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2023 Colecao Estudos Enamat v0003
2023 Colecao Estudos Enamat v0003
2023 Colecao Estudos Enamat v0003
Volume 3 ESTUDOS
A efetividade da execução trabalhista
ENAMAT
Coordenação Geral
Ministro Mauricio Godinho Delgado
COLEÇÃO
Ministro Cláudio Mascarenhas Brandão
Volume 3 ESTUDOS
A efetividade da execução trabalhista
ENAMAT
Brasília, DF
Obra Coletiva ENAMAT
Maio de 2023
©2023 BRASIL. Tribunal Superior do Trabalho.
Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados do Trabalho (ENAMAT)
Permitida a reprodução de qualquer parte, desde que citada a fonte.
Capa:
Secretaria de Comunicação Social do TST (SECOM)
Coordenação Editorial:
Carlos Amaral Filho
Diagramação:
Eron de Castro
Revisão:
Carmem Menezes
Impressão e Acabamento:
ACE Comunicação e Editora EIRE
FICHA CATALOGRÁFICA
428 p.
ISBN: 978-65-87325-07-1
CDU – 349.2
Ficha Elaborada pela Bibliotecária Mariana Ferreira dos Anjos – CRB 1976
ESCOLA NACIONAL DE FORMAÇÃO E APERFEIÇOAMENTO
DE MAGISTRADOS DO TRABALHO (ENAMAT)
(Gestão 2022/2024)
13 APRESENTAÇÃO
Ministro Mauricio Godinho Delgado
Ministro Cláudio Mascarenhas Brandão
PARTE I
EXECUÇÃO DIRETA, INDIRETA E
EFETIVIDADE DOS DIREITOS TRABALHISTAS
61 PERSONALIDADES (DES)CONSIDERADAS:
A VIABILIDADE DA DESCONSIDERAÇÃO DA
PERSONALIDADE JURÍDICA DOS FUNDOS DE
INVESTIMENTO EM PARTICIPAÇÃO (FIP) COMO
SUPOSTO DE PRESERVAÇÃO DA PERSONALIDADE
HUMANA NA ERA DO CAPITALISMO FINANCEIRO
Bruno Alves Rodrigues
PARTE IV
MEDIDAS ATÍPICAS DE EXECUÇÃO:
LIMITES E POSSIBILIDADES
PARTE V
MEDIDAS DE ENFRENTAMENTO À
LITIGÂNCIA HABITUAL E EXECUÇÃO
NO PROCESSO COLETIVO
que recai sobre a Escola (arts. 93, IV e art. 111-A, § 2.º, inciso I, da Constituição
Federal).
Nesse sentido, os artigos de elevada qualidade elaborados por magistradas
e magistrados do trabalho cuidaram de trazer preciosas reflexões acerca de
importantes dimensões formativas descritas em tal tabela de competências,
como as que dizem respeito a:
a) identificação de grandes litigantes regionais e os grandes grupos seto-
riais econômicos, assim como os seus padrões de litigância, para uma
atuação preditiva, com utilização de conceitos do processo estrutural e
do processo coletivo (dimensão formativa 4.1.a);
b) aplicação de medidas indutivas, constitutivas, mandamentais e executivas
lato sensu, para tutela específica dos direitos e obrigações das partes,
visando a obtenção de resultado prático equivalente ao adimplemento
(dimensão formativa 4.2.f);
c) celeridade e efetividade concreta no cumprimento dos acordos realiza-
dos (dimensão formativa 4.3.e);
d) proatividade no curso do processo de execução, por meio da utilização
de instrumentos para a sua efetividade, com a aplicação das técnicas de
pesquisa, investigação e avaliação de dados patrimoniais e decidir com
o menor custo processual maior efetividade para o credor trabalhista
(dimensão formativa 4.9.a);
e) implementação de novas práticas que possam auxiliar na efetividade
da execução e proposição de alternativas criativas para que o devedor
satisfaça sua dívida (dimensão formativa 4.9.d).
Desejamos, assim, que esta obra, lançada por ocasião do “Seminário Cami-
nhos para a Efetividade da Execução Trabalhista” – evento também correalizado
pela Enamat junto à CNEET, nos dias 30 e 31 de maio de 2023, no TST – se preste
à melhoria das condições humanas e instrumentais dessa importante fase da
prestação jurisdicional, relacionada à entrega material do direito reconhecido
ao seu titular.
Assim é que, por exemplo, os entes responsáveis pela defesa judicial dos
interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos dos trabalhadores, po-
derão se valer do remédio jurídico da ação civil pública para solicitar ao Juiz
do Trabalho todos aqueles provimentos mandamentais que sejam hábeis à
promoção do respeito à integridade ambiental trabalhista, sempre que o em-
pregador se recusar a fazê-lo espontaneamente ou pela via administrativa. À
guisa de exemplificação, são passíveis de veiculação em juízo, visando à criação
de um meio ambiente de trabalho hígido, entre outras, as seguintes pretensões
de natureza mandamental:
• Imposição ao empregador de condutas aptas à inviabilização da consu-
mação das crises ambientais trabalhistas, quer sejam elas de dimensão
desumanizante, físico-ergonômica ou mesmo moral;
• Impedimento de o estabelecimento iniciar as suas atividades sem prévia
inspeção e aprovação das instalações;
• Interdição de estabelecimento, setor de serviço, máquina ou equipamen-
to, ou ainda embargo de obra, em caso de grave e iminente risco para a
saúde e segurança do trabalhador;
• Dotação de dispositivo de partida e parada e outros que se fizerem neces-
sários nas máquinas, colimando a prevenção de acidentes do trabalho;
• Obrigação de o empregador tomar todas as medidas necessárias à eli-
minação da insalubridade acaso existente no ambiente de trabalho, seja
ela decorrente de ruído, vibrações, contaminação do ar ou outros;
• Obrigação de o empregador, baldados todos os esforços de eliminação
completa da insalubridade, fornecer aos empregados EPIs adequados
ao risco e em perfeito estado de conservação e funcionamento;
• Realização, pelo empregador, de exames médicos periódicos, onde
possam ser detectados indícios de contaminação por agentes tóxicos
ou de desenvolvimento de doenças ocupacionais, a fim de que sejam
tomadas, a tempo e modo, as medidas úteis à restauração da saúde do
empregado;
• Proibição da realização de jornadas exaustivas, que iniludivelmente au-
mentam a possibilidade da ocorrência de acidentes de trabalho;
• Concessão de mobiliário que seja ergonomicamente adaptado às neces-
sidades físicas dos trabalhadores; e
• Impedimento da prática de atos que caracterizem o terror psicológico
no trabalho.
A EFETIVIDADE DA EXECUÇÃO TRABALHISTA 25
Confirmando tal opção, o artigo 536, caput, do Código de Processo Civil, aduz
que, no cumprimento de decisão que reconheça a exigibilidade de obrigação
de fazer ou de não fazer, o juiz poderá, de ofício ou a requerimento, para a
efetivação da “tutela específica” ou a obtenção de tutela pelo resultado prático
equivalente, determinar as medidas necessárias à satisfação, que, nos termos
do § 1.º do aludido preceito podem ser, entre outras, a imposição de multa, a
busca e apreensão, a remoção de pessoas e coisas, o desfazimento de obras e o
impedimento de atividade nociva, se necessário com o auxílio de força policial.
Vale transcrição, tratando da “tutela específica”, as palavras de Luiz Guilherme
Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero:
neste trabalho como uma das mais eficientes formas de coerção do réu para
a adoção de um comportamento específico, seja ele comissivo ou omissivo.
Assim, ao ordenar o cumprimento de determinada obrigação de fazer ou não
fazer, o julgador deverá fixar um prazo para a sua implementação, sob pena
de multa. Terminado o prazo e não cumprida a obrigação, o juiz determinará
a satisfação das astreintes vencidas e, com fulcro no § 1.º do artigo 537 do Có-
digo de Processo Civil, que retira a possibilidade de formação de coisa julgada
sobre o valor da multa e a sua periodicidade, concederá novo prazo para o
cumprimento da obrigação imposta na sentença, sob a cominação de nova
multa pecuniária, que poderá, no futuro, ser mais uma vez executada, e assim
sucessivamente, até que a obrigação seja cumprida.
Observe-se, contudo, que um dos temas mais discutidos relativamente às as-
treintes, reside no momento a partir do qual elas poderiam ser implementadas.
Sob a égide do Código de Processo Civil de 1973 a doutrina oscilava entre dois
pontos de vista. O primeiro apregoava que a satisfação da multa dependeria
do trânsito em julgado da decisão.3 Já o segundo asseverava que a sua satisfa-
tividade haveria que ser imposta a partir do decurso do prazo concedido para
o cumprimento da ordem judicial.4 Ainda hoje, verdade seja dita, o artigo 12, §
2.º da Lei n. 7.347/1985 (Lei de Ação Civil Pública) carrega consigo uma resposta
legislativa expressa para a questão, ao estatuir que a multa cominada liminar-
mente só será exigível após o trânsito em julgado da decisão favorável ao autor,
mas será devida desde o dia em que houver configurado o descumprimento.
Esgrimamos, acerca da parte final do parágrafo anterior, o ponto de vista de
que o prefalado artigo 12, § 2.º da Lei de Ação Civil Pública, com a sua redação
datada de 1985, não foi recepcionado pela ordem constitucional emergida em
1988, haja vista que não se mostra sensato supor que a legislação infracons-
titucional, em pleno Estado Democrático-Ambiental de Direito, possa impor
obstáculos à satisfação imediata das tutelas inibitória e de remoção do ilícito,
principalmente quando rememoramos a natureza jurídica preventiva que as
distingue dos preceitos condenatórios, que no âmbito laboral, por exemplo,
revelam-se empenhadas em reduzir os riscos inerentes ao trabalho, por meio de
normas de saúde, higiene e segurança. Não custa assim repisar, vez mais, que
as técnicas mandamentais, ao contrário das condenatórias, não se comprazem
constitui ato atentatório à dignidade da justiça, devendo o juiz, sem prejuízo das
sanções criminais, civis e processuais cabíveis, aplicar ao responsável multa de
até 20% do valor da causa, de acordo com a gravidade da conduta, a qual será
inscrita como dívida ativa da União ou do Estado, após o trânsito em julgado
da decisão que a fixou, se não for paga.
De tal arte, sendo o sócio gestor um terceiro, a quem incumbe cumprir em
nome da empresa a obrigação que lhe foi imposta, poderá, perfeitamente, se
ver compelido a suportar a multa em questão, independentemente da sua res-
ponsabilização criminal por desobediência (artigo 330 do Código Penal). Nem
se objete que nesse caso haveria bis in idem. Primeiramente, porque as multas
serão aplicadas a diferentes sujeitos, ou seja, à empresa e ao seu sócio gestor.
Ademais, ao deixar de cumprir a obrigação imposta, a empresa e o seu sócio
gestor estarão a toda evidência criando embaraços à administração da justiça.
Ao agirem assim, além de lesionarem o direito fundamental da parte con-
trária à tutela jurisdicional útil, célere e eficaz, perpetrarão inominável ofensa à
própria dignidade da Justiça, que almejando cumprir com eficiência o seu dever
constitucional de bem subministrar o direito, ver-se-á aprisionada no emara-
nhado de chicanas praticadas por aqueles que desejam retardar a entrega do
bem da vida a quem de direito. Com efeito, o § 2.º do artigo 77 do Código de
Processo Civil de 2015, tal como já o tinha feito o parágrafo único do art. 14
do Código de Processo Civil de 1973, importou do direito anglo-saxônico para
o brasileiro o instituto jurídico conhecido como contempt of court, que na boa
dicção de Fabrizio Camerini é definido como a “desobediência [...] às ordens
proferidas pelo Poder Judiciário, por meio de ações que contrariem sua auto-
ridade, dignidade ou justiça de seus comandos”.5
Como se vê, as sanções respectivamente previstas nos artigos 536, § 1.º, e 77,
§ 2.º, ambos do Código de Processo Civil, embora passíveis de serem impostas
em virtude de um mesmo ato, colimam fins absolutamente diversos. Tanto é as-
sim que, enquanto a primeira delas se destina à parte nas ações individuais (art.
537, § 2.º do CPC/2015) ou à sociedade no caso das ações coletivas, a segunda é
devida, sem prejuízo das demais sanções criminais, civis e processuais cabíveis,
à União (na hipótese da aplicação pela Justiça do Trabalho), sendo inserida na
sua dívida ativa, caso não venha a ser adimplida no prazo estabelecido pelo
magistrado, sempre contado do trânsito em julgado da decisão final da causa
(art. 77, § 3.º, do CPC/2015). Por todo o exposto, não se pode concluir de modo
diverso, a não ser para se compreender que a aplicação cumulada das duas san-
ções, longe de ferir o princípio jurídico do non bis in idem, homenageia, a mais
não poder, tanto em eficácia vertical quanto horizontal, o direito fundamental
à inafastabilidade substancial da jurisdição (artigo 5.º, XXXV, da Constituição).
7 SÍNTESES CONCLUSIVAS
Uma vez apresentado um trabalho, é sempre saudável veicularmos em tó-
picos algumas sínteses conclusivas:
• Quando falamos na efetividade da execução trabalhista, pensamos, ime-
diatamente, no cumprimento das obrigações de dar quantia certa;
• Tal comportamento, de resto viciado, decorre de um excessivo apego
do juslaboralismo para com a monetização da saúde do cidadão-traba-
lhador;
• Temos hoje delineado um modelo estatal epitetado como “Estado Demo-
crático-Ambiental de Direito”, sendo a sua principal característica jurídica
o “privilégio da prevenção em detrimento da repressão”;
• Pode-se concluir, do quanto asseverado no item anterior, que o princi-
pal direito fundamental trabalhista é a “redução dos riscos inerentes ao
trabalho”, haja vista que ele guarda uma relação de anterioridade lógica
para com a fruição de todos os demais interesses laborais;
• De tal arte, o Direito do Trabalho clama por ser ressignificado pela princi-
piologia epistemológica que orienta o Direito Ambiental, com ênfase para
os princípios do “desenvolvimento sustentável” e do “poluidor-pagador”;
• Por corolário, o Processo do Trabalho também haverá de ser reconfor-
mado, centrando a sua atenção nos provimentos mandamentais pre-
ventivos, calcados nas tutelas “inibitória”, de “remoção do ilícito” e “res-
sarcitória na forma específica”;
36 COLEÇÃO ESTUDOS ENAMAT
REFERÊNCIAS
CAMERINI, Fabrizio. Teoria geral da tutela mandamental: conceituação e aplicação.
São Paulo: Quartier Latin, 2007.
MARINONI, Luiz Guilherme. Tutela inibitória (individual e coletiva). 2. ed. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2000.
MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz; MITIDIERO, Daniel. Curso de pro-
cesso civil: tutela dos direitos mediante procedimento comum. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2015. V. 2.
NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de direito processual civil. 12. ed. rev. e
atual. Salvador: JusPodivm, 2019.
SPADONI, Joaquim Felipe. Ação inibitória: ação preventiva prevista no art. 461 do CPC.
2 ed. rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007.
TERMO DE
COMPROMISSO DE
AJUSTAMENTO DE
CONDUTA:
CARACTERÍSTICAS
E EFETIVIDADE DA
EXECUÇÃO PERANTE A
JUSTIÇA DO TRABALHO
Xisto Tiago de Medeiros Neto
Doutorando pela Universidade Federal do Paraná. Procurador
regional do trabalho. Professor adjunto da Universidade Federal
do Rio Grande do Norte. Membro do Grupo de Estudos em
Trabalho, Economia e Políticas Públicas. E-mail: xistotmn@gmail.
com. Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/0969634391823319.
1 INTRODUÇÃO
O Termo de Compromisso de Ajustamento de Conduta (TAC) é espécie de
negócio jurídico bilateral, alçado por lei à categoria de título executivo extra-
judicial, constituindo instrumento hábil, eficaz e atualíssimo voltado para a
composição e conciliação de conflitos envolvendo direitos difusos, coletivos
e individuais homogêneos, encontrando-se o Ministério Público do Trabalho
legitimado e qualificado legalmente para a sua promoção, no exercício de sua
função institucional.
O descumprimento dos deveres assumidos no TAC pela parte compromi-
tente e a consequente execução judicial das respectivas obrigações (de fazer,
não fazer e/ou pagar) revelam questões importantes de ordem procedimental,
principalmente quanto à busca da efetividade e eficácia processual da tutela
jurisdicional, a exigir uma abordagem jurídica apropriada, considerando-se tra-
tar da proteção de direitos transindividuais.
Em tal caminho, explicita-se neste estudo, em exame introdutório, o con-
ceito e a natureza jurídica do TAC, o conteúdo possível das suas obrigações
e a abrangência territorial e vigência. No ponto central, cuida-se da análise
dos aspectos correspondentes ao seu descumprimento, da relevância da ade-
quação do procedimento executivo em conformidade com as características
das obrigações pactuadas, da execução específica da multa nele prevista e da
multa judicial fixada no âmbito do processo, da impossibilidade da prescrição
da pretensão executiva, por força da essência e peculiaridades próprias dos
interesses transindividuais, e, por último, do limite da intervenção judicial em
relação às cláusulas firmadas pelas partes.
7 O artigo 5.º, I a IV, elenca os entes públicos legitimados para celebrar o TAC com a parte interessada:
o Ministério Público; a Defensoria Pública; a União, os estados, o Distrito Federal e os municípios; a
autarquia, empresa pública, fundação ou sociedade de economia mista.
8 Essa disposição foi introduzida na LACP pelo art. 113 do Código de Defesa do Consumidor (Lei
n. 8.078/1990) e encontra-se também presente no art. 211 do Estatuto da Criança e do Adolescente.
A EFETIVIDADE DA EXECUÇÃO TRABALHISTA 39
9 Art. 784. São títulos executivos extrajudiciais: XII – todos os demais títulos aos quais, por disposição
expressa, a lei atribuir força executiva.
10 Definição expressa pelo art. 1.º, caput, da Resolução n. 174, de 26/7/2017, do CNMP, que disci-
plinou a tomada do compromisso de ajustamento de conduta, no âmbito do Ministério Público.
40 COLEÇÃO ESTUDOS ENAMAT
15 OJ 130-SBDI-2: AÇÃO CIVIL PÚBLICA. COMPETÊNCIA. LOCAL DO DANO. LEI n. 7.347 /1985, ART. 2º.
CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR, ART. 93. I – A competência para a Ação Civil Pública fixa-se
pela extensão do dano. II – Em caso de dano de abrangência regional, que atinja cidades sujeitas
à jurisdição de mais de uma Vara do Trabalho, a competência será de qualquer das varas das lo-
calidades atingidas, ainda que vinculadas a Tribunais Regionais do Trabalho distintos. III – Em caso
de dano de abrangência suprarregional ou nacional, há competência concorrente para a Ação Civil
Pública das varas do trabalho das sedes dos Tribunais Regionais do Trabalho. IV – Estará prevento
o juízo a que a primeira ação houver sido distribuída.
A EFETIVIDADE DA EXECUÇÃO TRABALHISTA 43
5 DESCUMPRIMENTO
A fiscalização do cumprimento das obrigações do TAC deve ser realizada em
procedimento administrativo do Parquet trabalhista, mediante a realização de
inspeção ou por meio de requisição de ação fiscal à Superintendência Regional
do Trabalho, ao órgão da Vigilância Sanitária, ao Centro de Referência em Saúde
do Trabalhador (CEREST), ou a outro órgão ou instituição qualificada para tal
atividade, conforme entendimento pacífico do TST:
16 A Resolução n. 179/2017 do CNMP, assim estatui em seu art. 11: Descumprido o compromisso
de ajustamento de conduta, integral ou parcialmente, deverá o órgão de execução do Ministério
Público com atribuição para fiscalizar o seu cumprimento promover, no prazo máximo de sessenta
dias, ou assim que possível, nos casos de urgência, a execução judicial do respectivo título executivo
extrajudicial com relação às cláusulas em que se constatar a mora ou inadimplência. Parágrafo único.
O prazo de que trata este artigo poderá ser excedido se o compromissário, instado pelo órgão do
Ministério Público, justificar satisfatoriamente o descumprimento ou reafirmar sua disposição para
o cumprimento, casos em que ficará a critério do órgão ministerial decidir pelo imediato ajuizamento
da execução, por sua repactuação ou pelo acompanhamento das providências adotadas pelo com-
promissário até o efetivo cumprimento do compromisso de ajustamento de conduta, sem prejuízo
da possibilidade de execução da multa, quando cabível e necessário.
A EFETIVIDADE DA EXECUÇÃO TRABALHISTA 45
Para cada espécie de obrigação inadimplida deve ser intentada uma execução
diversa, instruída com cópia do título, pois os ritos procedimentais são distintos. A
cumulação de execuções só é possível quando houver identidade de partes, iden-
tidade de competência do juízo e identidade do meio executório (procedimental),
ou seja, a cumulação somente é admissível se as obrigações exigidas forem da
mesma espécie, por exemplo, duas dívidas de valor decorrentes de obrigação de
indenizar e da incidência de multa cominatória. Não é possível o ajuizamento de
uma só execução para buscar a satisfação, por exemplo, de obrigação de fazer e de
obrigação de indenizar, porque o rito da execução por quantia certa e da execução
de obrigação de fazer são complemente distintos.19
17 CPC, art. 780. O exequente pode cumular várias execuções, ainda que fundadas em títulos dife-
rentes, quando o executado for o mesmo e desde que, para todas elas, seja competente o mesmo
juízo e idêntico o procedimento.
Dessa maneira, não somente por ser tecnicamente adequada e exigida por
lei, mas também por garantir maior efetividade processual, em atenção ao
princípio-vetor do devido processo legal, é dever legal do Ministério Público do
Trabalho, como tomador do TAC, propor ações de execução próprias e inde-
pendentes: uma específica para as obrigações de fazer e não fazer e outra com
o rito adequado à obrigação de pagar a reparação pactuada pelo dano coletivo
e/ou a multa prevista pelo descumprimento do compromisso.
Assim, na ação de execução pertinente à multa constante do TAC e/ou à
parcela não cumprida da reparação do dano coletivo, se a parte devedora após
a citação não pagar tais valores, obriga-se a garantir previamente o juízo para
poder embargar a execução, sob pena de penhora, o que representa maior
possibilidade de êxito na cobrança desta parcela (art. 829 do CPC).
Diversamente disso, tratando-se da ação de execução das obrigações de
fazer e não fazer descumpridas, o executado será intimado pessoalmente para
cumpri-las, sob pena de incidência de multa por período de atraso, a partir da
sua intimação (Súmula 410, STJ). É essa a previsão do art. 814 do CPC, ao pres-
crever que “na execução de obrigação de fazer e não fazer fundada em título
extrajudicial, ao despachar a inicial, o juiz fixará multa por período de atraso no
cumprimento da obrigação e a data a partir da qual será devida”.
Em conclusão, sendo incongruentes os procedimentos executivos, por força
da natureza das obrigações descumpridas e diante da regra cogente do art. 780
do CPC e da imperatividade do princípio do devido processo legal, não se pode
admitir a cumulação, em uma mesma ação, de obrigações de fazer e não fazer
com obrigações de pagar quantia certa, originárias do descumprimento de TAC,
sob pena de resultar o processo em inefetividade e prejuízo para as partes.
22 TRT3, Agravo de petição n. 005590-41.2007.5.03.0057, 7.ª T, Rel. Des. Paulo Roberto de Castro,
j. 1/10/2009.
25 Art. 5.º. As indenizações pecuniárias referentes a danos a direitos ou interesses difusos e coleti-
vos, quando não for possível a reconstituição específica do bem lesado, e as liquidações de multas
deverão ser destinadas a fundos federais, estaduais e municipais que tenham o mesmo escopo do
fundo previsto no art. 13 da Lei n. 7.347/1985.
§ 1º Nas hipóteses do caput, também é admissível a destinação dos referidos recursos a projetos de
prevenção ou reparação de danos de bens jurídicos da mesma natureza, ao apoio a entidades cuja
finalidade institucional inclua a proteção aos direitos ou interesses difusos, a depósito em contas
judiciais ou, ainda, poderão receber destinação específica que tenha a mesma finalidade dos fundos
previstos em lei ou esteja em conformidade com a natureza e a dimensão do dano.
A EFETIVIDADE DA EXECUÇÃO TRABALHISTA 51
Art. 7.º Para orientar a reversão de bens e recursos decorrentes da atuação fina-
lística, o Ministério Público do Trabalho instituirá e manterá atualizado o cadastro
nacional de órgãos e entidades públicos ou privados, nacionais ou internacionais,
sem fins lucrativos, que promovam direitos sociais, com expressa indicação dos
diretamente relacionados ao trabalho.
Parágrafo único. O cadastro nacional será alimentado pelos cadastros instituídos,
no âmbito das Procuradorias Regionais do Trabalho, destinados às reparações
regionais ou locais.
7 PRESCRIÇÃO
Não prescreve a pretensão do Ministério Público do Trabalho de exigir judi-
cialmente o cumprimento das obrigações constantes do TAC, diante da natureza
transindividual e indisponível do direito tutelado e, também, da observação da
vigência do instrumento, em regra, por prazo indeterminado.
No âmbito dos direitos transindividuais é inconcebível falar-se em aplicação
do instituto da prescrição, em razão das suas características básicas, como a in-
determinação dos integrantes da coletividade, a indivisibilidade dos respectivos
interesses e, ainda, a extrapatrimonialidade, não se referindo, pois, a direitos
patrimoniais individualizados com equivalência a “crédito”.
Seria absurdo, assim, pensar-se na ocorrência de inércia quanto à postula-
ção de uma pretensão executiva de natureza coletiva, por não conferir a lei a
legitimação processual aos indivíduos integrantes da coletividade afetada, para
reivindicar diretamente a tutela do direito em nome de todos.
Assim, é incompatível com a noção do devido processo legal infringir-se a
um grupo, categoria ou classe de pessoas a perda de uma pretensão pelo não
exercício do direito de demandar em determinado prazo, quando não se faz
possível, no plano jurídico-processual, garantir-se o acesso à justiça por iniciativa
própria e individualizada dos seus integrantes, exatamente em decorrência de o
interesse encontrar-se dimensionado em um universo coletivo de titularização.
O paradoxo externado em tais questionamentos é bastante para realçar a
inaplicabilidade do instituto prescricional nessa seara da tutela coletiva. Dessa
maneira, os interesses titularizados pela coletividade, por serem indisponíveis
e indeterminados, concernindo a bens e valores inseridos na órbita de direitos
de indiscutível fundamentalidade, não poderiam submeter-se, quanto à pos-
sibilidade de tutela executiva, a uma limitação extintiva de natureza temporal.
A EFETIVIDADE DA EXECUÇÃO TRABALHISTA 55
28 TRT 23.ª Região – Processo AP 00360.2005.061.23.00-9, Rel. Des. Paulo Brescovici, 22/3/2007.
29 TRT 9.ª Região, Processo 0001779-53.2012.5.09.0661, Rel. Des. Cassio Colombo Filho, 2.ª T,
j 13/5/2014.
56 COLEÇÃO ESTUDOS ENAMAT
30 Art. 877-A. É competente para a execução de título executivo extrajudicial o juiz que teria com-
petência para o processo de conhecimento relativo à matéria.
31 Processo AP n. 00143-33.2012.5.03.0010, 6.ª Turma, Rel. Des. Jorge Berg de Mendonça, DJe 12/4/2013.
REFERÊNCIAS
GAVRONSKI, Alexandre Amaral. Técnicas Extraprocessuais de tutela coletiva. São
Paulo: RT, 2010.
LEONEL, Ricardo de Barros. Manual do processo coletivo. São Paulo: Malheiros, 2021.
MANCUSO, Rodolfo de Camargo. Ação Civil Pública. 12. ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2011.
NEVES. Daniel Amorim Assumpção. Novo CPC comentado. Salvador: JusPodium, 2016.
INTRODUÇÃO
O ser humano é essencialmente um ser gregário, na medida em que a
própria condição humana é forjada em sociedade. Tratar de personalidade
é tratar do substrato de uma práxis social. O homem o é com os outros. E o
trabalho representa a mais relevante práxis societária significante do mundo,
isso em sua acepção ampla, a abranger a ação de empreender, base etimológi-
ca do próprio conceito de Empresa, que deriva do latim prehensus, prehendere
(empreender, praticar). Empresa é ato, e não ente; empresa em seu conteúdo
ético é trabalho.
Tratar do fenômeno da desconsideração da personalidade jurídica supõe
a compreensão de que personalidade não representa simples ficção jurídica
convencionalmente constituída ou formalistamente reconhecida. A persona-
lidade vincula-se ao empreender como amalgama relacional performativo do
um ser social ou, mais especificamente para o que nos interessa neste artigo,
de um ser societário.
É no empreender humano, como percurso dialetizado do reconhecimento,
que se performa a consciência histórica, substância maior de qualquer perso-
nalidade. No grupo humano, essa consciência apenas se dá a partir da percep-
ção da essencialidade que o outro sujeito prova deter a partir de seu próprio
trabalho. “A adequada relação do grupo humano com a natureza como fonte
de recursos (trabalho) passa a condicionar decisivamente a efetiva relação
dos indivíduos entre si como sujeitos do direito (reconhecimento)” (LIMA VAZ,
1993, p. 271).
No reconhecimento do outro pela ação de empreender, ou seja, pelo traba-
lho, o homem expande a consciência de si. O indivíduo que não forma o seu ser
numa relação de reconhecimento para com o outro não desfruta de liberdade
socialmente reconhecida, única a prescindir da força para se concretizar em
um mundo de cultura.
Podemos dizer, assim, que a personalidade é forjada socialmente por meio
do trabalho, a abranger a noção de empreender, de empresa. “O homem tem
um lugar na sociedade do trabalho e só vale para a sociedade na medida em
que contribui para a atividade comum” (WEIL, 2012, p. 565). O ser social (ser
humano ou empresa) o é com os outros, afirmando-se, pelo trabalho, uma cons-
ciência individual que também é consciência social. O trabalho se apresenta, na
sociedade civil, como ação do ser que, movido em seu interesse particular, age
A EFETIVIDADE DA EXECUÇÃO TRABALHISTA 63
33 “O homem na sociedade trabalha; é assim que, agindo em seu interesse particular, ele age para
todo o mundo.” (WEIL, 2011, p. 104).
64 COLEÇÃO ESTUDOS ENAMAT
34 As sociedades em nome coletivo surgiram na Idade Média, de forma natural e ampla, do âmago
da família medieval. Compunham-se, no princípio, apenas dos membros de uma mesma unidade
familiar. Com efeito, Umberto Navarrini e Gabriele Faggella relatam que as dificuldades materiais
inerentes a muitas das famílias da época obrigaram, inclusive por muitas gerações, seus membros
a uma vida e a uma casa comuns. (SCALZILLI, 2009, p. 132).
35 Tal contrato, praticado especialmente nas cidades italianas, consistia na entrega de dinheiro ou
mercadorias por um dos contratantes (commendador, posteriormente denominado comanditário)
à outra parte na avença (tractator ou commendatarius, posteriormente denominado comanditado),
geralmente proprietário de um navio (armador), a quem incumbia negociar os bens a ele confiados.
(SCALZILLI, 2009, p. 134)
36 Era necessária uma sociedade que transcendesse à pessoa dos sócios, que ficasse imu-
ne aos eventos que por ventura os atingissem, como a morte ou a incapacidade. Era im-
portante que novos sócios nela pudessem ingressar sem a outrora inafastável anuên-
cia dos demais e esses, quando lhes aprouvessem, deveriam ter a possibilidade de se
retirar pela simples transferência de suas ações a outrem, sendo, conseqüentemente, os tí-
tulos representativos de seu capital passíveis de livre circulação. Além disso, deveria estar pre-
sente a possibilidade de uma gestão exercida por pessoas estranhas ao capital social, ou seja,
por profissionais altamente qualificados na administração de empresas. E, por fim, já que a
gestão da empresa não caberia a todos os sócios, ou quiçá, a nenhum deles, aos demais seria muito
importante, senão essencial, a possibilidade de inspeção e controle da administração. (SCALZILLI,
2009, p. 136, 137)
A EFETIVIDADE DA EXECUÇÃO TRABALHISTA 65
37 Foi só em 1892, na Alemanha, que se legislou pela primeira vez acerca da criação de uma so-
ciedade empresarial sob medida para os pequenos e médios negócios. (SCALZILLI, 2009, p. 140)
38 No início do século XIX, em França, Napoleão, com a ambição de regular a totalidade das relações
sociais, patrocina a edição de dois monumentais diplomas jurídicos: o Código Civil (1804) e o Co-
mercial (1808). Inaugura-se, então, um sistema para disciplinar as atividades dos cidadãos, que
repercutirá em todos os países de tradição romana, inclusive o Brasil. De acordo com este sistema,
classificam-se as relações que hoje em dia são chamadas de direito privado em civis e comerciais.
