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Livro-Texto - Unidade I
Livro-Texto - Unidade I
Livro-Texto - Unidade I
Bacharel em Comunicação Social pela Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM) de São Paulo,
pós-graduado em Marketing de Serviços pela Universidade Paulista (UNIP) e mestre em Administração pela Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Profissional de marketing, possui vinte anos de experiência executiva
em empresas nacionais e multinacionais dos ramos de embalagens, equipamentos, gráfico, financeiro e de serviços.
CDU 65.012.2
U515.31 – 22
© Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou transmitida por qualquer forma e/ou
quaisquer meios (eletrônico, incluindo fotocópia e gravação) ou arquivada em qualquer sistema ou banco de dados sem
permissão escrita da Universidade Paulista.
Prof. Dr. João Carlos Di Genio
Reitor
Unip Interativa
Material Didático
Comissão editorial:
Profa. Dra. Christiane Mazur Doi
Profa. Dra. Angélica L. Carlini
Profa. Dra. Ronilda Ribeiro
Apoio:
Profa. Cláudia Regina Baptista
Profa. Deise Alcantara Carreiro
Projeto gráfico:
Prof. Alexandre Ponzetto
Revisão:
Vitor Andrade
Lucas Ricardi
Sumário
Administração Estratégica
APRESENTAÇÃO.......................................................................................................................................................7
INTRODUÇÃO............................................................................................................................................................7
Unidade I
1 CASO DA IBM........................................................................................................................................................9
2 ENTENDENDO O QUE É A ADMINISTRAÇÃO ESTRATÉGICA............................................................. 12
2.1 Evolução histórica da estratégia..................................................................................................... 14
2.1.1 Período de 1900 a 1950........................................................................................................................ 19
2.1.2 A matriz produto/mercado de Ansoff............................................................................................. 21
2.1.3 Período das décadas de 1950 e 1960.............................................................................................. 24
2.1.4 Matriz BCG................................................................................................................................................. 25
2.1.5 Matriz GE/McKinsey................................................................................................................................ 29
2.1.6 Michael Porter e estratégia.................................................................................................................. 32
2.1.7 Década de 1980 em diante.................................................................................................................. 39
2.1.8 Mintzberg e estratégia........................................................................................................................... 40
2.1.9 A vantagem competitiva de Ghemawat e Rivkin ...................................................................... 43
2.2 O processo de administração estratégica.................................................................................... 45
2.3 Níveis de decisão estratégica........................................................................................................... 46
Unidade II
3 ANÁLISE DO AMBIENTE EXTERNO E DO AMBIENTE INTERNO....................................................... 53
3.1 Análise do Ambiente Externo........................................................................................................... 53
3.2 Análise do Ambiente Interno............................................................................................................ 59
4 A INTEGRAÇÃO DAS ANÁLISES – SWOT.................................................................................................. 62
Unidade III
5 CASO HAVAIANAS............................................................................................................................................ 69
5.1 Formulação estratégica de nível corporativo............................................................................ 76
5.1.1 Estratégia de crescimento.................................................................................................................... 76
5.1.2 Estratégia de estabilidade.................................................................................................................... 80
5.1.3 Estratégia de retração............................................................................................................................ 81
5.2 Formulação estratégica de nível de negócio............................................................................. 82
5.2.1 Liderança de custo.................................................................................................................................. 82
5.2.2 Diferenciação............................................................................................................................................. 85
5.2.3 Foco............................................................................................................................................................... 86
5.3 Formulação estratégica de nível funcional................................................................................ 89
5.3.1 Estratégia de RH....................................................................................................................................... 89
5.3.2 Estratégia de vendas/marketing........................................................................................................ 90
5.3.3 Estratégia de produção/operação..................................................................................................... 95
5.3.4 Outras estratégias funcionais............................................................................................................. 97
6 CAMPOS E ARMAS DA COMPETIÇÃO: NOVO MODELO DE ESTRATÉGIA.................................... 97
6.1 Campos de competição...................................................................................................................... 98
6.2 Armas de competição........................................................................................................................102
Unidade IV
7 CASO MASTERCARD......................................................................................................................................113
7.1 Implementação das estratégias.....................................................................................................115
7.2 Balanced Scorecard (BSC)................................................................................................................121
7.2.1 Perspectiva financeira......................................................................................................................... 124
7.2.2 Perspectiva do cliente......................................................................................................................... 126
7.2.3 Perspectiva de processos internos................................................................................................. 127
7.2.4 Perspectiva de aprendizagem e crescimento............................................................................ 128
7.3 Design Thinking....................................................................................................................................128
7.4 Controle...................................................................................................................................................133
8 APRENDIZADO ESTRATÉGICO....................................................................................................................137
APRESENTAÇÃO
Esta disciplina trata do processo estratégico para a formulação das estratégias organizacionais
(corporativas, de negócios e funcionais) a partir de ferramentas e métodos de análise dos ambientes
e informações relevantes que afetam o negócio. Trata da implementação das estratégias por meio da
definição dos objetivos estratégicos e respectivos indicadores de desempenho, metas e planos de ação,
bem como do controle e aprendizado do processo estratégico.
Serão discutidos aspectos importantes, como níveis de decisão, estratégia versus estrutura, análise
de ambiente competitivo, matriz BCG, formulação de estratégias, campos e armas de competição,
Balanced Scorecard (BSC) entre outros.
Para exemplificar o conteúdo abordado, serão estudados casos de empresas com descrição
de estratégias.
Bons estudos!
INTRODUÇÃO
Você certamente está observando as mudanças que ocorrem no mercado empresarial desde a
virada do século.
• O Waze for criado em 2008 em Israel, cresceu rapidamente e foi comprado pelo Google em
2013 por quase 1 bilhão de dólares. É um modelo de negócios cujos principais inputs são dados
gratuitamente pelos usuários quando usam o aplicativo, mostrando sua velocidade na via. Esses
dados são consolidados e vendidos para anunciantes. Fonseca (2019) afirma que o Waze tem 115 milhões
de usuários ativos em 185 países.
• A Uber foi criada em 2009 na Califórnia, cresceu pelos EUA e cruzou o Atlântico, sendo lançada em
Londres em 2012. O resto do mundo foi recebendo o serviço nos anos seguintes. Em 2019 abriu seu
capital na Bolsa de Nova York e foi avaliada em US$ 82 bilhões, mesmo sem nunca ter registrado
lucro. Parece um contrassenso, mas o valor de mercado de uma empresa tem muito a ver com as
perspectivas de ganhos futuros – o que no caso da Uber é uma aposta bastante razoável.
E o que dizer de segmentos de mercado sendo abandonados em um país, por exemplo, a Ford
Caminhões? O fato é relevante, pois o Brasil depende muito do modal rodoviário para transporte de
cargas (o modal ferroviário é incipiente pelo volume, e o aéreo é caro demais). Em 2019, a unidade
de negócios da Ford que fabricava caminhões no Brasil foi fechada e a marca saiu do setor no país.
O motivo principal foi a necessidade de altos investimentos para adequar os produtos às exigências
legais do Proconve P8 (emissões de poluentes e adequação a testes mais rigorosos de consumo), além
da existência de mercados mais promissores em outros países.
Recentemente, muitas empresas líderes mundiais abandonaram seus negócios. No início deste
século, a empresa finlandesa Nokia foi líder em celulares. Provavelmente você lembra de alguns
modelos, pois eram extremamente comuns no Brasil. Por conta de decisões estratégicas equivocadas
(que discutiremos neste livro-texto), quase faliu. Abandonou o ramo de celulares por vários anos e há
pouco voltou ao mercado, porém sem grande representatividade.
Observe que destacamos uma pequena parte das profundas mudanças no ambiente competitivo.
O ambiente é turbulento e pode quebrar tanto empresas pequenas quanto organizações bem estruturadas.
Por outro lado, é desafiador por permitir rápido crescimento. Cada vez mais fica claro que é preciso ter
foco estratégico e olhos atentos para ameaças e oportunidades.
Este livro-texto pretende contribuir para o aumento de seu conhecimento sobre esse foco estratégico
tão necessário no mundo globalizado e competitivo em que vivemos. Serão acentuados vários exemplos
para esclarecer aspectos teóricos, com tabelas, ilustrações e gráficos, a fim de facilitar seu aprendizado.
8
ADMINISTRAÇÃO ESTRATÉGICA
Unidade I
1 CASO DA IBM
A IBM é uma multinacional americana de informática. Como os mercados mudam com o tempo,
a estratégia também deve ser adequada. A empresa foi líder mundial de fabricação de computadores
de grande e médio porte durante décadas no último século. Hoje é uma das líderes mundiais de TI em
nuvem. A IBM abandonou a fabricação de computadores que a fez famosa, ou seja, a estratégia mudou
com o tempo.
Fundada em 1911 por meio da fusão de três empresas, o nome original da IBM era CTR (Computing
Tabulating Recording Company) e fabricava registradores mecânicos de tempo para máquinas industriais,
instrumentos de aferição de peso, relógios e máquinas de cartões perfurados para tabulação (precursores
dos computadores). Eram centenas de produtos das três empresas originais que eram vendidos somente
para empresas, e não pessoas físicas.
