Brazil">
Jornal Brasil de Fato - 13 A 19 Agosto 2015
Jornal Brasil de Fato - 13 A 19 Agosto 2015
Jornal Brasil de Fato - 13 A 19 Agosto 2015
ISSN 1978-5134
“Amor e ódio” entre LGBT Morre general torturador
e moradores de rua Pág. 9 no Chile de Pinochet Pág. 14
Guilherme C. Delgado Beto Almeida Altamiro Borges
Apropriação financeira Lições do Mais Médicos Aécio, o “arregão”
Há que se reconhecer o óbvio, de O governo não organiza uma mídia Sob o comando do cambaleante Aécio
que enquanto tais motivos da avidez própria capaz de divulgar ações como Neves, o PSDB decidiu utilizar a rede
financeira por proteger seus ativos, o Mais Médicos, hoje com aprovação nacional de rádio e tevê para convocar
socializando perdas, prevalecerem na de 95% do povo. Uma contradição as marchas golpistas de 16 de agosto.
gestão da crise econômica, a crise se com as pesquisas que apontam queda No entanto, existe a desconfiança de
prolongará indefinidamente. Pág. 2 de sua popularidade. Pág. 3 que cambaleante é um “arregão”. Pág. 3
2 de 13 a 19 de agosto de 2015
editorial
Apropriação Laerte
Escolhendo o paraíso
financeira EU TIVE A VISÃO DO INFERNO. E como sou muito religiosa,
aquilo me bateu feio. Era sábado, final de tarde. Hora de tomar
um cafezinho com leite e fazer bolinhos de chuva para acompa-
na crise
nhar. Odeio cozinha, mas o dia, frio e pálido, estava pedindo. As-
sim, cheia de boa vontade fui fazer a magia da mistura dos sa-
bores. Receita sobre a mesa, ovos, farinha, fermento, banana e...
putz...faltou o açúcar. Aí não dava mais para não fazer. A boca já
salivava antecipando o gosto. O jeito era descer e comprar o da-
HÁ PROCESSOS econômicos que se nado. Morava a dois passos de um grande supermercado. Não
realizam de forma sub-reptícia, prin- gostava muito de comprar ali. Evitava a mais não poder. Sempre
cipalmente em momentos de crise preferi o pequeno comércio, aonde o dono me chama pelo nome
econômica e política como o atual. É e sabe do meu gosto. Aonde a menina que atende sorri para mim
o caso da apropriação financeira ex- e diz que o pão está bem pretinho, como eu gosto. Essas coisas
traordinária, que realizam, de for- de quem se conhece. O olho no olho. Mas, afinal, era uma emer-
ma politicamente regulada ou con- gência, e a receita esperava impaciente para ser completada.
venientemente frouxa, os proprie- Desci correndo e entrei no super. Como estava com pressa, mal
tários de dois ativos financeiros es- percebi o lugar. Fui direto para a prateleira do açúcar. Peguei um
tratégicos – títulos da dívida públi- quilo e voltei correndo em direção aos caixas. Foi então que tive
ca e terras rurais. No primeiro caso, a visão do inferno. Eram mais de quarenta caixas. Todos lotados.
ocorre um estrepitoso silêncio mi- As filas, imensas. Nem a preferencial para cestinhas dava mo-
diático, com as exceções de praxe, le. Era gente demais. Num repente eu me vi ali, entre aquele po-
para o fato de que a política de juros vo que falava sem parar. Vozes em todos os tons. Carrinhos lota-
altos do Banco Central, que eleva em dos de porcarias. Muita, mas muita Coca-Cola. Coisas que, certa-
doze meses – de julho de 2014 a ju- mente, não eram essenciais. Aquilo me embrulhou o estômago,
lho de 2015, a taxa de juros Selic de mas perseverei. Lá na minha pia, bolinhos esperavam.
11% a 14,25% ao ano, gerando em
contrapartida uma despesa financei-
ra extra da União ao redor de R$ 90 Há que se reconhecer o salvar a renda fundiária e a renda fi- Lá, era o céu. Quase ninguém. Os
bilhões. Observe o leitor que esta é nanceira em uma economia de cres-
óbvio, de que enquanto
apenas a despesa extra, porque o vo- cimento zero ou negativa. grandes quase sempre engolem o
lume de juros devidos totais, consi- tais motivos da A “mágica” distributiva que o pen-
derado um estoque de dívida públi-
ca mobiliária de R$ 2,3 trilhões em avidez financeira por
samento ultraconservador conse-
guiu produzir na crise fiscal foi a de
pequeno. Mesmo assim, a atendente
2015 fica no entorno dos R$ 320 bi- proteger seus ativos, apontar para o “ajuste fiscal” radi- sorriu para mim, entregou o açúcar,
lhões ao ano. cal, cujo efeito imediato em seis me-
Economistas conservadores que socializando perdas, ses provocou tal queda na receita perguntou se não ia querer o pão
vociferam contra os gastos sociais do prevalecerem na gestão pública (tributária, previdenciária e
Seguro-Desemprego, da Previdên- patrimonial da União), que obrigou
cia Social, da Lei Orgânica da Assis- da crise econômica, o próprio governo a rever suas me-
tência Social, do Sistema Único de tas de superávit primário para 2015 Entrei numa das filas. O coração apertando. Veio à mente as
Saúde e da Educação Básica, apon- a crise se prolongará (praticamente zero) e 2016. Mas não fotos do Sebastião Salgado, sobre as migrações. Êxodo. Um exér-
tando-os, dissimuladamente, co- indefinidamente sossegou a avidez dos proprietários cito de miseráveis, famintos, em marcha, num mundo tão pouco
mo “bola da vez” para um mal expli- da riqueza financeira que, agora in- solidário. O açúcar começou a pesar. Na minha frente, duas mu-
cado “ajuste estrutural”, silenciam vocando o “ajuste estrutural”, miram lheres bem vestidas discutiam acaloradamente sobre algo da no-
completamente para o caráter com- o corte dos direitos sociais protegi- vela. Um garoto berrava em desespero porque queria que o pai
pletamente desequilibrado do “ajus- dos por regra constitucional. levasse um carrinho horroroso, puro plástico. Dois adolescen-
te” monetário do Banco Central e o O movimento de defesa financei- tes bebiam iogurte e davam altas risadas. A algaravia ia crescen-
claudicante ajuste fiscal ora em cur- ra, preventivo na dívida pública e no do e eu, agarrada ao meu saquinho de açúcar, fui ficando sem ar.
so. mercado de terras, opera também, Uma menina de uns 13 anos cantarolava uma canção do Luan
Outra forma sub-reptícia de pro- com todo sigilo bancário de pra- Santana e duas outras mulheres discutiam atrás de mim sobre
duzir valorização financeira na cri- xe, no “saneamento” de dívidas pri- o quanto seria bom se o Aécio fosse presidente. Comecei a pas-
se econômica, favorecendo, no ca- ras brasileiro. Os preços das terras vadas, de que temos vários indícios sar mal.
so, um outro título patrimonial es- rurais no Brasil, segundo os levanta- pela tradição da política econômica A visão daquela multidão debruçada nos carrinhos abarrota-
tratégico, é combinar medidas regu- mentos mais recentes, não tem caído brasileira, tais dívidas, mais dia me- dos, aquele povo saciado, cheio de supérfluos, as falas vazias,
latórias com outras não-regulatórias em termos reais, refletindo aparen- nos dia transformar-se-ão em “es- os caixas amarelos com luzes vermelhas piscando, os gritos das
para impedir que a queda nos pre- temente a desregulação e a provisão queletos financeiros”, reivindicando crianças, o barulho, o ruído das latas de Coca-Cola sendo aber-
ços das commodities desvalorize os de crédito público, mas não as cha- um “lugar ao sol” – a dívida pública tas, o caos, foi me sufocando. Comecei a arder. De medo, de ver-
preços das terras rurais, impactados madas variáveis de mercado (preços mais bem remunerada do mundo. gonha, de fazer parte disso. De estar ali. Então eu soube que se
por mais de uma década do boom das commodities) Finalmente, há que se reconhecer houver inferno ele é assim. Um grande supermercado onde pes-
das commodities. Dentre as medi- Proprietários de ativos financei- o óbvio, de que enquanto tais moti- soas compram o que não precisam e cantam músicas do Luan
das regulatórias, figura o Plano Safra ros e de recursos naturais – terras, vos da avidez financeira por prote- Santana. Veio uma espécie de desespero, e a fila não andava.
