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Regina Horta - História Dos Animais No Brasil Tradições Culturais Historiografia e Transformação
Regina Horta - História Dos Animais No Brasil Tradições Culturais Historiografia e Transformação
Regina Horta - História Dos Animais No Brasil Tradições Culturais Historiografia e Transformação
historiografia e transformação
RESUMO
Este ensaio visa apresentar o estado da arte dos estudos sobre animais realizados pelos
historiadores no Brasil. Sérgio Buarque de Holanda identificou uma tradição cultural luso-
brasileira, na qual predominou uma relação de extrema imprevidência e antropocentrismo em
relação ao mundo natural e, consequentemente, aos animais, desde os primeiros anos de
colonização do território. Frente ao caráter inovador de algumas obras de Sérgio Buarque no
tratamento dos animais, e da reconhecida importância desse historiador, é surpreendente
que esse aspecto tenha sido obscurecido pela historiografia brasileira entre os anos 1960 e os
2000. Em anos recentes, os animais têm invadido o horizonte de interesse dos historiadores.
Não obstante, ainda não se pode falar num campo de estudos sobre animais realmente bem
estabelecido na historiografia brasileira. A conclusão discute as possíveis razões dessa lacuna.
Palavras-Chave: História dos animais; Historiografia brasileira; Sérgio Buarque de Holanda.
1
Doutorado em História pela Universidade Estadual de Campinas, UNICAMP, Brasil. Docente do Programa de Pós-
Graduação em História na Universidade Federal de Minas Gerais, UFMG, Brasil. reginahortaduarte@gmail.com
2
O Estado do Maranhão e do Grão Pará abarcava toda a região norte do Brasil, entre 1621 e 1772, com administração
própria e relações diretas com Lisboa. Sérgio Buarque de Holanda, A época colonial, do descobrimento à expansão.
História Geral da Civilização Brasileira, tomo I, vol. 1 (Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1997). Sobre o Padre Vieira e sua
trajetória política e religiosa, ver: Alcir Pécora, Teatro do sacramento (Coimbra: Imprensa da Universidade de Coimbra,
Campinas: Editora da Unicamp, 2016), Ronaldo Vainfas, Antonio Vieira: jesuíta do rei (São Paulo: Companhia das
Letras, 2011); Ernani Mügge e Daniel Conte, “Sermão de Santo Antônio aos peixes, ou a metáfora do imaginário
colonial português”, Navegações, v. 10, no 2 (2017):131-140. É importante destacar, com Pécora e Vainfas, que a
defesa dos jesuítas da liberdade dos indígenas não se originava em qualquer relativismo cultural, ou tampouco a
consideração da alteridade indígena. Antes, Vieira era um “colonizador de almas”. Vainfas, Antonio Vieira, 199.
animais criados por Deus na face da terra, mas permaneciam como os mais
indomáveis, verdadeiramente indomesticáveis, não havendo “nenhum tão grande que
se fie do homem, nem tão pequeno que não fuja dele”. Nem mesmo nos sacrifícios
religiosos eram utilizados, já que era desejável que os animais chegassem vivos aos
altares, e isso era mais difícil em se tratando de peixes. Essa distância valeu-lhes
serem poupados da grande mortandade causada pelo dilúvio, pois Deus escolheu um
castigo que não os atingiu e, segundo explicara Santo Ambrósio, o Criador os isentara
pelo simples fato de viverem completamente alheios aos pecados humanos.
3
Ver, respectivamente: Antigo Testamento, Tobias, cap. 6; Novo Testamento, Mateus 14: 15-21. Rêmoras são peixes
da família Echeneidae, cuja barbatana em forma de ventosa possibilita sua fixação em outros animais ou superficies, ao
que aumenta seu potencial migratório. Torpedos são peixes da família Torpedinidae que produzem corrente elétrica,
paralisando seus predadores. Os “4-olhos” pertencem à família Anablepidae, sendo duas espécies encontradas na
região onde Vieira então vivia, a Anableps anableps e a Anableps microlepis. Eles possuem apenas dois olhos, cada um
com uma dupla estrutura, aérea e aquática. Ver Valéria Oliveira, Nelson Fontoura e Luciano Muntag, “Reproductive
characteristics and the weight-length relationship in Anableps anableps (Linnaeus, 1758) (Cyprinodontiformes:
Anablepidae) from the Amazon Estuary”, Neotropical Ichthyology, v. 9, no 4 (2011): 757-766.