Em 1914, passou a fabricar caixas registradoras e outras máquinas, mantendo o foco inicial de
atender empresas. Sua primeira filial fora dos EUA foi no Brasil, em 1917, onde vendia máquinas que
tabulavam o censo demográfico de 1920. De fato, tem presença centenária no Brasil.
9
Unidade I
Em 1924, a empresa mudou o nome para International Business Machines Corporation (IBM), utilizado
até hoje. O novo nome estabelece claramente o foco em produzir máquinas que auxiliam negócios.
1924-1946 1947-1956 1956-1972 1972-present
Na década de 1930, a IBM lançou com sucesso vários modelos de calculadoras mecânicas. Na
Segunda Guerra (1939-1945), criou novas calculadoras e colocou todas as fábricas americanas à
disposição do governo americano para compensar a nacionalização da filial alemã pelo governo
nazista, que utilizou suas máquinas de cartões perfurados e outros equipamentos no esforço de
guerra contra os Aliados.
Na década de 1950, a IBM lançou o primeiro computador de grande porte feito em linha de produção:
o IBM 650. Foram cerca de 2 mil unidades em cinco anos. Ainda criou calculadoras eletrônicas
programáveis (que pesavam 600 quilos e não tinham teclado, só cartões perfurados) e máquinas para
contabilidade. Na década de 1960, a IBM tornou-se a maior fabricante de computadores de grande
porte do mundo e também passou a fabricar máquinas de escrever elétricas.
10
ADMINISTRAÇÃO ESTRATÉGICA
A) B)
C) D)
Figura 4 – Máquina contábil IBM 632 (A); calculadora eletrônica programável IBM 604 (B);
computador IBM 650 (C); máquina de escrever elétrica IBM Selectric (D)
Anos depois, a IBM lançou o disquete flexível (originalmente de 8”), as máquinas automáticas de
banco e o terminal de caixas de supermercados, destacados a seguir.
A) B) C)
Figura 5
Em 1981, a IBM lançou o primeiro modelo de computador pessoal feito em massa, o PC-XT, e passou
a ser uma das maiores empresas do mundo. Fabricou vários modelos, inclusive de computadores
portáteis (que pesavam 15 kg), com grande sucesso.
11
Unidade I
A) B)
Nos anos 2000, tudo mudou. Assim, a IBM começou a se desfazer das unidades de negócio de
produtos físicos como hard disks (HDs), periféricos, computadores etc. Deixou de fabricar hardware após
quase cem anos. O foco concentrou-se em serviços, patentes e desenvolvimento de tecnologia. Hoje, a
empresa tem 350 mil funcionários no mundo e fatura mais de US$ 77 bilhões.
Recentemente, novos concorrentes menores surgiram, sobretudo, por meio de aplicativos: Nu Bank,
PIC PAY, Banco Original etc., além do crescimento de corretoras como XP e Rico. Esses novos concorrentes
passaram a tomar parte do mercado. Neste livro-texto, vamos discutir sobre a força competitiva de
novos entrantes.
A) B) C)
A competição cria a necessidade de fazer as organizações serem melhores, mais eficientes e mais
baratas que os concorrentes: o objetivo é que o cliente não escolha outra marca. É necessário que haja
vantagens competitivas para permanecer no mercado – e para crescer, mais ainda.
13
Unidade I
De acordo com Ansoff (1965), a vantagem competitiva procura identificar propriedades específicas
e combinações individuais de produtos e mercados que dão à empresa uma forte posição concorrencial.
Numa outra definição:
Ou seja, para competir é necessário adotar estratégias que os concorrentes não tenham condições
de copiar. Para adotar essas estratégias, é preciso entender a administração estratégica:
Na Grécia Antiga, período histórico compreendido entre os séculos XV e III a.C., a palavra strategía
significava “a arte de ser general” liderando exércitos e derrotando inimigos. Você provavelmente assistiu
a filmes ou leu livros sobre guerras e conflitos armados. Pois é exatamente esse o ponto de partida: a
estratégia é necessária quando há competição! Quando exércitos se enfrentam, estão competindo por
algo: terreno, recursos, poder etc. Quando empresas se enfrentam no mercado, estão competindo
por algo também: o cliente.
14
ADMINISTRAÇÃO ESTRATÉGICA
Muito embora pareça estranho à primeira vista, sob o ponto de vista da teoria econômica, empresas
que atuem de forma idêntica para atingir os mesmos clientes são redundantes: bastaria uma existir.
Pense numa pequena cidade no agreste. Poucos habitantes, a maioria espalhada na região rural, baixa
renda, uma única escola e um só mercadinho. Sob a ótica de utilidade econômica, não faz sentido abrir
outro mercadinho, a não ser que o novo negócio tenha diferenciais e acabe sobrepujando o outro.
Dois mercadinhos de atuação semelhante vão dividir o mesmo mercado e a rentabilidade dos dois será
sofrível – talvez ambos quebrem.
Em mercados grandes o suficiente para acomodar dois ou mais competidores, quando a atuação de
um é percebida como diferente e positiva, este naturalmente se sobrepõe aos outros e conquista espaço,
crescendo mais rapidamente. Como vimos, esse é o papel da estratégia: criar vantagens competitivas
dificilmente copiáveis pelos concorrentes.
Observação
O fator cópia é extremamente comum nos negócios. E não estamos
falando de produtos falsificados, e sim de cópia de ideias sem proteção
de registro oficial. Por exemplo, a Record tentou anos atrás copiar
declaradamente (a própria emissora noticiou) a grade de programação
da Globo. No início da noite, por décadas, a grade da Globo era: novela I
(inicialmente às 18h, foi mudando para 18:20); jornalismo local (SP TV, RJ
TV etc.); novela II (inicialmente às 19h, foi mudando para 19:30); jornalismo
nacional (Jornal Nacional); novela III (inicialmente às 20h, foi mudando
para 21:30); e variedades (filmes, programas e séries que variavam por
noite). A Record copiou exatamente a mesma grade de programação e
após anos acabou desistindo da cópia, pois não foi bem-sucedida como
desejava: a audiência não mudou de canal em quantidade suficiente. O
que se percebe é que a vantagem competitiva da Globo não é somente essa
grade de programação: há inúmeros elementos exclusivos que a Record
não conseguiu copiar.
[...] o livro cobre todos os aspectos de como se fazer uma guerra e fornece
grandes quantidades de conselhos estratégicos e filosóficos que ainda
estão sendo usados como uma fonte de inspiração para políticos e líderes
empresariais (AURIK; JONK; FABEL, 2014, p. 5).
A obra em questão é um texto derivado daquilo que se concebia na época como guerra na China.
Ou seja, há toda uma contextualização social, histórica e comportamental cujo conteúdo foi apropriado
pela área da administração como uma metáfora: negócios são guerra.
15
Unidade I
Tzu (2006) considera o conhecimento como o recurso mais importante, pois permite que o general
consiga calcular os fatores vitoriosos na batalha.
A apropriação do conteúdo pela área da administração é compreensível: esses trechos podem ser
utilizados para abordar a importância da análise de pontos fortes e fracos do inimigo e assim poder
sobrepujá-lo. Depois, estudaremos a análise SWOT e você poderá traçar suas próprias conjecturas
a respeito.
De maneira direta e utilizando o linguajar da época, Tzu (2006) descreve o que se pode interpretar
como conceitos e aplicações de:
• oportunidades;
• ameaças;
• eficiência e eficácia;
• disciplina;
• táticas.
Saiba mais
16
ADMINISTRAÇÃO ESTRATÉGICA
Avancemos alguns séculos e passemos para a época do descobrimento do Brasil. Nicolau Maquiavel
(Niccolò Machiavelli, originalmente, em italiano) foi filósofo, historiador, dramaturgo, diplomata e
escritor. É considerado o precursor da teoria política, pois procurava descrever o Estado e os meios de
governar de maneira direta e clara. Tanto é assim que um de seus livros, O príncipe, publicado em 1532,
é editado e estudado com afinco até hoje pelos interessados em ciências políticas.
Contudo, em nosso resgate histórico, foi outro livro de Maquiavel, coincidentemente intitulado
A arte da guerra, que trouxe grandes contribuições para entender estratégia. São sete volumes
descrevendo “a organização do exército, a hierarquia de comando, a formação de soldados, o
Estado‑maior e os códigos de leis militares” (DAROS, 2017, p. 88). Para Maquiavel, a guerra deve
ser um assunto de Estado e de responsabilidade do poder maior: o rei.
Veja que é possível discutir conceitos estratégicos como ameaças e oportunidades, bem como sigilo.
Nenhum método é melhor do que aquele que o inimigo não percebe até o
adotarmos. Na guerra, reconhecer a oportunidade e aproveitá-la vale mais
do que qualquer outra coisa. A natureza não faz muitos homens bravos; a
aplicação e o exercício, sim. Na guerra, a disciplina pode mais que o ímpeto
(MAQUIAVEL, 2007, p. 127).
A questão de recursos humanos treinados e disciplinados também é abordada, como pode ser visto
no trecho anterior.