2015-2016, que manteve o volume recursos hídricos, minas e campos ger seus ativos, socializando perdas, Uma garota, com uma camiseta que levava estampada a bandei-
de crédito e os subsídios oferecidos petroleiros, normalmente estariam prevalecerem na gestão da crise eco- ra dos Estados Unidos, explodiu um chiclete no meu ouvido. Foi
pelo Sistema Nacional de Crédito preocupados com a reversão dos nômica, a crise se prolongará indefi- o que me salvou. Eu pirei total. Larguei o quilo de açúcar e sai
Rural, recusados ao sistema indus- preços externos das commodities. nidamente. E pior ainda será se con- em desabalada carreira. Sacudi o pó das sandálias e decidi andar
trial, abastecido pelo BNDES. E no Alguns, de fato, sentiram a crise, co- seguirem passar a ideia de um cor- as quatro quadras que me separavam da padaria mais próxima.
caso das medidas não regulatórias, mo é o caso das grandes empresas te mais profundo nos direitos sociais Lá, era o céu. Quase ninguém. Os grandes quase sempre engo-
temos a completa inocuidade da po- do setor – Petrobras, Vale, Albras- básicos – tese pomposamente vendi- lem o pequeno. Mesmo assim, a atendente sorriu para mim, en-
lítica fundiária, no sentido de con- -Alunorte, etc. –, cujos negócios ex- da como “ajuste estrutural”. tregou o açúcar, perguntou se não ia querer o pão. “Tá como tu
trolar a excessiva valorização e con- ternos encolheram. Mas há uma via gosta”. Disse “não, vou fazer bolinhos” e saí contente da vida.
centração privada da propriedade secreta de apropriação de fundos Guilherme Costa Delgado é Nunca mais voltei ao supermercado. Quero a quenturinha do pa-
rural, agora desbordando para uma públicos – a dívida pública e o mer- doutor em Economia pela Unicamp e raíso, enquanto ele existir!
almejada (pelo agronegócio), inter- cado de terras, que vem sendo man- consultor da Comissão Brasileira
nacionalização do mercado de ter- tido artificialmente valorizados para de Justiça e Paz. Elaine Tavares é jornalista.
Editor-chefe: Nilton Viana • Editores: Aldo Gama, Marcelo Netto • Repórter: Marcio Zonta• Correspondentes nacionais: Maíra Gomes (Belo Horizonte – MG),
Pedro Carrano (Curitiba – PR), Pedro Rafael Ferreira (Brasília – DF), Vivian Virissimo (Rio de Janeiro – RJ) • Correspondentes internacionais: Achille Lollo (Roma – Itália),
Baby Siqueira Abrão (Oriente Médio), Claudia Jardim (Caracas – Venezuela) • Fotógrafos: Carlos Ruggi (Curitiba – PR), Douglas Mansur (São Paulo – SP), Flávio Cannalonga (in memoriam), João R. Ripper
(Rio de Janeiro – RJ), João Zinclar (in memoriam), Joka Madruga (Curitiba – PR), Le onardo Melgarejo (Porto Alegre – RS), Maurício Scerni (Rio de Janeiro – RJ), Pilar Oliva (São Paulo – SP) • Ilustradores: Latuff,
Márcio Baraldi, Maringoni • Editora de Arte – Pré-Impressão: Helena Sant’Ana • Revisão: Maria Aparecida Terra • Jornalista responsável: Nilton Viana – Mtb 28.466 • Administração: Valdinei Arthur Siqueira •
Programação: Equipe de sistemas • Assinaturas: Juliana Fernandes • Endereço: Alameda Olga, 399 – Barra Funda – São Paulo – SP CEP: 01155-040 – Tel. (11) 2131-0800/ Fax: (11) 4301-9590 – São Paulo/SP –
redacao@brasildefato.com.br • Gráfica: Taiga • Distribuição: Dinap Ltda. – Distribuidora Nacional de Publicações • Conselho Editorial: Alipio Freire, Altamiro Borges, Aurelio Fernandes, Bernadete Monteiro,
Beto Almeida, Dora Martins, Frederico Santana Rick, Igor Fuser, José Antônio Moroni, Luiz Dallacosta, Marcelo Goulart, Maria Luísa Mendonça, Mario Augusto Jakobskind, Neuri Rosseto, Paulo Roberto Fier,
René Vicente dos Santos, Ricardo Gebrim, Rosane Bertotti, Sergio Luiz Monteiro, Vito Giannotti (in memoriam) • Assinaturas: (11) 2131–0800 ou assinaturas@brasildefato.com.br • Para anunciar: (11) 2131-0800
de 13 a 19 de agosto de 2015 3
Por democracia
feminista
RESTAURAR O PODER feminino no mundo.
Ressignificar a Política e o fazer político. Isto é o
que querem as mulheres da #partidA da demo-
cracia feminista. A #partidA é o nome que se deu
a um movimento que, lançado há dois meses sob
liderança da filósofa feminista Márcia Tiburi, já
tem núcleos em várias cidades do país e vem cau-
sando polêmica ao pensar na criação de um par-
tido feminista. O desejo de construir um contra-
ponto ao estado atual do poder é o desafio a que
se propõem estas mulheres. Elas estão cansadas
de ser silenciadas dentro das organizações e dos
partidos, de esquerda inclusive, pois são protago-
nistas na própria vida. Elas defendem uma poÉ-
ticA feministA como uma nova forma de pensar
e estar no mundo.
O poder feminino foi esmagado durante toda a
história da humanidade, por isso o mundo está
em desequilíbrio e o planeta morrendo. O femi-
nino também existe nos homens e neles também
é reprimido. E o que seria esse poder feminino?
A ligação com a natureza, com a vida, o cuidar do
outro e do bem coletivo. No cotidiano, a maioria
das mulheres enfrenta muitas dificuldades e elas
decorrem das decisões políticas dos que gover-
nam. Entretanto, este aspecto da vida é despoliti-
zado pela cultura patriarcal dominante e o traba-
lho das mulheres é invisibilizado, desqualificado
e desvalorizado. Somem-se a isso a crescente vio-
lência contra a mulher e a permanente tentativa
de controle sobre seu corpo e sua subjetividade.