4
Roncadores integram, entre outros, a família Haemulidae, comum nas costas do Atlântico brasileiro, especialmente a
Anisotremus virginicus. O ruído do ronco é produzido pelo o atrito dos dentes. Entre os voadores, as espécies mais
comuns no Brasil são Cypselurus cyanopterus e Hirundichthys affinis. Ver Andrea de Araújo e Sathyabama Chellappa,
“Estratégia reprodutiva do peixe voador, Hirundichthys affinis Günther”, Revista Brasileira de Zoologia, v. 19, no 3
(2002): 691-703. Paradoxalmente, os peixes pegadores dificilmente podem ser distintos das rêmoras inicialmente
elogiadas, pois todos se fixam a outros peixes maiores com suas ventosas. Acredito que a distinção de Vieira em dois
momentos diferentes do discurso é apenas um recurso retórico.
O que se torna claro ao leitor atento é que o Sermão aos peixes não é
sobre animais ou sobre as relações dos seres humanos com eles, mas é tão somente
sobre os homens que Vieira queria arrancar da insensibilidade. Virar-lhes as costas
era um recurso radical para despertar sua atenção, contando fábulas que incitavam o
arrependimento e a obediência aos princípios cristãos e às leis portuguesas. Além do
conteúdo religioso mais estrito, o sermão de Vieira – como tantos que compôs – era
uma peça política, social e cultural no intrincado jogo da colonização da América
Portuguesa.
5
Pécora, Teatro do sacramento. Sobre o conceito de lugar social, ver Michel de Certeau, A escrita da história (Rio de
Janeiro: Forense Universitária, 1982), 66.
mesmo que muitas vezes misturadas a lendas e mitos. Em 1560, muito antes do
Sermão aos peixes, Padre Anchieta escreveu a Carta de São Vicente enquanto
trabalhava na catequese dos índios da capitania de mesmo nome, situada no sudeste
da colônia, numa área integrada ao denso maciço florestal posteriormente nomeado
de Mata Atlântica. Dirigida ao Padre Geral, narrava coisas dignas de admiração ou
desconhecidas daquela parte do mundo. Anchieta descreve peixes, mamíferos
aquáticos e terrestres, répteis, insetos, aves, descrevendo características variadas
sobre cada um. Uma das avaliações predominantes sobre os animais elencados
versava sobre sua utilidade como alimento. Assim, os papagaios eram “todos bons
para se comerem”; o mel era farto e produzido por “quase vinte espécies diversas de
abelhas”; formigas içás tostadas constituíam deleitável e saudável iguaria, as infinitas
multidões de macacos eram “todas mui próprias para se comer”; o boi marinho ou
iguarará era “excelente para comer-se” e sua gordura, uma vez levada ao fogo,
produzia um excelente molho comparável à manteiga; o tamanduá era
“saborosíssimo”, seu sabor semelhante “à carne de vaca, sendo todavia mais mole e
macia” e assim por diante6.
ROMPENDO TRADIÇÕES
mitos edênicos logo após os descobrimentos. Esse autor argumentou que a forma
mentis lusitana – tal como expressa desde a carta de Pero Vaz de Caminha a El-Rey,
escrita em maio de 1500, até meados do século XVII, ou um pouco mais – gerava
descrições da natureza dominadas pelos padrões conservadores e arcaicos do
pensamento medieval, pela resignação e fatalismo alheios à curiosidade universal tão
marcante no humanismo ascendente em outras partes da Europa7.
ouro que se extrai até o esgotamento, tudo isso sem permanência de benefícios que
não o do fortalecimento dos interesses das elites oligárquicas. Essa “procissão de
milagres” perdurou por todo o período colonial, não foi interrompida pela
Independência, nem sequer pela República10. Para o autor, tratava-se de superar as
raízes ibéricas, de construir novos valores e práticas para a sociedade brasileira, de
romper, enfim, com um passado que as elites incessantemente reinventam e
reinauguram no presente, sufocando outras possibilidades para o futuro.
