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08 - Vânia Motta e Roberto Leher - Políticas Educacionais Neoliberais e EdoC 1
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317 (ditas) sem fins lucrativos e 1.125 e organizações de direito privado sem
particulares (com fins lucrativos). Em fins lucrativos, voltadas para atividades
2008, último ano do Censo Inep em de pesquisa. A propriedade intelectual
que foi feita a discriminação entre pri- sobre os resultados obtidos pertence-
vadas sem fins lucrativos e com fins rá às instituições detentoras do capital
lucrativos, o total de instituições tinha social e não às universidades. Ademais,
subido para 2.252, sendo 236 públicas, os professores universitários podem se
437 (ditas) sem fins lucrativos e 1.579 dedicar às atividades empresariais, des-
particulares (com fins lucrativos) (Ins- vinculando-se de suas obrigações de
tituto Nacional de Estudos e Pesquisas ensino e pesquisa públicos, mas man-
Educacionais, 2009). tendo seus salários pelo Estado.
Porém a mercantilização não se es- Os editais que definem as áreas
gota no suporte financeiro e legal do prioritárias de atuação da universidade
Estado ao setor privado-mercantil; al- são definidos com relevante presença
cança, inclusive, o cerne da educação empresarial. Com isso, o que é dado a
superior: as prioridades de pesquisa, o pensar na universidade é parcialmente
teor do currículo, as formas de avalia- estabelecido pela representação direta
ção e a carreira docente. O principal do capital. Desse modo, as corpora-
ordenamento do Estado que permite ções podem definir linhas de pesquisa
ao capital influenciar diretamente o e prioridades do fazer acadêmico, em
conhecimento produzido ou em circu- detrimento da função social das uni-
lação na universidade é a Lei de Inova- versidades de problematizar as teorias
ção Tecnológica (lei nº 10.973/2004), científicas e de se engajarem na solu-
que estabelece medidas de incentivo à ção dos problemas atuais e futuros dos
inovação e à pesquisa científica e tec- povos. No agronegócio, a presença
nológica no ambiente produtivo, por das corporações difunde, no seio mes-
meio do apoio à constituição de alian- mo da atividade universitária, o modelo
dos transgênicos e, mais genericamen-
ças estratégicas e ao desenvolvimento
de projetos de cooperação envolvendo te, do agronegócio voltado para a ex- P
empresas nacionais, universidades e portação, em detrimento da soberania
centros públicos de pesquisa e funda- alimentar dos povos.
ções ditas de apoio privado nas uni- A admissão das corporações e das
versidades. As universidades podem, parcerias das universidades com as
mediante remuneração e por prazo empresas, por meio dos editais, altera
determinado, nos termos do contrato o lugar dos serviços no fazer universi-
ou convênio, compartilhar seus labo- tário, protegidos que estão dos espaços
ratórios, equipamentos, instrumentos, públicos da universidade em poderosas
materiais e demais instalações com mi- fundações, ditas de apoio, privadas;
croempresas e empresas de pequeno isso possibilita ao capitalismo acadê-
porte, em atividades voltadas à inova- mico assumir um lugar de prestígio e
ção tecnológica, e permitir a utilização de poder na hierarquia interna da uni-
de seus laboratórios, equipamentos, versidade, o que realimenta a força do
instrumentos, materiais e demais ins- referido capitalismo acadêmico.
talações existentes em suas próprias Se, sob o ponto de vista dos seto-
dependências por empresas nacionais res dominantes, não parecem restar
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dúvidas sobre o fato de que eles em- tos, mas o conjunto dos trabalhadores,
preendem intensa luta de classes no como parte do processo de constitui-
campo educacional, sob o ponto de ção da classe nas lutas do presente.