Para cada regime, estabelecem-se regras diferentes sobre contratos, obrigações, prescrição,
prerrogativas, prova judiciária e foros. A delimitação do campo de incidência do Código Comercial é
feita, no sistema francês, pela teoria dos atos de comércio. (COELHO, 2003, p. 7)
66 COLEÇÃO ESTUDOS ENAMAT
39 Vale aqui resgatar este preciso estudo, do renomado jurista Rubens Requião, e que bem delineia
a origem histórica da disregard doctrine: Todos percebem que a personalidade jurídica pode vir a ser
usada como anteparo de fraude, sobretudo para contornar as proibições estatutárias do exercício
de comércio ou outras vedações legais. Lembramo-nos de certa representação dirigida à autoridade
estadual contra a participação, em concorrência pública, de sociedade constituída ela espôsa de
um funcionário da mesma repartição, em que o recurso foi descartado sob o argumento de que
se tratava de pessoa jurídica, e como tal distinta das pessoas que a compunham… Ora, imagine-se
a satisfação que nos dominou quando nos deparamos, na Itália com monografia recentemente
vinda a lume, de autoria do Prof. Piero Verrucoli, da Universidade de Piza, sob o excitante título “Il
Superamento della Personalità Giuridica delle Società, di Capitali nella ‘Common Law’ e nella ‘Civil Law’”.
Pouco mais tarde, por feliz coincidência, recebíamos do exterior uma outra obra, de título não me-
nos significativo: “Aparencia y Realidad en las Sociedades Mercantiles – El Abuso de Derecho por Médio
de la Persona Jurídica”, que mais acentuou o nosso fascínio pelo curioso tema. Êsse livro, tese de
concurso com que o professor germânico Rolf Serick conquistara cêrca de dez anos o título de “Pri-
vat-Dozent”, na Universidade de Tübingen, vinha traduzido para o castelhano por um jurista catalão,
José Puig Brutau, sob o patrocínio do Seminário da Cátedra de Direito Mercantil da Universidade de
Barcelona, sendo apresentado pelo catedrático Prof. Polo Diez. A tese do Prof. Serick, hoje professor
na Universidade de Heidelberg, causou profunda impressão nos meios jurídicos europeus, sendo
largamente debatida. Na Áustria, o Prof. Schwind citou-a numa conferência “como um exemplo do
que deve ser um trabalho de Direito comparado”. Refletiu-se o tema, também, recentemente na
Argentina, merecendo longo estudo do Prof. Gervásio R. Colombres, em seu livro “Curso de Derecho
Societario”, apadrinhado com palavras de louvor pelo insigne e venerando Prof. Malagarriga. Não
68 COLEÇÃO ESTUDOS ENAMAT
temos lembrança, em nossas constantes peregrinações pelas páginas do direito comercial pátrio,
de haver encontrado doutrina nacional ou estudos sôbre o uso abusivo ou fraudulento da pessoa
jurídica, o que nos daria, se correta nossa impressão, o júbilo de apresentá-la pela primeira vez, em
sua formulação sistemática, aos colegas e aos juristas nacionais. (REQUIÃO, 1969)
A EFETIVIDADE DA EXECUÇÃO TRABALHISTA 69
trabalho repetitivo e uniforme, mobilizador de grandes grupos humanos, perdia a sua anterior expo-
nencial relevância, substituído, em razoável medida, pela nova tecnologia” (DELGADO, 2015, p. 38).
72 COLEÇÃO ESTUDOS ENAMAT
41 A falência do sistema de previdência privada do Chile representa um claro exemplo: “Os trabalha-
dores passaram a ser afiliados a um sistema de seguridade e ser consumidores de uma indústria de
serviços financeiros que eram basicamente oferecidos por administradoras de fundos de pensão.
Criaram-se 12 AFPs, que logo chegaram a 21 e hoje em dia são seis. [...] Quando foi feita a primeira
reforma de [Michelle] Bachelet, em 2008, o diagnóstico era que metade dos adultos mais velhos
76 COLEÇÃO ESTUDOS ENAMAT
estavam sem nenhuma previdência. Depois disso, o Estado passou a prestar assistência aos idosos
mais pobres (a partir dos 65 anos). Criou-se uma pensão básica solidária a quem não havia poupado
nada e um aporte provisório, complementar, a quem havia poupado algo. Mas os aportes são muito
pequenos e os níveis das prestações são insuficientes. Hoje, mesmo com a ajuda, 79% das pensões
no Chile estão abaixo do salário mínimo (US$ 420), e 44% estão abaixo da linha da pobreza. O sis-
tema acabava empobrecendo toda a classe média quando se aposentava” (MORTARI, 2018, n.p.).
A EFETIVIDADE DA EXECUÇÃO TRABALHISTA 77
42 “A aposta fora do comum de Warren Buffett na Apple pode acabar sendo um de seus investi-
mentos mais vitoriosos, ganhando mais de US$ 120 bilhões (R$ 680 bilhões) no papel enquanto a
gigante da tecnologia quebrou mais um recorde para chegar a uma avaliação de mercado de US$ 3
trilhões (R$ 17 trilhões) nesta semana” (Yahoo, 2022).
78 COLEÇÃO ESTUDOS ENAMAT
43 “Luis Sthulberger, gestor do Fundo Verde, o maior hedge fund do Brasil, já havia dito uma vez:
‘Nós operamos o mundo’. Não é à toa, esses fundos possuem mais de US$ 3 trilhões em ativos sob
custódia, utilizam estratégias das mais variadas e operam em praticamente todos os mercados
existentes no mundo. Os hedge funds utilizam diferentes estratégias: operam alavancados em deri-
vativos, fazem operações de high frequency trading para operar spread no livro de ofertas de ações
e também fazem muitas operações de arbitragem” (BASSOTO, 2020, n.p.).
A EFETIVIDADE DA EXECUÇÃO TRABALHISTA 79
CONCLUSÃO
Os Fundos de Investimento em Participação (FIP) geridos por companhias
do sistema financeiro que exercem prática estritamente especulativa, promo-
vendo inversões financeiras de elevada volatilidade (como as praticadas por
fundos hedge ou segundo modelo de day trading), em indução comportamental
de mercado que faz descolar o preço das ações em relação ao seu real valor
para economia, numa gestão agressiva e de risco que corrói a função social
da empresa por inviabilizar maior estabilidade e segurança àqueles que com
ela empreendem (consumidores, fornecedores, trabalhadores), acabam por
incorrer em nítido abuso de direito e desvio de finalidade, a justificar a respon-
sabilização dos mesmos por desconsideração da personalidade jurídica, nos
termos do art. 50, do Código Civil.
Tal conclusão representa um imperativo civilizatório de se resgatar a es-
sência do que representa a própria personalidade humana e empresarial, em
suas dimensões ética e de alteridade que se atrelam à práxis intersubjetiva de
empreender, uma práxis de encontro e de reconhecimento, e não um mero
instrumento de hipertrofia rentista.
Assim é que havemos de concluir pela possibilidade de desconsideração da
personalidade jurídica dos FIP como suposto de preservação da personalidade
humana e de sua dignidade na era do capitalismo financeiro.
REFERÊNCIAS
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HARARI, Y. n. Homo Deus: uma breve história do amanhã. São Paulo: Companhia das
Letras, 2016.
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amamos, nos relacionamos, trabalhamos e vivemos. Rio de Janeiro: Globo, 2019.
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PONTUAL, J. Detroit, nos EUA, anuncia falência e faz pedido oficial de concordata.
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REALE, M. Considerações gerais sobre o projeto de Código Civil (Projeto de Lei n. 634, de
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c0d81247f40415e50efceim5izjbv.html.
VITÓRIO, T. 10 frases de Warren Buffett para te ajudar nas finanças. 2020. Dispo-
nível em: https://exame.com/seu-dinheiro/10-frases-de-warren-buffett-para-te-aju-
dar-nas-financas/#:~:text=Confira%20as%2010%20frases%20de%20Buffett%3A&tex-
t=%E2%80%9CUma%20pessoa%20muito%20rica%20deveria,%C3%A9%20o%20que%20
voc%C3%AA%20leva.%E2%80%9D.
Yahoo, R. F. Warren Buffett ganha R$ 680 bilhões com recorde da Apple. 2022. Dis-
ponível em: https://br.financas.yahoo.com/noticias/warren-buffett-ganha-r-680-bilho-
es-com-recorde-da-apple-161912010.html
O MÉTODO DA TEORIA
DA DESCONSIDERAÇÃO
DA PERSONALIDADE
JURÍDICA NA EXECUÇÃO
TRABALHISTA E A
TEORIA MENOR
Bianca Bastos
Doutora pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo,
desembargadora do trabalho no Tribunal Regional do Trabalho
da 2.ª Região. E-mail: profbianca.bastos@gmail.com.
Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/8576431059069979.
90 COLEÇÃO ESTUDOS ENAMAT
INTRODUÇÃO
A teoria da desconsideração da personalidade jurídica (disregard doctrine)
surgiu a partir de grandes discussões entre doutrinadores civilistas quanto ao
mau uso da pessoa jurídica, instituto responsável pela autonomia patrimo-
nial de uma sociedade, associação ou fundação, e seus integrantes. O debate
também atingiu outras disciplinas, especialmente o direito empresarial, que
dispõe sobre tipos societários, e o direito econômico, no tocante à criação das
sociedades comerciais e sua atuação no mercado.
No contexto da execução trabalhista, que busca adimplir o crédito com
brevidade e eficiência, é privilegiada a aplicação da teoria menor da disregard
doctrine, com base no art. 28, § 5.º da Lei n. 8.078/1990. Diante da ampla adoção
da teoria menor na jurisprudência trabalhista, é necessária sua análise mais
aprofundada, buscando sua origem e fundamentos, especialmente pelo fato
de inexistir regulação própria da teoria no direito do trabalho.
O questionamento sempre presente é no sentido de que se a empregadora
é sociedade de responsabilidade limitada e o insucesso do negócio não decorre
de atuação abusiva, a vinculação do sócio no descumprimento das obrigações
trabalhistas poderia corromper a própria limitação da responsabilidade, garan-
tida aos sócios no tipo societário.
É nesse contexto que este artigo procura trazer reflexões sobre um méto-
do para a desconsideração da personalidade jurídica. Embora com a natural
restrição do desenvolvimento do tema no âmbito de um artigo, o objetivo é
tornar clara a origem das teorias maior e menor, e compilar as posições de áreas
interdisciplinares quanto à propriedade da desconsideração ante a insolvência
do empregador.
As reflexões e soluções apresentadas não se distanciam dos resultados que
a jurisprudência vem propondo, pretendendo-se apenas acrescer solidez aos
fundamentos e disseminar uma reflexão quanto ao fortalecimento de um sis-
tema próprio da disregard doctrine no âmbito trabalhista.
1 GOMES, Orlando. O autor discorre sobre os sujeitos da obrigação e consigna que devem ser ao
menos determináveis: “Aponta-se a substituição de sujeitos originários da relação como atenuação
da regrada de determinação dos sujeitos.” (Obrigações, 2005, p. 22).
92 COLEÇÃO ESTUDOS ENAMAT
3 Art. 135. São pessoalmente responsáveis pelos créditos correspondentes a obrigações tributárias,
resultantes de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatu-
tos: I – as pessoas referidas no artigo anterior; II – os mandatários, prepostos e empregados; III – os
diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado.
4 Art. 18. A personalidade jurídica do responsável por infração de ordem econômica poderá ser
desconsiderada quando houver da parte deste abuso de direito, excesso de poder, infração da lei,
fato ou ato ilícito ou violação dos estatutos ou contrato social. A desconsideração também será
efetivada quando houver falência, estado de insolvência, encerramento ou inatividade da pessoa
jurídica, provocados por má administração.
5 Art. 4.º. Poderá ser desconsiderada a pessoa jurídica sempre que sua personalidade for obstáculo
ao ressarcimento de prejuízos causados à qualidade do meio ambiente.
A EFETIVIDADE DA EXECUÇÃO TRABALHISTA 93
8 O autor publicou artigo se reportando a considerações realizadas pelos próprios autores do projeto
do Código de Defesa do Consumidor, no sentido de que a previsão desse parágrafo estava direcio-
nada a coibir a má utilização da personalidade jurídica em sociedades unipessoais. Complementa
afirmando que, no processo legislativo, houve erro de direcionamento de veto ao projeto de lei que
originou o Código de Defesa do Consumidor. O erro decorreu das razões do veto se direcionarem ao
§ 5.º do art. 28 da Lei n. 8.078/1990, e ter sido consumado em relação ao § 1.º do mesmo dispositivo
legal. In: PERIN JÚNIOR, 2004, p. 299.
[...] O art. 6.º-C afasta, de uma vez por todas, a chamada “teoria menor da desconsi-
deração da personalidade jurídica”. Sob este conceito, abrigava-se originariamente
uma sarcástica crítica às decisões judiciais e posicionamentos doutrinários que,
distorcendo a disregard doctrine, admitiam a ineficácia da autonomia patrimonial
com base apenas na insuficiência do patrimônio da sociedade empresária. Curio-
samente, a ironia não foi percebida e o conceito acabou sendo apropriado por
distorção, como se a simples ausência de patrimônio na pessoa jurídica fosse um
fundamento suficiente para suspender a eficácia da autonomia patrimonial dela.14
15 BRASIL. TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 2.ª REGIÃO. 9.ª Turma. Processo TRT/SP
n. 1001233-24.2016.5.02.0050, Redatora designada: Desembargadora Bianca Bastos. DJE, 19/10/2022.
16 BRASIL. TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 2.ª REGIÃO. 9.ª Turma. Processo TRT/SP n. 1001699-
10.2017.5.02.0203 (AP), Relatora: Juíza Convocada Valéria Pedroso de Moraes. DJE, 20/3/2023.
17 BRASIL. TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 2.ª REGIÃO. 9.ª Turma. Processo TRT/SP
n. 1000227-15.2018.5.02.0081. Relator Desembargador Mauro Vignotto. DJE, 5/10/2022.
A EFETIVIDADE DA EXECUÇÃO TRABALHISTA 97
18 BRASIL. TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO. Processo n. 885/48. Relator: Manuel Caldeira Neto.
Julgado em: 12/8/1948. Revista do Tribunal Superior do Trabalho, n. 5, p. 72-77, 1948.
98 COLEÇÃO ESTUDOS ENAMAT
Esta sentença foi confirmada por acórdão do Tribunal Regional da 1.ª Região,
da lavra do juiz Délio Maranhão, proferido em 17/12/1947. Embora o acórdão
valide a penhora, faz isso com outro fundamento, o de que não houve prova de
que a constrição teria recaído sobre os bens adquiridos pelo sócio, afastando
a tese da sentença, que hoje podemos enquadrar como sendo da aplicação da
disregard doctrine por confusão patrimonial.20
Em 19/3/1964, como indicação precursora de que a insolvência da empre-
sa deveria ter efeito jurídico na execução trabalhista, citou-se uma decisão
do STF, no Recurso Extraordinário n. 55.052, relator ministro Gonçalves de
Ferreira.21 Esse julgado foi citado numa referência feita por Osiris Rocha 22 cuja
obra defendia a impossibilidade de vinculação do patrimônio dos sócios de
19 BRASIL. TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO. Processo n. 885/48. Relator: Manuel Caldeira Neto.
Julgado em: 12 ago.1948. Revista do Tribunal Superior do Trabalho, n. 5, p.73.
20 BRASIL. TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO. Processo n. 885/48. Relator: Manuel Caldeira Neto.
Julgado em: 12/8/1948. Revista do Tribunal Superior do Trabalho, n. 5, p.75-76.
22 ROCHA, 1974, p. 928. “A matéria, tem admitido exceções. Assim, em decisão de 19/3/1964, o
Supremo Tribunal Federal, sendo relator o Ministro Gonçalves de Oliveira, no RR 55-55052, diria que
não seria possível a penhora em bens de sócio se não fizesse a prova de que a empresa estivesse
em estado de insolvência (LTr, 29/235).
A EFETIVIDADE DA EXECUÇÃO TRABALHISTA 99
25 Art. 795. Os bens particulares dos sócios não respondem pelas dívidas da sociedade, senão nos
casos previstos em lei. § 1.º O sócio réu, quando responsável pelo pagamento da dívida da sociedade,
tem o direito de exigir que primeiro sejam excutidos os bens da sociedade.
100 COLEÇÃO ESTUDOS ENAMAT
O art. 350 do Código Comercial e o art. 596 do CPC de 1973 não trataram
da disregard doctrine. Pelo contrário, ambos se referiam à responsabilidade de
direito societário.
O art. 596 do CPC de 1973 se relacionava com a disposição do inciso II do
art. 592 do mesmo Código (hoje, inciso II do art. 790 do CPC de 2015 26), es-
tabelecendo um benefício de ordem quanto à responsabilidade secundária
do sócio de responsabilidade ilimitada. E assim também o antigo art. 350 do
Código Comercial.
Esses artigos dispuseram que nas estruturas societárias em que a respon-
sabilidade do sócio já foi prevista de forma ilimitada, ainda assim ela é subsi-
diária à responsabilidade da sociedade empresarial. Portanto, um sócio que
participe de uma sociedade já com responsabilidade ilimitada, tem o direito de
que primeiro sejam penhorados os bens da pessoa jurídica e mesmo sendo
solidariamente responsável perante terceiros, sua responsabilidade (ilimitada)
é secundária.
Nas execuções trabalhistas, este artigo acabou sendo invocado para situa-
ções em que a executada era sociedade de responsabilidade limitada, diante da
insolvência da empresa. Todavia, no decorrer dos anos, foi por meio da citação
desse artigo de lei que se justificou atrelar o patrimônio pessoal do sócio à
execução, quando a empresa se tornasse insolvente.
Mesmo diante da introdução do art. 28 da Lei n. 8.078/1990, persistiram
decisões27 atrelando nas suas fundamentações a previsão do inciso II do art.
592 do CPC (Art. 790, inciso II do CPC de 2015).
Entretanto, não se considerou que o inciso II do art. 592 sempre tratou de
responsabilidade societária, referindo-se à responsabilidade do sócio, nos ter-
mos da lei que prevê os modelos societários com responsabilidade ilimitada.
Pelo contrário, as decisões passaram a associar o art. 28 do Código de Defesa do
Consumidor, à previsão de responsabilidade societária do Código de Processo
Civil, como se a lei a que se referia o inciso II do art. 592 do CPC de 1973 (inciso
II do art. 790 do CPC de 2015), fosse o próprio art. 28 da Lei n. 8.078/1990.
Como se vê, a vinculação do sócio pelas obrigações trabalhistas foi pautada
nas disposições legais possíveis à época. Sucessivamente, o fundamento que
26 Art. 790. São sujeitos à execução os bens: [...] II – do sócio, nos termos da lei; [...].
28 BRASIL. Tribunal Regional do Trabalho da 2.ª Região. 9.ª Turma. Processo TRT/SP n. 0201800-
68.2004.5.02.0031, Relatora: Desembargadora Bianca Bastos. Acórdão assinado em 20/10/2016.
A EFETIVIDADE DA EXECUÇÃO TRABALHISTA 103
29 The rights of creditors of affiliates corporations, University of Chicago. Law Review 43/501, apud
Salomão Filho, 2002, p. 239-242.
CONCLUSÃO
A ampla adoção da disregard doctrine na execução trabalhista com funda-
mento no art. 28 da Lei n. 8.078/1990 resolve satisfatoriamente a hipótese de
desconsideração no caso em que há crédito de trabalhador em face da socie-
dade empresária. Entretanto, a solução que a jurisprudência vem adotando
deve ser relacionada também a uma doutrina que supere a limitação da res-
ponsabilidade do sócio perante o direito de empresa e justifique a ilimitação
da responsabilidade do sócio perante o credor trabalhista, por se tratar ele de
credor não negocial.
Verifica-se que a doutrina da disregard doctrine não desenvolveu subteorias,
sendo que a teoria maior e a teoria menor surgiram a partir de uma preferência
pelo critério subjetivista da desconsideração da personalidade jurídica, sem
substrato e fundamento teórico para discriminar as situações. Originalmente,
a partir da denominação teoria menor, pretendeu-se apenas indicar o mau uso
da teoria da desconsideração.
106 COLEÇÃO ESTUDOS ENAMAT
REFERÊNCIAS
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a despersonalização do empregador como instrumento para vinculação do patrimônio
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São Paulo: LTr, 1974.
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A DESCONSIDERAÇÃO
DA PERSONALIDADE
JURÍDICA COM A
PESSOA JURÍDICA DE
DIREITO PÚBLICO E A
RESPONSABILIDADE
PESSOAL DO AGENTE
PELA EXECUÇÃO DOS
CRÉDITOS TRABALHISTAS
Vicente de Paula Maciel Júnior
Doutor em direito pela Faculdade de Direito da Universidade Federal
de Minas Gerais, área de concentração em direito comercial. Pós-
doutor em direito pela Universidade de Roma (La Sapienza); professor
adjunto de direito processual civil da Faculdade de Direito da
Universidade Católica de Minas Gerais na graduação e pós-graduação;
desembargador federal do trabalho do Tribunal Regional do Trabalho
da 3.a Região; autor de diversos livros e artigos, com participação em
obras coletivas no Brasil e no exterior; vencedor do Prêmio INNOVARE
2021 na categoria juiz, com a prática “Processo Coletivo Eletrônico”.
108 COLEÇÃO ESTUDOS ENAMAT
1 OS TERMOS DA QUESTÃO
A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 37, exigiu que houvesse sem-
pre a adoção do sistema de contratação por concurso público para a ocupação
de vaga existente no serviço público.
O regime celetista é calcado na precariedade da contratação, decorrente
do poder deferido ao empregador de promover a dispensa sem justa causa.
Na contratação com o ente de direito público a Constituição exigiu expressa-
mente que fosse feito concurso público, seja para cargo ou emprego público,
formalizando o ato de admissão.
A incompatibilidade da plena adoção do sistema da CLT para a regência do
vínculo com as entidades de direito público decorre ainda de inúmeros fatores de
diferenciação, como o fato de que vários privilégios foram concedidos para a admi-
nistração, como o sistema dos precatórios, o alongamento dos prazos processuais,
as condições especiais em que o serviço público é prestado e que geram direitos
diferenciados para os servidores públicos. Some-se a isso a finalidade vetorial do
ente público, que não objetiva o lucro, mas o cumprimento de um papel dentro das
políticas públicas. Apesar de alterações no regime jurídico vigente para o serviço
público, com a modificação constitucional por emenda33 e a adoção da figura do
emprego público, a forma de admissão prevista em lei continuou sendo peculiar,
com a exigência de concurso público de provas ou de provas e títulos.
Portanto, por exigência constitucional, para que se forme um vínculo entre
a pessoa jurídica de direito público e o servidor tem de haver concurso público.
Pretendeu o legislador constituinte, com certeza, refrear as antigas práticas
políticas das nomeações de ocasião, destinadas apenas a atender interesses
eleitorais de certos políticos.
Apesar desse quadro acima relatado, diversos chefes de governo estaduais,
municipais e federais, bem como diretores de autarquias e fundações, têm
desconsiderado o comando da norma constitucional. Agem sempre pautados
na convicção de que não serão responsabilizados e, se houver a condenação,
nunca sofrerão os seus efeitos, que serão suportados por todos que pagam
impostos. Esses arautos da esperteza descobriram e acreditam piamente que a
condenação sempre será dirigida ao ente público e nunca às pessoas que agem
em nome dele. E se a condenação vier, ela será suportada segundo um sistema
33 Emenda constitucional n. 19/1998 que alterou a redação do inciso II do art. 37 da CF/88 para
admitir e incluir a figura do emprego público.
A EFETIVIDADE DA EXECUÇÃO TRABALHISTA 109
34 O novo código civil reeditou o artigo 159, que recebeu o n. 927 e a seguinte redação: “art.927 –
Aquele que, por ato ilícito (arts.186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.”. Houve o
acréscimo do parágrafo único, que assim restou escrito: “Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar
o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normal-
mente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.”.
35 “85. CONTRATO NULO. EFEITOS. DEVIDOS APENAS O EQUIVALENTE AOS SALÁRIOS DOS DIAS TRA-
BALHADOS: A contratação de servidor público, após a CF/1988, sem prévia aprovação em concurso
público encontra óbice no art. 37, II, da CF/88, sendo nula de pleno direito, não gerando nenhum efeito
trabalhista, salvo quanto ao pagamento do equivalente aos salários dos dias efetivamente trabalhados.”
36 O precedente 85 foi convertido no enunciado 363, que passou a ter a seguinte redação: “363 –
Contrato nulo – efeitos – A contratação de servidor público, após a Constituição Federal de 1988,
sem prévia aprovação em concurso público, encontra óbice no seu art.37, II e parágrafo 2.º, somente
110 COLEÇÃO ESTUDOS ENAMAT
Mas não é só. A Constituição, com relação à contratação irregular, tem sido
interpretada sob a ótica de velhos conceitos, quando se invoca como consequên-
cia para essa irregularidade o parágrafo 6.º do art. 37 do texto da Magna Carta.
Assim, inspirados no velho adágio da responsabilidade civil tradicional no
direito brasileiro, nossos civilistas, constitucionalistas, administrativistas, re-
petem a máxima, quase dogma, de que a responsabilidade por ato ou fato
irregular que cause dano será sempre suportada pelas pessoas jurídicas de
direito público e, no máximo, poderia haver a ação regressiva contra o agente
que procedeu em desacordo com a lei.
O parágrafo 6.º, do art. 37 da CF/88 tem a seguinte redação:
37 A antiga redação do artigo 37, antes da emenda constitucional n. 19 era: Art.37. A administração
pública direta, indireta ou fundacional, de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito
Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, pu-
blicidade e, também, ao seguinte: [...] II – a investidura em cargo ou emprego público depende de
aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, ressalvadas as nomeações
para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração;
112 COLEÇÃO ESTUDOS ENAMAT
Mas existe lei no direito brasileiro que dê tratamento jurídico ao tema para
responsabilizar a autoridade responsável que contratou irregularmente? Em
nosso entendimento sim e é o que exporemos em sequência.
38 Art. 43, 47, 50 do Código Civil. Art.133 a 137 do CPC/2015. Art.855-A, da CLT.
A EFETIVIDADE DA EXECUÇÃO TRABALHISTA 115
39 Lei n. 3.708/2019.
116 COLEÇÃO ESTUDOS ENAMAT
E aqui surge talvez o tema mais interessante quanto à legitimação para agir
na tutela dos interesses dos empregados contratados irregularmente.
A par da responsabilidade administrativa, penal, civil que poderá ser apurada
contra o agente que contratou irregularmente e será objeto de ação específica
do Ministério Público, Tribunal de Contas etc., surge o dano ao trabalhador em
face de seus direitos trabalhistas desrespeitados. Esse dano pode ser indivi-
dualmente defendido e apurado. Mas se houver uma coletividade de empre-
gados contratados irregularmente e que se encontrem na mesma situação de
terem trabalhado e permanecido sem o recebimento das verbas decorrentes
do contrato, essa tutela poderá ser exercida coletivamente? Por quem? Como?
A EFETIVIDADE DA EXECUÇÃO TRABALHISTA 123
Ainda no campo das tutelas não poderíamos deixar de falar que sempre será
possível para a defesa do patrimônio público que o cidadão possa ajuizar a ação
popular. Entretanto, nesse caso o objetivo será o de decretação da nulidade
da contratação irregular feita com a pessoa jurídica de direito público e o res-
sarcimento ao erário. Os interesses dos empregados não estarão assegurados
por meio da ação popular.
7 CONCLUSÃO
Hoje temos o dever de abrir diariamente a Constituição e refletir sobre os
valores, os princípios e as deliberações nela contidas. Nossa maior tarefa é a
reflexão e nossa grande dificuldade é o apego ao que já conhecemos em detri-
mento do que ainda nos é estranho.
Muito nos preocupa, a todos nós, a efetividade das normas. Em diversas
situações pode-nos parecer ser mais fácil criar uma lei nova, como uma tábua de
A EFETIVIDADE DA EXECUÇÃO TRABALHISTA 127
salvação, do que nos debruçarmos sobre as leis existentes e delas extrair pelo
esforço a interpretação mais consentânea com nossos valores constitucionais.
A efetividade não está nas leis, está em nós, naquilo que conseguimos trans-
formar em atos concretos, em direitos, cumprindo os preceitos de nossas leis.
Essa foi nossa singela tentativa de contribuição pessoal para esse tema intri-
gante e tormentoso que todos os dias bate às portas da Justiça. Nosso objetivo
foi alertar, argumentar com o que já temos na lei, tentando demonstrar que
nossa Lei Maior já prevê a possibilidade de repressão a atos de contratação
irregular pela administração pública e que as autoridades implicadas nessas
contratações deverão responder diretamente pelos atos praticados, sem ne-
cessidade de ação regressiva.
Em termos de contratação irregular pela pessoa jurídica de direito público,
concluímos que deve haver a aplicação do parágrafo 2.º do art. 37 da CF/88 e
não do parágrafo 6.º desse mesmo artigo.
Esse é poderoso instituto previsto inovadoramente em nossa CF/88 e com
potencial regulatório importantíssimo para forçar o cumprimento da norma
que proíbe contratação irregular de pessoal com o poder público.
Entendemos também que devem ser invocados subsidiariamente a Lei
n. 8.078/1990, em seu artigo 28, para se aplicar a teoria da desconsideração
da personalidade jurídica ao ente público e atingir o patrimônio das autorida-
des responsáveis pelas contratações irregulares; bem como dos artigos 43, 47,
50, 186, 187 e 927, parágrafo único, do novo Código Civil que reafirmam esse
instituto, visto que ele é perfeitamente compatível com o parágrafo 2o. do art.
37 da CF/88.
Quanto à legitimação para agir, fundamental é a participação do Ministério
Público do Trabalho, que é o legitimado natural para o exercício da ação civil
pública que objetive a tutela coletiva dos interesses dos empregados contra-
tados irregularmente.
REFERÊNCIAS
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bra, 1997.
ALMEIDA, Lúcio Rodrigues de. O dano moral e a reparação trabalhista. Rio de Janeiro:
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BARROS, Alice Monteiro de. Proteção à intimidade do empregado. São Paulo: LTR, 1997.
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GONÇALVES, Aroldo Plínio. A ação civil pública na Justiça do Trabalho. São Paulo: Legis-
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MACIEL JR., Vicente de Paula. Convenção coletiva de consumo. Belo Horizonte: Del
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MARINONI, Luiz Guilherme. Novas linhas do processo civil. São Paulo: Malheiros, 1996.
MARINONI, Luiz Guilherme. Tutela específica. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000.
MARINONI, Luiz Guilherme. Tutela inibitória. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1998
MARINONI, Luiz Guilherme. Tutela específica. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000.
MARTINS, Sérgio Pinto. Direito processual do trabalho. São Paulo: Atlas, 1993.
A EFETIVIDADE DA EXECUÇÃO TRABALHISTA 129
NAVARRO, Joaquim Belmonte. Derecho procesal laboral. Madrid: Editorial Tecnos, 1997.
OLIVEIRA, Sebastião Geraldo de. Proteção jurídica à saúde do trabalhador. São Paulo:
LTR, 1998.
SILVA, Antônio Álvares da. A prescrição do trabalhador rural após a emenda consti-
tucional 28/2000. Belo Horizonte: RTM, 2001.