10
Holanda, Visão do Paraíso, 334. Se hoje estivesse vivo, Holanda se depararia com um Brasil da soja e do gado que
avança de forma impiedosa sobre o bioma cerrado, dos garimpos ilegais na Amazônia e da sede de exploração de
minérios nas reservas indígenas, da derrubada da floresta por madeireiros ilegais, das grandes explorações
siderúrgicas e seu rastro de destruição ambiental, como ocorreu na explosão das barragens de resíduos de minérios
nas cidades mineiras de Mariana (2016) e Brumadinho (2019).
11
No caso específico aqui tratado, o legado português e colonial teria aprofundado – na interpretação de Buarque de
Holanda - o que foi conceituado por Plumwood como “standpoint of mastery”, um dualismo racional no qual o mundo
natural aparece subordinado ao homem . Essa autora ressalta a marca do patriarcado, pois mulheres, indígenas e
animais acabam englobados na visão predominante construída sobre o mundo natural. Segundo ela, “the category of
nature is a filed of multiple exclusion and control, not only of non-humans, but of various groups of humans and aspects
of human life which are cast as nature.” Val Plumwood. Feminism and the Mastery of Nature (New York: Routledge,
1993), 4. Da mesma autora, ver também Environmental Culture: The Ecological Crisis of Reason (New York: Routledge,
2002), 12. No caso do Brasil, seria possível incluir os africanos e seus descendentes, transportados e comercializados
como objetos para trabalharem na empreitada colonial.
12
Sérgio Buarque de Holanda. Monções 3a ed. (São Paulo: Brasiliense, 2000); Caminhos e Fronteiras 3a ed. (São
Paulo: Companhia das Letras, 1994). Nas próximas citações: Holanda, Monções; Holanda, C&F.
13
Certeau, A escrita da história, 78-86.
observação do entorno para sobreviver determinava que “os laços que unem o homem
ao mundo ambiente” se estreitassem, configurando uma “comunhão assídua com a
vida íntima da natureza”. A vegetação das matas e o curso acidentado e
encachoeirados dos rios determinavam os tipos das canoas possíveis de serem
construídas e utilizadas. No meio da mata, para vencer a sede, era preciso saber
identificar árvores e plantas que serviriam como fonte de água. Havia também
consequências sociais, pois dias a fio em embarcações no meio da mata fechada
estimulavam a contenção dos comportamentos e o estabelecimento de regras e
limites da convivência.
Animais são analisados, por Sérgio Buarque, como agentes em seu meio. Eles
condicionam as ações humanas, impõem a observação, instigam o conhecimento,
demandam soluções. Muitas vezes, o colonizador fracassa. A umidade da mata
arruinava as armas de fogo que, simplesmente, paravam de funcionar, e deixavam os
invasores sem defesa possível frente ao ataque de uma onça.
14
Robert Wegner, A conquista do Oeste, a fronteira na obra de Sérgio Buarque de Holanda (Belo Horizonte: Editora
UFMG, 2000), 145-7, 211.
(diversas espécies formigas cortadeiras do gênero Atta), e larvas diversas. Pesca e caça
também forneciam proteína e sabores.