vista dos trabalhadores tal questão está Dilemas estratégicos, contudo, estão
longe de integrar a estratégia de grande longe de terem sido equacionados. Al-
parte dos setores da esquerda socialista. guns movimentos preconizam que a
Com efeito, o objetivo político dos se- educação popular deve ser organizada
tores dominantes ao buscarem subme- fora do âmbito estatal; outros susten-
ter a educação à sua estratégia política tam que a educação deve estar assegu-
vem sendo combatido principalmente rada como dever do Estado, mas que
por movimentos sociais, notadamente não compete ao Estado educar – tarefa
pelos movimentos próximos ao Movi- dos educadores e do poder popular.
mento dos Trabalhadores Rurais Sem O tema é importante, pois confor-
Terra (MST), por sindicatos da educa- ma os arcos de forças das lutas pela
ção autônomos em relação aos gover- educação pública.
nos, pelo Fórum Nacional em Defesa Em relação à estratégia de luta pelo
da Escola Pública entre 1987 e 2005 público, as ações do MST em prol da
e, no caso da educação superior, por educação do campo são as mais mar-
setores minoritários das universidades, cantes do Brasil. Buscando dar um sen-
particularmente pela esquerda estu- tido ao público que recusa a tutela esta-
dantil e pelo movimento docente or- tal, o movimento sustenta um projeto
ganizado no Sindicato Nacional dos ético-político universal que contém as
Docentes das Instituições de Ensino principais marcas da pedagogia socialis-
Superior (Andes-SN). No âmbito latino- ta – como o sentido do trabalho na for-
americano, os mais relevantes movi- mação do ser social e, dialeticamente,
mentos sociais estão tomando para si como forma de alienação a ser superada
as tarefas de formação política de seus nas lutas sociais – sem perder de vista
militantes e de educar suas crianças a particularidade do campo, recusando as
e jovens. É o caso das experiências concepções arcaicas da educação rural
dos zapatistas, com os conselhos de e da educação para o campo.
bom governo (juntas de buen gobierno), Para derrotar a pedagogia pró-
e da Assembleia dos Povos de Oaxaca sistêmica encaminhada pelas diversas
(APPO) no México; da Coordena- expressões do capital, os movimentos
ção Nacional dos Povos Indígenas do que apostam na autoformação da clas-
Equador (Conaie); dos trabalhadores se e na luta pelo público têm amplia-
desempregados e das fábricas ocupa- do seus próprios espaços educativos
das, na Argentina, por meio dos bacha- nos moldes preconizados por Gramsci
relados populares; e do MST, no Brasil, (2000): o “partido” como educador
inscritas nesses processos. coletivo capaz de elevar a consciência
Para alterar a correlação de forças social para o momento ético-político.
com o capital, essas iniciativas de for- Nesse prisma, cada militante tem de es-
mação política e de educação popular tar preparado para ser um organizador
necessitam de um salto de qualidade, da atividade política, potencializando
visando construir processos que en- as ações diretas, a democracia protagô-
volvam não apenas alguns movimen- nica e o debate estratégico.
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Notas P
1
O sistema voucher e o modelo de escola charter são mecanismos de repasse de fundos públi-
cos ao setor privado para a gestão de escolas públicas de ensino básico que vêm se generali-
zando nos sistemas educacionais do Chile e dos Estados Unidos, com algumas experiências
similares nas redes de ensino público brasileiro. Os vouchers são subsídios às famílias para
que elas paguem pela educação de seus filhos nas escolas de sua escolha. E as escolas char-
ters são um tipo de financiamento público de abertura de escolas por entidades privadas.
Representam a institucionalização do protagonismo do setor privado na educação pública
e a desresponsabilização do Estado pela educação básica, sob o signo da “autonomia” dos
pais na escolha da escola e da eficiência da gestão privada.
2
Em 1921, Walter Benjamin escreveu o ensaio Zur Kritik der Gewalt (Para uma crítica da
violência) no qual desenvolve, dialeticamente, uma reflexão sobre a violência, construída
com base na ambiguidade da palavra Gewalt, que em alemão designa tanto a violência quan-
to o poder legítimo. Dessa reflexão sobre a pura violência, Benjamin define que vivemos,
como regra geral, num “estado de exceção” (ver Benjamin, 1986 e 1987).
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