SOUZA, Sérgio Alberto de. Direito e processo do trabalho. Belo Horizonte: RTM, 1998.
VILHENA, Paulo Emílio Ribeiro de. Direito e processo do trabalho. Belo Horizonte: Del
Rey, 1994.
NEM MAIOR NEM MENOR,
APENAS ORDINÁRIA
Jayme Polachini Neto
Juiz do Trabalho do Tribunal Regional do Trabalho da
8.ª Região. E-mail: jayme.polachini@trt8.jus.br.
132 COLEÇÃO ESTUDOS ENAMAT
1 INTRODUÇÃO
O presente artigo tem como objetivo defender a aplicação de uma nova
acepção da teoria da desconsideração da personalidade jurídica no direito ma-
terial e processual do trabalho.
Para tanto, este trabalho terá como base teórica a obra desenvolvida pelo
jurista João Cánovas Bottazzo Ganacin, Desconsideração da Personalidade Jurídica
no Processo Civil, apresentada à Faculdade de Direito da Universidade de São
Paulo para a obtenção do título de mestre e editada em 2020, pela Revista dos
Tribunais, como parte da Coleção Liebman.
A exposição será dividida nos seguintes eixos: (i) conceito de desconsidera-
ção da personalidade jurídica desenvolvido por João Cánovas Bottazzo Ganacin;
(ii) falsas hipóteses de desconsideração; e (iii) utilidade da nova vertente dou-
trinária e sua aplicação como ferramenta de eficácia na execução trabalhista.
Com efeito, essa percepção encontra respaldo na principal norma que trata
do tema no direito positivo. Nos termos do art. 50 do Código Civil:
Por dedução lógica da premissa adotada, um instituto que não esteja intrin-
secamente ligado ao abuso de personalidade não se confunde com o fenômeno
epistemológico da desconsideração da personalidade jurídica.
Na obra que imanta este artigo são citadas três falsas hipóteses de des-
consideração presentes nos seguintes ramos do sistema jurídico: (i) direito
empresarial; (ii) direito do consumidor e (iii) direito ambiental.
Pelo próprio regramento comercial, nos casos em que a pessoa jurídica toma
a forma jurídica de uma sociedade em nome coletivo, por exemplo, todas as
pessoas físicas que a integram respondem pelas obrigações sociais, de forma
solidária e ilimitada.3
No caso do direito do consumidor, será atingido o patrimônio particular
do sócio, além de outras hipóteses, nos casos de insolvência da sociedade 4 ou
3 Art. 1.039, CC. Somente pessoas físicas podem tomar parte na sociedade em nome coletivo, res-
pondendo todos os sócios, solidária e ilimitadamente, pelas obrigações sociais.
4 Art. 28, caput, CDC. O juiz poderá desconsiderar a personalidade jurídica da sociedade quando,
em detrimento do consumidor, houver abuso de direito, excesso de poder, infração da lei, fato ou
134 COLEÇÃO ESTUDOS ENAMAT
ato ilícito ou violação dos estatutos ou contrato social. A desconsideração também será efetivada
quando houver falência, estado de insolvência, encerramento ou inatividade da pessoa jurídica
provocados por má administração.
5 Art. 28, § 5.º, CDC. Também poderá ser desconsiderada a pessoa jurídica sempre que sua persona-
lidade for, de alguma forma, obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados aos consumidores.
Além dos casos citados na tese de João Cánovas, plenamente possível incluir
na moldura jurídica desenhada mais uma falsa hipótese de desconsideração da
personalidade jurídica.
Trata-se da responsabilidade ordinária e subsidiária do sócio no caso da
exigibilidade de créditos provenientes da relação jurídica de trabalho.
Isso porque, com as inovações legislativas trazidas pela Lei n. 13.467/2017,
aportou à CLT o art. 10-A, com a seguinte redação:
Nos termos expressos do caput do art. 10-A da CLT, pode recair sobre o sócio
retirante a responsabilidade subsidiária das obrigações sociais relativas aos
créditos trabalhistas, com a fixação de uma limitação temporal da pretensão –
dois anos contados a partir da averbação da retirada do então sócio.
Entretanto, a norma mais importante é aquela que se extrai da interpretação
lógica da redação legal, qual seja: a obrigação oriunda do contrato de trabalho
11 Art. 50, CC. Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade
ou pela confusão patrimonial, pode o juiz, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quan-
do lhe couber intervir no processo, desconsiderá-la para que os efeitos de certas e determinadas
relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares de administradores ou de sócios
da pessoa jurídica beneficiados direta ou indiretamente pelo abuso.
A EFETIVIDADE DA EXECUÇÃO TRABALHISTA 137
estende seus efeitos aos sócios atuais, a despeito de qualquer análise subjetiva,
ressalvado o benefício de ordem em relação à pessoa jurídica.
Trata-se, portanto, da aludida responsabilidade ordinária e subsidiária ex-
cepcional do sócio por força legal, à semelhança das normas contidas nos es-
tatutos ambiental e do consumidor.
Não há no texto celetista, como se observa, qualquer menção ao abuso da
personalidade jurídica. Logo, reitera-se, não há espaço para a subjetividade.
O sócio, por sua própria qualidade, responde de forma ordinária e subsidiária
pelas obrigações de natureza trabalhista, independentemente de seu compor-
tamento societário, da existência de ato ilícito ou da extrapolação do direito
subjetivo da pessoa jurídica.
A natureza do crédito trabalhista, proveniente de uma relação jurídica assi-
métrica, justifica a excepcionalidade prevista pela legislação especial. Trata-se
de reflexo na legislação ordinária do valor social do trabalho, axioma que integra
um dos fundamentos do Estado Democrático de Direito (art. 1.º, III, CF).
A norma inserida na CLT mantém a harmonia do sistema normativo estático.
Vale ressaltar, nesse ponto, que os créditos trabalhistas também possuem pre-
ferência em outras situações previstas pelo ordenamento, como, por exemplo,
nos casos de falência e recuperação judicial.12 No mesmo sentido, para a satis-
fação de créditos de natureza alimentar, excepciona-se a impenhorabilidade
de salários e proventos em geral.13
E mesmo antes da inserção do art. 10-A na CLT, a jurisprudência tinha sólido po-
sicionamento de que, no caso da cobrança de verbas de natureza trabalhista, ado-
tar-se-ia a denominada teoria menor, como nos casos consumerista ou ambiental.
Na doutrina, o professor Felipe Bernardes vem defendendo tese semelhante,
batizando a responsabilidade ordinária e subsidiária dos sócios como descon-
sideração direta da personalidade jurídica, nos seguintes termos:
16 Art. 18-B da Lei n. 9.615/1998. Os dirigentes das entidades do Sistema Nacional do Desporto,
independentemente da forma jurídica adotada, têm seus bens particulares sujeitos ao disposto no
art. 50 da Lei n. 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil).
REFERÊNCIAS
BARBOSA MOREIRA, José Carlos. A nova definição de sentença. In: Temas de direito
processual: nona série. São Paulo: Saraiva, 2007.
SILVA, Homero Batista Mateus da Silva. CLT Comentada. 2. ed. São Paulo: Thomson
Reuters Brasil, 2018.
23 GOMES, Orlando; GOTTSCHALK, Elson. Curso de direito do trabalho. 9. ed. Rio de Janeiro:
Forense, 1984. p. 71.
PARTE III
EXECUÇÃO TRABALHISTA
E RECUPERAÇÃO
JUDICIAL
RECUPERAÇÃO
JUDICIAL E A TORTUOSA
EXECUÇÃO DO CRÉDITO
TRABALHISTA
Maria Rita Manzarra de Moura Garcia
Juíza do Trabalho Titular da Vara do Trabalho de Assú, Tribunal
Regional do Trabalho da 21.ª Região, graduada em direito pela
Universidade de Fortaleza, especialista em direito e processo do
trabalho pela Universidade Cândido Mendes e mestre em direito pela
Universidade Autónoma de Lisboa. E-mail: mariarita@trt21.jus.br.
146 COLEÇÃO ESTUDOS ENAMAT
4 BERNARDES, 2023.
A EFETIVIDADE DA EXECUÇÃO TRABALHISTA 149
6 Idem.
150 COLEÇÃO ESTUDOS ENAMAT
7 Idem.
A EFETIVIDADE DA EXECUÇÃO TRABALHISTA 151
tarefa de suprir tais lacunas, conferindo soluções das mais criativas em busca
da efetivação do direito.
Pois bem. Ante a tentativa infrutífera do ofício expedido e em face da mal-
fadada espera do trabalhador, que não vê meios de receber um crédito tido
por lei como preferencial, mas que, na prática, não possui preferência alguma,
entendo que providências mais enérgicas e invasivas devem ser adotadas pelo
juízo de origem, no caso, o trabalhista.
Por essas razões, após esgotadas as tentativas anteriores, entendo premente
o prosseguimento da execução perante a Justiça Especializada. Por dever de
cautela, contudo, reputo salutar que o primeiro ato do juiz do trabalho, antes de
avançar com os atos executórios, seja a renovação da notificação da executada
para que, em 48 horas, indique bens não essenciais ao sucesso do plano de
recuperação, passíveis de penhora.
No caso de inércia empresa recuperanda, o animus inadimplendi e o intento
deliberado de violar o disposto no artigo 84, da Lei de Recuperação Judicial,
restará sobejamente comprovado, o que, sem sombra de dúvida, justificará a
realização de atos de constrição patrimonial diretamente pelo juízo trabalhista,
como única forma de assegurar a preferência legal do crédito extraconcursal e
a autoridade das decisões do Poder Judiciário.
Autorizada estará, assim, a realização de atos de constrição como a penhora
on-line, pelo Sisbajud, bem como a penhora sobre todo e qualquer bem de pro-
priedade da pessoa jurídica, uma vez que oportunizada à empresa recuperanda,
em diversos momentos, a possibilidade de satisfazer esses créditos da forma
menos impactante e traumática ao plano de recuperação judicial.
Entendimento diverso, digo e reafirmo, representaria um prêmio ao mau pa-
gador, que, escudado por um verdadeiro limbo legal e jurisprudencial, findaria
por dele se beneficiar, esquivando-se em todos os Juízos de atos executórios e
expropriatórios, furtando-se de pagar, justamente, quem o legislador pretendeu
conferir um tratamento privilegiado.
É preciso, contudo, ir mais fundo.
Sem querer ser tomada por um pessimismo quanto a todas as soluções
apresentadas, devo ainda contemplar a possibilidade das medidas acima não
lograrem o êxito esperado, como na hipótese de não se encontrar numerário
suficiente nas contas bancárias da empresa recuperanda, ou, ainda, não exis-
tirem bens suficientes ou desembaraçados da pessoa jurídica.
O que poderá ser feito, mais, na esfera trabalhista?
158 COLEÇÃO ESTUDOS ENAMAT
REFERÊNCIAS
BERNARDES, Felipe. Aspectos processuais trabalhistas da Lei 14.112/2020: a modifi-
cação do regime legal de recuperação judicial e falência. Disponível em: https://trabalho-
emdebate.com.br/artigo/detalhe/aspectos-processuais-trabalhistas-da-lei-141122020-a-
-modificacao-do-regime-legal-de-recuperacao-judicial-e-falencia. Acesso em: 10 abr. 2023.
16 PEREIRA, 2022.
A COOPERAÇÃO
JUDICIÁRIA ENTRE
JUÍZOS DO TRABALHO
E DE RECUPERAÇÃO
JUDICIAL:
UM CAMINHO PARA
A EFETIVIDADE
JURISDICIONAL
Ulisses de Miranda Taveira
Mestre e doutorando em função social do direito pela Faculdade
Autônoma de Direito, especialista em direito do trabalho e juiz titular
no Tribunal Regional do Trabalho da 23.ª Região. E-mail: ulissestaveira@
trt23.jus.br. Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/2869301110491191.
INTRODUÇÃO
É notório que a quantidade de empresas em recuperação judicial sobe a
cada ano. Embora os dados do Serasa Experian17 revelem que os novos pedi-
dos de recuperação judicial tenham diminuído nos últimos anos, é fato que o
número acumulado de recuperações judiciais só aumenta, visto que, em média,
o tempo de tramitação da recuperação judicial – entre o pedido e a extinção –
demora anos, o que se agravou com a pandemia de covid-19.
A propósito, os Relatórios de Observatórios de Insolvência sobre Processos
de Recuperação Judicial mais recentes, dos estados de São Paulo,18 do Rio de
Janeiro19 e do Rio Grande Sul20, indicam que as recuperações judiciais nos refe-
ridos estados têm duração média próxima a qutro anos, entre a data do pedido
e a data do término da fase de cumprimento.
Soma-se a isso que grande parcela dos planos de recuperação judicial abran-
ge os créditos trabalhistas, repercutindo, assim, em inúmeras execuções que
tramitam na Justiça do Trabalho.
Entre os diversos impactos das recuperações judiciais sobre os processos
trabalhistas, destacamos a suspensão das execuções, a necessidade de habi-
litação para satisfação dos créditos concursais e a limitação da apuração da
correção monetária e dos juros. Ao lado destes, salientamos, ainda, a limitação
de prática de atos constritivos pela Justiça Especializada para satisfação de
créditos extraconcursais.
Muito frequentemente, tais repercussões nos processos trabalhistas geram
divergências de entendimentos de juízos do trabalho e da recuperação judicial,
acarretando incontáveis conflitos de competência perante o STJ, sem falar do
incremento da morosidade da satisfação dos créditos trabalhistas, seja por meio
da habilitação, seja por meio da execução na Justiça do Trabalho.
Nesse contexto, a cooperação judiciária surge como relevante mecanismo
processual, capaz de evitar ou solucionar conflitos de competência, tornando
17 SERASA, 2023.
a satisfação dos credores trabalhistas mais célere e efetiva. Além disso, a coo-
peração judicial tem o potencial de evitar incidentes desnecessários e atribuir
maior celeridade aos processos de recuperação judicial.
referentes aos créditos não sujeitos à recuperação, tratados no art. 49, §§ 3.º e
4.º, da mesma Lei (oriundos de arrendamentos mercantis, de alienação fiduci-
ária e de compra e venda com reserva de domínio).
A cooperação judiciária tem como uma de suas principais características
a atipicidade,24 podendo se dar de inúmeras formas. Seguindo nesse trilho,
explica Leandro Fenandez, a atipicidade da cooperação judiciária permite o
desenvolvimento pelos juízes de respostas inovadoras e criativas, aptas ao ofe-
recimento de tutela adequada a um processo individualmente considerado ou
a um grupo mais ou menos numeroso de processos.25
A Resolução n. 350 do CNJ cita alguns tipos de cooperação: ativa, passiva
ou simultânea; cooperação por concertação; cooperação interinstitucional;
por auxílio direto, atos concertados, atos conjuntos ou outros instrumentos
adequados.
Ademais, o artigo 6.º da mesma Resolução elenca exemplos de aplicações
práticas da cooperação judiciária, entre as quais destacamos alguns:
28 Embora o juízo da recuperação judicial não tenha, propriamente, caráter de juízo universal, já que,
diferentemente da falência, não se trata de uma execução coletiva e, ainda, diversos créditos não
se submetem ao crivo do juízo recuperacional, é certo que a jurisprudência do STJ se consolidou no
sentido de que compete ao juízo da recuperação deliberar e controlar todos os atos constritivos que
recaiam sobre o patrimônio da recuperanda, com o fim de evitar o fracasso da recuperação judicial.
A EFETIVIDADE DA EXECUÇÃO TRABALHISTA 169
29 Leading cases: REsp 1843332/RS, REsp 1842911/RS, REsp 1843382/RS, REsp 1840812/RS, REsp
1840531/RS. STJ. Segunda Seção. Relator min. Ricardo Villas Bôas Cueva. Julgamento em 9/12/2020.
Publicação em 17/12/2020.
170 COLEÇÃO ESTUDOS ENAMAT
30 MANZARRA, 2022.
A EFETIVIDADE DA EXECUÇÃO TRABALHISTA 171
32 STJ – CC: 183129 RS 2021/0312845-7, Relator: ministro Marco Aurélio Bellizze, DJ 7/12/2021
34 STJ – CC: 182647 RN 2021/0292504-2, Relator: ministra Maria Isabel Gallotti, DJ 1/2/2022.
35 STJ – CC: 181127 MG 2021/0216281-8, Relator: ministro Marco Aurélio Bellizze, DJ 9/9/2021.
A EFETIVIDADE DA EXECUÇÃO TRABALHISTA 173
Em que pese o disposto nos artigos 9.º, II, § 2.º 37, e 49, § 2.º38, da Lei
n. 11.101/2005, bem como o entendimento reiterado do STJ,39 fixando a data
do pedido de recuperação como termo final da atualização e dos juros dos
valores apurados nas certidões para fins de habilitação, ainda persiste séria
cizânia na Justiça do Trabalho.
Ocorre que a não observância pela Justiça do Trabalho dos parâmetros dos
artigos 9.º, II, § 2.º, e 49, § 2.º, da Lei n. 11.101/2005, na expedição de certidões
de crédito acaba por inviabilizar a habilitação automática pretendida pelo artigo
6.º, § 2.º, da referida Lei, uma vez que o administrador judicial ou o juízo recu-
peracional acabam tendo que reapreciar os valores dos créditos indicados nas
certidões da Justiça do Trabalho, atrasando, assim, a habilitação e o pagamento
dos créditos trabalhistas.
Desse modo, atos concertados ou interinstitucionais versando sobre parâ-
metros de liquidação nas certidões de crédito tornariam mais célere a habilita-
ção e o pagamento aos credores trabalhistas nas recuperações judiciais, além
de evitarem retrabalhos pelo administrador judicial e pelo juízo recuperacional.
Com isso, seriam evitados incidentes desnecessários e debates processuais
acerca dos critérios de juros e correção, tanto no âmbito dos processos na
Justiça do Trabalho, quanto nas recuperações judiciais.
37 Art. 9.º. A habilitação de crédito realizada pelo credor nos termos do art. 7º, § 1.º, desta Lei deverá
conter: [...] II – o valor do crédito, atualizado até a data da decretação da falência ou do pedido de
recuperação judicial, sua origem e classificação. [...] § 2.º As obrigações anteriores à recuperação
judicial observarão as condições originalmente contratadas ou definidas em lei, inclusive no que diz
respeito aos encargos, salvo se de modo diverso ficar estabelecido no plano de recuperação judicial.
38 Art. 49. [...] § 2.º As obrigações anteriores à recuperação judicial observarão as condições origi-
nalmente contratadas ou definidas em lei, inclusive no que diz respeito aos encargos, salvo se de
modo diverso ficar estabelecido no plano de recuperação judicial
41 TST-RO-348– 74.2016.5.13.0000, SBDI-2, rel. min. Maria Helena Mallmann, red. p/ acórdão min.
Renato de Lacerda Paiva. Data de publicação 15/5/2018.
42 TST – RO: 5806320175090000, relator: Renato de Lacerda Paiva, data de julgamento: 24/11/2020,
SBDI-2, Data de publicação: 27/11/2020.
43 STJ – CC: 162769 SP 2018/0330658-8, relator: Ministra Maria Isabel Gallotti, data de julgamento:
24/06/2020, S2 – Segunda Seção, DJe 30/06/2020.
A EFETIVIDADE DA EXECUÇÃO TRABALHISTA 177
44 Art. 112. Deferida a recuperação judicial ou a falência, caberá ao juiz do trabalho determinar a
expedição de Certidão de Habilitação de Crédito para ser submetida à apreciação do administra-
dor judicial. § 1º Terão prosseguimento na Justiça do Trabalho as ações que demandarem quantia
ilíquida, até a apuração do respectivo crédito e a expedição de certidão de habilitação do crédito.
§ 2.º Da Certidão de Habilitação de Crédito deverá constar: I – nome do exequente, data da distri-
buição da reclamação trabalhista, da sentença condenatória e a de seu trânsito em julgado; II – a
especificação dos títulos e valores integrantes da sanção jurídica, das multas, dos encargos fiscais
e sociais (imposto de renda e contribuição previdenciária), dos honorários advocatícios e periciais,
se houver, e demais despesas processuais; III – data da decisão homologatória dos cálculos e do
seu trânsito em julgado; IV – o nome do advogado que o exequente tiver constituído, seu endereço,
para eventual intimação, e número de telefone a fim de facilitar possível contato direto pelo admi-
nistrador judicial. Art. 113. Expedida a Certidão de Habilitação de Crédito, é desnecessária a remessa
dos autos físicos ou eletrônicos ao juízo no qual se processa a Recuperação Judicial ou a Falência.
Art. 114. Os juízes do trabalho manterão os processos em arquivo provisório até o encerramento
da Recuperação Judicial ou da falência que ela eventualmente tenha sido convolada (artigo 156 e
seguintes da Lei n. 11.101/2005). Parágrafo único. Os processos suspensos por Recuperação Judicial
ou Falência deverão ser sinalizados com marcador correspondente no Sistema PJe. Art. 115. As dis-
posições desta Seção não se aplicam nos casos em que o magistrado determinar o direcionamento
da execução contra sócios ou ex-sócios da executada ou a empresa que integre grupo econômico
do qual ela faça parte.
A EFETIVIDADE DA EXECUÇÃO TRABALHISTA 179
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Os processos de recuperação judicial têm grande impacto nos processos
trabalhistas, notadamente em razão da suspensão das execuções, da necessi-
dade de habilitação para satisfação dos créditos concursais e da limitação da
apuração da correção monetária e dos juros, além da limitação de prática de
atos constritivos pela Justiça Especializada para satisfação de créditos extra-
concursais.
Em razão disso, surgem muitas situações de divergência de entendimentos
entre os juízos do trabalho e da recuperação judicial, acarretando incontáveis
conflitos de competência perante o STJ, sem falar do incremento da morosidade
da satisfação dos créditos trabalhistas, seja por meio da habilitação, seja por
meio da execução na Justiça do Trabalho.
Como forma de evitar e solucionar os conflitos de competência, dando mais
celeridade e efetividade à prestação jurisdicional trabalhista e recuperacional,
destaca-se a cooperação judiciária, prevista pelos artigos 67 a 69 do Código de
Processo Civil e regulamentada pela Resolução n. 350 do CNJ.
No âmbito das recuperações judiciais, a Lei n. 14.112/2020 incluiu os §§ 7.º-
A e 7.º-B do art. 6.º da Lei n. 11.101/2005 com determinação de utilização da
cooperação judiciária para satisfação de créditos não sujeitos à recuperação
judicial quando se tratar de execuções fiscais e de credores de arrendamentos
mercantis, de alienação fiduciária e de compra e venda com reserva de domínio.
Embora os dispositivos não versem sobre os demais créditos extraconcur-
sais, considerando-se o entendimento do STJ no sentido de que cabe ao juízo da
180 COLEÇÃO ESTUDOS ENAMAT
REFERÊNCIAS
ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS MAGISTRADOS DA JUSTIÇA DO TRABALHO. Teses Aprova-
das no 20.º CONAMAT. Disponível em: https://www.anamatra.org.br/conamat/20-edicao.
Acesso em: 5 abr. 2023.
BRASIL. STJ – REsp 1843332/RS. STJ. Segunda Seção. Relator min. Ricardo Villas Bôas
Cueva. Julgamento em 9/12/2020. Publicação em 17/12/2020.
BRASIL. TST – RO-348– 74.2016.5.13.0000, SBDI-2, rel. Min. Maria Helena Mallmann, red.
p/ acórdão Min. Renato de Lacerda Paiva. Data de publicação 15/5/2018.
182 COLEÇÃO ESTUDOS ENAMAT
CABRAL, Antonio do Passo. Fundamentos para uma teoria da cooperação judiciária. In:
CABRAL, Antonio do Passo; DIDIER Jr., Freddie (coords.). Grandes temas do novo CPC – v.
16 – Cooperação Judiciária Nacional. Salvador: Editora Juspodivm, 2021.
DIDIER Jr., Freddie. Cooperação judiciária nacional. 2. ed. rev., atual. e ampl. Salvador:
Juspodivm, 2021.
1 INTRODUÇÃO
O presente ensaio objetiva analisar a aplicabilidade do incidente de des-
consideração da personalidade jurídica no processo de recuperação judicial
de empresas, expondo as normas aplicadas ao instituto da desconsideração,
algumas considerações doutrinárias e decisões relevantes sobre o tema.
Para tanto, o artigo está decomposto nos seguintes tópicos: 1) Da concei-
tuação, da origem, da normatividade do instituto da desconsideração da per-
sonalidade jurídica, seu patrimônio e descontinuidade; 2) Caracteres do pro-
cedimento falimentar e da recuperação judicial e, finalmente, a aplicabilidade
do instituto da desconsideração da personalidade jurídica em empresas em
recuperação judicial.
Não é absoluto o princípio de que a pessoa jurídica não se confunde com seus
membros. É possível superar os efeitos da personalidade jurídica em casos con-
cretos, impedindo desvios na utilização de sua finalidade, de forma a alcançar a
responsabilidade de seus membros e bens pessoais.45
45 GARCIA, 2018.
186 COLEÇÃO ESTUDOS ENAMAT
O art. 795, § 4.º, do mesmo diploma jurídico acima descrito, revela que “para
a desconsideração da personalidade jurídica é obrigatória a observância do
incidente previsto neste Código”.
As normas processuais reportadas sobre o tema no CPC são as dispostas
nos artigos 133 a 137, que exige ser o incidente instaurado pela parte ou Mi-
nistério Público, observando-se os pressupostos legais, devendo o processo
ser suspenso, os sócios citados para se manifestarem e requererem provas
em 15 dias e, por fim, que o incidente seja resolvido por decisão interlocutória.
Embora a norma processual expresse que a instauração do incidente se dê
pela parte ou Ministério Público, entende-se também como possuidores de
legitimidade ativa o administrador judicial e a parte interessada, sejam credores
ou até mesmo a empresa recuperanda.
Entre os normativos legais que preveem a desconsideração da personalida-
de jurídica, o Código Civil, em seu art. 50, traz duas características autorizativas
que aplacam a separação patrimonial da empresa e seus sócios, quais sejam:
“o abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade ou
pela confusão patrimonial”.
A vertente tradicional da teoria da desconsideração da personalidade jurí-
dica funda-se na ideia de que é possível a sua desconstituição sempre que esta
for utilizada de forma abusiva, desviando-se dos fins para os quais fora criada,
ou seja, a fraude e abuso de direito praticados pelos sócios e administradores
são pressupostos inerentes – teoria maior.
Utilizando-se das palavras de Fredie Didier Jr:
que, em teoria geral do direito, é sanção aplicada a ato ilícito (no caso, a utilização
abusiva da personalidade jurídica).46
O TST também trilha, de forma pacífica, o caminho descrito pela teoria me-
nor, conforme se observa na decisão transcrita:
[...] abuso de direito, excesso de poder, infração da lei, fato ou ato ilícito ou viola-
ção dos estatutos ou contrato social. A desconsideração também será efetivada
quando houver falência, estado de insolvência, encerramento ou inatividade da
pessoa jurídica provocados por má administração.
Art. 47. A recuperação judicial tem por objetivo viabilizar a superação da situação
de crise econômico-financeira do devedor, a fim de permitir a manutenção da
fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores,
promovendo, assim, a preservação da empresa, sua função social e o estímulo à
atividade econômica.
Art. 49. Estão sujeitos à recuperação judicial todos os créditos existentes na data
do pedido, ainda que não vencidos.
Art. 115. As disposições desta Seção não se aplicam nos casos em que o magistrado
determinar o direcionamento da execução contra sócios ou ex-sócios da executada
ou a empresa que integre grupo econômico do qual ela faça parte.
Súmula 480 do STJ: “O juízo da recuperação judicial não é competente para de-
cidir sobre a constrição de bens não abrangidos pelo plano de recuperação da
empresa”.
AGRAVO INTERNO NO CONFLITO DE COMPETÊNCIA. RECUPERAÇÃO JUDICIAL.
EXECUÇÃO DE CRÉDITO TRABALHISTA. INCLUSÃO DE COOBRIGADOS NO POLO
PASSIVO. DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA. COMPETÊNCIA IN-
DISTINTA DA JUSTIÇA COMUM E DA JUSTIÇA DO TRABALHO. AUSÊNCIA DE INVASÃO
DE ATRIBUIÇÕES JUDICIAIS. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO.
1. Nos termos da iterativa jurisprudência desta Corte, a Justiça do Trabalho tem
competência para decidir acerca da desconsideração da personalidade jurídica
da sociedade em recuperação judicial, bem como para, em consequência, incluir
coobrigado no polo passivo da execução, pois tal mister não é atribuído com ex-
clusividade a um determinado Juízo ou ramo da Justiça.
2. Nesses casos, de redirecionamento da execução para coobrigados, a jurispru-
dência desta egrégia Corte firmou o entendimento de não reconhecer a existência
de conflito de competência, porquanto não há dois juízes decidindo acerca do
destino do mesmo patrimônio.
3. Incidência da Súmula 480 desta Corte: “O juízo da recuperação judicial não é
competente para decidir sobre a constrição de bens não abrangidos pelo plano
de recuperação da empresa”.
194 COLEÇÃO ESTUDOS ENAMAT
50 TST-AgInt no CC n. 188.933/SP, relator ministro Raul Araújo, Segunda Seção, julgado em 14/2/2023,
DJe de 6/3/2023.
51 AgInt no CC n. 180.309/SP, relator ministro Luis Felipe Salomão, Segunda Seção, julgado em
19/10/2021, DJe 22/10/2021.
A EFETIVIDADE DA EXECUÇÃO TRABALHISTA 195
52 TST-AgInt nos EDcl no CC n. 155.003/RS, relator ministro Marco Aurélio Bellizze, Segunda Seção,
julgado em 22/2/2018, DJe 28/2/2018.
53 TST-AgRg no CC n. 136.779/MT, relator ministro Marco Aurélio Bellizze, Segunda Seção, julgado
em 26/11/2014, DJe 2/12/2014.
196 COLEÇÃO ESTUDOS ENAMAT
56 BRASIL, 2023.
A EFETIVIDADE DA EXECUÇÃO TRABALHISTA 197
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A recuperação judicial tem como objetivo proteger as entidades empresa-
riais que passam por dificuldades financeiras, econômicas e administrativas,
não conseguindo adimplir com suas obrigações. Trata-se de um instituto jurí-
dico que oportuniza a continuidade da sociedade empresária afetada por tais
dificuldades, mantendo a função econômico-social da empresa, com a geração
de empregos e tributos para o Estado.
Ocorre que o pedido de processamento da recuperação, com aprovação
do plano de pagamento, não pode ser fundamento para toda e qualquer sus-
pensão de atos de constrição patrimonial dos sócios da pessoa jurídica, sejam
os atuais, sejam os anteriores, uma vez que a ação em sede de juízo universal
não se equipara a garantia do juízo de que haverá escorreito cumprimento e
quitação de dívidas.
Assim sendo, conclui-se que os dois institutos jurídicos (desconsideração da
personalidade jurídica e a recuperação judicial) caminham na mesma direção,
198 COLEÇÃO ESTUDOS ENAMAT
REFERÊNCIAS
BRASIL. Estudo do veto n. 57/2020. Secretaria Legislativa do Congresso Nacional (SLCN).
Disponível em: https://legis.senado.leg.br/sdleg-getter/documento?dm=8920093&t-
s=1633558848451&disposition=inline. Acesso em: 12 abr. 2023.
DIDIER Jr., Fredie et al. Curso de direito processual civil: execução. 6. ed. Salvador:
JusPodivm, 2014. v. 5.
LOBO, Jorge. Da recuperação judicial. In: TOLEDO, Paulo F. C. Salles de; ABRÃO, Carlos
Henrique (coords.). Comentários à lei de recuperação de empresas e Falência. 2. ed.
São Paulo: Saraiva, 2007.