As feministas foram as primeiras a dizer o
quanto o pessoal é político e o quanto a política
interfere na vida pessoal. O capitalismo vive nova
crise e a democracia que serviu ao seu desenvol-
vimento mostra sua podridão em toda parte. O
imperialismo, por meio de 85 famílias que detém
o poder global de fato, utiliza todas as suas ar-
mas (literalmente) para continuar na exploração
Altamiro Borges e controle da humanidade. A esquerda, por sua
vez, precisa urgentemente reinventar-se, pois as
estruturas partidárias verticais e competitivas
fatos em foco
da Redação
Alemanha lucrou mais de 100 bilhões Ato contra ódio pede punição por Julgamento no STF pode levar Brasil dar um passo importante para viabilizar o
de euros com a crise na Grécia atentado no Instituto Lula a descriminalizar porte de drogas acesso de dependentes químicos ao trata-
A Alemanha “se beneficiou claramen- Mais de mil pessoas participaram dia 7 O Brasil pode se igualar aos demais paí- mento de saúde, além de pôr fim à estig-
te com a crise grega”, em mais de 100 de agosto do ato de solidariedade ao Ins- ses da América do Sul que descrimina- matização do usuário como criminoso.
bilhões de euros, segundo um estudo tituto Lula, que foi alvo de atentado dia lizaram o porte de drogas hoje ilícitas e
divulgado dia 10 de agosto pelo Institu- 30 de julho. Lula chegou acompanhado passar a ser tolerante com o consumo e Ambev é condenada por
to de Investigação Econômica Leibniz, da ex-primeira-dama, Marisa Letícia, e com o cultivo para uso próprio. A medida terceirização irregular
informou a agência France Presse. O foi recepcionado com cartazes e faixas de depende do Supremo Tribunal Federal A Justiça do Trabalho condenou a Ambev
instituto, sem fins lucrativos, conside- apoio. A manifestação teve a presença de (STF) que deve julgar, neste mês, ação a pagar indenização de R$ 1 milhão por ter-
rou que o valor representa a poupança sindicalistas, representantes de diversos questionando a inconstitucionalidade ceirização irregular. Uma ação civil pública,
garantida pela Alemanha por meio de movimentos sociais e lideranças políticas da proibição. A Defensoria Pública do movida pelo Ministério Público do Trabalho,
baixas taxas de juros sobre as suas obri- ligadas a partidos progressistas. A estreita Estado de São Paulo recorreu à Corte, constatou que trabalhadores terceirizados da
gações, resultantes da atração da sua esquina onde fica a instituição, no bairro do alegando que o porte de drogas, tipifica- fábrica de Agudos (SP) estavam exercendo
economia sobre investidores assustados Ipiranga, zona sul de São Paulo, ficou lota- do no Artigo 28 da Lei 11.343, de 2006, funções consideradas atividade-fim (que
com a instabilidade grega. Os estimados da. Os manifestantes espalharam fumaça não pode ser considerado crime, por não caracteriza a finalidade da empresa). Entre
100 bilhões de euros que a Alemanha vermelha, fizeram um abraço no Instituto e prejudicar terceiros. O relator é o minis- essas atividades estão manuseio, seleção,
poupou desde 2010 constituíram cerca entregaram flores. Ricardo Patah, presiden- tro Gilmar Mendes, que finalizou o voto movimentação, empacotamento e movimen-
de 3% do Produto Interno Bruto (PIB) te da UGT, diz: “Democracia é o regime do e deve colocar o tema em votação ainda tação interna de cargas, insumos, vasilha-
do país. Outros países como os Estados diálogo, não da violência e das provocações. este mês. Para especialistas em segurança mes, bebidas e similares. A decisão também
Unidos, a França e a Holanda também Sou solidário a Lula como serei a todos que, pública, direitos humanos e drogas, o STF proíbe a Ambev de terceirizar as funções
se beneficiaram, mas “a um nível muito porventura, foram vítimas de atos como o tem a chance de colocar o Brasil no mes- essenciais em qualquer fábrica no país, sob
mais reduzido”. (Agência Brasil) que ocorreu aqui”. (Agência Sindical) mo patamar de outros países da região e pena de multa diária. (Agência Sindical)
4 de 13 a 19 de agosto de 2015 brasil 5
assassinatos em Rondônia
sem respeitados nos diversos aspectos, roubar, por exemplo, não é considerado provavelmente a polícia está atrás de
para resolver os conflitos, inclusive os direitos daquelas pessoas um problema, mas cometer um ato de quem o esfaqueou, porque é mais fácil
que são acusadas de algum crime. Elas estupro fere o código interno dos presos. de identificar a responsabilidade. É difí-
e os casos de linchamento não têm a cidadania suspensa por terem Ocorre, contudo, que o linchamen- cil solucionar esses casos, especialmente
cometido algum crime ou por serem cul- to sempre envolve uma disputa despro- quando não se tem casos de morte, por-
entrariam nesse contexto” padas. São esses valores que, apesar de porcional entre uma vítima e um núme- que é mais difícil de a polícia investigar.
vivermos numa democracia, não conse- ro grande de agressores, e tem o objeti-
guimos incutir nas pessoas. vo de fundo de controle social, de fazer Que avaliação você faz da OPINIÃO A violência Assim, a violência tem sido o soneto A frustação e o desencanto cada vez ta relação jurídica. Os Inquéritos Poli-
justiça. Ou seja, trata-se sempre de uma abordagem e divulgação feita do indissociável do latifúndio e da grilagem mais crescente quanto aos Programas e ciais que investigam a morte dos traba-
Ariadne Natal analisou mais de 500 Por que, segundo sua avaliação, resposta a uma ação especial que é con- linchamento de Cledenilson, no tem sido o soneto intocados na Amazônia Legal. Em Ron- promessas governamentais (Programa lhadores são relegados ao esquecimento.
casos de linchamento que ocorreram no o linchamento é algo aceito siderada problemática. Maranhão? indissociável do latifúndio dônia, pela análise preliminar dos da- de Regularização fundiária na Amazônia Assim, uma vez mais, a questão agrária
país, e destaca que é possível entender no Brasil? Esse sentimento de Tem formas diferentes de noticiar es- dos da violência, compreende-se clara- Legal), a falta de oportunidades de tra- é tratada como questão de polícia e não
o anseio das pessoas que cometem es- impunidade justifica as ações? se tipo de ocorrência, desde abordagens e da grilagem intocados mente que esta violência é bem locali- balho nos núcleos urbanos (em Rondô- de política. Assim, inclusive para a região
sas ações, mas “o que se coloca em ques- Não sei se ele justifica, mas ajuda a ex- “Existe um processo de valores que que alimentam novos casos, porque na- zada na região onde a questão das ter- nia o que mais emprega e gera renda no onde ocorreu a maioria dos assassinatos,
tão é: por que essa resposta? Ela é a mais plicar, porque as pessoas têm uma cer- turaliza a situação e diz que esses casos na Amazônia Legal ras públicas não foi resolvida (Região de PIB é o setor de serviços), reanima as or- o esforço uníssono de governo e outras
adequada? Vai realmente trazer tranqui- ta abertura para resolver os conflitos de são compartilhados, entre eles está são legítimos e, com isso, estimula ou- Ariquemes, Machadinho d’Oeste e Buri- ganizações e movimentos sociais no que autoridades públicas têm clamado por
lidade?” Embora seja “impossível” pen- maneira violenta. Há outras situações essa ideia de que eliminar o outro é tras pessoas a agir da mesma maneira, tis). Trata-se, ou de áreas irregularmen- se refere às ocupações de terras como patrulha rural ao invés de políticas pú-
sar que o linchamento resolverá o pro- em que a população muitas vezes apoia criando um clima em que esse tipo de te ocupadas por grandes especuladores instrumento legítimo de promover a dis- blicas que resolvam a questão fundiária.