Por outro lado, a ação dos animais também instaurava a ameaça de morte e de
doença, em situações em que a fonte de alimento era o ser humano, que passava da
condição de caçador à de presa. Piranhas arrancavam nacos de carne dos desavisados
que ousassem banhar-se em certos rios. Mosquitos diversos, carrapatos e bichos de
pé (Tunga penetrans) sugavam os caminhantes dia e noite, causando verdadeiros
tormentos e podendo mesmo levar à morte, fosse por malária, febre amarela, ou até
septicemia no caso de feridas que infeccionassem. Os invasores despertavam também
as estratégias de defesa de certos animais: serpentes numerosas aterrorizavam
mesmo os sertanistas mais atentos e experientes. Uma vez consumado, o ataque
mobilizava uma miríade de práticas de cura, superstições, rezas e benzeduras, numa
agonia humana resignada e estendida em vários dias. Jaguares se moviam pelas
“brenhas com rapidez e agilidade extrema”, avançando em silêncio e precisão,
atacando quando se sentiam ameaçados em seus territórios15. Nas áreas de ocupação
humana a presença de gafanhotos e grilos destruíam roçados, tornando os alimentos
disponíveis para os humanos mais escassos. Ratos, baratas e pulgas causavam
doenças, morcegos atacavam animais de criação.
15
Holanda, Monções, 51, 101; Holanda, C&F, 36, 57, 95, 102-107. Walker, ao discutir as várias formas de intimidade e
proximidade entre seres humanos e outros animais, fala da “intimacy of violence”, quando o ser humano é alimento e se
transforma em energia para outro animal. Uma vez , puxado de volta ao metabolismo do reino natural, o ser humano é
“ripped from the safe confines of cultural dominium”. Brett L. Walker, “Animals and the Intimacy of History”, in The Oxford
Handbook of Environmental History, Andrew G. Isenberg ed, 52-75 (New York: Oxford University Press, 2014), 54. Ver
também Val Plumwook, “Being Prey”, Terra Nova 1, no. 3 (1996): 32-44.
16
Holanda, Monções, 27, 165-168. Holanda, C&F, 60, 79-81, 91, 95, 102.
Três anos antes de Sérgio Buarque publicar Monções, em 1942, Caio Prado
Jr. lançou Formação do Brasil Contemporâneo, no qual argumentou que a pecuária era
um dos mais importantes capítulos da história brasileira. Não obstante ser um atento
leitor de fontes arquivísticas, o fascínio de Caio Prado Jr pela geografia tornou-o um
incansável observador de paisagens, e o trabalho de campo informou parte crucial de
suas interpretações. Caio Prado traçou as diferentes áreas da pecuária na colônia,
cada uma com condições naturais e técnicas de criação específicas, e na maioria delas
constatou, desolado, a permanência, no exato momento em que escrevia, da produção
extensiva e de baixa produtividade, com técnicas destrutivas de desmate e formação
de pastos, com o uso de largas faixas de território sem ganhos econômicos e sociais
efetivos18.
17
João Capistrano de Abreu, Capítulos de História Colonial, 5a ed. (Brasília: Editora UnB, 1963),147-148.
18
Caio Prado Jr. Formação do Brasil Contemporâneo, 1942 (São Paulo: Companhia das Letras, 2011), 195-221. Ver
ainda: Paulo Henrique Martinez, A dinâmica de um pensamento critico: Caio Prado Jr. (São Paulo: Edusp, 2008). Sobre
os temas de história em natureza em Holanda e Prado Jr. ver ainda: Regina Horta Duarte, “Nature and Historiography in
Brazil”, Iberoamericana América Latina, España, Portugal 3 no 10 (2003): 23-36.
19
Essas vertentes historiográficas estão fora do interesse imediato do presente ensaio, não obstante sua importância
inegável. Por isso, esta autora preferiu omitir os dados de edição das obras seminais de cada um desses historiadores.
Seria difícil citar aqui todas os temas explorados desde então, mas o grande
impulso inicial ocorreu em duas frentes principais. A história do movimento operário
voltou-se para as condições de vida e trabalho e as estratégias cotidianas de luta
contra a exploração. A história da escravidão renovou-se, catapultando os
escravizados e seus descendentes ao papel de protagonistas da história, tocando
numa pedra de toque do racismo arraigado na sociedade brasileira. As interpretações
históricas conferiram nova complexidade às relações entre dominantes e dominados,
privilegiando diversos atores como agentes políticos e sociais decisivos. Tratava-se de
recuperar as falas e ações dos sujeitos históricos. Na sequência dos trabalhadores
livres e escravizados, e especialmente a partir da década de 1990, os historiadores
brasileiros voltaram-se também para os trabalhadores rurais (fossem lavradores,
seringueiros, ou ainda os participantes dos vários movimentos milenaristas no Brasil,
como Canudos ou Contestado), artesãos, indígenas, caricaturistas, artistas
mambembes, ciganos, mulheres, homossexuais, “loucos”, cantores de rádio, crianças,
estudantes, boêmios, sambistas, quilombolas. Uma pluralidade de vozes povoou a
história do Brasil.