PARTE IV
MEDIDAS ATÍPICAS DE
EXECUÇÃO: LIMITES E
POSSIBILIDADES
MEDIDAS INDUTIVAS,
ATIPICIDADE E EFETIVIDADE
DA EXECUÇÃO TRABALHISTA:
POSSIBILIDADES E LIMITES
PARA A APLICAÇÃO DA
DISPOSIÇÃO CONTIDA NO
ART. 139, IV, do CPC/15
Guilherme Guimarães Feliciano
Juiz titular da 1.ª Vara do Trabalho de Taubaté/SP. Doutor em direito
penal pela Universidade de São Paulo e em direito processual civil pela
Faculdade de Direito de Lisboa. Livre-docente em direito do trabalho
pela Universidade de São Paulo. Pós-doutor em direitos humanos pela
Universidade de Coimbra. Professor associado I do Departamento de
Direito do Trabalho e da Seguridade Social da Universidade de São
Paulo. Presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça
do Trabalho (gestão 2017-2019). Coordenador-chefe dos grupos
de pesquisa e extensão “O trabalho além do Direito do Trabalho”
e “Meio Ambiente do Trabalho”, ambos vinculados à Faculdade de
Direito da Universidade de São Paulo. E-mail: darkggf@uol.com.
br. Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/0028206539888072.
Como bem pondera Schauer, todo sistema jurídico existente possui alguma
maneira de coagir ou induzir determinados comportamentos dos indivíduos,
até mesmo considerando que uma hipotética “comunidade de anjos” não é
fenômeno compatível com a realidade vivenciada em grande parte das socie-
dades ocidentais modernas.57 Ainda que a coerção talvez não seja elemento
ou propriedade essencial do direito enquanto sistema de normas, 58 é relativa-
mente comum que se estabeleçam meios para que uma determinada ordem
produza efeitos – concretos – a partir dos comandos emanados pelos órgãos
competentes em um Estado de Direito.
Particularmente dentro do tema que anima o presente estudo, vale refe-
rir que os órgãos do Poder Judiciário, ainda que atuando apenas mediante
provocação suficiente para romper a ideia de inércia jurisdicional (art. 2.º do
CPC/15) e no exercício de relevante parcela de soberania estatal,59 devem dis-
por de meios – adequados – para a imposição de suas respectivas decisões.
A imposição concreta do resultado ou solução apresentada para as crises ou
insatisfações, em alguma medida, funciona como mecanismo de legitimação
da própria existência do Estado de Direito, a qual estaria seriamente abalada
se, violados reiteradamente os comandos legais, não houvesse qualquer con-
sequência prática para os integrantes da comunidade que atuassem ao arrepio
do ordinariamente esperado.60
Forte nessa premissa é que se destaca o papel esperado do juiz na pers-
pectiva de efetivação do direito reconhecido, particularmente a partir do não
cumprimento espontâneo e posteriormente voluntário daquilo que foi fixado
como decisão em um processo, aqui entendido como método de trabalho para
o exercício da jurisdição. O valor da efetividade das decisões judiciais pode ser
57 “Embora saibamos que um sistema jurídico poderia existir, em teoria, sem sanções e sem coerção,
sabemos também que, em algum lugar entre pouca e nenhuma exceção, realmente não existe tal
sistema jurídico” (SCHAUER, 2022, p. 143).
58 HART destaca em tal sentido que “o modelo simples do direito como um conjunto de ordens
coercitivas do soberano não reproduz, em vários aspectos fundamentais, algumas das principais
características dos sistemas jurídicos” (HART, 2009, p.103).
59 Para uma análise crítica da ideia de que a jurisdição seria um dos atributos da soberania estatal
e por uma nova concepção desestatizada da jurisdição, ver Gonçalves (2020, p. 119-206).
60 Dinamarco destaca quanto ao tema que “a própria existência do Estado, como poder instituciona-
lizado com vocação à permanência, repousa e extrai legitimidade do já afirmado clima generalizado
de aceitação; a desobediência generalizada e repúdio ao direito posto por ele (poder positivado)
significaria negação da própria ordem instituída” (DINAMARCO, 2022, p. 96).
A EFETIVIDADE DA EXECUÇÃO TRABALHISTA 203
62 Justamente a partir de tal premissa é que se consagra entre as normas fundamentais do CPC/15
a previsão no sentido que “as partes têm o direito de obter em prazo razoável a solução integral do
mérito, incluída a atividade satisfativa” (art. 4.º).
64 Hart identifica que o centro do fenômeno jurídico está na junção das normas primárias – preceitos
que impõem obrigações – com as denominadas normas secundárias, as quais “capacitam alguns
indivíduos a solucionar de forma autorizada o problema de saber se, numa ocasião específica, foi
violada uma norma primária” (HART, 2009, p. 125). Ocorre que a mera existência das normas se-
cundárias acima referidas, sem que se considere o fenômeno da coerção ou o “arsenal coercitivo”
citado por SCHAUER (2022, p. 189), parece insuficiente para se assegurar nas sociedades ocidentais
modernas o efetivo cumprimento das obrigações contidas nas normas primárias.
65 Vale aqui ressaltar que “o escopo principal do princípio do contraditório deixou assim de ser
a defesa, no sentido negativo de oposição ou resistência à actuação alheia, para passar a ser a
influência, no sentido positivo de direito de incidir activamente no desenvolvimento e no êxito do
processo” (FREITAS, 2013, p. 125).
204 COLEÇÃO ESTUDOS ENAMAT
último, consideremos também aquele que tem dívidas com o INSS), já que as restrições legais para
o inadimplente trabalhista são infinitamente menores” (CHAVES, 2012, p. 1013).
70 O relator do Projeto de Lei n. 7.077/2002 destacou em seu parecer inicial de 2003 que “ao se
exigir que, para participar de licitações, as empresas apresentem a certidão negativa de débitos
trabalhistas, há o estímulo para que a empresa cumpra as suas obrigações trabalhistas para não
ser impedida de contratar com o Poder Público”. Disponível em: https://www.camara.leg.br/propo-
sicoesWeb/prop_mostrarintegra?codteor=138966&filename=Tramitacao-PL%207077/2002. Acesso
em: 24 mar. 2023.
71 Não obstante os limites da Lei n. 12.440/2011, a doutrina referia à época com algum entusiasmo
que “não se pode olvidar do potencial futuro da CNDT para ser adotada como medida de garantia
em relação a outros tantos contratos e negócios jurídicos, ainda que, por ora, de forma voluntária,
elevando a segurança das relações sociais, bem como reafirmando o caráter de responsabilidade
social dos que cumprem regiamente a legislação trabalhista, não tendo sido condenado pela Justiça
do Trabalho” (CHAVES, 2012, p. 1027).
206 COLEÇÃO ESTUDOS ENAMAT
72 Defende-se inclusive que “o preceito sufragado pelo inciso IV pode ser considerado um adequa-
do desdobramento supletivo e subsidiário do comando contido no art. 765 da CLT, na medida em
que complementa e reforça a expressão “qualquer diligência” a que o dispositivo consolidado faz
menção” (SILVA, 2016, p. 200).
74 Marinoni, Arenhart e Mitidiero, ao analisarem a regra do art. 139, IV, do CPC/15 na perspectiva de
atipicidade das formas executivas e de abertura do sistema, pontuam que ela “supre a lacuna incons-
titucional da legislação brasileira, colocando a tutela das prestações pecuniárias no mesmo nível que
aquela oferecida às outras formas de interesse” (MARINONI, ARENHART e MITIDIERO, 2017, p. 775).
75 Tal lei alterou dispositivos do Código de Processo Civil de 1973 sobre o processo de conhecimento
e o processo cautelar, introduzindo a denominada tutela antecipada e fixando em relação ao cum-
primento de obrigação de fazer ou não fazer que será possível a imposição de “multa diária ao réu,
independentemente de pedido do autor” (art. 461, § 4.º, CPC/73) e também consagrando que “para
a efetivação da tutela específica ou para a obtenção do resultado prático equivalente, poderá o juiz,
de ofício ou a requerimento, determinar as medidas necessárias, tais como a busca e apreensão,
remoção de pessoas e coisas, desfazimento de obras, impedimento de atividade nociva, além de
requisição de força policial” (art. 461, § 5.º, CPC/73). Tratou-se de alteração legislativa que buscou
disseminar aquilo que já era previsto no microssistema das tutelas coletivas em sentido amplo,
particularmente daquilo que já constava no art. 11 da Lei n. 7.347/1985 (lei da ação civil pública) e
no art. 84, § 4.º, da Lei n. 8.078/1990 (código de defesa do consumidor).
77 “É duvidosa, senão patente, a inconstitucionalidade do art. 139, IV. É bem de ver que, nos casos
de coerção pessoal (prisão) ou patrimonial (astreinte), os efeitos jurídicos são predeterminados:
(a) prisão por determinado tempo; e (b) formação de crédito pecuniário, por sua vez exequível à
medida que existam bens penhoráveis no patrimônio do executado. Essa predeterminação das
consequências jurídicas para o executado recalcitrante torna essas medidas compatíveis com o
art. 5.º, LIV, da CF/1988. Ao invés, a aplicação do art. 139, IV, a par de gerar abusos dificilmente
controláveis (v.g., a privação do sono, mediante transmissão de música estridente, para induzir a
desocupação de imóvel; a apreensão do passaporte de quem trabalha no exterior, necessitando
deslocar-se periodicamente para outro país, e a carteira de habilitação do motorista profissional),
carece dessas características. E, a mais das vezes, traduzirá pena civil, sem precisão específica, em
razão do inadimplemento “culposo” e arrogantemente ostensivo. Concebe-se que o recalcitrante
incorra na ira da contraparte, mas é inadmissível que a pessoa investida na função judicante decida
embalada por paixão análoga, amesquinhando o executado com o poder do Estado. E não parece
exato que, além da pressão psicológica da prisão ou da multa, outras medidas atinjam a pessoa e,
não, o patrimônio do executado” (ASSIS, 2022).
80 Com a cláusula geral abandona-se a “concepção do juiz como mero aplicador da lei e o seu dever
de agir no limite da estrita legalidade, ganhando o julgador um papel mais ativo” (WALD, 2009, p. 214).
A EFETIVIDADE DA EXECUÇÃO TRABALHISTA 209
82 Como pondera Rodrigues “podemos e devemos aceitar que existam executados decentes, porque
todos podemos um dia sermos devedores e nos encontrar numa situação de penúria financeira
ou patrimonial com dívidas que sejam maiores do que o nosso patrimônio, desde que tal situação
não seja forjada para este fim; mas não podemos aceitar executados cafajestes que se comportam
como um ladrão que esconde seu patrimônio propositadamente para desta forma impedir que o
processo atue coativamente para expropriar seu patrimônio e assim saldar os seus débitos para
com o exequente”. Disponível em: https://www.migalhas.com.br/depeso/245946/o-que-fazer-quan-
do-o-executado-e-um--cafajeste---apreensao-de-passaporte--da-carteira-de-motorista. Acesso em:
24 mar. 2023. Em idêntico sentido já eram os ensinamentos de Dinamarco que, ao analisar a ideia
de menor onerosidade na execução a partir do art. 620 do CPC/73, vaticinava a necessidade de “dis-
tinguir entre o devedor infeliz e de boa-fé, que vai ao desastre patrimonial em razão de involuntárias
circunstâncias da vida, e caloteiro chicanista, que se vale das formas do processo executivo e da
benevolência dos juízes como instrumento a serviços de suas falcatruas” (DINAMARCO, 2004, p. 58).
83 Aqui vale apenas referir que a opção de prisão civil por dívidas do depositário infiel também é atu-
almente inadmissível, consoante entendimento fixado na Súmula Vinculante n. 25 do STF no sentido
que “é ilícita a prisão civil de depositário infiel, qualquer que seja a modalidade do depósito”. Entre
210 COLEÇÃO ESTUDOS ENAMAT
os textos constitucionais pátrios, apenas a Constituição Federal de 1824, em seu art. 179, X, indicava
a possibilidade de eventual prisão por “não cumprir uma obrigação dentro de determinado prazo”.
85 Em que pese a apreensão da CNH, em abstrato, possa ser reconhecida como uma espécie válida
de medida indutiva e não seja necessariamente violadora do direito de livre locomoção do devedor,
cumpre destacar que pode representar, em um caso concreto, verdadeira punição injustificada com
caráter próximo às sanções penais. É o que se verifica, por exemplo, quando uma pessoa física que
atua como motorista profissional seja privada dos rendimentos que habitualmente auferia para
sua sobrevivência. Ainda nesse sentido, apenas a fim de indicar o grau de relevância da situação,
cumpre relembrar que a CLT atualmente fixa como uma das hipóteses de justas causas a “perda
da habilitação ou dos requisitos estabelecidos em lei para o exercício da profissão, em decorrência
de conduta dolosa do empregado” (art. 482, alínea “m”), o que apenas reforça o necessário cuidado
na análise concreta da medida e denota que soluções apriorísticas – do tipo lícito/ilícito – não se
compatibilizam com o fenômeno aqui analisado. O que não pode ser tolerado é a busca do fim
a todo o custo e em claro raciocínio utilitarista, como se o meio utilizado fosse indiferente para a
legitimidade do resultado a ser alcançado.
86 Dinamarco, ao tratar das multas periódicas previstas no CPC/73 para o cumprimento das obriga-
ções de fazer/não fazer, coloca com bastante pertinência que elas não possuem verdadeiro caráter
repressivo e “miram o futuro, querendo promover a efetividade dos direitos, e não o passado em que
alguém haja cometido alguma infração merecedora de repulsa” (DINAMARCO, 2004, p. 471), o que
se adequa perfeitamente às medidas indutivas aqui analisadas e ao claro caráter não sancionatório
que elas devem possuir dentro do nosso modelo processual.
87 Em idêntico sentido é o que indica o seguinte trecho de ementa extraída de julgado da 3.ª Turma
do STJ no sentido que: “[...] Como forma de resolução plena do conflito de interesses e do resguardo
do devido processo legal, cabe ao juiz, antes de adotar medidas atípicas, oferecer a oportunidade
de contraditório prévio ao executado, justificando, na sequência, se for o caso, a eleição da medida
adotada de acordo com os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade[...]” (STJ, RHC n. 99.606/
SP, relatora Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 13/11/2018, DJe de 20/11/2018).
212 COLEÇÃO ESTUDOS ENAMAT
88 A própria definição da expressão influência já indica que, por meio dela, se pretende descrever
algo que deve ocorrer previamente a uma decisão ou julgamento, reforçando a premissa que o con-
traditório deve ao menos como regra ser prévio, ainda que concretamente possam existir pontuais
inflexões e a admissão do denominado contraditório diferido.
89 Que contempla, como um dos autores já teve oportunidade de referir em outro estudo, “a ideia
de concordância harmônica dos princípios do processo do trabalho, por meio da qual se almeja a
“obtenção, em tempo razoável, da justa composição do litígio perante o juiz do trabalho natural,
independente e imparcial, a que as partes acederão em condições de pleno acesso à Justiça, aten-
dendo-se a que as garantias processuais do réu jamais obstem a satisfação ideal dos direitos sociais
violados ou a satisfação integral dos créditos alimentares sonegados” (FELICIANO, 2016, p. 440).
90 A interação entre as partes e o juiz, por meio do necessário diálogo sobre todos os atos e fatos
componentes do processo, acaba por qualificar o debate com a possível apresentação de novas
perspectivas, reduzindo demasiadamente o risco de opiniões preconcebidas (OLIVEIRA, 1999, p. 139).
A EFETIVIDADE DA EXECUÇÃO TRABALHISTA 213
decisão.91 Nem se cogite aqui que no campo do processo do trabalho, por força
do disposto no artigo 883-A da CLT, seria necessário se aguardar ao menos 45
dias para que se acolhesse eventual pedido de adoção de meios que, dentro
do postulado da proporcionalidade, tivessem aptidão para induzir o devedor
ao imediato cumprimento da decisão. Inadequada aqui qualquer ampliação
das taxativas e injustificadas opções legislativas contempladas na regra, a qual,
como já foi acima apontado, é manifestamente contraditória ao disposto no art.
517 do CPC/15 e cria uma peculiar situação de menor efetividade do processo
do trabalho pátrio. Já no que concerne ao caráter patrimonial da medida, em
que pesem alguns meios indutivos típicos ostentem tal condição e sejam os
imediatamente lembrados em um regime capitalista, como é o caso da “multa
diária” originariamente prevista no art. 11 da Lei n. 7.347/1985 (Lei da Ação Civil
Pública) e no art. 84, § 4.º, da Lei n. 8.078/1990 (Código de Defesa do Consumi-
dor), vale referir que tal nova perspectiva de atipicidade não necessariamente
se limita ao fenômeno da multa periódica ou equivalente patrimonial. Algumas
medidas típicas que já foram introduzidas pelo legislador no sentido de induzir
ao cumprimento da decisão judicial não possuem tal conotação, como é o caso
do protesto do título executivo judicial e a própria inscrição em banco de dados
de devedores,92 valendo referir que nem por isso deixaram de ser adotadas pelo
91 No mesmo sentido são os ensinamentos de Doutor que, ao fazer a crítica aos que defende o
caráter sempre subsidiário das medidas atípicas, pondera que “um fator a se considerar na aná-
lise da prioridade dos meios indutivos aos sub-rogatórios é o custo da execução por expropria-
ção” (DOUTOR, 2019, p. 93). De qualquer sorte, vale referir que a necessidade de esgotamento
dos meios típicos tem sido amplamente acolhida pelos Tribunais Superiores quando da análise
da temática, como se depreende, por exemplo, dos seguintes trecho de ementas de julgados da
SBDI-II do TST e da 3.ª Turma do STJ : “[...]As medidas de execução atípicas previstas no art. 139, IV,
do Código de Processo Civil devem ser adotadas quando demonstrado previamente o esgotamen-
to das medidas típicas de execução e verificada a existência de indícios de que o devedor possua
patrimônio expropriável, observadas a necessidade, a adequação e a proporcionalidade[...]” (TST,
Ag-ROT-80384-78.2021.5.22.0000, Subseção II Especializada em Dissídios Individuais, relator ministro
Amaury Rodrigues Pinto Junior, DEJT 07/10/2022) e “A jurisprudência desta Corte Superior reputa,
em tese, lícita e possível a adoção de medidas executivas indiretas, inclusive a apreensão de pas-
saporte, desde que, exauridos previamente os meios típicos de satisfação do crédito exequendo,
bem como que a medida se afigure adequada, necessária e razoável para efetivar a tutela do direito
do credor em face de devedor que, demonstrando possuir patrimônio apto a saldar o débito em
cobrança, intente frustrar injustificadamente o processo executivo. Na hipótese, a conclusão do
acórdão recorrido, no sentido de denegar a ordem, se coaduna com o referido entendimento. 2.
Agravo interno desprovido. (STJ, AgInt no RHC n. 128.327/SP, relator ministro Marco Aurélio Bellizze,
Terceira Turma, julgado em 12/4/2021, DJe 15/4/2021).
92 NEVES pondera até mesmo que “a opção legislativa de limitar a prisão civil ao devedor de ali-
mentos não parte da premissa de que medidas de execução indireta não possam recair sobre a
214 COLEÇÃO ESTUDOS ENAMAT
pessoa do devedor, mas em que grau tal medida possa levar à plena restrição de seu direito de ir
e vir” (NEVES, 2017, p. 107-150).
100 Em idêntico sentido é o que indica o seguinte trecho de ementa extraída de julgado da 2.ª Tur-
ma do STJ no sentido que: “a observância da proporcionalidade não deve ser feita em abstrato, a
não ser que as instâncias ordinárias expressamente declarem inconstitucional o artigo 139, IV, do
CPC/2015. Não sendo o caso, as balizas da proporcionalidade devem ser observadas com referência
ao caso concreto, nas hipóteses em que as medidas atípicas se revelem excessivamente gravosas
e causem, por exemplo, prejuízo ao exercício da profissão. Recurso Especial parcialmente provido
para determinar a devolução dos autos à origem, a fim de que o requerimento de adoção de medi-
das atípicas, feito com fundamento no artigo 139, IV, do CPC, seja analisado de acordo com o caso
concreto, mediante a observância dos parâmetros acima delineados.” (STJ, REsp n. 1.929.230/MT,
relator ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 4/5/2021, DJe de 1/7/2021).
101 Enquanto para a adoção de medidas típicas a mera remissão ao texto legal e ao momento de
sua efetivação possa ser suficiente para legitimar o ato de constrição (ex. penhora livre de bens após
esgotado o prazo para pagamento voluntário), em se tratando de medidas indutivas é claramente
insuficiente a fundamentação no sentido da mera referência ao texto legal (art. 139, IV, CPC/15) e
também aquela que simplesmente acolhe o pedido do exequente, ou seja, sem apresentar – ainda
que sinteticamente – a adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito da medida ali
escolhida para induzir o cumprimento da obrigação por aquele que aparenta ter meios para honrá-la
e deliberadamente não cumpre o papel esperado pela ordem jurídica. Em idêntico sentido é o que se
depreende de trecho do voto condutor no julgamento do RHC 97.876/SP pelo STJ, quando se destacou
que a decisão de primeiro grau se limitou “a deferir o pedido feito pelo exequente de suspensão do
passaporte e CNH, sem preocupar-se com a demonstração de sua necessidade e utilidade”.
102 Dinamarco, ao tratar das multas periódicas como medida indutiva típica então prevista no art.
461, § 4.º, CPC/73, pontua que “ainda quando não houvesse tanta explicitude legal, seria obrigatório
o entendimento de que o juiz tem esse poder, porque as multas, como outras medidas necessárias,
têm o escopo não só de abrir caminho para a satisfação do credor, mas também de preservar a
autoridade das decisões” (DINAMARCO, 2004, p. 472-473). Além disso, a própria localização do artigo
139 no início do capítulo que trata dos poderes, dos deveres e da responsabilidade do juiz (capítulo
I do título IV do CPC/15), enumerando incumbências do juiz na direção do processo, é bastante in-
dicativa da ideia no sentido que as medidas indutivas podem ser adotadas oficiosamente ao longo
do procedimento.
A EFETIVIDADE DA EXECUÇÃO TRABALHISTA 217
Um ponto talvez pouco explorado e que possa indicar trilha a ser desbra-
vada para tanto passa pela análise da condição do devedor – seja ele pessoa
física ou jurídica – e de seu comportamento ao longo do procedimento, já que
se trata de fator de grande pertinência para justificar a ampla adoção de me-
didas indutivas como as que foram acima referidas. A partir do padrão de vida
ostentado publicamente pelo devedor e pela eventual ocultação ou sonegação
de bens, exemplos que podem ser reconhecidos por meio de indícios ou pro-
vas constantes nos autos,103 parece-nos bastante justificada a adoção pelo juiz
de medidas destinadas a adequar a conduta do devedor solvente ao padrão
socialmente esperado. Situação diversa será aquela em que se está diante de
devedor claramente insolvente e sem que existam mínimos indícios de ocul-
tação patrimonial. Mesmo que se esteja diante da premente necessidade de
concretização de direitos sociais e de requerimento do exequente em tal sen-
tido, não se pode utilizar o processo como meio legitimador de revanchismos
que não apresentem qualquer resultado útil ao deslinde do feito, ainda que
ocorra eventual insucesso na busca patrimonial. Não é demais repisar que a
própria natureza das medidas indutivas em sentido amplo é adequar a conduta
do indivíduo e, particularmente quando incorporada ao arsenal processual,
103 É o que se extrai do da ementa de decisão da 2.ª Turma do STJ: “AMBIENTAL. PROCESSO CIVIL.
CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. INDENIZAÇÃO POR DANO AMBIENTAL. MEDIDA COERCITIVA ATÍPICA
EM EXECUÇÃO POR QUANTIA CERTA. RESTRIÇÃO AO USO DE PASSAPORTE. INJUSTA VIOLAÇÃO DO
DIREITO FUNDAMENTAL DE IR E VIR. NÃO OCORRÊNCIA. DECISÃO ADEQUADAMENTE FUNDAMEN-
TADA. OBSERVÂNCIA DO CONTRADITÓRIO. PONDERAÇÃO DOS VALORES EM COLISÃO. PREPONDE-
RÂNCIA, IN CONCRETO, DO DIREITO FUNDAMENTAL À TUTELA DO MEIO AMBIENTE. DENEGAÇÃO
DO HABEAS CORPUS. I – Na origem, trata-se de cumprimento de sentença que persegue o paga-
mento de indenização por danos ambientais fixada por sentença. Indeferida a medida coercitiva
atípica de restrição ao passaporte em primeira instância, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do
Sul deu provimento ao agravo interposto pelo Ministério Público, determinando a apreensão do
passaporte dos pacientes. II – Cabível a impetração de habeas corpus tendo em vista a restrição ao
direito fundamental de ir e vir causado pela retenção do passaporte dos pacientes. Precedentes:
RHC n. 97.876/SP, HC n. 443.348/SP e RHC n. 99.606/SP. III – A despeito do cabimento do habeas
corpus, é preciso aferir, in concreto, se a restrição ao uso do passaporte pelos pacientes foi ilegal ou
abusiva. IV – Os elementos do caso descortinam que os pacientes, pessoas públicas, adotaram, ao
longo da fase de conhecimento do processo e, também, na fase executiva, comportamento desleal
e evasivo, embaraçando a tramitação processual e deixando de cumprir provimentos jurisdicionais,
em conduta sintomática da ineficiência dos meios ordinários de penhora e expropriação de bens.
V – A decisão que aplicou a restrição aos pacientes contou com fundamentação adequada e analítica.
Ademais, observou o contraditório. Ao final do processo ponderativo, demonstrou a necessidade
de restrição ao direito de ir e vir dos pacientes em favor da tutela do meio ambiente. VI – Ordem de
habeas corpus denegada.” (STJ, HC n. 478.963/RS, relator ministro Francisco Falcão, Segunda Turma,
julgado em 14/5/2019, DJe de 21/5/2019).
218 COLEÇÃO ESTUDOS ENAMAT
direcionar o devedor solvente, que tem meios e posses para tanto, no sentido
do cumprimento daquilo que já foi objeto de decisão em sede de execução de
créditos alimentares. Tal indução ao cumprimento pode validamente ser reali-
zada de modo progressivo, por meio de adoção de uma ou mais medidas entre
aquelas que preencham os requisitos acima fixados, sendo que pela própria
teleologia do instituto parece-nos bastante pertinente a fixação de um prazo
para a sua manutenção, em sentido similar ao que já ocorre como a prisão
do devedor de alimentos naturais.104 O viés punitivo que também compõe o
sistema jurídico não é propriamente aquele esperado a ser desempenhado em
caráter principal pelo meio aqui analisado, mormente quando inexista abuso
ou tentativa deliberada de deslegitimar o Estado de Direito. Já no que concerne
ao comportamento do devedor ao longo do procedimento, pensamos que ao
menos no campo das ações que tenham por objeto prestação pecuniária de
cunho trabalhista é de reduzida incidência a ideia de utilização de medidas
indutivas para a concessão de “recompensas” ou “prêmios” ao que já violou
a ordem jurídica e persiste descumprindo os comandos já fixados pelos ór-
gãos judiciais. Não se pode cogitar, por exemplo, da adoção indiscriminada
de medidas indutivas que materializem deságios nas obrigações principais ou
mesmo que desnaturem as verbas que já foram reconhecidas no título execu-
tivo judicial para fins de redução da base de cálculo de determinados tributos
– recolhimentos previdenciários e fiscais – que são executados pelos órgãos
da Justiça do Trabalho.105
Como se depreende de tudo o que aqui foi exposto, não se deve imaginar
que os meios atípicos contemplados no art. 139, IV, do CPC/15 funcionarão
como verdadeira panaceia para remediar todos os males da execução traba-
lhista. A opção legislativa de dotar o juiz de meios indutivos para o cumprimento
de suas decisões, que como vimos não é inédita e em alguma medida também
104 O próprio artigo 537 do CPC/15, ao tratar de uma medida indutiva típica (multa periódica) para
as obrigações de fazer ou não fazer, estabelece que o juiz determine “prazo razoável para cumpri-
mento do preceito”. Em idêntico sentido Doutor pondera que “é salutar a averbação de um prazo
na decisão judicial que fixa a medida indutiva atípica para a reavaliação da eficiência do comando
enquanto providência executória. O prazo deve ser aferido em cada caso” (DOUTOR, 2019, p. 102).
105 “Sem expresso respaldo na lei, todavia, ao juiz não cabe fazer “caridade com o chapéu alheio”.
Ou seja, a princípio, ao magistrado é vedado conceder isenções tributárias sem previsão legal, su-
primir remuneração de outrem sem autorização legal (caso dos honorários advocatícios), ou mesmo
impor ao credor uma desvantagem negocial não prevista em lei ou em contrato” (MEIRELLES, 2015,
p. 231-246).
A EFETIVIDADE DA EXECUÇÃO TRABALHISTA 219
REFERÊNCIAS
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Revista dos Tribunais, 2022. E-book.
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Athayde (org.). Curso de processo do trabalho. 2. ed. rev. e ampl. São Paulo: LTr, 2012.
DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de direito processual civil. 1. ed. São Paulo:
Malheiros, 2004. V. 4.
FELICIANO, Guilherme Guimarães. Fênix: por um novo processo do trabalho. São Paulo:
LTr, 2011.
220 COLEÇÃO ESTUDOS ENAMAT
FREITAS, José Lebre de. Introdução ao processo civil: conceito e princípios gerais à luz
do novo código. 3. ed. Coimbra: Coimbra, 2013.
MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz; MITIDIERO, Daniel. Novo curso de
processo civil: tutela dos direitos mediante procedimento comum. 3. ed. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2017. V. II.
OLIVEIRA, Carlos Alberto Alvaro de. Garantia do Contraditório In: TUCCI, José Rogério
Cruz e (coord.). Garantias constitucionais do processo civil. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 1999.
SCHAUER, Frederick. A força do direito. Trad. André Luiz Freire. 1. ed. São Paulo: WMF
Martins Fontes, 2022.
SILVA, José Antônio Ribeiro de Oliveira (coord.). Comentários ao novo CPC e sua apli-
cação ao processo do trabalho: vol. 1: parte geral: arts. 1.º ao 317: atualizado conforme
a Lei n. 13.256/2016. São Paulo: LTr, 2016.
WALD, Arnoldo. Direito das obrigações e teoria geral dos contratos. 18. ed. São Paulo:
Saraiva, 2009.
NOVA PERSPECTIVA
PARA A EFETIVIDADE
DA EXECUÇÃO:
A APLICAÇÃO DAS
MEDIDAS COERCITIVAS
NA EXECUÇÃO
TRABALHISTA APÓS O
RECONHECIMENTO DA
CONSTITUCIONALIDADE
DO ART. 139, IV, DO
CPC NA ADI 5.941
Ben-Hur Silveira Claus
Mestre em direito pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos.
Professor. Juiz do trabalho aposentado do Tribunal Regional
do Trabalho da 4.ª Região. Autor de obras jurídicas sobre
execução trabalhista. E-mail: benhurclaus@terra.com.br.
222 COLEÇÃO ESTUDOS ENAMAT
Mudaram as estações
E nada mudou
Mas eu sei que alguma coisa aconteceu
Está tudo assim tão diferente
Renato Russo
1 INTRODUÇÃO
A introdução da execução atípica no atual CPC representa o reconhecimento,
pelo legislador de 2015, de que o modelo de execução típica se revelou insufi-
ciente à efetividade da prestação jurisdicional. O advento do julgamento da ADI
5.941 recoloca o tema em evidência, ao resgatar a juridicidade da perspectiva
em que se inspirara o legislador de 2015. O STF julgou improcedente a ação
direta de inconstitucionalidade objeto da ADI 5.941,1 reconhecendo a consti-
tucionalidade do art. 139, IV, do CPC, sede normativa das medidas coercitivas
que conferem operatividade à execução atípica no sistema processual civil.
A importância do tema é grande para a jurisdição brasileira em geral, cujos
números são insuficientes. Para a jurisdição trabalhista também, porque os
números da execução trabalhista também deixam a desejar: em média, apenas
duas execuções, de cada dez, são efetivas; as outras oito execuções vão para
o arquivo com a dívida não satisfeita, conforme informa o Relatório Geral da
Justiça do Trabalho de 2020, elaborado pelo Tribunal Superior do Trabalho. 2
Art. 139. O juiz dirigirá o processo conforme as disposições deste Código, incum-
bindo-lhe:
[...]