blema da segurança, a socióloga pontua a violência, e o anseio é o mesmo: o de legítimo para garantir a segurança” ação não é favorável. No ano passado, Afonso das Chagas imobiliários ou áreas de antigas conces- tribuição de terras (sobretudo as públi- Historicamente, o Estado tem se fei-
que “temos de entender que se é esse ti- eliminar aquela pessoa que cometeu um por exemplo, no caso de um linchamen- sões de terras. Com a manutenção da cas) e garantir meios de sobrevivência e to presente indiretamente através de po-
po de ação que gera paz, imagina o que crime como forma de garantir a paz. É to em Botafogo, no Rio de Janeiro, uma A HISTÓRIA de colonização do Estado pecuária, como fonte primária de pro- dignidade aos camponeses. líticas equivocadas. O próprio Tribunal
as pessoas estão vivendo no momen- uma ideia bastante rasa de que o proble- jornalista deu uma declaração dizendo de Rondônia, desde o início, conforme dução de matéria-prima (carne e leite), de Contas ao fiscalizar o Programa Ter-
to anterior ao linchamento. Então, es- ma da criminalidade está focado em al- Como os linchamentos são que o linchamento foi em legítima defe- sustenta Octavio Ianni no livro Colo- esta região tende a uma reconcentração ra Legal constata o baixo índice de atingi-
sa situação está relacionada a uma sé- guns indivíduos e de que, eliminando- tratados legalmente? sa, ou seja, legitimou esse tipo de ação. nização e contrarreforma agrária na de terras e, sob as lacunas e equívocos A justiça estadual e federal, mento das metas, alertando inclusive pa-
rie de privações, aliada a uma percepção -os, se conseguiria estabelecer a ordem. Há uma dificuldade da polícia em tra- Outra possibilidade de noticiar é ex- Amazônia (publicado pela Editora Vo- de um Programa feito para “não funcio- ra o fato de que, a maioria dos benefici-
de que a criminalidade é presente, alta e Essa é uma ideia falsa de combater a cri- tar desse tipo de fenômeno, primeiro, pondo o linchamento de maneira crítica, zes, 1979), caracteriza-se como contrar- nar”, a grilagem mantém-se como es- de forma generalizada, não ários não se enquadra nos critérios pre-
de que não há respostas para a resolução minalidade, mas que tem uma lógica porque é algo que é imprevisível, mas como foi feito pelo Jornal Extra, do Rio reforma agrária, ou seja, em momento tratégia do latifúndio. E este latifúndio vistos do próprio programa. Dessa for-
desse caso, mas de que a partir do lin- que está não só por trás dos linchamen- quando a polícia se depara com uma si- de Janeiro, que abordou o caso do Mara- algum, desde o Programa de Integração tem na violência sua alma-gêmea. A jus-
compreende nem a questão agrária ma, a revisão do próprio programa é me-
chamento algo foi feito”. tos, mas de outras ações, as quais con- tuação dessas, tem a função de impedir nhão com uma capa em que foi coloca- Nacional (1970), da época dos militares, tiça estadual e federal, de forma genera- como uma questão social, nem a dida de necessidade indiscutível, e isso,
Entre as propostas para diminuir esse tam com o apoio da população e, por is- que isso aconteça e, portanto, cessar as da a imagem do rapaz amarrado no pos- a reforma agrária foi tratada como polí- lizada, não compreende nem a questão a partir dos próprios resultados. Igual-
tipo de crime, ela é categórica: “É preci- so, continuam acontecendo. Existe um agressões é sempre a primeira preocu- te e outra imagem de um negro amarra- tica pública de Estado. A década de 1980 agrária como uma questão social, nem histórica questão dos bens públicos mente, nos poucos casos de retomada
so construir a ideia de que ter a lei fun- processo de valores que são comparti- pação. Ocorre, contudo, que nem sem- do ao tronco, fazendo alusão à escravi- caracterizou-se, no recém-criado Esta- a histórica questão dos bens públicos, de terras públicas irregularmente ocupa-
cionando é bom para todo mundo e ir lhados, entre eles está essa ideia de que pre no calor dos acontecimentos a po- dão e mostrando o absurdo do lincha- do de Rondônia, como um dos períodos no caso a terra pública, sua retomada e das, por parte do programa, não encon-
contra ela é ruim para todo mundo. Ou eliminar o outro é legítimo para garantir lícia militar se preocupa em identificar mento. Ou seja, é possível noticiar o caso mais sangrentos no que se refere à vio- destinação, como uma questão a ser dis- tra ressonância por parte da Justiça Fe-
seja, quando as pessoas desrespeitam a a segurança. quem são os agressores. Muitas vezes a de maneira crítica, mostrando um pro- lência ligada à questão agrária. De lá pa- cutida e resolvida por esta instância. O Mas também a fragilidade dos movi- deral que precisa legitimar a imissão na
lei, elas também estão cometendo um polícia é chamada em razão do delito an- blema que tem de ser resolvido. ra cá, infelizmente, a violência no campo grileiro, não raras vezes, é tratado como mentos sociais, a ausência de formação posse da União em tais áreas. Por últi-
crime”. terior, do qual o linchado é acusado. A tem sido permanentemente associada à proprietário, o especulador imobiliário e debate político em sentido amplo da mo, se não houver um esforço concentra-
“Infelizmente a nossa democracia não polícia chega na ocorrência com a infor- desorganização fundiária, à reconcen- como legítimo destinatário de terras pú- questão agrária, facilita também a pro- do e conjunto por parte dos órgãos fede-
Qual é a lógica que sustenta os mação de que algo ocorreu, mas se depa- “Em casos que envolvem tração da terra, à inércia do órgão res- blicas e os movimentos sociais como vi- cura por estes grupos de muitos que ve- rais em uma estratégia de fiscalização e
linchamentos? foi capaz de garantir que as instituições ra com o acusado do roubo, por exem- ponsável pela reforma agrária e ainda, lões, invariavelmente. em em tais movimentos a oportunidade efetivação das medidas necessárias, ob-
homicídio do suspeito, e que
Ariadne Natal – Uma questão de fun- tomassem as rédeas em casos de conflitos, plo, sendo agredido. Então, ela identifi- de forma específica, à complacência da A inicial vocação agrícola do Esta- da “terra fácil”, criando, por vezes, um jetivando uma “higienização” nos cartó-
do importante é a de que as instituições ca o suspeito e o detém, mas nem sem- necessita de uma investigação, justiça frente ao tratamento da questão, do de Rondônia há duas décadas foi re- ambiente de contendas internas, despre- rios de registros de imóveis e outros se-
do Estado não são uma fonte de segu- e tampouco garantir que os direitos pre faz alguma coisa em relação à agres- com as variáveis da notória criminaliza- definida como vocação à pecuária. Is- paro e, até, situações associadas a inte- tores governamentais, incluindo autar-
rança garantida. Nesse sentido, há um são física que ele está sofrendo. O mais há uma dificuldade de realizar ção dos movimentos sociais e os equívo- so demanda mais terra, aquece a grila- resses particulares, terreno propício pa- quias, a “legalização da grilagem” perdu-
sentimento generalizado de que há im- fossem respeitados nos diversos aspectos, comum, portanto, é o linchamento não cos no tratamento das terras públicas. gem e incentiva a especulação imobiliá- ra especuladores imobiliários, madei- rará, perdurando igualmente a violência
punidade e de que as pessoas têm me- ser caracterizado como uma ocorrência a investigação porque são Recentemente criado, em 2009, o Pro- ria. O Estado, como desde sempre, tem reiros e, inclusive, a reprodução da gri- como instrumento de sustentação explí-
do. Ou seja, a percepção das pessoas é de
inclusive os direitos daquelas pessoas que cita destes esquemas de apropriação de
criminal também. múltiplos atores participando da grama Terra Legal, objetivava, ainda que chegado sempre depois, e muitas vezes, lagem. Sem a compreensão política do
que há uma criminalidade generalizada são acusadas de algum crime” Em casos que envolvem homicídio do retoricamente, resolver a questão da ter- apenas assumindo a legitimação do fa- processo, pode ocorrer, em certas situa- terras públicas e especulação imobiliária.