20
Maria Celia Paoli, “Os trabalhadores urbanos na fala dos outros: tempo, espaço e classe na história operaria
brasileira‟, in Anais do Encontro da Associação Brasileira de Antropologia (Rio de Janeiro: Museu Nacional, UFRJ,
1982), 16-65; Eliana Dutra & Yonne Grossi, “Historiografia e movimento operario: o novo em questão”, Revista Brasileira
de Estudos Políticos 65 (1988): 77-108; Angela de Castro Gomes, “Questão social e historiografia no Brasil pós-80:
notas para um debate”, Estudos Históricos 34 (2004): 157-186.
22
Regina Horta Duarte, “Cavalinhos, leões e outros bichos: o circo e os animais”, Varia História 26 n.26 (2002): 97-106;
Duarte, “Pássaros e cientistas no Brasil: em busca de proteção”, Latin American Research Review 41 no 1 (2006): 3-26;
Duarte, “Zoogeografia do Brasil: Fronteiras nacionais, percursos pan-americanos”, Latin American Research Review 49
no. 1 (2014): 68-83; Duarte, “Zoos in Latin America”, in: William Beezley.ed. The Oxford Research Encyclopedia of Latin
American History. New York: Oxford University Press, 2017.
https://oxfordre.com/latinamericanhistory/view/10.1093/acrefore/9780199366439.001.0001/acrefore-9780199366439-e-
439 Duarte, “El zoológico del porvenir: narrativas y memorias de nación sobre el Zoológico de Chapultepec, Ciudad de
México, siglo XX”, Historia Critica 21 no 72 (2019): 93-113.
23
Diogo de Carvalho Cabral, “O Brasil é um grande formigueiro: território, ecologia e a história ambiental da América
Portuguesa”, parte I, HALAC 3 no.2 (2014): 467-489; parte 2, HALAC 4 no.1 (2015): 87-113.
24
Lorelay Kuri (org.), Representações da fauna do Brasil, séculos XVI-XX (Rio de Janeiro: Andrea Jakobsson Estúdio,
2014).
25
Valéria Mara de Oliveira, “Nascidas do Sol e da Chuva: Minas Gerais e o combate às saúvas”, Dissertação de
Mestrado, Universidade Federal de Minas Gerais, Brasil, 2007.
http://www.bibliotecadigital.ufmg.br/dspace/handle/1843/BUBD-9EFM7M Ver ainda, da mesma autora: Oliveira, “O Brasil
contra a saúva: considerações sobre a Campanha Nacional de 1935”, Cadernos de Pesquisa do CDHIS-UFU 23
(2010): 563-580; Oliveira, “De insetos e outros bichos no papel”, Revista do Arquivo Publico Mineiro 51 (2015): 154-
161.
26
Valéria Dorneles Fernandes, “Pragas de gafanhotos: relações entre natureza e sociedade, Argentina, Brasil e
Uruguai, 1890-1950. Da autora, ver: Fernandes, “Combate à praga de gafanhotos na América do Sul: diferentes
técnicas apresentadas pelo Almanaque do Ministério de Agricultura de la Nación (Argentina, 1925-52)”, Estudios
Rurales 8 no. 15 (2018): 232-256.
27
Miguel Mundstock Xavier de Carvalho e Odair Oliveira, “Memórias de criadores de suínos: a modernização da
suinocultura vista a partir da experiência dos criadores, Paraná”, Revista de História Regional 23 no. 1 (2018): 134-150.
