construção da Usina hidrelétrica de Belo
Monte no Pará, que modificou drasticamente o modo de Clique aqui ou use o QR CODE da página 6.
vida dos povos indígenas daquela região. Os vídeos Po-
vos indígenas do Brasil (Cristian Wariu, 2018) e Parque
Nacional da Serra da Canastra (documentário Parques do
Brasil) propiciam uma visão crítica a respeito dessas pro-

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Precisamos romper com os silêncios -
Djamila Ribeiro
Autora
Djamila Taís Ribeiro dos Santos é uma mulher Contexto
negra, brasileira, feminista e mestra em Filosofia Políti-
ca pela Universidade Federal de São Paulo. Djamila se O TEDx Talk de Djamila Ribeiro foi publicado no
tornou conhecida por usar a internet como espaço de começo de 2017, em um contexto social e político que
discussão de temas relacionados a gênero e raça. permite, ainda que de forma limitada, que se questione
os espaços de poder e quem ocupa esse espaço.
A formação em filosofia de Djamila tem ênfase
em teoria feminista, sobretudo teoria feminista negra. Ao se falar de espaços de poder e espaços de
Desde de os 18 anos, ao se envolver com a Casa da Cul- fala, o contexto, ainda que atual, não deixa de reproduzir
tura da Mulher Negra, a atual filósofa debate sobre as estruturas que foram construídas em um Brasil escravis-
distinções do movimento feminista e a desigualdade so- ta que hierarquizou os sujeitos sociais e institucionalizou
cial entre mulheres brancas e negras. Atualmente Dja- a voz masculina branca como a detentora do saber.
milla é colunista da Carta Capital, Blogueiras Negras e
Revista Azmina, além de ter sido nomeada em 2016 para O Brasil passou por quase quatro séculos de es-
ser secretária-adjunta de Direito Humanos e Cidadania cravidão e não refletiu sobre as consequências desse re-
da cidade de São Paulo. gime político que segregou e inferiorizou a figura negra
por tanto tempo. Atualmente, graças à difusão da infor-
Além de escrever o prefácio do livro Mulheres, mação e o acesso tecnológico, os sujeitos negros, que
raça e classe da filósofa negra Angela Davis, um dos sofrem as consequências desse passado não debatido,
maiores nomes do feminismo negro do mundo, Djamila podem expor seus processos e violências sofridas em es-
também publicou duas obras: O que é lugar de fala?, em paços de amplo acesso, como a internet, possibilitando
2017 e Quem tem medo do feminismo negro?, em 2018. esse debate que ainda parece tão distante das vias ins-
As duas obras procuram debater o espaço social da mu- titucionais.
lher negra e as representações que se constroem sobre
esse grupo social que, no Brasil, ocupa um espaço tão Sendo assim, é possível afirmar que o contexto
marginalizado e violentado. atual, devido ao acesso à informação via internet, per-
mite que esses discursos, essas vozes até então silencia-
das, possam ser ecoadas pela sociedade e cheguem a
Estrutura espaços e pessoas que antes não refletiam sobre essas
Por se tratar de uma palestra que discute direito condições sociais.
à voz, aos espaços de fala enquanto espaços de poder
e pautas identitárias, o discurso de Djamila pode ser Obra
enquadrado como parte do movimento pós-moderno.
Após a Revolução Industrial se iniciou o que é conhecido A obra elencada, Precisamos romper com os si-
como a modernidade, trazendo para a discussão socioló- lêncios, é um TEDx Talk, ou seja, uma palestra ministra-
gica as condições sociais materiais e a diferenciação de da por Djamila Ribeiro em São Paulo, de duração de 10
classes proposta por Karl Marx. minutos, na qual elenca alguns silenciamentos impostos
socialmente à população negra, e o silêncio de uma so-
A modernidade então se divide em duas corren- ciedade ao se deparar com desigualdades estruturais,
tes de pensamento: De um lado a do projeto iluminista, sutis ou mesmo explícitas.
que mantém a crença no progresso industrial, científico
e social; de outro lado a crítica social voltada para a di- O TEDx Talk é uma conferência internacional que
ferenciação de classes, focada puramente nas condições convida figuras importantes para dialogar, de forma su-
materiais/econômicas. cinta, sobre temas relevantes relacionados à sociedade,
tecnologia e inovação. Os vídeos são disponibilizados no
A pós-modernidade seria o rompimento dessa perfil oficial da conferência na plataforma YouTube e são
lógica e a negação de esquemas totalizantes, ocasionan- comumente utilizados como Obras do PAS pelo formato
do discussões de questões identitárias e discursos que acessível.
até então estavam silenciados. Nesse período se coloca
em evidência os discursos de países que foram coloniza- O discurso apresentado por Djamila Ribeiro no
dos, de sujeitos marginalizados e passa-se a compreen- TEDx Talk “Precisamos romper com os silêncios” é uma
der o mundo não apenas pela desigualdade econômica, reflexão filosófica, social e histórica sobre os locais de
mas por uma intersecção de violências que ocorrem na fala que foram construídos na sociedade, que acabam
sociedade. hierarquizando os sujeitos, impondo o silêncio sobre

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alguns enquanto permite que outros sejam colocados ta real daqueles e daquelas que sofrem dessas violências
como os únicos possíveis falantes. cotidianamente e que são obrigados a se calar por não
terem espaços para ecoar suas vozes.
A reflexão se inicia partindo da própria expe-
riência de Djamila enquanto mulher negra. A filóso-
fa se questiona acerca dos silenciamentos que foram
impostos a ela desde sua infância e que acabaram por
demarcar um local social de não fala, de renúncia e de
apagamento. Partindo dessa análise individual, Djamila
a insere em um quadro maior, de sociedade, e percebe
quais foram os sujeitos silenciados e quais foram os do-
tados do poder do discurso e que acabaram sendo ‘’co-

Citações da Obra na Matriz de Referências
O ser humano como um ser que pergunta e quer saber

Produções audiovisuais como A cidade é uma só?


(Adirley Queiroz, 2012), Precisamos romper com os silên-
roados’’ detentores do saber. cios (Djamila Ribeiro, TEDxSãoPauloSalon, 2016) e Povos
Ao se pensar na sociedade brasileira, é possível indígenas do Brasil (youtuber indígena Cristian Wariu,
ver, desde a colonização e se perpetuando por toda a 2018), assim como a Plataforma Geoprocessamento da
Funai permitem ampliar a reflexão sobre o conhecimento
história do país, a posição do sujeito masculino branco
de si e do outro, da história e da sociedade, pois tratam
como o detentor do saber, a voz digna de ser escutada.
da noção de povo e discutem temas relativos ao território
Essa concepção, construída num pensamento científico
brasileiro, ampliando para categorias de coletividades a
eugenista, que prioriza os sujeitos brancos justamente
problematização decorrente do perguntar e querer saber.
por ter sido pensado por eles, ainda se mantém presente
(Página 4, sexto parágrafo)
no imaginário social.
Indivíduo, cultura e mudança social
Essa sociedade que tem como topo da pirâmide
social o homem branco, possui como base a mulher ne- A participação da mulher na política ou na vida
gra, o que coopera para que esse grupo social seja o mais social de forma pública, pode ser percebida em obras
marginalizado e apagado socialmente. como O rapto de Prosérpina (Bernini), Maria Antonieta
com rosa (Le Brun), Jane Avril (Lautrec), Moema (Victor
Sujeitos negros, principalmente mulheres ne- Meirelles), Úrsula (Maria Firmina dos Reis), Precisamos
gras, que vivenciam a dupla violência (gênero e raça), romper com os silêncios - TEDxSaoPauloSalon (Djamila
são constantemente silenciadas em um movimento que Ribeiro), Cota não é Esmola (Bia Ferreira) e Maria da Vila
é histórico. E além de silenciadas, ao se verem em situa- Matilde (Elza Soares) que trata da necessidade da desna-
ções de opressão, seja ela explícita ou simbólica, ou seja, turalização da violência, permitindo um diálogo sobre a
mais subjetiva, contam com o silêncio dos demais, os su- Lei Maria da Penha. (Página 8, quinto parágrafo)
jeitos privilegiados, que fecham os olhos para as injusti-
ças e desigualdades que atingem aos demais. Tipos e gêneros
Nesse ponto é preciso distinguir o silêncio im- A fala de Djamila Ribeiro Precisamos romper os
posto do silêncio escolhido. Os sujeitos historicamente silêncios (TEDx SãoPauloSalon) propicia questionamen-
oprimidos não escolhem o silêncio, são silenciados de tos sobre a naturalização da morte dos negros e sobre
forma violenta, suas vozes não são ouvidas nem respei- silêncios institucionais. No âmbito literário, coaduna-se à
tadas, já os sujeitos que se beneficiam dessa estrutura fala de Djamila Ribeiro o poema intitulado Sonho Africa-
escolhem o silêncio em frente às injustiças que ocorrem no de Francisca Júlia, espaço poético no qual se elucidam
aos silenciados. as condições de vida do negro após a assinatura da Lei
Áurea em 1888. Desse modo, o poema suscita questões
Para resolver esse problema, Djamila propõe um acerca da memória e da importância de se conservar a
pacto de humanidade, que seria uma escolha diferente ancestralidade. Já a obra de Maria Firmina dos Reis, o
de silêncio por parte dos sujeitos beneficiados nessa so- romance Úrsula, rompe com a naturalização das diferen-
ciedade que hierarquiza as vozes. Aqui o silêncio seria ças e também desarticula a concepção antagônica entre
uma escolha dos silenciadores, seria um momento de explorador e explorado. No romance, inserido no gênero
escuta da fala dos silenciados. do folhetim, forma de publicação comum às narrativas
românticas, e que se passa em pleno Brasil escravocrata
Mas para que isso funcione de forma verdadeira, e distante ainda da abolição da escravidão, o negro pos-
é necessário que a escuta seja sincera, seja com inten- sui características morais elevadas, como a coragem, a
cionalidade de construir e entender o papel das vozes lealdade e a bondade, o que já configura a materialida-
que até então não tinham espaço. É possível que pes- de de uma enunciação negra singular para o século XIX e
soas brancas contribuam para a luta contra o racismo, possibilita a discussão sobre a da participação da mulher
como também é possível que homens contribuam para a na construção da identidade nacional, majoritariamente
luta contra o machismo, mas isso só será possível se essa composta por produções de autores masculinos. (Página
contribuição se iniciar de um ponto de escuta, uma escu- 10, primeiro parágrafo)

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Estruturas Questões, Justificativas e Dicas


Expandindo um pouco o conceito de estruturas, Quer acessar as questões, justificativas e dicas desta obra?
o mestre espanhol Goya utiliza-se da arte para expor ao
mundo algumas consequências da guerra como exempli- Clique aqui ou use o QR CODE da página 6.
ficado nas gravuras românticas Série: desastres de guerra
- chapas selecionadas: Enterrar e calar; E não há remédio; Anotações e Rascunhos
Estragos da guerra; O mesmo. A utilização de mídias para
questionar o mundo tem sido fortemente ressignificada
na contemporaneidade, por força da grande velocidade
de 13 informações que permeia a sociedade. Nesse senti-
do, aponta-se a Plataforma de Geoprocessamento da Fu-
nai, que não só facilita a velocidade da informação, como
permite pesquisa refinada de dados. Também é exemplo
disso o canal do jovem Cristian Wariu, sobretudo em seu
primeiro vídeo Povos indígenas do Brasil no qual se iden-
tifica como descendente de uma das etnias pré-cabralinas
e discute a importância de que essas etnias sejam enten-
didas pelo resto da sociedade. A obra audiovisual Preci-
samos romper com os silêncios (Djamila Ribeiro - TEDx-
SaoPauloSalon 2016) também traz importantes reflexões
críticas acerca da estrutura social brasileira, ocidental-
-cristã hegemônica e a marginalização de determinados
grupos sociais e étnicos. (Página 12, sexto parágrafo)

A formação do mundo ocidental contemporâneo

Observa-se também no século XIX a construção


das lutas emancipatórias femininas na Europa, nos Esta-
dos Unidos e na América Latina. Essas temáticas estão
presentes nas músicas Cota Não é Esmola (Bia Ferreira),
Maria da Vila Matilde (Elza Soares), Inclassificáveis (Ney
Matogrosso) e Eu estou apaixonada por você (Gina Lo-
brista), obras contemporâneas que estimulam reflexões
acerca das rupturas ou permanências relativas à socieda-
de brasileira e aos movimentos sociais surgidos no século
XIX. Essas reflexões são evidenciadas nas obras audiovi-
suais Precisamos romper com os silêncios (Djamila Ribei-
ro - TEDxSaoPauloSalon 2016) e Povos indígenas do Brasil
(Cristian Wariu, 2018). (Página 21, sexto parágrafo)

Espaços

No mundo tecnológico-informacional, temos o


desenvolvimento do espaço virtual. Neste novo espaço
da virtualidade, estão reproduzidas as relações sociais
do mundo presencial, estabelecendo reflexões acerca de
desigualdades, como pode ser observado no Precisamos
romper com os silêncios - TEDxSaoPauloSalon,2016 (Dja-
mila Ribeiro), na fotografia Atrás da estação Saint Lazare
(Cartier-Bresson) e no documentário Parque Nacional da
Serra da Canastra. Também, essas novas tecnologias da
informação afetam percepções do sujeito a respeito de
aspectos do espaço, tais como: próximo - distante, gran-
de - pequeno, rural - urbano, centro - periferia, local - re-
gional, nacional - internacional. Essas noções de espaço
antes da tecnologia virtual podem ser apreciadas nas pin-
turas em óleo sobre tela como Impressão nascer do sol
(Monet), Noite estrelada (Van Gogh, 1889) e O juramen-
to dos Horácios (Jacques-Louis David, 1784). (Página 26,
quinto parágrafo)

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Conservar a Amazônia, Uma Questão
Ambiental, Social e Econômica - FAPESP

Autoria
A obra não tem um autor, pois não é uma pes- rios diferentes da região. Assim, as três principais vege-
quisa individual, mas um tema genérico debatido em tações são:
workshop realizado em 2018 em dois locais: no Brasil
em 16/08/2018 e nos Estados Unidos em 24/09/2018. • Floresta de Terra Firme: é a que fica nos espaços que
O tema foi a conservação da Amazônia como uma ques- não foram alagados. Está presente em quase toda a
tão ambiental, social e econômica. No evento, estive- floresta. Um dos exemplos de flora presente nesta
ram presentes diversos pesquisadores com trabalhos vegetação é a árvore castanheira.
publicados sobre o assunto. Os principais objetivos do • Floresta de Várzea: é aquela que cresce nas áreas pla-
workshop foram divulgar pesquisas financiadas pela nas próximas dos rios. Quando chove, a água dos rios
FAPESP sobre o bioma amazônico e discutir de modo in- sobe e inunda o solo dessa floresta. Com isso, a rique-
terdisciplinar os fatores científicos, sociais e econômicos za dos nutrientes deste solo permite o crescimento
do desenvolvimento da Amazônia. Ainda, foram explo- cada vez maior dessa vegetação.
rados os aspectos climáticos, funcionamento ecológico, • Vegetação de Igapó: é aquela que cresce durante
biodiversidade e aspectos socioeconômicos associados todo o tempo nas regiões alagadas próximas dos cur-
ao atual projeto de desenvolvimento amazônico. Foram sos d’água. Um dos exemplos é a maior planta que
discutidos também iniciativas empresariais e de organi- cresce em água em todo o mundo, a vitória-régia.
zações não governamentais de pesquisas, que têm tido
papel importante no conhecimento dos processos afe- Além da variedade da vegetação, todas essas
tando o desenvolvimento da Amazônia. áreas têm uma função, que aparentemente é improduti-
va, mas alimenta com chuvas não apenas a economia do
Apesar de não haver um autor específico, pode- Brasil como também vários outros países. Isso se deve ao
mos destacar o organizador do workshop, o Prof. Paulo fenômeno dos rios voadores, que são formados por mas-
Artaxo, que é um dos principais cientistas brasileiros no sas de ar carregadas de vapor de água gerados pela eva-
mundo em termos de citações, número de publicações, potranspiração da Amazônia. Em outras palavras, leva
premiações e entre outros critérios. Além disso, tem re- água das bacias amazônicas para regiões em que não
conhecimento internacional como um dos pesquisado- tem água com abundância. Dessa forma, as vegetações
res mais influentes na sua área de atuação, que é o meio que, aparentemente, deveriam ser desmatadas para dar
ambiente (especialmente amazônico), mudanças climá- espaço ao agronegócio servem, invariavelmente, como
ticas/aquecimento global e poluição do ar. matéria prima do agronegócio em outras localidades em
toda a América do Sul.
Contextualização Se não bastasse a função de gerar chuvas a di-
De início, cabe fazer algumas considerações so- versas regiões do país e do continente, a densa Floresta
bre a Amazônia, sua importância para o Brasil bem como Amazônia tem também a função de reter bilhões de to-
para o mundo. neladas de carbono, o que ajuda a estabilizar o clima não
só do Brasil e países próximos, mas de todo o planeta.
A Amazônia, ou Floresta Amazônica, é a principal
floresta tropical do mundo. Ela não está somente no Bra- Além da vegetação, produção de chuvas, re-
sil, mas em outros 8 países: Bolívia, Colômbia, Equador, tenção de carbono, a biodiversidade da Amazônia é es-
Guiana, Guiana Francesa, Peru, Suriname e Venezuela. tratosférica. A variedade de animais e plantas é muito
grande. Há espécies que só são encontradas na região,
Por ter um clima quente e úmido em quase todo outras que estão em extinção e algumas que existem em
o ano, é tropical. Entre os muitos rios que a cortam, o abundância.
principal é o rio Amazonas, que, atrás apenas do rio Nilo
(6650 km), é rio mais extenso do planeta, com cerca de Portanto, a Floresta Amazônica conta com uma
6400 km de extensão. Já pelo critério de maior bacia de variedade muito grande de plantas, micro-organismos,
rios, o rio Amazonas é quase duas vezes o tamanho da fungos e animais, que crescem e se multiplicam diaria-
bacia do Nilo, que fica no Egito. mente dadas as condições favoráveis que a Floresta pro-
porciona.
A Amazônia é a maior e a mais importante vege-
tação em todo o mundo, tanto em tamanho quanto em Então, por sua extensão e propriedades, a Ama-
variedade. Por outro lado, a sua vegetação não é homo- zônia influencia todo um contexto de países na América
gênea, pois há uma enorme quantidade de variações, a do Sul, principalmente quanto ao regime de chuvas. E
depender das características do solo e da quantidade de em termos de mundo, contribui enormemente para es-

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tabilizar o clima global, haja vista que as temperaturas frequentes e intensos. Isso ocasiona a mortalidade das
têm aumentado ano após ano. Por essas e outras razões, árvores e a consequente perda em estocar carbono.
é urgente que a Floresta Amazônica deve ser preservada.
“Talvez já estejamos vendo o efeito das mudan-
ças climáticas na Amazônia, e um interfere no outro. Ou
Obra seja, o evento extremo degrada mais a floresta, degra-
A Amazônia é única. É a maior extensão de flo- dando a floresta ela emite mais CO2 e aumenta a inten-
resta tropical e o único lugar onde a própria floresta con- sidade e frequência dos eventos extremos”, disse Mar-
trola seu clima interno, impactando o mundo todo. Com tinelli.
sua biodiversidade ímpar, a Amazônia possibilita a ma-
nutenção de serviços ecossistêmicos e limpa a atmosfera Serviços ecossistêmicos
do planeta. Porém, para que haja um desenvolvimento
Fora o evidente impacto ambiental das mudan-
social sustentável na região, é necessária uma forte base
ças climáticas, há ainda consequências sociais e econô-
científica capaz de subsidiar políticas públicas que aten-
micas.
dam questões relacionadas à população, biodiversidade,
meio ambiente e economia. “Secas como as que tivemos em 2005 e 2010
provocaram um impacto social enorme. Municípios fi-
É o que destacaram participantes no workshop
caram completamente isolados, sem água e alimentos,
“As dimensões científicas, sociais e econômicas do de-
pois os rios são o transporte na região. Já as cheias ex-
senvolvimento da Amazônia”, realizado no dia 16 de
tremas deslocam populações da beira de Manaus, por
agosto de 2018, em Manaus, pela FAPESP em parce-
exemplo”, disse Artaxo.
ria com o Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia
(Inpa) e com o Brazil Institute do Wilson Center, em Modelos climáticos têm previsto aumento signi-
Washington. ficativo dos eventos extremos nas próximas décadas.
“É preciso ver a Amazônia a partir de vários as- “O Brasil precisa ter um plano de adaptação para
pectos diferentes. Ela não é um jardim botânico, pois a Amazônia. O aumento da temperatura na região foi da
não tem um funcionamento ou um impacto linear, e é ordem de 1,6 °C, enquanto a média no Brasil foi de 1,3 °C
chave para as mudanças climáticas globais”, disse Paulo e a mundial de 1,1°C [desde o fim do século 19]. Então, a
Artaxo, professor no Instituto de Física da Universidade Amazônia, por estar em uma região tropical, por receber
de São Paulo (USP) e membro da coordenação do Pro- muita radiação solar, é uma região sensível ao aumen-
grama FAPESP de Pesquisa sobre Mudanças Climáticas to da temperatura e à redução da precipitação. Dá para
Globais. imaginar o impacto socioeconômico de um dia de verão
em Manaus com temperatura média aumentada em até
O funcionamento biológico da Floresta Amazô-
5 ºC. É o que pode acontecer no futuro”, disse Artaxo.
nica regula o clima sobre a região. “A floresta controla o
balanço de energia, o fluxo de calor latente e sensível, o Um ponto a ser investigado é o dos diversos ser-
vapor d’água e os núcleos de condensação de nuvem que viços ecossistêmicos da floresta, como o processamento
vão intensificar o ciclo hidrológico. E isso só é possível se de vapor d’água e a absorção de uma quantidade enor-
houver uma extensão muito grande de floresta. Quando me de CO2 da atmosfera.
ela é fragmentada, deixa de ter essa propriedade”, disse
Artaxo, organizador do workshop, à Agência FAPESP. “O valor dos serviços ecossistêmicos que a Flo-
resta Amazônica realiza equivale a US$ 14 trilhões.
Um exemplo do impacto da floresta está na sua Atualmente, o preço da tonelada de CO2 no mercado
capacidade de armazenar carbono da atmosfera, ques- internacional está em torno de US$ 100, e a Amazônia
tão fundamental para as mudanças climáticas. absorve uma quantidade gigantesca desse gás. Isso vale
muito”, disse Artaxo.
“Mas a capacidade da Floresta Amazônica em
armazenar carbono e, de certa forma, limpar a atmosfe- Mas existe uma lista maior de serviços ecossis-
ra, está diminuindo. Há três décadas, era relativamente têmicos, como, por exemplo, o vapor d’água – essen-
mais intensa que hoje. O problema é se a floresta passar cial para a agricultura. Durante as apresentações no
a emitir mais dióxido de carbono que absorver, o que workshop, foi destacada a dependência da agricultura
agravaria as mudanças climáticas. O que acontece com de todo o sul do Brasil e dos estados de Mato Grosso e
a Amazônia interfere no mundo inteiro”, disse Luiz Antô- Goiás pelo vapor d’ água processado pela Amazônia.
nio Martinelli, professor do Centro de Energia Nuclear na
Agricultura (Cena) da USP. “Essa floresta é valorizada, é valorizável. Mas
o seu modo de exploração atual, baseado em grandes
De acordo com Martinelli, a hipótese principal projetos agropecuários, não beneficia necessariamente
para a diminuição de estocagem de carbono tem relação a população da região”, disse Artaxo.
com os eventos extremos, como a seca, que estão mais

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Outro ponto destacado foi o crescimento nos úl- Gênero e/ou Estrutura
timos cinco anos do índice de desmatamento, que vinha
decaindo consideravelmente nos últimos 30 anos. Observa-se que para cada tipo de mensagem
que um emissor deseja transmitir, ele deve utilizar-se de
“Não ter essa floresta em um cenário futuro de um gênero textual diferente. Nessa obra, o gênero tex-
aquecimento significa não ter um ativo econômico que tual escolhido foi o de divulgação científica, pois trata-se
terá muita importância para prevenir grandes prejuízos de um artigo de divulgação de uma pesquisa científica.
no futuro. Fora isso, se o Brasil quer ter uma meta além
dos 7% da produção mundial [do agronegócio], é bom Um texto de divulgação de artigo científico é um
valorizar a conservação. Pois sem esse sistema gigante gênero discursivo que transmite uma ideia de uma es-
de irrigação, não será possível atingir essa meta. É uma fera específica da ciência para a comunidade em geral,
questão econômica”, disse Paulo Moutinho, pesquisador na sua linguagem, ou seja, é por meio dos textos de di-
sênior do Instituto de Pesquisas Ambientais da Amazô- vulgação científica que a sociedade em geral toma co-
nia (Ipam). nhecimento das pesquisas que aconteceram, que estão
Mau exemplo acontecendo e que vão acontecer. Isso acontece, vistos
que se os cientistas fossem utilizar a linguagem científica
A importância de conservar a biodiversidade da pesquisa também para a sua divulgação, somente as
também foi debatida no workshop. Para Maria Teresa pessoas da área específica conseguiriam extrair as ideias
Piedade, pesquisadora do Inpa, é preciso criar um de- transmitidas. Por fim, para tornar acessível uma pesqui-
senvolvimento sustentável que seja compatível com a sa científica, utiliza-se uma linguagem também acessível,
biodiversidade e não o contrário. “A biodiversidade está isto é, um texto de divulgação científica.
aqui muito antes da nossa vinda e da região se tornar a
última fronteira de acesso a bens e produtos”, disse. Cabe mencionar que a popularização da ciência
se deve a esse tipo de gênero textual. Ele é considerado
Piedade orienta estudos de impacto na hidrelé- um dos principais instrumentos por tornar disponíveis
trica de Balbina, obra da década de 1980 no município conhecimentos e tecnologias que têm o potencial de
de Presidente Figueiredo (AM) e que tem desdobramen- ajudar a vida das pessoas em geral, e, assim, dar suporte
tos até hoje. e desenvolvimentos econômicos e sociais sustentáveis.
“A hidrelétrica de Balbina tem sido apontada há Um texto de divulgação científica tem algumas caracte-
tempos como um péssimo exemplo de sustentabilidade. rísticas, que são a presença necessária da impessoalida-
Ela deslocou populações tradicionais indígenas, gerou de, verbos predominantemente no presente do indica-
massiva mortalidade de peixes e vários outros proble- tivo e na terceira pessoa, uma vez que o autor expressa
mas. Fora isso, tem baixa eficiência”, disse à Agência descobertas que fez sem deixar revelar suas marcas pes-
FAPESP. soais e a não utilização de expressões demasiadamente
coloniais, mas também a não utilização de expressões
“Houve um achatamento da variação de secas e demasiadamente científicas, significa que, trata-se de
cheias do rio. Estamos verificando a ocorrência de mor- um texto acessível a um cidadão comum.
talidade em massa de árvores das porções mais baixas
e a entrada de espécies de terra firme nas porções mais Quanto à estrutura de um texto de divulgação
altas, anteriormente colonizadas por árvores das áreas científica, ela não tem uma forma rígida. É expositiva e
úmidas. Isso altera a biodiversidade local, a composição tem a única finalidade de transmitir conhecimentos de
florística e o banco de sementes para peixes que utilizam natureza científica a um público mais amplo. Tem uma
os rios da região para se alimentar”, disse Piedade. ideia central (afirmação dos conceitos), desenvolvimen-
to por meio de provas (exemplos, comparações, relações
O workshop “As dimensões científicas, sociais e
de efeito e causa, resultados de experiências, dados es-
econômicas do desenvolvimento da Amazônia” terá con-
tinuação no dia 24 de setembro, no Wilson Center, nos tatísticos), e uma conclusão.
Estados Unidos.

No evento, a intenção também será debater que


o entendimento físico, químico e biológico da Amazônia
auxilia na compreensão de suas fragilidades e resiliên-
cias, e que é preciso olhar para as dimensões sociais e
econômicas da região de maneira integrada.

Citações da Obra na Matriz de Referências
O ser humano como um ser que pergunta e quer saber

Torna-se, portanto, imprescindível o contato com


diferentes tipos e gêneros de texto, inclusive esses de di-
vulgação do conhecimento científico, como uma das pos-
sibilidades de identificação dos limites dessa forma de
saber. Obras audiovisuais podem contribuir na apresenta-

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ção de tais problemas, como nos documentários Conser- des), Cabaça d’água (Alberto Salgado), O rompimento da
var a Amazônia, uma questão ambiental, social e eco- barragem de Mariana e seus impactos socioambientais
nômica (Agência Fapesp) e Parque Nacional da Serra da (Luciano M. N. Lope), Um Inimigo do Povo (Henrik Ibsen)
Canastra (Parques do Brasil). Há neles conjunto de temas e Conservar a Amazônia, uma questão ambiental, social
que podem ser utilizados para o exercício da identificação e econômica (Agência FAPESP), ao criticarem os impactos
de informações centrais e periféricas, apresentadas em sociais e ambientais relacionados ao Imperialismo. (Pági-
diferentes linguagens, com potencial também para inter- na 23, primeiro parágrafo)
-relacionar objetos de conhecimento nas diferentes áreas.
(Página 5, terceiro parágrafo) Espaços

Energia e oscilações Pensar em espaços naturais implica em com-


preender a sustentabilidade como condição necessária
O audiovisual Conservar a Amazônia, uma para orientar as atividades humanas, a fim de evitar a de-
questão ambiental, social e econômica (documentário vastação desses espaços. Essa reflexão pode ser suscitada
da Agência Fapesp) motiva discussões e reflexões sobre na peça Um inimigo do povo (Henrik Ibsen), na música
como utilizar a tecnologia a favor da sustentabilidade e da O Sal da Terra (Beto Guedes), no texto O rompimento da
busca por novas fontes de energias renováveis. É relevan- barragem de Mariana e seus impactos socioambientais
te que o estudante consiga estabelecer conexões entre o (Luciano M. N. Lopes) e no documentário Conservar a
desenvolvimento tecnológico e suas consequências, como Amazônia, uma questão ambiental, social e econômica
por exemplo: a construção da Usina hidrelétrica de Belo (Agência Fapesp). Nesse documentário pode-se, também,
Monte no Pará, que modificou drasticamente o modo de perceber como a influência climática interfere nos espaços
vida dos povos indígenas daquela região. Os vídeos Povos agrários produtivos e de manutenção do meio ambiente.
indígenas do Brasil (Cristian Wariu, 2018) e Parque Na- (Página 27, quinto parágrafo)
cional da Serra da Canastra (documentário Parques do
Brasil) propiciam uma visão crítica a respeito dessas pro- Materiais
blemáticas. (Página 14, sexto parágrafo)
O desmatamento provocado pela agroindústria,
Ambiente e vida pecuária, exploração da madeira e de minérios, coloca em
risco as comunidades tradicionais, como povos indígenas
Ao longo da história da humanidade temos obser- e quilombolas. O aumento do efeito estufa, a diminuição
vado que a biodiversidade é constantemente negligencia- da evapotranspiração, empobrecimento do solo, redução
da em benefício do capital, como exposto por Beto Guedes da biodiversidade, são alguns dos efeitos que podem ge-
em O Sal da Terra. O texto O rompimento da barragem rar impactos no ciclo hidrológico. Conservar a Amazônia,
de Mariana e seus impactos socioambientais (Luciano M. uma questão ambiental, social e econômica (Agência
N. Lopes) e o vídeo Conservar a Amazônia, uma questão Fapesp), apresenta e ilustra esses efeitos. (Página 30, sé-
ambiental, social e econômica mostram como as ações timo parágrafo)
humanas impactam o meio ambiente e podem causar a
destruição de espaços e prejudicar espécies, evidenciando Questões, Justificativas e Dicas
a necessidade de repensar o uso desses ambientes. Kant,
no texto Resposta à pergunta: o que é o esclarecimento? Quer acessar as questões, justificativas e dicas desta obra?
sugere que ao fazer uso da razão o homem exerce sua au-
tonomia, condição que o torna responsável pela manu- Clique aqui ou use o QR CODE da página 6.
tenção das demais formas de vidas assegurando o equilí-
brio ambiental. (Página 17, quarto parágrafo) Anotações e Rascunhos
A formação do mundo ocidental contemporâneo

A Cidade é uma só? (Adirley Queirós, 2011), Con-


servar a Amazônia, uma questão ambiental, social e
econômica (Agência Fapesp, 2018) e O Mar de Brasília
(Engels Espíritos) problematizam os deslocamentos e as
migrações de grupos sociais e étnicos, relacionados aos
interesses e orientações vinculados ao Capitalismo Indus-
trial desenvolvido a partir do século XIX. (Página 22, pri-
meiro parágrafo)

África, Ásia e América Latina foram submetidas


e expostas a situações dramáticas, relacionadas à expan-
são dos modelos capitalistas industriais europeus e norte
americano em sua fase imperialista. Reflexões acerca des-
sa temática estão presentes em: O Sal da Terra (Beto Gue-

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Parque Nacional da Serra da Canastra

Autoria e Contextualização
O documentário Parque Nacional Serra da Ca- estiverem interessados no conhecimento científico gera-
nastra foi produzido pela TV Brasil/EBC como sendo o do na exploração dos parques brasileiros.
primeiro dos episódios da série de TV e WEB Parques do
Brasil, que foi lançada em 2018 com pré-estreia no dia 5 Ficha Técnica
de junho, às 22h15, na TV Brasil.

A série Parques do Brasil é fruto de uma parce- Coprodução: TV Brasil/EBC, Casa de Oswaldo Cruz/Fun-
ria de sucesso entre três instituições públicas: a Casa de dação Oswaldo Cruz e ICMBio
Oswaldo Cruz/Fiocruz, a TV Brasil/EBC e o Instituto Chico Direção e Roteiro: Carlos Sanches
Mendes de Conservação da Biodiversidade-ICMBio. Pesquisa e Produção: Luciana Alvarenga
Narração: Sidney Ferreira
O objetivo da sua produção foi popularizar o Produção: Ingrid Gassert e Eduardo Gurgel
conhecimento científico sobre a biodiversidade nos par- Edição e Finalização: Carolina Rodrigues
ques nacionais e outras unidades de conservação brasi- Trilha Sonora: Flavia Tygel
leiras. Videografismo: Marco Bravo e Sergio Pranzl
Imagens e imagens aéreas: Carlos Sanches e Luciana
O foco da produção foi enfatizar a relação entre Alvarenga
o meio ambiente, a saúde e a qualidade de vida das pes-
soas, alertando para ameaças aos benefícios que a natu- Obra
reza preservada disponibiliza.
O documentário Parque Nacional Serra da Ca-
Inicialmente, foram previstas duas temporadas nastra foi o episódio número 1 da série Parques do Bra-
para a série. Cada uma delas conta com 6 episódios de sil. Ao longo dos 26 minutos de duração, foi apresentado
aproximadamente 30 minutos. Ao todo, são mais de 20 o Parque Nacional da Serra da Canastra, uma das princi-
episódios retratando os principais parques e unidades pais áreas de conservação do cerrado mineiro, relatada
de conservação do Brasil. Em cada episódio, até três a história da criação da unidade e sua relação com o Rio
áreas protegidas diferentes serão retratadas, sendo os São Francisco, além de ter destacado espécies ameaça-
principais: Parque Nacional da Serra da Canastra (MG), das de extinção como o pato-mergulhão.Antes de tratar
o Parque Nacional da Serra da Bodoquena (MS), o Par- do documentário em si, cabem algumas considerações
que Nacional das Sempre Vivas (MG), o Parque Nacional sobre o Parque Nacional Serra da Canastra e o Cerrado
do Descobrimento (BA), o Parque Nacional do Pau Bra- em que se encontra.
sil (BA), o Parque Nacional da Serra das Lontras (BA), o
Parque Nacional da Chapada Diamantina (BA), o Parque Parque Nacional Serra da Canastra
Nacional do Pantanal Mato-grossense (MT), o Parque
Nacional da Serra dos Órgãos (RJ), o Parque Nacional de O Parque Nacional da Serra da Canastra loca-
Itatiaia (RJ), o Parque Nacional da Chapada dos Guima- liza-se no sudoeste de Minas Gerais, ao norte do Rio
rães (MT) e o Parque Nacional de Boa Nova (BA); a Reser- Grande. É composto por várias características do bioma
va Biológica de Sooretama (ES) e a Reserva Biológica de Cerrado, com predomínio de vários tipos de campos. A
Una (BA); a Estação Ecológica de Taiamã (MT) e a Estação vegetação predominante são os campos rupestres, com
Ecológica da Serra das Araras (MT). manchas de cerrado e matas ciliares.

Por meio de belas imagens e áudio, cada epi- O parque foi criado em 3 de abril de 1972 pelo
sódio tem um enredo que explora o gênero textual, ou Decreto nº 70.355. A sua área demarcada é de aproxima-
seja, relata situações reais vividas no diário ato da explo- damente 200 mil hectares, nas quais há a preservação
ração. No presente caso, o diário utilizado foi o diário de de várias nascentes do rio São Francisco e vários outros
expedição feito pela equipe de produção, no qual foram monumentos. Da área total, teve 83 mil hectares indeni-
relatados os mínimos detalhes e contadas as diversas zados, incluindo o chapadão da Canastra e tem 117 mil
histórias sobre a fauna e a flora, os processos ecológicos hectares na região da Babilônia, abrangendo os muni-
envolvidos, os serviços ambientais e outros. cípios de Capitólio, Vargem Bonita, São João Batista do
Glória e Delfinópolis aguardando regularização.
A série conta, ainda, com trilha sonora original e
inédita, além de desenhos e mapas para tornar, da ma- O grande objetivo da criação do Parque foi a pro-
neira mais simples possível, compreensível a todos que teção das nascentes do rio São Francisco, o curso d’água
mais conhecido que brota no imenso chapadão em for-
ma de baú ou canastra.

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O Parque chama a atenção de adeptos de vários em espetáculo cinematográfico, não deixando de ser
esportes e amantes do turismo de aventura por possuir poético e subjetivo, o qual carrega a marca de seu autor
uma variada beleza cênica com grandes paredões de ro- de alguma forma, é possível perceber um grau altíssimo
cha onde existem várias e grandes cachoeiras. Além dis- de imparcialidade dos seus produtores.
so, a região como um todo tem muitos outros atrativos
e, dentro do parque, há sinalização dos pontos de visita- É possível observar que ao longo do documen-
ção que podem ser acessados de carro, por estradas de tário a sequência de cenas e os assuntos tratados levam
terra, a depender das condições meteorológicas. o telespectador a reflexões previamente planejadas, e
muitas vezes até mesmo os resultados dessas reflexões.
Uma característica interessante do parque é que Entretanto, nesta última, muitas vezes fogem ao contro-
ele é um divisor natural de águas das bacias dos rios São le dos produtores o que resultará das reflexões levanta-
Francisco e Paraná, neste caso contribuindo ao sul com o das pelos problemas apresentados. De qualquer forma,
rio Grande e ao norte com o rio Paranaíba, por intermé- ficam evidentes as questões levantadas e os problemas
dio do rio Araguari que nasce dentro do parque. Ou seja, postos, e isso justamente para que o estudante pratique
possui várias nascentes, além de várias bacias. o exercício de refletir sobre questões cobradas na prova
como identidade sociocultural, mudança cultural, explo-
Documentário Parque Nacional Serra da Canastra ração cultural, apropriação cultural etc. Cabe, então, ao
estudante decidir como refletirá as questões levantas,
Ao todo, o documentário tem três blocos, sendo dada a imparcialidade necessária a este gênero cinema-
que o primeiro mostra a história da nascente do Rio São tográfico.
Francisco e descreve os principais ambientes dos Chapa-
dões da Canastra e da Babilônia, como o campo rupestre
e o campo limpo. Revela também conflitos existentes
desde a criação da unidade de conservação em 1972 e
apresenta espécies como a noivinha-branca, o chupim-
-do-brejo, o joão-graveto, o carcará, a coruja-buraqueira,
o periquito-rei, a cobra-de-vidro, o veado-campeiro, o lo-
bo-guará e a ema.

Citações da Obra na Matriz de Referências
O ser humano como um ser que pergunta e quer saber

Torna-se, portanto, imprescindível o contato com


diferentes tipos e gêneros de texto, inclusive esses de di-
O segundo bloco revela a origem do nome da
vulgação do conhecimento científico, como uma das pos-
Serra da Canastra e fala sobre a importância da unida-
sibilidades de identificação dos limites dessa forma de
de para a conservação do cerrado e de recursos hídricos
saber. Obras audiovisuais podem contribuir na apresen-
fundamentais. Ainda conta histórias sobre a influência tação de tais problemas, como nos documentários Con-
da Mata Atlântica na unidade, o tamanduá-bandeira e servar a Amazônia, uma questão ambiental, social e eco-
o pato-mergulhão, um dos animais mais raros do plane- nômica (Agência Fapesp) e Parque Nacional da Serra da
ta, criticamente ameaçado de extinção, que tem a sua Canastra (Parques do Brasil). Há neles conjunto de temas
maior população na região do parque. que podem ser utilizados para o exercício da identificação
de informações centrais e periféricas, apresentadas em
E o último bloco mostra a monumental Casca
diferentes linguagens, com potencial também para inter-
D’Anta, uma cachoeira de 186 metros de altura que en-
-relacionar objetos de conhecimento nas diferentes áreas.
cantou o naturalista francês Auguste Saint-Hilaire em
(Página 5, terceiro parágrafo)
1819.
Energia e oscilações
Gênero e/ou Estrutura
O audiovisual Conservar a Amazônia, uma
O gênero desta obra é o documentário. Docu-
questão ambiental, social e econômica (documentário
mentário é um filme não-ficcional que se caracteriza da Agência Fapesp) motiva discussões e reflexões sobre
pelo compromisso da exploração da realidade. Mas des- como utilizar a tecnologia a favor da sustentabilidade e da
sa afirmação não se deve deduzir que ele represente a busca por novas fontes de energias renováveis. É relevan-
realidade tal como ela é. O documentário, assim como o te que o estudante consiga estabelecer conexões entre o
cinema de ficção, é uma representação parcial e subjeti- desenvolvimento tecnológico e suas consequências, como
va da realidade. por exemplo: a construção da Usina hidrelétrica de Belo
Monte no Pará, que modificou drasticamente o modo de
Não se pode confundir a exploração do gênero
vida dos povos indígenas daquela região. Os vídeos Povos
textual diário no enredo do documentário com imparcia-
indígenas do Brasil (Cristian Wariu, 2018) e Parque Na-
lidade, pois a realidade é relatada conforme a subjetivi-
cional da Serra da Canastra (documentário Parques do
dade de quem a relata.
Brasil) propiciam uma visão crítica a respeito dessas pro-
Logo, essa obra foi elaborada por meio do gêne- blemáticas. (Página 14, sexto parágrafo)
ro cinematográfico que mais se aproxima da realidade.
Embora tenha como característica transformar o banal

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Ambiente e vida Questões, Justificativas e Dicas


A conservação do ambiente pode ser observada Quer acessar as questões, justificativas e dicas desta obra?
no vídeo Parque Nacional da Serra da Canastra. O par-
que abriga várias espécies nativas do Cerrado, perten- Clique aqui ou use o QR CODE da página 6.
centes aos mais diversos grupos de seres vivos. É possí-
vel identificar organismos como artrópodes, aves, peixes, Anotações e Rascunhos
mamíferos, angiospermas e um exemplar de pteridófita
arborícola ameaçado de extinção, a samambaiaçu. O
parque apresenta fitofisionomias variadas de Cerrado e
Mata Atlântica. Esses são exemplos de biomas brasileiros
que estampam a paisagem e são responsáveis pela gran-
de biodiversidade nacional. A variedade de solos, climas,
relevos e bacias hidrográficas determinam a riqueza pe-
culiar de cada bioma. O bioma 18 Cerrado, por exemplo, é
marcado por incêndios naturais espontâneos necessários
a sua manutenção e permitem uma variação constante de
sua paisagem. O fogo tem um papel fundamental na ati-
vação da vida e na garantia da diversidade biológica por
ativar os processos químicos necessários ao metabolismo
da flora promovendo a sua evolução. A Mata Atlântica e
o Cerrado são os que mais tem sofrido com as alterações
humanas. A fim de garantir sua integridade e a manuten-
ção de suas espécies, algumas unidades de conservação
destes biomas entraram para a lista dos patrimônios tom-
bados pela UNESCO em 2001. (Página 17, quinto parágra-
fo)

Espaços

No mundo tecnológico-informacional, temos o


desenvolvimento do espaço virtual. Neste novo espaço
da virtualidade, estão reproduzidas as relações sociais
do mundo presencial, estabelecendo reflexões acerca de
desigualdades, como pode ser observado no Precisamos
romper com os silêncios - TEDxSaoPauloSalon,2016 (Dja-
mila Ribeiro), na fotografia Atrás da estação Saint Lazare
(Cartier-Bresson) e no documentário Parque Nacional da
Serra da Canastra. Também, essas novas tecnologias da
informação afetam percepções do sujeito a respeito de
aspectos do espaço, tais como: próximo - distante, gran-
de - pequeno, rural - urbano, centro - periferia, local - re-
gional, nacional - internacional. Essas noções de espaço
antes da tecnologia virtual podem ser apreciadas nas pin-
turas em óleo sobre tela como Impressão nascer do sol
(Monet), Noite estrelada (Van Gogh, 1889) e O juramen-
to dos Horácios (Jacques-Louis David, 1784). (Página 26,
quinto parágrafo)

Materiais

Parque Nacional da Serra da Canastra (docu-


mentário Parques do Brasil) mostra muito sobre o cer-
rado, citando a combustão natural como fenômeno im-
portante na manutenção desse bioma. (Página 30, oitavo
parágrafo)

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Plataforma GeoProcessamento da Funai

Autoria
A obra Plataforma de Geoprocessamento é um O lançamento ocorreu em 2011 e teve como
software com um conjunto de mapas capazes de dar in- principal característica o inteiro uso de tecnologias li-
formações precisas sobre as terras indígenas. A platafor- vres, que são softwares criados, mantidos e distribuídos
ma foi criada pela Fundação Nacional do Índio. gratuitamente pela comunidade de programadores, e
isso significou uma economia enorme para a instituição,
A seguir, veja a definição e um pouco da história visto que a própria sociedade é que executou a trabalho-
da FUNAI disponível em seu site: sa missão de desenvolver uma plataforma tão robusta
como esta, objeto da análise.
“A FUNAI é o órgão indigenista oficial do Estado brasileiro.
Criada por meio da Lei nº 5.371, de 5 de dezembro de 1967, O objetivo da criação da plataforma foi se tor-
vinculada ao Ministério da Justiça, é a coordenadora e princi- nar uma ferramenta de análise disponível gratuitamente
pal executora da política indigenista do Governo Federal. Sua
tanto para a própria FUNAI quanto para a sociedade civil
missão institucional é proteger e promover os direitos dos
povos indígenas no Brasil.
em geral. Com a plataforma foi possível ter acesso a in-
formações organizadas e precisas sobre as terras indíge-
Cabe à FUNAI promover estudos de identificação e delimi- nas regularizadas.
tação, demarcação, regularização fundiária e registro das
terras tradicionalmente ocupadas pelos povos indígenas, Os principais beneficiados pela disponibiliza-
além de monitorar e fiscalizar as terras indígenas. A FUNAI ção do software foram a Polícia Federal e as ONGs, pois
também coordena e implementa as políticas de proteção aos sempre tiveram que atuar junto aos indígenas sem infor-
povos isolados e recém-contatados. mações precisas acerca das terras indígenas, e, claro, os
próprios povos indígenas, que puderam ter uma prote-
É, ainda, seu papel promover políticas voltadas ao desenvol- ção e cuidado maior vindo do poder público.
vimento sustentável das populações indígenas. Nesse campo,
a FUNAI promove ações de etnodesenvolvimento, conserva-
ção e a recuperação do meio ambiente nas terras indígenas, Obra
além de atuar no controle e mitigação de possíveis impactos
ambientais decorrentes de interferências externas às terras
A Plataforma de Geoprocessamento é um sof-
indígenas.
tware livre, disponível ao público em geral gratuita-
mente, que serve de importante ferramenta para que a
Compete também ao órgão a estabelecer a articulação inte- FUNAI consiga alcançar os seus objetivos institucionais
rinstitucional voltada à garantia do acesso diferenciado aos com relação aos povos indígenas. Afinal, os desafios são
direitos sociais e de cidadania aos povos indígenas, por meio enormes. Segundo o Relatório Anual de Gestão da FU-
do monitoramento das políticas voltadas à seguridade social NAI de 2018:
e educação escolar indígena, bem como promover o fomento
e apoio aos processos educativos comunitários tradicionais e “Os povos indígenas brasileiros variam em suas culturas, lín-
de participação e controle social. guas, formas de organização social e política, rituais, mitos,
formas de expressão artística, habitações e maneiras de se
A atuação da Funai está orientada por diversos princípios, relacionar com o ambiente em que vivem.
dentre os quais se destaca o reconhecimento da organização
social, costumes, línguas, crenças e tradições dos povos indí- No Brasil existem aproximadamente 305 etnias, 274 línguas
genas, buscando o alcance da plena autonomia e autodeter- indígenas faladas e foi contabilizado o registro de 114 povos/
minação dos povos indígenas no Brasil, contribuindo para a grupos indígenas isolados, sendo 26 referências confirmadas
consolidação do Estado democrático e pluriétnico. ” em 2018. Ainda, o censo do IBGE demonstrou que cerca de
17,5% da população indígena não fala a língua portuguesa.

Contextualização Atualmente existem 566 Terras Indígenas (111,07 milhões de


hectares) que representam cerca de 12,9% do território brasi-
A FUNAI (Fundação Nacional do Índio) foi a leiro, em diferentes fases do procedimento administrativo de
instituição responsável pela criação da Plataforma de demarcação de terras indígenas.”
Geoprocessamento. Os profissionais Rafael Wasowski
(geógrafo), Patrícia Cayres (engenheira florestal) e Bruno O geoprocessamento, que é a finalidade da pla-
Rebello (analista de geoprocessamento), juntos à Coor- taforma criada pela FUNAI, é um dos desdobramentos
denação Geral de Geoprocessamento (CGGEO) e à Dire- da evolução dos estudos da cartografia. Em termos téc-
toria de Proteção Territorial (DPT), foram os responsá- nicos, geoprocessamento é formado por Sistemas de
veis pela condução do desenvolvimento desse software. Informação Geográfica (SIG), que é um nome genérico
dado a todo programa de computador que tem função

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de processar dados espaciais. Ou seja, SIGs são softwa- brasileiro, ampliando para categorias de coletividades a
res criados para reunir informações de áreas a serem es- problematização decorrente do perguntar e querer saber.
tudadas e modelar, processar e analisar todas os dados (Página 4, sexto parágrafo)
disponíveis. Assim, podemos dizer que a Plataforma de
Geoprocessamento criada pela FUNAI é um SIG, pois é Indivíduo, cultura e mudança social
capaz de reunir informações do espaço geográfico bra-
sileiro e gerar dados como etnias indígenas, grupos, lín- Elementos relacionados à identidade indígena,
guas faladas, entre outras. seu reconhecimento e sua condição contemporânea estão
presentes na Plataforma GeoProcessamento da Funai e
Antes da evolução da tecnologia computacional, são tratados pelo jovem xavante no vídeo Povos indígenas
os dados espaciais do local objeto de estudo eram regis- do Brasil (Cristian Wariu, 2018). A percepção da identida-
trados em papel e a elaboração dos mapas despendia de e estratificação, também presentes em Brasília, são te-
uma grande quantidade de atividade intelectual humana mas do filme A cidade é um só? (Adirley Queirós). (Página
e nem sempre se chegava a conclusões corretas. Atual- 8, segundo parágrafo)
mente, com os SIGs, os dados espaciais são coletados e
Estruturas
registrados em programas computacionais em tempo
real e, imediatamente, já estão disponíveis para análise Expandindo um pouco o conceito de estruturas,
e a geração das geoinformações. o mestre espanhol Goya utiliza-se da arte para expor ao
mundo algumas consequências da guerra como exempli-
As geoinformações geradas pelos SIGs são dife-
ficado nas gravuras românticas Série: desastres de guerra
rentes das geradas pelos mapas antes das tecnologias - chapas selecionadas: Enterrar e calar; E não há remédio;
de geoprocessamento serem desenvolvidas, pois toda Estragos da guerra; O mesmo. A utilização de mídias para
geoinformação, atualmente, vem acompanhada pelas questionar o mundo tem sido fortemente ressignificada
suas coordenados geográficas (longitude, latitude e al- na contemporaneidade, por força da grande velocidade
titude), ou seja, todo resultado que é gerado é precisa- de 13 informações que permeia a sociedade. Nesse senti-
mente localizável. do, aponta-se a Plataforma de Geoprocessamento da Fu-
nai, que não só facilita a velocidade da informação, como
Podemos dizer que a cartografia apresenta as
permite pesquisa refinada de dados. Também é exemplo
formas de representação dos dados para os processos
disso o canal do jovem Cristian Wariu, sobretudo em seu
que ocorrem no espaço geográfico e o geoprocessa-
primeiro vídeo Povos indígenas do Brasil no qual se iden-
mento faz um tratamento desses dados resultando em
tifica como descendente de uma das etnias pré-cabralinas
geoinformações. Portanto, a cartografia e o geoproces-
e discute a importância de que essas etnias sejam enten-
samento são importantíssimos para a tomada de deci-
didas pelo resto da sociedade. A obra audiovisual Preci-
sões com relação a espaços geográficos, especialmente samos romper com os silêncios (Djamila Ribeiro - TEDx-
no caso das terras indígenas, pois podem colaborar no SaoPauloSalon 2016) também traz importantes reflexões
planejamento do meio rural, do meio urbano, do meio críticas acerca da estrutura social brasileira, ocidental-
ambiente e até mesmo do transporte, para que tudo isso -cristã hegemônica e a marginalização de determinados
seja feito de maneira a preservar os índios. grupos sociais e étnicos. (Página 12, sexto parágrafo)
Assim, a Plataforma de Geoprocessamento cria- Energia e oscilações
da pela FUNAI é fundamental para preservar os povos in-
dígenas e sua cultura, pois permitem ampliar a reflexão A radiação é responsável pela transmissão de da-
sobre o conhecimento de si e do outro, já que mostra dos o que é perceptível na existência de radares e satélites
que na sociedade brasileira existe uma diversidade de de alta resolução capazes de fornecer imagens, mapas e
cultura muito maior do que é de conhecimento comum. localizações através de sistemas como o GPS. Nesse senti-
do, a Plataforma de Geoprocessamento da Funai é uma


ferramenta para a coleta de dados. (Página 16, terceiro
parágrafo)
Citações da Obra na Matriz de Referências Espaços
O ser humano como um ser que pergunta e quer saber Na formação do espaço geográfico brasileiro,
observa-se a constituição de focos de resistência e afirma-
Produções audiovisuais como A cidade é uma só? ção de escravos, ex-escravos e indígenas. Exemplos dessa
(Adirley Queiroz, 2012), Precisamos romper com os silên- formação estão na pintura Roda de capoeira (Rugendas),
cios (Djamila Ribeiro, TEDxSãoPauloSalon, 2016) e Povos na Plataforma GeoProcessamento da Funai e nas mani-
indígenas do Brasil (youtuber indígena Cristian Wariu, festações de cultura popular tais como Capoeira e Carim-
2018), assim como a Plataforma Geoprocessamento da bó que carregam influências africanas e indígenas que
Funai permitem ampliar a reflexão sobre o conhecimento estão evidenciadas nas coreografias e na dramaticidade
de si e do outro, da história e da sociedade, pois tratam e gestualidade dos brincantes, além de representar a di-
da noção de povo e discutem temas relativos ao território

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versidade, no que se refere às suas fronteiras geográficas,


culturais e econômicas. (Página 28, terceiro parágrafo)

Questões, Justificativas e Dicas


Quer acessar as questões, justificativas e dicas desta obra?