e essa sensação, às vezes, é mais impor- suspeito, e que necessita de uma investi- agressão ao suspeito” ra pública e do secular problema da gri- to consumado. É mais de 13 milhões de ções, até a utilização da pretensa organi- A fim de romper com o império da im-
tante do que os números. Por conta dis- gação, há uma dificuldade de realizar a lagem em terras amazônicas. Com uma cabeça de gado, o rebanho bovino, pa- zação das pequenas posses por parte de punidade do latifúndio, compete às pró-
so, algumas pessoas tomam certas medi- investigação porque são múltiplos ato- tarefa de regularizar mais de 67 milhões ra uma população de aproximadamen- grandes interesses. prias instâncias superiores do Judiciá-
das para resolver os conflitos, e os casos O que os casos de linchamento res participando da agressão ao suspei- de hectares e seis anos depois, o progra- te 1,7 milhão de habitantes. O ciclo da Na região, onde ocorreu a maioria dos rio uma força-tarefa no sentido de acom-
de linchamento entrariam nesse contex- evidenciam sobre o sistema to. O papel da polícia seria identificar as Pode nos falar sobre os 589 ma governamental não deu conta de re- pecuária ainda tem seu fôlego, mas a crimes, no Estado de Rondônia, o diag- panhar de perto e monitorar o funciona-
to. Isso seria uma forma de tentar es- judiciário brasileiro? ações individualmente, mas o problema casos de linchamento que você solver o caos fundiário na Amazônia. Em época da soja se aproxima. No Estado, nóstico policial de qualquer assassina- mento da Justiça no Estado de Rondônia.
tabelecer uma “ordem”, porque se tra- Fica claro, nos casos de linchamento, é que nesses casos, geralmente, ninguém analisou na região metropolitana outro rumo, tem servido muito mais à a cada ano avança a área de produção to ou tentativa de assassinato, localizado
ta de uma ação violenta, mas essa ação que a população não recorre a essas ins- está disposto a falar, porque muitas ve- de São Paulo entre 1980 e 2009? “legalização” de grandes áreas de terras do grão, que já passa de 200 mil hecta- em área rural, possui destaque na carti- Afonso das Chagas é professor de Direito
tem como objetivo fazer justiça e garan- tituições em razão da falta de confiança zes o linchamento acontece em comuni- Quais os casos que motivaram os públicas irregularmente ocupadas (gri- res, sobretudo avançando em regiões de lha militar como crime ligado aos sem- da Universidade Federal de Rondônia (Unir),
tir uma ordem que foi quebrada ou que que se tem nelas, seja por causa da inefi- dades e as pessoas não querem denun- linchamentos ao longo dos anos? lagem), do que promover uma justa dis- pastagem degradada, o gado vai dando -terra. Mandantes, fazendeiros e grilei- já foi coordenador da CPT Rondônia e hoje
parece ter sido quebrada por alguém que ciência em identificar responsáveis, indi- ciar o vizinho, por exemplo, por medo de Tem uma série de variações no perfil tribuição fundiária na região. lugar à soja. ros nunca figuram no polo passivo des- é colaborador da Pastoral no estado.
6 de 13 a 19 de agosto de 2015 brasil
“EU NÃO VOU” A curiosa estratégia Políticas Públicas da USP, Pablo Ortella-
do, e pela professora de relações interna-
dos que afirmam enfrentar a cionais da Universidade Federal de São
Paulo (Unifesp), Esther Solano, detectou
corrupção enganando a população que a crença em boatos era muito forte
com mentiras tão absurdas que era entre os participantes paulistas da mani-
festação de 12 de abril.
mais simples dizer a verdade Os pesquisadores ouviram 541 pes-
soas na Avenida Paulista, e identifica-
ram que 47,3% dos entrevistados “con-
fiam muito” em informações obtidas pe-
Rodrigo Gomes lo Facebook. Outros 26,6% têm a mes-
de São Paulo (SP) ma percepção de informações repassa-
da Rede Brasil Atual das pelo aplicativo de celular Whatsapp.
Nada menos que 71,3% dos manifes-
NA TARDE DO DIA 6 muitas pesso- tantes entrevistados acreditam que Fa-
as perceberam que estavam confirma- bio Luiz, o Lulinha, filho do ex-presi-
das nos chamados eventos das redes so- dente Lula, é sócio da Friboi – aquela
ciais pelo impeachment da presidenta da mesma que contratou Roberto Carlos e
República, Dilma Rousseff, mesmo sem Toni Ramos como garotos-propaganda.
nunca terem aceitado tal convite e nem A informação já foi desmentida muitas
sequer cogitarem participar, por posicio- vezes, inclusive pelo presidente do gru-
namento ideológico. Fato é, que eventos po JBS, que controla a Friboi, José Ba-
criados com outros objetivos – do apoio tista Júnior.
à presidenta à repulsa ao clima de golpis- Outros 53,2% dos manifestantes an-
mo – tinham sido alterados proposital- ti-corrupção disseram acreditar que “o
mente para aumentar o alcance da con- PCC é um braço armado do PT”. E 42,6%
vocação para os protestos marcados para que “o PT trouxe 50 mil haitianos para
o dia 16 de agosto. votar na Dilma nas últimas eleições”.
Um dos eventos modificados era rela- Nas redes também são comuns pos-
cionado às eleições do ano passado e se tagens, vídeos e textos com “denún-
chamava “eu não voto em Aécio Neves”. cias”, que precisam ser repassadas “an-
Como o site não exclui eventos já reali- tes que sejam censuradas”. Alguns gru-
zados, alguém mudou o nome do even- pos têm até “veículos de comunicação”
to para “16 de agosto eu vou pra rua #Fo- Página do evento “eu não voto em Aécio Neves” transformado em “16 de agosto eu vou pra rua #ForaPT” próprios, para dar mais credibilidade
raPT”. E os defensores do impeachment às notícias forjadas, misturadas a no-
ganharam, automaticamente, 70 mil As informações falsas estão na estru- muita questão. Como pode ter sido frau- tas retiradas de portais da grande im-
apoiadores. No entanto, permaneceu a tura da convocação das manifestações dada só a eleição presidencial, num plei- prensa. Nessa bagunça, os golpistas se
foto de fundo com o rosto do candida- de rua. No ato realizado em 15 de março, to que elegeu governadores, deputados e esbaldam.