Há importantes trabalhos de brasilianistas sobre frente de expansão pastoril no Brasil. A história do gado na região sul
foi pioneiramente estudada por Stephen Bell, Campanha Gaúcha: a Brazilian Ranching System, 1850-1920 (Stanford:
Stanford University Press, 1998). No estado do Mato Grosso, obra mais recente privilegia aspectos econômicos, sociais
e políticos do ranching, focando, além do gado, jaguares, moscas e outros animais do cerrado e pantanal. Robert W.
Wilcox, Cattle in the Backlands: Mato Grosso and the Evolution of Ranching in the Brazilian Tropics (Austin: University
of Texas Press, 2017).
28
Mark Hickie, Rogerio Oliveira e Mariana Quinteiro, “The Ecological, Economic, and Cultural Legacies of the Mule in
Southeast Brazil”, Society & Animals 26 (2018): 1-20.
no Rio de Janeiro, abrindo diálogo mais específico com a história dos animais29.
Fonseca também partiu da questão do consumo de carne, mas seu trabalho se
desenvolve entre a história do tempo presente e a história dos animais, analisando a
mudança de sensibilidades desde os anos 1970, no Brasil30. Com consistente
sofisticação teórica, os trabalhos de Ostos sobre a história das sociedades protetoras
dos animais têm assumido relevância na configuração desse campo do conhecimento
no Brasil, e a apresentam como uma das historiadoras atualmente dedicadas
exclusivamente a esse tema31.
29
Lucas Vinicius Erichsen Rocha, “Passagens e novas fronteiras dos abates: o Matadouro Municipal de Ponta Grossa e
a historicidade dos espaços de matança animal centralizada” (Dissertação de mestrado, Universidade Estadual de
Ponta Grossa, Paraná, 2015) http://tede2.uepg.br/jspui/handle/prefix/368
30
Maira Kaminski da Fonseca, “Da crueldade à libertação: análise dos níveis de sensibilidade em relação aos animais
no Brasil pós década de 1970” (Dissertação de Mestrado, Universidade Federal de Santa Catarina, 2018).
https://repositorio.ufsc.br/handle/123456789/189165
31
Natascha Stefania de Carvalho Ostos, “Por que devemos ser bons para com os animais? A formação prática e moral
dos brasileiros por meio dos discursos de proteção aos animais (1930-1939)”, Historia Critica 21 no. 71 (2019):49-68;
Ostos, “União Internacional Protetora dos Animais de São Paulo: práticas, discursos e representações de uma entidade
nas primeiras décadas do século XX”, Revista Brasileira de História 37 no. 1 (2017):1-22.
32
Os dossiês sobre animais em revistas de antropologia no Brasil estão em: “Dossiê Relações humanos e animais”,
Anuário Antropológico, 37 no. 12 (2012); “Dossiê Animais e humanos”, AntHropológicas 24 no. 1 (2013); Cadernos
Eletrônicos de Ciências Sociais (CADECS) 3 no.1(2015); “Dossiê Animalidades plurais”, R@u – Revista de Antropologia
da UFSCar 7 no.1 (2015); “Dossiê Humanos e não humanos”, Revista de Estudos e Investigações Antropológicas 3 no.
1 (2016); “Dossiê Animais em contextos rurais e indígenas”, Teoria & Cultura 11 no. 2 (2016); “Dossiê Antropologia das
relações humano-animal: paisagens simbólico-práticas de coexistência”, Iluminuras 17 no. 42 (2016); “Dossier Animals
in Anthropology”, Vibrant – Virtual Brazilian Anthropology 13 no. 2 (2016).
33
Felipe Vander Velden, “Apresentação ao dossiê „animalidades plurais‟”, R@u 7 no.11 (2015): 7-16.
34
Eduardo Viveiros de Castro, Araweté: os deuses canibais (Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor/Anpocs, 1986), p. 221-
228. Ver ainda Viveiros de Castro, Perspectivismo e multinaturalismo na América Indígena”, in: A inconstância da alma
selvagem (São Paulo: Cosac & Naify, 2002), p. 345-400.