Clique aqui ou use o QR CODE da página 6.

Anotações e Rascunhos

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"Não há sucesso sem
dificuldade ”.
(Sófocles)

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Gráficos e Estatísticas
OBRAS COBRADAS NA PROVA DESDE
2019 Contos
A Canção do O Sonho Selecionados de
Exílio Machado de
O Assinalado Assis
O Bom Crioulo Ideias Íntimas
O Rompimento
da Barragem de
Mariana
A Desobediência
Úrsula civil

Resposta à
Pergunta: O que
é Esclarecimento

OBRAS COBRADAS NA PROVA DESDE


2019

13 14
8
4 5 4
2 3
1 1

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Controle de Desempenho
Total Porcentagem
Itens Itens Escore
Obra de
certos errados
de itens
bruto
itens certos
Contos Selecionados de Machado de Assis
O Bom Crioulo
A Canção do Exílio
Ideias Íntimas
Meus Oito Anos
Marieta
O Sonho Africano
Mal Secreto
O Assinalado
Ismália
Úrsula
A Desobediência Civil
Resposta à Pergunta: O que É Esclarecimento?
Museu Nacional
O Rompimento da Barragem de Mariana
Entrevista - Edgar Dutra Zanotto
Onde as Cientistas Não Têm Vez
Lei Maria da Penha
Declaração Universal
Constituição Federal, Capítulo II

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Contos Selecionados - Machado de
Assis

Autor
Joaquim Maria Machado de Assis nasceu no dia O Realismo chega ao Brasil num contexto aboli-
21 de junho de 1839 na cidade do Rio de Janeiro. Filho cionista, de crise monárquica e instituição da Lei Áurea
de uma lavadeira e de pintor de paredes, Machado le- em que houve a troca da mão de obra escrava pela mão
vava uma vida muito simples no Morro do Livramento. de obra assalariada. As indústrias começavam a crescer,
Ficou órfão de mãe muito cedo, vendia doces para aju- colaborando para que o ambiente urbano se desenvol-
dar nas despesas da família e frequentou por um curto vesse a fim de atrair quem antes vivia no meio rural.
período de tempo a escola pública. Toda essa mudança de pensamento se reflete nas obras
literárias.
Apesar disso, durante a juventude, o autor fre-
quentava a livraria e tipografia de Francisco de Paula Bri- A narrativa Realista visou a descrever na sua
to, sede da redação da revista Marmota Fluminense, o ficção a realidade da forma mais real (repetitivo assim
que contribuiu para que Machado sempre estivesse em mesmo: real!), mais objetiva e verossimilhante possível.
contato com o mundo literário. Em 1856, se torna tipó-
grafo e conhece o escritor Manuel Antônio de Almeida, Pai Contra Mãe
autor de “Memórias de Um Sargento de Milícias”.
Resumo
Em 1858 volta à livraria, começa seu trabalho
como revisor da revista, publicando seu primeiro poe- O conto começa descrevendo alguns dos ofícios
ma: Ela, na revista. Pouco tempo depois, começa a con- e aparelhos que foram aposentados com a abolição da
tribuir com contos, crônicas para jornais e revistas. Logo escravidão: o ferro ao pescoço, ferro ao pé, e o ofício de
depois, começa sua carreira como funcionário público, e, caçador de escravos fugidos, este último funcionava da
por indicação de um colega, Machado torna-se redator seguinte forma: o dono colocava um anúncio pelas ruas
do Diário Oficial. com a descrição do escravizado, nome, vestimentas, e
quem o encontrasse recebia uma quantia de dinheiro.
Em 1896, o escritor ajuda na fundação da Acade-
mia Brasileira de Letras, sendo eleito por unanimidade Um dos que se dispunha a esse ofício era Cândi-
como presidente da Academia. do Neves, o protagonista da história, o qual após várias
tentativas em outras ocupações, depois de se apaixonar
No ano de 1908, Machado de Assis morre, deixando 10 por Clara, numa forma de arranjar dinheiro rápido para
romances, 216 contos, 10 peças teatrais, 5 coletâneas casar com a moça, acabou nesse trabalho de capturar
de poemas e sonetos, e mais de 600 crônicas.Principais escravos fugidos.
Obras:
Clara era órfã e morava com a tia, Mônica. Am-
● Ressurreição-1º romance publicado- (1872) bas trabalhavam como costureiras. De início a tia não
apoiou o casório de Clara e Cândido, justamente por este
● Helena (1876) não ter um emprego fixo e estável. Mesmo assim eles se
casaram, vivendo os três sob o mesmo teto.
● Memórias Póstumas de Brás Cubas- (1881)
O casal queria um filho, mas a tia Mônica nova-
● Quincas Borba (1892) mente foi contra, dado que as condições financeiras da
casa eram muito escassas. Logo o filho veio e a tia insiste
● Dom Casmurro (1900)
então para que Cândido procurasse um outro ofício, já
que agora existiam outras pessoas no mesmo trabalho
Realismo de captura de escravizados, o que atrapalhava o rapaz,
Realismo é o movimento literário presente na razão pela qual não tinha muito sucesso em arrecadar
metade do séc. XIX. Iniciada por Flaubert com Madame recompensas, tornando a situação financeira ainda mais
Bovary na França, ao apresentar uma personagem ca- precária.
sada e adúltera, o autor destrói a idealização amorosa
Cândido até tenta, mas não consegue achar ocu-
que existia sobre a figura feminina no Romantismo. Além
pação em que consiga aprender rápido o trabalho, e en-
disso, com a protagonista sendo uma integrante da alta
quanto isso a gravidez da esposa chegava ao oitavo mês.
burguesia na narrativa, o autor faz uma crítica certeira
Clara continuava costurando com a tia, no entanto o di-
às aparências e hipocrisias que a classe burguesa vivia.
nheiro ainda não era o suficiente para cobrir três meses
de aluguel. Mônica insiste então para que o casal dê o

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filho na Roda dos Enjeitados, um mecanismo criado pe- sobre algumas crueldades e ofícios existentes na época
las instituições caridosas, principalmente ligados à Igre- da escravidão para depois entrar na história de Cândido,
ja, para doar recém-nascidos. Os pais ficam chocados e em que o tempo da narrativa é cronológico. O espaço da
rejeitam a proposta até o fim. Porém, o dono da casa história acontece todo momento no Rio de Janeiro, no
aparece para cobrar os três meses de aluguel atrasado, e período Imperial.
se estes não fossem pagos em cinco dias, estariam todos
na rua. Sendo uma obra Realista, encontra-se nela as ca-
racterísticas do movimento como crítica social, comple-
Cândido não consegue o dinheiro, a criança nas- xidade humana e crítica à hipocrisia humana.
ce, e tia Mônica consegue abrigo na casa de uma conhe-
cida, voltando a insistir na doação da criança na Roda A crítica social existente na obra consiste na de-
dos Enjeitados. Sem muita escolha, Cândido promete núncia da pobreza e do desemprego da época, a partir
levar o filho ainda aquela semana. do momento que Cândido tem que se prestar a um ser-
viço de captura de escravizados, isso demonstra a pre-
Mas antes de doar a criança, o pai tenta mais cariedade da sociedade. É interessante notar também
uma vez capturar algum escravo fugido, e vai à rua. Vê como a questão de classe social é retratada, uma vez que
o cartaz de uma escrava fugida. Arminda era seu nome na cena final da briga entre o pai livre e mãe escraviza-
e a recompensa: cem mil réis. Cândido vai ao local onde da, ambos estavam lutando com o mesmo objetivo em
a escrava poderia estar escondida, mas o mais próximo mente: proteger seus filhos. Se o pai conseguisse vencer,
que chega é de um farmacêutico que diz que a moça que conseguiria manter seu filho, e a mãe conseguindo fugir,
Cândido descrevia havia passado ali no dia anterior. não teria um filho escravizado. Nesse contexto, pode-se
concluir que o único que teve direito à vida foi a criança
Novamente Cândido volta para casa de mãos branca, livre; enquanto a criança preta e escravizada foi
vazias e promete levar a criança no dia seguinte à Roda abortada. E mesmo que essa criança preta nascesse, no
dos Enjeitados. E no dia seguinte, assim o faz, mas no meio escravo, não viveria, sobreviveria certamente sob
caminho resolve voltar à rua do farmacêutico com o pro- aquelas condições de crueldade descritas no início do
pósito de pegar o caminho mais longo e passar mais um texto.
tempo com a criança. Mas ao passar pela rua que estava
no dia anterior, logo vê mais à frente a escrava fugida A análise do psicológico humano é descrito pela
que valia cem mil réis. Cândido deixa a criança sob os capacidade de que persuasão que tia Mônica tem e a ca-
cuidados do farmacêutico que conhecera no dia ante- pacidade de humilhar e maltratar a qualquer custo para
rior, e vai ao encontro da captura da escrava. proteção dos seus próprios, visto o que Cândido faz para
proteger sua família. É interessante notar que quando
Ele chama por Arminda, e a mulher se vira, con- Clara dá à luz ao neném, e a tia sugere novamente levar
firmando ser quem ele procurava. Cândido a agarra, a criança à Roda dos Enjeitados, a discussão acontece
enquanto ela suplica para que a solte pois está grávida, apenas entre a tia e o pai, enquanto a voz de Clara não
Cândido continua prendendo e arrastando-a até a casa aparece.
do senhor de escravos, ignorando os berros da escraviza-
da. Ele a entrega para o senhor de escravos, mesmo após A hipocrisia da sociedade e do ser humano mos-
o esforço feito pela mulher para se largar. Em função do tram que para uma criança viver com os pais, outra pre-
sofrimento nessa luta, o filho que Arminda esperava é cisou morrer no útero da mãe. A desigualdade e a po-
abortado. breza levam as pessoas a um nível tão cruel a ponto de
caçarem seus iguais (afinal, escravo e homem livre são
Cândido deixa a criança sob os cuidados do far- da mesma espécie humana) para conseguirem sobrevi-
macêutico que conhecera no dia anterior, e vai ao en- ver.
contro de Arminda para capturá-la. A única declaração
que faz sobre o aborto da mulher é que “algumas crian- Além disso, a narrativa é construída com a iro-
ças simplesmente não vingam”. nia tipicamente Machadiana. O trecho abaixo é um bom
exemplo da ironia do autor:
Análise
Há meio século, os escravos fugiam com frequência. Eram
O conto foi publicado em 1906, o que significa muitos, e nem todos gostavam da escravidão. Sucedia oca-
que foi num período pós-abolição e já no regime republi- sionalmente apanharem pancada, e nem todos gostavam de
cano. Porém, Machado viveu o período do Império e da apanhar pancada.
escravidão, é ainda mais válido lembrar que o autor era
negro, tendo sofrido preconceito racial durante sua vida, A Igreja do Diabo
e além disso, várias tentativas de representá-lo como
branco ao longo da história. Resumo

A obra é escrita em terceira pessoa, é dividida A Igreja do Diabo foi publicado em 1884 no livro
em duas partes: uma em que o autor nos contextualiza Histórias sem Data. O conto é dividido em quatro capítu-

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los protagonizados pelo Diabo, que, insatisfeito com a comparação que se faz do céu com um comércio (trecho
falta de rituais, leis e outros artifícios para serem usados citado anteriormente em que o Diabo diz que o preço
a seu favor, então resolve construir sua própria Igreja. para se chegar ao céu é muito alto) e o próprio fato do
Diabo construir uma instituição tão próxima em estru-
O primeiro capítulo nos apresenta o nascimento tura à Igreja, já caracteriza como crítica. Essa é uma das
dessa ideia e o descontentamento do Diabo por não ter características do Realismo, visto que, por influência do
um livro, uma ideologia que servisse unicamente ao mal. cientificismo vindo da Europa no final do séc. XIX, é mar-
E idealiza como será: uma igreja única, ao contrário das cado por esse afastamento da Igreja e da religião.
outras que se dividiram em diversas doutrinas diferentes
da primeira, a Igreja do Diabo não se dividira jamais, pois Enquanto no Romantismo existe uma exaltação
“há vários modos de se afirmar; mas há apenas um de da Igreja, no Realismo existe a crítica e a aproximação ao
negar tudo”. cientificismo.

Como uma espécie de anúncio, o Diabo então no É interessante notar que em A Igreja do Diabo na
segundo capítulo sobe ao céu para comunicar a Deus seu verdade não existe uma crítica somente à Igreja Católica,
plano diabólico. Existe aqui inclusive uma crítica à igreja mas Machado demonstra uma descrença na religião em
católica quando o Diabo declara que “Não tarda muito si, seja ela diabólica ou divina. Uma vez que em nenhu-
que o céu fique semelhante a uma casa vazia, por causa ma das duas instituições os fiéis seguiam à risca suas leis.
do preço, que é alto”. Existem três interpretações dessa
sentença: uma é que o preço do céu é alto, porque os sa- Todavia o principal ponto do conto não é tanto a
crifícios que um Cristão deve fazer para chegar até lá são religião, mas de uma forma mais abrangente, a própria
muitos; a outra interpretação pode ser uma referência complexidade do ser humano, como é comum nas obras
à venda de indulgências (que aconteceu somente até o Machadianas e Realistas. O ser humano não é apresen-
séc. XVI, bem antes de Machado de Assis); ou ao próprio tado como um ser completamente perfeito, nem com-
dízimo que se deve pagar quando se é participante assí- pletamente defeituoso, e sim como ele realmente é.
duo de uma igreja. Deus, com toda a sua superioridade, Quando lhe é pedido para que seja cem por cento bom,
não julga e nem repreende o diabo, apenas pede para ele dá um jeito de pecar, logo lhe é permitido ser cem
que saia logo do céu. Com esse cenário, a última fala de por cento ruim, então faz coisas boas às escondidas. A
Deus soa um pouco impaciente: “Vai, vai, funda a tua complexidade e contradição humana são apresentadas
igreja; chama todas as virtudes, recolhe todas as franjas, de forma muito clara: o contraste razão/impulso e bem/
convoca todos os homens... Mas, vai! vai!”. mal convivendo paralelamente no homem.

Então o Diabo chega literalmente como um raio Em uma análise um pouco mais crítica e apro-
à Terra e constrói sua Igreja. Os 7 Pecados Capitais se tor- fundada, pode-se interpretar também a Igreja do Diabo
nam quase equivalentes aos 10 Mandamentos da Bíblia. como uma metáfora para a própria sociedade brasileira
E é impressionante como tudo é muito bem justificado: da época. Com isso, no momento em que o Diabo resolve
“a avareza é mãe da economia”, “a ira tinha a melhor criar sua própria instituição, ele cria aos moldes da Igreja
defesa na existência de Homero” e assim por diante. O Católica. Até a missa seria adaptada na sua religião dia-
amor ao próximo era inadmissível, a não ser que esse bólica. Levando isso para o contexto da sociedade brasi-
amor tenha relação com desejo à mulher alheia, sendo leira, a segunda metade do século XIX foi quando vários
inclusive a traição completamente permitida. A Igreja é ideais, teorias e discussões estavam migrando da Europa
fundada, e várias pessoas se agregam a ela. para cá, sendo adaptadas ao contexto brasileiro. Ideais
do Liberalismo Econômico chegavam a um país onde ain-
Mas, no quarto capítulo é que se apresenta a da existia escravidão (a Lei Áurea só veio em 1888, e a
contradição do ser humano, porque o Diabo começa a Igreja do Diabo foi publicado em 1884). A própria Inde-
observar que muitos de seus fiéis estavam fazendo pe- pendência foi resultado de movimentos estadunidenses,
quenas boas ações às escondidas, inclusive alguns que francês e inglês que influenciaram a declaração do nosso
pareciam ser extremamente leais ao Pai do Mal, na ver- famoso 7 de setembro.
dade se confessavam, ou davam esmolas, além de ou-
tras coisas. Então o Diabo sobe novamente ao céu para A Igreja do Diabo (como instituição, não o Con-
questionar Deus sobre o que estava acontecendo, e to), pode ser então uma metáfora para o que estava
Deus apenas responde: “As capas de algodão têm agora acontecendo no Brasil na época de Machado: uma adap-
franjas de seda, como as de veludo tiveram franjas de tação de modelos somados a uma identidade própria, no
algodão. É a eterna contradição humana”. conto, uma identidade diabólica, e no Brasil, uma iden-
tidade brasileira.
Análise

O primeiro ponto a ser observado na obra é a


crítica à Igreja, que pode ser até considerado por mui-
tos cristãos como um conto extremamente herege. A

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A Cartomante tia no Romantismo. Ao contrário, o leitor se sente quase


dentro de uma fotografia. Como no seguinte trecho: “A
Resumo cartomante fê-lo sentar diante da mesa, e sentou-se do
lado oposto, com as costas para a janela, de maneira que
O conto A Cartomante foi publicado em 1884, a pouca luz de fora batia em cheio no rosto de Camilo”.
originalmente no jornal Gazeta de Notícias (Rio de Janei-
ro). O conto narra o triângulo amoroso entre Rita, Cami- Ao contrário do que acontecia no movimento
lo e Vilela. Camilo e Vilela são amigos de infância, mas anterior, Romantismo, no Realismo, e consequente-
se afastaram por um certo período. A história é contada mente no conto, não existe idealização da mulher, nem
a partir do reencontro dos dois, em que Camilo conhece das relações amorosas. Uma vez que o conto narra um
Rita e os dois começam a viver um caso de amor escon- adultério, e Rita não é a mulher perfeita, angelical, como
dido. eram descritas as personagens femininas no romantis-
mo.
O conto começa com Rita extremamente angus-
tiada por estar vivendo duas relações paralelas e, por Machado apresenta então o ser humano muito
conta dessa angústia, visita uma cartomante. mais próximo da realidade, com todas as suas comple-
xidades e defeitos. Assim, apresenta juntamente com a
O drama começa quando Camilo recebe uma narração a análise psicológica dos personagens (sendo
carta anônima “que lhe chamava de imoral, pérfido e di- todas essas características citadas convergentes com as
zia que a aventura era sabida de todos”. Com receio de características do movimento Realista).
que o remetente dessa carta fosse Vilela, Camilo inter-
rompe suas visitas ao amigo. É pertinente observar também que existe inter-
textualidade no texto, logo no início existe uma citação
Vilela estranha a ausência, até que envia um bi- de Shakespeare: “Hamlet observa a Horácio que há mais
lhete para Camilo com o propósito de que ele apareça cousas no céu e na terra do que sonha a nossa filosofia”.
na sua casa o mais rápido possível. Camilo fica receoso
de que o assunto fosse seu caso amoroso com Rita, no Além disso, é interessante como o autor deixa
entanto resolve ir à casa do amigo mesmo assim. No ca- a obra em aberto, já que não se sabe como Vilela des-
minho, passa pela casa da Cartomante que Rita visitou e cobriu a traição. Não se sabe se foi a Cartomante que
decide parar para uma consulta. A cartomante desvenda contou. Talvez. Nada disso fica claro para o leitor. Seria
que ele está passando por um grande susto e suspeita a Cartomante uma cúmplice de Vilela? Uma vez que ela
que ele quer saber se lhe acontecerá alguma coisa ou assegura a Camilo que não é necessário ter medo de ir à
não. Camilo confirma as deduções da cartomante, e casa do amigo, porque este não sabe de nada.
esta, por sua vez, declara que ele não precisa ter medo
de nada. O Enfermeiro
Ao chegar na casa de Vilela, este convida Camilo Resumo
a entrar na sala, onde vê Rita estirada no chão morta e
ensanguentada. Vilela puxa Camilo pela gola e o assassi- O conto se inicia com Procópio, o protagonista,
na com dois tiros, deixando-o morto no chão. deitado no leito de morte e começando a contar sua his-
tória com o propósito de essa se tornar “página de um
Análise livro”.
A história não é contada de forma linear, o que A história se passa em 1860. Procópio trabalha-
significa que os acontecimentos não são narrados um va como copiador de um padre que, além do emprego,
após o outro: o autor volta ao passado, por exemplo, também lhe oferecia cama, mesa e sua casa. Certo dia
para falar sobre como Camilo se aproximou mais de Rita ele recebeu uma carta de um vigário pedindo que ocu-
e de Vilela após a morte da mãe. passe o papel de enfermeiro de um coronel em uma vila
do interior, e Procópio então aceitou de bom grado.
É narrado em terceira pessoa, com narrador
onisciente, ou seja, aquele que tudo sabe e tudo vê, e Porém, ao chegar na vila já ouvia-se boatos de
sendo um conto pertencente ao Realismo é válido notar que nenhum enfermeiro aguenta o coronel, por ele ser
que existe descrição dos conflitos internos dos persona- uma pessoa amarga de coração. E de fato, quando Pro-
gens, aprofundamento psicológico, o que eles pensam, cópio o conhece, reconhece essa amargura do idoso,
seus medos, e outros. mas numa primeira conversa consegue conquistar a sim-
patia do enfermo.
Ainda de acordo com as características Realistas,
a descrição do espaço é feita de forma detalhada, mas Passam-se alguns dias e os xingamentos come-
objetiva, de forma que a visualização do local, no qual se çam a vir, Procópio ainda o suporta, até o dia em que o
encontram os personagens, é bastante clara para o leitor. coronel tem um surto e agride o enfermeiro com uma
Não é uma descrição romantizada e exaltada, como exis-

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bengala. Com essa situação, Procópio pensa seriamente pessoa com o coração bom. Entretanto, a partir do mo-
em pedir as contas, mas o velho insiste na permanência mento que as pessoas o respondem dizendo o quanto
dele, e diz que não será mais agredido, assim Procópio aquele homem era na verdade horrível, agressivo, vio-
aceita permanecer. lento e uma porção de outros adjetivos ruins, Procópio
começa a usar isso como um consolo e uma justificativa
Até que um dia, o coronel teve um acesso de rai- como se o coronel tivesse que morrer mesmo, tanto que
va e atirou uma moringa que bateu na cabeça de Procó- no final o protagonista diz já não ter o mesmo remorso
pio. O rosto do rapaz doía tanto que ele avançou no co- que tinha no começo depois de matar o velho.
ronel, agarrando-lhe o pescoço. Lutaram, mas o coronel
deu seu último suspiro, esganado. Após o enterro do coronel, Procópio diz estar
em paz com os humanos, todavia ainda não estava em
Procópio fica então transtornado, contudo con- paz com a própria consciência. Machado demonstra aqui
seguiu encobrir seu crime e ninguém descobre o que fez. que a moral funciona de um indivíduo para com a socie-
O coronel é enterrado, e durante vários dias as pessoas dade, e do indivíduo com ele mesmo.
conversam com Procópio sobre o tanto que o defunto
era um homem ruim, amargo, agressivo, violento. Passa- Conto
dos alguns dias, o ex-enfermeiro recebe a notícia de que
o coronel deixou a herança toda para ele. O conto, segundo o dicionário, é uma narrativa
escrita em prosa. Pode ser também uma história conta-
De início, Procópio pensa em doar o dinheiro, da, falada, visto que a palavra “conto” lembra o verbo
não utilizá-lo em seu benefício, pois a consciência ainda “contar”, ou seja, dizer algo. A partir de tal entendimen-
lhe pesava. Mas de tanto as pessoas falarem do quanto o to, o gênero conto possui como características ser uma
coronel era uma pessoa ruim, Procópio vai se auto-con- história fictícia, breve (curta) e de poucos personagens.
solando e no fim das contas, acabando dando esmolas
para uns e outros, manda levantar um túmulo todo de Dessa maneira, o autor do conto tem como tare-
mármore para o coronel, e fica com o dinheiro para seu fa chamar atenção do leitor rapidamente (já que o gêne-
bel prazer. ro não pode ser extenso demais) por meio de um bom
enredo, isto é, com base em uma ação, constrói o conto
Análise com a seguinte estrutura: a situação inicial consiste na
inserção de componentes como tempo, lugar e persona-
A obra é escrita em primeira pessoa, se passa gens, a fim de introduzir o leitor quanto ao espaço do en-
no período do Império, 1860, e é quase toda narrada no redo; o conflito é composto pela trama da estória, e é daí
passado. Soa quase como se Procópio estivesse fazendo que irá se desenvolver toda sucessão de acontecimentos
uma confissão. A narração é objetiva, com característica da narrativa; o clímax é constituído pelo ponto alto da es-
realista. Não é subjetiva e amorosa, como era no Roman- tória e é nesse ponto em que se espera chamar atenção
tismo. do leitor, para que de alguma forma o surpreenda; por
Outra característica a ser destacada, muito pre- fim o desfecho, e este resultará na resolução dos eventos
sente nas obras Machadianas e Realistas, é a apresen- apresentados.
tação da contradição humana. O ser humano como um Além da estrutura apresentada, o conto deve
ser que não é cem por cento ruim nem cem por cento ser elaborado da seguinte forma: com espaço (onde
bom. Ao mesmo tempo que temos um personagem que, ocorre? Geográfico e psicológico), tempo (quando acon-
durante todo o conto, o vigário admira por ser extrema- tece? Tempo cronológico ou psicológico), personagens
mente paciente e sereno, por conseguir dar conta do Co- (protagonista e antagonista), foco narrativo (narrador:
ronel, este mesmo personagem, no fim, acaba por matar onisciente, personagem ou observador), diálogo (pode
o homem que cuidava. E mesmo o Coronel, com toda a ter discurso: direto, indireto ou indireto livre) e com
sua amargura e ofensas destinadas a Procópio, mostra epílogo (é o mesmo que clímax, desfecho misterioso,
que na verdade tinha um carinho por ele, ao deixar toda surpreendente). Estes elementos compõem a formação
a herança para o enfermeiro. do conto.
O materialismo também é uma característica Logo, segundo André Fiorussi “Um conto é uma
presente no realismo, visto que mesmo que Procópio narrativa curta. Não faz rodeios: vai direto ao assunto.
tentasse não se apegar a herança, acaba por utilizar qua- No conto tudo importa: cada palavra é uma pista. Em
se todo o dinheiro para uso próprio. uma descrição, informações valiosas; cada adjetivo é
A moral humana também é apresentada de uma insubstituível; cada vírgula, cada ponto, cada espaço –
forma interessante no conto, visto que após a morte do tudo está cheio de significado. [...] ”
coronel, Procópio fica com a consciência pesada, se re-
moendo, tenta até enganar a si mesmo quando fala para
as outras pessoas o quanto no fundo o enfermo era uma

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Na prosa, Machado de Assis, um dos maiores
contistas de nossa literatura, propõe reflexões sobre sua
sociedade contemporânea, por meio de textos curtos
Citações da Obra na Matriz de Referências e ágeis, uma grande inovação em seu tempo. A Carto-
mante não apenas debate a noção de inexorabilidade do
O ser humano como um ser que pergunta e quer saber destino, questão debatida desde a Antiguidade Clássica
na Grécia, como também começa com uma citação de
Na literatura, os contos de Machado de Assis Pai William Shakespeare em seu teatro. (Página 13, segundo
contra a mãe, A igreja do Diabo e O enfermeiro temati- parágrafo)
zam contradições e conflitos relativos à condição humana
e sua capacidade autorreflexiva. (Página 4, terceiro pará- A formação do mundo ocidental contemporâneo
grafo)
Na obra Maria Antonieta com rosa (Le Brun,
Indivíduo, cultura e mudança social 1783) encontram-se elementos representativos e sim-
bólicos do Antigo Regime, em especial da aristocracia
Nesta etapa, cabe questionar mais profunda- francesa. Por outro lado, também, existiram obras que
mente sobre a relação do indivíduo e sua cultura no pro- buscavam criticar os privilégios sociais da aristocracia,
cesso de mudança social, assim como sobre as possibilida- assim como os costumes e padrões sociais hegemônicos
des das identidades construídas gerarem mudança social. da época. Outras obras também criticaram as contradi-
Os contos Pai contra a mãe, A cartomante, A igreja do ções do emergente Capitalismo Industrial ou até mesmo
Diabo e O enfermeiro (Machado de Assis) assim como apontavam caminhos para perspectivas sociais alternati-
o romance O Bom-Crioulo (Adolfo Caminha) ilustram a vas, como pode ser observado no conto realista A Igreja
partir da literatura algumas dessas questões. Em Deso- do Diabo (Machado de Assis,1884), na obra naturalista O
bediência Civil, Henry David Thoreau divulga suas ideias Bom-Crioulo (Adolfo Caminha, 1895), assim como na peça
políticas vinculadas às liberdades individuais e ao direito realista Um Inimigo do Povo (Henrik Ibsen, 1882). (Página
à resistência, relacionando-as aos Direitos Humanos. (Pá- 21, segundo parágrafo)
gina 7, segunda etapa)
O conto Pai Contra a Mãe (Machado de Assis,
Tipos e gêneros 1906) aborda aspectos da marginalização de diferen-
tes grupos sociais no Brasil do século XIX, em especial o
Um exercício de leitura que contribui para a aná-
das populações negras escravizadas, situação observada
lise da estrutura textual, assim como da estrutura socio-
mesmo após o processo de abolição da escravidão. (Pági-
política, se dá pelo contato com obras de Machado de As-
na 21, quinto parágrafo)
sis. Assim, o conto Pai contra mãe, escrito 18 anos após
a abolição da escravidão, problematiza também o proces- Espaços
so de escravização, assim como os ecos desse processo
no comportamento humano. Em contrapartida, o conto A literatura amplia os espaços ou territórios exis-
O Enfermeiro, também de Machado de Assis, aborda a tenciais dos sentimentos humanos, a partir de exercícios
aspiração do assalariado e agregado Procópio Valongo de leitura e apreciação, nos quais podem ser desenvol-
à classe proprietária. Contudo, em ambas narrativas há vidas potencialidades humanas. A leitura dos contos de
uma convergência no que tange à discussão ética, moral Machado de Assis O enfermeiro, Pai contra mãe, A igreja
e ao anseio por sobrevivência. Há de se notar também a do diabo e A cartomante provoca questionamentos acer-
presença espacial no primeiro conto, e simbólica, no se- ca das possibilidades das relações afetivas nos diferentes
gundo, quanto à presença do Valongo. (Página 10, quinto espaços. Essas obras também levam a um entendimento
parágrafo) da dinâmica espacial do período histórico retratado pelos
contos, pois o autor produz descrições espaciais de dife-
Machado de Assis é um escritor que traz repre- rentes lugares e as percepções dos personagens em rela-
sentações do homem moderno para além de ser represen- ção aos mesmos. (Página 27, terceiro parágrafo)
tante do Realismo, pois descreve e narra acontecimentos
de sua época, bem como apresenta personagens que cor-
respondem a “tipos” que demonstram os conflitos da con- Questões, Justificativas e Dicas
dição humana. Suas personagens portam-se como heróis Quer acessar as questões, justificativas e dicas desta obra?
modernos, vivendo angústias e mesmo fraquezas ante as
imposições sociais, às dificuldades de uma vida centrada Clique aqui ou use o QR CODE da página 6.
nas relações de competição profissional e amorosa. As-
sim, por meio de narradores, ele fala da condição huma-
na. Há muitos “tipos”, estereótipos e clichês encontrados
na construção de suas personagens. (Página 11, primeiro
parágrafo)

Estruturas

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O Bom Crioulo - Adolfo Caminha

Autor
Em 29 de maio de 1867, veio ao mundo o es- No dia 1º de janeiro de 1987, Adolfo Cami-
critor e romancista brasileiro Adolfo Ferreira dos Santos nha, com apenas 30 anos, falece em sua casa, no Rio
Caminha, conhecido pela sua obra de tom polêmico: O de Janeiro. Deixa obras inéditas como Pequenos Con-
Bom Crioulo. tos e os romances inacabados Ângelo e O Emigrado.

Cearense, nasceu em Aracati, filho de Raimundo Obras de Adolfo Caminha


Ferreira dos Santos e Maria Firmina Caminha. Sua mãe
veio a falecer quando ele tinha apenas 10 anos de idade. • Voos Incertos, poesia, 1855-56
Devido a esse infortúnio foi morar com o tio em Forta- • A Normalista, romance, 1892
leza. • Judith, conto, 1893
• Lágrima de um Crente, conto, 1893
Em 1883, Adolfo se muda para o Rio de Janei- • No País dos Ianques, crônica, 1894
ro, onde inicia sua jornada na antiga Escola de Marinha. • Bom Crioulo, romance, 1895
Logo é promovido a guarda-marinha e começa a se des- • Cartas Literárias, crítica, 1895
tacar e crescer no ramo. Em 1886, realizou uma viagem • A Tentação, romance, 1896
de instrução aos Estados Unidos. Retorna ao Rio de Ja-
neiro e depois de um ano é promovido a segundo-tenen-
te. No ano de 1888, por motivos de saúde, se transfere
Obra
para Fortaleza e em 1890 é demitido da Marinha. Amaro, o personagem principal, é um escraviza-
do fugido que consegue se alistar na Marinha. Negro e
Assim como as suas obras, a vida do autor car- de aparência forte, possui um jeito gentil com todos e é
rega escândalos. Caminha se apaixona por uma mulher batizado com um apelido de Bom-Crioulo. Apesar de ain-
casada com um alferes. Isabel Jataí de Paula Barros cor-
da haver uma rigidez e punições violentas, como castigos
responde a paixão e deixa o seu marido para então se
físicos, por exemplo, a vida trabalhando na Marinha era
unir a Caminha. Tiveram duas filhas: Belkiss e Aglaís. Nos
melhor do que quando era escravo na fazenda.
livros “A normalista” e “O Bom-Crioulo”, Adolfo convida
o leitor a conhecer histórias relacionadas a homosexua- Amaro se sentia livre e satisfeito em alto mar. Ele
lidade, a paixão proibida, o racismo e o abolicionismo, se dedica bastante por um certo tempo, mas depois não
assim como vários outros temas densos, considerados mostra a mesma disposição para o trabalho, tampouco
polêmicos para a sociedade da época. a mesma simpatia. Devido ao excesso de álcool que gos-
tava de ingerir, seu estado de ânimo se alterou. Outro
Desde a Marinha, Adolfo se dedicava a escrita.
motivo para essa mudança é uma paixão por um homem
Quando ainda atuava por lá, publicou “Voos Incertos”
branco de olhos azuis, cabelos loiros, baixinho e bem for-
(1886), um livro com poemas. Em 1891, em Fortaleza,
moso, um certo grumete chamado Aleixo, com quem se
institui a revista Moderna. Também contribuiu para o
envolve amorosamente.
Jornal do Norte. Já em 1892, funda o jornal O Diário do
qual é redator-principal. No mesmo ano, participa como Os dois começam uma relação mais íntima e se
fundador de um movimento literário-político chamado instalam em uma pensão na Rua da Misericórdia, no Rio
“Padaria Espiritual”. Esse movimento era idealizado pela de Janeiro. A proprietária da pensão, uma senhora que
necessidade da educação para a evolução do povo e mu- se chama D. Carolina, sabendo dos interesses de Amaro
dança do país. Um órgão do movimento se chama “O pelo seu companheiro, dispõe um quarto secreto para
Pão”, onde publicava artigos. os dois. Ali, Amaro e Aleixo vivem noites de conversas,
Em 1893 publica seu primeiro romance, A Nor- risos, intimidades e desejos como, por exemplo, Aleixo
malista. No ano seguinte, lança No País dos Ianques, ceder aos pedidos de Amaro de o ver nu.
livro em que narra a viagem que fizera, como guarda-
Um ano se passa e a vida de Amaro segue da for-
-marinha, aos Estados Unidos. No ano de 1895, publica
ma como ele desejava: um trabalho, um local para morar
as Cartas Literárias e, também, seu segundo romance
e um amor ao seu lado. Não podia estar melhor. Toda-
Bom-Crioulo.
via, como nada dura para sempre, logo Amaro se depara
No ano de 1896, em janeiro, funda A Nova Revis- com uma notícia desagradável: fora transferido para tra-
ta, escreve seu último romance Tentação e traduz peças balhar em outro navio, longe de Aleixo. Distantes um do
de Balzac. Por essa época, o autor já sofria de dificulda- outro, Aleixo começa a se sentir atraído por D. Carolina e
des econômicas e da doença tuberculose. esta também se sente inevitavelmente interessada pelo

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rapaz. Os dois amantes começam a se envolver sexual- talhadamente, assim como todos os outros espaços: a
mente, enquanto Amaro, distante, trabalhava bastante. pensão, o hospital, o navio, o quarto, entre outros.

Perturbado pelo desejo e pela saudade do ama- 4. Linguagem


do, Amaro desobedece às ordens superiores, foge de seu
trabalho e vai até a pensão. Não encontra Aleixo, isso Linguagem crua, clara e objetiva. Como já citado,
o deixa ainda mais desconfortável e ciumento. Atribula- discurso indireto e livre. Ocorre a predominância da des-
do, o Bom-Crioulo sai para a rua, se embriaga e acaba crição de detalhes e fatos de forma minuciosa, condizen-
entrando em uma briga. A polícia captura-o e Amaro é tes com a estética naturalista que privilegia a observação
entregue ao comandante do navio. De volta às mãos dos meticulosa dos fatos, buscando não se confundir com a
superiores, Amaro sofre punições tão severas e violen- história e nem com os personagens.
tas, que é levado ao hospital. Sozinho e tristonho, ele
5. Tema
não compreende o porquê de Aleixo não o procurar,
deixando-o ainda pior. Escreve um bilhete a seu amado, A temática central da obra diz respeito à homos-
porém D. Carolina, com medo de perder o amante, inter- sexualidade. Um tema que, a depender de alguns, até
cepta o recado. hoje é polêmico. Para a sociedade conservadora da épo-
ca, as críticas à obra eram de insatisfação. Mas, é devido
Durante sua estadia no hospital, ele recebe a vi- a essa característica de abranger temas chocantes que o
sita de Herculano, companheiro antigo de embarcação, livro é reconhecido como parte do movimento naturalis-
e este acaba alertando Amaro sobre a relação de Aleixo ta da literatura brasileira.
com uma mulher. Atordoado de ciúme e ódio, o Bom-
-Crioulo aguarda a madrugada para poder fugir. Em bus- Fazendo jus ao Naturalismo, Caminha convida o
ca de evidências, ele se encontra com o empregado de leitor a conhecer os desejos, bem como instintos físicos
uma padaria localizada próxima a pensão, que comprova e psicológicos mais profundos dos personagens. O au-
a relação amorosa entre D. Carolina e Aleixo. tor tem um cuidado e uma responsabilidade ao tratar
dos desejos carnais de Amaro por Aleixo, olhando a sua
A raiva e o ódio só aumentavam. Assim que vontade por um viés objetivo e científico, um instinto
Amaro vê Aleixo saindo da pensão, se dirige a ele, discu- natural. De nenhuma maneira o narrador deixa transpa-
tem e começam a brigar. Em seguida, D. Carolina sai para recer um tom preconceituoso. Apesar de também não
a rua, em meio à multidão que rodeava os dois, e vê o se isentar em demonstrar o medo que Amaro tinha pelo
seu amante estendido no chão, com um corte profundo preconceito que poderia sofrer, por isso vivia às escon-
no pescoço. Para Amaro, sobra um fim desastroso e de- didas com Aleixo.
solado. Triste, ele é apreendido por dois policiais.
Há também a descrição dos desejos de uma mu-
Análise lher mais velha por um rapaz novo e sem experiência. O
autor é tão original que sustenta a história de um triân-
1. O Narrador
gulo amoroso completamente distante do convencional,
O foco narrativo é em terceira pessoa com um entre uma mulher e dois homens que mantém relação
narrador onisciente. Há uma forte presença do discur- homossexual.
so indireto livre a fim de desvendar os pensamentos e
sentimentos dos personagens. Muitas vezes, o narrador Uma obra extraordinária feita para demonstrar
interfere no relato, criando comentários a respeito de que a realidade acontece independente dos preconcei-
certos acontecimentos do enredo. Isso fica evidente logo tos e hipocrisias que rondam a sociedade. Uma forma de
no início da história: “A velha e gloriosa corveta – que denúncia, também, contra o racismo e a péssima condi-
pena! – já nem sequer lembrava o mesmo navio de ou- ção de trabalho dos marinheiros, submetidos a castigos
tr’ora”. físicos e longe de suas famílias.

2. Tempo Contexto
Há uma predominância do tempo cronológico. O
Os escritores da segunda metade do século XIX
narrador conta história de modo linear e gradativo. Em
buscavam uma tendência antagônica àquela que já es-
alguns momentos, percebe-se o uso do flashback.
tavam acostumados, como, por exemplo, o idealismo da
3. Espaço estética romântica. Esse período teve como principais
acontecimentos históricos: a luta pela abolição da es-
No livro, há a descrição de vários espaços. A cravidão e a abolição efetivamente em 1888, o fim do
paisagem marítima e o céu azulado são descritos com período imperial e a proclamação da República em 1889
um certo Romantismo. Em relação à vida de marinheiro, e o advento da segunda Revolução Industrial.
descreve um ambiente ofegante e rude. As ruas do Rio
de Janeiro, sujas e regadas a pobreza, são descritas de-

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Movimento da sensibilidade, ao expressarem poeticamente as muitas


significações da linguagem. O romance O Bom-Crioulo
O Naturalismo é um movimento artístico e lite- (Adolfo Caminha, 1895), vinculado aos ideais naturalis-
rário em que o realismo é expressado de forma radical e tas, apresenta-se em linguagem clara, direta e objetiva.
explícita. Sem interesses em idealizações, o naturalismo (Página 5, quarto parágrafo)
busca o retrato fiel e real da sociedade como também
Indivíduo, cultura e mudança social
seu comportamento. O homem é definido a partir da sua
condição biológica, fisiológica e natural e age, muitas ve- Nesta etapa, cabe questionar mais profundamen-
zes, por interesse ou instinto. te sobre a relação do indivíduo e sua cultura no processo
de mudança social, assim como sobre as possibilidades
Os naturalistas, convencidos pelo determinis- das identidades construídas gerarem mudança social. Os
mo, acreditavam que o indivíduo é um mero produto contos Pai contra a mãe, A cartomante, A igreja do Diabo
da hereditariedade, assim como o seu comportamento e O enfermeiro (Machado de Assis) assim como o roman-
é fruto da educação e do meio em que vive e sobre o ce O Bom-Crioulo (Adolfo Caminha) ilustram a partir da
qual age. Inspirados pela ciência, os que se dedicavam literatura algumas dessas questões. Em Desobediência
ao naturalismo, também eram impulsionados pela teoria Civil, Henry David Thoreau divulga suas ideias políticas
da evolução de Darwin e na seleção natural como parte vinculadas às liberdades individuais e ao direito à resis-
transformadora da espécie. tência, relacionando-as aos Direitos Humanos. (Página 7,
segundo parágrafo)
Na escrita naturalista, a objetividade é desta-
cada, pois não há espaço para interesses individuais ou Tipos e gêneros
para a subjetividade, como acontece no Romantismo. As obras teatrais podem variar no tipo de gênero
Trata de assuntos como sexo, instinto, agressividade, dramatúrgico, como a peça Medida por medida (Shakes-
desequilíbrio, incestos e tantos outros temas que fazem peare), que é uma comédia, ainda que sua comicidade se
parte de personagens dominados pelos seus desejos e apresente de forma sutil em muitos momentos da peça.
instintos. Já Um inimigo do povo (Ibsen) apresenta-se como um dra-
ma que busca uma representação fidedigna da realidade.
Características do Naturalismo em tópicos: Acerca dos gêneros sexuais, as duas obras colocam ho-
mens e mulheres em papéis sociais diferentes, evidencian-
• Impessoalidade / Linguagem simples e enxuta; do o poder, e a ausência dele, em cada grupo. É possível
• Engajamento literário (o autor tenta convencer o analisar, criticamente, como o gênero de cada indivíduo
leitor); condiciona seus pensamentos e estabelece limitações
• Determinismo (o homem é fruto do meio/ raça/ para suas atitudes. Nesse viés, há abordagem semelhante
momento); na obra O Bom-Crioulo (Adolfo Caminha, publicada em
• Darwinismo social; 1895), visto que o romance engendra questões de 10 gê-
• Positivismo / Cientificismo exagerado; nero, corpo e sexualdiade, não só como identidades re-
• Ambiente restrito como microcosmo de toda a so- presentadas, mas também discursivamente construídas
ciedade; (Página 9, quinto parágrafo)
• Preferência por grupos humanos marginalizados;
• Patologias sociais (prostituição, traição, incesto;) Energia e oscilações
• Animalização / Zoomorfização dos personagen Na Química, o conhecimento sobre a radiação le-
vou a formalização dos conceitos corpusculares e ondula-
Diferença entre Naturalismo X Realismo: tórios da luz. Bohr propõe um novo olhar sobre a radiação
• Realismo: análise psicológica / Naturalismo: análise dos corpos negros e novas considerações sobre a estrutu-
social. ra do núcleo atômico, aperfeiçoando, assim, o modelo de
Rutherford. Nesse mesmo período, conhecido como a Era


das Revoluções, constroem-se novos paradigmas e pen-
samentos científicos que repercutem nas produções artís-
Citações da Obra na Matriz de Referências ticas desse período, como se percebe em O Bom-Crioulo
(Adolfo Caminha), representante do Naturalismo, direta-
O ser humano como um ser que pergunta e quer saber mente influenciado pelo Positivismo de Augusto Comte e
Determinismo de Hippolyte Taine. (Página 16, quinto pa-
Nesse sentido, os poemas A canção do exílio rágrafo)
(Gonçalves Dias, 1843), Ideias íntimas (Álvares de Aze- A formação do mundo ocidental contemporâneo
vedo, 1853), Meus oito anos (Casimiro de Abreu, 1859),
Marieta (Castro Alves, 1870), O sonho africano (Francis- Na obra Maria Antonieta com rosa (Le Brun,
ca Júlia, 1895), Mal secreto (Raimundo Correia, 1883), O 1783) encontram-se elementos representativos e sim-
assinalado (Cruz e Sousa, 1905) e Ismália (Alphonsus de bólicos do Antigo Regime, em especial da aristocracia
Guimaraens, 1923) contribuem para o enriquecimento francesa. Por outro lado, também, existiram obras que
buscavam criticar os privilégios sociais da aristocracia,

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assim como os costumes e padrões sociais hegemônicos


da época. Outras obras também criticaram as contradi-
ções do emergente Capitalismo Industrial ou até mesmo
apontavam caminhos para perspectivas sociais alternati-
vas, como pode ser observado no conto realista A Igreja
do Diabo (Machado de Assis,1884), na obra naturalista
O Bom-Crioulo (Adolfo Caminha, 1895), assim como na
peça realista Um Inimigo do Povo (Henrik Ibsen, 1882).
(Página 21, segundo parágrafo)

Questões, Justificativas e Dicas


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Anotações e Rascunhos

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Canção do Exílio - Gonçalves Dias

Autor
Antônio Gonçalves Dias nasceu em 10 de agosto Em sua estadia na Europa como secretário dos
de 1823 em Caxias, Maranhão. Foi professor, poeta, críti- Negócios Estrangeiros, entre 1854 e 1858, viaja para
co de história, etnólogo, jornalista e advogado. É filho do a Alemanha, onde, em 1857, teve os quatro primeiros
comerciante português João Manuel Gonçalves, refugia- cantos de “Os Timbiras” e o “Dicionário da Língua Tupi”
do das exaltações nativistas, e da mestiça Vicência Fer- editados por Brockhaus.
reira, que sofreu preconceito pela sua origem. Em 1825,
seu pai casou-se com outra mulher, levando o poeta O poeta voltou ao Brasil e permaneceu no país
consigo para dar-lhe instrução e trabalho. Matriculou-o por dois anos, 1861-1862, viajando pelo Norte como
no curso de Latim, Francês e Filosofia ministrado pelo membro da Comissão Científica de Exploração. E, depois
professor Ricardo Leão Sabino. de uma curta estadia no Rio de Janeiro em 1862, em-
barcou novamente para a Europa buscando tratamento
Apesar da morte do pai e das dificuldades fi- para a sua saúde bastante fragilizada.
nanceiras da família, em 1835 Gonçalves Dias conseguiu
embarcar para Coimbra, Portugal, para prosseguir seus Gonçalves Dias faleceu em 10 de setembro de
estudos em Direito. Lá, entrou em contato com a poesia 1864, aos 41 anos, única vítima do naufrágio do navio
romântica de Alexandre Herculano e Almeida Garrett. In- Ville de Boulogne no baixo de Atins, no Maranhão.
serindo-se no romantismo, participou da Gazeta Literá-
ria e d’O Trovador. Também ligou-se ao grupo de poetas Obra
batizado por Fidelino Figueiredo de “Medievalistas”. À
luz dessas influências, Gonçalves Dias aproximou-se dos A obra retrata a saudade do eu-lírico exilado em
românticos franceses, ingleses, espanhóis e alemães. relação ao seu país. As comparações favorecendo a sua
terra natal são encontradas ao longo do poema, passan-
Em 1843 escreveu “A canção do exílio”, poesia do a ideia de que tudo que há nesta terra é diferente
bastante conhecida não só dentre os seus escritos, mas como em outros lugares ou que possui características
também na língua portuguesa. exclusivas. Ao final de quatro estrofes de comparação,
na última do poema o eu-lírico implora a Deus que não
Regressou ao Brasil em 1845, logo após sua for- morra sem que antes volte para “lá” (sua terra), sem que
mação em Direito na Universidade de Coimbra. Depois desfrute os “primores que eu não encontro por cá”.
de uma rápida estadia no Maranhão, mudou-se para o
Rio de Janeiro em meados de 1846, onde compôs o dra- O poema tem a sua versificação em períodos
ma teatral “Leonor de Mendonça”, impedido pelo Con- rítmicos iguais, com versos heptassílabos (ou redondilha
servatório do Rio de Janeiro de ser representado devido maior) que se alternam entre as rimas ricas e as rimas
aos erros em sua linguagem. pobres, entre a sílaba forte e a fraca, com acentuação na
primeira, na terceira, na quinta e na sétima sílaba.
Em 1847 publicou “Primeiros cantos”, obra
aplaudida pela crítica e pelo público leitor de poesia, Os seus versos são regulares, ou seja, obedecem
sendo elogiada pelo imperador D. Pedro II de Portugal às regras clássicas de métrica. Com isso, as sílabas acen-
e por Alexandre Herculano em seu artigo encomiástico. tuadas aparecerão num determinado ponto do verso de
No ano seguinte, saiu “Segundos Cantos” e “Sextilhas de acordo com o seu tipo. Neste caso, sendo regular, a acen-
Frei Antão” — registram os historiadores que esta última tuação será marcada ao final de cada verso como, por
foi publicada para vingar os seus censores do Conserva- exemplo, em: ”Minha terra tem palmeiras/ onde canta
tório, demonstrando pleno domínio sobre a língua. o sabiá/ as aves, que aqui gorjeiam/ não gorjeiam como
lá”. Nota-se, então, a semelhança fônica entre sabiá/lá,
Quatro anos depois, em 1851, Gonçalves Dias sílabas justamente localizadas ao final de cada verso, ca-
viajou para o norte brasileiro em missão oficial. Lá, tam- racterizando-se em rima externa.
bém tem a intenção de desposar o grande amor de sua
vida e musa dos seus escritos românticos, Ana Amélia Falando em métrica, os versos heptassílabos
Ferreira do Vale, cuja mãe não concordou com as núp- são os mais simples, pois desde que a última sílaba seja
cias devido à origem bastarda e mestiça do escritor. No acentuada, os demais acentos podem aparecer em qual-
ano seguinte, frustrado, casou-se com Olímpia Carolina quer outra sílaba. Este tipo de versificação é bastante
da Costa, uma união de conveniência que não lhe trouxe predominante nas quadrinhas, cantigas populares e me-
felicidade devido à personalidade da esposa, da qual se- dievais, tradicional na língua portuguesa com exemplos
parou-se em 1856. em todas as épocas tanto em Portugal como no Brasil.

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Sua estrofação é dividida em três quadras (es- momento da escrita]/ sem qu’inda aviste as palmeiras
trofe com quatro versos) e duas sextilhas (estrofe com [figura brasileira],/ onde canta o sabiá [também figura
seis versos). brasileira].”