to tucano. Ao perceber a farsa, de ontem seus organizadores bradavam dos carros senadores? Não importa. A “notícia” do dia 7 de agosto é que a
para hoje 30 mil retiraram seus apoios ao de som que “Dilma cortou a internet na Os usuários desse expediente são cria- carta-renúncia de Dilma Rousseff esta-
evento. Avenida Paulista, para impedir a revolu- tivos: “Dilma vai proibir as religiões”, ria pronta, aguardando o momento cer-
Esse tipo de prática tem sido comum ção”. Em uma aglomeração tão grande “Dilma vai pegar o dinheiro das poupan- to para ser divulgada. Quem dá o “fu-
entre os grupos que tentam convencer a de pessoas é comum que a internet não ças”, “Dilma vai acabar com a família”, ro” é o colunista do jornal Metro e blo-
sociedade de que a corrupção no Brasil funcione. O mesmo ocorre com rádio. É “O PT vai instaurar uma ditadura comu- gueiro limpinho, Cláudio Humberto, que
foi inventada por Dilma, o ex-presiden- rara uma estação que pegue bem na Pau- nista no Brasil”, “O PT trouxe os haitia- foi porta-voz do ex-presidente Fernando
te Luiz Inácio Lula da Silva e o PT. Utili- lista devido à quantidade de transmisso- nos para votar na Dilma”. Collor de Mello e é uma espécie de Rei-
zam de todo tipo de fraudes e enganações res instalados na região. Mas o que im- Até mesmo um “combo” de pedidos naldo Azevedo fora da Veja. Se os mani-
com a justificativa de “salvar o Brasil”. porta é o “efeito manada” com que a fú- de impeachment publicado numa re- festantes estão lutando contra a corrup-
O expediente não é novo, e ficou mais ria se espalha. de social viralizou. Segundo o boato, se- ção, como podem crer em uma informa-
intenso com as redes sociais e o acesso à Também naquele domingo, os golpis- ria preciso registrar o pedido em um car- ção sem fontes, passada por um ex-alia-
internet por dispositivos como celulares tas exaltaram um “relatório de uma au- tório, pedindo “combo de quatro impea- do do Collor?
e tablets. No dia de ir às urnas na última ditoria em Washington que garantiu que chments”, para garantir que os petistas Os combatentes contra a corrupção pa-
eleição, uma mensagem de que o dolei- as eleições de 2014 foram fraudadas”. O não assumissem de novo e o tucano Aé- recem se importar tanto com a origem da
ro Alberto Youssef, primeiro delator re- “ativista” Marcello Reis, do grupo Revol- cio Neves pudesse ser o novo presidente. corrupção no Brasil quanto com a vera-
levante da operação Lava Jato, havia si- tados On-Line, se emocionava ao ber- cidade nas notícias que engolem, quan-
do envenenado na prisão inundou celu- rar “Dilma não foi eleita”. Só não expli- Fundamento do lhes convêm. Para acabar com Dilma,
lares em todo o país, a ponto de a Polícia cava de onde saía a tese fantasiosa – e Mas não se mente à toa. O recurso tem Lula e o PT, vale-tudo, até mesmo esses
Federal (PF) emitir nota garantindo que de explicações convincentes os seguido- fundamento. Uma pesquisa coordena- exemplos bem-acabados de corrupção da
ele gozava de plena saúde. res dessa onda de ódio não fazem mesmo da pelo professor do curso de Gestão de verdade como estratégia política.
ORGANIZAÇÃO
Walber Pinto
de São Paulo (SP)
“Quando os governos de
esquerda, mesmo que sejam
moderados, estão no poder, Manifestação em São Paulo: onda conservadora empunha bandeiras como a volta dos militares
quem está insatisfeito é a
Mesmo não havendo Há uma torcida [por parte da porém a sociedade votou nesses repre-
direita, então é ela quem vai fundamentação jurídica para mídia] contra o atual governo? sentantes. Eduardo Cunha é uma pessoa
o afastamento da presidenta É claro que tem uma torcida contra o que não se detém diante do apelo ao bom
pra rua. Só que esse governo Dilma, alguns especialistas governo do PT. Eu não acho que a im- senso, da moralidade. Ele tem um proje-
afirmam que pode acontecer. prensa seja golpista, ela é de direita, con- to pessoal, manipula fortemente, não sei
de esquerda não criou base Podemos falar em golpe? servadora. Naquela outra passeata da di- em que base ele manipula, me parece que
de esquerda, pois fez tanta Se não há fundamentação, quer di- reita [15 de março deste ano] a estimati- tem uma prática mafiosa, isso é o que os
zer que vai existir? Não tem elementos. va da Globo era de 1 milhão de pessoas e jornais dizem.
concessão com a direita que Vai trazer o exército? Eu não sei se a im- a PM, que é PM, falou em duzentas mil,
prensa espelha algo que está acontecen- e olhe lá. Nós [esquerda] temos que fazer
ficou atordoado” do no país. Acho a democracia um valor crescer o Brasil de Fato, o Portal da CUT, “Nós [esquerda] temos que
inestimável, temos que preservá-la, de- a TVT e a imprensa de esquerda.
fendê-la sempre, de qualquer maneira. fazer crescer o Brasil de
Nada justifica um golpe, nem de direita Fato, o Portal da CUT, a TVT
Como você avalia esse momento e nem de esquerda, um golpe que supri- “A sociedade brasileira nunca
da conjuntura política em que me a democracia, que suprime a liber- e a imprensa de esquerda”
setores conservadores de direita dade. Há uma retomada do conserva- conseguiu erradicar a corrupção,
avançam e pedem o impeachment dorismo, inclusive uma direita pra lá de inclusive a corrupção nas grandes
da presidenta Dilma? conservadora que pede a volta dos mi-
Maria Rita Kehl – Eu tenho tanto me- litares. Isso é de uma ignorância, é co- estatais começa ali. Mas no Podemos falar que o Brasil
do dessa onda conservadora que está na mo se os militares viessem colocar or- está passando por uma crise
sociedade que não consigo dizer se vai dem na casa. A corrupção endêmica co- ponto que nos dói mais, há uma institucional, uma falência na
ou não ter impeachment, porque o me- meça na ditadura, porque não havia no- responsabilidade do PT, nessa representatividade dos partidos
do me impede de enxergar claramente tícia nem imprensa livre e nas estatais políticos?
a conjuntura. O fato do Eduardo Cunha permitia-se que se metesse a mão. A so- despolitização da sociedade brasileira” Eu gostaria de poder dizer que há uma
estar na operação Lava Jato, quer dizer, ciedade brasileira nunca conseguiu er- falência, e que os partidos não represen-
isso que é triste, porque não podemos radicar a corrupção, inclusive a corrup- tam a sociedade brasileira, mas eu pos-
contar com a sociedade para defender ção nas grandes estatais começa ali. Mas so estar errada, porque os partidos talvez
o governo. Quem está mobilizado nes- no ponto que nos dói mais, há uma res- A Câmara dos Deputados, sob representem a sociedade brasileira. Tal-
se momento é a direita pelas redes so- ponsabilidade do PT, nessa despolitiza- comando de Eduardo Cunha, tem vez a sociedade brasileira esteja num re-
ciais e pelo descontentamento que já vi- ção da sociedade brasileira. colocado pautas que vão contra trocesso conservador, já que ela tem uma
nha desde o governo Lula, mas que es- os direitos dos trabalhadores tendência conservadora. O Brasil foi o
tava em minoria por não querer o go- e contra os direitos humanos, último país livre, dos países do ocidente,
verno do PT, além de estarem mobiliza- “Acho a democracia um como é o caso da terceirização, a abolir a escravidão. Foi uma elite que
dos pela crise econômica. Não é absur- do financiamento empresarial de deitou na sopa porque os outros países
do que, quando os governos de esquer- valor inestimável, temos campanha, da maioridade penal já tinham abolido, e que só deixou de ser
da, mesmo que sejam moderados, estão e da PEC 451, que viola o direito porque se tornou economicamente invi-
no poder, quem está insatisfeito é a di-
que preservá-la, defendê- à saúde, entre outras. Qual sua ável por uma elite cafeeira e canavieira.
reita, então é ela quem vai pra rua. Só la sempre, de qualquer avaliação sobre isso?
que esse governo de esquerda não criou O que eu posso dizer desse Congresso?