35
Felipe Vander Velden, Inquietas companias: sobre os animais de criação entre os Karitiana (São Paulo: Alameda,
2012). Ver também seu livro mais recente, Velden, Jóias da floresta: antropologia do tráfico de animais (São Carlos:
EdUFscar, 2018).
questão da nossa relacionalidade com o que não é humano como a “quarta ferida ao
narcisismo primário”. Kohn também tem sido atentamente discutido pelos
antropólogos brasileiros, na sua redefinição de noções de pensamento e
representação, por sua experiência com os povos amazônicos Runa (Ecuador), num
enredamento radical entre humanos e os outros seres vivos36.
Essa ausência é ainda mais angustiante por três aspectos. Em primeiro lugar,
pelo fato de o Brasil ter uma fauna nativa e aclimatada incrivelmente diversa, além de
uma história calcada na participação de animais nas mais diversas atividades
econômicas e nas variegadas práticas culturais, religiosas e artísticas de nossas
populações, ao longo do tempo, e nos diferentes espaços do território. Em segundo
lugar, pelo fato de Sérgio Buarque, um dos mais respeitados historiadores brasileiros,
ter explorado magistralmente a temática das relações entre homens e animais numa
de suas obras mais magistrais e impactantes, Visão do Paraíso, em 1956, e que tem
várias e comemoradas reedições. Se a contribuição de Sérgio é sempre lembrada e
discutida em variados aspectos – destaque para o conceito de “homem cordial” e sua
interpretação das “raízes do Brasil” – o foco privilegiado nos animais foi
36
Donna Haraway, The Companion Species Manifesto (Chicago: Prickly Paradigm Press, 2003), Haraway, When
Species Meet (Minneapolis: University of Minnesota Press, 2008). As três primeiras feridas do narcisismo primário,
elencadas por Jacques Derrida, seriam a copernicana, a darwiniana e a freudiana. Eduardo Eduardo Kohn, How Forests
Think: Toward an Anthropology Beyond the Human (Berkeley: University of California Press, 2013). Sobre o impacto
significativo dessa abordagem entre antropólogos brasileiros – cujas obras permanecem sem tradução para o português
– ver, por exemplo, Iara Maria de Almeida Souza, “Review”, Horizontes Antropológicos 21 no. 43 (2015): 411-416.
37
Ver: Erica Fudge, “A Left-Handed Blow: Writing the History of Animals”, in Representing Animals, Nigel Rothfels ed.
(Bloomington: Indiana University Press, 2002): 3-18; Harriet Ritvo, “On the Animal turn”, Daedalus 136 no.4 (2007): 118-
121; David G. Shaw, “A Way with Animals”, History and Theory 52 (2013): 1-12; Susan Nance, “Introduction”, in The
Historical Animal (Syracuse: Syracuse University Press, 2015), p.1-18; Zeb Tortorici and Martha Few, “Writing Animal
Histories” in Centering Animals in Latin America (Durham: Duke University Press, 2013), p.1-27.
RESULTADOS E DISCUSSÕES
Em primeiro lugar, a história dos seres humanos é também uma história dos
animais. Não há retorno da segunda ruptura narcísica, desde que Darwin escandalizou
a sociedade vitoriana ao evidenciar a condição do Homo sapiens. Integramos a vida
animal no planeta. Falar do humano implica recuperar nossa condição biológica e as
dimensões materiais de nossa existência. Podemos criar miríades de práticas
socioculturais e tecnológicas em torno do sexo, do nascimento, da doença, da
alimentação, da morte. Mas não há como escapar do fato irredutível de que nascemos,
nos alimentamos, nos reproduzimos, e morremos. Nem mesmo nosso corpo individual
é uma unidade “fechada”, como mostra Donna Haraway:
38
Haraway, When Species Meet, 3-4. Livre tradução pela autora deste artigo.