IV – determinar todas as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-ro-
gatórias necessárias para assegurar o cumprimento de ordem judicial, inclusive
nas ações que tenham por objeto prestação pecuniária;
1 A ADI 5.941 foi julgada improcedente, por dez votos a um, em 9 de fevereiro de 2023.
Conforme preleciona Hermes Zaneti Jr., o art. 139, IV, do CPC, estabelece
novo modelo de execução civil no Brasil. Ao prever a atipicidade dos meios exe-
cutivos ligada ao controle da adequada e efetiva tutela pelo juiz, o CPC migra de
um modelo exclusivo de execução rígida, de obrigações-tipo e execuções-tipo
(germânico), para um modelo combinado de execuções tipo flexíveis, tutela
adequada (commom law) e generalização das astreintes (francês).3
Na interpretação do preceito legal, a doutrina predominante assentou o
entendimento de que o art. 139, IV, do CPC, é a principal sede normativa da
execução atípica no Código de 2015, na medida em que o dispositivo diz ser
incumbência do juiz, para assegurar o cumprimento de ordem judicial, adotar
todas as medidas que para tanto se façam necessárias. Ao referir-se a tais
medidas, o legislador optou pela indicação da natureza dessas providências
judiciais, especificando-as como “medidas indutivas, coercitivas, mandamen-
tais ou sub-rogatórias”. Como veremos no item seguinte do presente artigo, as
medidas indutivas, coercitivas e mandamentais estão relacionadas à execução
atípica, ao passo que as medidas sub-rogatórias estão relacionadas à execução
típica. Também identificado como sede normativa do poder geral de efetivação
do magistrado na doutrina de Cassio Scarpinella Bueno,4 o art. 139, IV, do CPC
representa uma importante inovação em relação ao CPC de 1973, na medida
em que neste último diploma legal a execução atípica limitava-se às obrigações
de fazer, ao passo que no CPC de 2015 a execução atípica foi estendida a todas
as obrigações, inclusive às obrigações pecuniárias, uma histórica postulação da
teoria processual civil brasileira mais avançada. A amplitude das medidas de
coerção indireta postas a serviço da efetividade da jurisdição no art. 139, IV, do
CPC de 2015 é tamanha que Daniel Amorim Assumpção Neves afirma tratar-se
“da consagração legislativa do princípio da atipicidade das formas executivas,
de forma que o juiz poderá aplicar qualquer medida executiva”. 5 Um registro de
direito comparado é necessário. Observada a finalidade do preceito legal em
questão, é intuitiva a conclusão de que o art. 139, IV, do CPC foi inspirado no
instituto da Civil Contempt da common law, isso porque, apesar das diferenças
entre os sistemas da common law e da civil law, a aproximação e o diálogo entre
esses sistemas jurídicos têm sido uma tendência, com a adoção de institutos
de um pelo outro, na busca do aprimoramento de ambos.
6 A execução típica é também conhecida como execução sub-rogatória, porque que nela a vontade
do devedor é substituída pela atividade estatal; a satisfação da obrigação é imposta coativamente
pela jurisdição estatal mediante a constrição de bens do executado e sua alienação judicial, apu-
rando-se o valor necessário ao pagamento devido ao credor. A execução típica é o sucedâneo do
descumprimento da obrigação pelo devedor. Em termos ideais, o devedor, citado, tomaria a iniciativa
de satisfazer a obrigação. A execução ocorre por sub-rogação quando o devedor se omite quanto
ao dever jurídico de cumprimento espontâneo da obrigação.
A EFETIVIDADE DA EXECUÇÃO TRABALHISTA 225
Note-se que se o jurisdicionado sabe, diante de previsão legal, que a sua esfera
jurídica somente poderá ser invadida por meio de determinadas modalidades
executivas, confere-se a ele a possibilidade de antever a reação ao seu inadimple-
mento, bem como a garantia de que a jurisdição não determinará ou permitirá a
utilização de meio executivo diverso daqueles previstos. 9
12 MARINONI e ARENHART, 2014, p. 71. A locução “autênticas formas de execução” tem o sentido
de “lícitas formas de execução”.
[...] foram realizadas inúmeras diligências com a finalidade encontrar bens móveis
e imóveis, ou aplicações financeiras passíveis de penhora, para quitar o débito tra-
234 COLEÇÃO ESTUDOS ENAMAT
balhista, mas que todas restaram infrutíferas. Verifica-se, ainda, que o ato coator foi
prolatado de maneira fundamentada, levando em consideração as particularidades
da hipótese, especialmente a conduta do ora impetrante na execução, que não
fornece endereço correto para ser localizado, mas consegue atuar no processo,
por meio de advogado, quando entende conveniente.
sua fundamentação, o acórdão indica que não basta o esgotamento das medi-
das de execução típica para que se passe às medidas coercitivas previstas no
art. 139, IV, do CPC: “da decisão censurada não constam quaisquer indicações
de que o devedor venha ocultando bens ou de que o padrão de vida por ele
experimentado revele a existência de patrimônio que lhe permita satisfazer
a execução. Com efeito, não obstante assinalado, pela autoridade coatora, a
utilização de diversas medidas executivas típicas ou tradicionais, inexiste indi-
cação de elementos – de conteúdo probatório ou indiciário – que revelem que
o executado ostente capacidade financeira para adimplir a obrigação contida
no título executivo e não o faz com ardil ou dissimulação, em ordem a justificar
a drástica determinação imposta” (TST-RO – 11629-30.2021.5.03.0000 – SBDI-II,
Rel. Min. Douglas Alencar Rodrigues – Julgamento: 4/10/2022).
23 A Seção Especializada em Execução do TRT9 tem prerrogativa regimental para editar Orientações
Jurisprudenciais, destinadas a promover a uniformização da jurisprudência na 9.ª Região acerca da
matéria de execução.
236 COLEÇÃO ESTUDOS ENAMAT
24 O princípio da patrimonialidade da execução e os meios executivos atípicos: lendo o art. 139, IV,
do CPC. (CÂMARA, 2020, p. 256).
A EFETIVIDADE DA EXECUÇÃO TRABALHISTA 237
25 Art. 5.º XIII – “é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações
profissionais que a lei estabelecer;”.
26 A Lei da Reforma Trabalhista, a Lei n. 13.467/2017, alterou a redação do art. 878 da CLT.
238 COLEÇÃO ESTUDOS ENAMAT
Por tais razões, a alegação de execução mais gravosa somente será avaliada
pelo juízo quando o devedor oferecer, já na sua peça de impugnação, sugestão
de meio executivo alternativo àquele adotado pelo juízo da execução. Além do
ônus processual de indicar meio executivo alternativo, recai sobre o executado
o encargo processual de demonstrar que o meio executivo alternativo indica-
do atende à exigência legal de se tratar de meio executivo menos gravoso e,
simultaneamente, mais eficaz do que o meio executivo empregado pelo juízo
da execução, sob pena de manutenção do meio executivo adotado.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O julgamento da ADI n. 5.941 traz maior segurança jurídica à aplicação das
medidas coercitivas do art. 139, IV, do CPC, estimulando a magistratura do tra-
balho a abandonar a posição defensiva que prevaleceu sobre a matéria desde
o advento do Código de 2015. Isso porque o reconhecimento da constituciona-
lidade do preceito contribui para a superação da arraigada concepção de que
a execução é apenas e sempre patrimonial e de que não há outras técnicas de
execução a adotar senão os tradicionais os atos de execução sub-rogatória de
penhora e leilão. É possível prever o fortalecimento que o modelo de execução
atípica experimentará após o julgamento da ADI n. 5.941, restando à teoria
jurídica e à jurisprudência debruçarem-se sobre o debate acerca dos requisitos
necessários a conformar a juridicidade na aplicação das medidas coercitivas na
execução – suas potencialidades e seus limites.
A jurisdição trabalhista tem vocação histórica para afirmar-se como juris-
dição de resultados, dado que tutela créditos de natureza alimentar, dotados
de privilégio legal, razão por que é de se esperar que a jurisdição trabalhista
242 COLEÇÃO ESTUDOS ENAMAT
REFERÊNCIAS
ALMEIDA, Cleber Lúcio de. Direito processual do trabalho. 7. ed. Salvador: Juspodivm,
2019.
ASSIS, Araken de. Cabimento e adequação dos meios executivos “atípicos”. In: TALAMINI
Eduardo; MINAMI, Marcos Youji (coords.). Medidas executivas atípicas. 2 ed. Salvador:
JusPodivm, 2020.
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2018.
MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Curso de processo civil: execu-
ção. 6. ed. São Paulo: RT, 2014. V. 3.
MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz; MITIDIERO, Daniel. Novo código
de processo civil comentado. 2. ed. São Paulo: RT, 2016.
NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Novo código de processo civil comentado artigo
por artigo. Salvador: Juspodivm, 2016.
ZANETI Jr., Hermes. Comentários ao código de processo civil. Luiz Guilherme Marinoni
(diretor). Sérgio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero (coordenadores). São Paulo: RT, 2016.
V. XIV
FINANCIAMENTO
BANCÁRIO E CARTÃO
DE CRÉDITO NAS
ALIENAÇÕES JUDICIAIS:
INSTRUMENTOS DE
MERCADO EM PROL
DA EFETIVIDADE
DA EXECUÇÃO
André Braga Barreto
Juiz do Trabalho Substituto no Tribunal Regional do Trabalho da 7.ª Região
– Ceará. Gestor nacional da Comissão Nacional de Efetividade da
Execução Trabalhista como representante da Região Nordeste.
1 INTRODUÇÃO
Segundo dados do Relatório Justiça em Números de 2022,29 do Conselho
Nacional de Justiça, “o Poder Judiciário contava com um acervo de 77 milhões
de processos pendentes de baixa no final do ano de 2021, sendo que mais da
metade desses processos (53,3%) se referia à fase de execução”. O relatório
expressa como o impacto da execução é especialmente significativo nos seg-
mentos da Justiça Estadual, Federal e Trabalhista, correspondendo, a respec-
tivamente, 55,48%, 46,1% e 47,8% do acervo total de cada ramo, chegando a
60% do acervo em alguns Regionais Trabalhistas, como o TRT10, TRT13, TRT14,
TRT16, TRT19, TRT20, TRT21, TRT22, TRT7 e TRT9.
Ainda na análise dos dados do Relatório Justiça em Números, colhe-se que
a taxa de congestionamento30 média na fase de execução no âmbito da Justiça
do Trabalho é da ordem de 76%, chegando a 86% na Justiça Estadual, 84% na
Justiça Federal, e contabiliza 85% no Poder Judiciário como um todo.
A leitura desses números traz um alarmante quadro acerca da efetividade
da fase de execução em nosso país. Em termos de efetividade, portanto, a cada
100 execuções iniciadas ou em curso, 85 permanecem sem solução ao final do
ano; mesmo a Justiça do Trabalho, que apresenta números melhores, tem seu
percentual de execuções sem finalização em espantosos 76%.
Abordando especialmente a situação do Judiciário Trabalhista, não se pode
negar que parcela desse resultado seja atribuível a medidas de blindagem pa-
trimonial empreendidas pelos devedores, na tentativa de escapar à execução;
tampouco se olvide haver situações de efetiva ausência de patrimônio por parte
alguns devedores de menor porte, incapazes de adimplir as dívidas acumula-
das na Justiça do Trabalho. Muitas vezes, o insucesso da atividade econômica
empresarial gera uma reação em cadeia que exponencializa as dívidas e gera
situações fora de controle.
No entanto, não merece escapar da análise qual a parcela de contribuição
do próprio sistema de justiça e do procedimento para a inefetividade da exe-
cução. Em que medida uma melhor gestão do processo pode ser instrumento
de incremento dos resultados, em prol do jurisdicionado e de toda a sociedade.
Com efeito, a atividade jurisdicional, como toda e qualquer função pública,
não é infensa ao princípio da eficiência, um dos pilares que norteiam toda a
atividade pública, como inserto no art. 37, caput, da CF. Nesta linha, tem sido
cada vez mais corriqueiro o debate acerca da necessidade da capacitação do
magistrado como gestor do processo, para além de sua mera condução téc-
nico-jurídica. Assim, em paralelo ao impulsionamento da marcha processual,
o magistrado deve também pautar sua conduta para uma melhor gestão do
processo judicial, tudo em busca de uma melhor eficiência na condução do pro-
cesso. Eficiência não somente quanto à razoável duração do processo, direito
fundamental do cidadão, reconhecido no art. 5.º, LXXVIII, da CF, mas igualmente
quanto à maximização dos resultados da atividade judiciária, o que se logra por
meio do maior retorno aos jurisdicionados com o menor dispêndio de recursos
materiais e humanos da estrutura do Poder Judiciário.
Essa nova visão do juiz enquanto gestor do processo está na pauta das mais
atuais discussões acerca da gestão pública, como se pode ver na publicação a
seguir, ligada à Ciência da Administração:
31 KILIMNIK, 2010.
A EFETIVIDADE DA EXECUÇÃO TRABALHISTA 247
Art. 888 – Concluída a avaliação, dentro de dez dias, contados da data da nomeação
do avaliador, seguir-se-á a arrematação, que será anunciada por edital afixado na
sede do juízo ou tribunal e publicado no jornal local, se houver, com a antecedência
de vinte (20) dias. (Redação dada pela Lei n. 5.584, de 26.6.1970)
252 COLEÇÃO ESTUDOS ENAMAT
Como visto, mesmo com a aplicação das normas do processo civil, no silêncio
do diploma consolidado, a possibilidade de pagamento parcelado estava restrita
aos bens imóveis e ainda somente poderia ser aceita se observado o valor da
avaliação, com um sinal mínimo de 30% do valor da operação, independente-
mente de já ter havido sujeição anterior do bem à oferta pública.
A EFETIVIDADE DA EXECUÇÃO TRABALHISTA 253
Como se vê, da mesma forma que ocorre com os bens imóveis, a nova Lei
Adjetiva de 2015 expressamente prevê a possibilidade de parcelamento nas
arrematações de bens móveis. Nesse caso, também é devido o pagamento de
258 COLEÇÃO ESTUDOS ENAMAT
4 CONCLUSÃO
No presente estudo, diante dos assustadores números de execuções frus-
tradas, objetivamos defender que é possível e necessário buscarmos novos
instrumentos para potenciar as alienações judiciais, adequando as hastas pú-
blicas às ferramentas mercadológicas.
Tanto o financiamento bancário, quanto o uso do cartão de crédito são ins-
trumentos utilizados amplamente no mercado e presentes no nosso cotidiano,
urgindo a necessidade de sua utilização para fomentar o princípio da efetividade
da execução, na medida em que tencionam ampliar o acesso de interessados
na hasta pública e, como isso, potencializar a venda dos bens pelo maior valor,
com indiscutível ganho para exequente, executado e sociedade. O exequente
tende a receber mais rapidamente o seu crédito. O executado tem seu bem
vendido pelo valor maior. E ao interessado no bem contará com ferramentas
para facilitar a sua participação na hasta pública com melhores condições de
pagamento.
Portanto, não temos dúvidas de que a criação de linhas de créditos espe-
cíficas para os leilões de imóveis, bem como a disponibilidade do uso de car-
tões de créditos na aquisição de bens móveis, contribuirá sobremaneira para
a efetividade da execução, com observância da duração razoável do processo,
preceitos fundamentais e tão caros ao Estado Democrático de Direito.
Tudo isso permitirá que o Poder Judiciário consiga atingir a sua missão, que
é, com efetividade, dar a cada um o que é seu.
REFERÊNCIAS
FERNANDES, Danielly. Custas judiciais do STF poderão ser pagas com Pix ou cartão
de crédito. Disponível em: https://www.jota.info/justica/custas-judiciais-stf-pix-cartao-
-credito-21032022.
UOL, São Paulo. 75% dos usuários de cartão de crédito parcelam as compras, diz
Datafolha. Disponível em: https://economia.uol.com.br/noticias/redacao/2021/02/11/
compras-parceladas-cartao-de-credito-datafolha.htm?cmpid=copiaecola.
KILIMNIK, Zelia. O juiz de direito como gestor: competências necessárias para uma difícil
conciliação de papéis. Revista Gestão & Tecnologia, 2010.
PARTE V
MEDIDAS DE
ENFRENTAMENTO À
LITIGÂNCIA HABITUAL
E EXECUÇÃO NO
PROCESSO COLETIVO
A LEGITIMIDADE ATIVA
PARA A LIQUIDAÇÃO E
EXECUÇÃO DA SENTENÇA
COLETIVA GENÉRICA
NA JURISDIÇÃO
TRABALHISTA
André Araújo Molina
Professor da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Mato
Grosso, pós-doutor em direito do trabalho pela Universidade de São
Paulo, doutor em filosofia do direito pela Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo, mestre em direito do trabalho pela Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo, bacharel em direito pela
Universidade Federal de Mato Grosso, titular da Academia Brasileira
de Direito do Trabalho, titular da Academia Mato-Grossense de
Direito, titular do Instituto Brasileiro de Estudos em Responsabilidade
Civil e juiz do trabalho titular no Tribunal Regional do Trabalho
da 23.ª Região (Mato Grosso). E-mail: aamolina@bol.com.br.
266 COLEÇÃO ESTUDOS ENAMAT
1 INTRODUÇÃO
A estruturação política dos Estados contemporâneos teve início com a ado-
ção do modelo liberal, passou pelo Estado de Bem-Estar Social e, atualmente,
experimenta a fórmula do Estado Democrático de Direito, que pretende ser
uma síntese agregadora e inclusiva das duas visões parciais anteriores, em cujo
modelo há um reforço constitucional na promoção dos direitos fundamentais
das mais diferentes dimensões, como a individual, a coletiva e a difusa.
Ocorre que, nada obstante desde a Constituição de 1934 já se tivesse ado-
tado um Título para a Ordem Econômica e Social, positivando alguns direitos
trabalhistas como direitos fundamentais, com outros de natureza coletiva ou
de solidariedade, o fato é que o direito processual nacional, inaugurado pelo
CPC de 1939, foi estruturado tendo em conta apenas a perspectiva liberal e
individualista, de modo que o procedimento foi desenhado para promover em
juízo os direitos de liberdade individual, especialmente a defesa da propriedade
privada, os direitos civis e os direitos políticos.
Uma tutela processual diferenciada, preocupada com a defesa adequada
dos direitos coletivos em juízo, apenas iniciou com a reforma da Lei de Ação
Popular em 1977, com a criação de um procedimento especial para a defesa
dos direitos difusos ligados ao patrimônio ambiental; que seguiu com a Lei
n. 6.938/1981, que atribuiu ao Ministério Público a titularidade para as ações
ambientais de responsabilidade penal e civil; a Lei n. 7.347/1985, que disciplinou
a ação civil pública de responsabilidade por danos causados ao meio ambiente,
ao consumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e
paisagístico, complementada por atualizações legislativas mais recentes, para
inserir a infração da ordem econômica, a ordem urbanística, a honra e dignida-
de de grupos raciais, étnicos ou religiosos, o patrimônio público e social, além
de qualquer outro interesse difuso ou coletivo.
A universalização da proteção coletiva dos direitos de natureza transindi-
vidual veio com a Constituição Federal de 1988, na consagração do Estado
Democrático de Direito, dos direitos fundamentais das três dimensões, com
reforço do papel institucional do Ministério Público (arts. 127 e 129), instituição
da Defensoria Pública (art. 134), a legitimação de outros entes para a defesa
dos interesses coletivos em juízo, como as entidades sindicais (art. 8.º, III) e as
associações (art. 5.º, XVII), naquela altura por meio da ação popular e da ação
civil pública.
A EFETIVIDADE DA EXECUÇÃO TRABALHISTA 267
38 Art. 81 do CDC. A defesa dos interesses e direitos dos consumidores e das vítimas poderá ser exer-
cida em juízo individualmente, ou a título coletivo. Parágrafo único. A defesa coletiva será exercida
quando se tratar de: I – interesses ou direitos difusos, assim entendidos, para efeitos deste código,
os transindividuais, de natureza indivisível, de que sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas
por circunstâncias de fato; II – interesses ou direitos coletivos, assim entendidos, para efeitos deste
código, os transindividuais, de natureza indivisível de que seja titular grupo, categoria ou classe de
pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica base; III – interesses ou
direitos individuais homogêneos, assim entendidos os decorrentes de origem comum.
39 “Art. 83. Compete ao Ministério Público do Trabalho o exercício das seguintes atribuições junto
aos órgãos da Justiça do Trabalho: [...] III – Promover a ação civil pública no âmbito da Justiça do
Trabalho, para a defesa dos interesses coletivos, quando desrespeitados os direitos sociais consti-
tucionalmente garantidos;”
268 COLEÇÃO ESTUDOS ENAMAT
40 Por todos: BEZERRA LEITE, Carlos Henrique. Ministério Público do Trabalho: doutrina, juris-
prudência e prática. São Paulo: LTr, 1998.
41 “COMPETÊNCIA – AÇÃO CIVIL PÚBLICA – CONDIÇÕES DE TRABALHO. Tendo a ação civil pública
como causa de pedir disposições trabalhistas e pedidos voltados à preservação do meio ambiente
do trabalho e, portanto, aos interesses dos empregados, a competência para julgá-la é da Justiça do
Trabalho” (STF – 2.ª Turma – RE n. 206.220 – Rel. Min. Marco Aurélio – DJ 17/9/1999).
42 STF – Tribunal Pleno – RE n. 163.231 – Rel. min. Maurício Corrêa – DJ 29/6/2001, posição que foi
ajustada por acórdãos posteriores, como no RE n. 195.056 – Rel. min. Carlos Velloso – DJ 14/11/2003 e
no RE n. 631.111 – Rel. min. Teori Zavascki – DJ 7/8/2014, que previu que “a legitimidade do Ministério
Público para tutelar em juízo, direitos individuais homogêneos se configura nas hipóteses em que
a lesão a tais direitos compromete também interesses sociais subjacentes.”
43 Por todos: TST – SDI-1 – E-RR n. 734212-30.2001.5.23.5555 – Rel. Min. Maria de Assis Calsing –
DEJT 18/6/2010.
A EFETIVIDADE DA EXECUÇÃO TRABALHISTA 269
2 LEGITIMIDADE ATIVA
44 STF – 2.ª Turma – RE n. 470.135 AgR-ED – Rel. min. Cezar Peluso – DJ 29/6/2007.
270 COLEÇÃO ESTUDOS ENAMAT
Nas ações que veiculam a defesa dos direitos ou interesses difusos e coleti-
vos em sentido estrito, a efetivação da decisão é uma mera fase de cumprimen-
to da sentença, visto na perspectiva de um processo sincrético, que tramita nos
mesmos autos do processo, como em qualquer ação individual, mantendo-se
os legitimados para a ação como também legítimos para dar início à liquidação
e a execução do título executivo judicial.
A única ressalva importante é que, se o autor da ação de conhecimento
não promover o impulsionamento da execução, quaisquer um dos outros le-
gitimados poderá assumir esta condição e dar início ou prosseguir na fase de
execução, nos mesmos autos do processo, a teor do art. 15 da LACP.
O exemplo clássico na seara trabalhista é a adequação do meio ambiente
do trabalho, para eliminar ou reduzir os riscos aos níveis de tolerância, p. ex.,
45 STF – Plenário – RE n. 733.433 – Rel. min. Dias Toffoli – DJE de 7/4/2016 – Tema 607.
46 No mesmo sentido: “A Defensoria Pública tem legitimidade para propor ação civil pública, na
defesa de interesses difusos, coletivos ou individuais homogêneos.” (STF – Plenário – ADI n. 3.943 –
Rel. Min. Cármen Lúcia – DJE 6/8/2015).
A EFETIVIDADE DA EXECUÇÃO TRABALHISTA 271
previstos no art. 82 da mesma lei, porém, nesse último caso, apenas poderão
fazê-lo decorrido o prazo de um ano sem a habilitação de interessados em nú-
mero compatível com a gravidade do dano, conforme exige o art. 100 do CDC.
Teori Albino Zavascki, comentando os citados dispositivos, leciona:
47 ZAVASCKI, Teori Albino. Defesa de direitos coletivos e defesa coletiva de direitos. Revista de
Informação Legislativa, Brasília, ano 32, n. 127, jul./set. 1995, p. 92.
48 PIZZOL, Patricia Miranda. Liquidação nas ações coletivas. São Paulo: Lejus, 1998, p. 184.
49 WAMBIER, Luiz Rodrigues; WAMBIER, Tereza Arruda Alvim. Anotações sobre a liquidação das
sentenças coletivas. In: GRINOVER, Ada Pellegrini; MENDES, Aluisio Gonçalves de Castro: WATANABE,
A EFETIVIDADE DA EXECUÇÃO TRABALHISTA 273
Nesses casos, será preciso que o juiz tenha redobrada atenção para auto-
rizar o início imediato da execução, nos próprios autos, apenas dos capítulos
condenatórios sobre direitos difusos e coletivos em sentido estrito.
Para o capítulo dos direitos individuais homogêneos violados, o ente coletivo
não possui legitimidade primária, direta e imediata, devendo as próprias vítimas
ou seus sucessores ajuizarem as liquidações individuais no foro competente, a
partir da extração do título executivo judicial, enquanto verdadeiros legitimados
primários, diretos e imediatos; ou autorizar que os legitimados coletivos os
representem, juntando-se autorização individual e expressa.
Basta imaginar a ação coletiva em que se pleiteia o reconhecimento de dano
moral coletivo e de danos morais individuais, para cada uma das vítimas afeta-
das por um acidente ambiental.50 No exemplo, a sentença já teria condições, se
for o caso, de arbitrar a indenização coletiva (direito difuso e coletivo) e o valor
do dano moral de cada um dos afetados51 (direito individual homogêneo), de-
legando para a liquidação apenas a identificação dos beneficiados e a cobrança
da indenização por estes, individualmente.
Lado outro, em outra ação em que se aponta irregularidade no pagamento
de uma determinada verba de natureza salarial, travestida de verba indeniza-
tória, a sentença terá de ser, necessariamente, genérica, na medida em que a
extensão do dano sofrido por cada um dos atingidos dependerá de uma série
de detalhes, como o salário básico, a função exercida, o tempo de contrato, o
período de recebimento da verba etc., a justificar o porquê de o legislador do
CDC ter sido sábio ao conceder, apenas, aos beneficiários, a legitimidade, dire-
ta e primária, para a liquidação e a execução individuais, seja na modalidade
individual pura, ou seja, pela representação concedida ao ente coletivo.
Na jurisdição civil, o Superior Tribunal de Justiça tem decisões recentes na
linha de que a legitimidade dos entes coletivos, que ajuizaram a ação civil públi-
51 Na perspectiva objetiva dos danos morais, que não admite a diferença de tratamento em rela-
ção à condição econômica, social, valor da remuneração, grau de escolaridade ou qualquer traço
particular da personalidade humana, que geraria tratamento diferenciado a todos que possuem
igual dignidade, quando submetidos à mesma situação ilícita danosa. Neste sentido: MOLINA, André
Araújo. A configuração e a transmissibilidade dos danos extrapatrimoniais no contexto da reforma
trabalhista. Revista Jurídica Luso-Brasileira, Lisboa, ano 4, n. 4, p. 163-197, 2018.
A EFETIVIDADE DA EXECUÇÃO TRABALHISTA 275
52 Exemplificativamente: “Os sujeitos previstos no rol do art. 82 do CDC têm legitimidade subsidiária
para a liquidação e execução da sentença coletiva, na forma dos arts. 97 e 98 do CDC, caso não haja
habilitação por parte dos beneficiários ou haja em número incompatível com a gravidade do dano,
nos termos do art. 100 do CDC.” (STJ – 3.ª Turma – REsp n. 1.955.899 – Rel. Min. Nancy Andrighi – DJe
21/3/2022).
276 COLEÇÃO ESTUDOS ENAMAT
53 STF – Tribunal Pleno – RE n. 214.668 – Red. p/ac. min. Joaquim Barbosa – DJ 24/8/2007.
A EFETIVIDADE DA EXECUÇÃO TRABALHISTA 277
54 “Solução diversa importaria em admitir que a Constituição teria erigido o sindicato como coti-
tular dos direitos subjetivos individuais de filiados e não filiados. É de se repelir interpretação que
conduza a expropriação, pelo sindicato, dos direitos individuais dos trabalhadores.” (voto do min.
Nelson Jobim).
278 COLEÇÃO ESTUDOS ENAMAT
casos em que o sindicato não terá elementos para requerer a liquidação. Este
é um problema a ser examinado caso e caso.”
Amadurecido o debate, que durou algumas sessões e resultou em um longo
acórdão de 195 páginas, os ministros encontraram um ponto de equilíbrio em
torno do fato de que a decisão constitucional deveria ser apenas da melhor
interpretação do art. 8.º, III, da Constituição, na linha de que há legitimidade
extraordinária dos sindicatos para defender em juízo os direitos e interesses
coletivos ou individuais dos integrantes da categoria que representam, sendo
que tal legitimação é ampla, englobando, em tese, a liquidação e a execução.
Os interessantes debates que se travaram, em torno da maior ou menor
amplitude da legitimidade sindical para as fases de liquidação e execução, fo-
ram apenas em obter dictum, já que não foi objeto do julgamento e nem todos
os ministros manifestarem-se expressamente sobre o tema. Inclusive, a detida
leitura integral do acórdão, revela que houve completa divisão sobre a questão,
já que os ministros Nelson Jobim, Cezar Peluso, Eros Grau, Gilmar Mendes e
Ellen Gracie, foram expressos em não admitir a legitimidade extraordinária
sindical para a fase de liquidação e execução, sendo que a admitiram os minis-
tros Carlos Velloso, Ayres Britto, Sepúlveda Pertence, Marco Aurélio e Joaquim
Barbosa. Inclusive, dentro deste último grupo, alguns anotaram que as questões
processuais, em torno da amplitude da legitimidade executiva, era para ser
realizada caso a caso, conforme a natureza dos direitos e da sentença proferida.
O ministro Ricardo Lewandowski não participou deste julgamento.
Logo, considerando que sequer era objeto do julgamento – que, repita-se, tra-
tava da definição da legitimidade extraordinária ou da representação sindical para
a cognição –, os debates travados servem como mero obter dictum. Mesmo assim,
houve completa divisão entre os ministros, sendo que metade disse que a legiti-
midade era ampla tanto no conhecimento quanto na execução, e a outra metade,
nada obstante tenha reconhecido que no conhecimento era caso de legitimidade
extraordinária, e não de mera representação, não avançou para fixar posição geral
quanto às fases de liquidação e execução, ficando para o caso concreto.
Não há como atestar que o Supremo tenha fixado posição em torno da
legitimidade sindical direta e ampla para a liquidação imediata da sentença
genérica, pelo simples fato de alguns dos ministros terem defendido esta po-
sição, justamente porque esta questão processual sequer é de competência
do STF; não era objeto do recurso; e nem todos os ministros manifestaram-se
sobre ela. Logo, não havendo como afirmar-se que, mesmo que em obiter dic-
280 COLEÇÃO ESTUDOS ENAMAT
55 THEODORO JÚNIOR, Humberto; NUNES, Dierle; BAHIA, Alexandre. Breves considerações sobre
a politização do Judiciário e sobre o panorama de aplicação no direito brasileiro – Análise da con-
A EFETIVIDADE DA EXECUÇÃO TRABALHISTA 281
vergência entre o civil law e o common law e dos problemas de padronização decisória. Revista de
Processo, São Paulo, ano 35, v. 189, p. 9/52, nov. 2010.
56 STF – Tribunal Pleno – RE n. 883.642-RG – Rel. min. Ricardo Lewandowski – DJE 26/6/2015 – Tema
823.
57 TST – 6.ª Turma – AIRR n. 000808-52-2018.5.12.0054 – Rel. min. Augusto César Leite de Carvalho
– DEJT 29/4/2022.