Narrador Tempo

O eu-lírico apresenta angústia ao descrever a O poema foi escrito em 1843, durante longa es-
sua terra natal justamente porque está longe dela, daí tadia de Gonçalves Dias em Coimbra, Portugal. Dentro
vem o “exílio” do título. Exilado, o narrador então com- do texto, considerando as comparações feitas pelo autor
para os dois lugares, o “lá” e o “cá”, dando predileção na e os traços românticos, é possível interpretar ele seja si-
descrição de sua terra natal. Exemplo: “Nosso céu tem multâneo em relação ao tempo de escrita e ao tempo
mais estrelas/ nossas várzeas têm mais flores/ nossos do poema.
bosques têm mais vida/ nossa vida mais amores”. Nes-
te caso percebe-se que os pronomes possessivos nosso/ Contextualização
nossa têm relação com o sentido de adição do “mais”,
sendo qualificado por ele. Gonçalves Dias foi um dos primeiros autores
brasileiros a ambientar os seus escritos no Brasil. O poe-
Em outro exemplo, como “Minha terra tem pri- ta nasceu um ano após a proclamação da independên-
mores/ que tais não encontro eu cá,/ em cismar - sozi- cia, em 1823, vivendo as duas décadas de sua juventude
nho à noite/ mais prazer encontro eu lá;/ minha terra numa época marcada pelo nacionalismo e pela rejeição
tem palmeiras/ onde canta o sabiá”, o narrador não está à cultura portuguesa, ambos frutos do entusiasmo do
satisfeito com a sua situação atual, ilustrada pela polari- marco histórico do país.
zação dos advérbios “cá” e “lá”, e então passa a idealizar
o lugar onde gostaria de estar - o “lá” no verso “mais Na procura por uma nova identidade para a na-
prazer encontro eu lá”. ção, surge o movimento romântico (1836-1881) baseado
no amor à terra e, consequentemente, na valorização
Ainda nesta interpretação, os substantivos “pal- do brasileiro em detrimento do português, exaltando a
meiras” e “sabiá” ganham outro significado. Enquanto cultura local e transformando o índio em herói nacio-
“palmeiras” remete ao Brasil, símbolo do país, “sabiá”, nal. Não obstante, a primeira geração do movimento se
também figura brasileira, assim como o autor, pode ser concentra na fuga à realidade, abordando o passado. Na
traduzido como o eu-lírico, o cantor do poema. E, se for Europa, as retratações ambientam-se na Idade Média.
mais longe, a associação do narrador ao sabiá faz sentido No Brasil, como a nação não passou por este período, as
no momento em que associa-se também o humor dele temáticas abordarão a figura do índio antes da chegada
(triste) com o canto natural do pássaro (também triste). dos portugueses.
Novamente, citando os versos, o raciocínio das relações


entre as palavras fica mais claro: “minha terra [Brasil]
tem palmeiras [Brasil]/ onde canta o sabiá [eu-lírico can-
tor/figura brasileira]”.
Citações da Obra na Matriz de Referências
Espaço e linguagem
O ser humano como um ser que pergunta e quer saber
Gonçalves Dias define a linguagem como es-
trutura crucial para caracterizar o espaço desejado. Por Nesse sentido, os poemas A canção do exílio
exemplo, ao utilizar os termos “palmeiras” e “sabiá”, o (Gonçalves Dias, 1843), Ideias íntimas (Álvares de Aze-
autor define em que espaço o poema se trata, levando vedo, 1853), Meus oito anos (Casimiro de Abreu, 1859),
em consideração de que ambos são figuras brasileiras. Marieta (Castro Alves, 1870), O sonho africano (Francis-
Os advérbios “aqui”, “lá” e “cá” também representam a ca Júlia, 1895), Mal secreto (Raimundo Correia, 1883), O
dualidade entre Brasil e Portugal, se levarmos em consi- assinalado (Cruz e Sousa, 1905) e Ismália (Alphonsus de
deração que o autor, bastante nacionalista, escreveu o Guimaraens, 1923) contribuem para o enriquecimento
da sensibilidade, ao expressarem poeticamente as muitas
poema enquanto estava em Coimbra.
significações da linguagem. O romance O Bom-Crioulo
Exemplo: “Não permita Deus que eu morra,/ (Adolfo Caminha, 1895), vinculado aos ideais naturalis-
sem que eu volte para lá;/ sem que desfrute os primores/ tas, apresenta-se em linguagem clara, direta e objetiva.
que eu não encontro por cá/ sem qu’inda aviste as pal- (Página 5, quarto parágrafo)
meiras,/ onde canta o sabiá.”
Indivíduo, cultura e mudança social
Analisando o contextos dos espaços atrelados
à linguagem escolhida, fica assim: “Não permita Deus Dentre as possibilidades de texto literários têm-
que eu morra,/ sem que eu volte para lá [Brasil, terra na- -se os poemas A canção do exílio (Gonçalves Dias), Ideias
tal];/ sem que desfrute os primores/ que eu não encontro íntimas (Álvares de Azevedo), Meus oito anos (Casimiro
por cá [Coimbra, Portugal, onde o autor se encontra no de Abreu), Marieta (Castro Alves), O sonho africano (Fran-

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cisca Júlia), Mal secreto (Raimundo Correia), O assinalado Questões, Justificativas e Dicas
(Cruz e Sousa), Ismália (Alphonsus de Guimaraens). (Pági-
na 8, quarto parágrafo) Quer acessar as questões, justificativas e dicas desta obra?

Estruturas Clique aqui ou use o QR CODE da página 6.

No campo da poesia, pode-se perceber um maior Anotações e Rascunhos


rigor na forma como nas redondilhas de A Canção do
Exílio (Gonçalves Dias) consagrou-se rapidamente, de
forma tal que é referida explicitamente na letra do Hino
Nacional. O poema é composto por cinco estrofes, as três
primeiras são quartetos e as duas últimas sextetos. To-
dos os versos são heptassílabos. O poema também não
apresenta nenhum adjetivo qualificativo em seus vinte e
quatro versos, apenas expressões qualificativas, em uma
comparação constante entre “lá” (refere-se ao Brasil) e
“cá” (refere-se a Portugal). Gonçalves Dias consolidou a
Primeira Geração Romântica, chamada de Nacionalista.
Utilizando-se, também, de redondilhas, o poeta Alphon-
sus de Guimaraens propõe uma narrativa menos cartesia-
na, sob influência do estudo do subconsciente, que narra
o fim da vida de Ismália, poema pertencente ao Simbolis-
mo em que a tônica é a busca pelo transcendente, pelo
cósmico. (Página 13, primeiro parágrafo)

Ambiente e vida

O ambiente físico desempenha um papel prepon-


derante na seleção e distribuição das espécies. As pecu-
liaridades do espaço geográfico como clima, vegetação,
relevo e demais fatores físicos são determinantes na orga-
nização e agrupamento dos seres vivos além de serem uti-
lizados na categorização dos ambientes brasileiros e seus
biomas. No território brasileiro é possível observar uma
grande variedade de ambientes, que se dividem em espa-
ços urbanos, rurais e naturais. O Brasil é o país que abriga
a maior biodiversidade do mundo. O IBGE estima que em
território nacional estejam de 10% a 15% de toda a biodi-
versidade do planeta. A riqueza da fauna e flora brasileira
foram descritas no poema Canção do exílio (Gonçalves
Dias), representando a saudade da terra natal. (Página
17, segundo parágrafo)

Espaços

O espaço do texto literário pode variar, modifi-


cando sua forma de acordo com a época e o gênero. Nes-
ses textos, pode-se perceber, também, a riqueza de tipos
humanos em espaços de habitações ou espaços territo-
riais comuns à época e nas tensões presentes entre espa-
ços sociais complexos e distintos, aos quais esses tipos hu-
manos são vinculados na obra. Essas relações podem ser
percebidas na obra parnasiana O sonho africano (Francis-
ca Júlia) e em obras românticas, como A canção do exílio
(Gonçalves Dias) e Ideias íntimas (Álvares de Azevedo) e
em obras simbolistas, como O assinalado (Cruz e Sousa) e
Ismália (Alphonsus de Guimaraens). (Página 27, terceiro
parágrafo)

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Idéias Íntimas - Álvares de Azevedo

Autor
Manuel Antônio Álvares de Azevedo nasceu no do título, e por mais que seja possível notar que o autor
dia 12 de setembro de 1831, em São Paulo, numa família desejava alcançar certo realismo em seus versos, o seu
ilustre. Filho de Inácio Manuel Álvares de Azevedo e de “eu” romântico acaba por predominar no final.
Maria Luísa Mota Azevedo, Álvares de Azevedo foi poeta,
contista e ensaísta da segunda geração romântica brasi- Na primeira estrofe, o eu-lírico apresenta as
leira. É patrono da cadeira nº 2 da Academia Brasileira de suas leituras, exemplificadas por autores como Lamar-
Letras por escolha de Coelho Neto. Mudou-se para o Rio tine, Shakespeare e Johannisberg, citados ao longo dos
de Janeiro com a família em 1833. Lá, matriculou-se no versos. Vale notar que cada escritor possui uma carga
Colégio Stoll e, segundo dados históricos, era um ótimo emocional: Lamartine, a monotonia; Shakespeare, o
aluno. Regressou a São Paulo em 1844 na companhia do amor; e Johannisberg, poeta ardente, algo próximo da
tio, mas no ano seguinte volta para o Rio de Janeiro, in- empolgação. Finalizando as referências literárias, o eu-
gressando no internato Colégio Pedro II. -lírico muda de assunto bruscamente, “perdendo o gos-
to”, narrando, agora, aquilo que não há mais graça para
Em 1848 entra para a Faculdade de Direito de ele, como o charuto, o cachimbo, o passeio a cavalo e
São Paulo, onde seu pai era estudante, sendo aluno o namoro. É importante notar que, assim como muitos
aplicado. Em sua intensa vida literária, fundou a Revista poetas românticos, Álvares de Azevedo introduz a mu-
Mensal da Sociedade Ensaio Filosófico Paulistano, tradu- dança de assunto por meio das reticências, como se o
zindo Parisina, de Lord Byron e o quinto ato de Otelo, de seu silêncio momentâneo permitisse a pausa necessária
William Shakespeare. Fez amizade com Aureliano Les- para terminar um tópico e começar outro.
sa e Bernardo Guimarães, seus colegas de fundação de
uma república dos estudantes na Chácara dos Ingleses. O tédio, a tristeza e o desgosto ampliam-se na
segunda estrofe, enquanto na primeira todo o sentimen-
Naquela época, São Paulo passava por uma onda to é internalizado, limitado aos gostos literários do eu-lí-
byroniana que afetara as suas obras com temas como rico e sua relação com eles. Agora, o que está guardado é
melancolia, previsão da morte, tédio da vida e frustra- posto para fora “contaminando” o ambiente, abordando
ções amorosas — inclusive, Álvares de Azevedo era fi- elementos exteriores. E não só um desabafo, o descon-
liado à escola de Byron. A temática fúnebre, além de ser forto é o que move o eu-lírico pelo ambiente, neste caso,
vista como uma solução para as suas dores, era como salão, criando ideia de movimento.
uma fuga à realidade em relação à sensação de impotên-
cia com a sociedade em que estava inserido. A figura fe- Conforme o “passar dos versos”, a posição do
minina era constantemente retratada como ser inacessí- eu-lírico vai se tornando contraditória, uma vez que na
vel, ora anjo, ora fatal. Com isto, a maioria de suas obras próxima estrofe, ao abordar novamente Lamartine, a
se encaixa nos aspectos românticos, justamente pelo quem havia taxado de monótono nos primeiros versos,
seu lado dramático, o que significa que Álvares de Aze- acaba por valorizar a literatura do poeta, descrevendo-a
vedo foi um dos autores que deixaram de lado os temas como parte de sua vida. Nota-se, pelo termo “alcova” no
nacionalistas e indianistas da época pós-independência. verso 39, que o narrador descreve o “quarto de dormir”

Entre os anos de 1851 e 1852, o escritor teve tu- O eu-lírico continua a descrição dos elemen-
berculose pulmonar, que se agravou num acidente com tos poéticos em sua casa, seguindo para a sala, o que
cavalo resultando-lhe num tumor na fossa ilíaca. Apesar pode ser visto na quarta estrofe, ao falar dos retratos. É
de ter sido operado, não resistiu e faleceu no dia 25 de visto que cada elemento possui uma história, o que vai
abril de 1852. No mês anterior, quase como uma previ- ocupando os próximos versos, e quem sabe a sua movi-
são, Álvares de Azevedo escrevera o poema Se eu mor- mentação pelos espaços pode ser interpretada como à
resse amanhã, lido em seu enterro por Joaquim Manuel procura por respostas sobre aquilo que lhe incomoda –
de Macedo. tensão entre o eu-lírico e o espaço.

Análise Já na sexta estrofe, a figura feminina é introdu-


zida, enquanto a ideia dos versos, diante da introdução
Os versos de Álvares de Azevedo em Ideias Ín- de certos elementos, como “leito”, por exemplo, remete
timas são marcados pelas características descritivas da a uma cama, onde o eu-lírico divaga sobre a musa dese-
prosa, “mais prosa que poesia”, oscilando o assunto fa- jada. E é desta estrofe em diante, dividida em “leitos”,
cilmente de acordo com a mobilidade do eu-lírico. Pos- que o poeta revisita os gostos literários e as idealizações
suem um cunho subjetivo, sobretudo o adjetivo íntimas românticas.

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O poema é composto por 14 partes, tendo como


temática a oposição entre o sonho e a realidade. No pri-
meiro momento, há prazer e felicidade, enquanto no
segundo há tristeza, solidão e pessimismo. A figura femi-
nina, neste caso, é um ser inalcançável e extremamente
idealizada, quase inumana. Seus versos são decassíla-
bos, ou seja, possuem dez sílabas poéticas, sem nenhu-
ma rima, os chamados versos brancos. Apesar disso, os

Citações da Obra na Matriz de Referências
O ser humano como um ser que pergunta e quer saber

Nesse sentido, os poemas A canção do exílio


(Gonçalves Dias, 1843), Ideias íntimas (Álvares de Aze-
versos possuem ritmos e acentuações diferentes.
vedo, 1853), Meus oito anos (Casimiro de Abreu, 1859),
Narrador, linguagem, tempo e espaço Marieta (Castro Alves, 1870), O sonho africano (Francis-
ca Júlia, 1895), Mal secreto (Raimundo Correia, 1883), O
Na linguagem destacam-se os termos literários e assinalado (Cruz e Sousa, 1905) e Ismália (Alphonsus de
românticos, tanto como referência como caracterização Guimaraens, 1923) contribuem para o enriquecimento
do humor do eu-lírico que, de certa forma, vai oscilando da sensibilidade, ao expressarem poeticamente as muitas
conforme as suas movimentações. No espaço, percebe- significações da linguagem. O romance O Bom-Crioulo
-se que a sua mudança, durante o passeio pela própria (Adolfo Caminha, 1895), vinculado aos ideais naturalis-
casa, dita os tons do poema, conforme os cômodos re- tas, apresenta-se em linguagem clara, direta e objetiva.
metem-lhe certas lembranças, uma oportunidade bem (Página 5, quarto parágrafo)
aproveitada pelo narrador para os seus desabafos.
Indivíduo, cultura e mudança social
Contextualização Dentre as possibilidades de texto literários têm-
Os escritos de Álvares de Azevedo encaixam-se -se os poemas A canção do exílio (Gonçalves Dias), Ideias
na segunda geração do Romantismo, justamente porque íntimas (Álvares de Azevedo), Meus oito anos (Casimiro
o seu primeiro livro está datado no ano 1850, o decê- de Abreu), Marieta (Castro Alves), O sonho africano (Fran-
nio em que o movimento tomou características ultrar- cisca Júlia), Mal secreto (Raimundo Correia), O assinalado
românticas, como os portugueses gostavam de chamar. (Cruz e Sousa), Ismália (Alphonsus de Guimaraens). (Pági-
Neste momento, houve a ruptura com o nacionalismo e na 8, quarto parágrafo)
a figura do herói indígena, levando os autores da época a
A formação do mundo ocidental contemporâneo
outros tipos de preocupações, quase sempre relaciona-
das ao amor de forma negativa. Nesse contexto da Era das Revoluções, o movi-
mento literário romântico sinaliza uma produção lírica
Esta segunda etapa também era chamada de
agonizante perante à Modernidade. Em outros termos, o
mal do século, e para esta expressão há duas hipóteses:
escritor desse período, conhecido como Ultrarromantis-
referência aos temas mórbidos e/ou o fato de a maioria
mo, manifesta a negatividade perante à realidade reifi-
dos autores na época terem tuberculose, doença tam- cada pelo advento da indústria e do capital. Com efeito,
bém apelidada com este nome. tem-se uma poética reverberada pela consciência da so-
O foco dessa geração é a fuga à realidade, e dife- lidão, pelo profundo pessimismo e, por conseguinte, pela
melancolia e pela angústia, marcas do ser humano con-
rente da primeira geração, o refúgio não é temporal ou
temporâneo. Diante disso, o poema Ideias íntimas (Álva-
espacial, e sim trágico, concentrado no pessimismo, na
res de Azevedo, escrito em 1853) externa esse mal-estar
dor existencial, no sofrimento e no isolamento. As abor-
da civilização burguesa, chamado de mal do século, no
dagens, em geral, estão sempre à beira do masoquismo,
qual se constata o enfado, a fadiga e a imaginação exa-
sem contar o sarcasmo e a ironia, levando o subjetivis-
cerbada do eu lírico. Logo, no poema vislumbra-se essa
mo às últimas consequências. Isso aconteceu porque os
crise de valores provocada pela necessidade de encontrar
poetas desta geração não simpatizavam com os ideais da
a satisfação interior que, para o sujeito lírico, resume-se
Revolução Francesa, tais como o nacionalismo, optando
em amar. (Página 20, quinto parágrafo)
por retratar o íntimo, aquilo que era intrínseco.
Espaços
Notava-se, também, que os estudantes de Direi-
to eram um grupo significativo, principalmente os de São O espaço do texto literário pode variar, modifi-
Paulo, justamente por serem bastante sociáveis, dando o cando sua forma de acordo com a época e o gênero. Nes-
aspecto de “literatura da mocidade” para o movimento. ses textos, pode-se perceber, também, a riqueza de tipos
No primeiro momento foram considerados aberrações, humanos em espaços de habitações ou espaços territo-
mas, com o tempo, conquistaram o seu espaço e o seu riais comuns à época e nas tensões presentes entre espa-
reconhecimento. ços sociais complexos e distintos, aos quais esses tipos hu-
manos são vinculados na obra. Essas relações podem ser
percebidas na obra parnasiana O sonho africano (Francis-
ca Júlia) e em obras românticas, como A canção do exílio

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(Gonçalves Dias) e Ideias íntimas (Álvares de Azevedo) e


em obras simbolistas, como O assinalado (Cruz e Sousa) e
Ismália (Alphonsus de Guimaraens). (Página 27, terceiro
parágrafo)

Questões, Justificativas e Dicas


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Anotações e Rascunhos

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Meus Oito Anos - Casimiro de Abreu

Autor
Casimiro José Marques de Abreu nasceu no dia As três gerações dessa escola literária têm al-
4 de janeiro de 1839 no município de Barra de São João, guns pontos em comum, como o rompimento com a tra-
no Rio de Janeiro, que desde 1938 é chamado Casimiro dição clássica, o idealismo, subjetivismo, nacionalismo,
de Abreu, em homenagem ao poeta. É um dos três filhos sentimentalismo e evasão da realidade, mas cada uma
do português José Joaquim Marques Abreu e da brasi- delas têm suas características particulares.
leira Luísa Joaquina das Neves, que nunca foram oficial-
mente casados. No caso da segunda geração, algumas das mais
marcantes são o egocentrismo, negativismo, pessimis-
Casimiro recebeu apenas a instrução primária mo, dúvida, desilusão, boemia, exaltação da morte e
em Nova Friburgo, dos onze aos treze anos, quando se fuga da realidade.
transferiu para o Rio de Janeiro, em 1852, para trabalhar
no comércio paterno, contra a sua vontade. Casimiro de Abreu, considerado o “poeta ingê-
nuo”, acaba se afastando de algumas dessas caracterís-
Depois, com o pai, mudou-se para Lisboa, em ticas, como a exaltação da morte e o negativismo. Mas
1853, e foi lá, exposto ao meio intelectual e aos senti- ainda há outros bem marcados em suas obras, são eles:
mentos saudosos, que escreveu a maior parte de sua o saudosismo marcante de seus poemas e a evasão da
obra. realidade presente em suas constantes visitas ao passa-
do.
Além de produzir os versos saudosos sobre sua
terra natal, o poeta também colaborava com a impren- Contextualização
sa portuguesa. Teve um folhetim, Carolina, publicado no
jornal O Progresso, e os primeiros capítulos de Camila As Primaveras, livro de poemas de Casimiro de
publicados na revista Ilustração Luso-Brasileira. Também Abreu, foi escrito em um período de exílio do autor, o
escreveu um drama, Camões e Jaú, que foi interpretada que explica a forte presença do lirismo amoroso, da nos-
em Lisboa, em 1856. talgia (da infância e da pátria) e da tristeza nas poesias
que contém.
Em 1857, retornou para o Brasil, voltando a tra-
balhar no armazém do seu pai, mas não largou a literatu- A obra é dividida em cinco partes: a introdução
ra. Colaborou em A Marmota, O Espelho, Revista Popu- e mais quatro livros, sendo chamados de Primeiro, Se-
lar e no Correio Mercantil, tornou-se amigo do jornalista gundo, Terceiro e Livro Negro. Divididos por temas, cada
Manuel Antônio de Almeida e de Machado de Assis e, livro retrata uma característica marcante específica do
em 1859 editou e lançou suas poesias reunidas, sob o romantismo. O Livro Negro, por exemplo, é o que apre-
nome de As Primaveras. senta mais claramente a influência do ultrarromantismo
de lorde Byron, contribui para segunda fase do roman-
A coletânea reflete o estilo lírico-romântico do tismo brasileiro seja chamada, por vezes, de fase byro-
autor, o que, somado aos temas de sua preferência o fi- niana.
zeram ser considerado como “o mais ingênuo de nossos
poetas” por Manuel Bandeira. Meus Oito Anos está contido no Livro Primeiro,
que reúne produções ligadas à saudade da infância, nos-
No início de 1860, ficou noivo de Joaquina Alva- talgia e religiosidade do poeta.
renga da Silva Peixoto, mas nunca chegaram a se casar.
O poeta havia contraído tuberculose, e mesmo voltando Obra
para Nova Friburgo para tentar se tratar, não resistiu e
morreu no dia 18 de outubro de 1860, aos 21 anos. Oh! que saudades que eu tenho
Da aurora da minha vida,
Seu reconhecimento veio postumamente, bem Da minha infância querida
como a indicação a patrono da cadeira nº 6 da Academia Que os anos não trazem mais!
Brasileira de Letras, por escolha de Teixeira de Melo. Que amor, que sonhos, que flores,
Naquelas tardes fagueiras
Movimento À sombra das bananeiras,
Debaixo dos laranjais!
Toda a pequena produção literária de Casimiro
de Abreu é enquadrada na segunda geração do Roman- Como são belos os dias
tismo, também chamada de Ultrarromantismo ou Mal Do despontar da existência!
do Século. – Respira a alma inocência

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Como perfumes a flor; Da minha infância querida B


O mar é – lago sereno, Que os anos não trazem mais! C
O céu – um manto azulado, Que amor, que sonhos, que flores, D
O mundo – um sonho dourado, Naquelas tardes fagueiras E
A vida – um hino d’amor! À sombra das bananeiras, E
Debaixo dos laranjais! C
Que auroras, que sol, que vida,
Que noites de melodia
Linguagem
Naquela doce alegria,
Naquele ingênuo folgar! A linguagem simples da obra facilita a identifica-
O céu bordado d’estrelas, ção do leitor, ainda mais com os elementos narrativos e
A terra de aromas cheia, descritivos presentes, respectivamente, nas menções às
As ondas beijando a areia atividades de infância e na descrição do ambiente ou do
E a lua beijando o mar! próprio poeta (pés descalços, braços nus).
Oh! dias de minha infância!
Oh! meu céu de primavera! Espaço e Tempo
Que doce a vida não era O poema é o retrato da nostalgia lírica do poeta,
Nessa risonha manhã! se passando nos dias de sua infância (quando tinha oito
Em vez de mágoas de agora, anos, daí o título da obra) e em sua terra natal, onde não
Eu tinha nessas delícias estava no momento da escrita. A julgar pela época referi-
De minha mãe as carícias da, é provável que o espaço específico seja o da Fazenda
E beijos de minha irmã! da Prata, onde Casimiro de Abreu passou sua infância.
Livre filho das montanhas,
Eu ia bem satisfeito, Referências
De camisa aberta ao peito, O verso “que auroras, que sol, que vida” é uma
– Pés descalços, braços nus – referência ao poema “Ô souvenirs! printemps! aurore!”,
Correndo pelas campinas
de Victor Hugo.
À roda das cachoeiras,
Atrás das asas ligeiras
Das borboletas azuis!

Naqueles tempos ditosos


Ia colher as pitangas,
Trepava a tirar as mangas,
Brincava à beira do mar;
Rezava às Ave-Marias,
Achava o céu sempre lindo,

Citações da Obra na Matriz de Referências
O ser humano como um ser que pergunta e quer saber

Nesse sentido, os poemas A canção do exílio


(Gonçalves Dias, 1843), Ideias íntimas (Álvares de Aze-
Adormecia sorrindo,
vedo, 1853), Meus oito anos (Casimiro de Abreu, 1859),
E despertava a cantar!
Marieta (Castro Alves, 1870), O sonho africano (Francis-
Oh! que saudades que eu tenho ca Júlia, 1895), Mal secreto (Raimundo Correia, 1883), O
Da aurora da minha vida assinalado (Cruz e Sousa, 1905) e Ismália (Alphonsus de
Da minha infância querida Guimaraens, 1923) contribuem para o enriquecimento
Que os anos não trazem mais! da sensibilidade, ao expressarem poeticamente as muitas
– Que amor, que sonhos, que flores, significações da linguagem. O romance O Bom-Crioulo
Naquelas tardes fagueiras (Adolfo Caminha, 1895), vinculado aos ideais naturalis-
À sombra das bananeiras, tas, apresenta-se em linguagem clara, direta e objetiva.
Debaixo dos laranjais! (Página 5, quarto parágrafo)

Indivíduo, cultura e mudança social


Aspectos poéticos
Apesar de sutil, o poema tem uma métrica bem Dentre as possibilidades de texto literários têm-
definida: é escrito em redondilha maior (versos com sete -se os poemas A canção do exílio (Gonçalves Dias), Ideias
sílabas poéticas), e, embora sua versificação não possa íntimas (Álvares de Azevedo), Meus oito anos (Casimiro
ser classificada, sendo o que chamamos de rima mistu- de Abreu), Marieta (Castro Alves), O sonho africano (Fran-
rada, por não ter uma esquematização regular durante cisca Júlia), Mal secreto (Raimundo Correia), O assinalado
todo o poema, apresenta diversos trechos com rimas (Cruz e Sousa), Ismália (Alphonsus de Guimaraens). (Pági-
emparelhadas: na 8, quarto parágrafo)

Oh! que saudades que eu tenho A


Da aurora da minha vida, B

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Marieta - Castro Alves

Autor
Filho do médico Antônio José Alves e de Clélia to físico, ao contrário da fase antecessora do movimen-
Brasília da Silva Castro, Antônio Frederico de Castro Al- to, que prezava pelo irreal e pelo sofrimento.
ves nasceu em 14 de março de 1847 em Muritiba, Bahia.
Com quatro estrofes, o poema é dividido em
Em 1854, em função da profissão do pai, que re- duas quadras, ou quartetos, e dois tercetos, e concen-
cebeu convite para a docência na Faculdade de Medicina tra-se na sensualidade mais concreta. A sensação de
de Salvador, mudou-se para a capital, onde estudou no movimento, como se o escritor descrevesse um único
colégio Abílio César Borges, demonstrando habilidades momento, é dada pela presença das reticências, que
precoces para a poesia. Perdeu a mãe em 1859. também é causadora de certa expectativa no leitor.

Em 1862, com o novo casamento do pai com Ma- Percebe-se, também, que cada estrofe guarda
ria Rosário Guimarães, a família muda-se para Recife, e lá um momento diferente da musa do autor. Na primeira,
Castro Alves matricula-se na Faculdade de Direito depois o soltar dos cabelos e, pela escolha de palavras noite e
de concluir os preparatórios e de ser reprovado duas ve- lua, ainda que em sentidos figurativos e poéticos, não
zes. Porém, dedicou-se mais aos seus poemas que aos imagina-se nada além do que a noite como pano de fun-
seus estudos. No mesmo ano, publicou o seu primeiro do. Em seguida, o eu-lírico observa Marieta dormindo,
poema chamado A Destruição de Jerusalém. Exatamente por meio da descrição da sua respiração e do seu sonho:
neste período, discutia-se os ideais abolicionistas, o que “O seio virginal que a mão recata/Embalde o prende a
influenciou fortemente as obras do escritor. Suas poe- mão... cresce... flutua... [trata-se a respiração. O crescer
sias mais conhecidas têm o combate à escravidão como refere-se à inspiração do ar] /Sonha [literalmente o sono,
tema, marcando-o como “poeta dos escravos”. ao dormir] a moça ao relento... além na rua/Preludia um
violão na serenata”. Observa-se o contraste de realida-
Perdeu o pai em 1866 e, pouco tempo depois, des, a de Marieta, ao dormir, e a da serenata, provavel-
envolveu-se com a atriz portuguesa Eugênia Câmara, dez mente alguém que se declara para ela. Estes dois fatos
anos mais velha. Dois anos mais tarde, escreveu o drama não são possíveis de ocorrerem ao mesmo tempo, logo,
teatral Gonzaga, que foi representado com sucesso. Po- quando o eu-lírico introduz a ideia da serenata, sabe-se
rém, a fase próspera se abalou com a sua separação com que Marieta está dormindo e que esta ideia faz parte de
Eugênia. Em 1869, ao sair para caçar, o escritor se aci- seu sonho.
dentou com uma espingarda, amputando o pé esquerdo
sob o risco de gangrena. Na terceira estrofe, o eu-lírico volta à realidade,
mais uma vez um contraste de situações, e o ponto de
Voltou à Bahia em 1870, passando grande parte vista amplia-se para fora do quarto (“Furtivos passos
do tempo em fazenda de parentes. Devido à sua saúde morrem no lajedo.../Resvala a escada do balcão discre-
debilitada, procurava melhoras para tuberculose. Po- ta...), até voltar para o cômodo novamente (Matam os
rém, faleceu devido à doença no ano seguinte, no dia 6 lábios os beijam em segredo...), quando Marieta é bei-
de julho de 1871. jada ao dormir.
Castro Alves teve um único livro editado em Por último, finalizando o poema com um terceto,
vida, Espumas flutuantes, bem recebido pelos leitores. o eu-lírico desabafa seu desejo, o ponto alto do sutil ero-
tismo, o que é aumentado diante da expressão “noites
Obra de Romeu e Julieta”, que tanto pode ser interpretado por
um viés romântico quanto proibido, no sentido de que
“Marieta” faz parte do compilado de poemas de todo o poema é concentrado numa relação inalcançável
“Os anjos da meia-noite”, mulheres que são represen- ou não permitida. Este último ponto é bastante pareci-
tadas como sombras, fantasmas que, apesar de causar do com a geração romântica anterior, porém insuficiente
perturbação e tirar o sono do eu-lírico, trazem prazer ao para classificar todo o poema como parte dela. Os auto-
poeta. “Marieta”, portanto, primeira sombra, é uma re- res, embora sempre busquem o novo para se sobrepor
ferência à Leonídia Fraga, a quem também dedicou os ao movimento atual, não conseguem criar algo do nada,
poemas “Os perfumes” e “Fé, Esperança e Caridade’’. e consequentemente buscarão referências para suas
inspirações, mesmo que sejam totalmente contrárias às
Escrito na terceira geração do Romantismo, ape- suas criações.
lidada de Condoreira, o poema difere-se por abordar um
amor real, acessível e sensual, o qual concretiza o conta- As rimas, sempre externas, embora fáceis de
identificar, são classificadas como rimas ricas. Ou seja,

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as palavras que rimam entre si são de classes de palavras situação do Brasil naquela época, um país que ainda se
diferentes. Exemplo: “O seio virginal que a mão recata/ sustentava às custas da escravidão.
Embalde o prende a mão... cresce... flutua.../Sonha a
moça ao relento... além na rua/Preludia um violão na se- Os sentimentos de igualdade e de liberdade não
renata”. Nesta estrofe, a segunda do poema, observa-se aplicavam-se apenas aos negros, mas também à visão
a rima feita com os pares recata/serenata e flutua/rua. do amor. Nesta terceira fase do movimento, os poetas
Recata é um verbo, do infinitivo recatar, serenata é um expressaram seus sentimentos de forma mais concreta e
substantivo; flutua é um verbo, do infinitivo flutuar, e rua leve, valorizando características reais das musas amadas
é um substantivo. Percebendo os pares de rima verbo que, em vez de serem retratadas como seres inacessí-
+ substantivo, e as suas diferenças enquanto classes de veis, estão em pé de igualdade em relação ao poeta. E,
palavras, as rimas serão ricas. como o amor passou a ser abordado de forma mais con-
creta e real, as poesias, consequentemente, tomaram
Narrador um cunho mais erótico, ou seja, a relação amorosa acon-
tece, de fato — caso do poema em questão, Marieta.
O eu-lírico toma características de narrador-ob-


servador, pois concentra o poema numa pessoa alheia,
no caso, Marieta. Apenas nas duas últimas estrofes, ele
permite ampliarmos a visão do acontecimento em si e,
pelos desabafos dos últimos versos, nota-se que ele pas- Citações da Obra na Matriz de Referências
sa a ter ações ao invés de permanecer na observação.
O ser humano como um ser que pergunta e quer saber
Espaço, tempo e linguagem
Nesse sentido, os poemas A canção do exílio
O espaço e o tempo atrelam-se. O poema é divi- (Gonçalves Dias, 1843), Ideias íntimas (Álvares de Aze-
dido em três espaços e dois tempos. Os três, que seriam vedo, 1853), Meus oito anos (Casimiro de Abreu, 1859),
Marieta (Castro Alves, 1870), O sonho africano (Francis-
o quarto, a rua (no sonho de Marieta) e o que parece ser
ca Júlia, 1895), Mal secreto (Raimundo Correia, 1883), O
o primeiro piso da casa (na descrição “Furtivos passos
assinalado (Cruz e Sousa, 1905) e Ismália (Alphonsus de
morrem ao lajedo.../Resvala a escada do balcão discre-
Guimaraens, 1923) contribuem para o enriquecimento
ta...”). Já o tempo divide-se entre a realidade e sonho
da sensibilidade, ao expressarem poeticamente as muitas
(na descrição, percebe-se os limites: “Sonha a moça ao
significações da linguagem. O romance O Bom-Crioulo
relento... Além da rua/Preludia um violão na serenata”).
(Adolfo Caminha, 1895), vinculado aos ideais naturalis-
Na linguagem, notam-se sinais de erotismo, explicitados
tas, apresenta-se em linguagem clara, direta e objetiva.
na última estrofe, uma espécie de desespero, enfatizada
(Página 5, quarto parágrafo)
pelos pontos de exclamação.
Indivíduo, cultura e mudança social
Contextualização
Dentre as possibilidades de texto literários têm-
É importante entender que Marieta foi escrito -se os poemas A canção do exílio (Gonçalves Dias), Ideias
na terceira geração do Romantismo, conhecida como íntimas (Álvares de Azevedo), Meus oito anos (Casimiro de
Geração Condoreira, que também possuía fortes in- Abreu), Marieta (Castro Alves), O sonho africano (Francis-
fluências de Victor-Marie Hugo, também apelidada de ca Júlia), Mal secreto (Raimundo Correia), O assinalado
Geração Hugoniana. Nesta época, os poetas tinham (Cruz e Sousa), Ismália (Alphonsus de Guimaraens). (Pági-
preocupações muito diferentes daquelas que norteavam na 8, quarto parágrafo)
a primeira e a segunda geração. As reflexões literárias
não se concentravam mais na morte, no pessimismo e
no amor correspondido do Ultrarromantismo e, apesar Questões, Justificativas e Dicas
de ainda procurarem uma nova identidade para o país,
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agora tinham como centro de suas escritas a figura do
negro, apagada e silenciada devido à escravidão. Clique aqui ou use o QR CODE da página 6.
A terceira geração tinha como pano de fundo
uma visão mais ampla da identidade brasileira, embo-
ra tenha deixado de lado a figura do índio. Na verdade,
nessa época, a busca pela “cara” do Brasil concentrou-se
na figura do negro e nas discussões abolicionistas. Cas-
tro Alves foi um dos autores que tentou trazer a figura
negra para os holofotes e, ganhando destaque pela sua
“inspiração generosa”, acaba por ser conhecido como
“poeta dos escravos”. Esse período pode ser chamado,
também, de pré-realista, justamente pelas denúncias da

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O Sonho Africano - Francisca Julia

Autora
Francisca Júlia da Silva Münster nasceu no dia 31 Obra
de agosto de 1871 em Xiririca, atual Eldorado, em São
Paulo. Filha de Miguel Luso da Silva e de Cecília Isabel Na primeira quadra, ou quarteto, o eu-lírico des-
da Silva, e irmã do poeta Júlio César da Silva, foi crítica creve o momento inicial, um ambiente precário descrito
literária e poetisa. Estreou na literatura em 1891 no jor- nos versos “Eil-o em sua choupana. A lâmpada, suspen-
nal Estado de S. Paulo com o soneto Quadro Incompleto. sa/ao tecto oscilla; a um canto, um velho e hernando
Colaborou para jornais como Correio Paulistano e Diário fimbo”. A escolha do vocábulo choupana, que significa
Popular, ambos de São Paulo, e para os periódicos O Ál- uma casa feita de madeira ou ramos sem nenhum aca-
bum e A Semana, os dois do Rio de Janeiro. bamento, é autoexplicativa. Mas, nas palavras seguintes,
a autora prefere corroborar a imagem frágil do ambien-
Publicou o seu primeiro livro de poesias, cha- te e descreve a lâmpada pendurada, o que supõe que a
mado Mármores, em 1895 com o prefácio do filólogo e casa não tem estrutura estável, o que diz muito não só
historiador João Ribeiro. Já em 1899, escreveu O livro da sobre o lugar, mas também sobre quem está nele e as
infância, uma coletânea de textos em prosa e em verso, suas respectivas condições. Ainda sobre a descrição do
prefaciado pelo seu irmão Júlio da Silva e publicado pelo espaço, há um elemento que chama bastante atenção, o
Governo de São Paulo. Em 1902 foi cofundadora da re- fimbo, que é uma arma de arremesso. Com isso, alguns
vista Educação. No ano seguinte, publicou seu terceiro autores veem o objeto como uma metáfora relacionada
livro, Esfinges, novamente prefaciado por João Ribeiro. aos negros que lutaram na Guerra do Paraguai em troca
Tornou-se membro efetivo do Comitê Central Brasileiro de liberdade.
da Societá Internazionale Elleno-Latina, de Roma, em
1904. O método descritivo, predominante no poema,
dá lugar ao método narrativo, e a estrofe preocupa-se
Em 1909, casou-se com o telegrafista da Central em narrar as ações do homem nela retratados, como
do Brasil, Filadelfo Edmundo Münster. Dedicou-se, por podemos ver em: “Estira-se no chão... tanta fadiga e
alguns anos, ao lar, afastando-se da sua vida literária. Em doença! /espreguiça, boceja... o apagado cachimbo/na
1912 volta a publicar, lançando a coletânea de poesias bocca, nessa meia escuridão de limbo, /molho, semi-
Alma Infantil, em coautoria com o seu irmão. Foi home- cerrado os dúbios olhos, pensa...”. As palavras fadiga e
nageada na Academia de Letras por poetas e admirado- doença continuam a reforçar a situação de fragilidade,
res com um busto seu em bronze. Teve seus trabalhos assim como dúbios olhos, sugerindo idade avançada do
publicados nas revistas A Mensageira, A Cigarra, Rua do sujeito. Logo em seguida, as reticências preparam o se-
Ouvir, O Pirralho, A Época, Kosmos, Revista do Brasil, A gundo momento do poema, que é uma descrição mais
Vida Moderna, Revista da Semana, Comércio de Campi- psicológica, mais íntima.
nas e Renascença.
A próxima estrofe é um terceto. Descreve o de-
Nas impressões de sua primeira obra, a crítica sejo do negro, pobre e idoso que sonha com o seu país
pontuou características parnasianas das poesias da au- de origem descrito com “[...] As florestas gigantes/Se
tora em detrimento dos elementos simbolistas que João estendem sob o azul, onde, cheios de mágoa, /Vivem ne-
Ribeiro notara e escrevera no prefácio do livro. Naque- gros reptis e enormes elefantes...”.
la época, suas obras foram alvo de críticas por ter uma
“dicção máscula”, que significava o “não feminino”. O fe- Na última estrofe, também um terceto, as des-
minino naquele tempo era entendido como a literatura crições saudosas do passado terminam abruptamente
sentimental e inferior em termos estéticos. com a volta à realidade infeliz. O negro, “desce um rio,
a cantar”, e depara-se com “os velhos crocodilos”. Uma
Francisca Julia cometeu suicídio no dia do en- leitura possível é a de que os versos retratam a captura
terro de seu marido, 1º de novembro de 1920, deixan- dos negros pelos portugueses, que acontecia muito nos
do o projeto do livro Versos áureos. Em seu funeral, os rios, o rio Níger é um exemplo de ponto de comércio de
futuros autores da Semana de Arte Moderna, Oswald escravos.
de Andrade, Guilherme de Almeida, Paulo Setúbal, Ciro
Costa, Menotti Del Picchia e Martins Fontes, decidiram Narrador
homenageá-la com um mausoléu. Em sua missa de séti-
mo dia a Câmara dos Deputados aprovam o projeto para Em terceira pessoa, o eu-lírico conta uma histó-
construir um túmulo memorativo. ria que não é sua, ao mesmo tempo em que ela lhe é
íntima, uma vez que descreve os pensamentos do único
personagem dela, “Pensa na pátria, além… As florestas

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gigantes/Se estendem sob o azul, onde, cheios de má-


goa, /Vivem negros reptis e enormes elefantes...”.

Linguagem
A autora opta por uma linguagem mais crua,
“dicção máscula”, como as críticas gostavam de dizer.
Isto é, pouco havia sentimentalismo em suas palavras.

Citações da Obra na Matriz de Referências
O ser humano como um ser que pergunta e quer saber

Nesse sentido, os poemas A canção do exílio


(Gonçalves Dias, 1843), Ideias íntimas (Álvares de Aze-
Nota-se a sua concentração em narrar o fato, ainda que vedo, 1853), Meus oito anos (Casimiro de Abreu, 1859),
em versos, sem precisar floreá-lo. Marieta (Castro Alves, 1870), O sonho africano (Francis-
ca Júlia, 1895), Mal secreto (Raimundo Correia, 1883), O
assinalado (Cruz e Sousa, 1905) e Ismália (Alphonsus de
Espaço e tempo Guimaraens, 1923) contribuem para o enriquecimento
da sensibilidade, ao expressarem poeticamente as muitas
O espaço divide-se em dois tempos, basicamen-
significações da linguagem. O romance O Bom-Crioulo
te para destacar dois momentos com dois sentimentos
(Adolfo Caminha, 1895), vinculado aos ideais naturalis-
diferentes: a “choupana” do homem e a sua pátria. O tas, apresenta-se em linguagem clara, direta e objetiva.
primeiro momento ilustra a realidade sob uma emoção (Página 5, quarto parágrafo)
mais sóbria e mais pesada, num período de escravidão
no Brasil, que se intensifica a partir de 1550 e permane- Indivíduo, cultura e mudança social
ce até 1888, um pouco antes do ano em que o poema foi
escrito, 1895. Dentre as possibilidades de texto literários têm-
-se os poemas A canção do exílio (Gonçalves Dias), Ideias
Já no segundo momento possui duas sentimen- íntimas (Álvares de Azevedo), Meus oito anos (Casimiro de
talidades, embora seja um único ambiente: a nostalgia Abreu), Marieta (Castro Alves), O sonho africano (Francis-
de um passado do qual sente falta e a infelicidade de ter ca Júlia), Mal secreto (Raimundo Correia), O assinalado
seu cotidiano interrompido, dois extremos que podem, (Cruz e Sousa), Ismália (Alphonsus de Guimaraens). (Pági-
ou não, ter diferença de alguns anos entre a liberdade e na 8, quarto parágrafo)
a escravização.
Tipos e gêneros
Contextualização A fala de Djamila Ribeiro Precisamos romper os
Francisca Júlia foi uma expoente do Parnasianis- silêncios (TEDx SãoPauloSalon) propicia questionamentos
mo no Brasil, que herdou do Romantismo a busca pela sobre a naturalização da morte dos negros e sobre silên-
identidade da nova nação durante as primeiras décadas cios institucionais. No âmbito literário, coaduna-se à fala
pós-independência. de Djamila Ribeiro o poema intitulado Sonho Africano
de Francisca Júlia, espaço poético no qual se elucidam as
O movimento tem como característica a tenta- condições de vida do negro após a assinatura da Lei Áurea
tiva da impessoalidade de quem escreve, o que explica em 1888. Desse modo, o poema suscita questões acerca
o acabamento estético impecável e a métrica perfeita, da memória e da importância de se conservar a ancestra-
sendo uma oposição quase perfeita ao Simbolismo, que lidade. Já a obra de Maria Firmina dos Reis, o romance
prezava a sonoridade ao invés da grafia. É quase perfeita Úrsula, rompe com a naturalização das diferenças e tam-
porque nenhum autor consegue seguir um estilo sem fa- bém desarticula a concepção antagônica entre explorador
zer referência a outro ou tudo àquilo que vê e consome. e explorado. No romance, inserido no gênero do folhetim,
forma de publicação comum às narrativas românticas,
Exemplo disto é o Parnasianismo que tem temas e que se passa em pleno Brasil escravocrata e distante
comuns ao Romantismo, amor e escravidão negra no ainda da abolição da escravidão, o negro possui caracte-
Brasil. No caso do último tema, abolição da escravatura, rísticas morais elevadas, como a coragem, a lealdade e
o movimento não era exatamente ativista da causa, ape- a bondade, o que já configura a materialidade de uma
nas tratava-a como ponto central de algumas obras, até enunciação negra singular para o século XIX e possibilita
porque grande parte de suas poesias foram publicadas a discussão sobre a da participação da mulher na constru-
após a libertação dos escravos. ção da identidade nacional, majoritariamente composta
por produções de autores masculinos. (Página 10, primei-
Os sonetos parnasianos apresentam reformula- ro parágrafo)
ções e correções, justamente devido à busca da perfei-
ção. As suas versões de Musa Impassível e a publicação Espaços
de Esphinges, de certa forma uma visão ampliada de
O espaço do texto literário pode variar, modifi-
Mármores, são exemplo disso. Com isso, surge a repeti- cando sua forma de acordo com a época e o gênero. Nes-
ção de temas bastante criticada por Mário de Andrade. ses textos, pode-se perceber, também, a riqueza de tipos
humanos em espaços de habitações ou espaços territo-
riais comuns à época e nas tensões presentes entre espa-

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ços sociais complexos e distintos, aos quais esses tipos hu-


manos são vinculados na obra. Essas relações podem ser
percebidas na obra parnasiana O sonho africano (Francis-
ca Júlia) e em obras românticas, como A canção do exílio
(Gonçalves Dias) e Ideias íntimas (Álvares de Azevedo) e
em obras simbolistas, como O assinalado (Cruz e Sousa) e
Ismália (Alphonsus de Guimaraens). (Página 27, terceiro
parágrafo)

Questões, Justificativas e Dicas


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Anotações e Rascunhos

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Mal Secreto - Raimundo Correia

Autor
“Sou um homem sem pátria; nasci no Oceano”, vidade, o cientificismo e as descrições realistas, embora
disse Raimundo da Mota de Azevedo Correia, sobre seu fuja do sentimentalismo, não exclui o subjetivismo.
nascimento no navio São Luís, ancorado na Baía de Mo-
gúncia, no Maranhão, no dia 13 de maio de 1859. Filho Uma de suas principais características é a preo-
do Desembargador José Mota de Azevedo Correia – des- cupação com a perfeição da forma, recuperada do pe-
cendente dos duques de Caminha e filho de portugueses ríodo clássico. Preza por rimas ricas e formas fixas, em
–, e de Maria Clara Vieira da Silva, ambos maranhenses, especial o soneto, e apoia a ideia de “arte pela arte”: a
Raimundo foi com a família para o Rio de Janeiro, onde poesia não precisa se comprometer com nada, vale só
estudou no atual Colégio Pedro II, antes de se inscrever por sua beleza.
na Faculdade de Direito em São Paulo, em 1877.
Mal secreto foi publicado no livro Sinfonias, lan-
Durante a época de estudante, colaborava com çado em 1983.
jornais e revistas. Lançou seu primeiro livro, Sinfonias,
em 1883. Foi nesse livro que lançou o poema As pombas, Contexto
que o fez ficar conhecido como “o poeta das pombas”,
A melhor descrição/contextualização sobre a
alcunha da qual não gostava.
obra se encontra em seu próprio prefácio: “Não posso
Foi juiz no Rio de Janeiro, onde casou com Ma- dizer longamente o que é esse livro; confesso que há
riana Sodré e publicou escritos no jornal O Vassourense, nele o cheiro romântico da decadência, e um certo as-
e, em 1889, foi nomeado secretário da presidência da pecto flácido; mas, tais defeitos, a mesma afetação de
Província do Rio de Janeiro. Foi preso após a Proclama- algumas páginas, a vulgaridade de outras, não suprimem
ção da República, sendo solto em seguida por suas con- a individualidade do poeta, nem excluem movimento e a
vicções republicanas, e passou a exercer a profissão de melodia da estrofe. [...]
juiz em Minas Gerais, lugar em que lecionou na Facul-
Em termos chãos, o Raimundo Correia não dá
dade de Direito e foi nomeado diretor da Secretaria de
ainda neste livro tudo o que se pode esperar do seu ta-
Finanças de Ouro Preto.
lento, mas dá muito mais do que dera antes; afirma-se,
Também exerceu os cargos de segundo secretá- toma lugar entre os primeiros da nova geração. Estuda e
rio da Legação do Brasil em Portugal; diretor e professor trabalha. Dizem-me que compõe com grande facilidade,
no Ginásio Fluminense de Petrópolis e juiz de vara cível. e, todavia, o livro não é sobejo, ao passo que os versos
manifestam o labor de artista sincero e paciente, que
O poeta ocupa um dos mais altos postos na poe- não pensa no público se não para respeitá-lo”.
sia brasileira: faz parte da Tríade Parnasiana, junto a Al-
berto de Oliveira e Olavo Bilac, mas também teve obras Obra
no Romantismo e pendendo para o Simbolismo. Além da
poesia, deixou obras de crítica, ensaio e crônicas. Se a cólera que espuma, a dor que mora
N’aIma, e destrói cada ilusão que nasce,
Faleceu em 13 de setembro de 1911, em Paris, Tudo o que punge, tudo o que devora
onde foi tratar de sua tuberculose. O coração, no rosto se estampasse;

Se se pudesse, o espírito que chora,


Parnasianismo Ver através da máscara da face,
O Parnasianismo nasce, no Brasil, como uma Quanta gente, talvez, que inveja agora
ruptura com o Romantismo, por poetas insatisfeitos com Nos causa, então piedade nos causasse!
sua estética, que buscam inspiração nas ideias positivis-
tas e realistas do momento para acharem uma nova for- Quanta gente que ri, talvez, consigo
Guarda um atroz, recôndito inimigo,
ma de arte. Assim, surgiram as poesias científica, socia-
Como invisível chaga cancerosa!
lista e realista, primeiras manifestações da reforma que
culminou no Parnasianismo. Quanta gente que ri, talvez existe,
Cuja ventura única consiste
O Parnasianismo brasileiro, mesmo sendo ba-
Em parecer aos outros venturosa!
seado no Parnasianismo francês, rompe com alguma de
suas características, como a preocupação com a objeti-

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Aspectos poéticos Indivíduo, cultura e mudança social


Como não poderia deixar de ser, numa obra par- Dentre as possibilidades de texto literários têm-
nasiana, a preocupação com a forma e os valores estéti- -se os poemas A canção do exílio (Gonçalves Dias), Ideias
cos da antiguidade clássica são visíveis e bem marcados íntimas (Álvares de Azevedo), Meus oito anos (Casimiro
no poema. de Abreu), Marieta (Castro Alves), O sonho africano (Fran-
cisca Júlia), Mal secreto (Raimundo Correia), O assinalado
Em primeiro lugar, percebemos que se trata de
(Cruz e Sousa), Ismália (Alphonsus de Guimaraens). (Pági-
um soneto, uma composição poética de estrutura fixa,
na 8, quarto parágrafo)
com 14 versos divididos em quatro estrofes: dois quarte-
tos (estrofes compostas por quatro versos) seguidos por
dois tercetos (estrofes compostas por três versos). Todos Questões, Justificativas e Dicas
os 14 versos possuem 10 sílabas poéticas, sendo deno-
minados decassílabos. Quer acessar as questões, justificativas e dicas desta obra?

As rimas, por fim, são alternadas nos quartetos Clique aqui ou use o QR CODE da página 6.
(ABAB) e, apesar de mistas nos tercetos (CCD), podemos
considerar que são rimas emparelhadas seguidas de ver- Anotações e Rascunhos
sos soltos (que, apesar disso, rimam entre si).

Linguagem
A linguagem do poema, embora simples e de
fácil compreensão, é rica, tanto em aspectos poéticos
quanto em figuras da linguagem, como a metáfora que
é a própria “máscara da face” e o hipérbato, que é a in-
versão da ordem direta do discurso, como em “Se se pu-
desse o espírito que chora, /Ver através da máscara da
face, /Quanta gente, talvez, que inveja agora /Nos causa,
então piedade nos causasse! ”

Tema e Assunto
O soneto trata da dualidade entre essência e
aparência. O poeta descreve uma alma que representa o
que há de verdadeiro, sendo encoberta por uma másca-
ra que a esconde, criando pessoas vazias que têm como
única qualidade parecer admirável aos olhos dos outros,
ainda que não seja, de verdade.


Citações da Obra na Matriz de Referências
O ser humano como um ser que pergunta e quer saber

Nesse sentido, os poemas A canção do exílio


(Gonçalves Dias, 1843), Ideias íntimas (Álvares de Aze-
vedo, 1853), Meus oito anos (Casimiro de Abreu, 1859),
Marieta (Castro Alves, 1870), O sonho africano (Francis-
ca Júlia, 1895), Mal secreto (Raimundo Correia, 1883), O
assinalado (Cruz e Sousa, 1905) e Ismália (Alphonsus de
Guimaraens, 1923) contribuem para o enriquecimento
da sensibilidade, ao expressarem poeticamente as muitas
significações da linguagem. O romance O Bom-Crioulo
(Adolfo Caminha, 1895), vinculado aos ideais naturalis-
tas, apresenta-se em linguagem clara, direta e objetiva.
(Página 5, quarto parágrafo)

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O Assinalado - Cruz e Sousa

Autor
João da Cruz e Sousa, filho dos escravos alfor- A literatura do período é marcada por temas es-
riados Guilherme da Cruz e Carolina Eva da Conceição, pirituais, místicos, transcendentais e metafísicos. Muito
nasceu em Nossa Senhora do Desterro, no dia 24 de no- ligado ao imaginário e à fantasia, trazem muitos termos
vembro de 1861. vagos ou propositalmente indefinidos, para manter uma
aura de mistério e/ou misticismo.
Desde pequeno, o jovem Cruz e Sousa recebeu
tutela do seu ex-senhor, o marechal Guilherme Xavier de Na época, foi considerada uma irmã gêmea obs-
Sousa. Sua esposa, Dona Clarinda Fagundes Xavier de cura do Romantismo, por resgatar seu gosto pelo sen-
Sousa, não tinha filhos, e passou a proteger e cuidar da timentalismo e o subjetivismo. No entanto, enquanto
educação de João, que adotou do casal o sobrenome da o Romantismo pendia muito para questões pessoais e
família. amorosas, o Simbolismo traz uma busca mais profunda
pelo “eu”, a partir do inconsciente.
O jovem aprendeu francês, latim e grego, além
de ter sido discípulo do alemão Fritz Müller, com quem Uma das principais características desse período
aprendeu Matemática e Ciências Naturais. é a musicalidade das obras, que abusam de figuras de
linguagem como a sinestesia, a aliteração e a assonância.
Em 1881, dirigiu o jornal Tribuna Popular, no
qual combateu a escravidão e o preconceito racial, e em Contexto
1885, lançou o primeiro livro, Tropos e Fantasias, em
parceria com Virgílio Várzea. O Assinalado faz parte da coletânea Últimos So-
netos, publicada postumamente em 1905.
Sendo o “único escritor eminente de pura raça
negra na literatura brasileira, onde são numerosos os Bastante diferente de suas outras obras, princi-
mestiços”, recebeu as alcunhas de Cisne Negro e Dante palmente em temáticas, o livro reúne sonetos sobre a
Negro, quando começou a carreira literária. própria arte poética, mesclado a confissões, como o de-
sejo de ser reconhecido e a angústia de não o ser.
Em 1890, foi para o Rio de Janeiro, trabalhar
como arquivista na Estrada de Ferro Central do Brasil, e
colaborou também com diversos jornais. Em 1893, publi-
Obra
cou suas obras mais significativas, Missal (prosa poética Tu és o louco da imortal loucura,
baudelairiana) e Broquéis (poesia), que foram as obras O louco da loucura mais suprema.
fundadoras do movimento simbolista no Brasil, que se A Terra é sempre a tua negra algema,
estendeu até a Semana de Arte Moderna, em 1922. Prende-te nela a extrema Desventura.
Em novembro de 1893, casou-se com Gavita Mas essa mesma algema de amargura,
Gonçalves, também negra, com quem teve quatro filhos. Mas essa mesma Desventura extrema
Todos os filhos faleceram prematuramente por conta da Faz que tu’alma suplicando gema
tuberculose, o que levou sua esposa à loucura. E rebente em estrelas de ternura.
O próprio Cruz e Sousa foi, também, vítima do Tu és o Poeta, o grande Assinalado
mal do século: sucumbiu em Curral Novo, Minas Gerais, Que povoas o mundo despovoado,
no dia 19 de março de 1898. De belezas eternas, pouca a pouco...