Em segundo lugar, uma história que não inclui os animais omite um ponto
crucial da trajetória das sociedades humanas no planeta Terra. E isso também vale,
claro, para o Brasil, porque os animais sempre compuseram a vida dos seus
habitantes. Muito antes da chegada dos portugueses, populações nativas
relacionavam-se com a fauna na construção de visões de universo, na caça, aliança e
convívio afetivo. Eram, por vezes, presas, por vezes, caçadores. Os europeus
trouxeram seus animais, fascinaram-se com os que encontraram, mas também tantas
vezes os desprezaram e os julgaram unicamente pela utilidade, a exemplo de Anchieta
e Vieira. O gado pisoteou a terra rumo ao sertão, conquistando o território, e seu
couro tornou-se matéria prima dos mais variados objetos de uso diário. Bois
acompanharam o dia a dia dos engenhos de cana de açúcar e, junto com mulas e
jumentos, cruzaram as montanhas e vales da região centro sul, transportando
galinhas, ovos, leite, queijos, torresmos, banha. Animais integravam os inventários
post-mortem preservados nos arquivos, assim como a Historia Naturalis Brasiliae,
publicada em 1648 por Willem Piso e George MarcGraf e as obras de viajantes como
Jean-Baptiste Debret. Cavalos encheram as ruas das cidades no despertar da
urbanização de capitais como o Rio de Janeiro, Recife e São Paulo, logo no início da
República. Cães perambulavam pelas ruas, famintos e alquebrados, sensibilizando
habitantes burgueses de São Paulo e do Rio de Janeiro, fundadores das primeiras
Sociedades Protetoras. Pássaros enfeitaram os chapéus das mulheres elegantes.
Couros de animais silvestres compuseram exportações legais e ilegais. Animais
diversos povoaram os picadeiros dos circos que percorriam as pequeninas vilas do
interior, mas também as coleções zoológicas do Museu Nacional e no Museu Paraense
Emilio Goeldi. Invadiram as páginas literárias de autores como Machado de Assis,
Guimarães Rosa, Clarice Lispector. Compuseram as imagens do cinema de Humberto
Mauro e de Nelson Pereira dos Santos, saltaram dos traços do pincéis de Alberto
Guignard e Tarsila do Amaral, dos versos dos poemas de Carlos Drummond de
Andrade, da música popular brasileira. Foram inimigos da Nação, causadores da
malária que dizimou milhares de homens durante a construção da Ferrovia Madeira-
Mamoré, na Amazônia, assim como da febre amarela que avassalou o Rio de Janeiro
entre fins do século XIX e início do século XX. Formigas ameaçaram acabar com o
Brasil, caso o Brasil não fosse capaz de dar cabo delas. Corpos de animais circularam
nas mesas de vivissecção, nos matadouros instalados nas cidades, nas bancas das
vendas e mercados, nas receitas de sopa de tartaruga e pastel de passarinho 39.
***
39
R.C.M. O cozinheiro imperial (Rio de Janeiro: Laemmert & Cia, 1840), 13,173,
nuestro entorno natural”40. Além da postura de “quem vier depois que se arranje”,41
quais práticas diferentes dessa integraram a história da sociedade brasileira ao longo
dos séculos? Quais outras podemos sonhar construir no presente e fazer prosperar no
futuro?
AGRADECIMENTOS
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ABSTRACT
This essay aims to present the state of the art of animal studies conducted by historians in
Brazil. Sérgio Buarque de Holanda identified a Luso-Brazilian cultural tradition, in which a
relationship of extreme unpredictability and anthropocentrism prevailed in relation to the
natural world and, consequently, to animals, since the first years of the territory’s
colonization. Given the innovative character of some of Sérgio Buarque's approach to animals,
and the acknowledged importance of this historian, it is surprising that this aspect was
obscured by Brazilian historiography between the 1960s and 2000s. In recent years, animals
have invaded the horizon of interest to historians. However, one cannot yet speak of really
well established field of animal studies in Brazilian historiography. The conclusion discusses
the possible reasons for this gap.
Keywords: Animal history, Brazilian historiography, Sérgio Buarque de Holanda.
Recebido: 30/05/2019
Aprovado: 10/11/2019