282 COLEÇÃO ESTUDOS ENAMAT
59 Por todos: “EXECUÇÃO INDIVIDUAL. ACORDO CELEBRADO NOS AUTOS DA AÇÃO COLETIVA. EX-
TINÇÃO. Correta a decisão proferida, ao extinguir o processamento da execução individual, diante
da constatação de acordo celebrado pelo sindicato autor da ação coletiva, fato este confirmado pelo
Exequente nos presentes autos. [...] Ora, o Sindicato é o titular da ação coletiva, tendo legitimidade
constitucional para transacionar com o réu, ora agravado, os direitos postulados, sendo certo que
a mera alegação de risco de não pagamento não autoriza a que o Agravante receba por direito já
regularmente quitado pelo Executado. Caso o Sindicato não arque com o pagamento dos créditos
relativos ao Agravante, este deve tomar as medidas jurídicas cabíveis, não tendo nenhum amparo
legal a tese sustentada no agravo de petição.” (TRT 1.ª Região – 7.ª Turma – Processo n. 0101005-
21.2016.5.01.0012 – Rel. des. Rogério Lucas Martins – DEJT 30/8/2017).
O que a Suprema Corte afirmou foi que o art. 8.º, III, da Constituição não
elenca nenhuma condicionante no dispositivo, quanto à legitimidade sindical
para a defesa dos direitos dos trabalhadores da sua base de representação, de
modo que, em tese, a sua legitimidade é ampla para todas as fases do processo,
ao contrário da visão restritiva da antiga Súmula n. 310 do TST, que não admitia,
sequer, a legitimidade extraordinária para o ajuizamento da ação quando os
direitos defendidos fossem individuais homogêneos.
Inclusive, em qualquer processo, o advogado somente poderá transigir, re-
nunciar, receber e dar quitação, quando expressamente autorizado, sendo que
a usual procuração geral para o foro não é suficiente, sequer, para conceder ao
advogado da própria parte titular do direito material estes especiais poderes
(art. 105 do CPC), menos ainda poderá o advogado sindical, que nem procuração
geral para o foro, outorgada pelo trabalhador, possui, avançar para levantar
individuais homogêneos dos trabalhadores, também lhes foi autorizado celebrar acordos em juízo,
desde que se mostrem mais favoráveis à efetivação dos direitos metaindividuais por eles tutelados.”
(BASTOS, Guilherme Augusto Caputo; SILVA, Jurema Costa de Oliveira. Limites constitucionais impos-
tos ao sindicato para transacionar direitos individuais homogêneos em ação coletiva e a extensão
subjetiva da coisa julgada. Revista LTr, São Paulo, v. 82, n. 11, p. 1287-1295, nov. 2018).
61 TST – SDI-2 – RO n. 010941-15.2014.5.03.0000 – Rel. min. Maria Helena Mallmann – DJET 18.02.2022.
284 COLEÇÃO ESTUDOS ENAMAT
valores em nome deste, que no mais das vezes não é sindicalizado, quando
não for o caso de, além de não ser sindicalizado, também sequer saber da
existência da sentença coletiva genérica e do seu direito material reconhecido,
cujos valores terão sido levantados por estranhos.
Humberto Theodoro Júnior leciona que os poderes do substituto processual
“são amplos, no que dizem respeito aos atos e faculdades processuais, mas não
compreendem, obviamente, os atos de disposição do próprio direito material
do substituído, como confissão, transação, reconhecimento do pedido etc.”.62
Alguns tribunais regionais do trabalho, ao contrário do acórdão da 1.ª Turma
do TST e de outros tribunais regionais, têm compreendido a diferença entre
legitimidade extraordinária reconhecida pelo Supremo, que é matéria proces-
sual, da quitação das obrigações, que é direito material, não confundindo os
temas e as suas implicações.63
Assim, em nossa interpretação, a legitimidade sindical reconhecida pelo
art. 8.º, III, da Constituição é ampla, na atual leitura do Supremo (Tema 823),
de modo que os sindicatos poderão ajuizar as ações coletivas em defesa dos
direitos difusos, coletivos ou individuais homogêneos dos integrantes da cate-
goria, sem limitação quanto à condição de sindicalizado.
Obtida a sentença coletiva genérica, do art. 95 do CDC, a liquidação poderá
ser promovida, simultaneamente, tanto pelo trabalhador interessado – sozinho
ou representado –, quanto pelo sindicato, pressupondo que este tenha todos
os dados possíveis para a delimitação dos danos sofridos e a identificação dos
trabalhadores vitimados.
62 THEODORO JUNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil. 56. ed. São Paulo: Atlas, 2016.
v. 1, p. 292.
63 Por todos: “Assim, compete ao sindicato ajuizar ação com vistas à tutela de interesses difu-
sos, coletivos e individuais, homogêneos ou não, com ampla abrangência em relação a todos os
empregados integrantes da respectiva categoria, tanto na fase cognitiva quanto na liquidação e
execução. Portanto, a atuação do sindicato profissional nas fases de liquidação e execução não fica
condicionada à apresentação de instrumento de mandato passado pelo substituído, de modo que
sua exigência no atual quadrante processual configura restrição indevida à atuação sindical, a qual
se funda em legitimidade assegurada pela Constituição. [...] No entanto, em que pese o sindicato
possuir poderes amplos para defesa dos interesses individuais e coletivos da categoria, não se pode
elastecer a interpretação para incluir poderes especiais para receber, dar quitação, entre outros.
Dessa forma, no momento do pagamento, a liberação do crédito líquido do trabalhador somente
poderá ocorrer diretamente a ele ou após juntada de procuração com poderes específicos ao ad-
vogado.” (TRT da 23.ª Região – 2.ª Turma – RO n. 0000825-71.2021.5.23.0056 – Rel. des. Aguimar
Peixoto – DEJT 16.12.2022).
A EFETIVIDADE DA EXECUÇÃO TRABALHISTA 285
64 STF – Tribunal Pleno – RE n. 573.232-RG – Red. p/ ac. min. Marco Aurélio – DJE 19/9/2014.
286 COLEÇÃO ESTUDOS ENAMAT
ser revertida aos fundos de recomposição dos danos causados, jamais para
individualizar valores e, menos ainda, para sacá-los.
Interpretando os arts. 97, 98 e 100 do CDC, a doutrina de Ada Pelegrini
Grinover é contundente, na linha de que “parece faltar ao Ministério Público
legitimação para a liquidação e a execução individual, em que se trata da defesa
de direitos individuais disponíveis, exclusivamente (art. 127 da CF)”. 65
O STJ, em reiterados julgados, tem feito a distinção da legitimidade do Mi-
nistério Público para a ação e a execução coletiva, fixando a diretriz de que,
nada obstante o Parquet tenha a sua legitimidade extraordinária reconhecida
inclusive para a defesa de interesses ou direitos individuais homogêneos de
uma universalidade de vítimas, após o trânsito em julgado esgota-se a sua
atribuição, restando apenas a legitimidade subsidiária ou residual, superado o
prazo de um ano, para o arbitramento da indenização fluída reversível ao fundo
público de reconstituição dos bens lesados.66
3 CONCLUSÕES
A legitimidade ativa para a liquidação e execução das sentenças coletivas
genéricas que reconhecem direitos individuais homogêneos das vítimas é dis-
ciplinada pelos arts. 97 e seg. do Código de Defesa do Consumidor, tendo o le-
gislador optado pela legitimidade primária e direta das próprias vítimas ou seus
sucessores para promoverem as execuções, individualizando a sua situação e
provando que estão contempladas nos limites objetivos e subjetivos da decisão.
Somente nos casos em que as vítimas não se habilitarem, em número sufi-
ciente, por meio das liquidações individuais, e superado o prazo de um ano, é
que os entes coletivos teriam a sua legitimidade subsidiária ativada, mas não
para liquidar e executar os prejuízos específicos individuais sofridos, mas para
pleitear o arbitramento da indenização fluída, a ser revertida aos fundos de
reconstituição dos bens lesados.
Especificamente em relação aos direitos trabalhistas, o STF reconheceu a
ampla legitimidade sindical, atuando como verdadeiro substituto processual
65 GRINOVER, Ada Pelegrini. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor comentado pelos au-
tores do anteprojeto. 10 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2011. p. 157-158.
66 Por todos: STJ – 3.ª Turma – REsp n. 1.801.518 – Rel. min. Paulo de Tarso Sanseverino – DJe
16/12/2021 e STJ – 4.ª Turma – AgInt no REsp n. 1.761.683 – Rel. min. Luis Felipe Salomão – DJe
4/6/2020.
A EFETIVIDADE DA EXECUÇÃO TRABALHISTA 287
Essas políticas públicas devem ter por foco duas vertentes: o setor público
e o privado.
No setor público, é essencial que seja implementada a regra vinculativa ao
administrador público. Significa que, além de estar obrigado a seguir a lei, como
é óbvio, ele deve incorporar como prática da gestão pública as orientações cons-
tantes nas súmulas e enunciados dos tribunais nas questões afetas à gestão
de pessoal, sob pena de caracterização de falta funcional com afastamento do
cargo e abertura de inquérito para apuração e eventual punição em caso de
descumprimento das orientações.
No setor privado, a questão pode ser tratada tanto pela perspectiva das
sanções premiais como das sanções de caráter punitivo – o melhor seria uma
mescla de ambas.
A ideia é criar um certificado, do tipo ISO-SOCIAL, que seria um índice, um
fator, uma equação, que poderia ser elaborada pelo CNJ, pelo TST, com o auxílio
de outras instituições estatais ligadas à regulação trabalhista como o Ministério
do Trabalho e Emprego e o Ministério Público do Trabalho. Sem esse certificado
a empresa não poderia contratar com o poder público, pedir financiamento em
banco público ou de fomento.
A sigla Isso refere-se à International Organization for Standartization,69 en-
tidade independente, não governamental, fundada na Suíça, em 1947, que
congrega representantes de diversos países, Brasil entre eles, com o objetivo
74 WORLD BUSINESS COUNCIL FOR SUSTAINABLE DEVELOPMENT, 2017. Entre as empresas que
compõem o WBSCD estão a Unilever, Banco Santander, Toshiba, JP Morgan, China Petrochemical
Corporation, Royal Dutch-Shell, Toyota.
A EFETIVIDADE DA EXECUÇÃO TRABALHISTA 295
75 WORLD BUSINESS COUNCIL FOR SUSTAINABLE DEVELOPMENT, 2008, p. 276, tradução nossa.
296 COLEÇÃO ESTUDOS ENAMAT
que obtêm o certificado e se adequam as políticas públicas, como ela pode ter
caráter punitivo, no sentido de aplicação de sanções de rescisão de contratos
em vigor para empresas que não cumprem as metas estabelecidas.
Essa ideia é de grande importância porque ela retira o tratamento das ques-
tões do litígio de massa do âmbito da esfera de soluções individuais, pontuais,
endojudiciárias e as transporta para o âmbito das políticas públicas, das políticas
de Estado.
A atuação no sentido da efetividade das normas legais e constitucionais é
um dever e um dever qualificado para quem recebe apoio financeiro de órgãos
públicos. Se as normas legais e constitucionais são de natureza trabalhista tal
dever qualificado atinge seu ponto mais sensível quando tal apoio vem de um
órgão público como o BNDES, uma instituição que, em sua história, teve como
fonte principal de recursos fundos ligados ao universo do trabalho como o
PIS-Pasep e o FAT.
A rica trajetória do BNDES pode ser abordada por vários ângulos: um deles
é o de como o banco tem incrementado sua vocação de agente de desenvol-
vimento não só econômico, mas também social. Por isso, e por ser o principal
banco de fomento econômico do Brasil e um dos maiores do mundo, o BNDES
seria a instituição crucial para a implantação do certificado de ISO-SOCIAL, sem
desprezar a importância de outras instituições estatais.
ano seguinte, pela lei 2973, e só terminaria, portanto, no final de 1966. Em seus
primeiros anos, os recursos do Banco vinham somente dessa fonte. A partir de
1956, o Banco começou também a captar recursos externos, mas o Fundo de
Reaparelhamento Econômico, alimento pela adicional de Imposto de Renda,
manteve-se como a receita principal, ou seja, foi a sociedade brasileira, e mais
especificamente suas camadas mais abastadas, que financiou o BNDE.
O foco do Banco, nestes primeiros anos, foi a indústria e a infraestrutura,
funcionava como uma instituição financeira de crédito direcionado, aquela
cujos recursos só vão para determinados setores previamente definidos por
lei e/ou estatuto interno. Mas o banco também operava dentro do paradigma
do planejamento econômico – seu aporte para o plano de metas de Juscelino
Kubitschek, por exemplo, foi crucial.
A disponibilização de crédito, até 1965, era realizada em negociações diretas
com as empresas interessadas. Depois disso, o Banco começou a descentralizar
suas operações, seja por meio de bancos regionais e estaduais de desenvolvi-
mento – que se miraram no BNDE para se organizar institucionalmente –, seja
por meio de instituições financeiras privadas. Em ambos os casos, os repasses
de recursos oriundos do Banco para que estes agentes capilarizassem o finan-
ciamento do desenvolvimento econômico seguiam suas regras e condições
gerais para definir condições de financiamento, assim como setores e atividades
econômicas contemplados. E no ciclo de expansão econômica iniciado no fim
dos anos 1960, o Banco teria papel fundamental.
Em 1971, a Lei 5662, transformou o BNDE em empresa pública federal, o que
incrementou sua autonomia e flexibilidade administrativa. E em 1974, outro
evento fundamental para a solidificação do Banco – e importantíssimo para o
argumento que desenvolvemos aqui: o BNDE passa a administrar os recursos
do sistema PIS-Pasep,76 o que lhe garantiu um aporte seguro e previsível de
recursos, que perdera quando findara adicional de Imposto de Renda. Não por
acaso, logo após, no biênio 1975-1976, o banco atingiria sua capacidade máxima
de financiamento até então, que só seria superada nos anos 1990.
77 Atualmente, essas contribuições estão em 0,65% sobre o faturamento bruto das empresas; 1% so-
bre a folha de salários das entidades sem fins lucrativos; 1,65% sobre a importação de bens e serviços.
A EFETIVIDADE DA EXECUÇÃO TRABALHISTA 299
79 O BNDES considera como micro, pequenas ou médias empresas aqueles cujo faturamento bruto
anual esteja abaixo de 300 milhões de reais.
A EFETIVIDADE DA EXECUÇÃO TRABALHISTA 301
82 Essas condicionantes compõem a chamada “cláusula social” presentes nos contratos de finan-
ciamento do Banco.
83 E desde 2003 a chamada “lista suja” do Ministério do Trabalho, cadastro do órgão de pessoas
físicas e jurídicas autuadas por sujeitar trabalhadores a condições análogas às de escravo, era utili-
zada pelo Banco como referência para negar acesso a empréstimos para tais pessoas. Infelizmente,
porém, a “lista suja”, malgrado sua importância, reconhecida inclusive internacionalmente, viu-se,
desde 2014, no centro de disputas jurídicas e de alegações que, apelando para aspectos formais,
visam impedir sua divulgação.
304 COLEÇÃO ESTUDOS ENAMAT
Para sustentar nossa sugestão de que o BNDES, para liberar seus emprés-
timos às empresas, exija a contrapartida do ISO-SOCIAL trabalhista e induza
mecanismos de participação dos trabalhadores nas empresas recebedoras de
crédito do Banco no sentido da garantia de postos de trabalho, levantamos os
dados relativos aos maiores litigantes no TRT3, que abrange o estado de Minas
Gerais, durante um período de dez anos, de 2006 a 2015 e ao volume de em-
préstimos que muitos destes litigantes receberam do BNDES.
O dilatado período visou descartar qualquer sazonalidade na litigância das
empresas e instituições, advindas de motivos como quebra ou fechamento de
empresa ou crises de determinados setores etc. Assim, se uma empresa, ou
ente público, ou sindicato, permanece durante dez anos seguidos na lista dos
maiores litigantes trabalhistas, seja no polo ativo ou passivo, e figura, na lista
consolidada destes dez anos, com um número expressivo de demandas, é um
sinal robusto de que sua litigância não é fortuita, mas sistemática.
O levantamento compilou, ano a ano, de 2006 a 2015, os 100 maiores liti-
gantes, sem discriminar se figuravam no polo ativo ou passivo da demanda. A
seguir, computou-se o quanto cada um desses 100 maiores litigantes do TRT3
recebeu do BNDES a título de financiamentos e/ou participações acionárias, por
meio de operações contratadas desde 2002 até 31/10/2016.84 A fonte destas
informações foi a própria página da Internet do BNDES.85
O custo de financiamentos do BNDES quase sempre está abaixo daquele
oferecido pelos bancos comerciais a pessoas jurídicas pelos bancos comerciais.
Por causa dessas condições vantajosas dos empréstimos do BNDES, o le-
vantamento de dados mostra um volume impressionante de recursos públicos
destinados, por meio dessas várias formas de apoio do Banco, aos 100 maiores
litigantes do TRT mineiro: mais de 205 bilhões de eais, entre 2002 e 2016.
REFERÊNCIAS
ALÉM, Ana Cláudia; GIAMBIAGI, Fábio (Org.). O BNDS em um brasil em transição. Rio
de Janeiro: BNDS, 2010.
CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryan. Acesso à Justiça. Porto alegre: Fabris, 1988.
DURKHEIM, Émile. Da divisão do trabalho social. São Paulo: Martins Fontes, 1999.
MACIEL JÚNIOR, Vicente de Paula. Teoria das ações coletivas: as ações coletivas como
ações temáticas. São Paulo: Ltr, 2006.
MATTEI, Ugo; NADER, Laura. Quando o estado de direito é ilegal. São Paulo: WMF
Martins Fontes, 2013.
PARTE VI
PODER DE DILIGÊNCIA
E MEDIDAS DE EFICÁCIA
DA EXECUÇÃO E O
USO REGULAR DOS
INSTRUMENTOS DE
GARANTIA PROCESSUAL
REQUISITOS PARA O
AFASTAMENTO DO
SIGILO BANCÁRIO NA
EXECUÇÃO TRABALHISTA
Ulisses de Miranda Taveira
Mestre e doutorando em função social do direito pela
Faculdade Autônoma de Direito, especialista em direito do trabalho
e juiz titular no Tribunal Regional do Trabalho da 23.ª Região.
E-mail: ulissestaveira@trt23.jus.br. Currículo Lattes:
http://lattes.cnpq.br/2869301110491191.
INTRODUÇÃO
O presente artigo tem por objetivo analisar requisitos do afastamento do
sigilo bancário na execução trabalhista à luz da Constituição Federal, da Lei
Complementar n. 105/2001 e da doutrina e da jurisprudência, demonstrando
as principais correntes doutrinárias e jurisprudenciais, para, ao final, propor
quais os requisitos para o afastamento do sigilo dos dados bancários na Justiça
do Trabalho.
O assunto é de suma importância por envolver os direitos fundamentais à
privacidade e à intimidade, previstos no artigo 5.º, X e XII, da Constituição Federal,
bem como a vedação à obtenção de provas ilícitas, no artigo 5.º, LVI, da Constitui-
ção, de modo que a discussão jurídica é pertinente a diversos ramos do direito.
Embora no âmbito do processo penal o afastamento do sigilo bancário seja
mais frequente em razão do bem jurídico tutelado, especialmente quando en-
volve investigações relacionadas a lavagem de dinheiro, tráfico de drogas e
corrupção,1 o tema vem ganhando relevância em outras searas, especialmente
na fase ou no processo de execução e no cumprimento de sentença, com a rea-
lização de pesquisas patrimoniais por meio das ferramentas eletrônicas Simba
(Sistema Informatizado de Movimentações Bancárias) e Sisbajud (Sistema de
Busca de Ativos do Poder Judiciário), no módulo de afastamento do sigilo ban-
cário, as quais facilitam a requisição judicial de dados bancários dos executados.
No âmbito das execuções trabalhistas, tais ferramentas são cada vez mais
utilizadas, até mesmo porque, historicamente, a Justiça do Trabalho é o mais
célere dos ramos do Poder Judiciário.2 E isso decorre do caráter alimentar pre-
2 Dados da Justiça em Números do CNJ comprovam tal afirmação. Nesse sentido, o último relatório
estatístico, de 2022, relativo ao ano de 2011, indica as seguintes taxas de congestionamento na execu-
ção: média nacional de 85%, Justiça Estadual de 86%, Justiça Eleitoral de 85%, Justiça Federal de 84%,
Justiça Militar Estadual de 96% e, finalmente, Justiça do Trabalho de 76%, conforme BRASIL. Justiça
em Números 2020: ano-base 2019. Brasília: CNJ, 2022. P. 169, fig. 112: Taxa de congestionamento
nas fases de execução e conhecimento, na 1.ª instância, por tribunal. Disponível em: https://www.
cnj.jus.br/wp-content/uploads/2022/09/justica-em-numeros-2022-1.pdf. Acesso em: 5 abr. 2023.
A EFETIVIDADE DA EXECUÇÃO TRABALHISTA 313
Não se pode esquecer, ainda, que o acesso à justiça, consagrado como ga-
rantia fundamental no artigo 5.º, XXXV, da Constituição Federal, abrange não
apenas o acesso ao Judiciário, mas também e principalmente, o acesso a um
procedimento justo que conduza a resultado prático e efetivo. 5
De acordo com a moderna teoria geral do processo, o direito material deve
influenciar a atuação dos que participam do processo, para assegurar a in-
tegridade da ordem jurídica, “sob pena de transformar aquela ciência num
desinteressante sistema de formalidades e prazos”.6
Para Maurício Godinho e Gabriela Delgado, “processo judicial sem eficiência,
celeridade e efetividade é veículo que não atende ao comando constitucional
8 André Gambier Campos analisou mais de 9.000 processos findos das décadas de 1990 e 2000 e
constatou que processos com execução forçada duravam à época 1.082,1 dias, em média, enquanto
os casos com pagamento voluntário duravam 307,9 dias. Vide CAMPOS, 2017.
9 BRASIL. CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. 2022, p. 169, fig. 112. Acesso em: 5 abr. 2023. Observan-
do-se os dados desde 2005, quando começou a ser editado o relatório, observa-se uma tendência
de evolução do congestionamento, inicialmente na casa dos 60% e, uma década e meia depois, por
volta dos 70% de congestionamento.
A EFETIVIDADE DA EXECUÇÃO TRABALHISTA 315
10 Nesse sentido, CHAVES, 2010. A reforçar esse argumento, verifica-se que na distribuição de
funções comissionadas nas Secretarias de Vara do Trabalho determinada pela Resolução 296/2021
do CSJT, não há sequer uma função comissionada destinada exclusivamente ao desempenho de
atividades vinculadas à execução, salvo a de calculista, que serve mais à liquidação do que propria-
mente à execução.
11 Para uma noção básica das ferramentas eletrônicas, por BEGALLES, 2023.
316 COLEÇÃO ESTUDOS ENAMAT
Por outro lado, existem os que (cf. TEIXEIRA, Eduardo Didonet; HAEBERLIN, Martin.
A proteção da privacidade: aplicação na quebra do sigilo bancário e fiscal, p.
91-92) sustentam uma fundamentação mais ampliada, sugerindo a existência de
três explicações para o reconhecimento do direito fundamental ao sigilo fiscal e
bancário na Constituição: “1) as operações bancárias e as informações do Fisco
sobre os contribuintes são armazenadas, atualmente, em bancos de dados (os
sigilos bancário e fiscal estariam, assim, abrangidos no sigilo de dados disposto no
art. 5.º, XII, da CF); 2) a garantia da inviolabilidade da intimidade e da vida privada
(art. 5.º, X, da CF) abriga, como princípios, o sigilo, sendo este derivado daqueles;
3) o sigilo bancário e o fiscal são imposições legais aos profissionais, respectiva-
mente, de bancos e da Fazenda Pública (como necessário à profissão, estes sigilos
estariam resguardados pelo art. 5.º, XIV, da CF)”.13
O que a Constituição pretende é, neste caso, ir além, para emprestar caráter sigi-
loso aos próprios dados comunicados, pelo particular, ao Estado ou às instituições
bancárias.
Contudo, o sigilo desses dados não é absoluto. Há, em primeiro, a exclusão da
tutela constitucional daqueles casos que envolvem verbas públicas. Em segundo
lugar, desde que com autorização judicial, e amparada em suficiente motivação,
a quebra do sigilo dos dados é sempre admissível.15
Uma primeira diretriz diz respeito ao caráter excepcional da restrição, que, a exem-
plo das demais intervenções em direitos fundamentais, deve ser justificável a partir
§ 4.º A quebra de sigilo poderá ser decretada, quando necessária para apuração
de ocorrência de qualquer ilícito, em qualquer fase do inquérito ou do processo
judicial, e especialmente nos seguintes crimes:
I – de terrorismo;
II – de tráfico ilícito de substâncias entorpecentes ou drogas afins;
III – de contrabando ou tráfico de armas, munições ou material destinado a sua
produção;
IV – de extorsão mediante sequestro;
V – contra o sistema financeiro nacional;
VI – contra a Administração Pública;
VII – contra a ordem tributária e a previdência social;
VIII – lavagem de dinheiro ou ocultação de bens, direitos e valores;
IX – praticado por organização criminosa.
Assim, a regra é o sigilo dos dados bancários, sendo possível o seu afasta-
mento apenas em casos específicos e quando absolutamente necessário, como,
por exemplo, nas hipóteses de ilícitos contra a ordem tributária, previdência
social, lavagem de dinheiro ou ocultação de bens, direitos e valores, conforme
previsão do artigo 1.º, §4.º, da Lei Complementar n. 105/2001.
Importante salientar que o rol dos incisos do § 4.º do artigo 1.º não é exausti-
vo, mas meramente exemplificativo, já que, de acordo com o referido parágrafo,
o afastamento do sigilo bancário poderá ser decretado, quando necessária para
apuração de ocorrência de qualquer ilícito, em qualquer fase do inquérito ou
do processo judicial, inclusive nas hipóteses elencadas no dispositivo. Dessa
forma, de acordo com a referida norma, o afastamento do sigilo bancário pode
se dar, também, na execução trabalhista.
Ocorre que, por se tratar de medida que relativiza direito fundamental do
executado, a quebra do sigilo bancário deve observar alguns parâmetros.
A propósito, destaca-se a importante decisão do STF no MS 25.812/DF sobre
a CPI dos bingos, fixando as seguintes premissas jurídicas para o afastamento
do sigilo bancário: a) motivação: decisão fundamentada; b) pertinência temática
com o que se investiga: o afastamento do sigilo bancário deve ter como foco
solucionar o processo e não outras finalidades escusas; c) necessidade abso-
luta da medida: deve-se mostrar que já foram utilizadas outras ferramentas de
investigação sem sucesso, de modo que o afastamento do sigilo bancário seja
essencial para a solução do processo; e d) limitação temporal da medida: não
pode ser irrestrita, deve delimitar o período abrangido pela decisão.
Referido entendimento vem sendo aplicado pelo STF em outros julgamentos,
exigindo, até mesmo em apurações criminais, “pertinência temática, a neces-
sidade da medida, que o resultado não possa advir de nenhum outro meio ou
fonte lícita de prova” e “existência de limitação temporal do objeto da medida,
enquanto predeterminação formal do período”, além de forte indício de ocor-
rência dos fatos investigados.17
Na Justiça do Trabalho, a Resolução 140 do CSJT regulamentou a Lei Com-
plementar n. 105/2001 que, no seu artigo 4ª, prevê:
quebra, devidamente fundamentada, com respaldo no art. 4.º, § 1.º, da Lei Com-
plementar n. 105/2001.
Parágrafo único. Uma vez determinado o afastamento de sigilo bancário, compete
ao magistrado, ou servidores autorizados, a inserção dos dados no sistema, con-
forme parâmetros fixados na ordem judicial, bem como a criação eletrônica do
caso na base de dados do CSJT.
Com base em tal dispositivo, muitos juízes do trabalho têm entendido que
o mero inadimplemento, somado à excessiva demora para a solução do pro-
cesso, são suficientes para justificar o afastamento do sigilo bancário, após
tentativa, ainda que não exauriente, das buscas patrimoniais, como se observa
no seguinte julgado:
[...] Após diversas e inócuas tentativas de busca de bens dos executados, por meio
de convênios como Bacenjud, Arisp, Renajud, Susep entre outros, pleiteou o exe-
quente consulta ao sistema Simba, com o intuito de perseguir as movimentações
financeiras dos devedores.
A pretensão foi indeferida sob o fundamento de que a quebra de sigilo bancário
é medida excepcional, e que “não há, nos presentes autos, indícios de fraude ou
ocultação de patrimônio por meio de operações irregulares para justificar a dili-
gência em questão [...]” – fls. 606/607.
Mostra-se necessária na presente hipótese a diligência pretendida, a fim de se
apurar eventual movimentação financeira fraudulenta por parte dos executados,
máxime se levado em conta o fato de que todas as diligências anteriores restaram
infrutíferas.
A inadimplência dos devedores, somada à excessiva demora para satisfação dos
créditos deferidos ao reclamante, que perdura por mais de vinte anos (fl. 106),
revela-se suficiente para o deferimento da consulta ao sistema Simba.
Provido o agravo de petição, com o fito de determinar a expedição de ofício ao
Simba – sistema de Investigação de Movimentações Bancárias, nos moldes plei-
teados pelo exequente.
(TRT-2 0229800-64.1995.5.02.0461, Relatora: Silvia Terezinha de Almeida Prado
Andreoni, 8.ª Turma, Data de publicação: 16/7/2020).18
informações dos veículos e de seus proprietários, além de permitir o bloqueio dos veículos e regis-
tro de penhora. ARISP (Associação dos Registradores Imobiliários de São Paulo) permite acesso às
matrículas imobiliárias por CPF e CNPJ, além da averbação das penhoras. CNIB – Central Nacional
de Indisponibilidade de Bens – é um sistema criado e regulamentado pelo Provimento n. 39/2014
da Corregedoria Nacional de Justiça para integrar todas as indisponibilidades de bens imóveis de-
cretadas por magistrados e por autoridades administrativas em território nacional.
A EFETIVIDADE DA EXECUÇÃO TRABALHISTA 323
Assim, temos que o afastamento do sigilo bancário somente deve ser de-
ferido na execução por decisão judicial que, diante das peculiaridades de cada
caso concreto, pondere a necessidade, a adequação e a proporcionalidade
estrita da medida.
Toda decisão judicial deve ser fundamentada, conforme artigos 93, IX,
da Constituição Federal e 11 do CPC, princípio reproduzido pela Resolução
140/2016 do CSJT, ao determinar que “o magistrado deverá expedir ordem
judicial determinando a quebra, devidamente fundamentada, com respaldo
no art. 4.º, § 1.º, da Lei Complementar n. 105/2001.
Assim, exige-se não apenas que a decisão judicial seja devidamente funda-
mentada, mas que se faça o enquadramento numa das hipóteses do artigo 1.º, §
4.º, da Lei Complementar n. 105/2001 e que pondere, diante das peculiaridades
de cada caso concreto, a necessidade, adequação e proporcionalidade estrita
da medida.
22 Art. 797. Ressalvado o caso de insolvência do devedor, em que tem lugar o concurso universal,
realiza-se a execução no interesse do exequente que adquire, pela penhora, o direito de preferência
sobre os bens penhorados. Parágrafo único. Recaindo mais de uma penhora sobre o mesmo bem,
cada exequente conservará o seu título de preferência.
A EFETIVIDADE DA EXECUÇÃO TRABALHISTA 327
CONCLUSÃO
O caráter alimentar das verbas trabalhistas e a proteção constitucional dos
direitos dos trabalhadores, fundada no princípio da dignidade, impõem uma
série de medidas para a desmercantilização da mão de obra, entre as quais se
destaca todo o sistema de justiça de proteção dos direitos dos trabalhadores,
em especial a jurisdição trabalhista. Ocorre que o serviço público jurisdicional
trabalhista somente se revela plenamente eficaz quando a satisfação dos cré-
ditos reconhecidos nas sentenças proferidas pela Justiça do Trabalho é efeti-
vamente cumprida.
Portanto, é plenamente legítima a adoção, em determinados casos, de
medidas processuais mais incisivas com o fim de concretizar a efetividade da
prestação jurisdicional trabalhista.
Para tanto, têm surgido novas ferramentas de pesquisa patrimonial dos
executados, até mesmo para tentar acompanhar as formas de blindagem e
ocultação patrimonial, surgindo a discussão quanto à possibilidade de afasta-
mento do sigilo bancário.