base de esquerda, pois fez tanta conces- maneira. Nada justifica um No caso das igrejas evangélicas não sei “Eduardo Cunha é uma pessoa
são com a direita que ficou atordoado. analisar o crescimento delas, eu respeito
Outra coisa que também criticamos [do golpe, nem de direita e nem as religiões que vieram do protestantis- que não se detém diante do apelo
Lula] foi a coalizão com o PMDB, embo-
de esquerda, um golpe que mo de Lutero, mas é claro que essa ban- ao bom senso, da moralidade. Ele
ra o PMDB no período militar tenha si- cada é uma bancada mais conservado-
do um partido valoroso – porque o MDB suprime a democracia, que ra. Avaliar o Congresso nesse momento tem um projeto pessoal, manipula
foi um partido que teve elementos valo- é me pedir pra dizer um monte de pala- fortemente, não sei em que base
rosos de oposição – quando virou o PM- suprime a liberdade” vrão porque é uma decepção gigantesca,
DB, principalmente depois das alianças José Antonio Teixeira/ALESP ele manipula, me parece que tem
com os governos petistas, vira um parti-
do ônibus: entra quem quer. Esse é o pior
uma prática mafiosa, isso é o que
momento, com o atual presidente da Câ- E como você avalia o os jornais dizem”
mara, Eduardo Cunha. O PMDB quer es- comportamento da mídia nesse
tar perto do poder, seja ele qual for. Se processo?
naquele momento o Executivo tivesse co- A mídia é conservadora, no entanto,
locado limite nas reivindicações, o PM- a imprensa, as televisões, o patrão de- Nas duas ditaduras que tivemos aqui,
DB não iria deixar de apoiar e nem vi- les não é só o dono da empresa, o pa- a oposição foi fraca. Se considerarmos a
rar oposição. Tanto que ele só vira oposi- trão deles são os leitores e os telespec- oposição à ditadura Argentina, Chilena
ção hoje porque o governo está despresti- tadores. Se a imprensa fica mais con- e Uruguaia, não é que lá houveram mui-
giado por conta de uma crise econômica. servadora é porque esses leitores estão tos mortos e muito mais presos, porque
Quer dizer, é um partido sem moral, sem mais conservadores, uma coisa alimen- as ditaduras eram brutais - aqui houve
fibra. É fácil virar oposição e ficar chanta- ta a outra. A Folha de S. Paulo no final menos porque teve menos oposição. A
geando a presidenta. No entanto, quando dos anos 1970 virou uma imprensa pro- questão é que a passeata dos cem mil em
Lula estava forte, era a hora de ter barra- gressista quando a grande parte da so- apoio ao Jango foi superada pela Marcha
do e não barrou. ciedade brasileira estava contra a dita- da Família com Deus pela Liberdade. A
dura. Na ditadura, a Comissão Nacio- sociedade do Brasil na sua formação so-
nal da Verdade não conseguiu compro- cioeconômica é conservadora. Muitas
“Esse é o pior momento, var isso e não lembro se está anexo dos mudanças progressistas foram efeitos
relatórios; dizia-se que Octávio Frias de arranjos da elite, porque não valiam
com o atual presidente da [morto em 2007] emprestava os carros mais à pena, como é o caso da escravi-
pra levar presos ou cadáveres. Então, dão e da República. E, mesmo assim, no
Câmara, Eduardo Cunha. O não é que eles eram contra a ditadura caso da República o primeiro grande ato
PMDB quer estar perto do por princípios, mas quando foi crescen- qual foi? Reprimir Canudos de uma ma-
do a onda de insatisfação no país pelos neira horrorosa e violentíssima. Então,
poder, seja ele qual for” militares, a imprensa se coloca contra. tem um conservadorismo aqui, princi-
Não dá para saber quem vem primeiro, palmente com os pobres, com os quilom-
se é o ovo ou a galinha. A psicanalista Maria Rita Kehl bolas, camponeses. (Portal da CUT)
8 de 13 a 19 de agosto de 2015 brasil
Marcela Belchior
de São Paulo (SP)
DOCUMENTÁRIO
Aurélio Michiles refaz
a politizada trajetória
de Cosme Alves Netto,
embaixador do cinema
do Leste Europeu e da
América Hispânica no Brasil
Um turco amazonense?
de Jerzy Kavalerowich), soviéticos (ape-
sar da maldição que recaía sobre esta ci-
nematografia), argentinos (“La Hora de
los Hornos”, de Solanas & Getino), boli-
vianos (filmes de Jorge Sanjinés) e cuba-
nos (“Memórias do Subdesenvolvimen-
to”, de Alea, entre outros). o oceano de navio e passou por Dakar, tamanhas privações, se ele era filho de
A relação de Cosme com Cuba foi das de São Paulo (SP) no Marrocos, onde provavelmente com- pai rico, industrial? Pois agora, poucos
mais profundas. Ajudou o Festival del prou este chapéu e o eternizou nesta fo- meses atrás, Glória me enviou carta es-
Nuevo Cine Latinoamericano de la Ha- Há uma foto de Cosme Alves Netto, to, guardada com zelo. Fez a viagem jun- crita pelo pai do Cosme, na qual ele conta
vana desde seu nascimento, em 1979 mostrada em “Tudo por Amor ao Cine- to com amigos e uma amiga. Estes re- que tinha recebido correspondência do
(edição vencida por “Coronel Delmiro ma”, que surpreende até os que convi- tornaram ao Brasil e Cosme seguiu para filho e que já havia remetido, através de
Gouveia”, de Geraldo Sarno), integrou veram com ele, por décadas. O vemos Paris, pois queria conhecer a Cinemate- ordem bancária, dinheiro para ele. Tra-
a direção colegiada da Fundação do jovem, de pele bem morena e fantasia- ca do Henri Langlois (1914-1977). ta-se de carta super carinhosa, que revela
Novo Cinema Latino-Americano, se- do de “turco”. Que registro é este? Tal Depoimentos de suas amigas da épo- muito da relação entre os dois. O pai pe-
diada na Finca Santa Bárbara e coman- indumentária foi usada num baile de ca registram que ele chegou a dormir nos de que Cosme observe tudo e depois re-
dada por Gabriel García Márquez (1927 carnaval, em Manaus? bancos de praça, passou necessidades, late em detalhes toda experiência pari-
-2014) e ajudou na criação da Escola Aurélio Michiles esclarece: “trata-se mas realizou seu sonho de conhecer a Ci- siense. “A sua opinião é muito importan-
Internacional de Cinema de San Anto- de retrato realizado na primeira via- nemateca Francesa e Langlois. Isto nos te para mim”, afirmava. Publiquei a carta
nio de los Baños. gem internacional do Cosme. Ele cruzou leva a perguntar: mas como passou por na página do filme no Facebook”. (MRC)
cultura de 13 a 19 de agosto de 2015 11
Frei Betto
www.malvados.com. br dahmer
PALAVRAS CRUZADAS
Horizontais: 1.Tempero – Movimento social brasileiro que completou 30 anos
1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18
em 2014 – Nas eleições 2012, foi o candidato do PT à Prefeitura de Campinas. 1
2.Que não tem nada dentro – Pronto Socorro. 3.Cair neve – Em inglês, diz –se
“home” – Medida de sensibilidade de um filme fotográfico. 4.“Cobra”, em tupi – 2
Ala de um hospital para casos graves. 5.Emissora que foi alvo dos protestos em
3
2013 – No sentido figurado, acontecimento inesperado. 6.“Dentro”, em inglês –
Segunda nota musical. 7.Desde 2011, há uma marcha mundial com este nome. 4
8.Frequência de rádio – Patativa do Assaré nasceu neste estado (sigla). 9.Têm
sido introduzidas pelo Estado como compensatória – Agência de espionagem 5
dos Estados Unidos – Lampião nasceu neste estado (sigla). 10.Cor que tem o
6
nome de uma flor – Interjeição de decepção – Dá risada. 11.Uma forma de greve
– “Sim”, em espanhol – Catedral. 7
Verticais: 1.A Globo é acusada deste crime. 2.Sua carne é apreciada por uns e 8
considerada nojenta por outros. 3.Conjunto de folhas de papel, em branco, es-
9
critas ou impressas, soltas ou cosidas, em brochura ou encadernadas – De “?”,
quando sabemos algo de memória. 4.Presidente do STF que não achou alto o
10
gasto público de R$ 850 mil para receber o papa no Palácio Guanabara, em visita
ao Brasil em julho de 2013. 5.Que é chefe de – Igual. 7.Lugares onde magistra- 11
dos desempenham o seu cargo. 9.Arte de regular as relações de um Estado com
os outros Estados. 10. “Casa”, em tupi – Bosque. 11.Em alemão, diz –se “Farbe”.