Algumas décadas depois, o famoso samurai japonês Musashi escreveu suas ideias sobre guerra
e estratégia:
Três séculos após, em 1832, um general prussiano chamado Carl Von Clausewitz publicou o livro
Da guerra, conteúdo obrigatório para os estudantes de teoria militar em todo o mundo. Para nós, o que
interessa é o conjunto de contribuições que ele deu para que possamos compreender estratégia.
[...] o estrategista deve definir, portanto, uma meta para todo o aspecto
operativo da guerra, que deverá estar de acordo com o seu propósito. Em
outras palavras, ele esboçará o plano de guerra, e o propósito determinará
a série de ações pretendidas para atingi-lo [...] (CLAUSEWITZ, 2010, p. 199).
Observe que nesse trecho ele está descrevendo como uma estratégia se desdobra em planos de ação
para atingir um objetivo.
18
ADMINISTRAÇÃO ESTRATÉGICA
Assim, podemos perceber que tanto o conceito quanto a aplicação de estratégia ficaram restritos ao
campo militar durante séculos. Pense nas guerras travadas pelo Império Romano, ou por Marco Polo, ou
por Napoleão Bonaparte: todas implicavam a adoção de estratégias para derrotar o inimigo.
Saiba mais
TROIA. Direção: Wolfgang Petersen. EUA: Warner Bros, 2004. 163 min.
Na primeira metade do século XX, a evolução dos negócios se deu mais por crescimento de demanda
do que por concorrência pelos mesmos mercados. Pode-se dizer que na época qualquer coisa produzida
tinha demanda certa. Assim, a maioria das empresas estava mais ligada a políticas de negócios voltadas
para melhoria de procedimentos, aumento de produção e geração de retorno para os acionistas, sem se
preocupar muito em ser melhor que a concorrência: havia mercado para todos, de certa forma. No caso
de Europa e EUA, quando o mercado doméstico apresentasse dificuldade concorrencial, nada melhor
que exportar os excedentes e dominar novos mercados em outros países. Estratégia em termos de ser
melhor que o concorrente ainda não era uma necessidade clara para a maior parte dos negócios, por
assim dizer. Isso foi comum na maioria dos ramos de negócio até a Segunda Guerra.
Obviamente, nem sempre era tão fácil assim. Alguma concorrência naturalmente iria surgir com o
tempo. Desde o início, já havia alguns setores bem competitivos, a exemplo do setor de automóveis.
Você provavelmente conhece a história do Ford modelo T, que em 1913 foi o primeiro produto feito em
linha de montagem de manufatura seguindo os ditames da administração científica de Taylor. O sucesso
de Henry Ford foi enorme, e ele dizia que você poderia escolher qualquer cor para o Ford T, desde que
fosse a cor preta, pois a padronização era total.
19
Unidade I
A) B)
Em razão do aspecto apresentado, a Ford perdeu a liderança para a General Motors (GM) na década
de 1920. Em 1923, o novo presidente da GM, Alfred Sloan, estudou os métodos da Ford e achou um
ponto fraco: oferta de uma única cor. Lançou modelos diferentes com várias cores e foi um sucesso.
Parece simples e mágico, mas foi um processo bastante complicado. Sloan, sem ser um teórico, mostrou
a possibilidade de tomar decisões estratégicas baseadas na análise da concorrência para atingir objetivos.
O resultado foi a conquista da liderança da GM no mercado americano, e a liderança do mercado
mundial na década de 1950, quando Sloan saiu da presidência da companhia.
No Brasil, a IRFM (Indústrias Reunidas Fábricas Matarazzo) foi a maior organização empresarial
da América Latina. Baseado em São Paulo, o grupo chegou a ter 350 empresas de vários ramos, como
têxtil, químico, bancário e alimentício. Surgiu em 1891 e faliu na década de 1980. O principal motivo
foi a concorrência. Enquanto não tinha concorrente, vendia tudo o que fabricava. Ou seja, não tinha
vantagem competitiva sustentável.
Vamos voltar aos militares por um instante. O maior conflito armado do século passado, a Segunda
Guerra (1939-1945), além das tragédias humanas e econômicas, criou uma circunstância inusitada
após o seu término: a desmobilização da maioria dos combatentes. Imagine haver milhares de oficiais
experientes em estratégia militar perdendo o emprego nas forças armadas ao mesmo tempo em que a
Europa precisava de reconstrução e os EUA se consolidavam como a maior potência econômica. Uma
boa parte do alto oficialato americano foi contratada por grandes conglomerados industriais americanos
em altos cargos (inclusive na GM). E isso não era necessariamente uma ação de agradecimento ou de
relações públicas: a visão estratégica desses ex-oficiais poderia contribuir muito para o crescimento das
empresas. Tenha em mente que um dos aspectos da estratégia é a gestão de recursos. E, sob o ponto
de vista de características pessoais, haja disciplina e respeito à hierarquia.
Essa circunstância fortuita trouxe para muitas organizações a aplicação prática de conceitos
estratégicos. Naturalmente, esse aspecto atraiu a curiosidade de acadêmicos.
20
ADMINISTRAÇÃO ESTRATÉGICA
Observação
A presença militar nas empresas gerou massa crítica de aplicação de estratégias, nem todas
bem-sucedidas, é evidente. Esse fato gerou curiosidade intelectual na academia, o que abriu espaço nas
pesquisas de administração. Assim, na década de 1950, um russo radicado nos EUA chamado Igor Ansoff
publicou suas ideias sobre estratégia empresarial que culminaram na matriz Ansoff, também chamada
de matriz produto/mercado. Essa matriz é uma ferramenta que auxilia executivos a tomar decisões
estratégicas até hoje e traz as primeiras definições sedimentadas de estratégia empresarial.
Igor Ansoff, executivo de topo da empresa americana de aviões militares Lockheed Corporation,
era também um acadêmico brilhante que observou e mapeou as distintas realidades das grandes
empresas e percebeu o valor da estratégia como um meio de fazer as empresas crescerem. Ansoff (1965)
postulava que estratégia só tinha aplicação para empresas que queriam crescer. Hoje sabemos que
estratégia não atende somente objetivos de crescimento (estudaremos neste livro-texto), mas na época
pós-Segunda Guerra, com tantas oportunidades de crescimento no mercado americano, a observação
de Ansoff ficou restrita a esse objetivo. Mesmo assim, foi um início formidável, já que a matriz
produto/mercado pode ser utilizada por qualquer empresa até hoje em qualquer lugar do mundo com
razoáveis possibilidades de sucesso.
É preciso entender melhor a ideia conceitual de estratégia de crescimento. Pela visão de Ansoff,
caso a empresa continuasse a fazer o que sempre fazia, não teria crescimento, faturando basicamente o
mesmo valor do período anterior. Caso adotasse uma estratégia, cresceria x% sobre o período anterior
(se a estratégia fosse bem-sucedida, claro).
Veja o gráfico a seguir. Ansoff dizia que, sem estratégia de crescimento, a tendência seria a empresa
permanecer com o mesmo faturamento após um período (cor azul). Se adotasse uma estratégia de
crescimento bem-sucedida, teria faturamento “azul + laranja”, sendo laranja o acréscimo de vendas
advindo da estratégia bem-sucedida.
21
Unidade I
Ano 1 Ano 2
Claro que é uma visão reducionista, pois no mundo real nada garante que o faturamento permaneça
o mesmo. Mas entenda que na época a economia americana, campo de estudo de Ansoff (1965), estava
em franco desenvolvimento, assim, mesmo sem muito esforço, a maioria das empresas americanas
reuniam condições de continuar faturando.
Produtos
Existentes Novos
Existentes
Penetração Desenvolvimento
de mercado de produtos
Mercados
Novos
Desenvolvimento Diversificação
de mercado
Ansoff (1965) postulava que há duas variáveis para a empresa escolher ao definir sua estratégia,
cada uma com duas escolhas:
• Mercados: a empresa escolhe em atender aos novos clientes ou atender aos clientes existentes
(atuais). Os novos clientes podem ser de outras praças (regiões geográficas), de outra classe
econômica (A, B, C, D ou E), de outro gênero (masculino ou feminino) etc. Ou seja, são pessoas
ou empresas que não são atendidas pelo produto e que reúnem condições para virarem
compradores. O esforço para atrair novos clientes é sempre maior que o esforço para manter os
clientes atuais.
22
ADMINISTRAÇÃO ESTRATÉGICA
Ao observar o quadro anterior, as duas variáveis estão lá: mercados e produtos. Mercados conta com
duas divisões, “novos” e “existentes”, o que ocorre também com produtos. O cruzamento dessas variáveis
traz quatro estratégias: penetração de mercado, desenvolvimento de mercado, desenvolvimento de
produto e diversificação.
• Se a empresa opta por continuar vendendo os produtos existentes para os mercados (clientes)
existentes, estará realizando a estratégia de penetração de mercado. O crescimento que se espera
dessa estratégia é oriundo do aumento do tíquete médio (valor médio de compra por cliente).