O afastamento do sigilo bancário possibilita o acesso pelo magistrado e
pela parte contrária de dados financeiros dos executados, capazes de revelar
a rotina e outras informações afetas à intimidade e à privacidade de modo que
a utilização de tal instrumento processual de busca patrimonial deve ser usado
com parcimônia, apenas em determinados casos.
Isso porque o acesso aos dados bancários sigilosos pode escancarar si-
tuações privadas, que vão desde hábitos sociais e de consumo pelos gastos
financeiros, até locais frequentados ou eventuais relações extraconjugais, opi-
niões políticas ou preferências partidárias. Assim, a tutela constitucional do
sigilo bancário vai muito além da discussão sobre o “ter” do titular dos dados,
afetando a esfera do “ser”.23
O sigilo de dados, incluindo os dados bancários, é direito fundamental pre-
visto no artigo 5.º, X, XII e LVI, como forma de proteção à privacidade.
Entretanto, como todo direito fundamental, o sigilo bancário não é absoluto
e não pode ser utilizado como escudo para encobrir ilícitos. Seguindo esta lógi-
ca, a Lei Complementar n. 105/2001 estabelece algumas hipóteses excepcionais
em que ele pode ser afastado judicialmente, admitindo sua adoção, inclusive,
na execução trabalhista, conforme regulamentado pela Resolução 140 do CSJT.
Soma-se a isso que o STF fixou que o afastamento do sigilo bancário pres-
supõe os seguintes requisitos: motivação: decisão fundamentada; pertinência
temática com o que se investiga; necessidade absoluta da medida, mostran-
do-se que já foram utilizadas outras ferramentas de investigação sem sucesso,
de modo que o afastamento do sigilo bancário seja essencial para a solução do
processo; limitação temporal da medida: não pode ser irrestrita, deve delimitar
o período abrangido pela decisão.
Assim, com base na Lei Complementar n. 105/2001, artigo 1.º, § 4.º, no artigo
4.º da Resolução n. 140 do CSJT, bem como nos parâmetros fixados pelo STF,
podemos concluir que o afastamento do sigilo bancário é medida extremamen-
te relevante em determinados casos específicos para a efetivação da prestação
jurisdicional trabalhista. Contudo, deve observar os seguintes requisitos de
validade: decisão judicial fundamentada, o prévio esgotamento da busca pa-
trimonial, forte indício de ocultação patrimonial, limitação temporal e subjetiva
da medida e proporcionalidade da medida.
Quanto aos principais motivos de indeferimento dos pedidos de afastamen-
to do sigilo bancário, pode-se afirmar que decorrem de pedidos inoportunos,
genéricos ou sem fundamentação específica, bem como por ser a medida des-
proporcional, inadequada ou desnecessária, ou ainda por ausência de indícios
de ocultação de bens, dinheiro ou valores, de fraude ou simulação.
Com o presente artigo, espera-se contribuir para o debate acerca do afasta-
mento do sigilo bancário, seus requisitos e aspectos processuais e procedimen-
tais de sua operacionalização, tudo com enfoque na efetividade da execução
trabalhista.
REFERÊNCIAS
ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS MAGISTRADOS DA JUSTIÇA DO TRABALHO. Teses Aprova-
das no 20.º CONAMAT. Disponível em: https://www.anamatra.org.br/conamat/20-edicao.
Acesso em: 5 abr. 2023.
BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Direito e processo: influência do direito material
sobre o processo. 5. ed. rev. e ampl. São Pulo: Malheiros, 2009.
BEGALLES, Carlos Alberto. Curso de execução trabalhista. São Paulo: Ltr, 2020.
A EFETIVIDADE DA EXECUÇÃO TRABALHISTA 331
SARLET, Ingo Wolfgang; MARINONI Luiz Guilherme; e MITIDIERO, Daniel. Curso de direito
constitucional. 7. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2018.
STF – AgR AC: 3872 DF – Distrito Federal 0002325-34.2015.1.00.0000, relator: min. Teori
ZavasckI, data de julgamento: 22/10/2015, Tribunal Pleno, DJe-228 13/11/2015.
TAVARES, André Ramos. Curso de direito constitucional. 15. ed. rev. e atual. São Paulo:
Saraiva, 2017.
1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS
A Justiça do Trabalho é considerada, entre todos os segmentos de justiça,
o ramo do Poder Judiciário mais célere, em razão do tempo médio de duração
do processo ser extremamente mais rápido do que qualquer outro, o que se
revela nos dados do Justiça em Números, publicados anualmente pelo Conselho
Nacional de Justiça (CNJ).
Em que pese essa assertiva também ser verdadeira na fase da execução, o
fato é que a taxa de congestionamento dessa fase é extremamente elevada.
Dados extraídos do Justiça em Números 202124 apontam para uma taxa de
congestionamento na fase de execução na Justiça do Trabalho de 76%, em
detrimento dos outros segmentos de justiça, com 83% para a Justiça Federal,
84% para a Justiça Estadual e 83% para a Justiça Eleitoral.
Nesse contexto de aumentar a efetividade da execução trabalhista, algumas
medidas de política judiciária vêm sendo tomadas ao longo dos anos, entre elas,
a criação dos Núcleos de Pesquisa Patrimonial no âmbito dos TRTs.
Sob essa perspectiva, o escopo do presente artigo é permitir uma reflexão
dessa importante ferramenta na garantia da entrega da prestação jurisdicional,
a partir da experiência do TRT da 21.ª Região.
Um princípio que vem ganhando muito espaço na agenda das políticas ju-
diciárias nacionais é o princípio da cooperação judicial. Normatizado por meio
dos art. 6.º e 67 e ss. do Código de Processo Civil.
Uma estratégia que vem se tornando cada vez mais comum não apenas na
execução trabalhista, mas também em todos os segmentos de justiça é a oculta-
ção patrimonial por meio de mecanismos jurídico-contábeis que “escondem” o
patrimônio do devedor, comumente conhecido como “blindagem patrimonial”.
Essas medidas vão desde a criação de holding familiar até a antecipação de
herança, divórcio simulado ou até mesmo pedidos de recuperação judicial com
intenção de desviar a competência da execução trabalhista.
A consequência processual nesses casos recai em fraude a credores ou à
execução, conforme o caso, mas o que preocupa realmente é o nível de or-
ganização e profissionalização desses agentes que vêm conseguindo ocultar
o patrimônio de forma cada vez mais sofisticada, o que vem trazendo sérios
prejuízos à efetividade da execução trabalhista.
Na esteira desse cenário, a Justiça do Trabalho começou a fomentar a cria-
ção de núcleos especializados em pesquisa patrimonial avançada com o ob-
jetivo de especializar e capacitar os servidores e magistrados trabalhistas no
conhecimento dos instrumentos e técnicas que permitem elucidar as fraudes
perpetradas pelos agentes que buscam a blindagem patrimonial.
A normatização para criação dos Núcleos de Pesquisa Patrimonial no âmbito
dos TRTs pelo Conselho Superior da Justiça do Trabalho (CSJT) foi grande avanço
na profissionalização do nosso quadro funcional.
338 COLEÇÃO ESTUDOS ENAMAT
Art. 9.º Os Juízes designados contarão com espaço físico e instalações apropriadas
para o desenvolvimento das funções atribuídas ao Núcleo de Pesquisa Patrimonial.
(Redação dada pela Resolução CSJT n. 193, de 30 de junho de 2017)
342 COLEÇÃO ESTUDOS ENAMAT
Art. 150. São atribuições do juízo centralizador de execução do PRE: (Redação dada
pelo Provimento n. 1/CGJT, de 19 de agosto de 2022)
II – promover, de ofício, a identificação dos grandes devedores e, se for o caso, dos
respectivos grupos econômicos, no âmbito do Tribunal Regional, cujas execuções
poderão ser reunidas para processamento conjunto por meio da instauração do
REEF, utilizando -se de todas as ferramentas eletrônicas de investigação patrimo-
nial disponíveis por meio de processo piloto indicado pelo juízo centralizador de
execução; (Redação dada pelo Provimento n. 1/CGJT, de 19 de agosto de 2022).
Esses recursos de livre acesso e livres de sigilo, acessíveis por sistemas pú-
blicos ou privados, podem ser utilizados pelas próprias partes em rede aberta
de computadores, mas também podem ser muito úteis ao próprio Judiciário. É
possível consultar por fontes abertas informações oficiais da Receita Federal,41
das Secretarias Estaduais de Tributação42 e de Cartórios,43 por exemplo.
§ 3.º Cada Núcleo deverá elaborar manual, atualizado com a mesma frequência,
com o registro das técnicas de uso dos sistemas de pesquisas, dos bancos de
dados, de coleta, de análise, de checagem, e de emprego dos dados obtidos nas
pesquisas, agilizando o acesso à informação preexistente. (Redação dada pela
Resolução CSJT n. 193, de 30 de junho de 2017)
Arrematando a lógica do papel formativo dos NPPs, o § 4.º do art. 6.º ex-
pressamente determina que todo o material produzido será de pleno acesso
aos órgãos judicantes:
§4.º Todo o material produzido pelo núcleo, inclusive o manual com as técnicas
de pesquisa patrimonial, será de pleno acesso aos órgãos judicantes do Tribunal,
preferencialmente pela intranet, para que todos os magistrados e servidores pos-
sam se utilizar desse conhecimento para maior efetividade da fase de execução.
(Incluído pela Resolução CSJT n. 193, de 30 de junho de 2017)
Veja-se que se exige repetidamente que as atividades dos NPPs sejam re-
gistradas e compartilhadas, seja por meio de estudos, relatórios ou manuais.
Se por um lado, disseminar o conhecimento é indispensável para a própria
manutenção dos NPPs, pois se trata da materialização da efetividade de sua
atuação, por outro lado, pode-se afirmar que a propagação da aprendizagem
visa a estimular a prática da pesquisa patrimonial e do uso das ferramentas
eletrônicas de forma adequada e estratégica nas unidades jurisdicionais, como
352 COLEÇÃO ESTUDOS ENAMAT
46 “Já o visual law é a parte do legal design que utiliza técnicas visuais e de linguagem para facilitar
a comunicação nos documentos jurídicos.” Conjur. Visual law e legal design provocam revolução no
Poder Judiciário. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2022-jan-03/darci-visual-law-legal-de-
sign-provocam-revolucao-judiciario. Acesso em: 9 abr. 2023.
A EFETIVIDADE DA EXECUÇÃO TRABALHISTA 353
REFERÊNCIAS
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CASELLI, Guilherme. Manual de investigação digital. 3. ed. São Paulo: JusPodivm, 2023.
DARCI, Marconi. Visual law e legal design provocam revolução no Poder Judiciário.
Disponível em: https://www.conjur.com.br/2022-jan-03/darci-visual-law-legal-design-
-provocam-revolucao-judiciario. Acesso em: 9 abr. 2023.
MELLO, Celso Antonio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 8. ed. São Paulo:
Malheiros, 1997.
HASTA PÚBLICA E
ALIENAÇÃO POR
PARTICULAR NO
PROCESSO DO
TRABALHO:
REFLEXÕES
Homero Batista Mateus da Silva
Doutor em direito do trabalho pela Universidade de São Paulo.
Desembargador do Tribunal Regional do Trabalho da 2.ª Região.
Coordenador do grupo de pesquisa Observatório Nacional dos Incidentes
de Resolução de Demandas Repetitivas Trabalhistas, da Faculdade de
Direito da Universidade de São Paulo. E-mail: homero.mateus@trt2.
jus.br. Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/8519311092627990.
358 COLEÇÃO ESTUDOS ENAMAT
1 DESAMBIGUAÇÕES
Evita-se usar o verbo vender, para representar a alienação forçada do patri-
mônio do executado, por não se tratar de contrato de compra e venda. Nada
há a ser considerado quanto ao Código de Defesa do Consumidor, nem sucede
negociação quanto ao preço. No entanto, é muito comum se dizer que o bem foi
vendido em leilão. Aliás, o próprio art. 888 da CLT refere a expressão venda do
bem, dificultando a formação conceitual das etapas denominadas praça e leilão.
Na dúvida, preferimos a expressão hasta pública ou simplesmente alienação
judicial, porque mais abrangentes e precisas.48
No processo do trabalho, podemos afirmar que praça nada mais é do que o
ato cronologicamente anterior ao leilão, com a consequência de que, na praça,
os lances devem ser manifestados com base no valor da avaliação, ao passo
que no leilão os lances passam a ser livres.
Trata-se de uma combinação de diferença cronológica e estratégica.
No processo civil de 1973, a praça normalmente era associada à alienação de
imóveis, ao passo que o leilão dizia respeito à expropriação de móveis e demais
bens, ou seja, a diferença conceitual entre as duas formas de hasta pública era
o conteúdo dos bens penhorados e não na cronologia dos fatos.
Outra distinção repousava no local da realização, porque a praça tinha lugar
no átrio do edifício do Fórum, enquanto o leilão podia ocorrer onde estivessem
os bens, ou no lugar designado pelo juiz.
E, ademais, conquanto não houvesse lance mínimo para o leilão, havia um
patamar mínimo de 80% do valor da avaliação para fins do lance em praça.
O processo civil de 2015 inclinou-se à perda de interesse nesta dicotomia,
passando-se a empregar unicamente a palavra leilão para designar a alienação
judicial, mas o processo do trabalho persevera na distinção entre as duas etapas
da hasta pública, com o critério cronológico acima referido.
Além de encarar o leilão como gênero, o processo civil reputa-o como a
última via de satisfação do crédito e o admite sob diversas modalidades.
A via eletrônica, por exemplo, prescinde da concordância do exequente,
pois passou a ser a regra, esvaziando a realização de duas hastas consecutivas
e a discussão sobre preço vil, porque as regras e os parâmetros seguem aquilo
que houver constado da publicação para essa modalidade.
48 PINTO, 2006.
A EFETIVIDADE DA EXECUÇÃO TRABALHISTA 359
unificados para deixar bem claro que está sendo realizado o segundo ato pro-
cessual da hasta pública, apenas, partindo-se da premissa de que a praça será
negativa e que, minutos depois, o leilão será efetuado com ampla liberdade
de oferta de lances.
Ao contrário da legislação civil,50 o processo do trabalho conta com o Oficial de
Justiça Avaliador, que promove a citação, a penhora e, também, a avaliação do bem.
Remanesce a possibilidade de nomear um avaliador particular apenas em
caso de alta indagação, quando a avaliação do bem se mostre muito complexa
e inacessível aos conhecimentos do cotidiano.
Encerrada a avaliação, há necessidade do vencimento de alguns prazos
processuais.
8 SINGULARIDADES DA ADJUDICAÇÃO
Usa-se a palavra adjudicação para representar a arrematação feita por parte
do próprio credor,57 achando-se ambas as modalidades dentro da categoria
dos atos de expropriação.
No particular, o credor fica com a propriedade do bem em troca da satisfa-
ção de sua dívida.
A natureza jurídica dessa aquisição judicial é idêntica àquela da arrematação.
O sistema concebido pelo Código de Processo Civil segue uma ordem cro-
nológica rígida: primeiro, tem preferência o credor caso queira adjudicar, antes
mesmo da publicação de editais e sem necessidade de marcação da hasta
pública; depois, tem preferência a alienação por iniciativa particular; somente
então, se não houve sucesso nessas tentativas, consideradas mais eficazes e
menos onerosas, passa-se para o ritual conhecido do edital e da hasta.
Portanto, embora não haja um prazo fatal, a adjudicação deve ser reque-
rida em juízo tão logo os bens já estejam aptos à alienação (além da penhora
consumada, espera-se que já exista a dupla definitividade da decisão, sobre a
qual se falou acima), sempre antes da expedição dos editais de praça e leilão.
No processo do trabalho, todavia, a adjudicação pode ser requerida ainda
um pouco mais tarde, admitindo-se o requerimento do exequente depois da
praça e antes do leilão.
Indaga-se, ainda, se o credor pode retardar ainda mais seu pedido de adju-
dicação, deixando-o para depois do leilão. O reclamante deixa passar todas as
etapas posteriores à penhora, a fim de manifestar interesse na adjudicação so-
mente depois de consumado o leilão. A conduta protela o desfecho do processo,
em seu próprio desfavor, e alimenta hipótese de insegurança jurídica, naqueles
casos em que houve lances no praceamento e, quando a arrematação ia ser con-
cluída, o exequente manifesta interesse em ficar com os bens em troca da vida.
No processo do trabalho, à falta de regramento específico sobre a cronologia
da adjudicação, há vários esforços dos reclamantes para a aquisição de bens
por valores bem abaixo aos da avaliação, possivelmente com o propósito de
tirarem vantagem dentro da adversidade.
A técnica é bastante simples: deixa-se a apresentação do pedido de adju-
dicação para a última hora, quando já colhidos os lances, e, então, saca-se do
requerimento afirmando que aceitam bem pelo mesmo valor do maior lance
pedido deve ser feito antes mesmo de elaborado o edital. Por sua vez, o credor
com garantia real (como o credor hipotecário) também foi contemplado com o
direito de requerer a adjudicação, mas, nesse particular, surge a incompatibili-
dade com o Processo do Trabalho: de um lado, a Justiça do Trabalho não terá
competência para dirimir a controvérsia entre o credor e o devedor hipotecário,
nem mesmo para analisar prazos e garantias; de outro lado, o crédito trabalhis-
ta tem prioridade sobre o crédito hipotecário. Essa tese se fundamenta, entre
outros argumentos, na prioridade que a Lei de Falência e o Código Tributário
Nacional conceberam para o crédito trabalhista.
Por ilação do conteúdo dessas leis e pela natureza essencialmente alimentar,
o crédito trabalhista não toleraria que o credor hipotecário comparecesse em
juízo, adjudicasse o bem e partisse.
Caso haja arrematação por valor superior ao crédito, defende-se que, depois
de pago o trabalhador, o que exceder não será devolvido para o executado,
mas entregue ao credor hipotecário, como uma antecipação daquilo que terá
de executar em juízo próprio.
Remição vem do verbo remir, que significa quitar, solver. Remissão vem do
verbo remitir, que representa perdoar, desconsiderar.59
Logo, o devedor pode remir a execução, depositando o valor pendente,
enquanto o credor por remitir a dívida, perdoa-a. O comportamento do credor,
de perdoar a dívida, é assunto particular, de tal forma que o legislador não
dedica muita energia ao assunto. A principal preocupação é não permitir que
o perdão da dívida objetive prejudicar terceiros (arts. 385 a 388 do CC/2002). 60
Já a remição é um ato essencialmente processual, impondo-se que o Direito
Processual discipline a matéria.61
A dúvida mais incisiva, porém, não é separar quitação de perdão, mas saber
se o devedor pode escolher este ou aquele bem, a fim de remir apenas uma
unidade penhorada, ou se deveria ser forçado a remir todo o processo, caso
queira salvar alguma penhora.
Há entendimentos no sentido de que a autorização, para que o devedor
escolha os bens que queira salvar, proporciona situação muito confortável,
que só faz procrastinar o feito.
te, tão logo o Oficial de Justiça conclua o trabalho de penhora e avaliação, sem
que se aguardem os prazos dos Embargos à Execução, a prolação da sentença
e o julgamento do Agravo de Petição, por se considerar que os meses ou anos
de escoamento dessas figuras já seriam graves o suficiente para aniquilar o
REFERÊNCIAS
ARAÚJO, Thiago Cássio d’Ávila. Arrematação na recuperação judicial: sucessão trabalhista.
Jornal Trabalhista Consulex, Brasília, ano 29, n. 1409, p. 10-11, 16 jan. 2012.
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PINTO, José Augusto Rodrigues. Execução trabalhista: estática, dinâmica, prática. 11.
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em processos de apuração de atos de improbidade administrativa: uma abordagem a
partir do dever fundamental de colaboração com a justiça. Revista de Processo, v. 267,
p. 431-456, maio 2017.
INTRODUÇÃO
A discussão acerca da efetividade da execução, em regra, relega a um plano
de pouquíssima importância a questão relacionada aos meios de defesa do exe-
cutado. O senso comum acaba por conceber que os instrumentos processuais
de resistência na fase executiva concretizam exatamente o oposto da efetivi-
dade da execução, na medida em que retardam o cumprimento da obrigação
reconhecida no título, seja ele judicial ou extrajudicial.
Na realidade, a dogmática trabalhista não foi capaz de construir um arcabou-
ço jurídico suficientemente robusto para assegurar, de fora clara e inequívoca,
os limites e as espécies de meios de defesa do devedor. Nesse ponto, enfren-
ta-se uma situação verdadeiramente paradoxal, na medida que a natural resis-
tência em se reconhecerem os meios executivos gera um sistema processual
confuso e propenso a criação de incidentes de difícil e demorada solução. Ao
se restringir e mitigar o exercício do direito de defesa do executado, o sistema
processual trabalhista acaba por retardar o cumprimento da obrigação reco-
nhecida no plano jurídico.
A demonstração empírica dessa situação pode ser feita mediante o uso
enviesado do mandado de segurança como remédio processual extraordinário
para a defesa executiva. Esse uso excessivo do mandado de segurança é um
traço característico próprio da execução trabalhista,70 que acaba sendo justi-
ficado diante das graves incertezas quanto ao manejo dos meios defensivos
adequados. Nessa perspectiva, a falsa ideia de restrição dos meios de defesa
como forma de tornar a execução trabalhista mais efetiva, acaba por apresentar
uma resposta oposta, no sentido de permitir, em muitas situações, a eternização
do processo executivo.
A análise da jurisprudência do TST, em matéria de execução, é capaz de
ilustrar bem o referido paradoxo. Tratando-se de tribunal de jurisdição extra-
ordinária, o TST disporia de poucas oportunidades para construir um conjunto
de precedentes acerca da tutela executiva, pois as hipóteses de cabimento do
70 A execução cível apresenta um sistema de meios de defesa do executado bem mais claro e sis-
tematizado do que o trabalhista. No Código de Processo Civil, estão delimitados os meios de defesa
do devedor no cumprimento da sentença (CPC, art. 525-527) e segs.); na execução contra a Fazenda
Pública (CPC, art. 535); na execução fundada em título extrajudicial (CPC, arts, 914-920); bem como
dos terceiros incluídos na relação executiva (CPC, arts. 674-681). Além do mais, a execução cível, tal
como acontece na fase de cognição, ostenta a possibilidade de manejo do agravo de instrumento
em face das decisões interlocutórias.
A EFETIVIDADE DA EXECUÇÃO TRABALHISTA 381
72 O artigo 884 da Consolidação, entre outras impropriedades: a) denomina o meio de defesa como
embargos à penhora (parágrafo terceiro), como se a defesa da execução fosse limitada aos atos de
constrição; b) trata de uma sentença de liquidação, que na realidade é uma decisão de natureza
interlocutória (parágrafo terceiro); c) estatui uma espécie de impugnação ao devedor, sem divisá-la
da impugnação reconhecida pela CLT, art. 879, § 2.º (caput); d) iguala garantia do juízo e penhora
enquanto categorias similares (caput e parágrafo sexto). Essa incongruência gera inúmeras dúvidas
quanto aos meios de defesa cabíveis e estimula o manejo enviesado do mandado de segurança na
execução.
A EFETIVIDADE DA EXECUÇÃO TRABALHISTA 383
73 Nesse aspecto, merece destaque a lição de Marcelo Rodrigues Abelha (2007. p. 114): “Não obstante
o papel realizador da tutela executiva, engana-se que imagina que no módulo processual executivo
existe uma diminuição do devido processo legal, senão porque o fenômeno é exatamente o inver-
so. É justamente numa tutela executiva que o devido processo legal (fator legitimante da atividade
estatal e fator de libertação do cidadão) ganha maior e mais importante relevo, justamente em
razão da sensibilidade que a situação jurídica requer. Resta claro, por conseguinte, que a efetividade
jurisdicional, mesmo no plano da tutela executiva, não prescinde a fiel observância das diretrizes
do due process of law.”
384 COLEÇÃO ESTUDOS ENAMAT
75 Como bem asseverava Enrico Tullio Liebman: “Tal não importa em dizer que o processo de
execução constitua o prosseguimento do de cognição, ou que este seja simplesmente a reparação
daquele. Correspondem, em realidade, a dois processos distintos e representam figuras autôno-
mas de proteção jurídica, porquanto contam-se, de um lado, sentenças que não têm necessidade
de serem executadas para se obter a atuação do direito, e que não têm, por conseguinte, eficácia
executória, ao passo que, em sentido contrário, numerosos atos existem, distintos da sentença,
386 COLEÇÃO ESTUDOS ENAMAT
à que tal eficácia se atribui.” (In: Embargos do executado – oposição de mérito no processo de
execução. Campinas: Bookseller, 2003. p. 137).
77 Para uma visão panorâmica e resumida das características da ação executiva lato sensu, construída
no âmbito de seu clássico “Tratado das ações”, ver Miranda (1995, p. 104-118).
79 “Dela se destaca, em virtude da oposição, nova relação processual autônoma, seja por apresentar
pressupostos próprios distintos dos da relação executória, seja por ter natureza diversa, pelo fato
de constituir uma relação processual de cognição, do qual se origina, para as partes, a expectativa,
e para o órgão judiciário, o poder e a obrigação de proferir uma decisão.” (LIEBMAN, 1985, p. 293).
80 A diferença substancial entre o regramento dos embargos do devedor do CPC de 1939 e o atual
(antes da edição da Lei n. 11.232/2005) residia a uniformização do tratamento dos remédios para
as execuções fundadas em títulos judiciais e extrajudiciais feita pelo Código revogado.
388 COLEÇÃO ESTUDOS ENAMAT
cas hermenêuticas, seja no particular ou no geral. Seria insensato supor, p. ex., que ao embargante
fosse defeso alegar a inexigibilidade do título, a ilegitimidade da parte, a incompetência do juízo,
o impedimento ou a suspeição do juiz, o excesso de execução e o mais, como se esses fatos não
existissem no mundo jurídico.”
83 Desde o início de vigência da Consolidação, o art. 844 sofreu quatro mudanças legislativas: a) a
inclusão dos parágrafos terceiro e quarto pela Lei n. 2.244, de 23/6/1954; b) a modificação da redação
do parágrafo quarto pela Lei 10.035, de 25/10/2000; c) a inclusão do parágrafo quinto por intermédio
da Medida Provisória n. 2.180-35, de 24/8/2001; d) a inclusão do parágrafo sexto pela Lei n. 13.467,
de 13/7/2017 (Reforma Trabalhista). Além poucas e esparsas, as alterações contemplaram revisões
cosméticas e de pouco alcance sistêmico.
390 COLEÇÃO ESTUDOS ENAMAT
84 Conforme assevera Araken de Assis (2006, p. 36): “Perante conceitos jurídicos indeterminados,
na verdade, a atividade do juiz não se afigura discricionária no sentido exato e preciso do termo,
mas vinculada à única resolução correta que lhe cabe tomar em razão do seu ofício: ou bem se
verificam os elementos de incidência, hipótese em que suspenderá a execução; ou não se verificam
tais elementos, caso em que a lei proíbe suspender a marcha da execução.”
392 COLEÇÃO ESTUDOS ENAMAT
85 Ressalte-se que, mesmo antes das profundas alterações na execução cível, promovidas pela Lei
n. 11.232/2005 e 11.382/2006, a doutrina apresentava ponderações relevantes acerca dos problemas
relacionados à garantia do juízo como pressuposto para conhecimento dos embargos à execução.
Nesse sentido, asseverava José Miguel Garcia Medina (2006): “Estes fenômenos – abstração do título
executivo, necessidade de “segurança do juízo” e efeito suspensivo dos embargos –, no entanto,
geram situações insatisfatórias, tanto para o exequente quanto para o executado. Isso porque a
valoração dos bens jurídicos em jogo já foi feita, de modo abstrato, pelo legislador, que criou uma
estrutura fechada que não admite que a ponderação de bens seja realizada de acordo com as
necessidades reais da causa.” Ora, na visão do autor havia um paradoxo incontornável na relação
394 COLEÇÃO ESTUDOS ENAMAT
nhecimento dos embargos no âmbito do direito processual civil (CPC, art. 525,
caput e 914, caput).86
A partir de uma visão instrumental da tutela executiva, na qual sejam pre-
servados os fundamentos do devido processo legal, não se pode estabelecer
regra rígida e inflexível para a chamada garantia do juízo. A falta integralização
do montante da execução não pode significar o não conhecimento automático
dos embargos, mormente quando são discutidas questões fundamentais do
processo executivo. Aguardar, por outro lado, a complementação da segurança
pode implicar o retardamento injustificado da execução, principalmente quan-
do questões relevantes podem, de logo, obter pronunciamento definitivo do
Poder Judiciário.
A promulgação da Lei n. 13.467, de 13/7/2017, não procedeu a nenhum aper-
feiçoamento em relação ao tema da garantia do juízo. Ao invés de consagrar a
relativização da garantia do juízo, optou por incluir regra confusa e desprovida
de técnica legislativa. Nesses termos, o art. 884, § 6.º, passou a dispensar a
garantia do juízo e a penhora no caso dos embargos manejados por entidades
de filantropia, bem como de seus dirigentes. A infeliz redação conferida ao
mencionado dispositivo legal em nada esclarece ou aperfeiçoa o sistema de
defesa dos devedores trabalhistas.
Inicialmente, é imperioso esclarecer a amplitude da dispensa implementada
pela norma. Por óbvio, devemos concluir que a norma se refere especificamente
ao pressuposto dos embargos, que não será exigido para as entidades descritas
no dispositivo. Obviamente, não existem limitações para a penhora de bens ou
de dinheiro de qualquer devedor privado, mesmo que dotado de funções de
filantropia. O alcance do texto legal restringe-se a eximir o devedor, enquadrado
86 Nesse particular é a percuciente advertência feita por Marcelo Abelha (2008, p. 555): “Para aqueles
que sustentam, com base na literalidade do dispositivo (art. 475-J,§ 1.º, e 736), a diferença do regime
da segurança do juízo em relação aos meios de oposição do executado, a justificativa só poderia
residir no fato de que o legislador teria reconhecido que o portador do título executivo judicial mere-
ceria uma situação diferenciada de vantagem, em razão do fato de que teria passado por uma prévia
cognição judicial, e, por isso mesmo, a execução não poderia ser impugnada, salvo se seguro o juízo.
[...] A diferença em si não tem um significado prático muito diferente para o exequente, porque, em
ambos os casos – execuções sincréticas ou autônomas –, nenhum dos meios de oposição típicos
(impugnação e embargos) é dotado de efeito suspensivo.”
A EFETIVIDADE DA EXECUÇÃO TRABALHISTA 395
88 Não se pode deixar de mencionar, por outro lado, que a doutrina não é uníssona nessa pers-
pectiva. Ovídio Baptista (2000, p. 64), por exemplo, é expresso no sentido de não reconhecer essa
característica típica da tutela de execução, quando afirma: “A suposição de que a ação executiva
seja diferente das demandas do processo de conhecimento, por fundar-se, invariavelmente, num
título, é sem dúvida falsa. Existem mesmo no processo de conhecimento demandas que exigem,
para serem admitidas, que o autor exiba, com a petição inicial, um documento escrito, ou um título
que lhe sirva de fundamento.” Essas particularidades de algumas ações de conhecimento, não são
capazes de subtrair o aspecto mais relevante da tutela executiva consistente na determinação prévia
e concreta da legitimação em relação ao devedor reconhecido no título. Aliás, essa é a posição explí-
cita de Araken de Assis (2007, p. 382): “Em relação à demanda executória, outra questão atrapalha a
clareza do conceito de parte legítima. O título executivo virtualmente identifica os legitimados, ou,
no mínimo, sinaliza a chave de uma resposta hábil a quesito deste teor.” Ora, deflui-se da análise
das citações conflitantes que não há como reconhecer a identidade conceitual da legitimação no
âmbito da tutela executiva com aquele fixada para a tutela de conhecimento.
A EFETIVIDADE DA EXECUÇÃO TRABALHISTA 397
dessa tarefa a legislação processual trabalhista, ainda afogada em sua visão mi-
nimalista da regulação executiva. Diante do laconismo da legislação, a doutrina
passou a adotar critérios de classificação da legitimidade na execução, levando
em consideração dois referenciais: a previsão explícita da parte no título execu-
tivo e a pertinência dos sujeitos processuais em face da obrigação reconhecida.