12.Reza. 13.Nome do programa do governo federal que cadastrou médicos para
receberem uma bolsa de R$ 10 mil para trabalharem em locais carentes de aten- 10.Oca – Mata. 11.Cor. 12.Ora. 13.Mais médicos. 15.Neo – Atacar. 16.SE – Is. 18.Espionagem.
dimento. 15.Prefixo que significa “novo” – Agredir. 16.Menor estado brasileiro, Verticais: 1.Sonegação. 2.Rã. 3.Livro – Cor. 4.Barbosa. 5.Mor – Tal. 7.Tribunais. 9.Política.
pouco maior do que Israel – “É” ou “está”, em inglês. 18.O ex–técnico da CIA, Edw- 6.In – Ré. 7.Vadias. 8.AM – CE. 9.Cotas – CIA – PE. 10.Rosa – Pô – Ri. 11.Paralisação – Sí – Sé.
ard Snowden, denunciou os Estados Unidos por esta prática. Horizontais: 1.Sal – MST – Pochmann. 2.Oco – PS. 3.Nevar – Lar – ISO. 4.M’boi – UTI. 5.Globo – Bomba.
cultura de 13 a 19 de agosto de 2015 13
lhas pessoal e acadêmica, tanto que a dis- própria identidade”, argumenta o artista
sertação de seu mestrado teve como tema cuja fotografia deu sentido à vida.
os adolescentes na literatura anglo-ame-
ricana. Embora a formação literária pos- Inspirações e influências
sa contribuir para desenvolver diferen- Um dos grandes incentivadores de
tes linguagens fotográficas, não é a par- Sluban no projeto com os meninos em
te mais interessante na troca com os jo- situação de cárcere foi o fotojornalis-
vens. Sluban é descrente quando fala so- ta francês Henri Cartier-Bresson (1908-
bre sistema educacional ou métodos for- 2004). Antes de se conhecerem pesso-
mais e, por ansiar algo mais humano, co- almente, Sluban o escreveu para pedir
mo a vivência, prefere estar nas institui- apoio no início de suas idas às prisões.
ções penais em vez da sala de aula no pa- Cartier-Bresson abraçou imediatamente
pel de professor. “Foda-se a teoria! Exis- a ideia, inclusive por sempre ter mantido
te uma verdade que é muito mais eficien- contato com os jovens presos na França.
te do que qualquer outra na fotografia.” Os encontros eram sempre intensos, pois
Cartier-Bresson também viveu experiên-
cia prisional.
“Não quero servir um propósito, uma À época da Segunda Guerra Mun-
dial, Henri Cartier-Bresson foi captura-
causa. Não quero minhas fotografias do por soldados alemães como prisionei-
em jornais ilustrando algo que não ro de guerra. Em fevereiro de 1943, em
sua terceira tentativa de fuga, consegue
seja o que eu quero passar Exposição reúne 25 fotografias de centros de detenção para adolescentes libertar-se.
Em conversa com Sluban, Cartier-
ção com a possível distorção de seu tra- lho Balcãs Trânsito), o artista se apressa -Bresson confidenciou que não se encon-
balho. “Não quero servir um propósito, em negar ser especialista em fotos ou em trava com os meninos encarcerados para
O artista trabalha de forma indepen- uma causa. Não quero minhas fotogra- celas. Fotografa nos ambientes prisionais transmitir o ofício fotográfico, mas sim
dente, em vez de ficar atrelado às insti- fias em jornais ilustrando algo que não por unir sua arte com a paixão em com- para ensiná-los a fugir da prisão! Além
tuições ou agências. “Eu fotografo em seja o que eu quero passar.” partilhar a prática com adolescentes em dessa grande referência, outros fotógra-
primeira pessoa, no singular. É subje- Ganhador de prêmios como Niépce situação inusitada. Começou a gostar de fos aos quais Sluban cita como apoiado-
tivo. Eu assino, é como eu vejo as coi- (em 2000), Leica (em 2004) e da Radio fotografias quando adolescente “porque res e influências são os franceses William
sas”, pontua, ao falar sobre a preocupa- Internacional Francesa (RFI, pelo traba- tinha que encontrar outra maneira” pa- Klein e Marc Riboud.
Opera Mundi
cado ano passado. tes do Tratado de Não-Proliferação de
Hiroshima foi o primeiro alvo de uma Armas Nucleares (TNP), e que também
bomba nuclear na história. Três dias de- são os cinco membros permanentes do
pois, a também japonesa Nagasaki teria Conselho de Segurança da ONU — Esta-
o mesmo tratamento, alvo da ogiva nor- dos Unidos, Rússia, França, Reino Unido
te-americana “Fat Man” (Homem Gor- e China — possuem mais de 98% das ar-
do). O saldo total de mortos decorren- mas nucleares do mundo, como aponta o
tes dos dois ataques ultrapassa os 200 estudo citado.
mil civis japoneses. Após os bombar- Assim, apesar do aumento de arma-
deios, ocorreram mais de 2.000 deto- mento em países fora do TNP, a respon-
nações de bombas nucleares em testes sabilidade pela redução das armas de
e demonstrações, nenhuma delas foi em destruição em massa é predominante-
outra guerra. mente do chamado grupo dos cinco, diz
O uso das bombas impulsionou a cor- o estudo científico.
rida armamentista entre Estados Uni- O trabalho, realizado por Hans M.
dos e a URSS (União das Repúblicas So- Kristensen e Robert S. Norris, am-
cialistas Soviéticas) durante o período bos da Federação de Cientistas Nor-
conhecido como Guerra Fria (1945- te-Americanos, conclui que o TNP es-
1991). Não por acaso, hoje Rússia e os tá diante de um dilema. “Após décadas
EUA detêm 93% das armas nucleares de de redução dos níveis das ogivas nucle-
todo o mundo. ares após a Guerra Fria, esta tendên-
A quantidade de ogivas prontas pa- cia parece ter diminuído e todos os Es-
ra o uso sob a posse de Washington tados com armamento nuclear estão
e Moscou é aproximadamente 25 ve- ocupados modernizando seus arsenais
zes superior à da França, que detém o nucleares. Não há indicações de que al-
terceiro maior arsenal. E, se permane- guma das potências esteja planejando
cer no mesmo ritmo de crescimento, os desistir das armas nucleares em um fu-
dois arsenais que crescem mais rapida- turo previsível. Ao contrário, todas fa-
mente, Paquistão e Índia, poderiam le- lam da importância das armas nuclea-
var 760 anos para atingir os dois países res para a segurança nacional”, aponta.
no topo da lista. (Opera Mundi)
CRISE HUMANITÁRIA
Mesmo com toda a
repressão e o risco de
viajar em transportes
improvisados, imigrantes
continuam chegando em
vários países da Europa
Achille Lollo
de Roma (Itália)