Simbolismo Na Natureza prodigiosa e rica


Toda a audácia dos nervos justifica
Cruz e Souza foi o grande precursor do Simbo- Os teus espasmos imortais de louco!
lismo nacional, com suas obras Missal e Broquéis sendo
marcos fundadores. Aspectos poéticos

O Simbolismo foi uma escola literária posterior O poema é um soneto, tipo de produção de es-
ao Parnasianismo, que se desvencilhou do movimento trutura fixa, com dois quartetos e dois tercetos, isso é,
anterior principalmente devido à ruptura com a falta de duas estrofes composta por quatro versos seguidas e
sentimentalismo, ou o sentimentalismo comedido. Tam- duas compostas por três.
bém nega as tendências do Realismo e do Naturalismo.

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Sua versificação é bem definida, com versos de- Energia e oscilações


cassílabos – aqueles que contêm dez sílabas poéticas –
que seguem o padrão de rima ABBA, nos quartetos, e A relação da interferência visual da luz sobre o
CCD, nos tercetos, sendo que os últimos versos dos dois pigmento é tratado nas pinturas impressionistas, como se
tercetos rimam entre si. percebe na obra Impressão, nascer do sol (Monet). Na li-
teratura, o Simbolismo também aborda a relação cromá-
tica, como pode ser observado na obra O assinalado (Cruz
Linguagem
e Souza). Na música Mar de Brasília (Engels Espíritos) é
A linguagem empregada em O Assinalado é ex- possível perceber o fenômeno da dispersão da luz. (Pági-
tremamente rica: traz assonância, ou repetição de som na 15, quarto parágrafo)
vocálico (“Mas essa mesma algema de amargura”), pro- A formação do mundo ocidental contemporâneo
sopopeia, ou empréstimo de sentimentos humanos e
palavras a seres inanimados (“Faz que tua alma suplican- Quanto à arte literária, formas poéticas têm
do gema”), bem como antítese, ou emprego de ideias grande relevância no contexto do século XIX. Essas formas
conflitantes num mesmo objeto (“Que povoas o mundo podem ser analisadas no aspecto sincrônico e no diacrôni-
despovoado”). co, ou seja, não só nas relações da literatura com o seu
tempo, mas também em diálogos que a literatura tra-
Tema e Assunto va consigo mesma, dando saltos, provocando rupturas,
A obra em si é voltada na metalinguagem: um transformando-se e levando o indivíduo a um profundo
poema sobre o fazer poético. esclarecimento, ou quem sabe, transportando-o a um la-
boratório virtual de infinitas possibilidades, como pode
Traz uma dualidade na visão da poesia, que é a ser apreciado nos poemas simbolistas, Ismália (Alphonsus
prisão que se impõe sobre o poeta e também sua liberta- de Guimaraens) e O Assinalado (Cruz e Souza). (Página
ção. Cruz e Sousa narra um processo artístico: a angústia 22, quinto parágrafo)
de ser poeta e, portanto, louco, preso à terra, que acaba
chamando-o a escrever, libertando assim seus “rompan- Espaços
tes de ternura”, para então fazê-lo distribuir beleza para
o mundo, justificando assim sua loucura. O espaço do texto literário pode variar, modifi-
cando sua forma de acordo com a época e o gênero. Nes-
ses textos, pode-se perceber, também, a riqueza de tipos


Citações da Obra na Matriz de Referências
O ser humano como um ser que pergunta e quer saber

Nesse sentido, os poemas A canção do exílio


(Gonçalves Dias, 1843), Ideias íntimas (Álvares de Aze-
humanos em espaços de habitações ou espaços territo-
riais comuns à época e nas tensões presentes entre espa-
ços sociais complexos e distintos, aos quais esses tipos hu-
manos são vinculados na obra. Essas relações podem ser
percebidas na obra parnasiana O sonho africano (Francis-
ca Júlia) e em obras românticas, como A canção do exílio
(Gonçalves Dias) e Ideias íntimas (Álvares de Azevedo) e
em obras simbolistas, como O assinalado (Cruz e Sousa)
vedo, 1853), Meus oito anos (Casimiro de Abreu, 1859), e Ismália (Alphonsus de Guimaraens). (Página 27, terceiro
Marieta (Castro Alves, 1870), O sonho africano (Francis- parágrafo)
ca Júlia, 1895), Mal secreto (Raimundo Correia, 1883), O
assinalado (Cruz e Sousa, 1905) e Ismália (Alphonsus de
Guimaraens, 1923) contribuem para o enriquecimento da
Questões, Justificativas e Dicas
sensibilidade, ao expressarem poeticamente as muitas Quer acessar as questões, justificativas e dicas desta obra?
significações da linguagem. O romance O Bom-Crioulo
(Adolfo Caminha, 1895), vinculado aos ideais naturalis- Clique aqui ou use o QR CODE da página 6.
tas, apresenta-se em linguagem clara, direta e objetiva.
(Página 5, quarto parágrafo) Anotações e Rascunhos
Indivíduo, cultura e mudança social

Dentre as possibilidades de texto literários têm-


-se os poemas A canção do exílio (Gonçalves Dias), Ideias
íntimas (Álvares de Azevedo), Meus oito anos (Casimiro
de Abreu), Marieta (Castro Alves), O sonho africano (Fran-
cisca Júlia), Mal secreto (Raimundo Correia), O assinalado
(Cruz e Sousa), Ismália (Alphonsus de Guimaraens). (Pági-
na 8, quarto parágrafo)

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Ismália - Alphonsus de Guimaraens

Autor
Afonso Henrique da Costa Guimaraens, filho Uma das principais características desse período
do português lbino da Costa Guimarães, e da brasileira é a musicalidade das obras, as quais abusam de figuras
Francisca Paula Guimaraens Alvim, nasceu em 24 de ju- de linguagem como a sinestesia, a aliteração e a asso-
lho de 1870, na cidade mineira de Ouro Preto. nância.

Com apenas 18 anos, perdeu sua prima e noi- Contexto


va Constança, filha do poeta Bernardo Guimaraens, seu
tio-avô, e essa perda marcou não somente o jovem, mas Ismália está contido em uma coletânea de Al-
também sua produção poética. phonsus lançada postumamente, em 1923. Denominada
Pastoral aos crentes do amor e da morte, foi organizada
Afonso Guimaraens se mudou para São Paulo pelo seu filho, o também escritor João Alphonsus.
em 1980, para estudar na Faculdade de Direito do Largo
São Francisco. Foi nessa época que começou a colaborar A obra é o poema XXXIII d’As Canções, terceira
na imprensa e frequentou a Vila Kyrial, de José de Freitas das quatro sessões do livro: Brazão, As Estâncias, As Can-
Vale, onde se reuniam os jovens simbolistas. ções e Os Sonetos.

Foi juiz-substituto e promotor no estado de Mi- Obra


nas Gerais, onde se casou, em 1897, com Zenaide de Oli-
veira, com quem teve 15 filhos. Lançou suas primeiras Quando Ismália enlouqueceu,
obras – em versos – em 1899, e começou a colaborar Pôs-se na torre a sonhar...
com A Gazeta em 1900, mas foi somente em 1902, quan- Viu uma lua no céu,
do lançou sua obra Kyriale, que assinou com o pseudôni- Viu outra lua no mar.
mo de Alphonsus de Guimaraens.
No sonho em que se perdeu,
Em 1906, mudou-se para Mariana, e seu isola- Banhou-se toda em luar...
mento o fez ficar conhecido como “O Solitário de Maria- Queria subir ao céu,
na”, ainda que vivesse com sua família. Foi nessa mesma Queria descer ao mar...
cidade, sua “torre de marfim do Simbolismo” que fale-
ceu, anos depois, no dia 15 de julho de 1921. E, no desvario seu,
Na torre pôs-se a cantar...
Simbolismo Estava perto do céu,
Estava longe do mar...
Alphonsus de Guimaraens é, junto a Cruz e Sou-
za, um dos maiores nomes do Simbolismo brasileiro. E como um anjo pendeu
As asas para voar...
O Simbolismo foi uma escola literária posterior Queria a lua do céu,
ao Parnasianismo, que se desvencilhou do movimento Queria a lua do mar...
anterior principalmente devido à ruptura com a falta de
sentimentalismo, ou o sentimentalismo comedido. Tam- As asas que Deus lhe deu
bém nega as tendências do Realismo e do Naturalismo. Ruflaram de par em par...
Sua alma subiu ao céu,
A literatura do período é marcada por temas es- Seu corpo desceu ao mar...
pirituais, místicos, transcendentais, metafísicos. Muito
ligado ao imaginário e à fantasia, trazem muitos termos Aspectos poéticos
vagos ou propositalmente indefinidos, para manter uma
A obra é uma quadra poética, isso é, um poema
aura de mistério e/ou misticismo.
dividido em estrofes de quatro versos. Cada um desses
Na época, foi considerada uma irmã gêmea obs- verbos possui sete sílabas poéticas, os chamados hep-
cura do Romantismo, por resgatar seu gosto pelo sen- tassílabos, mais conhecidos como redondilha maior.
timentalismo e o subjetivismo. No entanto, enquanto
Quanto à versificação, o poema apresenta ri-
o Romantismo pendia muito para questões pessoais e
mas alternadas, ou seja, de padrão ABAB, durante todo
amorosas, o Simbolismo propõe uma busca mais profun-
o poema. É interessante notar que, apesar de ser um
da pelo “eu”, a partir do inconsciente.
esquema de rimas comum, foi extremamente bem tra-
balhado na poesia, que rima vogais abertas com vogais

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fechadas (seu/céu) e apresenta as chamadas rimas ricas, Guimaraens, 1923) contribuem para o enriquecimento
como são chamadas aquelas que ocorrem entre palavras da sensibilidade, ao expressarem poeticamente as muitas
de classes gramaticais diferentes (céu, que é um subs- significações da linguagem. O romance O Bom-Crioulo
tantivo, rima com enlouqueceu, perdeu, pendeu e deu, (Adolfo Caminha, 1895), vinculado aos ideais naturalis-
verbos, bem como com seu, pronome). tas, apresenta-se em linguagem clara, direta e objetiva.
(Página 5, quarto parágrafo)
Outros pontos dignos de nota são a repetição da
figura do céu e do mar nos versos finais de cada quadra, Indivíduo, cultura e mudança social
que também repetem os verbos, nas quatro primeiras
estrofes, e os pronomes, na última. Dentre as possibilidades de texto literários têm-
-se os poemas A canção do exílio (Gonçalves Dias), Ideias
íntimas (Álvares de Azevedo), Meus oito anos (Casimiro
Linguagem
de Abreu), Marieta (Castro Alves), O sonho africano (Fran-
A linguagem da obra é uma bela representação cisca Júlia), Mal secreto (Raimundo Correia), O assinalado
do estilo de escrita do autor, em geral: extremamente (Cruz e Sousa), Ismália (Alphonsus de Guimaraens). (Pági-
poética e rica em figuras de linguagem, é bem marcada na 8, quarto parágrafo)
pelo lirismo e pela suavidade, que contrastam com os
temas obscuros sobre o qual escreve, sobretudo a morte Estruturas
da pessoa amada.
No campo da poesia, pode-se perceber um maior
Em relação às figuras de linguagem, as mais mar- rigor na forma como nas redondilhas de A Canção do
cantes em Ismália são o hipérbato (inversão da ordem Exílio (Gonçalves Dias) consagrou-se rapidamente, de
direta do discurso) em “E, no desvario seu, /Na torre forma tal que é referida explicitamente na letra do Hino
pôs-se a cantar” e a antítese (exposição de ideias opos- Nacional. O poema é composto por cinco estrofes, as três
tas) presente em todo o poema, nas referências a céu e primeiras são quartetos e as duas últimas sextetos. To-
mar, mas também no emprego seguido dos termos “per- dos os versos são heptassílabos. O poema também não
to” e “longe”, e também “subir” e “descer”. apresenta nenhum adjetivo qualificativo em seus vinte e
quatro versos, apenas expressões qualificativas, em uma
Tema e Assunto comparação constante entre “lá” (refere-se ao Brasil) e
“cá” (refere-se a Portugal). Gonçalves Dias consolidou a
O poema é estruturado em torno de uma forte Primeira Geração Romântica, chamada de Nacionalista.
dualidade entre corpo e espírito, céu e terra, humano e Utilizando-se, também, de redondilhas, o poeta Alphon-
divino. sus de Guimaraens propõe uma narrativa menos cartesia-
na, sob influência do estudo do subconsciente, que narra
Ismália tenta, a todo custo, unir a matéria e a o fim da vida de Ismália, poema pertencente ao Simbo-
alma, ainda que isso pareça algo inalcançável e impos- lismo em que a tônica é a busca pelo transcendente, pelo
sível, como unir céu e mar, fazendo jus ao movimento cósmico. (Página 13, primeiro parágrafo)
simbolista, ao apresentar esse desejo, que vai contra a
lógica, o positivismo e a racionalidade. O próprio poema A formação do mundo ocidental contemporâneo
trata isso como o delírio de alguém louco, como mostra
o primeiro verso. Quanto à arte literária, formas poéticas têm
grande relevância no contexto do século XIX. Essas formas
Foi em meio a um desvario que conseguiu alcan- podem ser analisadas no aspecto sincrônico e no diacrôni-
çar seu desejo, e por se tratar de uma obra muito subje- co, ou seja, não só nas relações da literatura com o seu
tiva, não é possível dizer ao certo se isso é um resultado tempo, mas também em diálogos que a literatura tra-
de um sonho, ou se acontece de fato o que o final dá a va consigo mesma, dando saltos, provocando rupturas,
entender – um suicídio. transformando-se e levando o indivíduo a um profundo
esclarecimento, ou quem sabe, transportando-o a um la-
boratório virtual de infinitas possibilidades, como pode


Citações da Obra na Matriz de Referências
O ser humano como um ser que pergunta e quer saber

Nesse sentido, os poemas A canção do exílio


(Gonçalves Dias, 1843), Ideias íntimas (Álvares de Aze-
ser apreciado nos poemas simbolistas, Ismália (Alphonsus
de Guimaraens) e O Assinalado (Cruz e Souza). (Página 22,
quinto parágrafo)

Espaços

O espaço do texto literário pode variar, modifi-


cando sua forma de acordo com a época e o gênero. Nes-
vedo, 1853), Meus oito anos (Casimiro de Abreu, 1859), ses textos, pode-se perceber, também, a riqueza de tipos
Marieta (Castro Alves, 1870), O sonho africano (Francis- humanos em espaços de habitações ou espaços territo-
ca Júlia, 1895), Mal secreto (Raimundo Correia, 1883), O riais comuns à época e nas tensões presentes entre espa-
assinalado (Cruz e Sousa, 1905) e Ismália (Alphonsus de ços sociais complexos e distintos, aos quais esses tipos hu-

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manos são vinculados na obra. Essas relações podem ser


percebidas na obra parnasiana O sonho africano (Francis-
ca Júlia) e em obras românticas, como A canção do exílio
(Gonçalves Dias) e Ideias íntimas (Álvares de Azevedo) e
em obras simbolistas, como O assinalado (Cruz e Sousa) e
Ismália (Alphonsus de Guimaraens). (Página 27, terceiro
parágrafo)

Questões, Justificativas e Dicas


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Anotações e Rascunhos

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Úrsula - Maria Firmina dos Reis

Autora
Maria Firmina dos Reis nasceu na Ilha de São tar de amores impossíveis, e sim mostrar a perspectiva
Luís, na data de 11 de março de 1822. Se tornaria a pri- da escravidão pelo próprio negro, atitude inovadora e
meira romancista negra brasileira. Filha de Leonor Felip- ousada, para o contexto da época.
pa dos Reis, ex-escravizada, e João Pedro Esteves, sócio
do senhor de escravos de sua mãe, o nome de seu pai No decorrer da história, nota-se um enredo mar-
não consta no registro de batismo, apenas no de óbito. cado por ilusões, desencontros, decepções e tragédias.
Em 1830, se muda para a vila de São José de Guimarães Úrsula, aprisionada pelo seu tio em uma fazenda falida
com sua família. Viveu grande parte da sua vida na casa no nordeste do Maranhão, vivia com sua mãe doente.
de uma tia materna que tinha maior poder aquisitivo. A princípio, o romance nos envolve em um triângulo
amoroso entre Úrsula (a jovem humilde e desampara-
Sua trajetória e dedicação às letras e à educação da), Tancredo (o homem afortunado) e o tio de Úrsula (o
inicia em 1847, quando concorre à cadeira de Instrução vilão). Há também a presença de três personagens ne-
Primária, com outras duas concorrentes e, sendo a única gros e escravos, Túlio, Susana e Antero, que questionam,
aprovada, assume e exerce a profissão de professora de agem e acima de tudo: traçam uma identidade do Brasil,
primeiras letras, de 1847 a 1881. Em 1859 publica seu uma vez que, estes personagens recebem, no texto, um
primeiro romance “Úrsula”, sob pseudônimo de “Uma tratamento marcado pelo ponto de vista interno, pau-
maranhense”. Em 1887 publica na Revista Maranhense tado por uma profunda fidelidade à história oculta da
o conto “A Escrava”, conhecido pelo seu conteúdo abo- diáspora africana no Brasil.
licionista. Aos 54 anos de idade e 34 anos de magistério
oficial, Maria Firmina fundou uma aula mista e gratui- Desde o período oitocentista, os romances bra-
ta para alunos de baixa renda em Maçaricó, próximo a sileiros traziam muito daquilo que era visto e vivido no
vila São José de Guimarães. As aulas eram ministradas contexto social e político. Em Úrsula, não é diferente,
num barraco e Maria se dirigia ao barracão toda manhã o livro descreve como era a sociedade escravocrata da
subindo num carro de boi. Lá, ensinava as filhas de um época, mediante narrativas pessoais de alguns perso-
senhor de engenho, dono do barraco, e também aos alu- nagens. O personagem Túlio, por exemplo, é de grande
nos que ela mesma levava. importância para a trama, já que ele se sente insatisfeito
com sua condição de escravo e narra sua revolta.
Dedicada e estudiosa, Maria Firmina contribuiu
bastante para a vida intelectual maranhense: publicou Dividido em quatro blocos, o romance Úrsula,
livros, colaborou com a imprensa local, participou de an- nos dois primeiros, discorre sobre como Tancredo e Úr-
tologias e foi musicista e compositora. sula se conhecem e salvam a vida de um cavalheiro que
conta todos seus conflitos familiares. Nos dois últimos,
Maria Firmina foi descrita por alguns conheci- Úrsula é quem conta como fora sua vida de escrava,
dos, quando tinha 85 anos, como uma mulher negra, além dos relatos de Susana de como conseguiu sobrevi-
baixa e de cabelos crespos. Muito ligada à causa aboli- ver a uma viagem dentro de um navio negreiro.
cionista e a luta antirracista, a autora expõe um conteú-
do literário relacionado as denúncias contra as desigual- Nota-se que a narrativa mostra a memória do
dades sociais. passado do negro africano que vem a se tornar o agente,
o protagonista da história, ou seja, é ele quem mostra,
Em 11 de novembro de 1917, aos 92 anos, cega por meio da sua vivência e seus próprios conceitos, o
e pobre, Maria Firmina faleceu na casa de uma ex-escra- que é a escravidão. É esta a diferença marcante da auto-
va, Mariazinha, mãe de um dos seus filhos de criação. ra Maria Firmina, pois demonstra uma preocupação que
vai além da estética e da forma, bem como de conteúdo
Obra passado ao leitor.

O romance “Úrsula” gira em torno de uma nar- De acordo com Telles (1997), o que mais chama
rativa demonstrando a vivência de personagens negros, atenção no livro não é o enredo romântico de amor, dor,
suas relações e os impactos que eles sofriam com a es- incesto e morte, temas comuns ao romance do século
cravidão. Úrsula é uma jovem pura e simples que irá se XIX, mas o tratamento dado à questão do escravo.
relacionar com o nobre bacharel Tancredo.
Outro aspecto importante presente na obra de
Esse contraste entre os personagens evidencia Maria Firmina, é a preocupação em denunciar as auto-
uma trágica história de amor impossível. Porém, é ne- ridades patriarcais que oprimiam os direitos das mulhe-
cessário destacar que a preocupação da obra não é tra- res. A autora acaba assinando o romance como “uma

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maranhense”, e já no prólogo da sua obra, expõe o des-


prezo que a sociedade carregava para com mulheres e
sem estudos privilegiados: “pouco vale este romance,
porque escrito por uma mulher, e mulher brasileira, de
educação acanhada e sem o trato e conversação dos ho-
mens ilustrados. ”

• Narrador: terceira pessoa;



Citações da Obra na Matriz de Referências
O ser humano como um ser que pergunta e quer saber

O romance Úrsula (Maria Firmina dos Reis, 1859)


apresenta perspectivas abolicionistas que podem ilustrar
• Linguagem: descritiva e poética, a ambientação natu-
ral é vista em quase toda a obra; as tensões diante dessa complexidade relativa ao conheci-
• Estrutura: encaixe de narrativas, diversas narrativas mento humano e suas concepções de mundo. É um marco
entrelaçadas em uma história principal; importante na literatura produzida por mulheres no Brasil
• Tempo: cronológico; por ser o primeiro romance de autoria negra e feminina
• Espaço: descrição do ambiente natural, como o cam- do país e também o primeiro de cunho antiescravista. (Pá-
po, e de vilarejos; gina 4, quinto parágrafo)
• Primeira contribuição para a literatura afro-brasileira
Indivíduo, cultura e mudança social
e abolicionista;
• Primeiro romance publicado por uma mulher negra A participação da mulher na política ou na vida
no Brasil. social de forma pública, pode ser percebida em obras
como O rapto de Prosérpina (Bernini), Maria Antonieta
Romantismo com rosa (Le Brun), Jane Avril (Lautrec), Moema (Victor
O Romantismo no Brasil foi dividido em três gera- Meirelles), Úrsula (Maria Firmina dos Reis), Precisamos
ções: romper com os silêncios - TEDxSaoPauloSalon (Djamila
Ribeiro), Cota não é Esmola (Bia Ferreira) e Maria da Vila
• Nacionalismo Matilde (Elza Soares) que trata da necessidade da desna-
• Mal do século turalização da violência, permitindo um diálogo sobre a
• Condoreirismo Lei Maria da Penha. (Página 8, quinto parágrafo)

A terceira geração do Romantismo tem como um Tipos e gêneros


de seus princípios o foco político e social. Na época, ideais
abolicionistas e republicanos ganhavam força e espaço, e, A fala de Djamila Ribeiro Precisamos romper os
junto com eles, um enorme desejo de liberdade em relação silêncios (TEDx SãoPauloSalon) propicia questionamen-
ao imperialismo autoritário. É nesse contexto que nasce a tos sobre a naturalização da morte dos negros e sobre
primeira história abolicionista brasileira. silêncios institucionais. No âmbito literário, coaduna-se à
fala de Djamila Ribeiro o poema intitulado Sonho Africa-
É chamada de condoreira justamente por fazer alu- no de Francisca Júlia, espaço poético no qual se elucidam
são ao condor, uma ave que, voando muito alto, represen- as condições de vida do negro após a assinatura da Lei
tava o desejo de renovação da sociedade. Dessa geração, Áurea em 1888. Desse modo, o poema suscita questões
podemos dizer que Maria Firmina, com sua obra recheada acerca da memória e da importância de se conservar a
de questões ligadas ao abolicionismo, a identidade do Bra- ancestralidade. Já a obra de Maria Firmina dos Reis, o
sil, ao negro como protagonista, antecipa o que viria a ser romance Úrsula, rompe com a naturalização das diferen-
um dos homens mais conhecidos pela terceira geração do ças e também desarticula a concepção antagônica entre
romantismo, o poeta baiano Castro Alves. explorador e explorado. No romance, inserido no gênero
do folhetim, forma de publicação comum às narrativas
Semelhante a Maria Firmina, Castro Alves descons- românticas, e que se passa em pleno Brasil escravocrata
trói a ideia romântica da primeira geração, em que o povo e distante ainda da abolição da escravidão, o negro pos-
brasileiro é representado pela união do branco europeu sui características morais elevadas, como a coragem, a
com o indígena. Esse projeto do resgate do negro como lealdade e a bondade, o que já configura a materialida-
personagem da nossa cultura mostra uma inovação do mo- de de uma enunciação negra singular para o século XIX e
vimento romântico brasileiro. possibilita a discussão sobre a da participação da mulher
na construção da identidade nacional, majoritariamente
composta por produções de autores masculinos. (Página
10, primeiro parágrafo)

A formação do mundo ocidental contemporâneo

A obra literária Úrsula (Maria Firmina dos Reis)


se destaca como uma voz de resistência à escravidão, à
condição do negro e ao papel da mulher na sociedade
sexista, apresentando um amplo painel da formação da

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sociedade brasileira. O fato de essa importante escritora


brasileira permanecer à margem da tradição literária dia-
loga com o artigo Onde as cientistas não têm vez (Revista
Pesquisa FAPESP, edição 273 de novembro de 2018) escri-
to por Rodrigo de Oliveira Andrade, que destaca a falta
de espaço para a produção intelectual feminina ainda nos
dias de hoje. (Página 22, quarto parágrafo)

Espaços

Estabelecendo uma comparação entre Brasil e


Europa, percebe-se que, enquanto aquele continente já
se encontrava na Segunda Revolução Industrial, entran-
do no capitalismo monopolista e desenvolvendo novas
tecnologias de produção e de fontes energéticas, o Brasil
permanecia tecnicamente atrasado, com uma economia
agroexportadora e sob o poder de uma aristocracia rural
e escravagista. Reflexões acerca dessas temáticas podem
ser elucidadas na pintura Roda de capoeira (Rugendas) e
no texto Úrsula (Maria Firmina dos Reis) que, por meio de
descrições detalhadas das senzalas e da problematização
dos espaços de convivência entre negros e brancos, con-
tribui para refletir sobre a tensão social existente nessa
época. (Página 28, sexto parágrafo)

Questões, Justificativas e Dicas


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Anotações e Rascunhos

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A Desobediência Civil - Henry David
Thoreau

Autoria
Henry David Thoreau, poeta, naturalista, ativis- Henry David Thoreau faleceu aos 44 anos em
ta anti-impostos, crítico da ideia de desenvolvimento, Concord, Estados Unidos, no dia 6 de maio de 1862.
pesquisador, historiador, filósofo e transcendentalista,
foi um importante escritor norte-americano, tendo De- Obra
sobediência Civil como sua principal obra, mesmo sendo
póstuma. A obra trata-se de uma espécie de manual do Como se trata de uma obra pequena e de fácil
anarquismo pacífico, que influenciou Gandhi, Martin Lu- compreensão é de extrema importância que se tenha
ther King, Nelson Mandela entre outros homens impor- contato direto. Ela será transcrita na íntegra. Antes, po-
tantes da história. rém, cabem algumas considerações.

Descendente de franceses, ele nasceu em Con- Apesar de não ter sido a primeira ou a última
cord no dia 12 de julho de 1817, no estado de Massachu- obra escrita pelo escritor, Desobediência Civil, inicial-
setts. Criado em uma família de protestantes franceses mente nomeada de Resistência ao Governo Civil, está
donos de uma fábrica de lápis, a sua infância foi simples entre as obras mais famosas e importantes de Thoreau.
e vivida em meio à natureza. Ela foi escrita em 1849, quando ele tinha 22 anos de ida-
de, tornando-se, mais tarde, um clássico da literatura
Estudou no Concord Academy e logo depois foi política e filosófica da América.
estudar como bolsista em Literatura Clássica e Línguas
na Universidade de Harvard. Em 1837, uma vez formado, É importante mencionar que a obra foi fruto de
voltou para Concord, onde iniciou uma longa e íntima toda uma convicção estabelecida, mas o estopim foi um
amizade com o escritor Ralph Waldo Emerson, que co- episódio marcante em sua vida, que foi quando ele este-
nheceu em 1835. Nessa época, por influência do amigo, ve preso por uma noite por se recusar a pagar impostos
entrou em contato com alguns pensadores transcenden- ao governo, como protesto ao financiamento da guer-
talistas, embora discordasse de algumas ideias, e passou ra e escravidão. Dessa forma, na obra, publicada 3 anos
a fazer parte do grupo. depois, ele explica as razões pelas quais não pagou os
impostos e porque ninguém deveria pagar. Mais do que
Logo que retornou à cidade de origem, começou isso, ele explica que não seria preciso lutar fisicamente
a dar aula no colégio em que havia estudado na infância contra o governo para modificar a sua forma de atuação.
e adolescência. Entretanto, desanimado com o ensino, Para ele, seria suficiente que a população não apoiasse
ele passou a dedicar-se ao estudo da natureza e da es- o sistema e que também não permitisse que o governo
crita. Por causa da sua dedicação, as pessoas o conside- apoiasse os movimentos populacionais da época.
ravam preguiçoso pois passava muito tempo andando,
observando a natureza e escrevendo. Cabe destaque, também, o fato de que foi desse
ensaio que se solidificou o conceito de desobediência ci-
Em 1845, muito ligado à natureza e em busca de vil, hoje amplamente conhecido, inclusive pelas ciências
uma existência simples, construiu uma pequena cabana jurídicas. É certo que alguns autores anteriores a Tho-
às margens do lago Walden, e passou dois anos se de- reau já tinham escrito sobre o assunto como, por exem-
dicando à contemplação da natureza e escrita de suas plo, Sófocles na Grécia Antiga e Immanuel Kant, mas so-
reflexões. Foi nessa época que ele escreveu uma de suas mente ele falou sobre desobediência civil num contexto
principais obras e um clássico da literatura americana, concreto de um governo estabelecido, como o caso do
“Walden ou a Vida nos Bosques”. governo americano. Diante desse contexto, podemos
dizer que ele é o principal autor do conceito de desobe-
Em 1846, depois de ter passado uma tempora- diência civil.
da na natureza e durante a Guerra do México, Thoreau
se recusou a pagar os impostos que o governo impôs a O ensaio Desobediência Civil trata, portanto,
ele como um protesto contra a escravidão nos Estados das relações do indivíduo com o Estado e os governos,
Unidos, razão pela qual ele foi preso. Foi essa situação das obrigações da cidadania, dos sistemas de governo
que o levou a escrever Desobediência Civil (1849), obje- pela maioria, do quanto opor-se apenas pela opinião é
to desta análise, obra na qual estabeleceu a doutrina da insuficiente se os cidadãos continuam, pelo pagamento
resistência passiva que mais tarde influenciaria ativistas dos impostos, custeando o Estado, os governos e os go-
proeminentes do século XX, pois pregava um reformis- vernantes que moralmente desaprovam. Podemos dizer
mo que partia do indivíduo e não da comunidade, além que se trata de um manual do anarquismo pacífico.
disso defendia um modo de vida que privilegiava o con-
tato com a natureza.

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Ao longo do ensaio, Thoreau mostra o seu la- co homem vivo, pois pode dobrar-se à vontade deste ho-
mento para o fato de que o pleno uso de sua defesa da mem. É uma espécie de arma de brinquedo para o povo,
liberdade individual o tenha levado para a prisão. Para mas nem por isso menos necessária, pois o povo preci-
ele, a plenitude da liberdade era algo que ninguém po- sa ter algum tipo de maquinaria complicada, e ouvir sua
deria impedi-lo de exercer, e, por isso, deixa claro que, algazarra, para satisfazer sua idéia de governo. Assim, os
mesmo atrás das grades, se sentia livre e honrado por governos demonstram até que ponto os homens podem
não ter traído a si mesmo e nem as suas ideias. Ou seja, ser enganados, ou enganar a si mesmos, para seu próprio
mesmo preso, se sentia livre. benefício. Isto é excelente, devemos todos concordar. E
no entanto, este governo, por si só, nunca apoiou qual-
Engana-se quem pensa que Thoreau, no seu quer empreendimento, a não ser pela rapidez com que
ensaio, trava uma guerra contra o governo dos Estados lhe saiu do caminho. Ele não mantém o país livre. Ele não
Unidos, pois, além disso, ele faz muitas e duras críticas povoa o Oeste. Ele não educa. O caráter inerente ao povo
aos americanos. O escritor critica seus compatriotas, americano é que fez tudo o que foi realizado, e teria feito
visto que, em troca de facilidades e conveniências, acei- ainda mais se o governo não houvesse às vezes se coloca-
tam tudo que o Estado impõe. Para ele, de nada vale a do em seu caminho. Pois o governo é uma conveniência
pela qual os homens conseguem, de bom grado, deixar-se
indignação se ela não é transformada em ação. Chega
em paz uns aos outros, e, como já se disse, quanto mais
a comentar, inclusive, que não basta não ter escravos e
conveniente ele for, tanto mais deixará em paz seus go-
ser contra a escravidão se não há atitude para libertar os vernados. Se não fossem feitos de borracha, o comércio e
escravos de quem os prende. o tráfico em geral jamais conseguiriam superar os obstá-
culos que os legisladores continuamente colocam em seu
Por outro lado, o que o escritor defendia não era
caminho. E se tivéssemos que julgar estes homens intei-
um anarquismo violento, mas um anarquismo silencioso ramente pelos efeitos de seus atos, e não, em parte, por
e pacífico. Ele conclui que a desobediência contra o sta- suas intenções, eles mereceriam ser punidos tanto quan-
tus quo em defesa de uma causa é a forma mais simples to aquelas pessoas nocivas que obstruem as ferrovias.
e eficaz de se alcançar os objetivos. Como já citado, e
não por acaso, A desobediência civil influenciou líderes Porém, para falar de modo prático e como um cidadão, ao
que defendiam a resistência não-violenta, como Gandhi, contrário daqueles que chamam a si mesmos de antigo-
Martin Luther King, Nelson Mandela entre outros ho- vernistas, eu clamo não já por governo nenhum, mas ime-
mens importantes na história. diatamente por um governo melhor. Deixemos que cada
homem faça saber que tipo de governo mereceria seu
Segue a transcrição da obra. respeito e este já seria um passo na direção de obtê-lo.

A desobediência civil - Henry David Thoreau Afinal, a razão prática por que se permite que uma maioria
governe, e continue a fazê-lo por um longo tempo, quan-
“O melhor governo é o que governa menos” - aceito entu- do o poder finalmente se coloca nas mãos do povo, não
siasticamente esta divisa e gostaria de vê-la posta em prá- é a de que esta maioria esteja provavelmente mais certa,
tica de modo mais rápido e sistemático. Uma vez alcança- nem a de que isto pareça mais justo para a minoria, mas
da, ela finalmente equivale a esta outra, em que também sim a de que a maioria é fisicamente mais forte. Mas um
acredito: “0 melhor governo é o que absolutamente não governo no qual a maioria decida em todos os casos não
governa”, e quando os homens estiverem preparados pode se basear na justiça, nem mesmo na justiça tal qual
para ele, será o tipo de governo que terão. Na melhor os homens a entendem. Não poderá existir um governo
das hipóteses, o governo não é mais do que uma conve- em que a consciência, e não a maioria, decida virtualmen-
niência, embora a maior parte deles seja, normalmente, te o que é certo e o que é errado? Um governo em que
inconveniente - e, por vezes todos os governos o são. As as maiorias decidam apenas aquelas questões às quais se
objeções levantadas contra a existência de um exérci- apliquem as regras de conveniência? Deve o cidadão, se-
to permanente - e elas são muitas e fortes e merecem quer por um momento; ou minimamente, renunciar à sua
prevalecer - podem afinal ser levantadas também contra consciência em favor do legislador?
a existência de um governo permanente. O exército per-
manente é apenas um braço do governo permanente. O Consciências e seu bom senso, o que torna esta marcha
governo em si, que é apenas a maneira escolhida pelo bastante difícil, na verdade, e produz uma palpitação no
povo para executar sua vontade, está igualmente sujeito coração. Eles não têm dúvida alguma de que estão en-
ao abuso e à perversão antes que o povo possa agir por volvidos numa atividade condenável, pois todos têm
meio dele. Basta pensar na atual guerra mexicana, obra inclinações pacíficas. Então, o que são eles? Homens
de uns poucos indivíduos que usam o governo permanen- ou pequenos fortes e paióis a serviço de algum homem
te como seu instrumento, pois, de início, o povo não teria inescrupuloso no poder? Visitem o arsenal da Marinha
consentido nesta medida. e contemplem um fuzileiro naval, alguém que o governo
americano pode fazer ou que um homem pode fazer com
O que é este governo americano senão uma tradição, sua magia negra - uma mera sombra e reminiscência de
embora recente, que se empenha em passar inalterada humanidade, um homem amortalhado em vida, de pé,
à posteridade, mas que perde a cada instante algo de sua mas já sepultado em armas com acompanhamento fúne-
integridade? Não possui a vitalidade e a força de um úni- bre, pode-se dizer, embora também possa ocorrer que:

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“Não se ouviu nenhum tambor, nenhuma nota funeral, passar sem elas. Todas as máquinas têm seu atrito, e isto
possivelmente tem um lado bom que compensa o lado
Enquanto levávamos seu corpo para a trincheira final; ruim. De qualquer modo, seria bastante nocivo fazer mui-
to alvoroço por causa disso. Mas quando o atrito chega
Nem salva de adeus disparada por nenhum soldado ao ponto de controlar a máquina, e a opressão e o roubo
se tornam organizados, digo que não devemos mais ficar
Sobre a tumba em que nosso herói foi enterrado.” presos a tal máquina. Em outras palavras, quando um sex-
to da população de uma nação que se comprometeu a ser
A grande maioria dos homens serve ao Estado desse
o abrigo da liberdade é formado por escravos, e um país
modo, não como homens propriamente, mas como má-
inteiro é injustamente invadido e conquistado por um
quinas, com seus corpos. São o exército permanente, as
exército estrangeiro e submetido à lei militar, penso que
milícias, os carcereiros, os policiais, os membros da força
não é demasiado cedo para os homens honestos se rebe-
civil, etc. Na maioria dos casos não há um livre exercício
larem e darem início a uma revolução. O que torna este
seja do discernimento ou do senso moral, eles simples-
dever ainda mais urgente é o fato de que o país invadido
mente se colocam ao nível da árvore, da terra e das pe-
não é o nosso mas é nosso o exército invasor.
dras. E talvez se possam fabricar homens de madeira que
sirvam igualmente a tal propósito. Tais homens não mere- Paley, para muitos uma autoridade em questões morais,
cem respeito maior que um espantalho ou um monte de no capítulo que dedica ao “Dever de Submissão ao Go-
lama. O valor que possuem é o mesmo dos cavalos e dos verno Civil”, reduz toda obrigação civil a uma questão de
cães. No entanto, alguns deles são até considerados bons conveniência e prossegue afirmando que “uma vez que
cidadãos. Outros - como a maioria dos legisladores, polí- o interesse de toda a sociedade o exija, ou seja, uma vez
ticos, advogados, ministros e funcionários públicos - ser- que não se pode resistir ao governo estabelecido ou mu-
vem ao Estado principalmente com seu intelecto, e, como dá-lo sem inconveniência pública, é vontade de Deus que
raramente fazem qualquer distinção moral, estão igual- o governo estabelecido seja obedecido, e não mais que
mente propensos a servir tanto ao diabo, sem intenção de isto. Admitindo-se este princípio, a justiça de cada caso
fazê-lo, quanto a Deus. Uns poucos - como os heróis, os particular de resistência reduz-se ao cálculo da quantida-
patriotas, os mártires, os reformadores no melhor sentido de de perigo e ressentimento, de um lado, e da probabili-
e os homens - servem ao Estado também com sua cons- dade e do custo de repará-lo, de outro”. A respeito disso,
ciência, e assim necessariamente resistem a ele, em sua afirma, cada homem terá que julgar por si próprio. Mas
maioria, e são comumente tratados como inimigos. Um Paley parece jamais ter contemplado os casos aos quais
homem sábio só será útil como homem e não se sujeitará não se aplicam as regras de conveniência, em que um
ao papel de “barro “ para “tapar um buraco que impeça o povo, tanto quanto um indivíduo, deve fazer justiça, custe
vento de entrar’’, mas deixará esta tarefa, ao menos, para o que custar. Se injustamente arrebatei a tábua de salva-
suas cinzas: ção a um homem que se afogava, devo devolvê-la a ele
mesmo que me afogue. Isto, de acordo com Paley, seria
“Sou nobre demais para ser posse,
inconveniente. Mas aquele que salvasse sua própria vida,
Ser um subalterno no comando, em tal caso, acabaria por perdê-la. Este povo deve deixar
de ter escravos e de fazer guerra ao México, mesmo que
Ou mesmo servo e instrumento útil isso lhe custe sua existência como povo.

A qualquer Estado soberano deste mundo.” Em sua prática, as nações concordam com Paley. Mas será
que alguém pensa que o estado de Massachusetts faz
Aquele que se dá inteiramente a seus semelhantes pare- exatamente o que é direito na presente crise?
ce-lhes inútil e egoísta; aquele, porém, que a eles se dá
parcialmente é considerado um benfeitor e um filantropo. “Uma meretriz de profissão, vestida de prata

De que modo convém a um homem comportar-se em re- Ergue a cauda do vestido,


lação ao atual governo americano? Respondo que ele não
poderá associar-se a tal governo sem desonra. Não posso, Mas sua alma se arrasta no lodo”.
por um instante sequer, reconhecer como meu governo
Falando de modo prático, os que se opõem a uma refor-
uma organização política que é também governo de es-
ma em Massachusetts não são os cem mil políticos do
cravos.
Sul, mas os cem mil mercadores e fazendeiros daqui, que
Todos os homens reconhecem o direito de revolução, isto estão mais interessados no comércio e na agricultura do
é, o direito de recusar lealdade ao governo, e opor-lhe re- que na humanidade e não estão preparados para fazer
sistência, quando sua tirania ou sua ineficiência tornam- justiça aos escravos e ao México, custe o que custar. Não
-se insuportáveis. Mas quase todos dizem que não é este brigo com inimigos distantes mas com aqueles que, aqui
o caso no momento atual. Mas foi este o caso, pensam, na perto, cooperam com os que estão longe e cumprem suas
Revolução de 75 . Se alguém me dissesse que este é um ordens, e sem os quais os últimos seriam inofensivos. Es-
mau governo porque tributa determinadas mercadorias tamos acostumados a dizer que a massa dos homens é
estrangeiras trazidas a seus portos, é bastante provável despreparada, mas o progresso é lento porque a mino-
que eu não movesse uma palha a respeito, já que posso ria não é substancialmente mais sábia ou melhor do que
a maioria. Não é tão importante que a maioria seja tão

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boa quanto vós, mas sim que exista a bondade absoluta candidatos assim escolhidos como único candidato dis-
em alguma parte, pois isto fará fermentar toda a massa. ponível, provando deste modo, que ele próprio está dis-
Existem milhares de pessoas que se opõem teoricamente ponível para quaisquer propósitos dos demagogos. Seu
à escravidão e à guerra, e que, no entanto, efetivamente voto não tem mais valor que o de qualquer estrangeiro
nada fazem para dar-lhes um fim; que, considerando-se sem princípios ou o de algum mercenário nativo que te-
filhos de Washington e Franklin, sentam-se com as mãos nha sido comprado. Oh, para um homem que é homem e
nos bolsos e dizem não saber o que fazer, e nada fazem; que, como diz meu vizinho, tem uma espinha nas costas
que chegam a postergar a questão da liberdade em nome que não se deixa dobrar! Nossas estatísticas são equivo-
da questão do livre comércio, e, serenamente, após o jan- cadas: a população foi estimada em excesso. Quantos ho-
tar, lêem as listas com as cotações de preços junto com as mens existem em cada mil milhas quadradas deste país?
últimas notícias do México, possivelmente dormindo so- Apenas um, se tanto. A América não oferecerá nenhum
bre ambas. Qual é, hoje, a cotação de um homem hones- incentivo aos homens para que aqui se estabeleçam? O
to e de um patriota? Eles hesitam, e lamentam, e às vezes americano reduziu-se a um Sujeito Peculiar, que pode ser
suplicam, mas não fazem nada a sério ou que seja eficaz. reconhecido pelo desenvolvimento de seu órgão gregário
Esperarão, bem dispostos, que outros remediem (sic.) o e pela manifesta ausência de intelecto e alegre autocon-
mal, para que não precisem mais lamentar. O máximo que fiança, um sujeito cuja principal preocupação, ao chegar
fazem, quando o direito lhes passa perto, é dar-lhe um ao mundo, é verificar se os asilos de pobres estão em bom
voto barato, mostrando-lhe uma expressão débil e dese- estado; e que, antes mesmo de ter legalmente vestido um
jando-lhe felicidades. Há novecentos e noventa e nove uniforme varonil, já está coletando fundos para as viúvas
defensores da virtude para cada homem virtuoso. Mas é e órfãos que possam porventura existir; em suma, alguém
mais fácil lidar com quem verdadeiramente possui algo que só se aventura a viver através da ajuda da Companhia
do que com quem apenas o guarda temporariamente. de Seguros Mútuos, que prometeu enterrá-lo decente-
mente.
Toda votação é uma espécie de jogo, como o de damas ou
o gamão, com um leve matiz moral, um jogo com o certo Não é dever de um homem, na verdade, devotar-se à er-
e o errado, com questões morais, naturalmente acompa- radicação de qualquer injustiça, mesmo a maior delas,
nhado de apostas. O caráter dos votantes não está em pois ele pode perfeitamente estar absorvido por outras
discussão. Dou meu voto, talvez, ao que considero direi- preocupações. Mas é seu dever, ao menos, lavar as mãos
to, mas não estou vitalmente interessado em que este em relação a ela e, se não quiser mais levá-la em conside-
direito prevaleça. Disponho-me a deixar isto nas mãos ração, não lhe dar seu apoio em termos práticos. Se me
da maioria. A obrigação desta, portanto, jamais excede a dedico a outras ocupações e projetos, devo ao menos ve-
da conveniência. Mesmo votar em favor do direito é não rificar, inicialmente, se não o faço sentando sobre ombros
fazer coisa alguma por ele. Significa apenas expressar de- de outro homem. Devo sair de cima dele, antes de mais
bilmente aos homens seu desejo de que ele prevaleça. nada, para que também ele possa ocupar-se de seus proje-
Um homem sábio não deixará o direito à mercê do aca- tos. Vejam que gritante contradição se tolera. Ouvi alguns
so, nem desejará que ele prevaleça por meio do poder de meus concidadãos afirmarem: “Gostaria que me man-
da maioria. Não há senão uma escassa virtude na ação dassem ajudar a sufocar uma insurreição de escravos ou
de multidões de homens. Quando a maioria finalmente marchar em direção ao México - vejam só se eu iria!”. No
votar a favor da abolição da escravidão, será porque esta entanto, estes mesmos homens, seja diretamente através
lhe é indiferente ou porque não haverá senão um mínimo de sua sujeição, ou indiretamente, pelo menos, através
de escravidão a ser abolida por meio de seu voto. Eles, de seu dinheiro, forneceram substitutos para si mesmos.
então, serão os únicos escravos. O soldado que se recusa a servir numa guerra injusta é
aplaudido por aqueles que não se recusam a sustentar o
Somente o voto de quem afirma sua própria liberdade governo injusto que faz a guerra, por aqueles cujos atos e
através desse voto pode apressar a abolição da escravi- autoridade ele negligencia e despreza, como se o Estado
dão. fosse penitente ao ponto de contratar alguém para casti-
gá-lo enquanto peca mas não ao ponto de deixar de pecar
Ouço falar de uma convenção a ser realizada em Balti- por um momento sequer. Assim, em nome da Ordem e do
more, ou em algum outro lugar, para a escolha de um Governo Civil, somos levados, finalmente, a homenagear
candidato à Presidência, formada principalmente por di- e a sustentar nossa própria vileza. Depois do primeiro ru-
retores de jornais e políticos profissionais. Mas pergunto: bor do pecado vem a indiferença, e, de imoral, ela passa
que importância tem para qualquer homem independen- a ser, digamos, amoral, e não inteiramente desnecessária
te, inteligente e respeitável a decisão a que possam eles à vida que levamos.
chegar? Não poderemos ter, apesar disso, os benefícios
de sua sabedoria e honestidade? Não poderemos contar O erro mais óbvio e geral, para sustentar-se, exige a virtu-
com alguns votos independentes? Não existirão no país de mais desinteressada. A leve censura a que a virtude do
muitos indivíduos que não participam de convenções? patriotismo encontra-se normalmente sujeita é exercida,
Mas não: vejo que o homem respeitável, chamado a par- com mais probabilidade, pelos homens nobres. Aqueles
ticipar, imediatamente se desvia de sua posição e passa que, embora desaprovando o caráter e as medidas do go-
a desesperar de seu país, quando este teria muito mais verno, dão a ele sua lealdade e seu apoio, são indubita-
razões para desesperar dele. Sem demora, adota um dos velmente seus defensores mais conscienciosos e freqüen-
temente tornam-se os mais sérios obstáculos à reforma.