Assim sendo, a legitimidade na tutela de execução é vivenciada em relação
ao credor e ao devedor, o que demandaria a sua classificação em ativa e passi-
va. No que concerne a cada uma das espécies, poderíamos classificá-las como
originária e superveniente, levando em consideração a existência das partes
no momento de produção do título executivo. Finalmente, a legitimidade pode
ser mensurada a partir da identificação da ligação das partes em face da re-
lação obrigação reconhecida no título executivo, podendo ser classificada em
ordinária ou extraordinária.90
O tema mais relevante e, ao mesmo tempo, mais inóspito em matéria de
legitimidade da execução reside na delimitação das hipóteses de legitimação
passiva extraordinária. Há situações processuais capazes de determinar a in-
clusão de novos sujeitos passivos na relação processual executiva, mesmo não
tendo integrado o título executivo ou participado formalmente da relação de
direito material.
A doutrina laboral não usa costumeiramente a classificação da legitimidade
extraordinária no âmbito da execução. Essa omissão, na nossa ótica, acaba por
criar uma série de problemas metodológicos na apreciação dos procedimentos
de inserção a posteriori de devedores nas execuções trabalhistas. É preciso com-
preender que, muito embora a responsabilidade pela execução não se limite
aos atores descritos no título executivo, a integração excepcional de responsá-
vel é um procedimento complexo dotado de inúmeras repercussões práticas.
É induvidoso o fato de que a legislação processual civil não se reporta à
legitimação extraordinária, mas sim à responsabilidade (CPC, art. 790). Essa
omissão, por outro lado, não retira do intérprete a possibilidade de realizar
uma construção dogmática mais clara acerca desse procedimento. A falta de
91 Não é demais lembrar que, no caso da terceirização, o TST nega peremptoriamente a possibili-
dade de responsabilização do devedor subsidiário, quando ele não integra primariamente o título
executivo, nos termos da Súmula 331, IV.
400 COLEÇÃO ESTUDOS ENAMAT
de legitimação passiva extraordinária (CPC, art. 790, II). Observe-se que a con-
denação é endereçada à pessoa jurídica e o sócio não tem sua personalidade
confundida com a da pessoa moral. O surgimento desse novo devedor pres-
supõe uma operação posterior à formação do título, capaz de responsabilizar
um novo sujeito passivo não titular de relação jurídica preliminar.
Observe-se que caso a despersonalização tivesse ocorrido ainda na fase de
conhecimento, o sócio ostentaria a condição de devedor, pois constaria explici-
tamente do título executivo judicial. Em tal hipótese, a legitimação passiva é de
caráter ordinário primário. Uma análise desavisada da questão poderia conduzir
à equivocada conclusão de que o posicionamento do sócio na tutela executiva
não seria substancialmente diferente, divergindo apenas no momento da con-
cretização da responsabilidade. O grande problema reside na identificação do
momento de o devedor exercer o contraditório e, eventualmente, insurgir-se
quanto à responsabilidade que lhe foi imputada.
Caso a legitimação passiva se opere de forma ordinária, não existe possi-
bilidade de o devedor incluso no título insurgir-se contra a responsabilização
patrimonial decorrente da tutela executiva. A legitimação passiva extraordiná-
ria de caráter executivo, por outro lado, exige a garantia do contraditório e da
possibilidade de discussão acerca da higidez do referencial jurídico que atribui
o ônus da execução ao terceiro.
Nesse aspecto, o vigente CPC buscou estabelecer certa ordem no procedi-
mento de responsabilização de terceiros, em especial dos sócios de pessoas
jurídicas, pela positivação do incidente de desconsideração da personalidade
jurídica, nos termos ao art. 133 e ss. A Lei n. 13.467, de 13/7/2017 assimilou,
explicitamente, o instituto no âmbito trabalhista (CLT, art. 855-A), conforme
inequívoca posição do TST, nos termos da IN 41/2018, art. 17.
A questão a ser colocada, entretanto, reside no fato de que as demais situa-
ções de legitimação extraordinária possíveis no processo do trabalho, especial-
mente os casos de grupo econômico (CLT, art. 3.º) e de sucessão empresarial
(CLT, art. 448-A), não apresentam, ao contrário da responsabilização do sócio, o
procedimento prévio de discussão acerca da legitimação. Nesse caso, resta ao
executado recém inserido na relação processual executiva o manejo dos meios
de defesa típicos. Quando tais meios são trancados o caminho inexorável acaba
sendo o uso enviesado do mandado de segurança.
Ora, a ilegitimidade das partes também é matéria suscitável no âmbito dos
embargos. Essa hipótese de cabimento não é novidade no âmbito de nossa
A EFETIVIDADE DA EXECUÇÃO TRABALHISTA 401
92 Conforme afirma Araken de Assis (2006, p. 325): “É cabível ao executado alegar, via impugnação,
ilegitimidade ativa ou passiva (art. 475-L, IV). Parece curioso, mas é exato: a parte ilegítima, passi-
vamente na execução, todavia de legitima para impugnar e alegar a própria ilegitimidade e assim
excluir da execução”.
402 COLEÇÃO ESTUDOS ENAMAT
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A busca pela efetividade da tutela da execução sempre foi preocupação prio-
ritária do direito processual do trabalho. Estabeleceu-se, no entanto, a premissa
equivocada no sentido de que a inibição dos meios de defesa seria instrumento
relevante para a concretização das obrigações inseridas nos títulos executivos.
A prática, no entanto, tem revelado que a severa restrição no uso dos instru-
mentos de defesa do executado gera uma situação paradoxal, na medida em
que os pretensamente prejudicados diante da prática dos atos executivos são
conduzidos ao uso de formas alternativas de defesa.
A situação mais corriqueira é a do uso enviesado do mandado de segurança.
Substituindo os meios típicos de defesa, o mandado de segurança acaba por
imprimir um curso inesperado e indeterminado da relação processual executiva,
gerando sérios prejuízos na efetividade da execução. Diante da impossibilidade
política de uma solução legislativa de curto prazo, afigura-se razoável propor
uma verdadeira reconstrução dogmática da tessitura dos meios de defesa típi-
cos da execução, alargado e facilitando o seu exercício por parte do executado.
Nessa perspectiva, duas medidas podem ser assimiladas com a finalidade
precípua de efetivar a execução mediante a garantia concreta do exercício do
direito de defesa e do contraditório por parte dos executados.
A primeira delas consiste no uso efetivo da suspensividade ope legis da
execução, aliada à mitigação da exigência da garantia do juízo. Essas duas fer-
ramentas ampliam a admissibilidade dos embargos à execução e permitem
engrandecer a possibilidade do exercício do direito ao contraditório e à ampla
defesa por parte do executado.
A EFETIVIDADE DA EXECUÇÃO TRABALHISTA 403
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EXCEÇÃO DE
PRÉ‑EXECUTIVIDADE
E EFETIVIDADE DA
EXECUÇÃO NA JUSTIÇA
DO TRABALHO
Sérgio Cabral dos Reis
Doutor em direito pela Universidade Federal de Santa Catarina.
Professor universitário da Univerisade Estadual da Paraíba
e Centro Universitário Unifacisa. Juiz do Tribunal Regional
do Trabalho da 13.ª Região. E-mail: screis@trt13.jus.br.
406 COLEÇÃO ESTUDOS ENAMAT
1 INTRODUÇÃO
A exceção de pré-executividade é um instituto bastante utilizado na prática
forense, mas nem sempre devidamente compreendido. Diante desse aspecto,
como objetivo geral, pretende-se estudar o seu regime jurídico, com especial
destaque aos feitos que estão no âmbito da competência material da Justiça do
Trabalho. Pretende-se demonstrar, inclusive, que ela, atualmente, apresenta-se
como uma “defesa típica”, e não mais como uma defesa excepcional. De modo
específico, no entanto, pretende-se responder ao seguinte questionamento: a
exceção de pré-executividade pode contribuir para a efetividade da execução
trabalhista? Como hipótese, advoga-se que a resposta seja positiva, desde que
o instituto seja manejado com ética e responsabilidade.
Sendo assim, para a ratificação ou não da hipótese, impõe-se refletir sobre
os principais aspectos do instituto, o que se fará nos itens que se seguem.
93 REIS, 2008.
95 KNIJNIK, 2001, p. 123 e 137. No mesmo sentido, Cf. ROSA, 2003, p. 127-128.
100 Se há textos normativos que permitem a utilização da defesa endoprocessual executiva, não
há sentido em continuar afirmando que se trata de uma “defesa atípica”. Nesse sentido, Cf. DIDIER
Jr., 2017, p. 791.
101 Incidente processual, na clássica definição de Antônio Scarance Fernandes (1991, p. 147-148),
é “um momento novo no processo, formado por um ou mais atos não inseridos na cadeia procedi-
mental prevista na lei; possibilita a decisão da questão incidental ou a apreciação da existência dos
requisitos para a sua admissibilidade no processo”.
102 Revela-se oportuno transcrever a seguinte lição de Araken de Assis (2016, p. 1523): “A exceção
de pré-executividade não pode ser encarada como expediente pernicioso ou maligno. Ao contrário,
presta-se admiravelmente para impedir o prosseguimento de execuções inúteis, beneficiando o
conjunto da atividade jurisdicional”.
408 COLEÇÃO ESTUDOS ENAMAT
103 Nessa hipótese, como se sabe, incumbe ao interessado promover a devida ação rescisória,
se ainda estiver dentro do prazo decadencial de dois anos e o caso envolver alguma das matérias
previstas no art. 966 do CPC.
107 Para uma distinção entre essas categorias jurídicas, Cf. DIDIER JR., 2005.
A EFETIVIDADE DA EXECUÇÃO TRABALHISTA 409
109 RR-478-48.2017.5.10.0021, 4.ª Turma, Relator Ministro Ives Gandra Martins Filho, DEJT 1.º/7/2021.
110 A CDA é expedida após a inscrição de um crédito público em dívida ativa e deve conter, sob
pena de nulidade, os mesmos elementos do termo de inscrição (art. 2.º, § 6.º, da Lei n. 6.830/1980).
A inscrição da dívida ativa constitui ato de controle de regularidade dos atos administrativos. No
entanto, embora seja presumido o cumprimento da legalidade quanto à CDA, é possível, inclusive em
exceção de pré-executividade, demonstrar-se que essa presunção não corresponde à realidade. Por
exemplo, por demandarem, em princípio, apenas análise de documentos, podem-se ser alegadas a
decadência do direito de realizar o “lançamento”, que dá início ao processo administrativo gerador
da CDA, e a prescrição da execução fiscal. Os vícios no processo administrativo fiscal, como se sabe,
retiram do título executivo a presunção de certeza, liquidez e exigibilidade do crédito.
410 COLEÇÃO ESTUDOS ENAMAT
à execução fiscal, que é o limite legal para a CDA ser emendada ou substituída
(art. 2.º, § 6.º, da Lei n. 6.830/1980), a execução deve ser extinta.
A incompetência absoluta para a prática dos atos executivos é outro ilustra-
tivo exemplo de matéria processual de ordem pública que pode ser suscitada
em sede de exceção de pré-executividade (por exemplo, contra a prática de atos
executivos trabalhistas em desfavor de empresa em recuperação judicial ou
com falência decretada). A impenhorabilidade absoluta de determinado bem
ou a arrematação por preço vil também são hipóteses plenamente viáveis para
o exercício da defesa endoprocessual executiva.111 De igual modo, podem ser
alegadas a prescrição da pretensão executiva ou a prescrição intercorrente. 112
Observe-se que a exceção de pré-executividade não comporta alegação
de “excesso de execução”, salvo se esse for evidente, prescindindo de dilação
probatória.113 Se há excesso de execução por ser a decisão exequenda ultra
petita, é possível argui-lo em sede de exceção de pré-executividade. Por outro
lado, se, para demonstrar que os cálculos estão bem superiores aos limites do
título executivo, for necessária a prova pericial, não é possível a arguição da
matéria por meio da exceção de pré-executividade.
Verifica-se, assim, que, embora a matéria possa ser cognoscível de ofício,
nem sempre o excesso de execução pode ser demonstrado de plano. Quando
o executado lograr essa demonstração apenas por documentos, será admitida
a veiculação da matéria por meio da exceção de pré-executividade. Se o tema
reclamar dilação probatória, ele deve ser suscitado nos embargos à execução.
Pelo que se observa, a doutrina tradicional condicionou a utilização da ex-
ceção de pré-executividade ao preenchimento dos seguintes pressupostos:
a) arguição de matéria cognoscível de ofício pelo juiz; b) impossibilidade de
dilação probatória para sua verificação. A doutrina mais recente, no entanto,
passou a admitir a alegação de outras matérias que possam comprometer a
113 Conforme decidiu a Terceira Turma do STJ, a exceção de pré-executividade “constitui via pro-
cessual adequada para arguir matéria de ordem pública, especificamente o não preenchimento dos
pressupostos processuais, das condições da ação, no que se insere indiscutivelmente à legitimidade
de partes, dos requisitos objetivos de executibilidade do título (certeza, liquidez e exigibilidade), e
até excesso de execução, desde que, em todos os casos, amparada em prova pré-constituída”. Cf.
AgInt no AREsp n. 2.006.257/SP, relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, julgado em
15/8/2022, DJe de 18/8/2022.
A EFETIVIDADE DA EXECUÇÃO TRABALHISTA 411
Nesse sentido, inclusive, parte da doutrina mais moderna tem admitido até
mesmo a possibilidade de dilação probatória na exceção de pré-executividade.
Eduardo Talamini e Luiz Rodrigues Wambier,119 por exemplo, advogam a tese
da possibilidade de dilação probatória para provar a ausência de matéria de
ordem pública (impenhorabilidade absoluta do bem, por exemplo). Sustentam
que o requisito da desnecessidade da dilação probatória apenas se justifica
em relação às matérias de mérito que podem ser suscitadas na execução. 120
Particularmente, entende-se que esse entendimento esteja correto, mere-
cendo um redirecionamento quanto ao regime jurídico do instituto. Se a matéria
é compatível com a finalidade e a estrutura procedimental da execução, não há
motivo para se vedar a possibilidade de dilação probatória. Afinal, como várias
vezes adiantado, trata-se de uma defesa endoprocessual típica. 121
No entanto, os tribunais superiores ainda têm posição diversa. A Súmula
n. 393 do STJ (Tema Repetitivo 104), por exemplo, preconiza o seguinte: “A
exceção de pré-executividade é admissível na execução fiscal relativamente às
matérias conhecíveis de ofício que não demandem dilação probatória”.
Tem-se entendido, no particular, que a presunção de legitimidade asse-
gurada à Certidão de Dívida Ativa (CDA) impõe ao executado que figura no
título executivo o ônus de demonstrar a inexistência de sua responsabilidade
tributária, demonstração essa que, se demandar dilação probatória, deve ser
promovida pela via adequada, qual seja, os embargos à execução fiscal. Sendo
assim, em sede de exceção de pré-executividade, alegações genéricas, sem
comprovação efetiva de seus argumentos, não afastam a mencionada presun-
ção de regularidade.
É relativamente antiga a posição do STJ no sentido de que, para a admissão
da exceção de pré-executividade, é indispensável que a decisão possa ser to-
120 No mesmo sentido, com ênfase nas possibilidades probatórias decorrentes da aplicação do art.
803 do CPC, Cf. PEIXOTO e MINAMI, 2022, p. 465-475.
122 Ilustrativamente, Cf. REsp. 1.110.925/SP, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, DJe 4/5/2009.
123 Como decidido pela SDI-2 do TST, isso significa que “a procedência da alegação, na exceção de
pré-executividade, precisa ser constatada de plano, a partir da documentação apresentada, situação
em que, excepcionalmente, se permite que o executado possa opor objeções (que dispensem dilação
probatória), sem necessidade de realização de depósito judicial do valor executado ou oferecimento
de garantia”. Cf. RO-353-46.2017.5.10.0000, Subseção II Especializada em Dissídios Individuais, Relator
Ministro Amaury Rodrigues Pinto Junior, DEJT 17/3/2023.
124 REsp. 1912277/AC, Rel. Ministra Nancy Andrighi, 3ª T., julgado em 18/05/2021, DJe 20/5/2021.
125 Observe-se que o STJ compreende não ser possível autorizar a emenda da petição inicial do
mandado de segurança para correção da autoridade indicada como coatora nas hipóteses em que tal
modificação implica em alteração de competência jurisdicional. Ilustrativamente, Cf. RMS n. 62.373/
MT, relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 1/6/2021, DJe de 1/7/2021. Mas,
nas demais hipóteses, o STJ entende ser possível a emenda à petição inicial, não vislumbrando qual-
quer incompatibilidade entre o art. 321 do CPC com a sistemática do mandado de segurança. Cf. AgInt
no RMS n. 64.159/MG, relator Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, julgado em 17/5/2021, DJe de
20/5/2021. Há julgados exigindo que a emenda à petição inicial deva ocorrer “antes da notificação
da autoridade impetrada e da cientificação do representante judicial da pessoa jurídica subjacente,
quando houver a necessidade de juntada da prova documental que havia de ser previamente cons-
tituída”. Cf. RMS n. 65.800/BA, relator ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado
em 4/5/2021, DJe 10/5/2021. O TST, entretanto, não admite a aplicação do art. 321 do CPC no pro-
cedimento sumário do mandado de segurança (Súmula n. 415 do TST). Na doutrina, criticando essa
posição do TST, com ênfase no princípio da instrumentalidade do processo na interpretação dessa
garantia constitucional do cidadão, Cf. BEBBER, 2020, p. 83.
414 COLEÇÃO ESTUDOS ENAMAT
citá-la,129 uma vez que é possível velar pela regularidade dos atos executivos
no curso da execução (atividade cognitiva na execução). 130 Há vícios de fácil
percepção que podem surgir após a penhora e podem ser questionados no
âmbito interno da execução.131 Os arts. 518, 525, § 11, 803, 828, § 3.º, 854, § 1.º,
874, 903, § 2.º, e 917, § 1.º, do CPC, em princípio, não deixam dúvidas quanto
a essa conclusão.
Evitar a penhora é apenas uma possível consequência da exceção de pré-
-executividade; não é especificamente sua finalidade, que está voltada a evitar
uma execução constituída ou desenvolvida de forma irregular. 132 Ademais, em
todo e qualquer caso, a oposição de embargos à execução ou impugnação ao
cumprimento de sentença é sempre mais complexa e onerosa do que a simples
arguição da questão no próprio procedimento executivo.
Quanto à legitimidade, pelo menos em perspectiva defensiva na execução,
podem propor a exceção de pré-executividade a parte executada e terceiros
juridicamente interessados.133 A legitimidade do sujeito executado é evidente.
Por outro lado, no caso de terceiro interessado, pode-se imaginar a situação do
sócio atingido pela execução sem a prévia realização do IDPJ. No caso, ele pleite-
ará a nulidade de eventual constrição patrimonial sem a prévia observância do
procedimento correto, decorrente do art. 855-A da CLT, que lhe proporcionaria
oportunidade de contraditório, como influência prévia e ampla defesa.
Poder-se-ia imaginar que a Fazenda Pública não teria interesse quanto à uti-
lização da exceção de pré-executividade, porque a execução contra ela pressu-
põe o trânsito em julgado. Ocorre que, mesmo quando já ultrapassado o prazo
de apresentação de embargos à execução, é possível a verificação por parte
dela quanto à ausência de matéria de ordem pública. Ademais, é possível pro-
vocar, por simples petição incidente defensiva no curso da execução (exceção
de pré-executividade), a revisão do valor dos precatórios, evitando pagamentos
indevidos por erros formais e materiais não alcançados pela coisa julgada, cor-
rigíveis de ofício (art. 1.º-E da Lei n. 9.494/1997).134 Nesse caso, por provocação
da Fazenda Pública, o juiz da execução pode analisar aspectos qualitativos dos
cálculos que se traduzam em erros meramente aritméticos nas contas.135
Resolvida a questão da legitimidade, impõe-se analisar a sequência proce-
dimental desse incidente. A exceção de pré-executividade, como defesa endo-
processual, inicia-se por petição simples, criando um incidente na execução. Em
seguida, passa-se ao exame de sua admissibilidade. Na hipótese, por exemplo,
se o suscitante argumentar que suas alegações serão comprovadas por teste-
munhas em audiência ou por prova pericial, a exceção de pré-executividade
deve ser rejeitada de plano, pois, como visto, o entendimento jurisprudencial
dominante ainda é no sentido de que só se admite prova documental nesse
incidente.
Proposta regularmente, pode-se indagar sobre a possibilidade de suspen-
são da execução. Na prática, normalmente ocorre, mas o tema é polêmico. No
geral, tem-se entendido que a oposição da exceção de pré-executividade pode
permitir a suspensão da execução, desde que também haja a garantia do juízo
pela penhora. Por outro lado, há quem defenda que, mesmo sem a garantia
do juízo, é possível a suspensão cautelar da execução, por incidência do direi-
to fundamental à tutela jurisdicional de urgência,136 especialmente quando se
perceber que a execução está fadada ao insucesso.137
Da conjugação desses critérios, e considerando a sistemática dos embargos
à execução, observa-se que o juiz, quando do processamento da exceção de
pré-executividade, pode atribuir efeito suspensivo à execução, quando presen-
tes, cumulativamente, os seguintes requisitos: a) requerimento do suscitante;
b) relevância da argumentação; c) risco de dano grave de difícil ou incerta re-
paração; e d) garantia do juízo.
Observe-se que, nos termos do § 3.º do art. 2.º do Ato CGJT n. 01, de 21 de
janeiro de 2022, a oposição do incidente de pré-executividade não suspende
ou interrompe o prazo de 45 dias, a contar da citação para cumprir a obrigação
exequenda, para inscrição do executado no BNDT. Observe-se, também, que
140 Nesse sentido, é a posição do TST: “RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. RE-
JEIÇÃO DA EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE. INSURGÊNCIA OPONÍVEL MEDIANTE INSTRUMENTOS
PROCESSUAIS ESPECÍFICOS. NÃO CABIMENTO DA AÇÃO MANDAMENTAL. INCIDÊNCIA DA DIRETRIZ DA
OJ 92 DA SBDI-2 DO TST. 1. Mandado de segurança aviado contra decisão na qual rejeitada exceção
de pré-executividade. 2. Na forma do art. 5º, II, da Lei 12.016/2009, o mandado de segurança não
representa a via processual adequada para a impugnação de decisões judiciais passíveis de retificação
por meio de recurso, ainda que com efeito diferido (OJ 92 da SBDI-2 do TST). 3. No caso, a decisão de
Juízo de primeira instância, em que rejeitada a exceção de pré-executividade, pode ser impugnada
no próprio processo originário mediante a apresentação de embargos à execução (art. 884 da CLT),
com possibilidade de interposição, posteriormente, de agravo de petição (artigo 897, “a”, da CLT). 4.
Havendo no ordenamento jurídico instrumento processual idôneo para corrigir a suposta ilegalida-
de cometida pela autoridade apontada como coatora, resta afastada a pertinência do mandado de
segurança. Recurso ordinário conhecido e não provido” (ROT-10563-78.2022.5.03.0000, Subseção II
Especializada em Dissídios Individuais, Relator Ministro Douglas Alencar Rodrigues, DEJT 3/3/2023)”.
141 TST-ARR-19700-68.1986.5.02.0002, 4.ª Turma, rel. min. Guilherme Augusto Caputo Bastos, julgado
em 13/5/2020 – Informativos TST n. 218.
142 O tema foi estudado com mais profundida em estudo anterior, Cf. REIS, 2008, p. 396-410.
143 SCHIAVI, 2021, p. 431. No mesmo sentido, Cf. CORDEIRO, 2015, p. 548.
A EFETIVIDADE DA EXECUÇÃO TRABALHISTA 419
Impõe-se observar, não obstante o acerto dessa tese, que a coisa julgada
material está vinculada, no sistema jurídico pátrio, à profundida da cognição.
Embora, na execução, por conta da alegação de inadimplemento da obrigação
exequenda, o mérito diga respeito à pretensão executiva,144 nela também é possí-
vel proferir decisões de mérito.145 Sendo assim, todas as vezes em que a questão,
na fase executiva, for apreciada do mesmo modo que seria apreciada na fase de
conhecimento (art. 487 do CPC), é possível falar-se em cognição exauriente. 146
É o caso da prescrição intercorrente (art. 924, V, do CPC; art. 11-A da CLT),
sendo certo que a sentença que a acolher em sede de exceção de pré-execu-
tividade possui profundidade cognitiva suficiente para transitar em julgado e,
com efeito, eventualmente ser objeto de ação rescisória. Ocorre o mesmo em
relação à decadência do direito de efetuar o “lançamento fiscal”.
Outro exemplo seria a hipótese de alegação de pagamento da obrigação exe-
quenda mediante prova documental.147 Se o juiz da execução, na exceção de
pré-executividade, entender que essa prova tem força suficiente para formar o
seu convencimento quanto ao adimplemento da obrigação que subjaz ao título
executivo, ele deve extinguir a execução, pelo alcance de sua finalidade, e essa
sentença tem aptidão para formar coisa julgada material.148 O que se deve consi-
derar, portanto, é a intensidade da cognição judicial, em sua perspectiva vertical.149
Assim, se o juiz declarar, na sua decisão sobre a exceção de pré-executi-
vidade, que não ocorreu prescrição, decadência ou pagamento da obrigação
exequenda, essa declaração, em princípio, tem aptidão para transitar em jul-
gado.150 Observe-se que, quanto a essas decisões de mérito, se as alegações
fáticas forem as mesmas, não é possível a renovação da discussão em sede
de embargos à execução (ou alguma modalidade de defesa heterotópica). Há
impedimento pela autoridade da coisa julgada material (decorrente da exceção
de pré-executividade).
147 Sobre a arguição de pagamento em sede de exceção de pré-executividade, Cf. PEREIRA, 2001,
p. 427-430.
151 LUCON, 2001, p. 345-348. No processo do trabalho, por todos, Cf. GIGLIO, 1997, p. 503.
153 Resp. 1.764.405-SP, Rel. Min. Assusete Magalhães, Primeira Seção, julgado em 10/3/2021, DJe
29/3/2021. Observe-se que há decisões do STJ no sentido de que, nos casos em que a exceção de
pré-executividade visar, tão somente, à exclusão do excipiente do polo passivo da execução fiscal,
sem impugnar o crédito executado, os honorários advocatícios deverão ser fixados por apreciação
equitativa, nos moldes do art. 85, § 8.º, do CPC, porquanto não há como se estimar o proveito eco-
nômico obtido com o provimento jurisdicional. Cf. AgInt no REsp n. 2.025.080/SP, relatora Ministra
Regina Helena Costa, Primeira Turma, julgado em 14/11/2022, DJe 17/11/2022.
A EFETIVIDADE DA EXECUÇÃO TRABALHISTA 421
dos honorários, por ter dado causa à instauração de execução infrutífera. 154 O
STJ tem posição vacilante quanto ao tema,155 com a ressalva do mencionado
caso da exclusão do litisconsorte na execução fiscal.
Na Justiça do Trabalho, contudo, é forte a linha de pensamento no sen-
tido de que o art. 791-A da CLT contempla praticamente todas as hipóteses
de cabimento dos honorários sucumbenciais na esfera trabalhista, estando
excluída a possibilidade de condenação na fase de execução 156. Por essa linha
de raciocínio, pelo menos em princípio, mesmo que a decisão proferida na
exceção de pré-executividade trabalhista tenha natureza jurídica de sentença,
a jurisprudência trabalhista dominante refuta a possibilidade de condenação
do exequente em honorários advocatícios.
No entanto, acredita-se, na linha do STJ, que a melhor solução seja aquela
que admite a condenação do exequente ao pagamento de honorários sucum-
benciais pelo menos na hipótese em que o julgamento da exceção de pré-exe-
cutividade acarreta a exclusão de litisconsorte da execução. Valoriza-se, no
particular, o trabalho do advogado157 e se impõe ao exequente maior respon-
154 LOPES, 2008, p. 219. Em sentido mais amplo, defendendo o cabimento de condenação em
honorários advocatícios, na exceção de pré-executividade, quando ocorre a extinção da execução
ou a exclusão de litisconsorte, Cf. THEODORO JÚNIOR, 2016, p. 680.
155 O STJ tem entendido, por exemplo, que, rejeitada a exceção de pré-executividade, não é cabível a
condenação em honorários advocatícios. Cf. AgInt nos EDcl nos EDcl no AREsp n. 1.956.794/SP, relator
Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, julgado em 29/8/2022, DJe de 31/8/2022. Também
tem decisão no sentido de que não é possível a condenação da “Fazenda Pública ao pagamento de
honorários sucumbenciais nas hipóteses de extinção do processo executivo em razão da prescrição
intercorrente, ainda que oferecida exceção de pré-executividade”. Cf. AgInt no REsp n. 1.993.985/MG,
relator Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, julgado em 6/3/2023, DJe de 9/3/2023. Por outro lado,
há decisão no sentido de que “são devidos honorários advocatícios sucumbenciais pelo exequente
quando o acolhimento da exceção de pré-executividade resultar na extinção [...]”. Cf. AgInt no REsp
n. 2.004.203/SP, relator Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, julgado em 19/9/2022, DJe de 4/10/2022.
156 Ilustrativamente, Cf. TRT da 13.ª Região; Processo: 0000682-45.2020.5.13.0008; Data: 19-05-2021;
Órgão Julgador: Gabinete do Desembargador Ubiratan Moreira Delgado – 2.ª Turma; relator(a):
desembargador Ubiratan Moreira Delgado.
7 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A garantia do devido processo legal executivo também é um imperativo de
observância obrigatória na Justiça do Trabalho, sendo certo dizer, mesmo que
corretamente se considere que a maioria das execuções trabalhistas versem
sobre obrigações de natureza jurídica alimentar, que os executados não podem
ser tratados, genericamente, como “criminosos”, destituídos de suas garantias
constitucionais. Seria uma lógica incompatível com a ideia de Estado Democrá-
tico de Direito, que assegura, como conquista histórica civilizatória, procedi-
mentos judiciais adequados aos valores do devido processo legal substancial.
O processo, nesse contexto, não pode ser visto apenas como forma de re-
alização de “atividade estatal”. Mais do que isso, o processo, não obstante, de
um lado, tenha função de prestar tutela jurisdicional efetiva, de outro, deve ser
visto como “instrumento democrático de controle” contra abusos de poder e
utilização de procedimentos inconstitucionais e ilegais.
Por esse motivo, considerando as suas legítimas possibilidades, não se pode
ter preconceito com a exceção de pré-executividade. Se a parte interessada
desejar comprovar suas alegações por dilação probatória e com ampla pos-
sibilidade de formação de coisa julgada material, deve ajuizar os embargos
à execução (art. 884 da CLT), mediante prévia garantia do juízo. No entanto,
se a alegação defensiva for demonstrável de plano, por intermédio de prova
documental, ela pode apresentar a defesa endoprocessual executiva de que
trata este estudo e que tem sustentação normativa nos arts. 518, 525, § 11,
803, 828, § 3.º, 854, § 1.º, 874, 903, § 2.º, e 917, § 1.º, do CPC. (art. 769 da CLT).
São dois caminhos possíveis.
Nesse sentido, observa-se que o uso adequado da exceção de pré-executi-
vidade pode contribuir para a efetividade da execução, denunciando injustiças
158 Sobre a correlação entre os “riscos financeiros do processo” e o “desestímulo à litigância aven-
tureira”, por todos, Cf. ABREU, 2020, p. 110-115.
159 Ilustrativamente, observe-se que, no âmbito de atuação da PGFN, o art. 19, § 1.º, I, da Lei
n. 10.522/2002 preconiza que não haverá condenação de honorários advocatícios nas hipóteses
em que o Procurador da Fazenda Nacional expressamente reconhecer a procedência do pedido
quando for intimado para apresentar resposta à exceção de pré-executividade.
A EFETIVIDADE DA EXECUÇÃO TRABALHISTA 423
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