A cor laranja no gráfico de crescimento é fruto do aumento do tíquete médio. Por exemplo, uma
papelaria de bairro opta por atender aos clientes habituais com novas promoções e ofertas dos
produtos que sempre vendeu ou uma empresa de cartão de crédito incentiva o uso mais frequente
de seus cartões. A ideia é aumentar a compra média de cada cliente.
• A última estratégia de crescimento postulada por Ansoff (1965) é a mais arriscada: diversificação.
Note que as estratégias anteriores sempre partem de ao menos uma “âncora” que a empresa
conhece (ou mercado, ou produto, ou ambos). Aqui o território é inteiramente novo. O crescimento
vem da venda de novos produtos para novos mercados. Ou seja, vou vender algo que nunca
vendi para um cliente que não me conhece: eis o risco inerente a essa estratégia. Porém, uma
regra básica de negócios diz o seguinte: quando o risco é alto, os ganhos também devem ser.
Assim, essa estratégia, quando bem-sucedida, pode ser mais rentável que as outras três. Como
exemplo, em 1999 o Bank of America investiu na criação do Econ Supermercados, uma rede de
23
Unidade I
supermercados de bairro em São Paulo focada em perecíveis e produtos de limpeza voltada para as
classes C e D. Veja que o público é novo (o Bank of America era focado em grandes empresas) e
o produto também (o Bank of America vendia produtos financeiros). A ideia era fazer o negócio
crescer e depois vender toda a operação. Com efeito, cinco anos depois o negócio foi vendido
para o Grupo CBA com excelente retorno.
Peter Drucker, considerado o maior gênio da administração, escreveu mais de trinta livros de rigor
intelectual e, ao mesmo tempo, de fácil compreensão. Uma de suas contribuições à estratégia foi o livro
The practice of management, de 1954, obra em que defende que o negócio é determinado pelo cliente
e suas necessidades. Veja a linha de pensamento inovadora para a década de 1950: não é o dono (ou
acionista) do negócio quem determina sua existência: é o cliente. Drucker (apud GHEMAWAT, 2002, p. 39)
argumentava que o comportamento do gestor não é simplesmente passivo e adaptativo diante do
ambiente, e sim ativo e propositivo, realizando ações que permitam atingir os objetivos estratégicos.
Para Drucker (1954, p. 22), “estratégia é a análise de situação atual e de mudanças, se necessárias.
Incorpora-se a essa análise os recursos disponíveis e os que precisam ser adquiridos”.
Drucker também desenvolveu na década de 1950 a APO (administração por objetivos), em que
gestores e subordinados estabelecem objetivos comuns e definem suas áreas de responsabilidade com
foco nos resultados. Assim, todos perseguem objetivos desdobrados em metas verificáveis e controláveis.
24
ADMINISTRAÇÃO ESTRATÉGICA
Chandler (1962) estudou as mudanças históricas de grandes organizações dos EUA (GM, Du Pont,
Standard Oil e Sears, entre outras) sob o ponto de vista da estrutura de negócios. Percebeu que a maioria
utilizava um modelo descentralizado de gestão, com várias unidades de negócios sendo controladas
por um escritório central, e que as mudanças estruturais (fábricas, recursos etc.) eram guiadas pelos
objetivos de longo prazo. Nessa discussão sobre estratégia e estrutura empresarial, formularam-se as
bases do planejamento estratégico: “É a determinação de metas e objetivos de longo prazo de uma
empresa, e a adoção das linhas de ação e aplicação dos recursos necessários para alcançar essas metas”
(CHANDLER, 1962, p. 23).
George Steiner (apud MINTZBERG; AHLSTRAND; LAMPEL, 2000) definiu em 1969 o modelo de planejamento
estratégico como uma sequência de etapas:
• Fixação de objetivo: métodos e procedimentos para estabelecer metas que, somadas, atendem
a objetivos.
Schneider (2013) comenta que a década de 1960 viu surgir duas das mais famosas empresas de
consultoria ligadas à estratégia: Boston Consulting Group (BCG) e a McKinsey & Company. Ambas
desenvolveram métodos de análise de mercado que são largamente utilizados até hoje, como a matriz BCG
e a matriz GE (também chamada matriz McKinsey).
25
Unidade I
Crescimento Pontos de
de mercado interrogação
Estrelas
24
Longal
Dorian 21
Energan
Xantax
18
Pentrix
Bendac Braviton
11
Zodial
Eviron
Lotran
8
Vacas-leiteiras Abacaxis
A posição dos círculos na vertical no gráfico obedece a uma métrica específica: quanto mais para o
alto, maior a taxa de crescimento do mercado do produto. Não é a taxa de crescimento do produto em
si, mas a taxa de crescimento de todo o mercado desse produto. A linha divisória é a taxa de crescimento
do país (do PIB). O motivo é simples: a taxa de crescimento de PIB é, resumidamente, a média de
crescimento de todos os mercados do país. Portanto, produtos cujo mercado crescem mais que o PIB
têm alto crescimento (cresceram mais que a média de tudo no Brasil), e mercados com crescimento
inferior ao PIB têm baixo crescimento (pela mesma lógica). Por exemplo, o crescimento do PIB brasileiro
de 2019 foi de 1,1%. O mercado brasileiro de computadores em 2019 foi de 1,2%. Portanto, numa
matriz BCG de qualquer fabricante de computadores seus produtos estariam acima da linha divisória.
No gráfico, o mercado de produtos equivalentes ao Pendrix cresceu mais que o de Bendac e menos que
o de Dorian, e tanto o mercado de Pendrix quanto o de Dorian cresceram mais que o PIB. Lembre-se de
que se trata da taxa de crescimento do mercado do produto, e não do produto em si.
26
ADMINISTRAÇÃO ESTRATÉGICA
A posição na horizontal também tem uma métrica específica: quanto mais para a esquerda,
maior a participação relativa de mercado. Quanto mais à direita, menor a participação relativa. Essa
métrica compara a participação de mercado do produto e de seu principal concorrente (quando
o produto é líder, o principal concorrente é o segundo colocado; quando o produto não é líder, o
principal concorrente é o líder). O resultado é participação relativa de mercado. Por exemplo, se
meu produto tem 30% de participação e meu principal concorrente tem 20%, logo, 30/20 = 1,5.
Como a linha divisória assume sempre o valor 1, meu produto (o círculo) estará localizado à
esquerda da linha divisória na localização 1,5. No gráfico, vemos que Dorian, Pendrix, Bendac,
Eviron e Lotran são líderes de seus respectivos mercados, uma vez que todos estão à esquerda da
linha divisória. Os outros produtos do gráfico não são líderes de seus mercados, e quanto mais à
direita estiverem, mais distantes estarão da participação do líder.
Quadro 2
Produtos
Alto Baixo
Crescimento do mercado-produto
Ponto de
Alto
Estrela interrogação
Baixo
Vaca-leiteira Abacaxi
• Estrela: alto crescimento de mercado com alta participação relativa de mercado. Ou seja, dentro
desse quadrante entram os produtos que são estrelas de Hollywood: lideram um mercado que
cresce mais que o PIB. Produtos nesse quadrante são naturalmente atacados pelos concorrentes,
pois o mercado é atrativo e o líder é normalmente o alvo. Exemplo: Amazon.com é uma empresa
americana líder em comércio eletrônico que, em função da pandemia de 2020, atuou num
mercado com altas taxas de crescimento. Outro exemplo são os produtos alimentícios de moda
passageira como empadas gourmet, brigadeiros gourmet, paleterias (sorvetes estilo mexicano) etc.
Durante alguns poucos anos, enquanto está na moda, algum player é líder de um mercado que cresce
a taxas assombrosas, ficando na posição de estrela. Depois de a moda passar, esses produtos enfrentam
queda de venda até praticamente deixarem de existir, mudando de local na matriz BCG.
27
Unidade I
• Ponto de interrogação: alto crescimento de mercado com alta participação relativa. Produtos
que não são líderes de um mercado que cresce bastante. Assim, esse mercado atrai novos
players e os players atuais aproveitam a taxa de crescimento alta, disputando entre si. O ponto
de interrogação surge em função da dúvida, isto é, se a empresa vai manter um produto em
mercado tão disputado, pois naturalmente são necessários investimentos pesados para manter a
participação. Exemplo: concorrentes da Netflix, como Amazon Prime Video, HBO Go, iTunes Store
etc. Não são líderes em um mercado que cresce muito e cuja disputa envolve altos investimentos.
No exemplo anterior de produtos gourmet, exceto o líder, todos os players ficam na posição de
ponto de interrogação enquanto a moda persistir.