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Alguns dirigemse ao Estado pedindo que este dissolva a deter a máquina. O que devemos fazer, de qualquer ma-
União, que desconsidere as solicitações do Presidente10. neira, é verificar se não nos estamos prestando ao mal
Por que eles mesmos não dissolvem a união que existe que condenamos.
entre eles e o Estado e não se recusam a pagar sua cota
ao Tesouro? Não se mantêm, assim, em relação ao Esta- Quanto a adotar os meios que o Estado propiciou para
do, do mesmo modo que o Estado em relação à União? remediar o mal, nada sei sobre eles. Levam tempo demais
E não serão as mesmas razões que impediram o Estado e a vida se esgotaria. Tenho outros assuntos com que me
de resistir à União que os impedem de resistir ao Estado? preocupar. Vim a este mundo não, principalmente, para
fazer dele um bom lugar para se viver, mas para viver nele,
Como pode um homem satisfazer-se com apenas ter uma seja bom ou mau. Um homem não tem que fazer tudo,
opinião e deleitar-se com ela? Haverá nela algum deleite mas algo, e não é porque não pode fazer tudo que precisa
se sua opinião for a de que ele se sente lesado? Se teu fazer este algo de maneira errada. Não tenho maior obri-
vizinho te rouba um único dólar, não te contentarás em gação de enviar petições ao Governador ou à Legislatura
saber que foste roubado, ou em dizer que o foste, nem do que eles a mim, e, se não atenderem a minhas solici-
mesmo em pedir que ele pague o que te deve, mas toma- tações, o que devo fazer? Mas neste caso o Estado não
rás providências efetivas para obter de volta toda a quan- propicia solução alguma: o mal está em sua própria Cons-
tia e, ao mesmo tempo, para que não sejas novamente tituição. Isto pode parecer rude, inflexível e hostil, mas
roubado. A ação baseada num princípio, a percepção e é tratar com a máxima bondade e consideração o único
execução do direito, modifica coisas e relações; é essen- espírito que pode apreciá-lo ou merecê-lo. E assim o são
cialmente revolucionária e não condiz inteiramente com todas as mudanças para melhor, como o nascimento e a
nada que lhe seja anterior. Ela não divide apenas Estados morte, que convulsionam o corpo.
e Igrejas, mas também famílias, ah!, divide o indivíduo,
separando nele o diabólico do divino. Não hesito em dizer que aqueles que se autoproclamam
abolicionistas deveriam, imediata e efetivamente, retirar
Leis injustas existem: devemos contentar-nos em obede- seu apoio pessoal ou econômico ao governo de Massa-
cer a elas ou esforçar-nos em corrigi-las, obedecer-lhes chusetts, e não esperar até que se constituam em maioria
até triunfarmos ou transgredi-las desde logo? Num gover- de um para só então obter o direito de predominar. Penso
no como este, os homens geralmente pensam que devem ser suficiente que tenham Deus a seu lado sem que preci-
esperar até que a maioria seja persuadida a alterá-las. sem esperar por aquele homem a mais. Além disso, qual-
Pensam que, se resistissem ao governo, o remédio seria quer homem mais justo que seus semelhantes já constitui
pior que o mal. Mas é culpa do próprio governo que o uma maioria de um.
remédio seja, efetivamente, pior que o mal. É ele que o
torna pior. Por que ele não está mais apto a antecipar e Encontro diretamente, frente a frente, esse governo ame-
proporcionar a reforma? Por que não trata com carinho ricano, ou seu representante, o governo do Estado, uma
sua sábia minoria? Por que suplica e resiste antes de ser vez por ano - não mais - na pessoa do coletor de impos-
ferido? Por que não encoraja seus cidadãos a prontamen- tos. Este é o único modo pelo qual um homem na minha
te apontarem seus defeitos e a agirem melhor do que ele situação pode necessariamente encontrá-lo. E então ele
lhes pede? Por que sempre crucifica Cristo, excomunga afirma claramente: “Reconheça-me”. E a maneira mais
Copérnico e Lutero e declara Washington e Franklin re- simples, mais efetiva e, no atual estado de coisas, mais
beldes? indispensável de tratar com ele sobre este assunto, de ex-
pressar nossa pouca satisfação e carinho em relação a ele,
Pode-se pensar que a deliberada e eficaz negação de sua então, é negá-lo. O coletor de impostos, meu semelhante,
autoridade tenha sido a única ofensa jamais levada em é exatamente o homem com quem tenho de tratar - pois,
conta pelo governo. De outro modo, por que não lhe atri- afinal, é com homens que brigo e não com pergaminhos
buiu ele uma penalidade definida, adequada e proporcio- - e ele escolheu voluntariamente ser um agente do gover-
nal? Se um homem sem propriedade alguma recusa-se no. Como poderá ele saber, com certeza, o que é e o que
uma única vez a contribuir com nove xelins para o Esta- faz como representante do governo, ou como homem,
do, é aprisionado por um período de tempo ilimitado por até que seja obrigado a decidir se irá tratar a mim, seu
qualquer lei que seja de meu conhecimento, e determi- semelhante, por quem tem respeito, como um homem
nado apenas pelo critério pessoal daqueles que ali o colo- bem-intencionado e um seu semelhante, ou como um
caram. Mas tivesse ele roubado ao Estado noventa vezes maníaco e perturbador da ordem, até que seja obrigado
nove xelins, teria sido sem demora posto em liberdade. a ver se tem condições de superar este obstáculo a sua
urbanidade sem um pensamento ou discurso mais rudes
Se a injustiça faz parte do atrito necessário à máquina do e impetuosos correspondentes a sua ação? Estou certo
governo, deixemos que assim seja: talvez amacie com o de que se mil, se cem, se dez homens aos quais pudes-
passar do tempo, e certamente a máquina irá se desgas- se nomear -se dez homens honestos apenas - ah, se um
tar. Se a injustiça tem uma mola, polia, cabo ou manivela homem HONESTO, neste Estado de Massachusetts, dei-
exclusivamente para si, talvez possamos questionar se o xando de manter escravos, decidisse realmente retirar-se
remédio não será pior que o mal. Mas se ela for de natu- desta sociedade e fosse por isto encarcerado, isso signi-
reza tal que exija que nos tornemos agentes de injustiça ficaria o fim da escravidão nos Estados Unidos. Pois não
para com os outros, então proponho que violemos a lei. importa quão limitado possa parecer o começo: aquilo
Deixemos que nossas vidas sejam um anti-atrito capaz de que é bem feito uma vez está feito para sempre. Mas pre-

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ferimos falar sobre isso: essa é a nossa missão, dizemos. A muito tempo a acumular propriedades. A esses, o Estado
reforma tem a seu serviço um grande número de jornais, presta, comparativamente, pouco serviço, e um pequeno
mas nenhum homem. Se meu estimado semelhante, o re- imposto costuma ser visto como exorbitante, particular-
presentante do Estado11, que dedica seus dias ao arranjo mente se são obrigados a ganhá-lo com suas próprias
da questão dos direitos humanos na Câmara do Conselho, mãos. Se houvesse alguém que pudesse viver inteiramen-
ao invés de ser ameaçado com as prisões da Carolina, as- te sem o uso de dinheiro, o próprio Estado hesitaria em
sumisse a condição de prisioneiro de Massachusetts, este exigir-lhe pagamento. Mas o homem rico - sem querer fa-
Estado sempre ansioso por impingir o pecado da escra- zer nenhuma comparação invejosa - está sempre vendido
vidão a seu irmão - embora, no momento, possa apenas à instituição que o faz rico. Falando em termos absolutos,
descobrir um ato de inospitalidade como base para uma quanto mais dinheiro, menos virtude, pois o dinheiro se
disputa com ele -, a Legislatura não deixaria inteiramen- interpõe entre um homem e seus objetivos, e os obtém
te de lado o assunto no próximo inverno. Num governo para ele, e certamente não há grande virtude em fazê-lo.
que aprisiona qualquer pessoa injustamente, o verdadei- O dinheiro abafa muitas questões que, de outro modo,
ro lugar de um homem justo é também a prisão. O lugar este homem seria levado a responder, ao mesmo tem-
apropriado, hoje, o único lugar que Massachusetts pro- po em que a única nova questão que lhe propõe é a di-
porciona a seus espíritos mais livres e menos desesperan- fícil, embora supérflua, questão de saber como gastá-lo.
çados, são seus cárceres, nos quais se verão aprisionados Assim, seu fundamento moral lhe é retirado de sob os
e expulsos do Estado, por ação deste, os mesmos homens pés. As oportunidades de viver diminuem na proporção
que já haviam expulsado a si mesmos por seus princípios. em que aumenta o que se chama de “meios”. O melhor
É ali que deverão encontrá-los o escravo foragido, o pri- que um homem pode fazer por sua cultura, quando en-
sioneiro mexicano em liberdade condicional e o índio que riquece, é tentar pôr em prática os planos que concebeu
queiram protestar contra as injustiças sofridas por sua quando pobre. Cristo respondeu aos herodianos de acor-
raça; naquele lugar à parte, embora mais livre e honro- do com sua situação. “Mostrai-me o dinheiro do tributo”,
so, em que o Estado coloca aqueles que não estão com disse, e um deles tirou uma moeda do bolso. Se usais di-
ele, mas contra ele - o único lugar num Estado escravo nheiro com a imagem de César gravada, e que ele tornou
em que um homem livre pode viver-se com honra. Se al- corrente e útil, ou seja, se sois homens do Estado, e de
guém pensa que ali sua influência se perderá, que sua voz bom grado desfrutais as vantagens do governo de César,
não mais atormentará os ouvidos do Estado e que ele não então devolvei a ele um pouco do que lhe pertence quan-
será como um inimigo dentro de suas muralhas, é porque do ele assim o exigir. “Logo, dai a César o que é de César,
não sabe o quanto a verdade é mais poderosa que o erro, e a Deus o que é de Deus”, disse, deixando-os sem saber
nem o quão mais eloqüente e eficazmente pode comba- mais do que antes a respeito de qual era qual, pois não
ter a injustiça aquele que já a tenha experimentado em desejavam sabê-lo.
sua própria carne. Dá o teu voto inteiro, não uma simples
tira de papel, mas toda tua influência. Uma minoria é im- Quando converso com os mais livres dos meus semelhan-
potente enquanto se conforma à maioria, nem chega a tes, percebo que, seja o que for que digam sobre a magni-
ser uma minoria então, mas torna-se irresistível quando tude e seriedade do problema, e sobre sua preocupação
se põe a obstruir com todo o seu peso. Se a alternativa com a tranqüilidade pública, o cerne da questão é que
for a de manter todos os homens justos na prisão ou de- não podem dispensar a proteção do governo existente
sistir da guerra e da escravidão, o Estado não hesitará em e temem as conseqüências que possam advir para suas
sua escolha. Se mil homens se recusassem a pagar seus propriedades e suas famílias da desobediência a ele. De
impostos este ano, esta não seria uma medida violenta e minha parte, não gostaria de pensar que alguma vez te-
sangrenta, como seria a de pagá-los e permitir ao Estado nha confiado na proteção do Estado. No entanto, se nego
cometer violências e derramar sangue inocente. Esta é, a autoridade do Estado quando ele me apresenta a conta
de fato, a definição de uma revolução pacífica, se tal for dos impostos, logo ele irá se apossar de meu patrimônio
possível. Se o coletor de impostos ou qualquer outro fun- e dissipá-lo, molestando-me, assim, interminavelmente,
cionário público perguntar-me, como um deles já o fez, bem como aos meus filhos. Isso é injusto. Isso torna im-
“Mas o que devo fazer?”, minha resposta será: “Se deseja possível a um homem viver honestamente, e ao mesmo
realmente fazer algo, peça demissão”. Quando o súdito tempo confortavelmente, no que diz respeito às circuns-
recusar sua lealdade e o funcionário demitir-se de seu tâncias exteriores. Não valerá a pena acumular proprie-
cargo, então a revolução terá se realizado. Mas suponha- dades, pois com certeza estas seriam novamente con-
mos, até, que deva correr sangue. Já não se derrama uma fiscadas. Deves arrendar ou ocupar terra devoluta num
espécie de sangue quando a consciência é ferida? Através lugar qualquer, plantar não mais que uma pequena safra
deste ferimento esvai-se a verdadeira coragem e imortali- e consumi-la imediatamente. Deves viver contigo e de-
dade de um homem, e ele sangra até a morte. pender só de ti, sempre arrumado e pronto para partir, e
não ter muitos negócios. Um homem pode enriquecer até
Vejo este sangue correndo neste momento. mesmo na Turquia, se for, em todos os aspectos, um bom
súdito do governo turco. Confúcio disse: “Se um Estado
Refleti sobre o aprisionamento do ofensor e não sobre o for governado pelos princípios da razão, a pobreza e a mi-
confisco de seus bens, embora ambos possam servir ao séria serão objeto de vergonha; se um Estado não for go-
mesmo propósito, porque aqueles que afirmam o mais vernado pelos princípios da razão, a riqueza e as honrarias
puro direito, e são, consequentemente, mais perigosos serão objeto de vergonha.” Não: até que eu queira que
para um Estado corrupto, normalmente não passaram a proteção de Massachusetts me seja proporcionada em

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algum distante porto do Sul em que minha liberdade seja quão diligentemente fechavam a porta às minhas medi-
ameaçada, ou até que eu me veja exclusivamente volta- tações, que os perseguiam totalmente desimpedidas,
do para o desenvolvimento de uma propriedade em seu e eles é que eram, na verdade, tudo de perigoso. Como
território, através de um empreendimento pacífico, pos- não podiam alcançar-me, resolveram punir meu corpo;
so permitir-me recusar obediência a Massachusetts e seu como meninos que, não conseguindo atacar alguém que
direito a minha vida e meu patrimônio. Custa-me menos, odeiam, maltratam-lhe o cão. Vi que o Estado era irres-
em todos os sentidos, incorrer na pena de desobediência ponsável, tímido como uma mulher solitária com suas co-
ao Estado do que me custaria obedecer-lhe. Neste caso, lheres de prata, e que não sabia distinguir seus amigos de
eu haveria de me sentir diminuído. seus inimigos, e perdi o resto de respeito que ainda nutria
por ele, e tive pena dele.
Há alguns anos, o Estado veio ao meu encontro, em nome
da Igreja, e mandou-me pagar uma certa quantia em be- Portanto, o Estado nunca enfrenta intencionalmente a
nefício de um padre a cujas pregações meu pai compa- consciência intelectual ou moral de um homem, mas ape-
recia, mas a que eu mesmo jamais comparecera. “Paga”, nas seu corpo, seus sentidos. Não está equipado com in-
disse, “ou serás preso”. Eu me recusei a pagar, mas, infe- teligência ou honestidade superiores, mas com força físi-
lizmente, outro homem houve por bem fazê-lo. Eu não via ca superior. Não nasci para ser forçado a nada. Respirarei
por que o mestre-escola deveria pagar um imposto para a meu próprio modo.
sustentar o padre, e não o contrário, já que eu não era
um mestre-escola do Estado mas me mantinha através de Vejamos quem é o mais forte. Que força tem uma mul-
subscrição voluntária. Não via por que a escola não deve- tidão? Só pode forçar-me aquele que obedece a uma lei
ria apresentar sua conta de impostos e fazer com que o mais alta que a minha. Forçam-me a tornar-me como
Estado atendesse a suas exigências, assim como a Igreja. eles. Não sei de homens que tenham sido forçados a vi-
Contudo, a pedido dos conselheiros municipais, concor- ver desta ou daquela maneira por uma massa de homens.
dei em fazer, por escrito, uma declaração como esta: “Sai- Que espécie de vida seria essa? Quando me deparo com
bam todos, pela presente, que eu, Henry Thoreau, não um governo que diz “Teu dinheiro ou tua vida”, por que
desejo ser considerado membro de nenhuma sociedade deveria apressar-me em dar-lhe meu dinheiro? Ele pode
juridicamente constituída à qual não tenha me associa- estar em grande dificuldade e não saber o que fazer, mas
do”. Entreguei-a ao secretário da câmara municipal, que não posso ajudá-lo nisso. Ele deve ajudar a si mesmo, fa-
a guarda com ele. Desde então, o Estado, tendo tomado zer como eu faço. Não vale a pena lamuriar-se. Não sou
conhecimento de que eu não desejava ser considerado responsável pelo bom funcionamento da maquinaria da
membro daquela igreja, nunca mais me fez tal exigência, sociedade. Não sou o filho do maquinista. Observo que,
embora dissesse que precisava manterse fiel a sua pre- quando uma bolota de carvalho e uma castanha caem
sunção inicial naquela época. Se eu tivesse como especi- lado a lado, uma não se mantém inerte para dar lugar à
ficá-las então, teria identificado minuciosamente todas as outra, mas ambas obedecem às próprias leis, e desenvol-
sociedades às quais não pertencia. Mas não soube onde vem-se e crescem e florescem tão bem quanto podem,
encontrar uma lista completa delas. até que uma delas, talvez, domine e destrua a outra. Se
uma planta não consegue viver de acordo com sua natu-
Não pago imposto individual há seis anos. Por causa disso, reza, ela morre, e assim também um homem.
certa vez, fui colocado na cadeia por uma noite. E, en-
quanto contemplava as sólidas paredes de pedra, com A noite que passei na prisão foi bastante inusitada e inte-
dois ou três pés de espessura, a porta de madeira e ferro, ressante. Quando lá entrei, os prisioneiros, em mangas de
com um pé de espessura, e a grade de ferro que filtrava a camisa, conversavam e aproveitavam o ar da noite perto
luz, não pude deixar de ficar impressionado com a insen- da entrada. Mas o carcereiro disse: “Vamos lá, rapazes,
satez daquela instituição que me tratava como se eu fosse é hora de fechar”, e assim eles debandaram, e pude ou-
um mero amontoado de carne, sangue e ossos, pronto vir o som de seus passos retornando às celas vazias. Meu
para ser aprisionado. companheiro de cela foi-me apresentado pelo carcereiro
como “um camarada de primeira e um homem inteligen-
Estranhei que ela tenha concluído, por fim, que aquele te”. Quando a porta foi fechada, ele me mostrou onde
fosse o melhor uso que poderia fazer de mim e que não pendurar meu chapéu e como lidava com as coisas ali.
tenha pensado em aproveitar-se de meus serviços de al- As celas eram caiadas uma vez por mês, e aquele, pelo
gum modo. Vi que, se havia um muro de pedra entre eu menos, era o aposento mais alvo, o mais simplesmente
e meus concidadãos, havia um outro ainda mais difícil de mobiliado e provavelmente o mais asseado da cidade. Na-
galgar e transpor para que eles pudessem tornar-se tão turalmente, ele quis saber de onde eu vinha e o que me
livres quanto eu. Não me senti aprisionado sequer por levara até ali. E, depois de ter lhe contado, perguntei-lhe
um momento e aqueles muros pareceram-me um enor- igualmente como tinha ido parar ali, presumindo, é cla-
me desperdício de pedra e argamassa. Sentia-me como se ro, que fosse um homem honesto. E, do jeito que anda o
apenas eu, entre todos meus concidadãos, tivesse pago mundo, acredito que o fosse. “Bem”, disse ele, “fui acusa-
o imposto. Eles claramente não sabiam como tratar-me do de incendiar um celeiro, mas não o fiz”. Tanto quanto
mas portavam-se como pessoas maleducadas. Em cada pude constatar, ele provavelmente fora dormir bêbado
ameaça e em cada cumprimento havia um disparate, por num celeiro, fumara ali seu cachimbo e assim incendia-
pensarem que meu maior desejo era estar do outro lado ra o celeiro. Tinha a fama de ser um homem inteligente,
daquele muro de pedra. Eu não podia senão sorrir ao ver estava ali há cerca de três meses esperando que seu jul-

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gamento fosse realizado e ainda teria que esperar outro pudesse ser efetuada pela mera passagem do tempo.
tanto, mas encontrava-se bastante domesticado e satis- Enxerguei ainda mais claramente o Estado em que vi-
feito, já que tinha casa e comida de graça e achava que via. Vi até que ponto podia confiar, como bons vizinhos
era bem tratado. e amigos, nas pessoas entre as quais vivia. Vi que sua
amizade valia apenas para o tempo bom, que eles não
Ele ocupava uma das janelas e eu a outra, e descobri se propunham muito a praticar o bem. Vi que eram de
que, se alguém ficasse ali por muito tempo, sua principal uma raça diferente da minha, tanto quanto os chineses
ocupação seria a de ficar olhando pela janela. Em pouco e os malaios, devido a seus preconceitos e superstições;
tempo eu havia lido todos os panfletos que tinham sido que, em seus sacrifícios pela humanidade, não colocavam
deixados ali, e examinado por onde antigos prisioneiros nada em risco, nem mesmo seu patrimônio; que, afinal
haviam escapado, e onde uma grade havia sido serrada, de contas, não eram assim tão nobres, pois tratavam o
e escutado a história dos vários ocupantes daquela cela, ladrão como este os havia tratado, e esperavam, através
pois descobri que mesmo ali havia histórias e boatos que de certas observâncias exteriores, de umas poucas preces
nunca haviam circulado além dos muros da prisão. Esta e de andarem por um determinado caminho reto, porém
é provavelmente a única casa da cidade em que se com- inútil, de tempos em tempos, salvar suas almas. Isto pode
põem versos que são posteriormente impressos sob for- parecer um julgamento demasiado severo de meus pró-
ma de circular mas não são publicados. Mostraram-me ximos, pois acredito que muitos deles não estejam cons-
uma lista bastante longa de versos compostos por alguns cientes da existência de uma instituição como a cadeia
jovens que haviam sido descobertos numa tentativa de em sua vila.
fuga e que se vingaram cantando-os.
Antigamente era costume em nossa vila, quando um po-
Tirei o máximo que pude de meu companheiro de cela, bre devedor saía da cadeia, seus conhecidos o saudarem
temendo que não voltasse a vê-lo nunca mais, mas ele, olhando-o através dos dedos, que eram cruzados para re-
afinal mostrou-me qual era a minha cama e deixou-me presentar as grades de uma janela de prisão, e dizendo
com a missão de apagar a lamparina. Dormir ali por uma “Como vai?”. Meus conterrâneos não me saudaram desta
noite foi como viajar para um país distante, que eu jamais forma, mas primeiro olharam para mim, depois uns para
esperara conhecer. Pareceu-me que eu nunca antes tinha os outros, como se eu tivesse retornado de uma longa
ouvido a batida do relógio da cidade, nem os sons notur- jornada. Eu tinha sido preso enquanto me dirigia ao sa-
nos da vila, pois dormíamos com as janelas abertas, que pateiro para buscar um sapato que precisara de conser-
eram gradeadas por fora. Era como ver minha vila natal to. Quando saí, na manhã seguinte, tratei de completar
à luz da Idade Média, e nosso Concord transformava-se minha pequena missão e, já calçando meu sapato con-
num riacho como os do Reno, e visões de cavaleiros e cas- sertado, juntei-me à turma do huckleberry, que estava
telos passavam diante de meus olhos. Eram as vozes dos impaciente para ser por mim conduzida e, depois de meia
velhos cidadãos dos burgos que eu ouvia nas ruas. Eu era hora - pois o cavalo fora atrelado em seguida -, encontrá-
um espectador e um ouvinte involuntário de tudo que era vamo-nos no meio de um campo de huckleberry, numa
dito e feito na cozinha da estalagem contígua – uma ex- de nossas colinas mais altas, a duas milhas de distância, e
periência totalmente nova e rara para mim. Era uma visão logo já não podíamos enxergar o Estado em parte alguma.
mais minuciosa de minha cidade natal. Eu estava comple-
tamente dentro dela. Nunca havia enxergado suas insti- Esta é toda a história das “Minhas Prisões”.
tuições antes. Aquela era uma de suas instituições pecu-
liares, pois era um condado. Comecei a compreender com Nunca me recusei a pagar o imposto rodoviário, pois de-
que se ocupavam seus habitantes. sejo tanto ser um bom vizinho quanto um mau súdito. E,
quanto a sustentar as escolas, faço minha parte educando
Pela manhã, nosso desjejum era passado através da vi- hoje meus concidadãos. Não é por nenhum item específi-
gia da porta, em pequenas vasilhas de lata retangulares co da lista de impostos que me recuso a pagá-la. Simples-
que continham meio litro de chocolate, pão preto e uma mente desejo recusar sujeição ao Estado, afastar-me dele
colher de ferro. Quando pediram de volta as vasilhas, mi- e manter-me à parte de modo efetivo. Não me interessa
nha inexperiência me fez devolver o pão que me sobrara, traçar a rota de meu dólar, mesmo que pudesse, até o
mas meu companheiro agarrou-o e disse que eu deveria ponto em que ele compre um homem ou um mosquete
guardá-lo para o almoço ou o jantar. Pouco depois, deixa- para matar um homem - o dólar é inocente -, mas a mim
ram-no sair para trabalhar num campo de feno próximo interessa rastrear os efeitos de minha sujeição. Na verda-
dali, para onde ia todos os dias, e, como estaria de volta de, serenamente declaro guerra ao Estado, a meu modo,
só depois do meio-dia, disse-me adeus, pois duvidava que embora eu ainda possa vir a usá-lo e obter dele as vanta-
fosse me ver outra vez. gens que puder, como é comum nestes casos.

Quando saí da prisão - pois alguém interferiu e pagou Se outros pagam o imposto que me é exigido, por solida-
aquele imposto - não achei que grandes mudanças hou- riedade ao Estado, fazem simplesmente o que já haviam
vessem ocorrido nas coisas comuns, como o faria alguém feito em seus próprios casos, ou, mais exatamente, favo-
que tivesse entrado jovem na prisão e dela saísse já grisa- recem a injustiça numa extensão maior que a exigida pelo
lho e cambaleante. Mesmo assim, aos meus olhos, ocor- Estado. Se pagam o imposto devido a um interesse equi-
rera uma mudança no cenário - na cidade, no estado, no vocado pelo indivíduo taxado, para salvar seu patrimônio
país -, uma mudança maior do que qualquer outra que ou impedir que ele vá para a cadeia, é porque não ava-

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liaram sensatamente até que ponto permitem que seus “Devemos amar nossa pátria como a nossos pais;
sentimentos pessoais interfiram no bem público.
E se em algum momento deixarmos de dedicar-lhe
Esta é, portanto, minha posição atual. Num caso como
esse porém, nunca se pode estar demasiadamente em Nosso amor e nossos cuidados,
guarda, para que nossa ação não seja influenciada pela
obstinação ou por uma indevida consideração pelas opi- Devemos honrar o afeto e ensinar à alma
niões dos homens. Tratemos de fazer apenas aquilo que
nos seja próprio e oportuno. As coisas da consciência e da religião,

Às vezes, penso: ora, essas pessoas são bem-intencio- E não o desejo de poder ou benefício.”
nadas, mas são ignorantes. Agiriam melhor se soubes-
Acredito que o Estado logo será capaz de me tirar das
sem como fazê-lo: por que dar a nossos concidadãos o
mãos todo trabalho desse tipo e então não serei melhor
incômodo de tratar-nos de uma maneira pela qual não
patriota que meus conterrâneos. Analisada de um ponto
se mostram inclinados? Mas penso melhor: isto não é
de vista inferior, a Constituição, com todos os seus defei-
razão para que eu aja como eles ou permita que outros
tos, é muito boa; a lei e os tribunais são muito respeitá-
sofram um incômodo muito maior, de um tipo diferen-
veis; mesmo este Estado e este governo americano são,
te. Digo a mim mesmo, também: quando muitos milhões
sob muitos aspectos bastante raros e admiráveis, como
de homens, sem ódio, sem hostilidade, sem sentimentos
muitos já os descreveram, e podemos ser gratos a eles.
pessoais de qualquer espécie, exigem de ti apenas uns
Porém, analisados de um ponto de vista um pouco mais
poucos xelins, sem a possibilidade, por seu temperamen-
elevado, eles são exatamente aquilo que descrevi, e, vis-
to, de retraírem-se ou de alterarem sua atual demanda,
tos de um lugar ainda mais alto, do topo mesmo, quem
e sem a possibilidade, de tua parte, de apelar para quais-
poderá dizer o que eles são ou que merecem ser aprecia-
quer outros milhões, por que expor-te a esta força bruta
dos e ser objeto de nossos pensamentos?
e esmagadora? Não resistes tão obstinadamente ao frio
e à fome, aos ventos e às ondas; submetes-te serena- Entretanto, o governo não me interessa tanto assim, e
mente a mil necessidades semelhantes. Não colocas tua dedicarei a ele o menor número possível de pensamen-
cabeça no fogo. Mas na exata medida em que considero tos. Não são muitos os momentos em que vivo sob um
que esta não é uma força inteiramente bruta, mas parcial- governo, mesmo neste mundo. Se um homem pudesse
mente humana, e que me relaciono com esses milhões não ter mais pensamentos, fantasias ou imaginação, algo
de homens tanto quanto com outros milhões, e não sim- que jamais poderia lhe acontecer por um tempo muito
plesmente com coisas brutas ou inanimadas, vejo que se longo, então, fatalmente, os governantes ou reformado-
torna possível um apelo, antes de mais nada, deles ao res insensatos não poderiam interrompê-lo.
seu Criador, e, em segundo lugar, deles a eles mesmos.
Porém, se eu colocar deliberadamente minha cabeça no Sei que a maioria dos homens pensa de modo diferen-
fogo, não haverá apelo que possa fazer ao fogo ou ao seu te do meu, mas aqueles que dedicam suas vidas profis-
Criador, e só poderei culpar a mim mesmo. Se eu pudes- sionais ao estudo deste e de outros assuntos afins con-
se convencer-me de que tenho algum direito de estar sa- tentam-me tão pouco quanto os demais. Os estadistas e
tisfeito com os homens tais como são, e de tratá-los de legisladores, situando-se tão completamente dentro da
acordo com isso, e não de acordo, em alguns aspectos, instituição, nunca a contemplam nítida e abertamente.
com minhas exigências e expectativas quanto ao que eles Falam de uma sociedade em movimento, mas fora dela
e eu devamos ser, então, como um bom muçulmano e não têm nenhum lugar onde descansar. Podem ser ho-
fatalista, deveria empenhar-me para me satisfazer com mens de certa experiência e discernimento, e sem dú-
as coisas como elas são, e dizer que esta é a vontade de vida inventaram sistemas engenhosos e mesmo úteis,
Deus. E, acima de tudo, existe uma diferença entre resistir pelos quais sinceramente lhes agradecemos. Mas todo
a isto e a uma força puramente bruta ou natural, que é a seu engenho e utilidade situam-se dentro de limites não
de que posso resistir a isto com algum sucesso, mas não muito amplos. Costumam esquecer que o mundo não é
posso esperar, como Orfeu, mudar a natureza das rochas governado pela sagacidade e pela conveniência. Webster
das árvores e dos animais. nunca chega aos bastidores do governo e, portanto, não
pode falar com autoridade sobre ele. Suas palavras são
Não desejo brigar com nenhum homem ou nação. Não a própria sabedoria para aqueles legisladores que não
quero entrar em minúcias desnecessárias, nem fazer dis- consideram fazer nenhuma reforma essencial no governo
tinções sutis, nem pretendo parecer melhor do que meus existente. Mas para aqueles que pensam, e para os que
semelhantes. Ao contrário, posso dizer que até mesmo legislam para todos os tempos, ele não chega sequer a
procuro uma desculpa para conformar-me com as leis vislumbrar o assunto. Sei de alguns cujas serenas e sábias
da terra. Estou mesmo pronto a conformar-me com elas. especulações a respeito deste tema logo colocariam em
Na verdade, tenho razões para suspeitar de mim mesmo evidência os limites da amplitude e da receptividade da
quanto a este assunto. E todo ano, quando reaparece o mente de Webster. Mesmo assim, comparadas com as
coletor de impostos, vejo-me disposto a rever os atos e manifestações ordinárias da maioria dos reformadores,
a posição do governo geral e do Estado, e o espírito do e com a sabedoria e a eloqüência ainda mais ordinárias
povo, para descobrir um pretexto para a conformidade. dos políticos em geral, suas palavras são quase as únicas
palavras sensatas e válidas, e agradecemos aos Céus por

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ele. Comparativamente, ele é sempre forte, original e, so- que ocupam entre as nações. Há mil e oitocentos anos,
bretudo, prático. No entanto, sua virtude é a prudência, embora eu talvez não tenha o direito de dizêlo, o Novo
não a sabedoria. A verdade do advogado não é Verdade, Testamento foi escrito. E, no entanto, onde está o legis-
mas coerência, ou uma conveniência coerente. A Verda- lador com sabedoria e talento prático bastante para tirar
de está sempre em harmonia consigo própria e não se proveito da luz que ele lança sobre a ciência da legisla-
preocupa primordialmente em exibir a justiça que possa ção? A autoridade do governo, mesmo aquela a que es-
condizer com o mal. Webster bem merece ser chamado, tou disposto a me submeter – pois obedecerei com prazer
como realmente o foi, de Defensor da Constituição. Não àqueles que saibam e possam fazer melhor do que eu, e,
há, realmente, outros golpes que ele possa desferir se- em muitas coisas, mesmo àqueles que não saibam nem
não os defensivos. Ele não é um líder, mas um seguidor possam fazer tão bem -, é ainda uma autoridade impu-
Seus lideres são os homens de 8716. «Nunca fiz qualquer ra: para ser rigorosamente justa, ela deve ter a sanção e
esforço», diz, «nem me proponho a fazê-lo; nunca apoiei o consentimento dos governados. Não pode ter nenhum
qualquer esforço, e nem pretendo fazê-lo um dia, no sen- direito puro sobre minha pessoa e meu patrimônio, ape-
tido de perturbar o acordo originalmente feito pelo qual nas aquele que concedo. O progresso de uma monarquia
os vários Estados constituíram a União.» Contudo, pen- absoluta para uma monarquia limitada e desta para uma
sando na sanção que a Constituição concede à escravi- democracia é um progresso no sentido de um verdadeiro
dão, ele diz: «Deixemo-la permanecer, já que fazia parte respeito pelo indivíduo. Mesmo o filósofo chinês foi sábio
do arranjo original». A despeito de sua notável agudeza bastante para ver no indivíduo a base do império. Será a
e capacidade, ele é incapaz de isolar um fato de suas re- democracia, tal como a conhecemos, o último desenvolvi-
lações meramente políticas e contemplá-lo em termos mento possível em matéria de governo? Não será possível
absolutos, como convém ao intelecto considerá-lo - por dar um passo mais além no sentido do reconhecimento
exemplo, o que cabe a um homem fazer hoje, na América, e da organização dos direitos do homem? Jamais haverá
com relação à escravidão. Aventura-se, porém, ou é leva- um Estado realmente livre e esclarecido até que este ve-
do a fazer declarações desesperadas como as seguintes, nha a reconhecer o indivíduo como um poder mais alto e
embora reconheça estar falando em termos absolutos e independente, do qual deriva todo seu próprio poder e
como particular - que novo e singular código de deveres autoridade, e o trate da maneira adequada. Agrada-me
sociais pode ser inferido disto? «A maneira pela qual», imaginar um Estado que, afinal, possa permitir-se ser
afirma, «os governos dos Estados onde existe a escravi- justo com todos os homens e tratar o indivíduo com res-
dão deverão regulamentá-la será a de levar em conside- peito, como um seu semelhante; que consiga até mesmo
ração as leis gerais da propriedade, humanidade e justiça, não achar incompatível com sua própria paz o fato de uns
além de seu temor a Deus, por força da responsabilidade poucos viverem à parte dele, sem intrometer-se com ele,
perante seus constituintes. Associações formadas alhu- sem serem abarcados por ele, e que cumpram todos os
res, nascidas de um sentimento humanitário ou de qual- seus deveres como homens e cidadãos. Um Estado que
quer outra causa, não têm absolutamente nada a ver com produzisse este tipo de fruto, e que o deixasse cair assim
ela. Jamais receberam qualquer encorajamento de minha que estivesse maduro, prepararia o caminho para um Es-
parte e jamais o receberão.» tado ainda mais perfeito e glorioso, que também imagi-
nei, mas que ainda não avistei em parte alguma.
Aqueles que não conhecem fontes mais puras de verda-
de, que não seguiram seu curso até mais alto, apoiam-se, Gênero e/ou Estrutura
sabiamente, na Bíblia e na Constituição, e bebem-na ali
com reverência e humildade; mas aqueles que contem- O gênero desta obra é o ensaio. O ensaio é
plam o lugar de onde ela verte para este lago ou aquela um texto no padrão formal opinativo em que se expõe
lagoa, arregaçam as mangas mais uma vez e continuam ideias, críticas, reflexões e impressões pessoais, realizan-
sua peregrinação até suas nascentes. do uma avaliação sobre determinado tema. A principal
característica do gênero textual ensaio é uma linguagem
Nenhum homem com gênio para legislar apareceu na
simples, concisa, subjetiva, argumentativa, original, cria-
América. Eles são raros até na história do mundo. Exis-
tem oradores, políticos e homens eloqüentes aos milha-
tiva e problematizadora.
res, mas ainda não abriu a boca para falar aquele inter-
Diferente dos textos narrativos e descritivos, o
locutor capaz de resolver as questões mais discutidas
ensaio pressupõe interpretação e análise mais profunda
do momento. Amamos a eloqüência pela eloqüência
e não por qualquer verdade que possa exprimir ou por
sobre um tema. Assim, o ensaio é um gênero discursivo
qualquer heroísmo que possa inspirar. Nossos legislado- argumentativo e expositivo que implica o ato de ensaiar.
res ainda não aprenderam o valor comparativo que têm Ou seja, ele apresenta tentativas de reflexão crítica e
o livre comércio e a liberdade, a união e a retidão, para subjetiva (ponto de vista pessoal) num fluxo natural de
uma nação. Não têm gênio ou talento para as questões ideias.
relativamente modestas de tributação e finanças, comér-
cio, manufaturas e agricultura. Se nos deixássemos guiar Os ensaios são textos breves não sistematizados
exclusivamente pela palavrosa sabedoria dos legisladores que não possuem um estilo definido. Dependendo do
do Congresso, sem que esta fosse corrigida pela oportuna objetivo do ensaio, deve seguir algumas formalidades,
experiência e pelas efetivas reclamações do povo, os Es- no entanto, o que não se abre mão é que deve conter
tados Unidos não sustentariam por muito tempo o lugar clareza de ideias e ainda seguir a normas padrões da lín-
gua.

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Questões, Justificativas e Dicas


Citações da Obra na Matriz de Referências
O ser humano como um ser que pergunta e quer saber

O debate sobre autonomia e liberdade conta com


um marco a partir da obra A desobediência Civil. Henry
Quer acessar as questões, justificativas e dicas desta obra?

Clique aqui ou use o QR CODE da página 6.

Anotações e Rascunhos

David Thoreau trata do ideal americano do viver para o


trabalho e para o consumo. Após ter sido preso por ques-
tionar o pagamento de impostos para o financiamento da
guerra dos Estados Unidos contra o México, escreveu o
ensaio questionando se a obediência às leis e as normas,
nesse contexto, não seria compactuar com as guerras re-
correntes e com o sistema escravocrata que ainda existia
no país. Thoreau defendia que o dever com sua consciên-
cia estaria acima do dever de um cidadão com o Estado.
(Página 3, quarto parágrafo)

Indivíduo, cultura e mudança social

Nesta etapa, cabe questionar mais profundamen-


te sobre a relação do indivíduo e sua cultura no processo
de mudança social, assim como sobre as possibilidades
das identidades construídas gerarem mudança social. Os
contos Pai contra a mãe, A cartomante, A igreja do Diabo
e O enfermeiro (Machado de Assis) assim como o roman-
ce O Bom-Crioulo (Adolfo Caminha) ilustram a partir da
literatura algumas dessas questões. Em Desobediência
Civil, Henry David Thoreau divulga suas ideias políticas
vinculadas às liberdades individuais e ao direito à resis-
tência, relacionando-as aos Direitos Humanos. (Página 7,
segundo parágrafo)

A formação do mundo ocidental contemporâneo

São notórias as influências do Iluminismo nos


movimentos de emancipação política na América Latina,
particularmente no Brasil, assim como o advento de novos
referenciais ideológicos presentes nos movimentos sociais
europeus do século XIX e suas influências para as demais
regiões do mundo. Obras como O Juramentos do Horácios
(Jacques-Louis David,1784) e Desobediência civil (Henry
David Thoreau, 1849) exemplificam aspectos desses no-
vos pensamentos e mentalidades difundidos no período.
(Página 21, primeiro parágrafo)

Número, grandeza e forma

Se a linguagem científica cria modelos para expli-


car a realidade, Henry David Thoreau no texto A Desobe-
diência Civil contesta os modelos de governo criados pela
sociedade. Os parâmetros de modelagem de Thoreau di-
ferem da maioria e o levaram a um pensamento crítico ao
governo estabelecido em sua época. (Página 24, quarto
parágrafo)

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Resposta à Pergunta: O Que é
Esclarecimento? - Immanuel Kant

Contextualização
Qual a influência da filosofia de Immanuel Kant A ideia de dar à Filosofia um novo lugar entre
desde sua origem até hoje? Essa talvez seja a pergunta as ciências, surge da necessidade de superar a própria
que introduz e situa o filósofo alemão no desenvolvi- compreensão de mundo. Pois, vendo o progresso das
mento do pensamento e da ciência no mundo. Inicial- ciências naturais modernas (Galilei e Newton) e o de-
mente, para uma introdução, é necessário se submeter a senvolvimento da Lógica e da Matemática, parece-lhe
alguns questionamentos como: o que é a filosofia kantia- inaceitável que a Primeira Filosofia (Metafísica) se dete-
na e o que a caracteriza? Para isso, adotamos a perspec- nha ainda com as questões de Deus, de Liberdade e de
tiva do autor Otfried Höffe no livro “Immanuel Kant”, de imortalidade. Para isso então, deixando para trás a ob-
que uma introdução pretende mais “(...) apontar para o soleta concepção filosófica, inicia sua investigação com
alto nível de reflexão, a diferenciação conceitual e a con- uma pergunta à Primeira Filosofia, se ela pode ser ciên-
siderável consistência (...)” que expor de forma porme- cia. Isto porque, antes de se deter com o mundo natural
norizada as dificuldades de uma teoria. (HÖFFE, 2005, e social, “(...) a filosofia tem a tarefa de examinar a sua
p.XXIII). própria possibilidade” (HÖFFE, 2005, pp.XVIII, XX). Este,
portanto, é o início da sua teoria da filosofia ou teoria de
Segundo Höffe, “Kant é um dos maiores pensa- uma metafísica científica. (Idem, XVIII)
dores do Ocidente (...)” (HÖFFE, 2005, p.XVII). O mesmo
se diz de Galilei e Newton, representantes excepcionais Este novo campo do conhecimento e da ciên-
de sua área, mas que, posteriormente, a concepção de cia, introduz um novo elemento para a compreensão da
Física foi superada pela teoria da relatividade e a teoria capacidade da razão e a possibilidade de um “filosofar
quântica. Então, o mesmo poderíamos dizer de Kant? científico autônomo”, sem desconsiderar a necessidade
(Ibidem) do limite neste último. Esse novo elemento é o da “ra-
dicalidade”, que segundo Kant, só é possível através de
A época do iluminismo europeu tem um contex- um “novo e mais profundo modo de pensar”, que é a
to cujos ideais tornaram-se frágeis, são eles “(...) o ho- “crítica transcendental da razão” (HÖFFE, 2005, pp.XX).
mem pode dominar todas as coisas, a fé no progresso Para ficar mais claro, a “crítica transcendental da razão”
constante da humanidade e (...) a confiança otimista da se refere à maneira como devemos compreender o pro-
razão”. Contudo, isso não significa que perdeu-se algum cesso de uma “filosofia científica autônoma”. A questão
valor das suas ideias, pois, os conceitos de “liberdade”, de ser ciência ou não, “(...) não pode ser resolvida de
“crítica” e “maioridade” permaneceram presentes para modo abstrato, mas somente por uma investigação de
além dos séculos XVII e XVIII. (HÖFFE, 2005, pp.XVII e problemas objetivos centrais” (ibidem). Visto que, isso
XVIII) [filosofia científica autônoma] pressupõe a existência de
elementos que são válidos independentemente de toda
A filosofia de Kant, além do auge intelectual, empiria, dentro de um escopo do conhecer e o agir hu-
representa uma transformação na compreensão do ilu- manos (Direito, História e Religião).
minismo europeu, no sentido de que suas ideias perma-
necem equidistantes tanto de uma atitude de rejeição A ideia, portanto, é a possibilidade de conhecer
quanto de ingenuidade ao iluminismo da “razão humana tais fenômenos filosoficamente e não ficar dependente
universal”. do processo empírico. Nesse sentido, a independência
de diversos campos de conhecimento da experiência
Isto é, para ele, o princípio universal da razão, empírica, indica “(...) a possibilidade, [não ignorando as
que não deveria ser rejeitado, mas elevado a um novo limitações sensoriais do ser humano] a universalidade e
tipo de compreensão que é o da “(…) crítica de toda filo- a necessidade do verdadeiro saber, do agir moral (...)”
sofia dogmática e na descoberta do fundamento último (HÖFFE, 2005, pp.XXI).
da razão (…)” (HÖFFE, 2005, pp.XXVIII).Em outras pala-
vras, os princípios de autonomia e liberdade serviriam Colocado isso, apesar desse processo não se
para a própria auto legislação, ou seja, a ação de fazer submeter à experiência empírica, é necessário o uso de
leis ou regular-se a si mesmo. Juntamente com isso, Kant um método de forma a sistematizar o conhecimento.
também faz críticas à noção do “otimismo ilimitado”, ou Para isso, o método é justamente a “crítica transcenden-
seja, a ideia de que não há barreiras para o desenvolvi- tal da razão”. O meio pelo qual é possível uma análise, é
mento da “razão humana universal ”. O que ele desen- por meio da descoberta de elementos não empíricos e
volve, portanto, é justamente a compreensão não só das a crítica da razão. E aqui se acha a importância de Kant
origens, mas também dos limites da razão pura, “(...) como representante de uma revolução no modo tradi-
tanto da teórica quanto da prática. ” (Ibidem) cional do pensar. A influência de sua filosofia se acha na

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teoria do conhecimento e do objeto, da ética, da filosofia possível perceber que Kant “(...) era sociável e até galan-
da história, da religião e da arte. Nas palavras do autor: te no seu estilo de vida” (HÖFFE, 2005, p.3).
“Se pensarmos em conhecimentos a priori e a posteriori, em “Immanuel Kant nasceu no dia 22 de abril de
juízos sintéticos e analíticos, argumentos transcendentais, 1724 como o quarto de nove filhos de um modesto se-
ideias regulativas e constitutivas, no imperativo categórico leiro nos subúrbios de Königsberg e foi batizado no dia
ou na autonomia da vontade – o número de conceitos e pro-
seguinte com o nome de Emanuel (“... Deus conosco”)
blemas de discussão atual que têm origem em Kant é sur-
preendentemente grande. ” (HÖFFE, 2005, pp.XXI, XXII) ” (HÖFFE, 2005, p.3, 4). Sua cidade natal era resultado
da unificação de três cidades (Altstadt, Löbenicht, Knei-
Em suma, Immanuel Kant não é só um dos clás- phof), além de capital econômica da Prússia Oriental.
sicos da filosofia, mas um eminente interlocutor e re- Até os dezesseis anos, frequentou duas escolas, a do
presentante de conceitos-chave até hoje presentes e hospital de Vorstadt (1730-32) e a Friedrichs-Kollegium
com elevado valor como, por exemplo, crítica, razão e (1732-40) – essa era uma das melhores escolas da Ale-
liberdade. Contudo, é preciso acrescentar que, por outro manha na época. Devido a situação pobre da sua família,
lado, Kant também ganhou críticas cada vez mais con- dependeu muito do apoio dos amigos e do professor de
temporâneas. Nesse sentido, importantes tendências da teologia Franz Albert Schultz (1692-1763), também dire-
filosofia, da ciência e da política diferem da representati- tor do colégio e discípulo de Christian Wolff (1697-1754).
vidade da filosofia kantiana. No sentido de que Kant “(...)
não é um antecessor das ciências naturais, humanas e Kant saiu desse colégio no outono de 1740 como
sociais contemporâneas, nem fundador da atual filosofia segundo da turma, tendo passado pela rígida disciplina
da ciência (...) [nem] promotor da transição dos Estados do estatuto religioso, que lhe confere habilidades em lín-
democráticos de direito para Estados sociais” (HÖFFE, guas, instrução religiosa, matemática e ciências naturais.
2005, pp.XXII). Deste modo, abre-se espaço para uma Sua família tinha sido influenciada pelo pietismo, um
perspectiva particular acerca da filosofia de Kant, ado- movimento religioso surgido no século XVII, que pregava
tada pelo autor Otfried Höffe e colocada aqui. A de que, a renovação de uma vida piedosa. A principal referência
há duas visões possíveis da importância de Kant, a histó- para ele era sua própria mãe, a quem tinha elevada ad-
ria do seu desenvolvimento filosófico e a história de sua miração. (Ibidem, p.6)
influência, tendo como base, a referência dos “escritos
Aos 16 anos, passou no exame de ingresso, ma-
principais”, pois neles se encontram tanto os questiona-
triculou-se na Albertina, universidade de Königsberg.
mentos quanto as soluções ou respostas às inquietações
Lá se dedicou aos estudos de matemática e ciências
da filosofia. Portanto, o objetivo desta introdução é o de
da natureza, teologia, filosofia e letras clássicas latinas,
mostrar os aspectos que caracterizam o pensamento de
contando também com a forte influência de seu profes-
Kant, a fim de que se incorpore possibilidades de debate
sor de lógica e metafísica, Martin Knutzen (1713-1751),
dessa filosofia a outras obras que se atentem mais para
sobretudo para o interesse na física de Isaac Newton
uma crítica sistemática a Kant. Nas palavras do autor, o
(1643-1725). (Ibidem)
objetivo é “(...) interpretá-lo de modo dinâmico e favorá-
vel”. (HÖFFE, 2005, p.XXIII e XXIV) Umas das fases de sua vida compreende a do
início como professor particular e seus primeiros escri-
Autor tos. Essa fase, se inicia com a morte de seu pai (1746) e
quando Kant sai da universidade, até o início de 1755,
“Kant era de um caráter extraordinariamente
passando a ganhar sua vida como professor particular
reservado” (HÖFFE, 2005, p.1). Sua vida não apresenta
(preceptor) em três casas (do pregador Andersch, do
grandes revelações ou momentos de elevado prestígio e
latifundiário Major von Hülsen e do conde Keyserling).
curiosidade como a de outros filósofos. Empreendimen-
Este período é de grande importância para o seu desen-
tos políticos, histórias amorosas e estilos requintados
volvimento intelectual, pois a proximidade com um esti-
passaram longe dos registros que se tem da sua vida.
lo elegante de vida social obriga-o a ampliar seu conheci-
Sua obra, no entanto, expressa elevada singularidade do
mento filosófico e das ciências naturais. No seu primeiro
seu pensamento e, com isso, uma particular história do
escrito Gedanken Von der Wahren Schätzung der Leben-
seu filosofar. Além de que, evidencia-o como o primeiro
dizen Kräfte (Pensamentos sobre a verdadeira avaliação
filósofo entre os modernos que “(...) ganha seu sustento
das forças vivas – de 1746, mas publicado em 1749),
através do exercício profissional da docência na discipli-
Kant toma contato com as questões ainda sem respostas
na” (HÖFFE, 2005, p.2). Os registros que se tem da vida,
da geometria (“... cálculo da força (F) a partir da massa
da personalidade e do desenvolvimento filosófico, são as
(m) e velocidade (v) .... (F=m⋅v2)”) (HÖFFE, 2005, p.6, 7).
correspondências (cartas) dos tratados escritos de Kant
A partir daí desenvolve seu primeiro questionamento
a partir de 1770, quando já tinha 46 anos. Além de se
acerca da possibilidade de uma razão humana universal,
saber sobre a “(...) evolução acadêmica, as relações com
pois observa que “(...) os mais importantes cientistas de
amigos, parentes, colegas e estudantes (...) [e] de seu
sua época não conseguiram chegar a um acordo sobre
relacionamento com célebres personagens contemporâ-
um problema tão preciso” (ibidem).
neos, com correntes e acontecimentos culturais (...)” é

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Outra fase também particular da sua vida é a de defende que “(...) o principal objetivo do esclarecimento,
“professor bem-sucedido” e “mestre elegante”. Dando segundo Kant, é o estabelecimento de um modo de pen-
início à sua atividade docente no outono de 1755 de 16 sar autônomo em sentido moral. ” (Ibidem).
horas semanais e depois de 20 horas, passa um período
de 6 anos, ou seja, até 1761, sem nenhuma publicação. O escrito de Kant foi publicado em um jornal,
Só em 1770, na idade de 46 anos, e depois de ter ten- cujo público alvo eram as pessoas letradas em geral. As-
tado várias cátedras, que conseguiu a cátedra de lógica sim, percebe-se que o estilo literário deste em relação as
e metafísica. Suas aulas, de elevado conhecimento dos outras obras se aproxima mais do publicitário que aca-
principais campos da ciência, são vistas com grande dêmico. Entretanto, a ideia de esclarecimento é deveras
entusiasmo e interesse pelos alunos, devido a sua alta relacionada com suas outras obras. (KLEIN, 2009, p.212)
capacidade de estimular a reflexão. Juntamente com
sua atividade docente, as atividades da vida social têm O uso do termo “esclarecimento” diz respeito a
grande impacto na sua jornada intelectual. Nas horas dois contextos distintos, mas não isolados um do outro.
que passava junto com seus amigos (almoços, jogos de No contexto subjetivo, Kant se refere ao indivíduo, já no
bilhar e cartas, teatro e salões da cidade), destacava-se contexto objetivo, à época histórica, isto é, por um lado
todo tempo “na sua qualidade de debatedor brilhante ele aborda o significado do esclarecimento, por outro,
(...) tendo se tornado um hóspede muito apreciado”. o “espírito do esclarecimento”. Tomado isso, a relação
(HÖFFE, 2005, p.10-12) ou o contato entre os dois contextos se dá com o “uso
público da razão”, no sentido de conectar as percepções
“Passado os anos” e já em 1803, desgastado das esferas privada e pública ou individual e comunitá-
com suas decepções do progresso do seu trabalho, as- ria. Sendo assim, Kant caracteriza esclarecimento como
sim como, com suas próprias forças físicas e intelectuais, a disponibilidade de fazer uso do próprio entendimento.
“(...) cai gravemente enfermo pela primeira vez em sua Daí cabe perguntar o que significa fazer uso do próprio
vida [no dia 8 de outubro], e quatro meses depois, em 12 entendimento e o que ele entende por entendimento,
de fevereiro de 1804, às 11 horas da manhã de domingo, ou seja, se isso corresponde apenas ao uso teórico ou
a morte põe fim à sua vida frágil” (HÖFFE, 2005, p.29). também prático da razão. (Ibidem)
No dia 28 de fevereiro, é levado pela sua cidade natal em
cortejo fúnebre e ao som de todos os sinos da cidade, à Fazer um uso livre da razão é “(...) raciocinar e
igreja catedral e universitária, acompanhado por milha- refletir apenas segundo as regras que a própria razão
res de pessoas. Por fim, Acima do seu túmulo é colocada humana oferece (...)” (KLEIN, 2009, p.213) e, portanto,
mais tarde uma placa comemorativa com a famosa frase não significa o pensar sem regras. Na passagem “Se eu
da Crítica da razão prática (V 161): tiver um livro que tem entendimento por mim, um dire-
tor espiritual que tem em minha voz consciência moral,
“Duas coisas enchem o ânimo de admiração e veneração um médico que por mim decide a dieta, etc., então não
sempre novas e crescentes quanto mais frequente e mais preciso de eu próprio me esforçar. ” (Ibidem), deixa claro
persistentemente delas se ocupa a reflexão: o céu estrelado os limites da não submissão à autoridade de um pen-
sobre mim e a lei moral em mim’”. (HÖFFE, 2005, p.29, 30) samento, mas, por outro lado, a não rejeição completa
também. Desta forma, o método crítico da razão de Kant
Obra diz que “(...) se por um lado, esclarecer-se, implica a re-
cusa de uma forma de pensar baseada em argumentos
A análise da obra tomou como base o artigo de de autoridade, por outro lado, esclarecer-se não conduz
Joel Thiago Klein, intitulado “A Resposta Kantiana à Per- o indivíduo a uma espécie de “egoísmo lógico”, o qual
gunta: o que é o esclarecimento? ”, em que a pergunta traria consigo o relativismo e o ceticismo. ” (Ibidem).
central deriva da caracterização do termo “esclareci-
mento”, sob o lema “separe aude”, que é: o que significa Nesse sentido, Kant fala na possibilidade de um
pensar em si mesmo? Para responder a isso, além de se equilíbrio no seu método crítico, em que a dúvida cética
compreender a perspectiva kantiana na filosofia críti- serviria como princípio metodológico e a precisão dog-
co-transcendental, é necessário também observar três mática como o estabelecimento. Para ele, há na verdade
aspectos importantes sobre “esclarecimento”. Primeiro, um descrédito de acontecer uma revolução, pois ela não
a ambivalência do termo, isto é, a possibilidade de se levaria a “(...) uma verdadeira reforma do modo de pen-
pensar no sentido de dois valores. Segundo, a contrapo- sar (...)” servindo-se sempre de conceitos antigos. Então,
sição do método sobre a noção de “conteúdo do pensa- esclarecimento não se refere diretamente ao conteúdo
mento”; e aqui a ideia é que “(...) o esclarecimento exige de algo, mas do modo como se chega a ele. Portanto,
um determinado modo de pensar (Denkungsart), que se esclarecer-se seria tanto “(...) a tomada de uma deter-
caracteriza pela disposição de se fazer um uso público da minada posição, de uma postura frente as suas próprias
razão, ou seja, a disponibilidade pública de pedir e ofere- crenças. ” quanto “(...) uma atitude ativa e crítica por
cer razões para justificar determinada posição. ” (KLEIN, parte do sujeito.” (KLEIN, 2009, p.214), ou seja, se im-
2009, p.211). E por último, qual a relação entre “fazer portar com a avaliação de determinado conteúdo e não
uso de teu próprio entendimento” e os seus dois campos em apenas acatá-lo a partir da autoridade de outrem.
de atuação, o teórico e o prático. Nesse sentido, o autor (Ibidem).

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Voltemos agora ao que Kant diz sobre o uso pú- nismo é a época em que se começa a defender o direito
blico ou privado da razão. O primeiro se refere àquele de fazer um uso público da razão – no caso da época, da
que “(...) qualquer um, enquanto erudito, dela faz peran- razão republicana. (KLEIN, 2009, p.221)
te o grande público do mundo letrado (...)”. Já o segundo,
àquele que “(...) pode fazer da sua razão num certo cargo Por último, entendemos agora o porquê disto:
ou função a ele confiado. ” (KLEIN, 2009, p.215). Kant “vivemos nós agora numa época esclarecida? Não. Vive-
vê o uso público da razão como condição para estimular mos numa época de esclarecimento”. Para Kant esclare-
o esclarecimento, uma vez que, o uso privado pode ser cer-se é mais uma tarefa que um resultado. Visto que, o
restringido sem afetar o esclarecimento, seja dos indi- próprio termo “aufklären” + a partícula “ung” resulta em
víduos ou da sociedade. Isto porque, no uso público da “Aufklärung”, que significa um processo, um movimen-
razão supõe-se que exista, num determinado contexto, to. Nesse sentido, a humanidade ou os indivíduos jamais
“(...) uma comunidade de iguais em que os diálogos se- poderiam dizer que estão completamente esclarecidos,
jam mediados através da argumentação racional. ” Além dado que o esclarecimento envolve “(…) o uso público
de que, para isso, só poderia participar dessa comunida- da razão que ao mesmo tempo garanta a possibilidade
de indivíduos eruditos em tal questão, a fim de se evitar e a promoção do esclarecimento moral dos indivíduos. ”
“(...) uma mera exposição de opiniões irrefletidas e sem (KLEIN, 2009, p.222)
sentido. ” (Ibidem). Sendo assim, esclarece-se porque o


uso público da razão constitui a intersecção entre o es-
clarecimento individual e o esclarecimento coletivo e,
por conseguinte, de uma época. (Ibidem)
Citações da Obra na Matriz de Referências
Ainda sobre esclarecimento, no sentido de pen-
O ser humano como um ser que pergunta e quer saber
sar criticamente, é preciso compreender a diferenciação
entre conhecimentos a partir de dados e conhecimentos O filósofo alemão, Immanuel Kant, preocupado
a partir de princípios. O primeiro se refere a conhecimen- com o uso da razão, escreveu, em 1784, o texto Resposta
tos empíricos obtidos por meio da experiência própria à pergunta: o que é o esclarecimento?, a partir do qual
ou alheia, já o segundo diz respeito ao conhecimento pensa e problematiza seu próprio tempo e apresenta
que se origina da razão. Contudo, é preciso acrescentar orientações para o uso da razão com o objetivo de eman-
que pode acontecer de um conhecimento da razão ser cipar os seres humanos de uma condição de minoridade.
adquirido por uma forma histórica e não meramente ra- (Página 3, segundo parágrafo)
cional como, por exemplo, um letrado que aprende os
produtos da razão alheia. (KLEIN, 2009, pp.216-217) Ambiente e vida

Mediante isso, pergunta-se “(...) em que contex- Ao longo da história da humanidade temos ob-
tos se coloca como necessário fazer um uso público da servado que a biodiversidade é constantemente negli-
razão (...) e em quais âmbitos o esclarecimento se faz genciada em benefício do capital, como exposto por Beto
necessário para todo indivíduo? ” (KLEIN, 2009, p.218). Guedes em O Sal da Terra. O texto O rompimento da bar-
Para Kant, o uso público da razão se faz necessário em ragem de Mariana e seus impactos socioambientais (Lu-
tantos contextos que for necessário, a exemplo, o caso ciano M. N. Lopes) e o vídeo Conservar a Amazônia, uma
do juiz. Para ele é necessário compreender tanto o con- questão ambiental, social e econômica mostram como as
texto do caso quanto o espírito que está por detrás da ações humanas impactam o meio ambiente e podem cau-
lei. Então, não basta apenas o uso mecânico da lei, mas sar a destruição de espaços e prejudicar espécies, eviden-
é imprescindível que haja um nível de interpretação da ciando a necessidade de repensar o uso desses ambientes.
mesma. (Ibidem) Kant, no texto Resposta à pergunta: o que é o esclareci-
mento? sugere que ao fazer uso da razão o homem exer-
O esclarecimento não se restringe apenas a um ce sua autonomia, condição que o torna responsável pela
processo sobre a razão teórica. Junto ao termo “Vers- manutenção das demais formas de vidas assegurando o
tand” (tem coragem de te servires do teu próprio en- equilíbrio ambiental. (Página 17, quarto parágrafo)
tendimento) é preciso compreender também o termo
“sapere unde”. “Na caracterização de ‘sapere unde’ o A formação do mundo ocidental contemporâneo
termo “Verstand” é susbtituído por “Vernunft”. Isso quer
dizer que o esclarecimento envolve tanto um uso teórico Foi a partir do Iluminismo, considerado a base in-
como um uso prático. Em suma, esse é um trabalho ra- telectual da Era das Revoluções, que ocorreram as ruptu-
cional, isto é, de dentro para fora “(...) onde a ação deve ras mais drásticas e profundas em relação ao Antigo Regi-
ser gradativamente cada vez mais governada pelos prin- me. Dentre os pensadores iluministas e as diversas obras
cípios da razão prática pura. ” (KLEIN, 2009, p.220) elaboradas por eles, vale destacar Resposta à pergunta:
O Que é o Esclarecimento? (Immanuel Kant,1783) e seu
À luz do contexto das luzes, esclarecimento apa- grande potencial crítico, como uma obra representativa
rece como uma tentativa de emancipar os indivíduos em das profundas transformações ocorridas nesse período.
relação aos governadores. Em outras palavras, o ilumi- Na entrevista Edgar Dutra Zanotto: Um olho na ciência,

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outro na indústria, concedida à Revista Pesquisa-FAPESP,


edição 269, julho de 2018, o entrevistado aborda aspectos
pertinentes ao desenvolvimento do cientificismo, influen-
ciado pelos pensadores iluministas. (Pagina 20, quarto
parágrafo)

Número, grandeza e forma

A perspectiva apresentada por Immanuel Kant


no texto Resposta à pergunta: o que é o esclarecimento?
propõe ultrapassar limitações vinculadas às orientações
empiristas e racionalistas, num esforço de síntese entre
essas escolas filosóficas. (Página 24, terceiro parágrafo)

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Museu Nacional - BBC

Autoria e Contextualização
A obra jornalística “Museu Nacional: Em 10 Como se trata de uma obra relativamente pe-
anos, fogo dízima ao menos 8 prédios com tesouros cul- quena, será transcrita na íntegra, em razão de não haver
turais e científicos do país” não se trata de um livro, mas muitas análises a serem feitas de uma obra que já é uma
de uma reportagem feita a partir de uma tragédia com o análise por natureza.
Museu Nacional do Rio de Janeiro que levantou impor-
tantes discussões sobre o quanto o país tem descuidado Obra
dos seus acervos históricos, culturais e, acima de tudo,
científicos. Dessa forma, não há como destacar um autor Museu Nacional: Em 10 anos, fogo dizima ao menos 8
apenas, mas cabe mencionar que a obra foi elaborada e prédios com tesouros culturais e científicos do país
publicada pela equipe de redação da rede de televisão
BBC em 03 de setembro de 2018 e que a sua repercussão Nos últimos anos, o Brasil assistiu a pelo menos
foi imensa. 8 grandes incêndios que consumiram prédios que guarda-
vam acervo com valor artístico, histórico e científico.
Ao longo dos mais de 7 mil caracteres de repor-
tagem, os redatores da BBC tiveram a intenção de fazer Neste domingo, o país perdeu parte da sua his-
um levantamento, nos últimos 10 anos, de quantos pré- tória guardada no Museu Nacional, no Rio de Janeiro.
dios com tesouros culturais e científicos no país foram Os bombeiros levaram seis horas para conter as chamas
destruídos pelo fogo a partir de incêndios, e a maioria no mais antigo museu do Brasil, que tinha 20 milhões de
sem explicações objetivas. O resultado do levantamento itens e apresentava problemas de manutenção.
é claro: o poder público, em todas as suas esferas, não dá
Em julho de 1978, o Museu de Arte Moderna
o devido valor à preservação dos seus tesouros culturais
(MAM) do Rio de Janeiro viu telas de Picasso, Miró, Dalí e
e científicos, pois, em apenas uma década, ao menos 8
de centenas de artistas brasileiros queimarem em 40 mi-
prédios e seus respectivos acervos foram destruídos. Isso
nutos de incêndio, conforme o relato de jornais na época.
significa perdas irressarcíveis à cultura e à ciência. E não
pode-se falar meramente em “acidentes”, pelo fato de Do acervo, de mais de mil peças, restaram apenas
se perceber que, em quase todos os casos, os incêndios 50. O trauma foi tamanho que somente nos anos 1990 o
foram iniciados por situações de falta de manutenção ou Brasil reconquistou a confiança de instituições internacio-
mesmo negligência com o uso dos recursos repassados nais para sediar exposições de grande porte.
às manutenções.
Nos últimos dez anos, contudo, o fogo voltou a
É preciso reavaliar o valor dado à cultura, histó- destruir museus, teatros e institutos. Além do Museu Na-
ria e ciência, e isso começa com a preservação e manu- cional do Rio, outros 7 prédios, listados a seguir, sofreram
tenção das instituições que são responsáveis por conce- perdas históricas com incêndios.
der vida longa a esses patrimônios não só do Brasil, mas
da humanidade. Como um país pode salvaguardar a sua 1. Teatro Cultura Artística, 2008
memória? Como a humanidade pode cuidar da preser-
vação dos processos que a fizeram chegar aonde está Destruído por um incêndio que durou mais de
hoje? Por meio de instituições como os museus. quatro horas em 2008, o Teatro Cultura Artística, na re-
gião central de São Paulo, até hoje está coberto por ta-
“O museu é o lugar onde se guardam coisas que são impor- pumes.
tantes para a história de um país, de uma época e de um
povo. O museu perpetua um conhecimento adquirido atra- Foi inaugurado em 1950, com um concerto de
vés da pesquisa, preservação e a divulgação de bens mate- Heitor Villa-Lobos.
riais e imateriais. Quando vamos a um espaço como esse,
o museu cumpre um papel social e educativo de transmitir
O teto desabou, uma sala foi inteiramente incen-
cultura para a sociedade. É um relicário de nossas memórias
diada e uma outra ficou alagada. Além de dois pianos e
enquanto humanidade e seu ambiente. ” (CUNHA, 2018)
equipamentos de som e iluminação, foram destruídos o
figurino das peças O Bem Amado, do ator Marco Nanini,
Portanto, é preciso que o país e o poder público e Toc Toc .
de modo geral comecem a valorizar mais as suas insti-
O afresco de Di Cavalcanti na fachada, com 48
tuições. Seja com mais investimentos ou mais eficiência
metros de largura e 8 metros de altura, é um dos poucos
na aplicação dos recursos, porque os bens que estão em
pontos da estrutura original com condições de ser restau-
risco não podem ser negligenciados.
rado.

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As causas do incêndio são desconhecidas. Sabe- ceiro andar do prédio, depois de ter ficado cercada pelas
-se apenas que ele começou perto da cortina do palco. chamas.

No decorrer da última década, vários prazos para O fogo atingiu principalmente o segundo andar,
o início da recuperação não foram cumpridos perdidos. onde havia três exposições: uma sobre a vida no Cerrado,
Desde março, contudo, o local está em obras, e a expecta- outra sobre o paleontólogo dinamarquês Peter Lund, e
tiva é de que o novo teatro fique pronto em 2021. uma sobre o Período Pleistoceno.

2. Instituto Butantan, 2010 Na ocasião, o bispo auxiliar da Arquidiocese de


Belo Horizonte, dom Joaquim Mol, disse que “o prejuízo
Em maio de 2010, um incêndio atingiu o labora- científico foi incalculável”.
tório de répteis do Instituto Butantan, na Zona Oeste de
São Paulo, destruindo um dos principais acervos de co- 5. Centro Cultural Liceu de Artes e Ofícios, 2014
bras do mundo.
Fundado em 1873, o Liceu de Artes e Ofícios de
O fogo atingiu o prédio em que cientistas pesqui- São Paulo, no centro da capital paulista, reabriu as portas
savam cobras, aranhas e escorpiões. Parte dos animais foi como centro cultural somente no mês passado, depois de
retirada com vida do local e levada para um local seguro. ficar mais de quatro anos fechado.

Segundo o Instituto Butantan, a coleção atingida Em 2014, um incêndio destruiu seu galpão cen-
pelo incêndio possuía cerca de 77 mil cobras catalogadas tenário.
e cerca de 5 mil em processo de registro.
O Liceu se tornou referência na capital paulista
“É uma tragédia da proporção do incêndio da bi- como escola de ensino técnico profissionalizante e de
blioteca de Alexandria”, afirmou à imprensa, na ocasião, formação geral. No início dos anos 1920, o engenheiro e
Francisco Luiz Franco, que era curador da coleção de ser- arquiteto Ramos de Azevedo assumiu sua direção, e seu
pentes do Instituto Butantan, referindo-se ao fogo que escritório contratou obras para serem executadas por ar-
consumiu a maior biblioteca da Antiguidade. tesãos e alunos.

Mais de 100 anos de História e de conhecimento Em 1930, a instituição desenvolveu e fabricou


acumulado, ainda segundo o especialista, virou pó com o primeiro hidrômetro (instrumento usado para medir a
as chamas. velocidade ou o escoamento da água) inteiramente na-
cional.
3. Memorial da América Latina, 2013
O incêndio de fevereiro de 2014 queimou qua-
Em novembro de 2013, um incêndio atingiu o dros, esculturas, móveis antigos e réplicas em gesso. En-
Memorial da América Latina, em São Paulo, e destruiu o tre as 35 peças danificadas, estava a versão em gesso da
auditório Simón Bolívar, onde havia uma tapeçaria de 800 Pietá, de Michelangelo, cujo original em mármore está na
metros quadrados da artista Tomie Ohtake. Basílica de São Pedro, no Vaticano.
Onze integrantes do Corpo de Bombeiros e um Quando pegou fogo, em razão de um curto-cir-
brigadista ficaram feridos enquanto tentavam conter as cuito, o auto de vistoria dos Bombeiros estava vencido.
chamas.
6. Museu da Língua Portuguesa, 2015
O laudo do Instituto de Criminalística de São Pau-
lo apontou um curto-circuito como causa do incêndio. Em 21 de dezembro de 2015, chamas tomaram
Segundo a perícia, pouco antes do início do fogo, havia conta dos três andares e da cobertura do Museu da Lín-
faltado luz no local e um gerador reserva fora acionado, o gua Portuguesa, no centro de São Paulo, que naquela se-
que pode ter provocado uma sobrecarga de energia. gunda-feira estava fechado para o público.

4. Museu de Ciências Naturais da PUC de Minas Gerais, Tudo virou cinza. À época, Isa Ferraz, curadora
2013 do museu, classificou o incêndio como uma “tragédia”.
O bombeiro civil Ronaldo Pereira da Cruz, que atuava no
Em janeiro de 2013, um incêndio destruiu répli- museu, morreu ao abrir uma porta enquanto o prédio pe-
cas, cenários, fiações e pisos do Museu de Ciências Natu- gava fogo.
rais da PUC Minas, em Belo Horizonte. A instituição tem
um dos maiores acervos de fósseis de mamíferos do Bra- Inaugurado em março de 2006, era um dos mu-
sil. seus mais visitados do Brasil e da América do Sul, e o pri-
meiro do mundo dedicado exclusivamente a um idioma.
Na ocasião, uma funcionária do serviço de limpe-
za foi resgatada, sem ferimentos, de uma sacada do ter- A estrutura ainda está sendo reconstruída, e a
previsão é que fique pronta no ano que vem. Os respon-

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sáveis pela restauração estão aproveitando para reformar ter, donde se desenvolve um debate sobre um tema, de
a fachada até de áreas que não foram atingidas pelo fogo, modo mais abrangente que a notícia.
como a torre do relógio e as paredes do saguão da esta-


ção da Luz.

7. Cinemateca Brasileira, 2016


Citações da Obra na Matriz de Referências
Em fevereiro de 2016, a Cinemateca Brasileira
perdeu de forma definitiva 270 títulos. Um incêndio em O ser humano como um ser que pergunta e quer saber
um dos quatro depósitos do galpão na parte de trás do
terreno na Vila Clementino, bairro da zona sul de São Acontecimentos recentes podem ilustrar a neces-
Paulo, destruiu cerca de 731 - dos quais 461 felizmente sidade do uso da razão na análise de fatos catastróficos,
possuía cópia de segurança - de seus 44 mil títulos, entre na medida em que decorrem de maneiras contemporâ-
cinejornais com cenas do noticiário político e curtas-me- neas de sistematizar a realidade, como é possível cons-
tragens. tatar na reportagem Museu Nacional: em 10 anos, fogo
dizima ao menos 8 prédios com tesouros culturais e cien-
Os rolos carbonizados eram feitos de nitrato de tíficos do país (BBC, 3 de setembro de 2018) ou no artigo
celulose, substância inflamável usada em películas cine- O rompimento da barragem de Mariana e seus impactos
matográficas até os anos 1950. socioambientais, de Luciano M. N. Lopes (Sinapse Múlti-
pla, 5 (1), jun 1-14, 2016). (Página 5, segundo parágrafo)
Gênero e/ou Estrutura
Tipos e gêneros
A Reportagem é um gênero textual não literário.
Ela é considerada um texto jornalístico veiculado pelos Tendo em vista que tipos e gêneros são classi-
meios de comunicação: jornais, revistas, televisão, inter- ficações que a inteligência humana realiza consciente e
net, rádio, dentre outros. inconscientemente, estabelecendo critérios, convenções,
medidas para agrupar objetos pelas semelhanças e afini-
A Reportagem é um tipo de texto que tem o in- dades, a caracterização é importante como fator determi-
tuito de informar ao mesmo tempo que prevê criar uma nante de pertencimento à ordem classificatória dada. O
opinião nos leitores. Portanto, ela possui uma função so- Museu Nacional do Rio de Janeiro constitui um lugar para
cial muito importante como formadora de opinião. reunir objetos classificados como obras de arte e acadê-
micas. É importante compreender que podem existir di-
A Reportagem pode ser um texto expositivo, ferentes arranjos no agrupamento de objetos, conforme
informativo, descritivo, narrativo ou opinativo. Desse as motivações, julgamentos e pensamentos de quem clas-
modo, ela pode tanto se aproximar da notícia quanto sifica. No campo da biologia, a taxonomia moderna em-
dos artigos opinativos, porém não deve ser confundida preendeu a caracterização dos seres vivos como forma de
com eles. Sendo expositivo e informativo porque ele ex- organização da biodiversidade. Um exemplo dessa biodi-
põe sobre um determinado assunto com o intuito princi- versidade é a aquarela Anartia Olivacea (de José Joaquim
pal de informar o leitor. Freire), que faz um dos primeiros registros de uma planta
no território brasileiro. (Página 11, segundo parágrafo)
Podem também ser textos descritivos e narra-
tivos, uma vez que descrevem ações e incluem tempo, Ambiente e vida
espaço e personagens.E por fim, é um texto opinativo,
ou seja, o repórter apresenta juízos de valor sobre o que Conhecer os seres vivos e a sua riqueza torna-se
está sendo discorrido. essencial para a preservação das espécies e conservação
dos ambientes para as futuras gerações. Os museus, com
Geralmente são textos mais longos, opinativos seus acervos, são ferramentas educativas e possuem pa-
e assinados pelos repórteres, enquanto as notícias são pel fundamental na divulgação da biodiversidade. São
textos relativamente curtos e impessoais que possuem instituições que investigam o mundo biológico e possuem
o intuito de somente informar o leitor de um fato atual uma grande coleção de exemplares coletados por pesqui-
ocorrido. sadores ao longo dos séculos. Suas coleções são utilizadas
nos estudos dos seres vivos, como taxonomia e história
Em resumo, podemos dizer que a notícia faz evolutiva, e permitem a população conhecer exemplares
parte do jornalismo informativo, enquanto as reporta- raros e extintos, além de informar sobre espécies comuns.
gens fazem parte do chamado jornalismo opinativo. O No Brasil, esse papel é muitas vezes ignorado devido à fal-
repórter é a pessoa que está incumbida de apresentar a ta de investimentos, que tornam as coleções vulneráveis
reportagem, a qual aborda temas da sociedade em geral. e subutilizadas. A situação precária dos museus brasilei-
ros é evidenciada na reportagem Museu Nacional: Em
Por esse motivo, a reportagem é um texto que 10 anos, fogo dízima ao menos 8 prédios com tesouros
precisa de mais tempo para ser elaborado pelo repór- culturais e científicos do país. Muitas coleções foram su-
primidas ao longo dos anos, acarretando prejuízos irrepa-

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ráveis, como a destruição de um dos principais acervos de


cobras do mundo, que queimou no Instituto Butantã, e a
perda de fósseis importantes, no incêndio que aconteceu
no Museu Nacional. (Página 18, primeiro parágrafo)

Número, grandeza e forma

Representações numéricas, assim como de gran-


deza, estão presentes nos textos Entrevista - Edgar Zanot-
to: um olho na ciência, outro na indústria (Revista Fapesp
- Ed. 269, jul. 2018), O rompimento da barragem de Ma-
riana e seus impactos socioambientais (Revista Sinapse
Múltipla, v.5, n.1), Onde as cientistas não têm vez (Revista
Fapesp, ed. 273, nov. 2018), assim como na reportagem
Museu Nacional: em 10 anos, fogo dizima ao menos 8
prédios com tesouros culturais e científicos do país (BBC
Brasil). (Página 24, sexto parágrafo)

Espaços

A arte transita entre espaços de segregação, de


integração e de transformação. Nesse sentido, espaços
podem ser transformados, como o Museu Nacional do
Rio de Janeiro, no Brasil, que, inicialmente, serviu como
residência à família real portuguesa, sediou a primeira
Assembleia Constituinte Republicana, e a partir de 1892,
foi destinado ao uso como museu acadêmico e científico.
A trajetória de transformação do espaço do museu, devi-
do ao incêndio, pode ser estudada na reportagem Museu
Nacional: Em 10 anos, fogo dízima ao menos 8 prédios
com tesouros culturais e científicos do país. (Página 27,
primeiro parágrafo)

Materiais

O artigo Museu Nacional: Em 10 anos, fogo dí-


zima ao menos 8 prédios com tesouros culturais e cien-
tíficos do país, ilustra o descaso com a cultura e a preser-
vação de materiais e objetos em espaços que retratam a
história da humanidade. O fogo descontrolado nos mu-
seus brasileiros teve como uma das causas sobrecargas
de energia, por falta de manutenção e investimentos pú-
blicos. (Página 31, segundo parágrafo)

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O Rompimento da Barragem de Mariana e
seus Impactos Socioambientais - Luciano

Autoria e Contextualização
O artigo científico O rompimento da barragem mento, puderam ser observados desde a jusante da bar-
de Mariana e seus impactos socioambientais foi escrito ragem destruída, em Minas Gerais, até a foz do rio Doce,
por Luciano M. N. Lopes. À época, ele era Mestrando da no mar do Espírito Santo. Seu legado: um rastro de des-
Faculdade de Direito da Universidade Federal Fluminen- truição, contaminação e mortes.
se - UFF - em Parceria com o Núcleo de Ciências do Poder
Judiciário - NUPEJ. Possui como principais áreas de atua- O presente trabalho possui como objetivo prin-
ção os Direitos da Infância e da Juventude e os Métodos cipal realizar uma abordagem crítica, científica e pontual
Adequados para a Resolução de Conflitos. Ao longo da sobre as prováveis causas do rompimento da barragem,
sua carreira, já publicou vários artigos e capítulos de li- sem olvidar os efeitos socioambientais e econômicos ad-
vros sobre a sua área de atuação. vindos desse desastre.
No artigo científico O rompimento da barragem [...]
de Mariana e seus impactos socioambientais, Luciano
Lopes nos instiga a revisitar as principais matérias, repor- AS BARRAGENS DE FUNDÃO E SANTARÉM
tagens, entrevistas e laudos técnicos de órgãos públicos
e privados que retrataram o tema à época, realizando Criadas para receberem os rejeitos provenientes
uma análise crítica e pontual sobre o desastre ocasio- do processo de extração de minério de ferro pela mine-
nado pelo rompimento da barragem de Fundão e suas radora Samarco S/A, as barragens de Fundão e Santarém
consequência socioambientais. Além disso, realiza uma estavam localizadas num complexo que, ironicamente à
abordagem crítica, científica e pontual sobre as prová- tragédia anunciada, chamava-se “Alegria”.
veis causas do rompimento da barragem, sem olvidar os
Estudos preliminares (BRASIL, 2015) apontam
efeitos socioambientais e econômicos advindos desse
que, somente na barragem de Fundão, havia aproximada-
desastre.
mente 50 milhões de m³ de resíduos, classificados, segun-
Como se trata de uma obra pequena, autoexpli- do a NBR 10.004, como sólidos, não perigosos e não iner-
cativa e de fácil compreensão, ela será transcrita na sua tes, como o ferro e o manganês, ou seja, sua composição
integralidade. Cabe ressaltar, antes, que uma leitura com era formada basicamente por areia e metais.
atenção da obra se faz extremamente necessária.
No dia 05/11/2015, por volta das 16 h e 20 min.,
a barragem de Fundão entrou em colapso e rompeu-se.
Obra Com a ruptura, cerca de 34 milhões de m³ de rejeitos de
O rompimento da barragem de Mariana e seus impactos minério, o equivalente a quatorze mil piscinas olímpicas,
socioambientais foram diretamente lançados no meio ambiente, atingin-
do a barragem de Santarém, logo à jusante, causando-lhe
sérias avarias e o seu transbordo. Os 16 milhões de m³
Introdução. restantes ainda continuam sendo despejados, vagarosa-
É cediço que na história da mineração brasileira mente, seguindo o sentido da correnteza das águas em
e mundial acidentes ocorrem com relativa frequência. direção à foz do Rio Doce, no oceano espírito-santense
Alguns sequer chegam a serem noticiados pela grande (BRASIL, 2015).
mídia, passando despercebidos pela maioria da popula-
ção. Todavia, a tragédia ocasionada pelo rompimento da Pari passu ao rompimento da barragem de
barragem de Fundão foi particularmente dramática, haja Fundão e o consequente “galgamento” da barragem de
vista suas consequências socioambientais de grande am- Santarém, formou-se uma devastadora tsunami de lama
plitude. residual que aniquilou Bento Rodrigues e causou sérios
transtornos a outros sete distritos de Mariana/MG, além
A represa encontrava-se localizada no município de contaminar importantes rios como o Gualaxo do Nor-
de Mariana/MG e foi especificamente construída para te, do Carmo e o Doce.
servir de depósito dos resíduos gerados durante o proces-
so de mineração de ferro. Pertencia à empresa Samarco Segundo Gonçalves, Vespa e Fusco (2015), as
S/A, cujos acionistas majoritários são a Companhia Vale barragens do complexo operavam através de um méto-
do Rio Doce e a anglo-australiana BHP Billinton. do tradicionalmente utilizado em todo mundo: o aterro
hidráulico. Nesse sistema, os resíduos separados do fer-
No dia 05 de novembro de 2015, o dique de Fun- ro durante o processo de mineração são escoados até as
dão entrou em colapso e rompeu-se, causando um de- bacias (barragens) por força da ação gravitacional. Já a
sastre ambiental sem precedentes na história do Brasil. filtragem da água é realizada pela areia, localizada estra-
Os efeitos imediatos dessa tragédia, ainda em desenvolvi- tegicamente na parte frontal dessas bacias.

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A despeito do sistema de aterro hidráulico ser o 4. Já o Ministério Público Federal – MPF - instau-
mais utilizado em todo mundo, atualmente existem téc- rou quatro inquéritos civis com objetivo de se apurar as
nicas mais modernas que permitem a drenagem mais responsabilidades pela tragédia. Para isso, designou sete
segura dos resíduos da mineração através de filtros. Esse procuradores federais (quatro de Minas Gerais, dois do
novo sistema, entrementes, eleva em até seis vezes os Espírito Santo e um do Rio de Janeiro) que envidarão es-
custos de produção, o que tem inviabilizado sua utiliza- forços em conjunto para identificar os responsáveis pelos
ção pela maioria das empresas. Desta forma, esclarece danos socioambientais; apurar irregularidades dos órgãos
Edilson Pissato, professor de geologia de engenharia da responsáveis pela fiscalização; adotar medidas destinadas
Universidade de São Paulo (USP), as mineradoras prefe- à proteção das comunidades tradicionais atingidas (índios
rem assumir os riscos advindos da utilização de sistemas e quilombolas); identificar e acompanhar a existência e a
eficácia de medidas preventivas nas barragens do Com-
mais tradicionais e menos onerosos (GONÇALVES; VESPA;
plexo de Germano e; instaurar e conduzir procedimento
FUSCO, 2015).
investigatório criminal, objetivando apurar as causas e as
responsabilidades quantos aos crimes ambientais.
No caso do rompimento da barragem de Maria-
na/MG os especialistas são uníssonos em afirmar que a Contudo, devido à complexidade e magnitude da
utilização de técnicas mais modernas de filtragem dos tragédia não são esperadas respostas conclusivas antes
resíduos, a manutenção correta das barragens, a utili- de decorridos seis meses, haja vista que boa parte das
zação de instrumentos de monitoramento eletrônico, a averiguações depende do resultado de laudos, o que in-
implementação de sistemas de alerta, a adoção de pla- viabiliza adoção de prazo peremptório para o término dos
nos emergenciais e, sobretudo, uma fiscalização séria e inquéritos e de outros estudos técnicos.
eficiente pelos órgãos competentes são medidas que, se
estivessem em pleno funcionamento, certamente teriam Em que pese as investigações oficiais estarem
evitado o desastre ou minimizariam seus impactos so- longe de um fim, peritos do setor afirmam que as possí-
cioambientais. veis causas para o rompimento da barragem devem estar
relacionadas ao processo de liquefação; aos abalos sísmi-
AS PROVÁVEIS CAUSAS DO ROMPIMENTO cos que antecederam o desastre; a falhas na construção/
manutenção das barragens; a uma fiscalização deficitária
Logo após o acidente, diversos órgãos estatais pelos órgãos competentes e à utilização do reservatório
abriram múltiplas linhas de investigação em busca de res- acima de sua capacidade de armazenamento.
postas concretas sobre os motivos, as circunstâncias e os
efeitos da tragédia: Para a maior parte dos especialistas, entretanto,
o processo de liquefação configura-se na hipótese mais
1. Pela Polícia Civil de Minas Gerais abriu-se in- provável para o colapso da represa de Fundão. O fenô-
quérito criminal para se investigar os crimes ambientais meno emerge quando a camada de areia depositada na
e os contra a vida já identificados, além de outros delitos parte frontal das barragens opera no sentido inverso à sua
que porventura fossem evidenciados no transcorrer das utilização, ou seja, ao invés de expelir a água, ela a retém.
investigações; Isso ocorre devido a mudanças abruptas na pressão inter-
na do depósito, fazendo com que a areia transforme-se
2. A pedido do Procurador da República, José em lama e deixe de filtrar os resíduos.
Adércio Leite Sampaio, a Superintendência da Polícia Fe-
A segunda causa refere-se aos pequenos tremo-
deral de Minas Gerais instaurou inquérito policial visando
res que precederam à tragédia. Segundo sismógrafos da
apurar os crimes e as causas da tragédia. A solicitação fir- Universidade de Brasília (UNB), no dia do rompimento
ma-se no entendimento de que a investigação do desas- das barragens, pelo menos onze pequenos abalos sísmi-
tre também é da competência da Polícia Federal, uma vez cos, cujas magnitudes oscilaram entre 1,7 a 2,7 graus na
que as consequências do acidente possuem amplitude Escala Richter, foram detectados nas áreas corresponden-
nacional e não se limitam ao território de Minas Gerais, tes às localidades de Mariana, Itabira e Itabirito. Todavia,
estendendo-se até o mar do Espírito Santo; ainda não há como se afirmar, de forma cabal, se existe
uma correlação entre os tremores e o rompimento das
3. Pelo Ministério Público de Minas Gerais criou- barragens, conforme asseverou George Sandi França, pro-
-se “força-tarefa” composta por nove promotores de jus- fessor chefe do Observatório Sismológico da UNB, em re-
tiça, cuja finalidade principal é identificar, por intermédio portagem exibida pelo Site G1:
de inquéritos civis, as causas do rompimento da barra-
gem. De forma simultânea a essa linha de investigação Dentre esses eventos, três foram muito próximos da barra-
principal, diligências técnicas estão sendo efetivadas no gem que se rompeu. Normalmente, por mais que sejam de
sentido de se aferir a segurança e estabilidade das barra- rejeitos, as barragens são construídas para suportar magni-
gens de Santarém e de Germano que, segundo a própria tudes maiores [...]. É muito prematuro afirmar que a ação
mineradora Samarco, encontram-se em iminente perigo dessa pequena atividade possa ter gerado o rompimento.
estrutural. Esses inquéritos civis servirão de base para se Mas existe a relação que depois do tremor, a barragem se
ajuizarem futuras ações de responsabilidade civil pelos rompeu (SITE G1, 2015).
danos causados ao meio ambiente e às comunidades atin-
gidas, sendo que algumas já estão em pleno andamento; O aumento exacerbado na produção de miné-
rio de ferro pela empresa extrativista alicerça a terceira

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hipótese como causa provável da tragédia. Somente no Decerto, os efeitos dramáticos e perversos do
último ano, houve um incremento da ordem de 37% na “desastre de Mariana” serão sentidos por décadas e gera-
geração do minério. Com a aceleração da produção e o ções, principalmente aquelas formadas por comunidades
consequente aumento do volume de rejeitos, a empre- que estão localizadas dentro da bacia hidrográfica do rio
sa iniciou, em julho de 2015, obras de elevação de sua Doce.
estrutura com o objetivo de ampliar sua capacidade de
armazenamento. Acredita-se que, mesmo após as obras Nesse ínterim, os três subitens a seguir trarão
de ampliação, houve um acúmulo de material superior à importantes elementos e profundas análises sobre os im-
capacidade suportada pela barragem, causando-lhe o seu pactos causados ao distrito de Bento Rodrigues, à flora
rompimento. e às Áreas de Preservação Permanentes atingidas, bem
como ao rio Doce e a sua ictiofauna.
A última teoria diz respeito à negligência da mi-
neradora Samarco e à vigilância deficitária dos órgãos O distrito de Bento Rodrigues
responsáveis pela fiscalização. Em matéria veiculada pela
Revista Isto É e intitulada “Lama e Descaso”, a jornalista Com população estimada em 612 habitantes, o
Perez (2015) revelou que, em outubro de 2013, a empresa distrito de Bento Rodrigues, localizado na cidade mineira
já tinha sido devidamente advertida sobre a possibilidade de Mariana, foi o primeiro a receber o impacto da onda
de colapso na represa de Fundão. Segundo laudo reali- de rejeitos. Devido à violência da enxurrada, o pequeno
zado pelo Instituto Prístino e apresentado à mineradora, povoado simplesmente desapareceu – soterrado em um
diversos aspectos técnicos da barragem foram colocados mar de lama. Todos os sobreviventes ficaram desabriga-
sob alerta. Apesar dos avisos e advertências, a Samarco dos, pois suas casas, igrejas e colégios foram arrastados e
não interrompeu a exploração de minério de ferro na re- destruídos pela força descomunal da avalanche.
gião e tampouco procedeu aos reparos que foram orien-
tados pelos técnicos. Corroborando com a descrição acima, o Ibama,
através da Nota Técnica 02001.002155/2015-91 CSR/IBA-
Ao ignorar os laudos que alertavam tanto sobre as MA, descreveu o uso do solo na área afetada de Bento Ro-
falhas na construção como na manutenção da barragem drigues. No que diz respeito ao impacto causado nas ha-
a empresa de mineração demonstrou evidente descaso e bitações, aduziu que “das 251 edificações mapeadas em
assumiu para si os riscos da tragédia que, entrementes, Bento Rodrigues, 207 apresentaram sobreposição com o
poderia ter sido evitada se houvesse rigor nas fiscaliza- polígono da área atingida, ou seja, 82% das edificações
ções e na vigilância realizadas pelos órgãos competentes. foram atingidas” (BRASIL, 2015, p. 25).
A despeito de suas causas e consequências ainda Bento Rodrigues, embora vilarejo, era um distrito
serem objetos de análise de estudos complexos e apro- que possuía uma história majestosa e digna de orgulho
fundados, a tragédia de Mariana, ainda em curso, já é entre os seus concidadãos. Com 317 anos de existência,
considerada por muitos especialistas como o maior de- abrigava igrejas centenárias com obras sacras importan-
sastre socioambiental da história do Brasil. tes e monumentos de notória relevância cultural, além
RESULTADOS E DISCUSSÃO de fazer parte da rota da Estrada Real no século XVII.
Além das perdas de vidas humanas, cujos valores são in-
Os impactos socioambientais e econômicos calculáveis, em apenas onze minutos de avalanche todo
patrimônio histórico e cultural, construído ao longo de
Um dia após a catástrofe, o Instituto Brasileiro de séculos, fora dizimado pelo mar de rejeitos (GONÇALVES;
Meio Ambiente e Recursos Renováveis -Ibama - órgão res- VESPA; FUSCO, 2015).
ponsável pelo monitoramento e controle ambiental em
nível federal, iniciou o acompanhamento in loco da evolu- Até o dia 16/12/2015, segundo informações de
ção do desastre. O resultado desse trabalho culminou na órgãos oficiais, dezessete corpos de vítimas já haviam sido
elaboração de um documento científico intitulado “Lau- reconhecidos. Todavia, o nome de duas pessoas (um fun-
do Técnico Preliminar: Impactos ambientais decorrentes cionário da Samarco e outro de uma empresa terceiriza-
do desastre envolvendo o rompimento da barragem de da) ainda constava na lista de desaparecidos.
Fundão, em Mariana, Minas Gerais”, o qual fora concebi-
do para subsidiar a propositura de Ação Civil Pública por A flora e as Áreas de Preservação Permanentes atingidas
danos causados ao meio ambiente pela mineradora Sa- Conforme dispõe o artigo 3º, II do Novo Código Florestal
marco. Nele, o órgão ambiental evidenciou e relatou “im- - Lei nº 12.651/2012 - considera-se Área de Preservação
pactos agudos de contexto regional, entendidos como a Permanente - APP - a “área protegida, coberta ou não por
destruição direta de ecossistemas, prejuízos à fauna, flora vegetação nativa, com a função ambiental de preservar os
e socioeconômicos, que afetaram o equilíbrio da Bacia Hi- recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica e
drográfica do rio Doce, com desestruturação da resiliên- a biodiversidade, facilitar o fluxo gênico de fauna e flora,
cia do sistema” (BRASIL, 2015, p. 2).
proteger o solo e assegurar o bem-estar das populações
De uma análise primária e sistemática do citado humanas” (BRASIL, 2012).
documento infere-se que a tragédia de Mariana configu-
rou-se num desastre socioambiental de proporções nunca Para o IBAMA, as florestas estabelecidas ao longo
antes vista na história da mineração brasileira e mundial. dos cursos d’água são vitais para o equilíbrio de todo o

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ecossistema e da biodiversidade local, especialmente em atuam no sentido de preservar os cursos d’água de pro-
relação ao sistema hídrico: cessos erosivos fluviais.

É inegável a importância ecológica de florestas ao longo de De acordo com o IBAMA, as matas de galeria
cursos d›água, com reflexos tanto para a manutenção da também foram gravemente impactadas pela onda dos
biodiversidade local como para as comunidades que com ela resíduos de minério. Em boa parte das áreas degradadas
interagem de forma social e econômica. As vegetações nes- houve a completa remoção da cobertura vegetal e o total
sas áreas atenuam a erosão do solo, regularizam os fluxos
hídricos e impedem o processo de assoreamento dos cursos
soterramento de seus bancos de sementes, o que fez com
da água, dentre outras funções vitais. As APPs e as áreas de que sua capacidade de recuperação e de sucessão fosse
reserva legal têm um papel fundamental no ciclo da bacia seriamente prejudicada:
hidrológica como um todo (BRASIL, 2015, p. 7).
Com o “arranque” de indivíduos arbóreos pela força da onda
de lama de rejeitos e a sedimentação da lama sobre a se-
Diante de sua inquestionável relevância social e
rapilheira e seus bancos de sementes, as matas de galeria
ambiental, o legislador pátrio buscou proteger as APPs, atingidas pelo desastre tiveram sua resiliência e processos de
na medida em que tipificou qualquer ação humana que sucessão comprometidos. No entanto, cada trecho atingido
pudesse destruir ou causar danos a essas vegetações, dependerá de sua capacidade de resiliência (capacidade que
ainda que em formação. Nesse desiderato, tais condutas um ecossistema perturbado/degradado possui de retornar,
foram devidamente qualificadas, à luz do art. 38 da Lei naturalmente, às suas características originais, ou o mais
próximo possível, sem intervenção humana). Certamente,
9.605/98, como crime ambiental, in verbis: trechos com baixa ou nenhuma capacidade de resiliência ne-
cessitarão de Planos de Recuperação de Áreas Degradadas
Art. 38. Destruir ou danificar floresta considerada de preser-
– PRAD, a serem executados a longo prazo. Em ambas as si-
vação permanente, mesmo que em formação, ou utilizá-la tuações – PRADS x Regeneração Natural – o monitoramento
com infringência das normas de proteção: ambiental deverá ser constante até a completa regeneração
do ambiente (BRASIL, 2015, p. 11).
Pena - detenção, de um a três anos, ou multa, ou ambas as
penas cumulativamente. A despeito dos resíduos não apresentarem riscos
Parágrafo único. Se o crime for culposo, a pena será reduzida
imediatos à saúde humana, segundo Cleuber Moraes de
à metade (BRASIL, 1998). Brito, professor de Geologia da Universidade Estadual de
Londrina (UEL) e consultor na área de meio ambiente e
Ao elaborar nota técnica sobre os danos ambien- mineração, os danos ambientais advindos do desastre po-
tais decorrentes do rompimento da barragem de Fundão, derão se estender por anos:
o Centro de Sensoriamento Remoto do IBAMA concluiu Comparado ao mercúrio, por exemplo, esse rejeito não é tó-
que a tragédia foi responsável pela destruição de “1.469 xico, já que é formado basicamente por sílica. Ninguém vai
hectares ao longo de 77 km decursos d’água, incluindo desenvolver câncer, nada disso. O risco não é para o ser hu-
Áreas de Preservação Permanente” (BRASIL, 2015, p. 10). mano, mas para o meio ambiente. Essa lama avermelhada
O Estudo, extremamente técnico e descritivo, analisa com deve causar danos em todo o ecossistema da região, impac-
profundidade as consequências imediatas e mediatas que tando por anos seus rios, fauna, solo e até os moradores, no
sentido de que o trabalho deles, como a agricultura, pode se
o acidente causou ao ecossistema local:
tornar impraticável (DELLA BARBA, 2015).
O desastre em análise causou a devastação de matas ciliares
remanescentes (fragmentos/mosaicos), já o aporte de sedi-
Nessa mesma esteira de entendimento, o Dr.
mentos (lama de rejeito da exploração de minério de ferro) Maurício Ehrlich, professor do Instituto Alberto Luiz
imediatamente soterrou os indivíduos de menor porte do Coimbra de Pós-Graduação e Pesquisa de Engenharia da
sub-bosque e suprimiu indivíduos arbóreos. Os rejeitos de Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), senten-
mineração de ferro também têm potencial para afetar o solo ciou: “Se não limpar, não tem material orgânico nenhum
ao longo do tempo por se tratarem de material inerte sem para plantas. Nada se desenvolve por dezenas de anos.
matéria orgânica, causando desestruturação química e afe- Se deixar por conta da natureza, essa área toda vai ser
tando o Ph do solo. Tal alteração dificultará a recuperação estéril” (CORRÊA; LIMA; GOMIDE, 2015).
e o desenvolvimento de espécies que ali viviam, podendo
modificar, a médio e longo prazos, a vegetação local, com O prognóstico das consequências socioambien-
o estabelecimento de ecossistemas diferentes dos originais tais do acidente é, portanto, estarrecedor. Quando a
(BRASIL, 2015, p. 10-11). lama de rejeitos secar, o solo ficará impermeabilizado e
sem nenhum tipo de matéria orgânica. Sem os nutrien-
O acidente também atingiu de forma devastado- tes necessários não haverá tentativa de resiliência nem
ra as coberturas vegetais conhecidas por “matas de ga- de sucessão por parte da vegetação. O assoreamento dos
leria”. Esse tipo de vegetação possui essa nomenclatura cursos d’água, com suas nascentes e margens, será inevi-
devido a sua fisionomia, uma vez que as copas de suas tável. Todo o ecossistema local e sua biodiversidade serão
árvores, ao se encontrarem, formam uma espécie de “tú- drasticamente afetados. Em alguns casos, como veremos
nel” ou “galeria”. Sua preservação é considerada basilar a diante, de forma irreversível.
para a manutenção do ecossistema hídrico, pois as ma-
tas de galeria, assim como as ciliares, possuem raízes que

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Os impactos ao rio Doce e a sua ictiofauna tação de larvas e juvenis); l) alteração e empobrecimento
da cadeia trófica em toda a extensão do dano; m) inter-
Conforme documento elaborado pelo IBAMA já rupção do fluxo gênico de espécies entre corpos d’água;
citado alhures, mais de 600 km de cursos d’água foram n) perda de espécies com especificidade de habitat (cor-
afetados e contaminados pela lama de resíduos da mine- redeiras, locas, poços, remansos, etc; o) mortandade de
ração: espécimes em toda a cadeia trófica; p) piora no estado
Inicialmente, esse rejeito atingiu a barragem de Santarém
de conservação de espécies já listadas como ameaçadas e
logo a jusante, causando seu galgamento e forçando a passa- ingresso de novas espécies no rol de ameaçadas; q) com-
gem de uma onda de lama por 55 km no rio Gualaxo do Norte prometimento da estrutura e função dos ecossistemas e;
até desaguar no rio do Carmo. Neste, os rejeitos percorreram r) comprometimento do estoque pesqueiro.
outros 22 km até seu encontro com o rio Doce. Através do
curso deste, foram carreados até a foz no Oceano Atlântico, Este mesmo estudo apurou, às fls. 14/15, que o
chegando no município de Linhares, no estado do Espírito desastre ambiental sob análise alterou drasticamente a
Santo, em 21/11/2015, totalizando 663,2 km de corpos hídri- cadeia alimentar dos rios que foram contaminados pela
cos diretamente impactados (BRASIL, 2015, p. 3). lama, causando danos imensos à ictiofauna local:
Malgrado ainda estejam sendo mensuradas, sa- Os efeitos sobre a biodiversidade aquática podem variar con-
be-se que as consequências sociais e ambientais do aci- forme o nível trófico e fisiologia dos organismos. Em relação
dente foram dramáticas e de grande amplitude. Somente aos organismos aquáticos produtores, a saber, fitoplâncton,
para se identificar e quantificar a dimensão dos prejuízos perifíton, e macrófitas aquáticas submersas, o aumento da
turbidez impede a entrada de luz solar na água, o que invia-
serão necessários anos de estudos e de análises.
biliza a fotossíntese. As consequências à comunidade aquática
dependem da permanência dos sedimentos no ambiente, da
Especificamente no que tange à biodiversidade resiliência dos produtores primários afetados e da importância
aquática e a qualidade das águas da bacia hidrográfica dessa produção endógena na cadeia trófica aquática como um
do rio Doce os danos causados foram particularmente todo. Em relação aos organismos aquáticos consumidores, a
perversos e imensos, eis que proporcionais à extensão quantidade de sólidos em suspensão no corpo d’água provoca
do corpo hídrico atingido pela lama. Em alguns casos, as o colabamento das brânquias, levando-os à morte por asfixia.
perdas serão irreversíveis, haja vista a possível extinção [...] Dessa forma, evidencia-se que a mortalidade instantânea
é apenas um dos impactos aos organismos aquáticos causados
de espécies consideradas endêmicas. Por onde a lama de
pelo desastre. Muito mais do que os organismos em si, os pro-
rejeitos passou deixou um rastro de contaminação, mor- cessos ecológicos responsáveis por produzir e sustentar a ri-
tandade e destruição. Não é exagero ou sensacionalismo queza e diversidade do rio Doce foram afetados (BRASIL, 2015,
dizer que o rio Doce foi a óbito, agonizado em um mar de p. 14-15).
lama que lhe feriu as entranhas e retirou-lhe a vida.
Com a contaminação pela onda de rejeitos, a
Logo no primeiro dia do desastre, observou-se a qualidade da água dos rios foi diretamente afetada. De-
completa aniquilação dos anfíbios, mamíferos e animais vido ao alto grau de turbidez, as águas ficaram momen-
de pequeno porte, cujos habitats estabelecidos às mar- taneamente impróprias para o consumo humano e para
gens dos rios foram soterrados pelos resíduos. No que a agropecuária. Todas as cidades que dependiam do rio
concerne aos danos causados à ictiofauna [conjunto de Doce para o abastecimento de água à população tiveram
espécies de peixes que habitam determinada região hi- que interromper sua captação, conforme salientou o IBA-
drográfica] identificou-se ao longo do trajeto do rio Doce MA:
um elevado índice de mortandade de peixes. Devido ao
alto nível de turbidez da água, ocasionado pelos sedimen- Em relação ao impacto na qualidade da água, além da sus-
tos que compõem os rejeitos, houve o “colabamento” pensão do abastecimento nos municípios afetados, a pre-
[fechamento] das brânquias dos peixes que morreram sença de metais e alteração de outros parâmetros indica a
necessidade de monitoramento contínuo do ambiente afeta-
por asfixia.
do, bem como da remediação ou recuperação a ser indicada
com base nos resultados do comportamento dos parâmetros
O colossal impacto causado à ictiofauna da ba- alterados no ambiente hídrico (BRASIL, 2015, p. 34).
cia do rio Doce foi mapeado pelo IBAMA que, através da
Nota Técnica 24/2015/CEPTA/DIBIO/ICMBIO (BRASIL, Segundo Sassine (2015), a Agência Nacional de
2015, p.14), elencou as principais consequências ambien- Águas (ANA) finalizou, no último dia 27 de novembro, lau-
tais em relação à população de peixes: a) fragmentação do técnico que serviu de base para o ajuizamento de uma
e destruição de habitats; b) contaminação da água com Ação Civil Pública onde a União pede o ressarcimento dos
lama de rejeitos; c) assoreamento do leito dos rios; d) danos causados pelo rompimento da barragem de Ma-
soterramento das lagoas e nascentes adjacentes ao leito riana/MG, avaliados em cerca de 20 bilhões. O processo
dos rios; e) destruição da vegetação ripária e aquática; f) tramita na Justiça Federal de Minas Gerais e possui como
interrupção da conexão com tributários e lagoas margi- rés a mineradora Samarco e suas controladoras, Vale do
nais; g) alteração do fluxo hídrico; h) impacto sobre es- Rio Doce e a anglo-australiana BHP Bilinton.
tuários e manguezais na foz do Rio Doce; i) destruição de
áreas de reprodução de peixes; j) destruição das áreas Ainda de acordo com o citado autor, todas as co-
“berçários” de reposição da ictiofauna (áreas de alimen- munidades que dependiam do abastecimento das águas

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do rio Doce precisarão de novos mananciais e sistemas al- Embora as circunstâncias do acidente ainda este-
ternativos de captação, considerando que as consequên- jam sendo apuradas, segundo a maioria dos especialistas
cias do acidente foram classificadas como “indetermina- do setor de mineração, a liquefação, fenômeno pelo qual
das e imprevisíveis”: a pressão no interior da barragem é abruptamente alte-
rada, fazendo com que a areia torne-se lama e deixe de
As águas do Rio Doce, depois do maior desastre ambiental filtrar a água, é a causa mais provável para o rompimento
da História do país, estarão sujeitas a novos picos de turbidez
da represa.
(água turva), quedas de oxigênio, aumentos na concentra-
ção de metais e prejuízos para os dependentes da bacia por
períodos “indeterminados e imprevisíveis”. Por essa razão,
Ainda que as causas do rompimento da barragem
o abastecimento de água em 12 cidades de Minas Gerais sejam evidenciadas é clara a assertiva de que mudanças
e Espírito Santo que precisam do rio dependerá de “novos na legislação e na forma das concessões de licenças, alia-
mananciais, implantação de poços profundos e sistemas de das a uma fiscalização efetiva por parte dos órgãos go-
adução”. Essas 12 cidades concentram mais de 550 mil mora- vernamentais competentes são medidas preventivas ur-
dores (SASSINE, 2015). gentes e necessárias para que se possam impedir novos
acidentes.
Diante de um quadro de destruição, contamina-
ção e de incertezas toda a bacia hidrográfica do rio Doce Por fim, infere-se que, diante dos fatos e das evi-
agoniza a espera de ações que minimizem os danos cau- dências científicas que o presente estudo trouxe a lume, a
sados ao seu ecossistema. Decerto, a adoção de Planos “tragédia de Mariana” poderia, sim, ter sido evitada.
de Recuperação de Áreas Degradadas - PRAD’s- espe-
cialmente nas Áreas de Preservação Permanentes, nas
nascentes e rios afetados, além de um constante e rígido
Gênero
monitoramento ambiental são medidas que, a médio e Artigo científico é o trabalho acadêmico que
longo prazos, poderão regenerar o rio Doce e recuperar apresenta resultados sucintos de uma pesquisa realiza-
seu ecossistema, sua biodiversidade e sua vida. da de acordo com o método científico aceito por uma
CONCLUSÃO comunidade de pesquisadores. Por esse motivo, consi-
dera-se científico o artigo que foi submetido a exame por
A maior tragédia ambiental da história do Brasil outros cientistas, que verificam as informações, os méto-
começou a ser desenhada muito antes do dia 05 de no- dos e a precisão lógico-metodológica das conclusões ou
vembro de 2015. Sua gênese ocorreu por força de uma le- resultados obtidos.
gislação opaca e ultrapassada, uma fiscalização deficitária
e do absoluto descaso da Samarco com o meio ambiente Em geral, é uma produção curta que tem aproxi-
e vidas humanas. madamente entre 20 a 40 páginas. Pode ser resultado de
sínteses de trabalhos maiores ou elaborados em número
O rompimento da barragem de fundão gerou de três ou quatro, em substituição às teses e disserta-
uma onda de lama residual tão devastadora e poluente ções; são desenvolvidos, nesses casos, sob a assistência
que, durante sua trajetória até o mar do Espírito Santo, de um orientador acadêmico. São submetidos às comis-
dizimou o distrito de Bento Rodrigues, ceifou vidas huma- sões e conselhos editoriais dos periódicos, que avaliam
nas, soterrou centenas de nascentes, contaminou impor-
sua qualidade e decidem sobre sua relevância e adequa-
tantes rios como o Gualaxo do Norte, do Carmo e Doce,
ção ao veículo.
destruiu florestas inteiras que estavam situadas em Áreas
de Preservação Permanente e causou prejuízos sociais e
Metodologia
econômicos de grande amplitude a populações inteiras.
Trata-se de pesquisa de revisão bibliográfica
A contaminação da bacia hidrográfica do rio Doce
com abordagem técnica qualitativa. Em face da escassez
pelos rejeitos elevou consideravelmente os níveis de tur-
de material de pesquisa, uma vez que o “desastre
bidez da água, tornando-a imprópria tanto para o consu-
de Mariana” é fato recente e com poucas obras cien-
mo humano como para a agropecuária. O mesmo motivo
fez com que a população de peixes fosse praticamente
tíficas publicadas, optou-se pela utilização de toda
aniquilada de todos os cursos d’água que foram atingidos fonte literária disponível que estivesse correlacionada
pela lama. Com os danos à ictiofauna, os pescadores per- ao assunto. Assim, a pesquisa desenvolveu-se sob o
deram seu principal meio de subsistência. Diversas loca- arcabouço de matérias jornalísticas, reportagens, entre-
lidades que dependiam do turismo também contabiliza- vistas e laudos técnicos de órgãos públicos e privados
ram amargos prejuízos. que versaram sobre o tema.

Logo após o acidente, abriram-se múltiplas linhas


de investigação, objetivando identificar os responsáveis,
as causas e as consequências da tragédia. Entretanto, de-
vido à complexidade e a amplitude do desastre não há
prazo para a conclusão dos inquéritos e dos estudos.