• Vaca-leiteira: toda organização deveria ter ao menos uma. São produtos líderes cujo mercado
apresenta baixa taxa de crescimento, portanto não atrai novos players. A metáfora da
vaca-leiteira é precisa: dá leite todo dia e não dá muito trabalho. Ou seja, gera mais recursos do
que exige para se manter. O exemplo clássico é a VW Kombi no Brasil, que desde o lançamento,
em 1957 (foi o primeiro produto da VW no Brasil), foi líder, e nos últimos anos de vida esteve num
mercado com baixas taxas de crescimento. Os executivos da VW Brasil diziam que a Kombi era
dinheiro em caixa: não se investia praticamente nada (exceto na produção e transporte) e cada
unidade nas concessionárias encontrava comprador sem problemas. Em 2014 a legislação exigiu
airbags em todos os carros, e o custo de adaptar na Kombi era proibitivo, criando uma situação
incompreensível para quem está de fora do mercado: líder que gera lucro permanente sendo
descontinuado. Outro exemplo clássico de vaca-leiteira é o Bombril. Líder inconteste há décadas
do mercado de palha de aço, gera receita na venda em altos volumes, com lucro unitário pequeno,
mas não exige muitos recursos para se manter.
• Abacaxi: produtos que não são líderes e cujo mercado apresenta baixa taxa de crescimento.
A metáfora do abacaxi é essa: vale a pena descascar esse abacaxi? A primeira coisa a avaliar
é a rentabilidade. Se não estiver num patamar aceitável para os objetivos da organização,
provavelmente valerá a pena descontinuar o produto. A posição do círculo no gráfico também deve
ser analisada. Se estiver muito para baixo e muito para a direita, significa que a taxa de crescimento
do mercado é muito baixa e que o produto tem participação de mercado muito distante do líder,
e talvez valha a pena descontinuar. Um exemplo de abacaxi é dos tablets Samsung, Huawei,
Lenovo e outros. A liderança do mercado mundial de tablets é da Apple, e a taxa de crescimento
de mercado é negativa (vai caindo ano após ano). Na matriz BCG da Samsung, Huawei e Lenovo,
seus produtos estão no quadrante de abacaxi, pois não são líderes de um mercado que cresce
pouco (no caso, diminui).
28
ADMINISTRAÇÃO ESTRATÉGICA
Saiba mais
Você mesmo pode montar uma matriz BCG se tiver os dados em mãos.
O site indicado a seguir ensina o passo a passo para elaborar o gráfico
utilizando o MS-Excel.
Essa ferramenta de análise, por ter métricas internas claras e por permitir analisar vários fatores
externos em conjunto das métricas definidas, é bastante utilizada por empresas cujos mercados são
auditados externamente, pois tem acesso a todos os dados requeridos para fazer a matriz. No Brasil, as
duas empresas que fazem regularmente auditoria de dados de mercado são a Nielsen, para produtos de
consumo, e a Close-Up, para produtos farmacêuticos.
A Nielsen é uma multinacional de pesquisa e inteligência de mercado que atua em mais de cem
países. No Brasil, há décadas é o principal fornecedor de dados de mercado (participação, preços,
locais de distribuição etc.). Seu levantamento de dados abrange mais de 150 categorias de produto de
alimentos, higiene/limpeza, eletroeletrônicos. Canais varejistas como supermercados, mercearias, bares,
farmácias, perfumarias e papelarias fornecem dados de vendas e estoque à Nielsen para serem inseridos
numa base de dados que gera relatórios variados. O varejo que participa cedendo dados tem acesso
gratuito aos relatórios. A indústria paga pelos relatórios. A Nielsen é a fonte para os dados que você lê
regularmente na mídia, como a participação de mercado da Coca-Cola ou o crescimento do mercado
de papel higiênico.
A matriz GE (ou McKinsey) é uma ferramenta de análise de unidades de negócio e foi criada
originalmente pela consultoria McKinsey para atender à empresa General Electric. Os dados de análise
levam em consideração o nível de atratividade do ramo de atividade e a força competitiva da unidade
de negócio.
29
Unidade I
Ghemawat (2002) comenta que em 1968 o presidente da General Electric contratou a consultoria
McKinsey & Company para examinar a estrutura corporativa da organização, que na época era composta
de 145 departamentos dispostos em dez diretorias. A lógica do arranjo organizacional era de controle
financeiro. Os consultores da McKinsey consideraram esse arranjo inadequado, pois os departamentos
eram voltados para dentro (controles financeiros internos), e propuseram uma estrutura baseada em
linhas de estratégia alinhadas com as condições externas (de mercado). A nova estrutura teria divisões
em unidades estratégicas de negócios e, de fato, foi implementada.
Alguns anos depois, a GE contratou novamente a McKinsey para auxiliar na avaliação das estratégias
das unidades de negócio recém-criadas. Após usar a matriz BCG, a GE sentiu necessidade de ir além
das variáveis básicas taxa de crescimento de mercado e participação relativa de mercado, que geravam
somente quatro possibilidades na matriz (estrela, vaca-leiteira, ponto de interrogação e abacaxi). Assim,
encomendou uma nova ferramenta mais adequada para suas necessidades. O resultado foi uma matriz
de nove quadrantes que utilizava dez variáveis para análise aprofundada.
Por ter sido criada para a uma demanda específica da General Electric, a matriz é voltada para analisar
unidades de negócio, e não para produtos em si (muito embora seja possível adaptar). A ferramenta
permite que sejam tomadas decisões de investimento, colheita e retração.
A matriz parte de dois eixos: atratividade da indústria e força da unidade do negócio.
• tamanho do mercado;
• preço atual e projetado;
• oportunidades de crescimento;
• rentabilidade;
• distribuição e logística.
A força da unidade de negócio mede o quanto a unidade de negócio reúne de vantagens competitivas
defensáveis. Trata-se de um cálculo econométrico que cria três intensidades de força (baixa, média ou alta)
a partir dessas variáveis:
• força da marca;
• força da empresa;
• capacidade de inovar.
30
ADMINISTRAÇÃO ESTRATÉGICA
Alta
Atratividade da indústria
cauteloso seguro prioritário
Investimento Investimento
Média
Colheita cauteloso seguro
Investimento
Baixa
A análise da matriz pronta consiste em entender o significado da posição em cada um dos nove
quadrantes. Cada unidade de negócio estará posicionada em um desses quadrantes:
Assim, a alta direção da GE teve condições de analisar metodicamente suas unidades de negócio e
tomar decisões estratégicas de investimento a partir de então.
31
Unidade I
As discussões acadêmicas sobre estratégia das décadas de 1980 e 1990 são notavelmente dominadas
por Michael Porter por meio de três livros: Competitive strategy, de 1980, Competitive advantage, de
1986, e The competitive advantage of nations, de 1990.
Suas contribuições são inestimáveis: modelo das cinco forças competitivas, modelo das estratégias
genéricas e vantagens competitivas das nações.
A primeira, o modelo das cinco forças competitivas, postula que não são somente os concorrentes
que afetam a competitividade de uma organização.
Veja que, pelo senso comum, ao se falar de competitividade há uma tendência a considerar somente
a força contrária dos concorrentes disputando mercado como importante. Entretanto, Michael Porter
apresentou outras quatro forças que também afetam a capacidade competitiva das organizações:
Poder de
barganha dos
fornecedores
Poder de
barganha dos
clientes
A rivalidade entre concorrentes é a primeira força, e a mais óbvia pelo senso comum. Alguns
ramos de atividade são compostos de empresas que disputam espaço com alta rivalidade. Bancos e serviços
de celular, por exemplo, vivem tentando convencer clientes da concorrência a mudar de fornecedor.
Há, entretanto, alguns ramos com baixa rivalidade. Padarias e lanchonetes de bairro não fazem muitos
esforços para atrair fregueses dos concorrentes: cada player toca seus negócios. Observe que o nível
de rivalidade afeta as capacidades competitivas de uma empresa, pois quando há alta rivalidade é
necessário ter mais investimentos em qualidade, operações, marketing etc. para superar o rival. Em baixa
rivalidade ocorre o contrário. Ou seja, o nível de rivalidade afeta a rentabilidade, já que é preciso investir
mais para se contrapor a concorrentes mais agressivos.
32
ADMINISTRAÇÃO ESTRATÉGICA
• Nível de cartelização: mercados com poucas empresas de porte podem incentivar acordos de
não agressão, isto é, cartel. A competição é localizada e sem invadir os espaços combinados
entre os players. Mesmo o cartel sendo ilegal pela lei da livre concorrência, há alguns setores
nessa situação. Veja o caso de pequenas cidades com somente dois ou três postos de gasolina.
Frequentemente, há acusações de cartel, com preços altos combinados e ausência de esforços
competitivos.
• Taxa de crescimento de mercado: a Teoria de Ciclo de Vida de Produto estabelece que produtos e
empresas são como seres humanos: nascem, crescem, atingem a maturidade e entram em declínio
em fases sequenciais. No caso de produtos e empresas, sempre é possível adotar estratégias que
alonguem o tempo do ciclo ou que recomecem o ciclo em caso de relançamentos. Em geral, a
rivalidade é baixa em fase de crescimento (quando a taxa de crescimento de mercado é alta),
pois se o mercado cresce não há custo-benefício positivo em investir para conquistar clientes do
concorrente. Por outro lado, na fase de maturidade a rivalidade é alta, pois a taxa de crescimento
de mercado é baixa/nula e os players tendem a investir para roubar clientes dos concorrentes.