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Número, grandeza e forma


Citações da Obra na Matriz de Referências
O ser humano como um ser que pergunta e quer saber

Acontecimentos recentes podem ilustrar a neces-


sidade do uso da razão na análise de fatos catastróficos,
Representações numéricas, assim como de gran-
deza, estão presentes nos textos Entrevista - Edgar Zanot-
to: um olho na ciência, outro na indústria (Revista Fapesp
- Ed. 269, jul. 2018), O rompimento da barragem de Ma-
riana e seus impactos socioambientais (Revista Sinapse
Múltipla, v.5, n.1), Onde as cientistas não têm vez (Revista
Fapesp, ed. 273, nov. 2018), assim como na reportagem
na medida em que decorrem de maneiras contemporâ- Museu Nacional: em 10 anos, fogo dizima ao menos 8
neas de sistematizar a realidade, como é possível cons- prédios com tesouros culturais e científicos do país (BBC
tatar na reportagem Museu Nacional: em 10 anos, fogo Brasil). (Página 24, sexto parágrafo)
dizima ao menos 8 prédios com tesouros culturais e cien-
tíficos do país (BBC, 3 de setembro de 2018) ou no artigo Conceitos matemáticos, tais como: geometria
O rompimento da barragem de Mariana e seus impactos dos corpos curvos (cilindros, cones e esferas); figuras pla-
socioambientais, de Luciano M. N. Lopes (Sinapse Múlti- nas criadas a partir de interseções de um plano com cor-
pla, 5 (1), jun 1-14, 2016). (Página 5, segundo parágrafo) pos curvos (principalmente, os conceitos das cônicas); e o
princípio de Cavalieri na comparação de volumes podem
Ambiente e vida ser observados no artigo O rompimento da barragem de
Mariana e seus impactos socioambientais, de Luciano M.
Ao longo da história da humanidade temos ob- N. Lopes e na Igreja São Francisco de Assis de Ouro Pre-
servado que a biodiversidade é constantemente negli- to: estrutura arquitetônica, pintura do teto e esculturas
genciada em benefício do capital, como exposto por Beto encravadas na estrutura, de Aleijadinho e Ataíde, século
Guedes em O Sal da Terra. O texto O rompimento da bar- XVII. Nesta Igreja, pode-se observar a relação entre as
ragem de Mariana e seus impactos socioambientais (Lu- partes e o conjunto, o modo como elas estão articuladas
ciano M. N. Lopes) e o vídeo Conservar a Amazônia, uma e a estrutura interna das imagens. Destacam-se marcas
questão ambiental, social e econômica mostram como as como contrastes e semelhanças, variações formais, inter-
ações humanas impactam o meio ambiente e podem cau- valos, pausas e interrupções, agrupamentos. (Página 25,
sar a destruição de espaços e prejudicar espécies, eviden- terceiro parágrafo)
ciando a necessidade de repensar o uso desses ambientes.
Kant, no texto Resposta à pergunta: o que é o esclareci- Espaços
mento? sugere que ao fazer uso da razão o homem exerce
sua autonomia, condição que o torna responsável pela Pensar em espaços naturais implica em com-
manutenção das demais formas de vidas assegurando o preender a sustentabilidade como condição necessária
equilíbrio ambiental. (Página 17, quarto parágrafo) para orientar as atividades humanas, a fim de evitar a de-
vastação desses espaços. Essa reflexão pode ser suscitada
Acontecimentos como os rompimentos das bar- na peça Um inimigo do povo (Henrik Ibsen), na música O
ragens das atividades de mineração, como pode ser obser- Sal da Terra (Beto Guedes), no texto O rompimento da
vado no texto O rompimento da barragem de Mariana e barragem de Mariana e seus impactos socioambien-
seus impactos socioambientais (Luciano M. N. Lopes), im- tais (Luciano M. N. Lopes) e no documentário Conservar
pactaram o ambiente tornando a água imprópria para o a Amazônia, uma questão ambiental, social e econômica
consumo e contribuíram para incidência de focos do mos- (Agência Fapesp). Nesse documentário pode-se, também,
quito Aedes aegypti e seus surtos de dengue, febre chikun- perceber como a influência climática interfere nos espaços
gunya e zika vírus. A maior parte das doenças relacionada agrários produtivos e de manutenção do meio ambiente.
à falta de saneamento básico se desenvolve devido à água (Página 27, quinto parágrafo)
contaminada. (Página 19, segundo parágrafo)
Materiais
A formação do mundo ocidental contemporâneo
Segundo pesquisadores brasileiros, os resíduos
África, Ásia e América Latina foram submetidas da mineração encontrados após o rompimento da barra-
e expostas a situações dramáticas, relacionadas à expan- gem em Mariana, contêm metais pesados, como chumbo,
são dos modelos capitalistas industriais europeus e norte bário, zinco, manganês, alumínio, cromo e ferro, nocivos
americano em sua fase imperialista. Reflexões acerca des- à saúde e ao ambiente. Esse fato é abordado no artigo O
sa temática estão presentes em: O Sal da Terra (Beto Gue- rompimento da barragem de Mariana e seus impactos
des), Cabaça d’água (Alberto Salgado), O rompimento da socioambientais (Luciano M. N. Lopes), exemplificando o
barragem de Mariana e seus impactos socioambientais desrespeito ao Artigo 6º da Constituição Federal. (Página
(Luciano M. N. Lope), Um Inimigo do Povo (Henrik Ibsen) 30, quarto parágrafo)
e Conservar a Amazônia, uma questão ambiental, social
e econômica (Agência FAPESP), ao criticarem os impactos
sociais e ambientais relacionados ao Imperialismo. (Pági-
na 23, primeiro parágrafo)

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Questões, Justificativas e Dicas


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Anotações e Rascunhos

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Entrevista - Edgar Dutra Zanotto: Um
Olhar na Ciência, Outro na Indústria

Autoria e Contextualização
Como se trata de uma entrevista sobre o pesqui- Uma das características da trajetória de Zanotto é o inte-
sador e sobre sua pesquisa científica, não há que se falar resse simultâneo pela ciência básica e aplicada. “Sempre
sobre o autor, haja vista que a entrevista já relata os pon- trabalhei com um pé em cada uma”, diz. A formação em
tos importantes sobre sua vida e sobre a pesquisa, pois física e engenharia o ajuda tanto a formular e testar hipó-
esta também é retratada. teses científicas como a desenvolver vidros especiais para
a indústria ou com funcionalidades para o organismo hu-
Vale destacar, porém, antes da transcrição inte- mano, como os biovidros.
gral da obra, a importância da ciência no desenvolvimen-
to da indústria, seja na indústria do vidro ou quaisquer Natural de Botucatu (SP) e há 42 anos professor na UFS-
outras áreas. Car, Zanotto foi professor visitante em universidades da
Europa e Estados Unidos e consultor científico de em-
Fica claro que o entrevistado, o cientista Edgar presas do Brasil e exterior, produtoras de vários tipos de
Dutra Zanotto, pautou sua carreira toda dentro e fora vidro. Desde 2013 coordena o Centro de Pesquisa, Educa-
dos laboratórios, aplicando toda a informação bem ção e Inovação em Vidros (CeRTEV), um dos 17 Centros
como conhecimento produzidos e conquistados além de de Pesquisa, Inovação e Difusão (Cepid) financiados pela
continuar produzindo academicamente, mesmo depois FAPESP, que reúne pesquisadores da UFSCar, USP e Uni-
de décadas de atuação. Afinal, a ciência tem uma função versidade Estadual Paulista (Unesp), campus de Araraqua-
muito mais social do que formal e é importante que a ra. E desde 2017 preside o Conselho Científico do Institu-
comunidade acadêmica absorva essa ideia. to Serrapilheira, do Rio de Janeiro. As duas experiências o
incentivaram a investir de modo mais intensivo na difusão
Obra da ciência.

Edgar Dutra Zanotto: Um olho na ciência, outro na in- Na entrevista abaixo, Zanotto, casado e pai de duas filhas,
dústria conta de seu trabalho mais atual e de uma proposta ousa-
da, publicada em 2017, sobre um novo status da matéria,
Engenheiro conta como a inteligência artificial ajudará a o estado vítreo.
criar novos vidros e explica sua definição desse material
Como é sua pesquisa mais recente, de desenvolvimento
O engenheiro de materiais Edgar Dutra Zanotto gosta de de inteligência artificial para ganhar tempo no laborató-
citar um artigo científico para mostrar como os vidros são rio?
importantes. “Vidros são os olhos da ciência”, afirma, tra-
duzindo o título do paper (“Glass: The eye of science”). A Focamos em previsão. Quase 100% da ciência trata de
tese é do norte-americano Marvin Bolt, curador de Ciên- entender e descrever fenômenos naturais. Cada vez que
cia e Tecnologia do Museu de Vidro de Corning, cidade do entendemos e descrevemos algo novo, podemos pu-
estado norte-americano de Nova York. Em texto de feve- blicar um artigo científico. Já prever seria o ideal, mas é
reiro de 2017, escrito para o periódico International Jour- muito difícil. Se conseguirmos antever um fenômeno ou
nal of Applied Glass Science, Bolt advoga que a revolução tendência corretamente, não precisaremos dedicar um
científica iniciada no século XVII teve como ferramentas tempo enorme, recursos financeiros e energia realizan-
mais importantes o microscópio e o telescópio – sendo do um grande número de experimentos. No momento,
o elemento principal dos dois instrumentos as lentes de trabalhamos com alunos e pós-doutores, os professores
vidro. Pedro Rino e André Moura, da UFSCar, e André Ponce de
Leon, do CeMEAI [Centro de Ciências Matemáticas Apli-
Quando começou a se interessar pelo assunto, em mea- cadas à Indústria, Cepid sediado na USP de São Carlos],
dos dos anos 1970, Zanotto não tinha essa compreen- com simulação computacional para predizer fenômenos
são, mas percebeu que esse era um objeto de pesquisa relacionados à estrutura, processos dinâmicos e proprie-
interessante e pouco pesquisado no Brasil. Formado em dades de vidros. Se funcionar, será possível criar vidros
engenharia de materiais na Universidade Federal de São não existentes em um tempo significativamente reduzido.
Carlos (UFSCar) em 1976, foi no Instituto de Física de São Os dois primeiros artigos estão sendo redigidos, em fase
Carlos da Universidade de São Paulo (USP) e na Universi- de ajustes. Um pós-doc do nosso grupo, Daniel Cassar, co-
dade de Sheffield, no Reino Unido – onde cursou mestra- letou cerca de 55 mil dados de temperatura de transição
do e doutorado, respectivamente –, que o então jovem vítrea para iniciar esse estudo.
pesquisador achou as melhores referências para começar
sua carreira. “Se nossa estratégia funcionar, será possível criar novos
vidros em tempo muito mais reduzido”

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Do que se trata? No ano passado você advogou um novo status da matéria,


o estado vítreo, algo que não é sólido nem líquido. O que
O vidro é um material rígido feito da mistura de vários é, então?
reagentes que geralmente são fundidos e resfriados rapi-
damente evitando a cristalização. Assim, os átomos ficam Vou começar respondendo com outra pergunta: qual a
presos em um estado de desordem, formando um líqui- diferença entre informação e conhecimento? Obtemos
do temporariamente congelado, o vidro. Já na estrutura uma informação em determinada época, depois outra e
cristalina, os átomos estão perfeitamente organizados, outra… Elas vão sendo acumuladas com o passar do tem-
formando um sólido. A cristalização é um processo que po. Ao juntá-las e conectá-las, alcançamos o conhecimen-
ocorre naturalmente em todos os vidros, mas pode levar to. Foram 40 anos estudando e pesquisando para ter o
de segundos a milênios dependendo da temperatura. insight, refletir e redigir esse artigo sobre o estado vítreo,
Quando aquecidos, todos os vidros sofrem um fenôme- publicado no Journal of Non-Crystalline Solids [JNCS].
no chamado transição vítrea, ou Tg – temperatura onde
ocorre uma transformação entre a rigidez e um líquido Quais são eles?
de alta viscosidade –, que está relacionada a sua compo-
sição química. Para desenvolver um vidro com novas fun- O primeiro é sobre a estrutura atômica do vidro, que é
cionalidades, sem gastar demasiado tempo e energia em igual à do líquido do qual ele advém. O vidro é um líquido
testes experimentais, é fundamental conhecer a Tg, além congelado temporariamente sem cristalizar. Depois vem o
de outras propriedades. A partir dessa ideia, o Daniel con- conceito de relaxação estrutural – um rearranjo espontâ-
seguiu pescar na literatura dos últimos 50 anos trabalhos neo e parcial das moléculas no material – e, finalmente, a
contendo a composição química e as respectivas Tg. Ele cristalização, quando todos os átomos e moléculas ficam
compilou 55 mil composições de diferentes vidros óxidos alinhados em um padrão tridimensional bem definido.
– hoje há catalogados 400 mil vidros. Com o auxílio do es- Isso acontece com todos os vidros, que se cristalizarão em
pecialista em inteligência artificial André Ponce de Leon, mais ou menos tempo. Em quanto tempo? Em tempera-
ele criou um algoritmo que foi “treinado” a correlacionar turas relativamente altas, leva apenas algumas horas. Em
a Tg com a composição química de 45 mil desses vidros. temperatura ambiente, é muito difícil saber com precisão;
Em seguida, usamos dados dos outros 10 mil vidros, que precisaremos realizar cálculos e simulações. Portanto, os
não foram utilizados na etapa de treinamento, para tes- elementos dessa nova definição do vidro proposta no arti-
tar a habilidade do novo algoritmo em prever a Tg e com- go de 2017 são que a estrutura molecular dele é igual à do
paramos com os valores reportados para ver se estariam líquido-mãe, com os átomos congelados na mesma posi-
certos. A rede neural resultante pode ser otimizada, mas, ção, bem diferente da do cristal. Com o tempo, o vidro
no momento, ela leva a um erro máximo de 6%, em 90% relaxa espontaneamente até cristalizar. Se estiver numa
dos testes, o que é um ótimo resultado porque se igua- temperatura perto da Tg, cristalizará em minutos ou ho-
la ao erro típico dos próprios dados experimentais. Com ras, se estiver muito abaixo, levará muito mais tempo.
esse software será possível prever a Tg de qualquer vidro
Esses conceitos já existiam?
óxido ainda não existente. A mesma lógica poderá ser
aplicada para previsão de outras propriedades físico-quí- Pesquisadores da área vêm refletindo sobre esses con-
micas de vidros. ceitos, mas ninguém havia combinado todos eles, como
John Mauro [da Universidade do Estado da Pensilvânia,
Por que esse programa permitirá ganhar tempo?
Estados Unidos] e eu fizemos. Redigi a primeira versão do
Em 2004 publiquei um artigo com o Chico Coutinho [o artigo e o John entrou durante o processo. Juntamos as
físico Francisco Bezerra Coutinho, da Faculdade de Me- informações e esclarecemos a natureza do vidro.
dicina da USP] em que calculamos quantas composições
Como foi essa parceria?
de vidros seriam possíveis usando 80 elementos químicos
“amigáveis”. Para fazer uma conta redonda, variamos de Apresentei essas ideias em uma plenária no evento de
1% em 1% a composição, combinando aqueles elementos comemoração do centenário da Society of Glass Tech-
de modo variado. Nesse exercício de previsão, calculamos nology, realizado em Sheffield, em setembro de 2016.
que seria possível obter 1052 tipos de vidros, um número O indo-americano Arun Varshneya, da Alfred University,
astronômico. Os 400 mil – ou 4 x 105 – vidros inorgânicos conhecido como o “guru do vidro” e meu amigo há mui-
já conhecidos representam apenas uma minúscula fração to tempo, disse logo de cara: “Não concordo com esse
desse total. Precisaríamos de infindáveis anos e recursos pacote, precisamos discutir”. Conversamos muito em
para produzir 1052 vidros. Seria inviável. A saída é realizar Sheffield e, quando voltei ao Brasil, decidi escrever um
simulações computacionais até encontrarmos fórmulas rascunho. Enviei ao Arun, que convidou para a discussão
interessantes que possam resultar em propriedades inu- um primo dele, o Prabhat Gupta, da Universidade do Es-
suais. Aí, sim, iremos para o laboratório testar cada com- tado de Ohio, Estados Unidos, um teórico muito bom. O
posição e verificar se elas realmente fornecem as proprie- Arun também introduziu na discussão o John Mauro, que
dades que o software indicou. havia sido o seu mais brilhante aluno de doutorado – foi
um dos inventores do Gorilla glass, vidro usado em tele-

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fones celulares. Depois de uma dúzia de e-mails trocados ópticas, ou seja, o vidro por excelência, em que acrescen-
com eles, convidei todos a participar como coautores, tamos impurezas para alterar as propriedades, mudamos
mas eles não responderam. Imaginei que fosse um sinal a cor, a absorção etc.; e, finalmente, materiais para pro-
de que não concordavam com a minha proposta. Isso foi cessos catalíticos.
em outubro de 2016. Em dezembro, eu estava acabando
de polir o manuscrito quando o John Mauro me enviou As pesquisas sobre biovidro continuam?
mensagem de votos natalinos e perguntando que fim
Sim, esse material é muito promissor. Foi inventado no
havia levado o artigo. Respondi que estava quase pron-
começo dos anos 1970 com uma composição química
to, assinado apenas por mim porque eles não quiseram que tem sódio, silício, cálcio e fósforo. Isso deixa o vidro
participar. Ele imediatamente respondeu que continuava com uma bioatividade alta quando em contato com flui-
interessado. Entre o Natal e o Ano-Novo o artigo ficava dos corporais. Eles podem ser usados na regeneração de
um dia com cada um até ficar pronto e ser submetido à ossos, como próteses, problemas dentários e também fe-
publicação. Há algumas semanas, o paper já tinha recebi- ridas de pele e degeneração de nervos e cartilagens. Em
do mais de 7 mil visualizações. Para um artigo científico pó, funciona como uma espécie de cola. Algumas dessas
de uma pequena subárea da ciência de materiais é muita possíveis utilidades já são funcionais. Há, por exemplo,
coisa. Para dar uma ideia quantitativa, o site do JNCS tem um osso ilíaco artificial feito de vitrocerâmico bioativo
26 mil artigos e todos podem ser baixados. Desde a sua para ser implantado no quadril. Foi desenvolvido por Ta-
publicação até esta data [24/6/2018], o nosso paper está dashi Kokubo, da Universidade de Chubu, no Japão. Se-
em primeiro lugar dentre todos no ranking de downloads. gundo ele, foi implantado em milhares de pessoas. Aqui
na UFSCar, com o auxílio de dois ex-alunos, hoje profes-
Qual o tamanho da comunidade que estuda vidros? sores, Oscar Peitl e Murilo Crovacce, e vários pós-docs,
com destaque para Marina Trevellin, e alunos, criamos
Estimativas indicam que há cerca de 3 mil pesquisadores um biovitrocerâmico semelhante aos ossículos do ouvi-
vidreiros no mundo, e apenas de 100 a 120 no Brasil estu- do médio usado para substituir aqueles que apodrecem
dando e publicando regularmente nessa área. Desses, o quando alguém contrai uma infecção severa. Realizamos
nosso CeRTEV tem 14 professores e 60 alunos e pós-docs. ensaios clínicos bem-sucedidos na Faculdade de Medicina
No exterior, há empresas com muito mais pesquisadores, da USP de Ribeirão Preto, conduzidos pela equipe do mé-
mas nas universidades há poucos grupos de porte. Co- dico Eduardo Tanaka Massuda, mas precisamos realizar
nheço apenas um, enorme, em Rennes, na França, maior mais testes para conseguir aprovação da Anvisa [Agência
que o nosso. Na China há, possivelmente, grupos maiores Nacional de Vigilância Sanitária]. Este aqui [mostra uma
porque eles publicam até mais do que os americanos nes- peça] é outro exemplo: é um olho artificial feito de mate-
se tema. No Japão, Estados Unidos e Europa há de um a rial bioativo e patenteado. Depois de implantado, ele se
três professores em cada grupo. Por essas razões, estimo liga aos nervos da cavidade ocular para dar um movimen-
que nossa equipe está entre as cinco maiores do mundo. to natural igual ao olho bom. Realizamos bons ensaios
Quando o Hellmut Eckert [químico alemão, vice-coorde- clínicos na Faculdade de Medicina da Unesp, campus de
nador do CeRTEV e professor da USP de São Carlos] e eu Botucatu, liderados por Silvana Schellini e Simoni Milani
formamos o grupo do Cepid, o centro ganhou visibilidade Brandão. Mas também precisamos continuar com os tes-
internacional. tes.

Você publica no JNCS, do qual é editor. Não há conflito de


Essa visibilidade vale para as áreas científica e tecnológi-
interesses?
ca?
Comecei como editor em 2010, mas já havia publicado
Para as duas. Sobre pesquisas de cunho fundamental,
cerca de 70 artigos nesse periódico antes disso. É a mi-
científico, temos um grupo que usa técnicas distintas para nha revista favorita por estar estabelecida há 50 anos, ser
caracterizar os detalhes estruturais do vidro. A estrutura muito rigorosa – rejeita 2/3 das submissões –, com tempo
e a composição química são o conjunto que determina as médio de resposta de apenas seis semanas, e principal-
propriedades ópticas, mecânicas, térmicas, magnéticas, mente por ser lida e respeitada pela comunidade que pes-
químicas e biológicas do material. Esse grupo também quisa vidros. Quando fui convidado, respondi à publisher
trabalha nos processos dinâmicos, um conjunto de me- Karine Van Wetering, da Elsevier, que aceitaria ser o edi-
canismos que ocorrem quando aquecemos o vidro – os tor apenas se pudesse continuar publicando no periódi-
átomos começam a se deslocar, relaxar, fundir ou cristali- co. Ela me respondeu que não haveria problema porque
zar. E essa é a área em que mais atuo, a cristalização. Estu- seríamos três editores. São eles que encaminham meus
damos a estrutura e os processos dinâmicos e essas duas papers para revisores ad-hoc sem que eu saiba quem são.
áreas determinam as propriedades e aplicações, divididas Ela gostaria que eu e os outros editores continuássemos a
em cinco tópicos, no nosso Cepid: as propriedades mecâ- publicar lá porque os leitores devem perceber que o edi-
nicas, que tentamos entender para desenvolver vidros e tor valoriza a revista que edita.
vidros cerâmicos cada vez mais fortes e resistentes, algo
que tem uma demanda industrial mundial; as elétricas, Como se interessou por vidros?
com vidros condutores iônicos, com potencial de aplica-
ção em novas e eficientes baterias; os biovidros, feitos de Sou da terceira turma formada em engenharia de mate-
material bioativo para ser usados em organismos vivos; as riais da UFSCar, que criou o curso em 1970, o primeiro da

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América Latina. Naquele tempo não havia muitos profes- máquina. Há apenas três empresas que produzem esse
sores disponíveis nessa área. Por isso, a UFSCar convidava material. Esta pequena peça custa US$ 5 mil. Ela já existia
professores visitantes. Vinha gente da USP, da Unicamp e e ajudei a otimizá-la. O material foi inventado pelo pes-
muitos do exterior. Um deles, Osgood James Whittemo- soal da empresa Corning e passou a ser melhorado e pro-
re [1919-2010], da Universidade de Washington, Estados duzido pela Optigrate, uma fábrica de Orlando, na Flórida.
Unidos, me convidou para trabalhar em um projeto de Passei 10 meses lá em 2005, a convite, enquanto usufruía
iniciação científica. Era um estudo experimental sobre a de um período sabático na Universidade da Flórida Cen-
durabilidade química de vidros candidatos ao encapsu- tral. O material deles era ruim, não vendia porque espa-
lamento de resíduos radioativos. O objetivo era coletar lhava luz demasiadamente. Além da colaboração, eles me
rejeitos de usinas nucleares, adicionar reagentes, fundir permitiram publicar alguns artigos. Isso não é muito co-
tudo e resfriar rapidamente formando um “vidrão”. O mo- mum em razão da cláusula de sigilo que há nos contratos
nólito resultante ficaria compacto e impermeável e seria com empresas.
enterrado em uma mina de carvão abandonada a muitos
metros abaixo do solo, mas bem separado do ambiente “Gravo todas as minhas aulas e as disponibilizo na inter-
superficial, encapsulado, sem contaminar a atmosfera e net. O efeito, para os alunos, tem sido fantástico”
o lençol freático. Esse método é usado até hoje. Comecei
então a estudar vidros. Peguei livros na biblioteca e come- Você tem muitos vídeos didáticos sobre vidro gravados.
cei a ler papers. Fiquei interessadíssimo. Também pude Por quê?
praticar bastante o inglês. Essas atividades me renderam
São dois tipos de vídeo: aulas formais e de disseminação
uma vaga de professor auxiliar de ensino no Departamen-
de ciência. Gravo todas as minhas aulas e as disponibilizo
to de Engenharia de Materiais [DEMa] da UFSCar.
na internet. O efeito é fantástico. Se um aluno perde uma
Foi a única razão por ter sido contratado tão novo, aos 22 aula, basta assistir o vídeo. Para estudar para uma prova,
anos? está lá. Produzimos também vídeos bem didáticos, de 1
a 5 minutos, explicando conceitos e experiências com vi-
Eu era um aluno aplicado, falava inglês e pesquisava vi- dros, e temos mangás com esse tema impressos e na pá-
dros. O DEMa precisava de professores nessa área e não gina do CeRTEV. Começamos a fazer divulgação de ciência
existiam especialistas. Como eu só tinha a graduação, em consequência das exigências do Cepid. Tem sido uma
recebi um ultimato do chefe do departamento, Dyonísio prazerosa e educativa experiência.
Garcia Pinatti [1946-1986]: “Você tem dois anos para fa-
zer um mestrado em qualquer tema relacionado a vidros O Instituto Serrapilheira, do qual você é membro, tem
para, em seguida, ir para o exterior realizar o doutorado, preocupações na mesma linha, não é?
voltar e nuclear o grupo de vidros”. Por sorte, provavel-
Branca e João Moreira Salles, criadores e mantenedores
mente o único pesquisador que trabalhava com vidros no
do instituto, a diretoria, os conselhos Científico e de Ad-
Brasil era o Aldo Craievich, da Física da USP de São Carlos.
ministração, todos esperam que os pesquisadores e bol-
Devo muito da minha formação científica ter realizado o
sistas apoiados, que tenham esse desejo e essa vocação,
mestrado em física com ele. Em seguida Aldo me indicou
realizem atividades de divulgação científica. Este ano foi
para um conhecido dele, o então famoso físico Peter Ja-
aberta uma chamada pública para o primeiro programa
mes [1940-2005], da Universidade de Sheffield. Consegui
de apoio à divulgação, o Camp Serrapilheira, para formar
uma bolsa da Capes [Coordenação de Aperfeiçoamento
divulgadores e também mapear e selecionar projetos de
de Pessoal de Nível Superior] e fui fazer o doutorado com
divulgação a serem financiados.
o Peter de 1979 a 1982. Na época eles tinham o maior
time de pesquisadores do planeta em vidros. A experiên- Acredita que o instituto poderá fazer diferença no finan-
cia foi fundamental para a minha formação. ciamento à ciência?
Como ocorre a colaboração de seu grupo com as empre- Sim. No momento o Serrapilheira se esforça para nuclear
sas? grupos de pesquisa liderados por jovens pesquisadores
promissores que demonstrem potencial de realizar pes-
Em todos os níveis. Podemos descobrir algo interessan-
quisa de alto nível, na fronteira do conhecimento, em
te e procurar empresas potencialmente interessadas em
temas relevantes. A previsão inicial é aplicarmos entre
realizar ensaios em escala piloto e em licenciar o invento.
R$ 16 milhões e R$ 18 milhões anualmente. O modelo
Outras vezes, é a empresa que nos procura. Por exemplo,
de financiamento é um sonho para o pesquisador, muito
auxiliamos a aperfeiçoar este material [mostra um vidro
mais flexível do que o de qualquer instituição pública de
de 1 centímetro quadrado e o ilumina com um laser] que
fomento à pesquisa. O sistema de seleção de projetos é
difrata a luz. Dentro dele há cristais nanométricos alinha-
rigoroso, mas o pesquisador que recebe um grant [auxí-
dos a uma distância igual ao comprimento da luz visível,
lio para pesquisar] pode aplicá-lo em qualquer atividade
cerca de 400 nanômetros entre um e outro. Este é o único
de pesquisa. Por exemplo, admitir outros pesquisadores,
material do mundo para redes de difração de lasers de
comprar equipamento e material de consumo, contratar
alta potência. Há um holograma de cristais aqui dentro.
serviços ou viajar por alguma necessidade da pesquisa.
Qualquer sistema de alta potência, como lasers indus-
Isso tudo sem precisar reenviar currículos, subprojetos ou
triais, por exemplo, requer várias peças dessas dentro da

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estimativa de custos, cotações para análise… Além disso, terminado tema, em que o discurso direto é sua princi-
a trabalhosa etapa de prestação de contas é realizada por pal característica.
uma fundação, não pelo pesquisador. Damos total flexibi-
lidade porque confiamos nos pesquisadores e desejamos Ou seja, as palavras proferidas pelo entrevistado
que eles dediquem a maior parte do tempo à pesquisa, e o entrevistador são transcritas de maneira fidedigna e,
não à administração de projetos. É diferente dos órgãos portanto, pode haver muitas marcas de oralidade bem
públicos que normalmente desconfiam do pesquisador. como observações (geralmente entre parênteses) que
Por exemplo, tenho 42 anos de experiência em pesquisa, descrevem as ações de ambos, por exemplo: (risos).
coordeno um Cepid, sou membro da ABC [Academia Bra-
sileira de Ciências] e quando peço uma bolsa de iniciação No entanto, é notório um tipo de formalismo nas
científica para qualquer agência pública tenho de escre- entrevistas, exposto pela linguagem utilizada entre am-
ver um projeto, mandar meu currículo atualizado, o do bos, com apresentação de um discurso coerente.
aluno… É uma burocracia massacrante. No Serrapilheira
nós confiamos e damos liberdade ao pesquisador. Características da Entrevista

Você gosta de dizer que “defende pesquisador velho”. Por -Textos informativos e/ou opinativos;
quê?
-Presença do entrevistador e do entrevistado;
Pesquisadores “velhos” dedicaram 20, 30, 40 ou até 50
anos não só para coletar informações, mas principalmen-
-Linguagem dialógica e oral;
te para conectá-las, gerando conhecimento. É óbvio que -Marca do discurso direto e da subjetividade;
há jovens cientistas brilhantes que conseguem fazer a ne-
cessária conexão em menos tempo. Discuti várias vezes -Mescla da linguagem formal e informal.
esse tema com o Fernando Reinach, biólogo que também
é membro do Conselho de Administração do Serrapilhei-
ra. É desses que pensam que só pesquisadores jovens têm
futuro. Discordo. Defendo que pesquisadores seniores
ativos, os que continuam motivados na batalha diária da
pesquisa, desenhando e realizando experimentos, testan-
do hipóteses, criando modelos teóricos, participando de
congressos, orientando, publicando, ensinando e apren-
dendo – e também sendo criticados –, podem melhorar

Citações da Obra na Matriz de Referências
O ser humano como um ser que pergunta e quer saber

Quanto a procedimentos científicos e métodos,


destaca-se o tema da concepção de Ciência como saber
continuamente. A qualidade da minha pesquisa atual é
muito superior que a dos primeiros 10 ou 15 anos. Espero privilegiado, que trata seus objetos de modo dogmático e
continuar avançando nas próximas décadas. não crítico, como questionam o artigo Onde as cientistas
não têm vez (Revista Fapesp, edição 273 - novembro de
Gênero e/ou Estrutura 2018) e a entrevista Edgar Dutra Zanotto: um olho na
ciência, outro na indústria (Revista Fapesp, edição 269 -
A Entrevista é um dos gêneros textuais com fun- julho de 2018). Esses são pontos centrais para se ques-
ção geralmente informativa veiculado, sobretudo, pelos tionar a supremacia da tecnologia no mundo contempo-
meios de comunicação: jornais, revistas, internet, televi- râneo e para problematizar a desigualdade de gênero.
são, rádio, dentre outros. (Página 5, primeiro parágrafo)

Há diversos tipos de entrevistas dependendo da Energia e oscilações


intenção pretendida: a entrevista jornalística, entrevista
de emprego, entrevista psicológica, a entrevista social, Assim, a entrevista do cientista Edgar Dutra
entre outras. Elas podem fazer parte de outros textos Zanotto: um olho na ciência, outro na indústria (Revis-
jornalísticos como, por exemplo, a notícia e a reporta- ta Fapesp, edição 269 - julho de 2018), especialista em
gem. vidros, cita a revolução causada por esses instrumentos
capazes de desvendar fenômenos, até então impossíveis
Trata-se de um texto marcado pela oralidade de serem vistos a olho nu, possibilitando novas interpreta-
produzido pela interação entre duas pessoas, ou seja, ções dos fenômenos físicos. É comum caracterizar o vidro
o entrevistador, responsável por fazer perguntas, e o como um corpo sólido, porém isso pode ser desmistificado
entrevistado (ou entrevistados), quem responde às per- ao analisar os vidros de igrejas seculares, como a Igreja
guntas. São Francisco de Assis de Ouro Preto: estrutura arquitetô-
nica, pintura do teto e esculturas encravadas na estrutura
A Entrevista possui uma função social muito (Aleijadinho e Ataíde, século XVII), na qual fica evidente
importante, sendo essencial para a difusão do conheci- que os vidros são mais espessos na base, pois, como um
mento, a formação de opinião e posicionamento crítico líquido, escorreram, fluindo lentamente para a base com
da sociedade, uma vez que propõe um debate sobre de- o passar dos séculos. (Página 16, segundo parágrafo)

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A formação do mundo ocidental contemporâneo

Foi a partir do Iluminismo, considerado a base in-


telectual da Era das Revoluções, que ocorreram as ruptu-
ras mais drásticas e profundas em relação ao Antigo Regi-
me. Dentre os pensadores iluministas e as diversas obras
elaboradas por eles, vale destacar Resposta à pergunta:
O Que é o Esclarecimento? (Immanuel Kant,1783) e seu
grande potencial crítico, como uma obra representativa
das profundas transformações ocorridas nesse período.
Na entrevista Edgar Dutra Zanotto: Um olho na ciência,
outro na indústria, concedida à Revista Pesquisa-FAPESP,
edição 269, julho de 2018, o entrevistado aborda aspectos
pertinentes ao desenvolvimento do cientificismo, influen-
ciado pelos pensadores iluministas. (Página 20, quarto
parágrafo)

No cenário internacional, devem ser considera-


das as contradições entre áreas centrais e periféricas, a
situação da Europa e da América na segunda 23 metade
do século XIX, a Revolução Industrial seus impactos sociais
e tecnológicos. Parte dessas reflexões estão presentes na
entrevista Um olho na ciência, outro na indústria (Edgar
Dutra Zanotto). (Página 22, sétimo parágrafo)

Número, grandeza e forma

Representações numéricas, assim como de gran-


deza, estão presentes nos textos Entrevista - Edgar Zanot-
to: um olho na ciência, outro na indústria (Revista Fapesp
- Ed. 269, jul. 2018), O rompimento da barragem de Ma-
riana e seus impactos socioambientais (Revista Sinapse
Múltipla, v.5, n.1), Onde as cientistas não têm vez (Revista
Fapesp, ed. 273, nov. 2018), assim como na reportagem
Museu Nacional: em 10 anos, fogo dizima ao menos 8
prédios com tesouros culturais e científicos do país (BBC
Brasil). (Página 24, sexto parágrafo)

Materiais

A entrevista Um olho na ciência, outro na indús-


tria (Edgar Dutra Zanotto) conceitua e discorre sobre a
viabilidade e economia de tempo, com o uso de algorit-
mos, influenciando na realização de experiências na pro-
dução do vidro, tendo como matéria prima óxidos, sais,
água e outras substâncias inorgânicas. (Página 30, sexto
parágrafo)

Questões, Justificativas e Dicas


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Anotações e Rascunhos

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Onde as Cientistas Não Têm Vez

Autoria e Contextualização
A obra trata-se de uma reportagem em que o jor- na nos setores de Stem (sigla em inglês para designar as
nalista Rodrigo de Oliveira Andrade faz um levantamento disciplinas de Ciências, Tecnologia, Engenharia e Mate-
das pesquisas nacionais e internacionais que demons- mática). Os estudos citados indicam que 74% das mulhe-
tram e constatam os índices de baixa representatividade res se interessam por essas áreas, mas que apenas 30%
das mulheres no mundo da ciência, especificamente no se tornam pesquisadoras. Em relação às que ingressam
mundo STEM (sigla em inglês para ciência, tecnologia, no mercado de trabalho, 27% “sentem que não estão
engenharia e matemática). evoluindo em suas carreiras” e 32% desistem da sua área
um ano depois de concluírem a graduação. Outros dados
Além das pesquisas citadas, mostra, também, apontam que apenas 35% dos estudantes matriculados
trechos de falas da pesquisadora e professora Márcia em cursos de Stem são mulheres. Os fatores que cau-
Cristina Bernardes Barbosa, que, hoje, é uma das prin- sam desinteresse e desistência são muitos, desde a falta
cipais brasileiras na ciência (STEM) e que luta e pesquisa de apoio e incentivo durante a infância e vida escolar,
sobre a representatividade da mulher no mundo científi- passando pela baixa representatividade de mulheres em
co. A professora é graduada em física, tem 3 pós-douto- tais áreas, até situações como assédio e humilhação.
rados, um mestrado, um doutorado, além de inúmeros
outros títulos. Apesar do cenário adverso, felizmente uma série
de incentivos estão sendo lançados ao redor do mundo
Assim, além da reportagem na obra, há uma para aumentar a representatividade feminina na ciência.
entrevista oral da professora Márcia Cristina, na qual Um deles é o “Meninas na Ciência”, projeto de extensão
explica alguns dos motivos, constatados por ela e por da UFRGS, que tem como objetivo estimular o interesse
algumas outras pesquisas, de haver índices tão baixos de meninas e mulheres pela ciência e incentivar que as
de mulheres, em comparação com homens, nas áreas profissionais da área persistam em suas carreiras. Para
STEM. Dessa forma, vale a pena ouvir a entrevista, cujo que as cientistas “tenham vez” é necessário que esses
áudio consta na página em que há o link nas dicas de projetos sejam cada vez mais ampliados.
estudos.
A obra na Matriz
Como se trata de uma obra pequena, de fácil
compreensão e uma análise por si só, será transcrita na A matriz de referências do PAS 2 relaciona a tra-
íntegra. jetória de Marie Curie com o artigo da Revista Fapesp
para enunciar a desigualdade de gênero no meio acadê-
Marie Curie e “Onde as cientistas não têm vez” mico, apontando fatores tais como “patriarcado, machis-
mo e conservadorismo” que perpetuam as diferenças de
A primeira mulher a ganhar o nobel ainda é um oportunidades e acessos. O texto também aponta para a
ponto fora da curva. Marie Curie foi uma grande cien- falta de reconhecimento que várias cientistas sofreram
tista que causou uma verdadeira revolução no meio ao longo de suas carreiras, colocando Marie Curie como
científico, não apenas pela sua engenhosidade e gran- exceção: “única mulher a receber dois prêmios Nobel”.
des descobertas, mas também pelo seu pioneirismo em
um meio dominado por homens. Em 1903 ganhou o No-
bel de Física, juntamente com seu marido Pierre Currie
Obra
e com Antoine Becquerel, pelo seu trabalho investiga- As mulheres que iniciam um doutorado em áreas
tivo excepcional acerca da radioatividade. Em 1911 ga- de ciência, tecnologia, engenharia e matemática (STEM,
nhou o Nobel de Química pela sua descoberta de dois em inglês) são 12% menos propensas a terminar suas pes-
elementos químicos, os quais denominou polônio, em quisas, em comparação com os homens. A conclusão é de
homenagem a sua terra natal, e rádio. Marie foi, portan- um estudo do Departamento Nacional de Pesquisas Eco-
to, a primeira pessoa a ganhar os dois prêmios e, claro, nômicas dos Estados Unidos (NBER) e envolveu a avalia-
foi também a primeira mulher, desde então inspirou e ção dos dados de 2.541 estudantes que ingressaram em
continua inspirando inúmeras mulheres a seguirem a 33 programas de pós-graduação em seis universidades do
carreira de cientistas. Mas como é hoje a representativa estado de Ohio, entre 2005 e 2009. Os resultados tam-
feminina na ciência? bém indicam que a probabilidade de elas concluírem a
pós-graduação aumenta até 1 ponto percentual para cada
“Onde as cientistas não têm vez” acréscimo de 10% na proporção de mulheres que iniciam
o doutorado em alguma dessas áreas.
O artigo da Revista Fapesp aponta dados que nos
permitem ter uma noção da representatividade femini-

Tudo Sobre o PAS UnB 203


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Os achados parecem estar alinhados a outros da- do Maine, nos Estados Unidos, que não participou do es-
dos, como os divulgados em 2017 pela ONU Mulheres, tudo produzido pelo NBER, vai na mesma linha. Ao co-
entidade das Nações Unidas para a igualdade de gênero mentar os resultados do trabalho em entrevista à Science,
e o empoderamento feminino. No estudo Cracking the ela explica que as estudantes abandonam os cursos por
code: Girls’ and women’s education in science, technolo- fatores não relacionados à capacidade intelectual, mas
gy, engineering and mathematics, verificou-se que 74% por discriminação e falta de apoio, confiança e escassez
das mulheres se interessam por ciência, tecnologia, en- de modelos femininos em áreas com baixa representativi-
genharia e matemática. No entanto, apenas 30% delas se dade de mulheres.
tornam pesquisadoras nessas áreas. Para as que ingressa-
ram no mercado de trabalho, os dados indicam que 27% No Brasil, a discussão sobre a participação das
sentem que não estão evoluindo em suas carreiras, en- mulheres nas áreas STEM também desperta a atenção
quanto 32% desistem em até um ano depois de concluída de pesquisadores. É o caso de Márcia Cristina Bernardes
a graduação. Barbosa, do IF-UFRGS. Há quase duas décadas, ela de-
senvolve estudos com o propósito de analisar obstáculos
Na Austrália, um levantamento feito em 2016 que dificultam, ou mesmo impedem, maior participação
pelo Departamento de Inovação, Indústria, Ciência e das mulheres nessas áreas do conhecimento. Em um de
Pesquisa do governo constatou que apenas 16% dos pro- seus trabalhos, desenvolvido em parceria com a cientis-
fissionais que atuam nas áreas STEM são mulheres, das ta social Betina Stefanello Lima, analista de coordenação
quais 31% esperam deixar seu trabalho em até cinco de programas acadêmicos do Conselho Nacional de De-
anos. De acordo com dados da Sociedade de Engenheiras senvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), depois
Mulheres do país, mais da metade das mulheres que in- de analisados dados do Censo da Educação Superior de
gressam nessas áreas abre mão de suas carreiras em até 2010, constatou-se que as mulheres são maioria em 15
uma década. das 20 carreiras de graduação com maior número de re-
cém-formados.
As áreas STEM representam um dos setores da
economia e do mercado de trabalho que mais cresce no “Além disso, também são maioria entre os dis-
mundo, segundo a física Márcia Cristina Bernardes Barbo- centes nas universidades brasileiras e já compõem cerca
sa, professora titular do Instituto de Física da Universida- de 50% dos docentes nas instituições públicas, segundo o
de Federal do Rio Grande do Sul (IF-UFRGS), que há pelo mesmo censo”, destaca Márcia. “No entanto”, ela explica,
menos 15 anos estuda a sub-representatividade das mu- “este crescimento não está homogeneamente distribuído
lheres nessas áreas. No Brasil, ainda que sejam maioria entre as disciplinas. O percentual de mulheres nas áreas
nas universidades, a atuação das mulheres é incipiente. de STEM é muito pequeno e diminui desproporcional-
As diferenças de gênero na educação, visíveis desde o en- mente à medida que se avança na carreira”.
sino básico, tornam-se mais evidentes nos níveis mais al-
tos de ensino. O relatório da ONU destaca que as meninas Ao avaliar os bolsistas de produtividade em pes-
começam a perder o interesse pelas áreas STEM tão logo quisa (PQ) do CNPq entre 2001 e 2011, nas disciplinas de
ingressam nas escolas. A tendência se acentua no ensino física e medicina, elas observaram que o percentual de
médio, de modo que, atualmente, na educação superior, mulheres em física no nível mais básico, PQ-2, é de 10%.
as mulheres representam apenas 35% dos matriculados Esse número cai para 5% no nível PQ-1A, reservado a pes-
em cursos STEM no mundo. quisadores que demonstram excelência continuada na
produção científica e na formação de recursos humanos.
Na investigação recém-divulgada pelo NBER, ava- O mesmo se aplica para o caso da medicina. O percentual
liou-se o ambiente dos programas de doutorado em áreas de mulheres chega a quase 40% na categoria PQ-2, mas
STEM e sua contribuição para a desigualdade de gênero. também cai pela metade (20%) na PQ-1A.
Não foram identificadas evidências de que o desempenho
acadêmico das estudantes ou dificuldades financeiras Primeira e até hoje única mulher a coordenar o
contribuam para a manutenção da sub-representação das comitê de física e astronomia do CNPq, Márcia conta que
mulheres nesses cursos. Para Bruce Weinberg, professor desde cedo se acostumou a ser minoria na sala de aula.
de economia na Universidade Estadual de Ohio, em Co- “Em uma turma de 40 alunos, éramos apenas quatro mu-
lumbus, e um dos autores do trabalho, o problema parece lheres. Ao final do curso, em 1981, apenas eu me formei.
residir no fato de os cursos serem compostos majoritaria- ” Foi o que a motivou a desenvolver pesquisas sobre dis-
mente por homens, o que contribuiria para o estabeleci- paridades de gênero. Em um de seus estudos mais recen-
mento de um ambiente hostil às mulheres, envolvendo, tes, publicado em agosto na Anais da Academia Brasileira
muitas vezes, assédio sexual, humilhação, menosprezo de Ciências, ela e outras pesquisadoras do IF e da Escola
ou rejeição de ideias manifestadas, por exemplo, em reu- de Engenharia da UFRGS analisaram o perfil dos titulares
niões de laboratório. Segundo disse à Science, tais situa- da Academia Brasileira de Ciências. Constataram que, dos
ções, não raro, contribuem para que as estudantes se iso- 518 membros, 449 são homens. No campo da física e as-
lem do convívio social. tronomia, as mulheres compõem apenas 6% dos partici-
pantes, ao passo que entre os pesquisadores no topo da
Susan Gardner, diretora do Programa de Estudos carreira elas representam por volta de 5%.
sobre Mulheres, Gênero e Sexualidade na Universidade

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“As mulheres ainda são consideradas desprovi- o intuito de somente informar o leitor de um fato atual
das das habilidades tidas como necessárias para a produ- ocorrido.
ção de conhecimento científico”, comenta Márcia. “Não
raro, enfrentam preconceitos pautados em rótulos que as Em resumo, podemos dizer que a notícia faz par-
definem como sensíveis, emocionais, sem aptidão para o te do jornalismo informativo, enquanto as reportagens
cálculo ou para a abstração. ” Alguns países começaram a fazem parte do chamado jornalismo opinativo.
investir no desenvolvimento de estratégias de inclusão. O
Ministério da Ciência do Canadá, por exemplo, lançou em O repórter é a pessoa que está incumbida de
fevereiro de 2017 a campanha Choose Science. O objetivo apresentar a reportagem, a qual aborda temas da socie-
é incentivar as mulheres a conhecer melhor e optar por dade em geral.
áreas STEM. Também a Academia Australiana de Ciências
começou a desenvolver um plano para, em uma década, Por esse motivo, a reportagem é um texto que
aumentar o engajamento e a participação das mulheres. precisa de mais tempo para ser elaborado pelo repór-
Organizações como Girls Who Code, Engineer Girl, Girls ter, donde se desenvolve um debate sobre um tema, de
Can Code e @IndianGirlsCode, são alguns exemplos de modo mais abrangente que a notícia.
iniciativas para encorajar meninas e mulheres a explorar
essas áreas do conhecimento.

No Brasil, o movimento ainda é tímido. Um dos


casos mais conhecidos é o do projeto Meninas na Ciên-
cia, uma ação de extensão do IF-UFRGS lançado há cinco
anos, com o objetivo de atrair jovens para as carreiras em
STEM e estimular as mulheres que já escolheram essas
carreiras a persistirem e se tornarem agentes no desen-

Citações da Obra na Matriz de Referências
O ser humano como um ser que pergunta e quer saber

Quanto a procedimentos científicos e métodos,


destaca-se o tema da concepção de Ciência como saber
volvimento científico e tecnológico do Brasil. privilegiado, que trata seus objetos de modo dogmático
e não crítico, como questionam o artigo Onde as cientis-
Gênero e/ou Estrutura tas não têm vez (Revista Fapesp, edição 273 - novembro
de 2018) e a entrevista Edgar Dutra Zanotto: um olho na
A Reportagem é um gênero textual não literário. ciência, outro na indústria (Revista Fapesp, edição 269 - ju-
Ela é considerada um texto jornalístico veiculado pelos lho de 2018). Esses são pontos centrais para se questionar
meios de comunicação: jornais, revistas, televisão, inter- a supremacia da tecnologia no mundo contemporâneo e
net, rádio, dentre outros. para problematizar a desigualdade de gênero. (Página 5,
primeiro parágrafo)
A Reportagem é um tipo de texto que tem o in-
Tipos e gêneros
tuito de informar ao mesmo tempo que prevê criar uma
opinião nos leitores. Portanto, ela possui uma função so- Entende-se o termo gênero de várias formas: gê-
cial muito importante como formadora de opinião. nero como distinção de sexo, como classificação textual,
como classificação taxonômica, gênero artístico, entre
A Reportagem pode ser um texto expositivo, in- outras. Assim como existem tipos variados de textos, há
formativo, descritivo, narrativo ou opinativo. numerosos tipos de organização social, de figuras geo-
métricas, de linguagens e de manifestações artísticas. As
Desse modo, ela pode tanto se aproximar da no- peculiaridades a esse respeito, presentes nas diferentes
tícia quanto dos artigos opinativos, porém não deve ser áreas do conhecimento, acerca das questões de gênero,
confundida com eles. são abordadas nas músicas, nos textos e no artigo Onde
as cientistas não têm vez (Revista Fapesp, edição 273 -
Expositivo e informativo porque ele expõe sobre novembro de 2018). (Página 9, terceiro parágrafo)
um determinado assunto, com o intuito principal de in-
formar o leitor. A formação do mundo ocidental contemporâneo

Podem também ser textos descritivos ou narra- A obra literária Úrsula (Maria Firmina dos Reis)
tivos, uma vez que descrevem ações e incluem tempo, se destaca como uma voz de resistência à escravidão, à
espaço e personagens. condição do negro e ao papel da mulher na sociedade
sexista, apresentando um amplo painel da formação da
E por fim, é um texto opinativo, ou seja, o re- sociedade brasileira. O fato de essa importante escritora
pórter apresenta juízos de valor sobre o que está sendo brasileira permanecer à margem da tradição literária dia-
discorrido. loga com o artigo Onde as cientistas não têm vez (Revista
Pesquisa FAPESP, edição 273 de novembro de 2018) escri-
Geralmente são textos mais longos, opinativos to por Rodrigo de Oliveira Andrade, que destaca a falta
e assinados pelos repórteres, enquanto as notícias são de espaço para a produção intelectual feminina ainda nos
textos relativamente curtos e impessoais que possuem dias de hoje. (Página 22, quarto parágrafo)

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Número, grandeza e forma

Representações numéricas, assim como de gran-


deza, estão presentes nos textos Entrevista - Edgar Zanot-
to: um olho na ciência, outro na indústria (Revista Fapesp
- Ed. 269, jul. 2018), O rompimento da barragem de Ma-
riana e seus impactos socioambientais (Revista Sinapse
Múltipla, v.5, n.1), Onde as cientistas não têm vez (Re-
vista Fapesp, ed. 273, nov. 2018), assim como na reporta-
gem Museu Nacional: em 10 anos, fogo dizima ao menos
8 prédios com tesouros culturais e científicos do país (BBC
Brasil). (Página 24, sexto parágrafo)

Materiais

Na história da ciência, há registros de muitas


pesquisadoras com participação significativa em desco-
bertas que propulsionaram a evolução do conhecimento
científico, mas que não obtiveram reconhecimento por
suas descobertas pelo simples fato de serem mulheres.
O artigo Onde as cientistas não têm vez (Revista FAPESP,
ed. 273 – nov. 2018) ilustra a baixa presença numérica de
mulheres nas ciências, quando comparada à participação
de homens. (Página 32, quarto parágrafo)

Questões, Justificativas e Dicas


Quer acessar as questões, justificativas e dicas desta obra?

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Anotações e Rascunhos

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Lei Maria da Penha - Lei nº 11.340
/2006

Autoria e Contextualização
A Lei Maria Da Penha, sancionada em 7 de agos- Hoje, esta lei é considerada pela ONU como uma
to de 2006 pelo ex-presidente Lula, foi feita visando criar das três melhores legislações de proteção à mulher no
mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar mundo.
contra a mulher e instituir apoio às vítimas de violência
doméstica. Cabe destacar que a lei não serve apenas para
mulheres cisgênero, mas também para mulheres trans-
O nome da lei 11.340/2006, Maria da Penha, foi sexuais. A lei serve para todas as pessoas que se identifi-
popularmente determinado em função da história de cam com o sexo feminino.
agressão sofrida pela farmacêutica chamada Maria da
Penha. Esta mulher foi a pessoa que deu início ao grande Algo que precisa ser configurado para haver en-
movimento que culminou na criação da lei. Assim, em quadramento na Lei Maria da Penha é a vítima estar em
que pese ela ser o ícone da criação da Lei, era só uma das relação de vulnerabilidade em relação ao agressor. Isso
milhares (ou milhões) de mulheres agredidas no Brasil significa que não precisa ser necessariamente o marido
diariamente. ou o companheiro, mas qualquer um que esteja em seu
convívio. Inclusive, agressão entre mulheres pode ser
A história da lei se mistura com a própria história considerada uma violência enquadrável na lei.
de Maria da Penha, pois essa sofria constantes e profun-
das violências no seu âmbito familiar. Maria sofreu pelo Além disso, não se trata apenas de agressão físi-
menos duas tentativas de homicídio, sendo que uma de- ca, mas também de toda e qualquer agressão psicológi-
las a deixou paraplégica e quando finalmente resolveu ca, sexual, patrimonial e moral:
criar coragem para denunciar seu marido, o agressor,
ela se deparou com uma situação muito comum com as • Por violência física entende-se como qualquer condu-
mulheres da época, que era o fechamento dos olhos da ta que ofenda sua integridade ou saúde corporal;
justiça para essas situações, deixando-as completamen- • Por violência psicológica entende-se como qualquer
te desamparadas. Naquele tempo, o sistema jurídico conduta que lhe cause dano emocional e diminuição
deixava o agressor sempre como parte privilegiada nos da autoestima ou que lhe prejudique e perturbe o ple-
processos, visto que negava tudo sob o argumento de no desenvolvimento ou que vise degradar ou contro-
que eram normais os desentendimentos dentro do casa- lar suas ações, comportamentos, crenças e decisões,
mento, permitia que o agressor respondesse em liberda- mediante ameaça, constrangimento, humilhação,
de e dava o ônus de provar os fatos e convencer os ma- manipulação, isolamento, vigilância constante, perse-
gistrados sempre à mulher, a vítima e, portanto, a parte guição contumaz, insulto, chantagem, violação de sua
mais frágil da relação. Esse foi o contexto enfrentado por intimidade, ridicularização, exploração e limitação do
Maria da Penha, que restou completamente injustiçada. direito de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe cau-
se prejuízo à saúde psicológica e à autodeterminação;
Insatisfeita, ela escreveu um livro, que acabou • Por violência sexual entende-se como qualquer con-
se tornando um dos marcos da criação da lei cujo título duta que a constranja a presenciar, a manter ou a
foi “Sobrevivi...posso contar”, em que narra os tipos de participar de relação sexual não desejada, mediante
violências sofridas não só por ela, mas por suas 3 filhas, intimidação, ameaça, coação ou uso da força; que a
durante muito tempo. induza a comercializar ou a utilizar, de qualquer modo,
a sua sexualidade, que a impeça de usar qualquer mé-
Além disso, ela decidiu ir além da justiça brasi- todo contraceptivo ou que a force ao matrimônio, à
leira, que até então não servia para outra coisa a não gravidez, ao aborto ou à prostituição, mediante coa-
ser privilegiar o agressor. Decidiu, por fim, acionar orga- ção, chantagem, suborno ou manipulação; ou que li-
nismos internacionais, que podiam pressionar o Brasil a mite ou anule o exercício de seus direitos sexuais e
fim de dar devida dignidade às mulheres. Anos depois, reprodutivos;
em 2002, a estratégia deu certo, pois o Brasil foi conde- • Por violência patrimonial entende-se como qualquer
nado por omissão e negligência pela Corte Internacional conduta que configure retenção, subtração, destrui-
de Direitos Humanos. Dessa forma, o país teve que se ção parcial ou total de seus objetos, instrumentos de
comprometer a reformular suas leis e políticas públicas trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direi-
em relação à violência no âmbito doméstico. O resulta- tos ou recursos econômicos, incluindo os destinados
do disso foi a justiça no caso da farmacêutica Maria da a satisfazer suas necessidades; e
Penha e a criação da Lei Maria da Penha, a Lei 11.340 de • Por violência moral entende-se qualquer conduta que
2006. configure calúnia, difamação ou injúria.

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Entre tantos outros diferenciais que a lei Ma- Art. 1o Esta Lei cria mecanismos para coibir e prevenir a
ria da Penha trouxe às mulheres e à sociedade em ge- violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos
ral, pode-se destacar o fato de que, por lei, depois que do § 8o do art. 226 da Constituição Federal, da Conven-
a mulher apresenta queixa na delegacia de polícia ou à ção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Violência
Justiça, o magistrado tem o prazo de até 48 horas para contra a Mulher, da Convenção Interamericana para Pre-
analisar a concessão de proteção ou não. Isso significa venir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher e de
um avanço enorme, diante do fato de que a justiça brasi- outros tratados internacionais ratificados pela República
leira é extremamente lenta. O ideal seria o atendimento Federativa do Brasil; dispõe sobre a criação dos Juizados
imediato, mas, em termos de demora de, literalmente, de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher; e esta-
anos para serem atendidas antes da Lei Maria da Penha, belece medidas de assistência e proteção às mulheres em
48 horas é um prazo bem menor. situação de violência doméstica e familiar.

Além disso, para a mulher vítima de violência, Art. 2o Toda mulher, independentemente de classe, raça,
a nova lei prevê atendimento médico e psicológico pelo etnia, orientação sexual, renda, cultura, nível educacional,
Sistema Único de Saúde (SUS). Para isso, determinou a idade e religião, goza dos direitos fundamentais inerentes
criação de um cadastro do governo feito especialmente à pessoa humana, sendo-lhe asseguradas as oportunida-
para mulheres que estejam em situação de violência fa- des e facilidades para viver sem violência, preservar sua
miliar, para que sua segurança seja garantida. saúde física e mental e seu aperfeiçoamento moral, inte-
lectual e social.
Para além das possibilidades de condenação,
depois que a vítima faz a denúncia, de imediato o juiz Art. 3o Serão asseguradas às mulheres as condições para
pode tomar algumas providências como a prisão pre- o exercício efetivo dos direitos à vida, à segurança, à saú-
ventiva do agressor em qualquer momento do inquérito de, à alimentação, à educação, à cultura, à moradia, ao
criminal ou do processo judicial, além do afastamento acesso à justiça, ao esporte, ao lazer, ao trabalho, à cida-
do lar; suspensão da posse legal de arma, se o agressor dania, à liberdade, à dignidade, ao respeito e à convivên-
tiver uma; proibição de aproximação da mulher ou de cia familiar e comunitária.
seus familiares; suspensão de visitas aos filhos menores
§ 1o O poder público desenvolverá políticas que visem
de idade; proibição de frequentar lugares em que possa
garantir os direitos humanos das mulheres no âmbito das
colocar a mulher em risco, entre outros.
relações domésticas e familiares no sentido de resguardá-
Por fim, cabe dizer que a Lei Maria da Penha foi -las de toda forma de negligência, discriminação, explora-
um avanço enorme na proteção da mulher. Mas é ape- ção, violência, crueldade e opressão.
nas um mecanismo legislativo. O que acabará com a
§ 2o Cabe à família, à sociedade e ao poder público criar
violência doméstica não é outra coisa senão a própria as condições necessárias para o efetivo exercício dos di-
conscientização da sociedade. reitos enunciados no caput.

Obra Art. 4o Na interpretação desta Lei, serão considerados os


fins sociais a que ela se destina e, especialmente, as con-
Como se trata de uma obra pequena e de fácil dições peculiares das mulheres em situação de violência
compreensão, será transcrita na íntegra: doméstica e familiar.
LEI Nº 11.340, DE 7 DE AGOSTO DE 2006. TÍTULO II
Cria mecanismos para coibir a violência doméstica e fa- DA VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MU-
miliar contra a mulher, nos termos do § 8o do art. 226 da LHER
Constituição Federal, da Convenção sobre a Eliminação de
Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres e CAPÍTULO I
da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erra-
dicar a Violência contra a Mulher; dispõe sobre a criação DISPOSIÇÕES GERAIS
dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a
Art. 5o Para os efeitos desta Lei, configura violência
Mulher; altera o Código de Processo Penal, o Código Pe-
doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação ou
nal e a Lei de Execução Penal; e dá outras providências.
omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão,
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou
Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei: patrimonial: (Vide Lei complementar nº 150, de 2015)

I - no âmbito da unidade doméstica, compreendida como


TÍTULO I
o espaço de convívio permanente de pessoas, com ou
DISPOSIÇÕES PRELIMINARES sem vínculo familiar, inclusive as esporadicamente agre-
gadas;

Tudo Sobre o PAS UnB 208


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II - no âmbito da família, compreendida como a comuni- IV - a violência patrimonial, entendida como qualquer
dade formada por indivíduos que são ou se consideram conduta que configure retenção, subtração, destruição
aparentados, unidos por laços naturais, por afinidade ou parcial ou total de seus objetos, instrumentos de traba-
por vontade expressa; lho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou re-
cursos econômicos, incluindo os destinados a satisfazer
III - em qualquer relação íntima de afeto, na qual o agres- suas necessidades;
sor conviva ou tenha convivido com a ofendida, indepen-
dentemente de coabitação. V - a violência moral, entendida como qualquer conduta
que configure calúnia, difamação ou injúria.
Parágrafo único. As relações pessoais enunciadas neste
artigo independem de orientação sexual. TÍTULO III

Art. 6o A violência doméstica e familiar contra a mulher DA ASSISTÊNCIA À MULHER EM SITUAÇÃO DE VIOLÊNCIA
constitui uma das formas de violação dos direitos huma- DOMÉSTICA E FAMILIAR
nos.
CAPÍTULO I
CAPÍTULO II
DAS MEDIDAS INTEGRADAS DE PREVENÇÃO
DAS FORMAS DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR
CONTRA A MULHER Art. 8o A política pública que visa coibir a violência do-
méstica e familiar contra a mulher far-se-á por meio de
Art. 7o São formas de violência doméstica e familiar con- um conjunto articulado de ações da União, dos Estados,
tra a mulher, entre outras: do Distrito Federal e dos Municípios e de ações não-go-
vernamentais, tendo por diretrizes:
I - a violência física, entendida como qualquer conduta
que ofenda sua integridade ou saúde corporal; I - a integração operacional do Poder Judiciário, do Mi-
nistério Público e da Defensoria Pública com as áreas de
II - a violência psicológica, entendida como qualquer con- segurança pública, assistência social, saúde, educação,
duta que lhe cause dano emocional e diminuição da auto- trabalho e habitação;
-estima ou que lhe prejudique e perturbe o pleno desen-
volvimento ou que vise degradar ou controlar suas ações, II - a promoção de estudos e pesquisas, estatísticas e ou-
comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça, tras informações relevantes, com a perspectiva de gênero
constrangimento, humilhação, manipulação, isolamen- e de raça ou etnia, concernentes às causas, às conseqü-
to, vigilância constante, perseguição contumaz, insulto, ências e à freqüência da violência doméstica e familiar
chantagem, ridicularização, exploração e limitação do contra a mulher, para a sistematização de dados, a serem
direito de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe cause unificados nacionalmente, e a avaliação periódica dos re-
prejuízo à saúde psicológica e à autodeterminação; sultados das medidas adotadas;

II - a violência psicológica, entendida como qualquer con- III - o respeito, nos meios de comunicação social, dos va-
duta que lhe cause dano emocional e diminuição da au- lores éticos e sociais da pessoa e da família, de forma a
toestima ou que lhe prejudique e perturbe o pleno desen- coibir os papéis estereotipados que legitimem ou exacer-
volvimento ou que vise degradar ou controlar suas ações, bem a violência doméstica e familiar, de acordo com o es-
comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça, tabelecido no inciso III do art. 1o, no inciso IV do art. 3o e
constrangimento, humilhação, manipulação, isolamen- no inciso IV do art. 221 da Constituição Federal;
to, vigilância constante, perseguição contumaz, insulto,
chantagem, violação de sua intimidade, ridicularização, IV - a implementação de atendimento policial especiali-
exploração e limitação do direito de ir e vir ou qualquer zado para as mulheres, em particular nas Delegacias de
outro meio que lhe cause prejuízo à saúde psicológica e Atendimento à Mulher;
à autodeterminação; (Redação dada pela Lei nº 13.772,
de 2018) V - a promoção e a realização de campanhas educativas
de prevenção da violência doméstica e familiar contra a
III - a violência sexual, entendida como qualquer conduta mulher, voltadas ao público escolar e à sociedade em ge-
que a constranja a presenciar, a manter ou a participar ral, e a difusão desta Lei e dos instrumentos de proteção
de relação sexual não desejada, mediante intimidação, aos direitos humanos das mulheres;
ameaça, coação ou uso da força; que a induza a comer-
cializar ou a utilizar, de qualquer modo, a sua sexualida- VI - a celebração de convênios, protocolos, ajustes, ter-
de, que a impeça de usar qualquer método contraceptivo mos ou outros instrumentos de promoção de parceria
ou que a force ao matrimônio, à gravidez, ao aborto ou entre órgãos governamentais ou entre estes e entidades
à prostituição, mediante coação, chantagem, suborno ou não-governamentais, tendo por objetivo a implementa-
manipulação; ou que limite ou anule o exercício de seus ção de programas de erradicação da violência doméstica
direitos sexuais e reprodutivos; e familiar contra a mulher;

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VII - a capacitação permanente das Polícias Civil e Militar, Parágrafo único. Aplica-se o disposto no caput deste arti-
da Guarda Municipal, do Corpo de Bombeiros e dos pro- go ao descumprimento de medida protetiva de urgência
fissionais pertencentes aos órgãos e às áreas enunciados deferida.
no inciso I quanto às questões de gênero e de raça ou et-
nia; Art. 10-A. É direito da mulher em situação de violência
doméstica e familiar o atendimento policial e pericial es-
VIII - a promoção de programas educacionais que disse- pecializado, ininterrupto e prestado por servidores - pre-
minem valores éticos de irrestrito respeito à dignidade da ferencialmente do sexo feminino - previamente capacita-
pessoa humana com a perspectiva de gênero e de raça dos. (Incluído pela Lei nº 13.505, de 2017)
ou etnia;
§ 1o A inquirição de mulher em situação de violência do-
IX - o destaque, nos currículos escolares de todos os níveis méstica e familiar ou de testemunha de violência domés-
de ensino, para os conteúdos relativos aos direitos huma- tica, quando se tratar de crime contra a mulher, obede-
nos, à eqüidade de gênero e de raça ou etnia e ao pro- cerá às seguintes diretrizes: (Incluído pela Lei nº 13.505,
blema da violência doméstica e familiar contra a mulher. de 2017)

CAPÍTULO II I - salvaguarda da integridade física, psíquica e emocional


da depoente, considerada a sua condição peculiar de pes-
DA ASSISTÊNCIA À MULHER EM SITUAÇÃO DE VIOLÊNCIA soa em situação de violência doméstica e familiar; (Incluí-
DOMÉSTICA E FAMILIAR do pela Lei nº 13.505, de 2017)
Art. 9o A assistência à mulher em situação de violência II - garantia de que, em nenhuma hipótese, a mulher em
doméstica e familiar será prestada de forma articulada e situação de violência doméstica e familiar, familiares e
conforme os princípios e as diretrizes previstos na Lei Or- testemunhas terão contato direto com investigados ou
gânica da Assistência Social, no Sistema Único de Saúde, suspeitos e pessoas a eles relacionadas; (Incluído pela Lei
no Sistema Único de Segurança Pública, entre outras nor- nº 13.505, de 2017)
mas e políticas públicas de proteção, e emergencialmente
quando for o caso. III - não revitimização da depoente, evitando sucessivas
inquirições sobre o mesmo fato nos âmbitos criminal, cí-
§ 1o O juiz determinará, por prazo certo, a inclusão da vel e administrativo, bem como questionamentos sobre a
mulher em situação de violência doméstica e familiar no vida privada. (Incluído pela Lei nº 13.505, de 2017)
cadastro de programas assistenciais do governo federal,
estadual e municipal. § 2o Na inquirição de mulher em situação de violência
doméstica e familiar ou de testemunha de delitos de que
§ 2o O juiz assegurará à mulher em situação de violência trata esta Lei, adotar-se-á, preferencialmente, o seguinte
doméstica e familiar, para preservar sua integridade física procedimento: (Incluído pela Lei nº 13.505, de 2017)
e psicológica:
I - a inquirição será feita em recinto especialmente pro-
I - acesso prioritário à remoção quando servidora pública, jetado para esse fim, o qual conterá os equipamentos
integrante da administração direta ou indireta; próprios e adequados à idade da mulher em situação de
violência doméstica e familiar ou testemunha e ao tipo
II - manutenção do vínculo trabalhista, quando necessário e à gravidade da violência sofrida; (Incluído pela Lei nº
o afastamento do local de trabalho, por até seis meses. 13.505, de 2017)
§ 3o A assistência à mulher em situação de violência do- II - quando for o caso, a inquirição será intermediada por
méstica e familiar compreenderá o acesso aos benefícios profissional especializado em violência doméstica e fami-
decorrentes do desenvolvimento científico e tecnológico, liar designado pela autoridade judiciária ou policial; (In-
incluindo os serviços de contracepção de emergência, a cluído pela Lei nº 13.505, de 2017)
profilaxia das Doenças Sexualmente Transmissíveis (DST)
e da Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (AIDS) e III - o depoimento será registrado em meio eletrônico ou
outros procedimentos médicos necessários e cabíveis nos magnético, devendo a degravação e a mídia integrar o in-
casos de violência sexual. quérito. (Incluído pela Lei nº 13.505, de 2017)
CAPÍTULO III Art. 11. No atendimento à mulher em situação de vio-
lência doméstica e familiar, a autoridade policial deverá,
DO ATENDIMENTO PELA AUTORIDADE POLICIAL entre outras providências:
Art. 10. Na hipótese da iminência ou da prática de vio- I - garantir proteção policial, quando necessário, comuni-
lência doméstica e familiar contra a mulher, a autoridade cando de imediato ao Ministério Público e ao Poder Judi-
policial que tomar conhecimento da ocorrência adotará, ciário;
de imediato, as providências legais cabíveis.
II - encaminhar a ofendida ao hospital ou posto de saúde
e ao Instituto Médico Legal;

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III - fornecer transporte para a ofendida e seus dependen- cleos Investigativos de Feminicídio e de equipes especiali-
tes para abrigo ou local seguro, quando houver risco de zadas para o atendimento e a investigação das violências
vida; graves contra a mulher.

IV - se necessário, acompanhar a ofendida para assegurar § 3o A autoridade policial poderá requisitar os serviços
a retirada de seus pertences do local da ocorrência ou do públicos necessários à defesa da mulher em situação de
domicílio familiar; violência doméstica e familiar e de seus dependentes. (In-
cluído pela Lei nº 13.505, de 2017)
V - informar à ofendida os direitos a ela conferidos nesta
Lei e os serviços disponíveis.

Art. 12. Em todos os casos de violência doméstica e fami-


liar contra a mulher, feito o registro da ocorrência, deve-
rá a autoridade policial adotar, de imediato, os seguintes
procedimentos, sem prejuízo daqueles previstos no Códi-
go de Processo Penal:

I - ouvir a ofendida, lavrar o boletim de ocorrência e to-



Citações da Obra na Matriz de Referências
O ser humano como um ser que pergunta e quer saber

O texto da Constituição Federal, Capítulo II, Direi-


tos Fundamentais, artigo 6° (Congresso Nacional Consti-
mar a representação a termo, se apresentada; tuinte - Brasil - 1988), a Declaração 5 Universal dos Direi-
tos Humanos e a Lei Maria da Penha, artigos 1º a 12-B
II - colher todas as provas que servirem para o esclareci- (Lei nº 11.340/2006) podem ser pensados em conexão
mento do fato e de suas circunstâncias; como os temas problematizados até aqui, como noções
de cidadania, direitos individuais, direitos sociais, entre
III - remeter, no prazo de 48 (quarenta e oito) horas, expe-
diente apartado ao juiz com o pedido da ofendida, para a outros. (Página 4, sétimo parágrafo)
concessão de medidas protetivas de urgência;
Indivíduo, cultura e mudança social
IV - determinar que se proceda ao exame de corpo de de-
A participação da mulher na política ou na vida
lito da ofendida e requisitar outros exames periciais ne-
social de forma pública, pode ser percebida em obras
cessários;
como O rapto de Prosérpina (Bernini), Maria Antonieta
V - ouvir o agressor e as testemunhas; com rosa (Le Brun), Jane Avril (Lautrec), Moema (Victor
Meirelles), Úrsula (Maria Firmina dos Reis), Precisamos
VI - ordenar a identificação do agressor e fazer juntar aos romper com os silêncios - TEDxSaoPauloSalon (Djamila
autos sua folha de antecedentes criminais, indicando a Ribeiro), Cota não é Esmola (Bia Ferreira) e Maria da Vila
existência de mandado de prisão ou registro de outras Matilde (Elza Soares) que trata da necessidade da desna-
ocorrências policiais contra ele; turalização da violência, permitindo um diálogo sobre a
Lei Maria da Penha. (Página 8, quinto parágrafo)
VII - remeter, no prazo legal, os autos do inquérito policial
ao juiz e ao Ministério Público. A formação do mundo ocidental contemporâneo

§ 1o O pedido da ofendida será tomado a termo pela au- Textos contemporâneos como a Constituição Fe-
toridade policial e deverá conter: deral, Capítulo II, Direitos Fundamentais, artigo 6° (Con-
gresso Nacional Constituinte - Brasil - 1988), a Declaração
I - qualificação da ofendida e do agressor; Universal dos Direitos Humanos (ONU,1948) e a Lei Ma-
ria da Penha, artigos 1º a 12-B (Lei nº 11.340/2006) são
II - nome e idade dos dependentes; bastante representativos no concernente aos conceitos e
noções de cidadania, direitos individuais, sociais, à pro-
III - descrição sucinta do fato e das medidas protetivas so-
priedade, à nacionalidade, como princípios influenciados
licitadas pela ofendida.
pelos acontecimentos relacionados à Era das Revoluções.
§ 2o A autoridade policial deverá anexar ao documento (Página 21, terceiro parágrafo)
referido no § 1o o boletim de ocorrência e cópia de todos
Espaços
os documentos disponíveis em posse da ofendida.
Os espaços de convivência e coletividade se for-
§ 3o Serão admitidos como meios de prova os laudos ou
mam por questões sociais e econômicas, além das ques-
prontuários médicos fornecidos por hospitais e postos de
tões geográficas. A escultura O rapto de Prosérpina (Ber-
saúde.
nini) ilustra tais aspectos e remete aos mitos gregos como
Art. 12-A. Os Estados e o Distrito Federal, na formulação referência de organização dessas relações. As músicas
de suas políticas e planos de atendimento à mulher em Maria da Vila Matilde (Elza Soares) e Cota não é esmola
situação de violência doméstica e familiar, darão priori- (Bia Ferreira) permitem problematizar os espaços defini-
dade, no âmbito da Polícia Civil, à criação de Delegacias dos para cada grupo social, além de definir um espaço
Especializadas de Atendimento à Mulher (Deams), de Nú- que pode ser confrontado pelo protagonismo feminino.

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Essas percepções estão presentes, também nas pinturas


Maria Antonieta com rosa (Le Brun) e Moema (Victor Mei-
relles), na litogravura Jane Avril (Toulouse-Lautrec) e na
análise da Lei Maria da Penha, artigos 1º a 12-B – Lei nº
11.340/2006. (Página 27, quarto parágrafo

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Anotações e Rascunhos

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Declaração Universal dos Direitos Humanos
(ONU, 1948)

Autoria e Contextualização
A Declaração Universal dos Direitos Humanos Direitos Humanos. Dois anos depois, 1948, o texto final
(DUDH) foi proclamada em Paris na data de 10 de de- surgiu e foi aprovado.
zembro de 1948 pela Assembleia Geral das Nações Uni-
das. É um dos documentos mais importantes na história Desde sua aprovação final, a DUDH foi traduzida
dos direitos humanos, estabelecendo pela primeira vez em mais de 500 idiomas – o documento mais traduzido
a proteção universal dos direitos humanos. A DUDH não do mundo segundo o livro dos recordes – e inspirou as
tem um autor individual, mas foi elaborada por repre- constituições de muitos Estados e democracias recentes.
sentantes de diversas origens jurídicas e culturais de to- A sua importância é tal que especialistas concordam com
das as regiões do mundo. a necessidade de sua disseminação em todos os lugares,
independente de aspectos culturais como política ou
Cabe mencionar que a Assembleia Geral das modelo educacional adotado no local. Essa necessidade
Nações Unidas, órgão da Organização das Nações Uni- baseia-se no fato de que todo o ser humano é igual, in-
das que elaborou este documento, é um dos principais dependentemente de qualquer aspecto individual que
órgãos da ONU, pois é o único dos 6 órgãos em todos o cerque, e a DUDH existe com o objetivo de orientar
os países membros têm representação igualitária nas todas as sociedades do mundo a preservarem os direitos
deliberações em relação aos demais. O Brasil, a título humanos.
de curiosidade, faz parte deste órgão desde 1945 e foi o
primeiro país a se tornar membro, tendo a honra de dar No Brasil, a sua influência é tamanha que é pos-
abertura em todas as reuniões realizadas anualmente, sível observar trechos da Constituição Federal de 1988
em parte devido às ações do diplomata Osvaldo Aranha que são literalmente copiados e colados da DUDH, além
que foi crucial na articulação que levou a criação do Es- dos desdobramentos da mesma nas demais Leis do
tado de Israel, após o fim da Segunda Guerra Mundial. país, sem mencionar as centenas de organizações que
se articulam em torno da defesa e promoção dos direi-
A Organização das Nações Unidas, ONU, foi a en- tos humanos, baseando-se, principalmente, na mesma.
tidade intergovernamental expoente deste documento Exemplo recente é o da atuação dessas instituições na
tão marcante para os direitos humanos. Ela surgiu logo denúncia dos crimes cometidos pelo regime militar, que
após o fim da Segunda Guerra Mundial, em 24 de ou- usam a DUDH como base, principalmente no debate pú-
tubro de 1945, com o objetivo de tentar unir todas as blico sobre a violação dos direitos humanos, que atinge,
nações do mundo em prol de não permitir mais que as especialmente, grupos sociais mais vulneráveis.
futuras gerações chegassem ao nível de degradação que
havia se instalado durante o período da guerra em ques-
tão. E foi esse também o contexto em que se começou
Obra
a pensar e formular a Declaração Universal dos Direitos Diferente dos tratados e convenções interna-
Humanos. cionais, a Declaração Universal dos Direitos Humanos é
uma declaração de um órgão intergovernamental e não
É certo que antes a humanidade já teve outros uma deliberação de um órgão governamental, portanto,
documentos que tratavam da proteção dos direitos não é lei e não tem força de lei, mas é como uma nor-
humanos como, por exemplo, a Declaração de Direitos ma comum do Direito Internacional a ser alcançada por
Inglesa (elaborada em 1689, após as Guerras Civis In- todos os povos e nações. Apesar disso, a garantia dos
glesas, para pregar a democracia) e a Declaração dos Di- direitos humanos universais é feita por lei, na forma de
reitos do Homem e do Cidadão (redigida em 1789, após tratados e de leis internacionais, por exemplo, ou mes-
a Revolução Francesa, a fim de proclamar a igualdade mo pelas leis produzidas nos órgãos do poder Legislativo
para todos). Entretanto, um documento como a DUDH de cada país. Como já mencionado, portanto, apesar do
nunca tinha sido elaborado antes, dado que é um do- seu poder não vinculante, ela influenciou e influencia
cumento forte, pensado e muito bem apoiado, e foi ela- literalmente centenas de constituições, de leis, de trata-
borado como reação de várias nações do mundo, em dos e convenções internacionais por todo o mundo, sem
concordância, com o único objetivo que era não permitir mencionar as entidades que se organizam em prol dos
nunca mais, em nenhum lugar do mundo, que atrocida- direitos humanos.
des acontecessem como aconteceram durante a recém
terminada guerra. Assim, mais de 50 líderes mundiais se A DUDH é o documento da luta universal contra
uniram com este objetivo e apresentaram, na primeira a opressão e a discriminação, defende a igualdade e a
Assembleia Geral da ONU em 1946, um esboço prelimi- dignidade das pessoas, como também reconhece que os
nar do que viria a se tornar a Declaração Universal dos direitos humanos e as liberdades fundamentais devem

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ser aplicados a cada cidadão do planeta, pois os direitos Artigo 7º - Mais uma vez a igualdade é pregada,
humanos são os direitos essenciais a todos os seres hu- apontando que todos devem ter acesso igual à proteção
manos, sem que haja discriminação por raça, cor, gêne- e que não devem existir qualquer incitamento a discrimi-
ro, idioma, nacionalidade ou por qualquer outro motivo nações.
(como religião e opinião política). Podem também ser
econômicos, sociais e culturais, como o direito ao tra- Artigo 8º - Caso exista alguma violação à lei, to-
balho e a educação e coletivos, como o direito ao de- dos têm direito a um recurso a ser batalhado por meio de
senvolvimento. Independe se eles são civis ou políticos, tribunais competentes.
tais como o direito à vida, à igualdade perante a lei e à
liberdade de expressão, são direitos humanos que de- Artigo 9º - Prevê que nenhuma pessoa pode ser
vem ser protegidos. presa, detida ou exilada de maneira arbitrária.

A DUDH é formada por 30 artigos que versam Artigo 10º - Todos os julgamentos devem ser pau-
sobre direitos inalienáveis – tanto individuais, quanto tados na igualdade e todas as pessoas merecem ter aces-
coletivos – que, em conjunto, deveriam assegurar a li- so a julgamentos realmente justos e imparciais.
berdade, a justiça e a paz mundial. Entre outros direitos,
Artigo 11º - Prevê que todos os supostos melian-
esse conjunto de artigos, declara o direito à vida, o di-
tes sejam inocentes até que se prove o contrário e que
reito a não ser escravizado, não ser preso ou exilado de
todas as possibilidades de defesa lhe devem ser assegu-
forma arbitrária, o direito de contar com a presunção da
radas.
inocência e ser tratado com igualdade perante as leis e
o direito à privacidade e à livre circulação, incluindo a Artigo 12º - Prevê que nenhuma pessoa deve ser
imigração. Também ficam declarados, nesse mesmo do- atacada em sua vida privada ou familiar de maneira irre-
cumento, os direitos à livre expressão política e religiosa, gular por nenhum meio.
e à liberdade de pensamento e de participação política.
O lazer, a educação, a cultura e o trabalho (exercido livre- Artigo 13º - Reafirma o direito de ir e vir e prevê
mente e remunerado de forma a garantir uma vida digna que todas as pessoas podem ter o direito de circular e es-
a família do trabalhador) também são declarados como colher sua residência de maneira legal no lugar que julgar
direitos humanos fundamentais. melhor, inclusive de abandonar o seu atual país e voltar
ao país de origem.
Vejamos resumidamente os 30 artigos e a que
se referem: Artigo 14º - Todos os seres humanos devem ter
direito a asilo desde que estejam sujeitas ou já sofrendo
Artigo 1º - Afirma que todo ser humano já nasce algum tipo de perseguição. Porém, esse direito não pode
livre e igual a todos os e que por isso deve agir de forma existir caso o requerente tenha algum processo por cri-
racional, sempre com o espírito de promover a fraterni- mes contrários aos princípios estabelecidos pelas ONU.
dade.
Artigo 15º - Afirmou que todo indivíduo tem di-
Artigo 2º - Afirma que não deverá existir nenhum reito à nacionalidade, e que todos têm direito a querer e
tipo de distinção entre seres humanos e que todos devem buscar outra nacionalidade.
ser atendidos quando solicitarem que os seus direitos se-
jam cumpridos independente de sua cor, sexo, religião ou Artigo 16º - Quando em idade legal, todos devem
qualquer outro tipo de opinião, e isso independe do mo- poder se casar, e não deve haver nenhum tipo de distin-
delo governamental sob o qual vive. ção como cor, raça, família ou religião de qualquer um dos
cônjuges. E para que um casamento aconteça, é neces-
Artigo 3º - Expõe o direito à vida, liberdade e se- sário existir a vontade de ambas as pessoas envolvidas.
gurança pessoal. Uma vez formada a família, deve ter direito a proteção do
estado de forma igualitária.
Artigo 4º - Baseando-se na liberdade do artigo
anterior, mostra que nenhum ser humano pode ser es- Artigo 17º - Todos têm o direito à propriedade e
cravizado pelos outros, ficando assim proibido o comércio que ninguém pode ser privado deste direito de forma ar-
de escravos. bitrária.
Artigo 5º - Fala sobre as punições aos seres huma- Artigo 18º - Afirma que todos podem ter o pensa-
nos e mostra que nenhuma delas deve ser cruel, desuma- mento, consciência e religião que melhor o atender, fican-
na ou degradante. do assim livre para se manifestar publicamente.
Artigo 6º - Afirma que todas as pessoas devem Artigo 19º - Trata da liberdade de expressão, mos-
ser reconhecidas como pessoa pela lei. trando que todos podem opinar, buscar informações e se
manifestar sem sofrer interferências.

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Artigo 20º - Todos podem se reunir de maneira le- Artigo 30º - Por fim, a DUDH afirma que nenhum
gal e pacífica, mas ninguém pode ser obrigado a participar dos pontos anteriores podem ser usados para destruir os
de nenhuma associação se não é de sua vontade. direitos citados anteriormente.

Artigo 21º - Todos têm o direito de participar dos Gênero e/ou Estrutura
negócios públicos de seu país por intermédio de seus re-
presentantes escolhidos por meio de eleições livres. Nas Quanto à estrutura, a Declaração é composta
eleições, devem se cumprir integralmente a vontade das de um preâmbulo e da parte dispositiva, que é forma-
pessoas, que devem escolher seus representantes de for- da por trinta artigos, sendo o primeiro deles verdadeira
ma honesta e secreta. declaração de princípios, cujo princípio da igualdade, no
que tange ao seu alcance, é versado no artigo seguinte.
Artigo 22º - Todos os membros da sociedade Na referida seção articulada, contemplam-se os direitos
devem ter direito à segurança social, ficando livre para individuais, os coletivos, as obrigações e as condições
cobrar seus representantes e exigir que seu direito seja de exercício dos direitos. De efeito, o documento cuida
cumprido. pormenorizadamente dos direitos civis, que contêm as
liberdades fundamentais (arts. 3-20), dos políticos, que
Artigo 23º - Todos devem ter direito ao trabalho são os de soberania (art. 21) e dos econômicos, sociais
de maneira igualitária e com remuneração satisfatória e culturais, que são os direitos coletivos (arts. 22-27).
que permita a existência de sua família de maneira digna. As condições e os limites de exercício dos direitos são
Assim como todos possuem o direito de criar e se filiar a tratados nos dispositivos finais do documento (art. 28-
sindicatos que atendam aos seus interesses. 30). Ademais, a Declaração estabelece também que ao
lado dos direitos há deveres em relação à comunidade
Artigo 24º - Prevê o lazer e descanso, como férias
política (art. 29). Finalmente, é escusado (desnecessário)
pagas e remuneradas, e folgas.
dizer que o documento carece de fecho porque não se
Artigo 25º - Todos devem receber uma remune- trata de matéria convencional.
ração que possibilite o acesso a quesitos como saúde,
bem-estar, vestuário, entre outros. Também devem ser
segurados os direitos de todos durante o desemprego ou
invalidez, assim como a maternidade e infância merecem
assistências sociais especiais pautadas na proteção social.

Artigo 26º - Prevê o direito à educação, tendo


como obrigatório o ensino elementar e os demais gene-
ralizados, porém com acesso a todos e a educação deve

Citações da Obra na Matriz de Referências
O ser humano como um ser que pergunta e quer saber

O texto da Constituição Federal, Capítulo II, Direi-


tos Fundamentais, artigo 6° (Congresso Nacional Consti-
respeitar a personalidade dos seres e fortalecer os ditos tuinte - Brasil - 1988), a Declaração Universal dos Direitos
direitos humanos. O tipo de educação a ser oferecida Humanos e a Lei Maria da Penha, artigos 1º a 12-B (Lei
deve ser de escolha preferencial dos pais. nº 11.340/2006) podem ser pensados em conexão como
os temas problematizados até aqui, como noções de cida-
Artigo 27º - Afirma que todos podem participar dania, direitos individuais, direitos sociais, entre outros.
da existência cultural, assim como participar de progres- (Página 4, sétimo parágrafo)
sos científicos, ficando assegurado à proteção a interes-
ses ligados à literatura, ciência ou qualquer outro tema Tipos e gêneros
do tipo.
Pode-se também refletir a respeito de tipologiza-
Artigo 28º - Afirma que as pessoas devem ter ção de estereótipos e preconceitos a partir dos vídeos Po-
acesso a uma ordem de forma nacional ou internacional vos indígenas do Brasil (Cristian Wariu, 2018) e A cidade
que garantam que todos os direitos previstos sejam ga- é um só? (Adirley Queirós), de forma a relacioná-los à De-
claração Universal dos Direitos Humanos (ONU, 1948),
rantidos.
à Constituição Federal, Capítulo II, Direitos Sociais Fun-
Artigo 29º - Assim como seus direitos, os seres damentais, artigos 6° (Congresso Nacional Constituinte,
humanos possuem deveres diante ao desenvolvimento Brasil, 1988) e aos demais objetos de conhecimento nas
diferentes áreas do saber. (Página 10, quarto parágrafo)
de toda a sociedade. Todos estão expostos a questões le-
gais caso não se dedique aos seus deveres colocando em Energia e oscilações
risco a ordem pública ou bem-estar das outras pessoas.
Mas, de forma alguma, os direitos poderão ser exercidos Dessa forma, essa nova relação do homem com
de forma que vá contra aos princípios propostos pelas Na- o espaço geográfico e ambiental, regulamentados em
ções Unidas. diversos documentos oficiais, despertou a consciência
antropológica e cultural do sujeito moderno, tal como a
Declaração Universal dos Direitos Humanos (ONU, 1948)
e a Constituição Federal 15 (Congresso Nacional Consti-

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tuinte, Brasil, 1988) que promovem o posicionamento éti- Anotações e Rascunhos


co frente ao conhecimento científico. (Página 14, sétimo
parágrafo)

Ambiente e vida

Ainda no que diz respeito aos seres vivos, deve-


-se dar importância aos causadores de doenças como ví-
rus, bactérias, protozoários e vermes. Cabe enfatizar os
desdobramentos das principais patologias e seus modos
de transmissão e profilaxia. É importante lembrar que
muitas doenças estão diretamente relacionadas a ques-
tões ambientais. O desmatamento resulta em prejuízos
irreparáveis ao meio ambiente e pode ser responsável
pelo reaparecimento de doenças infecciosas. A falta de
saneamento básico e cuidados nos ambientes dificultam
o acesso à água potável criando condições propícias ao
desenvolvimento de doenças. Os direitos à água potável e
limpa e ao saneamento básico estão previstos na Declara-
ção Universal de Direitos Humanos como essenciais para
garantir a dignidade humana e o direito à saúde, asse-
gurado no artigo 6º da Constituição Federal. (Página 19,
primeiro parágrafo)

A formação do mundo ocidental contemporâneo

Textos contemporâneos como a Constituição Fe-


deral, Capítulo II, Direitos Fundamentais, artigo 6° (Con-
gresso Nacional Constituinte - Brasil - 1988), a Declaração
Universal dos Direitos Humanos (ONU,1948) e a Lei Ma-
ria da Penha, artigos 1º a 12-B (Lei nº 11.340/2006) são
bastante representativos no concernente aos conceitos e
noções de cidadania, direitos individuais, sociais, à pro-
priedade, à nacionalidade, como princípios influenciados
pelos acontecimentos relacionados à Era das Revoluções.
(Página 21, terceiro parágrafo)

Espaços

A Declaração Universal dos Direitos Humanos,


adotada pela ONU, nos serve, também, como base para
estabelecer debates acerca do espaço virtual, que é um
meio tecnológico de geração de informação, e, também,
sobre o espaço físico brasileiro em que pode-se estabe-
lecer reflexões sobre a eficácia dos meios de transporte,
moradia, saúde etc. Ainda nessa óptica, as novas formas
de comunicação via redes-sociais como ilustra a obra Po-
vos indígenas do Brasil 27 (Cristian Wariu) servem para
ilustrar a interrelação dos espaços físico-midiático, deba-
tendo sobre o espaço social do índio no Brasil. (Página 26,
sexto parágrafo)

Questões, Justificativas e Dicas


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Constituição Federal, Capítulo II,
Direitos Fundamentais

Autoria
A Constituição Federal de 1988 não tem um au- Inácio Lula da Silva e Franco Montoro, e liderou várias
tor, ou seja, não existe uma pessoa a quem podemos campanhas em prol da democracia, como a das eleições
atribuir a sua autoria. Na verdade, tem centenas ou mi- diretas (Diretas Já). Ele foi o presidente da Assembleia
lhões de autores, de pessoas que provocaram a origem Nacional Constituinte, o principal articulador para que
deste documento que mudou completamente o futuro a Constituição fosse tão diversificada e tivesse a partici-
do Brasil. Alguns desses autores já não estão mais vivos, pação de tantas vozes da sociedade. Por essa razão, ele
mas a maioria deles ainda vive e desfruta dos benefícios mesmo a chamou de Constituição Cidadã, apelido que
que ela trouxe ao país, sejam eles parlamentares mem- pegou, pois é uma Constituição que realmente teve a
bros da Assembleia Nacional Constituinte ou cidadãos participação da sociedade, e a qual dignificou o conceito
ativistas pela democracia participativa. clássico de cidadão àqueles que quiseram se encarregar
dessa responsabilidade, isto é, definir o futuro do pró-
Os autores da Constituição Federal de 1988 se prio país. De fato, todos que quiseram participar da sua
dividem em dois grupos, o das centenas de deputados elaboração tiveram oportunidade de fazê-lo.
e senadores integrantes da Assembleia Nacional Consti-
tuinte e o dos literalmente milhões de cidadãos brasilei- Contexto
ros que clamavam e lutavam por uma nova Constituição
para o Brasil, pela volta de uma democracia realmente Ao longo da história, o Brasil teve sete constitui-
participativa. ções, sendo que a primeira data de 1824 e foi outorgada
por D. Pedro 1º durante o Império, e a última de 5 de
O primeiro grupo de autores atuou direta e re- outubro de 1988. Em 1891, após a Proclamação da Re-
presentativamente. Enquanto um ficava pelas ruas pro- pública (1889), foi promulgada a primeira Constituição
movendo debates, protestos e lutando durante o fim Republicana brasileira, que adotou o sistema de governo
do governo militar e início do governo Sarney, o outro presidencialista, a eleição do chefe de Estado por voto
debatia, negociava e escrevia a Constituição dentro do direto e a divisão entre o Poder Legislativo (Câmara dos
Congresso Nacional. Deputados e Senado Federal), o Poder Executivo e o Po-
der Judiciário. A partir daí tivemos constituições em di-
Cabe explicar que uma Assembleia Nacional versos regimes, tanto democráticos quanto ditatoriais.
Constituinte é um instrumento genérico utilizado pelas
nações que estão em processo de transição de regime, A elaboração dessa nova constituição durou
geralmente de um regime ditatorial para um regime de- aproximadamente 20 meses e marcou a transição de
mocrático. No caso da ANC do Brasil, tinha a função de mais um momento de regime ditatorial para regime
transformar o país numa nação democrática, a sua com- democrático no Brasil, pois não foi a primeira vez que
posição era de 559 parlamentares, 487 deputados e 72 isso aconteceu por aqui. Um exemplo é a Constituição
senadores, que foram eleitos nas eleições gerais de 1986 de 1946, elaborada no contexto de redemocratização
além de acumularem a posição de parlamentares com a após o regime autoritário de Vargas, o qual se denomina
de constituintes. “Estado Novo”, que era regido pela Constituição de 1937
com claras características antidemocráticas.
Ainda sobre a sua autoria, apesar de não ter ha-
vido um ou dois autores apenas da Constituição Fede- O texto constitucional foi elaborado a partir de
ral de 1988, alguns dos constituintes presentes na sua propostas tanto dos deputados e senadores quanto da
elaboração se destacaram, e, muitos deles, até hoje, população, por intermédio de audiências públicas com
são destaques no cenário político nacional. Na verdade, representantes de movimentos sociais. Foi a primeira
o momento inicial da redemocratização do país foi um vez na história do Brasil que a população participou di-
ponto de partida para a carreira política de vários ativis- retamente da elaboração da sua própria Constituição.
tas sociais, tanto é verdade que a maioria dos presiden- E dessa vez foi importante não só porque foi a primei-
tes após 1988 estava presente na ANC. ra, mas também porque rompia com a Constituição de
1967, a que embasou o regime militar e deu legalidade
Um desses constituintes carece de destaque a atos institucionais trágicos e mortais para milhares de
especial para a prova do PAS, que é Ulysses Guimarães. pessoas.
Advogado e político, foi um dos principais opositores ao
regime militar. Inicialmente apoiou o regime militar, mas A ideia de uma nova Constituição já estava nos
após um tempo passou a lutar pelo retorno da democra- anseios da população desde o início do regime militar,
cia. Juntou-se a políticos como Tancredo Neves, Orestes em 1964, porém após a abertura política, com a eleição
Quércia, Mario Covas, Fernando Henrique Cardoso, Luís de Tancredo Neves, essa ideia estava se tornando cada

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vez mais real. José Sarney, que assumiu a presidência no tos dos povos quilombolas de viverem nas suas terras
lugar de Tancredo (este morreu antes da sua posse), sob de origem, o direito à saúde e educação, entres outros,
bastante pressão popular e parlamentar, deu prossegui- são exemplos dos direitos que a Constituição resguardou
mento a essa ideia, convocando e instalando a Assem- com muito cuidado, os quais contribuíram para que os
bleia Nacional Constituinte brasileira. direitos fossem garantidos não apenas no papel, mas na
prática também, isto é, de maneira substancial.
A Assembleia Nacional Constituinte Brasileira
era composta por deputados de todos os setores da so- Muitos criticam a Constituição Federal do Brasil
ciedade, e oficialmente começou as suas atividades em por ser muito extensa ou por ser teórica demais, mas é
primeiro de fevereiro de 1987, apesar de ter sido convo- unânime entre os operadores do direito que é uma das
cada no ano anterior. AA sua função era a de representar constituições mais avançadas do mundo, tanto por sua
os milhões de brasileiros que queriam a volta da demo- atualidade, quanto pelo seu grau de abrangência, e, con-
cracia, após 21 anos de governo militar, e elaborar uma sequentemente, pela justiça social que ela produz. Ape-
constituição que ao mesmo tempo fosse democrática, sar disso, cabe destaque para algo que a Constituição de
mas forte o suficiente para resistir às pressões da insta- 1988 fez com excelência, que foi a garantia dos direitos
bilidade política que assolava o Brasil há décadas. sociais.

Notadamente, 3 grandes grupos foram especial- Os direitos sociais estão no título II, do artigo sex-
mente representados nas discussões ao longo dos 20 to ao décimo primeiro. No artigo sexto foram colocados
meses de trabalho da Assembleia Nacional Constituinte os direitos sociais à educação, à saúde, à alimentação, ao
brasileira, a saber: o grupo governista, que objetivava a trabalho, à moradia, ao lazer, à segurança, à previdência
manutenção do sistema presidencialista e a conquista de social, à proteção à maternidade e à infância, à assistên-
cinco anos de mandato para o presidente Sarney, ambos cia aos desamparados e à alimentação. Do artigo sétimo
conquistados; o grupo empresarial, subdividido pelos ao décimo primeiro estão os direitos sociais do trabalha-
empresários rurais, empresários nacionais e empresá- dor, em suas relações individuais e coletivas (vale a pena
rios estrangeiros, o qual planejava evitar avanços na Re- uma rápida leitura nos artigos). Esses artigos da Cons-
forma Agrária, garantir a liberdade de mercado, reduzir tituição dedicados exclusivamente aos Direitos Sociais
impostos e a interferência do Estado na economia; e o refletem a preocupação dos constituintes com a integri-
grupo dos movimentos sociais, destaques para os movi- dade física dos cidadãos, e estão relacionados aos prin-
mentos MST — Movimento dos Sem-Terra, CUT — Cen- cípios da dignidade da pessoa humana, solidariedade e
tral Única dos Trabalhadores, CGT — Confederação Ge- igualdade, que visam atingir a justiça social.
ral dos Trabalhadores e demais sindicatos, entre outros
movimentos os quais foram representados por diversas Os direitos sociais são prestações comissivas
organizações que reuniam assinaturas em todo o territó- proporcionadas pelo Estado direta ou indiretamente,
rio nacional e delineavam a transformação do Brasil num enunciadas em normas constitucionais, que possibilitam
país com uma maior justiça social, em que a distribuição melhores condições de vida aos mais fracos, direitos que
de renda fosse mais justa e mais pessoas tivessem aces- tendem a realizar a igualização de situações desiguais.
so à dignidade da pessoa humana, princípio já defendido Dessa forma, a nível constitucional, possibilita ao indiví-
pela Declaração Universal dos Direitos Humanos e pro- duo exigir do Estado prestações e materiais necessários
fundamente adotado na Constituição Federal de 1988. para a garantia de cumprimento desses direitos, e exigir
que o Estado não seja omisso nas suas responsabilidades
Diante de tal contexto, após longos 20 meses de expressas na Constituição.
calorosos e irrestritos debates sobre os mais diversos
temas, em 5 de outubro de 1988 surgiu a Constituição Os Direitos Sociais não nasceram em 1988, eles
Federal, a sétima constituição de toda a história do país, têm uma história sofrida. Remonta ao século XX, no pe-
e a única que foi de fato debatida com a participação de ríodo pós-guerra, sendo fruto da reflexão antiliberal e
toda a sociedade. Especialistas dizem que o momento da ascensão do Estado de Bem-Estar Social (vale a pena
da elaboração da CF 1988 é especialmente único, pois uma pesquisa sobre os termos estranhos), predominan-
permitiu a todos os setores da sociedade a participação te na Europa e disciplinado nas Constituições Mexicana
na elaboração do documento que dirigiria todo o país de 1917 e de Weimar de 1919. Os Direitos Sociais tam-
dali em diante. bém são chamados de direitos de segunda geração, pois,
historicamente, vêm depois dos direitos civis e políticos,
Obra que são a primeira geração dos direitos fundamentais
das sociedades modernas.
O principal objetivo da Constituição Federal de
1988 era o retorno da democracia e, assim, da garan- A Constituição de 1988 não foi a primeira a tra-
tia dos direitos que tinham sido suprimidos pelo regime tar dos direitos sociais, mas foi a primeira a dar tanta
militar durante dolorosos 21 anos. Direitos sociais, eco- importância a eles. Tanto que é considerada como uma
nômicos, políticos e culturais, todos os daí decorrentes das constituições mundiais mais humanas de todas, mais
como, por exemplo, a liberdade de imprensa, os direi- voltadas para a dignificação da pessoa humana. Com ela,

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o país passou a ser bem mais justo socialmente falando 1º a 12-B (Lei nº 11.340/2006) podem ser pensados em
após a sua promulgação. As minorias passaram a ter voz. conexão como os temas problematizados até aqui, como
As instituições passaram a ser mais fortes e se voltarem noções de cidadania, direitos individuais, direitos sociais,
mais para a construção de uma sociedade com menos entre outros. (Página 4, sétimo parágrafo)
desigualdades. A igualdade deixou de ser formal para ser
substancial. Isto é, agora os iguais são tratados de forma Tipos e gêneros
igual e os diferentes de forma diferente, na medida das
suas necessidades. A cidadania passou a ser uma regra. Pode-se também refletir a respeito de tipologi-
Isto significa dizer que a participação da sociedade na zação de estereótipos e preconceitos a partir dos vídeos
Povos indígenas do Brasil (Cristian Wariu, 2018) e A cida-
sua própria construção ficou institucionalizada e siste-
de é um só? (Adirley Queirós), de forma a relacioná-los à
matizada de forma tal que governos entram e saem e
Declaração Universal dos Direitos Humanos (ONU, 1948),
o poder ainda emana do povo. Direitos que antes eram
à Constituição Federal, Capítulo II, Direitos Sociais Fun-
suspensos, agora são fundamentais.
damentais, artigos 6° (Congresso Nacional Constituinte,
Por fim, estamos diante de uma constituição Brasil, 1988) e aos demais objetos de conhecimento nas
que não é perfeita, que não resolve todos os problemas diferentes áreas do saber. (Página 10, quarto parágrafo)
sociais, além de não estar completa, no entanto possui
Energia e oscilações
ferramentas suficientes para que a sociedade decida
aonde quer chegar, como quer chegar e de que forma Dessa forma, essa nova relação do homem com
fará para chegar nos seus objetivos. o espaço geográfico e ambiental, regulamentados em
diversos documentos oficiais, despertou a consciência
Gênero e/ou Estrutura antropológica e cultural do sujeito moderno, tal como a
Declaração Universal dos Direitos Humanos (ONU, 1948)
A Constituição Federal de 1988 está dividida em e a Constituição Federal (Congresso Nacional Constituin-
títulos que se dividem de acordo com as atribuições de te, Brasil, 1988) que promovem o posicionamento ético
seus artigos. Cada título apresenta artigos referentes a frente ao conhecimento científico. (Página 14, sétimo pa-
determinada área, ou princípio, para que seja mais fácil rágrafo)
subdividir todas as características que regimentariam a
sociedade brasileira a partir daquele momento. Os títu- Ambiente e vida
los são:
Ainda no que diz respeito aos seres vivos, deve-
Título I – Princípios Fundamentais -se dar importância aos causadores de doenças como ví-
rus, bactérias, protozoários e vermes. Cabe enfatizar os
Título II – Direitos e Garantias Fundamentais desdobramentos das principais patologias e seus modos
de transmissão e profilaxia. É importante lembrar que
Título III – Organização do Estado muitas doenças estão diretamente relacionadas a ques-
tões ambientais. O desmatamento resulta em prejuízos
Título IV – Organização dos Poderes irreparáveis ao meio ambiente e pode ser responsável
pelo reaparecimento de doenças infecciosas. A falta de
Título V – Defesa do Estado e das Instituições Democrá-
saneamento básico e cuidados nos ambientes dificultam
ticas
o acesso à água potável criando condições propícias ao
Título VI – Tributação e Orçamento desenvolvimento de doenças. Os direitos à água potável e
limpa e ao saneamento básico estão previstos na Declara-
Título VII – Ordem Econômica e Financeira ção Universal de Direitos Humanos como essenciais para
garantir a dignidade humana e o direito à saúde, asse-
Título VIII – Ordem Social gurado no artigo 6º da Constituição Federal. (Página 19,
primeiro parágrafo)
Título IX – Disposições Constitucionais Gerais
A formação do mundo ocidental contemporâneo


Citações da Obra na Matriz de Referências
O ser humano como um ser que pergunta e quer saber

O texto da Constituição Federal, Capítulo II,


Direitos Fundamentais, artigo 6° (Congresso Nacional
Textos contemporâneos como a Constituição Fe-
deral, Capítulo II, Direitos Fundamentais, artigo 6° (Con-
gresso Nacional Constituinte - Brasil - 1988), a Declaração
Universal dos Direitos Humanos (ONU,1948) e a Lei Ma-
ria da Penha, artigos 1º a 12-B (Lei nº 11.340/2006) são
bastante representativos no concernente aos conceitos e
noções de cidadania, direitos individuais, sociais, à pro-
priedade, à nacionalidade, como princípios influenciados
Constituinte - Brasil - 1988), a Declaração 5 Universal pelos acontecimentos relacionados à Era das Revoluções.
dos Direitos Humanos e a Lei Maria da Penha, artigos (Página 21, terceiro parágrafo)

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Materiais

Segundo pesquisadores brasileiros, os resíduos


da mineração encontrados após o rompimento da barra-
gem em Mariana, contêm metais pesados, como chumbo,
bário, zinco, manganês, alumínio, cromo e ferro, nocivos
à saúde e ao ambiente. Esse fato é abordado no artigo
O rompimento da barragem de Mariana e seus impactos
socioambientais (Luciano M. N. Lopes), exemplificando o
desrespeito ao Artigo 6º da Constituição Federal. (Página
30, quarto parágrafo)

Questões, Justificativas e Dicas


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Anotações e Rascunhos

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Dedicatória
Futuro (a) calouro (a) da UnB,

Agradecemos a você por ter adquirido esta apostila. Saiba que você foi nossa inspiração em todas as
etapas de criação deste produto, pois sabemos como é almejar uma vaga na UnB e correr atrás para que isso
aconteça. Temos ciência de que uma boa preparação é o diferencial! Acreditamos nos seus sonhos e queremos te
ajudar a alcançá-los. Sabemos que você é capaz e que, com dedicação e muito estudo, vai alcançar as metas que
estabeleceu para si. Queremos fazer parte dessa linda trajetória que você está percorrendo. Nem sempre serão só
flores, nós sabemos, mas confie no seu potencial. Suas dificuldades não te definem, mas a forma como lida com
essas dificuldades é que faz toda a diferença. Lembre-se disso sempre! Dedicamos a você a citação abaixo:

“Suba o primeiro degrau com fé. Não é necessário que você veja
toda a escada. Apenas dê o primeiro passo.”
– Martin Luther King

Com muito amor e carinho,

Equipe Tudo Sobre o PAS UnB

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