Vendas
Lucros
Vendas
Lucro
33
Unidade I
Claro que a lista não se esgota aqui. Há outros fatores que afetam a rivalidade, até mesmo escolhas
pessoais. Destaca-se a centenária rivalidade entre Coca-Cola e Pepsi-Cola no mercado americano. Desde
a década de 1930 que essas empresas se digladiam para conquistar o espaço uma da outra. Promoções
agressivas de preços, disputas por espaço no varejo e exclusividade em lanchonetes eram ações comuns
ao longo dos anos. Nas décadas de 1980 e 1990, especialmente, a mídia passou a acompanhar o que
denominou “Guerra das colas”, em que todos os movimentos de uma contra a outra eram noticiados com
interesse. Os investimentos publicitários de ambas alcançaram recordes na época, contratando a peso de
ouro estrelas como Michael Jackson e Madonna para estrelar comerciais de TV. Um comercial da Pepsi
da década de 1980 é emblemático: estudantes de arqueologia com trajes futuristas estão escavando as
ruínas de uma civilização antiga (claramente a nossa). Ao encontrar uma lata amassada de Coca-Cola,
um estudante pergunta ao professor: O que é isso? E ele responde: Não faço ideia. E abre uma lata de
Pepsi! Ou seja, a Pepsi existe no futuro, e a Coca é esquecida. Essa rivalidade extrema foi estudada pela
academia, e D’Aveni (1994) calcula que o preço de uma caixa de bebida sabor cola, com preço ajustado
pela inflação para compensar, caiu de US$ 6.19 para US$ 3.99 em vinte anos, demonstrando um dos
efeitos deletérios da alta rivalidade.
Exemplo de aplicação
A internet dá acesso a vários comerciais da “Guerra das colas”. Digite “coke versus pepsi commercial”
(em inglês, mas vários são simples de entender) e divirta-se!
A segunda força de Porter, ameaça de novos entrantes, tem uma peculiaridade. Trata-se da
possibilidade de alguma empresa entrar no seu mercado. Não é o concorrente atual, e sim a chance de um
concorrente potencial. Para analisar esse risco de alguém vir a competir no seu mercado, é preciso entender
as barreiras de entrada, que são os fatores que podem impedir/atrapalhar (ou facilitar/incentivar) a entrada
de uma empresa em determinado setor. Por exemplo, o setor de siderurgia tem uma barreira de entrada que
limita muito qualquer entrante: necessita de altíssimos investimentos em estrutura (imagine quanto custa
construir um alto-forno siderúrgico e os maquinários de corte, processamento e distribuição) e alto volume
de capital de giro, o que torna o ramo pouco atraente para a grande maioria de investidores. É o mesmo
caso do ramo de aviação comercial: é preciso muito capital para constituir frota/manutenção, maquinário,
pessoal, permissões nos aeroportos etc. Por outro lado, o setor de salões de beleza/cabeleireiros/barbeiros
não tem praticamente nenhuma barreira de entrada: qualquer um pode criar um salão na garagem de casa
sem problemas. Porter (1980) cita algumas barreiras de entrada comuns:
• Economias de escala: quanto maior o volume de produção, menor o custo unitário. Em mercados
de massa, para um entrante se estabelecer de forma competitiva, é necessário ter escala de produção,
sob pena de ter custos unitários muito altos. Imagine um entrante no mercado de smartphones:
iniciar já com alta produção é fator mandatório. Huawei e Xiaomi iniciaram suas operações já
grandes para poderem competir. Mas normalmente essa barreira acaba desestimulando a entrada
em alguns mercados.
34
ADMINISTRAÇÃO ESTRATÉGICA
• Capital de entrada: como vimos, o setor siderúrgico exige um capital inicial altíssimo. Alguns
setores de atividade apresentam essa barreira. Claro que os valores são relativos: o investimento
necessário para criar um e-commerce pequeno é bem menor do que o necessário para um
e-commerce de altos volumes. O volume de capital necessário para entrar em um ramo é uma
barreira bastante comum.
• Acesso a fornecedores ou distribuidores: na maior parte dos mercados não há muita dificuldade
em negociar com fornecedores ou canais de distribuição, pois já atendem normalmente
as empresas existentes e não vão evitar um novo cliente. Porém, há casos em que os players
atuais exercem poder sobre fornecedores ou distribuidores; assim, forma-se uma barreira. Seja
por lealdade, seja por pressão econômica, fornecedores-chave e atacadistas/varejistas podem ser
exigentes além da conta com o entrante. Essa situação é típica no setor de produtos militares
como armas, aeronaves e veículos, com as empresas atuais pressionando seus fornecedores a
adotar contratos de exclusividade, atrapalhando novos entrantes. Em outra situação, fornecedores
de autopeças no mercado japonês são ferozmente leais aos fabricantes como Toyota e Honda,
e é difícil obter sua atenção.
• Curva de experiência: quem atua há mais tempo no mercado detém a vantagem da experiência
consolidada. Sua força de trabalho está treinada e operando há tempos. O know-how oriundo da
experiência é utilizado de maneira corriqueira. Muitas vezes, isso é uma barreira para um novo
entrante. Imagine o problema de uma nova empresa para entrar no mercado de relógios de luxo,
por exemplo. O nível de experiência e precisão exigido para a força de trabalho (praticamente
artesãos) pode dificultar enormemente uma nova empresa nesse ramo. Claro que isso pode ser
evitado ao se adquirir uma empresa já estabelecida: compra-se junto a curva de experiência
acumulada. A Volvo, tradicional montadora de automóveis sueca reconhecida mundialmente pelo
know-how em segurança automotiva, foi comprada pela Geely, grande fabricante chinesa de
automóveis, por US$ 1,8 bilhão há aproximadamente dez anos. Foi uma maneira eficiente
de entrar em mercados que reagiam mal aos produtos Geely. De maneira análoga, a Lenovo,
multinacional chinesa de tecnologia, comprou a unidade de negócio de computadores pessoais
da IBM em 2005 (já comentamos sobre a venda pela IBM anteriormente) e depois comprou a
unidade de negócios de servidores, também da IBM. Essa compra trouxe, entre outros benefícios
mais tangíveis, curva de experiência em projetar, fabricar e vender hardware de computadores em
escala mundial.
• Marco legal: trata-se de uma barreira imposta por governos locais que podem fazer restrições a
novos entrantes (normalmente estrangeiros). Podem ser de ordem fiscal (impostos, inclusive de
importação), exigência de documentações, proteção de patentes e exigência de contrapartidas.
Depois estudaremos como o governo chinês exige contrapartidas para empresas estrangeiras se
instalarem na China.
pensam em investir no ramo de automóveis de alto luxo. Rolls-Royce, Bentley e Maserati têm
altíssima percepção de valor.
Essas são as barreiras mais comuns, mas pode haver muito mais em casos específicos. De qualquer
forma, se há muitas barreiras de entrada, a capacidade competitiva de quem já está no setor é alta, pois
os riscos de um concorrente novo aparecer dividindo mercado são bem baixos.
A terceira força é a ameaça de produtos substitutos e também envolve a possibilidade, mas nesse
caso não é de um novo concorrente no seu mercado, e sim de um produto ou serviço que possa tornar
seu produto obsoleto ou sem atrativos. Por exemplo, locomotivas a vapor foram fabricadas até meados
do século XX, sendo substituídas por locomotivas a diesel ou elétricas. Os fabricantes que não mapearam
a ameaça de substituição certamente perderam mercado.
Você deve lembrar dos aparelhos toca-discos, que já foram uma indústria enorme em todo o
mundo. Foram substituídos pela tecnologia do CD. Alguns fabricantes de toca-discos quebraram por
isso (outros migraram para a nova tecnologia, claro). O CD foi substituído pela tecnologia de música
MP3 com players de todos os preços (e a pirataria de MP3 depois quebrou a indústria fonográfica em
larga escala). Agora a música é ouvida principalmente em smartphones através de aplicativos gratuitos
(com anúncios) ou pagos. Em outro ramo, o Uber substituiu o táxi tradicional – nesse caso, acabaram
dividindo mercado. Veja que empresas devem estar atentas a uma força competitiva que pode levá-las
à falência: a possibilidade de um know-how inovador pode tornar seu negócio obsoleto.
A) B)
C)
36
ADMINISTRAÇÃO ESTRATÉGICA
Impõe condições
comerciais
Impõe condições
comerciais
A quinta força, poder de barganha dos clientes, é exatamente igual, mas em outro sentido, pois
guarda relação com os clientes da empresa. O mais forte continua mandando na negociação. Imagine
de novo o pequeno laticínio mineiro do exemplo anterior. Na negociação com o Carrefour, ele perde
competitividade, mas na negociação com mercadinhos de cidades próximas talvez ele tenha mais poder
de barganha. Pense no mercadinho de bairro lidando com sua freguesia da vizinhança: se não houver
muitos outros mercadinhos, ele impõe preços. Ou será que o único posto de gasolina numa pequena
cidade não aproveita para aplicar preços altos? Veja como o poder de barganha dos clientes também
pode afetar a competitividade e, consequentemente, a rentabilidade de uma empresa.
Impõe condições
comerciais
Impõe condições
comerciais
37
Unidade I
Vantagem estratégica
Unicidade observada Posição de baixo custo
pelo cliente
Apenas um No âmbito
segmento de toda a
indústria
Alvo estratégico
Diferenciação Liderança em custo
Foco
Saiba mais
Há vários estudos de caso sobre o Habib’s. Leia a reportagem a seguir:
MENDES, A. et al. O sucesso do Habib’s no Brasil. BH1, 12 abr. 2018.
Disponível em: https://bit.ly/3Nh7cDR. Acesso em: 16 maio 2022.
maneira possível. A ideia é oferecer algo único e liderar esse segmento/nicho. Ou seja, a empresa
escolhe um segmento específico e faz o melhor produto possível, praticamente inviabilizando
a concorrência.
Em uma terceira contribuição, na década de 1990 Porter ampliou o escopo das vantagens
competitivas das nações para uma visão macroeconômica e geográfica que analisava as forças e
fraquezas de Estados nacionais como parte da análise da atuação de organizações multinacionais:
estratégia empresarial aplicada à geopolítica através do uso de indicadores de competitividade. O livro
The Competitive Advantage of Nations (1990) foi amplamente utilizado como base para planejamento
de muitas empresas internacionalizadas e também por vários governos para atrair investidores, inclusive
com a consultoria do próprio Michael Porter.
Andrews (apud GHEMAWAT, 2002, p. 41) argumenta que toda organização, suas divisões e mesmo
funcionários devem ter um conjunto claramente definido de propósitos ou metas que a faz se mover
numa direção deliberadamente escolhida e previne que vá para direções indesejadas. Nesse âmbito, em
1981 Andrews estabeleceu as bases para a criação da análise SWOT, ferramenta que compara pontos
fortes e fracos de uma organização com as ameaças e oportunidades do ambiente externo. A expressão
SWOT é um acrônimo formado pelas seguintes palavras: strenghts (pontos fortes); weaknesses (pontos
fracos); opportunities (oportunidades); e threats (ameaças).
39
Unidade I
O fato de a estratégia ser conhecida pelo mercado não significa que seja fácil copiá-la: imagine uma
rede de fast-food que queira copiar a estratégia de custo do Habib´s.
Lembrete
Para copiar essa estratégia, o pretenso concorrente precisaria comprar (ou criar) seus próprios
fornecedores e, ao mesmo tempo, oferecer produtos com preço bem baixo. Não é viável sob o ponto de
vista de retorno do investimento. Até ter massa crítica de faturamento e rentabilidade, certamente teria
muitos anos de prejuízo. Além da face visível, essa estratégia tem uma face sigilosa: qual é realmente o
custo do produto? Quais processos garantem qualidade razoável com custo baixo? E assim por diante.
Lembrete
Chaffee (1985) analisa as teorias de estratégia e as agrupa em três modelos de estratégia: o linear,
o adaptativo e o interpretativo. A estratégia linear tem uma perspectiva funcional por ser metódica,
sequencial e por ser baseada em um planejamento formal com análises estruturadas, sendo característica
de empresas de médio e grande porte. A estratégia adaptativa se ajusta ao ambiente competitivo e é
multifacetada com ajustes e mudanças, sendo mais comum em empresas de pequeno e médio porte
com visão mais avançada. Já a estratégia interpretativa tem caráter informal e deriva do contexto,
sendo mais comum em empresas de pequeno porte.
Peter Drucker aprimorou suas ideias sobre estratégia na década de 1990 e abraçou um escopo
mais amplo:
Mintzberg (1987) discute cinco significados ou dimensões para entender o conceito de estratégia:
plano, pretexto, padrão, posição e perspectiva.
40
ADMINISTRAÇÃO ESTRATÉGICA
• Plano: a estratégia é um guia ou curso de ação para lidar com a situação, é feito antes de agir
e é desenvolvido racionalmente. Muitas vezes, é documentado formalmente. Nessa dimensão,
entende-se que estratégia é um plano unificado, abrangente e integrado, apresentando objetivos
e as formas de atingi-los.
• Pretexto: a estratégia é um movimento intencional, como um truque ou manobra que visa
sobrepujar um concorrente. É derivado de condições dinâmicas da competição e tem funções
táticas. A empresa ilude a concorrência com movimentos que dão falsa percepção.
• Estratégia como padrão: a estratégia é um fluxo rotineiro de ações. Após algum tempo seguindo
uma estratégia, a empresa adota como rotina algumas ações que se provaram eficientes.
O comportamento constante das áreas gera resultados. Se um conjunto de ações repetidamente
traz os resultados esperados, a tendência é que vire comportamento padrão.
• Estratégia como posição: a estratégia é a maneira como a organização se posiciona no meio
competitivo. É a busca de um posicionamento vantajoso para crescer através das oportunidades e
para se manter ou se defender diante das ameaças. Define como a organização é percebida pelo
ambiente competitivo.
• Estratégia como perspectiva: a estratégia é uma abstração que está na mente dos líderes que
as concebem, e é difundida coletivamente em função de valores, ideologias e cultura uniformes.
É uma forma de ver o mundo, a competição e o mercado, interpretar as visões, projetar o futuro
da organização e atuar para atingir os objetivos.
Mintzberg, Ahlstrand e Lampel (2000) denominam as estratégias pretendidas que foram realizadas
como estratégias deliberadas. Porém, nem todas as estratégias conseguem ser realizadas. Estas são, na
visão dos autores, estratégias não realizadas. Por fim, há estratégias que surgem em função de uma
contingência ou situação não prevista e que são realizadas mesmo que não tenham sido planejadas
antecipadamente. Trata-se de estratégias emergentes.
Estratégia Estratégia
pretendida Estratégia deliberada realizada
41
Unidade I
• As estratégias realizadas dificilmente serão fruto 100% da estratégia deliberada. Assim, a estratégia
realizada é naturalmente um mix de estratégias deliberadas e estratégias emergentes. Sempre
ocorrerão fatos imprevistos para a aplicação de estratégias emergentes.
Por mais que se planeje, a realidade sempre exerce influência. O que realmente ocorre nas organizações
é uma combinação do planejado com ações que foram realizadas, mas não foram planejadas.
Como exemplo, imagine uma torrefadora de cafés de qualidade (preço premium) que estabelece
para os próximos anos uma estratégia de crescimento por aquisição de outras torrefadoras de qualidade,
tendo por objetivo adquirir ao menos duas por ano. Essa é a estratégia pretendida. Porém, no decorrer
do período, surge a oportunidade de adquirir a melhor rede de cafeterias premium do país, o que não
estava planejado, mas que pode agregar muito valor à operação como um todo. Decide-se comprar a
rede e também outra torrefadora. A estratégia pretendida não foi 100% implementada (compra de duas
torrefadoras virou compra de uma), e uma estratégia emergente acabou sendo executada (verticalizou um
canal de distribuição). Veja que essa empresa adaptou sua linha de ação em função de uma oportunidade
que surgiu e que foi aproveitada. A seguir, destaca-se outro exemplo interessante.
Exemplo de aplicação
Na década de 1990, Flávio era gerente de marketing de uma das maiores empresas gráficas do
Brasil (na época), a IBF Formulários. Os produtos eram para o mercado B2B: formulários contínuos
pré-impressos para computador, talões de cheques, passagens aéreas etc. A empresa era composta
de várias gráficas regionais que foram compradas pelos controladores ao longo dos anos, cada uma
com sua marca conhecida localmente. Havia unidades em Curitiba, São Bernardo, São Paulo, Rio de
Janeiro, Fortaleza etc. Os controladores contrataram um executivo de renome no mercado gráfico, que
desenvolveu várias estratégias para consolidar as unidades em uma só marca nova: Indústria Brasileira
de Formulários (IBF). Após dois anos padronizando procedimentos industriais, comerciais e financeiros
para que a estrutura fosse de uma só empresa com várias unidades industriais trabalhando em conjunto,
o marketing começou a atuar com mais força. A marca nova não era reconhecida pelos clientes, pois
ainda havia a força da imagem residual da marca regional anterior que os atendia. Uma das tarefas
de Flávio como gerente de marketing era divulgar e consolidar a imagem da marca IBF, e as estratégias de
comunicação foram desenvolvidas nesse sentido. Portanto, havia uma estratégia pretendida. Algumas
partes dessa estratégia acabaram não dando certo (estratégia não realizada), e outras, envolvendo
propaganda e relacionamento com imprensa, foram executadas (estratégia deliberada). Porém, surgiu
uma oportunidade única de ser o patrocinador oficial de um time de futebol, o São Paulo. Por força das
circunstâncias, o antigo patrocinador rompeu o contrato e, mesmo fora dos planos traçados, entrou
em negociação, pois o clube daria uma enorme visibilidade à marca. Foi a estratégia emergente que,
junto da estratégia deliberada, resultou na estratégia realizada. Uma vez que o São Paulo venceu
vários campeonatos na época, a visibilidade da marca IBF nas camisetas foi expressiva e os objetivos
de reconhecimento da nova marca foram atingidos. Foi uma rara ocasião de patrocínio esportivo em
time de futebol de primeira linha feito por empresa que não atuava no mercado de consumo, e sim no
mercado corporativo.
42
ADMINISTRAÇÃO ESTRATÉGICA
Ghemawat e Rivkin (2006) aprofundaram os conceitos de vantagem competitiva a partir das estratégias
genéricas de Porter (1986). Os autores definem vantagem competitiva como criação de valor superior aos
concorrentes diretos, considerando a diferença entre a disposição a pagar e o custo de oportunidade da
empresa. É um pensamento econométrico que ajuda a pensar sobre as vantagens competitivas.
• Disposição a pagar: é o valor monetário que em média os clientes aceitam pagar pelo produto
ou serviço. Claro que há grande elasticidade: a cerveja gelada na praia durante o verão tem um
valor diferente da mesma marca de cerveja no supermercado. O que interessa na discussão é o
conceito da média, e não os valores absolutos.
43
Unidade I
• A empresa que optar pela estratégia de diferenciação terá um custo de oportunidade um pouco
maior, mas em compensação a disposição a pagar será muito maior. Ou seja, é mais caro trabalhar
a diferenciação, mas a possível margem de lucro é bem maior.
• A empresa que optar pela estratégia de baixo custo terá um custo de oportunidade consideravelmente
menor, o que compensa a disposição a pagar um pouco menos. Ou seja, perseguir o baixo custo
gera menor percepção de valor por parte do cliente. Contudo, a margem de lucro pode compensar,
pois o volume de vendas é bem maior.
• A empresa que optar pela estratégia de foco (chamada pelos autores de dupla vantagem) terá um
custo de oportunidade um pouco menor e uma disposição a pagar um pouco maior.
Entendendo que essas diferenças gráficas são conceituais, e não de valores absolutos, podemos
inferir que:
• Todas as estratégias podem se constituir em vantagem competitiva, mas somente o efeito conjunto
causado pelas estratégias concorrentes é que pode determinar qual a mais vantajosa. Assim, se
estamos nos baseando em comparação com a média do ramo, basta que vários competidores
persigam a mesma estratégia para alterar a média. Por exemplo, se vários perseguirem a estratégia
de custo baixo, forçosamente a média da indústria será menor nas duas variáveis (disposição a
pagar e custo de oportunidade), privilegiando quem adota a diferenciação. Por outro lado, se
vários adotarem diferenciação, a média da indústria subirá, privilegiando o baixo custo.
• A empresa que realmente se posicionar bem à frente dos competidores em uma das estratégias
terá vantagem competitiva substancial. A Apple, com o iPhone, conseguiu ser realmente líder em
diferenciação por uma década, justificando preços bem mais altos e rentabilidade espetacular.
Nos últimos anos, o esforço constante em desenvolvimento de produto e marketing da Samsung,
e de outros players, vem conseguindo diminuir a distância de diferenciação com o iPhone.
Tanto é assim que nos dois últimos lançamentos (iPhone X, em 2018, e iPhone 11, em 2019)
não se verificou um estrondoso sucesso de vendas nas primeiras 24 horas, fato que aconteceu
em todos os lançamentos de iPhone anteriores. O produto continua sendo um grande sucesso,
mas os diferenciais competitivos atuais estão perdendo força. Desse modo, fica claro que mesmo
estratégias vencedoras não são garantia de sucesso ao longo do tempo: é preciso evoluir e adaptar.
O fato é que tanto a organização quanto os concorrentes se esforçam para oferecer valor aos
clientes, criando um ambiente de competição. A estratégia de cada um é que vai diferenciá-los através
de vantagens competitivas únicas.
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ADMINISTRAÇÃO ESTRATÉGICA
Clientes
Valor Valor
Estratégia
Organização Concorrentes
Competição
Há uma sequência lógica de passos para a execução do processo, incluindo planejar, implementar
e controlar.
Por planejar, entende-se fazer um diagnóstico da situação atual da empresa, analisar dados internos
e externos e formular a estratégia a ser adotada. Implementar significa executar as ações previstas com
eficiência e eficácia. Controlar, por sua vez, significa avaliar os resultados obtidos em comparação com o
planejado e propor correção de rumo quando necessário.
Análise
ambiental
Análise
interna
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Unidade I
Sobral e Peci (2013) definem como três os níveis de decisão estratégica, deixando claro que há
variações e adaptações no mundo corporativo.
Estratégia de nível corporativo
Corporação
Estratégia de nível de negócio
Recursos
Marketing P&D Operações Finanças humanos
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ADMINISTRAÇÃO ESTRATÉGICA
Com foco no longo prazo, é nesse nível de decisão estratégica que ocorre a definição dos negócios
mais atrativos e a correspondente alocação de recursos disponíveis. Estabelecidas as prioridades, a
organização pode investir para aproveitar oportunidades e para reduzir o risco de ameaças. Por exemplo,
comprar ou vender operações produtivas, fazer fusões com outras organizações ou mesmo realizar
joint-ventures.
Veja o exemplo do Grupo Votorantim, multinacional brasileira de controle familiar com operações
em mais de vinte países. Suas unidades de negócios estão nos setores de cimento, celulose, mineração,
siderurgia, energia e outros. A estratégia de nível corporativo em 2017 levou a empresa a vender
o controle acionário da unidade de negócios Votorantim Siderurgia para outra organização, a
ArcelorMittal, permanecendo no negócio somente como acionista. Os recursos financeiros dessa venda
foram direcionados para outras unidades de negócio, fortalecendo posições estratégicas do grupo e sem
abandonar o negócio de siderurgia.
A estratégia de nível funcional, como o próprio nome sugere, é aplicada em cada área funcional
da organização: RH, vendas/marketing, produção/operações etc. Os responsáveis (normalmente
diretorias ou gerências) desenvolvem estratégias restritas à sua área e alinhadas com as estratégias
de negócio. Por exemplo, caso a estratégia de negócio de uma empresa seja voltada para liderança de
custo, as áreas funcionais deverão formular estratégias voltadas para o atendimento desse quesito.
Nesse caso, a área funcional de produção poderia focar em processos de alta escala de produção para
reduzir custo unitário.
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Unidade I
Resumo
48
ADMINISTRAÇÃO ESTRATÉGICA
49
Unidade I
Exercícios
Questão 1. O ano de 2020 entra para a história como o ano em que a pandemia de coronavírus
alterou o dia a dia dos cidadãos e das empresas. Muitos produtos apresentaram quedas nas vendas, e os
administradores devem formular estratégias para reverter a situação.
Quadro 5
?
Alto
Crescimento do mercado
Estrela Interrogação
Baixo
Vaca-leiteira Abacaxi
I – O quadro mostra uma representação da matriz BCG, em que são considerados quatro quadrantes,
definidos por dois eixos: crescimento do mercado e participação relativa no mercado.
III – Um produto é considerado “abacaxi” quando, apesar da baixa participação de mercado, tem
faturamento estável e perspectivas de crescimento.
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ADMINISTRAÇÃO ESTRATÉGICA
A) I e III, apenas.
B) I e IV, apenas.
C) I e II, apenas.
D) I, II e III apenas.
E) II e IV, apenas.
Análise da questão
A imagem mostra a representação de uma matriz BCG, que considera dois eixos para avaliar a
situação de um produto. O posicionamento não é estático, ele é determinado em dado momento.
O produto considerado “abacaxi” não tem faturamento estável e pode não ter boas perspectivas.
O franchising permite que o franqueador aumente sua base de atuação com maior intensidade do
que seria possível se dependesse apenas de recursos próprios para instalar, operar e gerir novas unidades.
O fenômeno ocorre porque o franqueador faz uso daquilo que os estadunidenses denominam O.P.M.
(“other people’s money”, ou seja, “o dinheiro dos outros”), situação em que os franqueados bancam os
custos de implantação, operação e de gestão das respectivas unidades. Em segundo lugar, o franchising
reduz a necessidade de o franqueador recrutar, selecionar e contratar pessoal, em particular gerentes que
sejam capazes de administrar essas novas unidades, muitas vezes geridas pelos próprios franqueados.
Por meio do franchising, o franqueador pode, adicionalmente, ingressar em mercados nos quais
dificilmente entraria se dependesse de seus recursos próprios, sejam financeiros ou humanos. Para isso,
conta com a presença física e o conhecimento do franqueado sobre os hábitos e a cultura da região
onde vive e trabalha.
51
Unidade I
Quadro 6
Produtos
Existentes Novos
Desenvolvimento Diversificação
de mercado
Suponha que uma empresa franqueadora do setor de lanchonetes deseje ampliar negócios sem
modificar os princípios negociais habitualmente praticados. Com baser no texto e nos quatro quadrantes
da matriz de componentes do vetor de crescimento apresentada, qual das alternativas de crescimento
seria a mais pertinente ao caso?
Análise da questão
No caso em estudo, a empresa não está buscando crescimento por meio da ampliação de portfólio
de produtos, mas, sim, por meio da modificação e do desenvolvimento de produtos já existentes. A
ampliação dos negócios está centrada:
• na expansão do mercado pelo aumento de participação nos mercados existentes, o que indica
penetração no mercado;
• na expansão geográfica para os produtos fabricados pela empresa, o que indica desenvolvimento
de mercado.
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